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Coletânea de textos extraídos da Internet 1. INTRODUÇÃO O meio ambiente do trabalho envolve as instalações físicas do local (ventilação, iluminação natural ou artificial, ruídos, móveis, maquinário etc.) que devem oferecer um ambiente saudável para a prestação do serviço, bem como deve ser minimizada a possibilidade de contato com qualquer agente químico ou biológico que traga riscos à saúde do trabalhador. Um meio ambiente de trabalho sadio proporciona a manutenção da saúde do trabalhador, por sua vez, um meio ambiente de trabalho agressivo leva ao surgimento de doenças profissionais e, conseqüente, perda da capacidade laborativa deste trabalhador. O art.3º, I, da Lei 6.938/81, definiu meio ambiente como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Posteriormente, com base na Constituição Federal de 1988, passou-se a entender também que o meio ambiente divide-se em físico ou natural, cultural, artificial e do trabalho. Meio ambiente físico ou natural é constituído pela flora, fauna, solo, água, atmosfera etc, incluindo os ecossistemas (art. 225, §1º, I, VII). Meio ambiente cultural constitui-se pelo patrimônio cultural, artístico, arqueológico, paisagístico, manifestações culturais, populares etc (art.215, §1º e §2º). Meio ambiente artificial é o conjunto de edificações particulares ou públicas, principalmente urbanas (art.182, art.21,XX e art.5º, XXIII) e meio ambiente do trabalho é o conjunto de condições existentes no local de trabalho relativos à qualidade de vida do trabalhador (art.7, XXXIII e art.200). Podemos, ainda, conceituar meio ambiente do trabalho como "o conjunto de fatores físicos, climáticos ou qualquer outro que interligados, ou não, estão presentes e envolvem o local de trabalho da pessoa". Apesar desta definição aparentar certo individualismo, isto não acontece pois ante a importância da proteção dos trabalhadores e o interesse e obrigação do Estado de protegê-los, como demonstrado na legislação constitucional, o conceito extrapola na prática o aparente individualismo, tomando conotações de um direito transindividual ao mesmo tempo que difuso. Como dito nossa Constituição Federal incluiu entre os direitos dos trabalhadores o de ter reduzido os riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art.7º, XXII), e determinou que no sistema de saúde o meio ambiente do trabalho deve ser protegido (art.200, VIII), mostrando uma moderna posição com relação ao tema, de forma que as questões referentes ao meio ambiente do trabalho transcendem a questão de saúde dos próprios trabalhadores, extrapolando para toda a sociedade. Também a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) trata da segurança e saúde do trabalhador no art.154 e seguintes do Tít. II, Cap.V e no Tít. III (Normas Especiais de Tutela do Trabalho, além das Portarias do Ministério do Trabalho e a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/90). Há ainda o Programa de Controle Médico e de Saúde Ocupacional e o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, sem contar a obrigatoriedade das empresas terem que instituir as CIPAs – Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (art.163,CLT). Tudo visando a preservação da qualidade ambiental do local de trabalho. Conforme colocado o meio ambiente sadio do trabalho é um direito transindividual por ser um direito de todo trabalhador, indistintamente, e reconhecido como uma obrigação social constitucional do Estado, ao mesmo tempo em que se trata de um interesse difuso, ou mesmo coletivo quando se tratar de determinado grupo de trabalhadores. Em sendo assim, o meio ambiente do trabalho enquadra-se nos casos protegidos pela Lei 7.347/85, que em seu art.1º, I, estabelece a adequação da ação civil pública na proteção do meio ambiente e em seu inciso IV inclui também o caso de danos causados a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, de forma que é plenamente viável falarmos na existência da Ação Civil Pública para resguardar os direitos dos trabalhadores terem um ambiente de trabalho sadio e ecologicamente equilibrado como preceituado no art.225 da Constituição Federal. Assim, estão legitimados para propor a ação civil pública acidentária trabalhista as pessoas de diretito público e as entidades elencadas no art.5ºda Lei 7.347/85, dentre elas os sindicatos e o Minis tério Público. Aliás, até há pouco tempo discutia-se quanto a competência para julgar tal ação, se era da Justiça do Trabalho ou da Justiça Estadual, porém decidiu o Superior Tribunal de Justiça que a competência é da Justiça Estadual (Conflito de competência 16243-São Paulo- Rel.Min.Ari Pargendler,DOU,P.21.435,nº115,17.06.96-J.22.05.96); por conseguinte o Ministério Público estadual é que deve ser a parte legítima ativa e não o Ministério Público do Trabalho. O próprio Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo em sua Súmula 15, entendeu que cabe ao Ministério Público estadual ajuizar esta ação; neste sentido encontramos também Rodolfo de Camargo Mancuso (Ação Civil Pública Trabalhista: Análise de alguns pontos controvertidos, Rev. dos Trib. nº 732, pg.11-37). De fato, se observarmos o art.109 da Constituição Federal vamos ver que a matéria referente a acidentes do trabalho está excluída da competência dos juizes federais. Além disso, a matéria também não faz parte do rol da competência da Justiça do Trabalho nos termos do art.114 também da Carta Magna. Dessa forma, demonstrado está que as questões jurídicas relativas ao meio ambiente do trabalho estão na esfera de competência da Justiça Estadual, consequentemente legitimado está o Ministério Público estadual para ajuizar a ação pública referida. Evidentemente que antes de se ajuizar a ação civil pública em questão poderá o membro do MP chamar a empresa para tentar solucionar a questão mediante compromisso de ajustamento, mas antes ainda poderá requisitar vistoria de engenharia e médica do trabalho para verificar as condições inclusive solicitar dos peritos quais as medidas técnicas para sanar as irregularidades; requisitar documentos como laudos ambientais, relação dos CATs (Comunicação de Acidentes do Trabalho) e atas das CIPAs (Comissão Interna de Prevenção de Acidente) e com esses documentos tentar o compromisso de ajustamento. Pelo que se sabe as promotorias de Acidentes do Trabalhos das comarcas de São Paulo têm conseguido acordos com resultados positivos na quase totalidade dos inquéritos civis nesta área. Portanto, o empregador que por inobservância das normas de segurança do trabalho não fornecer aos seus empregados um ambiente de trabalho sadio e, consequentemente, vier a causar-lhes danos poderá sofrer ação civil pública para que adapte seu estabelecimento e/ou pague multa, bem como poderá ter seu estabelecimento fechado judicialmente, além de poder responder criminalmente. Estará ainda sujeito a multas administrativas (art.201,CLT), interdição do estabelecimento ou equipamento (art.161, CLT). Sem contar que poderá responder por indenização, em se constando sua culpa e dano ao trabalhador, apuráveis através da respectiva ação de indenização (art.7º,XXVIII, CF e art.159, Código Civil). Ante o exposto, podemos concluir que o conceito de meio ambiente evoluiu abrangendo atualmente além do fator natural e físico, o cultural, o artificial e meio ambiente do trabalho. Quanto a este último em especial, constata-se que tomou conotação transindividual e de interesse difuso, possibilitando a sua proteção por meio da ação civil pública com fulcro na Lei 7.347/85, tornando-se um importante direito de todos os trabalhadores e da sociedade como um todo, além de um dever do Estado de protegê-lo. Por conseguinte,isto certamente levará as empresas a dar mais atenção ao ambiente de suas instalações como escritórios e parques industriais, adequando-os aos novos anseios mundiais de desenvolvimento e de qualidade de vida, o que só trará vantagens diretas aos trabalhadores e indiretamente à toda sociedade. 2. TUTELA JURISDICIONAL Qualquer ação pode ser utilizada para efetivação da tutela do meio ambiente do trabalho. É importante, no entanto, ressaltar algumas com sede constitucional: 2.1 Ação popular O constituinte de 1988 ampliou o âmbito de aplicação da ação popular, conforme se depreende o artigo 5º, inciso LXXIII: Art. 5º. (…) (…) LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência (…). Até o advento da Constituição Federal, nos termos da Lei n. 4.717/65, a ação popular tinha como finalidade precípua a nulidade de ato lesivo ao patrimônio público. Desde 1988, no entanto, sua finalidade alcança atos lesivos à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Logo, observados os pressupostos típicos dessa ação, poderá ser utilizada para a salvaguarda do meio ambiente do trabalho. 2.2 Mandado de Segurança Coletivo O constituinte de 1988 criou uma nova forma de impetração do mandado de segurança coletivo, conforme se verifica do artigo 5º, inciso LXX: Art. 5º. (…) (…) LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados (…). Como as relações de trabalho podem envolver os sindicatos, essas organizações estariam perfeitamente habilitadas para defender, através de mandado de segurança coletivo, o meio ambiente do trabalho, já que este está incluído no grupo de matérias de “interesse de seus membros e associados”. 2.3 Mandado de Injunção Também no artigo 5º, agora no inciso LXXI, o constituinte assegura o mandado de injunção, nos seguintes termos: Art. 5º. (…) (…) LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (…). Na hipótese da existência de alguma norma constitucional de eficácia limitada (normalmente programática), protetora direta ou indiretamente do meio ambiente do trabalho, poderá ser impetrado mandado de injunção, para dar-lhe aplicabilidade plena. Afinal, toda a matéria relacionada com o meio ambiente, como já visto, abrange os direitos e liberdades constitucionais. 2.4 Ação Civil Pública Majoritariamente, a tutela jurisdicional do meio ambiente do trabalho é efetivada através da ação civil pública, prevista na legislação infraconstitucional pela Lei n. 7.347/85 e elevada ao nível constitucional pela Carta Magna de 1988, que no seu artigo 129, III estipula o seguinte: Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: (…) III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (…). O aparecimento de referida ação decorreu da constatação da insuficiência da clássica ciência processual, pautada no liberalismo individualista, típico das codificações do século XIX. Em virtude desse reconhecimento, fez-se imprescindível e necessário o surgimento de um processo diferenciado, que possibilitasse aos cidadãos reclamar do Estado um provimento jurisdicional justo e efetivo, também para este novo tipo de lesão envolvendo os interesses difusos. Nesse sentido, ensina a Professora Ada Pellegrini Grinover, "a solução macroscópica de tais conflitos, por intermédio de processos em que a lide seja resolvida, de uma vez por todas, com relação a todos os titulares dos interesses em conflito, significa a acolhida de novas formas de participação, pela ação de corpos intermediários". Também José Joaquim Gomes Canotilho afirma que "o direito a um procedimento justo implicará hoje a existência de procedimentos colectivos (Massenverfahren na terminologia alemã), possibilitadores da intervenção colectiva dos cidadãos na defesa de direitos econômicos, sociais e culturais de grande relevância para a existência colectiva (exemplo: 'procedimentos de massas', para a defesa do ambiente, da saúde, do patrimônio cultural, dos consumidores)". Por isso, no Brasil foi promulgada a Lei n. 7.347/85, instituidora da ação civil pública, exatamente para suprir as necessidades do processo moderno, próprio do século XX. E esse diploma legal trouxe muitas vantagens. Em primeiro lugar, soluciona os problemas relacionados com a admissibilidade em juízo: a) faz prevalecer o princípio da universalidade do acesso à justiça, já que o artigo 5º considera legitimados ativos o Ministério Público, a União, os Estados, os Municípios, as autarquias, as empresas públicas, as fundações, as sociedades de economia mista e as associações (incluindo-se os sindicatos); b) supera o problema das barreiras econômicas. Ainda que os cidadãos atingidos por uma macrolesão não possam se socorrer do Judiciário, por falta de assistência jurídica especializada ou por conta do alto custo do processo — que, na maioria das vezes, exige a realização de complicadas perícias —, os legitimados ativos, além de possuírem corpo jurídico especializado, têm maiores possibilidades de efetuar convênios com órgãos, estatais ou não, habilitados para a realização de provas técnicas; c) sana o problema da desinformação dos cidadãos atingidos pela macrolesão, tanto sobre o direito pretendido, como sobre a forma de acesso à justiça; e d) resolve o problema do descrédito em relação ao Judiciário, pois a tutela concedida será muito mais eficaz, já que atingirá todas as pessoas envolvidas no conflito. Em segundo lugar, a Lei n. 7.347/85 encontra solução para a problemática da coleta de provas, pois o seu artigo 2º estipula que as ações civis públicas devem ser propostas no foro do local onde ocorrer o dano, facilitando a instrução probatória. A grande vantagem dessa determinação é fazer com que o juiz que julgará a causa fique próximo da questão social envolvida, para melhor dimensioná-la e entendê-la. Em terceiro lugar, há maior utilidade das decisões. A sentença proferida em sede de ação civil pública tem eficácia erga omnes, atingindo todas as pessoas que estejam naquela situação (art. 16, primeira parte). Ademais, a coisa julgada é secundum eventum litis (art. 16, segunda parte), ou seja, só restará caracterizada em função do resultado da lide, pois se a ação civil pública for julgada improcedente por deficiência de provas, não haverá configuração da res judicata. Essa medida protege a questão social e impede que as pessoas atingidas por uma macrolesão sejam prejudicadas, se o legitimado ativo não as defender bem. Em quarto lugar, está o objetivo principal da ação, que é a reconstituição do bem lesado (art. 13). Além disso, a decisão pode, também, ter caráter preventivo ou cominatório (art. 11), ou seja, o legislador preocupou-se com a efetividade da solução dada pelo Estado-juiz. Em outras palavras, a lei privilegia a reconstituição do bem lesado ou a prevenção da macrolesão, e não apenas a mera re paração pecuniária. Em quinto lugar, a Lei n. 7.347/85 faz imperare prevalecer o princípio da economia processual. Com a utilização das ações civis públicas, há um gasto mínimo de tempo e de energia de toda a máquina do Poder Judiciário, pois evita-se a propositura de diversas ações individuais sobre uma mesma matéria. Evita-se, ainda, a existência de sentenças contraditórias para lides praticamente idênticas. É possível perceber que a Lei n. 7.347/85 muda a concepção de diversos institutos processuais clássicos, como por exemplo, a legitimidade ativa e a coisa julgada. O objetivo dessas mudanças é alcançar a efetividade do processo, fazendo com que este seja, realmente, instrumento de atuação da jurisdição. Isso porque, em última instância, todo direito me taindividual poderá sempre ser visto como uma "pequena causa", mas o que se busca, na verdade, é um provimento jurisdicional efetivo, que alcance de uma só vez todas as "pequenas causas", garantindo-se o acesso à justiça e a efetividade da decisão. Por não ser um fim em si mesmo, o processo não pode, em hipótese alguma, dissociar-se do direito material. Trata-se, assim, de adequar o processo às relações de massa que atingem novos tipos de interesses, ou seja, os interesses metaindividuais. A Carta Política de 1988 acompanhou essa evolução, deixando incontestável a preocupação do constituinte em assegurar a tutela dos interesses acima mencionados. E como o processo deve servir ao direito material, deixa de ser uma ciência neutra, para acompanhar a opção polít ica e ideológica do constituinte. Em virtude dessa preocupação, o constituinte deu status constitucional à ação civil pública, antes prevista apenas na legislação ordinária, como já mencionado acima. Depois disso, em 1990, a Lei n. 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor, veio aperfeiçoar a tutela jurisdicional coletiva, traçando regras processuais, no seu Título III, que podem ser aplicadas a quaisquer processos que envolvam direitos metaindividuais e não apenas aqueles atinentes às relações de consumo. Além de “complementar” a Lei da Ação Civil Pública, o CDC dirimiu polêmicas doutrinárias, particularmente no que diz respeito à sistematização do interesses metaindividuais, conforme se verá adiante. Esses dois diplomas legais, Leis ns. 7.347/85 e 8.078/90, informam o moderno processo coletivo, criando novos institutos processuais e reformulando outros já existentes, para que o processo acompanhe a evolução das relações sociais. No que diz respeito à tutela do meio ambiente do trabalho, o objeto precípuo da ação civil pública é preventivo. Trata-se de tentar evitar a ocorrência de acidente, com a observância das normas de segurança e medicina do trabalho. Nessas ações, é incontestável a natureza trabalhista, pois há conexão direta com as condições de trabalho, que, por sua vez, integram o próprio contrato de trabalho (art. 114 da Constituição Federal). Por tal motivo, a Justiça Especializada Laboral é o órgão do Poder Judiciário com competência para julgar tais ações; e o Ministério Público do Trabalho, o ramo do Parquet com legitimidade para propô-las. Esse é o entendimento que vem prevalecendo na Justiça do Trabalho, conforme se depreende das seguintes ementas: Ação Civil Pública. Normas de Higiene e Segurança. Competência. A Justiça do Trabalho é competente para conhecer e julgar ação civil pública, proposta pelo Ministério Público do Trabalho, quando o objeto da ação for norma de higiene e segurança não observada pela empresa. Tais normas advêm do contrato de trabalho. Seu não cumprimento fere o caráter sinalagmático da relação contratual. (TRT-15ª Região – Ac. n. 16.814/93 – rel. Juíza Eliana Felippe Toledo – DOESP, de 30.11.96). Justiça do Trabalho. Competência. Tratando-se da defesa de interesses coletivos e difusos no âmbito das relações laborais, a competência para apreciar ação civil pública é da Justiça do Trabalho, nos termos do art. 114, da Constituição Federal/88, que estabelece idoneidade a esse ramo do Judiciário para a apreciação, não somente dos dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, mas também de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho. Recurso de Revista não conhecido quanto ao tema, porque não demonstrada a vulneração ao art. 114 da Carta Política ou a qualquer outro dispositivo legal, mas conhecido e provido quanto aos honorários advocatícios, nos termos do inciso VIII, do Enunciado 310/TST. (TST - 5ª Turma – rel. desig. Min. Thaumaturgo Cortizo – DJU, de 7.8.98, Seç. 1, p. 895). Em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal, intérprete máximo do Texto Constitucional, posicionou-se igualmente, afastando, de forma definitiva, qualquer polêmica sobre a eventual competência das Varas de Acidente de Trabalho, como pode-se notar a seguir: Compete à Justiça do Trabalho o julgamento de ação civil pública que tenha por objeto a preservação do meio ambiente trabalhista e o respeito irrestrito às normas de proteção do trabalho. Com esse entendimento, a Turma julgou procedente recurso extraordinário, para reformar Acórdão do STJ que, ao dirimir conflito negativo de competência estabelecido entre a 4ª Junta de Conciliação e Julgamento de Juiz de Fora e o Juízo de Direito da Fazenda Pública, assentava a competência da Justiça comum para o julgamento da ação civil pública, entendendo ser esta uma verdadeira aç ão de acidente do trabalho. Trata-se, na espécie, de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra vinte e um bancos, em que se busca o cumprimento da legislação trabalhista diante da precariedade das condições e do ambiente do trabalho oferecidas pela rede bancária de Juiz de Fora, quais sejam, a extrapolação da jornada de trabalho e o conseqüente aparecimento de lesões pelo esforço repetitivo — LER. (STF – RE n. 206.220-1-MG – Ac. 2.ª T. – 16.3.1999 – rel. Min. Marco Aurélio – Revista LTr 63-5/628-630). Assim, depois da decisão do Supremo Tribunal Federal, não cabe mais discussão sobre qual órgão do Poder Judiciário é competente para julgar as ações que tratem da proteção do meio ambiente do trabalho: nos termos do artigo 114 da Carta Magna, a competência é da Justiça do Trabalho. Conseqüentemente, como ramo do Ministério Público que tem por função defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis, no âmbito da Justiça Laboral, caberá ao Ministério Público do Trabalho propor as respectivas ações civis públicas (art. 128, inciso III combinado com o art. 129, inciso III, da Constituição Federal). 2.5 As constituições estaduais Voltando aos artigos 23, 24 e 30 da Constituição da República, verifica-se que: a) No art. 23 - competência material comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios - o inciso II determina que todos estes entes federados cuidem da saúde da população e o inciso VI, preconiza que devem proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas. b) No art. 24 - competência legislativa concorrente entre União, Estados e Distrito Federal - o inciso VI permite que legislem sobre a proteção do meio ambiente e controle da poluição, o inciso VIII que disciplinem adequadamente a responsabilidade por dano ao meio ambiente e o inciso XII que estabeleçam normas acerca da proteção e defesa da saúde. c) No art. 30, I e II, resta estabelecida a competência dos Municípios para legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar as legislações federal e estadual. Como ficou dito acima, o bem jurídico tutelado pelas normas ambientais, no meio em que a pessoa humana desenvolve suas atividades produtivas, é a saúde e não o trabalho subordinado. A competência para legislar sobre trabalho, regido por contrato próprio, é da União, consoante dispõe o art. 22, I, da Carta Magna. Referida competênciaengloba apenas os aspectos contratuais, pecuniários e processais relativos ao exercício do trabalho subordinado. Entretanto, quando se trata de proteger a vida, a saúde e a dignidade da pessoa que trabalha, em relação direta com a influência proveniente do meio ambiente em que esta se ativa, a competência tanto material como legislativa diz respeito ao meio ambiente e à saúde, competindo aos demais entes federados, além da União, como prevêem os artigos 23. 24 e 30, da Lei Maior, acima aludidos, zelar pela proteção do meio em que o trabalhador exerce suas atividades, bem como buscar a preservação da saúde humana. Retomando aquilo que inicialmente foi dito sobre o movimento transversal do Direito Ambiental, presente nos mais diversos diplomas legais, perpassando todo o ordenamento jurídico, verifica-se que a Consolidação das Leis do Trabalho, no Capítulo V, do Título II, que cuida da segurança e medicina do trabalho, não contém apenas normas endereçadas àquele que está sob contrato de trabalho, em sentido estrito, mas normas ambientais relacionadas à prática de qualquer trabalho, em defesa da saúde, ao buscar a manutenção de um meio ambiente propício à incolumidade física do obreiro. Releva notar que o art. 154, da CLT, prevê não bastar obediência ao disposto no Capítulo V, mas determina que o empregador ou todo aquele que se utiliza, a qualquer título, da força de trabalho humana cumpra as disposições relativas à matéria concernente à saúde do trabalhador, no meio ambiente laboral, incluídas em códigos de obras ou regulamentos sanitários dos Estados ou Municípios, em que se situem seus estabelecimentos. O Professor Doutor Celso Antônio Pacheco Fiorillo assevera que " ...jamais se deve restringir a proteção ambiental trabalhista a relações de natureza unicamente empregatícia"(...) " O que interessa é a proteção ao meio ambiente onde o trabalho humano é prestado, seja em que condição for....". Valentin Carrion admite expressamente que: "União, Estados e Distrito Federal podem legislar concorrentemente sobre proteção e defesa da saúde(CF, art. 24, XII);" E os Estados vêm legislando sobre matéria de saúde no trabalho, inserindo normas de observância obrigatória, em seus territórios, nas respectivas Constituições. A seguir, são mencionadas disposições específicas sobre a matéria, constantes de algumas Constituições Estaduais, que primaram na elaboração de normas atinentes à saúde do trabalhador, no meio ambiente em que este exerce suas atividades. 1. Constituição do Estado de São Paulo. O artigo 220, § 1°, presente na Seção II, do Capítulo II, do Título VII, ao cuidar da Saúde, estabelece: "As ações e os serviços de preservação da saúde abrangem o meio ambiente natural, os locais públicos e de trabalho." Significativas são as disposições presentes no art. 223 ao determinar ao sistema único de saúde: a) no inciso II, a identificação e controle dos fatores determinantes e condicionantes da saúde individual e coletiva, mediante ações referentes à saúde do trabalhador, de acordo com previsão contida na alínea "c"; b) no inciso VI, a colaboração na proteção do meio ambiente, incluindo o do trabalho, a partir de atuação no processo produtivo para garantir o acesso dos trabalhadores às informações respeitantes a atividades que comportem riscos à saúde e a métodos de controle e adoção de medidas preventivas de acidentes e doenças do trabalho. Em decorrência desse espectro de proteção conferido ao meio ambiente do trabalho, a Constituição Paulista estipula, no art. 229 § 3°, que o Estado atuará para garantir a saúde e a segurança dos empregados no ambiente de trabalho. O §4°, deste mesmo artigo, assegura a cooperação dos sindicatos de trabalhadores nas ações de vigilância sanitária desenvolvidas no local de trabalho e o § 2° garante a interrupção de atividades que coloquem em risco a integridade do trabalhador, o que equivale à garantia de paralisação do trabalho, para a manutenção da salubridade do meio ambiente, como meio de defesa, sem a necessidade do cumprimento das exigências procedimentais, especialmente de prazos, estabelecidas pela Lei 7.783/89, que disciplina a greve, tendo em vista a expressa autorização constitucional de paralisação do trabalho na defesa de bem indispensável à manutenção da vida e de sua sadia qualidade: a saúde. 2. Constituição do Estado do Rio de Janeiro. O art. 290, inciso X, estabelece na alínea "c" o "controle e fiscalização dos ambientes e processos de trabalho nos órgãos e empresas públicas e privadas, incluindo os departamentos médicos", na alínea "d" assegura "direito de recusa ao trabalho em ambientes sem controle adequado de riscos, assegurada a permanência no emprego" e na línea "h" determina a "intervenção, interrompendo as atividades em local de trabalho em que haja risco iminente ou naqueles em que tenham ocorrido graves danos à saúde do trabalhador. " Oferece, por conseguinte, ao trabalhador dois importantes meios de defesa da higidez do meio ambiente do trabalho: a paralisação das atividades em casos de riscos não controlados, sem maiores óbices ou exigências legais, e a intervenção estatal no sentido de interromper atividades em locais de trabalho com acentuado risco à saúde humana. 3. Constituição do Estado do Amazonas. O § 2°, do artigo 229, da Constituição do Amazonas, consagra taxativamente, a proteção ao meio ambiente do trabalho, pois, se no caput do artigo dispõe que: " Todos têm direito ao meio ambiente equilibrado, essencial à sadia qualidade devida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo", no §2° já aludido especifica: " Esse direito estende-se ao ambiente de trabalho, ficando o Poder Público obrigado a garantir essa condição contra qualquer ação nociva à saúde física e mental do trabalhador". 4. Constituição do Estado da Bahia. O art. 218 desta Constituição Estadual dispõe expressamente: " O direito ao ambiente saudável inclui o ambiente de trabalho, ficando o Estado obrigado a garantir e proteger o trabalhador contra toda e qualquer condição nociva à sua saúde física e mental." O art. 239 determina às empresas que submetam, periodicamente, seus empregados expostos a substâncias químicas, tóxicas ou radioativas a exames médicos individuais . 3. ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE VERSUS HIGIDEZ DO MEIO AMBIENTE DE TRABALHO: ESSA “LUTA” QUEM DEVE VENCER? Algumas atividades profissionais são extremamente perniciosas para quem as desenvolve, ou porque lhes é inerente um determinado risco - como ocorre com as atividades nucleares - ou porque, embora originariamente inofensivas, o meio em que se desenvolvem não dispõe de condições razoáveis de salubridade ou segurança - é o caso de um escritório onde as pessoas passam o dia todo sentadas em cadeiras anatômicas, à mercê de mofo, ruídos insuportáveis, escassa iluminação e insuficiente ventilação. Parecerá ao mais desavisado que, ainda assim, ou seja, ainda que o trabalhador permaneça exposto a agentes agressores de sua saúde físico-psíquica, por oito (ou mais) horas diárias, a situação não lhe é de todo prejudicial, já que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) - diploma paternalista, para alguns - garante àqueles que desempenham seu mister num ambiente insalubre ou perigoso um adicional de insalubridade ou de periculosidade, de - pasmem!! - 10% a 40% do salário mínimo da região, no primeiro caso, ou de 30% do salário, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa, na segunda hipótese. O indivíduo vai perder um dedo ou um braço, vai perder a visão, vai ficar surdo, vais sofrer distúrbios mentais e contrair doenças irremediáveis, mas, em"compensação", vai ficar uns trocados mais rico (ou uns trocados menosmiserável). É bem verdade que CLT indica várias formas de atenuar ou eliminar, do meio ambiente de trabalho, males de tal jaez. Demonstra, inclusive, que prefere tais procedimentos ao pagamento dos adicionais. Todavia, forçoso é reconhecer que a lei, ainda assim, permite ao empregador OPTAR - é o que se depreende do art. 189 e ss. - por uma de duas alternativas absurdamente distintas: ou zelar pela saúde do empregado ou, se não o fizer, pagar-lhe uma quantia irrisória como compensação por ele sofrer agressões, às vezes irreversíveis, em sua integridade físico-psíquica. Colocada a questão sob esse prisma, - e não é preciso ser versado nas ciências jurídicas para perceber -, a complacência da lei em permitir que o empregador escolha o adicional de insalubridade ou periculosidade, quando possível eliminá-las, em detrimento da garantia da saúde do trabalhador, parece-nos nada razoável. Muito pelo contrário, um verdadeiro paradoxo. Por conta disso é que o quadro descrito merece ser interpretado com mais rigor, À LUZ DA CARTA CONSTITUCIONAL DE 1988. A Constituição da República, lei das leis, demonstra, em várias oportunidades, profunda preocupação com a qualidade de vida do ser humano (art. 225, caput), com sua saúde físico-psíquica (art. 6º, caput) e com a dignidade de vida (art. 1º, inc. III), determinando a tutela desses bens em primeiro lugar. Ocupa-se também de prover a ampla e necessária tutela do equilíbrio do meio ambiente, considerado este sob quatro facetas: meio ambiente natural (art. 225), meio ambiente artificial (art. 182 e ss.), me io ambiente cultural (art. 215 e 216) e meio ambiente do trabalho (art. 200, inc. VIII). Isso não bastasse, o art. 7º, inc. XXII consagra como direito básico do trabalhador, a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança ”. Visto isso, como se admitir, diante da Lei Maior, que a saúde, direito fundamental de todos, inclusive do trabalhador, possa ser “barganhada” dessa forma ? Como assentir que, em troca de míseros 40, 50 reais ou até menos, um trabalhador se veja privado da salubridade e segurança necessárias ao meio ambiente do trabalho e das condições indispensáveis à sua qualidade de vida ? Como aceitar que o empresário possa incrementar o próprio patrimônio (ou ao menos impedir que ele diminua) à custa da falência física e psíquica de seus empregados ? Sim, porque é certo que o empregador, via de regra, preferirá pagar o ínfimo adicional aos seus subordinados do que investir em medidas mitigadoras ou extirpadoras das insalubres ou perigosas condições do meio, tais como o investimento em avançados equipamentos de segurança, que evitariam trágicos acidentes, alguns dos quais fatais, ou a aquisição de máquinas mais modernas e pouco ruidosas, que impediriam irreversíveis problemas auditivos nos trabalhadores. É óbvio que a Constituição não compactua com essa situação, de modo que a política dos adicionais estabelecida, há algumas décadas, pela CLT, deve ser revisitada e adaptada aos valores jurídico-sociais predominantes no momento histórico atual, no qual a saúde, vista não apenas como a ausência de doença, mas bem estar físico e emocional, contínuo e permanente (OMS), é direito fundamental da pessoa humana, do qual não se pode dispôr. Equivale dizer, nessa linha, que a opção outrora dada ao empregador pela CLT - ou extirpar a insalubridade ou pagar o adicional - cedeu espaço para a obrigatoriedade de eliminar os agentes predadores da saúde humana, já que, acentua com maestria Antônio Lopes Monteiro, Promotor de Justiça de Acidentes do Trabalho do Ministério Público de São Paulo,"não há adicional que pague um ambiente sadio "("Insalubridade: Um Direito ou um Mal Necessário ?", in Tribuna do Direito, abril de 1996, p. 8) Não queremos defender, todavia, a absoluta inconstitucionalidade dos adicionais supra mencionados. Não. Os adicionais de insalubridade, periculosidade e penosidade (criado pela CF/88), inclusive, encontram respaldo na própria Constituição, em seu art. 7º, inc. XXIII. Mas não é por conta disso que persiste para o empregador a combatida “ escolha ” entre pagá-los ou extirpar suas causas do ambiente de trabalho. Entendemos, isso sim, que o adicional poderá existir apenas quando tais condições NÃO FOREM PASSÍVEIS DE ELIMINAÇÃO, dada a precária tecnologia da época ou motivos que o valham, e se, aliado a isso, a atividade, nada obstante a inafastável insalubridade, periculosidade ou penosidade, FOR REALMENTE IMPERIOSA PARA O ATENDIMENTO DAS NECESSIDADES DA COLETIVIDADE. A esse respeito, a lição de Daniela Câmara Ferreira e Guilherme Purvin de Figueiredo é providencial e, por essa razão, não podemos deixar de comenta-la e transcrever alguns de seus trechos. Afirmam que, consoante o comando constitucional, o Estado não tolerará atividade que ponha em, risco a vida, a integridade física e a segurança dos indivíduos. Mas, de outro lado, assumem que a exposição ao risco é indissociável a certas profissões em nosso aual estágio de desenvolvimento tecnológico, situação essa que não deve ser desconsiderada pelo legislador, por óbvio... E continuam: “Os eletricitários estão diuturnamente expostos ao perigo para que todos tenhamos o conforto do fornecimento de energia, necessária, por exemplo, para o funcionamento normal de hospitais e ambulatórios (...) Os médicos, enfermeiros e analistas de laboratórios clínicos arriscam-se ao contágio das mais variadas doenças, sempre em prol da saúde da população. Há uma lista infindável de profissões insalubres e perigosas. O legislador não pode, simplesmente, proibir tais atividades, ignorando o fato de que certos produtos e serviços são imprescindíveis para a implementação do disposto no próprio art. 225, caput. Em contrapartida, ele não pode ser conivente com a livre agressão à saúde do trabalhador. (...) A simples percepção do adicional nada resolve. Nenhum adicional reparará a morte, perda ou redução da capacidade de trabalho. Sabe-se que os trabalhos perigosos e insalubres são, na maioria das vezes, de baixa remuneração, de forma que os valores são calculados sobre salários muito pequenos, resultando em acréscimos ínfimos nos salários dos trabalhadores expostos ao risco. Poder-se-ia dizer que vinte por cento de acréscimo sobre um salário mínimo é dinheiro suficiente para indenizar um eventual acidente ? Este valor recompensará a ausência de um meio ambiente de trabalho saudável e seguro ? Não se pode dizer também que o pagamento do adicional é um estímulo para a introdução de tecnologias que contribuam para a diminuição do risco. Apesar da legislação infraconstitucional tentar fazê-lo ao desobrigar o empregador do pagamento do adicional quando da extinção do risco, este não é realmente um fator decisivo. Muitos empresários preferem continuar pagando os costumeiros adicionais a investir em equipamentos mais seguros (porém mais caros) e reformular seus velhos métodos de produção. A percepção do adicional não extingue o risco. O empregador deve, de todas as formas possíveis, buscar minimizar os riscos existentes de fato em sua atividade econômica, fornecendo o material de proteção necessário, investindo segurança e treinamento. Ele deve, como forma de concretizar o direito do empregado à integridade física, provê-lo de toda a técnica existente e capaz de afastar o risco, posto que esta redução é uma previsão constitucional. O pagamento do acréscimo não desobriga o empregador da busca de meios eficazes para a diminuição do risco. (...) O direito à percepção do adicional não deve ser entendido isoladamente, como uma barganha ou indenização. Ele deve, em suma, ser interpretado conjuntamente com o direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho, como uma forma de alcançar estaredução, garantindo assim a efetividade do direito à vida e integridade física ” (Direito Constitucional ao Meio Ambiente de Trabalho Seguro e Saudável. In: Temas de Direito Ambiental e Urbanístico. São Paulo: Max Limonad, 1998, p.109-15) O risco a que alguns empregadores submetem a saúde e segurança de seus empregados só se justifica, portanto, se, diante da comprovada impossibilidade de elidi-lo, houver um interesse (verdadeiramente) maior que o reclame. E sendo assim, ou seja, sendo inevitável que algumas pessoas enfrentem a insalubridade, a periculosidade e a penosidade do meio ambiente do trabalho, para o bem da coletividade, que ao menos sejam “gratificados” pela coragem desse proceder (que, admitamos, está mais para falta de opção do que para coragem propriamente dita) e pela “ disposição ” de um de seus bens mais caros, a sua integridade físico-psíquica. 4. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS CAUSADOS AO TRABALHADOR A entrada em vigor do Novo Código Civil (Lei n. 10.406/2002) trouxe consigo promessas e desafios. No campo da responsabilidade civil, a redação do artigo 927, par. único, do NCC entreabriu uma porta dilargada para que o intérprete identificasse, no cruzamento dos dados da realidade com o arcabouço legislativo, ensejos inéditos para a aplicação da teoria do risco, onde se plasma a responsabilidade civil objetiva. No universo juslaboral, esse assunto ganhou interesse no campo da infortunística do trabalho, notadamente após a edição da Súmula n. 736 do STF e, mais recentemente, com a alteração do artigo 114 da CRFB pela EC n. 45/2004, à qual se seguiu a inteligência do Excelso Pretório no Conflito de Competência n. 7.204-1/MG, rel. Min. Ayres Britto (fixação da competência da Justiça do Trabalho para o processo e o julgamento das ações de responsabilidade civil movidas pelo empregado em face do empregador). Em se tratando de meio ambiente do trabalho, a Constituição Federal de 1988 apresenta ao menos duas antinomias aparentes. Uma delas deflui do cotejo entre as normas constitucionais dos incisos XXII e XXIII do artigo 7º da Constituição Federal. O primeiro estabelece, como direito dos trabalhadores urbanos e rurais, a redução dos riscos inerentes ao trabalho; o segundo, ao revés, contrapõe ao risco o direito ao adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas (= monetização do risco). Outra antinomia aparente contrapõe o artigo 7º, XXVIII, da CRFB ? que parece vincular o direito de indenização do acidentado frente ao empregador à culpa ou dolo deste último (na esteira da Súmula n. 229 do STF, parcialmente superada) ? e o artigo 225, §3º, da CRFB ? que, sem aludir ao elemento subjetivo da conduta, destaca a obrigação do responsável à reparação dos danos de natureza ambiental a que der causa (o que deve incluir, por força do artigo 200, VIII, in fine, os danos relacionados ao meio ambiente do trabalho, derivados da inobservância das normas de segurança, higiene e saúde no trabalho). E, com efeito, o artigo 14, §1o, da Lei n. 6.938/81 dispõe, em matéria ambiental, que "é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade". São, portanto, normas contraditórias? Aparentemente, sim; concretamente, não. Quanto à primeira antinomia, resolve-se-a com a idéia de que a exposição ao risco é intrínseca a certas profissões no atual estágio de desenvolvimento tecnológico ("Risikogesellschaft"). Haverá, sempre, trabalho penoso, insalubre ou perigoso, que poderá ser empreendido, à luz dos princípios insculpidos no artigo 170 da CRFB (livre iniciativa e livre concorrência), ou mesmo que deverá ser empreendido, à mercê do interesse público primário (e.g., as atividades de geração e transmissão de energia elétrica, potencialmente perigosas ? v ide Lei n. 7.369/85). Assim, se a redução máxima do agente prejudicial, i.e., a sua eliminação, é o primeiro propósito da lei (propiciando, inclusive, a supressão do adicional ? Súmula n. 80 do C.TST), a Constituição transige com a realidade, estipulando o pagamento de adicionais para as atividades insalubres, perigosas e penosas, enquanto o atual estado da técnica não permitir, em determinadas atividades econômicas, a eliminação ou sequer a redução do elemento perverso a níveis toleráveis para a saúde humana. Nem por isso se haverá de proibir aquela dada atividade, seja por sua necessidade social, seja em respeito ao primado da livre iniciativa. Para esses casos, estão previstos os adicionais de remuneração. Por outro lado, se o estado atual da técnica permitir a eliminação dos riscos sem comprometimento cabal da atividade econômica, o trabalho perverso deve ser sumariamente eliminado; e, para tanto, poderão os trabalhadores e/ou o sindicato recorrer às instâncias do Poder Judiciário. Tal interpretação, sobre coordenar habilmente as duas normas constitucionais (e, por conseqüência, os dois princípios contrapostos ? direito ao meio ambiente do trabalho são e equilibrado e livre iniciativa econômica), realiza, no plano hermenêutico, a aplicação dos princípios da máxima efetividade e da força normativa da Constituição, que devem inspirar todos os esforços exegéticos no plano dos direitos humanos fundamentais. Quanto à segunda antinomia, há que distinguir entre as causas do dano experimentado pelo trabalhador no ambiente de trabalho. Haverá causas diretamente ligadas ao desequilíbrio do meio ambiente de trabalho, atraindo a norma do artigo 225, §3º, da CRFB e, com ela, a regra do art igo 14, §1º, da Lei n. 6.938/81. E outras haverá que não terão natureza sistêmica, devendo-se antes a circunstâncias imponderáveis como o ato negligente, as paixões ou o pendor criminoso. Com efeito, o conceito lato de poluição introduzido pelo artigo 3o, III, da Lei n. 6.938/81 permite reconhecer a figura da poluição labor-ambiental, que não se atém aos quadros de afetação da biota ou das condições estéticas e sanitárias do meio ambiente (artigo 3o, III, "c" e "d") ? como se dá com os agentes químicos, físicos e biológicos em níveis de intolerância ? , alcançando ainda os contextos de aguda periculosidade ou penosidade (artigo 3º, III, "b": "criem condições adversas às atividades sociais e econômicas"). É princípio informador do Direito Ambiental que "os custos sociais externos que acompanham a produção industrial (como o custo resultante da poluição) devem ser internalizados, isto é, levados à conta dos agentes econômicos em seus custos de produção" princípio do poluidor-pagador. Também os custos difusos do sistema de seguridade social com a legião brasileira de mutilados e desvalidos são, nesse sentido, externalidades a serem internalizadas. E, nesse encalço, a identificação do poluidor no meio ambiente do trabalho não oferece qualquer dificuldade: será, em geral, o próprio empregador, que engendra as condições deletérias da atividade econômica ou se omite no dever de arrostá-las; mas também poderá ser o tomador de serviços, quando a organização dos meios de produção e/ou do ambiente de trabalho deflagrar desequilíbrio sistêmico em prejuízo da saúde, segurança e bem-estar dos trabalhadores. Conseqüentemente, a aplicação do princípio do poluidor-pagador às hipóteses de danos pessoais (físicos ou psíquicos) derivados do desequilíbrio labor- ambiental sistêmico permite entrever que a responsabilidade pela internalização dos custos sociais externos e, "a fortiori", a obrigação de indenizar ("Schuld") com responsabilidade objetiva ("Haftung"), favorecem não apenas o empregado (= trabalhador subordinado), mas todo trabalhador inserido na organização empresarial, na acepção lata do artigo 114, I, da CRFB. Essa compreensão atende melhor ao princípio insculpido no artigo1º, III, da CRFB, uma vez que, do ponto de vista dos direitos humanos de primeira e terceira geração, não se justifica a distinção entre empregados, avulsos, autônomos e eventuais. E, na mesma ensancha, inviabiliza a tese da natureza contratual da responsabilidade civil do empregador pelos acidentes de trabalho (uma vez que, se tal responsabilidade dimanasse de cláusula implícita de integridade inerente aos contratos de emprego, não poderia ser imputada aos tomadores de serviços em geral). Conseqüentemente, quando o artigo 7o, XXVIII, da CRFB estabelece, como direito dos trabalhadores urbanos e rurais, o "seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa", não se refere às hipóteses de acidentes do trabalho (artigos 19 e 21 da Lei n. 8.213/91), moléstias profissionais (artigo 20, I, da Lei n. 8.213/91) ou doenças do trabalho (artigo 20, II, da Lei n. 8.213/91) desencadeadas por distúrbios sistêmicos do meio ambiente laboral. Se o acidente ou a moléstia é concreção dos riscos inerentes à atividade (vide artigo 22, II, da Lei n. 8.212/91), ou se não guarda relação causal adequada com tais riscos, a indenização, calcada no instituto da culpa aquiliana "lato sensu" (artigos 186 e 927, caput, do NCC), dependerá de prova do elemento subjetivo (dolo ou culpa), usualmente ao encargo do empregador ou tomador (inversão do ônus da prova). Assim é, p. ex., se o descuido de um supervisor culminar com a explosão de uma caldeira (riscos inerentes à atividade de caldeiras, fornos e recipientes sob pressão); ou, ainda, se o empregador dolosamente sabota equipamentos de proteção individual para provocar o acidente em detrimento do empregado desafeto (atividade criminosa, desvinculada dos riscos da atividade). Por outro lado, se o acidente ou a moléstia configuram dano labor-ambiental, desencadeado pelo incremento dos riscos inerentes ou pela criação de riscos atípicos em virtude da organização dos meios de produção e/ou dos elementos materiais do espaço laboral, a norma de regência é a do artigo 225, §3º, da CRFB e, por ela, a regra do artigo 14, §1o, da Lei n. 6.938/81. Aliás, são os riscos agravados ou atípicos que justificam, da mesma forma, a regra do artigo 927, par. único, do NCC. Usualmente, a evidência do desequilíbrio labor-ambiental está na sucessão de acidentes ou moléstias que acometem trabalhadores de uma mesma seção ou linha de produção (denotando a inadequação física, química, biológica, ergonômica ou psicológica do meio ambiente de trabalho). Mas, malgrado seja circunstancialment e usual, o caráter "coletivo" não está na essência da responsabilidade civil objetiva labor-ambiental. 