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Coletânea de textos extraídos da
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1. INTRODUÇÃO
O meio ambiente do trabalho envolve as instalações físicas do local (ventilação,
iluminação natural ou artificial, ruídos, móveis, maquinário etc.) que devem oferecer
um ambiente saudável para a prestação do serviço, bem como deve ser minimizada a
possibilidade de contato com qualquer agente químico ou biológico que traga riscos à
saúde do trabalhador. Um meio ambiente de trabalho sadio proporciona a manutenção
da saúde do trabalhador, por sua vez, um meio ambiente de trabalho agressivo leva ao
surgimento de doenças profissionais e, conseqüente, perda da capacidade laborativa
deste trabalhador.
O art.3º, I, da Lei 6.938/81, definiu meio ambiente como "o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, que permite, abriga e rege a
vida em todas as suas formas. Posteriormente, com base na Constituição Federal de
1988, passou-se a entender também que o meio ambiente divide-se em físico ou
natural, cultural, artificial e do trabalho. Meio ambiente físico ou natural é constituído
pela flora, fauna, solo, água, atmosfera etc, incluindo os ecossistemas (art. 225, §1º,
I, VII). Meio ambiente cultural constitui-se pelo patrimônio cultural, artístico,
arqueológico, paisagístico, manifestações culturais, populares etc (art.215, §1º e §2º).
Meio ambiente artificial é o conjunto de edificações particulares ou públicas,
principalmente urbanas (art.182, art.21,XX e art.5º, XXIII) e meio ambiente do
trabalho é o conjunto de condições existentes no local de trabalho relativos à qualidade
de vida do trabalhador (art.7, XXXIII e art.200).
Podemos, ainda, conceituar meio ambiente do trabalho como "o conjunto de
fatores físicos, climáticos ou qualquer outro que interligados, ou não, estão
presentes e envolvem o local de trabalho da pessoa". Apesar desta definição
aparentar certo individualismo, isto não acontece pois ante a importância da proteção
dos trabalhadores e o interesse e obrigação do Estado de protegê-los, como
demonstrado na legislação constitucional, o conceito extrapola na prática o aparente
individualismo, tomando conotações de um direito transindividual ao mesmo tempo
que difuso.
Como dito nossa Constituição Federal incluiu entre os direitos dos trabalhadores
o de ter reduzido os riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde,
higiene e segurança (art.7º, XXII), e determinou que no sistema de saúde o meio
ambiente do trabalho deve ser protegido (art.200, VIII), mostrando uma moderna
posição com relação ao tema, de forma que as questões referentes ao meio ambiente
do trabalho transcendem a questão de saúde dos próprios trabalhadores, extrapolando
para toda a sociedade.
Também a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) trata da segurança e saúde
do trabalhador no art.154 e seguintes do Tít. II, Cap.V e no Tít. III (Normas Especiais
de Tutela do Trabalho, além das Portarias do Ministério do Trabalho e a Lei Orgânica
da Saúde (Lei 8.080/90). Há ainda o Programa de Controle Médico e de Saúde
Ocupacional e o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, sem contar a
obrigatoriedade das empresas terem que instituir as CIPAs – Comissões Internas de
Prevenção de Acidentes (art.163,CLT). Tudo visando a preservação da qualidade
ambiental do local de trabalho.
Conforme colocado o meio ambiente sadio do trabalho é um direito
transindividual por ser um direito de todo trabalhador, indistintamente, e reconhecido
como uma obrigação social constitucional do Estado, ao mesmo tempo em que se trata
de um interesse difuso, ou mesmo coletivo quando se tratar de determinado grupo de
trabalhadores. Em sendo assim, o meio ambiente do trabalho enquadra-se nos casos
protegidos pela Lei 7.347/85, que em seu art.1º, I, estabelece a adequação da ação
civil pública na proteção do meio ambiente e em seu inciso IV inclui também o caso de
danos causados a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, de forma que é
plenamente viável falarmos na existência da Ação Civil Pública para resguardar os
direitos dos trabalhadores terem um ambiente de trabalho sadio e ecologicamente
equilibrado como preceituado no art.225 da Constituição Federal. Assim, estão
legitimados para propor a ação civil pública acidentária trabalhista as pessoas de
diretito público e as entidades elencadas no art.5ºda Lei 7.347/85, dentre elas os
sindicatos e o Minis tério Público.
Aliás, até há pouco tempo discutia-se quanto a competência para julgar tal
ação, se era da Justiça do Trabalho ou da Justiça Estadual, porém decidiu o Superior
Tribunal de Justiça que a competência é da Justiça Estadual (Conflito de competência
16243-São Paulo- Rel.Min.Ari Pargendler,DOU,P.21.435,nº115,17.06.96-J.22.05.96);
por conseguinte o Ministério Público estadual é que deve ser a parte legítima ativa e
não o Ministério Público do Trabalho. O próprio Conselho Superior do Ministério Público
de São Paulo em sua Súmula 15, entendeu que cabe ao Ministério Público estadual
ajuizar esta ação; neste sentido encontramos também Rodolfo de Camargo Mancuso
(Ação Civil Pública Trabalhista: Análise de alguns pontos controvertidos, Rev. dos Trib.
nº 732, pg.11-37).
De fato, se observarmos o art.109 da Constituição Federal vamos ver que a
matéria referente a acidentes do trabalho está excluída da competência dos juizes
federais. Além disso, a matéria também não faz parte do rol da competência da Justiça
do Trabalho nos termos do art.114 também da Carta Magna. Dessa forma,
demonstrado está que as questões jurídicas relativas ao meio ambiente do trabalho
estão na esfera de competência da Justiça Estadual, consequentemente legitimado
está o Ministério Público estadual para ajuizar a ação pública referida.
Evidentemente que antes de se ajuizar a ação civil pública em questão poderá o
membro do MP chamar a empresa para tentar solucionar a questão mediante
compromisso de ajustamento, mas antes ainda poderá requisitar vistoria de
engenharia e médica do trabalho para verificar as condições inclusive solicitar dos
peritos quais as medidas técnicas para sanar as irregularidades; requisitar documentos
como laudos ambientais, relação dos CATs (Comunicação de Acidentes do Trabalho) e
atas das CIPAs (Comissão Interna de Prevenção de Acidente) e com esses documentos
tentar o compromisso de ajustamento. Pelo que se sabe as promotorias de Acidentes
do Trabalhos das comarcas de São Paulo têm conseguido acordos com resultados
positivos na quase totalidade dos inquéritos civis nesta área.
Portanto, o empregador que por inobservância das normas de segurança do
trabalho não fornecer aos seus empregados um ambiente de trabalho sadio e,
consequentemente, vier a causar-lhes danos poderá sofrer ação civil pública para que
adapte seu estabelecimento e/ou pague multa, bem como poderá ter seu
estabelecimento fechado judicialmente, além de poder responder criminalmente.
Estará ainda sujeito a multas administrativas (art.201,CLT), interdição do
estabelecimento ou equipamento (art.161, CLT). Sem contar que poderá responder por
indenização, em se constando sua culpa e dano ao trabalhador, apuráveis através da
respectiva ação de indenização (art.7º,XXVIII, CF e art.159, Código Civil).
Ante o exposto, podemos concluir que o conceito de meio ambiente evoluiu
abrangendo atualmente além do fator natural e físico, o cultural, o artificial e meio
ambiente do trabalho. Quanto a este último em especial, constata-se que tomou
conotação transindividual e de interesse difuso, possibilitando a sua proteção por meio
da ação civil pública com fulcro na Lei 7.347/85, tornando-se um importante direito de
todos os trabalhadores e da sociedade como um todo, além de um dever do Estado de
protegê-lo.
Por conseguinte,isto certamente levará as empresas a dar mais atenção ao
ambiente de suas instalações como escritórios e parques industriais, adequando-os aos
novos anseios mundiais de desenvolvimento e de qualidade de vida, o que só trará
vantagens diretas aos trabalhadores e indiretamente à toda sociedade.
2. TUTELA JURISDICIONAL
Qualquer ação pode ser utilizada para efetivação da tutela do meio ambiente do
trabalho. É importante, no entanto, ressaltar algumas com sede constitucional:
2.1 Ação popular
O constituinte de 1988 ampliou o âmbito de aplicação da ação popular,
conforme se depreende o artigo 5º, inciso LXXIII:
Art. 5º. (…)
(…)
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a
anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à
moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural,
ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência (…).
Até o advento da Constituição Federal, nos termos da Lei n. 4.717/65, a ação
popular tinha como finalidade precípua a nulidade de ato lesivo ao patrimônio público.
Desde 1988, no entanto, sua finalidade alcança atos lesivos à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Logo,
observados os pressupostos típicos dessa ação, poderá ser utilizada para a
salvaguarda do meio ambiente do trabalho.
2.2 Mandado de Segurança Coletivo
O constituinte de 1988 criou uma nova forma de impetração do mandado de
segurança coletivo, conforme se verifica do artigo 5º, inciso LXX:
Art. 5º. (…)
(…)
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída
e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus
membros ou associados (…).
Como as relações de trabalho podem envolver os sindicatos, essas organizações
estariam perfeitamente habilitadas para defender, através de mandado de segurança
coletivo, o meio ambiente do trabalho, já que este está incluído no grupo de matérias
de “interesse de seus membros e associados”.
2.3 Mandado de Injunção
Também no artigo 5º, agora no inciso LXXI, o constituinte assegura o mandado
de injunção, nos seguintes termos:
Art. 5º. (…)
(…)
LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e
das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (…).
Na hipótese da existência de alguma norma constitucional de eficácia limitada
(normalmente programática), protetora direta ou indiretamente do meio ambiente do
trabalho, poderá ser impetrado mandado de injunção, para dar-lhe aplicabilidade
plena. Afinal, toda a matéria relacionada com o meio ambiente, como já visto, abrange
os direitos e liberdades constitucionais.
2.4 Ação Civil Pública
Majoritariamente, a tutela jurisdicional do meio ambiente do trabalho é
efetivada através da ação civil pública, prevista na legislação infraconstitucional pela
Lei n. 7.347/85 e elevada ao nível constitucional pela Carta Magna de 1988, que no
seu artigo 129, III estipula o seguinte:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
(…)
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos (…).
O aparecimento de referida ação decorreu da constatação da insuficiência da
clássica ciência processual, pautada no liberalismo individualista, típico das
codificações do século XIX. Em virtude desse reconhecimento, fez-se imprescindível e
necessário o surgimento de um processo diferenciado, que possibilitasse aos cidadãos
reclamar do Estado um provimento jurisdicional justo e efetivo, também para este
novo tipo de lesão envolvendo os interesses difusos.
Nesse sentido, ensina a Professora Ada Pellegrini Grinover, "a solução
macroscópica de tais conflitos, por intermédio de processos em que a lide seja
resolvida, de uma vez por todas, com relação a todos os titulares dos interesses em
conflito, significa a acolhida de novas formas de participação, pela ação de corpos
intermediários".
Também José Joaquim Gomes Canotilho afirma que "o direito a um
procedimento justo implicará hoje a existência de procedimentos colectivos
(Massenverfahren na terminologia alemã), possibilitadores da intervenção colectiva
dos cidadãos na defesa de direitos econômicos, sociais e culturais de grande relevância
para a existência colectiva (exemplo: 'procedimentos de massas', para a defesa do
ambiente, da saúde, do patrimônio cultural, dos consumidores)".
Por isso, no Brasil foi promulgada a Lei n. 7.347/85, instituidora da ação civil
pública, exatamente para suprir as necessidades do processo moderno, próprio do
século XX. E esse diploma legal trouxe muitas vantagens.
Em primeiro lugar, soluciona os problemas relacionados com a admissibilidade
em juízo:
a) faz prevalecer o princípio da universalidade do acesso à justiça, já que o
artigo 5º considera legitimados ativos o Ministério Público, a União, os Estados, os
Municípios, as autarquias, as empresas públicas, as fundações, as sociedades de
economia mista e as associações (incluindo-se os sindicatos);
b) supera o problema das barreiras econômicas. Ainda que os cidadãos
atingidos por uma macrolesão não possam se socorrer do Judiciário, por falta de
assistência jurídica especializada ou por conta do alto custo do processo — que, na
maioria das vezes, exige a realização de complicadas perícias —, os legitimados ativos,
além de possuírem corpo jurídico especializado, têm maiores possibilidades de efetuar
convênios com órgãos, estatais ou não, habilitados para a realização de provas
técnicas;
c) sana o problema da desinformação dos cidadãos atingidos pela macrolesão,
tanto sobre o direito pretendido, como sobre a forma de acesso à justiça; e
d) resolve o problema do descrédito em relação ao Judiciário, pois a tutela
concedida será muito mais eficaz, já que atingirá todas as pessoas envolvidas no
conflito.
Em segundo lugar, a Lei n. 7.347/85 encontra solução para a problemática da
coleta de provas, pois o seu artigo 2º estipula que as ações civis públicas devem ser
propostas no foro do local onde ocorrer o dano, facilitando a instrução probatória. A
grande vantagem dessa determinação é fazer com que o juiz que julgará a causa fique
próximo da questão social envolvida, para melhor dimensioná-la e entendê-la.
Em terceiro lugar, há maior utilidade das decisões. A sentença proferida em
sede de ação civil pública tem eficácia erga omnes, atingindo todas as pessoas que
estejam naquela situação (art. 16, primeira parte). Ademais, a coisa julgada é
secundum eventum litis (art. 16, segunda parte), ou seja, só restará caracterizada em
função do resultado da lide, pois se a ação civil pública for julgada improcedente por
deficiência de provas, não haverá configuração da res judicata. Essa medida protege a
questão social e impede que as pessoas atingidas por uma macrolesão sejam
prejudicadas, se o legitimado ativo não as defender bem.
Em quarto lugar, está o objetivo principal da ação, que é a reconstituição do
bem lesado (art. 13). Além disso, a decisão pode, também, ter caráter preventivo ou
cominatório (art. 11), ou seja, o legislador preocupou-se com a efetividade da solução
dada pelo Estado-juiz. Em outras palavras, a lei privilegia a reconstituição do bem
lesado ou a prevenção da macrolesão, e não apenas a mera re paração pecuniária.
Em quinto lugar, a Lei n. 7.347/85 faz imperare prevalecer o princípio da
economia processual. Com a utilização das ações civis públicas, há um gasto mínimo
de tempo e de energia de toda a máquina do Poder Judiciário, pois evita-se a
propositura de diversas ações individuais sobre uma mesma matéria. Evita-se, ainda, a
existência de sentenças contraditórias para lides praticamente idênticas.
É possível perceber que a Lei n. 7.347/85 muda a concepção de diversos
institutos processuais clássicos, como por exemplo, a legitimidade ativa e a coisa
julgada.
O objetivo dessas mudanças é alcançar a efetividade do processo, fazendo com
que este seja, realmente, instrumento de atuação da jurisdição. Isso porque, em
última instância, todo direito me taindividual poderá sempre ser visto como uma
"pequena causa", mas o que se busca, na verdade, é um provimento jurisdicional
efetivo, que alcance de uma só vez todas as "pequenas causas", garantindo-se o
acesso à justiça e a efetividade da decisão.
Por não ser um fim em si mesmo, o processo não pode, em hipótese alguma,
dissociar-se do direito material. Trata-se, assim, de adequar o processo às relações de
massa que atingem novos tipos de interesses, ou seja, os interesses metaindividuais.
A Carta Política de 1988 acompanhou essa evolução, deixando incontestável a
preocupação do constituinte em assegurar a tutela dos interesses acima mencionados.
E como o processo deve servir ao direito material, deixa de ser uma ciência neutra,
para acompanhar a opção polít ica e ideológica do constituinte. Em virtude dessa
preocupação, o constituinte deu status constitucional à ação civil pública, antes
prevista apenas na legislação ordinária, como já mencionado acima.
Depois disso, em 1990, a Lei n. 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor,
veio aperfeiçoar a tutela jurisdicional coletiva, traçando regras processuais, no seu
Título III, que podem ser aplicadas a quaisquer processos que envolvam direitos
metaindividuais e não apenas aqueles atinentes às relações de consumo. Além de
“complementar” a Lei da Ação Civil Pública, o CDC dirimiu polêmicas doutrinárias,
particularmente no que diz respeito à sistematização do interesses metaindividuais,
conforme se verá adiante.
Esses dois diplomas legais, Leis ns. 7.347/85 e 8.078/90, informam o moderno
processo coletivo, criando novos institutos processuais e reformulando outros já
existentes, para que o processo acompanhe a evolução das relações sociais.
No que diz respeito à tutela do meio ambiente do trabalho, o objeto precípuo da
ação civil pública é preventivo. Trata-se de tentar evitar a ocorrência de acidente, com
a observância das normas de segurança e medicina do trabalho. Nessas ações, é
incontestável a natureza trabalhista, pois há conexão direta com as condições de
trabalho, que, por sua vez, integram o próprio contrato de trabalho (art. 114 da
Constituição Federal).
Por tal motivo, a Justiça Especializada Laboral é o órgão do Poder Judiciário com
competência para julgar tais ações; e o Ministério Público do Trabalho, o ramo do
Parquet com legitimidade para propô-las. Esse é o entendimento que vem
prevalecendo na Justiça do Trabalho, conforme se depreende das seguintes ementas:
Ação Civil Pública. Normas de Higiene e Segurança. Competência. A
Justiça do Trabalho é competente para conhecer e julgar ação civil pública,
proposta pelo Ministério Público do Trabalho, quando o objeto da ação for
norma de higiene e segurança não observada pela empresa. Tais normas
advêm do contrato de trabalho. Seu não cumprimento fere o caráter
sinalagmático da relação contratual. (TRT-15ª Região – Ac. n. 16.814/93 – rel.
Juíza Eliana Felippe Toledo – DOESP, de 30.11.96).
Justiça do Trabalho. Competência. Tratando-se da defesa de interesses
coletivos e difusos no âmbito das relações laborais, a competência para
apreciar ação civil pública é da Justiça do Trabalho, nos termos do art. 114, da
Constituição Federal/88, que estabelece idoneidade a esse ramo do Judiciário
para a apreciação, não somente dos dissídios individuais e coletivos entre
trabalhadores e empregadores, mas também de outras controvérsias
decorrentes da relação de trabalho. Recurso de Revista não conhecido quanto
ao tema, porque não demonstrada a vulneração ao art. 114 da Carta Política
ou a qualquer outro dispositivo legal, mas conhecido e provido quanto aos
honorários advocatícios, nos termos do inciso VIII, do Enunciado 310/TST.
(TST - 5ª Turma – rel. desig. Min. Thaumaturgo Cortizo – DJU, de 7.8.98, Seç.
1, p. 895).
Em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal, intérprete máximo do Texto
Constitucional, posicionou-se igualmente, afastando, de forma definitiva, qualquer
polêmica sobre a eventual competência das Varas de Acidente de Trabalho, como
pode-se notar a seguir:
Compete à Justiça do Trabalho o julgamento de ação civil pública que tenha por
objeto a preservação do meio ambiente trabalhista e o respeito irrestrito às normas de
proteção do trabalho. Com esse entendimento, a Turma julgou procedente recurso
extraordinário, para reformar Acórdão do STJ que, ao dirimir conflito negativo de
competência estabelecido entre a 4ª Junta de Conciliação e Julgamento de Juiz de Fora
e o Juízo de Direito da Fazenda Pública, assentava a competência da Justiça comum
para o julgamento da ação civil pública, entendendo ser esta uma verdadeira aç ão de
acidente do trabalho. Trata-se, na espécie, de ação civil pública proposta pelo
Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra vinte e um bancos, em que se
busca o cumprimento da legislação trabalhista diante da precariedade das condições e
do ambiente do trabalho oferecidas pela rede bancária de Juiz de Fora, quais sejam, a
extrapolação da jornada de trabalho e o conseqüente aparecimento de lesões pelo
esforço repetitivo — LER. (STF – RE n. 206.220-1-MG – Ac. 2.ª T. – 16.3.1999 – rel.
Min. Marco Aurélio – Revista LTr 63-5/628-630).
Assim, depois da decisão do Supremo Tribunal Federal, não cabe mais
discussão sobre qual órgão do Poder Judiciário é competente para julgar as ações que
tratem da proteção do meio ambiente do trabalho: nos termos do artigo 114 da Carta
Magna, a competência é da Justiça do Trabalho.
Conseqüentemente, como ramo do Ministério Público que tem por função
defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais
indisponíveis, no âmbito da Justiça Laboral, caberá ao Ministério Público do Trabalho
propor as respectivas ações civis públicas (art. 128, inciso III combinado com o art.
129, inciso III, da Constituição Federal).
2.5 As constituições estaduais
Voltando aos artigos 23, 24 e 30 da Constituição da República, verifica-se que:
a) No art. 23 - competência material comum entre União, Estados, Distrito
Federal e Municípios - o inciso II determina que todos estes entes federados cuidem da
saúde da população e o inciso VI, preconiza que devem proteger o meio ambiente e
combater a poluição em qualquer de suas formas.
b) No art. 24 - competência legislativa concorrente entre União, Estados e
Distrito Federal - o inciso VI permite que legislem sobre a proteção do meio ambiente
e controle da poluição, o inciso VIII que disciplinem adequadamente a responsabilidade
por dano ao meio ambiente e o inciso XII que estabeleçam normas acerca da proteção
e defesa da saúde.
c) No art. 30, I e II, resta estabelecida a competência dos Municípios para
legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar as legislações federal e
estadual.
Como ficou dito acima, o bem jurídico tutelado pelas normas ambientais, no
meio em que a pessoa humana desenvolve suas atividades produtivas, é a saúde e
não o trabalho subordinado. A competência para legislar sobre trabalho, regido por
contrato próprio, é da União, consoante dispõe o art. 22, I, da Carta Magna. Referida
competênciaengloba apenas os aspectos contratuais, pecuniários e processais
relativos ao exercício do trabalho subordinado.
Entretanto, quando se trata de proteger a vida, a saúde e a dignidade da
pessoa que trabalha, em relação direta com a influência proveniente do meio ambiente
em que esta se ativa, a competência tanto material como legislativa diz respeito ao
meio ambiente e à saúde, competindo aos demais entes federados, além da União,
como prevêem os artigos 23. 24 e 30, da Lei Maior, acima aludidos, zelar pela
proteção do meio em que o trabalhador exerce suas atividades, bem como buscar a
preservação da saúde humana.
Retomando aquilo que inicialmente foi dito sobre o movimento transversal do
Direito Ambiental, presente nos mais diversos diplomas legais, perpassando todo o
ordenamento jurídico, verifica-se que a Consolidação das Leis do Trabalho, no Capítulo
V, do Título II, que cuida da segurança e medicina do trabalho, não contém apenas
normas endereçadas àquele que está sob contrato de trabalho, em sentido estrito, mas
normas ambientais relacionadas à prática de qualquer trabalho, em defesa da saúde,
ao buscar a manutenção de um meio ambiente propício à incolumidade física do
obreiro.
Releva notar que o art. 154, da CLT, prevê não bastar obediência ao disposto
no Capítulo V, mas determina que o empregador ou todo aquele que se utiliza, a
qualquer título, da força de trabalho humana cumpra as disposições relativas à matéria
concernente à saúde do trabalhador, no meio ambiente laboral, incluídas em códigos
de obras ou regulamentos sanitários dos Estados ou Municípios, em que se situem
seus estabelecimentos.
O Professor Doutor Celso Antônio Pacheco Fiorillo assevera que " ...jamais se
deve restringir a proteção ambiental trabalhista a relações de natureza unicamente
empregatícia"(...) " O que interessa é a proteção ao meio ambiente onde o trabalho
humano é prestado, seja em que condição for....".
Valentin Carrion admite expressamente que: "União, Estados e Distrito Federal
podem legislar concorrentemente sobre proteção e defesa da saúde(CF, art. 24, XII);"
E os Estados vêm legislando sobre matéria de saúde no trabalho, inserindo normas
de observância obrigatória, em seus territórios, nas respectivas Constituições.
A seguir, são mencionadas disposições específicas sobre a matéria, constantes
de algumas Constituições Estaduais, que primaram na elaboração de normas atinentes
à saúde do trabalhador, no meio ambiente em que este exerce suas atividades.
1. Constituição do Estado de São Paulo.
O artigo 220, § 1°, presente na Seção II, do Capítulo II, do Título VII, ao cuidar
da Saúde, estabelece: "As ações e os serviços de preservação da saúde abrangem o
meio ambiente natural, os locais públicos e de trabalho."
Significativas são as disposições presentes no art. 223 ao determinar ao
sistema único de saúde: a) no inciso II, a identificação e controle dos fatores
determinantes e condicionantes da saúde individual e coletiva, mediante ações
referentes à saúde do trabalhador, de acordo com previsão contida na alínea "c"; b) no
inciso VI, a colaboração na proteção do meio ambiente, incluindo o do trabalho, a
partir de atuação no processo produtivo para garantir o acesso dos trabalhadores às
informações respeitantes a atividades que comportem riscos à saúde e a métodos de
controle e adoção de medidas preventivas de acidentes e doenças do trabalho.
Em decorrência desse espectro de proteção conferido ao meio ambiente do
trabalho, a Constituição Paulista estipula, no art. 229 § 3°, que o Estado atuará para
garantir a saúde e a segurança dos empregados no ambiente de trabalho.
O §4°, deste mesmo artigo, assegura a cooperação dos sindicatos de
trabalhadores nas ações de vigilância sanitária desenvolvidas no local de trabalho e o
§ 2° garante a interrupção de atividades que coloquem em risco a integridade
do trabalhador, o que equivale à garantia de paralisação do trabalho, para a
manutenção da salubridade do meio ambiente, como meio de defesa, sem a
necessidade do cumprimento das exigências procedimentais, especialmente de prazos,
estabelecidas pela Lei 7.783/89, que disciplina a greve, tendo em vista a expressa
autorização constitucional de paralisação do trabalho na defesa de bem indispensável à
manutenção da vida e de sua sadia qualidade: a saúde.
2. Constituição do Estado do Rio de Janeiro.
O art. 290, inciso X, estabelece na alínea "c" o "controle e fiscalização dos
ambientes e processos de trabalho nos órgãos e empresas públicas e privadas,
incluindo os departamentos médicos", na alínea "d" assegura "direito de recusa ao
trabalho em ambientes sem controle adequado de riscos, assegurada a
permanência no emprego" e na línea "h" determina a "intervenção,
interrompendo as atividades em local de trabalho em que haja risco iminente
ou naqueles em que tenham ocorrido graves danos à saúde do trabalhador. "
Oferece, por conseguinte, ao trabalhador dois importantes meios de defesa da
higidez do meio ambiente do trabalho: a paralisação das atividades em casos de riscos
não controlados, sem maiores óbices ou exigências legais, e a intervenção estatal no
sentido de interromper atividades em locais de trabalho com acentuado risco à saúde
humana.
3. Constituição do Estado do Amazonas.
O § 2°, do artigo 229, da Constituição do Amazonas, consagra taxativamente, a
proteção ao meio ambiente do trabalho, pois, se no caput do artigo dispõe que: "
Todos têm direito ao meio ambiente equilibrado, essencial à sadia qualidade devida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo", no
§2° já aludido especifica: " Esse direito estende-se ao ambiente de trabalho, ficando
o Poder Público obrigado a garantir essa condição contra qualquer ação nociva à saúde
física e mental do trabalhador".
4. Constituição do Estado da Bahia.
O art. 218 desta Constituição Estadual dispõe expressamente: " O direito ao
ambiente saudável inclui o ambiente de trabalho, ficando o Estado obrigado a garantir
e proteger o trabalhador contra toda e qualquer condição nociva à sua saúde física e
mental."
O art. 239 determina às empresas que submetam, periodicamente, seus
empregados expostos a substâncias químicas, tóxicas ou radioativas a exames
médicos individuais .
3. ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE VERSUS HIGIDEZ DO
MEIO AMBIENTE DE TRABALHO: ESSA “LUTA” QUEM DEVE VENCER?
Algumas atividades profissionais são extremamente perniciosas para quem as
desenvolve, ou porque lhes é inerente um determinado risco - como ocorre com as
atividades nucleares - ou porque, embora originariamente inofensivas, o meio em que
se desenvolvem não dispõe de condições razoáveis de salubridade ou segurança - é o
caso de um escritório onde as pessoas passam o dia todo sentadas em cadeiras
anatômicas, à mercê de mofo, ruídos insuportáveis, escassa iluminação e insuficiente
ventilação.
Parecerá ao mais desavisado que, ainda assim, ou seja, ainda que o trabalhador
permaneça exposto a agentes agressores de sua saúde físico-psíquica, por oito (ou
mais) horas diárias, a situação não lhe é de todo prejudicial, já que a Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT) - diploma paternalista, para alguns - garante àqueles que
desempenham seu mister num ambiente insalubre ou perigoso um adicional de
insalubridade ou de periculosidade, de - pasmem!! - 10% a 40% do salário mínimo
da região, no primeiro caso, ou de 30% do salário, sem os acréscimos resultantes de
gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa, na segunda hipótese.
O indivíduo vai perder um dedo ou um braço, vai perder a visão, vai ficar surdo,
vais sofrer distúrbios mentais e contrair doenças irremediáveis, mas,
em"compensação", vai ficar uns trocados mais rico (ou uns trocados menosmiserável).
É bem verdade que CLT indica várias formas de atenuar ou eliminar, do meio
ambiente de trabalho, males de tal jaez. Demonstra, inclusive, que prefere tais
procedimentos ao pagamento dos adicionais. Todavia, forçoso é reconhecer que a lei,
ainda assim, permite ao empregador OPTAR - é o que se depreende do art. 189 e ss. -
por uma de duas alternativas absurdamente distintas: ou zelar pela saúde do
empregado ou, se não o fizer, pagar-lhe uma quantia irrisória como compensação por
ele sofrer agressões, às vezes irreversíveis, em sua integridade físico-psíquica.
Colocada a questão sob esse prisma, - e não é preciso ser versado nas ciências
jurídicas para perceber -, a complacência da lei em permitir que o empregador escolha
o adicional de insalubridade ou periculosidade, quando possível eliminá-las, em
detrimento da garantia da saúde do trabalhador, parece-nos nada razoável. Muito pelo
contrário, um verdadeiro paradoxo.
Por conta disso é que o quadro descrito merece ser interpretado com mais
rigor, À LUZ DA CARTA CONSTITUCIONAL DE 1988.
A Constituição da República, lei das leis, demonstra, em várias oportunidades,
profunda preocupação com a qualidade de vida do ser humano (art. 225, caput), com
sua saúde físico-psíquica (art. 6º, caput) e com a dignidade de vida (art. 1º, inc. III),
determinando a tutela desses bens em primeiro lugar.
Ocupa-se também de prover a ampla e necessária tutela do equilíbrio do meio
ambiente, considerado este sob quatro facetas: meio ambiente natural (art. 225),
meio ambiente artificial (art. 182 e ss.), me io ambiente cultural (art. 215 e 216) e
meio ambiente do trabalho (art. 200, inc. VIII).
Isso não bastasse, o art. 7º, inc. XXII consagra como direito básico do
trabalhador, a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de
saúde, higiene e segurança ”.
Visto isso, como se admitir, diante da Lei Maior, que a saúde, direito
fundamental de todos, inclusive do trabalhador, possa ser “barganhada” dessa forma ?
Como assentir que, em troca de míseros 40, 50 reais ou até menos, um trabalhador se
veja privado da salubridade e segurança necessárias ao meio ambiente do trabalho e
das condições indispensáveis à sua qualidade de vida ? Como aceitar que o empresário
possa incrementar o próprio patrimônio (ou ao menos impedir que ele diminua) à
custa da falência física e psíquica de seus empregados ?
Sim, porque é certo que o empregador, via de regra, preferirá pagar o ínfimo
adicional aos seus subordinados do que investir em medidas mitigadoras ou
extirpadoras das insalubres ou perigosas condições do meio, tais como o investimento
em avançados equipamentos de segurança, que evitariam trágicos acidentes, alguns
dos quais fatais, ou a aquisição de máquinas mais modernas e pouco ruidosas, que
impediriam irreversíveis problemas auditivos nos trabalhadores.
É óbvio que a Constituição não compactua com essa situação, de modo que a
política dos adicionais estabelecida, há algumas décadas, pela CLT, deve ser revisitada
e adaptada aos valores jurídico-sociais predominantes no momento histórico atual, no
qual a saúde, vista não apenas como a ausência de doença, mas bem estar físico e
emocional, contínuo e permanente (OMS), é direito fundamental da pessoa humana,
do qual não se pode dispôr. Equivale dizer, nessa linha, que a opção outrora dada ao
empregador pela CLT - ou extirpar a insalubridade ou pagar o adicional - cedeu espaço
para a obrigatoriedade de eliminar os agentes predadores da saúde humana, já que,
acentua com maestria Antônio Lopes Monteiro, Promotor de Justiça de Acidentes do
Trabalho do Ministério Público de São Paulo,"não há adicional que pague um
ambiente sadio "("Insalubridade: Um Direito ou um Mal Necessário ?", in Tribuna do
Direito, abril de 1996, p. 8)
Não queremos defender, todavia, a absoluta inconstitucionalidade dos
adicionais supra mencionados. Não. Os adicionais de insalubridade, periculosidade e
penosidade (criado pela CF/88), inclusive, encontram respaldo na própria Constituição,
em seu art. 7º, inc. XXIII. Mas não é por conta disso que persiste para o empregador a
combatida “ escolha ” entre pagá-los ou extirpar suas causas do ambiente de trabalho.
Entendemos, isso sim, que o adicional poderá existir apenas quando tais condições
NÃO FOREM PASSÍVEIS DE ELIMINAÇÃO, dada a precária tecnologia da época ou
motivos que o valham, e se, aliado a isso, a atividade, nada obstante a inafastável
insalubridade, periculosidade ou penosidade, FOR REALMENTE IMPERIOSA PARA O
ATENDIMENTO DAS NECESSIDADES DA COLETIVIDADE.
A esse respeito, a lição de Daniela Câmara Ferreira e Guilherme Purvin de
Figueiredo é providencial e, por essa razão, não podemos deixar de comenta-la e
transcrever alguns de seus trechos. Afirmam que, consoante o comando constitucional,
o Estado não tolerará atividade que ponha em, risco a vida, a integridade física e a
segurança dos indivíduos. Mas, de outro lado, assumem que a exposição ao risco é
indissociável a certas profissões em nosso aual estágio de desenvolvimento
tecnológico, situação essa que não deve ser desconsiderada pelo legislador, por
óbvio...
E continuam:
“Os eletricitários estão diuturnamente expostos ao perigo para que todos
tenhamos o conforto do fornecimento de energia, necessária, por exemplo, para o
funcionamento normal de hospitais e ambulatórios (...) Os médicos, enfermeiros e
analistas de laboratórios clínicos arriscam-se ao contágio das mais variadas doenças,
sempre em prol da saúde da população.
Há uma lista infindável de profissões insalubres e perigosas. O legislador não
pode, simplesmente, proibir tais atividades, ignorando o fato de que certos produtos e
serviços são imprescindíveis para a implementação do disposto no próprio art. 225,
caput. Em contrapartida, ele não pode ser conivente com a livre agressão à saúde do
trabalhador.
(...)
A simples percepção do adicional nada resolve. Nenhum adicional reparará a
morte, perda ou redução da capacidade de trabalho. Sabe-se que os trabalhos
perigosos e insalubres são, na maioria das vezes, de baixa remuneração, de forma que
os valores são calculados sobre salários muito pequenos, resultando em acréscimos
ínfimos nos salários dos trabalhadores expostos ao risco. Poder-se-ia dizer que vinte
por cento de acréscimo sobre um salário mínimo é dinheiro suficiente para indenizar
um eventual acidente ? Este valor recompensará a ausência de um meio ambiente de
trabalho saudável e seguro ?
Não se pode dizer também que o pagamento do adicional é um estímulo para a
introdução de tecnologias que contribuam para a diminuição do risco. Apesar da
legislação infraconstitucional tentar fazê-lo ao desobrigar o empregador do pagamento
do adicional quando da extinção do risco, este não é realmente um fator decisivo.
Muitos empresários preferem continuar pagando os costumeiros adicionais a investir
em equipamentos mais seguros (porém mais caros) e reformular seus velhos métodos
de produção.
A percepção do adicional não extingue o risco. O empregador deve, de todas as
formas possíveis, buscar minimizar os riscos existentes de fato em sua atividade
econômica, fornecendo o material de proteção necessário, investindo segurança e
treinamento. Ele deve, como forma de concretizar o direito do empregado à
integridade física, provê-lo de toda a técnica existente e capaz de afastar o risco, posto
que esta redução é uma previsão constitucional. O pagamento do acréscimo não
desobriga o empregador da busca de meios eficazes para a diminuição do risco.
(...)
O direito à percepção do adicional não deve ser entendido isoladamente, como
uma barganha ou indenização. Ele deve, em suma, ser interpretado conjuntamente
com o direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho, como uma forma de alcançar
estaredução, garantindo assim a efetividade do direito à vida e integridade física ”
(Direito Constitucional ao Meio Ambiente de Trabalho Seguro e Saudável. In: Temas de
Direito Ambiental e Urbanístico. São Paulo: Max Limonad, 1998, p.109-15)
O risco a que alguns empregadores submetem a saúde e segurança de seus
empregados só se justifica, portanto, se, diante da comprovada impossibilidade de
elidi-lo, houver um interesse (verdadeiramente) maior que o reclame. E sendo assim,
ou seja, sendo inevitável que algumas pessoas enfrentem a insalubridade, a
periculosidade e a penosidade do meio ambiente do trabalho, para o bem da
coletividade, que ao menos sejam “gratificados” pela coragem desse proceder (que,
admitamos, está mais para falta de opção do que para coragem propriamente dita) e
pela “ disposição ” de um de seus bens mais caros, a sua integridade físico-psíquica.
4. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS
CAUSADOS AO TRABALHADOR
A entrada em vigor do Novo Código Civil (Lei n. 10.406/2002) trouxe consigo
promessas e desafios. No campo da responsabilidade civil, a redação do artigo 927,
par. único, do NCC entreabriu uma porta dilargada para que o intérprete identificasse,
no cruzamento dos dados da realidade com o arcabouço legislativo, ensejos inéditos
para a aplicação da teoria do risco, onde se plasma a responsabilidade civil objetiva.
No universo juslaboral, esse assunto ganhou interesse no campo da
infortunística do trabalho, notadamente após a edição da Súmula n. 736 do STF e,
mais recentemente, com a alteração do artigo 114 da CRFB pela EC n. 45/2004, à qual
se seguiu a inteligência do Excelso Pretório no Conflito de Competência n. 7.204-1/MG,
rel. Min. Ayres Britto (fixação da competência da Justiça do Trabalho para o processo e
o julgamento das ações de responsabilidade civil movidas pelo empregado em face do
empregador).
Em se tratando de meio ambiente do trabalho, a Constituição Federal de 1988
apresenta ao menos duas antinomias aparentes. Uma delas deflui do cotejo entre as
normas constitucionais dos incisos XXII e XXIII do artigo 7º da Constituição Federal. O
primeiro estabelece, como direito dos trabalhadores urbanos e rurais, a redução dos
riscos inerentes ao trabalho; o segundo, ao revés, contrapõe ao risco o direito ao
adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas (=
monetização do risco). Outra antinomia aparente contrapõe o artigo 7º, XXVIII, da
CRFB ? que parece vincular o direito de indenização do acidentado frente ao
empregador à culpa ou dolo deste último (na esteira da Súmula n. 229 do STF,
parcialmente superada) ? e o artigo 225, §3º, da CRFB ? que, sem aludir ao
elemento subjetivo da conduta, destaca a obrigação do responsável à reparação dos
danos de natureza ambiental a que der causa (o que deve incluir, por força do artigo
200, VIII, in fine, os danos relacionados ao meio ambiente do trabalho, derivados da
inobservância das normas de segurança, higiene e saúde no trabalho). E, com efeito, o
artigo 14, §1o, da Lei n. 6.938/81 dispõe, em matéria ambiental, que "é o poluidor
obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar os danos
causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade". São, portanto,
normas contraditórias? Aparentemente, sim; concretamente, não.
Quanto à primeira antinomia, resolve-se-a com a idéia de que a exposição ao
risco é intrínseca a certas profissões no atual estágio de desenvolvimento tecnológico
("Risikogesellschaft"). Haverá, sempre, trabalho penoso, insalubre ou perigoso, que
poderá ser empreendido, à luz dos princípios insculpidos no artigo 170 da CRFB (livre
iniciativa e livre concorrência), ou mesmo que deverá ser empreendido, à mercê do
interesse público primário (e.g., as atividades de geração e transmissão de energia
elétrica, potencialmente perigosas ? v ide Lei n. 7.369/85). Assim, se a redução
máxima do agente prejudicial, i.e., a sua eliminação, é o primeiro propósito da lei
(propiciando, inclusive, a supressão do adicional ? Súmula n. 80 do C.TST), a
Constituição transige com a realidade, estipulando o pagamento de adicionais para as
atividades insalubres, perigosas e penosas, enquanto o atual estado da técnica não
permitir, em determinadas atividades econômicas, a eliminação ou sequer a redução
do elemento perverso a níveis toleráveis para a saúde humana. Nem por isso se
haverá de proibir aquela dada atividade, seja por sua necessidade social, seja em
respeito ao primado da livre iniciativa. Para esses casos, estão previstos os adicionais
de remuneração. Por outro lado, se o estado atual da técnica permitir a eliminação dos
riscos sem comprometimento cabal da atividade econômica, o trabalho perverso deve
ser sumariamente eliminado; e, para tanto, poderão os trabalhadores e/ou o sindicato
recorrer às instâncias do Poder Judiciário. Tal interpretação, sobre coordenar
habilmente as duas normas constitucionais (e, por conseqüência, os dois princípios
contrapostos ? direito ao meio ambiente do trabalho são e equilibrado e livre iniciativa
econômica), realiza, no plano hermenêutico, a aplicação dos princípios da máxima
efetividade e da força normativa da Constituição, que devem inspirar todos os
esforços exegéticos no plano dos direitos humanos fundamentais.
Quanto à segunda antinomia, há que distinguir entre as causas do dano
experimentado pelo trabalhador no ambiente de trabalho. Haverá causas diretamente
ligadas ao desequilíbrio do meio ambiente de trabalho, atraindo a norma do artigo 225,
§3º, da CRFB e, com ela, a regra do art igo 14, §1º, da Lei n. 6.938/81. E outras
haverá que não terão natureza sistêmica, devendo-se antes a circunstâncias
imponderáveis como o ato negligente, as paixões ou o pendor criminoso. Com efeito, o
conceito lato de poluição introduzido pelo artigo 3o, III, da Lei n. 6.938/81 permite
reconhecer a figura da poluição labor-ambiental, que não se atém aos quadros de
afetação da biota ou das condições estéticas e sanitárias do meio ambiente (artigo 3o,
III, "c" e "d") ? como se dá com os agentes químicos, físicos e biológicos em níveis de
intolerância ? , alcançando ainda os contextos de aguda periculosidade ou penosidade
(artigo 3º, III, "b": "criem condições adversas às atividades sociais e econômicas").
