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Projeto: Cidadão em Rede: De Consumidor a Produtor de Informação sobre o Território 
Convênio de Cooperação Tecnológica Prodeb/UFBA Período: jul 2011/jan 2013 
Título: A Nova Esfera Pública: Sociedade Civil Global 
Fonte: CASTELLS, Manuel. The New Public Sphere: Global Civil Society, Communication Networks, and 
Global Governance. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, 2008. 
p. 78-93. Disponível em http://ann.sagepub.com/content/616/1/78. 
 
Resumo de trabalho - Maria Célia Furtado Rocha 1/4 
 
Introdução 
Entre o estado e a sociedade está a esfera pública, a rede de comunicação de informação e de 
pontos de vista (Habermas, 1996), o espaço onde pessoas se reúnem como cidadãos e articulam 
suas visões autônomas para influenciar as instituições políticas da sociedade. Sociedade civil é a 
expressão organizada dessas visões. 
John Thompson (2000) disse que mídias se tornaram o maior componente da esfera pública na 
sociedade industrial. Se redes de comunicação de qualquer tipo formam a esfera pública então nossa 
sociedade, a sociedade em rede, organiza sua esfera pública mais do que qualquer outra forma 
histórica de organização, com base nas redes de comunicação da mídia. 
A esfera pública não é apenas a mídia ou lugares socioespaciais de interação pública. É o repositório 
cultural/informacional das ideias e projetos que alimentam o debate público. É através da esfera 
pública que diversas formas da sociedade civil estabelecem o debate público. A interação entre 
cidadãos, sociedade civil e o estado, comunicando-se através da esfera pública, assegura que o 
equilíbrio entre estabilidade e mudança social seja mantido. 
A crise de legitimidade ocorre porque os cidadãos não reconhecem a si mesmos nas instituições da 
sociedade. Isso leva a uma crise de autoridade. 
Como o próprio Habermas sabia, sua teorização de democracia era de fato uma situação idealizada. 
Mas os termos da equação política que ele propôs mantêm-se um construto intelectual útil – um meio 
de representar as relações contraditórias entre os interesses conflitivos de atores sociais, a 
construção social do sentido cultural e as instituições do estado. 
A noção de esfera pública como um espaço neutro para a produção de sentido se choca contra 
evidências históricas. Podemos enfatizar ainda o papel da arena cultural na qual representações e 
opiniões da sociedade são formadas, de-formadas e re-formadas para prover o material ideacional 
que constrói as bases sobre as quais política e políticas operam. 
Estas formas e processos sociopolíticos são construídos sobre materiais culturais e esses materiais 
são unilateralmente produzidos por instituições políticas como uma expressão de dominação ou são 
co-produzidos dentro da esfera pública por indivíduos, grupos de interesse, associações cívicas de 
vários tipos (a sociedade civil) e o estado. Como essa esfera pública é constituída e como opera 
define em grande medida a estrutura e dinâmicas de qualquer governo. 
Além disso há uma esfera pública na arena internacional que não está sujeita a nenhum poder 
soberano em particular mas que é desenhada por geometrias variadas de relacionamento entre 
estados e atores não-estatais globais.é amplamente reconhecido que uma variedade de interesses 
sociais se expressam nesta arena internacional: negócios multinacionais, religiões mundiais, 
criadores culturais, intelectuais e os auto-definidos cosmopolitas. Há ainda uma sociedade civil global 
e formas ad hoc de governança global promulgadas por instituições políticas internacionais, co-
nacionais e supranacionais. Para que esses atores e instituições interajam de uma maneira não 
disruptiva, o mesmo tipo de terreno ideacional comum desenvolvido na esfera pública nacional deve 
emergir. 
I. Globalização e o Estado-Nação 
Globalização é o processo que constitui um sistema social com a capacidade de funcionar como uma 
unidade em escala planetária num tempo real ou dado. Capacidade refere-se à capacidade 
tecnológica, institucional ou organizacional. Novas tecnologias de informação e comunicação 
permitem redes globais conectarem seletivamente qualquer pessoa ou qualquer coisa através do 
mundo. 
Capacidade institucional refere-se à desregulamentação (deregulation), liberalização e privatização 
de regras e procedimentos usados pelo estado-nação para controlar atividades em seu território. 
Capacidade organizacional refere-se à habilidade de usar networking como forma de estruturação 
flexível, interativa, sem fronteiras de qualquer atividade em qualquer domínio. Todas atividades 
econômicas, comunicativas e culturais centrais (core) são globalizadas. Isto é, elas são dependentes 
Projeto: Cidadão em Rede: De Consumidor a Produtor de Informação sobre o Território 
Convênio de Cooperação Tecnológica Prodeb/UFBA Período: jul 2011/jan 2013 
Título: A Nova Esfera Pública: Sociedade Civil Global 
Fonte: CASTELLS, Manuel. The New Public Sphere: Global Civil Society, Communication Networks, and 
Global Governance. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, 2008. 
p. 78-93. Disponível em http://ann.sagepub.com/content/616/1/78. 
 