5. ACIDENTES DO TRABALHO. RESPONSABILIDADES RELATIVAS AO MEIO AMBIENTE LABORAL Os acidentes do trabalho rememoram das primeiras atividades do homem voltadas à sua sobrevivência: a caça e a coleta. Os primitivos ancestrais do homem passavam por toda forma de penúria para conseguirem seu sustento. As caçadas eram atividades perigosas e extremamente arriscadas, com risco tanto de apanhar e matar uma presa quanto de serem, eles próprios, devorados. As coletas também exigiam, não raro, habilidades para escalar em árvores de grande porte, sem qualquer proteção... Desde a Idade da Pedra, há mais de 2,5 milhões de anos os seres humanos já fabricavam e utilizavam instrumentos para facilitar a execução de seus trabalhos. Eram manuseados instrumentos cortantes ou perfuro -cortantes, o que confirma as habilidades intelectuais dos seres primitivos. Mas tais instrumentos, por certo, eram causas de diversos acidentes. Na medida em que se deu a evolução dos processos de produção aumentaram os riscos de acidentes do trabalho. Todavia, foi a partir da Revolução Industrial – século XVIII, que se verificou a intensificação da degradação do meio ambiente natural e humano (artificial, cultural e do trabalho). A exposição dos seres humanos aos riscos do trabalho aumentou desde então. E atualmente, em plena época da globalização, embora algumas empresas tenham implantado e implementado com sucesso as normas de segurança e medicina do trabalho, o índice de acidentes ainda é altíssimo e aviltante. O conceito legal de acidente do trabalho está definido no artigo 19 da Lei nº 8.213 de 1991 nos seguintes termos: Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do artigo 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. Depreende-se pois, que para a Lei Previdenciária, o acidente do trabalho somente ocorre com trabalhadores, os quais, no exercício de suas atividades, prestam serviço à empresa: o segurado empregado ou empregado avulso, bem como com o segurado especial, cujos efeitos provocam lesão corporal ou perturbação funcional suficientes para causar a morte, a perda ou redução, temporária ou permanente, da capacidade para o trabalho. Ficam excluídos os empregados domésticos e os contribuintes individuais e facultativos, os quais não receberão o benefício de auxílio -acidente. Contudo, consoante as lições ministradas pelo Professor Sebastião Alves da Silva Filho, há que se discordar do conceito que trata acidente como fato inesperado, imprevisível. Isto porque... ...para os conceitos modernos de engenharia de segurança do trabalho, todo acidente de trabalho pode ter suas causas previamente levantadas. É possível determinar as probabilidades de ocorrências de falhas que podem gerar os acidentes. Mesmo porque do ponto de vista preventivo, é preferível considerar o acidente de trabalho como uma cadeia de eventos que freqüentemente tem como ponto de partida um incidente, uma perturbação do sistema no qual estão inseridos o trabalhador e sua tarefa, e que, após uma série mais ou menos longa de ocorrências, termine por determinar ou não uma lesão ao indivíduo. Conclui-se, por conseguinte, o conceito de acidente do trabalho, pode ser visto sob dois prismas: a) o da Previdência Social, que ao conceituar acidente de trabalho, inclui a necessidade de lesão, com fito de dar ao cidadão acidentado o tratamento físico, emocional e material, bem como sua reinserção no mercado de trabalho; b) o do Ministério do Trabalho e Emprego, no sentido de que a ocorrência de acidente independe da existência de vítima, visto que tal órgão tem por escopo a prevenção e a fiscalização (segundo nos informou o Professor e Subdelegado da Subdelegacia do Trabalho em Uberlândia – MG, Sebastião Alves da Silva Filho) Além do acidente laboral propriamente dito, também as doenças ocupacionais são consideradas como acidente do trabalho, nos termos do artigo 20 da lei previdenciária de nº 8.213/91: Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas: I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social; II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I. O parágrafo 1º desse artigo, de plano, exclui das referidas listagens as seguintes doenças: a) doença degenerativa; b) doença inerente a grupo etário; c) doença que não produza incapacidade laborativa; d) a doençaendêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva. O parágrafo 2º do mesmo artigo determina que mesmo eventuais doenças não relacionadas nas listas elaboradas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, mas que resultem das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, deverão ser consideradas como acidente do trabalho pela Previdência Social. A exceção abrange também as doenças endêmicas que, comprovadamente, resultem da exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho (§ 1º, "d", parte final). Com fito de ampliar o rol dos acidentes de trabalho e amparar o trabalhador desvalido, o legislador enumera outras situações diversas das condições específicas determinadas pela natureza do trabalho. Equiparam, pois, ao acidente do trabalho, para efeitos da citada lei previdenciária em seu artigo 21 e seus incisos: I - o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação; II - o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em conseqüência de: a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho; b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho; c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho; d) ato de pessoa privada do uso da razão; e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior; III - a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade; IV - o acidente sofrido pelo segurado, ainda que fora do local e horário de trabalho: a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa; b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito; c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado; d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado. Esta lei previdenciária esclareceu, ainda, nos parágrafos 1º e 2º desse artigo que: § 1º. Nos períodos destinados à refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho. § 2º. Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às conseqüências do anterior. Em síntese, a legislação brasileira considera acidente do trabalho os eventos ocorridos pelo exercício do trabalho, que causem lesão corporal ou perturbação funcional, morte e perda ou redução da capacidade para o trabalho, bem como as doenças profissionais e outras formas de acidentes vinculados ao trabalho: 1) aqueles ocorridos no local do trabalho decorrentes de atos intencionais ou não de terceiros ou de companheiros do trabalho; 2) os acidentes oriundos de casos fortuitos ou de força maior; 3) as doenças provenientes de contaminação acidental no exercício da atividade; 4) os acidentes ocorridos no percurso residência/local de trabalho/residência e nos horários das refeições. 5.1 Diferenças entre acidentes de trabalho e doenças ocupacionais Acidente do trabalho propriamente dito, segundo a legislação previdenciária, é um evento casual danoso, capaz de provocar lesão corporal ou perturbação funcional, perda ou redução da capacidade para o trabalho ou morte da vítima. Geralmente é previsível e evitável, oriundo de alguma ação inapta ou descuidada por parte do indivíduo (vítima ou agressor), seja por descumprir as normas de segurança e higiene do trabalho, ou seja, por não estar integrado em uma planificação preventiva de acidentes oferecida pela empresa. E raramente decorre de algum fato inevitável como de caso fortuito, de força maior ou fato de terceiro. Classifica-se em acidente-tipo – aquele que ocorre a serviço da empresa (dentro ou fora da sede), e acidente de trajeto, quando a ocorrência se dá durante o deslocamento do trabalhador para o local de trabalho ou vice-versa ou nos horários das refeições. As doenças ocupacionais são doenças que ocorrem pela exposição cotidiana do trabalhador a agentes nocivos de qualquer natureza, presentes no ambiente de trabalho. São espécies dessas doenças: as doenças do trabalho e as doenças profissionais. As primeiras estão associadas a fatores relacionados ao trabalho, porém, não estão ligadas ao exercício de determinada profissão. À guisa de exemplo cita-se a aquisição de DORT (exposição continuada ou não de movimentos repetitivos). As doenças associadas à profissão são aquelas cuja atividade, por sua natureza, atua na incapacitação para o trabalho, doença ou morte, como é o caso dos mineradores em lavra subterrânea, propensos à silicose – doença profissional. A importância dessa classificação é de interesse do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), que reconhece automaticamente a existência da relação de causa e efeito quando o cidadão que busca sua assistência é portador de doença profissional. Contudo, para os casos de doenças do trabalho o nexo causal deverá ser comprovado por meio de laudo técnico competente emitido pelo engenheiro de segurança ou médico do trabalho. 5.2 Causas de acidentes de trabalho As causas de acidentes de trabalho observadas sob a ótica restrita ou imediata são apontadas como atos ou condições inseguros, como por exemplo: a) contato da pessoa com um objeto, uma substância ou com outra pessoa; b) exposição do indivíduo aos riscos que envolvam objetos, substâncias químicas ou outras pessoas ou condições; etc. Em acepção ampla e mediata verifica-se que as causas acidentárias, quase sempre estão intrinsecamente ligadas ao incrível crescimento tecnológico experimentado pela humanidade nos últimos tempos e ao excessivo aumento da produção. É lamentável, mas em pleno início do século XXI, os empreendimentos econômicos, ainda, são voltados para os lucros imediatos em detrimento dos investimentos em programas e equipamentos adequados à proteção coletiva, que são meios eficazes de combate a acidentes do trabalho. Prefere-se equipamentos paliativos de proteção individual, aos equipamentos de proteção grupal ou outras a tomar medidas preventivas coletiva, por julgá-los mais onerosos, o que caracteriza o desinteresse pelo meio ambiente laboral salutar. Identificam-se, pois, como causas indiretas do aumento dos casos de doenças de origem psíquica e física e dos acidentes do trabalho, dentre outras: a complexidade das máquinas, a automação e a informatização, a crescente exposição aos ruídos, calor e substâncias tóxicas (condições insalubres, perigosas e penosas), ausência de efetividade das normas protetoras do ambiente laboral, a preferência apenas pela redução à eliminação dos riscos, deficiência no sistema de inspeção do trabalho, excesso de horas extras (que é uma das principais causas mediatas de acidentes laborais e do aumento do índice do desemprego), sistemainadequado de compensação de quadro de horários e dos turnos de revezamento, ausência de conscientização, a desmotivação, as exigências rigorosas nos processos de seleção combinada com deficiência de formação profissional, as dificuldades para atualizar os conhecimentos e acompanhar o desenvolvimento tecnológico para assegurar o direito ao trabalho digno, o temor do desemprego, a precarização dos direitos dos trabalhadores, o trabalho informal, a fadiga física e a tensão mental do trabalhador. O Professor Sebastião Alves da Silva Filho ensina que: Com a chegada ao país das tecnologias de engenharia de perdas e árvore de causas para os acidentes houve uma mudança no antigo enfoque dado às análises de acidentes graves e ou fatais. Hoje tais análises se prendem muito mais a refazer o conjunto de causas que geraram o acidente. Assim sendo, perdeu totalmente a importância avaliar unicamente e de forma simplória se houve ato [do trabalhador] ou condição [ambientais] insegura. Isso justifica também pelo fato de que dificilmente se encontraria um acidente onde atos ou condições inseguras se apresentariam isoladamente, ou seja, sem que a outra situação também estivesse presente. Segundo o raciocínio supra, conclui-se que está nas causas mediatas ou indiretas, o alicerce para o direcionamento da prevenção dos acidentes laborais, uma vez que são as causas básicas do índice estarrecedor de acidentes do trabalho, demonstrado pela estatística mundial. Desse modo, para prevenção e redução desse número, é imprescindível fazer um levantamento amplo e específico sobre a ocorrência de acidentes, como os fatos agressores mediatos e imediatos causadores do evento, o local, as condições de trabalho, etc. Assim, além de possibilitar a implementação de programas de prevenção de acidentes de trabalho pelos atores do ambiente laboral, aponta os locais em que a fiscalização deve ser realizada com mais rigor. Pode-se perceber, pelos estudos e pesquisas feitos com intuito de conhecer e dissertar sobre o tema que, as estatísticas oficiais, deixam a desejar, pois não revelam a realidade de acidentes laborais. No órgão previdenciário os acidentes de trabalho são registrados para fins de levantamentos estatísticos apenas em bloco de números de benefícios concedidos: auxílio-doença ou auxílio-acidente, pensão por morte, sem determinar a origem do sinistro (as causas específicas, o local do trabalho, etc.). Se não bastasse, percebe-se, com base na experiência forense, que há relutância, por parte do INSS, em reconhecer as doenças profissionais e do trabalho, diagnosticando-as, muitas vezes, como doenças normais, negando, conseqüentemente, o benefício respectivo. Não se pode esquecer que os processos acidentários trabalhistas são iniciados pelo órgão previdenciário somente após a comunicação do fato sinistro a partir da CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), documento relativo apenas aos empregados registrados em carteira da empresa, cujo número é reduzido em relação aos trabalhadores autônomos e informais. Outra realidade lastimável ocorre nos hospitais ou clínicas médicas, onde os prontuários médicos deveriam registrar informações mais abrangentes sobre os trabalhadores/pacientes que ali buscam consulta ou internamento (como a profissão, a origem (local) e a causa mediata e imediata dos acidentes, doenças e morte destes, ou seja, dados mais específicos de um eventual acidente/doença do trabalho), mas não o fazem, geralmente, limitam-se apenas em constar os sintomas físicos ou mórbidos apresentados pelo paciente. Diferentes não são os atestados médicos de óbito, que também, na sua maioria, somente constam as causas letais físic as, dos quais originam os registros de óbito – instrumento formal, exigido pela Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73, arts. 77 e ss.). Como se vê, os trabalhadores que não têm vínculo com a Previdência Social estão alijados das estatístic as oficiais, especialmente das estatísticas de tal órgão. Portanto, embora possa verificar uma redução significativa do número de sinistros trabalhistas sofridos pela massa de segurados da Previdência Social, segundo o quadro de estatísticas de acidente do trabalho no Brasil – 1970/2000 (em anexo), não se pode dizer que o referido quadro retrata a realidade brasileira, porquanto, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), entre 1991 e 1996, o percentual de trabalhadores sem carteira assinada passou de 40% para 47% no conjunto de seis regiões metropolitanas pesquisadas. Depois de se manter estável entre 1996 e 1997, a informalidade no mercado de trabalho brasileiro voltou a crescer no final da década de 90, como reflexo da crise da economia brasileira, até chegar a 50% no final de 1999 e ultrapassar os 60% em 2003. 5.3 Conseqüências dos acidentes do trabalho Os efeitos dos acidentes do trabalho são inúmeros e extremamente negativos e onerosos. Curialmente o trabalhador acidentado e sua família sofrem os maiores prejuízos (mutilação, incapacidade para o trabalho, morte, dor pelos danos físicos, psíquicos e morais, marginalização social, pobreza, etc.). Além deles, outros prejuízos sócio -econômicos são detectáveis. Os custos sociais da Previdência Social são altíssimos, considerando os gastos com benefícios: aposentadorias antecipadas (especiais e por invalidez), auxílios-doença, pensão por morte, auxílio-acidente, reabilitação e readaptação do segurado-acidentado, gastos com saúde. As empresas também perdem grandes somas e credibilidade social com os acidentes. Por um lado, precisam arcar com despesas imediatas com o acidentado (atendimento médico- ambulatorial, transporte, medicamentos, pagamento às vítimas de diárias correspondentes ao valor proporcional de seu salário-base até o 15º de afastamento, sem isenção dos encargos sociais relativos. Por outro lado, há queda na produção (pela perda e eficiência do processo, contratação de substituto ou necessidade de horas extras), inutilização de máquinas, insumos, produtos, necessidade de reposição de material inutilizado. etc. Além destes prejuízos, a empresa, a longo prazo, poderá ser obrigada a fazer a reinserção do acidentado pelo período de estabilidade adquirido, etc.), arcar com despesas advocatícias, judiciais, indenizatórias, multas administrativas, ter perdas negociais (multas contratuais por atraso de produção, rescisão de contratos), perda de certificados de gestão de qualidade, de gestão ambiental, etc. Ademais, vale lembrar que a fadiga física e mental dos demais trabalhadores, gerada pela ocorrência do sinistro, implica em absenteísmo, rotatividade de mão-de- obra, novos acidentes entre outras perdas. Dado o altíssimo índice mundial de acidentes do trabalho, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), com fito de reduzi-lo, lançou em 1976, o programa para o melhoramento das condições e do meio ambiente do trabalho (PIACT), mediante a implantação e implementação de medidas de segurança e higiene laboral, cujo início se deu na América Latina. Após o lançamento desse programa, especialmente no Brasil, notou-se a efetiva queda dos índices dos infortúnios do trabalho entre os operários segurados pela Previdência Social, segundo estatísticas oficiais. Observou-se, também que além de evitar os conhecidos prejuízos sociais e humanos, as empresas que implementaram esse programa tiveram significativa diminuição dos prejuízos econômicos (continuidade e elevação da qualidade da produção, eliminação de desperdícios, etc.). Entretanto, verificou-se a partir dos noticiários da imprensa falada e escrita e da doutrinas estudadas, que embora haja diminuído a ocorrência dos infortúnioslaborais no Brasil, o país ainda é palco de um dos maiores índices de acidentes do trabalho do mundo. As informações obtidas no sítio da Campanha Nacional de Saúde e Segurança no Trabalho – 2002, realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e coordenado pela Associação Brasileira para Prevenção de Acidentes (ABPA) – www.sst- cni-sesi.org.br – confirmam as benesses da prevenção de acidentes do trabalho. Ficou demonstrado que as empresas que implantaram e implementaram as medidas prevencionistas de acidentes laborais conseguiram a redução destes e dos prejuízos econômicos. É oportuno evidenciar que, ao participar da solenidade de lançamento da Campanha Nacional da Indústria para a Prevenção de Acidentes no Trabalho 2002 (em 22 de agosto de 2002), o Presidente da Associação Brasileira para Prevenção de Acidentes (ABPA), Mauro Daffre – Coordenador da Campanha – declarou que um dos pontos básicos do novo conceito sobre a segurança no trabalho é a preservação da vida do trabalhador. E disse ainda que: Isso gera lucro para o empresário e vantagem para a sociedade. É importantíssimo investir na saúde e segurança dos trabalhadores, o que é um fator de competitividade para as exportações que geram os empregos de que o Brasil precisa. Na mesma ocasião, o então Presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Moreira Ferreira falou sobre a relevância da prevenção acidentária para a economia das empresas ao afirmar que: Investir em prevenção, além da questão humana da perda de um ente querido, representa uma vantagem extraordinária e uma grande economia de recursos que são despendidos no pagamento de acidentes por invalidez e despesas hospitalares e, também, do tempo que o trabalhador fica fora de seu posto de trabalho. Isso obriga as empresas a contratarem mão-de-obra supletiva e todos esses custos, somados, aumentam o Custo Brasil, que precisa ser reduzido porque senão as empresas perdem a competitividade e, perdendo a competitividade, o número de empregos acaba reduzido. No dia anterior (21/08/02), em entrevista concedida ao Caldonews Jornal, Moreira Ferreira lembrou que após várias décadas de atuação prevencionista e das campanhas nacionais de prevenção desenvolvidas pelo sistema CNI/SESI/SENAI/IEL, iniciadas em 1997, houve uma significante a redução dos números catastróficos acidentários da década de 70, se comparados proporcionalmente em relação à massa trabalhadora daquela época e a atual. Mas, acrescentou que "ainda há muito para ser feito: apenas 3% das empresas no País contam com um serviço adequado em segurança do trabalho" Das assertivas supra e da leitura das diversas obras pesquisadas percebe-se que muitas empresas desconhecem ou ainda não estão convencidas da importância dos investimentos em prevenção acidentária como meio de evitar desperdícios e de torná-las mais competitivas. No Brasil ainda há o ranço da "monetização do risco", isto é, há uma opção pelo aumento da remuneração para compensar o maior desgaste do trabalhador, mediante pagamento de adicionais de periculosidade, de insalubridade, de horas extraordinárias, aposentadorias especiais, etc. Essa é uma estratégia traiçoeira que inibe a luta dos trabalhadores e sindicatos por melhores condições de trabalho. Estimula-os a acreditarem que é melhor obter um ganho imediato (aumento dos minguados salários e antecipação da aposentadoria) do que correr o risco de perder o emprego. Ficam inertes. Deixam de reivindicar a implantação e implementação das normas de higiene e segurança do trabalho. Parece que preferem expor a saúde, sem pensarem, de fato, nas nefastas e irreversíveis conseqüências das mutilações e doenças ocupacionais para o resto de suas vidas, a trabalharem por longos anos e com salário menor, mas com vigor. Por fim, muitas empresas desinformadas ou negligentes, quando adotam algumas medidas preventivas dos acidentes laborais, escolhem as paliativas, como o uso de equipamentos de proteção individual e/ou pagamento dos referidos adicionais e deixam de implantar medidas de proteção coletiva, mais eficazes na eliminação ou redução dos riscos do ambiente do trabalho, por julgarem as últimas mais onerosas ou por simples desinteresse. Agem em desacordo com os estudos das organizações governamentais (FUNDACENTRO - Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho) ou privadas (CNI - Confederação Nacional da Indústria, ABPA - Associação Brasileira para Prevenção de Acidentes, etc.) e violam as exigências da legislação trabalhista que impõe ao empreendedor a obrigação de, primeiramente, eliminar os riscos do trabalho ou, se impossível, no mínimo, procurar reduzi-los (Convenções da OIT nº 148, arts. 9 e 10 e nº 155, art. 4.2; CLT, art. 166 c/c NR-4, item 4.12, "a"). Uma das funções primaciais da lei é anular o desequilíbrio das partes, vindo em socorro dos mais fracos; assim se procede no próprio terreno contratual onde há a livre manifestação da vontade. Com mais força de razão, quando as circunstâncias da vida, múltiplas, imprevisíveis, inexoráveis, colocam os homens mais a mercê uns dos outros, justifica- se, sobremaneira, o amparo da lei na proteção da vítima. 6. RESPONSABILIDADES INERENTES AO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E SEUS FUNDAMENTOS LEGAIS No Brasil, foi criado um conjunto de normas de segurança e medicina do trabalho, o qual foi positivado na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho – Decreto-lei nº 5.452/1943), Título II, Capítulo V, artigos 154 e seguintes, com alterações feitas pela Lei nº 6.514/77 e complementado pelas Normas Regulamentadoras (NRs) aprovadas pelas Portarias de nº 3.214/78 (relativas à regras gerais e ao trabalhador urbano) e nº 3.067/88 (inerentes ao trabalhador rural), ambos os regramentos expedidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego nos termos da previsão legal contida nos artigos 190 e 193 da CLT. Todas as normas supra visam a preservação da qualidade ambiental do local de trabalho. O sistema acima é formado por subsistemas que, providos de recursos e regras mínimas, atuam entre si e com outras áreas jurídicas e visam, através do planejamento e desenvolvimento de ações, prevenir acidentes do trabalho, doenças ocupacionais e incidentes críticos em todas as atividades de uma empresa, de modo a satisfazer às necessidades da própria empresa no aspecto da integridade física e da qualidade de vida de seus trabalhadores e clientes. As normas de segurança e medicina do trabalho dividem-se em dois aspectos: por um lado, visam a prevenção contra acidentes do trabalho, doenças ocupacionais e outras formas de acidentes equiparados, isto é têm por finalidade tornar seguro meio ambiente laboral. E de outro lado, objetivam a saúde física e psíquica e a higiene do trabalhador enquanto indivíduo e parte da coletividade. Entretanto, pelo fato de convergirem para o mesmo fim, segurança e saúde do trabalho, em várias situações se entrelaçam e são interdependentes. Sob o ponto de vista da segurança no trabalho, as normas celetistas visam interação do trabalhador e o seu meio ambiente artificial de trabalho, ao considerar as prováveis fontes de riscos a serem extintas ou ao menos reduzidas. Assim prevêem que as edificações deverão ser implantadas observados requisitos técnicos (de engenharia, biomédicos etc.) que garantam a segurança e higiene como: a) iluminação uniforme, geral e difusa; b) conforto térmico com ventilação natural ou artificial, uso de roupas apropriadas em casos de condições térmicas desconfortáveis; c) pisos antiderrapantes, sem saliências ou depressões ou aberturas, apropriados à circulação, sem riscos de quedas de pessoas ou objetos; d)instalações elétricas instaladas e operadas por profissional, etc. (CLT, art. 170 e seguintes). No artigo 193 a lei trabalhista conceitua as atividades perigosas e define no artigo 197 algumas regras para transporte e manipulação de materiais e substâncias perigosas ou nocivas à saúde, como: uso de rótulos de identificação, símbolo padrão de perigo, avisos de advertências, etc. Também estipula regras relativas às máquinas e equipamentos, os quais deverão ser adaptados para reduzir a fadiga física e mental do trabalhador e não sacrificá-lo em prol do aumento da produção. Estipula regras sobre a movimentação, armazenagem e manuseio de materiais, instalação, manutenção e uso de máquinas (CLT, art. 182 a 188). Sob a ótica da higiene e saúde do trabalho a Consolidação das Leis Trabalhistas tece algumas regras voltadas para medidas preventivas para impedir danos à saúde física e psíquica do ser humano oriundos do trabalho, como: a exigência de serviços especializados em medicina do trabalho (art. 162); a obrigatoriedade de exame médico admissional e demissional, periódicos e complementares conforme capacidade física e mental do trabalhador em relação aos riscos de sua atividade (art. 168). Conceitua as atividades insalubres (art. 189) e determina que sejam tomadas medidas de proteção da saúde do trabalhador, preferencialmente, pela adoção de medidas coletivas que eliminem ou neutralizem a insalubridade, ou distribuição de equipamentos de proteção individual (EPIs), para reduzir o agente agressor a níveis toleráveis (par. único do art. 190 e art. 191). Exige que sejam mantidos, nos estabelecimentos de trabalho, os materiais próprios para prestação de primeiros socorros médicos (art.168, § 4º). E nos artigos 198 e 199 determina algumas regras sobre ergonomia, com fito de prevenir a fadiga, como, por exemplo: a) o peso máximo a serem removidos pelo trabalhador; b) a necessidade de assentos adequados para assegurar a postura correta; etc. A obrigação de proteger e defender o meio ambiente e torná-lo sustentável é de todos. Todavia, no que tange ao ambiente laboral, que deve ser livre de agressões à saúde do trabalhador, impende ao empregador maior responsabilidade, haja vista ser este (a empresa, individual ou coletiva), que assume os riscos da atividade econômica (CLT, art. 2º). Dessa forma a lei laboral determina uma série de obrigações para as empresas, a seguir expostas de forma exemplificativa. O estabelecimento da empresa deve estar de acordo com as exigências legais e esta não pode iniciar suas atividades sem a prévia inspeção e aprovação de suas instalações pela autoridade da Delegacia Regional do Trabalho e Emprego e deverá requerer-lhe nova inspeção quando houver alterações substanciais no mesmo. E por uma questão de economia poderá solicitar deste órgão a prévia aprovação dos projetos a serem implantados (CLT, art. 160 e §§). De acordo com o número de empregados e grau de riscos de acidentes nas empresas, estas deverão instituir e manter órgãos internos com fito de evitar infortúnios. Isto é, deverão manter um quadro de serviços especializados em segurança e medicina do trabalho - SESMT (engenheiro e técnicos em segurança do trabalho, médico, enfermeiro e técnico em enfermagem do trabalho), implantar, obrigatoriamente, uma Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), nos temos dos artigos 162 e seguintes e em conformidade com as normas expedidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. A empresa também está obrigada a: a) tomar, preferencialmente, medidas de segurança coletiva para proteção contra agressões à integridade física de seus empregados, ou na impossibilidade de eliminar os riscos, fornecer-lhes, gratuitamente, equipamentos de proteção individual (EPI) adequados, em perfeito estado de conservação e funcionamento (art.166); b) pagar adicional de insalubridade ou de periculosidade aos empregados sujeitos a agentes nocivos à sua saúde ou a contato permanente com inflamáveis, explosivos, radiações ionizantes ou substâncias radiotivas, energia elétrica, em condições de risco acentuado (CF/88, art. 7º, inc. XXIII (25) c/c CLT, arts. 192; 193 §§ 1º e 2º; 194 e 196); c) arcar com as despesas dos exames médicos obrigatórios e comunicar seus resultados ao empregado segundo a ética médica (CLT, art. 168); d) comunicar a ocorrência de doenças ocupacionais ou acidente do trabalho (CAT), à Previdência Social até o 1º (primeiro) dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário de contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social (CLT, art. 169. c/c NR 7, item 7.4.8 e art. 22 da Lei previdenciária nº 8.213/91). E, enfim, a empresa deve facilitar a fiscalização do estabelecimento pelo órgão competente, cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho definidas nos códigos de sanitários e seus regulamentos, nas normas celetistas e regulamentos expedidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego e normas coletivas de trabalho, mediante orientações aos empregados sobre as medidas necessárias para evitar acidente do trabalho (ordem de serviço, cursos de prevenção acidentária, qualificação profissional para utilização das máquinas,etc.) e por meio de fiscalização e exigência da conduta precavida dos trabalhadores, como o uso dos equipamentos de proteção individual fornecidos pela empresa (CLT, art. 154 e 157). Caso a empresa descumpra as referidas obrigações, ela suportará o ônus das multas administrativas e, eventualmente, responsabilidade civil e penal, além de ser obrigada a pagar os salários dos empregados durante o período de paralisação das atividades impostas pelo órgão competente (CLT, arts. 161 e 201). É importante assinalar que uso dos equipamentos de proteção individual pelo empregado sujeito a riscos ambientais, é essencial para eliminar ou reduzir o potencial do agente agressivo. Portanto, ao empregador, a quem impende zelar pela incolumidade de seus operários, cabe fornecer e exigir o uso desses equipamentos de proteção individuais, sob pena de sofrer autuações e multas impostas pelos fiscais da Delegacia Regional do Trabalho e Emprego e ser obrigado ao ônus de continuar devendo os adicionais de insalubridade (En. 289/TST). Em contrapartida, também os trabalhadores têm suas obrigações, visto que são os maiores interessados em usufruir um meio ambiente adequado ao trabalho e em manter a integridade da própria saúde. Deverão, pois, observar e colaborar com a empresa para a efetividade das normas de segurança e medicina do trabalho, por meio da participação dos cursos oferecidos, implementação das orientações recebidas como: tomar as precauções necessárias e usar os equipamentos de proteção individual, sob pena de dispensa por justa causa ou sofrer as conseqüências de sinistro indesejado (CLT, art. 158, par. único, "b" c/c art. 482, "h"). Ao Poder Público, por sua vez, compete, a edição, execução e fiscalização da observância das normas de segurança e medicina do trabalho. Os entes federados, o Ministério Público do Trabalho, o Sistema Único da Saúde e órgãos da vigilância sanitária têm obrigação de proteger e defender um ambiente laboral salutar, segundo as normas constitucionais e legais. Mas o Ministério do Trabalho e Emprego e seus órgãos regionais (Delegacias Regionais do Trabalho e Emprego – DRTE) são especialmente competentes pela execução das normas de segurança e medicina do trabalho (CLT, arts. 154; 155 e156). Ao órgão de âmbito nacional competente em matéria de segurança e medicina do trabalho(hoje, o Ministério do Trabalho e Emprego, órgão, cuja função é, eminentemente, executiva: como organizar, orientar, controlar e supervisionar a fiscalização da execução das normas ambientais do trabalho) foram delegados pela lei, amplos poderes para estabelecer atos normativos sobre a matéria (CLT, arts. 155, caput ; 162; 163; par. único; 168, caput, §§1º e terceiro; 169; 174; 175; 178; 179; 182;186; 187, par. único; 190; 193; 194; 195 e 200). Entende Amauri Mascaro Nascimento que: [A delegação de tais poderes] trata-se de um fenômeno geral, característico do Estado moderno. O direito atual reconhece o poder de interferência do Executivo no processo legislativo, a sua liderança na legislação, a iniciativa de projetos, o veto, a possibilidade de fixar prazos fatais para a manifestação do Legislativo e, até mesmo, o poder de editar atos com força de lei. É lastimável, mas muitas normas não têm eficácia plena, ainda que seu cumprimento seja essencial ao exercício cabal do direito à vida, como é o caso das normas protetoras do meio ambiente do trabalho. Há por parte de muitas empresas o interesse apenas no lucro em detrimento do bem-estar de seus trabalhadores e do meio ambiente. Até mesmo muitos trabalhadores têm conduta desinteressada pelas referidas normas, ou preferem retornos financeiros imediatistas, como o recebimento dos irrisórios e execráveis adicionais de periculosidade, insalubridade, de horário extraordinário, aposentadoria especial a exigirem condições mais salutares em seus ambientes de trabalho, a cultivarem regras de vida mais saudáveis. Porém, é importante evidenciar que na maioria dos casos, os operários não têm meios de vindicar seus direitos a melhores condições de trabalho, haja vista estar em jogo, o próprio direito de trabalhar e de sobrevivência. Há um verdadeiro temor do fantasma do desemprego que ronda seus lares. Então, com fito de dar efetividade à defesa e proteção desses direitos, designadamente, às Delegacias Regionais do trabalho compete, no limite de sua respectiva jurisdição, fiscalizar o cumprimento das referidas normas. Além dessa função devem também orientar e impor que sejam adotadas as medidas necessárias para evitar acidentes de trabalho. Para tanto têm, como atribuição, o poder de polícia para autuar, multar, interditar estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento, embargar obras edificadas sem observância dos requisitos legais, quando estes ofereçam grave e eminente risco para o trabalhador. Entretanto, segundo o devido processo legal, é assegurado o direito de recurso administrativo aos interessados para o órgão competente, em âmbito nacional, em matéria de segurança e medicina do trabalho (CLT, art. 155, inc. III). 7. NORMAS REGULAMENTADORAS (NRS) – PORTARIAS Nº 3.214/78 E Nº 3.067/88 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO O cerne do sistema de segurança e medicina do trabalho são as normas ínsitas na CLT em seus artigos 154 a 201. Interessante salientar que estas normas tratam de matéria complexa e de evolução dinâmica, razão porque ensejam regulamentação específica, propensa a sofrer alterações necessárias segundo as regras de experiência. Dessa forma, a lei trabalhista determinou que o órgão competente para a matéria em âmbito nacional – o Ministério do Trabalho – expedisse instruções específicas e complementares às normas gerais já estabelecidas com fito de executá- las. Para dar cumprimento às atribuições autorizadas pela referida lei o Ministério do Trabalho expediu as Portarias de nº 3.214/78 e nº 3.067/88, nas quais estão consubstanciadas as Normas Regulamentadoras (NRs) dos preceitos básicos do sistema de segurança e medicina do trabalho. Destarte, foram definidas e aprovadas até o momento 30 (trinta) normas regulamentadoras (NRs). A NR-1 trata de disposições gerais; a NR-2, de inspeção prévia; a NR-3 de embargo ou interdição, a NR-4, de Serviç os Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT); a NR-5, das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA); a NR-06 de equipamentos de proteção individuais (EPIs); a NR-7, de Programa d Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO); a NR- 8, de edificações, a NR-9, de Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA); a NR-10, de instalações sanitárias, a NR-11, de transporte e movimentação de materiais; a NR-12, de máquinas e equipamentos; a NR-13, de caldeiras e vasos de pressão; a NR-14, de fornos; a NR-15, de insalubridade; a NR-16, de periculosidade; a NR-17, de ergonomia; a NR-18, de meio ambiente da construção civil; a NR-19, de explosivos; a NR-20, de líquidos combustíveis e inflamáveis; a NR-21, de trabalhos a céu aberto; a NR-22, de trabalhos de mineração; a NR-23, de combate a incêndios; a NR-24, de condições sanitárias e de conforto nos locais de trabalho; a NR-25, de resíduos industriais; a NR-26, de sinalização de segurança; a NR-27, de registro profissional; a NR-28, de fiscalização e penalidades; a NR-29, de segurança e saúde no trabalho portuário e a NR-30 de segurança e saúde no trabalho aquaviário. Verifica-se a partir do título de cada norma regulamentadora a finalidade que ela propõe, qual seja: possibilitar o desenvolvimento do trabalho com o menor risco de lesões ao trabalhador e efetivar uma gama de medidas que protejam o meio ambiente laboral. Quanto à prevenção contra acidentes de trabalho é interessante salientar, o conteúdo de algumas das Normas Regulamentadoras: a) NR-1 – esta NR tem por fim complementar o artigo 157 da CLT. Dispõe sobre a implementação da Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes (itens 1.3 e 1.4) e especifica as condutas básicas a serem tomadas pelo empregador e empregado, com fito de evitar acidentes de trabalho (itens 1.7 e 1.8). b) NR-2 – nesta norma define-se a finalidade da inspeção prévia (CLT, 160) e do Certificado de Aprovação de Instalações, como elementos capazes de assegurar que o estabelecimento está iniciando as atividades conforme os requisitos legais e técnicos apropriados à garantia da perfeita segurança aos que nele trabalham, isto é, livre de riscos de acidentes ou doenças ocupacionais (item 2.6). c) NR-3 - conceitua risco grave e eminente como toda condição ambiental de trabalho que possa causar acidente do trabalho ou doença profissional com lesão grave à integridade física do trabalhador e regulamenta as regras sobre a interdição do estabelecimento ou embargos das obras, consideradas como todo e qualquer serviço de engenharia de construção, montagem, instalação, manutenção e reforma (itens 3.1.1 e 3.3.1 c/c CLT, art. 161). d) NR-4 – esta NR, nos termos do artigo 162 da CLT, instituiu a classificação nacional de atividades econômicas com seus respectivos graus de risco (conforme Quadro I em anexo). Definiu exigências quanto à manutenção obrigatória pelas empresas de Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), de acordo com o número de empregados e grau de risco da atividade empresarial, para a promoção e proteção da saúde e integridade do trabalhador no local de trabalho (item 4.1). Assim, as empresas (sejam elas privadas ou públicas, e mesmo os órgãos públicos da administração direta e indireta dos poderes legislativo e judiciário) que se enquadrem, por exemplo, no grau de risco 3 (três) e contam com um quadro de empregados que varia entre 50 a 100 indivíduos, não serão obrigadas a manter o Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT). Porém, se tiverem um quadro de empregados de 3.501 a 5000 pessoas, deverão manter o quadro completo do SESMT e deverão contratar como empregadospelo menos: a) oito técnic os de segurança do trabalho, dois engenheiros de segurança do trabalho, um auxiliar de enfermagem no trabalho, um enfermeiro do trabalho e dois médicos do trabalho (item 4.2). Vale ressaltar que para a NR-4 se a empresa tem vários estabelecimentos (mesmo que instalados em lugares diversos) e se mais de 50% de seus empregados trabalharem em setor, cuja atividade tenha gradação de risco superior ao da atividade principal, deverão dimensionar o SESMT em função do maior grau de risco. Inclusive, se apenas um de seus estabelecimentos se enquadrar no Quadro II (anexo que trata do dimensionamento dos SESMT), deverá prestar serviços especializados aos empregados do estabelecimento que não se enquadrou (itens. 