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Apostila Políticas de Segurança Pública

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Políticas de Segurança Pública 
 
 
 
Índice 
 
Apresentação 2 
 
Contextualização 2 
 
Relevância 3 
 
Bibliografia 4 
 
Avaliação 7 
 
Aula 1: Abordagem histórico-cultural das instituições de Segurança 
Pública e seu controle democrático interno e externo 8 
 
Aula 2: O Estado Democrático de Direito e o papel do policiamento no 
espaço público 17 
 
Aula 3: Policiamento comunitário 25 
 
Aula 4: Discussão e análise crítica das concepções de Política de 
Segurança Pública 31 
 
Aula 5: Política de Segurança Pública cidadã e política de extermínio 
do inimigo 38 
 
Aula 6: Formulação e análise de políticas no campo da Segurança Pública 45 
 
Aula 7: A intersetorialidade das Políticas de Segurança Pública 51 
 
Aula 8: A Municipalização das políticas de segurança 56 
 
Trabalho final 60 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Apresentação 
 
Depois de termos estudado os papéis dos profissionais de Segurança Pública e suas 
diferentes relações no processo de gestão integrada, e de termos analisado a relação 
desses atores com a ética, os Direitos Humanos e a cidadania, hoje, iniciaremos o estudo 
crítico das Políticas de Segurança Pública. 
 
A despeito da polêmica que o tema provoca na mídia, ainda é raro encontrarmos 
discussões técnicas sobre como construir uma Política de Segurança Pública eficiente e 
democrática. É sobre isso que pretendemos pensar e discutir com vocês nesta disciplina. 
 
A proposta é compreendermos fatores socioculturais relacionados às instituições de 
Segurança Pública para, a partir disso, analisarmos: quais os passos necessários à 
formulação de políticas voltadas à repressão da criminalidade com respeito aos Direitos 
Humanos; qual o papel da polícia nesse processo; e a que estamos nos referindo quando 
falamos em Municipalização da Segurança Pública. 
 
 
Contextualização 
 
A violência urbana representa um dos principais temas de debate da atualidade. Seu 
controle e sua redução se tornaram um dos maiores desafios dos gestores públicos, que 
passaram a desenvolver discursos e ações materializadas em políticas que parecem estar 
distantes de objetivos propalados. 
 
O conteúdo desta disciplina pretende esclarecer concepções relacionadas à temática das 
Políticas de Segurança Pública por meio da abordagem sociocultural das instituições de 
Segurança Pública e da análise do processo de formulação e manutenção dessas políticas 
como o conjunto de ações intersetoriais na sociedade. 
 
Estudos das Ciências Sociais e da Criminologia, realizados durante as duas últimas 
décadas, indicam a necessidade de evolução dos modelos de análise e tratamento do 
crime e da violência. Essa conclusão se deve ao fracasso do modelo repressivo clássico, 
baseado em uma política penal dissuasória de pretensão punitiva do Estado como única 
resposta ao problema do aumento do delito e seus efeitos. 
 
Esse modelo enfrenta, demasiadamente tarde, o problema do delito bem como privilegia 
a polarização Estado versus infrator, desconsiderando a questão da cidadania quando 
não ampara a vítima e não busca reintegrar o criminoso à sociedade. O elevado custo 
social e a extemporaneidade das ações desse modelo não interferem no ambiente 
situacional. 
 
Estudar as diferentes concepções de políticas desenvolvidas e os problemas relacionados 
ao fenômeno da violência significa aprofundar os conhecimentos, buscar soluções e 
preparar os gestores, os operadores de segurança e a própria sociedade para este 
desafio: controlar e reduzir a violência em nossa sociedade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Relevância 
 
É indiscutível a presença da temática da criminalidade no cotidiano dos moradores das 
zonas urbanas e rurais das cidades brasileiras, mas ainda se discute muito sobre quais as 
formas ideais de abordá-la. 
 
Nesse contexto, é indispensável analisar, de forma crítica, os desafios institucionais e 
socioeconômicos da elaboração de Políticas de Segurança Pública que tenham como 
objetivo a prevenção da violência e o combate à criminalidade com respeito aos Direitos 
Humanos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Bibliografia 
 
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______. O enigma de Nova York. In: OLIVEIRA, Nilson Vieira Oliveira (Org.). 
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Avaliação 
 
Em todas as disciplinas da pós-graduação online, existem: 
 
 
Avaliação formativa 
 
Não vale ponto, mas é importante para o aprofundamento e a fixação do conteúdo. Essa 
avaliação contém: 
 Atividades de fixação – atividades de passagem, presentes dentro das aulas; são 
testes contextualizados ao conteúdo explorado; 
 Exercícios de autocorreção – questões para verificação da aprendizagem; são 
essenciais, pois marcam sua presença em cada aula. 
 
 
Avaliação somativa 
 
Forma sua nota final na disciplina. Essa avaliação inclui: 
 Temas para discussão em fórum – que aprofundam e atualizam os temas 
estudados em aula; trata-se de um espaço para tirar suas dúvidas. Sua 
participação vale ponto; 
 Prova em data especificada no calendário acadêmico do curso, que será 
realizada em seu Polo; 
 Trabalho final da disciplina – resenha em 1 lauda (arquivo Word) do capítulo III 
do livro A síndrome da rainha vermelha: policiamento e Segurança Pública no 
século XXI, indicado na bibliografia do curso; ou uma resenha em 1 lauda 
(arquivo Word) do artigo O processo de gestão da segurança municipal, da 
pesquisadora Miriam Guindani. 
 
 
Orientações sobre a realização do trabalho podem ser obtidas com o professor no 
ambiente online, no Fórum de Discussão , no tópico Orientações do Trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 1: Abordagem histórico-cultural das instituições de Segurança 
Pública e seu controle democrático interno e externo 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: 
1. Estabelecer uma abordagem histórico-cultural das instituições de Segurança 
Pública; 
2. Identificar quais as formas de controle democrático interno e externo das 
instituições policiais. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
3. Realize a atividade proposta; 
4. Leia a síntese desta aula; 
5. Leia a chamada para a aula seguinte; 
6. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à primeira aula da disciplina Políticas de Segurança Pública. 
 
Quando falamos em instituições de Segurança Pública1, imediatamente fazemos a 
associação com as polícias em seus diferentes âmbitos. Isso pode ocorrer em razão da 
representação coletiva2 que temos tanto do que significa Segurança Pública quanto do 
que entendemos como o papel da polícia na sociedade. 
 
Trataremos mais adiante das concepções de Políticas de Segurança Pública. Por ora, 
abordaremos alguns pontos-chave da história da polícia no Brasil e de suas formas de 
controle social3 e institucional. 
 
Pronto para começar? 
 
 
 
 
 
1 Acesse a lista de sites oficiais das principais instituições de Segurança Pública no Brasil, disponível em: 
http://www.comunidadesegura.org/pt-br/node/90. 
 
2 Segundo Durkheim (1978, p. 79), a representação coletiva: 
 
“[...] traduz a maneira como o grupo se pensa em suas relações com os objetos que o afetam. Para 
compreender como a sociedade representa a si própria e ao mundo que a rodeia, precisamos considerar a 
natureza da sociedade, e não a dos indivíduos. Os símbolos com que ela se pensa mudam de acordo com sua 
natureza [...]. Se ela aceita ou condena certos modos de conduta, é porque entram em choque ou não com 
alguns de seus sentimentos fundamentais, sentimentos estes que pertencem à sua constituição”. 
 
Contemporaneamente, esse conceito tem sido usado por autores da Psicologia Social como representações 
sociais: 
 
“Um sistema de valores, ideias e práticas com uma dupla função: primeiro, estabelecer uma ordem que 
possibilitará às pessoas orientarem-se em seu mundo material e social e controlá-lo; e, em segundo lugar, 
possibilitar que a comunicação seja possível entre os membros de uma comunidade, fornecendo-lhes um código 
para nomear e classificar, sem ambiguidade, os vários aspectos de seu mundo e de sua história individual”. 
(MOSCOVICI, 2005, p. 21) 
 
3 Conceito aqui entendido como o controle que a sociedade faz das instituições de Segurança Pública por meio 
de Organizações Não Governamentais, Conselhos etc. 
 
 
 
 
 
 
 
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A polícia4 surge no século XIX, nos países europeus, como estrutura pública, profissional 
e permanente, voltada à manutenção da ordem pública5 e à garantia da segurança 
pública. Sua primeira função foi administrar as revoltas populares que, até então, eram 
abordadas pelo Exército. 
 
No Brasil, as polícias foram estruturadas no período imperial com a criação da 
Intendência de Polícia da Corte. No Período Colonial6, as polícias desenvolviam atividades 
judiciárias e investigativas. Após a Proclamação da Independência, foi criada a Guarda 
Nacional, formada por cidadãos eleitores7, que discriminava a maioria absoluta da 
população que não votava por não possuir renda. 
 
Recuemos, entretanto, um pouco no tempo para salientar a primazia histórica da polícia 
militar do Estado do Rio de Janeiro8. Em reconhecimento à singularidade dessa trajetória, 
vale citar o relato que a própria instituição divulga, em seu site9, sobre sua formação 
orgulhosa dos200 anos que, em 2009, foram celebrados: 
 
“No início do século XIX, como consequência da campanha Napolêonica de conquista do 
continente europeu, a Família Real portuguesa, juntamente com sua Corte, decidiram se 
mudar para o Brasil. Chegando aqui, a Corte instalou-se no Rio de Janeiro, iniciando a 
reorganização do Estado no dia 11 de março de 1808, com a nomeação de Ministros. Na 
época, a segurança pública era executada pelos chamados quadrilheiros – grupos 
formados por bons homens do Reino, armados de lanças e bastões, responsáveis pelo 
patrulhamento das vilas e cidades da metrópole portuguesa, cujo modelo foi estendido 
ao Brasil colonial. Eles eram responsáveis pelo policiamento das 75 ruas e alamedas da 
cidade do Rio. Com a chegada dessa nova população, os quadrilheiros não eram mais 
suficientes para fazer a proteção da Corte, até então, com cerca de 60.000 pessoas – 
mais da metade escravos. 
 
Em 13 de maio de 1809, dia do aniversário do Príncipe Regente, D. João VI criou a 
Divisão Militar da Guarda Real de Polícia da Corte (DMGRP), formada por 218 guardas 
com armas e trajes idênticos aos da Guarda Real Portuguesa. A DMGRP era composta por 
1 Estado-Maior, 3 regimentos de infantaria, 1 de artilharia e 1 esquadrão de cavalaria. 
Seu primeiro comandante foi José Maria Rebello de Andrade Vasconcellos e Souza, ex-
 
 
 
 
 
4 Etimologicamente, o termo deriva da expressão grega politeia: a arte de governar a cidade ou a arte de tratar 
da “coisa pública”. 
 
5 M. Rolim (2006, p. 21) discute quais as funções e responsabilidades da polícia, entendendo que a manutenção 
da ordem pública é uma noção insuficiente, tendo em vista que a “manutenção da ordem” pode estar 
sustentada em uma injustiça flagrante, como é o caso do apartheid ou outras práticas totalitárias. 
 
6 O Período Colonial começa com a expedição de Martim Afonso de Souza, em 1530, e vai até a Proclamação da 
Independência por Dom Pedro I, em 7 de setembro de 1822. 
 
7 A Constituição do Império, de 1824, determinava que apenas os cidadãos com renda mínima definida em seus 
artigos poderiam ser eleitores. A Guarda Nacional não fugia à regra de que a riqueza e a propriedade 
estabeleciam o grau de direitos políticos. 
 
8 Para uma análise profunda desse complexo processo histórico, recomendamos a leitura do artigo do professor 
Marcos Luiz Bretas A polícia carioca no Império, publicado na Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 12, 
n. 22, p. 219-234, 1998. 
 
9 Acesse o site da Polícia Militar, disponível em: http://www.policiamilitar.rj.gov.br/historia.asp. 
 
 
 
 
 
 
 
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capitão da Guarda de Portugal. Um brasileiro nato foi escolhido como seu auxiliar: o 
Major de Milícias Miguel Nunes Vidigal”. 
 
O aparelho repressivo estatal foi estruturado para agir frente aos “não eleitores”, ou seja, 
aos excluídos sociais, principalmente a população de etnia negra que, submetida à 
escravidão10, não era entendida como parte da raça humana, e sim como uma raça 
inferior que poderia ser vendida como mercadoria e forçada a trabalhar sem 
remuneração. 
 
O regime escravocrata durou 300 anos no Brasil. Nesse período, os negros foram 
torturados e assassinados, física e simbolicamente, assim como as populações 
indígenas11, que também tiveram suas tradições massacradas e suas terras roubadas. 
Quando conseguiam fugir de seus “donos”, os negros, índios e miseráveis protegiam-se 
em Quilombos12, no intuito de sobreviver e de resistir aos senhores de terras. 
 
Durante o Império, foram criados os Corpos de Guardas Municipais, a Intendência de 
Polícia e instituições de estrutura militar, como a Força Pública, por exemplo. A estrutura 
organizacional e de competências desses órgãos encontra-se presente até hoje: cada 
instituição policial desenvolve ações distintas, e nenhuma das polícias cumpre o ciclo 
completo da atividade policial, que se caracteriza pela investigação e o policiamento 
ostensivo. 
 
Não há concentração de atividades em uma instituição policial: com a institucionalização 
do inquérito policial13, a Intendência de Polícia – hoje Polícia Civil – passou a ter a 
competência legal de investigar e de realizar diligências para o descobrimento dos fatos 
criminosos, de suas circunstâncias, seus autores e cúmplices. Por outro lado, o 
 
 
 
 
 
10 O Estado brasileiro possui uma dívida irreparável em sua plenitude com a população de etnia negra 
escravizada e massacrada no Brasil. Com seu trabalho, os negros construíram o que hoje chamamos de 
economia do País. Em troca disso, foram privados do direito à integridade física e psicológica e ao estudo (pois 
eram proibidos de frequentar escolas e faculdades); de possuir bens materiais; do cultivo de suas religiões 
africanas etc. Com a Abolição, em 1888, os negros continuaram sem ter direitos civis e sem poder estudar, e 
foram novamente condenados à miséria no País. 
 
11 Sugestões de leitura: O povo brasileiro. A formação e o sentido do Brasil, do antropólogo Darcy Ribeiro; e as 
obras históricas do professor Marcos Bretas, como Ordem na cidade. O exercício cotidiano da autoridade policial 
no Rio de Janeiro: 1907-1930. 1. ed. v. 1. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. 221 p. 
 
12 Sugestão de leitura: Do Quilombo à favela: a produção do espaço criminalizado no Rio de Janeiro. 
 
13 Instituído pela Reforma Judiciária do Império – Lei n° 2.033, de setembro de 1871, regulamentada pelo 
Decreto n° 4.824, de 22 de novembro de 1871. Trata-se do Instituto do Código de Processo Penal, no qual são 
constituídas provas sem o crivo do contraditório – provas que vêm a ganhar caráter definitivo, orientando toda 
prova judicial. Esse Instituto atribui à polícia poder sem controle, pois sua elaboração não conta com a 
presença do Ministério Público e do advogado de defesa. Além disso, mesmo sem implicar juízo de culpa 
definitiva, o indiciamento pode trazer danos irreparáveis aos cidadãos, que terão contra si o preconceito 
estampado nas “folhas corridas”, ainda que diante de eventual pronunciamento posterior de inocência. 
 
Disponível em: http://www.soleis.adv.br/codigoprocessopenal.htm#DO%20INQU%C9RITO%20POLICIAL. 
Acesso em: 05 ago. 2007. 
 
Texto para reflexão: O princípio do contraditório e o inquérito policial. 
Disponível em: http://www.fdc.br/Arquivos/Mestrado/Revistas/Revista10/Discente/MargaridaMaria.pdf. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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policiamento ostensivo, uniformizado, de patrulhamento nas ruas e de atendimento das 
demandas urgentes da população, era – como é hoje – de competência das instituições 
policiais militares, cuja organização se baseava – como ainda hoje se baseia – nas regras 
do Exército, com treinamento para enfrentamento de inimigos (sustentado na lógica 
repressiva de combate com o uso de violência). 
 
O modelo dualizado – investigação e policiamento ostensivo – teve continuidade no 
período republicano. A mudança se deu em relação à centralidade da organização policial 
nos estados federados – antigas províncias do Império. Sendo assim, foi instituída a 
Polícia Federal, com caráter investigativo e judiciário. 
 
No período da Ditadura Militar14, de 1964 a 1985 – caracterizado pela supressão de 
direitos constitucionais, censura, perseguição política e repressão aos que eram 
contrários ao regime militar –, foram extintas as guardas civis em 15 Estados brasileiros. 
Em alguns casos, elas se somaram às forças militares estaduais, dando origem a Polícias 
Militares, comandadas por oficiais superiores do Exército e coordenadas pela Inspetoria-
Geral das Polícias Militares (IGPM)15, que “acompanhava” a execução das atividades 
dessasnovas instituições – as PMs –, de forma a não permitir desvios dos propósitos que 
lhes fossem estabelecidos pela União, na legislação pertinente. 
 
A partir do Decreto nº 88.777 de 198316, editado pelo Presidente João Figueiredo – que 
aprova o regulamento para Polícias Militares e Corpos de Bombeiros –, os governos 
estaduais (via Secretarias de Segurança Pública ou diretamente) ficaram incumbidos 
apenas da orientação e do planejamento das PMs, ou seja, do estabelecimento de 
diretrizes para as respectivas Polícias Militares estaduais. 
 
A Constituição Federal17 de 1988 (CF) foi um avanço no que tange aos direitos individuais 
e coletivos, e aos direitos sociais (Artigo 5º ao Artigo 11). Entretanto, no que se refere à 
estrutura institucional do setor de segurança, podemos afirmar que não houve mudanças 
significativas, inclusive, em certo sentido, a Carta Magna foi mais conservadora que a 
anterior (de 1969) no que tange às Justiças militares estaduais, ao garantir foro 
privilegiado para julgamento de policiais (Artigo 125, Parágrafos 3º e 4º). No Capítulo III 
da CF – Da Segurança Pública18 –, foi mantida a vinculação das Polícias Militares ao 
Exército, e, em relação à Polícia Civil, permaneceu a mesma orientação do período de 
arbítrio: preservou-se seu papel de polícia judiciária na elaboração do inquérito policial. 
 