Resumo de trabalho - Maria Célia Furtado Rocha 2/4 
 
de nós estratégicos conectados ao redor do mundo. Isso inclui mercados financeiros globais, 
produção e distribuição global de bens e serviços, comércio internacional, redes globais de ciência e 
tecnologia, força de trabalho global capacitada, integração seletiva de mercado de trabalho global, 
mídia global, redes de comunicação interativas globais, primariamente a Internet, mas também redes 
de computadores dedicados e culturas globais associadas com o crescimento de diversas indústrias 
culturais. 
Nem tudo e nem todos são globalizados: redes conectam e desconectam ao mesmo tempo. Excluem 
e ignoram qualquer coisa ou pessoa que não adicione valor à rede e/ou desorganize o 
processamento eficiente dos programas da rede. A geografia social, econômica e cultural de nosso 
mundo segue as variáveis geometrias das redes globais que incorporam a lógica da globalização 
multidimensional. 
Além disso uma quantidade de questões confrontadas pela humanidade são globais em suas 
manifestações e em seu tratamento. Entre elas o gerenciamento do ambiente como uma questão 
planetária, a globalização dos direitos humanos e a emergência da questão da justiça social para o 
planeta e segurança global como um problema compartilhado. 
O poder do Estado é também minado por estratégias de contrapoder da sociedade civil global que 
busca uma redefinição do sistema global. 
O crescente gap entre o espaço onde as questões aparecem (global) e o espaço onde são 
gerenciadas (estado-nação) está na fonte de 4 crises políticas distintas mas inter-relacionadas que 
afetam as instituições de governança: crise de eficiência; de legitimidade; de identidade; de equidade 
(crescente desigualdade). 
Como resultado dessas crises e da decrescente capacidade de os governos mitigá-las, atores não-
governamentais tornam-se os advogados das necessidades, interesses e valores das pessoas. 
II. A Sociedade Civil Global 
O termo sociedade civil é um rótulo genérico que reúne várias formas de organização e ação 
frequentemente contraditórias e competitivas. Uma distinção deve ser feita entre diferentes tipos de 
organização. 
Em cada país há atores da sociedade civil local que defendem interesses locais ou setoriais, assim 
como valores específicos contra ou além do processo político formal. Exemplos incluem 
comunidades, sindicatos, grupos de interesse, grupos religiosos e associações cívicas. A diferença 
entre esses grupos em variadas nações é que a fonte das organizações sociais é diversificada: 
religião joga um papel mais importantena América Latina; movimentos estudantis permanecem 
sendo uma fonte influente para a mudança social no leste da Ásia (Coréia do Sul em particular). 
Porém formas tradicionais de política e fontes ideológicas de associação voluntária parecem estar em 
declínio em quase todo lugar. 
Em geral esse processo equivale a uma mudança do sistema político institucional em direção a 
associações de interesses e valores formais ou informais como uma fonte de ação coletiva e 
influência sociopolítica. Isso empodera a sociedade civil local para se defrontar com problemas 
sociais resultantes da globalização irrestrita. Falando propriamente isto não é a sociedade civil global, 
embora constitua um ambiente de organizações, projetos e práticas que nutrem o crescimento da 
sociedade civil global. 
Uma segunda tendência é representada pelo aumento de organizações não-governamentais (ONGs) 
com um quadro de referência global ou internacional em sua ação e objetivos. Isto é ao que a maioria 
dos analistas se referem como uma “sociedade civil global”. Elas são organizações privadas, ainda 
que frenquentemente parcialmente suportadas financeiramente por instituições públicas, que agem 
fora dos canais governamentais para tratar problemas globais. Frequentemente afirmam valores 
universalmente reconhecidos mas politicamente manipulados em seu próprio interesse por agências 
políticas, incluindo governos. Exemplos de grupos de sociedade civil global incluem Médicos Sem 
Projeto: Cidadão em Rede: De Consumidor a Produtor de Informação sobre o Território 
Convênio de Cooperação Tecnológica Prodeb/UFBA Período: jul 2011/jan 2013 
Título: A Nova Esfera Pública: Sociedade Civil Global 
Fonte: CASTELLS, Manuel. The New Public Sphere: Global Civil Society, Communication Networks, and 
Global Governance. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, 2008. 
p. 78-93. Disponível em http://ann.sagepub.com/content/616/1/78. 
 