4.2.2 e 4.2.4). E mais, no item 4.5 e seus subitens, a NR-4 define a responsabilidade da empresa, cujos estabelecimentos se enquadram no Quadro II e que, normalmente, contratam serviços terceirizados. Ressalta-se, o comando desse item é de suma importância para evitar as forma s dissimuladas de burlar a efetivação das regras de segurança e medicina do trabalho, mediante a terceirização. Por um lado, determina que a empresa contratante deverá estender a assistência de seus Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho aos empregados da(s) contratada(s), sempre que o número de empregados desta(s), exercendo atividade naqueles estabelecimentos, não alcançar os limites previstos no Quadro II, devendo, ainda, a contratada cumprir o disposto no subitem 4.2.5. E também deverão ser estendidos a trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, no teor do item 1.1.1 da NR-1. Por outro lado, o subitem 4.5.1 estabelece que se a empresa contratante e as demais empresas por ela contratadas, consideradas individualmente, não se enquadrarem no Quadro II anexo, devem ser consideradas em conjunto, desde que atuem no mesmo no estabelecimento. E, se assim, atingirem o número total de empregados conforme os limites dispostos no referido quadro, deverá ser constituído um Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho comum, nos moldes do item 4.14. E para as empresas que não se enquadram no Quadro II anexo à NR-4 é facultado dar assistência, na área de segurança e medicina do trabalho, a seus empregados por meio de Serviços especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), organizados em comum pelo sindicato ou associação da categoria econômica correspondente ou pelas próprias empresas interessadas (item 4.14). Outro ponto que merece destaque é o item 4.12 da NR-4 que traça competências ao SESMT. Dentre elas sobressaem as obrigações de: 1) definir, primeiramente, que sejam utilizados todos os meios conhecidos para a eliminação do risco e, se o agente agressor persistir, ainda que de forma reduzida, depois de esgotadas todas as medidas possíveis para extingui-lo, o segundo passo é determinar a utilização, pelo trabalhador, de equipamentos de proteção individual (EPI), de acordo com as regras da NR-6, desde que a concentração, a intensidade ou característica do agente assim o exija; 2) "responsabilizar-se, tecnicamente, pela orientação quanto ao cumprimento do disposto nas NR aplicáveis às atividades executadas pela empresa e/ou seus estabelecimentos"; 3) "promover a realização de atividades de conscientização, educação e orientação dos trabalhadores para a prevenção de acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, tanto através de campanhas quanto de programas de duração permanente"; 4) "esclarecer e conscientizar os empregadores sobre acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, estimulando-os em favor da prevenção"; 5) "manter permanente relacionamento com a CIPA, valendo-se ao máximo de suas observações, além de apoiá-la, treiná-la e atendê-la, conforme dispõe a NR 5; etc". e) NR-5 – esta NR regulamentou amplamente, as atribuições, o funcionamento, a composição das Comissões Internas de Prevenções de Acidentes (CIPA) e estipulou a obrigatoriedade de sua instalação também de acordo com os graus de risco das atividades empresarias combinado com o número de empregados (conforme o dimensionamento previsto no Quadro I em anexo). As empresas, cujos estabelecimentos, independentemente do grau de riscos, tenham somente até 20 (vinte) empregados, não são obrigadas a instalar e manter a CIPA. Apenas deverão indicar um responsável pelo cumprimento dos objetivos desta NR, podendo ser adotados mecanismos de participação dos empregados através de negociação coletiva (item 5.6.4). Para termos uma visão mais abrangente sobre o dimensionamento do referido Quadro I, a proporção entre o número de empregados e o grau de risco, que obriga a empresa a instalar a CIPA, segundo seu enquadramento no Quadro I desta NR, observe o exemplo abaixo: Atividades de menor grau de risco (grau de risco 1), como é o caso das prestadoras de serviço pertencentes ao grupo C-29 (atividades de organizações profissionais, de organizações políticas, associativas de modo geral), somente serão obrigadas a implantar as CIPAs, se tiverem um contingente de empregados superior a 300 (trezentas) pessoas, sendo que será exigível apenas um titular e um suplente para representar cada grupo (empregados e empregadores), se esse número for inferior a 501 (quinhentos e um) indivíduos. Mas se a atividade exercida pela empresa tem grau de risco elevado, como indústrias de artigos de borracha e plástico, pertencentes ao grupo C-11 (fabricação de pneumáticos e de câmaras-de-ar de grau de risco 4); ou atividades de comércio de produtos perigosos – grupo C-22 (comércio e varejo de combustíveis de grau de risco 3), a empresa deverá instituir a CIPA a partir da existência de 20 (vinte) empregados. Aplica-se a referida norma às empresas privadas, públicas, sociedades de economia mista, órgãos da administração direta e indireta, instituições beneficentes, associações recreativas, cooperativas, bem como outras instituições que admitam trabalhadores como empregados e aos trabalhadores avulsos (item 5.2). Deve ser salientado que a constituição da CIPA não é por empresa, mas por estabelecimento, segundo seja enquadrada nos requisitos de obrigatoriedade de mantê-la em regular funcionamento. E estas deverão garantir a integração das CIPA e dos designados, se possuírem no mesmo município dois ou mais estabelecimentos, com fito de harmonizar as políticas de segurança e saúde no trabalho (item 5.2 c/c 5.4). Contudo, não basta constituir a CIPA, é preciso dar eficiência a este órgão. Então, à empresa cabe promover treinamento para os membros da CIPA, titulares e suplentes, antes da posse (item 5.32), exceto se for o primeiro mandato da CIPA, cujo prazo de realização será de no máximo trinta dias, contados a partir da data da posse (item 5.32.1). Segundo o item 5.33 da NR-5, o treinamento para a CIPA deverá contemplar, no mínimo, os seguintes itens: a)estudo do ambiente, das condições de trabalho, bem como dos riscos originados do processo produtivo; b)metodologia de investigação e análise de acidentes e doenças do trabalho; c)noções sobre acidentes e doenças do trabalho decorrentes de exposição aos riscos existentes na empresa; d)noções sobre a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - AIDS, e medidas de prevenção; e)noções sobre as legislações trabalhista e previdenciária relativas à segurança e saúde no trabalho; f)princípios gerais de higiene do trabalho e de medidas de controle dos riscos;g)organização da CIPA e outros assuntos necessários ao exercício das atribuições da Comissão. A NR-5 traçou como objetivos da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA: a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador o que revela a sua relevância (item 5.1). Nesse sentido, convém salientar algumas atribuições da CIPA (item 5.16, alíneas a, c, d, f, h, i, j, l, o, respectivamente): - identificar os riscos do processo de trabalho, e elaborar o mapa de riscos, com a participação do maior número de trabalhadores, com assessoria do SESMT, onde houver; - participar da implementação e do controle da qualidade das medidas de prevenção necessárias, bem como da avaliação das prioridades de ação nos locais de trabalho; - realizar, periodicamente, verificações nos ambientes e condições de trabalho visando a identificação de situações que venham a trazer riscos para a segurança e saúde dos trabalhadores; - divulgar aos trabalhadores informações relativas à segurança e saúde no trabalho; - requerer ao SESMT, quando houver, ou ao empregador, a paralisação de máquina ou setor onde considere haver risco grave e iminente à segurança e saúde dos trabalhadores; - colaborar no desenvolvimento e implementação do PCMSO e PPRA e de outros programas relacionados à segurança e saúde no trabalho; - divulgar e promover o cumprimento das Normas Regulamentadoras, bem como cláusulas de acordos e convenções coletivas de trabalho, relativas à segurança e saúde no trabalho; - participar, em conjunto com o SESMT, onde houver, ou com o empregador da análise das causas das doenças e acidentes de trabalho e propor medidas de solução dos problemas identificados; - promover, anualmente, em conjunto com o SESMT, onde houver, a Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho - SIPAT; etc. Destarte, diante da importância das atribuições dos integrantes da CIPA, os titulares da representação dos empregados receberam a concessão de estabilidade provisória no emprego a partir de 1977, com a alteração do artigo 165, da CLT, pela Lei nº 6.514. Tal comando foi ratificado pelo artigo 10 das Disposições Transitórias, inciso II, "a", que vedou a dispensa arbitrária ou sem justa causa do empregado eleito para o cargo de direção da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato. A CIPA é um órgão paritário de suma importância para a proteção do meio ambiente do trabalho, cuja efetividade depende da franca desenvoltura de seus dirigentes. Seu Presidente é indicado, anualmente, pelo empregador dentre seus representantes e o Vice-Presidente eleito pelos empregados (CLT, art. 164, § 5º). Portanto, a estabilidade provisória no emprego ao dirigente da CIPA, visa garanti-lo contra a insatisfação e eventual retaliação do empregador (ante a resistência de algumas empresas em investir em segurança e medicina do trabalho), óbice ao livre desempenho de sua árdua tarefa de vindicar e defender um dos mais relevantes interesses coletivos: o direito de obter melhores condições de trabalho no meio ambiente laboral. A garantia de estabilidade não foi estendida ao dirigente da CIPA, indicado pela empresa, o que se mostra injustificável, pois ambos os dirigentes – Presidente e Vice-Presidente – necessitam de garantia contra as eventuais pressões do meio patronal. Ora, inobstante o Presidente da CIPA, ocupe um cargo de confiança do empregador (posição que naturalmente o inibe e o força a atuar de forma tendenciosa), deve também, devido à proeminência da sua função, atuar sem constrangimentos e medo de dispensa coercitiva, ser livre para cuidar e zelar por um ambiente laboral seguro e adequado e, inclusive, para sugerir e solicitar ao empregador que sejam tomadas as medidas preventivas necessárias à redução e eliminação de riscos à saúde dos trabalhadores, ainda que estas sejam dispendiosas. Ademais, ao empregador compete o dever de garantir que seus indicados tenham a representação necessária para a discussão e encaminhamento das soluções de questões de segurança e saúde no trabalho analisadas na CIPA (NR-5, item 5.10). Outrossim, segundo a NR-5 o empregador deve garantir a todos os membros da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), condições que não descaracterizem suas atividades normais na empresa, sendo vedada a transferência para outro estabelecimento sem a sua anuência, ressalvado o disposto nos parágrafos primeiro e segundo do artigo 469, da CLT (item 5.9). As CIPAs (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes) são órgãos essenciais na defesa e prevenção do meio ambiente do trabalho, pois seus membros vivenciam diária e diretamente todas as situações potenciais de lesão aquele meio. Infelizmente, embora criadas, legalmente, à quase trinta anos, no Brasil, muitas empresas que se enquadram nas exigências dessa norma a desrespeitam, não constituindo as CIPAs ou não garantindo a efetividade daquelas já formalizadas em seus estabelecimentos. Muitos são os casos, salvo raras exceções, em que a atuação das CIPAs é medíocre. Eis a denúncia vigorosa de Raimundo Simão de Melo, atuante Procurador Regional do Trabalho, cotado na 15ª Região: No Brasil, se de um lado a fiscalização do Estado não atua a contento - ressalvadas honrosas exceções – por inúmeras razões, entre elas a falta de estrutura oferecida (ou não oferecida) pelo Estado, de outro, o diálogo social tem sido ausente na maioria dos casos e a criação dos órgãos paritários também não tem surtido os efeitos desejados, pois se por lei existe a obrigação de constituição de CIPAS (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes), nas empresas com mais de 50 empregados, essas comissões, também ressalvadas honrosas exceções, não cumprem realmente o seu papel, que é de defesa do meio ambiente adequado e seguro e da prevenção de acidentes de trabalho, pelo simples motivo de que são, na maioria, vinculadas e curvadas ao interesse patronal e os seus membros usam da importante estabilidade consagrada pela Constituição como um direito individual e pessoal, quando esse direito é muito mais da categoria que o elegeu. O Ilustre Procurador pondera com veemência e convoca aos interessados, especialmente aos membros das CIPAs, que dêem eficácia a sua atuação, pois somente assim e será possível regredir os estarrecedores acidentes havidos no meio laboral. A finalidade das comissões internas de prevenção de acidentes é cuidar e zelar por adequadas e seguras condições nos ambientes de trabalho, observando e relatando condições de risco, solicitando ao empregador medidas para reduzi-los e eliminá-los, bem como para prevenir a ocorrência de acidentes e doenças, e ainda, orientar os trabalhadores quanto à prevenção de tais eventos. (...) Urge, pois, que esses importantes órgãos de representação dos trabalhadores e empregadores nos locais de trabalho passem a cumprir o seu papel, inclusive com o apoio e em harmonia com os sindicatos, que é a única forma de serem realmente atuantes. f) NR-6 – esta NR aprova quais são os equipamentos de proteção individual que deverão ser utilizados (item 6.3), e define que as normas técnicas para fabricação e ensaio dos equipamentos de proteção serão baixadas pela SSMT (Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho, em portarias específicas (item 6.12). Reitera a gratuidade do fornecimento dos mesmos pela empresa e a obrigação desta de promover,prioritariamente, a implementação de medidas ou equipamentos de segurança e proteção coletiva (CLT, art. 166, in fine). Determina, pois, no item 6.3, que a empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, equipamentos de proteção individual (EPIs) adequado ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento, nas seguintes circunstâncias: a) sempre que as medidas de proteção coletiva forem tecnicamente inviáveis ou não oferecerem completa proteção contra os riscos de acidentes do trabalho e/ou de doenças profissionais e do trabalho; b) enquanto as medidas de proteção coletiva estiverem sendo implantadas; c) para atender a situações de emergência. A NR-6 impõe no item 6.8.6, responsabilidade ao fabricante de equipamentos de proteção individual, pela manutenção da mesma qualidade dos equipamentos de proteção individual (EPIs) padrão que deu origem ao Certificado de Aprovação (CA). g) NR-7 – Esta NR, considerando que todos os trabalhadores devem ter o controle de sua saúde de acordo com os riscos a que estão expostos, exigência legal prevista no artigo 168 da CLT, respaldada na Convenção 161 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), aprovou o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) com o escopo de promover e preservar a saúde do conjunto dos trabalhadores. A elaboração e implementação do PCMSO devem respeitar princípios éticos, morais e técnicos e é obrigatória a todos os empregadores e instituições que admitam trabalhadores como empregados. As empresas deverão arcar com todos os custos dos procedimentos (incluindo avaliações clínicas e exames complementares, etc.) e garantir a eficácia desse programa. Outrossim, toda empresa deverá informar sobre os riscos que envolvem sua atividade aos seus empregados, bem como a eventuais empresas contratadas para prestar serviços em seu local de trabalho. E, como são responsáveis, ainda que subsidiariamente, pelo cumprimento das obrigações trabalhistas da empresa contratada, deverão auxiliá-las na elaboração e implementação do PCMSO (item 7.1.3). E para coordenar o PCMSO a empresa deverá indicar um médico do trabalho do seu quadro de Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho – SESMT; ou caso esteja desobrigada de manter médico do trabalho, de acordo com a NR-4, deverá contratar e indicar médico do trabalho autônomo ou contratar médico de outra especialidade, caso inexista médico do trabalho na localidade, o empregador poderá contratar médico de outra especialidade (item 7.3.1). O médico coordenador é competente e responsável, pelas seguintes funções dentre outras: a) realizar os exames obrigatórios comuns ou complementares segundo o grau de risco da atividade; b) Emitir, para cada exame médico realizado, o Atestado de Saúde Ocupacional – ASO, segundo os requisitos mínimos exigidos no item 7.4.4.3, em duas vias, uma para o empregado e outra para ser arquivada no local de seu trabalho; c) Se constatar a ocorrência ou agravamento de doenças profissionais, através dos referidos exames médicos; ou sendo verificadas alterações que revelem qualquer tipo de disfunção de órgão ou sistema biológico, deverá nos termos do item 7.4.8: - solicitar à empresa a emissão da Comunicação de Acidente do Trabalho - CAT; - indicar, quando necessário, o afastamento do trabalhador da exposição ao risco, ou do trabalho; - encaminhar o trabalhador à Previdência Social para estabelecimento de nexo causal, avaliação de incapacidade e definição da conduta previdenciária em relação ao trabalho; - orientar o empregador quanto à necessidade de adoção de medidas de controle no ambiente de trabalho. d) Arquivar os prontuários individuais de cada paciente/trabalhador por no mínimo 20 (vinte) anos e transferi-los para eventual sucessor; e) Coordenar a implementação do PCMSO, o qual deverá obedecer a um planejamento em que estejam previstas as ações de saúde a serem executadas durante o ano; f) Fazer o relatório anual do programa, e apresentar e discutir na CIPA, se existente na empresa, a qual receberá e arquivará cópia em sua ata, etc. Entretanto, ficarão dispensadas de apresentar o referido relatório as empresas desobrigadas de indicar o médico coordenador do PCMSO (item 7.4.6.4). São elas, conforme estabelecido nos itens 7.3.1.1; 7.3.1.1.1 e 7.3.1.1.1: a) Empresas de grau de risco 1 e 2, com até 25 (vinte e cinco) empregados, bem como as empresas enquadradas no grau de risco 3 e 4, com até 10 (dez), segundo verifica-se no Quadro I da NR-4. b) As primeiras empresas, acima mencionadas, se tiverem um contingente entre 25 (vinte e cinco) e 50 (cinqüenta) empregados, poderão se desobrigar desse encargo mediante negociação coletiva. Aquelas de grau de ris co 3 e 4, com um quadro de empregados que varie de 10 (dez) até 20 (vinte) pessoas também poderão se desobrigar de tal ônus em decorrência de negociação coletiva, porém, com a assistência de profissional do órgão regional competente em segurança e saúde no trabalho. Contudo, vale ressaltar que, quaisquer empresas poderão ter a obrigatoriedade de indicação de médico coordenador, quando suas condições representarem potencial de risco grave aos trabalhadores, desde que verificado em parecer técnico conclusivo da autoridade regional competente em matéria de segurança e saúde do trabalhador, ou se assim for determinado em convenção coletiva ou, ainda, quando findar os efeitos normativos da convenção coletiva concedente da desoneração (Item 7.3.1.1.3) O programa (PCMSO) deve incluir, entre outros, a realização obrigatória dos exames médicos nas seguintes ocasiões, segundo o item 7.4.1 desta NR: a) na admissão do empregado, a ser realizado antes que o trabalhador assuma suas atividades; b) periodicamente (bienal, anual ou com intervalos menores para hipóteses de trabalhadores expostos a riscos ou situações de trabalho que impliquem o desencadeamento ou agravamento de doença ocupacional, ou, ainda, para aqueles que sejam portadores de doenças crônicas, podendo ser incluídos exames complementares); c) na data do retorno ao trabalho (em caso retorno de trabalhador ausente por período igual ou superior a trinta dias por motivo de doença ou acidente, de natureza ocupacional ou não, ou parto, deverá ser realizado, obrigatoriamente, no dia da volta ao trabalho); d) de mudança de função (assim entendida se ocorrer alteração do risco a que o trabalhador ficará exposto, visto que poderá ocorrer troca de função na empresa sem mudança de risco). Será obrigatória sua realização antes da data da mudança. e) no término do contrato (exame demissional). Pelo exposto, resta evidente que à empresa cabe o ônus de implementar o PCMSO, segundo orientações do médico coordenador. Mas a este impende a responsabilidade técnica. Assim ambos são responsáveis pelo controle ambiental no local de trabalho e prevenção de doenças ocupacionais. E caso ocorra um sinistro, a primeira poderá ser culpada por não fornecer meios necessários à elaboração e implantação do PCMSO, ou ainda, ter culpa in eligendo. Mas se comprovar que implementou todas as medidas indicadas pelo médico coordenador, terá direito regressivo contra ele, na hipótese desse ter agido com negligência, imperícia, imprudência ou mesmo, com dolo (negativo, positivo ou eventual). Para o controle ambiental realizado pelos órgãos internos da empresa, além de seobservar as determinações do Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional – PCMSO, também se faz essencial elaborar e implantar, de forma articulada com este programa o PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais). O PPRA visa à preservação da saúde e a integridade dos trabalhadores, através da antecipação, do reconhecimento, da avaliação e do conseqüente controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho, tendo em consideração a proteção do meio ambiente e dos recursos naturais. Daí, sua obrigatoriedade aos empregadores e inst ituições que admitam trabalhadores como empregados (NR-9, itens 9.1.1 e 9.1.3). h) NR-9 – Esta NR criou o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, que deverá ser elaborado e implantado pelo empregador com a colaboração dos seus empregados (item 9.1.2). Definiu parâmetros mínimos e diretrizes gerais a serem observados na execução do PPRA e caracterizou como riscos ambientais os agentes físicos, químicos e biológicos existentes nos ambientes de trabalho que, em função de sua natureza, concentração ou intensidade e tempo de exposição, são capazes de causar danos à saúde do trabalhador e exemplificou alguns desses agentes (item 9.1.5), cujas alterações poderão ser baixadas pela Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho, conforme necessidade e experiência (art. 2º da Portaria nº 3.214/78), que sempre surgem ante rápida evolução e aumento dessas espécies de agente sejam naturais ou artificiais. De acordo com os itens 9.2.1, 9.2.2, o PPRA deverá estar descrito num documento-base, cuja estrutura mínima deverá conter: a) planejamento anual com estabelecimento de metas, prioridades e cronogramas [cujos prazos para o desenvolvimento das etapas e cumprimento das metas do PPRA deverão ser claros]; b) estratégia e metodologia de ação; c) forma do registro, manutenção e divulgação dos dados; d) periodicidade e forma de avaliação do desenvolvimento do PPRA. O Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho - SESMT (ou a pessoa ou equipe de pessoas que, a critério do empregador, sejam capazes de desenvolver as disposições da NR-9) deverá elaborar, implementar, acompanhar a implantação do PPRA, bem como efetuar, anualmente ou sempre que se fizer necessário, uma análise global do mesmo para avaliar seu desenvolvimento e realizar os ajustes necessários e estabelecimentos de novas metas e prioridades (itens 9.2.1.1 e 9.3.1.1). O documento-base e suas alterações e complementações deverão ser apresentados e discutidos na CIPA, que deverá anexar sua cópia ao seu livro de atas (item 9.2.2.1), bem como deverão estar disponíveis de modo a proporcionar o imediato acesso às autoridades competentes (item 9.2.2.2). Estão previstas no item 9.3.1 da NR-9, as seguintes etapas a serem incluídas no Programa de Prevenção de Riscos Ambientais: a) antecipação e reconhecimento dos riscos; b) estabelecimento de prioridades e metas de avaliação e controle; c) avaliação dos riscos e da exposição dos trabalhadores; d) implantação de medidas de controle e avaliação de sua eficácia; e) monitoramento da exposição aos riscos; f) registro e divulgação dos dados. Entretanto, para as empresas cujas atividades, não ofereçam riscos ambientais, haja vista não terem sido identificados nas fases de antecipação ou reconhecimento, o PPRA poderá resumir-se às etapas previstas nas alíneas "a" e "f" desse subitem, conforme se depreende do item 9.1.2.1. Deve-se reiterar a prioridade da implementação pelo empregador de medidas de proteção coletiva. E somente quando ele comprova a inviabilidade técnica da adoção dessas medidas, ou quando estas não forem suficientes ou se encontrarem em fase de estudo, planejamento ou implantação, ou ainda em caráter complementar ou emergencial, deverão ser adotadas outras medidas, obedecendo-se a seguinte hierarquia conforme o item 9.3.5.4: a) medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho; b) utilização de equipamento de proteção individual - EPI. Enfim, segundo o item 9.4 da NR-9 tanto o empregador quanto os trabalhadores serão responsáveis pela eficácia do Programa de Prevenção de Riscos ambientais. Estes são obrigados colaborar e participar na implantação e execução do PPRA; seguir as orientações recebidas nos treinamentos oferecidos dentro do PPRA; informar ao seu superior hierárquico direto ocorrências que, a seu julgamento, possam implicar riscos à saúde dos trabalhadores. E de acordo com o item 9.6.3 da referida NR, em se tratando de situação de grave e iminente risco para um ou mais trabalhadores, esses poderão interromper, de imediato, as suas atividades e, somente após a interrupção, comunicar o fato ao superior hierárquico direto para que sejam tomadas as devidas providências. Ao empregador cabe garantir-lhes esse direito, mesmo porque já está obrigado a estabelecer, implementar e assegurar o cumprimento do PPRA, como atividade permanente da empresa ou instituição. E se vários empregadores realizarem, simultaneamente, atividades no mesmo local de trabalho terão o dever de executar ações integradas para aplicar as medidas previstas no PPRA visando à proteção de todos os trabalhadores expostos aos riscos ambientais gerados (item 9.6.1). Os programas acima apresentados (PCMSO e PPRA) são indubitavelmente, de natureza preventiva. E toda prevenção depende do conhecimento das causas, dos agentes causadores do evento do qual se deve e se quer precaver. Em se tratando de prevenção de acidentes de trabalho, há vários fatores de riscos a serem detectados e conhecidos para que sejam traçadas as suas dimensões e os meios para evitá-los. Primeiro deve-se ponderar que em qualquer atividade pode acontecer um infortúnio ao trabalhador, então deve estar cercada de todos os cuidados necessários à sua execução, a começar da edificação, instalações de máquinas e outros móveis e, principalmente, da orientação dos usuários e executores das tarefas, por mais singelas que sejam como, por exemplo, fazer o velho e gostoso cafezinho. Mas a ocorrência desses infortúnios, óbvio, aumenta quando as atividades, por sua própria natureza ou condições de trabalho, são insalubres ou perigosas. Arrisca-se, portanto, a vida e a integridade física nesses ambientes laborais. E ainda hoje, seja nas atividades industriais ou seja nas extrativas, é quase inevitável o trabalho em condições insalubres ou perigosas a serem precavidas. Então, para eliminar ou reduzir a margem de riscos existentes nesses ambientes laborais, é preciso, pois, detectar quais são os fatores de risco, os agentes insalubres ou operações perigosas. Inclusive, nos termos do artigo 191 da CLT, a insalubridade pode ser eliminada ou neutralizada, para tanto esse dispositivo determinou ao Ministério do Trabalho e Emprego a incumbência de aprovar o quadro das atividades e operações insalubres, adotar normas sobre os critérios para caracterizá-las, os limites de tolerância aos agentes agressivos (tempo máximo de exposição) e meios de proteção aos empregados, sejam coletivos ou individuais. i) NR-15 – Para cumprir o comando do artigo 190 da CLT, o Ministério do Trabalho e Emprego aprovou a NR-15, que trata das atividades e operações insalubres, com base em estudos da FUNDACENTRO (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho). Esta NR é integrada por quatorze anexos e formada por sete itens nos quais entreoutras regras: a) conceituam limite máximo de tolerância humana em relação ao ambiente insalubre (cuja previsão está contida nos anexos nº 1, 2, 3, 5, 11 e 12); b) definem as atividades e operações insalubres como sendo aquelas estão acima dos referidos limites de tolerância (subitem 15.1.1), as definidas nos anexos 6, 13 e 14 (subitem 15.1.3), bem como aquelas determinadas nos anexos 7, 8, 9 e 10 (subitem 15.1.4), além de confirmar as disposições da CLT que trata das atividades insalubres e perigosas. Os 14 anexos trazem impressionante conteúdo técnico, ao: a) definir regras e tabelas de limites de tolerância para: a) ruídos contínuos, intermitentes e de impacto (Anexo 1); b) exposição ao calor (Anexo 3); c) trabalho sob radiações ionizantes (Anexo 5); d) exposição a agentes químicos (Anexo 11); e e) limites de tolerância para poeiras minerais (Anexo 12); b) ao estabelecer normas sobre as condições insalubres do trabalho sobre pressões hiperbáricas (trabalhos sob ar comprimido e trabalhos submersos) determinadas nas tabelas de descompressão e para recompressão terapêutica e estabelecer instruções para seu uso e, ainda, as medidas de segurança e restrições para o exercício das atividades sob estas condições (anexo 6); c) determinar as atividades e operações insalubres que utilizam agentes químicos (diversos daqueles dos anexos 11 e 12) como: cádmio e seus compostos, arsênico, carvão, chumbo, cromo, fósforo, hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, mercúrio, silicatos e estipular os seus respectivos graus de insalubridade (máximo, médio ou mínimo), bem como definir as substâncias cancerígenas (4-amino difenil ou p-xenilamina, benzidina, beta-naftamina, 4-nitrodifenil) e proibir o contato ou exposição, por qualquer via, do trabalhador com o carcinogênico, (Anexo 13) e estabelecer as medidas de segurança e proibições ao exercício das atividades ou operações com produtos comprovadamente cancerígenos – o benzeno (Anexo 13-A); d) definir a relação de atividades insalubres que envolvem agentes biológicos (contatos com substâncias infecto-contagiosas nos trabalhos em hospitais, ambulatórios, laboratórios de análise clínica e histopatologia, clínica veterinária, esgotos, etc.), cujo grau de insalubridade pode ser máximo ou médio (anexo 14); e) determinar também, que poderão ser consideradas insalubres, conforme laudo de inspeção ou perícia do local de trabalho (segundo subitem 15.1.4), as atividades ou operações que exponham os trabalhadores à radiações não ionizantes (conceituadas como sendo somente as microondas, ultravioletas e laser), ao frio ou à umidade e à vibrações (Anexos 7, 8, 9 e 10). Conforme se infere do subitem 15.1.3 da NR-15, as atividades ou operações que exponham os trabalhadores aos fatores ou aos agentes agressivos indicados nos itens "b", "c" e "d" relacionados anteriormente são, por sua própria natureza, insalubres. É interessante registrar que a caracterização da insalubridade das atividades e operações com agentes biológicos é determinada pela avaliação qualitativa, ou seja, basta o simples contato com o agente agressivo para determinar esta situação (Vide preâmbulo do anexo 14). Já para as atividades em que há incidência dos agentes agressivos listados no item "a", a avaliação é qualitativa e quantitativa. Nesse caso, haverá insalubridade somente para os trabalhadores, cuja exposição aos agentes agressivos ultrapassar os limites de tolerância fixados nas tabelas ínsitas nos anexos 1, 2, 3, 5, 11 e 12 da NR-15. É o que se depreende do dispositivo do item 15.1.5 da NR- 15, que estabelece que tais limites estão definidos segundo a concentração ou intensidade máxima ou mínima, relacionada com a natureza e o tempo de exposição ao agente, que não causará dano à saúde do trabalhador, durante a sua vida laboral. Quanto aos agentes relacionados no item "e", no caso das atividades e operações que exponham os empregados, sem qualquer proteção, à vibrações localizadas ou de corpo inteiro, a insalubridade somente será caracterizada a partir de perícia realizada no local de trabalho, que terá por base os limites de tolerância definidos pela Organização Internacional para a Normalização (ISO), conforme suas normas ISO 2.631 e ISO/DIS 5.349 ou suas sucessoras. Já para a caracterização das atividades sujeitas à radiações não ionizantes, frio ou umidade, como sendo insalubres, basta o laudo de inspeção no local de trabalho que defina a inexistência de eliminação da insalubridade (anexos 7, 8, 9 e 10). Vale lembrar que a insalubridade poderá ser eliminada ou reduzida à patamares suportáveis, a partir da implementação de medidas de proteção coletiva ou do uso de equipamentos de proteção individual. O conhecimento das atividades consideradas insalubres serve para prevenção dos riscos próprios do meio ambiente laboral agressivo, bem como para poder compensar o trabalhador, pelo exercício de trabalho em condições de insalubridade, garantindo-lhe o direito de receber um adicional a sua remuneração, cujos percentuais são fixados proporcionalmente ao grau de intensidade do agente agressor no seu ambiente de trabalho. Se o grau é mínimo, médio ou máximo, o empregado faz jus ao adicional de 10%, 20 ou 40%, respectivamente, sobre o valor do salário mínimo (CLT, art. 192 c/c item 15.2). E na hipótese, da função do empregado abranger mais de um nível de agressão, receberá somente o adicional referente ao grau mais elevado (NR- 15, item 15.3). E, naturalmente, cessado o trabalho insalubre, cessa o direito ao recebimento do adicional de insalubridade. O contato com esses agentes pode ser: permanente, intermitente, eventual (ou esporádico). Somente este último não gera direito ao recebimento do adicional de insalubridade, tendo em vista que o exercício de trabalho em contato com agente insalubre não é corriqueiro, é imprevisível. Em virtude dessas considerações, verifica-se que são pressupostos da legislação voltada para o meio ambiente laboral: a inevitabilidade do trabalho em condições insalubres para algumas atividades, a possibilidade de eliminá-las ou reduzi- las por meio de medidas de proteção coletiva ou individual, ou mesmo a impossibilidade de fazê-lo, o que culmina com alguma medida compensatória para o trabalhador que se sujeita aos ris cos da atividade insalubre. Em suma, as normas que definem as causas, efeitos e prevenção da insalubridade são preventivas e compensatórias. Ademais, vale ressaltar que somente as atividades insalubres elencadas nos referidos anexos, geram efeitos jurídicos. Há tentativas de acompanhar o desenvolvimento tecnológico, por parte do órgão competente (Ministério do Trabalho e Emprego), mediante alterações dos quadros de atividades e operações insalubres, para complementar a NR-15. Entretanto, ainda existem muitas situações, no meio ambiente laboral, arriscadas e agressivas à saúde dos trabalhadores que não são contempladas pela referida norma regulamentadora. Se não bastasse, mesmo as normas existentes de caráter preventivo, eliminatório ou compensatório não são devidamente observadas por todas as empresas. Ademais, há deficiência de fiscalização tanto por parte dos sindicatos quanto, dos órgãos públicos competentes. Se esta fosse eficaz, coagiria aos empreendedores de atividades agressivas a cumprirem suas obrigações e tratar com mais humanidade e dignidade os seus trabalhadores. Cumpre examinar, nesse passo, os riscos inerentes ao meio ambiente laboral, relativos à atividades perigosas ou, potencialmente, produtoras de efeitos perigosos. Para a CLT, segundo dispositivo do artigo 193, somente serãoconsideradas atividades ou operações perigosas aquelas determinadas em regulamentos aprovados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, desde que por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado. j) NR-16 – Em cumprimento a esta determinação o Ministério do Trabalho e Emprego, baixou a Portaria nº 3.214/78 e aprovou a NR-16, que regulamenta e define quais são as atividades perigosas em seus sete itens e dois anexos. Estes tratam das atividades e operações perigosa com explosivos (Anexo 1) e com produtos inflamáveis (Anexo 2). Vale salientar que embora não esteja regulamentada nesta NR, também as atividades exercidas por empresas que exploram a energia elétrica são previstas como perigosas, nos termos da Lei nº 7.369/85. Esta lei também determina o recebimento pelos empregados deste setor (eletricitários) do adicional de periculosidade. Outrossim, outra profissão regulamentada, a de técnico em radiologia foi definida como atividade perigosa pela Lei nº 7.394/85. Após esta lei, o Ministério do Trabalho e Emprego baixou a Portaria n° 3.393/87, para acrescentar o anexo, que define como atividades e operações perigosas aquelas relacionadas à radiações ionizantes ou substâncias radiotivas, incluso o setor de radiologia. Segundo se infere dos quadros e determinações da NR-16 e do artigo 193 da CLT, o direito ao recebimento do adicional de periculosidade, pelo empregado das empresas que exercem as atividades regulamentadas, somente é gerado se aquele trabalha na área definida como de risco e tenha contato permanente (contínuo ou intermitente) com o fator ou agente perigoso. Portanto, não recebe o referido adicional o empregado que fortuitamente, eventualmente, entre na área de risco. E também deixará de recebê-lo, se parar de exercer a função perigosa e se afastar da área que ofereça os riscos. A simples redução dos riscos inerentes ao trabalho por medidas de segurança, obrigatória às empresas, conforme ordem constitucional (CF/88, art. 7º, inc. XXII), não desobriga o empregador de pagar o referido adicional, vez que as atividades tidas como perigosas pela lei ou NR-16, sempre oferecem perigo em potencial. As normas que tratam das atividades perigosas são de natureza compensatória, visto que determinam o pagamento de adicional de periculosidade no percentual de 30%, a ser calculado sobre o salário-base (sem outros acréscimos resultantes de gratificações, prêmios, etc.) a todo empregado que fique sujeito aos efeitos da periculosidade, por trabalhar em local cuja área é delimitada como de risco, independentemente de exercer ou não função em atividades legalmente consideradas perigosas. (CLT, 193, § 1º) E na hipótese, que não é rara, do empregado ficar exposto, simultaneamente, ao perigo e à insalubridade, ser-lhe-á facultado optar entre o recebimento do adicional de periculosidade ou insalubridade, vez que não lhe é permitido receber ambos ao mesmo tempo. (CLT, 193, § 2º). Algumas empresas brasileiras têm dado a merecida importância à Saúde e Segurança Ocupacional. Não se trata apenas de puro humanismo, mas de estratégia para obterem condições de concorrer no mercado global, que é muito exigente, especialmente no que tange à questão ambiental. Portanto, cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho faz parte da essência da vida das empresas, cujas atividades são voltadas para o comércio exterior. Por essa razão, atualmente, estas, além de se preocuparem em conseguir o certificado da Norma ISO 9000 (Qualidade Total) e Norma ISO 14000 (Proteção ao Meio Ambiente), já estão antecipando a implantação da possível Norma ISO 18000 (Sistemas de Gestão de Segurança e Saúde no Trabalho), que ainda se encontra em estudo. Convém mencionar que tais empresas, geralmente, estão em evidência e sofrem maior fiscalização por parte dos órgãos ambientais, inclusive, das Delegacias Regionais do Trabalho e Emprego, que exigem a implantação do Plano de Controle Ambiental (PCA). Ademais, visam também aplacar as pendências judiciais relacionadas a acidentes do trabalho (processos de criminais por lesões corporais, processos indenizatórios para reparação por danos materiais e morais, processos previdenciários regressivos) tendentes a complicar a vida empresarial, visto que ameaçam a estabilidade moral e econômica das empresas, podendo até mesmo impedir a viabilidade econômica daquelas de menor porte. Deduz-se, pelo enorme índice de acidentes laborais ocorridos neste país, segundo informações obtidas em sala de aula que, provavelmente, muitas empresas ainda não estão convictas dessa importância financeira, não percebem que é lucrativo investir em medidas de prevenção dos riscos de infortúnios no meio ambiente do trabalho. E muito menos estão imbuídas de ética humanista para implementá-las. Inclusive, sabe-se que algumas empresas procuram regularizar sua documentação conforme é exigido pelas normas de segurança e medicina do trabalho, mas esta fica engavetada, apenas para ser apresentada a algum fiscal desatento. Não implantam nem implementam as medidas preventivas, muitas vezes sob a alegação de impossibilidade de fazê-lo devido aos altos custos. 