É princípio informador do Direito Ambiental que "os custos sociais externos que
acompanham a produção industrial (como o custo resultante da poluição) devem ser
internalizados, isto é, levados à conta dos agentes econômicos em seus custos de
produção" princípio do poluidor-pagador. Também os custos difusos do sistema de
seguridade social com a legião brasileira de mutilados e desvalidos são, nesse sentido,
externalidades a serem internalizadas. E, nesse encalço, a identificação do poluidor no
meio ambiente do trabalho não oferece qualquer dificuldade: será, em geral, o próprio
empregador, que engendra as condições deletérias da atividade econômica ou se
omite no dever de arrostá-las; mas também poderá ser o tomador de serviços,
quando a organização dos meios de produção e/ou do ambiente de trabalho deflagrar
desequilíbrio sistêmico em prejuízo da saúde, segurança e bem-estar dos
trabalhadores. Conseqüentemente, a aplicação do princípio do poluidor-pagador às
hipóteses de danos pessoais (físicos ou psíquicos) derivados do desequilíbrio labor-
ambiental sistêmico permite entrever que a responsabilidade pela internalização dos
custos sociais externos e, "a fortiori", a obrigação de indenizar ("Schuld") com
responsabilidade objetiva ("Haftung"), favorecem não apenas o empregado (=
trabalhador subordinado), mas todo trabalhador inserido na organização empresarial,
na acepção lata do artigo 114, I, da CRFB. Essa compreensão atende melhor ao
princípio insculpido no artigo1º, III, da CRFB, uma vez que, do ponto de vista dos
direitos humanos de primeira e terceira geração, não se justifica a distinção entre
empregados, avulsos, autônomos e eventuais. E, na mesma ensancha, inviabiliza a
tese da natureza contratual da responsabilidade civil do empregador pelos acidentes de
trabalho (uma vez que, se tal responsabilidade dimanasse de cláusula implícita de
integridade inerente aos contratos de emprego, não poderia ser imputada aos
tomadores de serviços em geral).
Conseqüentemente, quando o artigo 7o, XXVIII, da CRFB estabelece, como
direito dos trabalhadores urbanos e rurais, o "seguro contra acidentes de trabalho, a
cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando
incorrer em dolo ou culpa", não se refere às hipóteses de acidentes do trabalho
(artigos 19 e 21 da Lei n. 8.213/91), moléstias profissionais (artigo 20, I, da Lei n.
8.213/91) ou doenças do trabalho (artigo 20, II, da Lei n. 8.213/91) desencadeadas
por distúrbios sistêmicos do meio ambiente laboral. Se o acidente ou a moléstia é
concreção dos riscos inerentes à atividade (vide artigo 22, II, da Lei n. 8.212/91), ou
se não guarda relação causal adequada com tais riscos, a indenização, calcada no
instituto da culpa aquiliana "lato sensu" (artigos 186 e 927, caput, do NCC), dependerá
de prova do elemento subjetivo (dolo ou culpa), usualmente ao encargo do
empregador ou tomador (inversão do ônus da prova). Assim é, p. ex., se o descuido
de um supervisor culminar com a explosão de uma caldeira (riscos inerentes à
atividade de caldeiras, fornos e recipientes sob pressão); ou, ainda, se o empregador
dolosamente sabota equipamentos de proteção individual para provocar o acidente em
detrimento do empregado desafeto (atividade criminosa, desvinculada dos riscos da
atividade).
Por outro lado, se o acidente ou a moléstia configuram dano labor-ambiental,
desencadeado pelo incremento dos riscos inerentes ou pela criação de riscos atípicos
em virtude da organização dos meios de produção e/ou dos elementos materiais do
espaço laboral, a norma de regência é a do artigo 225, §3º, da CRFB e, por ela, a
regra do artigo 14, §1o, da Lei n. 6.938/81. Aliás, são os riscos agravados ou atípicos
que justificam, da mesma forma, a regra do artigo 927, par. único, do NCC.
Usualmente, a evidência do desequilíbrio labor-ambiental está na sucessão de
acidentes ou moléstias que acometem trabalhadores de uma mesma seção ou linha de
produção (denotando a inadequação física, química, biológica, ergonômica ou
psicológica do meio ambiente de trabalho). Mas, malgrado seja circunstancialment e
usual, o caráter "coletivo" não está na essência da responsabilidade civil objetiva
labor-ambiental.
5. ACIDENTES DO TRABALHO.
RESPONSABILIDADES RELATIVAS AO MEIO AMBIENTE LABORAL
Os acidentes do trabalho rememoram das primeiras atividades do homem
voltadas à sua sobrevivência: a caça e a coleta. Os primitivos ancestrais do homem
passavam por toda forma de penúria para conseguirem seu sustento. As caçadas eram
atividades perigosas e extremamente arriscadas, com risco tanto de apanhar e matar
uma presa quanto de serem, eles próprios, devorados. As coletas também exigiam,
não raro, habilidades para escalar em árvores de grande porte, sem qualquer
proteção...
Desde a Idade da Pedra, há mais de 2,5 milhões de anos os seres humanos já
fabricavam e utilizavam instrumentos para facilitar a execução de seus trabalhos. Eram
manuseados instrumentos cortantes ou perfuro -cortantes, o que confirma as
habilidades intelectuais dos seres primitivos. Mas tais instrumentos, por certo, eram
causas de diversos acidentes.
Na medida em que se deu a evolução dos processos de produção aumentaram
os riscos de acidentes do trabalho. Todavia, foi a partir da Revolução Industrial –
século XVIII, que se verificou a intensificação da degradação do meio ambiente natural
e humano (artificial, cultural e do trabalho). A exposição dos seres humanos aos riscos
do trabalho aumentou desde então. E atualmente, em plena época da globalização,
embora algumas empresas tenham implantado e implementado com sucesso as
normas de segurança e medicina do trabalho, o índice de acidentes ainda é altíssimo e
aviltante.
O conceito legal de acidente do trabalho está definido no artigo 19 da Lei nº
8.213 de 1991 nos seguintes termos:
Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da
empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do artigo
11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte
ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
Depreende-se pois, que para a Lei Previdenciária, o acidente do trabalho
somente ocorre com trabalhadores, os quais, no exercício de suas atividades, prestam
serviço à empresa: o segurado empregado ou empregado avulso, bem como com o
segurado especial, cujos efeitos provocam lesão corporal ou perturbação funcional
suficientes para causar a morte, a perda ou redução, temporária ou permanente, da
capacidade para o trabalho.
Ficam excluídos os empregados domésticos e os contribuintes individuais e
facultativos, os quais não receberão o benefício de auxílio -acidente.
Contudo, consoante as lições ministradas pelo Professor Sebastião Alves da
Silva Filho, há que se discordar do conceito que trata acidente como fato inesperado,
imprevisível. Isto porque...
...para os conceitos modernos de engenharia de segurança do trabalho, todo
acidente de trabalho pode ter suas causas previamente levantadas. É possível
determinar as probabilidades de ocorrências de falhas que podem gerar os acidentes.
Mesmo porque do ponto de vista preventivo, é preferível considerar o acidente de
trabalho como uma cadeia de eventos que freqüentemente tem como ponto de partida
um incidente, uma perturbação do sistema no qual estão inseridos o trabalhador e sua
tarefa, e que, após uma série mais ou menos longa de ocorrências, termine por
determinar ou não uma lesão ao indivíduo.
Conclui-se, por conseguinte, o conceito de acidente do trabalho, pode ser visto
sob dois prismas: a) o da Previdência Social, que ao conceituar acidente de trabalho,
inclui a necessidade de lesão, com fito de dar ao cidadão acidentado o tratamento
físico, emocional e material, bem como sua reinserção no mercado de trabalho; b) o
do Ministério do Trabalho e Emprego, no sentido de que a ocorrência de acidente
independe da existência de vítima, visto que tal órgão tem por escopo a prevenção e a
fiscalização (segundo nos informou o Professor e Subdelegado da Subdelegacia do
Trabalho em Uberlândia – MG, Sebastião Alves da Silva Filho)
Além do acidente laboral propriamente dito, também as doenças ocupacionais
são consideradas como acidente do trabalho, nos termos do artigo 20 da lei
previdenciária de nº 8.213/91:
Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as
seguintes entidades mórbidas:
I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo
exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva
relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em
função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione
diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
O parágrafo 1º desse artigo, de plano, exclui das referidas listagens as
seguintes doenças: a) doença degenerativa; b) doença inerente a grupo etário; c)
doença que não produza incapacidade laborativa; d) a doençaendêmica adquirida por
segurado habitante de região em que ela se desenvolva.
O parágrafo 2º do mesmo artigo determina que mesmo eventuais doenças não
relacionadas nas listas elaboradas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, mas que
resultem das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se
relaciona diretamente, deverão ser consideradas como acidente do trabalho pela
Previdência Social. A exceção abrange também as doenças endêmicas que,
comprovadamente, resultem da exposição ou contato direto determinado pela
natureza do trabalho (§ 1º, "d", parte final).
Com fito de ampliar o rol dos acidentes de trabalho e amparar o trabalhador
desvalido, o legislador enumera outras situações diversas das condições específicas
determinadas pela natureza do trabalho. Equiparam, pois, ao acidente do trabalho,
para efeitos da citada lei previdenciária em seu artigo 21 e seus incisos:
I - o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única,
haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua
capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua
recuperação;
II - o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em
conseqüência de:
a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou
companheiro de trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa
relacionada ao trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de
companheiro de trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes
de força maior;
III - a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no
exercício de sua atividade;
IV - o acidente sofrido pelo segurado, ainda que fora do local e horário de
trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da
empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar
prejuízo ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada
por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra,
independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade
do segurado;
d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela,
qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.
Esta lei previdenciária esclareceu, ainda, nos parágrafos 1º e 2º desse artigo
que:
§ 1º. Nos períodos destinados à refeição ou descanso, ou por ocasião da
satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o
empregado é considerado no exercício do trabalho.
§ 2º. Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a
lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às
conseqüências do anterior.
Em síntese, a legislação brasileira considera acidente do trabalho os eventos
ocorridos pelo exercício do trabalho, que causem lesão corporal ou perturbação
funcional, morte e perda ou redução da capacidade para o trabalho, bem como as
doenças profissionais e outras formas de acidentes vinculados ao trabalho: 1) aqueles
ocorridos no local do trabalho decorrentes de atos intencionais ou não de terceiros ou
de companheiros do trabalho; 2) os acidentes oriundos de casos fortuitos ou de força
maior; 3) as doenças provenientes de contaminação acidental no exercício da
atividade; 4) os acidentes ocorridos no percurso residência/local de trabalho/residência
e nos horários das refeições.
5.1 Diferenças entre acidentes de trabalho e doenças ocupacionais
Acidente do trabalho propriamente dito, segundo a legislação previdenciária, é
um evento casual danoso, capaz de provocar lesão corporal ou perturbação funcional,
perda ou redução da capacidade para o trabalho ou morte da vítima. Geralmente é
previsível e evitável, oriundo de alguma ação inapta ou descuidada por parte do
indivíduo (vítima ou agressor), seja por descumprir as normas de segurança e higiene
do trabalho, ou seja, por não estar integrado em uma planificação preventiva de
acidentes oferecida pela empresa. E raramente decorre de algum fato inevitável como
de caso fortuito, de força maior ou fato de terceiro. Classifica-se em acidente-tipo –
aquele que ocorre a serviço da empresa (dentro ou fora da sede), e acidente de
trajeto, quando a ocorrência se dá durante o deslocamento do trabalhador para o local
de trabalho ou vice-versa ou nos horários das refeições.
As doenças ocupacionais são doenças que ocorrem pela exposição cotidiana do
trabalhador a agentes nocivos de qualquer natureza, presentes no ambiente de
trabalho. São espécies dessas doenças: as doenças do trabalho e as doenças
profissionais. As primeiras estão associadas a fatores relacionados ao trabalho, porém,
não estão ligadas ao exercício de determinada profissão. À guisa de exemplo cita-se a
aquisição de DORT (exposição continuada ou não de movimentos repetitivos). As
doenças associadas à profissão são aquelas cuja atividade, por sua natureza, atua na
incapacitação para o trabalho, doença ou morte, como é o caso dos mineradores em
lavra subterrânea, propensos à silicose – doença profissional.
A importância dessa classificação é de interesse do Instituto Nacional de
Seguridade Social (INSS), que reconhece automaticamente a existência da relação de
causa e efeito quando o cidadão que busca sua assistência é portador de doença
profissional. Contudo, para os casos de doenças do trabalho o nexo causal deverá ser
comprovado por meio de laudo técnico competente emitido pelo engenheiro de
segurança ou médico do trabalho.
5.2 Causas de acidentes de trabalho
As causas de acidentes de trabalho observadas sob a ótica restrita ou imediata
são apontadas como atos ou condições inseguros, como por exemplo: a) contato da
pessoa com um objeto, uma substância ou com outra pessoa; b) exposição do
indivíduo aos riscos que envolvam objetos, substâncias químicas ou outras pessoas ou
condições; etc.
Em acepção ampla e mediata verifica-se que as causas acidentárias, quase
sempre estão intrinsecamente ligadas ao incrível crescimento tecnológico
experimentado pela humanidade nos últimos tempos e ao excessivo aumento da
produção. É lamentável, mas em pleno início do século XXI, os empreendimentos
econômicos, ainda, são voltados para os lucros imediatos em detrimento dos
investimentos em programas e equipamentos adequados à proteção coletiva, que são
meios eficazes de combate a acidentes do trabalho. Prefere-se equipamentos paliativos
de proteção individual, aos equipamentos de proteção grupal ou outras a tomar
medidas preventivas coletiva, por julgá-los mais onerosos, o que caracteriza o
desinteresse pelo meio ambiente laboral salutar.
Identificam-se, pois, como causas indiretas do aumento dos casos de doenças
de origem psíquica e física e dos acidentes do trabalho, dentre outras: a complexidade
das máquinas, a automação e a informatização, a crescente exposição aos ruídos,
calor e substâncias tóxicas (condições insalubres, perigosas e penosas), ausência de
efetividade das normas protetoras do ambiente laboral, a preferência apenas pela
redução à eliminação dos riscos, deficiência no sistema de inspeção do trabalho,
excesso de horas extras (que é uma das principais causas mediatas de acidentes
laborais e do aumento do índice do desemprego), sistemainadequado de compensação
de quadro de horários e dos turnos de revezamento, ausência de conscientização, a
desmotivação, as exigências rigorosas nos processos de seleção combinada com
deficiência de formação profissional, as dificuldades para atualizar os conhecimentos e
acompanhar o desenvolvimento tecnológico para assegurar o direito ao trabalho digno,
o temor do desemprego, a precarização dos direitos dos trabalhadores, o trabalho
informal, a fadiga física e a tensão mental do trabalhador.
O Professor Sebastião Alves da Silva Filho ensina que:
Com a chegada ao país das tecnologias de engenharia de perdas e árvore de
causas para os acidentes houve uma mudança no antigo enfoque dado às análises de
acidentes graves e ou fatais. Hoje tais análises se prendem muito mais a refazer o
conjunto de causas que geraram o acidente. Assim sendo, perdeu totalmente a
importância avaliar unicamente e de forma simplória se houve ato [do trabalhador] ou
condição [ambientais] insegura. Isso justifica também pelo fato de que dificilmente se
encontraria um acidente onde atos ou condições inseguras se apresentariam
isoladamente, ou seja, sem que a outra situação também estivesse presente.
Segundo o raciocínio supra, conclui-se que está nas causas mediatas ou
indiretas, o alicerce para o direcionamento da prevenção dos acidentes laborais, uma
vez que são as causas básicas do índice estarrecedor de acidentes do trabalho,
demonstrado pela estatística mundial. Desse modo, para prevenção e redução desse
número, é imprescindível fazer um levantamento amplo e específico sobre a ocorrência
de acidentes, como os fatos agressores mediatos e imediatos causadores do evento, o
local, as condições de trabalho, etc. Assim, além de possibilitar a implementação de
programas de prevenção de acidentes de trabalho pelos atores do ambiente laboral,
aponta os locais em que a fiscalização deve ser realizada com mais rigor.
Pode-se perceber, pelos estudos e pesquisas feitos com intuito de conhecer e
dissertar sobre o tema que, as estatísticas oficiais, deixam a desejar, pois não revelam
a realidade de acidentes laborais.
No órgão previdenciário os acidentes de trabalho são registrados para fins de
levantamentos estatísticos apenas em bloco de números de benefícios concedidos:
auxílio-doença ou auxílio-acidente, pensão por morte, sem determinar a origem do
sinistro (as causas específicas, o local do trabalho, etc.). Se não bastasse, percebe-se,
com base na experiência forense, que há relutância, por parte do INSS, em reconhecer
as doenças profissionais e do trabalho, diagnosticando-as, muitas vezes, como
doenças normais, negando, conseqüentemente, o benefício respectivo.
Não se pode esquecer que os processos acidentários trabalhistas são iniciados
pelo órgão previdenciário somente após a comunicação do fato sinistro a partir da CAT
(Comunicação de Acidente de Trabalho), documento relativo apenas aos empregados
registrados em carteira da empresa, cujo número é reduzido em relação aos
trabalhadores autônomos e informais.
Outra realidade lastimável ocorre nos hospitais ou clínicas médicas, onde os
prontuários médicos deveriam registrar informações mais abrangentes sobre os
trabalhadores/pacientes que ali buscam consulta ou internamento (como a profissão, a
origem (local) e a causa mediata e imediata dos acidentes, doenças e morte destes, ou
seja, dados mais específicos de um eventual acidente/doença do trabalho), mas não o
fazem, geralmente, limitam-se apenas em constar os sintomas físicos ou mórbidos
apresentados pelo paciente.
Diferentes não são os atestados médicos de óbito, que também, na sua
maioria, somente constam as causas letais físic as, dos quais originam os registros de
óbito – instrumento formal, exigido pela Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73,
arts. 77 e ss.).
Como se vê, os trabalhadores que não têm vínculo com a Previdência Social
estão alijados das estatístic as oficiais, especialmente das estatísticas de tal órgão.
Portanto, embora possa verificar uma redução significativa do número de sinistros
trabalhistas sofridos pela massa de segurados da Previdência Social, segundo o quadro
de estatísticas de acidente do trabalho no Brasil – 1970/2000 (em anexo), não se pode
dizer que o referido quadro retrata a realidade brasileira, porquanto, de acordo com o
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), entre 1991 e 1996, o percentual
de trabalhadores sem carteira assinada passou de 40% para 47% no conjunto de seis
regiões metropolitanas pesquisadas. Depois de se manter estável entre 1996 e 1997, a
informalidade no mercado de trabalho brasileiro voltou a crescer no final da década de
90, como reflexo da crise da economia brasileira, até chegar a 50% no final de 1999 e
ultrapassar os 60% em 2003.
5.3 Conseqüências dos acidentes do trabalho
Os efeitos dos acidentes do trabalho são inúmeros e extremamente negativos
e onerosos. Curialmente o trabalhador acidentado e sua família sofrem os maiores
prejuízos (mutilação, incapacidade para o trabalho, morte, dor pelos danos físicos,
psíquicos e morais, marginalização social, pobreza, etc.). Além deles, outros prejuízos
sócio -econômicos são detectáveis. Os custos sociais da Previdência Social são
altíssimos, considerando os gastos com benefícios: aposentadorias antecipadas
(especiais e por invalidez), auxílios-doença, pensão por morte, auxílio-acidente,
reabilitação e readaptação do segurado-acidentado, gastos com saúde. As empresas
também perdem grandes somas e credibilidade social com os acidentes. Por um lado,
precisam arcar com despesas imediatas com o acidentado (atendimento médico-
ambulatorial, transporte, medicamentos, pagamento às vítimas de diárias
correspondentes ao valor proporcional de seu salário-base até o 15º de afastamento,
sem isenção dos encargos sociais relativos. Por outro lado, há queda na produção (pela
perda e eficiência do processo, contratação de substituto ou necessidade de horas
extras), inutilização de máquinas, insumos, produtos, necessidade de reposição de
material inutilizado. etc. Além destes prejuízos, a empresa, a longo prazo, poderá ser
obrigada a fazer a reinserção do acidentado pelo período de estabilidade adquirido,
etc.), arcar com despesas advocatícias, judiciais, indenizatórias, multas
administrativas, ter perdas negociais (multas contratuais por atraso de produção,
rescisão de contratos), perda de certificados de gestão de qualidade, de gestão
ambiental, etc.
Ademais, vale lembrar que a fadiga física e mental dos demais trabalhadores,
gerada pela ocorrência do sinistro, implica em absenteísmo, rotatividade de mão-de-
obra, novos acidentes entre outras perdas.
Dado o altíssimo índice mundial de acidentes do trabalho, a Organização
Internacional do Trabalho (OIT), com fito de reduzi-lo, lançou em 1976, o programa
para o melhoramento das condições e do meio ambiente do trabalho (PIACT),
mediante a implantação e implementação de medidas de segurança e higiene laboral,
cujo início se deu na América Latina. Após o lançamento desse programa,
especialmente no Brasil, notou-se a efetiva queda dos índices dos infortúnios do
trabalho entre os operários segurados pela Previdência Social, segundo estatísticas
oficiais. Observou-se, também que além de evitar os conhecidos prejuízos sociais e
humanos, as empresas que implementaram esse programa tiveram significativa
diminuição dos prejuízos econômicos (continuidade e elevação da qualidade da
produção, eliminação de desperdícios, etc.).
Entretanto, verificou-se a partir dos noticiários da imprensa falada e escrita e
da doutrinas estudadas, que embora haja diminuído a ocorrência dos infortúnioslaborais no Brasil, o país ainda é palco de um dos maiores índices de acidentes do
trabalho do mundo.
As informações obtidas no sítio da Campanha Nacional de Saúde e Segurança
no Trabalho – 2002, realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e
coordenado pela Associação Brasileira para Prevenção de Acidentes (ABPA) – www.sst-
cni-sesi.org.br – confirmam as benesses da prevenção de acidentes do trabalho. Ficou
demonstrado que as empresas que implantaram e implementaram as medidas
prevencionistas de acidentes laborais conseguiram a redução destes e dos prejuízos
econômicos.
É oportuno evidenciar que, ao participar da solenidade de lançamento da
Campanha Nacional da Indústria para a Prevenção de Acidentes no Trabalho 2002 (em
22 de agosto de 2002), o Presidente da Associação Brasileira para Prevenção de
Acidentes (ABPA), Mauro Daffre – Coordenador da Campanha – declarou que um dos
pontos básicos do novo conceito sobre a segurança no trabalho é a preservação da
vida do trabalhador. E disse ainda que:
Isso gera lucro para o empresário e vantagem para a sociedade. É importantíssimo
investir na saúde e segurança dos trabalhadores, o que é um fator de competitividade
para as exportações que geram os empregos de que o Brasil precisa.
Na mesma ocasião, o então Presidente da Confederação Nacional da Indústria
(CNI), Moreira Ferreira falou sobre a relevância da prevenção acidentária para a
economia das empresas ao afirmar que:
Investir em prevenção, além da questão humana da perda de um ente
querido, representa uma vantagem extraordinária e uma grande economia de recursos
que são despendidos no pagamento de acidentes por invalidez e despesas hospitalares
e, também, do tempo que o trabalhador fica fora de seu posto de trabalho. Isso obriga
as empresas a contratarem mão-de-obra supletiva e todos esses custos, somados,
aumentam o Custo Brasil, que precisa ser reduzido porque senão as empresas perdem
a competitividade e, perdendo a competitividade, o número de empregos acaba
reduzido.
No dia anterior (21/08/02), em entrevista concedida ao Caldonews Jornal,
Moreira Ferreira lembrou que após várias décadas de atuação prevencionista e das
campanhas nacionais de prevenção desenvolvidas pelo sistema CNI/SESI/SENAI/IEL,
iniciadas em 1997, houve uma significante a redução dos números catastróficos
acidentários da década de 70, se comparados proporcionalmente em relação à massa
trabalhadora daquela época e a atual. Mas, acrescentou que "ainda há muito para ser
feito: apenas 3% das empresas no País contam com um serviço adequado em
segurança do trabalho"
Das assertivas supra e da leitura das diversas obras pesquisadas percebe-se
que muitas empresas desconhecem ou ainda não estão convencidas da importância
dos investimentos em prevenção acidentária como meio de evitar desperdícios e de
torná-las mais competitivas.
No Brasil ainda há o ranço da "monetização do risco", isto é, há uma opção
pelo aumento da remuneração para compensar o maior desgaste do trabalhador,
mediante pagamento de adicionais de periculosidade, de insalubridade, de horas
extraordinárias, aposentadorias especiais, etc. Essa é uma estratégia traiçoeira que
inibe a luta dos trabalhadores e sindicatos por melhores condições de trabalho.
Estimula-os a acreditarem que é melhor obter um ganho imediato (aumento dos
minguados salários e antecipação da aposentadoria) do que correr o risco de perder o
emprego. Ficam inertes. Deixam de reivindicar a implantação e implementação das
normas de higiene e segurança do trabalho. Parece que preferem expor a saúde, sem
pensarem, de fato, nas nefastas e irreversíveis conseqüências das mutilações e
doenças ocupacionais para o resto de suas vidas, a trabalharem por longos anos e com
salário menor, mas com vigor.
Por fim, muitas empresas desinformadas ou negligentes, quando adotam
algumas medidas preventivas dos acidentes laborais, escolhem as paliativas, como o
uso de equipamentos de proteção individual e/ou pagamento dos referidos adicionais e
deixam de implantar medidas de proteção coletiva, mais eficazes na eliminação ou
redução dos riscos do ambiente do trabalho, por julgarem as últimas mais onerosas ou
por simples desinteresse. Agem em desacordo com os estudos das organizações
governamentais (FUNDACENTRO - Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e
Medicina do Trabalho) ou privadas (CNI - Confederação Nacional da Indústria, ABPA -
Associação Brasileira para Prevenção de Acidentes, etc.) e violam as exigências da
legislação trabalhista que impõe ao empreendedor a obrigação de, primeiramente,
eliminar os riscos do trabalho ou, se impossível, no mínimo, procurar reduzi-los
(Convenções da OIT nº 148, arts. 9 e 10 e nº 155, art. 4.2; CLT, art. 166 c/c NR-4,
item 4.12, "a").
Uma das funções primaciais da lei é anular o desequilíbrio das partes, vindo
em socorro dos mais fracos; assim se procede no próprio terreno contratual onde há a
livre manifestação da vontade.
Com mais força de razão, quando as circunstâncias da vida, múltiplas,
imprevisíveis, inexoráveis, colocam os homens mais a mercê uns dos outros, justifica-
se, sobremaneira, o amparo da lei na proteção da vítima.
6. RESPONSABILIDADES INERENTES AO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E
SEUS FUNDAMENTOS LEGAIS
No Brasil, foi criado um conjunto de normas de segurança e medicina do
trabalho, o qual foi positivado na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho – Decreto-lei
nº 5.452/1943), Título II, Capítulo V, artigos 154 e seguintes, com alterações feitas
pela Lei nº 6.514/77 e complementado pelas Normas Regulamentadoras (NRs)
aprovadas pelas Portarias de nº 3.214/78 (relativas à regras gerais e ao trabalhador
urbano) e nº 3.067/88 (inerentes ao trabalhador rural), ambos os regramentos
expedidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego nos termos da previsão legal contida
nos artigos 190 e 193 da CLT. Todas as normas supra visam a preservação da
qualidade ambiental do local de trabalho.
O sistema acima é formado por subsistemas que, providos de recursos e
regras mínimas, atuam entre si e com outras áreas jurídicas e visam, através do
planejamento e desenvolvimento de ações, prevenir acidentes do trabalho, doenças
ocupacionais e incidentes críticos em todas as atividades de uma empresa, de modo a
satisfazer às necessidades da própria empresa no aspecto da integridade física e da
qualidade de vida de seus trabalhadores e clientes.
As normas de segurança e medicina do trabalho dividem-se em dois aspectos:
por um lado, visam a prevenção contra acidentes do trabalho, doenças ocupacionais e
outras formas de acidentes equiparados, isto é têm por finalidade tornar seguro meio
ambiente laboral. E de outro lado, objetivam a saúde física e psíquica e a higiene do
trabalhador enquanto indivíduo e parte da coletividade. Entretanto, pelo fato de
convergirem para o mesmo fim, segurança e saúde do trabalho, em várias situações se
entrelaçam e são interdependentes.
Sob o ponto de vista da segurança no trabalho, as normas celetistas visam
interação do trabalhador e o seu meio ambiente artificial de trabalho, ao considerar as
prováveis fontes de riscos a serem extintas ou ao menos reduzidas. Assim prevêem
que as edificações deverão ser implantadas observados requisitos técnicos (de
engenharia, biomédicos etc.) que garantam a segurança e higiene como: a) iluminação
uniforme, geral e difusa; b) conforto térmico com ventilação natural ou artificial, uso
de roupas apropriadas em casos de condições térmicas desconfortáveis; c) pisos
antiderrapantes, sem saliências ou depressões ou aberturas, apropriados à circulação,
sem riscos de quedas de pessoas ou objetos; d)instalações elétricas instaladas e
operadas por profissional, etc. (CLT, art. 170 e seguintes).
No artigo 193 a lei trabalhista conceitua as atividades perigosas e define no
artigo 197 algumas regras para transporte e manipulação de materiais e substâncias
perigosas ou nocivas à saúde, como: uso de rótulos de identificação, símbolo padrão
de perigo, avisos de advertências, etc. Também estipula regras relativas às máquinas
e equipamentos, os quais deverão ser adaptados para reduzir a fadiga física e mental
do trabalhador e não sacrificá-lo em prol do aumento da produção. Estipula regras
sobre a movimentação, armazenagem e manuseio de materiais, instalação,
manutenção e uso de máquinas (CLT, art. 182 a 188).
Sob a ótica da higiene e saúde do trabalho a Consolidação das Leis
Trabalhistas tece algumas regras voltadas para medidas preventivas para impedir
danos à saúde física e psíquica do ser humano oriundos do trabalho, como: a exigência
de serviços especializados em medicina do trabalho (art. 162); a obrigatoriedade de
exame médico admissional e demissional, periódicos e complementares conforme
capacidade física e mental do trabalhador em relação aos riscos de sua atividade (art.
168). Conceitua as atividades insalubres (art. 189) e determina que sejam tomadas
medidas de proteção da saúde do trabalhador, preferencialmente, pela adoção de
medidas coletivas que eliminem ou neutralizem a insalubridade, ou distribuição de
equipamentos de proteção individual (EPIs), para reduzir o agente agressor a níveis
toleráveis (par. único do art. 190 e art. 191). Exige que sejam mantidos, nos
estabelecimentos de trabalho, os materiais próprios para prestação de primeiros
socorros médicos (art.168, § 4º). E nos artigos 198 e 199 determina algumas regras
sobre ergonomia, com fito de prevenir a fadiga, como, por exemplo: a) o peso máximo
a serem removidos pelo trabalhador; b) a necessidade de assentos adequados para
assegurar a postura correta; etc.
A obrigação de proteger e defender o meio ambiente e torná-lo sustentável é
de todos. Todavia, no que tange ao ambiente laboral, que deve ser livre de agressões
à saúde do trabalhador, impende ao empregador maior responsabilidade, haja vista
ser este (a empresa, individual ou coletiva), que assume os riscos da atividade
econômica (CLT, art. 2º).
Dessa forma a lei laboral determina uma série de obrigações para as
empresas, a seguir expostas de forma exemplificativa.
O estabelecimento da empresa deve estar de acordo com as exigências legais
e esta não pode iniciar suas atividades sem a prévia inspeção e aprovação de suas
instalações pela autoridade da Delegacia Regional do Trabalho e Emprego e deverá
requerer-lhe nova inspeção quando houver alterações substanciais no mesmo. E por
uma questão de economia poderá solicitar deste órgão a prévia aprovação dos projetos
a serem implantados (CLT, art. 160 e §§).
De acordo com o número de empregados e grau de riscos de acidentes nas
empresas, estas deverão instituir e manter órgãos internos com fito de evitar
infortúnios. Isto é, deverão manter um quadro de serviços especializados em
segurança e medicina do trabalho - SESMT (engenheiro e técnicos em segurança do
trabalho, médico, enfermeiro e técnico em enfermagem do trabalho), implantar,
obrigatoriamente, uma Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), nos
temos dos artigos 162 e seguintes e em conformidade com as normas expedidas pelo
Ministério do Trabalho e Emprego.
A empresa também está obrigada a: a) tomar, preferencialmente, medidas de
segurança coletiva para proteção contra agressões à integridade física de seus
empregados, ou na impossibilidade de eliminar os riscos, fornecer-lhes, gratuitamente,
equipamentos de proteção individual (EPI) adequados, em perfeito estado de
conservação e funcionamento (art.166); b) pagar adicional de insalubridade ou de
periculosidade aos empregados sujeitos a agentes nocivos à sua saúde ou a contato
permanente com inflamáveis, explosivos, radiações ionizantes ou substâncias
radiotivas, energia elétrica, em condições de risco acentuado (CF/88, art. 7º, inc. XXIII
(25) c/c CLT, arts. 192; 193 §§ 1º e 2º; 194 e 196); c) arcar com as despesas dos
exames médicos obrigatórios e comunicar seus resultados ao empregado segundo a
ética médica (CLT, art. 168); d) comunicar a ocorrência de doenças ocupacionais ou
acidente do trabalho (CAT), à Previdência Social até o 1º (primeiro) dia útil seguinte ao
da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena
de multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário de contribuição,
sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência
Social (CLT, art. 169. c/c NR 7, item 7.4.8 e art. 22 da Lei previdenciária nº 8.213/91).
E, enfim, a empresa deve facilitar a fiscalização do estabelecimento pelo órgão
competente, cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho
definidas nos códigos de sanitários e seus regulamentos, nas normas celetistas e
regulamentos expedidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego e normas coletivas de
trabalho, mediante orientações aos empregados sobre as medidas necessárias para
evitar acidente do trabalho (ordem de serviço, cursos de prevenção acidentária,
qualificação profissional para utilização das máquinas,etc.) e por meio de fiscalização e
exigência da conduta precavida dos trabalhadores, como o uso dos equipamentos de
proteção individual fornecidos pela empresa (CLT, art. 154 e 157). Caso a empresa
descumpra as referidas obrigações, ela suportará o ônus das multas administrativas e,
eventualmente, responsabilidade civil e penal, além de ser obrigada a pagar os salários
dos empregados durante o período de paralisação das atividades impostas pelo órgão
competente (CLT, arts. 161 e 201).
É importante assinalar que uso dos equipamentos de proteção individual pelo
empregado sujeito a riscos ambientais, é essencial para eliminar ou reduzir o potencial
do agente agressivo. Portanto, ao empregador, a quem impende zelar pela
incolumidade de seus operários, cabe fornecer e exigir o uso desses equipamentos de
proteção individuais, sob pena de sofrer autuações e multas impostas pelos fiscais da
Delegacia Regional do Trabalho e Emprego e ser obrigado ao ônus de continuar
devendo os adicionais de insalubridade (En. 289/TST).
Em contrapartida, também os trabalhadores têm suas obrigações, visto que
são os maiores interessados em usufruir um meio ambiente adequado ao trabalho e
em manter a integridade da própria saúde. Deverão, pois, observar e colaborar com a
empresa para a efetividade das normas de segurança e medicina do trabalho, por meio
da participação dos cursos oferecidos, implementação das orientações recebidas como:
tomar as precauções necessárias e usar os equipamentos de proteção individual, sob
pena de dispensa por justa causa ou sofrer as conseqüências de sinistro indesejado
(CLT, art. 158, par. único, "b" c/c art. 482, "h").
Ao Poder Público, por sua vez, compete, a edição, execução e fiscalização da
observância das normas de segurança e medicina do trabalho.
Os entes federados, o Ministério Público do Trabalho, o Sistema Único da
Saúde e órgãos da vigilância sanitária têm obrigação de proteger e defender um
ambiente laboral salutar, segundo as normas constitucionais e legais. Mas o Ministério
do Trabalho e Emprego e seus órgãos regionais (Delegacias Regionais do Trabalho e
Emprego – DRTE) são especialmente competentes pela execução das normas de
segurança e medicina do trabalho (CLT, arts. 154; 155 e156).
Ao órgão de âmbito nacional competente em matéria de segurança e medicina
do trabalho(hoje, o Ministério do Trabalho e Emprego, órgão, cuja função é,
eminentemente, executiva: como organizar, orientar, controlar e supervisionar a
fiscalização da execução das normas ambientais do trabalho) foram delegados pela lei,
amplos poderes para estabelecer atos normativos sobre a matéria (CLT, arts. 155,
caput ; 162; 163; par. único; 168, caput, §§1º e terceiro; 169; 174; 175; 178; 179;
182;186; 187, par. único; 190; 193; 194; 195 e 200).
Entende Amauri Mascaro Nascimento que:
[A delegação de tais poderes] trata-se de um fenômeno geral, característico
do Estado moderno. O direito atual reconhece o poder de interferência do Executivo no
processo legislativo, a sua liderança na legislação, a iniciativa de projetos, o veto, a
possibilidade de fixar prazos fatais para a manifestação do Legislativo e, até mesmo, o
poder de editar atos com força de lei.
É lastimável, mas muitas normas não têm eficácia plena, ainda que seu
cumprimento seja essencial ao exercício cabal do direito à vida, como é o caso das
normas protetoras do meio ambiente do trabalho. Há por parte de muitas empresas o
interesse apenas no lucro em detrimento do bem-estar de seus trabalhadores e do
meio ambiente. Até mesmo muitos trabalhadores têm conduta desinteressada pelas
referidas normas, ou preferem retornos financeiros imediatistas, como o recebimento
dos irrisórios e execráveis adicionais de periculosidade, insalubridade, de horário
extraordinário, aposentadoria especial a exigirem condições mais salutares em seus
ambientes de trabalho, a cultivarem regras de vida mais saudáveis. Porém, é
importante evidenciar que na maioria dos casos, os operários não têm meios de
vindicar seus direitos a melhores condições de trabalho, haja vista estar em jogo, o
próprio direito de trabalhar e de sobrevivência. Há um verdadeiro temor do fantasma
do desemprego que ronda seus lares.
Então, com fito de dar efetividade à defesa e proteção desses direitos,
designadamente, às Delegacias Regionais do trabalho compete, no limite de sua
respectiva jurisdição, fiscalizar o cumprimento das referidas normas. Além dessa
função devem também orientar e impor que sejam adotadas as medidas necessárias
para evitar acidentes de trabalho. Para tanto têm, como atribuição, o poder de polícia
para autuar, multar, interditar estabelecimento, setor de serviço, máquina ou
equipamento, embargar obras edificadas sem observância dos requisitos legais,
quando estes ofereçam grave e eminente risco para o trabalhador. Entretanto,
segundo o devido processo legal, é assegurado o direito de recurso administrativo aos
interessados para o órgão competente, em âmbito nacional, em matéria de segurança
e medicina do trabalho (CLT, art. 155, inc. III).
7. NORMAS REGULAMENTADORAS (NRS) – PORTARIAS Nº 3.214/78 E Nº
3.067/88 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO
O cerne do sistema de segurança e medicina do trabalho são as normas ínsitas
na CLT em seus artigos 154 a 201. Interessante salientar que estas normas tratam de
matéria complexa e de evolução dinâmica, razão porque ensejam regulamentação
específica, propensa a sofrer alterações necessárias segundo as regras de experiência.
Dessa forma, a lei trabalhista determinou que o órgão competente para a
matéria em âmbito nacional – o Ministério do Trabalho – expedisse instruções
específicas e complementares às normas gerais já estabelecidas com fito de executá-
las. Para dar cumprimento às atribuições autorizadas pela referida lei o Ministério do
Trabalho expediu as Portarias de nº 3.214/78 e nº 3.067/88, nas quais estão
consubstanciadas as Normas Regulamentadoras (NRs) dos preceitos básicos do
sistema de segurança e medicina do trabalho.
Destarte, foram definidas e aprovadas até o momento 30 (trinta) normas
regulamentadoras (NRs).
A NR-1 trata de disposições gerais; a NR-2, de inspeção prévia; a NR-3 de
embargo ou interdição, a NR-4, de Serviç os Especializado em Engenharia de
Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT); a NR-5, das Comissões Internas de
Prevenção de Acidentes (CIPA); a NR-06 de equipamentos de proteção individuais
(EPIs); a NR-7, de Programa d Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO); a NR-
8, de edificações, a NR-9, de Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA); a
NR-10, de instalações sanitárias, a NR-11, de transporte e movimentação de
materiais; a NR-12, de máquinas e equipamentos; a NR-13, de caldeiras e vasos de
pressão; a NR-14, de fornos; a NR-15, de insalubridade; a NR-16, de periculosidade; a
NR-17, de ergonomia; a NR-18, de meio ambiente da construção civil; a NR-19, de
explosivos; a NR-20, de líquidos combustíveis e inflamáveis; a NR-21, de trabalhos a
céu aberto; a NR-22, de trabalhos de mineração; a NR-23, de combate a incêndios; a
NR-24, de condições sanitárias e de conforto nos locais de trabalho; a NR-25, de
resíduos industriais; a NR-26, de sinalização de segurança; a NR-27, de registro
profissional; a NR-28, de fiscalização e penalidades; a NR-29, de segurança e saúde no
trabalho portuário e a NR-30 de segurança e saúde no trabalho aquaviário.
Verifica-se a partir do título de cada norma regulamentadora a finalidade que
ela propõe, qual seja: possibilitar o desenvolvimento do trabalho com o menor risco de
lesões ao trabalhador e efetivar uma gama de medidas que protejam o meio ambiente
laboral.
Quanto à prevenção contra acidentes de trabalho é interessante salientar, o
conteúdo de algumas das Normas Regulamentadoras:
a) NR-1 – esta NR tem por fim complementar o artigo 157 da CLT. Dispõe
sobre a implementação da Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes (itens 1.3 e
1.4) e especifica as condutas básicas a serem tomadas pelo empregador e empregado,
com fito de evitar acidentes de trabalho (itens 1.7 e 1.8).
b) NR-2 – nesta norma define-se a finalidade da inspeção prévia (CLT, 160) e
do Certificado de Aprovação de Instalações, como elementos capazes de assegurar que
o estabelecimento está iniciando as atividades conforme os requisitos legais e técnicos
apropriados à garantia da perfeita segurança aos que nele trabalham, isto é, livre de
riscos de acidentes ou doenças ocupacionais (item 2.6).
c) NR-3 - conceitua risco grave e eminente como toda condição ambiental de
trabalho que possa causar acidente do trabalho ou doença profissional com lesão grave
à integridade física do trabalhador e regulamenta as regras sobre a interdição do
estabelecimento ou embargos das obras, consideradas como todo e qualquer serviço
de engenharia de construção, montagem, instalação, manutenção e reforma (itens
3.1.1 e 3.3.1 c/c CLT, art. 161).
d) NR-4 – esta NR, nos termos do artigo 162 da CLT, instituiu a classificação
nacional de atividades econômicas com seus respectivos graus de risco (conforme
Quadro I em anexo). Definiu exigências quanto à manutenção obrigatória pelas
empresas de Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do
Trabalho (SESMT), de acordo com o número de empregados e grau de risco da
atividade empresarial, para a promoção e proteção da saúde e integridade do
trabalhador no local de trabalho (item 4.1).
Assim, as empresas (sejam elas privadas ou públicas, e mesmo os órgãos
públicos da administração direta e indireta dos poderes legislativo e judiciário) que se
enquadrem, por exemplo, no grau de risco 3 (três) e contam com um quadro de
empregados que varia entre 50 a 100 indivíduos, não serão obrigadas a manter o
Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho
(SESMT). Porém, se tiverem um quadro de empregados de 3.501 a 5000 pessoas,
deverão manter o quadro completo do SESMT e deverão contratar como empregadospelo menos: a) oito técnic os de segurança do trabalho, dois engenheiros de segurança
do trabalho, um auxiliar de enfermagem no trabalho, um enfermeiro do trabalho e dois
médicos do trabalho (item 4.2).
Vale ressaltar que para a NR-4 se a empresa tem vários estabelecimentos
(mesmo que instalados em lugares diversos) e se mais de 50% de seus empregados
trabalharem em setor, cuja atividade tenha gradação de risco superior ao da atividade
principal, deverão dimensionar o SESMT em função do maior grau de risco. Inclusive,
se apenas um de seus estabelecimentos se enquadrar no Quadro II (anexo que trata
do dimensionamento dos SESMT), deverá prestar serviços especializados aos
empregados do estabelecimento que não se enquadrou (itens. 4.2.2 e 4.2.4).