A dualidade (constitucional) da atividade policial – cuja determinação indica que uma 
(Polícia Civil) realiza a investigação e a outra (Polícia Militar), o policiamento ostensivo – 
representa o maior obstáculo para o trabalho integrado das atividades policiais. Isso se 
 
 
 
 
14 Sugestão de leitura: Brasil nunca mais – um relato para a história. Rio de Janeiro: Vozes. 
 
15 Criada pelo Decreto n° 61.245, de 28 de agosto de 1967, com o objetivo de o Exército coordenar as ações 
das forças militares estaduais. 
 
16 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto/D88777.htm. 
 
17 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. 
 
18 Artigo 144, Parágrafo 6º. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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deve ao fato de que as Polícias Militares criam mecanismos de investigação, assim como 
as polícias civis recorrem à formação de unidades de policiamento ostensivo. 
 
O controle democrático interno e externo das instituições de Segurança Pública não 
ocorre apenas por regulamentos normativos, preceitos jurídicos ou sanções formais, mas 
como o produto de instituições, relações e processos sociais mais amplos. Esses 
processos vão desde a criação de ouvidorias e corregedorias até a atuação de Conselhos, 
a vigilância constante da mídia, o trabalho das ONGs/OSCIPs19 e de outras organizações 
da sociedade civil organizada – como os movimentos GLBTT, Social Negro, de defesa dos 
povos indígenas, de defesa dos Direitos Humanos, feministas e do hip hop. 
 
Nesse contexto, é preciso distinguir o que é Corregedoria do que é Ouvidoria, em termos 
de objeto, finalidade, proposta e atribuições. A destinação da Ouvidoria é canalizar, 
escutar, perceber e detectar problemas (ainda que também possa receber e registrar 
elogios e sugestões) para encaminhá-los à Corregedoria (ou aos comandos pertinentes, 
quando se trata de elogios e recomendações), que é quem tem atribuição para tomar 
medidas investigativas. Em outros países – como a Irlanda, por exemplo –, a Ouvidoria 
tem mais peso, autonomia e autoridade para investigar e acusar diretamente a Justiça. O 
ouvidor (ou a ouvidora) é eleito(a), tendo mandato e recursos correspondentes às 
responsabilidades. 
 
No Brasil, as Ouvidorias da polícia foram criadas a partir de meados da década de 1990, 
com a finalidade de receber reclamações ou elogios relacionados a policiais civis e 
militares. Mesmo quando os ouvidores têm mandato, não são eleitos e carecem de 
autonomia, autoridade e recursos para investigar por conta própria. Trata-se de uma 
atividade técnica, cujas atribuições são: ouvir as reclamações de qualquer cidadão contra 
os abusos de autoridades e agentes policiais, civis e militares; receber denúncias contra 
os atos arbitrários, ilegais e de improbidade administrativa – praticados por servidores 
públicos vinculados à Segurança Pública – ou elogios relativos a atos virtuosos. 
 
Já as Corregedorias têm como competência promover as ações necessárias à apuração 
da veracidade das reclamações e denúncias, e, nesse caso, tomar as medidas 
necessárias ao saneamento das irregularidades, ilegalidades e arbitrariedades 
constatadas, para responsabilização civil, administrativa e criminal dos imputados. 
 
Se forem realmente autônomas e tiverem poder de auditar e fiscalizar as polícias, as 
Ouvidorias e Corregedorias de Polícia representarão um instrumento de controle 
democrático da população sobre as instituições de Segurança Pública, podendo vir a ser 
um dos principais mecanismos para garantir o controle da atividade policial na ótica dos 
Direitos Humanos. Para tanto, as Ouvidorias e Corregedorias precisam ser independentes 
Isso só ocorrerá se houver mandato na execução das atividades e se o ouvidor e o 
 
 
 
 
19 ONG é a sigla de Organização Não Governamental. Sua designação negativa (Não Governamental) revela a 
ideia inicial de independência e ocupação do espaço público por quem não é do governo. No direito brasileiro, 
não há qualquer designação de ONG, mas um reconhecimento de cunho cultural, político e sociológico. 
 
OSCIP, por sua vez, é a sigla de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, conforme disposto pela 
Lei nº 9.790/99. Trata-se de grupo e subgrupo, gênero e espécie. A OSCIP é reconhecida como tal por ato do 
governo federal, emitido pelo Ministério da Justiça, ao analisar o estatuto da instituição. Para tanto, é 
necessário que o estatuto atenda a certos pré-requisitos que estão descritos nos Artigos 1º, 2º, 3º e 4º da Lei 
nº 9.790/99. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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corregedor não estiverem subordinados ao comando das polícias, à Secretaria de 
Segurança ou ao Governador do Estado, o que dificultará o andamento de denúncias 
contra o setor intermediário e superior das instituições policiais. 
 
Outro “ator” fundamental para o controle democrático das instituições policiais é o 
Ministério Público – instituição do Estado cuja finalidade é verificar se a lei está sendo 
obedecida e, em caso contrário, provocar (geralmente através do Poder Judiciário) os 
órgãos do Estado, com incumbência de obrigá-los a cumprir a lei. Nesse sentido, o 
Ministério Público promove a aplicação das leis, a fim de que suas orientações estejam 
presentes nas relações sociais, e não apenas nos textos legais. 
 
A partir da Constituição Federal (Artigo 127)20, o Ministério Público tornou-se uma 
instituição independente, não se vinculando a nenhum dos poderes do Estado, com 
garantias de autonomia administrativa e funcional. A autonomia baseia-se no fato de que 
o recrutamento de seus membros está em suas mãos. Da mesma forma, a 
independência funcional e as garantias constitucionais manifestam-se sob as formas de 
vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. Entretanto, isso tudo é 
discutível, pelo menos até certo ponto, quando observamos que cabe ao Executivo 
escolher o Procurador Geral da Justiça, com base em uma lista tríplice encaminhada pela 
própria instituição. 
 
Por outro lado, a capacidade efetiva de cumprir suas atribuições é limitada por fatores 
como a dependência em relação a outras instituições – particularmente o Judiciário e a 
Polícia –, já que elas podem facilitar, dificultar ou mesmoimpedir o andamento de uma 
investigação, além da possibilidade de vulnerabilidade a pressões políticas. Sendo assim, 
 
 
 
 
20 Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, 
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais 
indisponíveis. 
 
§ 1º – São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência 
funcional. 
 
§ 2º – Ao Ministério Público, é assegurada a autonomia funcional e administrativa, podendo, observado o 
disposto no Art. 169, propor ao Poder Legislativo a criação e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, 
provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a política remuneratória e os planos de 
carreira; a lei disporá sobre sua organização e funcionamento. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 
19, de 1998). 
 
§ 3º – O Ministério Público elaborará sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na Lei de 
Diretrizes Orçamentárias. 
 
§ 4º – Se o Ministério Público não encaminhar a respectiva proposta orçamentária dentro do prazo estabelecido 
na Lei de Diretrizes Orçamentárias, o Poder Executivo considerará, para fins de consolidação da proposta 
orçamentária anual, os valores aprovados na lei orçamentária vigente, ajustados de acordo com os limites 
estipulados na forma do § 3º. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). 
 
§ 5º – Se a proposta orçamentária de que trata este Artigo for encaminhada em desacordo com os limites 
estipulados na forma do § 3º, o Poder Executivo procederá aos ajustes necessários para fins de consolidação da 
proposta orçamentária anual. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). 
 
§ 6º – Durante a execução orçamentária do exercício, não poderá haver a realização de despesas ou a 
assunção de obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na Lei de Diretrizes Orçamentárias, exceto se 
previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais. (Incluído pela Emenda 
Constitucional nº 45, de 2004). 
 
 
 
 
 
 
 
 
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para que seja realizado o controle democrático eficiente, é necessário que ele seja 
interno e externo, como forma de evitar os riscos provocados pelo corporativismo. 
Quanto mais independente e fortalecida for a instituição que fará o controle, menos 
riscos haverá para seu funcionamento eficiente. 
 
Daremos continuidade ao tema das instituições de Segurança Pública na próxima aula, 
cujo tema abordado será: O Estado Democrático de Direito e o papel do policiamento no 
espaço público. 
 
 
 
Para saber mais sobre os tópicos estudados nesta aula: 
 
Assista ao filme Quase dois irmãos. 
 
Sinopse: Miguel, senador da República, visita seu amigo de infância 
Jorge – que se tornou um poderoso traficante de drogas do Rio de 
Janeiro – para lhe propor um projeto social nas favelas. Apesar de 
suas origens diferentes, eles se tornaram amigos quando crianças, 
nos anos 1950, pois o pai de Miguel tinha paixão pela cultura negra 
e o pai de Jorge era compositor de sambas. Nos anos 1970, eles se 
encontraram novamente na prisão de Ilha Grande. Ali, as diferenças 
raciais eram mais evidentes: enquanto a maior parte dos 
prisioneiros brancos estava lá por motivos políticos, a maioria dos 
prisioneiros negros era de criminosos comuns. Este filme é um 
retrato da relação entre a classe média e a favela carioca, marcado 
pela música popular e pela história política recente. 
 
 
Assista ao documentário Vlado: 30 anos depois. 
 
Sinopse: Este documentário conta a história do jornalista Vladimir 
Herzog através de depoimentos de pessoas que conviveram com 
ele. Herzog foi assassinado na prisão, em 1975, durante o Regime 
Militar brasileiro. 
 
 
 
 
Disponível em: http://www.adorocinema.com. Acesso em: 05 ago. 2010. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Suponha que uma pesquisa tenha sido realizada com os moradores das zonas mais ricas 
e das localidades mais pobres da cidade do Rio de Janeiro. Nessa pesquisa, cada morador 
teria sido questionado sobre o que entendia quanto às principais demandas em relação 
às polícias. Nesse caso, as respostas seriam certamente diferentes. 
 
Cada grupo social parte de sua realidade, ou seja, alguns – que possuem segurança 
privada no prédio em que moram – podem entender que o problema da polícia é a falta 
de estrutura para investigar os crimes. Outros – que não estão preocupados com a 
polícia judiciária e que nunca tiveram advogado – querem chegar às suas casas sem que 
sejam atingidos por balas perdidas. Esses moradores almejam uma polícia próxima, 
honesta, que proteja a comunidade dos bandidos. 
 
Pense nisso e responda: 
 
1. Da maneira como estão constituídas hoje, as polícias atendem a todos do mesmo 
modo? Justifique sua resposta. 
2. O papel das Ouvidorias é importante nesse processo? Justifique sua resposta. 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online. 
 
 
 
 
Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre as seguintes questões: 
 
A integração do ciclo completo das atividades policiais – investigação e policiamento 
ostensivo – poderia ser feita pela mesma instituição? Quais as vantagens e desvantagens 
dessa integração? 
 
Ao desempenharem suas funções, as polícias reproduzem as desigualdades econômicas e 
sociais? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Nesta aula, você: 
 Compreendeu o contexto em que as instituições policiais foram criadas; 
 Entendeu qual a função de cada instituição; 
 Conheceu as formas de controle externo e interno das polícias como órgãos 
imprescindíveis para a sociedade. 
 
 
 
Após termos estudado as questões relacionadas à abordagem histórico-cultural das 
instituições de Segurança Pública e seu controle democrático interno e externo, daremos 
continuidade ao assunto na próxima Aula, cujo tema abordado será: O Estado 
Democrático de Direito e o papel do policiamento no espaço público. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 2: O Estado Democrático de Direito e o papel do policiamento no 
espaço público 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: 
1. Definir Estado Democrático de Direito, democracia e lei; 
2. Avaliar o papel das polícias no espaço público e os limites legais a que estão 
submetidas; 
3. Identificar a importância da discricionariedade da função policial. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
3. Realize a atividade proposta; 
4. Leia a síntese desta aula; 
5. Leia a chamada para a aula seguinte; 
6. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à aula O Estado Democrático de Direito e o papel do 
policiamento no espaço público. 
 
Devido ao sentimento coletivo de insegurança e ao destaque dado pela mídia, nos 
últimos anos, ao aumento de casos de criminalidade nas cidades, discute-se, 
especialmente no meio acadêmico e em algumas instituições de Segurança Pública, o que 
se espera das polícias. 
 
Dependendo das diretrizes político-institucionais que determinam suas linhas de atuação 
junto à sociedade, as polícias podem ter vários papéis que não necessariamente se 
excluem, como, por exemplo, prender criminosos e, ao mesmo tempo,priorizar 
estratégias de prevenção da violência. 
 
Entretanto, independente dessas ”opções”, tanto as instituições de Segurança Pública 
quanto a sociedade civil estão submetidas ao Estado Democrático de Direito, ou seja, a 
lei é soberana. Portanto, o arbítrio do policiamento não é ilimitado. 
 
Com o advento da Constituição Federal do Brasil de 198821, foram incorporados ao 
Ordenamento Jurídico pátrio os princípios universais do Estado Democrático de Direito. O 
 
 
 
 
21 Art. 1º – A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do 
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: 
 
I – a soberania; 
 
II – a cidadania; 
 
III – a dignidade da pessoa humana; 
 
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; 
 
V – o pluralismo político. 
 
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou 
diretamente, nos termos desta Constituição. 
 
 
 
 
 
 
 
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conceito de Estado Democrático deriva da etimologia do termo democracia e significa que 
nenhum indivíduo – presidente ou cidadão comum – está acima da lei. 
 
Os três grandes movimentos político-sociais responsáveis pela condução ao Estado 
Democrático foram: a Revolução Inglesa, com influência de John Locke22 e expressão 
mais significativa em Bill of Rights23 (1689); a Revolução Americana, com seus princípios 
expressos na Declaração de Independência das 13 colônias (1776); e a Revolução 
Francesa, com influência de Jean Jacques Rousseau24, que deu universalidade a seus 
princípios devidamente expressos na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão 
(1789)25. 
 
A democracia é um sistema político no qual o povo inteiro tem o direito de tomar as 
decisões básicas, determinantes, por sua vez – pela mediação da representação –, das 
decisões políticas do país. Esse direito é garantido por um conjunto de regras 
fundamentais, tais como a Constituição brasileira e de outros países26. Como o coletivo é 
heterogêneo, normalmente, leva-se em conta a vontade da maioria, seguindo o 
entendimento de que o número maior está mais perto de representar o todo. Essa 
posição gera críticas, pois o todo não é a maioria, mas necessita de consenso e 
conciliação. Para que isso ocorra, é necessário que os indivíduos estejam em pé de 
igualdade relativamente às decisões fundamentais. Em outras palavras, há democracia 
em uma sociedade na qual exista um grau razoável de igualdade social, econômica e 
cultural. 
 
 
 
 
 
 
22 Suas ideias fundamentam-se na noção de governo consentido dos governados, diante da autoridade 
constituída, e do respeito ao direito natural do ser humano – de vida, liberdade e propriedade. Sem perder de 
vista o contexto histórico em que viveu, é importante ressaltar que, ao mesmo tempo em que Locke defendia a 
igualdade entre os homens, também era defensor da escravidão – mas não aquela determinada pela raça, 
como ocorreu no período escravocrata do Brasil. 
 
Como sugestão, leia o texto sobre e de Locke, disponível em: 
http://www.geocities.com/spaprado/textoslocke.html 
 
23 Declaração de Direito de 1689, proclamada na Inglaterra pelo Parlamento que determinou, entre outras 
coisas, a liberdade, a vida e a propriedade privada, assegurando o poder da burguesia na Inglaterra. 
 
Acesse o texto da Declaração, disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/decbill.htm. 
 
24 De acordo com Rousseau, (2001, p.17): 
 
“Renunciar à própria liberdade é o mesmo que renunciar à qualidade de homem, aos direitos da humanidade, 
inclusive a seus deveres. Não há nenhuma compensação possível para quem quer que renuncie a tudo. Tal 
renúncia é incompatível com a natureza humana, e é arrebatar toda moralidade a suas ações bem como 
subtrair toda liberdade à sua vontade. Enfim, não passa de vã e contraditória convenção estipular, de um lado, 
uma autoridade absoluta, e, de outro, uma obediência sem limites.” 
 
Acesse, na íntegra, a obra Contrato social: princípios do Direito político, de Jean-Jacques Rousseau, disponível 
em: http://www.cfh.ufsc.br/~wfil/contrato.pdf. 
 
25 Acesse a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, disponível em: 
http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/dec1793.htm. 
 
26 Leia sobre as Constituições e seus contextos, de José Saramago, disponível em: 
http://caderno.josesaramago.org/2008/10/20/constituicoes-e-realidades/ 
 
 
 
 
 
 
 
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No Brasil, a democracia foi tolhida por um conjunto de obstáculos como renda, 
propriedade, gênero, educação, idade e diversidade étnica, que levaram os grupos 
socialmente discriminados a se organizarem no que hoje chamamos de movimentos 
sociais – cada um com sua história, mas todos ligados pela exclusão do processo 
democrático e pela discriminação. 
 
A partir da democracia e da luta dos movimentos sociais organizados, foi conquistado o 
Estado Democrático de Direito – bandeira de luta contra o Regime Militar no Brasil e em 
outros lugares do mundo, em que governos tiranos27 imperaram sobre a vontade do 
povo. O Estado de Direito promove os direitos fundamentais, políticos, sociais e 
econômicos, protegendo o povo da tirania e da ilegalidade, e garantindo que os governos 
não tenham poder ilimitado, isto é, que também estejam submetidos às normas legais. 
Nesse sentido, o princípio da legalidade28 – presente no rol dos princípios do Estado 
Democrático de Direito – atua não só com regras, formas e procedimentos que excluem 
o arbítrio autoritário do Estado enquanto meio de ordenação racional, mas também como 
alicerce para a construção da igualdade social29 no país. Além disso, o Estado 
Democrático é considerado, pelo menos em teoria, como possível transformador da 
realidade, agindo como fomentador da participação pública para sustentar a democracia, 
tendo em vista que esta implica necessariamente o combate à desigualdade nas 
condições materiais de existência dos cidadãos. 
 