7.1 As normas previdenciárias e suas regras para seguridade do trabalhador acidentado ou sujeito aos riscos inerentes ao meio ambiente agressivo. Lei nº 8.212/91 Esta lei dispõe sobre os objetivos da Previdência Social e sobre o plano de custeio. No seu artigo 1º, define que Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinado a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência social. E completa em seu artigo 2º que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos. A lei previdenciária impõe no artigo 22, inciso II, a contribuição obrigatória da empresa para financiar o benefício relativo à aposentadoria especial e dos demais a serem concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho. E, também define que a contribuição deverá ser paga segundo o grau de risco de acidentes do trabalho de cada atividade. Assim, será de 1% (um por cento), se atividade preponderante for de risco leve; de 2% (dois por cento) se médio e 3% (três por cento) se grave, cujo percentual terá como base de cálculo o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos. Ainda quanto ao financiamento da aposentadoria especial, a lei de plano de custeio (Lei nº 8.212/91) é complementada pelo parágrafo 6º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que estabelece o seguinte: O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. Lei nº 8.213/91 Como já informado é esta lei que conceitua o acidente do trabalho (art. 19), define as características das doenças ocupacionais consideradas acidente de trabalho (art. 20) e estabelece outras formas de sinistros equiparados a acidentes do trabalho (art. 21). A. Responsabilidades de natureza previdenciária do empregador A lei nº 8.213/91 também determina nos parágrafos1º, 2º e 3º do artigo 19 algumas das responsabilidades da empresa. O teor desses dispositivos, além de coagir a empresa a cumprir as normas de segurança e saúde do trabalho, tem por finalidade resguardar o poder-dever da Previdência Social de multar as empresas violadoras das referidas normas, bem como de receber a indenização dos valores despendidos com o beneficiário acidentado (empregado ou avulso que presta serviço à empresa), em eventual ação regressiva contra a empresa, na hipótese de haver nexo de causalidade entre o acidente de trabalho e a culpa ou dolo desta (art. 120). Para tanto, reitera a determinação a respeito da obrigação da empresa de adotar o uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador e de prestar informações pormenorizadas sobre os riscos operacionais de sua atividade, inclusive, do manuseio de produtos agressivos à saúde. Estipula, logo a seguir, a responsabilidade penal para a empresa que deixar de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho, definindo tal conduta como contravenção penal, punível com multa. A Lei 8.213/91 também impõe à empresa a responsabilidade pela comunicação de acidente do trabalho (CAT) a ser feita à Previdência Social, cujo prazo é até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência do sinistro e, em caso de morte do segurado, a comunicação deverá ser imediata à autoridade competente, sob pena de multa, independente da iniciativa de outrem dar a informação (art. 22, caput c/c § 3º) Define como dia do acidente oriundo das doenças ocupacionais (doença profissional ou do trabalho), a data do início da incapacidade laborativa para o exercício da atividade habitual, ou o dia da segregação compulsória, ou o dia em que for realizado o diagnóstico, valendo para este efeito o que ocorrer primeiro (art. 23). Determina, ainda, que seja fornecida cópia fiel da comunicação de acidente do trabalho (CAT) ao acidentado ou a seus dependentes e ao sindicato da categoria (art. 22, § 1º). E, na ausência da emissão da CAT pela empresa, faculta ao próprio acidentado, aos seus dependentes, à entidade sindical competente, ao médico assistente ou qualquer autoridade pública, formalizar a comunicação sem determinação do prazo (art. 22, § 2º). A lei nº 8.213/91 ainda estipula outras obrigações para a empresa empregadora, vejamos: a) durante o período de afastamento do empregado segurado, a empresa arcará com o pagamento do salário integral do empregado durante os primeiros quinze dias de afastamento da atividade, por motivo de doença ou invalidez (art. 42, § 2º e art. 60 § 3º); b) A empresa, para fins da aposentadoria especial, deverá: - manter laudo técnico das condições ambientais do trabalho (LTCAT) atualizado, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista, que comprove a efetiva exposição de seus trabalhadores aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho, sob pena de multa (arts. 58 e 133); - no referido laudo técnico deverão constar informação sobre a existência ou não de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo (art. 58, § 2º); - elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico, abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento. (art. 58, § 4º). c) A empresa que dispuser de serviço médico, próprio ou em convênio, terá a seu cargo o exame médico e o abono das faltas correspondentes ao período de afastamento por motivo de doença, somente devendo encaminhar o segurado à perícia médica da Previdência Social quando a incapacidade ultrapassar 15 (quinze) dias (art. 60, § 4º). d) A empresa financiará a aposentadoria especial, a partir da contribuição prevista no artigo 22 desta lei, acrescida das alíquotas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão da aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. e) A empresa que garantir ao segurado licença remunerada ficará obrigada a pagar-lhe durante o período de auxílio -doença a eventual diferença entre o valor deste e a importância garantida pela licença, visto que o segurado empregado em gozo de auxílio-doença será considerado pela empresa como licenciado (art. 63). f) Impôs à empresa a garantia de estabilidade, ao segurado que sofreu acidente do trabalho, pelo prazo mínimo de doze meses, após a cessação do auxílio- doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente (art. 118). Para dar efetividade ao cumprimento das normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para proteção coletiva e individual do trabalhador, voltadas a prevenção do meio ambiente laboral (art. 19, § 4º), a Lei nº 8.213/91 incumbe os Ministérios do Trabalho e Emprego da Previdência Social de fiscalizá-las, bem como encarrega aos sindicatos e entidades representativas de classe pelo acompanhamento da implementação dessas medidas preventivas. E no seu artigo 120, a lei supra estabelece que nas hipóteses do descumprimento dessas normas pela empresa e, naturalmente, de ocorrência de algum sinistro em razão da negligência desta, à Previdência Social cabe propor ação regressiva contra os responsáveis. E, por fim, a lei previdenciária realça a independência das indenizações previdenciárias, da reparabilidade do direito comum ao determinar que "o pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem" (art. 121). 7.2 Responsabilidade objetiva da Previdência Social e os direitos do empregado acidentado É oportuno ratificar que compete à Previdência Social, a responsabilidade objetiva de indenizar o trabalhador vítima de acidente do trabalho. À Previdência Social, independenteme nte, da culpa do empregador cabe dar cobertura aos danos resultantes de acidente do trabalho, visto que se trata de um direito social do trabalhador, assegurado constitucionalmente. Assim, o empregado acidentado, ainda que a sua empresa empregadora não tenha recolhido as contribuições devidas à Previdência Social, dependendo dos efeitos do acidente que o acometeu, terá direito de receber, sem que lhe seja exigido qualquer prazo de carência: a)o auxílio-doença acidentário equivalente a 91% (noventa e um por cento) da média aritmética simples dos maiores dos salários-de-contribuição correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo (garantido o salário mínimo) a partir do 16º (décimo sexto) dia de afastamento da atividade, pelo período necessário para restabeleça a saúde e volte ao trabalho ou se aposente por invalidez, se seu caso for irrecuperável (art. 59 e ss); b)o auxílio-acidente correspondente a 50% (cinqüenta por cento) do salário- benefício a ser recebido logo após a cessação do auxílio-doença, a título de indenização, se as lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho o qual exercia habitualmente, independente do recebimento de salário ou outro benefício, exceto o de aposentadoria (art. 86 e ss); c)aposentadoria por invalidez, correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, se for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para oexercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Esta ser-lhe-á paga apenas enquanto permanecer nesta condição. O direito do segurado acidentado pode iniciar- se, conforme o caso: a) a partir do décimo sexto dia do afastamento da atividade; b) desde a data da entrada do requerimento, se entre o afastamento e a entrada do requerimento decorrerem mais de trinta dias; c) ou a partir da cessação do auxílio- doença. E ainda, terá o direito de acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento), se necessitar da assistência permanente de outra pessoa (art. 42 e ss); d)a assistência para reabilitação profissional e serviço social. Outrossim, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, caberá o direito à aposentadoria especial equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, desde que cumprida a carência legal (art. 57). Mas, se o acidente resultar em morte do segurado, seus dependentes receberão, em conjunto, a pensão por morte correspondente ao valor de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício (art. 74. e ss). É preciso vencer o dano, inimigo comum, fator de desperdício e de insegurança, lançando mão de todos os meios preventivos e repressivos sugeridos pela experiência, sem desmantelar e desencorajar as atividades úteis. Para tal conseguir não nos devemos encastelar dentro de princípios abstratos, ou de preceitos envelhecidos para a nossa época, só por amor à lógica dos homens, à vaidade das concepções, ou à intransigência de moralistas de gabinete. 8. DANOS ORIUNDOS DE ACIDENTES DO TRABALHO E A RESPONSABILIDADE DE REPARÁ-LOS 8.1 Teorias norteadoras da responsabilidade civil de repara r os danos provocados à vítima de acidente do trabalho A importância do equilíbrio e da harmonização social, a partir da reparação dos danos, torna o tema da responsabilidade civil ou penal um dos mais relevantes para as ciências humanas, espec ialmente para a jurídica. Portanto, aquele que por sua conduta ou exercício de atividade produz uma modificação negativa no mundo exterior, violando direitos de outrem, deverá responder pelos seus atos com fito de satisfazer não só o lesado, mas principalmente, visando a paz social. Mesmo porque "o anseio de obrigar o agente, causador do dano, repará-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça". Os imensuráveis e estarrecedores casos de acidentes do trabalho, na sua grande maioria oriundos do descaso dos empregadores em manter um meio ambiente laboral salutar e outras vezes pelos riscos próprios da atividade econômica das suas empresas, afrontam o princípio constitucional da dignidade humana e da integridade física, psíquica e moral do trabalhador. O acidente de trabalho é evento danoso tanto para a vítima quanto para seus dependentes e, em muitos casos, é irreparável, devido à extensão de seus efeitos. Mas se o direito à vida e à integridade física do trabalhador é violado pela ocorrência de sinistro relacionado ao meio ambiente laboral, ocasionando-lhe perda parcial ou total, temporária ou permanente da sua capacidade para trabalhar ou até mesmo a morte, tal dano deverá ser reparado, ao menos pelo seguro social, independent emente de culpa do empregado ou empregador, ainda que tal indenização apenas mitigue o mal sofrido. É imperiosa, portanto, a reparação do dano causado a outrem para, na medida do possível, desfazer seus efeitos funestos e restituir statu quo ante aquele que sofreu o prejuízo. Nos dizeres de Maria Helena Diniz "o interesse em restabelecer o equilíbrio violado pelo dano é fonte geradora da responsabilidade civil", independentemente de que a causa da lesão ao bem material ou moral, seja ato ilícito ou lícito. Porque também as atividades permitidas legalmente, mas que por sua natureza, impliquem em risco para os direitos de outrem, cria o dever de indenizar, bastando haver nexo de causalidade entre o dano e atividade de risco desenvolvida, sem levar em conta a existência de culpa do criador do risco (CCB, art. 927, par. único). Por sua natureza social, a responsabilidade civil decorrente de acidente do trabalho funda-se em norma cogente de caráter público elevado à categoria constitucional. A nossa Carta Magna assegura ao trabalhador, com base nos princípios da valorização do trabalho e da dignidade humana, o direito ao meio ambiente laboral salutar e entre outros direitos o "seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa" (CF/88. art. 7º, inc. XXVIII). E determina que a Previdência Social atenderá, em concorrência com o regime de seguro privado, a cobertura dos riscos de acidente do trabalho, inclusos eventos de doença, invalidez ou morte (CF/88, art. 201, inc I e § 10). Mas no que tange à reparação a lesão ao meio ambiente, inclusive, ao meio ambiente do trabalho, a Constituição, cujo bem maior protegido é a vida, determina também, em seu parágrafo 3º, artigo 225 que: As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. Na combinação desses dispositivos está delimitada a fundamentação legal e teórica para as normas infraconstitucionais relativas à reparação acidentária laboral, seja de cunho civil, administrativa ou penal. E, infere-se das normas mencionadas que a responsabilidade civil poderá ter natureza contratual ou extracontratual, cujos pressupostos básicos são: a ocorrência de dano, nexo causal entre o evento danoso e o dano e a causa oriunda de ato ilícito ou não. Sendo assim, o tema está compreendido tanto pelas teorias civilistas (teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva) quanto pelas teorias publicistas (teoria do risco ou da responsabilidade objetiva). 8.2 Teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva A ânsia de obter a reparação do dano é tão antiga quanto a origem do homem. Com fulcro na Lei de Talião, surgiu a justiça privada. Impunha-se a regra "olho por olho, dente por dente", ou seja, reparava-se o mal pelo mal. Inclusive, sequer verificava-se a existência ou não de culpa. Inúmeros abusos foram cometidos em nome da reparação do dano, que de reparação nada tinha, mas caracterizava como mera vingança e dano em dose dupla (da vítima e do ofensor). Percebeu-se que a vingança privada era contraproducente. Optou-se, pois, pela exceção do dispositivo da lei 11ª, tábua VII, ínsita na Lei das Doze Tábuas, cuja determinação era que "se alguém fere a outrem, que sofra a pena de Talião, salvo se existiu acordo " Assim, a composição das partes para reparar o dano, mediante pecúnia, transferia ao patrimônio do agressor que agira com culpa, o ônus da reparação. Entrou em vigor, nova lei romana – a Lex Aquilia de damno – que introduziu a culpa do agente como fundamento da sua obrigação de reparar o dano, mediante prestação de pena pecuniária. Surgiu a clássica teoria da culpa, cujo pressuposto básico para a concessão da reparação impõe que "o respectivo fato gerador seja moralmente imputável ao seu autor, isto é que se origine de sua vontade determinada ou de sua atividade consciente". Porque, "pela teoria da responsabilidade subjetiva ou da culpa (...) a obrigação de reparar o dano decorre do juízo de reprovação ao comportamento do agente". Segundo essa teoria, a obrigação de indenizar pressupõe a existência do elementosubjetivo: dolo (culpa latu sensu), em que o agente tem pleno conhecimento do mal e intenção de praticá-lo; ou a culpa stricto sensu, advinda da negligência, imprudência ou imperícia do agressor, que viola o dever de conhecer e agir de modo a não prejudicar outrem. Além de tal pressuposto, também são requisitos indispensáveis para configurar a responsabilidade civil subjetiva, a existência do dano contra o direito tutelado e o nexo causal entre o dano e o fato imputável ao sujeito agressor. Assim, se alguém pela sua conduta culposa, viola direito de outrem e causa- lhe prejuízo ou dano, tem o dever de indenizar. A tradicional teoria da culpa ainda é o principal fundamento da responsabilidade civil, vez que ninguém será obrigado a indenizar se não houver agido culposamente, salvo nos casos especificados em lei ou quando sua atividade seja perigosa e implique em risco para os direitos de outrem (CCB, art. 927, par. único). Exceto raras exceções, como na hipótese do dispositivo do parágrafo acima mencionado, que determina a responsabilidade objetiva, o nosso Código Civil acolhe a responsabilidade civil subjetiva e, em parte, adota o princípio gera l do processo civil, que incumbe a quem alega, o ônus de provar o seu direito e os fatos que o fundam, ou seja, cabe ao lesado provar a culpa do agressor. Contudo, em determinados casos, a teoria da culpa aproxima-se da teoria da responsabilidade objetiva ao aceitar a culpa presumida. Deveras, muitas são as hipóteses em que praticamente fica impossível ao lesado provar a culpa do responsável pela violação do seu direito. Uma delas é o que acontece nos casos de acidente do trabalho decorrente de culpa ou dolo do empregador (CF/88, art. 7º, inc. XXVIII). Em tais situações, como regra, se não houver a inversão do ônus da prova, dificilmente o lesado poderá provar a culpabilidade do empregador. Houve uma evidente evolução na teoria da responsabilidade civil nos últimos tempos, uma busca de socialização dos riscos. A aplicação pura da teoria da culpa, definitivamente, não se mostrou suficiente para atender às transformações sócio- econômicas da nossa época. Ratifica essa assertiva os dizeres de Maria Helena Diniz: A insuficiência da culpa para cobrir todos os prejuízos, por obrigar a perquirição do elemento subjetivo na ação, e a crescente tecnização dos tempos modernos, caracterizado pela introdução de máquinas, pela produção de bens em larga escala e pela circulação de pessoas por meio de veículos automotores, aumentando assim os perigos à vida e à saúde humana, levaram a uma reformulação da teoria da responsabilidade civil dentro de um processo de humanização. O primeiro passo foi admitir a presunção da culpa. Ardorosos defensores da culpa como fundamento da responsabilidade civil, os irmãos Mazeud, numa concepção moderna, ante as dificuldades encontradas para efetivar a reparação do dano, criaram a teoria da culpa sem imputabilidade moral, mediante o artifício da presunção juris et de jure, que na verdade foi uma transição para aceitar as novas teorias do risco, defendidas por Saleiles e Josserand, precursores da objetivação da responsabilidade civil, segu idos no Brasil, dentre outros, por Alvino Lima, Orozimbo Nonato, Aguiar Dias. Segundo Alvino Lima, para os aguerridos defensores da culpa como princípio moral basilar da responsabilidade civil, dentre eles Ripert, as teorias de presunção da culpa, na verdade, são mentiras jurídicas criadas para não dar o verdadeiro nome às coisas, para acobertar as novas tendências. Enfim, como assinalou o próprio Ripert, a tendência atual do direito, que a cada dia se concretiza mais, inclusive no direito positivo brasileiro, manifesta-se no sentido de substituir a idéia da culpa pela idéia do risco, a responsabilidade subjetiva pela responsabilidade objetiva, tudo em prol da socialização dos riscos. Teoria do risco ou da responsabilidade objetiva A impossibilidade de concretizar reparação dos danos oriundos de acidentes, especialmente, do trabalho, cujo número cresceu assustadoramente nos últimos tempos (com alguma redução no quadro do mercado de trabalho formal), determinou a insuficiência responsabilidade subjetiva. O operário hipossuficiente e vulnerável ou seus dependentes, sempre se encontraram em irrefragável desvantagem em relação ao poderio do empregador. Como provar a culpa deste? A lei que por um lado tutelava o direito à integridade física e a reparação dos danos ocorridos com a violação desse direito, praticamente, negava o efetivo direito de ação, ao dificultar (quase impossibilitar) a prova da culpa do empregador. Conceder o direito à reparação do dano aos lesados, mas negar-lhes, ainda que indiretamente, instrumentos para provar o direito, equivale à negação do direito. Surgiu a teoria do risco como fundamento da responsabilidade objetiva, ante a necessidade de amparar as vítimas de acidentes e tendo em vista os problemas sociais deles originados, principalmente, para o operário e sua família, cuja sobrevivência depende do trabalho. Esta teoria vem, portanto, como resposta aos anseios de ordem sócio -econômica. Como bem esclarece o árduo defensor da teoria do risco em nosso país, Alvino Lima, "a necessidade imperiosa de se proteger a vítima, assegurando-lhe a reparação do dano sofrido, em face da díspar entre as empresas poderosas e as vítimas desprovidas de recursos, (...) [torna] imprescindível, pois, rebuscar um novo fundamento à responsabilidade extracontratual, que melhor resolvesse o grave problema da reparação dos danos, de molde a se evitarem injustiças que a consciência jurídica e humana repudiavam". Para Saleiles, o precursor das bases de sustentação para a nova doutrina, desenvolvida por Josserand e seus seguidores "a teoria objetiva é uma teoria social que considera o homem como fazendo parte de uma coletividade e que o trata como atividade em confronto com as individualidades que o cercam". Segundo Sérgio Cavalieri Filho, a teoria do risco foi embasada sob vários prismas e podem ser identificadas em diversas modalidades a seguir expostas: a)Teoria do risco-proveito – funda-se essa teoria na idéia de que aquele que tira proveito da atividade danosa é responsável pela reparação do dano. Porém, aplica-se somente aos exploradores de atividades econômicas, e ao lesado impende provar a existência do proveito. b)Teoria do risco criado – por essa teoria "aquele que, em razão de sua atividade ou profissão, cria um perigo, está sujeito à reparação do dano que causar, salvo prova de haver adotado todas as medidas idôneas de evitá-lo" Dessa elucidação do Mestre Caio Mário se infere, que prescinde a prova do proveito da atividade. c)Teoria do risco profissional – esta teoria foi desenvolvida especificamente para justificar a reparação dos prejuízos advindos de acidentes do trabalho, e sustenta ser suficiente a lesão, seja em decorrência da atividade ou da profissão do lesado. d)Teoria do risco excepcional – voltada para responsabilizar exploradores de atividades de riscos coletivos (exploração de energia nuclear, materiais radioativos, ect.), que podem lesar até mesmo terceiros alheios a estas atividades. e)Teoria do risco integral – para esta teoria basta haver o dano para caracterizar o dever de indenizar. Não admite quaisquer causas excludentes da responsabilidade (culpa exclusiva da vítima, de terceiros, caso fortuito ou forç a maior). Cavalieri afirma que, em qualquer das modalidades, a teoria do risco se resume na seguinte afirmação: "Todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autore reparado por quem o causou, independentemente de ter ou não agido com culpa ". Por conseguinte, para assegurar o ressarcimento ao prejudicado, cabe verificar se ocorreu o evento e dele emanou o dano, não se cogitando da imputabilidade ou antijuridicidade do fato danoso. É satisfatória a relação de causalidade entre o prejuízo e aquele que materialmente o causou, isto é, basta o nexo causal entre o dano e o fato gerador. O agente deve ser responsabilizado pelo simples fato da ocorrência do fato danoso prejudicial a outrem, relacionado à atividade exercida, visto que aquele assumiu, ao explorá-la, todos os riscos a ela inerentes. 8.3 Responsabilidade civil: subjetiva ou objetiva e seus elementos Conforme o fundamento teórico adotado, a responsabilidade civil se apresentará como: subjetiva ou objetiva. Maria Helena Diniz afirma que "o dever ressarcitório pela prática de atos ilícitos decorre da culpa, ou seja, da reprovabilidade ou censurabilidade da conduta do agente (...) Portanto, o ato ilícito qualifica-se pela culpa. Não havendo culpa, não haverá, em regra, qualquer responsabilidade". (grifou-se). A culpa é elemento subjetivo moralmente imputável ao agente, conforme seja sua conduta reprovável, a partir o juízo de valor feito a respeito de sua capacidade intelectiva e volitiva (capacidade mental para ter consciência e vontade de praticar o ato). Daí, a responsabilidade civil sob o fundamento da culpa é conhecida como responsabilidade subjetiva. No direito civil brasileiro a norma fundamental da responsabilidade civil está gravada nos artigos 186 e 187 (parte geral) combinado com o artigo 927, caput, (parte especial) do Código Civil nos seguintes termos: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Conforme se deduz dos dispositivos acima, especialmente do artigo 186, a responsabilidade civil, a princípio, está intimament e ligada à existência de um ato ilícito (que pressupõe a culpa), cujos elementos constitutivos são: a)a conduta culposa (dolo ou culpa stricto sensu) – violação de dever jurídico preexistente (contratual ou legal), imputável a alguém (agente ou responsável legal) que por ato comissivo (intencional) ou omissivo (ausência do cuidado exigível) causou dano a outrem; b)o dano – é a lesão ao direito patrimonial ou moral da vítima causado pela conduta culposa do agente, ressarcível mediante pecúnia; e c)nexo causal – é a relação de causalidade entre o dano e a conduta do agente. Toda regra tem exceção. As exceções existem como forma de equilibrar, harmonizar situações fáticas e dar respostas aos anseios de justiça e paz social. A responsabilidade com base na culpa se tornou insuficiente para solucionar questões complexas em torno de eventos danosos oriundos dos riscos de determinadas atividades econômicas, especialmente dos eventos sinistros ocorridos no ambiente laboral. Como bem esclarece Maria Helena Diniz: ...a crescente tecnização dos tempos modernos, caracterizado pela introdução de máquinas, pela produção de bens em larga escala e pela circulação de pessoas por meio de veículos automotores, aumentando assim os perigos à vida e à saúde humana, levaram a uma reformulação da teoria da responsabilidade civil dentro de um processo de humanização. Este representa uma objetivação da responsabilidade, sob a idéia de que todo risco deve ser garantido, visando a proteção jurídica à pessoa humana, em particular aos trabalhadores e às vítimas de acidentes, contra a insegurança material, e todo dano deve ter um responsável. Surge, então, a responsabilidade com fundamento nos riscos da atividade (responsabilidade objetiva), cujos pressupostos são apenas a existência do prejuízo e a relação entre este e o evento danoso que o causou (nexo causal). O nosso atual código civil abre exceção ao instituto da responsabilidade subjetiva, mediante norma genérica ao determinar no parágrafo único do artigo 927, que: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (Destacou-se) Logo, o dever de reparar, em determinadas hipóteses, independe da existência ou não de ato ilícito, de conduta culposa. Basta o dever legal de indenizar ou que a atividade, por sua natureza, cause riscos aos direitos de outrem, segundo fundamento da responsabilidade objetiva. Nos próximos itens, serão expostas as características mais detalhadas dos elementos constitutivos das duas espécies de responsabilid ade civil – subjetiva ou objetiva – e sobre a aplicabilidade de ambas na solução dos danos advindos de acidentes do trabalho. Reparação das lesões acidentárias laborais e a responsabilidade civil subjetiva do empregador A responsabilidade civil subjetiva do empregador, além da previsão constitucional do artigo 7º, inciso XXVIII, última parte, encontra-se regulada nos artigos 186 e 187 combinado com o artigo 927, caput , do atual Código Civil. Com efeito, rezam esses novos comandos que, in verbis: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 927: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, é obrigado a repará-lo. Os dois primeiros dispositivos conceituam ato ilícito. Uma norma conceitua o ato ilícito comissivo ou omissivo, doloso ou culposo (art. 186) e a outra ato ilícito por abuso de direito (art.187). O comando da cabeça do artigo 927 evidencia que a espécie de responsabilidade civil adotada é a subjetiva, pois é imprescindível a existência de ato ilícito que por sua vez é indissociável da idéia de culpa (elemento constitutivo do ato ilícito). Ato ilícito se resume, segundo Sérgio Cavalieri, em "ato voluntário e consciente do ser humano que transgride um dever jurídico". Maria Helena Diniz ensina que ato ilícito é aquele, "praticado culposamente em desacordo com a norma jurídica, destinada a proteger interesses alheios. É o que viola direito subjetivo individual, causando prejuízo a outrem, criando o dever de reparar tal lesão". Portanto, o dever de reparar do empregador, segundo a teoria da responsabilidade subjetiva, pressupõe conduta ilícita (comissiva ou omissiva, dolosa ou culposa), dele ou de seu preposto, contrário a um dever jurídico, que viole o direito à segurança, à incolumidade de seus empregados, no ambiente laboral, lhes causando prejuízos (danos físicos ou psíquicos). 8.5 Pressupostos da responsabilidade civil subjetiva Deduz-se do item anterior, que são pressupostos básicos da responsabilidade civil subjetiva: o ato ilícito (conduta dolosa ou culposa); imputabilidade; dano e relação de causalidade entrea conduta e o dano. A. Conduta humana (dolosa ou culposa) A conduta humana exigida para caracterizar o ato ilícito é voluntária e consciente (aspecto psicológico, subjetivo), se exterioriza (aspecto físico ou objetivo) em uma ação ou omissão, em desacordo com um dever legal, isto é transgridem a lei preexistente. A ação ou conduta comissiva viola um dever geral de abstenção enquanto a conduta omissiva infringe o dever de agir. Ambas produzem conseqüências jurídicas ante a culpabilidade do autor. A culpa pode ser lato sensu, abrangendo o dolo (vontade consciente de violar o direito, dirigida à consecução do fim ilícito), ou culpa stricto sensu (violação de um dever que o agente podia conhecer e acatar, mas por ausência de cuidado não o fez). É importante assinalar que tanto o ato ilícito penal como o civil tem o mesmo fundamento moral: transgressão a uma obrigação jurídica preexistente (definida em lei) e a conseqüente imputação moral à consciência do agente (porque agiu deliberadamente com intenção de causar o dano ou porque não teve a cautela exigida para evitá-lo). O ilícito penal se configura quando a conduta infringe norma imprescindível à existência harmoniosa da sociedade, portanto consiste em ofensa à ordem social. Ocorre ilícito civil quando o ato viola direito subjetivo privado. Porém, o ilícito poderá ter natureza dúplice – civil e penal, se violação for atentatória de direito do particular e da sociedade concomitantemente. Não se pode olvidar que nos casos de acidentes do trabalho, mesmo que não haja dolo, os resultados advindos da exposição da vida ou da integridade física dos empregados a perigo (CP, arts. 132, 250, § 2º; 251, § 3º; 252, par. único; 271, par. único); quase sempre implicam em lesão (CP, art. 129, § 6º) ou morte da vítima (CP, art. 121, § 3º). Destarte, pode-se afirmar que nessas hipóteses, se for tipificada a conduta e não houver nenhuma excludente da antijuridicidade, o empregador responderá penal e civilmente. Contudo, a responsabilidade civil não está jungida à responsabilidade penal. Mesmo que ocorra a absolvição do réu por falta de prova de culpabilidade penal, é possível responsabilizar o empregador civilmente, visto que na esfera cível, basta a culpa levíssima. a) Conduta dolosa Pela conduta dolosa, a ação ou omissão do autor, origina de vontade consciente e deliberada de violar o direito de outrem e causar-lhe prejuízos. O dolo se caracteriza quando o agente ao omitir-se ou agir, tem a representação do fato e a vont ade de causar o resultado. Isto é, o agente tem a previsão do resultado e consciência da ilicitude de sua conduta e quer o resultado (dolo determinado) ou assume o risco de produzi-lo (dolo eventual), ficando indiferente se ocorrerá ou não o resultado danoso. b) Conduta culposa O agente que se conduz de modo contrário à conduta esperada do ser humano prudente e produz resultado indesejado, mas moralmente imputável, tem erro de conduta ou conduta culposa. É a culpa estrita que se origina de ação ou omissão voluntária do agente, o qual não previu (porém, deveria prever) e nem quis o resultado danoso, Então, segundo o clássico conceito de Planiol, "a culpa é a violação de uma obrigação preexistente", é a produção involuntária do resultado, por inobservância do cuidado objetivo (negligência, imprudência ou imperícia) e ausência de previsão objetiva (possibilidade de antever o resultado). São, portanto, elementos da culpa: a) conduta voluntária – vontade de fazer ou não fazer, porém, sem intenção de causar resultado danoso; b) previsibilidade objetiva – possibilidade de antevisão do resultado, porque a imprevisibilidade é causa excludente da culpa (caso fortuito ou força maior); c) ausência de previsão – o resultado poderia ter sido representado mentalmente, ter sido previsto segundo capacidade mental do homem comum, mas não o foi (é a imprevisão do previsível); d) falta de cuidado objetivo – exterioriza-se pela: 1) imprudência (é a conduta comissiva em desacordo com a cautela exigida, é a falta involuntária de observância de medidas de precaução e segurança, de conseqüências previsíveis, que se faziam necessárias no momento para se evitar um mal ou a infração da lei); 2) negligência (é conduta omissiva, é a omissão voluntária de diligência ou cuidado, falta ou demora no prevenir. O agente deixa de fazer algo imposto pela lei) e; 3) imperícia (é a falta de aptidão, habilidade, ou experiência, ou de previsão, ou de conhecime nto ou de prática do agente no exercício de sua atividade técnica); e) resultado involuntário – o agente não quis nem assumiu o risco de causar resultado danoso; f) nexo causal – relação de causalidade entre a conduta culposa e o resultado danoso. g) Imputabilidade – é o elemento constitutivo da culpa, relativa à consciência e vontade do agente. A imputabilidade pressupõe ação livre, consciente e capaz do agente. São excludentes de imputabilidade: a menoridade, a demência, anuência da vítima, exercício normal de um direito (o manifesto excesso implica em abuso de direito), legítima defesa e estado de necessidade. A.1 Classificação da culpa Segundo disposição didática de Maria Helena Diniz a culpa se desdobra em diversas modalidades, conforme: a) a natureza do dever violado – pode ser culpa contratual (violação de obrigação jurídica preexistente relativa a um contrato) ou culpa extracontratual ou aquiliana (se o dever violado for estabelecido em preceito genérico de direito, ou seja, princípio geral de direito que manda respeitar as pessoas e bens). b) a sua graduação – classifica-se em: grave ou lata (quando o agente atuar com grosseira falta de cautela; é a conduta injustific ável se comparado ao bom senso do ser humano normal; se aproxima do dolo); leve (quando a lesão poderia ser evitada por medidas de cautela ordinária, própria do homem comum) e levíssima (caracteriza-se pela falta de atenção extraordinária, ou especial habilidade e conhecimento singular). c) quanto ao seu conteúdo – existem as espécies: in commitendo (conduta comissiva, positiva, como imprudência e imperícia); in omittendo (conduta omissiva, negativa, negligência); in eligendo (oriunda da má escolha do representante ou preposto); in vigilando (ausência de fiscalização por parte do patrão das coisas e do exercício de atividade de seus operários); in custodiendo (ausência de cautela em relação à pessoa, coisa ou animal, que se encontravam sob os cuidados do agente). d) quanto ao conteúdo de sua apreciação – pode ser: culpa in abstrato (o agente atua sem a atenção própria do homem normal, em relação aos seus negócios fazendo uso da inteligência de que foi dotado), culpa in concreto (ausência da diligência necessária às pessoas em relação as suas próprias coisas, segundo as suas faculdades, aptidões ou dos seus defeitos psíquicos) e) culpa concorrente – é hipótese de concorrência de causas. A vítima, paralelamente à conduta culposa do autor do dano, concorre com atitude, também culposa (se fosse dolosa excluiria a ilicitude), para a ocorrência do evento sinistro. Nesses casos a jurisprudência consagra a redução da indenização da vítima. Sérgio Cavalieri Filho ainda cita mais duas espécies de culpa: a culpa presumida e a culpa contra a legalidade. Aquela decorre do próprio fato (in re ipsa), é presumida a partir das "próprias circunstâncias em que se dá o evento", bastando que o lesado prove o dano e a relação de causalidade entre este e a condutado agente. Ocorre culpa contra a legalidade quando a conduta é contrária a um dever expresso em dispositivo legal. B. Dano O dano é elemento essencial ou determinante da responsabilidade civil, seja objet iva ou subjetiva. Sem a ocorrência de prejuízo não há o que reparar. Imputar a alguém o dever de indenizar sem restar caracterizada a existência do dano (ainda que presumido), se traduz em ofensa ao princípio geral de direito que veda o enriquecimento sem causa. Por conseguinte, se o ato ilícito for de mera conduta, sem resultado (isto é, sem dano patrimonial ou extrapatrimonial, físico ou psíquico), poderá haver responsabilidade penal, mas não civil. Segundo Jorge Bustamante, existem danos justificados e danos ressarcíveis. Estes são os danos patrimoniais e extrapatrimoniais. Aqueles são os danos advindos de atos lesivos, que não acarretam o dever de indenizar. O dano pode ser justificado pela lei, como são as hipóteses de exclusão da ilicitude, legítima defesa, exercício regular do direito, estado de necessidade próprio ou de terceiro (se o dono da coisa lesada foi o culpado do perigo). Outrossim, as excludentes de causalidade (caso fortuito ou força maior, culpa exclusiva da vítima) justificam os danos. Contudo, há de convir que mesmo os danos justificados não deixam de violar as esferas patrimonial e/ou moral, apenas não são reparados por causa das excludentes acima citadas. Portanto, dano é uma lesão, um prejuízo oriundo de algum evento, que afeta um bem jurídico de uma pessoa (patrimonial ou moral), que poderá ser reparado ou não. B.1 Requisitos dos danos ressarcíveis O prejuízo ou dano deve ter requisitos próprios para exigir-se a indenização. O dano que dá ensejo à reparação é aquele que: a) Implica em diminuição ou destruição de um bem jurídico patrimonial ou extrapatrimonial da pessoa. Enquanto o primeiro gera prejuízo material econômico, passível de reparação, o segundo é insuscetível de apreciação pecuniária, por se tratar de lesão a bem integrante da personalidade humana. Mas, ambos são passíveis de reparação, pois evidenciam prejuízos reais. b) Deve ser certo, real e efetivo (salvo nos casos de dano presumido). Não basta ser eventual, não pode ser hipotético. O dano certo deve ser atual e determinado ou futuro e determinável (a conseqüência posterior do ato ilícito é o prolongamento do dano atual – é potencial. Por exemplo: A lesão de uma perna pode implicar na imediata amputação da mesma e em posterior necessidade de colocação de prótese). c) Deve ser comprovada sua existência em face do evento e a repercussão sobre o bem jurídico da pessoa lesada (nexo causal). Poderá ser direto (neste "há uma relação imediata entre a causa destacada pelo direito e a perda sofrida pela pessoa") ou indireto (conhecido como dano reflexo ou por ricochete, pois consiste "numa conseqüência da perda mediatamente sofrida pelo lesado, representando uma repercussão ou efeito da causa noutros bens que não diretamente atingidos pelo fato lesivo"). d) Deve ser subsistente – é aquele que ainda não foi reparado pelo responsável. Se a vítima ou terceiro reparou o dano, este ainda subsiste em relação ao seu responsável. O terceiro sub-roga nos direitos do prejudicado. e) Deve ser pessoal – o autor da ação de indenização deve ser titular do direito lesado (a vítima ou seus beneficiários, nas hipóteses legais de dano indireto, conforme dispõe artigo 948 do Código Civil Brasileiro e casos análogos). Assim, o dano ressarcível é aquele que provoca a diminuição ou destruição do direito patrimonial ou moral, experimentada pelo lesado, contra a sua vontade; que é subsistente, atual e determinado ou futuro e determinável e o agente ou responsável pelo evento danoso não está acobertado por qualquer forma de exclusão de ilicitude ou causalidade. B.1.2 Dano patrimonial O dano patrimonial é a afetação dos bens de uma pessoa, que lhe são economicamente úteis, o que, por conseguinte, lhe ocasiona perdas materiais. Para Maria Helena Diniz "o dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável". A mestra, embasada na lição de Aguiar Dias, aponta como lesões que constituem danos patrimoniais: "a privação do uso da coisa, os estragos nela causados, a incapacitação do lesado para o trabalho, a ofensa a sua reputação quando tiver repercussão na sua vida profissional ou em seus negócios" (grifou-se). O acidente do trabalho, por conseguinte, além de redundar em dano ao corpo do operário vitimado e ao seu patrimônio moral (porque o dano à vida, em todas as suas nuances, é desmedido e pode afetar os sentimentos do lesado), pode atingir, simultaneamente, a esfera patrimonial da vítima e de seus beneficiários, visto que dependem economicamente do trabalho executado pelo corpo agredido para viver. Frise-se, a vida não tem valor econômico em si mesma, é imensurável, mas as atividades intelectuais, as habilidades técnicas, o próprio corpo representam irrefutáveis meios de aquisição econômica. Quanto aos danos patrimoniais advindos de lesões ou morte do trabalhador, este ou seus dependentes têm direito à indenização dos prejuízos efetivos – de lucros emergentes – e os prejuízos com base no que, razoavelme nte, o lesado deixou de ganhar – lucros cessantes. (CCB, arts. 402 e 403 c/c 948, 949 e 950). Desta forma, nos termos do artigo 949 do Código Civil, se do acidente laboral resultar lesões corporais – ofensa à integridade corporal e à saúde da vítima – que diminua ou incapacite o exercício do trabalho, sem deixar seqüelas, o empregador somente será responsabilizado pela indenização das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença do lesado, salvo se este provar que sofrera algum outro prejuízo, como o dano moral, por exemplo. Todavia, se do acidente emanar defeito ou diminuição da capacidade ou incapacidade total pelo qual o empregado não possa exercer a sua profissão ou tenha diminuído o valor do seu trabalho, a indenização abrangerá uma pensão correspondente à importância do trabalho, no todo ou em parte (dependendo do grau de depreciação sofrida), além de todas despesas do tratamento físico e psíquico (valores inerentes às despesas médicas, de enfermagem, medicamentos, exames, próteses, etc.) e lucros cessantes até o fim da convalescença (CCB, art. 950). A indenização relativa à pensão a ser arbitrada judicialmente, poderá ser exigida de uma só vez, se assim o prejudicado preferir (CCB, art. 950, par. únic o). Vale ressaltar que quando a deformidade física oriunda do acidente for puramente estética, o que a priori enseja apenas danos morais, poderá também ocasionar danos patrimoniais, pois poderá repercutir nas possibilidades econômicas da vítima (quando esta tiver suas chances de trabalho reduzidas ou mesmo impossibilitada). Um exemplo clássico, é o caso da modelo publicitária, cuja profissão está intimamente ligada à beleza do corpo. Também outros profissionais, lesados esteticamente, que dependem da aparência física para exercer o trabalho, deverão ser ressarcidos com fulcro no dano patrimonial, além do dano moral. Deve-se evidenciar que as lesões corporais ou à saúde advindas do meio ambiente de trabalho inadequado não são apenas as físicas, podendo ser também de cunho psíquico (traumas, fobias, psicoses, etc.).Corrobora essa posição, Bento de Faria em seu comentário ao artigo 129 do Código Penal o qual dispõe sobre lesões corporais, ao asseverar que "o dano ao corpo ocorre quando a lesão determina qualquer prejuízo à integridade do conjunto orgânico da pessoa. Dano à saúde é a desordem causada às atividades psíquicas ou ao funcionamento regular do organismo". Dessa forma, as doenças psíquicas ou neurológicas se relacionadas ao trabalho, equiparam-se a acidentes do trabalho e podem atingir tanto os bens patrimoniais quanto os morais. Portanto, deverão ser indenizadas. Por exemplo, se o trabalhador devido às agressões físicas ou psíquicas (atividades de risco, extenuantes, etc.) sofridas no ambiente laboral, desenvolve alguma fobia, ou algum outro distúrbio mental, que o incapacita, parcial ou totalmente, para o exercício de sua profissão ou de qualquer outro trabalho, deverá ser indenizado. Se o acidente do trabalho ceifou a vida da vítima, presume-se que houve prejuízo de cunho moral para seus familiares (que normalmente, sentem a perda do ente querido), visto que os sentimentos afetivos são bens de valor inestimável. Porém, para os dependentes, aquela vida humana igualmente tem valor econômico, uma vez que era fonte de possibilidades econômicas. O dano, sob este prisma é patrimonial. Por essa razão, o legislador definiu mais um caso de dano indireto a ser indenizado, ao dispor no artigo 948 do atual Código Civil que: No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando- se em conta a duração provável da vida da vítima. Em síntese, o prejuízo ao patrimônio decorre da comparação entre o estado patrimonial de alguém antes da ocorrência do ilícito e depois da sua prática. E, a reparação material da vítima deverá se mostrar capaz de restituir-lhe ao status quo ante, da forma mais adequada possível. B.1.3 Dano extrapatrimonial O dano moral, em sua acepção ampla, é a lesão de interesses não patrimoniais do ofendido. É ofensa aos direitos personalíssimos: os sentimentos afetivos, a própria imagem, a intimidade e o decoro, o bom nome, a privacidade, a integridade física e psíquica, a honra, a vida, a dignidade da pessoa humana, a liberdade, a capacidade, e outros mais cuja ofensa causem angústia, aflição, dor, aviltamento, vexame à vítima. A reparação pecuniária dessa espécie de dano, por serem esses bens da vida inestimáveis, é mais uma mitigação do sofrimento, uma satisfação, do que uma indenização propriamente dita. Como bem afirma Maria Helena Diniz, não se dá preço à dor, aos sentimentos... Razão porque "a reparação pecuniária teria, no dano moral, uma função satisfatória ou compensatória". Exatamente por essa espécie de dano não se sujeitar à apreciação pecuniária e estar intimamente ligado à ética, muitos doutrinadores refutavam sua reparabilidade. Porém, tal espécie de dano sempre foi indenizável, pois no sistema jurídico brasileiro além das leis esparsas, o Código Civil de Beviláqua (Lei nº 3.071/16), já previa em seu artigo 159, 1.537, 1.538, genericamente, a reparação do dano moral e, especificamente, o dano contra a honra nos dispositivos dos artigos 1.547, 1.548, 1.550. A Constituição Federal de 1988 pôs fim à interminável discussão sobre o cabimento ou não da reparação do dano moral. Nossa Carta Magna determinou, de forma explícita, a reparabilidade do dano moral e, inclusive, permitiu a cumulação desta com a indenização do dano patrimonial (CF/88, art. 5º, V e X). E, agora, o novo Código Civil, em seu artigo 186 (correspondente ao artigo 159 do Código de 1916), estipulou, explicitamente, a reparação do dano moral, com a seguinte disposição: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Enfim, à luz do disposto nos artigos 1º, III, 4º, II, e 5º, V e X do nosso Texto Maior, o "direito mais fundamental do ser humano, que é o respeito a seus sentimentos mais nobres, cresce e toma a dimensão esperada e necessária". As relações de trabalho, por sua própria natureza (devido à desigualdade entre os pólos da relação: a supremacia diretiva e econômica do empregador e a hipossuficiência e vulnerabilidade do empregado) é campo fértil para acontecimentos ofensivos à personalidade humana e, via de conseqüência, é onde se propagam os danos morais – fonte de intranqüilidade social. A vida humana, por sua natureza ética, é bem de natureza não patrimonial. É um direito da personalidade amparada como bem maior pela ordem jurídica, vez que a existência humana é essencial às demais categorias de direito. Portanto, qualquer ofensa aos direitos a ela inerentes, como à incolumidade física e psíquica, à saúde, implica em ofensa moral direta, por ser imensurável. Dessa forma, os eventos sinistros ao meio ambiente de trabalho, que causam dano à integridade física e à saúde dos operários, afetam, conforme o que ordinariamente acontece, a esfera moral, do lesado. É causa de dano moral direto. Embora, como já afirmamos anteriormente, também possa ensejar dano material reflexo. Daí, resultar em cumulação de reparabilidade por dano moral direto e dano patrimonial indireto. Assim, com base no artigo 186 combinado com os artigos 948, 949 e 950 do Código Civil, todos centrados na citada norma constitucional (CF/88, art. 5º, inc. V e X), a vítima de acidente de trabalho poderá pleitear, cumulativamente, a indenização por danos patrimoniais e morais. É presumível o prejuízo resultante da dor imputada à pessoa da vítima que sofreu aleijão e redução ou incapacidade para realizar seu ofício. Essa presunção se alicerça nas condições psíquicas do ser humano comum em relação às conseqüências do dano corporal, pois, comumente, uma lesão corporal ofende o espírito do lesado, seus sentimentos, provocando-lhe tristeza, mágoa ou atribulações na esfera interna pertinente à sua sensibilidade. Observa-se, pelas pesquisas feitas sobre as decisões dos nossos tribunais, que há uma tendência em acatar a presunção do dano moral. Em regra, basta que o autor prove a existência do dano material, o nexo de causalidade imputável ao agente ou responsável pelo evento danoso para imputar-lhe também a obrigação de ressarcir o dano moral. Impende a este o difícil ou quase impossível ônus de provar a inexistência de ofensa aos sentimentos do lesado ou outra excludente de sua responsabilidade. Mas, se o dano à incolumidade física não acarretar seqüelas físicas ou neurológicas, o dano moral deverá ser provado, segundo se infere da última parte do artigo 949 do Código Civil. Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido. Nada impede ao lesado de pleitear a reparação por dano moral (a não ser sua própria convicção ética), visto que a incolumidade física é parte integrante do direito à personalidade, cuja natureza é extrapatrimonial. Se o acidente do trabalho resultar em morte da vítima, os ofendidos serão sempre indiretos (os beneficiários). Porém, os danos sofridos serão próprios (iure hereditatis) e por isso diretos. Segundo Bustamante, trata-se do prejuízo de afeto (pretium affectionis), provocado pela morte da pessoa querida. É sabido que a morte causa uma diminuição no patrimônio do(s) dependente(s) da vítima, além dos gastos com tratamento médico, se houver, e funeral. Há a frustração da possibilidade de continuar recebendo os alimentos por um futuro determinável e tudo mais que o de cujus poderia ter adquirido pelo seu trabalho durante o período estimativo de sobrevida que teria. Conseqüentemente, enseja indenização por dano patrimonial, nos termos do artigo 948 do Código Civil. Outrossim, é inquestionável que o homicídio é um dano à vida, e ordinariamente, viola o direito personalíssimo de seus entes queridos, aflige-os no âmago de seus espíritos. Por conseguinte, dá azo ao ressarcimento por dano moral, sendo prescindível a sua prova por parte do autor da ação indenizatória, pois esta é presumida, conforme tem admitido a jurisprudência pátria. Ocorre a inversão do ônus da prova, devendo o agente comprovar alguma causa excludente da sua responsabilidade ou mesmo a ausência do direito do autor, por falta de interesse de agir. Necessário registrar que, excepcionalmente, os parentes da vítima não sofrem com a sua perda. Embora seja comum o amor familiar, há casos em que os pais ou filhos da vítima nunca conviveram com a mesma, nem nutriram algum sentimento por ela, ou em algumas situações lhe têm, até mesmo, rancor e ódio. Conseqüentemente, nestes casos, não há que se falar em dor, nem em prejuízo de afeto, muito menos em dano moral. Evidenciou-se que, na maioria das hipóteses de danos procedentes de acidente de trabalho, raramente verifica-se o dano moral puro (aquele que se esgota na lesão à personalidade, como é, por exemplo, o caso de injúria, que não extrapola a esfera íntima da pessoa ofendida para lesar o seu patrimônio). Entretanto, é possível, embora a probabilidade seja mínima, cogitar ao menos um caso de dano moral puro, advindo de acidente do trabalho. É o dano puramente estético, sem repercussão patrimonial (considerando-se a inexistência de gastos com assistência médica ou que estes sejam ínfimos, o que é difícil ocorrer). Nesta hipótese, seriam as cicatrizes ou mutilações que não incapacitam ou reduzem a capacidade para o trabalho, mas aflige o espírito da vítima e é capaz de provocar compreensível diminuição da sua auto-estima. Portanto, verific ar-se-ia apenas um prejuízo de sofrimento psíquico, que constitui modalidade de dano moral puro ressarcível. Mas, não se pode olvidar que a lesão puramente estética, além de acarretar complicações psicológicas e íntimas de convivência com o ale ijão, extrai da vítima as chances de ascensão profissional e até mesmo pessoal, em face da sua baixa auto- estima e, geralmente, da conhecida repulsa preconceituosa do meio social em relação às pessoas que apresentem alguma deformidade. Conclui-se que, de ordinário, o acidente de trabalho provocará, cumulativamente, dano material e moral, o que impõe ao agente ou seu responsável o dever de indenizar ambos, uma vez comprovada a culpa (subjetiva ou objetiva) pelo sinistro, o dano e o nexo causal entre o dano e o evento danoso. C. Nexo de causalidade A relação de causalidade entre o dano e a ação ou omissão que o produziu é também elemento essencial para obrigar o agente ou responsável pelo dano a repará - lo, seja fundado na culpa objetiva ou subjetiva. Porque é somente mediante a existência de nexo causal entre o resultado danoso e a conduta ilícita, que tornará possível concluir quem foi o causador do prejuízo e quem deverá repará-lo ou se o lesado deverá suportá-lo sozinho. Como bem afirma Sérgio Cavalieri Filho, "só há dever de indenizar onde houver dano. Ninguém, entretanto, pode responder por um dano a que não tenha dado causa". E conceitua, logo a seguir, o nexo causal como elemento "decorrente das leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado". Maria Helena Diniz esclarece que nexo de causalidade é: O vínculo entre o prejuízo e a ação (...), de modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente ou como sua conseqüência previsível. Tal nexo representa, portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação que o produziu, de tal sorte aqui esta é considerada como sua causa. Todavia, não será necessário que o dano resulte apenas imediatamente do fato que o produziu. Bastará que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido. Este poderá não ser a causa imediata, mas, se for condição para a produção do dano, o agente responderá pela conseqüência. Conforme esse ensinamento da ilustre mestra, adota-se a teoria da equivalência das causas ou conditio sine qua non para precisar se houve ou não relação de causalidade entre o dano e a conduta ilícita. Pela teoria enunciada, todos os elementos que não puderem ser excluídos da linha de desdobramento causal são relevantes antecedentes causais do resultado. Utiliza-se do procedimento hipotético de eliminação de Thyrén. Para compreender esse procedimento, Damásio Evangelista de Jesus ensina que: O importante é fixar que excluindo-se determinado acontecimento o resultado não teria ocorrido "como ocorreu": a conduta é causa quando, suprimida mentalmente, o evento in concreto não teria ocorrido no momento em que ocorreu. É interessante salientar que, não raro, as causas de um dano são múltiplas, o que dificulta a definição do agente responsável pela sua reparação. Pode haver causas concorrentes provenientes da vítima e do agente. Também existem as concausas: preexistentes, concomitantes ou supervenientes ao evento danoso, que podem ser absoluta ou relativamente independentes em relação à conduta do agente. Nas hipóteses da existência de concausas, pela teoria equivalência dos antecedentes causais, as causas absolutamente independentes da conduta do sujeito apontado como responsável pelo evento danoso excluirão o nexo causal entre a conduta deste e o dano. porque "se a causa, preexistente, concomitante ou superveniente, produz por si mesma o resultado, não se ligando de forma alguma com a conduta, em relação ao evento ela é uma não-causa", uma vez que não se encontra na "linha de desdobramento físico" do comportamento do agente. Também a causa superveniente relativamente independente, entendida como aquela que produz o resultado por si só, mas em face da conduta anterior, exclui a causalidade entre esta e o dano posterior. Um exemplo clássico dessa excludente de causalidade é o episódio do trabalhador que foi obrigado a usar uma escada em más condições, razão porque caiu e quebrou a perna. Internou-se no hospital para os procedimentos necessários ao tratamento médico e morreu vítima de um incêndio em seu quarto. A interdependência das causas existe porque se o operário não tivesse quebrado a perna não teria sido vítima do incêndio. Nesse caso, se adotada a teoria conditio sine qua non, o empregador responde apenas pela prática dos atos anteriores, mas não quer dizer que não tenha dado causa ao resultado morte. Caso contrário, se é a conduta do empregador, causa superveniente relativamente independente, ele ou o seguro social responderá pela indenização, conforme o evento ocorrido. É o que se depreende da lei acidentária (Lei nº 8.213/91 art. 20, inc. II), cuja norma estabelece que se causas posteriores, relacionadas às condições inadequadas do meio ambiente laboral, desencadeiam ou agravam uma doença pré-existente, ainda que tais causas sejam relativamente independentes, elas têm o condão de impor à Previdência Social a obrigaçãode indenizar a vítima, e se a conduta do agente (preposto ou empregador) foi culposa este deverá reembolsar o Seguro Social. Já as causas preexistentes e concomitantes relativamente independentes não excluem o resultado, segundo informa Damásio. Sérgio Cavalieri Filho assegura, no entanto, que os melhores doutrinadores, dentre eles o reverenciado civilista Aguiar Dias – "papa em responsabilidade civil", sustentam que a teoria da equivalência dos antecedentes elaborada por Von Buri, embasado nas idéias de Stuart Mill, tem ampla aplicação no Direito Penal de muitos países, inclusive no Brasil, mas na órbita do Direito Civil, a teoria acolhida por nosso sistema civilista é a teoria da causalidade adequada de autoria de Von Kries. E, diz também, que embora nosso Código Civil não adote, expressamente, nenhuma delas, faz uma referência à teoria da causa adequada (CCB, art. 403), ao determinar que "as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato", ou seja, somente a causa mais apropriada, mais direta e imediata é relevante para imputar o causador do dano. (Grifou-se) Aguiar Dias, citado por Cavalieri Filho, enfatiza sua defesa da aplicabilidade da teoria da causa adequada, para melhor solucionar as questões de responsabilidade civil nos seguintes termos: Consideramos em culpa quem teve não a last chance, mas a melhor oportunidade, e não a utilizou. Isso é exatamente uma consagração da causalidade adequada, porque, se alguém tem a melhor oportunidade de evitar o evento e não a aproveita, torna o fato do outro protagonista irrelevante para a sua produção (...)". "Em lugar de se apurar quem teve a última oportunidade (como sustenta a teoria norte-americana – last clear chance), o que se deve verificar é quem teve a melhor ou mais eficiente, isto é, que estava em melhores condições de evitar o dano; de quem foi o ato que decisivamente influiu para o dano. Por esta teoria, somente o fato, a condição mais adequada, mais idônea para determinar o evento danoso é a causa deste. Existem muitas teorias visando dar a solução mais apropriada para definição da causa ou causas do dano na busca de sua justa reparação. Mas, de acordo com as doutrinas estudadas para a execução deste trabalho, as duas teorias citadas são as mais importantes. Percebe-se que Sérgio Cavalieri Filho é tendente a se posicionar mais favoravelmente à aplicabilidade da teoria da causalidade adequada, porém, ele afirma com sensatez, pela sua experiência na magistratura, que: ...forçoso é reconhecer que o problema da causalidade não encontra solução numa fórmula simples e unitária, válida para todos os casos. (...) E assim é porque esta ou aquela teoria fornece apenas um rumo a seguir, posto que a solução do caso concreto sempre exige do julgador alta dose de bom senso prático e da justa relação das coisas..." Outro ponto que não poderia deixar de ser abordado neste trabalho refere-se à causalidade da omissão, tendo em vista que o maior número dos acidentes do trabalho é proveniente das omissões dos empregadores. O nexo causal é analisado segundo as leis naturais e, normalmente, diz respeito aos elementos objetivos, porém, quando se trata de omissão esta não pode ser analisada apenas sob a ótica física ou natural, por ser uma ausência de comportamento. Daí o jargão: "do nada, nada surge". Para elucidar esse entendimento, mais uma vez, transcreve-se a sucinta e clara explicação de Damásio: ....a estrutura da conduta é essencialmente normativa, não naturalística. A causalidade não é formulada em face de uma relação entre a omissão e o resultado, mas entre este e a conduta que o sujeito estava juridicamente obrigado a realizar e omitiu. Ele responde pelo resultado não porque causou com a omissão, mas porque não o impediu realizando a conduta a que estava obrigado. Ante o exposto, chega-se a duas conclusões: 1) se o empregador cumpre com desvelo seu dever jurídico de zelar pelo meio ambiente laboral, torna efetivas as normas de higiene e segurança do trabalho, provando que não houve de sua parte, a mais leve culpa, não pode ser acusado de omissão e, portanto, não poderá ser obrigado a indenizar, se eventualmente, houver um acidente do trabalho; 2) se não houver regra geral ou específica que determine "um dever jurídico de agir, a omissão não terá relevância causal e, conseqüentemente, nem jurídica". Ressalvam-se as hipóteses, em que, eventualmente, os jurisconsultos acolham a responsabilidade fundada na teoria do risco da atividade econômica, ao considerar a natureza perigosa do empreendimento. Neste caso, o nexo causal liga o prejuízo ao evento danoso, cuja culpa do empreendedor é presumível, uma vez que este assume os eventuais riscos de sua atividade. Inclusive, assume a possível a ocorrência de sinistros, pois tem ou deveria ter consciência de que mesmo sendo tomadas as medidas obrigatórias de segurança e higiene do trabalho, não está completamente livre dos acidentes de trabalho, dado o grau de perigo da atividade exercida. (CLT, art. 2º c/c CCB, art. 927, par. único, última parte). Dessa forma, é conveniente aos empresários que se ocupam de atividades econômicas lícitas, porém, perigosas, a contratação de seguro privado complementar ao seguro social, vez que assumem os riscos da atividade. Ademais, enfatiza-se, nos casos de responsabilidade subjetiva, basta que haja culpa levíssima do empregador para obrigá-lo a reparar o dano. Enfim, tanto o nexo causal como o dano são pressupostos indispensáveis para imputar ao agente ou responsável, a obrigatoriedade de indenizar o lesado, seja com fulcro na culpa objetiva ou subjetiva. E por essa razão, pelas obras dos doutrinadores e jurisprudências pesquisadas, verifica-se que, ao autor da ação indenizatória impende provar pelo menos esses dois elementos. Já no que tange a comprovação da culpa, poderá haver a inversão do ônus da prova, se a culpa for in vigilando ou presumida, segundo a teoria da responsabilidade subjetiva. E pela responsabilidade objetiva, a culpabilidade é indiferente, basta que o lesado comprove o dano e o nexo causal. Presunção de culpa do empregador e a inversão do ônus da prova – valioso instrumento de efetivação da eqüidade e justiça processual Segundo Alvino Lima a culpa presumida é o artifício da presunção juris et de jure. Tratam de "mentiras jurídicas" sustentadas pelos defensores da culpa como fundamento para responsabilidade civil (Irmãos Mazeud, De Page, Pirson, Harven e outros). Ante a insuficiência da teoria pura da culpa para solucionar, com justiça, algumas questões complexas oriundas de eventos danosos, estes doutrinadores sustentam a culpa sem imputabilidade moral, chamada culpa objetiva, ou a culpa legal ("criada pelo legislador, por necessidades de ordem econômica ou social"). Qualquer dessas espécies de presunção de culpa (legal ou objetiva) pressupõe a inversão do ônus da prova, em que o agente ou responsável pelo evento danoso só se exime de reparar o prejuízo se provar alguma das excludentes de responsabilidade: culpa exclusiva da vítima, culpa de terceiro, caso fortuito ou força maior. Uma vez consagrada, em nosso direito pátrio, a culpa subjetiva do empregador nos casos de acidentes do trabalho, muitas foram e ainda continuam sendo as injustiças cometidas pelas decisões judiciais, que tratam das ações reparatórias civis referentes aos prejuízos originados por eventos sinistros no ambiente laboral, ante a ausência de provas nos autos processuais. Ora, é conhecida a hipossuficiência e vulnerabilidade dos operáriosfrente o poderio sócio-econômico dos seus empregadores. Tanto é que um dos princípios que orientam o direito do trabalho é o princípio protetor, que visa igualar juridicamente, empregadores e trabalhadores. A bem da verdade, ignorando esse princípio, a norma processual trabalhista segue a regra geral do processo, determinando que a prova das alegações incumbe à parte que as fizer (CLT, art. 818). Mas convém salientar que para toda regra há exceções, com fito de dar o equilíbrio social aspirado por muitas consciências ávidas de justiça. Razão porque em hipóteses análogas de hipossuficiência e vulnerabilidade, como é o caso do consumidor, já se encontra positivada a inversão do ônus da prova, conforme está explícito no inciso VIII, do artigo 6º do código consumerista. São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do Juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; Tal regra pode e deve servir como base para interp retação analógica com a finalidade de sustentar a inversão do ônus da prova, em hipóteses de acidente do trabalho, visto que os empregados, sequer, têm acesso às documentações que comprovem a efetivação das medidas de segurança e medicina do trabalho e, geralmente, não têm condições financeiras para pagar a perícia técnica exigida nesses casos. Na realidade, no dizer sempre preciso de Sérgio Cavalieri, "a prova da culpa, em muitos casos, é verdadeiramente diabólica, erigindo-se em barreira intransponível para o lesado". Observa-se, que alguns doutrinadores e jurisconsultos, com o escopo de solucionar eqüitativamente, as ações indenizatórias civis a cargo do empregador, utilizam-se do artifício da culpa presumida. Sustenta-se a tese vestuta, mas justa, de que se o empregador tem o dever contratual-legal de velar pela segurança, higidez e incolumidade de seus trabalhadores, de zelar pelo meio ambiente laboral, mediante a implementação das normas de segurança e medicina do trabalho, de documentar esses procedimentos, a ele cabe comprovar que cumpriu as determinações legais. Assim, na ocorrência de acidente do trabalho, presume-se a culpa do empregador, sobretudo se a atividade empreendida por ele é de natureza perigosa, isto é, oferece riscos para incolumidade física e psíquica de seus trabalhadores. Inverte-se, pois, o ônus da prova. O empregador é responsável a menos que comprove que tomou realmente todas as medidas de segurança necessárias ou a existência de uma causa excludente da responsabilidade: caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. Ao autor da ação basta provar o dano acidentário e o nexo causal. Igualmente, há decisões, que argumentam ser a responsabilidade civil presumida, baseada na culpa in vigilando, pois, o empregador tem o dever de vigiar, fiscalizar as coisas (maquinários, produtos, etc.) e as atitudes de seus empregados. Então, aquele será responsável, salvo se provar que cumpriu o dever de vigilância ou outra excludente de sua responsabilidade. Vale lembrar que, ao deixar o empregador de cumprir as determinações legais ou regulamentares do sistema de segurança e saúde do trabalho, este foi negligente. E, se dessa negligência decorreu o acidente (nexo causal), incorre o empregador, só por este fato, em culpa, conhecida como culpa contra a legalidade. Causas excludentes da responsabilidade subjetiva por culpa presumida O empregador exime-se da responsabilidade civil por culpa presumida, se comprovar a interrupção da relação de causalidade quando: a) Houver culpa grave e exclusiva da vítima – a guisa de exemplo: 1) a própria vitima provoca o acidente intencionalmente (presença de dolo); 2) a vítima trabalhava em ambiente adequado, em conformidade com as exigências legais, sob condições comuns, sem causas extenuantes das forças físicas e psíquicas, mas se acidentou, porque mesmo tendo sido advertida, desacatou às orientações e exigências de cautela dadas pelo empregador ou preposto (presença de descaso intencional ou de culpa consciente). b) Força maior – É um acontecimento previsível ou não, mas inevitável e estranho à vontade das partes, proveniente de eventos da natureza: como um raio, uma tempestade, etc. c) Caso fortuito – É imprevisível e inevitável, proveniente de ato humano, de terceiro alheio ao ambiente laboral, que não tenha sequer ligação indireta com o empregador. Portanto, é causa estranha à atividade e vontade deste. Por exemplo: 1) o descarrilamento de um trem, nas imediações da fábrica, provoca uma explosão, sinistro que deu causa à morte do empregado; 2) Falha da Administração Pública, pela ausência de serviços de limpeza dos bueiros e galerias de águas pluviais, causa da enchente que vitimou o empregado. Responsabilidade civil objetiva para reparação de acidentes do trabalho A infortunística, matéria legal que trata dos riscos das atividades econômicas, especialmente dos riscos de acidentes do trabalho e doenças profissionais, tem por fundamento a teoria do risco. Por essa razão as leis acidentárias do sistema jurídico de vários países, inclusive no Brasil, para dar respaldo aos anseios dos cidadãos ávidos por justiça, consagraram a aplicação da responsabilidade objetiva para a reparação dos danos às vítimas de infortúnios relacionados ao meio ambiente do trabalho. Vale ressaltar que em nosso país, o dever da Previdência Social de indenizar por acidente do trabalho tem fulcro na teoria do risco integral. Basta o obreiro ou seus dependentes provar a relação de emprego e que o dano foi decorrente de uma situação relacionada ao seu trabalho. Não afastam seus direitos as tradicionais causas excludentes ou atenuantes da responsabilidade: culpa exclusiva da vítima, força maior, caso fortuito ou fato de terceiro. Assim, como já está previsto no sistema jurídico pátrio, a responsabilidade para indenizar sem culpa, advém de determinação legal. Várias legislações (Decreto Legislativo nº 3.724/19, Decreto nº 24.637/34, Decreto nº 7.036/44, Decreto-lei nº 293/91, Lei nº 5.316/67, Lei nº 6.367/76) trataram da infortunística. Hoje a lei acidentária (Lei nº 8.213/91), que é obrigatória e impositiva, estipula em dois prismas a responsabilidade objetiva para assegurar a relaç ão jurídica do seguro social e o direito de reparação da vitima de acidente. Por um lado, impõe ao empregador responsabilidade objetiva de natureza previdenciária – o ônus de arcar com a manutenção do seguro coletivo para reparação dos danos decorrentes de acidente do trabalho, haja ou não ocorrência de sinistros relativos ao seu empreendimento, além obrigá-lo a arcar com a responsabilidade de natureza trabalhista de pagar os primeiros quinze dias de afastamento do empregado e de garantir-lhe a estabilidade acidentária de um ano, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente, conforme previsão nos artigos 29 e 118, respectivamente, da Lei 8.213/91. Por outro lado, impõe à Previdência Social, a responsabilidade objetiva de dar cobertura à vítima que provar sua relação de emprego e o nexo causal entre o acidente e a atividade profissional exercida, indenizando-a, independente desta ter recebido as parcelas do seguro do empregador, cabendo-lhe cobrar deste as contribuições previdenciárias devidas. Entretanto, não se pode esquecer que embora o empregador se responsabilize objetivamente pela manutenção do seguro social, esteou os seus prepostos não estarão livres de ressarcir à Previdência Social dos gastos inerentes a cobertura indenizatória, se foram negligentes quanto à implementação das normas de higidez e segurança do trabalho. À Previdência Social foi assegurado o direito de regresso, contra eventuais responsáveis pelo acidente do trabalho, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91. A função teleológica da lei acidentária é assegurar o mínimo ao trabalhador acidentado e evitar que a vitima de sinistro trabalhista fique desamparada, caso não obtenha a reparação do dano sofrido segundo as normas do direito comum. Outra finalidade, também de cunho social, é impedir o fim de pequenas empresas que não suportariam o ônus da indenização. Razões porque buscou-se a socialização dos riscos, mediante a seguridade social. Vale evidenciar que a extensão da reparação do infortúnio é definida nos limites previstos na lei. Assim, se fica assegurado ao lesado o direito de indenização, em contrapartida, o seguro social não cobre todos os prejuízos causados pelo acidente, sendo o ressarcimento menor do que aquele que poderia ser conseguido segundo as normas gerais de indenização, embasadas na culpa do causador do dano. Mas Helvécio Lopes diz que há uma compensação tanto para o empregador quanto para o empregado. Este sempre será indenizado, embora com valor menor, sem necessitar provar a culpabilidade daquele. O empregador, por sua vez, é obrigado a custear o seguro social, independentemente da ocorrência de acidente, mas se livrará de pagar uma indenização maior se houver o sinistro e a ação reparatória. Para Washington de Barros Monteiro, "tudo se resolve, pois, sob a égide do risco profissional; o exercício de sua atividade expõe o operário a vários acidentes; é justo que esse risco seja compartilhado pelas duas partes, pelo patrão e pelo empregado". Depreende-se, dessas afirmações, que o mestre entende como razoável e normal que o risco de acidente do trabalho seja partilhado entre empregador e empregado. Aquele cabe pagar o seguro social e garantir a estabilidade no emprego por doze meses, enquanto este corre o risco de se acidentar e ter redução de suas habilidades para o trabalho e, na maioria das vezes, receber os valores de auxílio- doença ou da aposentadoria por invalidez ou especial inferiores à remuneração que receberia se não fosse vítima de acidente, haja vista ser a indenização compatível com o salário-contribuição e não com o salário real. Mas tal situação é inaceitável, ao se considerar a superioridade do valor da vida humana e que a maioria dos operários não tem opção de querer este ou aquele trabalho. Ademais, legalmente, é o empreendedor que se responsabiliza pelos riscos de sua atividade (CLT, art. 2º, Lei nº 9.477/97, art. 2º, § 4º). E segundo impõe norma constitucional, a empresa deve cumprir sua função social (CF/88, art. 170, inc. III). Maria Helena Diniz justifica que o empregado terá a priori o direito a reparação previdenciária e "terá direito a uma reparação civil somente se ficar provado que houve dolo ou culpa do empregador no evento que lhe foi danoso, pois este já indeniza o empregado, que exerce atividade perigosa, mensalmente, com o adicional de periculosidade". Há de se esclarecer que os adicionais (periculosidade, insalubridade e penosidade) embora aparentem ter natureza indenizatória, têm caráter salarial, são complementos de salário. Segundo ensina Mascaro, baseado na lição do tão festejado economista Adam Smith, a taxa salarial sofre as influências das condições em que é prestado, ou seja, os salários variam de acordo com a facilidade ou dificuldade, limpeza ou sujeira, dignidade ou indignidade do emprego. Assim, os adicionais de periculosidade e insalubridade integram o salário e repercutem no preço médio da força do trabalho, embora sejam compulsórios. Corroboram essa assertiva as palavras de nosso Professor César. Machado Jr.: "Os adicionais também são parcelas de natureza salarial concedidos em vista da execução de serviços em situações mais desfavoráveis ou gravosas." Salário é uma contraprestação do serviço executado, que obriga o empregador. A obrigação é um dever jurídico originário, enquanto a responsabilidade de indenizar é um dever derivado ou sucessivo. Esta surge a partir da violação do dever originário. Expostas essas definições, com o devido respeito pela nossa ilustre catedrática civilista, não se pode concordar que a natureza dos adicionais de periculosidade seja indenizatória. E ainda que fosse, não seria justificativa para impedir que a vítima de acidente laboral tenha respaldo na teoria do risco para exigir indenização do seu empregador, mas se restrinja apenas à teoria da responsabilidade subjetiva. Ao contrário, muitas vezes pagar tais adicionais já evidenciam o risco da atividade e nem sempre se comprova que foram tomadas todas as medidas necessárias para redução ou eliminação dos elementos nocivos à integridade física dos trabalhadores, conforme impõem as normas de segurança e saúde do trabalho. O único e intransponível obstáculo para o uso indiscriminado da teoria da responsabilidade objetiva do empregador, já consagrada em matéria de infortunística é de cunho constitucional, conforme se infere do Texto Maior em seu artigo 7º, inciso XXVIII, que estipula o dever do empregador de indeniz ar apenas quando ficar comprovado que este agiu com dolo ou culpa para a ocorrência do acidente. Ao analisar as várias doutrinas e jurisprudências, observou-se que é predominante o entendimento quanto às questões acidentárias trabalhistas, que a reparação do dano implica em responsabilidade objetiva da Previdência Social e subjetiva do empregador. Também verificou-se, que a teoria da culpa como fundamentação da reparabilidade do dano decorrente de acidente do trabalho, por parte do empregador, não é satisfatória. Porquanto, a reparação de natureza previdenciária, em muitos casos, não mitiga os infortúnios dos lesados. Outrossim, ainda que tivessem natureza indenizatória os adicionais de periculosidade, especialmente, os irrisórios adicionais de insalubridade, não compensam as mutilações e doenças profissionais adquiridas em ambiente laboral inadequado. 8.9 Clamores pela responsabilidade objetiva do empregador pelos riscos de sua atividade e a barreira constitucional. A partir da insatisfação com a responsabilidade objetiva parcial do empregador (que responde objetivamente, segundo a lei previdenciária, pelos encargos do seguro social) e, principalmente, ante o descaso de inúmeras empresas no que tange a efetivação das normas de segurança e higiene do trabalho e dos princípios da valorização do trabalho e da dignidade humana e do conseqüente aumento estarrecedor dos números de acidentes laborais, muitos operadores do direito passaram a defender teses para impor ao empregador a responsabilidade objetiva de indenizar diretamente ao empregado, ao menos nos valores que não são cobertos pelo seguro social. Em artigo da Revista Consultor Jurídico a advogada Nadia Demoliner Lacerda afirma terem os defensores da responsabilidade objetiva total do empregador nas hipóteses de acidentes laborais, festejado a determinação do parágrafo único, do artigo 927 do atual Código Civil, que prevê responsabilidade objetiva do empreendedor, para a reparação dos danos ocasionados ao trabalhador lesado, advindos da atividade, por aquele exercida, cuja natureza é perigosa e oferece riscos para os direitos de outrem. Diz, ainda, que estes doutrinadores estão equivocados ao interpretarem, sob a égide desse comando, que o empregado acidentado ou seus beneficiários conseguiriam a condenaçãodo empregador ao pagamento de indenização sem a necessidade de provar a sua culpa. Afirma também, que esta interpretação é inconstitucional (conforme aplicação do critério hierárquico lex superior derogat inferiori, para verificar a validade e eficácia da norma), pois, em regra, a responsabilidade do empresário com fulcro no risco do empreendimento (CCB, art. 927, par. único), pode ser aplicada a outros casos e não às hipóteses de indenização dos danos procedentes de acidentes do trabalho, sob pena de inconstitucionalidade. Concorda-se, em parte, com a autora, visto que a Constituição Federal consagrou no inciso XXVIII do artigo 7º, a responsabilid ade subjetiva do empregador para reparar os danos oriundos de acidentes do trabalho, salvo a exceção constitucional do parágrafo 3º do artigo 225. Contudo, a norma civilista refutada por ela, ao menos, serve de respaldo para a presunção da culpa do empreendedor que assume os riscos de sua atividade, inclusive de eventuais sinistros laborais, o que pressupõe a inversão do ônus da prova. Vale lembrar que a indenização por acidente do trabalho, embasada na responsabilidade objetiva em matéria de infortunística, é exigida porque há um risco potencial na atividade empresarial desenvolvida pelo empregador. Logo, por esta mesma razão este tem o dever de assumir os riscos dela provenientes, independentemente de culpa (CF/88, art. 7º, inc. XXVIII c/c CLT, art. 2º e CCB, art. 927, par. único), e deverá arcar com os ônus do seguro social e também demonstrar que tomou todas as medidas necessárias e possíveis para evitar a ocorrência do sinistro, sob pena de responder civil e penalmente (CF/88, art. 225, § 3º c/c Lei nº 6.938/81, art. 14, § 1º e Lei nº 8.213/91, art. 120). Frise-se, embora o preceito do parágrafo único do artigo 927 não se aplique diretamente a todos os casos de acidentes laborais, ele enseja a presunção da culpa do empregador. Para evidenciar a culpa presumida nesses casos com fundamento do referido dispositivo, é conveniente registrar que este guarda relação com a lei penal, que estabelece como conduta culposa, o simples fato de "expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente" (CP, art. 132), para configurar o crime de perigo. É desnecessária a ocorrência de qualquer dano, porque se dessa exposição resultar lesão ou morte, a conduta do agente será enquadrada nos tipos: lesões corporais ou homicídio (CP, arts. 121 e 129). É clarividente que se da exposição aos riscos da atividade resultar danos para outrem, presume-se a culpa do agente, por se tratar de uma presunção fática. Assim, seja na área penal, ou seja, na área civil, somente será possível ao agente ou responsável pelo dano, se eximir da imputação, caso este demonstre alguma excludente da ilicitude ou da culpabilidade. Poder-se-ia conceber o seguinte silogismo lógico: age com dolo eventual o agente que prevê a possível ocorrência do resultado danoso, mas assume o risco de produzi-lo. Existem atividades que por sua natureza, podem implicar em riscos para outrem. Logo se o empregador é aquele que assume os riscos da atividade empreendida, inclusive, a ocorrência de eventuais acidentes do trabalho, sua conduta caracteriza dolo eventual. Tal silogismo é falso, ao considerar que mesmo as atividades perigosas são lícitas, com escopo de satisfazer as necessidades da população humana. Entretanto, a licitude da atividade empresarial pressupõe a implementação das medidas de segurança e higiene laboral, ante a preexistência de norma jurídica que impõe ao empreendedor a obrigação de, primeiramente, eliminar os riscos do trabalho ou, se impossível, no mínimo, procurar reduzi-los (CLT, art. 166 c/c NR-4, item 4.12, "a"). Então, verificar-se-á a culpabilidade da conduta do empreendedor, se este agir de forma contrária a este comando. Um exemplo clássico da conduta típica do artigo 132 do Código Penal, o qual trata do crime de simples exposição a perigo, é o caso do empreiteiro que, para poupar-se ao dispêndio com medidas técnicas de prudência, na execução da obra, expõe o operário ao risco de grave acidente. Ressalte-se, basta a exposição da pessoa ao risco, para configurar a culpa do agente e este deverá provar sua inimputabilidade para não cumprir a pena. E se dessa exposição resultar dano à vítima, ela deverá ser indenizada. Interessante dizer que a finalidade do comando do artigo 132 do Código Penal é proteger a indenidade física e psíquica das pessoas, principalmente do trabalhador. E, por sua vez, o dispositivo do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, visa a reparação do dano e a proteção do indivíduo, ao qual cabe provar os fatos e não a culpa do agente ou responsável pela atividade. Esta se presume pela da simples evidência fática ante os riscos inerentes ao empreendimento do empregador, que poderá ser arredada se este provar as causas excludentes da sua responsabilidade. Enfim, estes preceitos objetivam a pacificação social e não a simples punição do agente. Ademais, "se o patrão é quem recolhe os benefícios da produção; logo, há de ser ele quem suporte não só os riscos da perda de materiais, como os [riscos] resultantes dos acidentes sofridos pelos operários". Dessa inferência, conclui-se que os infortúnios laborais oriundos da ausência de cumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho, seja por dolo eventual ou culpa stricto sensu, é uma ofensa social e por conseguinte implica em punibilidade penal e civil. É verdade que a "socialização dos riscos" e a moderna forma de cobertura das indenizações ligadas à infortunística deixam a desejar, mas é forçoso dizer que, na inexistência de emenda constitucional que revogue a última parte do inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição, prevalece como regra geral a responsabilidade civil subjetiva do empregador (cujos pressupostos são a imputabilidade e a culpabilidade), ressalvados os casos de responsabilidade objetiva relacionados a acidentes do trabalho originários de danos ambientais, nos termos do parágrafo 3º, do artigo 225 do Texto Maior combinado com os dispositivos do parágrafo 1º, do artigo 14 da Lei nº 6.938/81 e do artigo 120 da Lei nº 8.213/91. Por conseguinte, têm razão os doutrinadores ambientalistas (que desejam fazer cumprir as normas ambientais de segurança e medicina do trabalho) ao defenderem a aplicabilidade do parágrafo 3º do artigo 225 da Constituição Federal combinado com o parágrafo 1º do artigo 14 da Lei nº 6.938/81 com escopo de obrigar, objetivamente, os empreendedores responsáveis por danos ao ambiente laboral, inclusos os prejuízos individuais de seus empregados, vítimas de acidentes do trabalho. Celso Antônio Fiorillo e Marcelo Abelha Rodrigues, ambientalistas de renome nacional, são categóricos ao afirmarem que a tutela ao meio ambiente, especificamente ao meio ambiente do trabalho, bem como os princípios da valorização do trabalho e da dignidade humana têm como meta prioritária tutelar o bem maior – o direito à vida. Destarte, "o que se procura, salvaguardar é, pois, o homem trabalhador, enquanto ser vivo, das formas de degradação e poluição do meio ambiente onde exerce o seu labuto, que é essencial à sua vida. Trata-se, pois, de um direito difuso". A proteção da qualidade ambiental em todas as suas modalidades, cuja finalidade é antropocêntrica, visto que o homem está inserido no ecossistema, tem como objetos básicos de tutela: a saúde, a segurança e o bem-estar da população e da biota. E devido à magnitude desse direito, para efetivar a sua tutela, o parágrafo 3º do artigo 225 da Constituição, regulamentado nos termos do parágrafo 1º, do artigo 14 da Lei nº 6.938/81, prevê a responsabilidade civilobjetiva, para a reparação dos danos ambientais, inclusos os danos ao ambiente laboral ao estipular que: § 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. A lei ambiental nº 6.938/81, em seu parágrafo 1º, define que: § 1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente. Portanto, qualquer conduta ou atividade, lícita ou ilícita, culposa ou não, desde que lese o meio ambiente, implica em obrigação do autor de reparar o dano ambiental e os prejuízos causados a terceiros, inclusive, a integridade física destes. Trata-se, nitidamente, de responsabilidade civil objetiva daquele que violar direito difuso ou coletivo, ao provocar dano ambiental. Assim, com base nas normas mencionadas, se uma pessoa alheia à atividade de determinada fábric a, ali entrar, no momento de uma explosão, e tiver amputado uma parte do corpo em razão daquele sinistro, deve ser indenizada com base na teoria do risco, sendo obrigada apenas provar o nexo causal. Pergunta-se: E se um empregado, devido à mesma explosão, tiver sido mutilado, somente será indenizado se provar a culpa do empregador? Não é tratar o bem da vida sob duas medidas? Há que se concordar com Washington de Barros Monteiro, que para esse caso aplica-se a teoria do risco profissional, em que empregado e empresa assumem juntos o risco da atividade? Então, estamos diante de um aparente conflito de normas constitucionais entre o art. 7º, XXVIII e o § 3º do artigo 225. Segundo Kelsen, "tal conflito de normas surge quando uma norma determina uma certa conduta como devida e outra norma determina também como devida uma outra conduta, inconciliável com aquela". Ao analisar o conflito de normas do mesmo escalão, Kelsen ensina que quando numa mesma lei se encontram duas disposições, em que uma limita a validade da outra parcialmente, implica em exceção. Mas, para ele, não existe qualquer norma objetivamente válida. Porque quando o legislativo põe ...atos cujo sentido subjetivo é um dever-ser e que, quando este sentido é também pensado (interpretado) com o seu sentido objetivo, quando esses sentidos são considerados como normas, estas normas entram em conflito umas com as outras. Embora o ato tenha sido posto em harmonia com a norma fundamental,...