E mais, no item 4.5 e seus subitens, a NR-4 define a responsabilidade da
empresa, cujos estabelecimentos se enquadram no Quadro II e que, normalmente,
contratam serviços terceirizados.
Ressalta-se, o comando desse item é de suma importância para evitar as
forma s dissimuladas de burlar a efetivação das regras de segurança e medicina do
trabalho, mediante a terceirização. Por um lado, determina que a empresa contratante
deverá estender a assistência de seus Serviços Especializados em Engenharia de
Segurança e em Medicina do Trabalho aos empregados da(s) contratada(s), sempre
que o número de empregados desta(s), exercendo atividade naqueles
estabelecimentos, não alcançar os limites previstos no Quadro II, devendo, ainda, a
contratada cumprir o disposto no subitem 4.2.5. E também deverão ser estendidos a
trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, no teor do item 1.1.1 da NR-1. Por
outro lado, o subitem 4.5.1 estabelece que se a empresa contratante e as demais
empresas por ela contratadas, consideradas individualmente, não se enquadrarem no
Quadro II anexo, devem ser consideradas em conjunto, desde que atuem no mesmo
no estabelecimento. E, se assim, atingirem o número total de empregados conforme os
limites dispostos no referido quadro, deverá ser constituído um Serviço Especializado
em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho comum, nos moldes do item
4.14.
E para as empresas que não se enquadram no Quadro II anexo à NR-4 é
facultado dar assistência, na área de segurança e medicina do trabalho, a seus
empregados por meio de Serviços especializados em Engenharia de Segurança e em
Medicina do Trabalho (SESMT), organizados em comum pelo sindicato ou associação
da categoria econômica correspondente ou pelas próprias empresas interessadas (item
4.14).
Outro ponto que merece destaque é o item 4.12 da NR-4 que traça
competências ao SESMT. Dentre elas sobressaem as obrigações de:
1) definir, primeiramente, que sejam utilizados todos os meios conhecidos
para a eliminação do risco e, se o agente agressor persistir, ainda que de forma
reduzida, depois de esgotadas todas as medidas possíveis para extingui-lo, o segundo
passo é determinar a utilização, pelo trabalhador, de equipamentos de proteção
individual (EPI), de acordo com as regras da NR-6, desde que a concentração, a
intensidade ou característica do agente assim o exija;
2) "responsabilizar-se, tecnicamente, pela orientação quanto ao cumprimento
do disposto nas NR aplicáveis às atividades executadas pela empresa e/ou seus
estabelecimentos";
3) "promover a realização de atividades de conscientização, educação e
orientação dos trabalhadores para a prevenção de acidentes do trabalho e doenças
ocupacionais, tanto através de campanhas quanto de programas de duração
permanente";
4) "esclarecer e conscientizar os empregadores sobre acidentes do trabalho e
doenças ocupacionais, estimulando-os em favor da prevenção";
5) "manter permanente relacionamento com a CIPA, valendo-se ao máximo de
suas observações, além de apoiá-la, treiná-la e atendê-la, conforme dispõe a NR 5;
etc".
e) NR-5 – esta NR regulamentou amplamente, as atribuições, o
funcionamento, a composição das Comissões Internas de Prevenções de Acidentes
(CIPA) e estipulou a obrigatoriedade de sua instalação também de acordo com os
graus de risco das atividades empresarias combinado com o número de empregados
(conforme o dimensionamento previsto no Quadro I em anexo).
As empresas, cujos estabelecimentos, independentemente do grau de riscos,
tenham somente até 20 (vinte) empregados, não são obrigadas a instalar e manter a
CIPA. Apenas deverão indicar um responsável pelo cumprimento dos objetivos desta
NR, podendo ser adotados mecanismos de participação dos empregados através de
negociação coletiva (item 5.6.4).
Para termos uma visão mais abrangente sobre o dimensionamento do referido
Quadro I, a proporção entre o número de empregados e o grau de risco, que obriga a
empresa a instalar a CIPA, segundo seu enquadramento no Quadro I desta NR,
observe o exemplo abaixo:
Atividades de menor grau de risco (grau de risco 1), como é o caso das
prestadoras de serviço pertencentes ao grupo C-29 (atividades de organizações
profissionais, de organizações políticas, associativas de modo geral), somente serão
obrigadas a implantar as CIPAs, se tiverem um contingente de empregados superior a
300 (trezentas) pessoas, sendo que será exigível apenas um titular e um suplente para
representar cada grupo (empregados e empregadores), se esse número for inferior a
501 (quinhentos e um) indivíduos.
Mas se a atividade exercida pela empresa tem grau de risco elevado, como
indústrias de artigos de borracha e plástico, pertencentes ao grupo C-11 (fabricação de
pneumáticos e de câmaras-de-ar de grau de risco 4); ou atividades de comércio de
produtos perigosos – grupo C-22 (comércio e varejo de combustíveis de grau de risco
3), a empresa deverá instituir a CIPA a partir da existência de 20 (vinte) empregados.
Aplica-se a referida norma às empresas privadas, públicas, sociedades de
economia mista, órgãos da administração direta e indireta, instituições beneficentes,
associações recreativas, cooperativas, bem como outras instituições que admitam
trabalhadores como empregados e aos trabalhadores avulsos (item 5.2).
Deve ser salientado que a constituição da CIPA não é por empresa, mas por
estabelecimento, segundo seja enquadrada nos requisitos de obrigatoriedade de
mantê-la em regular funcionamento. E estas deverão garantir a integração das CIPA e
dos designados, se possuírem no mesmo município dois ou mais estabelecimentos,
com fito de harmonizar as políticas de segurança e saúde no trabalho (item 5.2 c/c
5.4).
Contudo, não basta constituir a CIPA, é preciso dar eficiência a este órgão.
Então, à empresa cabe promover treinamento para os membros da CIPA, titulares e
suplentes, antes da posse (item 5.32), exceto se for o primeiro mandato da CIPA, cujo
prazo de realização será de no máximo trinta dias, contados a partir da data da posse
(item 5.32.1).
Segundo o item 5.33 da NR-5, o treinamento para a CIPA deverá contemplar,
no mínimo, os seguintes itens:
a)estudo do ambiente, das condições de trabalho, bem como dos riscos
originados do processo produtivo;
b)metodologia de investigação e análise de acidentes e doenças do trabalho;
c)noções sobre acidentes e doenças do trabalho decorrentes de exposição aos
riscos existentes na empresa;
d)noções sobre a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - AIDS, e medidas
de prevenção;
e)noções sobre as legislações trabalhista e previdenciária relativas à
segurança e saúde no trabalho;
f)princípios gerais de higiene do trabalho e de medidas de controle dos riscos;g)organização da CIPA e outros assuntos necessários ao exercício das
atribuições da Comissão.
A NR-5 traçou como objetivos da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
– CIPA: a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a
tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a
promoção da saúde do trabalhador o que revela a sua relevância (item 5.1).
Nesse sentido, convém salientar algumas atribuições da CIPA (item 5.16,
alíneas a, c, d, f, h, i, j, l, o, respectivamente):
- identificar os riscos do processo de trabalho, e elaborar o mapa de riscos,
com a participação do maior número de trabalhadores, com assessoria do SESMT,
onde houver;
- participar da implementação e do controle da qualidade das medidas de
prevenção necessárias, bem como da avaliação das prioridades de ação nos locais de
trabalho;
- realizar, periodicamente, verificações nos ambientes e condições de trabalho
visando a identificação de situações que venham a trazer riscos para a segurança e
saúde dos trabalhadores;
- divulgar aos trabalhadores informações relativas à segurança e saúde no
trabalho;
- requerer ao SESMT, quando houver, ou ao empregador, a paralisação de
máquina ou setor onde considere haver risco grave e iminente à segurança e saúde
dos trabalhadores;
- colaborar no desenvolvimento e implementação do PCMSO e PPRA e de
outros programas relacionados à segurança e saúde no trabalho;
- divulgar e promover o cumprimento das Normas Regulamentadoras, bem
como cláusulas de acordos e convenções coletivas de trabalho, relativas à segurança e
saúde no trabalho;
- participar, em conjunto com o SESMT, onde houver, ou com o empregador
da análise das causas das doenças e acidentes de trabalho e propor medidas de
solução dos problemas identificados;
- promover, anualmente, em conjunto com o SESMT, onde houver, a Semana
Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho - SIPAT; etc.
Destarte, diante da importância das atribuições dos integrantes da CIPA, os
titulares da representação dos empregados receberam a concessão de estabilidade
provisória no emprego a partir de 1977, com a alteração do artigo 165, da CLT, pela
Lei nº 6.514. Tal comando foi ratificado pelo artigo 10 das Disposições Transitórias,
inciso II, "a", que vedou a dispensa arbitrária ou sem justa causa do empregado eleito
para o cargo de direção da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), desde
o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato.
A CIPA é um órgão paritário de suma importância para a proteção do meio
ambiente do trabalho, cuja efetividade depende da franca desenvoltura de seus
dirigentes. Seu Presidente é indicado, anualmente, pelo empregador dentre seus
representantes e o Vice-Presidente eleito pelos empregados (CLT, art. 164, § 5º).
Portanto, a estabilidade provisória no emprego ao dirigente da CIPA, visa garanti-lo
contra a insatisfação e eventual retaliação do empregador (ante a resistência de
algumas empresas em investir em segurança e medicina do trabalho), óbice ao livre
desempenho de sua árdua tarefa de vindicar e defender um dos mais relevantes
interesses coletivos: o direito de obter melhores condições de trabalho no meio
ambiente laboral.
A garantia de estabilidade não foi estendida ao dirigente da CIPA, indicado
pela empresa, o que se mostra injustificável, pois ambos os dirigentes – Presidente e
Vice-Presidente – necessitam de garantia contra as eventuais pressões do meio
patronal. Ora, inobstante o Presidente da CIPA, ocupe um cargo de confiança do
empregador (posição que naturalmente o inibe e o força a atuar de forma
tendenciosa), deve também, devido à proeminência da sua função, atuar sem
constrangimentos e medo de dispensa coercitiva, ser livre para cuidar e zelar por um
ambiente laboral seguro e adequado e, inclusive, para sugerir e solicitar ao
empregador que sejam tomadas as medidas preventivas necessárias à redução e
eliminação de riscos à saúde dos trabalhadores, ainda que estas sejam dispendiosas.
Ademais, ao empregador compete o dever de garantir que seus indicados
tenham a representação necessária para a discussão e encaminhamento das soluções
de questões de segurança e saúde no trabalho analisadas na CIPA (NR-5, item 5.10).
Outrossim, segundo a NR-5 o empregador deve garantir a todos os membros
da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), condições que não
descaracterizem suas atividades normais na empresa, sendo vedada a transferência
para outro estabelecimento sem a sua anuência, ressalvado o disposto nos parágrafos
primeiro e segundo do artigo 469, da CLT (item 5.9).
As CIPAs (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes) são órgãos
essenciais na defesa e prevenção do meio ambiente do trabalho, pois seus membros
vivenciam diária e diretamente todas as situações potenciais de lesão aquele meio.
Infelizmente, embora criadas, legalmente, à quase trinta anos, no Brasil,
muitas empresas que se enquadram nas exigências dessa norma a desrespeitam, não
constituindo as CIPAs ou não garantindo a efetividade daquelas já formalizadas em
seus estabelecimentos. Muitos são os casos, salvo raras exceções, em que a atuação
das CIPAs é medíocre. Eis a denúncia vigorosa de Raimundo Simão de Melo, atuante
Procurador Regional do Trabalho, cotado na 15ª Região:
No Brasil, se de um lado a fiscalização do Estado não atua a contento -
ressalvadas honrosas exceções – por inúmeras razões, entre elas a falta de estrutura
oferecida (ou não oferecida) pelo Estado, de outro, o diálogo social tem sido ausente
na maioria dos casos e a criação dos órgãos paritários também não tem surtido os
efeitos desejados, pois se por lei existe a obrigação de constituição de CIPAS
(Comissões Internas de Prevenção de Acidentes), nas empresas com mais de 50
empregados, essas comissões, também ressalvadas honrosas exceções, não cumprem
realmente o seu papel, que é de defesa do meio ambiente adequado e seguro e da
prevenção de acidentes de trabalho, pelo simples motivo de que são, na maioria,
vinculadas e curvadas ao interesse patronal e os seus membros usam da importante
estabilidade consagrada pela Constituição como um direito individual e pessoal,
quando esse direito é muito mais da categoria que o elegeu.
O Ilustre Procurador pondera com veemência e convoca aos interessados,
especialmente aos membros das CIPAs, que dêem eficácia a sua atuação, pois
somente assim e será possível regredir os estarrecedores acidentes havidos no meio
laboral.
A finalidade das comissões internas de prevenção de acidentes é cuidar e zelar
por adequadas e seguras condições nos ambientes de trabalho, observando e
relatando condições de risco, solicitando ao empregador medidas para reduzi-los e
eliminá-los, bem como para prevenir a ocorrência de acidentes e doenças, e ainda,
orientar os trabalhadores quanto à prevenção de tais eventos. (...) Urge, pois, que
esses importantes órgãos de representação dos trabalhadores e empregadores nos
locais de trabalho passem a cumprir o seu papel, inclusive com o apoio e em harmonia
com os sindicatos, que é a única forma de serem realmente atuantes.
f) NR-6 – esta NR aprova quais são os equipamentos de proteção individual
que deverão ser utilizados (item 6.3), e define que as normas técnicas para fabricação
e ensaio dos equipamentos de proteção serão baixadas pela SSMT (Secretaria de
Segurança e Medicina do Trabalho, em portarias específicas (item 6.12). Reitera a
gratuidade do fornecimento dos mesmos pela empresa e a obrigação desta de
promover,prioritariamente, a implementação de medidas ou equipamentos de
segurança e proteção coletiva (CLT, art. 166, in fine).
Determina, pois, no item 6.3, que a empresa é obrigada a fornecer aos
empregados, gratuitamente, equipamentos de proteção individual (EPIs) adequado ao
risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento, nas seguintes
circunstâncias:
a) sempre que as medidas de proteção coletiva forem tecnicamente inviáveis
ou não oferecerem completa proteção contra os riscos de acidentes do trabalho e/ou
de doenças profissionais e do trabalho;
b) enquanto as medidas de proteção coletiva estiverem sendo implantadas;
c) para atender a situações de emergência.
A NR-6 impõe no item 6.8.6, responsabilidade ao fabricante de equipamentos
de proteção individual, pela manutenção da mesma qualidade dos equipamentos de
proteção individual (EPIs) padrão que deu origem ao Certificado de Aprovação (CA).
g) NR-7 – Esta NR, considerando que todos os trabalhadores devem ter o
controle de sua saúde de acordo com os riscos a que estão expostos, exigência legal
prevista no artigo 168 da CLT, respaldada na Convenção 161 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), aprovou o Programa de Controle Médico de Saúde
Ocupacional (PCMSO) com o escopo de promover e preservar a saúde do conjunto dos
trabalhadores.
A elaboração e implementação do PCMSO devem respeitar princípios éticos,
morais e técnicos e é obrigatória a todos os empregadores e instituições que admitam
trabalhadores como empregados. As empresas deverão arcar com todos os custos dos
procedimentos (incluindo avaliações clínicas e exames complementares, etc.) e
garantir a eficácia desse programa.
Outrossim, toda empresa deverá informar sobre os riscos que envolvem sua
atividade aos seus empregados, bem como a eventuais empresas contratadas para
prestar serviços em seu local de trabalho. E, como são responsáveis, ainda que
subsidiariamente, pelo cumprimento das obrigações trabalhistas da empresa
contratada, deverão auxiliá-las na elaboração e implementação do PCMSO (item
7.1.3).
E para coordenar o PCMSO a empresa deverá indicar um médico do trabalho
do seu quadro de Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina
do Trabalho – SESMT; ou caso esteja desobrigada de manter médico do trabalho, de
acordo com a NR-4, deverá contratar e indicar médico do trabalho autônomo ou
contratar médico de outra especialidade, caso inexista médico do trabalho na
localidade, o empregador poderá contratar médico de outra especialidade (item 7.3.1).
O médico coordenador é competente e responsável, pelas seguintes funções
dentre outras:
a) realizar os exames obrigatórios comuns ou complementares segundo o grau
de risco da atividade;
b) Emitir, para cada exame médico realizado, o Atestado de Saúde
Ocupacional – ASO, segundo os requisitos mínimos exigidos no item 7.4.4.3, em duas
vias, uma para o empregado e outra para ser arquivada no local de seu trabalho;
c) Se constatar a ocorrência ou agravamento de doenças profissionais, através
dos referidos exames médicos; ou sendo verificadas alterações que revelem qualquer
tipo de disfunção de órgão ou sistema biológico, deverá nos termos do item 7.4.8:
- solicitar à empresa a emissão da Comunicação de Acidente do Trabalho -
CAT;
- indicar, quando necessário, o afastamento do trabalhador da exposição ao
risco, ou do trabalho;
- encaminhar o trabalhador à Previdência Social para estabelecimento de nexo
causal, avaliação de incapacidade e definição da conduta previdenciária em relação ao
trabalho;
- orientar o empregador quanto à necessidade de adoção de medidas de
controle no ambiente de trabalho.
d) Arquivar os prontuários individuais de cada paciente/trabalhador por no
mínimo 20 (vinte) anos e transferi-los para eventual sucessor;
e) Coordenar a implementação do PCMSO, o qual deverá obedecer a um
planejamento em que estejam previstas as ações de saúde a serem executadas
durante o ano;
f) Fazer o relatório anual do programa, e apresentar e discutir na CIPA, se
existente na empresa, a qual receberá e arquivará cópia em sua ata, etc.
Entretanto, ficarão dispensadas de apresentar o referido relatório as empresas
desobrigadas de indicar o médico coordenador do PCMSO (item 7.4.6.4). São elas,
conforme estabelecido nos itens 7.3.1.1; 7.3.1.1.1 e 7.3.1.1.1:
a) Empresas de grau de risco 1 e 2, com até 25 (vinte e cinco) empregados,
bem como as empresas enquadradas no grau de risco 3 e 4, com até 10 (dez),
segundo verifica-se no Quadro I da NR-4.
b) As primeiras empresas, acima mencionadas, se tiverem um contingente
entre 25 (vinte e cinco) e 50 (cinqüenta) empregados, poderão se desobrigar desse
encargo mediante negociação coletiva. Aquelas de grau de ris co 3 e 4, com um quadro
de empregados que varie de 10 (dez) até 20 (vinte) pessoas também poderão se
desobrigar de tal ônus em decorrência de negociação coletiva, porém, com a
assistência de profissional do órgão regional competente em segurança e saúde no
trabalho.
Contudo, vale ressaltar que, quaisquer empresas poderão ter a
obrigatoriedade de indicação de médico coordenador, quando suas condições
representarem potencial de risco grave aos trabalhadores, desde que verificado em
parecer técnico conclusivo da autoridade regional competente em matéria de
segurança e saúde do trabalhador, ou se assim for determinado em convenção coletiva
ou, ainda, quando findar os efeitos normativos da convenção coletiva concedente da
desoneração (Item 7.3.1.1.3)
O programa (PCMSO) deve incluir, entre outros, a realização obrigatória dos
exames médicos nas seguintes ocasiões, segundo o item 7.4.1 desta NR:
a) na admissão do empregado, a ser realizado antes que o trabalhador
assuma suas atividades;
b) periodicamente (bienal, anual ou com intervalos menores para hipóteses de
trabalhadores expostos a riscos ou situações de trabalho que impliquem o
desencadeamento ou agravamento de doença ocupacional, ou, ainda, para aqueles
que sejam portadores de doenças crônicas, podendo ser incluídos exames
complementares);
c) na data do retorno ao trabalho (em caso retorno de trabalhador ausente por
período igual ou superior a trinta dias por motivo de doença ou acidente, de natureza
ocupacional ou não, ou parto, deverá ser realizado, obrigatoriamente, no dia da volta
ao trabalho);
d) de mudança de função (assim entendida se ocorrer alteração do risco a que
o trabalhador ficará exposto, visto que poderá ocorrer troca de função na empresa sem
mudança de risco). Será obrigatória sua realização antes da data da mudança.
e) no término do contrato (exame demissional).
Pelo exposto, resta evidente que à empresa cabe o ônus de implementar o
PCMSO, segundo orientações do médico coordenador. Mas a este impende a
responsabilidade técnica. Assim ambos são responsáveis pelo controle ambiental no
local de trabalho e prevenção de doenças ocupacionais. E caso ocorra um sinistro, a
primeira poderá ser culpada por não fornecer meios necessários à elaboração e
implantação do PCMSO, ou ainda, ter culpa in eligendo. Mas se comprovar que
implementou todas as medidas indicadas pelo médico coordenador, terá direito
regressivo contra ele, na hipótese desse ter agido com negligência, imperícia,
imprudência ou mesmo, com dolo (negativo, positivo ou eventual).
Para o controle ambiental realizado pelos órgãos internos da empresa, além de
seobservar as determinações do Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional –
PCMSO, também se faz essencial elaborar e implantar, de forma articulada com este
programa o PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais). O PPRA visa à
preservação da saúde e a integridade dos trabalhadores, através da antecipação, do
reconhecimento, da avaliação e do conseqüente controle da ocorrência de riscos
ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho, tendo em
consideração a proteção do meio ambiente e dos recursos naturais. Daí, sua
obrigatoriedade aos empregadores e inst ituições que admitam trabalhadores como
empregados (NR-9, itens 9.1.1 e 9.1.3).
h) NR-9 – Esta NR criou o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, que
deverá ser elaborado e implantado pelo empregador com a colaboração dos seus
empregados (item 9.1.2).
Definiu parâmetros mínimos e diretrizes gerais a serem observados na
execução do PPRA e caracterizou como riscos ambientais os agentes físicos, químicos e
biológicos existentes nos ambientes de trabalho que, em função de sua natureza,
concentração ou intensidade e tempo de exposição, são capazes de causar danos à
saúde do trabalhador e exemplificou alguns desses agentes (item 9.1.5), cujas
alterações poderão ser baixadas pela Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho,
conforme necessidade e experiência (art. 2º da Portaria nº 3.214/78), que sempre
surgem ante rápida evolução e aumento dessas espécies de agente sejam naturais ou
artificiais.
De acordo com os itens 9.2.1, 9.2.2, o PPRA deverá estar descrito num
documento-base, cuja estrutura mínima deverá conter:
a) planejamento anual com estabelecimento de metas, prioridades e
cronogramas [cujos prazos para o desenvolvimento das etapas e cumprimento das
metas do PPRA deverão ser claros];
b) estratégia e metodologia de ação;
c) forma do registro, manutenção e divulgação dos dados;
d) periodicidade e forma de avaliação do desenvolvimento do PPRA.
O Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do
Trabalho - SESMT (ou a pessoa ou equipe de pessoas que, a critério do empregador,
sejam capazes de desenvolver as disposições da NR-9) deverá elaborar, implementar,
acompanhar a implantação do PPRA, bem como efetuar, anualmente ou sempre que se
fizer necessário, uma análise global do mesmo para avaliar seu desenvolvimento e
realizar os ajustes necessários e estabelecimentos de novas metas e prioridades (itens
9.2.1.1 e 9.3.1.1).
O documento-base e suas alterações e complementações deverão ser
apresentados e discutidos na CIPA, que deverá anexar sua cópia ao seu livro de atas
(item 9.2.2.1), bem como deverão estar disponíveis de modo a proporcionar o
imediato acesso às autoridades competentes (item 9.2.2.2).
Estão previstas no item 9.3.1 da NR-9, as seguintes etapas a serem incluídas
no Programa de Prevenção de Riscos Ambientais:
a) antecipação e reconhecimento dos riscos;
b) estabelecimento de prioridades e metas de avaliação e controle;
c) avaliação dos riscos e da exposição dos trabalhadores;
d) implantação de medidas de controle e avaliação de sua eficácia;
e) monitoramento da exposição aos riscos;
f) registro e divulgação dos dados.
Entretanto, para as empresas cujas atividades, não ofereçam riscos
ambientais, haja vista não terem sido identificados nas fases de antecipação ou
reconhecimento, o PPRA poderá resumir-se às etapas previstas nas alíneas "a" e "f"
desse subitem, conforme se depreende do item 9.1.2.1.
Deve-se reiterar a prioridade da implementação pelo empregador de medidas
de proteção coletiva. E somente quando ele comprova a inviabilidade técnica da
adoção dessas medidas, ou quando estas não forem suficientes ou se encontrarem em
fase de estudo, planejamento ou implantação, ou ainda em caráter complementar ou
emergencial, deverão ser adotadas outras medidas, obedecendo-se a seguinte
hierarquia conforme o item 9.3.5.4:
a) medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho;
b) utilização de equipamento de proteção individual - EPI.
Enfim, segundo o item 9.4 da NR-9 tanto o empregador quanto os
trabalhadores serão responsáveis pela eficácia do Programa de Prevenção de Riscos
ambientais. Estes são obrigados colaborar e participar na implantação e execução do
PPRA; seguir as orientações recebidas nos treinamentos oferecidos dentro do PPRA;
informar ao seu superior hierárquico direto ocorrências que, a seu julgamento, possam
implicar riscos à saúde dos trabalhadores. E de acordo com o item 9.6.3 da referida
NR, em se tratando de situação de grave e iminente risco para um ou mais
trabalhadores, esses poderão interromper, de imediato, as suas atividades e, somente
após a interrupção, comunicar o fato ao superior hierárquico direto para que sejam
tomadas as devidas providências.
Ao empregador cabe garantir-lhes esse direito, mesmo porque já está
obrigado a estabelecer, implementar e assegurar o cumprimento do PPRA, como
atividade permanente da empresa ou instituição. E se vários empregadores realizarem,
simultaneamente, atividades no mesmo local de trabalho terão o dever de executar
ações integradas para aplicar as medidas previstas no PPRA visando à proteção de
todos os trabalhadores expostos aos riscos ambientais gerados (item 9.6.1).
Os programas acima apresentados (PCMSO e PPRA) são indubitavelmente, de
natureza preventiva. E toda prevenção depende do conhecimento das causas, dos
agentes causadores do evento do qual se deve e se quer precaver. Em se tratando de
prevenção de acidentes de trabalho, há vários fatores de riscos a serem detectados e
conhecidos para que sejam traçadas as suas dimensões e os meios para evitá-los.
Primeiro deve-se ponderar que em qualquer atividade pode acontecer um
infortúnio ao trabalhador, então deve estar cercada de todos os cuidados necessários à
sua execução, a começar da edificação, instalações de máquinas e outros móveis e,
principalmente, da orientação dos usuários e executores das tarefas, por mais singelas
que sejam como, por exemplo, fazer o velho e gostoso cafezinho.
Mas a ocorrência desses infortúnios, óbvio, aumenta quando as atividades, por
sua própria natureza ou condições de trabalho, são insalubres ou perigosas. Arrisca-se,
portanto, a vida e a integridade física nesses ambientes laborais. E ainda hoje, seja
nas atividades industriais ou seja nas extrativas, é quase inevitável o trabalho em
condições insalubres ou perigosas a serem precavidas.
Então, para eliminar ou reduzir a margem de riscos existentes nesses
ambientes laborais, é preciso, pois, detectar quais são os fatores de risco, os agentes
insalubres ou operações perigosas.
Inclusive, nos termos do artigo 191 da CLT, a insalubridade pode ser
eliminada ou neutralizada, para tanto esse dispositivo determinou ao Ministério do
Trabalho e Emprego a incumbência de aprovar o quadro das atividades e operações
insalubres, adotar normas sobre os critérios para caracterizá-las, os limites de
tolerância aos agentes agressivos (tempo máximo de exposição) e meios de proteção
aos empregados, sejam coletivos ou individuais.
i) NR-15 – Para cumprir o comando do artigo 190 da CLT, o Ministério do
Trabalho e Emprego aprovou a NR-15, que trata das atividades e operações insalubres,
com base em estudos da FUNDACENTRO (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de
Segurança e Medicina do Trabalho).
Esta NR é integrada por quatorze anexos e formada por sete itens nos quais
entreoutras regras: a) conceituam limite máximo de tolerância humana em relação ao
ambiente insalubre (cuja previsão está contida nos anexos nº 1, 2, 3, 5, 11 e 12); b)
definem as atividades e operações insalubres como sendo aquelas estão acima dos
referidos limites de tolerância (subitem 15.1.1), as definidas nos anexos 6, 13 e 14
(subitem 15.1.3), bem como aquelas determinadas nos anexos 7, 8, 9 e 10 (subitem
15.1.4), além de confirmar as disposições da CLT que trata das atividades insalubres e
perigosas.
Os 14 anexos trazem impressionante conteúdo técnico, ao:
a) definir regras e tabelas de limites de tolerância para: a) ruídos contínuos,
intermitentes e de impacto (Anexo 1); b) exposição ao calor (Anexo 3); c) trabalho
sob radiações ionizantes (Anexo 5); d) exposição a agentes químicos (Anexo 11); e e)
limites de tolerância para poeiras minerais (Anexo 12);
b) ao estabelecer normas sobre as condições insalubres do trabalho sobre
pressões hiperbáricas (trabalhos sob ar comprimido e trabalhos submersos)
determinadas nas tabelas de descompressão e para recompressão terapêutica e
estabelecer instruções para seu uso e, ainda, as medidas de segurança e restrições
para o exercício das atividades sob estas condições (anexo 6);
c) determinar as atividades e operações insalubres que utilizam agentes
químicos (diversos daqueles dos anexos 11 e 12) como: cádmio e seus compostos,
arsênico, carvão, chumbo, cromo, fósforo, hidrocarbonetos e outros compostos de
carbono, mercúrio, silicatos e estipular os seus respectivos graus de insalubridade
(máximo, médio ou mínimo), bem como definir as substâncias cancerígenas (4-amino
difenil ou p-xenilamina, benzidina, beta-naftamina, 4-nitrodifenil) e proibir o contato
ou exposição, por qualquer via, do trabalhador com o carcinogênico, (Anexo 13) e
estabelecer as medidas de segurança e proibições ao exercício das atividades ou
operações com produtos comprovadamente cancerígenos – o benzeno (Anexo 13-A);
d) definir a relação de atividades insalubres que envolvem agentes biológicos
(contatos com substâncias infecto-contagiosas nos trabalhos em hospitais,
ambulatórios, laboratórios de análise clínica e histopatologia, clínica veterinária,
esgotos, etc.), cujo grau de insalubridade pode ser máximo ou médio (anexo 14);
e) determinar também, que poderão ser consideradas insalubres, conforme
laudo de inspeção ou perícia do local de trabalho (segundo subitem 15.1.4), as
atividades ou operações que exponham os trabalhadores à radiações não ionizantes
(conceituadas como sendo somente as microondas, ultravioletas e laser), ao frio ou à
umidade e à vibrações (Anexos 7, 8, 9 e 10).
Conforme se infere do subitem 15.1.3 da NR-15, as atividades ou operações
que exponham os trabalhadores aos fatores ou aos agentes agressivos indicados nos
itens "b", "c" e "d" relacionados anteriormente são, por sua própria natureza,
insalubres.
É interessante registrar que a caracterização da insalubridade das atividades e
operações com agentes biológicos é determinada pela avaliação qualitativa, ou seja,
basta o simples contato com o agente agressivo para determinar esta situação (Vide
preâmbulo do anexo 14). Já para as atividades em que há incidência dos agentes
agressivos listados no item "a", a avaliação é qualitativa e quantitativa. Nesse caso,
haverá insalubridade somente para os trabalhadores, cuja exposição aos agentes
agressivos ultrapassar os limites de tolerância fixados nas tabelas ínsitas nos anexos 1,
2, 3, 5, 11 e 12 da NR-15. É o que se depreende do dispositivo do item 15.1.5 da NR-
15, que estabelece que tais limites estão definidos segundo a concentração ou
intensidade máxima ou mínima, relacionada com a natureza e o tempo de exposição
ao agente, que não causará dano à saúde do trabalhador, durante a sua vida laboral.
Quanto aos agentes relacionados no item "e", no caso das atividades e
operações que exponham os empregados, sem qualquer proteção, à vibrações
localizadas ou de corpo inteiro, a insalubridade somente será caracterizada a partir de
perícia realizada no local de trabalho, que terá por base os limites de tolerância
definidos pela Organização Internacional para a Normalização (ISO), conforme suas
normas ISO 2.631 e ISO/DIS 5.349 ou suas sucessoras. Já para a caracterização das
atividades sujeitas à radiações não ionizantes, frio ou umidade, como sendo
insalubres, basta o laudo de inspeção no local de trabalho que defina a inexistência de
eliminação da insalubridade (anexos 7, 8, 9 e 10).
Vale lembrar que a insalubridade poderá ser eliminada ou reduzida à
patamares suportáveis, a partir da implementação de medidas de proteção coletiva ou
do uso de equipamentos de proteção individual.
O conhecimento das atividades consideradas insalubres serve para prevenção
dos riscos próprios do meio ambiente laboral agressivo, bem como para poder
compensar o trabalhador, pelo exercício de trabalho em condições de insalubridade,
garantindo-lhe o direito de receber um adicional a sua remuneração, cujos percentuais
são fixados proporcionalmente ao grau de intensidade do agente agressor no seu
ambiente de trabalho. Se o grau é mínimo, médio ou máximo, o empregado faz jus ao
adicional de 10%, 20 ou 40%, respectivamente, sobre o valor do salário mínimo (CLT,
art. 192 c/c item 15.2). E na hipótese, da função do empregado abranger mais de um
nível de agressão, receberá somente o adicional referente ao grau mais elevado (NR-
15, item 15.3). E, naturalmente, cessado o trabalho insalubre, cessa o direito ao
recebimento do adicional de insalubridade.
O contato com esses agentes pode ser: permanente, intermitente, eventual
(ou esporádico). Somente este último não gera direito ao recebimento do adicional de
insalubridade, tendo em vista que o exercício de trabalho em contato com agente
insalubre não é corriqueiro, é imprevisível.
Em virtude dessas considerações, verifica-se que são pressupostos da
legislação voltada para o meio ambiente laboral: a inevitabilidade do trabalho em
condições insalubres para algumas atividades, a possibilidade de eliminá-las ou reduzi-
las por meio de medidas de proteção coletiva ou individual, ou mesmo a
impossibilidade de fazê-lo, o que culmina com alguma medida compensatória para o
trabalhador que se sujeita aos ris cos da atividade insalubre. Em suma, as normas que
definem as causas, efeitos e prevenção da insalubridade são preventivas e
compensatórias.
Ademais, vale ressaltar que somente as atividades insalubres elencadas nos
referidos anexos, geram efeitos jurídicos.
Há tentativas de acompanhar o desenvolvimento tecnológico, por parte do
órgão competente (Ministério do Trabalho e Emprego), mediante alterações dos
quadros de atividades e operações insalubres, para complementar a NR-15.
Entretanto, ainda existem muitas situações, no meio ambiente laboral, arriscadas e
agressivas à saúde dos trabalhadores que não são contempladas pela referida norma
regulamentadora. Se não bastasse, mesmo as normas existentes de caráter
preventivo, eliminatório ou compensatório não são devidamente observadas por todas
as empresas. Ademais, há deficiência de fiscalização tanto por parte dos sindicatos
quanto, dos órgãos públicos competentes. Se esta fosse eficaz, coagiria aos
empreendedores de atividades agressivas a cumprirem suas obrigações e tratar com
mais humanidade e dignidade os seus trabalhadores.
Cumpre examinar, nesse passo, os riscos inerentes ao meio ambiente laboral,
relativos à atividades perigosas ou, potencialmente, produtoras de efeitos perigosos.
Para a CLT, segundo dispositivo do artigo 193, somente serãoconsideradas
atividades ou operações perigosas aquelas determinadas em regulamentos aprovados
pelo Ministério do Trabalho e Emprego, desde que por sua natureza ou métodos de
trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em
condições de risco acentuado.
j) NR-16 – Em cumprimento a esta determinação o Ministério do Trabalho e
Emprego, baixou a Portaria nº 3.214/78 e aprovou a NR-16, que regulamenta e define
quais são as atividades perigosas em seus sete itens e dois anexos. Estes tratam das
atividades e operações perigosa com explosivos (Anexo 1) e com produtos inflamáveis
(Anexo 2).
Vale salientar que embora não esteja regulamentada nesta NR, também as
atividades exercidas por empresas que exploram a energia elétrica são previstas como
perigosas, nos termos da Lei nº 7.369/85. Esta lei também determina o recebimento
pelos empregados deste setor (eletricitários) do adicional de periculosidade.
Outrossim, outra profissão regulamentada, a de técnico em radiologia foi
definida como atividade perigosa pela Lei nº 7.394/85. Após esta lei, o Ministério do
Trabalho e Emprego baixou a Portaria n° 3.393/87, para acrescentar o anexo, que
define como atividades e operações perigosas aquelas relacionadas à radiações
ionizantes ou substâncias radiotivas, incluso o setor de radiologia.
Segundo se infere dos quadros e determinações da NR-16 e do artigo 193 da
CLT, o direito ao recebimento do adicional de periculosidade, pelo empregado das
empresas que exercem as atividades regulamentadas, somente é gerado se aquele
trabalha na área definida como de risco e tenha contato permanente (contínuo ou
intermitente) com o fator ou agente perigoso. Portanto, não recebe o referido adicional
o empregado que fortuitamente, eventualmente, entre na área de risco. E também
deixará de recebê-lo, se parar de exercer a função perigosa e se afastar da área que
ofereça os riscos.
A simples redução dos riscos inerentes ao trabalho por medidas de segurança,
obrigatória às empresas, conforme ordem constitucional (CF/88, art. 7º, inc. XXII),
não desobriga o empregador de pagar o referido adicional, vez que as atividades tidas
como perigosas pela lei ou NR-16, sempre oferecem perigo em potencial.
As normas que tratam das atividades perigosas são de natureza
compensatória, visto que determinam o pagamento de adicional de periculosidade no
percentual de 30%, a ser calculado sobre o salário-base (sem outros acréscimos
resultantes de gratificações, prêmios, etc.) a todo empregado que fique sujeito aos
efeitos da periculosidade, por trabalhar em local cuja área é delimitada como de risco,
independentemente de exercer ou não função em atividades legalmente consideradas
perigosas. (CLT, 193, § 1º)
E na hipótese, que não é rara, do empregado ficar exposto, simultaneamente,
ao perigo e à insalubridade, ser-lhe-á facultado optar entre o recebimento do adicional
de periculosidade ou insalubridade, vez que não lhe é permitido receber ambos ao
mesmo tempo. (CLT, 193, § 2º).
Algumas empresas brasileiras têm dado a merecida importância à Saúde e
Segurança Ocupacional. Não se trata apenas de puro humanismo, mas de estratégia
para obterem condições de concorrer no mercado global, que é muito exigente,
especialmente no que tange à questão ambiental. Portanto, cumprir as normas de
segurança e medicina do trabalho faz parte da essência da vida das empresas, cujas
atividades são voltadas para o comércio exterior. Por essa razão, atualmente, estas,
além de se preocuparem em conseguir o certificado da Norma ISO 9000 (Qualidade
Total) e Norma ISO 14000 (Proteção ao Meio Ambiente), já estão antecipando a
implantação da possível Norma ISO 18000 (Sistemas de Gestão de Segurança e Saúde
no Trabalho), que ainda se encontra em estudo.
Convém mencionar que tais empresas, geralmente, estão em evidência e
sofrem maior fiscalização por parte dos órgãos ambientais, inclusive, das Delegacias
Regionais do Trabalho e Emprego, que exigem a implantação do Plano de Controle
Ambiental (PCA). Ademais, visam também aplacar as pendências judiciais relacionadas
a acidentes do trabalho (processos de criminais por lesões corporais, processos
indenizatórios para reparação por danos materiais e morais, processos previdenciários
regressivos) tendentes a complicar a vida empresarial, visto que ameaçam a
estabilidade moral e econômica das empresas, podendo até mesmo impedir a
viabilidade econômica daquelas de menor porte.
Deduz-se, pelo enorme índice de acidentes laborais ocorridos neste país,
segundo informações obtidas em sala de aula que, provavelmente, muitas empresas
ainda não estão convictas dessa importância financeira, não percebem que é lucrativo
investir em medidas de prevenção dos riscos de infortúnios no meio ambiente do
trabalho. E muito menos estão imbuídas de ética humanista para implementá-las.
Inclusive, sabe-se que algumas empresas procuram regularizar sua documentação
conforme é exigido pelas normas de segurança e medicina do trabalho, mas esta fica
engavetada, apenas para ser apresentada a algum fiscal desatento. Não implantam
nem implementam as medidas preventivas, muitas vezes sob a alegação de
impossibilidade de fazê-lo devido aos altos custos.
7.1 As normas previdenciárias e suas regras para seguridade do trabalhador
acidentado ou sujeito aos riscos inerentes ao meio ambiente agressivo.
Lei nº 8.212/91
Esta lei dispõe sobre os objetivos da Previdência Social e sobre o plano de
custeio. No seu artigo 1º, define que Seguridade Social compreende um conjunto
integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinado a
assegurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência social. E completa
em seu artigo 2º que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros
agravos.
A lei previdenciária impõe no artigo 22, inciso II, a contribuição obrigatória da
empresa para financiar o benefício relativo à aposentadoria especial e dos demais a
serem concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa
decorrente dos riscos ambientais do trabalho. E, também define que a contribuição
deverá ser paga segundo o grau de risco de acidentes do trabalho de cada atividade.
Assim, será de 1% (um por cento), se atividade preponderante for de risco leve; de
2% (dois por cento) se médio e 3% (três por cento) se grave, cujo percentual terá
como base de cálculo o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do
mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos. Ainda quanto ao
financiamento da aposentadoria especial, a lei de plano de custeio (Lei nº 8.212/91) é
complementada pelo parágrafo 6º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que estabelece o
seguinte:
O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes
da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de
1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais,
conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a
concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de
contribuição, respectivamente.
Lei nº 8.213/91
Como já informado é esta lei que conceitua o acidente do trabalho (art. 19),
define as características das doenças ocupacionais consideradas acidente de trabalho
(art. 20) e estabelece outras formas de sinistros equiparados a acidentes do trabalho
(art. 21).
A. Responsabilidades de natureza previdenciária do empregador
A lei nº 8.213/91 também determina nos parágrafos1º, 2º e 3º do artigo 19
algumas das responsabilidades da empresa. O teor desses dispositivos, além de coagir
a empresa a cumprir as normas de segurança e saúde do trabalho, tem por finalidade
resguardar o poder-dever da Previdência Social de multar as empresas violadoras das
referidas normas, bem como de receber a indenização dos valores despendidos com o
beneficiário acidentado (empregado ou avulso que presta serviço à empresa), em
eventual ação regressiva contra a empresa, na hipótese de haver nexo de causalidade
entre o acidente de trabalho e a culpa ou dolo desta (art. 120).
Para tanto, reitera a determinação a respeito da obrigação da empresa de
adotar o uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do
trabalhador e de prestar informações pormenorizadas sobre os riscos operacionais de
sua atividade, inclusive, do manuseio de produtos agressivos à saúde. Estipula, logo a
seguir, a responsabilidade penal para a empresa que deixar de cumprir as normas de
segurança e higiene do trabalho, definindo tal conduta como contravenção penal,
punível com multa.
A Lei 8.213/91 também impõe à empresa a responsabilidade pela
comunicação de acidente do trabalho (CAT) a ser feita à Previdência Social, cujo prazo
é até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência do sinistro e, em caso de morte do
segurado, a comunicação deverá ser imediata à autoridade competente, sob pena de
multa, independente da iniciativa de outrem dar a informação (art. 22, caput c/c § 3º)
Define como dia do acidente oriundo das doenças ocupacionais (doença
profissional ou do trabalho), a data do início da incapacidade laborativa para o
exercício da atividade habitual, ou o dia da segregação compulsória, ou o dia em que
for realizado o diagnóstico, valendo para este efeito o que ocorrer primeiro (art. 23).