Para chegarmos à ideia atual de Estado Democrático, foram necessárias inúmeras 
rupturas e transformações no Estado de Direito. Diferentemente da ideia a que se 
prendiam os outros modelos de Estado (liberal e social), o Estado Democrático de Direito 
apresenta a incorporação de conteúdos novos, com o aumento de direitos e mudanças no 
próprio conteúdo do Direito. Verificamos uma mudança no caráter da regra jurídica, 
substituindo-se o preceito genérico e abstrato pelo predomínio de um direito interpretado 
à luz de um conjunto de valores e princípios. A concepção formal é submetida à 
predominância de concepção material ou substancial. O Estado adquire um caráter mais 
dinâmico e mais forte do que previa sua concepção formal, ou seja, privilegia-se a visão 
segundo a qual as normas devem estar submetidas às variações sociopolíticas, 
analisando-as de acordo com os princípios democráticos de Direito. 
 
Nesse contexto, o papel do policiamento no espaço público pode ser analisado por vários 
ângulos. A maior parte das pessoas espera que a polícia prenda os que cometeram 
condutas tipificadas como crimes “inaceitáveis”. Isso porque alguns tipos penais30 são 
 
 
 
 
27 Oposto de democracia. Trata-se de uma forma de governo em que há poder ilimitado por parte dos chefes de 
Estado. 
 
28 Sobre o princípio da legalidade, o Artigo 5º, Inciso II, da Constituição afirma: ninguém será obrigado a fazer 
ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. 
 
29 Por igualdade social, entende-se uma situação em quetodos (homens e mulheres de todas as etnias, negros, 
índios, ciganos etc.) tenham as mesmas condições de acesso à educação, à saúde, ao mercado de trabalho, à 
Segurança Pública, ao lazer, e, como defende o escritor Eduardo Galeano, ao direito de sonhar. 
 
Acesse o texto O Direito de Sonhar, disponível em: http://www.dhnet.org.br/desejos/sonhos/dsonhar.htm. 
 
30 Modelo pelo qual o Estado, por meio da lei penal, descreve e classifica o comportamento humano 
transgressor. Veja um exemplo no Código Penal: 
 
 
 
 
 
 
 
 
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mais aceitos que outros pela opinião pública, como, por exemplo, a sonegação fiscal31 e 
o estelionato32. Com o princípio nullum crimen sine lege33, a Lei Penal34 impede que o 
arbítrio de cada um defina o que deve ou não ser considerado como crime, limitando, de 
forma positiva, a atuação policial, mesmo sabendo que ela não impede mecanismos 
culturais de seleção do que é ou não condenável. 
 
Por outro lado, os policiais não lidam apenas com questões relacionadas à criminalidade, 
mas desempenham tarefas burocráticas, auxiliam em eventos públicos, buscam 
desaparecidos, escoltam autoridades, controlam multidões em jogos de futebol, 
transportam doentes aos hospitais etc. Diante da complexidade de demandas com as 
quais os policiais se deparam cotidianamente, é equivocado pensar que as polícias 
desempenham apenas atividades de combate à criminalidade35. Suas funções não 
podem ser reduzidas à luta contra o crime, pois, normalmente, abrangem uma enorme 
diversidade de tarefas. 
 
As polícias atuam segundo a legislação e seus estatutos, mas esses, como qualquer 
norma formal, necessitam da interpretação do indivíduo que irá aplicá-los. Essa 
sistemática chama-se poder discricionário dos profissionais de Segurança Pública. A 
discricionariedade é inerente ao trabalho; não se trata de descompromisso com a 
legalidade. A interpretação humana é parte do conjunto de fatores de que é composto o 
trabalho dos policiais. 
 
Para ser aplicada, a lei necessita de um agente que o faça. Isso implica escolha entre 
diferentes interpretações possíveis do fato. Por exemplo, alguém foi agredido ou, na 
verdade, sofreu as consequências da resistência de sua vítima? O pedido da presença 
policial tinha o intuito de salvar uma vida ou de proteger um cidadão e preservar direitos 
e liberdades, ou tinha a velada intenção de incriminar alguém, fazendo com que 
aparências ocultassem o que realmente aconteceu? Seria melhor apoiar a liderança local 
para obter a paz momentaneamente suprimida ou seria recomendável solicitar reforço e 
agir, diretamente, para restaurar a ordem pública? Haveria, de fato, riscos envolvidos 
em determinada situação, objeto de reclamação de alguns moradores e comerciantes, 
 
 
 
 
Art. 155 – Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e 
multa. 
 
31 Veja a tipificação da sonegação fiscal, disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/LEIS/1950-
1969/L4729.htm. 
 
32 Veja a tipificação do estelionato, disponível em: 
http://www.dji.com.br/codigos/1940_dl_002848_cp/cp171a179.htm. 
 
Para refletir sobre estelionato e impunidade, acesse : 
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6223 
 
33 Expressão latina que significa: não haverá crime sem lei anterior que o defina. Em outras palavras, alguém 
só pode ser preso se a lei (anterior ao fato) disser que sua ação ou omissão constitui um fato delituoso (Artigo 
2º do Código Penal Brasileiro). 
 
34 Acesse, na íntegra, o Código Penal Brasileiro, disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-
Lei/Del2848compilado.htm. 
 
35 Acesse o site da Revista do Fórum de Brasileiro de Segurança Pública, com artigos sobre o tema, disponível 
em: http://www.forumseguranca.org.br/pdf/revista_3/RBSP_BAIXAres.pdf. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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em uma certa rua, ou se trata de preconceito contra adolescentes pobres, que apenas 
se divertiam na área, sem cometer qualquer crime ou irregularidade? 
 
O atributo da discricionariedade na função policial36 não pode ser entendido como medida 
arbitrária. Embora tenha caráter subjetivo, trata-se de uma prerrogativa legal conferida à 
Administração Pública para a prática de atos administrativos quanto à conveniência, à 
oportunidade e ao conteúdo desses atos. A discricionariedade37 é a liberdade de ação 
administrativa dentro dos limites estabelecidos pela lei. Portanto, não se confunde com 
arbitrariedade. 
 
Cabe salientar que os profissionais de segurança, tanto no momento de interpretar as 
normas quanto no atendimento ao público, podem adotar comportamentos desiguais, de 
acordo com as características de cada indivíduo-alvo da abordagem – por exemplo, se for 
pobre, negro, profissional do sexo ou estrangeiro (especialmente de países latino-
americanos). Essa postura não representa, necessariamente, um desejo consciente do 
indivíduo profissional de polícia ou uma exigência de seus superiores. Essa postura pode 
ser a reprodução do sistema sociocultural perverso e excludente no qual está inserido de 
forma involuntária, o que, por outro lado, não exclui sua responsabilidade enquanto 
cidadão e profissional. Da mesma forma, nenhum preconceito culturalmente reproduzido 
deve servir de justificativa para a prática de qualquer crime (como, por exemplo, o crime 
de racismo). 
 
No cotidiano das cidades, é visível que a percepção de segurança está sendo construída 
por estratégias particulares, as quais utilizam – muitas vezes, de forma ilegal – a 
segregação em vias públicas para proteger condomínios por meio de cancelas e guaritas, 
com seguranças privados que, arbitrariamente, decidem quem pode transitar no local. 
Essas situações refletem um dos maiores desafios a serem enfrentados na construção do 
papel do policiamento no espaço público, pois dizem respeito à herança autoritária e 
elitista na concepção do trabalho policial. 
 
Um aspecto a ser considerado – porque pode influir no reforço da tradição autoritária – é 
a natureza militar de uma das Polícias Estaduais (o que não significa que não haja 
problemas relativos a essa questão nas Polícias Civis). As instituições policiais podem-se 
utilizar de características organizacionais do militarismo – como o uniforme e a hierarquia 
–, sem que isso exerça qualquer impacto negativo sobre o comportamento e a postura 
adequados à democracia. O que ameaça a atuação democrática e compatível com os 
Direitos Humanos por parte das polícias é a perniciosa influência do Exército sobre os 
assuntos de Segurança Pública, que desconsidera as especificidades do trabalho policial. 
 
Dessa forma, partindo da ideia de que vivemos em um Estado Democrático de Direito, 
entendemos que, mesmo a atividade policial sendo regida por estatutos legais, os 
policiais possuem poder discricionário legítimo para desempenhar suas funções, as quais 
envolvem fatores complexos. 
 
 
 
 
 
36 Para refletir sobre o tema, leia um artigo sobre a função policial militar como operador do Direito, disponível 
em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9539. 
 
37 Para refletir sobre o tema, leia um artigo sobre a discricionariedade da autoridade policial no inquérito 
policial, disponível em: http://www.forumseguranca.org.br/artigos/o-sigilo-do-inquerito-policial. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Para saber mais sobre os tópicos estudados nesta aula: 
 
 
Assista ao documentárioNotícias de uma guerra particular. 
 
Sinopse: Produzido pelo cineasta João Moreira Salles e pela produtora Kátia Lund, em 
1999, este documentário tem como principais personagens os policiais, traficantes de 
drogas e os moradores das favelas. Nele, mostram-se, também, a vida no Morro Dona 
Marta, em Botafogo, na zona sul da cidade. 
 
 
 
 
 
 
 
Assista ao documentário Ônibus 174. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sinopse: Produzido por José Padilha, este documentário 
apresenta uma investigação cuidadosa, baseada em imagens 
de arquivo, entrevistas e documentos oficiais, sobre o 
sequestro de um ônibus em plena zona sul do Rio de Janeiro. O 
incidente, que aconteceu em 12 de junho de 2000, foi filmado 
e transmitido ao vivo por quatro horas, paralisando o País. 
 
 
 
 
 
 
 
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ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Leia a seguinte tirinha: 
 
 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online. 
 
 
 
 
Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre as seguintes questões: 
 
Sabemos que as polícias devem desenvolver suas atividades de acordo com a legislação, 
mas é isso o que acontece na prática? Se não, por que isso ocorre? Quais são os atores 
envolvidos nesse processo? 
 
Quais os o maiores desafios da democracia em relação à Segurança Pública? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Esta tirinha é de autoria do argentino Quino, criador da 
personagem Mafalda. Por meio de histórias em 
quadrinho, Quino imortalizou o período pós-ditadura 
vivenciado na Argentina. 
 
Nessa tirinha, vemos Mafalda surpresa com o significado 
da palavra democracia encontrado no dicionário. 
 
Por que será que a personagem achou tão engraçado o 
que leu? Qual a realidade dos países democráticos em 
relação à soberania do povo? 
 
 
 
 
 
 
 
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Nesta aula, você: 
 Compreendeu que o Brasil é um Estado Democrático de Direito; 
 Entendeu que todos estamos submetidos ao ordenamento legal, inclusive as 
instituições policiais e as autoridades políticas. 
 
 
 
Dando continuidade à reflexão sobre o papel do policiamento no espaço público, na 
próxima aula, o tema abordado será: O policiamento comunitário. Analisaremos, com 
especial atenção, a diferença entre policiamento comunitário e o policiamento entendido 
como militar, e o conceito de comunidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 3: Policiamento comunitário 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: 
1. Definir policiamento comunitário; 
2. Identificar os desafios para implementação de ações voltadas ao policiamento 
comunitário; 
3. Descrever as vantagens desse tipo de policiamento; 
4. Avaliar o papel da comunidade nesse processo. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
3. Realize a atividade proposta; 
4. Leia a síntese desta aula; 
5. Leia a chamada para a aula seguinte; 
6. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à aula Policiamento comunitário. 
 
O papel do policiamento nas cidades brasileiras está contaminado pela falta de 
credibilidade da polícia perante a população. Se, por um lado, as polícias deixam a 
desejar, por outro, os policiais não possuem condições materiais e humanas para dar 
conta das demandas que a sociedade lhes dirige no cotidiano. 
 
A população, da qual os policiais fazem parte, não reconhece ou valoriza o trabalho da 
polícia, principalmente dos policiais honestos, os quais, mesmo sem condições, querem 
diminuir a criminalidade e a violência. 
 
A partir do reconhecimento da importância dessa relação entre cidadão comum e polícia, 
foi idealizado o chamado policiamento comunitário – um conjunto de ações que visam 
prevenir a violência por meio da criação de canais de integração e de participação social, 
sustentados pela confiança mútua e pela colaboração entre polícia e comunidade. 
 
Há uma distância cultural que afasta os policiais dos cidadãos e vice-versa. São muitos 
os obstáculos para essa aproximação, como o descrédito das polícias e a falta de espaços 
de diálogo. A polícia comunitária surge como resposta a esse conjunto de problemas, 
visando oferecer, a um só tempo: melhores serviços de segurança, em uma perspectiva, 
sobretudo, preventiva; novas bases para a restauração da confiança abalada ou perdida 
(o que, caso se concretize, terá efeito sobre a própria qualidade do trabalho policial, 
fortalecendo-o com boa dose de renovada legitimidade); e novos canais de comunicação 
direta com cada comunidade local. 
 
A polícia comunitária é um novo modelo de policiamento que ganhou força nas décadas 
de 1970 e 1980, quando as organizações policiais, em diversos países da América do 
Norte e da Europa Ocidental, começaram a promover uma série de inovações em sua 
estrutura e na forma de lidar com o problema da criminalidade. Em distintos países, as 
organizações policiais promoveram experiências e inovações diversificadas, ou seja, os 
contextos de cada lugar foram levados em conta na elaboração de estratégias a serem 
desenvolvidas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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No Brasil, o policiamento comunitário38 é normalmente entendido como uma filosofia de 
atuação e construção de estratégias de policiamento baseadas na cooperação entre a 
polícia e a comunidade. Essa filosofia estaria voltada para a melhoria da Segurança 
Pública através da identificação e resolução dos problemas da comunidade que 
aumentam o risco de crimes. 
 
A proposta desse policiamento é associar, de forma inteligente, elementos para 
prevenção de crimes, que, frequentemente, são dissociados e desvalorizados pela polícia 
– como a participação popular e parcerias entre a polícia e a comunidade (vale reiterar) 
na identificação e resolução de problemas locais. Por essa razão, o policiamento 
comunitário também é chamado de policiamento orientado para a comunidade, 
policiamento orientado Para a identificação e resolução de problemas da comunidade e 
policiamento orientado para a manutenção da ordem pública e para a melhoria da 
qualidade de vida da comunidade39. 
 
A proposta do policiamento comunitário não exclui ou substitui, nas instituições policiais, 
o indispensável investimento em recursos humanos e materiais. Pelo contrário, essa 
proposta visa, justamente, qualificar os profissionais e suas condições de trabalho como 
forma de alcançar maior eficiência, mas também como um meio de reconquistar a 
credibilidade pública – o que se cumpre com melhores resultados na provisão de 
segurança, com abordagens mais adequadas, inteligentes, civilizadas, eficientes e de 
acordo com a legalidade. 
 
O policiamento comunitário constitui uma metodologia, uma concepção e até mesmo um 
paradigma técnico-profissional alternativo ao modelo atual, que pode ser entendido como 
algo militarizado e de combate do inimigo. A ideia de policiais atuarem em colaboração 
com a comunidade supõe uma mudança40 de paradigma41 da polícia tradicional. Para 
isso, muitos obstáculos têm de ser superados. 
 
Ao longo dos 200 anos de sua história, as organizações policiais do Brasil42 estiveram 
quase sempre voltadas para a proteção do Estado contra a sociedade. Até mais ou 
menos a década de 1970, essas organizações foram, por força de lei, forçadas a 
abandonar seu lugar de polícia em favor de outro lugar, cuja função poder-se-iadefinir 
 
 
 
 
38 Para refletir sobre o policiamento comunitário, leia um artigo disponível em: 
http://www.upis.br/nusp/downloads/nusp10.pdf. 
 
39 O quality of life policing valoriza e chama a atenção para a importância de manter a ordem pública e 
melhorar a qualidade de vida da comunidade, a fim de promover a Segurança Pública. Esse tipo de 
policiamento ficou conhecido principalmente através dos programas Tolerância Zero, inspirados na teoria das 
janelas quebradas que será abordada na Aula 4. 
 
40 “[...] mudar quer dizer alterar o modo corrente de interação no seio do sistema com os usuários e a 
população em geral. Trata-se de diminuir a dependência em relação à lógica burocrática e de confiar, cada vez 
mais, em consenso e participação, transformando a experiência de todos e cada um com o sistema de justiça.” 
 
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7359. Acesso em: 05 ago. 2007. 
 
41 Para refletir sobre o assunto, leia o artigo Reinventando a polícia: a implementação de um programa de 
policiamento comunitário, disponível em: http://www.crisp.ufmg.br/reinventando.pdf. 
 
42 Sobre as organizações sociais do Brasil, acesse a entrevista com a antropóloga Jacqueline Muniz, disponível 
em: http://www.comciencia.br/entrevistas/jacquelinemuniz.htm. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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como a imposição da ordem do Estado. Dessa forma, o processo de afastamento da 
polícia em relação à sociedade teve curso, no País, desde a fundação das instituições 
policiais. A ideia que se tinha – e que vigorou por um bom tempo como única forma de 
entender as polícias – é que essas instituições deveriam proteger-se de uma sociedade 
insurreta e rebelde, porque os germes da desordem poderiam contaminá-las ou poluí-las. 
 
A partir da década de 1990, as instituições policiais procuraram estabelecer novos 
caminhos de atuação e buscar sua identidade como instituição que deve proteger o 
cidadão e garantir-lhe sua liberdade e seus direitos, através de um protocolo vinculado a 
uma prática cidadã. Resgatando sua função essencial para o Estado Democrático de 
Direito, os processos de reestruturação da polícia tentam romper com práticas abusivas 
utilizadas rotineiramente, naturalizadas no âmbito das culturas corporativas tradicionais 
e forjadas em períodos autoritários da vida nacional. 
 
O modelo de policiamento comunitário – como o próprio nome diz – concede à 
comunidade ou às comunidades um papel central. Esse lugar lhes é concedido a título 
duplo: como vítimas diretas da atuação do Estado em suas vidas e como participantes da 
construção de novas formas de administrar os conflitos locais – entendendo-se que, 
quando alguém é afetado por alguma forma de violência criminal, esta atinge não só a 
pessoa diretamente prejudicada pela criminalidade mas também a comunidade mais ou 
menos próxima da vítima direta. 
 