[esta] não empresta a todo e qualquer ato o sentido objetivo de uma norma válida, mas apenas ao ato que tem um sentido, a saber o sentido subjetivo de que os indivíduos se devem conduzir de determinada maneira. Assim, a norma fundamental torna possível interpretar (pensar) o material que se apresenta ao conhecimento jurídico como um todo com sentido, o que quer dizer, descreve-lo em proposições que não são logicamente contraditórias. Como já foi afirmado o bem maior assegurado pela Constituição é a vida. Isto é, todos os comandos constitucionais têm como norma fundamental a tutela da vida. Até mesmo as normas organizacionais do Estado, somente têm sentido se forem para dar dignidade ao ser humano. Ora, o Estado Democrático Brasileiro foi instituído com o destino de "assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem internacional, com a solução pacífica das controvérsias" (CF/88, preâmbulo). E por outro lado a República Federativa do Brasil tem por fundamentos o valor social do trabalho e a dignidade humana (art. 1º, incs. III e IV), razão porque estes princípios são também as primícias da ordem econômica e social (art. 170 e 193). Sebastião Geraldo de Oliveira, de forma lapidar, dá brilho a este entendimento ao dizer: Aquele que não considerar os princípios constitucionais estará lidando apenas na periferia do Direito, ignorando as íntimas conexões do ramo específico com o seu tronco de sustentação, sua causa primeira. Avistando o continente sem captar o conteúdo, atento ao detalhe mas distraído do conjunto, não perceberá a irradiação da seiva tonificante, transitando do núcleo constitucional para abastecer e vitalizar toda a extensão que a ciência jurídica abarca. (...) A primazia do trabalho sobre a ordem econômica e social privile gia o trabalhador antes de avaliar sua atividade; valoriza o trabalho do homem em dimensões éticas que não ficam reduzidas a mera expressões monetárias. (...) Lançadas as premissas básicas da dignificação do trabalho, poderemos apreender, com maior profundidade, o significado e a extensão do direito à saúde do trabalhador, o direito ao meio ambiente de trabalho saudável e a redução dos riscos inerentes ao trabalho. Conclui-se, portanto, que, numa exegese sistemática e teleológica dos princípios e normas constitucionais, deve-se acatar o comando da parte final do inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição, que define a responsabilidade subjetiva do empregador em casos de acidente do trabalho, apenas como confirmação da regra geral, que institui a culpa como fundamento responsabilidade civil, adotada pelo nosso ordenamento jurídico. O parágrafo 3º do art. 225 combinado com o dispositivo do parágrafo 1º do artigo 14 da Lei Ambiental nº 6.938/81 (recepcionada pela Carta Maior) deve ser vis lumbrado como exceção a esta regra ao impor a reparação dos danos ambientais, inclusive dos danos ao ambiente laboral, objetivamente. Esclarece- se: aplica-se a responsabilidade subjetiva do empregador, única e exclusivamente, se as hipóteses de acidente laboral não advier de dano ao ambiente do trabalho. Como bem nos ensinou Kelsen, a interpretação da norma fundamental não pode levar à preposições contraditórias. E, segundo o princípio da igualdade, se uma empresa, cuja atividade causou, por alguma razão, irrefutável dano ambiental em sentido amplo (coletivo ou difuso) e, conseqüentemente, afetou qualquer pessoa, ainda que seja seu empregado, e acarretou-lhe prejuízos físicos ou não, deverá reparar todos os danos (ambiental ou individual), com base na teoria da responsabilidade objetiva, segundo o princípio do poluidor-pagador. Mas, se houve um acidente laboral, independentemente da ocorrência de dano ambiental, a princípio, ao empregado cabe demonstrar a culpa do empregador. Nessa linha de raciocínio, com brilhantismo e grande sensatez, Fábio Aurélio da Silva Alcure, em seu artigo Meio ambiente de trabalho e Perda Auditiva. Responsabilidade Objetiva do Empregador. dá a seguinte interpretação sistemática e teleológica dos artigos 7º, inc. XXVIII e 225, § 3º da Constituição quanto a aplicabilidade da responsabilidade civil dos danos causados ao ambiente laboral. Assim, em relação aos acidentes de trabalho, são dois os regimes existentes quanto ao dever de indenizar por parte do empregador. Se o acidente sofrido pelo empregado não tem qualquer relação com uma agressão ao meio ambiente de trabalho, o empregador só tem o dever de indenizar se tiver agido com dolo ou culpa. Como exemplo, se um empregado cai de uma escada e vem fraturar um dos braços, o empregador só éobrigado a indenizar se a escada não estava em condições de uso ou se não foi exigido do trabalhador a utilização de equipamento de segurança; não se pode responsabilizar o empregador se não houve culpa de sua parte. Agora, se o acidente de trabalho guarda um nexo de causalidade com uma lesão ao meio ambiente como um todo, não há que se analisar de quem é a culpa pelo acidente; neste caso, o empregador deve responder civilmente pelo danos decorrentes do acidente. A perda auditiva, dano reflexo do dano ao meio ambiente de trabalho causado pelo ruído, talvez seja o melhor exemplo dessa última espécie de acidente de trabalho. A responsabilidade subjetiva do empregador relaciona-se ao direito individual do empregado de ver-se indenizado dos prejuízos sofridos em decorrência de acidente de trabalho para o qual concorreu culposamente. Já a sua responsabilidade objetiva fundamenta-se no direito difuso (quando se considera a totalidade dos trabalhadores) ou coletivo (quando se tem em vista um grupo determinado de trabalhadores) a um meio ambiente de trabalho ecologicamente equilibrado. O direito individual do empregado acidentado de pleitear indenização, neste caso, é decorrência da violação de direito difuso ou coletivo preexistente. O bom senso não permitiria que fosse diferente. As lesões experimentadas pelos empregados, em decorrência de lesões ao meio ambiente de trabalho, costumam ser mais graves do que os prejuízos reflexos de terceiros pelos danos ao meio ambiente como um todo. Enquanto estes, normalmente, têm prejuízos econômicos, aqueles são vítimas de acidentes que lhes comprometem a integridade física, bem de muito maior valor. Atribuir responsabilidade civil aos empregadores, nestes casos, apenas quando provada a sua culpa, estabelecendo regimes diferentes de responsabilidade se os danos são ao meio ambiente domo um todo ou ao meio ambiente de trabalho específico, é destruir os pilares constitucionais da República Federativa do Brasil, que, fundada no valor social do trabalho (art. 1º, IV) e tendo na valorização do trabalho humano e no primado deste as bases de ordens econômica e social (art. 170 e 193), pretende-se um Estado Democrático de Direito. Enfim, as referidas normas constitucionais apenas apresentam conflito aparente, mas na verdade cada uma tem sua finalidade, conforme o caso concreto a ser analisado. Portanto, o dispositivo da parte final do inciso XXVIII do artigo 7º da Carta Magna não impede a aplicabilidade da objetivação da culpa empregador nos casos de reparação por acidentes do trabalho advindos de lesão ao ambiente laboral. Entretanto, é imperioso dizer que, a imposição constitucional da responsabilidade subjetiva do empregador para solucionar os demais casos de infortúnios sofridos pelos operários em razão de seu lavor, contraria o princípio protetor trabalhista. Não se pode esquecer que são notórios os obstáculos encontrados pelo trabalhador hipossuficiente e vulnerável para comprovar a culpabilidade do empregador. Para arredar esses percalços de uma vez por todas, seria de suma importância a aplicabilidade do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, ao menos para as hipóteses de sinistros trabalhistas inerentes às atividades, que por sua natureza, são perigosas. Mas o referido comando constitucional torna inaplicável esse dispositivo e, portanto, os empregadores, ainda que desempenhem, habitualmente, atividades de risco, estão livres da responsabilidade objetiva, o que impõe ao lesado, em eventuais as ações de indenização por acidente de trabalho, provar sua culpa, ressalvada a possibilidade de inversão do ônus da prova. E, por ser óbvio, tal situação somente é passível de mudança mediante emenda da Constituição, visto que as normas infraconstitucionais não podem ser instrumentos de afronta à Lei Maior, face ao princípio da supremacia da ordem constitucional. Destarte, na maioria dos casos acidentários laborais, as dificuldades do empregado, vítima de acidente do trabalho ou de seus beneficiários, para provar a culpa do empregador ainda persistem. Mas poderão ser contornadas se os operadores do direito analisarem o acidente do trabalho, como conseqüência de dano ambiental, ou se assim não o fizer, ao menos optarem pela culpa presumida, que dá ensejo à inversão do ônus da prova, porque é o empregador que tem condições reais para provar se implantou e implementou ou não, todas as medidas necessárias para a segurança e higidez de seus trabalhadores, que são de sua estrita responsabilidade. ANEXOS - Estatísticas de acidentes do trabalho no Brasil – 1970/2000, conforme fonte do MPAS e dados fornecidos pela ABRASEG - Associação Brasileira dos Distribuidores de Produtos e Equipamentos de Segurança e Proteção ao Trabalho. Disponível em: http://abraseg.com.br/feedback.htm ano massa segurada Típicos De trajeto doenças total total de óbitos 1970 7.284.022 1.199.672 14.502 5937 1.220111 2232 1971 7.553.472 1.308.335 18.138 4050 1330.523 2587 1972 8.148.987 1.479.318 23.389 2016 1.504.723 2854 1973 10.956.956 1.602.517 28.395 1784 1.632.696 3173 1974 11.537.024 1.756.649 38.273 1839 1.796.761 3833 1975 12.996.796 1.869.689 44.307 1976 14.945.489 1.692.833 48.394 2598 1.743.825 3900 1977 16.589.605 1.562.957 48.780 3013 1.614.750 4445 1978 16.638.799 1.497.934 48.511 5016 1.551.461 4342 1979 17.637.127 1.388.525 52.279 3823 1.444.627 4673 1980 18.686.355 1.404.531 55.967 3713 1.464.211 4824 1981 19.188.536 1.215.539 51.722 3204 1.270.465 4808 1982 19.476.362 1.117.832 57.874 2766 1.178.472 4496 1983 19.671.128 943.110 56.989 3016 1.003.115 4214 1984 19.673.915 901.238 57.054 3233 961.525 4508 1985 21.151.994 1.010.340 63.515 4006 1.077.861 4384 1986 22.163.827 1.129.152 72.693 6014 1.207.859 4578 1987 22.617.787 1.065.912 64.830 6382 1.137.124 5738 1988 23.661.579 927.424 60.284 5029 992.737 4616 1989 24.486.553 825.081 58.424 4838 888.343 4554 1990 23.198.656 632.012 56.343 5217 693.5725355 1991 23.004.264 587.560 46.679 6281 640.520 4464 1992 22.272.843 490.916 33.299 8299 532.514 3634 1993 23.165.027 374.167 22.709 15417 412.293 3110 1994 23.667.241 350.210 22.824 15270 388.304 3129 1995 23.755.736 374.700 28.791 20646 424.137 3967 1996 23.830.312 325.870 34.696 34.889 395.455 4488 1997 24.104.428 347.482 37.213 36.648 421.343 3469 1998 24.491.635 347.738 36.114 30.489 414.341 3793 1999 24.993.265 326.404 37.513 23.903 387.820 3896 2000 --- 287.500 37.362 19.134 343.996 3094 Jurisprudências Ementas de julgados que acolhem a culpa presumida do empregador, nas hipóteses de acidente do trabalho As normas e princípios que orientam a aplicabilidade do direito existem para dar a melhor solução para cada caso concreto. É conveniente lembrar que na aplicação da lei sempre cabe ao juiz atender "aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum". (LICC, art. 5º). Portanto, ante a vulnerabilidade do empregado, vítima de acidente do trabalho, ou de seus beneficiários, a exigência da comprovação de culpa, por parte do autor da ação, é uma demasia, mormente quando o infortúnio tem origem presumida no próprio fato inerente à atividade exercida, é essencial inverter o ônus da prova. Verifica-se que, sensatamente, parte dos nossos Tribunais ao decidirem pela reparabilidade ou não dos danos acidentários, pleiteada segundo o direito comum, adotam a culpa in vigilando, como fundamento da responsabilidade civil do empregador, impondo-lhes a obrigação de provar sua inimputação. A seguir transcrevem-se algumas ementas nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE DE TRABALHO – ACIDENTE OCORRIDO NAS DEPENDÊNCIAS DA EMPRESA APELANTE – MOTOR SE DESGOVERNA DURANTE TRANSPORTE E ATINGE EMPREGADO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR – CULPA PRESUMIDA – TEORIA DO RISCO – SENTENÇA DO JUÍZO A QUO DETERMINANDO PAGAMENTO I. O acervo probatório contido nos autos configura a responsabilidade civil do empregador, conduzindo à presunção iuris tantum de culpa in vigilando do mesmo. II. Recurso conhecido e improvido. (TJMA – AC 010243/98 – (29202) – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Raymundo Liciano de Carvalho – DJMA 10.02.2000) RESPONSABILIDADE CIVIL . ACIDENTE DE TRABALHO. FUNCIONÁRIO DE EMPRESA ATINGIDO POR DISPARO DE COLEGA DE TRABALHO. VIGILANTE PRESTADOR DE SERVIÇO TERCEIRIZADO. VINCULO DE PREPOSIÇÃO. RECONHECIMENTO. CULPA PRESUMIDA DA PREPONENTE. INEXISTÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO PELA RÉ. CULPA IN ELIGENDO E CULPA IN VIGILANDO. RECURSO PROVIDO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. FIXAÇÃO DA CONDENAÇÃO. I - Na linha da jurisprudência deste Tribunal, "para o reconhecimento do vínculo de preposição não é preciso que exista um contrato típico de trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem". II - Nos termos do enunciado nº 341 da súmula/STF, "é presumida a culpa do patrão ou do comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto". III - Além de não ter a ré cuidado de afastar referida presunção, os fatos registrados no acórdão revelam a ocorrência de culpa in eligendo e in vigilando. (RESP 284586/RJ; Recurso Especial nº: 2000/0109781-4, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma – STJ, DJ - 28/04/2003) RESPONSABILIDADE CIVIL. HÓSPEDE DE HOTEL QUE LESIONA O GERENTE. CULPA PRESUMIDA DO DONO DO ESTABELECIMENTO. ART. 1.521, IV, DO CC. INEXISTÊNCIA DE DISSÍDIO COM A SÚMULA 229/STF. 1. Segundo a jurisprudência desta Corte, a partir da edição da Lei 6.367/76, não mais prevalece o enunciado da Súmula 229/STF, bastando a culpa leve do empregador para embasar a sua responsabilidade. 2. A lei presume a culpabilidade do hoteleiro por ato do seu hóspede. Cabe ao estabelecimento tomar todas as medidas de segurança e precaução, por cuja falta ou falha é responsável. 3. Em sede de recurso especial não se reexamina matéria probatória. (Súmula 07/STJ). 4. "Nas indenizações por ato ilícito, os juros compostos somente são devidos por aquele que praticou o crime" (Súmula 186/STJ). Recurso especial conhecido, em parte, e provido. (RESP 69437/SP; Recurso Especial nº:1995/0033667-7. Rel. Min. Barros Monteiro, Quarta Turma – STJ, DJ: 14/12/1998) Ementas de julgados que acolhem a culpa objetiva do empregador, nas hipóteses de acidente do trabalho Embora, segundo pesquisas realizadas, seja raro, há decisões que condenam o empregador a reparar o dano advindo de acidente do trabalho com fulcro na teoria do risco, e por esta razão, declara de plano a sua responsabilidade objetiva. Abaixo transcreve-se ementa nesse sentido: ACIDENTE DO TRABALHO - RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR - em matéria de acidente do trabalho, já se consagrou a teoria do risco profissional, segundo a qual o empregador é objetivamente responsável pela situação de perigo gerada pelas máquinas e demais instrumentos de produção contidos nas dependências da empresa, devendo indenizar o dano físico decorrente da exposição de seu empregado ao referido foco de risco. E isto em razão da dupla circunstância de ser o empregador, como organizador da atividade produtiva, o gerador de tais riscos, além de ser o maior beneficiário do empreendimento, do qual extrai o lucro. A responsabilidade do empregado pelo acidente só se configura nas hipóteses em que tenha agido com manifesto dolo ou culpa grave, buscando voluntariamente a ocorrência do evento lesivo ou agindo sem cautela mínima. (RO 01 nº: 02970227104, Acórdão nº: 02980291646, Relatora Juíza Wilma Nogueira de Araujo Vaz da Silva, 8ª Turma - TRT 2ªRegião data:01/06/1998) RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR ACIDENTE DO TRABALHO - RESSARCIMENTO DE DESPESAS MÉDICAS - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR - DANOS/LESÕES EMOCIONAIS - Provado nos autos de forma inquestionável que no curso do contrato o(a) empregado(a) sofreu acidente do trabalho do qual resultaram lesões de ordem emocional, é devido o ressarcimento das despesas médicas havidas com o tratamento. Não é indenização por culpa. O ressarcimento de despesas médicas decorrentes de tratamento de acidente do trabalho ou doença profissional a ele equiparada é responsabilidade objetiva do empregador e não responsabilidade subjetiva, para a qual exige-se a culpa, além do dano e nexo causal. Não se pode negar que a saúde do ser humano está relacionada ao seu estado físico e mental. As seqüelas emocionais de um acidente são muitas vezes mais marcantes do que as cicatrizes e lesões manifestamente visíveis. As primeiras também deixam marcas, embora nem sempre vistas. (TRT 3ª R - 6ª Turma - RO/4201/03 - Rel. Juíza Nanci de Melo e Silva - DJMG 29/05/2003 - P. 13). Ementas de julgados que acolhem a culpasubjetiva do empregador, nas hipóteses de acidente do trabalho – culpa levíssima É mais comum os julgados que adotam a responsabilidade subjetiva do empregador. Porém, a culpa, ainda que levíssima, justifica a condenação do empregador a reparar os danos causados ao empregado oriundos de infortúnios laborais, principalmente, quando o empreendimento oferece, por sua natureza riscos. Abaixo um exemplo de jurisprudência que segue essa linha de raciocínio: EMENTA - ACIDENTE DO TRABALHO - RISCOS AMBIENTAIS - DIREITO DE INFORMAÇÃO - OMISSÃO DO EMPREGADOR - RESPONSABILIDADE CIVIL - A preocupação com a saúde e segurança do trabalhador no Brasil, talvez motivada pela expectação diuturna de imenso número de vítimas fatais em acidente do trabalho, motivou o legislador constituinte a alçar a nível constitucional as normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, obrigando o patrão a adotar medidas tendentes a garantir a integridade física do trabalhador. Desta forma, cabe ao empregador, mormente aquele que explora atividade que oferece risco à saúde e segurança do empregado, como no caso da reclamada, informar seus empregados dos riscos a que estão expostos e sobre as formas de prevenção, oferecendo-lhe o treinamento adequado para o desenvolvimento de seus misteres dentro da empresa. Aliás, o direito à informação dos empregados sobre os riscos da operação que realizam e de sua participação nos mecanismos de proteção contra acidentes foi objeto de várias Convenções da OIT ratificadas pelo Brasil, dentre elas as de nos. 148, 155 e 161, encontrando, também, previsão na NR 9, da Portaria 3214/78 do MTb. E demonstrando que o assunto é deveras preocupante, foi instituído em 1992, o Mapa de Riscos Ambientais, em que a CIPA, em colaboração com o SESMT, após ouvir os trabalhadores de todos os setores, elabora o referido mapa de riscos, identificando os existentes em cada local de trabalho, o qual deve ser afixado de forma visível e de fácil acesso para o trabalhadores, onde deverão ser descritos os riscos, físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e de acidente, tendo sido instituído, em 1994, o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, tudo com objetivo de resguardar a saúde e a integridade física dos trabalhadores. Inobstante a existência de todas estas normas, o que se verifica dos autos é que a reclamada não está muito afinada com os avanços na área de segurança do trabalho e, muito menos, com a obrigação que a constituição e a lei lhe atribuíram no particular. Explorando a empresa-ré atividade de risco à saúde do trabalhador, tanto que culminou com a morte prematura do autor (19 anos de idade), a ela incumbia implementar meios de reduzir os riscos de acidente do trabalho, propiciando a seus empregados trabalharem em condições dignas, saudáveis e seguras. No entanto, a prova dos autos revela justamente o contrário, pois no local onde foi encontrada morta a vítima não havia qualquer sinalização sobre o perigo de asfixiamento por flocos de espuma moída, demonstrando ainda a prova oral que no local onde ocorreu o acidente havia espuma na altura de três metros, tornando a operação arriscada, mesmo porque não possuía o compartimento janelas ou portas, mas pequenas aberturas, o que, sem dúvida, dificultou o salvamento do "de cujus" ou mesmo o pedido de socorro. Neste contexto, nota-se que a reclamada agiu com culpa no infortúnio sofrido pelo autor e ainda que se argumente sua ocorrência em grau leve, sua responsabilização impõe-se, considerando que até a culpa levísssima gera responsabilização civil. Confira- se, a propósito, a lição do ilustre magistrado Sebastião Geraldo de Oliveira em sua brilhante obra Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador, 3a. edição, LTR, pág. 228/229: Como se vê, foi ampliado consideravelmente o entendimento da Súmula 229/STF, que só deferia indenização no caso de dolo ou culpa grave. Agora, havendo culpa do empregador ou de outrem, de qualquer grau, mesmo na culpa levíssima, o acidentado faz jus à reparação. (RO NUM: 8666/2000, Rel. Juíza Maristela Íris da Silva Malheiros, 2ª Turma, TRT – 3ª Região, 24/04/2001) Ementas de julgados que acolhem a culpa concorrente entre empregador e empregado Ocorrem algumas hipóteses, que fica provado que tanto o empregador quanto o empregado tiveram condutas culposas que culminaram com o acidente laboral. Trata-se da culpa concorrente. A seguir um julgado do Superior Tribunal de Justiça, que decide pela culpa concorrente das partes: RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. CULPA CONCORRENTE. REEXAME DE PROVAS. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. ART. 602, CPC. SUBSTITUIÇÃO. INCLUSÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO. POSSIBILIDADE. EMPRESA IDÔNEA. INCAPACIDADE PARA A FUNÇÃO QUE EXERCIA. PERMANÊNCIA NA EMPRESA, EM OUTRA FUNÇÃO, COM A MESMA REMUNERAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA CONSIDERADA NA FIXAÇÃO DA PENSÃO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DO EVENTO. ENUNCIADO N. 54 DA SÚMULA/STJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I - Fixada a culpa concorrente com base na análise das provas dos autos, entender diversamente não prescindiria do revolvimento de matéria fática, procedimento vedado em sede de recurso especial, a teor do enunciado n. 7 da súmula/STJ. II – A norma do art. 1.539 do Código Civil traz a presunção de que o ofendido não conseguirá exercer outro trabalho, pelo que a pensão, em princípio, seria devida no mesmo valor que recebia a vítima. Por outro lado, evidenciado que esta continuou a trabalhar, e, no caso na mesma empresa, ainda que em atividade distinta, a pensão deve levar em consideração tal circunstância. III – Assentado pelo acórdão impugnado a idoneidade e solvabilidade da empresa condenada, é admissível, em substituição à constituição de capital prevista no art. 602, CPC, a inclusão do vencedor na folha de pagamento da empresa. IV - Tratando-se de indenização pelo direito comum, relativa a acidente de trabalho, contra empregador que agiu com culpa, a hipótese é de responsabilidade extracontratual, de sorte que os juros moratórios fluem a partir do evento danoso (enunciado n. 54 dasúmula/STJ). (RESP 401474/SP; Recurso Especial nº: 2001/0184733-7 Rel. Min. Sálvio De Figueiredo Teixeira - Quarta Turma/STJ DJ 15/04/2002) Ementas de julgados que acolhem a culpa objetiva das pessoas jurídicas de direito público ou de direito privado prestadoras de serviços públicos Em se tratando de pessoas jurídicas de direito público ou de direito privado, prestadoras de serviços públicos, a maioria das decisões tem adotado o instituto da responsabilidade civil objetiva como fundamento da reparação por acidentes do trabalho, com base no parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, transcreve-se algumas decisões abaixo: RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE DO TRABALHO – INDENIZAÇÃO – DIREITO COMUM – LITISCONSÓRCIO PASSIVO – PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO COM PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA COM BASE NO RISCO ADMINISTRATIVO – ADMISSIBILIDADE – A coleta de lixo urbano é considerada serviço público desempenhado por delegação. A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva, com base no risco administrativo. (2º TACSP – AI 604.940-00/2 – 10ª C. – Rel. Juiz Irineu Pedrotti – J. 10.11.1999) ACIDENTE DE TRABALHO – TRANSPORTE COLETIVO – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS REMUNERADOS POR ÔNIBUS NÃO LICENCIADO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – Sumária. Acidente de trânsito. Coletivo denominado de "pirata". Destinação ao transporte de passageiros. Equiparação a prestador de serviçode utilidade pública. Responsabilidade objetiva. Onus probandi do réu. Prejuízo comprovado. Improvimento do recurso. (LCR) (TJRJ – AC 15084/1999 – (20032000) – 9ª C.Cív. – Rel. Des. Renato Simoni – J. 14.12.1999) DIREITO CIVIL – ACIDENTE DE TRABALHO – RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA – SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA – CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO – LOCAL DE DESENPENHO DA ATIVIDADE LABORATIVA DO EMPREGADO – DESCUIDO COM AS CONDIÇÕES DE SEGURANÇA – PRESUNÇÃO DE CULPA, POR OMISSÃO, DA EMPRESA EMPREGADORA – PENSÃO DEVIDA AOS FILHOS E À VIÚVA – LIMITAÇÃO TEMPORAL – I – Responsabilidade civil da sociedade de economia mista, quando concessionária de serviço público, é objetiva. II – Estando sobejamente evidenciado que o fato acarretador da morte do empregado foi propiciado por comportamento omissivo da empresa empregadora, que descuidou das condições de segurança no local em que aquele desempenhava o trabalho que lhe competia, prevalece a presunção de culpa desta, com a conseqüente obrigação de indenizar, mormente se a atividade laboral, exercida pelo vitimado, qualificava-se como sendo de ''alta periculosidade''. III. É devida, pela empresa empregadora, pensão às filhas de empregado morto em acidente de trabalho, até que complete 21 anos, e à viúva, até o tempo em que a vítima completaria 65 anos. IV – Apresenta-se de grande oportunidade que, ao prestar a jurisdição, preveja, o julgador, a possibilidade de prorrogar a prestação da pensão até que as filhas do empregado falecido completem 24 anos se, alcançada a idade de 21 anos, estejam, as mesmas, matriculadas em curso superior, hipótese em que se presume contariam ainda com o amparo do genitor. V – A fixação do quantum para indenização de dano moral há de considerar as peculiaridades de cada caso, não se prestando, tal ressarcimento, como fonte de enriquecimento ilícito, mas não podendo, por outro lado, ser inexpressivo. Dar parcial provimento. Unânime. (TJDF – APC 4765098 – 2ª T.Cív. – Relª Desª Nancy Andrighi – DJU 02.02.2000 – p. 16) APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE COM MORTE SOFRIDO POR EMPREGADO DE EMPRESA CONTRATADA PARA OBRAS EM ORGANIZAÇÃO MILITAR. RESPONSABILIDADE DA UNIÃO. FIXAÇÃO DOS VALORES. LEGITIMIDADE DA COMPANHEIRA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS. - A União é responsável por acidente de trabalho ocorrido dentro de Organização Militar, independentemente de cláusula contratual em que a empresa contratada se responsabilize, pois tal cláusula não gera efeitos sobre terceiros, ressalvado o direito de regresso em caso de dolo e culpa, a teor do art. 37, § 6º da CF-88. - Embora não haja como tarifar a dor sofrida pelos próximos do de cujus, reduzo a indenização por dano moral a R$ 60.000,0 (sessenta mil reais) para a filha e a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) à companheira, por entender que este valor atinge o objetivo de minorar as penas dos atingidos, sem que seja caracterizada situação de enriquecimento sem causa, e também para melhor se harmonizar com as decisões desta Turma. - Inocorrência de nulidade da sentença por ultra -petita, pois os juros e a correção monetária devem ser incluídos na condenação independente de pedido, embasados na Súmula 254 do STF e art. 1º da Lei 6.899/81. (TRF4 SC, Quarta Turma - AC, processo nº 200204010133819, data de publicação -31/07/2002) É oportuno registrar abaixo uma das raras decisões em sentido contrário, conforme pesquisa realizada, que se aplica o princípio da responsabilidade subjetiva para as concessionárias de serviços públicos nas hipóteses de reparação de danos: 34005481 – INDENIZAÇÃO – ACIDENTE DO TRABALHO – CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO CULPA – Não se aplica o princípio da responsabilidade objetiva a indenização de direito comum em acidente de trabalho sofrido pelo empregado de concessionária de serviço público, devendo-se perquirir a culpa do empregador. (TAMG – Ap 0190106-6 – 3ª C.Cív. – Rel. Juiz Wander Marotta – J. 27.09.1995) 9. O PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO E AS MICROS E PEQUENAS EMPRESAS O Perfil Profissiográfico Previdenciário-PPP está previsto no artigo 58 da Lei 8.213/91, com redação dada pela Medida Provisória n.º 1.523/96 e convertida na Lei 9.528, de 10 de dezembro de 1997. Sua regulamentação se deu pela Instrução Normativa nº 78 de 18 de julho de 2002, do Ministério da Previdência Social. Trata-se de um documento histórico-laboral dos trabalhadores, apresentado em formulário próprio, que conterá um grande nº de informações detalhadas, sobre suas atividades, exposição a agentes nocivos à saúde, resultados de exames médicos e outras informações de caráter administrativo. O principal objetivo do PPP é apresentar, em um só documento, o resumo de todas as informações necessárias à fiscalização do gerenciamento de riscos e existência de agentes nocivos no ambiente de trabalho, além de ser o documento que orienta o processo de reconhecimento de aposentadoria especial do trabalhador. Pretende-se também uma dificultação das fraudes em aposentadorias especiais, mas às expensas do segmento empresarial. A empresa passa a ter a obrigação de elaborar e manter atualizado o perfil profissiográfico de cada trabalhador, descrevendo as atividades que os mesmos desenvolvem. Ressalte-se que os trabalhadores tem direito de deter cópia autêntica de tal documento, substanciando-se em obrigação a cessão do mesmo pelo empregador. As fontes de informação do PPP são o Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT), o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), todas estas obrigações vigentes para o empresariado em geral, mas, via de regra, descumpridas pelas MPE, pelo custo e pela burocracia que representam. Na realidade, há inúmeras empresas de medicina do trabalho que realizam tais obrigações, contratadas pelas empresas. Para uma maior didática, passemos a descrever, sucintamente, todas essas obrigações. - LTCAT - Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - deve ser expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Trata-se de documento que retrata as condições do ambiente de trabalho de acordo com as avaliações dos riscos. Seu custo varia pelo nº de funcionários e tamanho do estabelecimento. Temos como base um custo de R$ 2,00 por empregado, com um mínimo de R$ 100,00/ano, para empresas que não apresentam nenhum risco aparente. Se o houver riscos, esse valor sobe em muito, chegando a uma média R$ 500,00. - PPRA - Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – Trata-se de um programa de ação contínua e não apenas um documento. O LTCAT pode ser um dos documentos que integram o PPRA. Este é uma exigência da legislação trabalhista e aquele da legislação previdenciária. Visa à preservação da saúde e da integridade dos trabalhadores, pela antecipação, pelo reconhecimento, pela avaliação e, conseqüentemente, pelo controle da ocorrência de riscos ambientais relativos à iluminação, ergonometria, agentes químicos, ruídos, etc.. - PCMSO - Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional – Tem por objeto a promoção e preservação da saúde dos trabalhadores, a ser elaborado e implementado pela empresa, a partir do PPRA e do PCMAT, com o caráter de promover prevenção, rastreamento e diagnóstico precoce dos danos à saúde relacionados ao trabalho, além da constatação da existência de casos de doenças profissionais ou danos irreversíveis à saúde. Um bom exemplo é a lesão por esforços repetitivos. Consiste em exames clínicosocupacionais de admissão, periódico, troca de função e demissional, além da emissão dos atestados de saúde ocupacional. Seu valor varia de R$ 5,00 a R$ 10,00 por empregado/mês, condicionado a um mínimo de R$120,00/mês. O Ministério da Previdência e Assistência Social havia prorrogado para 1 de novembro 2003 a exigência do Perfil Profissiográfico Previdenciário. Ocorre que, devido ao descontentamento do empresariado (principalmente de micro e pequeno porte, além daqueles que, em condições normais, não oferecem riscos à atividade laboral) o MPAS já garantiu nova prorrogação para 1º de janeiro de 2.004. A partir desta data, a obrigatoriedade da apresentação do Laudo Técnico de Condições Ambientais (LTCAT) será dispensada. No entanto, este documento deverá permanecer disponível na empresa e ficar à disposição da Previdência Social pelo prazo de 20 anos. Com base nisso, a exigibilidade do PPP foi postergada de 1° de novembro de 2003 para 1° de janeiro de 2004, por força da Instrução Normativa do INSS, de nº 96, de 23 de outubro, publicada no Diário Oficial da União de segunda-feira, 27 de outubro. A grande novidade imposta IN 96/03 é que essa obrigação passa a ser exigida apenas para empresas cujos empregados estejam expostos a riscos físicos (como excesso de calor, som e vibração), químicos (benzeno, amianto, sílica e chumbo, por exemplo) e biológicos (como parasitas, vírus e bactérias infecto-contagiosas). Não obstante, a IN dispõe que após 1º de janeiro, a partir do momento em que a Previdência Social implantar o PPP "em meio magnético", o documento passará a ser exigido de todas as empresas, independente do ramo de atividade exercida e dos agentes nocivos a que o trabalhador esteja exposto. Não há qualquer esclarecimento sobre prazos ou forma desse "PPP em meio magnético". É bom lembrar que o LTCAT, o PCMSO e o PPRA servirão de base para o preenchimento do PPP, uma vez que trazem informações relativas às condições ambientais da organização e às condições do trabalhador. O PPP já trará a conclusão do laudo técnico e a descrição das atividades desenvolvidas pelo trabalhador, a existência de agentes prejudiciais à sua saúde ou integridade física e o caráter permanente ou não da exposição aos riscos. O PPP deve ser mantido atualizado magneticamente ou por meio físico com a seguinte periodicidade: I – anualmente, na mesma época em que se apresentar os resultados da análise global do desenvolvimento do PPRA, do PGR, do PCMAT e do PCMSO e II – nos casos de alteração de "layout" da empresa com alterações de exposições de agentes nocivos. A não manutenção de Perfil Profissiográfico Previdenciário atualizado e o não fornecimento do mesmo ao empregado, por ocasião do encerramento do contrato de trabalho ensejará aplicação de multa de R$ 991,03 à R$ 99.102,12. As microempresas e empresas de pequeno porte não têm quaisquer benefícios ou tratamento diferenciado no que tange ao PPP, até mesmo as optantes pelo SIMPLES. Há um forte movimento que defende o tratamento diferenciado para as MPE, assim como para as empresas cuja atividade não oferece risco para os empregados. Quanto aos últimos, a demanda já foi correspondida, pelo menos provisoriamente, até que o INSS crie o PPP "em meio magnético", O MPAS acena com a criação desse tratamento, conforme tem se visto em declarações à imprensa. 10. FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO AQUAVIÁRIO O Decreto No 3.129, de 9 de agosto de 1999, aprova a estrutura regimental do Ministério do Trabalho e Emprego e, com fonte no artigo 14, incisos I e II, atribui à Secretaria de Inspeção do Trabalho formular e propor as diretrizes da inspeção do trabalho, inclusive do trabalho portuário, priorizando o estabelecimento de política de combate ao trabalho forçado e infantil, bem como a todas as formas de trabalho degradante; e formular e propor as diretrizes e normas de atuação da área de segurança e saúde do trabalhador. Essa Secretaria expediu a Instrução Normativa nº 19, de 27 de setembro de 2000, traçando a competência das Unidades Regionais de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário, destacando a fiscalização das condições do trabalho, segurança e saúde e de vida a bordo de embarcação comercial, nacional ou estrangeira, utilizada na navegação marítima, fluvial e lacustre. Conceitua este at o normativo as condições de trabalho e de vida a bordo, considerando, entre outras, as relativas às normas de manutenção e limpeza das áreas de alojamento e trabalho a bordo, a idade mínima, os contratos de engajamento, a alimentação e o serviço de quarto, o alojamento da tripulação, a contratação, a lotação, o nível de qualificação, as horas de trabalho, os atestados médicos, a prevenção de acidentes de trabalho, os cuidados médicos, os pagamentos em caso de acidente ou doença do trabalho, o bem estar social e questões afins e a repatriação. Como se percebe, nada escapa ao controle, visto que essa enumeração não é exaustiva e outras poderão ocorrer, de modo que a proteção legal é rigorosa, abrangendo qualquer tipo de embarcação comercial, ainda que estrangeira. O auditor fiscal do trabalho deve atuar, em se tratando de embarcação comercial nacional, de conformidade com as normas da Convenção 147 e seus anexos, da CLT, da legislação complementar respectiva, dos acordos e convenções coletivas de trabalho e as normas de segurança e saúde do trabalho específicas para o trabalho aquaviário. Também deverá observar as diretrizes sobre procedimentos de inspeção das condições de trabalho a bordo de embarcações, aprovadas pela Reunião Tripartite de Peritos, convocada pela OIT, em 1989. Frise-se que, nas hipóteses que propiciarem repatriação, como as de contratos de engajamento vencidos ou de outras causas arroladas no artigo 2º da Convenção 166 da OIT, ratificada pelo Decreto 2670, de 15 de julho de 1998, deverá o referido servidor comunicar, por ofício, à Superintendência da Polícia Federal e tomar as demais providências mencionadas nesta Instrução. Uma medida de significativa importância diz respeito à mediação do conflito, pela fiscalização do trabalho, se a tripulação se encontrar em greve ou strike, garantindo os direitos dos trabalhadores e ainda o próprio direito à greve dos envolvidos. A Unidade Regional iniciará ação fiscal, se se tratar de embarcação comercial estrangeira, que estiver operando em águas jurisdicionais brasileiras, em virtude de contrato de afretamento ou de prestação de serviços ou de risco, celebrado com empresa estrangeira, e houver queixa de indício de irregularidade apresentada por membro de tripulação, de sindicato ou por qualquer pessoa ou organização interessada nas condições de trabalho ou ainda atendendo ao planejamento da Unidade Especial de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário. Cabe-lhe, também, entre outras atividades, verificar, no diário de navegação ou nos controles da autoridade marítima, se a embarcação está em águas nacionais, há mais de noventa dias e foram contratados tripulantes dos três níveis técnicos - oficiais, graduados e não graduados, para as atividades de navegação ( convés e de máquinas ), tendo em vista as RNs 31/98 e 46/2000. Dispõem essas regras que a embarcação estrangeira deverá contratar seis tripulantes brasileiros. Esse número poderá ser reduzido, se o cartão de lotação mínima da embarcação não utilizar algum desses níveis técnicos, como no caso de apoio marítimo. Trata-se, pois, de notável documento, distinguindo nosso País, entre os que se preocupam com as condições de trabalho,segurança e saúde de vida a bordo de embarcação comercial, em homenagem aos princípios fundamentais, insertos na Constituição Federal, da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho. 11. INSPEÇÃO DO TRABALHO POR AUTORIDADE ESTADUAL OU MUNICIPAL: INCONSTITUCIONALIDADE. ENTENDIMENTO DO STF Tivemos oportunidade de visualizar, em várias oportunidades, a atuação de autoridades estaduais, integrantes das secretarias de saúde, na inspeção e fiscalização do meio ambiente de trabalho das empresas, fazendo exigências e, por muitas vezes, chegando a lavrar multas, indicando como fundamento legal dispositivos da CLT e das Normas Regulamentadoras (NR’s), editadas pelo Ministério do Trabalho. Por outro lado, vê-se alguns entes da federação (Estados e Municípios) a legislar sobre o tema, impondo novas obrigações além daquelas constantes na legislação federal, sob pena pecuniária, bem como suas autoridades fiscalizatórias exigirem das empresas o cumprimento de tais obrigações inovadoras da legislação federal, sob a ameaça da imposição de autos de infração. Sem querer exaurir o tema neste artigo, é mister que se faça uma análise da legalidade de tais procedimentos, para que se conclua por seu cabimento ou não, em face do que dispõe a Constituição da República. 11.1 DOS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS REGULADORES DA INSPEÇÃO DO TRABALHO Iniclalmente é de se citar o que preceitua o art. 21, XXIV, da Constituição Federal : Art. 21 . Compete à União: ...................... XXIV – organizar, manter e executar a inspeção do trabalho Em seu art. 200, II e VIII, preceitua: Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: .................. II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador. VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho. Assim sendo, dispõe a Constituição da República sobre a inspeção do trabalho em duas passagens, uma ao definir a competência da União, outra, em definir a competência do SUS (sistema único de saúde). O SUS, como preceitua o art. 198 da Constituição e seus incisos, se constitui em rede hierarquizada e regionalizada, tendo direção única em cada esfera de governo. Em princípio, pois, (este o principal argumento das autoridades fiscalizadoras), todas as esferas de governo têm competência para a fiscalização e inspeção do trabalho, haja vista que, como se disse, o SUS tem descentralização, atividade e direção em cada esfera da federação. Uma melhor análise, porém, mostrará não ser esta a melhor interpretação. 