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Fronteiras, Oxfam, Greenpeace e muitos outros.1 
Para compreender as características das ONGs internacionais alguns aspectos devem ser 
ressaltados: 
• Em contraste com partidos políticos elas têm popularidade e legitimidade, o que se traduz em 
consideráveis fundos, sejam doações ou voluntariado. Suas atividades são focadas em 
assuntos práticos, casos específicos e expressões concretas de solidariedade. O que é 
fundamental aqui é que argumento político clássico da decisão racional em termos do contexto 
não é permitido. Objetivos não justificam os meios. O objetivo é desfazer o mal ou fazer o bem 
em instâncias específicas. O resultado positivo deve ser considerado em si mesmo, não como 
um meio de seguir numa direção positiva. Por conta do fato de que as pessoas passaram a 
desconfiar da lógica da política instrumental, o método da ação direta em busca de resultados 
diretos encontra suporte crescente. 
• Finalmente as táticas-chaves das ONGs para alcançar resultados e obter suporte para suas 
causas é a política de mídia. É através da mídia que essas organizações alcançam o público e 
mobilizam pessoas no suporte a estas causas. A mídia torna-se o campo de batalha para 
campanhas das ONGs. Uma vez que são campanhas globais, mídias globais são seu objetivo. 
A globalização da comunicação leva à globalização dos meios de comunicação política. 
Movimentos sociais que almejam controlar o processo de globalização constituem um terceiro tipo de 
ator da sociedade civil. Esses movimentos constroem redes de ação e organização parra induzir um 
movimento social global por justiça. 
A conexão entre muitos desses movimentos numa rede global de debate e coordenação de ação e a 
formalização de alguns desses movimentos em uma rede permanente de iniciativas sociais 
desejando alterar o processo de globalização são processos que estão redefinindo a paisagem 
sociopolítica do mundo. Seus nós crescem e diminuem alternadamente, dependendo das condições 
sob as quais cada sociedade relaciona-se com a globalização e suas manifestações políticas. São 
movimentos melhor definidos por aquilo a que se opõem do que por uma ideologia definida. É 
essencialmente um movimento democrático, um movimento que clama por novas formas de 
representação política de desejos e interesses de pessoas no processo de governança global. A 
despeito de sua extrema diversidade interna, há uma crítica compartilhada do gerenciamento do 
mundo por instituições internacionais compostas apenas por governos nacionais. É uma expressão 
da crise de legitimidade, transformada em ação política oposicionista. 
Há um quarto tipo de expressão global da sociedade civil. É o movimento da opinião pública, que 
conta com a emergência de mobilizações espontâneas ad hoc utilizando redes de comunicação 
horizontais autônomas. 
Esse fenômeno tem implicações em nível global, primeiramente exemplificadas em 15 de fevereiro de 
2003 nas demonstrações de paz ao redor do mundo contra a guerra iminente contra o Iraque. Internet 
e comunicações sem fio agindo como redes de comunicação globais, horizontais, provêem ambas 
uma ferramenta e um meio para o debate, diálogo e tomada coletiva de decisão. 
Mobilizações sociopolíticas locais organizadas por meio da Internet e comunicação móvel na Coréia 
do Sul, Filipinas, Espanha, Ucrânia, Equador, Nepal e Tailândia entre outros países ilustram a nova 
capacidade dos movimentos organizarem e mobilizarem cidadãos em seus países enquanto pedem 
solidariedade ao mundo. 
A mobilização contra a junta militar em Myamar em outubro de 2007 começou principalmente com 
estudantes e era relativamente pequena. A visão da brutalidade do regime militar providas por vídeos 
feitos com telefones celulares colocadas no YouTube imediatamente amplificaram o movimento. 
Em suma a sociedade civil global agora tem meios tecnológicos para existir independentemente de 
instituições políticas e das mídias de massa. Porém a capacidade de movimentos sociais mudarem a 
mente do público depende ainda em grande medida de sua habilidade de moldar o debate na esfera 
 