Essa ideia de que a comunidade será lesada, indiretamente, pela violência baseia-se em 
uma orientação que desloca o foco de uma justiça clássica punitiva – na qual o Estado é 
tido como a entidade prejudicada pelo crime – para um movimento restaurativo43, no 
qual as pessoas e suas comunidades, junto à polícia, sofrem os contragolpes da violência 
e da criminalidade. 
 
Para que exista, efetivamente, uma polícia comunitária, não é demais repetir: é preciso 
construir, desde que haja vontade política, canais de participação e colaboração da 
população com a polícia, entendendo que os policiais também são cidadãos e estão ali 
desempenhando suas funções de profissionais de Segurança Pública. O desafio é inserir 
os policiais enquanto membros das comunidades, e não como seus inimigos. Resta a 
pergunta: o que é uma comunidade e o que seria uma comunidade genuína44? 
 
O conceito de comunidade é comumente utilizado para identificar um grupo de pessoas 
que, convivendo em um mesmo local, compartilham dos mesmos interesses e 
problemas. Há a expectativa de que, nas comunidades, todos sejam fraternos entre si e 
 
 
 
 
43 Movimento referente à justiça restaurativa e à resolução de problemas de forma colaborativa. Práticas 
restaurativas proporcionam àqueles que foram prejudicados por um incidente ou transgressão a oportunidade 
de reunião para expressar seus sentimentos, descrever como foram afetados e desenvolver um plano para 
reparar os danos ou evitar que aconteçam novamente. A abordagem restaurativa é reintegradora e permite que 
o transgressor repare danos e não seja mais visto como tal. O engajamento cooperativo é elemento essencial 
da justiça restaurativa. Trata-se, enfim, de suprir as necessidades emocionais e materiais das vítimas e, ao 
mesmo tempo, fazer com que o infrator assuma a responsabilidade por seus atos, mediante compromissos 
concretos. 
 
44 Na obra A ideologia alemã (apud BOTTOMORE, 2001), Marx e Engels afirmam: “[...] em uma comunidade 
genuína, os indivíduos conquistam sua liberdade na/e através de sua associação.” 
 
 
 
 
 
 
 
 
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vivam em concordância com os mesmos valores, mas sabemos que não é essa a 
realidade. 
 
Uma comunidade caracteriza-se justamente pela diversidade. É a partir do diálogo entre 
diferentes opiniões, religiões e concepções que se torna possível criar canais de 
interlocução com a comunidade em seu conjunto – entendida como uma rede de 
segmentos diferenciados. Se as instituições policiais desejam criar fluxos positivos e 
abertos de interlocução, têm de fazê-lo respeitando e trabalhando com essa pluralidade 
constitutiva da comunidade. As relações internas às comunidades são complexas por 
natureza, e não haverá uma harmonia comunitária idealizada para interagir com a 
polícia. 
 
A palavra comunidade evoca, muitas vezes, tudo aquilo de que sentimos falta e de que 
precisamos para vivermos seguros e confiantes no mundo moderno. O conceito de 
comunidade não pode ser idealizado de forma cálida45, ou seja, um lugar em que todos 
se entendem bem, no qual podemos confiar no que ouvimos, no qual não há 
estranhamento entre os indivíduos e onde todos vivem em harmonia. 
 
Geralmente, as pessoas esperam das polícias um atendimento individualizado, pautado 
por ocorrências, com culpados punidos imediatamente. A expectativa da opinião pública 
é a de que se efetue o combate à criminalidade de forma tradicional (militarizada). Em 
outras palavras, da forma como tem atuado até este momento, se a polícia não 
conquistou a confiança da população, certamente não foi por falta de sintonia ideológica 
com o pensamento médio da sociedade, mas por suas deficiências, inclusive, na 
execução do modelo tradicional de segurança, bem como por conta das limitações 
intrínsecas a esse modelo. Ignorando-o, a opinião social média acaba atribuindo às 
polícias os defeitos do modelo que ela mesma idealiza. 
 
Ainda não vivemos a cultura da prevenção, do trabalho em parceria para cuidar de todos, 
e não do individual. A diferença do que é público para o que é privado constitui um 
desafio importante a ser superado para aproximar as instituições policiais do cidadão 
comum, até porque, no Brasil, o que é público não necessariamente o é para todos da 
mesma forma. A maioria da população não conhece os museus, os teatros, não pode 
entrar nos shoppings, não frequenta as universidades públicas etc. Nesse processo, a 
construção da comunidade passa pelo entendimento de que cuidar do que é público e 
coletivo é também cuidar do privado e do individual. 
 
Sendo assim, para falarmos de polícia comunitária, temos de analisar não só o papel dos 
policiais mas também o papel da comunidade, que, nãoraro, espera apenas a ação 
reativa e repressiva, cuja lógica da punição é a única forma de atender as demandas de 
Segurança Pública. O investimento deve ser intersetorial46, abrangendo desde a redução 
 
 
 
 
45 Nas palavras de Bauman (2003, p. 8): 
 
“[...] em uma comunidade, podemos contar com a boa vontade dos outros. Se tropeçarmos e cairmos, os 
outros nos ajudarão a ficar de pé novamente. Ninguém rirá de nós nem ridicularizará nossa falta de jeito e 
alegrar-se-á com nossa desgraça. Se dermos um mau passo, ainda podemos nos confessar, dar explicação e 
pedir desculpas, arrepender-nos se, necessário; as pessoas ouvirão com simpatia e nos perdoarão, de modo 
que ninguém fique ressentido para sempre.” 
 
46 Para problemas com causas complexas, devem ser oferecidas resoluções que atendam a multiplicidade de 
fatores envolvidos. 
 
 
 
 
 
 
 
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da rotatividade de pessoal – para que os policiais possam conhecer, aos poucos, as 
pessoas, estabelecendo vínculos de confiança com os moradores – até o aumento de 
efetivos, viaturas, coletes etc. ou mesmo a realização de melhorias no bairro e a 
revitalização de espaços públicos abandonados – com a participação dos moradores não 
como mão de obra, mas na construção do conceito do que se espera para o local. Outra 
decisiva exigência para um policiamento comunitário é a valorização do policial como 
cidadão e trabalhador, para que, sentindo-se respeitado como profissional e membro da 
sociedade, também o seja pela comunidade na qual desenvolve suas atividades. 
 
 
 
 
Para saber mais sobre os tópicos estudados nesta aula: 
 
Assista ao filme Justiça. 
 
Sinopse: Este documentário, de Maria Augusta Ramos, pousa a câmera onde muitos 
brasileiros jamais puseram os pés – o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro –, 
acompanhando o cotidiano de alguns personagens. 
 
Há os que trabalham ali diariamente (defensores públicos, juízes, promotores) e os que 
estão de passagem (réus). 
 
Disponível em: http://www.justicaofilme.com.br. Acesso em: 05 ago. 2010. 
 
 
 
 
ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Lei o fragmento a seguir: 
 
“[...] em uma comunidade, podemos contar com a boa vontade dos outros. Se 
tropeçarmos e cairmos, os outros nos ajudarão a ficar de pé novamente. Ninguém rirá de 
nós nem ridicularizará nossa falta de jeito e alegrar-se-á com nossa desgraça. Se dermos 
um mau passo, ainda podemos nos confessar, dar explicação e pedir desculpas, 
arrepender-nos se, necessário; as pessoas ouvirão com simpatia e nos perdoarão, de 
modo que ninguém fique ressentido para sempre.” (BAUMAN, 2003, p. 8) 
 
Comunidade não é sinônimo de homogeneidade e paz entre os moradores. Sendo assim, 
as ações de policiamento comunitário devem ser desenvolvidas apenas nos locais em que 
há respeito e integração entre os moradores? Justifique sua resposta. 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre o seguinte tema: 
 
O policiamento comunitário não exclui outras formas de policiamento, apenas abre 
espaço para que seja criado um novo paradigma, no qual a polícia desempenha suas 
atividades em colaboração com a comunidade. Quais os benefícios dessa nova forma de 
pensar a polícia? 
 
 
 
 
 
Nesta aula, você: 
 Conheceu o novo paradigma de atuação das polícias; 
 Realizou uma análise crítica do papel das polícias junto às comunidades; 
 Entendendo que, no processo de prevenção à violência, a responsabilidade não é 
só da polícia mas também da população como um todo. 
 
 
 
 
Nesta aula, analisamos a transformação do papel do Estado e de suas funções de 
controle da ordem pública, por meio da ideia de policiamento comunitário, entendendo 
que não há a comunidade idealizada, e sim uma diversidade de fatores que devem ser 
levados em conta. 
 
Na próxima aula, abordaremos o tema das Políticas públicas como processo de escolha 
das ações do Estado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 4: Discussão e análise crítica das concepções de Política de 
Segurança Pública 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: Definir o caminho teórico-histórico 
percorrido até chegarmos aos modelos de Políticas de Segurança Pública conhecidos na 
atualidade. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
3. Realize a atividade proposta; 
4. Leia a síntese desta aula; 
5. Leia a chamada para a aula seguinte; 
6. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à aula Discussão e análise crítica das concepções de 
Política de Segurança Pública. 
 
Na aula anterior, abordamos o tema do policiamento comunitário como o conjunto de 
ações que envolvem tanto o Estado – por meio das polícias – quanto a população – por 
meio de suas comunidades. 
 
Nesta aula, abordaremos a temática das concepções de política de segurança, buscando 
analisar aspectos teóricos relevantes para a construção do que hoje entendemos que 
deva ser, no Estado Democrático de Direito, a relação entre o Estado – responsável por 
garantir a segurança dos cidadãos – e a população. 
 
As políticas atuais pensadas para controlar a criminalidade urbana no mundo estão 
baseadas nas teorias construídas ao longo da história do pensamento social, 
particularmente em suas concepções sobre as relações sociedade-indivíduo e sobre as 
ideias de consenso e conflito. 
 
A relação entre o Estado e a administração da violência vem sendo abordada, de formas 
diversas, por filósofos e cientistas sociais. A problemática que envolve a relação entre 
violência e Estado foi introduzida no pensamento social moderno por Thomas Hobbes e 
Nicolau Maquiavel. Nicolau Maquiavel47 tratou o tema da violência, desnudando as 
hipocrisias vigentes e trazendo à luz o fato de que a força é o recurso elementar e 
inevitável do poder. Segundo suas teses, a violência ocupa função destacada nas 
disputas e estratégias para comover o povo ou acuá-lo, e produzir reações de acordo 
com as conveniências políticas. A tese hobbesiana48 atravessou, com revisões e 
 
 
 
 
47 Acesse o texto completo de O príncipe, disponível em: http://www.culturabrasil.org/zip/oprincipe.pdf. 
 
48 A tese de Thomas Hobbes afirma: 
 
“Sem a força, os pactos não passam de palavras sem substância para dar qualquer segurança a ninguém. 
Apesar das leis naturais – que cada um respeita quando tem vontade e o faz com segurança –, se não for 
instituído um poder suficientemente grande para nossa segurança, cada um confiará e poderá, legitimamente, 
confiar apenas em sua própria força e capacidade, como proteção contra todos os outros”. 
 
Acesse o texto completo, disponível em: http://www.arqnet.pt/portal/teoria/leviata.html. 
 
 
 
 
 
 
 
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mudanças, os séculos do pensamento social, baseando-se na ideia-chave de que a 
concentração despótica da violência no Leviatã-Estado representa condição indispensável 
para a domesticação da violência selvagem e ilimitada – concebida como ameaça, por 
excelência, à ordem social. 
 
A violência por parte do Estado não é subsidiária à ordem social estabelecida entre os 
indivíduos. Pelo contrário, os indivíduos necessitam ser controlados, de forma ostensiva, 
para viverem em sociedade com harmonia ou, no mínimo, sem a guerra generalizada de 
todos contra todos. Para Hobbes, o meio encontradopara concentrar esse poder central 
foi o estabelecimento do Estado político. Hobbes propôs, então, a necessidade de criação 
do Leviatã: monstro que morreria se não realizasse sua missão – proporcionar a 
segurança dos súditos, isto é, evitar a guerra. Leviatã é considerado um ser artificial e 
age de acordo com sua vontade, porque sua autoridade foi consentida pelos membros da 
sociedade. Dessa cláusula, Hobbes deduz que todos os atos do Leviatã-Estado 
representam, necessariamente, os desejos de toda a coletividade e, como consequência, 
quem o contestasse estaria se opondo a si mesmo. 
 
Se o estado de natureza – ou seja, a situação anárquica, sem Estado – corresponde à 
guerra generalizada, em que o ser humano se torna lobo do ser humano, a solução 
autoritária e centralizadora (o Estado-Leviatã) emerge, via contrato social, como uma 
derivação da natureza humana – mediada pela razão e animada pelo desejo de viver e o 
medo de morrer – enquanto realidade coletiva. 
 
Por outro lado, o francês Jean Jacques Rousseau entendeu a ordem social como um 
direito sagrado que serve a todos, mas que não advém da natureza, e sim de convenções 
– a base de toda autoridade legítima entre os homens. Na teoria rousseauniana49, o 
Estado constitui uma pessoa moral, cuja vida consiste na união de seus membros por 
meio do pacto social, que dá ao corpo político poder sobre todos. Esse mesmo poder – 
dirigido pela vontade geral – recebe o nome de soberania. 
 
Essas diferentes teorias sobre a relação entre Estado e violência mostram-se como o 
reflexo da preocupação a respeito de como poderia ser construída uma forma de 
proporcionar segurança estatal para os indivíduos em sociedade e quais as repercussões 
que ela teria no poder do próprio Estado. Vemos que, historicamente, o Estado foi 
entendido, por filósofos e cientistas sociais e políticos, como detentor da força e 
regulador das relações tidas como potencialmente violentas. Ainda hoje, esse tema está 
sendo abordado de forma analítica no que tange às possíveis repercussões da utilização 
de mecanismos controladores ou estimuladores da coação física do Estado em relação à 
população. 
 
As teorias clássicas de Maquiavel, Hobbes e Rousseau serviram de base para novas 
perspectivas de análise da relação entre Estado, violência e população. Exemplo disso é a 
 
 
 
 
 
49 A convenção seria um acordo em que as forças existentes estariam unidas em prol do coletivo. Nas palavras 
de Rousseau: “Trata-se de encontrar uma forma de associação que defenda e proteja, com toda força comum, 
a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedeça, contudo, a si 
mesmo e permaneça tão livre quanto antes.” 
 
Acesse, na íntegra, a obra de Rousseau, disponível em: http://www.cfh.ufsc.br/~wfil/contrato.pdf. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Escola de Criminologia Clássica, que teve sua origem na filosofia iluminista, na qual os 
direitos do homem tinham de ser protegidos da corrupção e dos excessos das 
instituições, como penas arbitrárias e delitos mal definidos. Nesse contexto, César 
Beccaria50, em sua obra Dos delitos e das penas51, formulou, pela primeira vez, os 
princípios da criminologia clássica, baseados nas teorias de Hobbes, Rousseau e 
Montesquieu52, e escreveu o primeiro texto sobre prevenção do delito: Dos meios de 
prevenir o crime53. A ideia principal defendida pelo autor é a de que é melhor prevenir os 
crimes do que ter de puni-los, e todo o legislador sábio deve procurar antes impedir o 
mal do que repará-lo. Beccaria afirma ainda que uma boa legislação é a arte de 
proporcionar aos homens o maior bem-estar possível e preservá-los de todos os 
sofrimentos que se lhes possam causar, segundo o cálculo dos bens e dos males da vida. 
 
Os princípios clássicos da criminologia se limitaram à concentração do foco no ato 
delitivo, desdenhando as diferenças individuais entre os atores tidos como delinquentes. 
Isso fez com que advogados e penalistas da época imprimissem esforços e expandissem 
suas ideias, desenvolvendo o que se convencionou denominar Escola Neoclássica, que 
forneceu os parâmetros para a maioria dos regimes jurídicos do Ocidente. Os 
neoclássicos focaram sua preocupação em introduzir a ideia de que o contexto dos atos 
delitivos, os antecedentes do autor do delito e sua capacidade de atuar livremente 
exigiam a atenção prioritária dos magistrados no momento de impor penalidades. Da 
mesma forma que a clássica, a teoria neoclássica entende que o homem deve responder 
por seus atos, mas introduz a importância de seus antecedentes e as circunstâncias em 
que foi cometido o ato delitivo como determinantes da possibilidade da pena. Em outras 
palavras, o delinquente não era mais o indivíduo isolado e racional da teoria clássica 
pura. 
 
Enfim, esse modelo trouxe a ampliação da forma de abordar a relação entre o delito e a 
pena, entendendo o homem dentro de um contexto complexo, e não de forma isolada da 
sociedade. Foi a partir dessa nova abordagem que surgiu a Escola Positivista da 
Criminologia, que teve o papel de desvincular o estudo do delito do funcionamento e da 
 
 
 
 
50 Ligado ao movimento filosófico-humanitário, da segunda metade do século XVIII, que reagia contra as 
distinções sociais exclusivamente baseadas nos privilégios de certas classes, o filósofo italiano denunciava: a 
falta de preocupação com as irregularidades dos processos criminais; os abusos de poder sem limites; e o fazer 
cessar os exemplos bem frequentes de frias atrocidades que os homens poderosos encararam como seus 
direitos. O autor entendia essas situações como uma barbárie absoluta em relação à liberdade do homem. Em 
razão disso, Beccaria buscou investigar: quais eram as origens das penas e do fundamento de punir; quais 
seriam as punições aplicáveis aos diferentes crimes; se a pena de morte era verdadeiramente útil, necessária e 
indispensável para a segurança e a boa ordem da sociedade; se os tormentos e as torturas eram justos; quais 
eram os melhores meios de prevenir os delitos; e quais as influências que esses meios exerciam sobre os 
costumes. 
 
51 Acesse, na íntegra, esse texto, disponível em: http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/delitosB.pdf. 
 