11.2 DA NATUREZA DA COMPETÊNCIA ATRIBUÍDA À UNIÃO EM MATÉRIA DE INSPEÇÃO DO TRABALHO Conforme esmerada doutrina, em termos de competência constitucional, deve- se fazer a distinção entre competências privativas e exclusivas. A competência privativa, não obstante o nome, seria aquela que, conferida a determinado ente federativo prioritariamente, não obsta que o ente beneficiado a delegue a outro, nos limites e forma permitidos na Constituição. Já a competência exclusiva, ao contrário da anterio r, não permite ao ente agraciado delegar de qualquer forma sua competência a outro congênere. Essa a lição de JOSÉ AFONSO DA SILVA (Curso de Direito Constitucional Positivo, Ed. Malheiros, 16a Edição, pg. 480) para quem: "...A diferença que se faz entre competência exclusiva e competência privativa é que aquela é indelegável e esta é delegável. Então, quando se quer atribuir competência própria a uma entidade ou a um órgão com possibilidade de delegação de tudo ou de parte, declara-se que compete privativamente a ele a metéria indicada. Assim, no art. 22 se deu competência privativa (não exclusiva) à União para legislar sobre: [...], porque parágrafo único faculta à lei complementar autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas nesse artigo. No art. 49, é indicada a competência exclusiva do Congresso Nacional. O art. 84 arrola a matéria de competência privativa do Presidente da República, porque seu parágrafo único permite delegar algumas atribuições ali arroladas..". Como se vê, diante de uma competência constitucional, teremos duas possibilidades: será ela privativa ou exclusiva, conforme a Carta Magna possibilite ou não a delegação. Assim, vejamos. A Constituição, ao contrário do que faz em seu art. 22, parágrafo único, não possibilita, em qualquer passagem de seu art. 21, a delegação de competências. Assim pensa MICHEL TEMER (Elementos de Direito Constitucional, Ed. Malheiros, 15a Ed., pg. 77): "...Dos arts. 21 e 22 se extrai que a União tem competências expressas e enumeradas. São também exaustivas, pois exaurem, pela enumeração, as matérias que lhe cabem". Não é outro o pensamento de IVES GANDRA DA SILVA MARTINS , ao comentar a Constituição Federal (Comentários à Constituição do Brasil, Ives Gandra da Silva Martins e Celso Ribeiro Bastos, Ed. Saraiva, pg. 2/3): "..O art. 21 é dedicado à competência de atribuições da União ...". Assim, temos pela frente claro caso de competência constitucional exclusiva sendo vedada a delegação. Por outro lado, igualmente deve-se fixar propriamente as competências legislativas e administrativas. Como se sabe, grande parte da doutrina sapara tais competências, afirmando que a competência legislativa, como o nome diz, dá a prerrogativa de legislar e a administrativa de atuar naquele âmbito específico de competência. Não obstante, preferimos concordar com IVES GANDRA DA SILVA MARTINS (op. cit., pg. 3), para quem: "A dificuldade, todavia, que se coloca é que, regido o país pelo princípio da legalidade, nenhuma entidade federativa pode agir, sem ter legislação anterior que a autorize, de tal forma que tanto o art. 21 quanto o art. 22 cuidam, em verdade, de competência para legislar sobre aquelas matérias. O mesmo se pode dizer no que concerne à competência comum e/ou concorrente, visto que a ação é sempre precedida de legislação..." Assim sendo, somente podendo a Administração agir quando previamente autorizada por lei, a diferença entre competência legislativa e administrativa fica muito reduzida de conteúdo, porquanto a ação administrativa sempre será necessariamente precedida de legislação. Portanto, conclui-se correto afirmar que a competência para agir deve corresponder igualmente à competência para legislar sobre a matéria. A primeira conclusão que se extrai é que, em sendo a competência do art. 21 exclusiva, somente a União poderá organizar, manter e inspecionar o trabalho. Em sendo a competência para agir (competência administrativa) corolário lógico e necessário da competência para legislar (competência legislativa), conclui-se que somente a União poderá legislar sobre organização, manutenção e inspeção do trabalho. Aliás, a matéria de organização, segurança e meio ambiente do trabalho é componente do Direito do Trabalho. Esse o pensamento de SÉRGIO PINTO MARTINS (Direito do Trabalho, 3a Edição, Ed, Malheiros, pg. 43/44), que, adotanto as orientações do Prof. OTÁVIO BUENO MAGANO, preceitua a divisão da disciplina do Direito do Trabalho na seguinte forma: "Preferimos adotar a divisão utilizada pelo Prof. Magano, ao falar de Direito Individual do Trabalho, Direito Tutelar do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho" E prossegue: "No Direito Tutelar do Trabalho versaremos sobre regras que tratamda proteção do trabalhador, como as normas de segurança e medicina do trabalho, regras sobre a jornada de trabalho, sobre os repousos do trabalhador, sobre a fiscalização trabalhista, etc." Vê-se, pois que o Direito Tutelar do Trabalho é parte do Direito do Trabalho. Ora, conforme o art. 22, I , da CF é privativa da União a competência para legislar sobre Direito do Trabalho. Logo, repita-se: somente a União poderá legislar criando obrigações relativas ao meio ambiente do trabalho, bem como somente ela poderá fiscalizar o cumprimento de tais obrigações. 11.3 DO ÂMBITO DE COMPETÊNCIA DO SUS Em se afirmando a competência exclusiva da União para legislar e agir em matéria de medicina, segurança, inspeção e meio ambiente do trabalho em geral, resta ainda fixar, dentro das normas constitucionais, o âmbito correto de competência do SUS (sistema único de saúde). Diz a Constituição Federal que o SUS, sendo um conjunto hierarquizado e descentralizado de ações mantidas pelo Poder Público, nos diversos níveis de governo, terá as competências de: Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: .................. II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador. VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho. Analisemos, pois, tal competência, nos termos postos pela Constituição Federal. Inicialmente diz a Constituição que caberá ao SUS: 1) executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica; 2) executar ações relativas à saúde do trabalhador. Logo após, diz caber ao SUS colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho. Assim, tem-se que o SUS deve inicialmente realizar ações diversas relativas à saúde do trabalhador. Ora, nehuma competência lhe atribuiu a Constituição Federal para INSPECIONAR ou FISCALIZAR o meio ambiente do trabalho, mas sim para que tenha ações diversas em prol da saúde do trabalhador, dentre as quais, v.g., a pesquisa de novas técnicas para a melhoria das condições de saúde do trabalho, a realização de exames médicos periódicos, etc, dentre as quais não está, de forma nehuma incluída a inspeção do trabalho. No mesmo sentido, colaborar na proteção do meio ambiente não significa dar atribuições ao SUS de inspecioná-lo ou fiscalizá-lo. Ora, quem colabora atua em conjunto, em participação secundária, que obviamente não poderá ser a inspeção, atividade primordial. Logo, nenhuma atribuição constituicional tem o SUS para inspecionar o meio ambiente do trabalho, sendo inconstitucional qualquer lei que venha a conferir tal atribuição a este órgão. Vejamos, agora, o que diz a legislação ordinária. Dada a descentralização do sistema, o SUS terá direções e atribuições diversas conforme o ente federativo a que pertencer e conforme definir a lei (pois a Carta Magna expressamente delega à lei a fixação das competências do SUS). É o SUS disciplinado pela Lei Nº 8.080, de 19 de setembro de 1990 que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diz referido diploma em seu art. 9o : Art. 9º A direção do Sistema Único de Saúde (SUS) é única, de acordo com o inciso I do art. 198 da Constituição Federal, sendo exercida em cada esfera de governo pelos seguintes órgãos: I - no âmbito da União, pelo Ministério da Saúde; II - no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente; e III - no âmbito dos Municípios, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente. Fica claro, assim, as atribuições dos órgãos para o exercício das atribuições do SUS. No âmbito federal, será competente o Ministério da Saúde. Nos Estados e Municípios as respectivas secretarias de saúde. Veja-se, agora, a competência deferida pela lei a cada esfera governamental (os grifos não constam no original). Seção II Da Competência Art. 16. A direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) compete: ............... II - participar na formulação e na implementação das políticas: .............. c) relativas às condições e aos ambientes de trabalho; V - participar da definição de normas, critérios e padrões para o controle das condições e dos ambientes de trabalho e coordenar a política de saúde do trabalhador; Art. 17. À direção estadual do Sistema Único de Saúde (SUS) compete: IV - coordenar e, em caráter complementar, executar ações e serviços: a) de vigilância epidemiológica; b) de vigilância sanitária; c) de alimentação e nutrição; e d) de saúde do trabalhador; VII - participar das ações de controle e avaliação das condições e dos ambientes de trabalho; Art. 18. À direção municipal do Sistema de Saúde (SUS) compete: III - participar da execução, controle e avaliação das ações referentes às condições e aos ambientes de trabalho; IV - executar serviços: a) de vigilância epidemiológica; b) vigilância sanitária; c) de alimentação e nutrição; d) de saneamento básico; e e) de saúde do trabalhador; Percebe-se, pois, que, em nehuma passagem a lei atribuiu ao SUS a inspeção do meio ambiente do trabalho, pois, participar de políticas, executar serviços ou coordená-los em caráter complementar não significa poder de polícia fiscalizatório. Ao contrário, competirá a inspeção do trabalho, em âmbito federal, ao MINISTÉRIO DO TRABALHO e não ao SUS (vinculado e exercido pelo Ministério da Saúde), conforme dispõe a CLT, em seu art. 626: Art. 626. Incumbe às autoridades competentes do Ministério do Trabalho, ou àquelas que exerçam funções delegadas, a discalização do fiel cumprimento das normas de proteção ao trabalho. 11.4 DO POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Instado a se manifestar, o plenário do Supremo Tribunal Federal, através do julgamento da liminar na ADIMC-1893/RJ – Rel. Min. Marco Aurélio, fixou, por unanimidade, o posicionamento do Pretório Excelso sobre a matéria. Por unanimidade, foi conferida liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade, movida pela Confederação Nacional da Indústria, nos seguintes termos: ADIMC-1893 / RJ ACAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR Relator Ministro MARCO AURELIO Publicação DJ DATA-23-04-99 PP-00002 EMENT VOL-01947-01 PP-00141 Julgamento 18/12/1998 - Tribunal Pleno Ementa SEGURANÇA E HIGIENE DO TRABALHO – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. Ao primeiro exame, cumpre à União legislar sobre parâmetros alusivos à prestação de serviços - artigos 21, inciso XXIV, e 22, inciso I, da Constituição Federal. O gênero "meio ambiente", em relação ao qual é viável a competência em concurso da União, dos Estados e do Distrito Federal, a teor do disposto no artigo 24, inciso VI, da Constituição Federal, não abrange o ambiente de trabalho, muito menos a ponto de chegar -se à fiscalização do local por autoridade estadual, com imposição de multa. Suspensão da eficácia da Lei nº 2.702, de 1997, do Estado do Rio de Janeiro. ObservaçãoVotação: Unânime. Resultado: Deferida. N.PP.:(13). Análise:(RCO). Revisão:(AAF). Inclusão: 06/05/99, (MLR). Partes REQTE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA - CNI ADVDOS. : LEONARDO GRECO E OUTROS REQDO. : GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO REQDA. : ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO O mesmo pronunciamento parece ter fundamentado o acórdão noticiado no Informativo 142 do STF: Informativo 142 – STF Saúde do Trabalhador e Competência Por aparente ofensa ao art. 22, I, da CF, que determina a competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho, o Tribunal, em ação direta proposta pela Confederação Nacional da Indústria-CNI, por maioria, deferiu, em parte, o pedido de medida cautelar para, dando interpretação conforme a CF, suspender relativamente aos empregados celetistas, sem redução de texto, a alínea b do inciso III do art. 3º da Lei 2.586/96 do Estado do Rio de Janeiro, que estabelece normas de prevenção das doenças e critérios de defesa da saúde dos trabalhadores em relação às atividades que possam desencadear lesões por esforços repetitivos - LER. Vencido, em parte, o Min. Marco Aurélio que, dando interpretação conforme a CF, suspendia relativamente aos empregados celetistas, sem redução de texto, toda a Lei nº 2.586/96. Vencidos ainda, em parte, os Ministros Néri da Silveira, relator, e Carlos Velloso que indeferiam integralmente o pedido. ADInMC 1.862-RJ, rel. Min. Néri da Silveira, 18.3.99. Muito bem andou a Corte Suprema ao fixar o posicionamento constitucional sobre a matéria, em linhas simples e sóbrias, evitando a superfetação de entes fiscalizatórios, incompetentes para tanto, em voracidade fiscal demasiada e, muitas vezes, a exigência ilegal por parte de fiscais inescrupulosos, como se está a ver nos noticiários televisivos. 12. NOVOS ASPECTOS JURÍDICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE OU DOENÇA DO TRABALHO 12.1 Responsabilidade da empresa e da Previdência Social no infortúnio no trabalho- Distinções Por primeiro, não se deve confundir a responsabilidade do empregador em indenizar o obreiro (responsabilidade civil), com a obrigação previdenciária a cargo do Estado (responsabilidade acidentária-previdenciária), representado aqui pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Com efeito, ocorrido o acidente, três hipóteses poderão existir, conforme o caso concreto: 1) ambos (empregador e INSS) estarão obrigados a reparar os danos sofridos pelo trabalhador, cada qual a sua forma; 2) apenas o INSS terá responsabilidade pelo fato; 3) não haverá obrigação de qualquer deles. A primeira hipótese será factível quando houver culpa do empregador. A segunda, quando inexistir negligência patronal. A terceira, quando além de não haver culpa, também não for devida a prestação de benefício (p.ex.: ato fraudulento do empregado). Referidas responsabilidades, portanto, são autônomas e estanques, não havendo influência ou compensação de quantias pagas. Assim, não é lícito ao empregador abater da indenização que deve ao empregado pelo infortúnio ocorrido o montante recebido por este último dos órgãos de Previdência. Em outras palavras: a indenização por responsabilidade civil a cargo da pessoa jurídica ou empresa individual é cumulável com o recebimento de benefício(s) previdenciário(s) pagos ao obreiro. Nesse sentido a jurisprudência é pacífica: Superior Tribunal de Justiça "Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Indenização. Acidente do trabalho. 1. O Acórdão recorrido está devidamente fundamentado, no sentido de que a culpa no trágico acidente foi exclusivamente da ora recorrente, estando, também, caracterizados os danos, inclusive morais, sofridos pela vítima, sendo o valor da pensão fixado com base nos elementos de prova constantes dos autos. Não há como ultrapassar os fundamentos do Acórdão sem adentrar o exame de matéria probatória, o que não se admite em sede de recurso especial. Inevitável a aplicação da Súmula nº 07/STJ. 2. Cabível é a cumulação da indenização do direito comum com o benefício previdenciário, sendo o pagamento da indenização devido desde a data do evento danoso. 3. A indenização por dano moral não exige a ocorrência de dolo no evento danoso. 4. Dissídio jurisprudencial afastado, em face da incidência da Súmula nº 83/STJ. 5. Agravo regimental improvido." RELATOR: MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO FONTE: DJ DATA: 31/05/1999 PG: 00148 ACÓRDÃO: AGA 213226/PR (199800868291) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO DATA DA DECISÃO: 20/04/1999 ORGÃO JULGADOR: - TERCEIRA TURMA Analisemos, pois, as diferenças entre as responsabilidades respectivas. A pessoa jurídica ou empresa individual, como veremos melhor a seguir, somente estará obrigada a reparar o obreiro em relação ao dano derivado de acidente do trabalho se restar evidenciada sua negligência no cumprimento das disposições de proteção ao trabalho. O mesmo, entretanto, não ocorre com o a responsabilidade estatal a cargo do INSS, que estará obrigado à prestação do benefício cabível na espécie, ainda que o acidente não decorra de culpa de qualquer pessoa, ou mesmo que decorra de culpa exclusiva do trabalhador segurado. Em outros termos: a responsabilidade do empregador é de natureza subjetiva (dependente de prova de culpa), enquanto a responsabilidade do INSS é de natureza objetiva (independente de prova de culpa). Além disso, a responsabilidade do empregador abrange a indenização por aquilo que o trabalhador perdeu com o acidente (dano emergente), bem como por aquilo que deixou de ganhar (lucro cessante), além de outras verbas (danos morais, estéticos, etc), não havendo qualquer teto ou limite para seu valor, salvo o montante do dano sofrido. Já o INSS não presta ao obreiro uma reparação de danos, mas sim um benefício acidentário (auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez, etc) que não visa à manutenção do padrão remuneratório percebido pelo trabalhador, mas sim a garantir-lhe um mínimo para que possa sobreviver dignamente, tendo seu valor limitado a patamares definidos na legislação. A indenização devida pela empresa não pressupõe incapacidade do obreiro, mas sim a comprovação do dano, o que é conceitualmente distinto [01]. Já o pagamento de benefício previdenciário pressupõe a incapacitação do trabalhador. Há ainda diferenças de menor monta, como a existência de ações distintas para que o trabalhador pleiteie seu direito em juízo (ação de indenização contra a empresa e ação acidentária contra o INSS). O quadro sinótico a seguir facilitará o entendimento das distinções: Espécie de responsabilidade pelo infortúnio do trabalho Pressupostos Verbas devidas Limitação de valor Incapacidade Responsabilidade civil da pessoa jurídica ou empresa individual Necessita de prova de culpa (responsabilidade subjetiva) Inclui o que o empregado perdeu (dano emergente) e o que deixou de ganhar (lucro cessante), além de outras verbas Não há limite para a indenização, ressalvado o valor do dano ocasionado Não se exige prova de incapacidade, mas sim prova do dano Responsabilidade do INSS Não necessita de prova de culpa (responsabilidade objetiva) Benefícios acidentários (auxílio-doença, auxílio acidente, aposentadoria por invalidez, pensão pormorte) Há limite legal para a o valor do benefício Exige-se prova da incapacidade Vejamos um exemplo concreto para que possamos fixar a responsabilidade por determinado acidente: imaginemos um empregado que após sair de seu local de trabalho na direção de seu automóvel venha a se acidentar no trânsito, no trajeto do trabalho para sua casa, daí resultando lesão corporal incapacitante. Trata-se de claro acidente de trabalho (acidente de trajeto ou in itinere). Responderá por ele o INSS? E o empregador? Claramente, o órgão previdenciário (INSS) estará obrigado à prestação de benefícios ou serviç os, uma vez que sua responsabilidade independe da perquirição de culpa. Dessa forma, ainda que a culpa pelo acidente referido seja atribuível ao trabalhador (culpa exclusiva da vítima) haverá a obrigação mencionada. No entanto, o empregador não contribuiu culposamente para o acontecimento mencionado, uma vez que não influiu mediante negligência, imprudência ou imperícia no resultado ocorrido. Diante disso, não será responsabilizada pelo evento. Nesse sentido: Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DO TRABALHO - INDENIZAÇÃO - DIREITO COMUM - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA - DIFERENÇAS - PROVA QUANTO À CULPA - AUSÊNCIA - DESCABIMENTO As ações de indenização por ato ilícito propostas em face das empregadoras não se confundem com aquelas propostas em face do INSS; nestas últimas, sendo o réu segurador obrigatório, basta a comprovação do mal e do nexo; nas primeiras, além do mal e do nexo, deve ficar sobejamente comprovada a culpa. Ap. c/ Rev. 603.743-00/6 - 12ª Câm. - Rel. Juiz ROMEU RICUPERO - J. 19.4.2001 (quanto a acidente-tipo) ANOTAÇÃO No mesmo sentido: - quanto a acidente-tipo: Ap. c/ Rev. 608.523-00/8 - 8ª Câm. - Rel. Juiz ORLANDO PISTORESI - J. 31.5.2001 - quanto a acidente: AI 715.900-00/6 - 5ª Câm. - Rel. Juiz LUIZ DE CARVALHO - J. 29.8.2001 - quanto a doença profissional: Ap. c/ Rev. 482.838-00/0 - JTA (LEX) 168/425 Ap. c/ Rev. 510.097-00/5 - 3ª Câm. - Rel. Juiz ACLIBES BURGARELLI - J. 17.3.98 Ap. c/ Rev. 517.824-00/0 - 3ª Câm. - Rel. Juiz ACLIBES BURGARELLI - J. 2.6.98 Ap. c/ Rev. 588.454-00/0 - 2ª Câm. - Rel. Juiz FELIPE FERREIRA - J. 9.10.2000 Ap. c/ Rev. 596.215- 00/9 - 3ª Câm. - Rel. Juiz FERRAZ FELISARDO - J. 5.2.2002 - quanto a acidente ´in itinere´: AI 693.042-00/0 - 5ª Câm. - Rel. Juiz LUÍS DE CARVALHO - J. 29.8.2001 Feitas as distinções iniciais, passemos as questões mais polêmicas a respeito do tema. 12.2 A competência para exame da matéria Com o advento na Emenda Constitucional 45/2004, reinou alguma controvérsia na jurisprudência do pretório Excelso quanto à definição da Justiça competente para o processo e julgamento das ações por responsabilidade civil derivadas de acidentes ou doenças ocupacionais, discutindo-se então se tocariam à Justiça do Trabalho ou à Justiça Comum. Historicamente, a matéria sempre esteve submetida ao crivo da Justiça Comum. Seguindo essa linha, pouco antes da entrada em vigor da Emenda Constitucional 45/2004, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu a questão, declarando a competência deste último ramo do Poder Judiciário, conforme decisão que transcrevemos a seguir. Supremo Tribunal Federal RE 349160 / BA - BAHIA RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE Órgão Julgador: Primeira Turma Publicação: DJ DATA-19-03-2003 PP-00040 EMENT VOL-02102-04 PP- 00864 Ementa EMENTA: I. Recurso extraordinário: prequestionamento: Súmula 356. O que, a teor da Súm. 356, se reputa carente de prequestionamento é o ponto que, indevidamente omitido pelo acórdão, não foi objeto de embargos de declaração; mas, opostos esses, se, não obstante, se recusa o Tribunal a suprir a omissão, por entendê-la inexistente, nada mais se pode exigir da parte, permitindo-se-lhe, de logo, interpor recurso extraordinário sobre a matéria dos embargos de declaração e não sobre a recusa, no julgamento deles, de manifestação sobre ela. II. Competência: Justiça comum: ação de indenização fundada em acidente de trabalho, ainda quando movida contra o empregador. 1. É da jurisprudência do STF que, em geral, compete à Justiça do Trabalho conhecer de ação indenizatória por danos decorrentes da relação de emprego, não importando deva a controvérsia ser dirimida à luz do direito comum e não do Direito do Trabalho. 2. Da regra geral são de excluir-se, porém, por força do art. 109, I, da Constituição, as ações fundadas em acidente de trabalho, sejam as movidas contra a autarquia seguradora, sejam as propostas contra o empregador. Apesar da orientação do STF, vários acórdãos da Justiça do Trabalho haviam se posicionado em sentido diverso afirmando a competência do Judiciário Trabalhista para resolver a questão, mantendo intensa controvérsia. A matéria, entretanto, veio a se pacificar no Supremo Tribunal Federal após certo período de indecisão, confirmando finalmente o Pretório Excelso que as causas referentes à responsabilização civil ainda não julgadas serão de competência da Justiça do Trabalho, enquanto aquelas que já possuírem sentença permanecerão na Justiça Comum. Essa foi a decisão tomada no CC 7204/MG (*acórdão publicado no DJU de 9.12.2005), cujo teor de um dos votos transcrevemos a seguir: Supremo Tribunal Federal EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO, PROPOSTA PELO EMPREGADO EM FACE DE SEU (EX-)EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA. REDAÇÃO ANTERIOR E POSTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/04. EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA COMUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA. Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda que movidas pelo empregado contra seu (ex-)empregador, eram da competência da Justiça comum dos Estados-Membros. 2. Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constituições anteriores. 3. Nada obstante, como imperativo de política judiciária — haja vista o significativo número de ações que já tramitaram e ainda tramitam nas instâncias ordinárias, bem como o relevante interesse social em causa —, o Plenário decidiu, por maioria, que o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o advento da EC 45/04. Emenda que explicitou a competência da Justiça Laboral na matéria em apreço. 4. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito. É dizer: as ações que tramitam perante a Justiça comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC 45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado, hão de ser remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontram,com total aproveitamento dos atos praticados até então. A medida se impõe, em razão das características que distinguem a Justiça comum estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas recursais, órgãos e instâncias não guardam exata correlação. 5. O Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica, atribuir eficácia prospectiva às suas decisões, com a delimitação precisa dos respectivos efeitos, toda vez que proceder a revisões de jurisprudência definidora de competência ex ratione materiae. O escopo é preservar os jurisdicionados de alterações jurisprudenciais que ocorram sem mudança formal do Magno Texto. 6. Aplicação do precedente consubstanciado no julgamento do Inquérito 687, Sessão Plenária de 25.08.99, ocasião em que foi cancelada a Súmula 394 do STF, por incompatível com a Constituição de 1988, ressalvadas as decisões proferidas na vigência do verbete. 7. Conflito de competência que se resolve, no caso, com o retorno dos autos ao Tribunal Superior do Trabalho. Relatório: Trata-se de conflito negativo de competência, suscitado pelo Tribunal Superior do Trabalho em face do recentemente extinto Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais. 2. Por meio dele, conflito, discute-se a competência para processar e julgar ação indenizatória por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, quando tal ação é proposta por empregado contra o seu empregador. Donde a controvérsia: competente é a Justiça comum estadual, ou a Justiça especializada do trabalho? 3. Pois bem, o fato é que Vicente Giacomini Peron ajuizou, na Justiça do Trabalho e contra o então Banco do Estado de Minas Gerais/BEMGE, ação de indenização por motivo de doença profissional. O que levou a Junta de Conciliação e Julgamento de Ubá/MG a se dar por incompetente e determinar a remessa dos autos a uma das Varas Cíveis daquela mesma Comarca. Pelo que a Justiça estadual julgou o pedido parcialmente procedente, resultando daí a interposição de recurso de apelação pelo Banco demandado. 4. Acontece que, ao apreciar o apelatório, o Tribunal de Alçada de Minas Gerais declinou de sua competência e determinou a devolução dos autos à Junta de Conciliação e Julgamento de Ubá/MG. Esta última, agora sim, aceitou o processamento da ação e, também ela, julgou parcialmente procedente o pedido do autor. Fato que ensejou a interposição de recurso ordinário — apenas parcialmente provido pelo TRT/3ª Região — e, posteriormente, recurso de revista. 5. Foi quando, na análise desta última impugnação, a 5a Turma do egrégio Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a incompetência da Justiça especial, de maneira a suscitar o presente conflito negativo de competência (tendo em vista a recusa anteriormente externada pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais). 6. Prossigo neste relato para consignar que o Ministério Público Federal opinou pela procedência da suscitação, em parecer assim ementado: "CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. QUINTA TURMA DO TST E TRIBUNAL DE ALÇADA DE MINAS GERAIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRABALHO. ART. 109, INCISO I, DA CF, E ART. 114, DA CF, COM A NOVA REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. REMANESCE A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA JULGAR AÇÃO INDENIZATÓRIA FUNDADA EM ACIDENTE DE TRABALHO. PRECEDENTES. PARECER PELO CONHECIMENTO DO CONFLITO, PARA QUE SE DECLARE COMPETENTE A JUSTIÇA COMUM ESTADUAL". 7. É o relatório, que submeto ao egrégio Plenário desta Casa (RI/STF, art. 6º, inciso I, "d"). Voto: Conforme visto, a questão que se põe neste conflito consiste em saber a quem compete processar e julgar as ações de reparação de danos morais e patrimoniais advindos do acidente do trabalho. Ações propostas pelo empregado em face de seu empregador, de sorte a provocar o seguinte questionamento: a competência é da Justiça comum estadual, segundo concluiu o órgão suscitante (TST), ou é da Justiça Obreira, como entendeu o suscitado (antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais)? 9. Começo por responder que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal proclama a competência da Justiça trabalhista para o conhecimento das ações indenizatórias por danos morais decorrentes da relação de emprego. Pouco importando se a controvérsia comporta resolução à luz do Direito Comum, e não do Direito do Trabalho. Todavia, desse entendimento o STF vem excluindo as ações reparadoras de danos morais, fundadas em acidente do trabalho (ainda que movidas pelo empregado contra seu empregador), para incluí-las na competência da Justiça comum dos Estados. Isso por conta do inciso I do art. 109 da Constituição Republicana. Foi o que o Tribunal Pleno decidiu, por maioria de votos, quando do julgamento do RE 438.639, sessão do dia 09/03/2005, na qual fiquei vencido, como Relator, na companhia do eminente Ministro Marco Aurélio. 10. Nada obstante, valendo-me do art. 6º do Regimento Interno da Casa, trago o presente conflito ao conhecimento deste colendo Plenário para rediscutir a matéria. É que, a meu sentir, a norma que se colhe do inciso I do art. 109 da Lei das Leis não autoriza concluir que a Justiça comum estadual detém competência para apreciar as ações que o empregado propõe contra o seu empregador, pleiteando reparação por danos morais ou patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho. É dizer: quanto mais reflito sobre a questão, mais me convenço de que a primeira parte do dispositivo constitucional determina mesmo que compete aos juízes federais processar e julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes...". Mas esta é apenas a regra geral, plasmada segundo o critério de distribuição de competência em razão da pessoa. Impõe-se atentar para a segunda parte do inciso, assim vocalizada: "...exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho". E esta segunda parte, como exceção que é, deve ser compreendida no contexto significante daquela primeira, consubstanciadora de regra geral. Em discurso quiçá mais elucidativo: à luz da segunda parte do inciso I do art. 109 da Constituição Federal, tem-se que as causas de acidente do trabalho em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas, na condição de autora, ré, assistente ou oponente, não são da competência dos juízes federais. 11. Remarque-se, então, que as causas de acidente do trabalho, excepcionalmente excluídas da competência dos juízes federais, só podem ser as chamadas ações acidentárias. Ações, como sabido, movidas pelo segurado contra o INSS, a fim de discutir questão atinente a benefício previdenciário. Logo, feitos em que se faz presente interesse de uma autarquia federal, é certo, mas que, por exceção, se deslocam para a competência da Justiça comum dos Estados. Por que não repetir? Tais ações, expressamente excluídas da competência dos juízes federais, passam a caber à Justiça comum dos Estados, segundo o critério residual de distribuição de competência. Tudo conforme serena jurisprudência desta nossa Corte de Justiça, cristalizada no enunciado da Súmula 501. 12. Outra, porém, é a hipótese das ações reparadoras de danos oriundos de acidente do trabalho, quando ajuizadas pelo empregado contra o seu empregador. Não contra o INSS. É que, agora, não há interesse da União, nem de entidade autárquica ou de empresa pública federal, a menos, claro, que uma delas esteja na condição de empregadora. O interesse, reitere-se,apenas diz respeito ao empregado e seu empregador. Sendo desses dois únicos protagonistas a legitimidade processual para figurar nos pólos ativo e passivo da ação, respectivamente. Razão bastante para se perceber que a regra geral veiculada pela primeira parte do inciso I do art. 109 da Lei Maior — definidora de competência em razão da pessoa que integre a lide — não tem como ser erigida a norma de incidência, visto que ela não trata de relação jurídica entre empregados e empregadores. Já a parte final do inciso I do art. 109 da Magna Carta, segundo demonstrado, cuida é de outra coisa: excepcionar as hipóteses em que a competência seria da própria Justiça Federal. 13. Deveras, se a vontade objetiva do Magno Texto fosse excluir da competência da Justiça do Trabalho matéria ontologicamente afeita a ela, Justiça Obreira, certamente que o faria no próprio âmbito do art. 114. Jamais no contexto do art. 109, versante, este último, sobre competência de uma outra categoria de juízes. 14. Noutro modo de dizer as coisas, não se encaixando em nenhuma das duas partes do inciso I do art. 109 as ações reparadoras de danos resultantes de acidente do trabalho, em que locus da Constituição elas encontrariam sua específica norma de regência? Justamente no art. 114, que proclama a competência da Justiça especial aqui tantas vezes encarecida. Competência que de pronto se define pelo exclusivo fato de o litígio eclodir entre trabalhadores e empregadores, como figura logo no início do texto normativo em foco. E já me antecipando, ajuízo que a nova redação que a EC nº 45/04 conferiu a esse dispositivo, para abrir significativamente o leque das competências da Justiça Laboral em razão da matéria, só veio robustecer o entendimento aqui esposado. 15. Com efeito, estabelecia o caput do art. 114, em sua redação anterior, que era da Justiça do Trabalho a competência para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho. Ora, um acidente de trabalho é fato ínsito à interação trabalhador/empregador. A causa e seu efeito. Porque sem o vínculo trabalhista o infortúnio não se configuraria; ou seja, o acidente só é acidente de trabalho se ocorre no próprio âmago da relação laboral. A possibilitar a deflagração de efeitos morais e patrimoniais imputáveis à responsabilidade do empregador, em regra, ora por conduta comissiva, ora por comportamento omissivo. 16. Como de fácil percepção, para se aferir os próprios elementos do ilícito, sobretudo a culpa e o nexo causal, é imprescindível que se esteja mais próximo do dia-a-dia da complexa realidade laboral. Aspecto em que avulta a especialização mesma de que se revestem os órgãos judicantes de índole trabalhista. É como dizer: órgãos que se debruçam cotidianamente sobre os fatos atinentes à relação de emprego (muitas vezes quanto à própria existência dela) e que por isso mesmo detêm melhores condições para apreciar toda a trama dos delicados aspectos objetivos e subjetivos que permeiam a relação de emprego. Daí o conteúdo semântico da Súmula 736, deste Excelso Pretório, assim didaticamente legendada: "Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores". 17. Em resumo, a relação de trabalho é a invariável matriz das controvérsias que se instauram entre trabalhadores e empregadores. Já a matéria genuinamente acidentária, voltada para o benefício previdenciário correspondente, é de ser discutida com o INSS, perante a Justiça comum dos Estados, por aplicação da norma residual que se extrai do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro. 18. Nesse rumo de idéias, renove-se a proposição de que a nova redação do art. 114 da Lex Maxima só veio aclarar, expletivamente, a interpretação aqui perfilhada. Pois a Justiça do Trabalho, que já era competente para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da relação trabalhista, agora é confirmativamente competente para processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho (inciso VI do art. 114). 19. Acresce que a norma fundamental do inciso IV do art. 1o da Constituição Republicana ganha especificação trabalhista em vários dispositivos do art. 7o, como o que prevê a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso XXII), e o que impõe a obrigação do seguro contra acidente do trabalho, sem prejuízo, note-se, da indenização por motivo de conduta dolosa ou culposa do empregador (inciso XXVIII). Vale dizer, o direito à indenização em caso de acidente de trabalho, quando o empregador incorrer em dolo ou culpa, vem enumerado no art. 7o da Lei Maior como autêntico direito trabalhista. E como todo direito trabalhista, é de ser tutelado pela Justiça especial, até porque desfrutável às custas do empregador (nos expressos dizeres da Constituição). 20. Tudo comprova, portanto, que a longa enunciação dos direitos trabalhistas veiculados pelo art. 7o da Constituição parte de um pressuposto lógico: a hipossuficiência do trabalhador perante seu empregador. A exigir, assim, interpretação extensiva ou ampliativa, de sorte a autorizar o juízo de que, ante duas defensáveis exegeses do texto constitucional (art. 114, como penso, ou art. 109, I, como tem entendido esta Casa), deve-se optar pela que prestigia a competência especializada da Justiça do Trabalho. 21. Por todo o exposto, e forte no art. 114 da Lei Maior (redações anterior e posterior à EC 45/04), concluo que não se pode excluir da competência da Justiça Laboral as ações de reparação de danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho, propostas pelo empregado contra o empregador. Menos ainda para incluí-las na competência da Justiça comum estadual, com base no art. 109, inciso I, da Carta de Outubro. 22. No caso, pois, julgo improcedente este conflito de competência e determino o retorno dos autos ao egrégio Tribunal Superior do Trabalho, para que proceda ao julgamento do recurso de revista manejado pelo empregador. É o meu voto. Essa linha, aliás, já vinha sendo adotada pelo STF quando da elaboração da Súmula 736, publicada no DJ de 09/12/2003, com o seguinte texto: "Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores", que dizia respeito particularmente ao ajuizamento de ações civis públicas para obrigar os empregadores ao cumprimento de normas de segurança e saúde ocupacional. O Superior Tribunal de Justiça acabou também por acolher o entendimento supracitado, afirmando competir à Justiça do Trabalho processar e julgar ações de indenização por dano moral decorrentes de acidente de trabalho, desde que ainda não prolatada sentença na Justiça comum (art. 114 da CF/1988 com nova redação a partir da EC n. 45/2004) no julgamento do AgRg no CC 53.744-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/11/2005. Diante disso, podemos dizer que a competência para julgamento das ações de responsabilidade civil movidas pelo empregado em face do empregador tendo como causa de pedir a ocorrência de acidente ou doença do trabalho está praticamente pacificada. Restará à Justiça do Trabalho formar novos entendimentos sobre a matéria (ou acompanhar aqueles anteriormente fixados pela Justiça Estadual). 