1
 The Global Civil Society Yearbook provê evidência da importância quantitativa e relevância qualitativa desses 
atores da sociedade civil global. 
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pública. 
III. A Nova Esfera Pública 
O novo sistema político num mundo globalizado emerge dos processos de formação da sociedade 
civil global e de uma rede global de estados que suplantam e integram os estados-nações 
preexistentes sem dissolvê-los num governo global. 
A esfera pública global contemporânea é grandemente dependente do sistema de meios de 
comunicação global/local. Essas mídias incluem televisão, rádio e imprensa, assim como uma 
variedade de sistemas de comunicação e multimídia entre os quais a Internet e as redes de 
comunicação horizontais jogam agora um papel decisivo. 
Há uma elevação da esfera pública ancorada em torno de instituições nacionais, sociedades 
territorialmente limitadas, para uma esfera pública constituída em torno de sistemas de mídia. Esses 
sistemas de mídia incluem o que eu conceitualizei como mass self-communication, isto é, redes de 
comunicação que relacionam muitos-para-muitos no envioe recepção de mensagens numa forma 
multimodal de comunicação que ignora (bypasses) a mídia de massa e frequentemente escapa do 
controle do governo. 
O corrente sistema de mídia é local e global ao mesmo tempo. Ele é organizado em torno de um 
centro formado por grupos com alcance global. Atuando no sistema de mídia, ativistas transnacionais 
induzem um debate sobre “o como”, “o porque” e sobre “o que” da globalização e das escolhas 
sociais relacionadas. É através da mídia, ambas, mass media e redes de comunicação horizontais, 
que atores não estatais influenciam pessoas e promovem mudanças sociais. 
Em última análise, a transformação da consciência tem conseqüências no comportamento político, 
nos padrões de votação e em decisões de governos.2 É em nível de meios de comunicação política 
que aparentemente a sociedade pode ser movida numa direção que diverge dos valores e interesses 
institucionalizados no sistema político. 
A esfera pública global é criada em torno dos sistemas de meios de comunicação e redes Internet, 
particularmente em espaços sociais da Web 2.0. Esse espaço de comunicação multimodal é que 
constitui a nova esfera pública global. 
IV. Diplomacia Pública na Esfera Pública Global 
Por “público” usualmente compreendemos o que é comum a dada organização social que transcende 
o privado. O privado é o domínio dos auto-definidos interesses e valores, enquanto o público é o 
domínio dos interesses e valores compartilhados (Dewey, 1954). 
Diplomacia pública procura construir a esfera pública na qual diversas vozes possam ser ouvidas a 
despeito de suas origens variadas, valores distintos e interesses frequentemente contraditórios. É um 
terreno de engajamento cultural no qual materiais ideacionais são produzidos e confrontados por 
vários atores sociais, criando as condições sob as quais diferentes projetos possam ser canalizados 
pela sociedade civil global e instituições políticas da governança global. 
Porque vivemos num mundo globalizado interdependente, o espaço de co-decisão política é 
necessariamente global. A escolha que encaramos é tanto construir o sistema político global como 
uma expressão de relações de poder sem mediação cultural ou uma nova forma de governança 
consensual global. 
 
 
 
2
 Uma série de grandes conferências foi organizada pelas Nações Unidas durantes os anos 1990 em questões 
pertinentes à humanidade (da condição das mulheres à conservação ambiental). Elas foram essenciais para 
promover o diálogo global, o aumento da consciência pública e a promoção de plataformas nas quais a 
sociedade civil global poderia se mover para o primeiro plano do debate político.