52 Sua principal obra é O Espírito das Leis, disponível em: 
http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/hdh_montesquieu_o_espirito_das_leis.pdf 
 
53 De acordo com Beccaria (1950, p. 196): 
 
“[...] o meio mais seguro, mas, ao mesmo tempo, mais difícil de tornar os homens menos inclinados a praticar 
o mal, é aperfeiçoar a educação. Se prodigalizardes luzes ao povo, a ignorância e a calúnia desaparecerão 
diante delas, a autoridade injusta tremerá e só as leis permanecerão inabaláveis, todo-poderosas. O homem 
esclarecido amará uma constituição cujas vantagens são evidentes, uma vez conhecidos seus dispositivos – 
uma constituição que dá bases sólidas à Segurança Pública”. 
 
 
 
 
 
 
 
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teoria do Estado. Nesse contexto, outra teoria importante é a positivista radical, que 
rompe com a ideia, até então tida como pressuposto pela teoria criminológica, de que o 
delito é fundamentalmente uma atividade própria de pessoas jovens, do sexo masculino, 
pertencentes à classe trabalhadora, para entendê-lo como manifestação de desvio em 
todos os setores da sociedade. Essa linha teórica compreendeu que a eficácia do controle 
social, em toda sociedade, não era tão grande quanto parecia, e que os juízes não 
aplicavam critérioscientíficos, baseados no consenso moral incorporado à legislação nas 
decisões tomadas sobre o destino dos delinquentes. 
 
Em relação ao que as duas teorias abordam, a diferença está em que a teoria clássica 
determina que o caráter delitivo dos atos realizados livremente define-se pelas normas 
morais implícitas no contrato social e supõe que quem age de forma delituosa é malvado 
e ignorante, e assim faz por ser impulsionado por forças de que nem ele próprio tem 
consciência. Disso resulta a importância de se investigar a motivação. Por outro lado, os 
teóricos positivistas entendem que a vida social deve-se explicar por si só, e as causas 
dos atos delituosos não estão relacionadas a questões morais, mas o delito pode ser 
explicado cientificamente – da mesma forma que os fenômenos, seres ou objetos do 
mundo natural. 
 
Na mesma linha de raciocínio, um grupo de sociólogos da Universidade de Chicago iniciou 
estudos sobre as condições sociais urbanas e as possibilidades de formulação de políticas 
públicas na cidade. Essas investigações focavam o que foi batizado de Ecologia Social54 
da cidade. A ideia da cultura diferente ou subcultura foi desenvolvida também pela Escola 
de Chicago, a partir da hipótese de que a sociedade não era consensual, e os valores que 
não faziam parte do consenso também existiam como tais. Em outras palavras, essa 
teoria importante, que surgiu no começo do século XX, repelia a tese segundo a qual 
haveria um grupo de pessoas culturalmente organizado e outro desorganizado, que não 
possuíam normas culturais ou valores. 
 
O pressuposto da consensualidade estava presente nas teorias anteriores. Nesse sentido, 
a Escola de Chicago constituiu um avanço, ainda que, nela, mesmo com o mérito de a 
reconhecer, a questão da diversidade seja tratada em termos limitados. O fato é que 
nenhuma dessas teorias se propôs a buscar, objetivamente, o que acontece dentro 
desses indivíduos que cometem delitos e de que forma essa motivação está relacionada à 
opressão do Estado, da lei, à desigualdade social e às estruturas da sociedade. 
 
A partir disso, surgem questionamentos que não mais se baseiam na ideia de consenso, 
e sim de conflito, negando o pressuposto de que a sociedade se estrutura com o objetivo 
de manter-se funcionando em harmonia. Trata-se das chamadas teorias do conflito, que 
surgem em razão de acontecimentos reais, e não do intuito de reexaminar teorias 
criminológicas clássicas. A teoria do conflito pressupõe a inexistência de um consenso ou 
um acordo valorativo entre as pessoas em sociedade. Seus teóricos, como o sociólogo 
 
 
 
 
54 Na opinião de Ian Taylor (1990), a teoria ecológica da Escola de Chicago está baseada em conceitos 
positivistas que se traduzem pela quantificação e codificação de dados utilizados para explicar a estrutura social 
da cidade e os agrupamentos humanos, de forma analógica com a ecologia e a vida vegetal. Essa teoria tem 
como precursor Robert Ezra Park, que defende a ideia de que, se, nas comunidades vegetais, a simbiose 
perfeita é o equilíbrio – situação que surge quando todos os processos que intervêm na reprodução das plantas 
estão em estado de equilíbrio –, a tarefa do sociólogo é descobrir esses mecanismos mediante os quais se 
poderia alcançar e manter o equilíbrio biológico na vida urbana. 
 
 
 
 
 
 
 
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alemão Ralf Dahrendorf55, estavam interessados em elaborar uma teoria que desse conta 
dos atos delituosos ou desviados. A teoria do conflito de Dahrendorf (1974) introduziu 
novas questões que, até então, não haviam sido abordadas, mas foi apenas a partir da 
teoria denominada nova criminologia que o político passou a fazer parte das origens e 
processos dos atos desviados. 
 
A nova criminologia56 tem como proposta ser uma teoria normativa que possa oferecer 
possibilidades de resolver, teórica e socialmente, questões relacionadas ao delito. Para 
tanto, essa teoria se dividiu em duas tendências: a social-democrática e a revolucionária 
(de ação direta). A primeira tem seu alicerce na premissa de que a função dos 
criminologistas é indicar os problemas, e não solucioná-los. Essa tendência também 
entende que os cientistas sociais são semelhantes aos artistas e aos escritores – 
trabalhadores da cultura que apenas observam e problematizam a sociedade. Por outro 
lado, a tendência revolucionária da ação direta entende que as causas do delito estão 
diretamente relacionadas aos ordenamentos sociais de seu contexto. Nesse sentido, a 
intenção é a de que, além de investigar as causas do delito, deve-se investir em 
mudanças sociais estruturais para aboli-lo, considerando-o não algo anormal ou 
patológico, mas uma simples manifestação a mais da diversidade humana e cultural da 
sociedade. 
 
Dessa forma, a partir da nova criminologia e da emergência da problemática da 
criminalidade urbana, surgiram pesquisas que buscavam descobrir não só o papel do 
Estado relativo às condutas desviantes mas também formas alternativas de abordar o 
tema na prática. Diferente de outras teorias criminológicas – como a clássica e a 
positivista, para as quais os atos delituosos contaminavam a estrutura social, e o 
consenso valorativo estabelecido entre os indivíduos deveria ser mantido –, a nova 
criminologia sustenta-se na ideia de diversidade de valores na sociedade, concebendo-os 
como vinculados a interesses econômicos e sociais não apenas diferentes, mas 
contraditórios – o que configura a distinção básica com a Escola de Chicago. Além disso, 
do ponto de vista da nova criminologia, quando fala em desvios de conduta, o cientista 
social não pode negar as questões político-estruturais. Por isso, a proposta é a de que se 
procure, além de observar e problematizar as questões sociais, construir alternativas 
para solucionar os problemas atinentes à criminalidade. 
 
Por meio do reconhecimento das distintas formas de abordagem do papel do Estado no 
que tange ao controle da violência, a conclusão a que chegamos é a de que, em 
 
 
 
 
 
55 Se, para explicar os atos delituosos, a Sociologia vinha trabalhando com os conceitos de consenso, norma e 
sanção, havia a necessidade de se abordar uma terceira categoria para a análise sociológica: o poder 
institucional. Por isso, em sua obra Ensaios da teoria da sociedade, Dahrendorf afirma que o fato de a 
sociedade ser regida por valores e normas dominantes indica que o poder institucionalizado é intrinsecamente 
explosivo e desorganizador, e não um fator integrador da organização social – como defendido em teorias 
funcionalistas. 
 
56 Também chamada de criminologia interacionista ou labeling approch, por considerar que as questões centrais 
da teoria e da prática criminológicas não se devem voltar ao crime e ao delinquente, mas, particularmente, ao 
sistema de controle adotado pelo Estado no campo preventivo, no campo normativo e na seleção dos meios de 
reação à criminalidade. No lugar de se indagar os motivos pelos quais as pessoas se tornam criminosas, deve-
se buscar explicações sobre os motivos pelos quais determinadas pessoas são estigmatizadas como 
delinquentes, qual a fonte da legitimidade e as consequências da punição imposta a essas pessoas. São os 
critérios ou mecanismos de seleção das instâncias de controle que importam, e não dar primazia aos motivos 
da delinquência. 
 
 
 
 
 
 
 
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consequência dessa heterogeneidade57, consolidam-se, também, formas distintas de se 
conceber as Políticas de Segurança Pública. Sendo assim, entendemos que, a partir 
dessas diferentes teorias a respeito do que representa o ato desviante e delituosopara 
um grupo social, configuram-se, nesse contexto, concepções sobre o papel do aparato 
estatal enquanto responsável por garantir a segurança aos indivíduos. 
 
 
 
 
Para saber mais sobre os tópicos estudados nesta aula, sugerimos as seguintes leituras: 
 
TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock. La nueva criminología: contribución a una 
teoría social de la conducta desviada. Buenos Aires: Amorrortu, 1990. 
 
SOARES, Luiz Eduardo. Violência e política no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Relume 
Dumará, 1996. 
 
 
Para complementar o estudo desta aula: 
 
 
 
 
 
 
Assista ao filme Ilha das flores. 
 
Sinopse: Produzido por Jorge Furtado, este filme é um ácido e divertido retrato da 
mecânica da sociedade de consumo. Acompanhando a trajetória de um simples tomate, 
desde sua plantação até ele ser jogado fora, o curta escancara o processo de geração de 
riqueza e as desigualdades que surgem no meio do caminho. 
 
 
 
 
 
 
 
57 Segundo a interpretação de Soares no livro Violência e política no Rio de Janeiro, as divergências de opinião 
podem expressar mais do que discordâncias quanto aos diagnósticos e às terapias voltadas ao tratamento da 
problemática da violência urbana – expressam uma ideologia que pode ser encontrada nas diferentes teorias 
criminológicas ou de ciências e políticas. 
 
Ouça o Hino da Campanha da Fraternidade 2009 que aborda o 
tema Segurança Pública. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Leia o texto disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/007/07mauricio.htm. 
 
Em seguida, aponte a relação desse texto com o que foi estudado nesta aula, na qual 
fizemos um percorrido histórico sobre as principais teorias do pensamento social no que 
tange ao delito e ao papel do Estado. 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online. 
 
 
 
Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre o seguinte tema: 
 
Qual a importância do conhecimento científico e teórico para a construção de Políticas de 
Segurança Pública eficazes? 
 
 
 
Nesta aula, você: 
 Percorreu as principais teorias do pensamento social sobre a relação entre Estado 
e sociedade no que tange à violência; 
 Entendeu, a partir de um embasamento teórico, o que são as Políticas de 
Segurança Pública – de onde surgiram e quais os passos para sua formulação e 
implementação. 
 
 
 
Após termos percorrido as principiais teorias da criminologia moderna, chegamos ao 
tema em pauta nos debates acadêmicos e políticos de diversas partes do mundo: a 
discussão sobre o papel do Estado frente a um tipo específico de violência – a 
criminalidade urbana. 
 
A discussão se faz em torno de quais seriam as possibilidades de gerenciar o problema 
de forma eficaz, tendo em vista que a postura até então adotada pelo Estado não está 
trazendo soluções que viabilizem o controle ou a diminuição da violência urbana. 
 
No meio acadêmico, o debate gira em torno de dois principais modelos de Políticas 
Públicas de Segurança: A Política de Segurança Pública cidadã e a política de extermínio 
do inimigo – tema que será abordado na próxima aula. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 5: Política de Segurança Pública Cidadã e Política de Extermínio do 
Inimigo 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: 
1. Identificar as diferentes concepções de Políticas de Segurança Pública; 
2. Diferenciar uma política de prevenção à violência e uma de combate e extermínio 
do inimigo. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
3. Realize a atividade proposta; 
4. Leia a síntese desta aula; 
5. Leia a chamada para a aula seguinte; 
6. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à aula Política de Segurança Pública cidadã e política de 
extermínio do inimigo. 
 
Na última aula, percorremos, em sentido amplo, as principais teorias sobre a relação do 
Estado com o controle da violência, entendendo que, sendo projetos estatais, as Políticas 
Públicas de Segurança podem ser analisadas, teoricamente, como um desdobramento 
desse processo. 
 
Nesta aula, abordaremos os modelos de Políticas Públicas de Segurança que vêm sendo 
discutidos no País, buscando entender o que caracteriza cada paradigma enquanto 
conjunto de ações estatais58 para proporcionar segurança59 aos cidadãos. 
 
As Políticas de Segurança Pública são projetos estatais que visam manter a ordem social, 
a fim de controlar o que é considerado crime60 pelas sociedades, utilizando, para isso, 
meios organizacionais, recursos humanos e instrumentos de poder. As concepções de 
Políticas Públicas de Segurança são resultados de um processo histórico construído por 
grupos sociais a partir de suas experiências e ideologias a respeito de qual seria o papel 
do Estado em relação à segurança urbana. 
 
No Brasil, tem-se abordado, com mais ênfase, dois conceitos de políticas: a chamada 
Política de Segurança Pública cidadã – terminologia utilizada por vários organismos 
internacionais latino-americanos – e outra entendida como política militarizada de 
extermínio do inimigo. Essas políticas também são denominadas, principalmente no meio 
 
 
 
 
58 As possibilidades de relacionar o ato delituoso com outros fatores sociais – como a exclusão e a relação social 
– foram abordadas como objeto de estudo pelas Ciências Sociais, especialmente nas obras dos clássicos: Émile 
Durkheim, Max Weber e Karl Marx. 
 
59 Como sugestão, leia o texto O impacto da televisão sobre o sentimento de insegurança, disponível em: 
http://www.scielo.br/pdf/se/v20n2/v20n2a14.pdf. 
 
60 Émile Durkheim foi o primeiro a analisar o crime como um fato social que ofende o sentimento coletivo. O 
autor entendia que era a sociedade que qualificava os atos como criminosos, de acordo com a consciência 
coletiva determinante. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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acadêmico, como política de nova prevenção61 e de tolerância zero62. A primeira é uma 
formulação teórica, e a segunda é a política implementada na cidade de Nova Iorque pelo 
então prefeito Rudolph Giuliani. 
 
Entretanto, essas concepções não são absolutas e se cruzam, uma vez que podemos 
entender uma ação como preventiva e pró-tolerância zero ao mesmo tempo. Por 
exemplo: o investimento em armamento por parte da polícia pode-se caracterizar como 
uma ação voltada para a repressão, mas o que determinará sua finalidade serão suas 
características e o tipo de treinamento dado aos policiais que o utilizarão. A mesma ação 
– nesse caso, a aquisição de armas – pode ser destinada a um policiamento comunitário 
– que busca a prevenção do crime – ou ao confronto com o inimigo. 
 
Ambas as políticas – de tolerância zero ou de nova prevenção – tiveram resultados 
negativos e positivos, dependendo da perspectiva em que se faça a análise. Por exemplo, 
na política de tolerância zero adotada em Nova Iorque, os números da criminalidade 
diminuíram, e a sensação de segurança da população aumentou. Por essas razões, o 
prefeito responsável pela implantação da política foi reeleito e ganhou fama mundial. As 
concepções de Políticas Públicas de Segurança, por sua vez, provenientes dos Estados 
Unidos, tornaram-se uma referência e um mito. Por outro lado, houve críticas de 
humanistas às posturas tidas como racistas e preconceituosas por parte de policiais, que 
fizeram com que fossem duplicados os índices de prisões de pessoas de etnia negra 
naquelacidade e naquele período, e limitada a liberdade de ir e vir das pessoas mais 
pobres63. 
 
A política militarizada de extermínio do inimigo não pretende abordar as motivações que 
conduzem os indivíduos aos crimes. Pelo contrário, essa política parte do pressuposto de 
que as pessoas agem racionalmente e que, dada a oportunidade, todos podem enveredar 
por atos criminosos. Portanto, devemos manter a ordem de forma autoritária e eficiente. 
A questão é que se entende por desordem a condição marginalizada a que muitas 
pessoas são submetidas por não fazerem parte das camadas privilegiadas da sociedade, 
como é o caso de mendigos, profissionais do sexo que atendem na rua, alcoólatras e 
usuários de drogas (pobres), menores abandonados e imigrantes ilegais etc. 
 
As ações militarizadas caracterizaram-se pelo combate à delinquência por meio de 
repressão estatal, pela vigilância constante dos possíveis criminosos e pela repressão 
fulcrada no regime punitivo-retributivo do Direito Penal64. Esse combate tem como 
 
 
 
 
61 Sobre a política de nova prevenção, leia o texto Em busca de um conceito de nova prevenção, do professor 
Theodomiro Dias Neto, disponível em: http://www2.mp.ma.gov.br/ampem/artigos/artigos2006/Baratta-
Espanha%20artigo%20theodomiro%5B1%5D.pdf. 
 
62 Sobre a política de tolerância zero, leia o texto Dissecando a tolerância zero, de Loïc Wacquant, disponível 
em: http://diplo.uol.com.br/2002-06,a336. 
 
63 Segundo a antropóloga Alba Zaluar: “[...] a pobreza perdeu seu sinal positivo mais forte e adquiriu, mais 
claramente, o sentido negativo de falta, estendida, também, ao plano moral, o que fez desaparecer as 
fronteiras entre o pobre honesto e o marginal ou criminoso”. Não ter dinheiro para consumir os bens cada vez 
mais oferecidos no mercado equivale, para os pobres – especialmente aqueles pertencentes a grupo raciais 
(como os negros) e residenciais (como os favelados), mas, principalmente, os despojados menores de rua –, a 
ser objeto da suspeita de cometer atos ilegais ou ilícitos ou, pior, a ser agente da violência. (ZALUAR, Alba. 
Cidadãos não vão ao Paraíso. São Paulo: Editora da Unicamp, 1994) 
 
 
 
 
 
 
 
 
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principal fundamento a ideia de que a violência nas cidades somente poderá ser 
controlada através de leis severas que imponham pena de morte, redução da maioridade 
penal e longas penas privativas de liberdade. Esses seriam os únicos meios eficazes para 
intimidar e neutralizar os criminosos, e para fazer justiça às vítimas e aos homens de 
bem, ou seja, aos que não delinquem e não fazem parte do grupo entendido como 
desviante65. 
 