12.3 Responsabilidade civil. É ainda necessáriaa existência de culpa do empregador? A responsabilidade civil se consubstancia na obrigação de reparar o dano, por todo aquele que, por ação ou omissão voluntária, imprudência, negligência ou imperícia, violar direito ou causar prejuízo a outrem. Doutrinariamente, até sob o ponto de vista histórico e ressalvadas algumas exceções pontuais, sempre se reconheceu no ordenamento jurídico pátrio que seria necessária à responsabilização civil em geral a presença dos seguintes pressupostos: 1.Ação ou omissão do empregador ou responsável técnico; 2.Existência de dolo (intenção) ou culpa (não observância de um dever de cuidado imposto em norma) na ação ou omissão supracitadas; 3.Resultado lesivo ao empregado (dano); 4.Nexo de causalidade entre a ação ou omissão do empregador ou responsável técnico e o resultado lesivo ocorrido; Porém, o novo Código Civil (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002) inovou a matéria, suscitando dúvidas sobre a necessidade da culpa para a indenização em matéria de infortúnio do trabalho, havendo alguns intérpretes favoráveis à adoção da responsabilidade objetiva (sem culpa) para tais casos. A polêmica foi inaugurada com a redação de referido diploma legal, que em seu art. 927 e parágrafo único, dispõe: Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Nos termo s do dispositivo supracitado, considerando que a atividade empresarial causa riscos ao empregado, argumentam alguns que a responsabilidade no caso seria objetiva (independente de culpa), ou mesmo que haveria uma presunção de culpa do empregador no infortúnio, consubstanciando uma inversão do ônus probatório. É o caso do ilustre doutrinador Sebastião Geraldo de Oliveira, em recente obra, na qual, visualizando as futuras tendências da questão ora abordada e citando a doutrina anterior, argumenta: "[...] Conforme se depreende do exposto, entendemos perfeitamente aplicável a teoria do risco na reparação civil por acidente do trabalho [...] Se um autônomo ou um empreiteiro sofrer acidente, o tomador dos serviços responde pela indenização, independente da culpa, com apoio na teoria do risco; no entanto, o trabalhador permanente, com os devidos registros formalizados, não tem assegurada essa reparação! Se um bem ou equipamento de terceiros for danificado pela atividade empresarial, haverá indenização, considerando os pressupostos da responsabilidade objetiva, mas o trabalhador, exatamente aquele que executa a atividade, ficará excluído[...]". Muito embora enalteçamos o ilustre doutrinador, ousamos divergir de referido posicionamento. Primordialmente, há aqui uma questão relativa à hierarquia das normas, uma vez que o art. 7o, XXVIII, da Constituição, preceitua serem direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; (grifos nossos). Assim, entendemos que se a Constituição da República exige a existência de culpa para a responsabilização, não poderá a legislação ordinária dispensá-la, pena de se tornar inconstitucional. Ao depois, não concordamos que a teoria do risco venha a se aplicar a autônomos ou a empreiteiros, pois será também exigível em tais casos, por similaridade de circunstâncias, a existência de culpa para fundamentar a responsabilização. Por fim, entendemos que a mera ocorrência de risco na atividade não é suficiente e nem constitui o princípio basilar por trás da responsabilização objetiva. Como ressalta Fábio Ulhoa Coelho, o fundamento primeiro da existência da responsabilização sem culpa (responsabilidade objetiva) não é meramente a existência de risco ou a vontade de praticar determinada atividade à qual o risco seja inerente, mas sim a possibilidade de que o custo de determinada atividade venha a ser repassado à sociedade como um todo. Segundo este último, "A doutrina costuma apontar o risco, inerente ao exercício de determina atividade, como o fundamento da responsabilidade objetiva (Savatier, 1945; Lima, 1960; Dias, 1979: passim). O fabricante de fármacos assume forçosamente um risco, inerente à exploração de qualquer atividade econômica, que é o de produzir e comercializar algumas unidades com defeitos. Pois bem, seria tal risco o fundamento valorativo para as normas jurídicas estabelecedoras da responsabilidade objetiva: da opção de o assumir decorreria, segundo tal formulação, a justeza da imputação do dever de indenizar. No final, não se livram os partidários dessa doutrina de algum apego à noção clássica da vontade do devedor como fonte da obrigação. De fato, ao se tomar o risco de determinada atividade por fundamento da responsabilidade objetiva, considera-se o demandado responsável pelo dano, em última análise, em razão de ter ele querido dedicar-se à atividade [...] Não é esse, contudo, o melhor enfoque a ser emprestado à matéria. Na verdade, o fundamento axiológico e racional para a responsabilidade objetiva não são propriamente os riscos da atividade, mas a possibilidade de se absorverem as repercussões econômicas ligadas ao evento danoso, por meio da distribuição do correspondente custo entre as pessoas expostas ao mesmo dano ou, de algum modo, beneficiárias do evento. É o mecanismo da socialização da das repercussões econômicas do dano, que torna justa a imputação da responsabilidade aos agentes em condições de o acionar. Note-se que o Estado pode responder objetivamente pelos danos causados por seus funcionários, porque tem meios para distribuir entre os contribuintes – mediante criação e cobrança de tributos – os encargos derivados de sua responsabilização. Por outro lado, o fornecedor pode ter responsabilidade objetiva por acidentes de consumo, na medida em que consegue incluir na composição de seus preços um elemento de custo correspondente às indenizações por aqueles acidentes[...]" Verifica-se, porém, que, para o Direito do Trabalho o conceito de empregador abrange não só aquele que exerce a atividade empresarial, mas também aqueles que se equiparam a empregador (art. 2º, §1º, da CLT), sendo enquadrados nesta última categoria os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados. A situação econômica e financeira dessas últimas categorias é muito diferente daquela inerente aos empregadores praticantes de atividade empresarial em sentido estrito. Poderá, por exemplo, o profissional liberal, acionado por seu empregado em virtude de uma doença do trabalho adquirida no ambiente laboral e sendo obrigado a repará-lo (embora não tenha a ele dado causa culposamente), repassar tais custos à coletividade? Sabe-se bem que dificilmente se conseguirá essa proeza. Se até mesmo as grandes empresas nos dias de hoje têm enormes dificuldades em repassar seus custos aos preços diante de condições maiores ou menores de elasticidade de demanda, mais ainda terão as instituições sem fins lucrativos, as associações e os profissionais liberais. Ademais, dizer que a responsabilidade da pessoajurídica ou empresa individual é objetiva, independendo da prova de culpa, além de afrontar diretamente o texto constitucional, torna a empresa obrigada a reparar eventos infortunísticos em que facilmente se constata a injustiça da responsabilização. Basta para tanto verificarmos três tipos de infortúnios do trabalho que ocorrem com razoável freqüência na prática, sem qualquer concurso culposo do empregador: - Acidente de trajeto ou in itinere: como vimos anteriormente, o acidente ocorrido com o empregado quando no trajeto casa-trabalho, trabalho-casa é conceituado como acidente do trabalho pela Lei 8.213/91, fato este que ocorre em regra sem qualquer intervenção do empregador. Não obstante, caso aplicada a teoria da responsabilidade civil objetiva, a empresa estará obrigada a indenizar o empregado ou a família deste por fato ocorrido sem sua intervenção culposa (mas sim por culpa de terceiro ou do próprio empregado, p.ex.: abuso de velocidade, embriaguez, etc). Será justo responsabilizar o empregador por tal fato, fazendo-o desembolsar quantias que podem superar vultosa quantia? - Hipersuscetibilidade individual do empregado: há casos práticos de empregados que são hipersuscetíveis a determinados agentes existentes no ambiente de trabalho, ou mesmo a materiais que não representam risco algum. Verifique-se, por exemplo, o caso de empregado que adquire dermatose ocupacional de natureza alérgica pelo uso de equipamentos de proteção individual (luvas, máscara ou bota), ou mesmo daquele empregado que por sua excepcional suscetibilidade vem a contrair perda auditiva, mesmo em ambiente de trabalho cujos níveis de ruído foram mantidos abaixo do nível de ação (metade da dose - norma NR-9). Seria justo que o empregador respondesse pela hipersuscetibilidade do empregado? Cremos que não - Culpa exclusiva do empregado no acidente: Suponhamos o caso do empregado que, mesmo treinado e advertido pelo empregador, vem a retirar as proteções de uma determinada máquina para dar-lhe maior produtividade, vindo posteriormente a se acidentar em referido equipamento. E nem se argumente que a culpa exclusiva exclui o nexo causal, como querem alguns doutrinadores, pois que em tal caso é indiscutível a presença de tal vínculo com o trabalho, tanto assim que é indubitável a obrigação de reparar o infortúnio a cargo do INSS (cuja responsabilização é de natureza objetiva) pelo pagamento de benefício acidentário em caso de culpa exclusiva da vítima. Seria justo responsabilizar o empregador pelo fato? Mais uma vez entendemos pela negativa Daí porque concordamos com RUI STOCO no que preceitua: "Há intérpretes que visualizaram, a partir da vigência do Código Civil de 2002, a possibilidade de os acidentes do trabalho serem enquadrados como intercorrências que ensejam responsabilidade objetiva ou independente de culpa do empregador, com supedâneo no referido art. 927, parágrafo único, quando o empregador exerça atividade perigosa ou que exponha a riscos, como, por exemplo, Henrique Gomes Batista (Código Civil altera indenizações. Valor Econômico – Caderno de Legislação, 19.02.2002). Não vemos essa possibilidade, pois a responsabilidade civil, nas hipót eses de acidente do trabalho com suporte na culpa (lato sensu) do patrão está expressamente prevista na Constituição Federal". Argumentam ainda alguns que a responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva (art. 14, §1º, da Lei 6.938/81) e que assim também deveria ser o regime de responsabilização pelos acidentes e doenças do trabalho. Também não chegam a convencer os argumentos citados. Com efeito, quando a legislação impõe a responsabilidade objetiva do poluidor ambiental está visando prioritariamente àquele que exerce atividade industrial em larga escala e cuja atividade prejudica a coletividade como um todo (p.ex.: atividades extrativas, mineração, etc). Tem ele, em regra, a estruturação empresarial e poderá repassar seus riscos ao consumidor por intermédio de seus preços. Não ocorre a mesma situação com os acidentes e doenças do trabalho, que, além de não ocorrerem somente em atividades de maior porte, são individualizados por trabalhador ou pequenos grupos de trabalhadores, não afetando a coletividade como um todo, salvo se considerarmos os efeitos indiretos de tais eventos. Assim sendo, para que haja responsabilidade civil do empregador é preciso que este, por si ou por intermédio de seus representantes, atue ou se omita dolosa (intencionalmente) ou culposamente (sem intenção, mas deixando de observar, por negligência, imprudência ou imperícia, um dever de cuidado imposto em norma). Caso inexistam tais pressupostos (dolo ou culpa), nem por isso o infortúnio restará não de alguma forma reparado, pois que ficará a cargo dos órgãos estatais previdenciários a prestação de benefícios ao obreiro. No entanto, não haverá indenização a ser paga por parte do empregador. Cabe salientar, por fim, que a jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, após o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, parece se manter firme na linha ora defendida, qual seja, a necessidade, mesmo após a superveniência do Código Civil, da existência de culpa do empregador, para a existência da responsabilidade civil por acidente ou doença do trabalho. Nesse sentido: Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região DOENÇA PROFISSIONAL - Indenização por danos materiais e morais - Requisitos: prática de ato ilícito (por ação ou omissão, decorrente de dolo ou culpa), verificação de prejuízo e nexo causal entre ação e dano - Trata-se de responsabilidade subjetiva do empregador, dependente de aferição de culpa ou dolo - A responsabilidade objetiva restringe-se ao órgão previdenciário, cuja obrigação nasce da mera constatação do infortúnio. TRT/SP - 01187200204802008 - RO - Ac. 7ªT 20050595177 - Rel. CATIA LUNGOV - DOE 09/09/2005 Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região ACÓRDÃO Nº: 20060136957 Nº de Pauta:025 PROCESSO TRT/SP Nº: 01321200307802003 RECURSO ORDINÁRIO - 78 VT de São Paulo RECORRENTE: CARLOS ROBERTO OLIVEIRA RECORRIDO: INSTITUTO CRIANÇA CIDADÃ EMENTA A indenização por acidente do trabalho só é devida na hipótese de culpa do empregador, nos termos do art. 186 e 927 do Código Civil. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região Danos materiais e morais. Redução da capacidade auditiva. Culpa da empresa não evidenciada. Nexo causal não estabelecido. Pedido improcedente. Prova documental e testemunhal que revela ter a empresa observado, com rigor, as normas de medicina e segurança do trabalho, especialmente quanto ao fornecimento e fiscalização do uso do protetor auricular. Hipótese em que o próprio autor foi integrante da CIPA, durante dois anos. Prova (confissão) a indicar que o autor exerceu, antes, atividade que o expunha a níveis excessivos de ruído, sem proteção. Exames médicos que já indicavam trauma acústico no período inicial do contrato de trabalho. Circunstâncias que, somadas, afastam a idéia de culpa do empregador e o próprio nexo etiológico. Pedido improcedente. Sentença mantida. TRT/SP - 00860200608902001 - RO - Ac. 11ªT 20060286380 - Rel. EDUARDO DE AZEVEDO SILVA - DOE 19/05/2006. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região ACÓRDÃO NUM: 20050887968 DECISÃO: 06 12 2005TIPO: RO01 NUM: 00714 ANO: 2004 NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 00714-2003-302-02- 00RECURSO ORDINÁRIOTURMA: 10ª ÓRGÃO JULGADOR - DÉCIMA TURMA FONTEDOE SP, PJ, TRT 2ª Data: 17/01/2006 PG: RELATOR: EDIVALDO DE JESUS TEIXEIRA REVISOR(A):RILMA APARECIDA HEMETÉRIO EMENTA DANO MATERIAL E MORAL DECORRENTE DE ACIDENTE DO TRABALHO. NECESSIDADE DE PROVA DA CULPA DO EMPREGADOR. A culpa, nessa hipótese, não se presume. Necessária a existência de prova apta a demonstrar que o empregador, por omissão voluntária, negligência ou imprudência, tenha dado causa à eclosão do acidente de trabalho (artigos 7º, XXVIII, CF, 159, CC/1916, 186 e 927 CC/2002). Veja-se que a norma regente relaciona a responsabilidade do agente à prática de ato ilícito, ou seja, contrário à ordem jurídica vigente. Como destaca Caio Mario "a iliceidade da conduta está no procedimento contrário a um dever preexistente". O ato ilícito, segundo a doutrina, pode ser comissivo ou omissivo. O primeiro, se materializa quando o agente orienta sua ação num sentido contraveniente à lei; o segundo eclode quando o agente se abstém de atuar e, com sua inércia, viola um direito predeterminado. Inexistente prova de que a empresa tenha agido em desconformidade com o ordenamento jurídico, evidente a inexistência do dever de indenizar. Diferem as responsabilidades do empregador e do órgão previdenciário estatal (INSS) na ocorrência de infortúnios laborais. Ao primeiro, caberá a indenização do obreiro em caso de procedimento negligente patronal. Ao segundo, incumbirá, independentemente da prova de culpa, a prestação do benefício cabível na espécie; Pacificou-se na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a competência da Justiça do Trabalho para o processo e julgamento das ações envolvendo responsabilidade civil de empregador decorrente de acidente do trabalho ou doença ocupacional; Com o advento do novo Código Civil (Lei 10.406/2002) alguns doutrinadores entendem que a responsabilidade do empregador por acidentes ou doenças do trabalho passou a ser objetiva (sem a exigência de prova de culpa), posição com a qual não concordamos pelos seguintes motivos: 1) diante da redação do art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal, subsiste a necessidade de culpa; 2) em face da impossibilidade de distribuição das perdas à coletividade de todos os empregadores sujeitos a tal regime; 3) referida disciplina poderá levar a sérias injustiças nos casos concretos. 13. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO NO SETOR RURAL Se, no geral, o Brasil registra marcas preocupantes com relação aos acidentes do trabalho, no setor ru ral a situação é muito pior. Enquanto na área rural um índice de 1,29% dos acidentes terminam com morte, no campo esse percentual aumenta para 2,57%, além do que é na área agrícola que o número de acidentes não- registrados é muitíssimo maior do que nos centros urbanos, porque, naturalmente, lá o índice de trabalhadores sem registro em carteira é consideravelmente maior, a ponto de a OIT - Organização Internacional do Trabalho - afirmar que os trabalhadores agrícolas correm, pelo menos, o dobro de riscos de morrer no local de trabalho do que os empregados dos demais setores ("O Globo", pág. 25, de 17.2.98). Afirma, ainda, aquela organização, que a situação é mais grave nos países em desenvolvimento, devido aos baixos índices educacionais. Lamentavelmente, no meio rural brasileiro, em especial, temos os ma iores índices de analfabetismo, falta de instrução e alto índice de miséria, que contribuem para a manutenção das precárias condições de trabalho desses irmãos brasileiros que produzem o feijão e o arroz da mesa de milhões de brasileiros. As principais causas de acidentes no campo são a falta de treinamento para lidar com maquinário, com agrotóxicos e, ainda, inexistência, em muitos casos, de equipamentos adequados de proteção individual e coletiva. Segundo Eduardo Garcia, engenheiro agrônomo e pesquisador da FUNDACENTRO, os maiores problemas com intoxicação ocorrem nas culturas de melancia, soja, batata, algodão e tomate (entrevista no jornal "O Globo”, de17.02.98). "Dados de pesquisa entre produtores e trabalhadores rurais mostram o alto risco do uso de agrotóxicos na agricultura paulista, que pode estar trazendo sérios prejuízos à saúde pública e ao meio ambiente. O levantamento é o primeiro resultado de um convênio assinado no ano passado, entre a FUNDACENTRO e a Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, para implementação do Programa de Segurança e Saúde do Trabalhador Rural" (Revista da FUNDACENTRO, ano II, nº 7, pág.23). Conforme essa pesquisa, o Brasil consome 1/5 de todo o agrotóxico utilizado pelo terceiro mundo, dado esse alarmante, levando-se em conta que, entre 1995 e 1996, houve um aumento de 16,7%, o que ensejou o seguinte comentário do já mencionado engenheiro agrônomo da FUNDACENTRO : "A falta de orientação e controle sobre o uso de agrotóxico, além da carência de informações sobre outras técnicas de manejo fitossanitário, que reduzam a necessidade do produto, têm impacto direto na saúde e segurança dos trabalhadores rurais, no meio ambiente e na qualidade dos alime ntos que são levados à mesa do consumidor". O pior é que o uso de agrotóxicos vem aumentando no campo, sem controle. Além dos adultos, vem sofrendo suas conseqüências também os menores que manuseiam com a mais absoluta normalidade qualquer tipo de defensivo agrícola, conforme temos constatado em Inquéritos Civis Públicos que apuram irregularidades do trabalho do menor e do meio ambiente do trabalho - irregularidades essas mostradas vez por outra pelas redes de televisão do país. As conseqüências do uso dos agrotóxicos pelos trabalhadores rurais podem acompanhá-los pelo resto de suas vidas. Como prova disso, lembramos que o país inteiro foi tomado por comoção nacional, quando da morte de Leandro, integrante de uma das mais conceituadas duplas sertanejas. Acometido por um tumor cancerígeno, de espécie rara, veio a óbito, cujas causas estão sendo hoje discutidas na classe médica, com, inclusive, suspeitas de que o mal tenha sido gerado quando ele trabalhava na lavoura do tomate, em meio a intensivo uso de agrotóxicos, segundo veiculado no dia 1º.7.98, pela jornalista Marília Gabriela, no Programa SBT-Repórter. Mas, se a falta de cultura e instrução do trabalhador rural contribuem para o aumento dos acidentes de trabalho, por outro lado, patrões inconseqüentes têm colocado em risco a saúde e segurança de milhares de bóias-frias catadores de laranja, "pulverizando-os", antes de entrarem nas fazendas, com um agrotóxico chamado QUATERMON, cuja autorização pelo Ministério da Saúde destina-se apenas à pulverização da lavoura, veículos e equipamentos agrícolas e, jamais, do ser humano. Esse tipo de atitude descabida e desumana tem rendido ensejo à instauração de Inquéritos Civis Públicos pelo Ministério Público do Trabalho, com embasamento na atuação fiscalizatória do Ministério do Trabalho e até o ajuizamento de Ações Civis Públicas para coibi-las, como ocorreu no processo nº 1925/97, da 2ª JCJ de Araraquara, quando, liminarmente, foi determinada, mediante cominação de multa, a suspensão dos "banhos" de defensivos agrícolas que vinham tomando os trabalhadores pela manhã, antes de adentrarem os pomares de laranja, como se instrumentos fossem. Merecem também registro os acidentes, não raros, sofridos por trabalhadores rurais no transporte para o trabalho, muitas vezes em razão das péssimas condições de uso dos velhos e inadequados veículos utilizados quase sempre pelos "gatos" que estão a serviço dos donos do capital e que também correm risco de vida, como recentemente noticiou a imprensa ("O Estado de São Paulo", cad. 6-6, de 23.6.98) a morte de mais 12 bóias-frias, em Olímpia, região de São José do Rio Preto, em São Paulo. Também em 6.11.97, no município de Macatuba-SP, outros 19 trabalhadores rurais foram vitimados por um acidente rodoviário, quando se dirigiam para o trabalho, cuja apuração, peloMinistério Público do Trabalho (Procedimento Investigatório nº 999/97-5), constatou que os mesmos sequer tinham registro em carteira, o que levou à responsabilização dos tomadores dos serviços pelas indenizações devidas - o que é pouco, pois é urgente que se aplique o Código Penal a quem coloca em risco a vida de trabalhadores. Nos últimos tempos, tem sido decisivo, para o aumento dos acidentes de trabalho e degradação das condições de trabalho e vida dos trabalhadores rura is, o implemento de cooperativas de trabalho fraudulentas, que, a pretexto de criar empregos, na verdade vêm substituindo antigos postos de trabalho regidos pela CLT, por trabalho precarizado, sem qualquer garantia e segurança para o cidadão que trabalha no campo. Neste caso, dificulta-se a fiscalização do meio ambiente do trabalho porque, segundo a expressão usual, os "cooperados" são trabalhadores autônomos - ou anônimos como os próprios assim se denominam - e desta forma os tomadores e beneficiários da mão-de-obra se dizem isentos de qualquer responsabilidade pelo cumprimento das normas de segurança e higiene no trabalho. E, no final, a sociedade inteira paga a conta! Aliás, não é só no setor rural que vem ocorrendo essa situação de risco, pois com a onda de desregulamentação atual do Direito Laboral, como pregam os neoliberais radicais e vêm aplicando os capitalistas inconseqüentes, daqui há pouco talvez nem mais se tenha Direito do Trabalho para preocupar os senhores tecnocratas da economia globalizada. E tudo volta ao que era antes. 13.1 NORMAS REGULAMENTADORAS SOBRE O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO RURAL A Lei nº 5.889/73 - Estatuto do Trabalhador Rural - estabeleceu, no artigo 13, que nos locais de trabalho rural serão observadas as normas de segurança e higiene estabelecidas em Portaria do Ministério do Trabalho e Previdência Social. Assim, em 1988, o MTb baixou a Portaria nº 3.067 que aprovou Normas Regulamentadoras Rurais – NRRs – relativas à Segurança e Higiene do Trabalho Rural. São cinco NRRs que tratam de: Disposições Gerais (NRR- 1); Serviços Especializados em Prevenção de Acidentes do Trabalho Rural – SEPATR (NRR-2); Comissão Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho Rural – CIPATR (NRR-3); Equipamentos de Proteção Individual – EPI (NRR-4) e de Produtos Químicos (NRR-5). Essas normas, evidentemente, não afastam a aplicação de outras que tratem da matéria, quando compatíveis, como, por exemplo, as NRs baixadas pela Portaria nº 3.214/78. Alguns itens dessas NRRs merecem destaque. No item 1.7 estabeleceu-se que cabe ao empregador rural: a) cumprir e fazer cumprir as NRRs; b) expedir e divulgar ordens de serviço sobre segurança e higiene do trabalho rural, tendo em conta os riscos genéricos e específicos do estabelecimento e de cada atividade; c) orientar os trabalhadores sobre técnicas prevencionistas a serem adotadas, objetivando evitar acidentes do trabalho e doenças profissionais; d) determinar os procedimentos que deverão ser adotados em caso de acidentes do trabalho rural; e) colaborar com as autoridades na adoção de medidas que visem à proteção dos trabalhadores rurais. Item 1.8 – Cabe ao trabalhador rural: a) cumprir as NRRs, bem como as ordens de serviço que forem estabelecidas para o desempenho de suas funções; b) usar, obrigatoriamente, os EPIs. Item 1.9 – Constitui falta grave a recusa injustificada do empregado ao cumprimento das disposições das NRRs. Item 1.10 – Constituem direitos dos trabalhadores: a) conhecer os riscos de suas atividades; b) promover a correção dos riscos; c) denunciar à autoridade competente a existência de atividades em condições de riscos graves e iminentes. Item 1.11 – Nos cursos e treinamentos de formação profissional rural promovidos pelo Serviço de Formação Profissional Rural – SENAR, serão incluídos tópicos sobre prevenção de riscos e acidentes do trabalho de acordo com as peculiaridades da atividade. Item 1.12 – Além das NRRs, aplicam-se ao trabalho rural, no que couber, as seguintes Normas Regulamentadoras – NRs aprovadas pela Portaria nº 3.214, de 08 de junho de l978, observadas as alterações posteriores: a) NR-7 - Exame médico; b) NR-15 – Atividades e operações insalubres; c) NR-16 – Atividades e operações perigosas. Item 3.1 – O empregador rural que mantenha a média de 20 ou mais trabalhadores fica obrigado a organizar e manter em funcionamento, por estabelecimento, uma Comissão Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho Rural – CIPATR. Item 3.5 – O mandato dos membros da CIPATR será de 2 anos, permitida uma recondução. 13.2 PREVENÇÃO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO RURAL Como consta da Portaria 3.067/88 e de outras normas legais, cabe ao Ministério do Trabalho, através dos seus órgãos, coordenar, orientar e fiscalizar sobre o cumprimento das normas legais sobre o meio ambiente do trabalho rural, no âmbito administrativo, usando, se for o caso, do poder de polícia, autuando e aplicando multas aos infratores das normas atinentes. Mas é certo que nem sempre essa atuação surte os efeitos desejados, mesmo esgotando o Ministério todos os seus recursos. Daí, surge a atuação do Ministério Público do Trabalho, como instituição que tem por dever defender a ordem jurídica como um todo e os interesses indisponíveis da sociedade. Com a Constituição de 1988, que priorizou e incentivou a questão da prevenção de acidentes e alterou substancialmente as atribuições do Ministério Público do Trabalho, novas ações passaram a ser ajuizadas, agora buscando-se obrigar o empregador a cumprir as normas de segurança e higiene e prevenir efetivamente o meio ambiente do trabalho. Estas são as novas Ações Civis Públicas, conforme tratamos no nosso "Segurança e meio ambiente do trabalho: uma questão de ordem pública", in Genesis - Revista de Direito do Trabalho, nº 37. Entretanto, dúvida tem surgido sobre qual o juízo competente para apreciar e julgar tais ações envolvendo o meio ambiente do trabalho: o comum ou o trabalhista? Uns defendem a competência da Justiça Comum dos Estados, por entender que se trata de uma questão entre o Estado que tem o dever de garantir o direito à saúde e à segurança do trabalhador, e um estabelecimento industrial, comercial ou agrícola. A este argumento, acrescenta-se aquele de que as questões acidentárias são sempre da competência da Justiça Comum, como previam as Constituições da República, antes da Carta de 1988 (in "Meio Ambiente do Trabalho: Prevenção e Reparação. Juízo Competente", Revista do Ministério Público do Trabalho, Brasília, nº 14, 9/1997), cujo preceito a respeito tinha o seguinte teor: "Os dissídios relativos a acidentes do trabalho são da competência da Justiça Ordinária". A partir da análise dos comandos constitucionais que vêm tratando da questão desde 1946 e, sobretudo, com base nos artigos 109 e 114, ambos da atual Constituição, forma -se outro entendimento pela competência da Justiça do Trabalho, do qual compartilhamos. "É que, como sustentamos em outros trabalhos a respeito da matéria, o conteúdo do contrato de trabalho não é composto apenas de salários, férias, 13º salário, aviso prévio, mas nele se inclui, como um dos primeiros direitos do empregado, o meio ambiente do trabalho seguro e adequado. Com efeito, o empregado, ao colocar à disposição de outrem a sua força de trabalho, mediante contrato de trabalho celebrado, tem como correspondência inúmeros direitos, além do pagamento de salários. E um deles, dos mais importantes, é a prestação dos serviços em local salubre e com adequadas condições ambientais, a fim de que possa manter rigidez física apta ao desempenho das funções para as quais foi contratado. E isto faz parte, sem sombra de dúvida, e como preleciona De LaCueva, do contrato de trabalho, como obrigação patronal que, se descumprida (art. 157 e incisos da CLT), autoriza o empregado, entre outras providências, a dar por rescindido o contrato de trabalho (art. 483, "d", da CLT) e pleitear as indenizações devidas perante a Justiça laboral. Da mesma forma, é nessa especializada que se discute sobre condições e meio ambiente do trabalho, porquanto, sendo obrigação do Estado fazer cumprir, administrativamente, normas sobre segurança do trabalho - e também todas as demais normas trabalhistas - não havendo êxito nesta tarefa, cabe, a quem legitimado, bater às portas do Judiciário (art. 5º, XXXV/CF) " – ibidem. É da Justiça comum estadual a competência para apreciar e julgar apenas as ações decorrentes de acidentes do trabalho que tenham como objeto o pedido de indenização de responsabilidade do órgão previdenciário, como, por exceção, constou na Constituição Federal (artigos 109, I, e § 3º e 201). Nesse sentido já decidiu o STJ, apreciando conflito positivo de competência suscitado pelo Ministério Público do Trabalho em ação civil pública sobre meio ambiente do trabalho, verbis: EMENTA: "CONFLITO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO DE NATUREZA TRABALHISTA - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESPECIALIZADA. 1) A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações tipicamente trabalhistas. 2) Conflito conhecido e provido para declarar competente a 13ª Junta de Conciliação e Julgamento de Porto Alegre para julgar as duas ações propostas. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente a Décima Terceira Junta de Conciliação e Julgamento de Porto Alegre-RS, suscitada. Votaram com o Relator os Ministros Demócrito Reinaldo, Gomes de Barros, Milton Pereira, César Rocha, Pádua Ribeiro, José de Jesus, Garcia Vieira e Hélio Mosimann. VOTO O EXMO. SR. MINISTRO PEÇANHA MARTINS (RELATOR) Adoto, em linhas gerais, o parecer do douto representante do Ministério Público Federal, Dr. José Arnaldo da Fonseca. Não há menor dúvida de que as pretensões deduzidas, na fase em que se encontram, são tipicamente trabalhistas. Posteriormente, na eventualidade dos trabalhadores sofrerem lesões decorrentes da agressão sofrida no ambiente de trabalho poderão, individualmente, ingressar com ações próprias no Juiz competente. Isto posto, dou provimento ao conflito suscitado para declarar a 13ª Junta de Conciliação e Julgamento de Porto Alegre competente para apreciar e julgar as duas ações propostas." (STJ - Conflito de Competência nº 3.639-I, DOU de 23.03.93). Também pela competência da Justiça do Trabalho, na espécie, decidiu o E. TRT/15ª Região, nos seguintes termos: EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - NORMAS DE HIGIENE E SEGURANÇA - COMPETÊNCIA - A Justiça do Trabalho é competente para conhecer e julgar ação civil pública, proposta pelo Ministério Público do Trabalho, quando o objeto da ação for norma de higiene e segurança não observada pela empresa. Tais normas advêm do contrato de trabalho. Seu não cumprimento fere o caráter sinalagmático da relação contratual (TRT/15ªR, Ac. Nº 16.814/93, DOESP de 30/11/96, Rel. Juíza Eliana Felippe Toledo; decisão unânime). Da mesma forma, reconhece a competência da Justiça do Trabalho para as questões envolvendo o meio ambiente do trabalho, o renomado Rodolfo de Camargo Mancuso ("Ação Civil Pública Trabalhista: Análise de alguns pontos controvertidos", Revista do Ministério Público do Trabalho, nº 12, setembro/96, págs.59/60), verbis: "O meio ambiente laboral há de ser assegurado, segundo pensamos, de três maneiras: a) numa instância primária, pelo próprio obreiro, quando ele mesmo obtém e maneja os instrumentos adequados à sua atividade, organiza seu local de trabalho, enfim, provê por conta própria os meios pelos quais pretende levar a bom termo seu empreendimento: o trabalhador autônomo, o profissional liberal, o hoje chamado microempresário, o homem de negócios; b) num outro plano, a implementação do adequado meio ambiente de trabalho passa a depender de atividade alheia, seja o dono da obra, o empresário que, auferindo a vantagem do negócio deve arcar com o ônus correspondente (os chamados custos sociais da mão-de-obra), seja o próprio o Sindicato, enquanto entidade encarregada da defesa e representação institucional de uma certa categoria laboral, seja, enfim, o Estado-fiscalizador, através de seus órgãos voltados à segurança e higiene do trabalho; c) numa instância substitutiva ou supletiva, o meio ambiente laboral haverá de ser assegurado, impositivamente, pela Justiça do Trabalho, quando, no exercício da jurisdição coletiva em sentido largo, ou ainda no âmbito de seu poder normativo (dissídios coletivos, "ações de cumprimento"), estabelece novas condições para o exercício do trabalho de certas categorias".... Em nível doutrinário parece já estar assegurada a autonomia conceitual do meio ambiente do trabalho, uma subespécie do meio ambiente artificial ou construído, ou seja, o "habitat" laboral, onde o homem deve encontrar os meios com que haverá de prover sua existência digna, projetada por nosso constituinte. Em nível legislativo esse termo também já encontrou guarida, seja expressamente, como por exemplo na antes citada Lei Orgânica do Município de São Paulo, art. 190, ou ainda implicitamente, como no Estatuto do Ministério Público da União (Lei Complementar n. 75, de 20.5.1993), cujo art. 83 comete ao Ministério Público do Trabalho competência para promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho (inciso III), texto esse que deve ser lido de forma integrada com o disposto na Lei Orgânica Nacional do MP (8.625, de 12.2.93), cujo art. 25, IV, permite o ajuizamento dessa ação: a) para proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente; dessa exegese sistemática resulta, dada a competência específica da Justiça do Trabalho (CF, art. 114) que ali se trata, naturalmente, do meio ambiente do trabalho, já que é este último qualificativo que enseja a propositura da ação civil pública nessa Justiça especializada "ratione materiae". Aliás, outro dispositivo constitucional - o art. 200, VIII - refere-se, expressamente, ao meio ambiente do trabalho. Com efeito, se o meio ambiente do trabalho seguro constitui direito social dos trabalhadores, constitucionalmente assegurado, e, ao Ministério Público do Trabalho compete, perante à Justiça do Trabalho, ajuizar ação civil pública para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos (art. 83 e inciso III da Lei Complementar 75/93), dúvida não pode mais existir sobre a competência trabalhista no tocante à prevenção do meio ambiente do trabalho. Aliás, entendimento contrário levaria ao inadequado esvaziamento das atribuições do Ministério Público do Trabalho na defesa do cumprimento da legislação do trabalho, pois, embora existam outros legitimados para a propositura de ação civil pública, esta, ordinariamente, vem sendo utilizada é pelo "Parquet" trabalhista, principalmente em razão de ser ele o único legitimado para instaurar inquérito civil público destinado não só à colheita de provas, mas também à busca de adequação legal do indiciado (conforme ainda o nosso MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: PREVENÇÃO E REPARAÇÃO. JUÍZO COMPETENTE). Do exposto, decorre claramente para nós que condições seguras e higiênicas de trabalho constituem importantes direitos indisponíveis dos trabalhadores, cujo descumprimento legitima aqueles, por si ou por quem os substitua legalmente, a buscar um comando judicial perantea Justiça do Trabalho, cujo litígio decorre, induvidosamente, da relação de emprego (art. 114/CF). Outrossim, não existe mais nenhuma disposição constitucional ou legal atribuindo essa competência à Justiça Comum, razão essa que tem passado desapercebida pela maioria dos operadores do direito. 13.3 RESPONSABILIDADES DECORRENTES DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO INADEQUADO As responsabilidades decorrentes do trabalho em condições inadequadas e em ambientes insalubres ou perigosos ou em razão de acidentes do trabalho (incluídas as doenças profissionais e do trabalho), podem ser caracterizadas como de natureza trabalhista, previdenciária, civil e penal. a) De natureza trabalhista: são o pagamento de adicionais de insalubridade e de periculosidade e a estabilidade provisória do empregado acidentado. De acordo com o artigo 189 da CLT, serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou método de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo máximo de exposição do empregado aos seus efeitos, conforme quadro aprovado pelo Ministério do Trabalho, que, no caso, é a NR- 15, da Portaria nº 3.214/78. Já as atividades e operações perigosas, também de acordo com regulamentação do MTb, são aquelas que por sua natureza ou método de trabalho impliquem o contato permanente do empregado com inflamáveis e explosivos (art. 193, da CLT) ou com energia elétrica (Lei 7.369/85). Não eliminados ou neutralizados os efeitos dos agentes insalubres ou perigosos, tem direito o empregado a receber os respectivos adicionais na base de 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo legal e de 30% sobre o salário real. Os adicionais de insalubridade, como se vê, são absolutamente irrisórios, porque conforme jurisprudência conservadora dominante, são calculados com base no salário mínimo legal, mesmo recebendo o empregado salário mínimo profissional negociado entre patrões e empregados, o que representa um retrocesso injustificado com relação à jurisprudência anterior que os reconhecia sobre o salário normativo da categoria (ex-Enunciado 17/TST). O trabalho penoso, que é bem próprio da atividade do trabalhador rural, na maior parte, até hoje não foi regulamentado e, por isso, não é remunerado. De qualquer forma, é de se salientar que ao trabalhador rural, no tocante aos adicionais de insalubridade e de periculosidade, aplicam-se as regras atinentes ao trabalhador urbano, desde que expostos aos agentes respectivos, sendo certo que, não obstante isso, poucos são os processos perante a Justiça do Trabalho em que se discute tais pleitos em favor do trabalhador, o que serve de alerta para os senhores advogados dos reclamantes. O outro item de natureza trabalhista de grande importância e alcance social é a estabilidade provisória ou garantia de emprego do acidentado. Essa garantia é devida, pela Lei 8.213/91, art. 118, ao trabalhador acidentado que se afastar do emprego e receber auxílio-doença acidentário, pelo prazo de 12 meses após a cessação do referido auxílio. Essa garantia poderá ter maior amplitude e prazo de duração, se negociada em instrumentos normativos, como vem ocorrendo com relação às categorias profissionais mais organizadas. Seja de uma forma ou de outra, é importante que os trabalhadores rurais também pleiteiem esse direito perante a Justiça do Trabalho, quando demitidos antes do prazo legal ou convencional. b) De natureza previdenciária: são o auxilio-doença acidentário, na base de 92% do salário-de-benefício ou do salário de contribuição, o que for maior, a partir do 16º dia de afastamento e enquanto permanecer afastado o empregado segurado (art. 29, da lei 8.213/91); aposentadoria por invalidez, na base de 100% do salário-de- beneficio ou de contribuição, o que for mais vantajoso, ao empregado segurado que se tornar incapacitado para o trabalho, acrescida de 25%, no caso de necessidade permanente de assistência de outra pessoa ao aposentado (arts. 44 e 45, da Lei 8.213/91); auxílio-acidente, correspondente a um pagamento mensal de 50% do salário-de-benefício, devido ao empregado segurado que se tornar parcialmente incapacitado para o serviço, valor esse que não mais se acumulará com qualquer outro tipo de aposentadoria (art. 86 e parágrafos da Lei 8.213/91, recentemente alterados); pensão por morte, equivalente a 100% do salário-de-benefício, paga mensalmente ao conjunto de dependentes do segurado falecido (art. 74 e seguintes, da Lei 8.213/91). c) De natureza civil/reparatória: De conformidade com a Constituição Federal de 1988 (art. 7º e inciso XXVIII), são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, ... "seguro contra acidente do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa" (grifamos). Antes, essa indenização era assegurada ao empregado acidentado, em caso de dolo ou culpa grave do empregador, conforme orientação jurisprudencial cristalizada na Súmula nº 229 do STF, nos seguintes termos: "A indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador". Referida indenização, oriunda do direito civil (art. 159, do Código Civil Brasileiro), independe das outras indenizações devidas pelo órgão previdenciário, pela chamada culpa objetiva. Nesta, o que se analisa é a existência da seqüela após o acidente do trabalho sofrido pelo empregado e a ocorrência de dolo ou mera culpa do empregador (negligência, imprudência e/ou imperícia), como causa do infortúnio. Essa indenização, de acordo com o artigo 1.059, do Código Civil Brasileiro, engloba não só o que o acidentado perdeu – dano emergente -, como também o que razoavelmente deixou de ganhar – lucro cessante. Desta forma, se do acidente resultar defeito ou diminuição da capacidade de trabalho pelo qual o empregado não possa exercer a sua profissão ou tenha diminuído o valor do seu trabalho, a indenização abrangerá uma pensão correspondente à importância do trabalho, no todo ou em parte, conforme o caso, além das despesas do tratamento e lucros cessantes. Para ilustrar, mencionemos o caso real de um trabalhador, ajudante geral, que ao operar uma prensa, sem a devida instrução, teve um dos seus braços decepado, quando tinha apenas 19 anos de idade. Ajuizada a correspondente ação de reparação, o juiz, entendendo que aquele jovem estava no início da carreira profissional e poderia, na área da metalurgia, que era a atividade da empresa, chegar a ferramenteiro, condenou-a no pagamento de uma indenização mensal correspondente ao salário de ferramenteiro, até a idade de 65 anos. Também é cabível indenização por dano moral, em caso de acidente do trabalho, conforme as circunstâncias, atividade desenvolvida pelo empregado, dano causado, etc. Mas como essa indenização é de natureza civil, embora paga pelo empregador porque decorrente da relação de emprego, discute-se no momento, qual o juízo competente para apreciá-la: o do trabalho ou o comum? As Constituições anteriores diziam expressamente que os dissídios relativos a acidentes do trabalho eram da competência da Justiça Ordinária, razão por que ninguém ousava querer atribuí-la à Justiça do Trabalho, a não ser de "lege ferenda". Porém, a partir de 1998, com clareza, a Constituição atual, nos artigos 109 e 114, tratou da competência da Justiça do Trabalho e da competência residual da Justiça Comum, não mais atribuindo a esta, com exclusividade e como ocorreu nas Constituições de 1946, 1967 e 1969, a competência para as questõesacidentárias. Agora, essa competência foi dividida entre a Justiça Comum e a do Trabalho. A competência é da Justiça do Trabalho quando o pleito de indenização acidentária (artigo 7º, inciso XXVIII/CF) for dirigido ao empregador, que tenha, por dolo ou culpa, causado o infortúnio - culpa subjetiva. A competência é da Justiça Comum, quando os pedidos de indenização, auxílios-doença e acidentário, aposentadoria por invalidez e pensão, forem dirigidos ao órgão previdenciário - culpa objetiva, como decorre do disposto no artigo 109, inciso XI, § 3º, combinado com o artigo 114, "caput", todos da Constituição Federal. O artigo 109, inciso 1, estabelece a competência dos juízes federais para as causas em que forem rés, assistentes ou oponentes, a União e entidades autárquicas ou empresa pública federal, excetuando-se, por exemplo, as de acidentes do trabalho, que são aquelas causas em que os segurados ou beneficiários acionam a instituição previdenciária. Nessas causas, como estabelece o § 3º, do mesmo artigo 109, a competência é da Justiça Comum Estadual, mesmo sendo parte entidade pública federal. A essa conclusão, também chegaram JOSÉ AUGUSTO RODRIGUES PINTO ("Processo Trabalhista de Conhecimento", 3ª edição, São Paulo, LTr Editora, 1996, pág. 113), VALDIR FLORINDO ("Dano Moral e o Direito do Trabalho", LTr Editora, São Paulo, 1995, págs. 90/98), VANDER ZAMBELI VALE, em artigo intitulado Acidente de Trabalho - Culpa do Empregador - Indenização - Competência da Justiça do Trabalho (Revista LTr, 60-08/1069) e SEBASTIÃO GERALDO DE OLIVEIRA ("Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador", São Paulo, LTr Editora, 1996, págs. 199-201), entre outros autores de nomeada, cujo resumo tomo a liberdade de fazer, com as palavras do insígne professor José Augusto Rodrigues Pinto: "Considerando não haver na Constituição atual nenhuma norma conservando essa exclusão da competência trabalhista para conhecer de dissídios de acidentes no trabalho, parece-nos fora de dúvida que eles devem passar a ser julgados pelos órgãos da Justiça do Trabalho, em harmonia com a regra geral e natural da competência em razão da matéria". Como se vê, a competência da Justiça Comum para resolver sobre o acidente do trabalho, prevista nos dispositivos em comento, restringiu-se às causas em que uma das partes seja entidade pública federal, como seguradora, contra quem são propostas as ações decorrentes de acidentes do trabalho. As demais demandas, mesmo que de natureza civil, se decorrentes da relação de emprego e contra o empregador, são de competência da Justiça do Trabalho, como já decidiu o E.STF: "A determinação da competência da Justiça do Trabalho não importa que dependa a solução da lide de questões de direito civil, mas sim, no caso, que a promessa de contratar, cujo alegado conteúdo é o fundamento do pedido, tenha sido feita em razão da relação de emprego, inserindo-se no contrato de trabalho." (Ac. Pleno; Conflito de Jurisdição nº 6.959 - Rel. Min. Sepúlveda Pertence, in DJU de 22.5.91, pág.1.259). d) De natureza penal: os acidentes do trabalho podem caracterizar, ainda, os crimes de homicídio, lesões corporais ou de perigo comum, previstos nos artigos 250 a 259, do Código Penal, por conduta dolosa ou culposa do empregador ou dos responsáveis. A culpa ocorre quando o agente der causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia (Sebastião Geraldo de Oliveira, obra citada, pág.210). E a responsabilidade criminal, que é pessoal, do empregador, do preposto, do membro da CIPA, etc., será caracterizada não só pelo acidente do trabalho, quando agindo com dolo ou culpa, mas também pelo simples fato de não se cumprir normas de segurança e higiene do trabalho, expondo-se a risco e perigo a vida de outrem, como preceitua o Código Penal e a Lei 8.213/91, esta, no art. 19, § 2º, timidamente dizendo que constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho. Enquanto isso, tramita perante o Congresso Nacional projeto de lei mais rigoroso no seguinte sentido: "Deixar o tomador de serviços ou seus prepostos de cumprir as normas sanitárias, de segurança ou de duração do trabalho, estabelecidas pela Lei ou pelas autoridades competentes, expondo a perigo a vida ou a saúde dos trabalhadores: PENA - Detenção, de um a três anos e multa. Parágrafo único: A pena é aumentada de metade se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada se resulta morte". Essa alteração legislativa, que incrimina o tomador ou preposto simplesmente pelo não-cumprimento das normas de segurança, é muito importante, enquanto que, pelas normas existentes, a criminalização só existe efetivamente depois que o trabalhador acidentou-se ou faleceu, o que na prática não tem surtido o efeito desejado, que é o de prevenir a ocorrência de acidentes.