Determina, ainda, que seja fornecida cópia fiel da comunicação de acidente do
trabalho (CAT) ao acidentado ou a seus dependentes e ao sindicato da categoria (art.
22, § 1º).
E, na ausência da emissão da CAT pela empresa, faculta ao próprio
acidentado, aos seus dependentes, à entidade sindical competente, ao médico
assistente ou qualquer autoridade pública, formalizar a comunicação sem
determinação do prazo (art. 22, § 2º).
A lei nº 8.213/91 ainda estipula outras obrigações para a empresa
empregadora, vejamos:
a) durante o período de afastamento do empregado segurado, a empresa
arcará com o pagamento do salário integral do empregado durante os primeiros quinze
dias de afastamento da atividade, por motivo de doença ou invalidez (art. 42, § 2º e
art. 60 § 3º);
b) A empresa, para fins da aposentadoria especial, deverá:
- manter laudo técnico das condições ambientais do trabalho (LTCAT)
atualizado, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho
nos termos da legislação trabalhista, que comprove a efetiva exposição de seus
trabalhadores aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho, sob pena de
multa (arts. 58 e 133);
- no referido laudo técnico deverão constar informação sobre a existência ou
não de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do
agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo
estabelecimento respectivo (art. 58, § 2º);
- elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico, abrangendo as atividades
desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de
trabalho, cópia autêntica desse documento. (art. 58, § 4º).
c) A empresa que dispuser de serviço médico, próprio ou em convênio, terá a
seu cargo o exame médico e o abono das faltas correspondentes ao período de
afastamento por motivo de doença, somente devendo encaminhar o segurado à perícia
médica da Previdência Social quando a incapacidade ultrapassar 15 (quinze) dias (art.
60, § 4º).
d) A empresa financiará a aposentadoria especial, a partir da contribuição
prevista no artigo 22 desta lei, acrescida das alíquotas de doze, nove ou seis pontos
percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa
permita a concessão da aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco
anos de contribuição, respectivamente.
e) A empresa que garantir ao segurado licença remunerada ficará obrigada a
pagar-lhe durante o período de auxílio -doença a eventual diferença entre o valor deste
e a importância garantida pela licença, visto que o segurado empregado em gozo de
auxílio-doença será considerado pela empresa como licenciado (art. 63).
f) Impôs à empresa a garantia de estabilidade, ao segurado que sofreu
acidente do trabalho, pelo prazo mínimo de doze meses, após a cessação do auxílio-
doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente (art. 118).
Para dar efetividade ao cumprimento das normas padrão de segurança e
higiene do trabalho indicadas para proteção coletiva e individual do trabalhador,
voltadas a prevenção do meio ambiente laboral (art. 19, § 4º), a Lei nº 8.213/91
incumbe os Ministérios do Trabalho e Emprego da Previdência Social de fiscalizá-las,
bem como encarrega aos sindicatos e entidades representativas de classe pelo
acompanhamento da implementação dessas medidas preventivas. E no seu artigo 120,
a lei supra estabelece que nas hipóteses do descumprimento dessas normas pela
empresa e, naturalmente, de ocorrência de algum sinistro em razão da negligência
desta, à Previdência Social cabe propor ação regressiva contra os responsáveis.
E, por fim, a lei previdenciária realça a independência das indenizações
previdenciárias, da reparabilidade do direito comum ao determinar que "o pagamento,
pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a
responsabilidade civil da empresa ou de outrem" (art. 121).
7.2 Responsabilidade objetiva da Previdência Social e os direitos do
empregado acidentado
É oportuno ratificar que compete à Previdência Social, a responsabilidade
objetiva de indenizar o trabalhador vítima de acidente do trabalho. À Previdência
Social, independenteme nte, da culpa do empregador cabe dar cobertura aos danos
resultantes de acidente do trabalho, visto que se trata de um direito social do
trabalhador, assegurado constitucionalmente.
Assim, o empregado acidentado, ainda que a sua empresa empregadora não
tenha recolhido as contribuições devidas à Previdência Social, dependendo dos efeitos
do acidente que o acometeu, terá direito de receber, sem que lhe seja exigido
qualquer prazo de carência:
a)o auxílio-doença acidentário equivalente a 91% (noventa e um por cento) da
média aritmética simples dos maiores dos salários-de-contribuição correspondentes a
80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo (garantido o salário mínimo) a
partir do 16º (décimo sexto) dia de afastamento da atividade, pelo período necessário
para restabeleça a saúde e volte ao trabalho ou se aposente por invalidez, se seu caso
for irrecuperável (art. 59 e ss);
b)o auxílio-acidente correspondente a 50% (cinqüenta por cento) do salário-
benefício a ser recebido logo após a cessação do auxílio-doença, a título de
indenização, se as lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem
seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho o qual exercia
habitualmente, independente do recebimento de salário ou outro benefício, exceto o de
aposentadoria (art. 86 e ss);
c)aposentadoria por invalidez, correspondente a 100% (cem por cento) do
salário-de-benefício, se for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para oexercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Esta ser-lhe-á paga apenas
enquanto permanecer nesta condição. O direito do segurado acidentado pode iniciar-
se, conforme o caso: a) a partir do décimo sexto dia do afastamento da atividade; b)
desde a data da entrada do requerimento, se entre o afastamento e a entrada do
requerimento decorrerem mais de trinta dias; c) ou a partir da cessação do auxílio-
doença. E ainda, terá o direito de acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento), se
necessitar da assistência permanente de outra pessoa (art. 42 e ss);
d)a assistência para reabilitação profissional e serviço social.
Outrossim, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25
(vinte e cinco) anos, caberá o direito à aposentadoria especial equivalente a 100%
(cem por cento) do salário-de-benefício, desde que cumprida a carência legal (art. 57).
Mas, se o acidente resultar em morte do segurado, seus dependentes
receberão, em conjunto, a pensão por morte correspondente ao valor de 100% (cem
por cento) do salário-de-benefício (art. 74. e ss).
É preciso vencer o dano, inimigo comum, fator de desperdício e de
insegurança, lançando mão de todos os meios preventivos e repressivos sugeridos pela
experiência, sem desmantelar e desencorajar as atividades úteis. Para tal conseguir
não nos devemos encastelar dentro de princípios abstratos, ou de preceitos
envelhecidos para a nossa época, só por amor à lógica dos homens, à vaidade das
concepções, ou à intransigência de moralistas de gabinete.
8. DANOS ORIUNDOS DE ACIDENTES DO TRABALHO E A RESPONSABILIDADE
DE REPARÁ-LOS
8.1 Teorias norteadoras da responsabilidade civil de repara r os danos
provocados à vítima de acidente do trabalho
A importância do equilíbrio e da harmonização social, a partir da reparação dos
danos, torna o tema da responsabilidade civil ou penal um dos mais relevantes para as
ciências humanas, espec ialmente para a jurídica. Portanto, aquele que por sua conduta
ou exercício de atividade produz uma modificação negativa no mundo exterior,
violando direitos de outrem, deverá responder pelos seus atos com fito de satisfazer
não só o lesado, mas principalmente, visando a paz social. Mesmo porque "o anseio de
obrigar o agente, causador do dano, repará-lo inspira-se no mais elementar
sentimento de justiça".
Os imensuráveis e estarrecedores casos de acidentes do trabalho, na sua
grande maioria oriundos do descaso dos empregadores em manter um meio ambiente
laboral salutar e outras vezes pelos riscos próprios da atividade econômica das suas
empresas, afrontam o princípio constitucional da dignidade humana e da integridade
física, psíquica e moral do trabalhador.
O acidente de trabalho é evento danoso tanto para a vítima quanto para seus
dependentes e, em muitos casos, é irreparável, devido à extensão de seus efeitos. Mas
se o direito à vida e à integridade física do trabalhador é violado pela ocorrência de
sinistro relacionado ao meio ambiente laboral, ocasionando-lhe perda parcial ou total,
temporária ou permanente da sua capacidade para trabalhar ou até mesmo a morte,
tal dano deverá ser reparado, ao menos pelo seguro social, independent emente de
culpa do empregado ou empregador, ainda que tal indenização apenas mitigue o mal
sofrido. É imperiosa, portanto, a reparação do dano causado a outrem para, na medida
do possível, desfazer seus efeitos funestos e restituir statu quo ante aquele que sofreu
o prejuízo.
Nos dizeres de Maria Helena Diniz "o interesse em restabelecer o equilíbrio
violado pelo dano é fonte geradora da responsabilidade civil", independentemente de
que a causa da lesão ao bem material ou moral, seja ato ilícito ou lícito. Porque
também as atividades permitidas legalmente, mas que por sua natureza, impliquem
em risco para os direitos de outrem, cria o dever de indenizar, bastando haver nexo de
causalidade entre o dano e atividade de risco desenvolvida, sem levar em conta a
existência de culpa do criador do risco (CCB, art. 927, par. único).
Por sua natureza social, a responsabilidade civil decorrente de acidente do
trabalho funda-se em norma cogente de caráter público elevado à categoria
constitucional.
A nossa Carta Magna assegura ao trabalhador, com base nos princípios da
valorização do trabalho e da dignidade humana, o direito ao meio ambiente laboral
salutar e entre outros direitos o "seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do
empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em
dolo ou culpa" (CF/88. art. 7º, inc. XXVIII). E determina que a Previdência Social
atenderá, em concorrência com o regime de seguro privado, a cobertura dos riscos de
acidente do trabalho, inclusos eventos de doença, invalidez ou morte (CF/88, art. 201,
inc I e § 10).
Mas no que tange à reparação a lesão ao meio ambiente, inclusive, ao meio
ambiente do trabalho, a Constituição, cujo bem maior protegido é a vida, determina
também, em seu parágrafo 3º, artigo 225 que:
As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Na combinação desses dispositivos está delimitada a fundamentação legal e
teórica para as normas infraconstitucionais relativas à reparação acidentária laboral,
seja de cunho civil, administrativa ou penal. E, infere-se das normas mencionadas que
a responsabilidade civil poderá ter natureza contratual ou extracontratual, cujos
pressupostos básicos são: a ocorrência de dano, nexo causal entre o evento danoso e
o dano e a causa oriunda de ato ilícito ou não.
Sendo assim, o tema está compreendido tanto pelas teorias civilistas (teoria
da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva) quanto pelas teorias publicistas (teoria
do risco ou da responsabilidade objetiva).
8.2 Teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva
A ânsia de obter a reparação do dano é tão antiga quanto a origem do
homem. Com fulcro na Lei de Talião, surgiu a justiça privada. Impunha-se a regra
"olho por olho, dente por dente", ou seja, reparava-se o mal pelo mal. Inclusive,
sequer verificava-se a existência ou não de culpa. Inúmeros abusos foram cometidos
em nome da reparação do dano, que de reparação nada tinha, mas caracterizava como
mera vingança e dano em dose dupla (da vítima e do ofensor).
Percebeu-se que a vingança privada era contraproducente. Optou-se, pois,
pela exceção do dispositivo da lei 11ª, tábua VII, ínsita na Lei das Doze Tábuas, cuja
determinação era que "se alguém fere a outrem, que sofra a pena de Talião, salvo se
existiu acordo "
Assim, a composição das partes para reparar o dano, mediante pecúnia,
transferia ao patrimônio do agressor que agira com culpa, o ônus da reparação.
Entrou em vigor, nova lei romana – a Lex Aquilia de damno – que introduziu a
culpa do agente como fundamento da sua obrigação de reparar o dano, mediante
prestação de pena pecuniária.
Surgiu a clássica teoria da culpa, cujo pressuposto básico para a concessão da
reparação impõe que "o respectivo fato gerador seja moralmente imputável ao seu
autor, isto é que se origine de sua vontade determinada ou de sua atividade
consciente". Porque, "pela teoria da responsabilidade subjetiva ou da culpa (...) a
obrigação de reparar o dano decorre do juízo de reprovação ao comportamento do
agente".
Segundo essa teoria, a obrigação de indenizar pressupõe a existência do
elementosubjetivo: dolo (culpa latu sensu), em que o agente tem pleno conhecimento
do mal e intenção de praticá-lo; ou a culpa stricto sensu, advinda da negligência,
imprudência ou imperícia do agressor, que viola o dever de conhecer e agir de modo a
não prejudicar outrem. Além de tal pressuposto, também são requisitos indispensáveis
para configurar a responsabilidade civil subjetiva, a existência do dano contra o direito
tutelado e o nexo causal entre o dano e o fato imputável ao sujeito agressor.
Assim, se alguém pela sua conduta culposa, viola direito de outrem e causa-
lhe prejuízo ou dano, tem o dever de indenizar.
A tradicional teoria da culpa ainda é o principal fundamento da
responsabilidade civil, vez que ninguém será obrigado a indenizar se não houver agido
culposamente, salvo nos casos especificados em lei ou quando sua atividade seja
perigosa e implique em risco para os direitos de outrem (CCB, art. 927, par. único).
Exceto raras exceções, como na hipótese do dispositivo do parágrafo acima
mencionado, que determina a responsabilidade objetiva, o nosso Código Civil acolhe a
responsabilidade civil subjetiva e, em parte, adota o princípio gera l do processo civil,
que incumbe a quem alega, o ônus de provar o seu direito e os fatos que o fundam, ou
seja, cabe ao lesado provar a culpa do agressor.
Contudo, em determinados casos, a teoria da culpa aproxima-se da teoria da
responsabilidade objetiva ao aceitar a culpa presumida.
Deveras, muitas são as hipóteses em que praticamente fica impossível ao
lesado provar a culpa do responsável pela violação do seu direito. Uma delas é o que
acontece nos casos de acidente do trabalho decorrente de culpa ou dolo do
empregador (CF/88, art. 7º, inc. XXVIII). Em tais situações, como regra, se não
houver a inversão do ônus da prova, dificilmente o lesado poderá provar a
culpabilidade do empregador.
Houve uma evidente evolução na teoria da responsabilidade civil nos últimos
tempos, uma busca de socialização dos riscos. A aplicação pura da teoria da culpa,
definitivamente, não se mostrou suficiente para atender às transformações sócio-
econômicas da nossa época. Ratifica essa assertiva os dizeres de Maria Helena Diniz:
A insuficiência da culpa para cobrir todos os prejuízos, por obrigar a
perquirição do elemento subjetivo na ação, e a crescente tecnização dos tempos
modernos, caracterizado pela introdução de máquinas, pela produção de bens em
larga escala e pela circulação de pessoas por meio de veículos automotores,
aumentando assim os perigos à vida e à saúde humana, levaram a uma reformulação
da teoria da responsabilidade civil dentro de um processo de humanização.
O primeiro passo foi admitir a presunção da culpa. Ardorosos defensores da
culpa como fundamento da responsabilidade civil, os irmãos Mazeud, numa concepção
moderna, ante as dificuldades encontradas para efetivar a reparação do dano, criaram
a teoria da culpa sem imputabilidade moral, mediante o artifício da presunção juris et
de jure, que na verdade foi uma transição para aceitar as novas teorias do risco,
defendidas por Saleiles e Josserand, precursores da objetivação da responsabilidade
civil, segu idos no Brasil, dentre outros, por Alvino Lima, Orozimbo Nonato, Aguiar Dias.
Segundo Alvino Lima, para os aguerridos defensores da culpa como princípio
moral basilar da responsabilidade civil, dentre eles Ripert, as teorias de presunção da
culpa, na verdade, são mentiras jurídicas criadas para não dar o verdadeiro nome às
coisas, para acobertar as novas tendências.
Enfim, como assinalou o próprio Ripert, a tendência atual do direito, que a
cada dia se concretiza mais, inclusive no direito positivo brasileiro, manifesta-se no
sentido de substituir a idéia da culpa pela idéia do risco, a responsabilidade subjetiva
pela responsabilidade objetiva, tudo em prol da socialização dos riscos.
Teoria do risco ou da responsabilidade objetiva
A impossibilidade de concretizar reparação dos danos oriundos de acidentes,
especialmente, do trabalho, cujo número cresceu assustadoramente nos últimos
tempos (com alguma redução no quadro do mercado de trabalho formal), determinou
a insuficiência responsabilidade subjetiva. O operário hipossuficiente e vulnerável ou
seus dependentes, sempre se encontraram em irrefragável desvantagem em relação
ao poderio do empregador. Como provar a culpa deste? A lei que por um lado tutelava
o direito à integridade física e a reparação dos danos ocorridos com a violação desse
direito, praticamente, negava o efetivo direito de ação, ao dificultar (quase
impossibilitar) a prova da culpa do empregador. Conceder o direito à reparação do
dano aos lesados, mas negar-lhes, ainda que indiretamente, instrumentos para provar
o direito, equivale à negação do direito.
Surgiu a teoria do risco como fundamento da responsabilidade objetiva, ante a
necessidade de amparar as vítimas de acidentes e tendo em vista os problemas sociais
deles originados, principalmente, para o operário e sua família, cuja sobrevivência
depende do trabalho. Esta teoria vem, portanto, como resposta aos anseios de ordem
sócio -econômica.
Como bem esclarece o árduo defensor da teoria do risco em nosso país, Alvino
Lima, "a necessidade imperiosa de se proteger a vítima, assegurando-lhe a reparação
do dano sofrido, em face da díspar entre as empresas poderosas e as vítimas
desprovidas de recursos, (...) [torna] imprescindível, pois, rebuscar um novo
fundamento à responsabilidade extracontratual, que melhor resolvesse o grave
problema da reparação dos danos, de molde a se evitarem injustiças que a consciência
jurídica e humana repudiavam".
Para Saleiles, o precursor das bases de sustentação para a nova doutrina,
desenvolvida por Josserand e seus seguidores "a teoria objetiva é uma teoria social
que considera o homem como fazendo parte de uma coletividade e que o trata como
atividade em confronto com as individualidades que o cercam".
Segundo Sérgio Cavalieri Filho, a teoria do risco foi embasada sob vários
prismas e podem ser identificadas em diversas modalidades a seguir expostas:
a)Teoria do risco-proveito – funda-se essa teoria na idéia de que aquele
que tira proveito da atividade danosa é responsável pela reparação do dano. Porém,
aplica-se somente aos exploradores de atividades econômicas, e ao lesado impende
provar a existência do proveito.
b)Teoria do risco criado – por essa teoria "aquele que, em razão de sua
atividade ou profissão, cria um perigo, está sujeito à reparação do dano que causar,
salvo prova de haver adotado todas as medidas idôneas de evitá-lo" Dessa elucidação
do Mestre Caio Mário se infere, que prescinde a prova do proveito da atividade.
c)Teoria do risco profissional – esta teoria foi desenvolvida especificamente
para justificar a reparação dos prejuízos advindos de acidentes do trabalho, e sustenta
ser suficiente a lesão, seja em decorrência da atividade ou da profissão do lesado.
d)Teoria do risco excepcional – voltada para responsabilizar exploradores
de atividades de riscos coletivos (exploração de energia nuclear, materiais radioativos,
ect.), que podem lesar até mesmo terceiros alheios a estas atividades.
e)Teoria do risco integral – para esta teoria basta haver o dano para
caracterizar o dever de indenizar. Não admite quaisquer causas excludentes da
responsabilidade (culpa exclusiva da vítima, de terceiros, caso fortuito ou forç a maior).
Cavalieri afirma que, em qualquer das modalidades, a teoria do risco se
resume na seguinte afirmação: "Todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autore
reparado por quem o causou, independentemente de ter ou não agido com culpa ".
Por conseguinte, para assegurar o ressarcimento ao prejudicado, cabe verificar
se ocorreu o evento e dele emanou o dano, não se cogitando da imputabilidade ou
antijuridicidade do fato danoso. É satisfatória a relação de causalidade entre o prejuízo
e aquele que materialmente o causou, isto é, basta o nexo causal entre o dano e o fato
gerador. O agente deve ser responsabilizado pelo simples fato da ocorrência do fato
danoso prejudicial a outrem, relacionado à atividade exercida, visto que aquele
assumiu, ao explorá-la, todos os riscos a ela inerentes.
8.3 Responsabilidade civil: subjetiva ou objetiva e seus elementos
Conforme o fundamento teórico adotado, a responsabilidade civil se
apresentará como: subjetiva ou objetiva.
Maria Helena Diniz afirma que "o dever ressarcitório pela prática de atos
ilícitos decorre da culpa, ou seja, da reprovabilidade ou censurabilidade da conduta do
agente (...) Portanto, o ato ilícito qualifica-se pela culpa. Não havendo culpa, não
haverá, em regra, qualquer responsabilidade". (grifou-se).
A culpa é elemento subjetivo moralmente imputável ao agente, conforme seja
sua conduta reprovável, a partir o juízo de valor feito a respeito de sua capacidade
intelectiva e volitiva (capacidade mental para ter consciência e vontade de praticar o
ato). Daí, a responsabilidade civil sob o fundamento da culpa é conhecida como
responsabilidade subjetiva.
No direito civil brasileiro a norma fundamental da responsabilidade civil está
gravada nos artigos 186 e 187 (parte geral) combinado com o artigo 927, caput,
(parte especial) do Código Civil nos seguintes termos:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,
comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.
Conforme se deduz dos dispositivos acima, especialmente do artigo 186, a
responsabilidade civil, a princípio, está intimament e ligada à existência de um ato
ilícito (que pressupõe a culpa), cujos elementos constitutivos são:
a)a conduta culposa (dolo ou culpa stricto sensu) – violação de dever jurídico
preexistente (contratual ou legal), imputável a alguém (agente ou responsável legal)
que por ato comissivo (intencional) ou omissivo (ausência do cuidado exigível) causou
dano a outrem;
b)o dano – é a lesão ao direito patrimonial ou moral da vítima causado pela
conduta culposa do agente, ressarcível mediante pecúnia; e
c)nexo causal – é a relação de causalidade entre o dano e a conduta do
agente.
Toda regra tem exceção. As exceções existem como forma de equilibrar,
harmonizar situações fáticas e dar respostas aos anseios de justiça e paz social.
A responsabilidade com base na culpa se tornou insuficiente para solucionar
questões complexas em torno de eventos danosos oriundos dos riscos de
determinadas atividades econômicas, especialmente dos eventos sinistros ocorridos no
ambiente laboral.
Como bem esclarece Maria Helena Diniz:
...a crescente tecnização dos tempos modernos, caracterizado pela introdução
de máquinas, pela produção de bens em larga escala e pela circulação de pessoas por
meio de veículos automotores, aumentando assim os perigos à vida e à saúde
humana, levaram a uma reformulação da teoria da responsabilidade civil dentro de um
processo de humanização. Este representa uma objetivação da responsabilidade, sob a
idéia de que todo risco deve ser garantido, visando a proteção jurídica à pessoa
humana, em particular aos trabalhadores e às vítimas de acidentes, contra a
insegurança material, e todo dano deve ter um responsável.
Surge, então, a responsabilidade com fundamento nos riscos da atividade
(responsabilidade objetiva), cujos pressupostos são apenas a existência do prejuízo e a
relação entre este e o evento danoso que o causou (nexo causal).
O nosso atual código civil abre exceção ao instituto da responsabilidade
subjetiva, mediante norma genérica ao determinar no parágrafo único do artigo 927,
que:
Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos
casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo
autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
(Destacou-se)
Logo, o dever de reparar, em determinadas hipóteses, independe da
existência ou não de ato ilícito, de conduta culposa. Basta o dever legal de indenizar ou
que a atividade, por sua natureza, cause riscos aos direitos de outrem, segundo
fundamento da responsabilidade objetiva.
Nos próximos itens, serão expostas as características mais detalhadas dos
elementos constitutivos das duas espécies de responsabilid ade civil – subjetiva ou
objetiva – e sobre a aplicabilidade de ambas na solução dos danos advindos de
acidentes do trabalho.
Reparação das lesões acidentárias laborais e a responsabilidade civil
subjetiva do empregador
A responsabilidade civil subjetiva do empregador, além da previsão
constitucional do artigo 7º, inciso XXVIII, última parte, encontra-se regulada nos
artigos 186 e 187 combinado com o artigo 927, caput , do atual Código Civil. Com
efeito, rezam esses novos comandos que, in verbis:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,
comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.
Art. 927: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, é
obrigado a repará-lo.
Os dois primeiros dispositivos conceituam ato ilícito. Uma norma conceitua o
ato ilícito comissivo ou omissivo, doloso ou culposo (art. 186) e a outra ato ilícito por
abuso de direito (art.187). O comando da cabeça do artigo 927 evidencia que a
espécie de responsabilidade civil adotada é a subjetiva, pois é imprescindível a
existência de ato ilícito que por sua vez é indissociável da idéia de culpa (elemento
constitutivo do ato ilícito).
Ato ilícito se resume, segundo Sérgio Cavalieri, em "ato voluntário e
consciente do ser humano que transgride um dever jurídico".
Maria Helena Diniz ensina que ato ilícito é aquele, "praticado culposamente em
desacordo com a norma jurídica, destinada a proteger interesses alheios. É o que viola
direito subjetivo individual, causando prejuízo a outrem, criando o dever de reparar tal
lesão".
Portanto, o dever de reparar do empregador, segundo a teoria da
responsabilidade subjetiva, pressupõe conduta ilícita (comissiva ou omissiva, dolosa ou
culposa), dele ou de seu preposto, contrário a um dever jurídico, que viole o direito à
segurança, à incolumidade de seus empregados, no ambiente laboral, lhes causando
prejuízos (danos físicos ou psíquicos).
8.5 Pressupostos da responsabilidade civil subjetiva
Deduz-se do item anterior, que são pressupostos básicos da responsabilidade
civil subjetiva: o ato ilícito (conduta dolosa ou culposa); imputabilidade; dano e relação
de causalidade entrea conduta e o dano.
A. Conduta humana (dolosa ou culposa)
A conduta humana exigida para caracterizar o ato ilícito é voluntária e
consciente (aspecto psicológico, subjetivo), se exterioriza (aspecto físico ou objetivo)
em uma ação ou omissão, em desacordo com um dever legal, isto é transgridem a lei
preexistente. A ação ou conduta comissiva viola um dever geral de abstenção
enquanto a conduta omissiva infringe o dever de agir. Ambas produzem conseqüências
jurídicas ante a culpabilidade do autor. A culpa pode ser lato sensu, abrangendo o dolo
(vontade consciente de violar o direito, dirigida à consecução do fim ilícito), ou culpa
stricto sensu (violação de um dever que o agente podia conhecer e acatar, mas por
ausência de cuidado não o fez).
É importante assinalar que tanto o ato ilícito penal como o civil tem o mesmo
fundamento moral: transgressão a uma obrigação jurídica preexistente (definida em
lei) e a conseqüente imputação moral à consciência do agente (porque agiu
deliberadamente com intenção de causar o dano ou porque não teve a cautela exigida
para evitá-lo).
O ilícito penal se configura quando a conduta infringe norma imprescindível à
existência harmoniosa da sociedade, portanto consiste em ofensa à ordem social.
Ocorre ilícito civil quando o ato viola direito subjetivo privado. Porém, o ilícito poderá
ter natureza dúplice – civil e penal, se violação for atentatória de direito do particular e
da sociedade concomitantemente.
Não se pode olvidar que nos casos de acidentes do trabalho, mesmo que não
haja dolo, os resultados advindos da exposição da vida ou da integridade física dos
empregados a perigo (CP, arts. 132, 250, § 2º; 251, § 3º; 252, par. único; 271, par.
único); quase sempre implicam em lesão (CP, art. 129, § 6º) ou morte da vítima (CP,
art. 121, § 3º). Destarte, pode-se afirmar que nessas hipóteses, se for tipificada a
conduta e não houver nenhuma excludente da antijuridicidade, o empregador
responderá penal e civilmente.
Contudo, a responsabilidade civil não está jungida à responsabilidade penal.
Mesmo que ocorra a absolvição do réu por falta de prova de culpabilidade penal, é
possível responsabilizar o empregador civilmente, visto que na esfera cível, basta a
culpa levíssima.
a) Conduta dolosa
Pela conduta dolosa, a ação ou omissão do autor, origina de vontade
consciente e deliberada de violar o direito de outrem e causar-lhe prejuízos.
O dolo se caracteriza quando o agente ao omitir-se ou agir, tem a
representação do fato e a vont ade de causar o resultado. Isto é, o agente tem a
previsão do resultado e consciência da ilicitude de sua conduta e quer o resultado (dolo
determinado) ou assume o risco de produzi-lo (dolo eventual), ficando indiferente se
ocorrerá ou não o resultado danoso.
b) Conduta culposa
O agente que se conduz de modo contrário à conduta esperada do ser humano
prudente e produz resultado indesejado, mas moralmente imputável, tem erro de
conduta ou conduta culposa. É a culpa estrita que se origina de ação ou omissão
voluntária do agente, o qual não previu (porém, deveria prever) e nem quis o
resultado danoso,
Então, segundo o clássico conceito de Planiol, "a culpa é a violação de uma
obrigação preexistente", é a produção involuntária do resultado, por inobservância do
cuidado objetivo (negligência, imprudência ou imperícia) e ausência de previsão
objetiva (possibilidade de antever o resultado).
São, portanto, elementos da culpa:
a) conduta voluntária – vontade de fazer ou não fazer, porém, sem intenção
de causar resultado danoso;
b) previsibilidade objetiva – possibilidade de antevisão do resultado, porque
a imprevisibilidade é causa excludente da culpa (caso fortuito ou força maior);
c) ausência de previsão – o resultado poderia ter sido representado
mentalmente, ter sido previsto segundo capacidade mental do homem comum, mas
não o foi (é a imprevisão do previsível);
d) falta de cuidado objetivo – exterioriza-se pela: 1) imprudência (é a
conduta comissiva em desacordo com a cautela exigida, é a falta involuntária de
observância de medidas de precaução e segurança, de conseqüências previsíveis, que
se faziam necessárias no momento para se evitar um mal ou a infração da lei); 2)
negligência (é conduta omissiva, é a omissão voluntária de diligência ou cuidado,
falta ou demora no prevenir. O agente deixa de fazer algo imposto pela lei) e; 3)
imperícia (é a falta de aptidão, habilidade, ou experiência, ou de previsão, ou de
conhecime nto ou de prática do agente no exercício de sua atividade técnica);
e) resultado involuntário – o agente não quis nem assumiu o risco de
causar resultado danoso;
f) nexo causal – relação de causalidade entre a conduta culposa e o resultado
danoso.
g) Imputabilidade – é o elemento constitutivo da culpa, relativa à
consciência e vontade do agente. A imputabilidade pressupõe ação livre, consciente e
capaz do agente. São excludentes de imputabilidade: a menoridade, a demência,
anuência da vítima, exercício normal de um direito (o manifesto excesso implica em
abuso de direito), legítima defesa e estado de necessidade.
A.1 Classificação da culpa
Segundo disposição didática de Maria Helena Diniz a culpa se desdobra em
diversas modalidades, conforme:
a) a natureza do dever violado – pode ser culpa contratual (violação de
obrigação jurídica preexistente relativa a um contrato) ou culpa extracontratual ou
aquiliana (se o dever violado for estabelecido em preceito genérico de direito, ou seja,
princípio geral de direito que manda respeitar as pessoas e bens).
b) a sua graduação – classifica-se em: grave ou lata (quando o agente atuar
com grosseira falta de cautela; é a conduta injustific ável se comparado ao bom senso
do ser humano normal; se aproxima do dolo); leve (quando a lesão poderia ser
evitada por medidas de cautela ordinária, própria do homem comum) e levíssima
(caracteriza-se pela falta de atenção extraordinária, ou especial habilidade e
conhecimento singular).
c) quanto ao seu conteúdo – existem as espécies: in commitendo (conduta
comissiva, positiva, como imprudência e imperícia); in omittendo (conduta omissiva,
negativa, negligência); in eligendo (oriunda da má escolha do representante ou
preposto); in vigilando (ausência de fiscalização por parte do patrão das coisas e do
exercício de atividade de seus operários); in custodiendo (ausência de cautela em
relação à pessoa, coisa ou animal, que se encontravam sob os cuidados do agente).
d) quanto ao conteúdo de sua apreciação – pode ser: culpa in abstrato (o
agente atua sem a atenção própria do homem normal, em relação aos seus negócios
fazendo uso da inteligência de que foi dotado), culpa in concreto (ausência da
diligência necessária às pessoas em relação as suas próprias coisas, segundo as suas
faculdades, aptidões ou dos seus defeitos psíquicos)
e) culpa concorrente – é hipótese de concorrência de causas. A vítima,
paralelamente à conduta culposa do autor do dano, concorre com atitude, também
culposa (se fosse dolosa excluiria a ilicitude), para a ocorrência do evento sinistro.
Nesses casos a jurisprudência consagra a redução da indenização da vítima.
Sérgio Cavalieri Filho ainda cita mais duas espécies de culpa: a culpa
presumida e a culpa contra a legalidade. Aquela decorre do próprio fato (in re ipsa), é
presumida a partir das "próprias circunstâncias em que se dá o evento", bastando que
o lesado prove o dano e a relação de causalidade entre este e a condutado agente.
Ocorre culpa contra a legalidade quando a conduta é contrária a um dever expresso
em dispositivo legal.
B. Dano
O dano é elemento essencial ou determinante da responsabilidade civil, seja
objet iva ou subjetiva. Sem a ocorrência de prejuízo não há o que reparar. Imputar a
alguém o dever de indenizar sem restar caracterizada a existência do dano (ainda que
presumido), se traduz em ofensa ao princípio geral de direito que veda o
enriquecimento sem causa.
Por conseguinte, se o ato ilícito for de mera conduta, sem resultado (isto é,
sem dano patrimonial ou extrapatrimonial, físico ou psíquico), poderá haver
responsabilidade penal, mas não civil.
Segundo Jorge Bustamante, existem danos justificados e danos
ressarcíveis. Estes são os danos patrimoniais e extrapatrimoniais. Aqueles são os
danos advindos de atos lesivos, que não acarretam o dever de indenizar. O dano pode
ser justificado pela lei, como são as hipóteses de exclusão da ilicitude, legítima defesa,
exercício regular do direito, estado de necessidade próprio ou de terceiro (se o dono da
coisa lesada foi o culpado do perigo). Outrossim, as excludentes de causalidade (caso
fortuito ou força maior, culpa exclusiva da vítima) justificam os danos.
Contudo, há de convir que mesmo os danos justificados não deixam de violar
as esferas patrimonial e/ou moral, apenas não são reparados por causa das
excludentes acima citadas.
Portanto, dano é uma lesão, um prejuízo oriundo de algum evento, que afeta
um bem jurídico de uma pessoa (patrimonial ou moral), que poderá ser reparado ou
não.
B.1 Requisitos dos danos ressarcíveis
O prejuízo ou dano deve ter requisitos próprios para exigir-se a indenização. O
dano que dá ensejo à reparação é aquele que:
a) Implica em diminuição ou destruição de um bem jurídico patrimonial
ou extrapatrimonial da pessoa. Enquanto o primeiro gera prejuízo material econômico,
passível de reparação, o segundo é insuscetível de apreciação pecuniária, por se tratar
de lesão a bem integrante da personalidade humana. Mas, ambos são passíveis de
reparação, pois evidenciam prejuízos reais.
b) Deve ser certo, real e efetivo (salvo nos casos de dano presumido). Não
basta ser eventual, não pode ser hipotético. O dano certo deve ser atual e
determinado ou futuro e determinável (a conseqüência posterior do ato ilícito é o
prolongamento do dano atual – é potencial. Por exemplo: A lesão de uma perna pode
implicar na imediata amputação da mesma e em posterior necessidade de colocação
de prótese).
c) Deve ser comprovada sua existência em face do evento e a repercussão
sobre o bem jurídico da pessoa lesada (nexo causal). Poderá ser direto (neste "há
uma relação imediata entre a causa destacada pelo direito e a perda sofrida pela
pessoa") ou indireto (conhecido como dano reflexo ou por ricochete, pois consiste
"numa conseqüência da perda mediatamente sofrida pelo lesado, representando uma
repercussão ou efeito da causa noutros bens que não diretamente atingidos pelo fato
lesivo").
d) Deve ser subsistente – é aquele que ainda não foi reparado pelo
responsável. Se a vítima ou terceiro reparou o dano, este ainda subsiste em relação ao
seu responsável. O terceiro sub-roga nos direitos do prejudicado.
e) Deve ser pessoal – o autor da ação de indenização deve ser titular do
direito lesado (a vítima ou seus beneficiários, nas hipóteses legais de dano indireto,
conforme dispõe artigo 948 do Código Civil Brasileiro e casos análogos).
Assim, o dano ressarcível é aquele que provoca a diminuição ou destruição do
direito patrimonial ou moral, experimentada pelo lesado, contra a sua vontade; que é
subsistente, atual e determinado ou futuro e determinável e o agente ou responsável
pelo evento danoso não está acobertado por qualquer forma de exclusão de ilicitude ou
causalidade.
B.1.2 Dano patrimonial
O dano patrimonial é a afetação dos bens de uma pessoa, que lhe são
economicamente úteis, o que, por conseguinte, lhe ocasiona perdas materiais.
Para Maria Helena Diniz "o dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que
afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou
deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível
de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável".
A mestra, embasada na lição de Aguiar Dias, aponta como lesões que
constituem danos patrimoniais: "a privação do uso da coisa, os estragos nela
causados, a incapacitação do lesado para o trabalho, a ofensa a sua reputação
quando tiver repercussão na sua vida profissional ou em seus negócios" (grifou-se).
O acidente do trabalho, por conseguinte, além de redundar em dano ao corpo
do operário vitimado e ao seu patrimônio moral (porque o dano à vida, em todas as
suas nuances, é desmedido e pode afetar os sentimentos do lesado), pode atingir,
simultaneamente, a esfera patrimonial da vítima e de seus beneficiários, visto que
dependem economicamente do trabalho executado pelo corpo agredido para viver.
Frise-se, a vida não tem valor econômico em si mesma, é imensurável, mas as
atividades intelectuais, as habilidades técnicas, o próprio corpo representam
irrefutáveis meios de aquisição econômica.
Quanto aos danos patrimoniais advindos de lesões ou morte do trabalhador,
este ou seus dependentes têm direito à indenização dos prejuízos efetivos – de lucros
emergentes – e os prejuízos com base no que, razoavelme nte, o lesado deixou de
ganhar – lucros cessantes. (CCB, arts. 402 e 403 c/c 948, 949 e 950).
Desta forma, nos termos do artigo 949 do Código Civil, se do acidente laboral
resultar lesões corporais – ofensa à integridade corporal e à saúde da vítima – que
diminua ou incapacite o exercício do trabalho, sem deixar seqüelas, o empregador
somente será responsabilizado pela indenização das despesas do tratamento e dos
lucros cessantes até ao fim da convalescença do lesado, salvo se este provar que
sofrera algum outro prejuízo, como o dano moral, por exemplo.
Todavia, se do acidente emanar defeito ou diminuição da capacidade ou
incapacidade total pelo qual o empregado não possa exercer a sua profissão ou tenha
diminuído o valor do seu trabalho, a indenização abrangerá uma pensão
correspondente à importância do trabalho, no todo ou em parte (dependendo do grau
de depreciação sofrida), além de todas despesas do tratamento físico e psíquico
(valores inerentes às despesas médicas, de enfermagem, medicamentos, exames,
próteses, etc.) e lucros cessantes até o fim da convalescença (CCB, art. 950). A
indenização relativa à pensão a ser arbitrada judicialmente, poderá ser exigida de uma
só vez, se assim o prejudicado preferir (CCB, art. 950, par. únic o).
Vale ressaltar que quando a deformidade física oriunda do acidente for
puramente estética, o que a priori enseja apenas danos morais, poderá também
ocasionar danos patrimoniais, pois poderá repercutir nas possibilidades econômicas da
vítima (quando esta tiver suas chances de trabalho reduzidas ou mesmo
impossibilitada). Um exemplo clássico, é o caso da modelo publicitária, cuja profissão
está intimamente ligada à beleza do corpo. Também outros profissionais, lesados
esteticamente, que dependem da aparência física para exercer o trabalho, deverão ser
ressarcidos com fulcro no dano patrimonial, além do dano moral.
Deve-se evidenciar que as lesões corporais ou à saúde advindas do meio
ambiente de trabalho inadequado não são apenas as físicas, podendo ser também de
cunho psíquico (traumas, fobias, psicoses, etc.).Corrobora essa posição, Bento de Faria em seu comentário ao artigo 129 do
Código Penal o qual dispõe sobre lesões corporais, ao asseverar que "o dano ao corpo
ocorre quando a lesão determina qualquer prejuízo à integridade do conjunto orgânico
da pessoa. Dano à saúde é a desordem causada às atividades psíquicas ou ao
funcionamento regular do organismo".
Dessa forma, as doenças psíquicas ou neurológicas se relacionadas ao
trabalho, equiparam-se a acidentes do trabalho e podem atingir tanto os bens
patrimoniais quanto os morais. Portanto, deverão ser indenizadas. Por exemplo, se o
trabalhador devido às agressões físicas ou psíquicas (atividades de risco, extenuantes,
etc.) sofridas no ambiente laboral, desenvolve alguma fobia, ou algum outro distúrbio
mental, que o incapacita, parcial ou totalmente, para o exercício de sua profissão ou
de qualquer outro trabalho, deverá ser indenizado.
Se o acidente do trabalho ceifou a vida da vítima, presume-se que houve
prejuízo de cunho moral para seus familiares (que normalmente, sentem a perda do
ente querido), visto que os sentimentos afetivos são bens de valor inestimável. Porém,
para os dependentes, aquela vida humana igualmente tem valor econômico, uma vez
que era fonte de possibilidades econômicas. O dano, sob este prisma é patrimonial.
Por essa razão, o legislador definiu mais um caso de dano indireto a ser
indenizado, ao dispor no artigo 948 do atual Código Civil que:
No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o
luto da família;
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-
se em conta a duração provável da vida da vítima.
Em síntese, o prejuízo ao patrimônio decorre da comparação entre o estado
patrimonial de alguém antes da ocorrência do ilícito e depois da sua prática. E, a
reparação material da vítima deverá se mostrar capaz de restituir-lhe ao status quo
ante, da forma mais adequada possível.
B.1.3 Dano extrapatrimonial
O dano moral, em sua acepção ampla, é a lesão de interesses não
patrimoniais do ofendido. É ofensa aos direitos personalíssimos: os sentimentos
afetivos, a própria imagem, a intimidade e o decoro, o bom nome, a privacidade, a
integridade física e psíquica, a honra, a vida, a dignidade da pessoa humana, a
liberdade, a capacidade, e outros mais cuja ofensa causem angústia, aflição, dor,
aviltamento, vexame à vítima.
A reparação pecuniária dessa espécie de dano, por serem esses bens da vida
inestimáveis, é mais uma mitigação do sofrimento, uma satisfação, do que uma
indenização propriamente dita.
Como bem afirma Maria Helena Diniz, não se dá preço à dor, aos
sentimentos... Razão porque "a reparação pecuniária teria, no dano moral, uma função
satisfatória ou compensatória".
Exatamente por essa espécie de dano não se sujeitar à apreciação pecuniária
e estar intimamente ligado à ética, muitos doutrinadores refutavam sua reparabilidade.
Porém, tal espécie de dano sempre foi indenizável, pois no sistema jurídico
brasileiro além das leis esparsas, o Código Civil de Beviláqua (Lei nº 3.071/16), já
previa em seu artigo 159, 1.537, 1.538, genericamente, a reparação do dano moral e,
especificamente, o dano contra a honra nos dispositivos dos artigos 1.547, 1.548,
1.550.
A Constituição Federal de 1988 pôs fim à interminável discussão sobre o
cabimento ou não da reparação do dano moral. Nossa Carta Magna determinou, de
forma explícita, a reparabilidade do dano moral e, inclusive, permitiu a cumulação
desta com a indenização do dano patrimonial (CF/88, art. 5º, V e X).