O foco desse tipo de política é o combate e a repressão dos pequenos e grandes delitos, 
bem como de seus agentes. Essa, portanto, é a principal estratégia de combate à 
criminalidade urbana e à manutenção da ordem nas ruas pela polícia. O policiamento não 
está dirigido à causa do crime, mas à proteção e à defesa de determinados segmentos da 
sociedade. Para tanto, é feito investimento público em armamento pesado, em 
treinamento voltado para o enfrentamento do inimigo e em ações estratégicas dirigidas à 
apreensão de armas e drogas em locais habitados por comunidades mais pobres. 
 
Outro fator importante é que não há participação da população na construção das 
políticas de combate à criminalidade urbana. O resultado é que o cidadão pode ser alvo 
do enfrentamento, e a Segurança Pública não é oferecida, com equidade, para todos. Ela 
acaba sendo distribuída de forma assimétrica, privilegiando os mesmos que têm acesso 
aos demais direitos fundamentais, como saúde, educação, lazer e cultura. 
 
Por outro lado, uma política entendida como de segurança cidadã tem como objetivo a 
prevenção e o combate da criminalidade de forma multidiscilplinar e com respeito aos 
Direitos Humanos. O crime e a violência não são entendidos de forma simplista. Quando 
o tema é Segurança Pública, as ações das polícias e dos demais órgãos responsáveis 
levam em conta a multiplicidade de fatores envolvidos. 
 
O investimento ocorre na aproximação entre o Estado e o cidadão comum, por meio da 
participação da população e de estratégias de prevenção, como o policiamento 
comunitário dirigido à elaboração de iniciativas junto às comunidades locais. As polícias 
atuam como atores centrais na constituição de redes de prevenção, que envolvem 
diversos segmentos da sociedade – como ONGs e Associações de bairros – na elaboração 
e implementação de ações cujo intuito é identificar e buscar soluções para as principais 
demandas da população, sempre visando garantir a segurança de todos. 
 
A ideia de respeito a todos os cidadãos permeia essa política, que visa à sincronia entre 
ações policiais, governamentais e da sociedade civil organizada para a prevenção da 
violência – entendida como um problema sem culpados que devam ser exterminados –, 
atendendo às expectativas de segurança de todos os segmentos da sociedade, sendo 
eles desviantes ou não. Para tanto, também são consideradas as medidas de prevenção 
situacional, que intervêm nas características físicas do local de acordo com as 
 
 
 
 
64 Para aprofundar o tema, leia o texto Política criminal, criminologia e vitimologia: caminhos para um Direito 
Penal humanista, disponível em: 
http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/view/28580/28136. 
 
65 Segundo a interpretação do antropólogo Gilberto Velho, o indivíduo desviante é visto a partir de uma 
perspectiva de anormalidade, como se fosse portador de patologia: alguns seriam desviantes incuráveis e 
outros, passíveis de recuperação, mas, em ambos os casos, o mal estaria no indivíduo, e não na sociedade. 
(VELHO, Gilberto. O estudo do comportamento desviante: a contribuição da Antropologia Social. In: VELHO, 
Gilberto (Org.). Desvio e divergência: uma crítica da patologia social. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985) 
 
 
 
 
 
 
 
 
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necessidades de seus moradores, proporcionando iluminação adequada, espaço de 
convívio comunitário, e postos policiais e de saúde dentro das comunidades mais 
estigmatizadas como violentas. 
 
Essas estratégias de prevenção social estão correlacionadas à transversalidade da 
problemática da segurança urbana, cuja natureza multidimensional exige, para seu 
enfrentamento, políticas sociais, culturais e econômicas, simultaneamente, para que as 
causas da criminalidade sejam alcançadas. Não afirmamos, aqui, que é a pobreza66 a 
causadora da violência nas cidades. Pelo contrário, as comunidades mais pobres, 
normalmente, são as que mais sofrem com a criminalidade67: a principal vítima da falta 
de Políticas de Segurança cidadã é o morador da favela. Não é a classe média ou alta que 
perde seus filhos para o tráfico68, seja pelo consumo ou pela morte. Hoje, segundo 
relatório69 da Organização dos Estados Ibero-americanos (OIE), quem mais morre 
assassinado no Brasil70 são os jovens negros71 moradores da periferia das grandes 
cidades. Pesquisas nacionais concordam: trata-se de jovens pobres, frequentemente 
negros, do sexo masculino, entre 15 e 29 anos, mais especificamente entre 15 e 24 
anos. 
 
Estudos72 recentes sobre juventude a caracterizam como apática, individualista e 
hedonista. Entretanto, não raro, é negligenciada a articulação dos jovens em torno de 
ações coletivas que ocorrem fora do âmbito da política partidária – como na área da 
cultura73, por exemplo –, o que fortalece a expressão de identidadeétnica e territorial. 
Se é verdade que os que se assemelham ao socialmente aceito ou se aproximam dos 
ideais morais merecem respeito e têm suas condutas aprovadas, há, em contrapartida, a 
ideia de que os que se afastam dos modelos ideais devem ser reprovados como 
transgressores, anormais e criminosos. Convém não esquecer que, apesar da enorme 
 
 
 
 
66 Como sugestão, leia o texto Pobreza como privação de liberdade, disponível em: 
http://www.uff.br/cpgeconomia/novosite/arquivos/tese/2007-larissa_martins.pdf. 
 
67 Acesse a entrevista com Loïc Wacquant sobre A criminalização da pobreza, disponível em: 
http://www.uff.br/maishumana/loic1.htm. 
 
68 Como sugestão, leia texto sobre o tráfico, disponível em: http://www.comunidadesegura.org/pt-
br/node/37775. 
 
69 Acesse o mapa da violência, disponível em: http://www.oei.org.br/mapaviolencia.pdf. 
 
70 Acesse o relatório de homicídios de crianças e jovens no Brasil (NEV/USP), disponível em: http://www.ovp-
sp.org/relatorio_nevusp_homicidios_jovens.pdf. 
 
71 Como sugestão, leia o texto sobre a mortalidade de jovens negros, disponível em: 
http://circulopalmarinoes.wordpress.com/2009/06/06/juventude-negra-e-a-luta-contra-o-exterminio/. 
 
72 Para um estudo mais aprofundado do tema, leia, na íntegra, o texto Juventude, violência e cidadania: os 
jovens de Brasília, de Julio Jacobo Waiselfisz, disponível em: 
http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001308/130866por. 
 
73 A principal ação coletiva que ocorre, hoje, na área da cultura é o movimento hip hop. Para conhecer o 
trabalho de alguns desses grupos, acesse os seguintes materiais online: 
 Movimento enraizados do Rio de Janeiro: http://www.enraizados.com.br/Default2.asp; 
 Ksulo – casa da cultura hip hop de Porto Alegre/RS: http://www.hiphop470.com.br/. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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desigualdade socioeconômica no Brasil, pouquíssimos são os jovens pobres que 
enveredam pela criminalidade. 
 
As políticas de segurança preventivas visam construir ações quer aproveitam o capital 
social74 de cada localidade, partindo da ideia de que a sociedade é heterogênea e não 
dicotômica, isto é, não se divide entre o bem e o mal. Do ponto de vista desse 
paradigma, a segurança deve ser oferecida para todos – para os usuários de drogas e 
para quem as vende –, diferentemente do que sustenta a política de combate ao inimigo, 
segundo a qual quem compra não é necessariamente criminoso, mas quem vende e mora 
em favelas sempre o é. O primeiro pode ser dependente ou apenas um usuário eventual, 
mas o mesmo não acontece do outro lado do balcão, em que a dependência e a intenção 
são de ordens menos nobres e apontam a necessidade de combate à criminalidade – 
entendida como se fosse produzida por um grupo específico da sociedade contra outro. 
 
Segundo a ótica da Política de Segurança cidadã, todos são vítimas da falta de segurança 
– um problema de responsabilidade do Estado, ao qual cabe proporcionar a convivência 
democrática entre grupos distintos em um mesmo espaço territorial, afirmando a 
tolerância entre diferentes ideologias e modos de entender a Segurança Pública. 
 
Cada grupo diferentemente posicionado tem uma experiência ou um ponto de vista 
particular acerca das políticas de segurança mais adequadas, precisamente porque cada 
um faz parte desses processos sociais e contribui para produzir suas configurações. 
Especialmente quando estão situadas em diferentes lados das relações de desigualdade 
estrutural75, as pessoas entendem essas relações e suas consequências de modos 
distintos. Agentes que estão próximos no campo social têm pontos de vista semelhantes 
sobre esse campo e sobre o que ocorre em seu âmbito; enquanto aqueles que estão 
socialmente distantes tendem a ver as coisas de modo diverso. 
 
Sendo assim, na discussão pública sobre o problema da criminalidade, tanto a população 
quanto os estudiosos se dividem entre os que advogam políticas sociais para combater a 
criminalidade e os que defendem uma polícia e uma justiça mais vigorosas e eficazes 
institucionalmente. As políticas sociais devem ser implementadas não porque os pobres 
constituam um perigo permanente76 à segurança ou porque sejam a classe perigosa, mas 
porque um país democrático e justo não pode existir sem tais políticas. 
 
 
 
 
 
74 Segundo Putnam, um dos pioneiros nos estudos sobre capital social, este se reflete no grau de confiança 
existente entre os diversos atores sociais – seu grau de associativismo – e no acatamento às normas de 
comportamento cívico, tais como o pagamento de impostos e os cuidados com que são tratados os espaços 
públicos e os bens comuns. 
 
75 Na obra Desigualdade reexaminada (p. 50), o economista Amrtya Sem explica: 
 
“[...] os seres humanos diferem uns dos outros de modos distintos. Diferimos quanto às características 
externas e circunstâncias. Começamos a vida com diferentes dotações de riqueza e responsabilidade herdadas. 
Vivemos em ambientes naturais diferentes – alguns mais hostis do que outros. As sociedades e comunidades às 
quais pertencemos oferecem oportunidades bastante diferentes quanto ao que podemos e ao que não podemos 
fazer”. 
 
76 Para um aprofundamento maior sobre o tema, leia o texto Integração perversa: pobreza e tráfico de drogas, 
de Alba Zaluar, disponível em: http://books.google.com.br/books?id=nIH34JXjXzEC&printsec=frontcover. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Para saber mais sobre os tópicos estudados nesta aula: 
 
Assista ao documentário Tiros em Columbine. 
 
Sinopse: Sob a ótica do diretor Michael Moore, este documentário faz uma análise sobre 
a obsessão americana às armas de fogo. Foi vencedor do Oscar de Melhor Documentário. 
 
 
ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Veja, a seguir, dois quadros construídos de forma ideal, ou seja, formatos que não 
existem na realidade – apenas uma construção teórica do que se entende por nova 
prevenção e por tolerância zero: 
 
http://www.lume.ufrgs.br/bistream/handle/10183/12087/000618596.pdf?sequence=1 
 
Observe os dois tipos ideais e, a partir do compreendido nesta aula com relação às 
concepções de Políticas de Segurança Pública, responda: 
 
A quais conclusões podemos chegar sobre a eficácia desses modelos transformados em 
ações governamentais? 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online. 
 
 
 
Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre o seguinte tema: 
 
Uma mesma política de segurança pode ter características preventivas e de combate ao 
inimigo? 
 
Pense em exemplos reais e nas ações governamentais implementadas no cotidiano. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Nesta aula, você: 
 Conheceu, teoricamente, as principais concepções de Políticas de Segurança 
Públicas discutidas na atualidade; 
 Entendeu a importância do papel do Estado no processo de gerenciamento do 
problema da violência e da criminalidade na sociedade. 
 
 
 
Pode haver divergências sobre qual é a concepção de política de segurança ideal a ser 
implementada: se é a política militarizada – que visa ao enfrentamento do inimigo – ou 
aquela voltada à implementação de ações compatíveis com o respeito aos Direitos 
Humanos. 
 
Entretanto, dificilmente haverá divergência quando se afirma a necessidade de 
implementação de políticas que diminuam a criminalidade e aumentem a segurança da 
população. 
 
Nesse sentido, a partir da análise apresentada ao longo desta aula, abordaremos, na 
próxima aula, o tema Formulaçãoe análise de políticas no campo da Segurança Pública, 
no intuito de analisarmos os fatores sociais e políticos envolvidos na elaboração de 
Políticas de Segurança Pública. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 6: Formulação e Análise de Políticas no Campo da Segurança 
Pública 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: 
1. Avaliar o processo de formulação e análise de Políticas de Segurança Pública; 
2. Identificar a importância da elaboração de diagnósticos à eficácia de Políticas de 
Segurança Pública. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
3. Realize a atividade proposta; 
4. Leia a síntese desta aula; 
5. Leia a chamada para a aula seguinte; 
6. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à aula Formulação e análise de políticas no campo da 
Segurança Pública. 
 
Dando continuidade ao conteúdo trabalhado na aula anterior, na qual analisamos 
diferentes concepções sobre Políticas de Segurança Pública, abordaremos o tema da 
formulação e análise de uma Política de Segurança Pública cidadã, voltada à 
implementação de ações comprometidas com a prevenção da violência e o respeito aos 
Direitos Humanos. 
 
A implantação de uma Política de Segurança Pública77 mobiliza um conjunto complexo de 
fatores que só podem ser conhecidos na realidade empírica de cada local. A experiência 
de uma política pode-se caracterizar por ações preventivas e de combate à violência, em 
razão das demandas de cada comunidade em que é implementada ou, ainda, da 
ideologia dos governantes responsáveis por sua gestão. 
 
A formulação de Políticas de Segurança Pública cidadã caracteriza-se por duas etapas 
principais: a realização de diagnóstico da situação da criminalidade local; e a promoção 
da intersetorialidade em políticas sociais, culturais e econômicas – tema que será 
abordado na próxima aula. 
 
O requisito fundamental à formulação de uma Política de Segurança Pública cidadã é a 
vontade política dos gestores responsáveis pela área. Havendo compromisso, o primeiro 
passo é a elaboração de um diagnóstico ou a realização de uma pesquisa de 
vitimização78, com o objetivo de buscar informações detalhadas sobre a violência e a 
 
 
 
 
77 Para aprofundar o tema, sugerimos as seguintes leituras: 
 
SOARES, Luiz Eduardo. Meu casaco de general; 500 dias no front da Segurança Pública do Rio de Janeiro. São 
Paulo: Companhia das Letras, 2000. 
 
______. Legalidade libertária. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2006. 
 
______. Segurança tem saída. Rio de Janeiro: Sextante, 2006. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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criminalidade praticadas no local, no qual será implantada a política de segurança 
formulada. 
 
É imprescindível saber qual o objetivo e quais as metas a serem alcançadas. Por mais 
que saibamos que o Brasil tem experimentado problemas crescentes quanto à Segurança 
Pública, esses não são os mesmos problemas de todas as regiões e de todas as cidades. 
Pelo contrário, o que observamos é o surgimento de tendências diversas na evolução do 
crime e da violência em cada região. Mais amplo que uma pesquisa de vitimização, o 
diagnóstico busca – além de informações sobre os crimes – dados sobre outras variáveis 
potencialmente significativas, como, por exemplo: a presença de jovens na composição 
demográfica; os índices de mobilidade social; os indicadores relativos à escolaridade e a 
acesso ao emprego; a disponibilidade de armas; as taxas de impunidade e as 
características culturais formadoras das identidades e dos valores dos moradores de 
determinado local; o grau de eficiência policial e de credibilidade das polícias. 
 
Podemos afirmar que, a par das semelhanças e dos problemas comuns, cada local possui 
seus próprios problemas, devendo produzir suas próprias soluções. A participação da 
sociedade é indispensável nesse processo, tanto na elaboração do diagnóstico quanto na 
construção do planejamento pensado a partir dele. É o diagnóstico que viabiliza o 
planejamento de ações concretas que permitem avaliações regulares do desempenho da 
política como um todo. A falta de avaliação impede que os gestores aprendam com seus 
erros e os corrijam, acumulando, racionalmente, experiência e criando uma história 
institucional – uma política de Estado79 que não desapareça com a mudança dos 
governos e que não seja personalizada. 
 
Reconhecer a desigualdade é determinante para que possamos chegar às características 
de cada território, para o qual está sendo pensada a política de segurança. Temos de 
entender a relação desigual no nível da alteridade, e não como expressão de 
inferioridade. Para ser chamada de convivência, a relação entre pessoas deve ser 
horizontal, baseada no respeito à diversidade. Mesmo que haja dissenso quanto às 
políticas a serem definidas, escolhidas e implementadas, elas serão mais eficazes do que 
a improvisação reativa80, comum nas políticas militarizadas e de combate ao inimigo, as 
quais, para alguns, sequer merecem o título de Políticas de Segurança Pública. 
 
A pluralidade estará refletida nas diferentes opiniões sobre o que se espera da Segurança 
Pública. Cada grupo possui sua história e seus valores, e, para ser democrática, a política 
terá de alcançar as mais diversas expectativas81. Por exemplo, a definição do que é 
 
 
 
 
78 Entre outras descrições que só a investigação apresentará, o conteúdo da pesquisa de vitimização deverá 
conter: as vítimas dos crimes; o perfil dos agressores; as circunstâncias nas quais os crimes ocorreram; as 
condições de infraestrutura urbana dos locais em que os crimes ocorreram; as experiências das vítimas com o 
sistema de Segurança Pública e de atendimento de emergência hospitalar; as medidas tomadas pelas pessoas, 
que visam à prevenção dos crimes. 
 
79 Sobre a política de Estado, leia o texto O outro Estado da Nação, do sociólogo português Boaventura de 
Souza Santos, disponível em: http://www.ces.uc.pt/opiniao/bss/024en.php. 
 
80 Sobre a improvisação reativa, leia o texto Notas sobre a problemática da Segurança Pública, do professor 
Luiz Eduardo Soares, disponível em: 
http://desafios.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/bpsociais/bps_02/ensaio3_notas.pdf. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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vandalismo varia de um grupo para outro dentro de uma mesma aglomeração 
habitacional, particularmente por idade e gênero. O desenvolvimento de sociedades 
pluralistas envolve conflitos disseminados entre grupos em torno do que é 
comportamento ordeiro e desordeiro. A necessidade de tolerância entre os grupos torna-
se uma questão fundamental, enquanto os limites de tolerância passam a ser cada vez 
mais disputados. A ordem de um é desordem para outro; o comportamento normal de 
um grupo cria condições intoleráveis para outros. 
 
É inútil pensar em uma Política de Segurança Pública sem que as polícias funcionem 
como parte da solução, atuando em conjunto com a sociedade na construção de um 
planejamento eficaz baseado em dados confiáveis – levantados pelo diagnóstico. Para 
tanto, os policiais devem operar com base em modelos racionais de gerenciamento, 
agindo a partir de informações sistemáticas, diagnósticos rigorosos, inserções planejadas 
e avaliações regulares, e dispondo dos equipamentos e da tecnologia correspondentes ao 
tamanho das responsabilidades. Essa mudançade paradigma do trabalho policial e a 
reconstrução da credibilidade das polícias junto à sociedade constituem, talvez, um dos 
principais desafios à formulação de uma política comprometida com a prevenção da 
violência por meio de ações que respeitem os Direitos Humanos e contem com a 
participação da sociedade – entendendo que os policiais são cidadãos com direitos 
comuns. 
 
Os dados disponíveis são – quase todos – aqueles produzidos pelas polícias a partir dos 
Boletins de Ocorrência (BOs). Portanto, trata-se de uma base frágil, na qual é impossível 
lidar com o volume de crimes ou de ocorrências violentas que não são comunicados à 
polícia. Essa subnotificação82 esconde problemas da maior gravidade, como, por 
exemplo, a violência doméstica que vitima crianças e mulheres, além de muitos outros 
delitos que, em regra, não são comunicados. Muitas vezes, as vítimas simplesmente 
deixam de registrar a ocorrência porque não confiam na polícia e não desejam perder 
tempo com isso. Em outras oportunidades, as vítimas temem eventuais represálias e 
sentem-se inseguras para efetuar alguma queixa. Mas há, também, situações muito 
comuns em que as vítimas conhecem os agressores e não desejam o envolvimento da 
polícia, seja porque entendem que podem resolver melhor o problema sozinhas, seja 
porque não desejam a punição do agressor com quem mantêm algum vínculo. Há, ainda, 
situações nas quais o registro policial deixa de ser feito, porque as vítimas sequer 
possuem as informações necessárias a respeito dos recursos existentes para a garantia 
de seus direitos ou porque não se podem deslocar até uma delegacia. Além disso, há um 
 
 
 
 
81 Sobre a questão, Carlos Drummond de Andrade afirma: 
 
“A porta da verdade estava aberta, mas só deixava passar meia pessoa de cada vez. Assim, não era possível 
atingir toda a verdade, porque a meia pessoa que entrava só trazia o perfil de meia verdade. E sua segunda 
metade voltava igualmente com meio perfil. E os meios perfis não coincidiam. Arrebentaram a porta. 
Derrubaram a porta. Chegaram ao lugar luminoso onde a verdade esplendia fogos. Era dividida em metades 
diferentes uma da outra. Chegou-se a discutir qual a metade mais bela. Nenhuma das duas era totalmente 
bela. E carecia optar. Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia”. (FAVELÁRIO Nacional de 
Carlos Drummond de Andrade. In: ANDRADE, Carlos Drummond de. O corpo. Rio de Janeiro: Record, 2002, p. 
47) 
 
82 Sobre a dark rate (cifra escura), sugerimos a seguinte leitura: 
 
ROLIM, Marcos. A síndrome da rainha vermelha: policiamento e Segurança Pública no século XXI. Rio de 
Janeiro: Jorge Zahar; Oxford, Inglaterra: University of Oxford, 2006. p. 40 e ss.) 
 
 
 
 
 
 
 
 
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conjunto de crimes sem vítima, como, por exemplo, o tráfico de drogas e o jogo ilegal. 
Por fim, há crimes que afetam comunidades inteiras, a médio e longo prazos, mas que 
não atingem, individualmente, esta ou aquela pessoa e que, portanto, igualmente não 
ensejam queixas policiais. Tal é o caso, por exemplo, da poluição ambiental, da 
sonegação de impostos, da corrupção etc. 
 
No mais, os BOs podem-se prestar a uma série de distorções, voluntárias ou não. Muitas 
vezes, eles registram um grande aumento de determinados crimes apenas porque a 
polícia passou a dar mais atenção àquele tipo de delito ou porque os policiais passaram a 
trabalhar melhor, despertando, por isso, a confiança das vítimas, que passam a 
denunciar com mais frequência. Em outros momentos, os BOs permitirão concluir que 
determinados delitos estão diminuindo, quando, na verdade, o que diminui é a taxa de 
registro. Além disso, os registros policiais costumam reproduzir a tipologia do Código 
Penal, o que pode fazer, por exemplo, com que um assalto praticado por uma quadrilha 
que empregou armamento pesado apareça na mesma totalização em que se encontra um 
crime de roubo praticado na rua, mediante ameaça, por um adolescente pobre e 
dependente de crack83. 
 
Sendo assim, os dados policiais são fundamentais, porque se referem a uma parte dos 
problemas reais. Entretanto, esses dados não podem oferecer a base única e suficiente 
para um diagnóstico a respeito das tendências criminais, suas naturezas e incidências. 
Para formar uma base mais completa e confiável, é necessária a coleta de outros dados 
estatísticos de instituições governamentais e não governamentais, além da investigação 
qualitativa por meio de grupos focais e entrevistas. 
 
O conteúdo do diagnóstico identificará a situação da criminalidade e será o ponto de 
partida para a elaboração da política. Esse primeiro momento é o alicerce para que 
possamos planejar ações concretas de prevenção e de enfrentamento da violência. Não 
só os dados representam o fundamento técnico para o planejamento da política; as 
relações de confiança construídas nesse processo também são o que legitima essa 
política na sociedade. Os problemas diagnosticados serão complexos e multifatoriais, o 
que gerará a necessidade de políticas também complexas, intersetoriais e transversais84, 
para dar conta da complexidade das demandas, dos atores e das instituições envolvidos 
no contexto. 
 
Sempre que possível, o plano de intervenções deve envolver as três esferas 
administrativas: federal, estadual e municipal. De acordo com a Constituição Federal, as 
prefeituras não têm competência para traçar Políticas de Segurança Pública. Isso, no 
entanto, não impede que os Municípios participem da elaboração e efetivação das 
políticas públicas na área – como veremos na Aula 08. As administrações municipais são 
as mais próximas da criminalidade cotidiana, da população e dos problemas que a 
afetam diretamente, o que permite não só conhecer melhor a realidade das pessoas mas 
também investir em estratégias caracterizadas pela pluriagencialidade e 
interdisciplinaridade de ações, e pela capacidade de mobilizar instituições envolvidas na 
complexidade dos fatores relativos ao tema da segurança. 
 
 
 
 
 
83 Sobre o crack, sugerimos o filme: A maldição da pedra. 
 
84 Estudaremos sobre políticas intersetoriais e transversais na próxima aula. 
 
 
 
 
 
 
 
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Para saber mais sobre os tópicos estudados nesta aula: 
 
Assista ao vídeo de apresentação da Primeira Conferência de Segurança Pública. 
 
 
Assista aos seguintes filmes: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Quanto vale ou é por quilo? 
(2005) – De Sérgio Bianchi 
Estamira (2006) 
– De Marcos Prado 
O dragão da maldade contra 
o santo guerreiro (1969) 
– De Glauber Rocha 
Atos dos homens (2006) 
– De Kiko Goifman 
 
 
 
 
 
 
 
 
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ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Assista, no ambiente online, aos vídeos sobre a Lei Maria da Penha e a violência contra 
as mulheres do Brasil: Retratos de uma Lei (parte 1) e Retratos de uma Lei (parte 2). 
 
A partir do compreendido nesta aula, discorra sobre a importância da elaboração do 
diagnóstico da situação de cada local à formulação de Políticas de Segurança cidadã que 
atendam às demandas de todos – nesse caso, especialmente às mulheres que sofrem 
violência doméstica. 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online.Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre os seguintes temas: 
 
Qual a importância da Lei Maria da Penha para a sociedade brasileira? Quais as 
mudanças que essa Lei causou à realidade? 
 
Quais os principais desafios à diminuição da violência contra a mulher e da violência 
doméstica? 
 
 
 
 
Nesta aula, você: 
 Conheceu os principais passos para a formulação de Políticas de Segurança 
Pública voltadas à prevenção da violência e da criminalidade; 
 Estabeleceu requisitos fundamentais para identificar se uma política é 
comprometida com medidas preventivas e cidadãs ou, por outro lado, se é apenas 
uma ação sem pretensão real de resolver os problemas atinentes à segurança nas 
cidades. 
 
 
 
Tendo abordado os fatores que envolvem a primeira etapa da formulação das políticas de 
segurança, daremos continuidade ao tema, analisando, na próxima aula, o que é A 
intersetorialidade das Políticas de Segurança Pública e qual sua importância nesse 
processo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 7: A intersetorialidade das Políticas de Segurança Pública 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: 
1. Identificar a importância da intersetorialidade nas Políticas de Segurança Pública; 
2. Definir as ações afirmativas para além da discussão sobre cotas raciais; 
3. Diferenciar as políticas interdisciplinares das políticas transversais. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Assista ao vídeo do coordenador Luiz Eduardo Soares; 
3. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
4. Realize a atividade proposta; 
5. Leia a síntese desta aula; 
6. Leia a chamada para a aula seguinte; 
7. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à aula A intersetorialidade das Políticas de Segurança 
Pública. 
 
Na aula anterior, analisamos a importância da elaboração de diagnósticos como o único 
caminho para a formulação de Políticas de Segurança Pública cidadã que correspondam 
às necessidades concretas da população, permitindo a avaliação das ações e a 
construção de intervenções eficazes no controle e na prevenção da criminalidade. 
 
Nesta aula, abordaremos o tema intersetorialidade85 das políticas de segurança, partindo 
do pressuposto de que, para problemas complexos e multidimensionais – como aqueles 
atinentes à Segurança Pública –, são necessárias soluções também complexas, isto é, 
intersetoriais. 
 
A sociedade é heterogênea e, nela, mantêm-se e reproduzem-se históricas desigualdades 
econômicas, sociais, políticas e culturais. Em razão disso, torna-se necessário que o 
Estado desenvolva políticas públicas que contemplem a universalidade, a indivisibilidade 
e a integralidade dos Direitos Humanos. Para que uma política de segurança tenha 
condições de proporcionar novas formas de relação entre grupos excluídos socialmente, 
necessita ter um caráter afirmativo, investindo em ações afirmativas86. Em outras 
palavras, essa política deve tratar de forma desigual os socialmente desiguais, por meio 
de políticas públicas que, em tese, têm o objetivo de concretizar o princípio constitucional 
da igualdade material, minimizando ou neutralizando (quando e se possível) os efeitos da 
discriminação – seja esta qual for: de gênero, racial, de idade, de origem nacional ou de 
estratificação social. Para ser cidadã, uma política pensada a partir de dados concretos 
 
 
 
 
85 De acordo com o Jurista Alessandro Baratta: 
 
“[...] uma política de proteção e desenvolvimento de bens jurídicos – na qual agem, sinergicamente, em 
sentido preventivo ou reativo, diversas agências do Estado e da sociedade – é a real alternativa ao monopólio 
das agências do sistema punitivo sobre os problemas de segurança; à legislação simbólica; à falta de medida; e 
às tendências autoritárias do Direito Penal. (apud DIAS NETO, 2005, p. 115). 
 
86 Sobre ações afirmativas, leia o texto de Maria Berenice Dias, disponível em: 
http://www.universia.com.br/materia/materia.jsp?id=8459. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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deve promover ações que garantam o atendimento às expectativas de segurança de 
todos os segmentos da sociedade, sem reduzir a segurança à proteção de um 
determinado grupo frente ao perigo representado por outros. 
 
A intersetorialidade rompe com o isolamento das iniciativas em Segurança Pública, para 
que se trabalhe a partir de uma rede de atores sociais, desde as agências públicas de 
policiamento e os diferentes serviços oferecidos pelo Estado até as agências privadas e 
os próprios cidadãos. O foco das ações deixa de ser o modelo reativo de segurança – 
centrado na repressão e na multiplicação das prisões – para voltar-se à concepção de 
estratégias comunitárias de segurança que busquem, de forma participativa e 
democrática, a transversalidade87. Diferente da interdisciplinaridade88 nas ações 
governamentais, nas quais há um diálogo entre vários segmentos governamentais – o 
que já é, em si, importante –, a transversalidade das políticas de segurança pressupõe 
que a preocupação com a prevenção da violência deve estar presente na elaboração e na 
execução das demais políticas públicas do executivo municipal, estadual ou federal. A 
transversalidade deve ser entendida como um dos princípios norteadores da execução 
das políticas destinadas a objetivos e metas determinados, mas não pode ser tomada 
como um fim em si mesmo. 
 
Quando falamos em prevenção no Brasil, é muito comum que isso seja compreendido 
como sinônimo de programas sociais ou de políticas públicas que aumentem a oferta de 
educação, saúde, habitação, lazer etc. Por esse caminho, os governos já estariam 
fazendo prevenção sempre que investissem em programas sociais. Isso não é 
rigorosamente verdadeiro. É claro que melhorias alcançadas na situação econômica e 
social da população tendem a produzir resultados positivos, concorrendo para a redução 
do crime e da violência. Ocorre que crime e violência não podem ser compreendidos 
como resultados diretos e exclusivos das carências sociais. Reduzir essas carências pode 
ajudar muito, mas isso não é, ainda, a prevenção a qual nos referimos. Aliás, quando 
imaginamos que o crime e a violência podem ser enfrentados apenas com reformas 
sociais, passamos a menosprezar a necessidade de uma política de segurança, e o mais 
provável é que nunca a tenhamos. 
 
Em função disso, falamos em agenciamentos do crime e da violência, e não em causas, a 
não ser em um sentido bastante amplo e genérico, em contextos nos quais isso facilite a 
comunicação. As causas de problemas complexos são, necessariamente, complexas e 
envolvem muitas mediações. Normalmente, elas remetem a problemas estruturais, cuja 
solução é tarefa para gerações inteiras – ou seja, problemas cujas soluções demandam 
décadas. Entretanto, quando o tema é segurança, não podemos aguardar por uma 
resolução tão demorada. Afirmar o contrário seria o mesmo que propor uma sentença de 
sofrimento e morte para a maioria das pessoas que se sentem inseguras e que, também 
por isso, têm pressa. 
 
 
 
 
 
87 De acordo com Theodomiro Dias Neto (2005, p. 115): “O confronto público das diversas experiências 
profissionais desbloqueia a criatividade social para novos tratamentos e permite que as diversas instituições – 
não somente a policial – possam enxergar os problemas além das dimensões estreitas de seus focos”. 
 
88 Sobre a interdisciplinaridade, leia o texto A interdisciplinaridade como uma das bases da inteligência policial, 
disponível em: http://www.forumseguranca.org.br/artigos/a-interdisciplinaridade-como-uma-das-bases-da-inteligencia-policial. 
 
 
 
 
 
 
 
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No Guia para a prevenção da violência89, assumido pela SENASP como orientação geral 
para políticas de segurança dos Municípios brasileiros, encontramos o seguinte exemplo 
para ilustrar o sentido do termo agenciamento: 
 
“Imaginemos uma ocorrência como um incêndio em uma favela. Tragédias do tipo são, 
ainda hoje, comuns em todo o País. Em várias dessas ocorrências, centenas de pessoas 
perdem o pouco que conseguiram juntar em suas vidas. Muitas outras ficam 
desabrigadas, e algumas, muito frequentemente crianças, morrem queimadas. Parece 
evidente que esses resultados estão relacionados a uma causa econômico-social. Se as 
pessoas não vivessem em favelas e morassem em casas de alvenaria, em bairros 
servidos por uma adequada infraestrutura, não ocorreriam incêndios e, ainda que eles 
ocorressem, os resultados não seriam tão devastadores. Isso é evidente. O que não é 
evidente é que a grande maioria dos incêndios desse tipo é produzida, no Brasil, por dois 
agenciamentos: problemas na instalação dos botijões de gás ou deficiências nas 
instalações elétricas e uso de velas para iluminação. Se tivermos uma política que 
assegure às residências mais humildes energia elétrica fortemente subsidiada – 
acabando com cortes de energia por falta de pagamento e com instalações clandestinas – 
e desenvolvermos uma política proativa com o Corpo de Bombeiros para visitação 
domiciliar – com inspeção e troca gratuita de mangueiras e válvulas de gás –, 
reduziremos os incêndios em favelas para algo próximo a zero. Os moradores seguiriam 
sendo muito pobres, mas nenhum entre eles morreria queimado. Quando falamos em 
prevenção queremos nos referir, então, à necessidade de identificar, em cada local, os 
agenciamentos equivalentes para o crime e a violência e, a partir desse diagnóstico, 
elaborar políticas específicas que, tanto quanto possível, os previnam”. 
 
A configuração de Políticas de Segurança Pública envolve o Estado e a população por 
meio de espaços de participação, da atribuição de um papel comunitário às polícias e de 
ações interagenciais que envolvem instituições governamentais e da sociedade 
organizada. Essa configuração pressupõe um canal de comunicação das políticas de 
segurança com diferentes códigos culturais dos distintos grupos sociais. No intuito de 
promover, de forma democrática, a convivência entre grupos distintos, o reconhecimento 
da heterogeneidade social e sua abordagem são essenciais para que uma política de 
segurança seja considerada preventiva e promotora dos Direitos Humanos. 
 
A implementação desse novo caminho para a formulação intersetorial de políticas de 
segurança – pensadas a partir de dados concretos e da realidade empírica de cada local 
específico – conta, de forma indispensável, com os Municípios como promotores, 
coordenadores e executores de boa parte dessas políticas. São as administrações 
municipais as mais próximas da população, as que melhor conhecem as necessidades 
dos moradores de cada local. Portanto, elas possuem capacidade e legitimidade para 
coordenar ações que envolvem instituições policiais, projetos governamentais e 
comunidades locais. A experiência recente em alguns Municípios brasileiros tem 
comprovado isso, e o caso de Diadema (SP) parece ser, entre eles, o mais significativo. A 
partir de um diagnóstico correto das especificidades do Município quanto à incidência do 
crime e da violência, Diadema apresentou uma resposta notadamente eficaz quanto à 
 
 
 
 
89 Acesse o Guia para prevenção do crime e da violência, do Ministério da Justiça, disponível em: 
http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ3F6F0588ITEMID576243E3FB8448E88D550DB118AB37F3PTBRNN.htm. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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redução das taxas de homicídio. Tais resultados foram rapidamente percebidos pela 
população como uma conquista coletiva dos diversos segmentos da sociedade. 
 