E, agora, o novo Código Civil, em seu artigo 186 (correspondente ao artigo
159 do Código de 1916), estipulou, explicitamente, a reparação do dano moral, com a
seguinte disposição:
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.
Enfim, à luz do disposto nos artigos 1º, III, 4º, II, e 5º, V e X do nosso Texto
Maior, o "direito mais fundamental do ser humano, que é o respeito a seus
sentimentos mais nobres, cresce e toma a dimensão esperada e necessária".
As relações de trabalho, por sua própria natureza (devido à desigualdade entre
os pólos da relação: a supremacia diretiva e econômica do empregador e a
hipossuficiência e vulnerabilidade do empregado) é campo fértil para acontecimentos
ofensivos à personalidade humana e, via de conseqüência, é onde se propagam os
danos morais – fonte de intranqüilidade social.
A vida humana, por sua natureza ética, é bem de natureza não patrimonial. É
um direito da personalidade amparada como bem maior pela ordem jurídica, vez que a
existência humana é essencial às demais categorias de direito. Portanto, qualquer
ofensa aos direitos a ela inerentes, como à incolumidade física e psíquica, à saúde,
implica em ofensa moral direta, por ser imensurável.
Dessa forma, os eventos sinistros ao meio ambiente de trabalho, que causam
dano à integridade física e à saúde dos operários, afetam, conforme o que
ordinariamente acontece, a esfera moral, do lesado. É causa de dano moral direto.
Embora, como já afirmamos anteriormente, também possa ensejar dano material
reflexo. Daí, resultar em cumulação de reparabilidade por dano moral direto e dano
patrimonial indireto.
Assim, com base no artigo 186 combinado com os artigos 948, 949 e 950 do
Código Civil, todos centrados na citada norma constitucional (CF/88, art. 5º, inc. V e
X), a vítima de acidente de trabalho poderá pleitear, cumulativamente, a indenização
por danos patrimoniais e morais.
É presumível o prejuízo resultante da dor imputada à pessoa da vítima que
sofreu aleijão e redução ou incapacidade para realizar seu ofício. Essa presunção se
alicerça nas condições psíquicas do ser humano comum em relação às conseqüências
do dano corporal, pois, comumente, uma lesão corporal ofende o espírito do lesado,
seus sentimentos, provocando-lhe tristeza, mágoa ou atribulações na esfera interna
pertinente à sua sensibilidade.
Observa-se, pelas pesquisas feitas sobre as decisões dos nossos tribunais, que
há uma tendência em acatar a presunção do dano moral. Em regra, basta que o autor
prove a existência do dano material, o nexo de causalidade imputável ao agente ou
responsável pelo evento danoso para imputar-lhe também a obrigação de ressarcir o
dano moral. Impende a este o difícil ou quase impossível ônus de provar a inexistência
de ofensa aos sentimentos do lesado ou outra excludente de sua responsabilidade.
Mas, se o dano à incolumidade física não acarretar seqüelas físicas ou
neurológicas, o dano moral deverá ser provado, segundo se infere da última parte do
artigo 949 do Código Civil.
Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o
ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da
convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver
sofrido.
Nada impede ao lesado de pleitear a reparação por dano moral (a não ser sua
própria convicção ética), visto que a incolumidade física é parte integrante do direito à
personalidade, cuja natureza é extrapatrimonial.
Se o acidente do trabalho resultar em morte da vítima, os ofendidos serão
sempre indiretos (os beneficiários). Porém, os danos sofridos serão próprios (iure
hereditatis) e por isso diretos. Segundo Bustamante, trata-se do prejuízo de afeto
(pretium affectionis), provocado pela morte da pessoa querida.
É sabido que a morte causa uma diminuição no patrimônio do(s)
dependente(s) da vítima, além dos gastos com tratamento médico, se houver, e
funeral. Há a frustração da possibilidade de continuar recebendo os alimentos por um
futuro determinável e tudo mais que o de cujus poderia ter adquirido pelo seu trabalho
durante o período estimativo de sobrevida que teria. Conseqüentemente, enseja
indenização por dano patrimonial, nos termos do artigo 948 do Código Civil.
Outrossim, é inquestionável que o homicídio é um dano à vida, e
ordinariamente, viola o direito personalíssimo de seus entes queridos, aflige-os no
âmago de seus espíritos. Por conseguinte, dá azo ao ressarcimento por dano moral,
sendo prescindível a sua prova por parte do autor da ação indenizatória, pois esta é
presumida, conforme tem admitido a jurisprudência pátria. Ocorre a inversão do ônus
da prova, devendo o agente comprovar alguma causa excludente da sua
responsabilidade ou mesmo a ausência do direito do autor, por falta de interesse de
agir.
Necessário registrar que, excepcionalmente, os parentes da vítima não sofrem
com a sua perda. Embora seja comum o amor familiar, há casos em que os pais ou
filhos da vítima nunca conviveram com a mesma, nem nutriram algum sentimento por
ela, ou em algumas situações lhe têm, até mesmo, rancor e ódio. Conseqüentemente,
nestes casos, não há que se falar em dor, nem em prejuízo de afeto, muito menos em
dano moral.
Evidenciou-se que, na maioria das hipóteses de danos procedentes de
acidente de trabalho, raramente verifica-se o dano moral puro (aquele que se esgota
na lesão à personalidade, como é, por exemplo, o caso de injúria, que não extrapola a
esfera íntima da pessoa ofendida para lesar o seu patrimônio).
Entretanto, é possível, embora a probabilidade seja mínima, cogitar ao menos
um caso de dano moral puro, advindo de acidente do trabalho. É o dano puramente
estético, sem repercussão patrimonial (considerando-se a inexistência de gastos com
assistência médica ou que estes sejam ínfimos, o que é difícil ocorrer). Nesta hipótese,
seriam as cicatrizes ou mutilações que não incapacitam ou reduzem a capacidade para
o trabalho, mas aflige o espírito da vítima e é capaz de provocar compreensível
diminuição da sua auto-estima. Portanto, verific ar-se-ia apenas um prejuízo de
sofrimento psíquico, que constitui modalidade de dano moral puro ressarcível.
Mas, não se pode olvidar que a lesão puramente estética, além de acarretar
complicações psicológicas e íntimas de convivência com o ale ijão, extrai da vítima as
chances de ascensão profissional e até mesmo pessoal, em face da sua baixa auto-
estima e, geralmente, da conhecida repulsa preconceituosa do meio social em relação
às pessoas que apresentem alguma deformidade.
Conclui-se que, de ordinário, o acidente de trabalho provocará,
cumulativamente, dano material e moral, o que impõe ao agente ou seu responsável o
dever de indenizar ambos, uma vez comprovada a culpa (subjetiva ou objetiva) pelo
sinistro, o dano e o nexo causal entre o dano e o evento danoso.
C. Nexo de causalidade
A relação de causalidade entre o dano e a ação ou omissão que o produziu é
também elemento essencial para obrigar o agente ou responsável pelo dano a repará -
lo, seja fundado na culpa objetiva ou subjetiva. Porque é somente mediante a
existência de nexo causal entre o resultado danoso e a conduta ilícita, que tornará
possível concluir quem foi o causador do prejuízo e quem deverá repará-lo ou se o
lesado deverá suportá-lo sozinho.
Como bem afirma Sérgio Cavalieri Filho, "só há dever de indenizar onde
houver dano. Ninguém, entretanto, pode responder por um dano a que não tenha
dado causa". E conceitua, logo a seguir, o nexo causal como elemento "decorrente das
leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o
resultado".
Maria Helena Diniz esclarece que nexo de causalidade é:
O vínculo entre o prejuízo e a ação (...), de modo que o fato lesivo deverá ser
oriundo da ação, diretamente ou como sua conseqüência previsível. Tal nexo
representa, portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação que o
produziu, de tal sorte aqui esta é considerada como sua causa. Todavia, não será
necessário que o dano resulte apenas imediatamente do fato que o produziu. Bastará
que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido. Este
poderá não ser a causa imediata, mas, se for condição para a produção do dano, o
agente responderá pela conseqüência.
Conforme esse ensinamento da ilustre mestra, adota-se a teoria da
equivalência das causas ou conditio sine qua non para precisar se houve ou não
relação de causalidade entre o dano e a conduta ilícita.
Pela teoria enunciada, todos os elementos que não puderem ser excluídos da
linha de desdobramento causal são relevantes antecedentes causais do resultado.
Utiliza-se do procedimento hipotético de eliminação de Thyrén. Para compreender esse
procedimento, Damásio Evangelista de Jesus ensina que:
O importante é fixar que excluindo-se determinado acontecimento o resultado
não teria ocorrido "como ocorreu": a conduta é causa quando, suprimida mentalmente,
o evento in concreto não teria ocorrido no momento em que ocorreu.
É interessante salientar que, não raro, as causas de um dano são múltiplas, o
que dificulta a definição do agente responsável pela sua reparação. Pode haver causas
concorrentes provenientes da vítima e do agente. Também existem as concausas:
preexistentes, concomitantes ou supervenientes ao evento danoso, que podem ser
absoluta ou relativamente independentes em relação à conduta do agente.
Nas hipóteses da existência de concausas, pela teoria equivalência dos
antecedentes causais, as causas absolutamente independentes da conduta do sujeito
apontado como responsável pelo evento danoso excluirão o nexo causal entre a
conduta deste e o dano. porque "se a causa, preexistente, concomitante ou
superveniente, produz por si mesma o resultado, não se ligando de forma alguma com
a conduta, em relação ao evento ela é uma não-causa", uma vez que não se encontra
na "linha de desdobramento físico" do comportamento do agente.
Também a causa superveniente relativamente independente, entendida como
aquela que produz o resultado por si só, mas em face da conduta anterior, exclui a
causalidade entre esta e o dano posterior.
Um exemplo clássico dessa excludente de causalidade é o episódio do
trabalhador que foi obrigado a usar uma escada em más condições, razão porque caiu
e quebrou a perna. Internou-se no hospital para os procedimentos necessários ao
tratamento médico e morreu vítima de um incêndio em seu quarto. A interdependência
das causas existe porque se o operário não tivesse quebrado a perna não teria sido
vítima do incêndio. Nesse caso, se adotada a teoria conditio sine qua non, o
empregador responde apenas pela prática dos atos anteriores, mas não quer dizer que
não tenha dado causa ao resultado morte.
Caso contrário, se é a conduta do empregador, causa superveniente
relativamente independente, ele ou o seguro social responderá pela indenização,
conforme o evento ocorrido. É o que se depreende da lei acidentária (Lei nº 8.213/91
art. 20, inc. II), cuja norma estabelece que se causas posteriores, relacionadas às
condições inadequadas do meio ambiente laboral, desencadeiam ou agravam uma
doença pré-existente, ainda que tais causas sejam relativamente independentes, elas
têm o condão de impor à Previdência Social a obrigaçãode indenizar a vítima, e se a
conduta do agente (preposto ou empregador) foi culposa este deverá reembolsar o
Seguro Social.
Já as causas preexistentes e concomitantes relativamente independentes não
excluem o resultado, segundo informa Damásio.
Sérgio Cavalieri Filho assegura, no entanto, que os melhores doutrinadores,
dentre eles o reverenciado civilista Aguiar Dias – "papa em responsabilidade civil",
sustentam que a teoria da equivalência dos antecedentes elaborada por Von Buri,
embasado nas idéias de Stuart Mill, tem ampla aplicação no Direito Penal de muitos
países, inclusive no Brasil, mas na órbita do Direito Civil, a teoria acolhida por nosso
sistema civilista é a teoria da causalidade adequada de autoria de Von Kries. E, diz
também, que embora nosso Código Civil não adote, expressamente, nenhuma delas,
faz uma referência à teoria da causa adequada (CCB, art. 403), ao determinar que "as
perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela
direto e imediato", ou seja, somente a causa mais apropriada, mais direta e imediata
é relevante para imputar o causador do dano. (Grifou-se)
Aguiar Dias, citado por Cavalieri Filho, enfatiza sua defesa da aplicabilidade da
teoria da causa adequada, para melhor solucionar as questões de responsabilidade civil
nos seguintes termos:
Consideramos em culpa quem teve não a last chance, mas a melhor
oportunidade, e não a utilizou. Isso é exatamente uma consagração da causalidade
adequada, porque, se alguém tem a melhor oportunidade de evitar o evento e não a
aproveita, torna o fato do outro protagonista irrelevante para a sua produção (...)".
"Em lugar de se apurar quem teve a última oportunidade (como sustenta a teoria
norte-americana – last clear chance), o que se deve verificar é quem teve a melhor ou
mais eficiente, isto é, que estava em melhores condições de evitar o dano; de quem foi
o ato que decisivamente influiu para o dano.
Por esta teoria, somente o fato, a condição mais adequada, mais idônea para
determinar o evento danoso é a causa deste.
Existem muitas teorias visando dar a solução mais apropriada para definição
da causa ou causas do dano na busca de sua justa reparação. Mas, de acordo com as
doutrinas estudadas para a execução deste trabalho, as duas teorias citadas são as
mais importantes.
Percebe-se que Sérgio Cavalieri Filho é tendente a se posicionar mais
favoravelmente à aplicabilidade da teoria da causalidade adequada, porém, ele afirma
com sensatez, pela sua experiência na magistratura, que:
...forçoso é reconhecer que o problema da causalidade não encontra solução
numa fórmula simples e unitária, válida para todos os casos. (...) E assim é porque
esta ou aquela teoria fornece apenas um rumo a seguir, posto que a solução do caso
concreto sempre exige do julgador alta dose de bom senso prático e da justa relação
das coisas..."
Outro ponto que não poderia deixar de ser abordado neste trabalho refere-se
à causalidade da omissão, tendo em vista que o maior número dos acidentes do
trabalho é proveniente das omissões dos empregadores.
O nexo causal é analisado segundo as leis naturais e, normalmente, diz
respeito aos elementos objetivos, porém, quando se trata de omissão esta não pode
ser analisada apenas sob a ótica física ou natural, por ser uma ausência de
comportamento. Daí o jargão: "do nada, nada surge". Para elucidar esse
entendimento, mais uma vez, transcreve-se a sucinta e clara explicação de Damásio:
....a estrutura da conduta é essencialmente normativa, não naturalística. A
causalidade não é formulada em face de uma relação entre a omissão e o resultado,
mas entre este e a conduta que o sujeito estava juridicamente obrigado a realizar e
omitiu. Ele responde pelo resultado não porque causou com a omissão, mas porque
não o impediu realizando a conduta a que estava obrigado.
Ante o exposto, chega-se a duas conclusões: 1) se o empregador cumpre com
desvelo seu dever jurídico de zelar pelo meio ambiente laboral, torna efetivas as
normas de higiene e segurança do trabalho, provando que não houve de sua parte, a
mais leve culpa, não pode ser acusado de omissão e, portanto, não poderá ser
obrigado a indenizar, se eventualmente, houver um acidente do trabalho; 2) se não
houver regra geral ou específica que determine "um dever jurídico de agir, a omissão
não terá relevância causal e, conseqüentemente, nem jurídica".
Ressalvam-se as hipóteses, em que, eventualmente, os jurisconsultos acolham
a responsabilidade fundada na teoria do risco da atividade econômica, ao considerar a
natureza perigosa do empreendimento. Neste caso, o nexo causal liga o prejuízo ao
evento danoso, cuja culpa do empreendedor é presumível, uma vez que este assume
os eventuais riscos de sua atividade. Inclusive, assume a possível a ocorrência de
sinistros, pois tem ou deveria ter consciência de que mesmo sendo tomadas as
medidas obrigatórias de segurança e higiene do trabalho, não está completamente
livre dos acidentes de trabalho, dado o grau de perigo da atividade exercida. (CLT, art.
2º c/c CCB, art. 927, par. único, última parte).
Dessa forma, é conveniente aos empresários que se ocupam de atividades
econômicas lícitas, porém, perigosas, a contratação de seguro privado complementar
ao seguro social, vez que assumem os riscos da atividade. Ademais, enfatiza-se, nos
casos de responsabilidade subjetiva, basta que haja culpa levíssima do empregador
para obrigá-lo a reparar o dano.
Enfim, tanto o nexo causal como o dano são pressupostos indispensáveis para
imputar ao agente ou responsável, a obrigatoriedade de indenizar o lesado, seja com
fulcro na culpa objetiva ou subjetiva. E por essa razão, pelas obras dos doutrinadores e
jurisprudências pesquisadas, verifica-se que, ao autor da ação indenizatória impende
provar pelo menos esses dois elementos.
Já no que tange a comprovação da culpa, poderá haver a inversão do ônus da
prova, se a culpa for in vigilando ou presumida, segundo a teoria da responsabilidade
subjetiva. E pela responsabilidade objetiva, a culpabilidade é indiferente, basta que o
lesado comprove o dano e o nexo causal.
Presunção de culpa do empregador e a inversão do ônus da prova – valioso
instrumento de efetivação da eqüidade e justiça processual
Segundo Alvino Lima a culpa presumida é o artifício da presunção juris et de
jure. Tratam de "mentiras jurídicas" sustentadas pelos defensores da culpa como
fundamento para responsabilidade civil (Irmãos Mazeud, De Page, Pirson, Harven e
outros). Ante a insuficiência da teoria pura da culpa para solucionar, com justiça,
algumas questões complexas oriundas de eventos danosos, estes doutrinadores
sustentam a culpa sem imputabilidade moral, chamada culpa objetiva, ou a culpa legal
("criada pelo legislador, por necessidades de ordem econômica ou social"). Qualquer
dessas espécies de presunção de culpa (legal ou objetiva) pressupõe a inversão do
ônus da prova, em que o agente ou responsável pelo evento danoso só se exime de
reparar o prejuízo se provar alguma das excludentes de responsabilidade: culpa
exclusiva da vítima, culpa de terceiro, caso fortuito ou força maior.
Uma vez consagrada, em nosso direito pátrio, a culpa subjetiva do
empregador nos casos de acidentes do trabalho, muitas foram e ainda continuam
sendo as injustiças cometidas pelas decisões judiciais, que tratam das ações
reparatórias civis referentes aos prejuízos originados por eventos sinistros no ambiente
laboral, ante a ausência de provas nos autos processuais.
Ora, é conhecida a hipossuficiência e vulnerabilidade dos operáriosfrente o
poderio sócio-econômico dos seus empregadores. Tanto é que um dos princípios que
orientam o direito do trabalho é o princípio protetor, que visa igualar juridicamente,
empregadores e trabalhadores.
A bem da verdade, ignorando esse princípio, a norma processual trabalhista
segue a regra geral do processo, determinando que a prova das alegações incumbe à
parte que as fizer (CLT, art. 818).
Mas convém salientar que para toda regra há exceções, com fito de dar o
equilíbrio social aspirado por muitas consciências ávidas de justiça. Razão porque em
hipóteses análogas de hipossuficiência e vulnerabilidade, como é o caso do
consumidor, já se encontra positivada a inversão do ônus da prova, conforme está
explícito no inciso VIII, do artigo 6º do código consumerista.
São direitos básicos do consumidor:
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão
do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do Juiz, for
verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras
ordinárias de experiências;
Tal regra pode e deve servir como base para interp retação analógica com a
finalidade de sustentar a inversão do ônus da prova, em hipóteses de acidente do
trabalho, visto que os empregados, sequer, têm acesso às documentações que
comprovem a efetivação das medidas de segurança e medicina do trabalho e,
geralmente, não têm condições financeiras para pagar a perícia técnica exigida nesses
casos.
Na realidade, no dizer sempre preciso de Sérgio Cavalieri, "a prova da culpa,
em muitos casos, é verdadeiramente diabólica, erigindo-se em barreira intransponível
para o lesado".
Observa-se, que alguns doutrinadores e jurisconsultos, com o escopo de
solucionar eqüitativamente, as ações indenizatórias civis a cargo do empregador,
utilizam-se do artifício da culpa presumida. Sustenta-se a tese vestuta, mas justa, de
que se o empregador tem o dever contratual-legal de velar pela segurança, higidez e
incolumidade de seus trabalhadores, de zelar pelo meio ambiente laboral, mediante a
implementação das normas de segurança e medicina do trabalho, de documentar
esses procedimentos, a ele cabe comprovar que cumpriu as determinações legais.
Assim, na ocorrência de acidente do trabalho, presume-se a culpa do
empregador, sobretudo se a atividade empreendida por ele é de natureza perigosa,
isto é, oferece riscos para incolumidade física e psíquica de seus trabalhadores.
Inverte-se, pois, o ônus da prova. O empregador é responsável a menos que comprove
que tomou realmente todas as medidas de segurança necessárias ou a existência de
uma causa excludente da responsabilidade: caso fortuito, força maior ou culpa
exclusiva da vítima ou de terceiro.
Ao autor da ação basta provar o dano acidentário e o nexo causal.
Igualmente, há decisões, que argumentam ser a responsabilidade civil
presumida, baseada na culpa in vigilando, pois, o empregador tem o dever de vigiar,
fiscalizar as coisas (maquinários, produtos, etc.) e as atitudes de seus empregados.
Então, aquele será responsável, salvo se provar que cumpriu o dever de vigilância ou
outra excludente de sua responsabilidade.
Vale lembrar que, ao deixar o empregador de cumprir as determinações legais
ou regulamentares do sistema de segurança e saúde do trabalho, este foi negligente.
E, se dessa negligência decorreu o acidente (nexo causal), incorre o empregador, só
por este fato, em culpa, conhecida como culpa contra a legalidade.
Causas excludentes da responsabilidade subjetiva por culpa presumida
O empregador exime-se da responsabilidade civil por culpa presumida, se
comprovar a interrupção da relação de causalidade quando:
a) Houver culpa grave e exclusiva da vítima – a guisa de exemplo: 1) a
própria vitima provoca o acidente intencionalmente (presença de dolo); 2) a vítima
trabalhava em ambiente adequado, em conformidade com as exigências legais, sob
condições comuns, sem causas extenuantes das forças físicas e psíquicas, mas se
acidentou, porque mesmo tendo sido advertida, desacatou às orientações e exigências
de cautela dadas pelo empregador ou preposto (presença de descaso intencional ou de
culpa consciente).
b) Força maior – É um acontecimento previsível ou não, mas inevitável e
estranho à vontade das partes, proveniente de eventos da natureza: como um raio,
uma tempestade, etc.
c) Caso fortuito – É imprevisível e inevitável, proveniente de ato humano, de
terceiro alheio ao ambiente laboral, que não tenha sequer ligação indireta com o
empregador. Portanto, é causa estranha à atividade e vontade deste. Por exemplo: 1)
o descarrilamento de um trem, nas imediações da fábrica, provoca uma explosão,
sinistro que deu causa à morte do empregado; 2) Falha da Administração Pública, pela
ausência de serviços de limpeza dos bueiros e galerias de águas pluviais, causa da
enchente que vitimou o empregado.
Responsabilidade civil objetiva para reparação de acidentes do trabalho
A infortunística, matéria legal que trata dos riscos das atividades econômicas,
especialmente dos riscos de acidentes do trabalho e doenças profissionais, tem por
fundamento a teoria do risco. Por essa razão as leis acidentárias do sistema jurídico de
vários países, inclusive no Brasil, para dar respaldo aos anseios dos cidadãos ávidos
por justiça, consagraram a aplicação da responsabilidade objetiva para a reparação
dos danos às vítimas de infortúnios relacionados ao meio ambiente do trabalho.
Vale ressaltar que em nosso país, o dever da Previdência Social de indenizar
por acidente do trabalho tem fulcro na teoria do risco integral. Basta o obreiro ou seus
dependentes provar a relação de emprego e que o dano foi decorrente de uma
situação relacionada ao seu trabalho. Não afastam seus direitos as tradicionais causas
excludentes ou atenuantes da responsabilidade: culpa exclusiva da vítima, força maior,
caso fortuito ou fato de terceiro.
Assim, como já está previsto no sistema jurídico pátrio, a responsabilidade
para indenizar sem culpa, advém de determinação legal. Várias legislações (Decreto
Legislativo nº 3.724/19, Decreto nº 24.637/34, Decreto nº 7.036/44, Decreto-lei nº
293/91, Lei nº 5.316/67, Lei nº 6.367/76) trataram da infortunística. Hoje a lei
acidentária (Lei nº 8.213/91), que é obrigatória e impositiva, estipula em dois prismas
a responsabilidade objetiva para assegurar a relaç ão jurídica do seguro social e o
direito de reparação da vitima de acidente. Por um lado, impõe ao empregador
responsabilidade objetiva de natureza previdenciária – o ônus de arcar com a
manutenção do seguro coletivo para reparação dos danos decorrentes de acidente do
trabalho, haja ou não ocorrência de sinistros relativos ao seu empreendimento, além
obrigá-lo a arcar com a responsabilidade de natureza trabalhista de pagar os primeiros
quinze dias de afastamento do empregado e de garantir-lhe a estabilidade acidentária
de um ano, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de
percepção de auxílio-acidente, conforme previsão nos artigos 29 e 118,
respectivamente, da Lei 8.213/91. Por outro lado, impõe à Previdência Social, a
responsabilidade objetiva de dar cobertura à vítima que provar sua relação de
emprego e o nexo causal entre o acidente e a atividade profissional exercida,
indenizando-a, independente desta ter recebido as parcelas do seguro do empregador,
cabendo-lhe cobrar deste as contribuições previdenciárias devidas.
Entretanto, não se pode esquecer que embora o empregador se responsabilize
objetivamente pela manutenção do seguro social, esteou os seus prepostos não
estarão livres de ressarcir à Previdência Social dos gastos inerentes a cobertura
indenizatória, se foram negligentes quanto à implementação das normas de higidez e
segurança do trabalho. À Previdência Social foi assegurado o direito de regresso,
contra eventuais responsáveis pelo acidente do trabalho, nos termos do artigo 120 da
Lei nº 8.213/91.
A função teleológica da lei acidentária é assegurar o mínimo ao trabalhador
acidentado e evitar que a vitima de sinistro trabalhista fique desamparada, caso não
obtenha a reparação do dano sofrido segundo as normas do direito comum. Outra
finalidade, também de cunho social, é impedir o fim de pequenas empresas que não
suportariam o ônus da indenização. Razões porque buscou-se a socialização dos riscos,
mediante a seguridade social.
Vale evidenciar que a extensão da reparação do infortúnio é definida nos
limites previstos na lei. Assim, se fica assegurado ao lesado o direito de indenização,
em contrapartida, o seguro social não cobre todos os prejuízos causados pelo acidente,
sendo o ressarcimento menor do que aquele que poderia ser conseguido segundo as
normas gerais de indenização, embasadas na culpa do causador do dano.
Mas Helvécio Lopes diz que há uma compensação tanto para o empregador
quanto para o empregado. Este sempre será indenizado, embora com valor menor,
sem necessitar provar a culpabilidade daquele. O empregador, por sua vez, é obrigado
a custear o seguro social, independentemente da ocorrência de acidente, mas se
livrará de pagar uma indenização maior se houver o sinistro e a ação reparatória.
Para Washington de Barros Monteiro, "tudo se resolve, pois, sob a égide do risco
profissional; o exercício de sua atividade expõe o operário a vários acidentes; é justo
que esse risco seja compartilhado pelas duas partes, pelo patrão e pelo empregado".
Depreende-se, dessas afirmações, que o mestre entende como razoável e
normal que o risco de acidente do trabalho seja partilhado entre empregador e
empregado. Aquele cabe pagar o seguro social e garantir a estabilidade no emprego
por doze meses, enquanto este corre o risco de se acidentar e ter redução de suas
habilidades para o trabalho e, na maioria das vezes, receber os valores de auxílio-
doença ou da aposentadoria por invalidez ou especial inferiores à remuneração que
receberia se não fosse vítima de acidente, haja vista ser a indenização compatível com
o salário-contribuição e não com o salário real.
Mas tal situação é inaceitável, ao se considerar a superioridade do valor da
vida humana e que a maioria dos operários não tem opção de querer este ou aquele
trabalho. Ademais, legalmente, é o empreendedor que se responsabiliza pelos riscos
de sua atividade (CLT, art. 2º, Lei nº 9.477/97, art. 2º, § 4º). E segundo impõe norma
constitucional, a empresa deve cumprir sua função social (CF/88, art. 170, inc. III).
Maria Helena Diniz justifica que o empregado terá a priori o direito a reparação
previdenciária e "terá direito a uma reparação civil somente se ficar provado que
houve dolo ou culpa do empregador no evento que lhe foi danoso, pois este já indeniza
o empregado, que exerce atividade perigosa, mensalmente, com o adicional de
periculosidade".
Há de se esclarecer que os adicionais (periculosidade, insalubridade e
penosidade) embora aparentem ter natureza indenizatória, têm caráter salarial, são
complementos de salário. Segundo ensina Mascaro, baseado na lição do tão festejado
economista Adam Smith, a taxa salarial sofre as influências das condições em que é
prestado, ou seja, os salários variam de acordo com a facilidade ou dificuldade,
limpeza ou sujeira, dignidade ou indignidade do emprego. Assim, os adicionais de
periculosidade e insalubridade integram o salário e repercutem no preço médio da
força do trabalho, embora sejam compulsórios.
Corroboram essa assertiva as palavras de nosso Professor César. Machado Jr.:
"Os adicionais também são parcelas de natureza salarial concedidos em vista da
execução de serviços em situações mais desfavoráveis ou gravosas."
Salário é uma contraprestação do serviço executado, que obriga o
empregador. A obrigação é um dever jurídico originário, enquanto a responsabilidade
de indenizar é um dever derivado ou sucessivo. Esta surge a partir da violação do
dever originário.
Expostas essas definições, com o devido respeito pela nossa ilustre catedrática
civilista, não se pode concordar que a natureza dos adicionais de periculosidade seja
indenizatória. E ainda que fosse, não seria justificativa para impedir que a vítima de
acidente laboral tenha respaldo na teoria do risco para exigir indenização do seu
empregador, mas se restrinja apenas à teoria da responsabilidade subjetiva. Ao
contrário, muitas vezes pagar tais adicionais já evidenciam o risco da atividade e nem
sempre se comprova que foram tomadas todas as medidas necessárias para redução
ou eliminação dos elementos nocivos à integridade física dos trabalhadores, conforme
impõem as normas de segurança e saúde do trabalho.
O único e intransponível obstáculo para o uso indiscriminado da teoria da
responsabilidade objetiva do empregador, já consagrada em matéria de infortunística é
de cunho constitucional, conforme se infere do Texto Maior em seu artigo 7º, inciso
XXVIII, que estipula o dever do empregador de indeniz ar apenas quando ficar
comprovado que este agiu com dolo ou culpa para a ocorrência do acidente.
Ao analisar as várias doutrinas e jurisprudências, observou-se que é
predominante o entendimento quanto às questões acidentárias trabalhistas, que a
reparação do dano implica em responsabilidade objetiva da Previdência Social e
subjetiva do empregador. Também verificou-se, que a teoria da culpa como
fundamentação da reparabilidade do dano decorrente de acidente do trabalho, por
parte do empregador, não é satisfatória. Porquanto, a reparação de natureza
previdenciária, em muitos casos, não mitiga os infortúnios dos lesados. Outrossim,
ainda que tivessem natureza indenizatória os adicionais de periculosidade,
especialmente, os irrisórios adicionais de insalubridade, não compensam as mutilações
e doenças profissionais adquiridas em ambiente laboral inadequado.
8.9 Clamores pela responsabilidade objetiva do empregador pelos riscos de
sua atividade e a barreira constitucional.
A partir da insatisfação com a responsabilidade objetiva parcial do empregador
(que responde objetivamente, segundo a lei previdenciária, pelos encargos do seguro
social) e, principalmente, ante o descaso de inúmeras empresas no que tange a
efetivação das normas de segurança e higiene do trabalho e dos princípios da
valorização do trabalho e da dignidade humana e do conseqüente aumento
estarrecedor dos números de acidentes laborais, muitos operadores do direito
passaram a defender teses para impor ao empregador a responsabilidade objetiva de
indenizar diretamente ao empregado, ao menos nos valores que não são cobertos pelo
seguro social.
Em artigo da Revista Consultor Jurídico a advogada Nadia Demoliner Lacerda
afirma terem os defensores da responsabilidade objetiva total do empregador nas
hipóteses de acidentes laborais, festejado a determinação do parágrafo único, do
artigo 927 do atual Código Civil, que prevê responsabilidade objetiva do
empreendedor, para a reparação dos danos ocasionados ao trabalhador lesado,
advindos da atividade, por aquele exercida, cuja natureza é perigosa e oferece riscos
para os direitos de outrem. Diz, ainda, que estes doutrinadores estão equivocados ao
interpretarem, sob a égide desse comando, que o empregado acidentado ou seus
beneficiários conseguiriam a condenaçãodo empregador ao pagamento de indenização
sem a necessidade de provar a sua culpa. Afirma também, que esta interpretação é
inconstitucional (conforme aplicação do critério hierárquico lex superior derogat
inferiori, para verificar a validade e eficácia da norma), pois, em regra, a
responsabilidade do empresário com fulcro no risco do empreendimento (CCB, art.
927, par. único), pode ser aplicada a outros casos e não às hipóteses de indenização
dos danos procedentes de acidentes do trabalho, sob pena de inconstitucionalidade.
Concorda-se, em parte, com a autora, visto que a Constituição Federal
consagrou no inciso XXVIII do artigo 7º, a responsabilid ade subjetiva do empregador
para reparar os danos oriundos de acidentes do trabalho, salvo a exceção
constitucional do parágrafo 3º do artigo 225. Contudo, a norma civilista refutada por
ela, ao menos, serve de respaldo para a presunção da culpa do empreendedor que
assume os riscos de sua atividade, inclusive de eventuais sinistros laborais, o que
pressupõe a inversão do ônus da prova.
Vale lembrar que a indenização por acidente do trabalho, embasada na
responsabilidade objetiva em matéria de infortunística, é exigida porque há um risco
potencial na atividade empresarial desenvolvida pelo empregador. Logo, por esta
mesma razão este tem o dever de assumir os riscos dela provenientes,
independentemente de culpa (CF/88, art. 7º, inc. XXVIII c/c CLT, art. 2º e CCB, art.
927, par. único), e deverá arcar com os ônus do seguro social e também demonstrar
que tomou todas as medidas necessárias e possíveis para evitar a ocorrência do
sinistro, sob pena de responder civil e penalmente (CF/88, art. 225, § 3º c/c Lei nº
6.938/81, art. 14, § 1º e Lei nº 8.213/91, art. 120).
Frise-se, embora o preceito do parágrafo único do artigo 927 não se aplique
diretamente a todos os casos de acidentes laborais, ele enseja a presunção da culpa do
empregador. Para evidenciar a culpa presumida nesses casos com fundamento do
referido dispositivo, é conveniente registrar que este guarda relação com a lei penal,
que estabelece como conduta culposa, o simples fato de "expor a vida ou a saúde de
outrem a perigo direto e iminente" (CP, art. 132), para configurar o crime de perigo. É
desnecessária a ocorrência de qualquer dano, porque se dessa exposição resultar lesão
ou morte, a conduta do agente será enquadrada nos tipos: lesões corporais ou
homicídio (CP, arts. 121 e 129). É clarividente que se da exposição aos riscos da
atividade resultar danos para outrem, presume-se a culpa do agente, por se tratar de
uma presunção fática. Assim, seja na área penal, ou seja, na área civil, somente será
possível ao agente ou responsável pelo dano, se eximir da imputação, caso este
demonstre alguma excludente da ilicitude ou da culpabilidade.
Poder-se-ia conceber o seguinte silogismo lógico: age com dolo eventual o
agente que prevê a possível ocorrência do resultado danoso, mas assume o risco de
produzi-lo. Existem atividades que por sua natureza, podem implicar em riscos para
outrem. Logo se o empregador é aquele que assume os riscos da atividade
empreendida, inclusive, a ocorrência de eventuais acidentes do trabalho, sua conduta
caracteriza dolo eventual.
Tal silogismo é falso, ao considerar que mesmo as atividades perigosas são
lícitas, com escopo de satisfazer as necessidades da população humana. Entretanto, a
licitude da atividade empresarial pressupõe a implementação das medidas de
segurança e higiene laboral, ante a preexistência de norma jurídica que impõe ao
empreendedor a obrigação de, primeiramente, eliminar os riscos do trabalho ou, se
impossível, no mínimo, procurar reduzi-los (CLT, art. 166 c/c NR-4, item 4.12, "a").
Então, verificar-se-á a culpabilidade da conduta do empreendedor, se este agir de
forma contrária a este comando.
Um exemplo clássico da conduta típica do artigo 132 do Código Penal, o qual
trata do crime de simples exposição a perigo, é o caso do empreiteiro que, para
poupar-se ao dispêndio com medidas técnicas de prudência, na execução da obra,
expõe o operário ao risco de grave acidente. Ressalte-se, basta a exposição da pessoa
ao risco, para configurar a culpa do agente e este deverá provar sua inimputabilidade
para não cumprir a pena. E se dessa exposição resultar dano à vítima, ela deverá ser
indenizada.
Interessante dizer que a finalidade do comando do artigo 132 do Código Penal
é proteger a indenidade física e psíquica das pessoas, principalmente do trabalhador.
E, por sua vez, o dispositivo do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, visa a
reparação do dano e a proteção do indivíduo, ao qual cabe provar os fatos e não a
culpa do agente ou responsável pela atividade. Esta se presume pela da simples
evidência fática ante os riscos inerentes ao empreendimento do empregador, que
poderá ser arredada se este provar as causas excludentes da sua responsabilidade.
Enfim, estes preceitos objetivam a pacificação social e não a simples punição do
agente. Ademais, "se o patrão é quem recolhe os benefícios da produção; logo, há de
ser ele quem suporte não só os riscos da perda de materiais, como os [riscos]
resultantes dos acidentes sofridos pelos operários".
Dessa inferência, conclui-se que os infortúnios laborais oriundos da ausência
de cumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho, seja por dolo
eventual ou culpa stricto sensu, é uma ofensa social e por conseguinte implica em
punibilidade penal e civil.
É verdade que a "socialização dos riscos" e a moderna forma de cobertura das
indenizações ligadas à infortunística deixam a desejar, mas é forçoso dizer que, na
inexistência de emenda constitucional que revogue a última parte do inciso XXVIII do
artigo 7º da Constituição, prevalece como regra geral a responsabilidade civil subjetiva
do empregador (cujos pressupostos são a imputabilidade e a culpabilidade),
ressalvados os casos de responsabilidade objetiva relacionados a acidentes do trabalho
originários de danos ambientais, nos termos do parágrafo 3º, do artigo 225 do Texto
Maior combinado com os dispositivos do parágrafo 1º, do artigo 14 da Lei nº 6.938/81
e do artigo 120 da Lei nº 8.213/91.
Por conseguinte, têm razão os doutrinadores ambientalistas (que desejam
fazer cumprir as normas ambientais de segurança e medicina do trabalho) ao
defenderem a aplicabilidade do parágrafo 3º do artigo 225 da Constituição Federal
combinado com o parágrafo 1º do artigo 14 da Lei nº 6.938/81 com escopo de obrigar,
objetivamente, os empreendedores responsáveis por danos ao ambiente laboral,
inclusos os prejuízos individuais de seus empregados, vítimas de acidentes do
trabalho.
Celso Antônio Fiorillo e Marcelo Abelha Rodrigues, ambientalistas de renome
nacional, são categóricos ao afirmarem que a tutela ao meio ambiente,
especificamente ao meio ambiente do trabalho, bem como os princípios da valorização
do trabalho e da dignidade humana têm como meta prioritária tutelar o bem maior – o
direito à vida. Destarte, "o que se procura, salvaguardar é, pois, o homem trabalhador,
enquanto ser vivo, das formas de degradação e poluição do meio ambiente onde
exerce o seu labuto, que é essencial à sua vida. Trata-se, pois, de um direito difuso".
A proteção da qualidade ambiental em todas as suas modalidades, cuja
finalidade é antropocêntrica, visto que o homem está inserido no ecossistema, tem
como objetos básicos de tutela: a saúde, a segurança e o bem-estar da população e da
biota. E devido à magnitude desse direito, para efetivar a sua tutela, o parágrafo 3º do
artigo 225 da Constituição, regulamentado nos termos do parágrafo 1º, do artigo 14
da Lei nº 6.938/81, prevê a responsabilidade civilobjetiva, para a reparação dos danos
ambientais, inclusos os danos ao ambiente laboral ao estipular que:
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
A lei ambiental nº 6.938/81, em seu parágrafo 1º, define que:
§ 1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o
poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou
reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua
atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor
ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.
Portanto, qualquer conduta ou atividade, lícita ou ilícita, culposa ou não, desde
que lese o meio ambiente, implica em obrigação do autor de reparar o dano ambiental
e os prejuízos causados a terceiros, inclusive, a integridade física destes.
Trata-se, nitidamente, de responsabilidade civil objetiva daquele que violar
direito difuso ou coletivo, ao provocar dano ambiental.
Assim, com base nas normas mencionadas, se uma pessoa alheia à atividade
de determinada fábric a, ali entrar, no momento de uma explosão, e tiver amputado
uma parte do corpo em razão daquele sinistro, deve ser indenizada com base na teoria
do risco, sendo obrigada apenas provar o nexo causal.
Pergunta-se: E se um empregado, devido à mesma explosão, tiver sido
mutilado, somente será indenizado se provar a culpa do empregador? Não é tratar o
bem da vida sob duas medidas? Há que se concordar com Washington de Barros
Monteiro, que para esse caso aplica-se a teoria do risco profissional, em que
empregado e empresa assumem juntos o risco da atividade?
Então, estamos diante de um aparente conflito de normas constitucionais
entre o art. 7º, XXVIII e o § 3º do artigo 225.
Segundo Kelsen, "tal conflito de normas surge quando uma norma determina
uma certa conduta como devida e outra norma determina também como devida uma
outra conduta, inconciliável com aquela".
Ao analisar o conflito de normas do mesmo escalão, Kelsen ensina que quando
numa mesma lei se encontram duas disposições, em que uma limita a validade da
outra parcialmente, implica em exceção. Mas, para ele, não existe qualquer norma
objetivamente válida. Porque quando o legislativo põe
...atos cujo sentido subjetivo é um dever-ser e que, quando este sentido é
também pensado (interpretado) com o seu sentido objetivo, quando esses sentidos
são considerados como normas, estas normas entram em conflito umas com as outras.
Embora o ato tenha sido posto em harmonia com a norma
fundamental,...[esta] não empresta a todo e qualquer ato o sentido objetivo de uma
norma válida, mas apenas ao ato que tem um sentido, a saber o sentido subjetivo de
que os indivíduos se devem conduzir de determinada maneira.
Assim, a norma fundamental torna possível interpretar (pensar) o material que
se apresenta ao conhecimento jurídico como um todo com sentido, o que quer dizer,
descreve-lo em proposições que não são logicamente contraditórias.
Como já foi afirmado o bem maior assegurado pela Constituição é a vida. Isto
é, todos os comandos constitucionais têm como norma fundamental a tutela da vida.
Até mesmo as normas organizacionais do Estado, somente têm sentido se forem para
dar dignidade ao ser humano. Ora, o Estado Democrático Brasileiro foi instituído com o
destino de "assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a
segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores
supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem internacional, com a solução pacífica das
controvérsias" (CF/88, preâmbulo). E por outro lado a República Federativa do Brasil
tem por fundamentos o valor social do trabalho e a dignidade humana (art. 1º, incs.
III e IV), razão porque estes princípios são também as primícias da ordem econômica
e social (art. 170 e 193).
Sebastião Geraldo de Oliveira, de forma lapidar, dá brilho a este entendimento
ao dizer:
Aquele que não considerar os princípios constitucionais estará lidando apenas
na periferia do Direito, ignorando as íntimas conexões do ramo específico com o seu
tronco de sustentação, sua causa primeira. Avistando o continente sem captar o
conteúdo, atento ao detalhe mas distraído do conjunto, não perceberá a irradiação da
seiva tonificante, transitando do núcleo constitucional para abastecer e vitalizar toda a
extensão que a ciência jurídica abarca. (...)
A primazia do trabalho sobre a ordem econômica e social privile gia o
trabalhador antes de avaliar sua atividade; valoriza o trabalho do homem em
dimensões éticas que não ficam reduzidas a mera expressões monetárias. (...)
Lançadas as premissas básicas da dignificação do trabalho, poderemos
apreender, com maior profundidade, o significado e a extensão do direito à saúde do
trabalhador, o direito ao meio ambiente de trabalho saudável e a redução dos riscos
inerentes ao trabalho.
Conclui-se, portanto, que, numa exegese sistemática e teleológica dos
princípios e normas constitucionais, deve-se acatar o comando da parte final do inciso
XXVIII do artigo 7º da Constituição, que define a responsabilidade subjetiva do
empregador em casos de acidente do trabalho, apenas como confirmação da regra
geral, que institui a culpa como fundamento responsabilidade civil, adotada pelo nosso
ordenamento jurídico. O parágrafo 3º do art. 225 combinado com o dispositivo do
parágrafo 1º do artigo 14 da Lei Ambiental nº 6.938/81 (recepcionada pela Carta
Maior) deve ser vis lumbrado como exceção a esta regra ao impor a reparação dos
danos ambientais, inclusive dos danos ao ambiente laboral, objetivamente. Esclarece-
se: aplica-se a responsabilidade subjetiva do empregador, única e exclusivamente, se
as hipóteses de acidente laboral não advier de dano ao ambiente do trabalho.
Como bem nos ensinou Kelsen, a interpretação da norma fundamental não
pode levar à preposições contraditórias. E, segundo o princípio da igualdade, se uma
empresa, cuja atividade causou, por alguma razão, irrefutável dano ambiental em
sentido amplo (coletivo ou difuso) e, conseqüentemente, afetou qualquer pessoa,
ainda que seja seu empregado, e acarretou-lhe prejuízos físicos ou não, deverá
reparar todos os danos (ambiental ou individual), com base na teoria da
responsabilidade objetiva, segundo o princípio do poluidor-pagador.
Mas, se houve um acidente laboral, independentemente da ocorrência de dano
ambiental, a princípio, ao empregado cabe demonstrar a culpa do empregador.
Nessa linha de raciocínio, com brilhantismo e grande sensatez, Fábio Aurélio
da Silva Alcure, em seu artigo Meio ambiente de trabalho e Perda Auditiva.
Responsabilidade Objetiva do Empregador. dá a seguinte interpretação sistemática e
teleológica dos artigos 7º, inc. XXVIII e 225, § 3º da Constituição quanto a
aplicabilidade da responsabilidade civil dos danos causados ao ambiente laboral.
Assim, em relação aos acidentes de trabalho, são dois os regimes existentes
quanto ao dever de indenizar por parte do empregador. Se o acidente sofrido pelo
empregado não tem qualquer relação com uma agressão ao meio ambiente de
trabalho, o empregador só tem o dever de indenizar se tiver agido com dolo ou culpa.
Como exemplo, se um empregado cai de uma escada e vem fraturar um dos braços, o
empregador só éobrigado a indenizar se a escada não estava em condições de uso ou
se não foi exigido do trabalhador a utilização de equipamento de segurança; não se
pode responsabilizar o empregador se não houve culpa de sua parte. Agora, se o
acidente de trabalho guarda um nexo de causalidade com uma lesão ao meio ambiente
como um todo, não há que se analisar de quem é a culpa pelo acidente; neste caso, o
empregador deve responder civilmente pelo danos decorrentes do acidente. A perda
auditiva, dano reflexo do dano ao meio ambiente de trabalho causado pelo ruído,
talvez seja o melhor exemplo dessa última espécie de acidente de trabalho. A
responsabilidade subjetiva do empregador relaciona-se ao direito individual do
empregado de ver-se indenizado dos prejuízos sofridos em decorrência de acidente de
trabalho para o qual concorreu culposamente. Já a sua responsabilidade objetiva
fundamenta-se no direito difuso (quando se considera a totalidade dos trabalhadores)
ou coletivo (quando se tem em vista um grupo determinado de trabalhadores) a um
meio ambiente de trabalho ecologicamente equilibrado. O direito individual do
empregado acidentado de pleitear indenização, neste caso, é decorrência da violação
de direito difuso ou coletivo preexistente.
O bom senso não permitiria que fosse diferente. As lesões experimentadas
pelos empregados, em decorrência de lesões ao meio ambiente de trabalho, costumam
ser mais graves do que os prejuízos reflexos de terceiros pelos danos ao meio
ambiente como um todo. Enquanto estes, normalmente, têm prejuízos econômicos,
aqueles são vítimas de acidentes que lhes comprometem a integridade física, bem de
muito maior valor. Atribuir responsabilidade civil aos empregadores, nestes casos,
apenas quando provada a sua culpa, estabelecendo regimes diferentes de
responsabilidade se os danos são ao meio ambiente domo um todo ou ao meio
ambiente de trabalho específico, é destruir os pilares constitucionais da República
Federativa do Brasil, que, fundada no valor social do trabalho (art. 1º, IV) e tendo na
valorização do trabalho humano e no primado deste as bases de ordens econômica e
social (art. 170 e 193), pretende-se um Estado Democrático de Direito.
Enfim, as referidas normas constitucionais apenas apresentam conflito
aparente, mas na verdade cada uma tem sua finalidade, conforme o caso concreto a
ser analisado. Portanto, o dispositivo da parte final do inciso XXVIII do artigo 7º da
Carta Magna não impede a aplicabilidade da objetivação da culpa empregador nos
casos de reparação por acidentes do trabalho advindos de lesão ao ambiente laboral.
Entretanto, é imperioso dizer que, a imposição constitucional da
responsabilidade subjetiva do empregador para solucionar os demais casos de
infortúnios sofridos pelos operários em razão de seu lavor, contraria o princípio
protetor trabalhista. Não se pode esquecer que são notórios os obstáculos encontrados
pelo trabalhador hipossuficiente e vulnerável para comprovar a culpabilidade do
empregador. Para arredar esses percalços de uma vez por todas, seria de suma
importância a aplicabilidade do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, ao
menos para as hipóteses de sinistros trabalhistas inerentes às atividades, que por sua
natureza, são perigosas. Mas o referido comando constitucional torna inaplicável esse
dispositivo e, portanto, os empregadores, ainda que desempenhem, habitualmente,
atividades de risco, estão livres da responsabilidade objetiva, o que impõe ao lesado,
em eventuais as ações de indenização por acidente de trabalho, provar sua culpa,
ressalvada a possibilidade de inversão do ônus da prova. E, por ser óbvio, tal situação
somente é passível de mudança mediante emenda da Constituição, visto que as
normas infraconstitucionais não podem ser instrumentos de afronta à Lei Maior, face
ao princípio da supremacia da ordem constitucional.
Destarte, na maioria dos casos acidentários laborais, as dificuldades do
empregado, vítima de acidente do trabalho ou de seus beneficiários, para provar a
culpa do empregador ainda persistem. Mas poderão ser contornadas se os operadores
do direito analisarem o acidente do trabalho, como conseqüência de dano ambiental,
ou se assim não o fizer, ao menos optarem pela culpa presumida, que dá ensejo à
inversão do ônus da prova, porque é o empregador que tem condições reais para
provar se implantou e implementou ou não, todas as medidas necessárias para a
segurança e higidez de seus trabalhadores, que são de sua estrita responsabilidade.
ANEXOS - Estatísticas de acidentes do trabalho no Brasil – 1970/2000,
conforme fonte do MPAS e dados fornecidos pela ABRASEG - Associação Brasileira dos
Distribuidores de Produtos e Equipamentos de Segurança e Proteção ao Trabalho.
Disponível em: http://abraseg.com.br/feedback.htm
ano massa segurada Típicos
De
trajeto doenças total
total
de óbitos
1970 7.284.022 1.199.672 14.502 5937 1.220111 2232
1971 7.553.472 1.308.335 18.138 4050 1330.523 2587
1972 8.148.987 1.479.318 23.389 2016 1.504.723 2854
1973 10.956.956 1.602.517 28.395 1784 1.632.696 3173
1974 11.537.024 1.756.649 38.273 1839 1.796.761 3833
1975 12.996.796 1.869.689 44.307
1976 14.945.489 1.692.833 48.394 2598 1.743.825 3900
1977 16.589.605 1.562.957 48.780 3013 1.614.750 4445
1978 16.638.799 1.497.934 48.511 5016 1.551.461 4342
1979 17.637.127 1.388.525 52.279 3823 1.444.627 4673
1980 18.686.355 1.404.531 55.967 3713 1.464.211 4824
1981 19.188.536 1.215.539 51.722 3204 1.270.465 4808
1982 19.476.362 1.117.832 57.874 2766 1.178.472 4496
1983 19.671.128 943.110 56.989 3016 1.003.115 4214
1984 19.673.915 901.238 57.054 3233 961.525 4508
1985 21.151.994 1.010.340 63.515 4006 1.077.861 4384
1986 22.163.827 1.129.152 72.693 6014 1.207.859 4578
1987 22.617.787 1.065.912 64.830 6382 1.137.124 5738
1988 23.661.579 927.424 60.284 5029 992.737 4616
1989 24.486.553 825.081 58.424 4838 888.343 4554
1990 23.198.656 632.012 56.343 5217 693.5725355
1991 23.004.264 587.560 46.679 6281 640.520 4464
1992 22.272.843 490.916 33.299 8299 532.514 3634
1993 23.165.027 374.167 22.709 15417 412.293 3110
1994 23.667.241 350.210 22.824 15270 388.304 3129
1995 23.755.736 374.700 28.791 20646 424.137 3967
1996 23.830.312 325.870 34.696 34.889 395.455 4488
1997 24.104.428 347.482 37.213 36.648 421.343 3469
1998 24.491.635 347.738 36.114 30.489 414.341 3793
1999 24.993.265 326.404 37.513 23.903 387.820 3896
2000 --- 287.500 37.362 19.134 343.996 3094
Jurisprudências
Ementas de julgados que acolhem a culpa presumida do empregador, nas
hipóteses de acidente do trabalho
As normas e princípios que orientam a aplicabilidade do direito existem para
dar a melhor solução para cada caso concreto. É conveniente lembrar que na aplicação
da lei sempre cabe ao juiz atender "aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências
do bem comum". (LICC, art. 5º). Portanto, ante a vulnerabilidade do empregado,
vítima de acidente do trabalho, ou de seus beneficiários, a exigência da comprovação
de culpa, por parte do autor da ação, é uma demasia, mormente quando o infortúnio
tem origem presumida no próprio fato inerente à atividade exercida, é essencial
inverter o ônus da prova. Verifica-se que, sensatamente, parte dos nossos Tribunais ao
decidirem pela reparabilidade ou não dos danos acidentários, pleiteada segundo o
direito comum, adotam a culpa in vigilando, como fundamento da responsabilidade
civil do empregador, impondo-lhes a obrigação de provar sua inimputação. A seguir
transcrevem-se algumas ementas nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE DE TRABALHO –
ACIDENTE OCORRIDO NAS DEPENDÊNCIAS DA EMPRESA APELANTE – MOTOR
SE DESGOVERNA DURANTE TRANSPORTE E ATINGE EMPREGADO –
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR – CULPA PRESUMIDA –
TEORIA DO RISCO – SENTENÇA DO JUÍZO A QUO DETERMINANDO
PAGAMENTO I. O acervo probatório contido nos autos configura a
responsabilidade civil do empregador, conduzindo à presunção iuris
tantum de culpa in vigilando do mesmo. II. Recurso conhecido e
improvido. (TJMA – AC 010243/98 – (29202) – 4ª C.Cív. – Rel. Des.
Raymundo Liciano de Carvalho – DJMA 10.02.2000)
RESPONSABILIDADE CIVIL . ACIDENTE DE TRABALHO. FUNCIONÁRIO DE
EMPRESA ATINGIDO POR DISPARO DE COLEGA DE TRABALHO. VIGILANTE
PRESTADOR DE SERVIÇO TERCEIRIZADO. VINCULO DE PREPOSIÇÃO.
RECONHECIMENTO. CULPA PRESUMIDA DA PREPONENTE. INEXISTÊNCIA DE
PROVA EM CONTRÁRIO PELA RÉ. CULPA IN ELIGENDO E CULPA IN
VIGILANDO. RECURSO PROVIDO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE.
FIXAÇÃO DA CONDENAÇÃO.
I - Na linha da jurisprudência deste Tribunal, "para o reconhecimento
do vínculo de preposição não é preciso que exista um contrato típico de
trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviço
sob o interesse e o comando de outrem".
II - Nos termos do enunciado nº 341 da súmula/STF, "é presumida a
culpa do patrão ou do comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto".
III - Além de não ter a ré cuidado de afastar referida presunção,
os fatos registrados no acórdão revelam a ocorrência de culpa in eligendo e in
vigilando.
(RESP 284586/RJ; Recurso Especial nº: 2000/0109781-4, Rel. Min.
Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma – STJ, DJ - 28/04/2003)
RESPONSABILIDADE CIVIL. HÓSPEDE DE HOTEL QUE LESIONA O GERENTE.
CULPA PRESUMIDA DO DONO DO ESTABELECIMENTO. ART. 1.521, IV, DO
CC. INEXISTÊNCIA DE DISSÍDIO COM A SÚMULA 229/STF.
1. Segundo a jurisprudência desta Corte, a partir da edição da Lei
6.367/76, não mais prevalece o enunciado da Súmula 229/STF, bastando a
culpa leve do empregador para embasar a sua responsabilidade.
2. A lei presume a culpabilidade do hoteleiro por ato do seu hóspede.
Cabe ao estabelecimento tomar todas as medidas de segurança e precaução,
por cuja falta ou falha é responsável.
3. Em sede de recurso especial não se reexamina matéria probatória.
(Súmula 07/STJ).
4. "Nas indenizações por ato ilícito, os juros compostos somente são
devidos por aquele que praticou o crime" (Súmula 186/STJ).
Recurso especial conhecido, em parte, e provido.
(RESP 69437/SP; Recurso Especial nº:1995/0033667-7. Rel. Min.
Barros Monteiro, Quarta Turma – STJ, DJ: 14/12/1998)
Ementas de julgados que acolhem a culpa objetiva do empregador, nas
hipóteses de acidente do trabalho
Embora, segundo pesquisas realizadas, seja raro, há decisões que condenam o
empregador a reparar o dano advindo de acidente do trabalho com fulcro na teoria do
risco, e por esta razão, declara de plano a sua responsabilidade objetiva. Abaixo
transcreve-se ementa nesse sentido:
ACIDENTE DO TRABALHO - RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR -
em matéria de acidente do trabalho, já se consagrou a teoria do risco
profissional, segundo a qual o empregador é objetivamente
responsável pela situação de perigo gerada pelas máquinas e demais
instrumentos de produção contidos nas dependências da empresa,
devendo indenizar o dano físico decorrente da exposição de seu empregado ao
referido foco de risco. E isto em razão da dupla circunstância de ser o
empregador, como organizador da atividade produtiva, o gerador de tais
riscos, além de ser o maior beneficiário do empreendimento, do qual extrai o
lucro. A responsabilidade do empregado pelo acidente só se configura nas
hipóteses em que tenha agido com manifesto dolo ou culpa grave, buscando
voluntariamente a ocorrência do evento lesivo ou agindo sem cautela mínima.
(RO 01 nº: 02970227104, Acórdão nº: 02980291646, Relatora Juíza
Wilma Nogueira de Araujo Vaz da Silva, 8ª Turma - TRT 2ªRegião
data:01/06/1998)
RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR ACIDENTE DO TRABALHO -
RESSARCIMENTO DE DESPESAS MÉDICAS - RESPONSABILIDADE
OBJETIVA DO EMPREGADOR - DANOS/LESÕES EMOCIONAIS - Provado nos
autos de forma inquestionável que no curso do contrato o(a) empregado(a)
sofreu acidente do trabalho do qual resultaram lesões de ordem emocional, é
devido o ressarcimento das despesas médicas havidas com o tratamento. Não
é indenização por culpa. O ressarcimento de despesas médicas
decorrentes de tratamento de acidente do trabalho ou doença
profissional a ele equiparada é responsabilidade objetiva do
empregador e não responsabilidade subjetiva, para a qual exige-se a culpa,
além do dano e nexo causal. Não se pode negar que a saúde do ser humano
está relacionada ao seu estado físico e mental. As seqüelas emocionais de um
acidente são muitas vezes mais marcantes do que as cicatrizes e lesões
manifestamente visíveis. As primeiras também deixam marcas, embora nem
sempre vistas.
(TRT 3ª R - 6ª Turma - RO/4201/03 - Rel. Juíza Nanci de Melo e Silva
- DJMG 29/05/2003 - P. 13).
Ementas de julgados que acolhem a culpasubjetiva do empregador, nas
hipóteses de acidente do trabalho – culpa levíssima
É mais comum os julgados que adotam a responsabilidade subjetiva do
empregador. Porém, a culpa, ainda que levíssima, justifica a condenação do
empregador a reparar os danos causados ao empregado oriundos de infortúnios
laborais, principalmente, quando o empreendimento oferece, por sua natureza riscos.
Abaixo um exemplo de jurisprudência que segue essa linha de raciocínio:
EMENTA - ACIDENTE DO TRABALHO - RISCOS AMBIENTAIS -
DIREITO DE INFORMAÇÃO - OMISSÃO DO EMPREGADOR -
RESPONSABILIDADE CIVIL - A preocupação com a saúde e segurança do
trabalhador no Brasil, talvez motivada pela expectação diuturna de imenso
número de vítimas fatais em acidente do trabalho, motivou o legislador
constituinte a alçar a nível constitucional as normas de saúde, higiene e
segurança do trabalho, obrigando o patrão a adotar medidas tendentes a
garantir a integridade física do trabalhador. Desta forma, cabe ao
empregador, mormente aquele que explora atividade que oferece risco
à saúde e segurança do empregado, como no caso da reclamada,
informar seus empregados dos riscos a que estão expostos e sobre as
formas de prevenção, oferecendo-lhe o treinamento adequado para o
desenvolvimento de seus misteres dentro da empresa. Aliás, o direito à
informação dos empregados sobre os riscos da operação que realizam e de
sua participação nos mecanismos de proteção contra acidentes foi objeto de
várias Convenções da OIT ratificadas pelo Brasil, dentre elas as de nos. 148,
155 e 161, encontrando, também, previsão na NR 9, da Portaria 3214/78 do
MTb. E demonstrando que o assunto é deveras preocupante, foi instituído em
1992, o Mapa de Riscos Ambientais, em que a CIPA, em colaboração com o
SESMT, após ouvir os trabalhadores de todos os setores, elabora o referido
mapa de riscos, identificando os existentes em cada local de trabalho, o qual
deve ser afixado de forma visível e de fácil acesso para o trabalhadores, onde
deverão ser descritos os riscos, físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e de
acidente, tendo sido instituído, em 1994, o Programa de Prevenção de Riscos
Ambientais, tudo com objetivo de resguardar a saúde e a integridade física
dos trabalhadores. Inobstante a existência de todas estas normas, o que se
verifica dos autos é que a reclamada não está muito afinada com os avanços
na área de segurança do trabalho e, muito menos, com a obrigação que a
constituição e a lei lhe atribuíram no particular. Explorando a empresa-ré
atividade de risco à saúde do trabalhador, tanto que culminou com a morte
prematura do autor (19 anos de idade), a ela incumbia implementar meios de
reduzir os riscos de acidente do trabalho, propiciando a seus empregados
trabalharem em condições dignas, saudáveis e seguras. No entanto, a prova
dos autos revela justamente o contrário, pois no local onde foi encontrada
morta a vítima não havia qualquer sinalização sobre o perigo de asfixiamento
por flocos de espuma moída, demonstrando ainda a prova oral que no local
onde ocorreu o acidente havia espuma na altura de três metros, tornando a
operação arriscada, mesmo porque não possuía o compartimento janelas ou
portas, mas pequenas aberturas, o que, sem dúvida, dificultou o salvamento
do "de cujus" ou mesmo o pedido de socorro. Neste contexto, nota-se que a
reclamada agiu com culpa no infortúnio sofrido pelo autor e ainda que se
argumente sua ocorrência em grau leve, sua responsabilização impõe-se,
considerando que até a culpa levísssima gera responsabilização civil. Confira-
se, a propósito, a lição do ilustre magistrado Sebastião Geraldo de Oliveira em
sua brilhante obra Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador, 3a. edição, LTR,
pág. 228/229: Como se vê, foi ampliado consideravelmente o entendimento da
Súmula 229/STF, que só deferia indenização no caso de dolo ou culpa grave.
Agora, havendo culpa do empregador ou de outrem, de qualquer grau,
mesmo na culpa levíssima, o acidentado faz jus à reparação.
(RO NUM: 8666/2000, Rel. Juíza Maristela Íris da Silva Malheiros, 2ª
Turma, TRT – 3ª Região, 24/04/2001)
Ementas de julgados que acolhem a culpa concorrente entre empregador e
empregado
Ocorrem algumas hipóteses, que fica provado que tanto o empregador quanto
o empregado tiveram condutas culposas que culminaram com o acidente laboral.
Trata-se da culpa concorrente. A seguir um julgado do Superior Tribunal de Justiça,
que decide pela culpa concorrente das partes:
RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. CULPA
CONCORRENTE. REEXAME DE PROVAS. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ.
CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. ART. 602, CPC. SUBSTITUIÇÃO. INCLUSÃO EM
FOLHA DE PAGAMENTO. POSSIBILIDADE. EMPRESA IDÔNEA. INCAPACIDADE
PARA A FUNÇÃO QUE EXERCIA. PERMANÊNCIA NA EMPRESA, EM OUTRA
FUNÇÃO, COM A MESMA REMUNERAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA CONSIDERADA NA
FIXAÇÃO DA PENSÃO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DO EVENTO.
ENUNCIADO N. 54 DA SÚMULA/STJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I - Fixada a culpa concorrente com base na análise das provas dos
autos, entender diversamente não prescindiria do revolvimento de matéria
fática, procedimento vedado em sede de recurso especial, a teor do enunciado
n. 7 da súmula/STJ.
II – A norma do art. 1.539 do Código Civil traz a presunção de que o
ofendido não conseguirá exercer outro trabalho, pelo que a pensão, em
princípio, seria devida no mesmo valor que recebia a vítima. Por outro lado,
evidenciado que esta continuou a trabalhar, e, no caso na mesma empresa,
ainda que em atividade distinta, a pensão deve levar em consideração tal
circunstância.
III – Assentado pelo acórdão impugnado a idoneidade e solvabilidade
da empresa condenada, é admissível, em substituição à constituição de capital
prevista no art. 602, CPC, a inclusão do vencedor na folha de pagamento da
empresa.
IV - Tratando-se de indenização pelo direito comum, relativa a
acidente de trabalho, contra empregador que agiu com culpa, a hipótese é
de responsabilidade extracontratual, de sorte que os juros moratórios fluem a
partir do evento danoso (enunciado n. 54 dasúmula/STJ).
(RESP 401474/SP; Recurso Especial nº: 2001/0184733-7 Rel. Min.
Sálvio De Figueiredo Teixeira - Quarta Turma/STJ DJ 15/04/2002)
Ementas de julgados que acolhem a culpa objetiva das pessoas jurídicas de
direito público ou de direito privado prestadoras de serviços públicos
Em se tratando de pessoas jurídicas de direito público ou de direito privado,
prestadoras de serviços públicos, a maioria das decisões tem adotado o instituto da
responsabilidade civil objetiva como fundamento da reparação por acidentes do
trabalho, com base no parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal de 1988.
Nesse sentido, transcreve-se algumas decisões abaixo:
RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE DO TRABALHO –
INDENIZAÇÃO – DIREITO COMUM – LITISCONSÓRCIO PASSIVO – PESSOA
JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO COM PESSOA JURÍDICA DE DIREITO
PÚBLICO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA COM BASE NO RISCO
ADMINISTRATIVO – ADMISSIBILIDADE – A coleta de lixo urbano é
considerada serviço público desempenhado por delegação. A responsabilidade
civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito
privado prestadoras de serviço público é objetiva, com base no risco
administrativo.
(2º TACSP – AI 604.940-00/2 – 10ª C. – Rel. Juiz Irineu Pedrotti – J.
10.11.1999)
ACIDENTE DE TRABALHO – TRANSPORTE COLETIVO –
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS REMUNERADOS POR ÔNIBUS NÃO LICENCIADO –
RESPONSABILIDADE OBJETIVA – Sumária. Acidente de trânsito. Coletivo
denominado de "pirata". Destinação ao transporte de passageiros. Equiparação
a prestador de serviçode utilidade pública. Responsabilidade objetiva. Onus
probandi do réu. Prejuízo comprovado. Improvimento do recurso.
(LCR) (TJRJ – AC 15084/1999 – (20032000) – 9ª C.Cív. – Rel. Des.
Renato Simoni – J. 14.12.1999)
DIREITO CIVIL – ACIDENTE DE TRABALHO –
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA – SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
– CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO – LOCAL DE DESENPENHO DA
ATIVIDADE LABORATIVA DO EMPREGADO – DESCUIDO COM AS CONDIÇÕES
DE SEGURANÇA – PRESUNÇÃO DE CULPA, POR OMISSÃO, DA EMPRESA
EMPREGADORA – PENSÃO DEVIDA AOS FILHOS E À VIÚVA – LIMITAÇÃO
TEMPORAL – I – Responsabilidade civil da sociedade de economia mista,
quando concessionária de serviço público, é objetiva. II – Estando
sobejamente evidenciado que o fato acarretador da morte do empregado foi
propiciado por comportamento omissivo da empresa empregadora, que
descuidou das condições de segurança no local em que aquele desempenhava
o trabalho que lhe competia, prevalece a presunção de culpa desta, com a
conseqüente obrigação de indenizar, mormente se a atividade laboral, exercida
pelo vitimado, qualificava-se como sendo de ''alta periculosidade''. III. É
devida, pela empresa empregadora, pensão às filhas de empregado morto em
acidente de trabalho, até que complete 21 anos, e à viúva, até o tempo em
que a vítima completaria 65 anos. IV – Apresenta-se de grande oportunidade
que, ao prestar a jurisdição, preveja, o julgador, a possibilidade de prorrogar a
prestação da pensão até que as filhas do empregado falecido completem 24
anos se, alcançada a idade de 21 anos, estejam, as mesmas, matriculadas em
curso superior, hipótese em que se presume contariam ainda com o amparo do
genitor. V – A fixação do quantum para indenização de dano moral há de
considerar as peculiaridades de cada caso, não se prestando, tal
ressarcimento, como fonte de enriquecimento ilícito, mas não podendo, por
outro lado, ser inexpressivo. Dar parcial provimento. Unânime.
(TJDF – APC 4765098 – 2ª T.Cív. – Relª Desª Nancy Andrighi – DJU
02.02.2000 – p. 16)
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
ACIDENTE COM MORTE SOFRIDO POR EMPREGADO DE EMPRESA
CONTRATADA PARA OBRAS EM ORGANIZAÇÃO MILITAR.
RESPONSABILIDADE DA UNIÃO. FIXAÇÃO DOS VALORES. LEGITIMIDADE DA
COMPANHEIRA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS.
- A União é responsável por acidente de trabalho ocorrido dentro de
Organização Militar, independentemente de cláusula contratual em que a
empresa contratada se responsabilize, pois tal cláusula não gera efeitos sobre
terceiros, ressalvado o direito de regresso em caso de dolo e culpa, a teor do
art. 37, § 6º da CF-88.
- Embora não haja como tarifar a dor sofrida pelos próximos do de
cujus, reduzo a indenização por dano moral a R$ 60.000,0 (sessenta mil reais)
para a filha e a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) à companheira, por entender
que este valor atinge o objetivo de minorar as penas dos atingidos, sem que
seja caracterizada situação de enriquecimento sem causa, e também para
melhor se harmonizar com as decisões desta Turma.
- Inocorrência de nulidade da sentença por ultra -petita, pois os juros e
a correção monetária devem ser incluídos na condenação independente de
pedido, embasados na Súmula 254 do STF e art. 1º da Lei 6.899/81.
(TRF4 SC, Quarta Turma - AC, processo nº 200204010133819, data
de publicação -31/07/2002)
É oportuno registrar abaixo uma das raras decisões em sentido contrário,
conforme pesquisa realizada, que se aplica o princípio da responsabilidade subjetiva
para as concessionárias de serviços públicos nas hipóteses de reparação de danos:
34005481 – INDENIZAÇÃO – ACIDENTE DO TRABALHO –
CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO CULPA – Não se aplica o princípio
da responsabilidade objetiva a indenização de direito comum em
acidente de trabalho sofrido pelo empregado de concessionária de
serviço público, devendo-se perquirir a culpa do empregador.
(TAMG – Ap 0190106-6 – 3ª C.Cív. – Rel. Juiz Wander Marotta – J.
27.09.1995)
9. O PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO E AS MICROS E PEQUENAS
EMPRESAS
O Perfil Profissiográfico Previdenciário-PPP está previsto no artigo 58 da Lei
8.213/91, com redação dada pela Medida Provisória n.º 1.523/96 e convertida na Lei
9.528, de 10 de dezembro de 1997. Sua regulamentação se deu pela Instrução
Normativa nº 78 de 18 de julho de 2002, do Ministério da Previdência Social.
Trata-se de um documento histórico-laboral dos trabalhadores, apresentado
em formulário próprio, que conterá um grande nº de informações detalhadas, sobre
suas atividades, exposição a agentes nocivos à saúde, resultados de exames médicos e
outras informações de caráter administrativo.
O principal objetivo do PPP é apresentar, em um só documento, o resumo de
todas as informações necessárias à fiscalização do gerenciamento de riscos e
existência de agentes nocivos no ambiente de trabalho, além de ser o documento que
orienta o processo de reconhecimento de aposentadoria especial do trabalhador.
Pretende-se também uma dificultação das fraudes em aposentadorias especiais, mas
às expensas do segmento empresarial.
A empresa passa a ter a obrigação de elaborar e manter atualizado o perfil
profissiográfico de cada trabalhador, descrevendo as atividades que os mesmos
desenvolvem. Ressalte-se que os trabalhadores tem direito de deter cópia autêntica de
tal documento, substanciando-se em obrigação a cessão do mesmo pelo empregador.
As fontes de informação do PPP são o Laudo Técnico de Condições Ambientais
do Trabalho (LTCAT), o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o
Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), todas estas obrigações
vigentes para o empresariado em geral, mas, via de regra, descumpridas pelas MPE,
pelo custo e pela burocracia que representam.
Na realidade, há inúmeras empresas de medicina do trabalho que realizam tais
obrigações, contratadas pelas empresas.
Para uma maior didática, passemos a descrever, sucintamente, todas essas
obrigações.
- LTCAT - Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - deve ser
expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Trata-se de
documento que retrata as condições do ambiente de trabalho de acordo com as
avaliações dos riscos. Seu custo varia pelo nº de funcionários e tamanho do
estabelecimento. Temos como base um custo de R$ 2,00 por empregado, com um
mínimo de R$ 100,00/ano, para empresas que não apresentam nenhum risco
aparente. Se o houver riscos, esse valor sobe em muito, chegando a uma média R$
500,00.
- PPRA - Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – Trata-se de um
programa de ação contínua e não apenas um documento. O LTCAT pode ser um dos
documentos que integram o PPRA. Este é uma exigência da legislação trabalhista e
aquele da legislação previdenciária. Visa à preservação da saúde e da integridade dos
trabalhadores, pela antecipação, pelo reconhecimento, pela avaliação e,
conseqüentemente, pelo controle da ocorrência de riscos ambientais relativos à
iluminação, ergonometria, agentes químicos, ruídos, etc..
- PCMSO - Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional – Tem por
objeto a promoção e preservação da saúde dos trabalhadores, a ser elaborado e
implementado pela empresa, a partir do PPRA e do PCMAT, com o caráter de promover
prevenção, rastreamento e diagnóstico precoce dos danos à saúde relacionados ao
trabalho, além da constatação da existência de casos de doenças profissionais ou
danos irreversíveis à saúde. Um bom exemplo é a lesão por esforços repetitivos.
Consiste em exames clínicosocupacionais de admissão, periódico, troca de função e
demissional, além da emissão dos atestados de saúde ocupacional. Seu valor varia de
R$ 5,00 a R$ 10,00 por empregado/mês, condicionado a um mínimo de
R$120,00/mês.
O Ministério da Previdência e Assistência Social havia prorrogado para 1 de
novembro 2003 a exigência do Perfil Profissiográfico Previdenciário. Ocorre que, devido
ao descontentamento do empresariado (principalmente de micro e pequeno porte,
além daqueles que, em condições normais, não oferecem riscos à atividade laboral) o
MPAS já garantiu nova prorrogação para 1º de janeiro de 2.004. A partir desta data, a
obrigatoriedade da apresentação do Laudo Técnico de Condições Ambientais (LTCAT)
será dispensada. No entanto, este documento deverá permanecer disponível na
empresa e ficar à disposição da Previdência Social pelo prazo de 20 anos.
Com base nisso, a exigibilidade do PPP foi postergada de 1° de novembro de
2003 para 1° de janeiro de 2004, por força da Instrução Normativa do INSS, de nº 96,
de 23 de outubro, publicada no Diário Oficial da União de segunda-feira, 27 de
outubro.
A grande novidade imposta IN 96/03 é que essa obrigação passa a ser exigida
apenas para empresas cujos empregados estejam expostos a riscos físicos (como
excesso de calor, som e vibração), químicos (benzeno, amianto, sílica e chumbo, por
exemplo) e biológicos (como parasitas, vírus e bactérias infecto-contagiosas).
Não obstante, a IN dispõe que após 1º de janeiro, a partir do momento em
que a Previdência Social implantar o PPP "em meio magnético", o documento passará a
ser exigido de todas as empresas, independente do ramo de atividade exercida e dos
agentes nocivos a que o trabalhador esteja exposto. Não há qualquer esclarecimento
sobre prazos ou forma desse "PPP em meio magnético".
É bom lembrar que o LTCAT, o PCMSO e o PPRA servirão de base para o
preenchimento do PPP, uma vez que trazem informações relativas às condições
ambientais da organização e às condições do trabalhador. O PPP já trará a conclusão
do laudo técnico e a descrição das atividades desenvolvidas pelo trabalhador, a
existência de agentes prejudiciais à sua saúde ou integridade física e o caráter
permanente ou não da exposição aos riscos.
O PPP deve ser mantido atualizado magneticamente ou por meio físico com a
seguinte periodicidade:
I – anualmente, na mesma época em que se apresentar os resultados da
análise
global do desenvolvimento do PPRA, do PGR, do PCMAT e do PCMSO e
II – nos casos de alteração de "layout" da empresa com alterações de
exposições
de agentes nocivos.
A não manutenção de Perfil Profissiográfico Previdenciário atualizado e o não
fornecimento do mesmo ao empregado, por ocasião do encerramento do contrato de
trabalho ensejará aplicação de multa de R$ 991,03 à R$ 99.102,12.
As microempresas e empresas de pequeno porte não têm quaisquer benefícios
ou tratamento diferenciado no que tange ao PPP, até mesmo as optantes pelo
SIMPLES. Há um forte movimento que defende o tratamento diferenciado para as MPE,
assim como para as empresas cuja atividade não oferece risco para os empregados.
Quanto aos últimos, a demanda já foi correspondida, pelo menos provisoriamente, até
que o INSS crie o PPP "em meio magnético", O MPAS acena com a criação desse
tratamento, conforme tem se visto em declarações à imprensa.
10. FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO AQUAVIÁRIO
O Decreto No 3.129, de 9 de agosto de 1999, aprova a estrutura
regimental do Ministério do Trabalho e Emprego e, com fonte no artigo 14,
incisos I e II, atribui à Secretaria de Inspeção do Trabalho formular e propor as
diretrizes da inspeção do trabalho, inclusive do trabalho portuário, priorizando o
estabelecimento de política de combate ao trabalho forçado e infantil, bem como a
todas as formas de trabalho degradante; e formular e propor as diretrizes e normas de
atuação da área de segurança e saúde do trabalhador.
Essa Secretaria expediu a Instrução Normativa nº 19, de 27 de setembro de
2000, traçando a competência das Unidades Regionais de Inspeção do Trabalho
Portuário e Aquaviário, destacando a fiscalização das condições do trabalho, segurança
e saúde e de vida a bordo de embarcação comercial, nacional ou estrangeira, utilizada
na navegação marítima, fluvial e lacustre.
Conceitua este at o normativo as condições de trabalho e de vida a bordo,
considerando, entre outras, as relativas às normas de manutenção e limpeza das áreas
de alojamento e trabalho a bordo, a idade mínima, os contratos de engajamento, a
alimentação e o serviço de quarto, o alojamento da tripulação, a contratação, a
lotação, o nível de qualificação, as horas de trabalho, os atestados médicos, a
prevenção de acidentes de trabalho, os cuidados médicos, os pagamentos em caso de
acidente ou doença do trabalho, o bem estar social e questões afins e a repatriação.
Como se percebe, nada escapa ao controle, visto que essa enumeração não é
exaustiva e outras poderão ocorrer, de modo que a proteção legal é rigorosa,
abrangendo qualquer tipo de embarcação comercial, ainda que estrangeira.
O auditor fiscal do trabalho deve atuar, em se tratando de embarcação
comercial nacional, de conformidade com as normas da Convenção 147 e seus anexos,
da CLT, da legislação complementar respectiva, dos acordos e convenções coletivas de
trabalho e as normas de segurança e saúde do trabalho específicas para o trabalho
aquaviário.
Também deverá observar as diretrizes sobre procedimentos de inspeção das
condições de trabalho a bordo de embarcações, aprovadas pela Reunião Tripartite de
Peritos, convocada pela OIT, em 1989.
Frise-se que, nas hipóteses que propiciarem repatriação, como as de contratos
de engajamento vencidos ou de outras causas arroladas no artigo 2º da Convenção
166 da OIT, ratificada pelo Decreto 2670, de 15 de julho de 1998, deverá o referido
servidor comunicar, por ofício, à Superintendência da Polícia Federal e tomar as
demais providências mencionadas nesta Instrução.
Uma medida de significativa importância diz respeito à mediação do conflito,
pela fiscalização do trabalho, se a tripulação se encontrar em greve ou strike,
garantindo os direitos dos trabalhadores e ainda o próprio direito à greve dos
envolvidos.
A Unidade Regional iniciará ação fiscal, se se tratar de embarcação comercial
estrangeira, que estiver operando em águas jurisdicionais brasileiras, em virtude de
contrato de afretamento ou de prestação de serviços ou de risco, celebrado com
empresa estrangeira, e houver queixa de indício de irregularidade apresentada por
membro de tripulação, de sindicato ou por qualquer pessoa ou organização interessada
nas condições de trabalho ou ainda atendendo ao planejamento da Unidade Especial de
Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário.
Cabe-lhe, também, entre outras atividades, verificar, no diário de navegação
ou nos controles da autoridade marítima, se a embarcação está em águas nacionais,
há mais de noventa dias e foram contratados tripulantes dos três níveis técnicos -
oficiais, graduados e não graduados, para as atividades de navegação ( convés e de
máquinas ), tendo em vista as RNs 31/98 e 46/2000. Dispõem essas regras que a
embarcação estrangeira deverá contratar seis tripulantes brasileiros. Esse número
poderá ser reduzido, se o cartão de lotação mínima da embarcação não utilizar algum
desses níveis técnicos, como no caso de apoio marítimo.
Trata-se, pois, de notável documento, distinguindo nosso País, entre os que se
preocupam com as condições de trabalho,segurança e saúde de vida a bordo de
embarcação comercial, em homenagem aos princípios fundamentais, insertos na
Constituição Federal, da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do
trabalho.
11. INSPEÇÃO DO TRABALHO POR AUTORIDADE ESTADUAL OU MUNICIPAL:
INCONSTITUCIONALIDADE. ENTENDIMENTO DO STF
Tivemos oportunidade de visualizar, em várias oportunidades, a atuação de
autoridades estaduais, integrantes das secretarias de saúde, na inspeção e fiscalização
do meio ambiente de trabalho das empresas, fazendo exigências e, por muitas vezes,
chegando a lavrar multas, indicando como fundamento legal dispositivos da CLT e das
Normas Regulamentadoras (NR’s), editadas pelo Ministério do Trabalho.
Por outro lado, vê-se alguns entes da federação (Estados e Municípios) a
legislar sobre o tema, impondo novas obrigações além daquelas constantes na
legislação federal, sob pena pecuniária, bem como suas autoridades fiscalizatórias
exigirem das empresas o cumprimento de tais obrigações inovadoras da legislação
federal, sob a ameaça da imposição de autos de infração.
Sem querer exaurir o tema neste artigo, é mister que se faça uma análise da
legalidade de tais procedimentos, para que se conclua por seu cabimento ou não, em
face do que dispõe a Constituição da República.
11.1 DOS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS REGULADORES DA INSPEÇÃO
DO TRABALHO
Iniclalmente é de se citar o que preceitua o art. 21, XXIV, da Constituição
Federal :
Art. 21 . Compete à União:
......................
XXIV – organizar, manter e executar a inspeção do trabalho
Em seu art. 200, II e VIII, preceitua:
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos
termos da lei:
..................
II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de
saúde do trabalhador.
VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do
trabalho.
Assim sendo, dispõe a Constituição da República sobre a inspeção do trabalho
em duas passagens, uma ao definir a competência da União, outra, em definir a
competência do SUS (sistema único de saúde).
O SUS, como preceitua o art. 198 da Constituição e seus incisos, se constitui
em rede hierarquizada e regionalizada, tendo direção única em cada esfera de
governo.
Em princípio, pois, (este o principal argumento das autoridades fiscalizadoras),
todas as esferas de governo têm competência para a fiscalização e inspeção do
trabalho, haja vista que, como se disse, o SUS tem descentralização, atividade e
direção em cada esfera da federação.
Uma melhor análise, porém, mostrará não ser esta a melhor interpretação.
11.2 DA NATUREZA DA COMPETÊNCIA ATRIBUÍDA À UNIÃO EM MATÉRIA DE
INSPEÇÃO DO TRABALHO
Conforme esmerada doutrina, em termos de competência constitucional, deve-
se fazer a distinção entre competências privativas e exclusivas.
A competência privativa, não obstante o nome, seria aquela que, conferida a
determinado ente federativo prioritariamente, não obsta que o ente beneficiado a
delegue a outro, nos limites e forma permitidos na Constituição.
Já a competência exclusiva, ao contrário da anterio r, não permite ao ente
agraciado delegar de qualquer forma sua competência a outro congênere.
Essa a lição de JOSÉ AFONSO DA SILVA (Curso de Direito Constitucional
Positivo, Ed. Malheiros, 16a Edição, pg. 480) para quem: "...A diferença que se faz
entre competência exclusiva e competência privativa é que aquela é indelegável e
esta é delegável. Então, quando se quer atribuir competência própria a uma entidade
ou a um órgão com possibilidade de delegação de tudo ou de parte, declara-se que
compete privativamente a ele a metéria indicada. Assim, no art. 22 se deu
competência privativa (não exclusiva) à União para legislar sobre: [...], porque
parágrafo único faculta à lei complementar autorizar os Estados a legislar sobre
questões específicas das matérias relacionadas nesse artigo. No art. 49, é indicada a
competência exclusiva do Congresso Nacional. O art. 84 arrola a matéria de
competência privativa do Presidente da República, porque seu parágrafo único permite
delegar algumas atribuições ali arroladas..".
Como se vê, diante de uma competência constitucional, teremos duas
possibilidades: será ela privativa ou exclusiva, conforme a Carta Magna possibilite ou
não a delegação.
Assim, vejamos.
A Constituição, ao contrário do que faz em seu art. 22, parágrafo único, não
possibilita, em qualquer passagem de seu art. 21, a delegação de competências.
Assim pensa MICHEL TEMER (Elementos de Direito Constitucional, Ed.