Nesse contexto, em que estão sendo buscadas novas formas de gerir a problemática da 
segurança, surge a discussão sobre a importância dos Municípios como atores 
fundamentais na construção de modos alternativos de enfrentar os problemas afetos à 
violência e à criminalidade nas cidades. 
 
 
 
Para saber mais sobre os tópicos estudados nesta aula: 
 
 
Assista aos seguintes filmes: 
 
 
Última parada 174 (2008) 
– De Bruno Barreto 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ganga Zumba (1964) 
– De Cacá Diegues 
Juízo (2008) 
– De Maria Augusta Ramos 
 
 
 
 
 
 
 
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ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Para realizar esta atividade, leia, no ambiente online, uma notícia sobre o tema estudado 
nesta aula. 
 
Como vimos, a intersetorialidade é fundamental na formulação de Políticas de Segurança 
cidadã. Sendo assim, qual a importância da participação de detentos na elaboração de 
políticas de segurança? Qual seu papel nesse processo? 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online. 
 
 
 
 
Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre o seguinte tema: 
 
Quando afirmamos que, para serem cidadãs, as políticas de segurança devem ser 
intersetoriais, estamos falando de quais agenciamentos e de quais fatores envolvidos 
nesse processo? 
 
 
 
Nesta aula, você: 
 Conheceu outra etapa fundamental à formulação de políticas no campo da 
Segurança Pública – a construção de ações intersetoriais que atendam às 
demandas identificadas no momento da elaboração do diagnóstico; 
 Aprendeu a diferenciar os conceitos de intersetorialidade, interdisciplinariedade, 
transversalidade e ações afirmativas – algo indispensável para pensar o desenho 
das ações voltadas à prevenção da violência e ao controle da criminalidade. 
 
 
 
No contexto atual, em que estão sendo buscadas novas formas de gerir a problemática 
da segurança, surge a discussão sobre a importância dos Municípios como atores 
fundamentais na construção de modos alternativos de enfrentar os problemas afetos à 
violência e à criminalidade nas cidades. 
 
Este será o tema abordado na próxima aula: A Municipalização das políticas de 
segurança. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Aula 8: A Municipalização das políticas de segurança 
 
Ao final desta aula, você será capaz de: Compreender o papel dos Municípios no que 
tange às políticas de prevenção da violência. 
 
Estudo dirigido da aula 
 
1. Leia o texto condutor da aula; 
2. Participe do Fórum de Discussão desta aula; 
3. Realize a atividade proposta; 
4. Realize o trabalho final; 
5. Leia a síntese desta aula; 
6. Realize os exercícios de autocorreção. 
 
Olá! Seja bem-vindo(a) à última aula da disciplina Políticas de Segurança Pública. 
 
Já estudamos o conceito de intersetorialidade nas Políticas de Segurança Pública e sua 
relevância no processo de implementação de ações concretas, pensadas a partir de 
diagnósticos locais. 
 
Nesta aula, abordaremos questões relacionadas ao tema da Municipalização da 
Segurança Pública, seu histórico e a importância dos Municípios na construção de um 
novo paradigma de ações voltadas à prevenção da violência. 
 
A implantação de políticas de segurança nos Municípios brasileiros é recente e possui 
poucos exemplos no Brasil. A despeito da legislação federal – que determina as 
competências na administração da Segurança Pública –, nos últimos 10 anos, as 
demandas crescentes de alguns segmentos da sociedade impulsionaram os Municípios a 
se manifestarem sobreo tema. A partir desse momento, algumas prefeituras começaram 
a construir estratégias no intuito de propor à população alternativas complementares às 
ações desenvolvidas pelos governos estadual e federal. Da mesma forma, em função do 
aumento da criminalidade urbana e da preocupação em torno do assunto, nos últimos 20 
anos, começaram a se desenvolver pesquisas acadêmicas sobre a problemática que 
envolve as políticas de segurança urbana e seus limites. 
 
Como já analisado em aulas anteriores, a partir da década de 1980, o aumento dos 
índices de violência urbana no País, somado à crise no sistema penitenciário, fez com que 
grupos da população brasileira e parcela significativa da opinião pública demandassem 
respostas imediatas do Estado para o combate à violência nas cidades. Os problemas 
relacionados à segurança do cidadão passaram a gerar preocupação política e acadêmica, 
até então muito limitada no Brasil. Iniciaram-se pesquisas científicas sobre violência 
urbana, doméstica e ambiental, sobre tráfico de drogas etc. Da mesma forma, a criação 
de ONGs voltadas para esses temas tem crescido bastante, o que demonstra mudanças 
da sociedade civil, até então mera espectadora das decisões estatais em relação à 
segurança dos cidadãos. 
 
Os governos federal e estadual começaram a demonstrar preocupação com a elaboração 
de políticas para tratar do problema da violência, com um espectro de abrangência 
ampliado em função da gravidade do problema social. Essas políticas se traduziram, 
inicialmente, na criação de delegacias de polícia especializadas e em investimentos em 
equipamentos, ou seja, corresponderam a uma aposta no aparelhamento da polícia para 
 
 
 
 
 
 
 
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combater a violência em detrimento da elaboração de novas abordagens e soluções 
eficazes. 
 
Antes de 1988, as Constituições Federais não explicitavam, claramente, as competências 
do Município90 como integrante da federação, ainda que fosse consensual que as mesmas 
competências atribuídas aos demais entes federados também diziam respeito aos 
Municípios. Foi a Constituição Federal de 198891 que inseriu, expressamente, nos Artigos 
1º e 18, o Município como ente federativo. 
 
A demanda por políticas municipais para segurança do cidadão esteve, por muito tempo, 
distante das administrações municipais, uma vez que a Segurança Pública, 
historicamente, era responsabilidade dos governos estaduais, especialmente das polícias. 
A partir de 1988, a concepção de Segurança Pública como tarefa do Estado inscreve-se 
em um contexto conceitual e axiológico, marcado pelos princípios da harmonia e da 
complementaridade entre as funções das organizações políticas, nomeadamente: União, 
Estados e Municípios. Em outras palavras, considerando-se o contexto mais amplo do 
sistema normativo constitucional, pareceria legítimo sugerir uma interpretação elástica, 
segundo a qual a Segurança Pública poderia passar a ser entendida como atribuição das 
três esferas de governo (federal, estadual e municipal), assim como, por vias distintas, 
caberia aos três poderes republicanos: Executivo, Legislativo e Judiciário. 
 
Qualquer que seja a posição de cada leitor e exegeta da Constituição, o fato é que, na 
vida prática, a despeito da prerrogativa estadual, o tema Segurança Pública apareceu 
com força em várias cidades, nas eleições municipais de 2000. Com o início dos novos 
mandatos, começaram a ser elaborados Planos Municipais de Direitos Humanos e 
Segurança Pública92. 
 
Em 2003, o Projeto de Segurança Pública para o Brasil – apresentado ao País pelo 
presidente Lula, em 2002, como candidato –, começou a ser implementado. Entre suas 
propostas, destacam-se: a normatização do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP); 
a instalação, nos Estados, dos Gabinetes de Gestão Integrada de Segurança Pública 
(essa proposta foi elaborada pela SENASP, sob a direção do então secretário nacional, 
Luiz Eduardo Soares, já em 2003); a integração territorial, com a criação, em nível 
estadual, de Áreas Integradas de Segurança Pública (AISPs); a desconstitucionalização93 
 
 
 
 
90 Sobre as competências do Município, leia o texto Segurança Pública: um desafio para os Municípios 
brasileiros, de Carolina de Mattos Ricardo e Haydee Caruso, disponível em: 
http://www.forumseguranca.org.br/pdf/artigo8_seguranca_publica.pdf. 
 
91 Acesse, na íntegra, a Constituição Federal de 1988, disponível em: 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. 
 
92 Sobre os Planos Municipais de Direitos Humanos e Segurança Pública, sugerimos as seguintes leituras: 
 
PLANO Nacional de Segurança Municipal. In: SOARES, Luiz Eduardo. Legalidade libertária. Rio de Janeiro: 
Lumen Júris, 2006. 
 
KAHN, Túlio. Indicadores em prevenção municipal de criminalidade. Disponível em: 
http://books.google.com.br/books?id=nIphnLkIHdAC&printsec=frontcover. Acesso em: 05 ago. 2009. 
 
93 A desconstitucionalização das polícias transferiria para os Estados a tarefa de prever, em seus respectivos 
diplomas legais, o modelo policial apropriado, o que poderia resultar na unificação das Polícias Estaduais bem 
como na criação de Polícias Municipais ou Metropolitanas, encarregadas tanto da investigação quanto do 
patrulhamento ostensivo uniformizado – denominadas polícias de ciclo completo. 
 
 
 
 
 
 
 
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das polícias; o foco na capacitação e valorização profissional das polícias; a ênfase na 
integração do conhecimento e no compartilhamento das informações; o estímulo às 
penas alternativas; o suporte aos mecanismos de controle das polícias através de 
Ouvidorias independentes e Corregedorias unificadas; o investimento em políticas 
preventivas no policiamento comunitário e na atuação das Guardas Municipais. 
 
O que está listado acima são apenas alguns pontos de um Projeto94 marcado pela 
amplitude e profundidade no encaminhamento dos problemas levantados. Esse Projeto 
estabelece um roteiro das questões a serem enfrentadas, o qual, de uma maneira ou de 
outra, vem servindo como norteador das políticas indutoras propostas pelo governo 
federal no âmbito da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). 
 
Esses planos objetivaram articular iniciativas de vários setores do executivo federal, de 
modo que programas de várias áreas pudessem convergir em empreendimentos 
selecionados a partir de demandas formuladas por Estados e pelas próprias 
municipalidades, por meio da ação coordenada do Poder Público local95 com a sociedade 
civil. As reformas propostas na esfera municipal estão votadas à redefinição de papéis: a 
administração local passaria a ser gestora e operadora da Segurança Pública em nível 
local, sem descuidar de sua articulação com as Polícias Estaduais e com as políticas 
integradas, propostas no âmbito federal. As propostas valorizam a qualificação, 
estruturação e o protagonismo das Guardas Municipais, que deixam de ser – 
exclusivamente – responsáveis pela tutela dos bens patrimoniais das prefeituras, 
passando a ter papel determinante nas ações de prevenção da violência e construindo 
relações de diálogo e parceria entre o executivo municipal e a população. 
 
Nas Políticas Municipais de segurança, o trabalho análogo ao policiamento vinculado à 
administração local é feito pela Guarda Municipal. Atualmente, menos de 20% dos 
Municípios possuem Guardas, o que tende a limitar (ainda que esteja longe de impedir) a 
atuação das prefeituras em relação à segurança urbana, fazendo com que dependam 
inteiramente das Polícias Civil e Militar, e, é claro, das políticas preventivas intersetoriais 
que venham a implementar. 
 
Legalmente,as atribuições das polícias nos espaços públicos são determinadas pela 
Constituição Federal de 1988, que estipula que as ações ostensivas de controle da 
criminalidade são atribuições dos governos federal e estadual, cabendo ao Município, no 
entanto, o papel de preservação do patrimônio público e de seus bens e serviços. Nesse 
sentido, o caráter preventivo da Guarda Municipal surge do entendimento de que, por 
meio de um atendimento direcionado às escolas e aos postos de saúde, ela pode 
executar projetos de inclusão social e cidadania como formas de prevenir a violência. 
 
A partir desse movimento nacional de repensar estratégias, nas quais os Municípios se 
tornariam protagonistas das políticas de segurança, algumas iniciativas voltadas para a 
 
 
 
 
94 Acesse, na íntegra, o Projeto Nacional de Segurança com Cidadania (PRONASCI), disponível em: 
http://www.mj.gov.br/pronasci/data/Pages/MJF4F53AB1PTBRNN.htm. 
 
95 Sobre o Poder Público local, leia o texto O papel dos Municípios na Segurança Pública, de Túlio Kahn e André 
Zanetic, disponível em: 
http://www.ssp.sp.gov.br/estatisticas_/downloads/manual_estudos_criminologicos_4.pdf. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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prevenção da violência no âmbito municipal96 já demonstraram resultado no Brasil. Além 
da já referida Diadema (SP), bons exemplos (ainda que alguns não tenham sido 
seguidos) são os casos de Santo André (SP), Vitória (ES), Recife (PE), Porto Alegre e 
Canoas (RS), São Paulo, Belo Horizonte, Nova Iguaçu e São Gonçalo (RJ), entre outros. 
 
A demanda e sua urgência passaram a pressionar os executivos municipais com um vigor 
antes desconhecido. Nesse aspecto, há uma situação política nova que exige uma 
resposta precisa por parte dos gestores municipais. De um lado, as prefeituras não 
podem assumir para si a responsabilidade de resolver um problema cujas causas 
estruturais mais importantes estão distantes das possibilidades abertas às políticas 
públicas municipais. De outro, seria simplesmente um erro contornar o problema como 
se ele não dissesse respeito aos Municípios e repetir que cabe ao Estado e à União 
apresentarem soluções. 
 
Como vimos, já temos, no Brasil, casos de administrações comprometidas com a 
população, conhecedoras das angústias vividas pelos munícipes, que foram capazes de 
construir uma abordagem específica dos problemas de segurança, oferecendo uma 
contribuição real para seu enfrentamento. Mas a história recente da participação dos 
Municípios na segurança não foi marcada só por sucesso e inovação. Na tentativa de 
oferecer uma resposta aos problemas da criminalidade e da violência, alguns Municípios 
investiram na reprodução de máquinas repressivas, organizando as Guardas Municipais 
como pequenas PMs em desvio de função, e as concebendo, desde sua 
formação/treinamento, como estruturas espelhadas no modelo reativo de policiamento. 
 
Nesses casos, os Municípios gastaram recursos significativos na compra de armas, 
coletes e viaturas, montando Guardas vocacionadas para perseguir e prender suspeitos, 
quando seu papel primordial, enquanto agente de prevenção da violência, deveria estar 
voltado para as ações de policiamento comunitário e de prevenção situacional do crime97. 
Não raro, tais experiências produziram apenas mais violência e se mostraram, de um 
modo geral, incapazes de construir um caminho que sustentasse, a partir do próprio 
interesse público, os gastos efetuados. 
 
Sendo assim, discutimos o tema da Municipalização das políticas de segurança após: 
cumprirmos um percurso histórico-cultural pelo campo vasto e complexo das instituições 
de Segurança Pública e de seu controle democrático, interno e externo; abordarmos o 
tema O Estado Democrático de Direito e o papel do policiamento no espaço público, 
entendendo a que nos referimos quando falamos em policiamento comunitário; 
analisarmos, criticamente, as concepções de políticas de segurança urbana, buscando 
evidenciar as diferenças entre Política de Segurança Pública cidadã e política de 
extermínio do inimigo; até avançarmos para o exame das políticas intersetoriais no 
campo da Segurança Pública. 
 
 
 
 
 
 
96 Sobre violência no âmbito municipal, leia o texto O processo de gestão da Segurança Municipal, de Miriam 
Guindani, disponível em: http://www.politicasuece.com/v6/admin/publicacao/mapps_Mirian_103.pdf. 
 
97 Como explica Theodomiro Dias Neto (2005), as medidas de prevenção situacional são aquelas voltadas a 
intervir nas características físicas de um local ou a introduzir mecanismos de vigilância (câmeras, alarmes, 
trancas) com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população e de evitar a prática de crimes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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ATIVIDADE PROPOSTA 
 
Assista, no ambiente online, aos vídeos sobre o papel das Guardas Municipais nas 
Políticas de Segurança Pública: Vídeo Institucional da Guarda Municipal e GCM de São 
Paulo denuncia descaso. 
 
Como vimos, as Guardas Municipais possuem um papel de grande importância na 
Municipalização das Políticas de Segurança Pública. Reflita sobre o assunto e responda: 
 
Como o poder local pode proporcionar que a Guarda Municipal deixe de ser a protetora 
do patrimônio do Município para ser a protagonista de ações de prevenção à violência? 
 
Digite sua resposta e acesse o gabarito comentado desta atividade no ambiente online. 
 
 
 
 
Acesse o Fórum de Discussão e debata sobre os seguinte temas: 
 
O papel dos Municípios nas Políticas de Segurança Pública ainda é recente. Quais as 
mudanças significativas que essa reforma de competências pode trazer? 
 
Tendo em vista que a administração municipal é a „porta‟ na qual a população bate, 
podemos pensar que a comunidade terá mais acesso às políticas de segurança? 
 
Como é vista a atuação das Guardas Municipais para além da proteção ao patrimônio? 
 
 
 
 
Escreva uma resenha em 1 lauda (arquivo Word) do capítulo III do livro indicado na 
bibliografia do curso: A síndrome da rainha vermelha: policiamento e Segurança Pública 
no século XXI; ou uma resenha em 1 lauda (arquivo Word) do artigo da pesquisadora 
Miriam Guindani, intitulado O processo de gestão da segurança municipal. 
 
 
Orientações sobre a realização do trabalho podem ser obtidas com o professor, no 
ambiente online, no Fórum de Discussão – tópico Orientações do Trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Nesta aula, você: 
 Percorreu o caminho histórico e político até chegarmos à Municipalização das 
Políticas de Segurança Pública; 
 Conheceu algumas experiências brasileiras e compreendeu como ocorre a 
competência dos Municípios nesse processo, tendo em vista que, historicamente, 
os protagonistas das questões atinentes à segurança nas cidades eram os 
governos estadual e federal. 
 
 
 
Aqui, encerramos a última aula da disciplina Políticas de Segurança Pública, para 
abordarmos, na próxima disciplina, a relação entre o Ordenamento Jurídico brasileiro e a 
Segurança Pública.