Malheiros, 15a Ed., pg. 77): "...Dos arts. 21 e 22 se extrai que a União tem
competências expressas e enumeradas. São também exaustivas, pois exaurem, pela
enumeração, as matérias que lhe cabem".
Não é outro o pensamento de IVES GANDRA DA SILVA MARTINS , ao comentar
a Constituição Federal (Comentários à Constituição do Brasil, Ives Gandra da Silva
Martins e Celso Ribeiro Bastos, Ed. Saraiva, pg. 2/3): "..O art. 21 é dedicado à
competência de atribuições da União ...".
Assim, temos pela frente claro caso de competência constitucional
exclusiva sendo vedada a delegação.
Por outro lado, igualmente deve-se fixar propriamente as competências
legislativas e administrativas.
Como se sabe, grande parte da doutrina sapara tais competências, afirmando
que a competência legislativa, como o nome diz, dá a prerrogativa de legislar e a
administrativa de atuar naquele âmbito específico de competência.
Não obstante, preferimos concordar com IVES GANDRA DA SILVA MARTINS (op.
cit., pg. 3), para quem: "A dificuldade, todavia, que se coloca é que, regido o país pelo
princípio da legalidade, nenhuma entidade federativa pode agir, sem ter legislação
anterior que a autorize, de tal forma que tanto o art. 21 quanto o art. 22 cuidam, em
verdade, de competência para legislar sobre aquelas matérias. O mesmo se pode dizer
no que concerne à competência comum e/ou concorrente, visto que a ação é sempre
precedida de legislação..."
Assim sendo, somente podendo a Administração agir quando previamente
autorizada por lei, a diferença entre competência legislativa e administrativa fica muito
reduzida de conteúdo, porquanto a ação administrativa sempre será necessariamente
precedida de legislação.
Portanto, conclui-se correto afirmar que a competência para agir deve
corresponder igualmente à competência para legislar sobre a matéria.
A primeira conclusão que se extrai é que, em sendo a competência do art. 21
exclusiva, somente a União poderá organizar, manter e inspecionar o trabalho.
Em sendo a competência para agir (competência administrativa) corolário lógico e
necessário da competência para legislar (competência legislativa), conclui-se que
somente a União poderá legislar sobre organização, manutenção e inspeção
do trabalho.
Aliás, a matéria de organização, segurança e meio ambiente do trabalho é
componente do Direito do Trabalho.
Esse o pensamento de SÉRGIO PINTO MARTINS (Direito do Trabalho, 3a Edição,
Ed, Malheiros, pg. 43/44), que, adotanto as orientações do Prof. OTÁVIO BUENO
MAGANO, preceitua a divisão da disciplina do Direito do Trabalho na seguinte forma:
"Preferimos adotar a divisão utilizada pelo Prof. Magano, ao falar de Direito Individual
do Trabalho, Direito Tutelar do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho"
E prossegue: "No Direito Tutelar do Trabalho versaremos sobre regras que
tratamda proteção do trabalhador, como as normas de segurança e medicina
do trabalho, regras sobre a jornada de trabalho, sobre os repousos do trabalhador,
sobre a fiscalização trabalhista, etc."
Vê-se, pois que o Direito Tutelar do Trabalho é parte do Direito do Trabalho.
Ora, conforme o art. 22, I , da CF é privativa da União a competência para
legislar sobre Direito do Trabalho.
Logo, repita-se: somente a União poderá legislar criando obrigações relativas ao
meio ambiente do trabalho, bem como somente ela poderá fiscalizar o cumprimento de
tais obrigações.
11.3 DO ÂMBITO DE COMPETÊNCIA DO SUS
Em se afirmando a competência exclusiva da União para legislar e agir em
matéria de medicina, segurança, inspeção e meio ambiente do trabalho em geral, resta
ainda fixar, dentro das normas constitucionais, o âmbito correto de competência do
SUS (sistema único de saúde).
Diz a Constituição Federal que o SUS, sendo um conjunto hierarquizado e
descentralizado de ações mantidas pelo Poder Público, nos diversos níveis de governo,
terá as competências de:
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos
termos da lei:
..................
II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de
saúde do trabalhador.
VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do
trabalho.
Analisemos, pois, tal competência, nos termos postos pela Constituição Federal.
Inicialmente diz a Constituição que caberá ao SUS: 1) executar as ações de
vigilância sanitária e epidemiológica; 2) executar ações relativas à saúde do
trabalhador.
Logo após, diz caber ao SUS colaborar na proteção do meio ambiente, nele
compreendido o do trabalho.
Assim, tem-se que o SUS deve inicialmente realizar ações diversas relativas à
saúde do trabalhador. Ora, nehuma competência lhe atribuiu a Constituição Federal
para INSPECIONAR ou FISCALIZAR o meio ambiente do trabalho, mas sim para que
tenha ações diversas em prol da saúde do trabalhador, dentre as quais, v.g., a
pesquisa de novas técnicas para a melhoria das condições de saúde do trabalho, a
realização de exames médicos periódicos, etc, dentre as quais não está, de forma
nehuma incluída a inspeção do trabalho.
No mesmo sentido, colaborar na proteção do meio ambiente não significa dar
atribuições ao SUS de inspecioná-lo ou fiscalizá-lo. Ora, quem colabora atua em
conjunto, em participação secundária, que obviamente não poderá ser a inspeção,
atividade primordial.
Logo, nenhuma atribuição constituicional tem o SUS para inspecionar o meio
ambiente do trabalho, sendo inconstitucional qualquer lei que venha a conferir tal
atribuição a este órgão.
Vejamos, agora, o que diz a legislação ordinária.
Dada a descentralização do sistema, o SUS terá direções e atribuições diversas
conforme o ente federativo a que pertencer e conforme definir a lei (pois a Carta
Magna expressamente delega à lei a fixação das competências do SUS).
É o SUS disciplinado pela Lei Nº 8.080, de 19 de setembro de 1990 que
dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a
organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências.
Diz referido diploma em seu art. 9o :
Art. 9º A direção do Sistema Único de Saúde (SUS) é única, de acordo com o
inciso I do art. 198 da Constituição Federal, sendo exercida em cada esfera de governo
pelos seguintes órgãos:
I - no âmbito da União, pelo Ministério da Saúde;
II - no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, pela respectiva Secretaria de
Saúde ou órgão equivalente; e
III - no âmbito dos Municípios, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão
equivalente.
Fica claro, assim, as atribuições dos órgãos para o exercício das atribuições do
SUS. No âmbito federal, será competente o Ministério da Saúde. Nos Estados e
Municípios as respectivas secretarias de saúde.
Veja-se, agora, a competência deferida pela lei a cada esfera governamental
(os grifos não constam no original).
Seção II
Da Competência
Art. 16. A direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) compete:
...............
II - participar na formulação e na implementação das políticas:
..............
c) relativas às condições e aos ambientes de trabalho;
V - participar da definição de normas, critérios e padrões para o controle
das condições e dos ambientes de trabalho e coordenar a política de saúde do
trabalhador;
Art. 17. À direção estadual do Sistema Único de Saúde (SUS) compete:
IV - coordenar e, em caráter complementar, executar ações e serviços:
a) de vigilância epidemiológica;
b) de vigilância sanitária;
c) de alimentação e nutrição; e
d) de saúde do trabalhador;
VII - participar das ações de controle e avaliação das condições e dos
ambientes de trabalho;
Art. 18. À direção municipal do Sistema de Saúde (SUS) compete:
III - participar da execução, controle e avaliação das ações referentes às
condições e aos ambientes de trabalho;
IV - executar serviços:
a) de vigilância epidemiológica;
b) vigilância sanitária;
c) de alimentação e nutrição;
d) de saneamento básico; e
e) de saúde do trabalhador;
Percebe-se, pois, que, em nehuma passagem a lei atribuiu ao SUS a inspeção
do meio ambiente do trabalho, pois, participar de políticas, executar serviços ou
coordená-los em caráter complementar não significa poder de polícia
fiscalizatório.
Ao contrário, competirá a inspeção do trabalho, em âmbito federal, ao
MINISTÉRIO DO TRABALHO e não ao SUS (vinculado e exercido pelo Ministério da
Saúde), conforme dispõe a CLT, em seu art. 626:
Art. 626. Incumbe às autoridades competentes do Ministério do Trabalho, ou
àquelas que exerçam funções delegadas, a discalização do fiel cumprimento das
normas de proteção ao trabalho.
11.4 DO POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Instado a se manifestar, o plenário do Supremo Tribunal Federal, através do
julgamento da liminar na ADIMC-1893/RJ – Rel. Min. Marco Aurélio, fixou, por
unanimidade, o posicionamento do Pretório Excelso sobre a matéria.
Por unanimidade, foi conferida liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade,
movida pela Confederação Nacional da Indústria, nos seguintes termos:
ADIMC-1893 / RJ
ACAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR
Relator
Ministro MARCO AURELIO
Publicação
DJ DATA-23-04-99 PP-00002 EMENT VOL-01947-01 PP-00141
Julgamento
18/12/1998 - Tribunal Pleno
Ementa
SEGURANÇA E HIGIENE DO TRABALHO – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA.
Ao primeiro exame, cumpre à União legislar sobre parâmetros alusivos à
prestação de serviços - artigos 21, inciso XXIV, e 22, inciso I, da Constituição
Federal. O gênero "meio ambiente", em relação ao qual é viável a competência
em concurso da União, dos Estados e do Distrito Federal, a teor do disposto no
artigo 24, inciso VI, da Constituição Federal, não abrange o ambiente de
trabalho, muito menos a ponto de chegar -se à fiscalização do local por
autoridade estadual, com imposição de multa. Suspensão da eficácia da Lei nº
2.702, de 1997, do Estado do Rio de Janeiro.
ObservaçãoVotação: Unânime.
Resultado: Deferida.
N.PP.:(13). Análise:(RCO). Revisão:(AAF).
Inclusão: 06/05/99, (MLR).
Partes
REQTE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA - CNI
ADVDOS. : LEONARDO GRECO E OUTROS
REQDO. : GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
REQDA. : ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
O mesmo pronunciamento parece ter fundamentado o acórdão
noticiado no Informativo 142 do STF:
Informativo 142 – STF
Saúde do Trabalhador e Competência
Por aparente ofensa ao art. 22, I, da CF, que determina a competência
privativa da União para legislar sobre direito do trabalho, o Tribunal, em ação
direta proposta pela Confederação Nacional da Indústria-CNI, por maioria,
deferiu, em parte, o pedido de medida cautelar para, dando interpretação
conforme a CF, suspender relativamente aos empregados celetistas, sem
redução de texto, a alínea b do inciso III do art. 3º da Lei 2.586/96 do Estado
do Rio de Janeiro, que estabelece normas de prevenção das doenças e critérios
de defesa da saúde dos trabalhadores em relação às atividades que possam
desencadear lesões por esforços repetitivos - LER. Vencido, em parte, o Min.
Marco Aurélio que, dando interpretação conforme a CF, suspendia
relativamente aos empregados celetistas, sem redução de texto, toda a Lei nº
2.586/96. Vencidos ainda, em parte, os Ministros Néri da Silveira, relator, e
Carlos Velloso que indeferiam integralmente o pedido. ADInMC 1.862-RJ, rel.
Min. Néri da Silveira, 18.3.99.
Muito bem andou a Corte Suprema ao fixar o posicionamento constitucional
sobre a matéria, em linhas simples e sóbrias, evitando a superfetação de entes
fiscalizatórios, incompetentes para tanto, em voracidade fiscal demasiada e, muitas
vezes, a exigência ilegal por parte de fiscais inescrupulosos, como se está a ver nos
noticiários televisivos.
12. NOVOS ASPECTOS JURÍDICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR
ACIDENTE OU DOENÇA DO TRABALHO
12.1 Responsabilidade da empresa e da Previdência Social no infortúnio no
trabalho- Distinções
Por primeiro, não se deve confundir a responsabilidade do empregador em
indenizar o obreiro (responsabilidade civil), com a obrigação previdenciária a cargo do
Estado (responsabilidade acidentária-previdenciária), representado aqui pelo Instituto
Nacional do Seguro Social – INSS.
Com efeito, ocorrido o acidente, três hipóteses poderão existir, conforme o
caso concreto: 1) ambos (empregador e INSS) estarão obrigados a reparar os danos
sofridos pelo trabalhador, cada qual a sua forma; 2) apenas o INSS terá
responsabilidade pelo fato; 3) não haverá obrigação de qualquer deles. A primeira
hipótese será factível quando houver culpa do empregador. A segunda, quando
inexistir negligência patronal. A terceira, quando além de não haver culpa, também
não for devida a prestação de benefício (p.ex.: ato fraudulento do empregado).
Referidas responsabilidades, portanto, são autônomas e estanques, não
havendo influência ou compensação de quantias pagas. Assim, não é lícito ao
empregador abater da indenização que deve ao empregado pelo infortúnio ocorrido o
montante recebido por este último dos órgãos de Previdência.
Em outras palavras: a indenização por responsabilidade civil a cargo da pessoa
jurídica ou empresa individual é cumulável com o recebimento de benefício(s)
previdenciário(s) pagos ao obreiro.
Nesse sentido a jurisprudência é pacífica:
Superior Tribunal de Justiça
"Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Indenização.
Acidente do trabalho. 1. O Acórdão recorrido está devidamente fundamentado,
no sentido de que a culpa no trágico acidente foi exclusivamente da ora
recorrente, estando, também, caracterizados os danos, inclusive morais, sofridos
pela vítima, sendo o valor da pensão fixado com base nos elementos de prova
constantes dos autos. Não há como ultrapassar os fundamentos do Acórdão sem
adentrar o exame de matéria probatória, o que não se admite em sede de
recurso especial. Inevitável a aplicação da Súmula nº 07/STJ. 2. Cabível é a
cumulação da indenização do direito comum com o benefício previdenciário,
sendo o pagamento da indenização devido desde a data do evento danoso. 3. A
indenização por dano moral não exige a ocorrência de dolo no evento danoso. 4.
Dissídio jurisprudencial afastado, em face da incidência da Súmula nº 83/STJ. 5.
Agravo regimental improvido." RELATOR: MINISTRO CARLOS ALBERTO
MENEZES DIREITO FONTE: DJ DATA: 31/05/1999 PG: 00148 ACÓRDÃO: AGA
213226/PR (199800868291) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE
INSTRUMENTO DATA DA DECISÃO: 20/04/1999 ORGÃO JULGADOR: - TERCEIRA
TURMA
Analisemos, pois, as diferenças entre as responsabilidades respectivas.
A pessoa jurídica ou empresa individual, como veremos melhor a seguir,
somente estará obrigada a reparar o obreiro em relação ao dano derivado de acidente
do trabalho se restar evidenciada sua negligência no cumprimento das disposições de
proteção ao trabalho. O mesmo, entretanto, não ocorre com o a responsabilidade
estatal a cargo do INSS, que estará obrigado à prestação do benefício cabível na
espécie, ainda que o acidente não decorra de culpa de qualquer pessoa, ou mesmo que
decorra de culpa exclusiva do trabalhador segurado.
Em outros termos: a responsabilidade do empregador é de natureza subjetiva
(dependente de prova de culpa), enquanto a responsabilidade do INSS é de natureza
objetiva (independente de prova de culpa).
Além disso, a responsabilidade do empregador abrange a indenização por
aquilo que o trabalhador perdeu com o acidente (dano emergente), bem como por
aquilo que deixou de ganhar (lucro cessante), além de outras verbas (danos morais,
estéticos, etc), não havendo qualquer teto ou limite para seu valor, salvo o montante
do dano sofrido.
Já o INSS não presta ao obreiro uma reparação de danos, mas sim um
benefício acidentário (auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez,
etc) que não visa à manutenção do padrão remuneratório percebido pelo trabalhador,
mas sim a garantir-lhe um mínimo para que possa sobreviver dignamente, tendo seu
valor limitado a patamares definidos na legislação.
A indenização devida pela empresa não pressupõe incapacidade do obreiro,
mas sim a comprovação do dano, o que é conceitualmente distinto [01]. Já o pagamento
de benefício previdenciário pressupõe a incapacitação do trabalhador.
Há ainda diferenças de menor monta, como a existência de ações distintas
para que o trabalhador pleiteie seu direito em juízo (ação de indenização contra a
empresa e ação acidentária contra o INSS).
O quadro sinótico a seguir facilitará o entendimento das distinções:
Espécie de responsabilidade pelo infortúnio do trabalho
Pressupostos
Verbas devidas
Limitação de valor
Incapacidade
Responsabilidade civil da pessoa jurídica ou empresa individual
Necessita de prova de culpa (responsabilidade subjetiva)
Inclui o que o empregado perdeu (dano emergente) e o que deixou de ganhar
(lucro cessante), além de outras verbas
Não há limite para a indenização, ressalvado o valor do dano ocasionado
Não se exige prova de incapacidade, mas sim prova do dano
Responsabilidade do INSS
Não necessita de prova de culpa (responsabilidade objetiva)
Benefícios acidentários (auxílio-doença, auxílio acidente, aposentadoria por
invalidez, pensão pormorte)
Há limite legal para a o valor do benefício
Exige-se prova da incapacidade
Vejamos um exemplo concreto para que possamos fixar a responsabilidade
por determinado acidente: imaginemos um empregado que após sair de seu local de
trabalho na direção de seu automóvel venha a se acidentar no trânsito, no trajeto do
trabalho para sua casa, daí resultando lesão corporal incapacitante.
Trata-se de claro acidente de trabalho (acidente de trajeto ou in itinere).
Responderá por ele o INSS? E o empregador?
Claramente, o órgão previdenciário (INSS) estará obrigado à prestação de
benefícios ou serviç os, uma vez que sua responsabilidade independe da perquirição de
culpa. Dessa forma, ainda que a culpa pelo acidente referido seja atribuível ao
trabalhador (culpa exclusiva da vítima) haverá a obrigação mencionada.
No entanto, o empregador não contribuiu culposamente para o acontecimento
mencionado, uma vez que não influiu mediante negligência, imprudência ou imperícia
no resultado ocorrido. Diante disso, não será responsabilizada pelo evento.
Nesse sentido:
Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo
RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DO TRABALHO -
INDENIZAÇÃO - DIREITO COMUM - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E
OBJETIVA - DIFERENÇAS - PROVA QUANTO À CULPA - AUSÊNCIA -
DESCABIMENTO
As ações de indenização por ato ilícito propostas em face das
empregadoras não se confundem com aquelas propostas em face do INSS;
nestas últimas, sendo o réu segurador obrigatório, basta a comprovação do
mal e do nexo; nas primeiras, além do mal e do nexo, deve ficar sobejamente
comprovada a culpa.
Ap. c/ Rev. 603.743-00/6 - 12ª Câm. - Rel. Juiz ROMEU RICUPERO - J.
19.4.2001 (quanto a acidente-tipo) ANOTAÇÃO No mesmo sentido: - quanto a
acidente-tipo: Ap. c/ Rev. 608.523-00/8 - 8ª Câm. - Rel. Juiz ORLANDO
PISTORESI - J. 31.5.2001 - quanto a acidente: AI 715.900-00/6 - 5ª Câm. -
Rel. Juiz LUIZ DE CARVALHO - J. 29.8.2001 - quanto a doença profissional:
Ap. c/ Rev. 482.838-00/0 - JTA (LEX) 168/425 Ap. c/ Rev. 510.097-00/5 - 3ª
Câm. - Rel. Juiz ACLIBES BURGARELLI - J. 17.3.98 Ap. c/ Rev. 517.824-00/0 -
3ª Câm. - Rel. Juiz ACLIBES BURGARELLI - J. 2.6.98 Ap. c/ Rev. 588.454-00/0
- 2ª Câm. - Rel. Juiz FELIPE FERREIRA - J. 9.10.2000 Ap. c/ Rev. 596.215-
00/9 - 3ª Câm. - Rel. Juiz FERRAZ FELISARDO - J. 5.2.2002 - quanto a
acidente ´in itinere´: AI 693.042-00/0 - 5ª Câm. - Rel. Juiz LUÍS DE
CARVALHO - J. 29.8.2001
Feitas as distinções iniciais, passemos as questões mais polêmicas a respeito
do tema.
12.2 A competência para exame da matéria
Com o advento na Emenda Constitucional 45/2004, reinou alguma
controvérsia na jurisprudência do pretório Excelso quanto à definição da Justiça
competente para o processo e julgamento das ações por responsabilidade civil
derivadas de acidentes ou doenças ocupacionais, discutindo-se então se tocariam à
Justiça do Trabalho ou à Justiça Comum.
Historicamente, a matéria sempre esteve submetida ao crivo da Justiça
Comum. Seguindo essa linha, pouco antes da entrada em vigor da Emenda
Constitucional 45/2004, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu a questão,
declarando a competência deste último ramo do Poder Judiciário, conforme decisão
que transcrevemos a seguir.
Supremo Tribunal Federal
RE 349160 / BA - BAHIA
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE
Órgão Julgador: Primeira Turma
Publicação: DJ DATA-19-03-2003 PP-00040 EMENT VOL-02102-04 PP-
00864
Ementa
EMENTA: I. Recurso extraordinário: prequestionamento: Súmula 356.
O que, a teor da Súm. 356, se reputa carente de prequestionamento é o ponto
que, indevidamente omitido pelo acórdão, não foi objeto de embargos de
declaração; mas, opostos esses, se, não obstante, se recusa o Tribunal a
suprir a omissão, por entendê-la inexistente, nada mais se pode exigir da
parte, permitindo-se-lhe, de logo, interpor recurso extraordinário sobre a
matéria dos embargos de declaração e não sobre a recusa, no julgamento
deles, de manifestação sobre ela. II. Competência: Justiça comum: ação de
indenização fundada em acidente de trabalho, ainda quando movida contra o
empregador. 1. É da jurisprudência do STF que, em geral, compete à Justiça
do Trabalho conhecer de ação indenizatória por danos decorrentes da relação
de emprego, não importando deva a controvérsia ser dirimida à luz do direito
comum e não do Direito do Trabalho. 2. Da regra geral são de excluir-se,
porém, por força do art. 109, I, da Constituição, as ações fundadas em
acidente de trabalho, sejam as movidas contra a autarquia seguradora, sejam
as propostas contra o empregador.
Apesar da orientação do STF, vários acórdãos da Justiça do Trabalho haviam
se posicionado em sentido diverso afirmando a competência do Judiciário Trabalhista
para resolver a questão, mantendo intensa controvérsia.
A matéria, entretanto, veio a se pacificar no Supremo Tribunal Federal após
certo período de indecisão, confirmando finalmente o Pretório Excelso que as causas
referentes à responsabilização civil ainda não julgadas serão de competência da Justiça
do Trabalho, enquanto aquelas que já possuírem sentença permanecerão na Justiça
Comum.
Essa foi a decisão tomada no CC 7204/MG (*acórdão publicado no DJU de
9.12.2005), cujo teor de um dos votos transcrevemos a seguir:
Supremo Tribunal Federal
EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA
MATÉRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS
DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO, PROPOSTA PELO EMPREGADO
EM FACE DE SEU (EX-)EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO
TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA. REDAÇÃO ANTERIOR E POSTERIOR À
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/04. EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA COMUM
DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA.
Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de
Outubro, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização
por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda
que movidas pelo empregado contra seu (ex-)empregador, eram da
competência da Justiça comum dos Estados-Membros.
2. Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei
Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja
porque o art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer,
seja porque aquela primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109
estava, em boa verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na
Corte sob a égide das Constituições anteriores.
3. Nada obstante, como imperativo de política judiciária — haja vista o
significativo número de ações que já tramitaram e ainda tramitam nas
instâncias ordinárias, bem como o relevante interesse social em causa —, o
Plenário decidiu, por maioria, que o marco temporal da competência da Justiça
trabalhista é o advento da EC 45/04. Emenda que explicitou a competência da
Justiça Laboral na matéria em apreço.
4. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça
comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito. É dizer: as
ações que tramitam perante a Justiça comum dos Estados, com sentença de
mérito anterior à promulgação da EC 45/04, lá continuam até o trânsito em
julgado e correspondente execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi
apreciado, hão de ser remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se
encontram,com total aproveitamento dos atos praticados até então. A medida
se impõe, em razão das características que distinguem a Justiça comum
estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas recursais, órgãos e instâncias
não guardam exata correlação.
5. O Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição
Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica, atribuir eficácia
prospectiva às suas decisões, com a delimitação precisa dos respectivos
efeitos, toda vez que proceder a revisões de jurisprudência definidora de
competência ex ratione materiae. O escopo é preservar os jurisdicionados de
alterações jurisprudenciais que ocorram sem mudança formal do Magno Texto.
6. Aplicação do precedente consubstanciado no julgamento do
Inquérito 687, Sessão Plenária de 25.08.99, ocasião em que foi cancelada a
Súmula 394 do STF, por incompatível com a Constituição de 1988, ressalvadas
as decisões proferidas na vigência do verbete.
7. Conflito de competência que se resolve, no caso, com o retorno dos
autos ao Tribunal Superior do Trabalho.
Relatório: Trata-se de conflito negativo de competência, suscitado pelo
Tribunal Superior do Trabalho em face do recentemente extinto Tribunal de
Alçada do Estado de Minas Gerais.
2. Por meio dele, conflito, discute-se a competência para processar e
julgar ação indenizatória por danos morais e patrimoniais decorrentes de
acidente do trabalho, quando tal ação é proposta por empregado contra o seu
empregador. Donde a controvérsia: competente é a Justiça comum estadual,
ou a Justiça especializada do trabalho?
3. Pois bem, o fato é que Vicente Giacomini Peron ajuizou, na Justiça
do Trabalho e contra o então Banco do Estado de Minas Gerais/BEMGE, ação
de indenização por motivo de doença profissional. O que levou a Junta de
Conciliação e Julgamento de Ubá/MG a se dar por incompetente e determinar a
remessa dos autos a uma das Varas Cíveis daquela mesma Comarca. Pelo que
a Justiça estadual julgou o pedido parcialmente procedente, resultando daí a
interposição de recurso de apelação pelo Banco demandado.
4. Acontece que, ao apreciar o apelatório, o Tribunal de Alçada de
Minas Gerais declinou de sua competência e determinou a devolução dos autos
à Junta de Conciliação e Julgamento de Ubá/MG. Esta última, agora sim,
aceitou o processamento da ação e, também ela, julgou parcialmente
procedente o pedido do autor. Fato que ensejou a interposição de recurso
ordinário — apenas parcialmente provido pelo TRT/3ª Região — e,
posteriormente, recurso de revista.
5. Foi quando, na análise desta última impugnação, a 5a Turma do
egrégio Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a incompetência da Justiça
especial, de maneira a suscitar o presente conflito negativo de competência
(tendo em vista a recusa anteriormente externada pelo Tribunal de Alçada de
Minas Gerais).
6. Prossigo neste relato para consignar que o Ministério Público
Federal opinou pela procedência da suscitação, em parecer assim ementado:
"CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. QUINTA TURMA DO TST E
TRIBUNAL DE ALÇADA DE MINAS GERAIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR
DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRABALHO.
ART. 109, INCISO I, DA CF, E ART. 114, DA CF, COM A NOVA REDAÇÃO DADA
PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. REMANESCE A COMPETÊNCIA
DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA JULGAR AÇÃO INDENIZATÓRIA FUNDADA EM
ACIDENTE DE TRABALHO. PRECEDENTES. PARECER PELO CONHECIMENTO DO
CONFLITO, PARA QUE SE DECLARE COMPETENTE A JUSTIÇA COMUM
ESTADUAL".
7. É o relatório, que submeto ao egrégio Plenário desta Casa (RI/STF,
art. 6º, inciso I, "d").
Voto: Conforme visto, a questão que se põe neste conflito consiste em
saber a quem compete processar e julgar as ações de reparação de danos
morais e patrimoniais advindos do acidente do trabalho. Ações propostas pelo
empregado em face de seu empregador, de sorte a provocar o seguinte
questionamento: a competência é da Justiça comum estadual, segundo
concluiu o órgão suscitante (TST), ou é da Justiça Obreira, como entendeu o
suscitado (antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais)?
9. Começo por responder que a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal proclama a competência da Justiça trabalhista para o conhecimento
das ações indenizatórias por danos morais decorrentes da relação de emprego.
Pouco importando se a controvérsia comporta resolução à luz do Direito
Comum, e não do Direito do Trabalho. Todavia, desse entendimento o STF
vem excluindo as ações reparadoras de danos morais, fundadas em acidente
do trabalho (ainda que movidas pelo empregado contra seu empregador), para
incluí-las na competência da Justiça comum dos Estados. Isso por conta do
inciso I do art. 109 da Constituição Republicana. Foi o que o Tribunal Pleno
decidiu, por maioria de votos, quando do julgamento do RE 438.639, sessão
do dia 09/03/2005, na qual fiquei vencido, como Relator, na companhia do
eminente Ministro Marco Aurélio.
10. Nada obstante, valendo-me do art. 6º do Regimento Interno da
Casa, trago o presente conflito ao conhecimento deste colendo Plenário para
rediscutir a matéria. É que, a meu sentir, a norma que se colhe do inciso I do
art. 109 da Lei das Leis não autoriza concluir que a Justiça comum estadual
detém competência para apreciar as ações que o empregado propõe contra o
seu empregador, pleiteando reparação por danos morais ou patrimoniais
decorrentes de acidente do trabalho. É dizer: quanto mais reflito sobre a
questão, mais me convenço de que a primeira parte do dispositivo
constitucional determina mesmo que compete aos juízes federais processar e
julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública
federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou
oponentes...". Mas esta é apenas a regra geral, plasmada segundo o critério
de distribuição de competência em razão da pessoa. Impõe-se atentar para a
segunda parte do inciso, assim vocalizada: "...exceto as de falência, as de
acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho". E
esta segunda parte, como exceção que é, deve ser compreendida no contexto
significante daquela primeira, consubstanciadora de regra geral. Em discurso
quiçá mais elucidativo: à luz da segunda parte do inciso I do art. 109 da
Constituição Federal, tem-se que as causas de acidente do trabalho em que a
União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas, na
condição de autora, ré, assistente ou oponente, não são da competência dos
juízes federais.
11. Remarque-se, então, que as causas de acidente do trabalho,
excepcionalmente excluídas da competência dos juízes federais, só podem ser
as chamadas ações acidentárias. Ações, como sabido, movidas pelo segurado
contra o INSS, a fim de discutir questão atinente a benefício previdenciário.
Logo, feitos em que se faz presente interesse de uma autarquia federal, é
certo, mas que, por exceção, se deslocam para a competência da Justiça
comum dos Estados. Por que não repetir? Tais ações, expressamente excluídas
da competência dos juízes federais, passam a caber à Justiça comum dos
Estados, segundo o critério residual de distribuição de competência. Tudo
conforme serena jurisprudência desta nossa Corte de Justiça, cristalizada no
enunciado da Súmula 501.
12. Outra, porém, é a hipótese das ações reparadoras de danos
oriundos de acidente do trabalho, quando ajuizadas pelo empregado contra o
seu empregador. Não contra o INSS. É que, agora, não há interesse da União,
nem de entidade autárquica ou de empresa pública federal, a menos, claro,
que uma delas esteja na condição de empregadora. O interesse, reitere-se,apenas diz respeito ao empregado e seu empregador. Sendo desses dois
únicos protagonistas a legitimidade processual para figurar nos pólos ativo e
passivo da ação, respectivamente. Razão bastante para se perceber que a
regra geral veiculada pela primeira parte do inciso I do art. 109 da Lei Maior —
definidora de competência em razão da pessoa que integre a lide — não tem
como ser erigida a norma de incidência, visto que ela não trata de relação
jurídica entre empregados e empregadores. Já a parte final do inciso I do art.
109 da Magna Carta, segundo demonstrado, cuida é de outra coisa:
excepcionar as hipóteses em que a competência seria da própria Justiça
Federal.
13. Deveras, se a vontade objetiva do Magno Texto fosse excluir da
competência da Justiça do Trabalho matéria ontologicamente afeita a ela,
Justiça Obreira, certamente que o faria no próprio âmbito do art. 114. Jamais
no contexto do art. 109, versante, este último, sobre competência de uma
outra categoria de juízes.
14. Noutro modo de dizer as coisas, não se encaixando em nenhuma
das duas partes do inciso I do art. 109 as ações reparadoras de danos
resultantes de acidente do trabalho, em que locus da Constituição elas
encontrariam sua específica norma de regência? Justamente no art. 114, que
proclama a competência da Justiça especial aqui tantas vezes encarecida.
Competência que de pronto se define pelo exclusivo fato de o litígio eclodir
entre trabalhadores e empregadores, como figura logo no início do texto
normativo em foco. E já me antecipando, ajuízo que a nova redação que a EC
nº 45/04 conferiu a esse dispositivo, para abrir significativamente o leque das
competências da Justiça Laboral em razão da matéria, só veio robustecer o
entendimento aqui esposado.
15. Com efeito, estabelecia o caput do art. 114, em sua redação
anterior, que era da Justiça do Trabalho a competência para conciliar e julgar
os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além
de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho. Ora, um acidente
de trabalho é fato ínsito à interação trabalhador/empregador. A causa e seu
efeito. Porque sem o vínculo trabalhista o infortúnio não se configuraria; ou
seja, o acidente só é acidente de trabalho se ocorre no próprio âmago da
relação laboral. A possibilitar a deflagração de efeitos morais e patrimoniais
imputáveis à responsabilidade do empregador, em regra, ora por conduta
comissiva, ora por comportamento omissivo.
16. Como de fácil percepção, para se aferir os próprios elementos do
ilícito, sobretudo a culpa e o nexo causal, é imprescindível que se esteja mais
próximo do dia-a-dia da complexa realidade laboral. Aspecto em que avulta a
especialização mesma de que se revestem os órgãos judicantes de índole
trabalhista. É como dizer: órgãos que se debruçam cotidianamente sobre os
fatos atinentes à relação de emprego (muitas vezes quanto à própria
existência dela) e que por isso mesmo detêm melhores condições para
apreciar toda a trama dos delicados aspectos objetivos e subjetivos que
permeiam a relação de emprego. Daí o conteúdo semântico da Súmula 736,
deste Excelso Pretório, assim didaticamente legendada: "Compete à Justiça do
Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento
de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos
trabalhadores".
17. Em resumo, a relação de trabalho é a invariável matriz das
controvérsias que se instauram entre trabalhadores e empregadores. Já a
matéria genuinamente acidentária, voltada para o benefício previdenciário
correspondente, é de ser discutida com o INSS, perante a Justiça comum dos
Estados, por aplicação da norma residual que se extrai do inciso I do art. 109
da Carta de Outubro.
18. Nesse rumo de idéias, renove-se a proposição de que a nova
redação do art. 114 da Lex Maxima só veio aclarar, expletivamente, a
interpretação aqui perfilhada. Pois a Justiça do Trabalho, que já era
competente para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre
trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da
relação trabalhista, agora é confirmativamente competente para processar e
julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da
relação de trabalho (inciso VI do art. 114).
19. Acresce que a norma fundamental do inciso IV do art. 1o da
Constituição Republicana ganha especificação trabalhista em vários
dispositivos do art. 7o, como o que prevê a redução dos riscos inerentes ao
trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso XXII), e o
que impõe a obrigação do seguro contra acidente do trabalho, sem prejuízo,
note-se, da indenização por motivo de conduta dolosa ou culposa do
empregador (inciso XXVIII). Vale dizer, o direito à indenização em caso de
acidente de trabalho, quando o empregador incorrer em dolo ou culpa, vem
enumerado no art. 7o da Lei Maior como autêntico direito trabalhista. E como
todo direito trabalhista, é de ser tutelado pela Justiça especial, até porque
desfrutável às custas do empregador (nos expressos dizeres da Constituição).
20. Tudo comprova, portanto, que a longa enunciação dos direitos
trabalhistas veiculados pelo art. 7o da Constituição parte de um pressuposto
lógico: a hipossuficiência do trabalhador perante seu empregador. A exigir,
assim, interpretação extensiva ou ampliativa, de sorte a autorizar o juízo de
que, ante duas defensáveis exegeses do texto constitucional (art. 114, como
penso, ou art. 109, I, como tem entendido esta Casa), deve-se optar pela que
prestigia a competência especializada da Justiça do Trabalho.
21. Por todo o exposto, e forte no art. 114 da Lei Maior (redações
anterior e posterior à EC 45/04), concluo que não se pode excluir da
competência da Justiça Laboral as ações de reparação de danos morais e
patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho, propostas pelo empregado
contra o empregador. Menos ainda para incluí-las na competência da Justiça
comum estadual, com base no art. 109, inciso I, da Carta de Outubro.
22. No caso, pois, julgo improcedente este conflito de competência e
determino o retorno dos autos ao egrégio Tribunal Superior do Trabalho, para
que proceda ao julgamento do recurso de revista manejado pelo empregador.
É o meu voto.
Essa linha, aliás, já vinha sendo adotada pelo STF quando da
elaboração da Súmula 736, publicada no DJ de 09/12/2003, com o seguinte
texto: "Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa
de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança,
higiene e saúde dos trabalhadores", que dizia respeito particularmente ao
ajuizamento de ações civis públicas para obrigar os empregadores ao
cumprimento de normas de segurança e saúde ocupacional.
O Superior Tribunal de Justiça acabou também por acolher o
entendimento supracitado, afirmando competir à Justiça do Trabalho processar
e julgar ações de indenização por dano moral decorrentes de acidente de
trabalho, desde que ainda não prolatada sentença na Justiça comum (art. 114
da CF/1988 com nova redação a partir da EC n. 45/2004) no julgamento do
AgRg no CC 53.744-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/11/2005.
Diante disso, podemos dizer que a competência para julgamento das ações de
responsabilidade civil movidas pelo empregado em face do empregador tendo como
causa de pedir a ocorrência de acidente ou doença do trabalho está praticamente
pacificada. Restará à Justiça do Trabalho formar novos entendimentos sobre a matéria
(ou acompanhar aqueles anteriormente fixados pela Justiça Estadual).
12.3 Responsabilidade civil. É ainda necessáriaa existência de culpa do
empregador?
A responsabilidade civil se consubstancia na obrigação de reparar o dano, por
todo aquele que, por ação ou omissão voluntária, imprudência, negligência ou
imperícia, violar direito ou causar prejuízo a outrem.
Doutrinariamente, até sob o ponto de vista histórico e ressalvadas algumas
exceções pontuais, sempre se reconheceu no ordenamento jurídico pátrio que seria
necessária à responsabilização civil em geral a presença dos seguintes pressupostos:
1.Ação ou omissão do empregador ou responsável técnico;
2.Existência de dolo (intenção) ou culpa (não observância de um
dever de cuidado imposto em norma) na ação ou omissão supracitadas;
3.Resultado lesivo ao empregado (dano);
4.Nexo de causalidade entre a ação ou omissão do empregador
ou responsável técnico e o resultado lesivo ocorrido;
Porém, o novo Código Civil (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002) inovou a
matéria, suscitando dúvidas sobre a necessidade da culpa para a indenização em
matéria de infortúnio do trabalho, havendo alguns intérpretes favoráveis à adoção da
responsabilidade objetiva (sem culpa) para tais casos.
A polêmica foi inaugurada com a redação de referido diploma legal, que em
seu art. 927 e parágrafo único, dispõe:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar
dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando
a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por
sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Nos termo s do dispositivo supracitado, considerando que a atividade
empresarial causa riscos ao empregado, argumentam alguns que a responsabilidade
no caso seria objetiva (independente de culpa), ou mesmo que haveria uma presunção
de culpa do empregador no infortúnio, consubstanciando uma inversão do ônus
probatório.
É o caso do ilustre doutrinador Sebastião Geraldo de Oliveira, em recente
obra, na qual, visualizando as futuras tendências da questão ora abordada e citando a
doutrina anterior, argumenta: "[...] Conforme se depreende do exposto, entendemos
perfeitamente aplicável a teoria do risco na reparação civil por acidente do trabalho
[...] Se um autônomo ou um empreiteiro sofrer acidente, o tomador dos serviços
responde pela indenização, independente da culpa, com apoio na teoria do risco; no
entanto, o trabalhador permanente, com os devidos registros formalizados, não tem
assegurada essa reparação! Se um bem ou equipamento de terceiros for danificado
pela atividade empresarial, haverá indenização, considerando os pressupostos da
responsabilidade objetiva, mas o trabalhador, exatamente aquele que executa a
atividade, ficará excluído[...]".
Muito embora enalteçamos o ilustre doutrinador, ousamos divergir de referido
posicionamento.
Primordialmente, há aqui uma questão relativa à hierarquia das normas, uma
vez que o art. 7o, XXVIII, da Constituição, preceitua serem direitos dos trabalhadores
urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do
empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado,
quando incorrer em dolo ou culpa; (grifos nossos).
Assim, entendemos que se a Constituição da República exige a existência de
culpa para a responsabilização, não poderá a legislação ordinária dispensá-la, pena de
se tornar inconstitucional.
Ao depois, não concordamos que a teoria do risco venha a se aplicar a
autônomos ou a empreiteiros, pois será também exigível em tais casos, por
similaridade de circunstâncias, a existência de culpa para fundamentar a
responsabilização.
Por fim, entendemos que a mera ocorrência de risco na atividade não é
suficiente e nem constitui o princípio basilar por trás da responsabilização objetiva.
Como ressalta Fábio Ulhoa Coelho, o fundamento primeiro da existência da
responsabilização sem culpa (responsabilidade objetiva) não é meramente a existência
de risco ou a vontade de praticar determinada atividade à qual o risco seja inerente,
mas sim a possibilidade de que o custo de determinada atividade venha a ser
repassado à sociedade como um todo.
Segundo este último, "A doutrina costuma apontar o risco,
inerente ao exercício de determina atividade, como o fundamento da
responsabilidade objetiva (Savatier, 1945; Lima, 1960; Dias, 1979:
passim). O fabricante de fármacos assume forçosamente um risco,
inerente à exploração de qualquer atividade econômica, que é o de
produzir e comercializar algumas unidades com defeitos. Pois bem, seria
tal risco o fundamento valorativo para as normas jurídicas
estabelecedoras da responsabilidade objetiva: da opção de o assumir
decorreria, segundo tal formulação, a justeza da imputação do dever de
indenizar. No final, não se livram os partidários dessa doutrina de algum
apego à noção clássica da vontade do devedor como fonte da obrigação.
De fato, ao se tomar o risco de determinada atividade por fundamento
da responsabilidade objetiva, considera-se o demandado responsável
pelo dano, em última análise, em razão de ter ele querido dedicar-se à
atividade [...] Não é esse, contudo, o melhor enfoque a ser emprestado
à matéria. Na verdade, o fundamento axiológico e racional para a
responsabilidade objetiva não são propriamente os riscos da atividade,
mas a possibilidade de se absorverem as repercussões econômicas
ligadas ao evento danoso, por meio da distribuição do correspondente
custo entre as pessoas expostas ao mesmo dano ou, de algum modo,
beneficiárias do evento. É o mecanismo da socialização da das
repercussões econômicas do dano, que torna justa a imputação da
responsabilidade aos agentes em condições de o acionar. Note-se que o
Estado pode responder objetivamente pelos danos causados por seus
funcionários, porque tem meios para distribuir entre os contribuintes –
mediante criação e cobrança de tributos – os encargos derivados de sua
responsabilização. Por outro lado, o fornecedor pode ter
responsabilidade objetiva por acidentes de consumo, na medida em que
consegue incluir na composição de seus preços um elemento de custo
correspondente às indenizações por aqueles acidentes[...]"
Verifica-se, porém, que, para o Direito do Trabalho o conceito de empregador
abrange não só aquele que exerce a atividade empresarial, mas também aqueles que
se equiparam a empregador (art. 2º, §1º, da CLT), sendo enquadrados nesta última
categoria os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações
recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores
como empregados.
A situação econômica e financeira dessas últimas categorias é muito diferente
daquela inerente aos empregadores praticantes de atividade empresarial em sentido
estrito.
Poderá, por exemplo, o profissional liberal, acionado por seu empregado em
virtude de uma doença do trabalho adquirida no ambiente laboral e sendo obrigado a
repará-lo (embora não tenha a ele dado causa culposamente), repassar tais custos à
coletividade?
Sabe-se bem que dificilmente se conseguirá essa proeza. Se até mesmo as
grandes empresas nos dias de hoje têm enormes dificuldades em repassar seus custos
aos preços diante de condições maiores ou menores de elasticidade de demanda, mais
ainda terão as instituições sem fins lucrativos, as associações e os profissionais
liberais.
Ademais, dizer que a responsabilidade da pessoajurídica ou empresa
individual é objetiva, independendo da prova de culpa, além de afrontar diretamente o
texto constitucional, torna a empresa obrigada a reparar eventos infortunísticos em
que facilmente se constata a injustiça da responsabilização. Basta para tanto
verificarmos três tipos de infortúnios do trabalho que ocorrem com razoável freqüência
na prática, sem qualquer concurso culposo do empregador:
- Acidente de trajeto ou in itinere: como vimos anteriormente, o acidente
ocorrido com o empregado quando no trajeto casa-trabalho, trabalho-casa é
conceituado como acidente do trabalho pela Lei 8.213/91, fato este que ocorre em
regra sem qualquer intervenção do empregador. Não obstante, caso aplicada a teoria
da responsabilidade civil objetiva, a empresa estará obrigada a indenizar o empregado
ou a família deste por fato ocorrido sem sua intervenção culposa (mas sim por culpa
de terceiro ou do próprio empregado, p.ex.: abuso de velocidade, embriaguez, etc).
Será justo responsabilizar o empregador por tal fato, fazendo-o desembolsar quantias
que podem superar vultosa quantia?
- Hipersuscetibilidade individual do empregado: há casos práticos de
empregados que são hipersuscetíveis a determinados agentes existentes no ambiente
de trabalho, ou mesmo a materiais que não representam risco algum. Verifique-se, por
exemplo, o caso de empregado que adquire dermatose ocupacional de natureza
alérgica pelo uso de equipamentos de proteção individual (luvas, máscara ou bota), ou
mesmo daquele empregado que por sua excepcional suscetibilidade vem a contrair
perda auditiva, mesmo em ambiente de trabalho cujos níveis de ruído foram mantidos
abaixo do nível de ação (metade da dose - norma NR-9). Seria justo que o
empregador respondesse pela hipersuscetibilidade do empregado? Cremos que não
- Culpa exclusiva do empregado no acidente: Suponhamos o caso do
empregado que, mesmo treinado e advertido pelo empregador, vem a retirar as
proteções de uma determinada máquina para dar-lhe maior produtividade, vindo
posteriormente a se acidentar em referido equipamento. E nem se argumente que a
culpa exclusiva exclui o nexo causal, como querem alguns doutrinadores, pois que em
tal caso é indiscutível a presença de tal vínculo com o trabalho, tanto assim que é
indubitável a obrigação de reparar o infortúnio a cargo do INSS (cuja responsabilização
é de natureza objetiva) pelo pagamento de benefício acidentário em caso de culpa
exclusiva da vítima. Seria justo responsabilizar o empregador pelo fato? Mais uma vez
entendemos pela negativa
Daí porque concordamos com RUI STOCO no que preceitua: "Há intérpretes
que visualizaram, a partir da vigência do Código Civil de 2002, a possibilidade de os
acidentes do trabalho serem enquadrados como intercorrências que ensejam
responsabilidade objetiva ou independente de culpa do empregador, com supedâneo
no referido art. 927, parágrafo único, quando o empregador exerça atividade perigosa
ou que exponha a riscos, como, por exemplo, Henrique Gomes Batista (Código Civil
altera indenizações. Valor Econômico – Caderno de Legislação, 19.02.2002). Não
vemos essa possibilidade, pois a responsabilidade civil, nas hipót eses de acidente do
trabalho com suporte na culpa (lato sensu) do patrão está expressamente prevista na
Constituição Federal".
Argumentam ainda alguns que a responsabilidade pelo dano ambiental é
objetiva (art. 14, §1º, da Lei 6.938/81) e que assim também deveria ser o regime de
responsabilização pelos acidentes e doenças do trabalho.
Também não chegam a convencer os argumentos citados. Com efeito, quando
a legislação impõe a responsabilidade objetiva do poluidor ambiental está visando
prioritariamente àquele que exerce atividade industrial em larga escala e cuja
atividade prejudica a coletividade como um todo (p.ex.: atividades extrativas,
mineração, etc). Tem ele, em regra, a estruturação empresarial e poderá repassar
seus riscos ao consumidor por intermédio de seus preços.
Não ocorre a mesma situação com os acidentes e doenças do trabalho, que,
além de não ocorrerem somente em atividades de maior porte, são individualizados
por trabalhador ou pequenos grupos de trabalhadores, não afetando a coletividade
como um todo, salvo se considerarmos os efeitos indiretos de tais eventos.
Assim sendo, para que haja responsabilidade civil do empregador é preciso
que este, por si ou por intermédio de seus representantes, atue ou se omita dolosa
(intencionalmente) ou culposamente (sem intenção, mas deixando de observar, por
negligência, imprudência ou imperícia, um dever de cuidado imposto em norma).
Caso inexistam tais pressupostos (dolo ou culpa), nem por isso o infortúnio
restará não de alguma forma reparado, pois que ficará a cargo dos órgãos estatais
previdenciários a prestação de benefícios ao obreiro. No entanto, não haverá
indenização a ser paga por parte do empregador.
Cabe salientar, por fim, que a jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho
de São Paulo, após o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, parece se manter
firme na linha ora defendida, qual seja, a necessidade, mesmo após a superveniência
do Código Civil, da existência de culpa do empregador, para a existência da
responsabilidade civil por acidente ou doença do trabalho.
Nesse sentido:
Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
DOENÇA PROFISSIONAL - Indenização por danos materiais e morais -
Requisitos: prática de ato ilícito (por ação ou omissão, decorrente de dolo ou
culpa), verificação de prejuízo e nexo causal entre ação e dano - Trata-se de
responsabilidade subjetiva do empregador, dependente de aferição de culpa ou
dolo - A responsabilidade objetiva restringe-se ao órgão previdenciário, cuja
obrigação nasce da mera constatação do infortúnio. TRT/SP -
01187200204802008 - RO - Ac. 7ªT 20050595177 - Rel. CATIA LUNGOV -
DOE 09/09/2005
Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
ACÓRDÃO Nº: 20060136957 Nº de Pauta:025
PROCESSO TRT/SP Nº: 01321200307802003
RECURSO ORDINÁRIO - 78 VT de São Paulo
RECORRENTE: CARLOS ROBERTO OLIVEIRA
RECORRIDO: INSTITUTO CRIANÇA CIDADÃ
EMENTA
A indenização por acidente do trabalho só é devida na hipótese de
culpa do empregador, nos termos do art. 186 e 927 do Código Civil.
Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
Danos materiais e morais. Redução da capacidade auditiva. Culpa da
empresa não evidenciada. Nexo causal não estabelecido. Pedido improcedente.
Prova documental e testemunhal que revela ter a empresa observado, com
rigor, as normas de medicina e segurança do trabalho, especialmente quanto
ao fornecimento e fiscalização do uso do protetor auricular. Hipótese em que o
próprio autor foi integrante da CIPA, durante dois anos. Prova (confissão) a
indicar que o autor exerceu, antes, atividade que o expunha a níveis
excessivos de ruído, sem proteção. Exames médicos que já indicavam trauma
acústico no período inicial do contrato de trabalho. Circunstâncias que,
somadas, afastam a idéia de culpa do empregador e o próprio nexo etiológico.
Pedido improcedente. Sentença mantida. TRT/SP - 00860200608902001 - RO
- Ac. 11ªT 20060286380 - Rel. EDUARDO DE AZEVEDO SILVA - DOE
19/05/2006.
Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
ACÓRDÃO NUM: 20050887968 DECISÃO: 06 12 2005TIPO: RO01
NUM: 00714 ANO: 2004 NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 00714-2003-302-02-
00RECURSO ORDINÁRIOTURMA: 10ª ÓRGÃO JULGADOR - DÉCIMA TURMA
FONTEDOE SP, PJ, TRT 2ª Data: 17/01/2006 PG:
RELATOR: EDIVALDO DE JESUS TEIXEIRA
REVISOR(A):RILMA APARECIDA HEMETÉRIO
EMENTA
DANO MATERIAL E MORAL DECORRENTE DE ACIDENTE DO
TRABALHO. NECESSIDADE DE PROVA DA CULPA DO EMPREGADOR. A culpa,
nessa hipótese, não se presume. Necessária a existência de prova apta a
demonstrar que o empregador, por omissão voluntária, negligência ou
imprudência, tenha dado causa à eclosão do acidente de trabalho (artigos 7º,
XXVIII, CF, 159, CC/1916, 186 e 927 CC/2002). Veja-se que a norma regente
relaciona a responsabilidade do agente à prática de ato ilícito, ou seja,
contrário à ordem jurídica vigente. Como destaca Caio Mario "a iliceidade da
conduta está no procedimento contrário a um dever preexistente". O ato ilícito,
segundo a doutrina, pode ser comissivo ou omissivo. O primeiro, se
materializa quando o agente orienta sua ação num sentido contraveniente à
lei; o segundo eclode quando o agente se abstém de atuar e, com sua inércia,
viola um direito predeterminado. Inexistente prova de que a empresa tenha
agido em desconformidade com o ordenamento jurídico, evidente a
inexistência do dever de indenizar.
Diferem as responsabilidades do empregador e do órgão previdenciário estatal (INSS)
na ocorrência de infortúnios laborais. Ao primeiro, caberá a indenização do obreiro em
caso de procedimento negligente patronal. Ao segundo, incumbirá, independentemente
da prova de culpa, a prestação do benefício cabível na espécie;
Pacificou-se na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a competência da Justiça
do Trabalho para o processo e julgamento das ações envolvendo responsabilidade civil
de empregador decorrente de acidente do trabalho ou doença ocupacional;
Com o advento do novo Código Civil (Lei 10.406/2002) alguns doutrinadores entendem
que a responsabilidade do empregador por acidentes ou doenças do trabalho passou a
ser objetiva (sem a exigência de prova de culpa), posição com a qual não concordamos
pelos seguintes motivos: 1) diante da redação do art. 7º, XXVIII, da Constituição
Federal, subsiste a necessidade de culpa; 2) em face da impossibilidade de distribuição
das perdas à coletividade de todos os empregadores sujeitos a tal regime; 3) referida
disciplina poderá levar a sérias injustiças nos casos concretos.
13. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO NO SETOR RURAL
Se, no geral, o Brasil registra marcas preocupantes com relação aos acidentes
do trabalho, no setor ru ral a situação é muito pior. Enquanto na área rural um índice
de 1,29% dos acidentes terminam com morte, no campo esse percentual aumenta
para 2,57%, além do que é na área agrícola que o número de acidentes não-
registrados é muitíssimo maior do que nos centros urbanos, porque, naturalmente, lá o
índice de trabalhadores sem registro em carteira é consideravelmente maior, a ponto
de a OIT - Organização Internacional do Trabalho - afirmar que os trabalhadores
agrícolas correm, pelo menos, o dobro de riscos de morrer no local de trabalho do que
os empregados dos demais setores ("O Globo", pág. 25, de 17.2.98). Afirma, ainda,
aquela organização, que a situação é mais grave nos países em desenvolvimento,
devido aos baixos índices educacionais.
Lamentavelmente, no meio rural brasileiro, em especial, temos os ma iores
índices de analfabetismo, falta de instrução e alto índice de miséria, que contribuem
para a manutenção das precárias condições de trabalho desses irmãos brasileiros que
produzem o feijão e o arroz da mesa de milhões de brasileiros. As principais causas de
acidentes no campo são a falta de treinamento para lidar com maquinário, com
agrotóxicos e, ainda, inexistência, em muitos casos, de equipamentos adequados de
proteção individual e coletiva. Segundo Eduardo Garcia, engenheiro agrônomo e
pesquisador da FUNDACENTRO, os maiores problemas com intoxicação ocorrem nas
culturas de melancia, soja, batata, algodão e tomate (entrevista no jornal "O Globo”,
de17.02.98).
"Dados de pesquisa entre produtores e trabalhadores rurais mostram o alto
risco do uso de agrotóxicos na agricultura paulista, que pode estar trazendo sérios
prejuízos à saúde pública e ao meio ambiente. O levantamento é o primeiro resultado
de um convênio assinado no ano passado, entre a FUNDACENTRO e a Secretaria da
Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, para implementação do Programa
de Segurança e Saúde do Trabalhador Rural" (Revista da FUNDACENTRO, ano II, nº 7,
pág.23).
Conforme essa pesquisa, o Brasil consome 1/5 de todo o agrotóxico utilizado
pelo terceiro mundo, dado esse alarmante, levando-se em conta que, entre 1995 e
1996, houve um aumento de 16,7%, o que ensejou o seguinte comentário do já
mencionado engenheiro agrônomo da FUNDACENTRO : "A falta de orientação e controle
sobre o uso de agrotóxico, além da carência de informações sobre outras técnicas de
manejo fitossanitário, que reduzam a necessidade do produto, têm impacto direto na
saúde e segurança dos trabalhadores rurais, no meio ambiente e na qualidade dos
alime ntos que são levados à mesa do consumidor".
O pior é que o uso de agrotóxicos vem aumentando no campo, sem controle.
Além dos adultos, vem sofrendo suas conseqüências também os menores que
manuseiam com a mais absoluta normalidade qualquer tipo de defensivo agrícola,
conforme temos constatado em Inquéritos Civis Públicos que apuram irregularidades
do trabalho do menor e do meio ambiente do trabalho - irregularidades essas
mostradas vez por outra pelas redes de televisão do país.
As conseqüências do uso dos agrotóxicos pelos trabalhadores rurais podem
acompanhá-los pelo resto de suas vidas. Como prova disso, lembramos que o país
inteiro foi tomado por comoção nacional, quando da morte de Leandro, integrante de
uma das mais conceituadas duplas sertanejas. Acometido por um tumor cancerígeno,
de espécie rara, veio a óbito, cujas causas estão sendo hoje discutidas na classe
médica, com, inclusive, suspeitas de que o mal tenha sido gerado quando ele
trabalhava na lavoura do tomate, em meio a intensivo uso de agrotóxicos, segundo
veiculado no dia 1º.7.98, pela jornalista Marília Gabriela, no Programa SBT-Repórter.
Mas, se a falta de cultura e instrução do trabalhador rural contribuem para o
aumento dos acidentes de trabalho, por outro lado, patrões inconseqüentes têm
colocado em risco a saúde e segurança de milhares de bóias-frias catadores de laranja,
"pulverizando-os", antes de entrarem nas fazendas, com um agrotóxico chamado
QUATERMON, cuja autorização pelo Ministério da Saúde destina-se apenas à
pulverização da lavoura, veículos e equipamentos agrícolas e, jamais, do ser humano.
Esse tipo de atitude descabida e desumana tem rendido ensejo à instauração de
Inquéritos Civis Públicos pelo Ministério Público do Trabalho, com embasamento na
atuação fiscalizatória do Ministério do Trabalho e até o ajuizamento de Ações Civis
Públicas para coibi-las, como ocorreu no processo nº 1925/97, da 2ª JCJ de
Araraquara, quando, liminarmente, foi determinada, mediante cominação de multa, a
suspensão dos "banhos" de defensivos agrícolas que vinham tomando os trabalhadores
pela manhã, antes de adentrarem os pomares de laranja, como se instrumentos
fossem.
Merecem também registro os acidentes, não raros, sofridos por trabalhadores
rurais no transporte para o trabalho, muitas vezes em razão das péssimas condições
de uso dos velhos e inadequados veículos utilizados quase sempre pelos "gatos" que
estão a serviço dos donos do capital e que também correm risco de vida, como
recentemente noticiou a imprensa ("O Estado de São Paulo", cad. 6-6, de 23.6.98) a
morte de mais 12 bóias-frias, em Olímpia, região de São José do Rio Preto, em São
Paulo. Também em 6.11.97, no município de Macatuba-SP, outros 19 trabalhadores
rurais foram vitimados por um acidente rodoviário, quando se dirigiam para o trabalho,
cuja apuração, peloMinistério Público do Trabalho (Procedimento Investigatório nº
999/97-5), constatou que os mesmos sequer tinham registro em carteira, o que levou
à responsabilização dos tomadores dos serviços pelas indenizações devidas - o que é
pouco, pois é urgente que se aplique o Código Penal a quem coloca em risco a vida de
trabalhadores.
Nos últimos tempos, tem sido decisivo, para o aumento dos acidentes de
trabalho e degradação das condições de trabalho e vida dos trabalhadores rura is, o
implemento de cooperativas de trabalho fraudulentas, que, a pretexto de criar
empregos, na verdade vêm substituindo antigos postos de trabalho regidos pela CLT,
por trabalho precarizado, sem qualquer garantia e segurança para o cidadão que
trabalha no campo. Neste caso, dificulta-se a fiscalização do meio ambiente do
trabalho porque, segundo a expressão usual, os "cooperados" são trabalhadores
autônomos - ou anônimos como os próprios assim se denominam - e desta forma os
tomadores e beneficiários da mão-de-obra se dizem isentos de qualquer
responsabilidade pelo cumprimento das normas de segurança e higiene no trabalho. E,
no final, a sociedade inteira paga a conta! Aliás, não é só no setor rural que vem
ocorrendo essa situação de risco, pois com a onda de desregulamentação atual do
Direito Laboral, como pregam os neoliberais radicais e vêm aplicando os capitalistas
inconseqüentes, daqui há pouco talvez nem mais se tenha Direito do Trabalho para
preocupar os senhores tecnocratas da economia globalizada. E tudo volta ao que era
antes.
13.1 NORMAS REGULAMENTADORAS SOBRE O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO
RURAL
A Lei nº 5.889/73 - Estatuto do Trabalhador Rural - estabeleceu, no artigo 13,
que nos locais de trabalho rural serão observadas as normas de segurança e higiene
estabelecidas em Portaria do Ministério do Trabalho e Previdência Social.
Assim, em 1988, o MTb baixou a Portaria nº 3.067 que aprovou Normas
Regulamentadoras Rurais – NRRs – relativas à Segurança e Higiene do Trabalho Rural.
São cinco NRRs que tratam de: Disposições Gerais (NRR- 1); Serviços
Especializados em Prevenção de Acidentes do Trabalho Rural – SEPATR (NRR-2);
Comissão Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho Rural – CIPATR (NRR-3);
Equipamentos de Proteção Individual – EPI (NRR-4) e de Produtos Químicos (NRR-5).
Essas normas, evidentemente, não afastam a aplicação de outras que tratem da
matéria, quando compatíveis, como, por exemplo, as NRs baixadas pela Portaria nº
3.214/78. Alguns itens dessas NRRs merecem destaque.
No item 1.7 estabeleceu-se que cabe ao empregador rural: a) cumprir e fazer
cumprir as NRRs; b) expedir e divulgar ordens de serviço sobre segurança e higiene do
trabalho rural, tendo em conta os riscos genéricos e específicos do estabelecimento e
de cada atividade; c) orientar os trabalhadores sobre técnicas prevencionistas a serem
adotadas, objetivando evitar acidentes do trabalho e doenças profissionais; d)
determinar os procedimentos que deverão ser adotados em caso de acidentes do
trabalho rural; e) colaborar com as autoridades na adoção de medidas que visem à
proteção dos trabalhadores rurais.
Item 1.8 – Cabe ao trabalhador rural: a) cumprir as NRRs, bem como as ordens
de serviço que forem estabelecidas para o desempenho de suas funções; b) usar,
obrigatoriamente, os EPIs.
Item 1.9 – Constitui falta grave a recusa injustificada do empregado ao
cumprimento das disposições das NRRs.
Item 1.10 – Constituem direitos dos trabalhadores: a) conhecer os riscos de
suas atividades; b) promover a correção dos riscos; c) denunciar à autoridade
competente a existência de atividades em condições de riscos graves e iminentes.
Item 1.11 – Nos cursos e treinamentos de formação profissional rural
promovidos pelo Serviço de Formação Profissional Rural – SENAR, serão incluídos
tópicos sobre prevenção de riscos e acidentes do trabalho de acordo com as
peculiaridades da atividade.
Item 1.12 – Além das NRRs, aplicam-se ao trabalho rural, no que couber, as
seguintes Normas Regulamentadoras – NRs aprovadas pela Portaria nº 3.214, de 08
de junho de l978, observadas as alterações posteriores: a) NR-7 - Exame médico; b)
NR-15 – Atividades e operações insalubres; c) NR-16 – Atividades e operações
perigosas.
Item 3.1 – O empregador rural que mantenha a média de 20 ou mais
trabalhadores fica obrigado a organizar e manter em funcionamento, por
estabelecimento, uma Comissão Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho Rural
– CIPATR.
Item 3.5 – O mandato dos membros da CIPATR será de 2 anos, permitida uma
recondução.
13.2 PREVENÇÃO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO RURAL
Como consta da Portaria 3.067/88 e de outras normas legais, cabe ao Ministério
do Trabalho, através dos seus órgãos, coordenar, orientar e fiscalizar sobre o
cumprimento das normas legais sobre o meio ambiente do trabalho rural, no âmbito
administrativo, usando, se for o caso, do poder de polícia, autuando e aplicando multas
aos infratores das normas atinentes. Mas é certo que nem sempre essa atuação surte
os efeitos desejados, mesmo esgotando o Ministério todos os seus recursos. Daí, surge
a atuação do Ministério Público do Trabalho, como instituição que tem por dever
defender a ordem jurídica como um todo e os interesses indisponíveis da sociedade.
Com a Constituição de 1988, que priorizou e incentivou a questão da prevenção
de acidentes e alterou substancialmente as atribuições do Ministério Público do
Trabalho, novas ações passaram a ser ajuizadas, agora buscando-se obrigar o
empregador a cumprir as normas de segurança e higiene e prevenir efetivamente o
meio ambiente do trabalho. Estas são as novas Ações Civis Públicas, conforme
tratamos no nosso "Segurança e meio ambiente do trabalho: uma questão de ordem
pública", in Genesis - Revista de Direito do Trabalho, nº 37.
Entretanto, dúvida tem surgido sobre qual o juízo competente para apreciar e
julgar tais ações envolvendo o meio ambiente do trabalho: o comum ou o trabalhista?
Uns defendem a competência da Justiça Comum dos Estados, por entender que
se trata de uma questão entre o Estado que tem o dever de garantir o direito à saúde
e à segurança do trabalhador, e um estabelecimento industrial, comercial ou agrícola.
A este argumento, acrescenta-se aquele de que as questões acidentárias são sempre
da competência da Justiça Comum, como previam as Constituições da República, antes
da Carta de 1988 (in "Meio Ambiente do Trabalho: Prevenção e Reparação. Juízo
Competente", Revista do Ministério Público do Trabalho, Brasília, nº 14, 9/1997), cujo
preceito a respeito tinha o seguinte teor: "Os dissídios relativos a acidentes do trabalho
são da competência da Justiça Ordinária".
A partir da análise dos comandos constitucionais que vêm tratando da questão
desde 1946 e, sobretudo, com base nos artigos 109 e 114, ambos da atual
Constituição, forma -se outro entendimento pela competência da Justiça do Trabalho,
do qual compartilhamos.
"É que, como sustentamos em outros trabalhos a respeito da
matéria, o conteúdo do contrato de trabalho não é composto
apenas de salários, férias, 13º salário, aviso prévio, mas nele se
inclui, como um dos primeiros direitos do empregado, o meio
ambiente do trabalho seguro e adequado.
Com efeito, o empregado, ao colocar à disposição de outrem a
sua força de trabalho, mediante contrato de trabalho celebrado,
tem como correspondência inúmeros direitos, além do
pagamento de salários. E um deles, dos mais importantes, é a
prestação dos serviços em local salubre e com adequadas
condições ambientais, a fim de que possa manter rigidez física
apta ao desempenho das funções para as quais foi contratado. E
isto faz parte, sem sombra de dúvida, e como preleciona De LaCueva, do contrato de trabalho, como obrigação patronal que, se
descumprida (art. 157 e incisos da CLT), autoriza o empregado,
entre outras providências, a dar por rescindido o contrato de
trabalho (art. 483, "d", da CLT) e pleitear as indenizações devidas
perante a Justiça laboral. Da mesma forma, é nessa especializada
que se discute sobre condições e meio ambiente do trabalho,
porquanto, sendo obrigação do Estado fazer cumprir,
administrativamente, normas sobre segurança do trabalho - e
também todas as demais normas trabalhistas - não havendo
êxito nesta tarefa, cabe, a quem legitimado, bater às portas do
Judiciário (art. 5º, XXXV/CF) " – ibidem.
É da Justiça comum estadual a competência para apreciar e julgar apenas as
ações decorrentes de acidentes do trabalho que tenham como objeto o pedido de
indenização de responsabilidade do órgão previdenciário, como, por exceção, constou na
Constituição Federal (artigos 109, I, e § 3º e 201). Nesse sentido já decidiu o STJ,
apreciando conflito positivo de competência suscitado pelo Ministério Público do Trabalho
em ação civil pública sobre meio ambiente do trabalho, verbis:
EMENTA: "CONFLITO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO DE NATUREZA TRABALHISTA -
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESPECIALIZADA.
1) A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações
tipicamente trabalhistas.
2) Conflito conhecido e provido para declarar competente a 13ª Junta de
Conciliação e Julgamento de Porto Alegre para julgar as duas ações propostas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar
competente a Décima Terceira Junta de Conciliação e Julgamento de Porto
Alegre-RS, suscitada. Votaram com o Relator os Ministros Demócrito Reinaldo,
Gomes de Barros, Milton Pereira, César Rocha, Pádua Ribeiro, José de Jesus,
Garcia Vieira e Hélio Mosimann.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO PEÇANHA MARTINS (RELATOR)
Adoto, em linhas gerais, o parecer do douto representante do Ministério
Público Federal, Dr. José Arnaldo da Fonseca. Não há menor dúvida de que as
pretensões deduzidas, na fase em que se encontram, são tipicamente
trabalhistas. Posteriormente, na eventualidade dos trabalhadores sofrerem
lesões decorrentes da agressão sofrida no ambiente de trabalho poderão,
individualmente, ingressar com ações próprias no Juiz competente. Isto posto,
dou provimento ao conflito suscitado para declarar a 13ª Junta de Conciliação
e Julgamento de Porto Alegre competente para apreciar e julgar as duas ações
propostas." (STJ - Conflito de Competência nº 3.639-I, DOU de 23.03.93).
Também pela competência da Justiça do Trabalho, na espécie, decidiu o E.
TRT/15ª Região, nos seguintes termos:
EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - NORMAS DE HIGIENE E SEGURANÇA -
COMPETÊNCIA - A Justiça do Trabalho é competente para conhecer e julgar
ação civil pública, proposta pelo Ministério Público do Trabalho, quando o
objeto da ação for norma de higiene e segurança não observada pela empresa.
Tais normas advêm do contrato de trabalho. Seu não cumprimento fere o
caráter sinalagmático da relação contratual (TRT/15ªR, Ac. Nº 16.814/93,
DOESP de 30/11/96, Rel. Juíza Eliana Felippe Toledo; decisão unânime).
Da mesma forma, reconhece a competência da Justiça do Trabalho para as
questões envolvendo o meio ambiente do trabalho, o renomado Rodolfo de Camargo
Mancuso ("Ação Civil Pública Trabalhista: Análise de alguns pontos controvertidos",
Revista do Ministério Público do Trabalho, nº 12, setembro/96, págs.59/60), verbis:
"O meio ambiente laboral há de ser assegurado, segundo
pensamos, de três maneiras: a) numa instância primária, pelo
próprio obreiro, quando ele mesmo obtém e maneja os
instrumentos adequados à sua atividade, organiza seu local de
trabalho, enfim, provê por conta própria os meios pelos quais
pretende levar a bom termo seu empreendimento: o trabalhador
autônomo, o profissional liberal, o hoje chamado
microempresário, o homem de negócios; b) num outro plano, a
implementação do adequado meio ambiente de trabalho passa a
depender de atividade alheia, seja o dono da obra, o empresário
que, auferindo a vantagem do negócio deve arcar com o ônus
correspondente (os chamados custos sociais da mão-de-obra),
seja o próprio o Sindicato, enquanto entidade encarregada da
defesa e representação institucional de uma certa categoria
laboral, seja, enfim, o Estado-fiscalizador, através de seus órgãos
voltados à segurança e higiene do trabalho; c) numa instância
substitutiva ou supletiva, o meio ambiente laboral haverá de ser
assegurado, impositivamente, pela Justiça do Trabalho, quando,
no exercício da jurisdição coletiva em sentido largo, ou ainda no
âmbito de seu poder normativo (dissídios coletivos, "ações de
cumprimento"), estabelece novas condições para o exercício do
trabalho de certas categorias"....
Em nível doutrinário parece já estar assegurada a autonomia conceitual do meio
ambiente do trabalho, uma subespécie do meio ambiente artificial ou construído, ou
seja, o "habitat" laboral, onde o homem deve encontrar os meios com que haverá de
prover sua existência digna, projetada por nosso constituinte. Em nível legislativo esse
termo também já encontrou guarida, seja expressamente, como por exemplo na antes
citada Lei Orgânica do Município de São Paulo, art. 190, ou ainda implicitamente, como
no Estatuto do Ministério Público da União (Lei Complementar n. 75, de 20.5.1993),
cujo art. 83 comete ao Ministério Público do Trabalho competência para promover a
ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho (inciso III), texto esse que deve ser
lido de forma integrada com o disposto na Lei Orgânica Nacional do MP (8.625, de
12.2.93), cujo art. 25, IV, permite o ajuizamento dessa ação: a) para proteção,
prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente; dessa exegese
sistemática resulta, dada a competência específica da Justiça do Trabalho (CF, art.
114) que ali se trata, naturalmente, do meio ambiente do trabalho, já que é este
último qualificativo que enseja a propositura da ação civil pública nessa Justiça
especializada "ratione materiae". Aliás, outro dispositivo constitucional - o art. 200,
VIII - refere-se, expressamente, ao meio ambiente do trabalho.
Com efeito, se o meio ambiente do trabalho seguro constitui direito social dos
trabalhadores, constitucionalmente assegurado, e, ao Ministério Público do Trabalho
compete, perante à Justiça do Trabalho, ajuizar ação civil pública para defesa de
interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente
garantidos (art. 83 e inciso III da Lei Complementar 75/93), dúvida não pode mais
existir sobre a competência trabalhista no tocante à prevenção do meio ambiente do
trabalho. Aliás, entendimento contrário levaria ao inadequado esvaziamento das
atribuições do Ministério Público do Trabalho na defesa do cumprimento da legislação
do trabalho, pois, embora existam outros legitimados para a propositura de ação civil
pública, esta, ordinariamente, vem sendo utilizada é pelo "Parquet" trabalhista,
principalmente em razão de ser ele o único legitimado para instaurar inquérito civil
público destinado não só à colheita de provas, mas também à busca de adequação
legal do indiciado (conforme ainda o nosso MEIO AMBIENTE DO TRABALHO:
PREVENÇÃO E REPARAÇÃO. JUÍZO COMPETENTE).
Do exposto, decorre claramente para nós que condições seguras e higiênicas de
trabalho constituem importantes direitos indisponíveis dos trabalhadores, cujo
descumprimento legitima aqueles, por si ou por quem os substitua legalmente, a
buscar um comando judicial perantea Justiça do Trabalho, cujo litígio decorre,
induvidosamente, da relação de emprego (art. 114/CF). Outrossim, não existe mais
nenhuma disposição constitucional ou legal atribuindo essa competência à Justiça
Comum, razão essa que tem passado desapercebida pela maioria dos operadores do
direito.
13.3 RESPONSABILIDADES DECORRENTES DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO
INADEQUADO
As responsabilidades decorrentes do trabalho em condições inadequadas e em
ambientes insalubres ou perigosos ou em razão de acidentes do trabalho (incluídas as
doenças profissionais e do trabalho), podem ser caracterizadas como de natureza
trabalhista, previdenciária, civil e penal.
a) De natureza trabalhista: são o pagamento de adicionais de insalubridade e
de periculosidade e a estabilidade provisória do empregado acidentado. De acordo com
o artigo 189 da CLT, serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas
que, por sua natureza, condições ou método de trabalho, exponham os empregados a
agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza
e da intensidade do agente e do tempo máximo de exposição do empregado aos seus
efeitos, conforme quadro aprovado pelo Ministério do Trabalho, que, no caso, é a NR-
15, da Portaria nº 3.214/78. Já as atividades e operações perigosas, também de
acordo com regulamentação do MTb, são aquelas que por sua natureza ou método de
trabalho impliquem o contato permanente do empregado com inflamáveis e explosivos
(art. 193, da CLT) ou com energia elétrica (Lei 7.369/85). Não eliminados ou
neutralizados os efeitos dos agentes insalubres ou perigosos, tem direito o empregado
a receber os respectivos adicionais na base de 10%, 20% ou 40% sobre o salário
mínimo legal e de 30% sobre o salário real.
Os adicionais de insalubridade, como se vê, são absolutamente irrisórios,
porque conforme jurisprudência conservadora dominante, são calculados com base no
salário mínimo legal, mesmo recebendo o empregado salário mínimo profissional
negociado entre patrões e empregados, o que representa um retrocesso injustificado
com relação à jurisprudência anterior que os reconhecia sobre o salário normativo da
categoria (ex-Enunciado 17/TST).
O trabalho penoso, que é bem próprio da atividade do trabalhador rural, na
maior parte, até hoje não foi regulamentado e, por isso, não é remunerado. De
qualquer forma, é de se salientar que ao trabalhador rural, no tocante aos adicionais
de insalubridade e de periculosidade, aplicam-se as regras atinentes ao trabalhador
urbano, desde que expostos aos agentes respectivos, sendo certo que, não obstante
isso, poucos são os processos perante a Justiça do Trabalho em que se discute tais
pleitos em favor do trabalhador, o que serve de alerta para os senhores advogados dos
reclamantes.
O outro item de natureza trabalhista de grande importância e alcance social é a
estabilidade provisória ou garantia de emprego do acidentado. Essa garantia é devida,
pela Lei 8.213/91, art. 118, ao trabalhador acidentado que se afastar do emprego e
receber auxílio-doença acidentário, pelo prazo de 12 meses após a cessação do
referido auxílio. Essa garantia poderá ter maior amplitude e prazo de duração, se
negociada em instrumentos normativos, como vem ocorrendo com relação às
categorias profissionais mais organizadas. Seja de uma forma ou de outra, é
importante que os trabalhadores rurais também pleiteiem esse direito perante a
Justiça do Trabalho, quando demitidos antes do prazo legal ou convencional.
b) De natureza previdenciária: são o auxilio-doença acidentário, na base de
92% do salário-de-benefício ou do salário de contribuição, o que for maior, a partir do
16º dia de afastamento e enquanto permanecer afastado o empregado segurado (art.
29, da lei 8.213/91); aposentadoria por invalidez, na base de 100% do salário-de-
beneficio ou de contribuição, o que for mais vantajoso, ao empregado segurado que se
tornar incapacitado para o trabalho, acrescida de 25%, no caso de necessidade
permanente de assistência de outra pessoa ao aposentado (arts. 44 e 45, da Lei
8.213/91); auxílio-acidente, correspondente a um pagamento mensal de 50% do
salário-de-benefício, devido ao empregado segurado que se tornar parcialmente
incapacitado para o serviço, valor esse que não mais se acumulará com qualquer outro
tipo de aposentadoria (art. 86 e parágrafos da Lei 8.213/91, recentemente alterados);
pensão por morte, equivalente a 100% do salário-de-benefício, paga mensalmente ao
conjunto de dependentes do segurado falecido (art. 74 e seguintes, da Lei 8.213/91).
c) De natureza civil/reparatória: De conformidade com a Constituição Federal de
1988 (art. 7º e inciso XXVIII), são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria de sua condição social, ... "seguro contra acidente do
trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado,
quando incorrer em dolo ou culpa" (grifamos).
Antes, essa indenização era assegurada ao empregado acidentado, em caso de
dolo ou culpa grave do empregador, conforme orientação jurisprudencial cristalizada
na Súmula nº 229 do STF, nos seguintes termos: "A indenização acidentária não exclui
a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador".
Referida indenização, oriunda do direito civil (art. 159, do Código Civil
Brasileiro), independe das outras indenizações devidas pelo órgão previdenciário, pela
chamada culpa objetiva. Nesta, o que se analisa é a existência da seqüela após o
acidente do trabalho sofrido pelo empregado e a ocorrência de dolo ou mera culpa do
empregador (negligência, imprudência e/ou imperícia), como causa do infortúnio. Essa
indenização, de acordo com o artigo 1.059, do Código Civil Brasileiro, engloba não só o
que o acidentado perdeu – dano emergente -, como também o que razoavelmente
deixou de ganhar – lucro cessante. Desta forma, se do acidente resultar defeito ou
diminuição da capacidade de trabalho pelo qual o empregado não possa exercer a sua
profissão ou tenha diminuído o valor do seu trabalho, a indenização abrangerá uma
pensão correspondente à importância do trabalho, no todo ou em parte, conforme o
caso, além das despesas do tratamento e lucros cessantes.
Para ilustrar, mencionemos o caso real de um trabalhador, ajudante geral, que
ao operar uma prensa, sem a devida instrução, teve um dos seus braços decepado,
quando tinha apenas 19 anos de idade. Ajuizada a correspondente ação de reparação,
o juiz, entendendo que aquele jovem estava no início da carreira profissional e poderia,
na área da metalurgia, que era a atividade da empresa, chegar a ferramenteiro,
condenou-a no pagamento de uma indenização mensal correspondente ao salário de
ferramenteiro, até a idade de 65 anos.
Também é cabível indenização por dano moral, em caso de acidente do
trabalho, conforme as circunstâncias, atividade desenvolvida pelo empregado, dano
causado, etc.
Mas como essa indenização é de natureza civil, embora paga pelo empregador
porque decorrente da relação de emprego, discute-se no momento, qual o juízo
competente para apreciá-la: o do trabalho ou o comum?
As Constituições anteriores diziam expressamente que os dissídios relativos a
acidentes do trabalho eram da competência da Justiça Ordinária, razão por que
ninguém ousava querer atribuí-la à Justiça do Trabalho, a não ser de "lege ferenda".
Porém, a partir de 1998, com clareza, a Constituição atual, nos artigos 109 e
114, tratou da competência da Justiça do Trabalho e da competência residual da
Justiça Comum, não mais atribuindo a esta, com exclusividade e como ocorreu nas
Constituições de 1946, 1967 e 1969, a competência para as questõesacidentárias.
Agora, essa competência foi dividida entre a Justiça Comum e a do Trabalho. A
competência é da Justiça do Trabalho quando o pleito de indenização acidentária
(artigo 7º, inciso XXVIII/CF) for dirigido ao empregador, que tenha, por dolo ou culpa,
causado o infortúnio - culpa subjetiva.
A competência é da Justiça Comum, quando os pedidos de indenização,
auxílios-doença e acidentário, aposentadoria por invalidez e pensão, forem dirigidos ao
órgão previdenciário - culpa objetiva, como decorre do disposto no artigo 109, inciso
XI, § 3º, combinado com o artigo 114, "caput", todos da Constituição Federal.
O artigo 109, inciso 1, estabelece a competência dos juízes federais para as
causas em que forem rés, assistentes ou oponentes, a União e entidades autárquicas
ou empresa pública federal, excetuando-se, por exemplo, as de acidentes do trabalho,
que são aquelas causas em que os segurados ou beneficiários acionam a instituição
previdenciária. Nessas causas, como estabelece o § 3º, do mesmo artigo 109, a
competência é da Justiça Comum Estadual, mesmo sendo parte entidade pública
federal. A essa conclusão, também chegaram JOSÉ AUGUSTO RODRIGUES PINTO
("Processo Trabalhista de Conhecimento", 3ª edição, São Paulo, LTr Editora, 1996,
pág. 113), VALDIR FLORINDO ("Dano Moral e o Direito do Trabalho", LTr Editora, São
Paulo, 1995, págs. 90/98), VANDER ZAMBELI VALE, em artigo intitulado Acidente de
Trabalho - Culpa do Empregador - Indenização - Competência da Justiça do Trabalho
(Revista LTr, 60-08/1069) e SEBASTIÃO GERALDO DE OLIVEIRA ("Proteção Jurídica à
Saúde do Trabalhador", São Paulo, LTr Editora, 1996, págs. 199-201), entre outros
autores de nomeada, cujo resumo tomo a liberdade de fazer, com as palavras do
insígne professor José Augusto Rodrigues Pinto: "Considerando não haver na
Constituição atual nenhuma norma conservando essa exclusão da competência
trabalhista para conhecer de dissídios de acidentes no trabalho, parece-nos fora de
dúvida que eles devem passar a ser julgados pelos órgãos da Justiça do Trabalho, em
harmonia com a regra geral e natural da competência em razão da matéria".
Como se vê, a competência da Justiça Comum para resolver sobre o acidente
do trabalho, prevista nos dispositivos em comento, restringiu-se às causas em que
uma das partes seja entidade pública federal, como seguradora, contra quem são
propostas as ações decorrentes de acidentes do trabalho.
As demais demandas, mesmo que de natureza civil, se decorrentes da relação
de emprego e contra o empregador, são de competência da Justiça do Trabalho, como
já decidiu o E.STF:
"A determinação da competência da Justiça do Trabalho não importa que
dependa a solução da lide de questões de direito civil, mas sim, no caso, que a
promessa de contratar, cujo alegado conteúdo é o fundamento do pedido,
tenha sido feita em razão da relação de emprego, inserindo-se no contrato de
trabalho." (Ac. Pleno; Conflito de Jurisdição nº 6.959 - Rel. Min. Sepúlveda
Pertence, in DJU de 22.5.91, pág.1.259).
d) De natureza penal: os acidentes do trabalho podem caracterizar, ainda, os
crimes de homicídio, lesões corporais ou de perigo comum, previstos nos artigos 250 a
259, do Código Penal, por conduta dolosa ou culposa do empregador ou dos
responsáveis. A culpa ocorre quando o agente der causa ao resultado por imprudência,
negligência ou imperícia (Sebastião Geraldo de Oliveira, obra citada, pág.210).
E a responsabilidade criminal, que é pessoal, do empregador, do preposto, do
membro da CIPA, etc., será caracterizada não só pelo acidente do trabalho, quando
agindo com dolo ou culpa, mas também pelo simples fato de não se cumprir normas
de segurança e higiene do trabalho, expondo-se a risco e perigo a vida de outrem,
como preceitua o Código Penal e a Lei 8.213/91, esta, no art. 19, § 2º, timidamente
dizendo que constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de
cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho. Enquanto isso, tramita perante
o Congresso Nacional projeto de lei mais rigoroso no seguinte sentido: "Deixar o
tomador de serviços ou seus prepostos de cumprir as normas sanitárias, de segurança
ou de duração do trabalho, estabelecidas pela Lei ou pelas autoridades competentes,
expondo a perigo a vida ou a saúde dos trabalhadores: PENA - Detenção, de um a três
anos e multa. Parágrafo único: A pena é aumentada de metade se da omissão resulta
lesão corporal de natureza grave, e triplicada se resulta morte".
Essa alteração legislativa, que incrimina o tomador ou preposto simplesmente
pelo não-cumprimento das normas de segurança, é muito importante, enquanto que,
pelas normas existentes, a criminalização só existe efetivamente depois que o
trabalhador acidentou-se ou faleceu, o que na prática não tem surtido o efeito
desejado, que é o de prevenir a ocorrência de acidentes.