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Bear cap12_Neuro2ed

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o SistemaSensorial
Somático
INTRODUÇÃO
TATO
MECANORRECEPTORESDA PELE
Vibraçãoe o CorpúsculodePacini
Discriminaçãodedoispontos
AXÔNIOS AFERENTES PRIMÁRIOS
A MEDULA ESPINHAL
OrganizaçãoSegmentardaMedulaEspinhal
. Quadro12.1 DeEspecialInteresse:Herpes Zoster,Cobreiro e Dermátomos
OrganizaçãoSensorialdaMedulaEspinhal
AVIA COLUNA DORSAL-LEMNISCO MEDIAL
. Quadro 12.2 Alimentopara o Cérebro: Inibição Lateral
AVIATÁCTIL TRIGEMINAL
CÓRTEX SOMATOSSENSORIAL
SomatotopiaCortical
PlasticidadedoMapaCortical
. Quadro12.3ARotadaDescoberta:QuandoosMapasCerebraisColidem,por
VilayanurS.Ramachandran
O CórtexParietalPosterior
DOR
. Quadro12.4DeEspecialInteresse:A MisériadaVidaSemDor
OSNOCICEPTORESEATRANSDUÇÃODOSESTíMULOSDOLOROSOS
TiposdeNociceptores
. Quadro12.5DeEspecialInteresse:QuenteeApimentado
Hiperalgesia
AFERENTESPRIMÁRIOS E MECANISMOS ESPINHAIS
VIASASCENDENTES DA DOR
A Via da Dor Espinotalâmica
A Via da Dor Trigeminal
O Tálamoe o Córtex
A REGULAÇÃO DA DOR
RegulaçãoAferente
RegulaçãoDescendente
OsOpióidesEndógenos. Quadro12.6DeEspecialInteresse:Dor eEfeitoPlacebo
TEMPERATURA
TERMORRECEPTORES
AVjA DATEMPERATURA
CONSIDERAÇÕES FINAIS
"
..,
I .
I
I
II
388 CAPíTULO 12
"
. O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
r INTRODUÇÃO
o sistemasensorial somáticonos permite apreciaralgumasdasexperiências
mais agradáveis,como tambémalgumasdasmais desagradáveis.A sensação
sornática permitequeo nossocorposintao contato,a dor,o frio equesaibare-
conhecero quefazemasdiferentespartesdo corpo.O corpoésensívelamuitos
tiposdeestímulos:à pressãode objetoscontraa pele,à posiçãodasarticulações
e dosmúsculos,à distensãodabexigae à temperaturadosmembrose do pró-
prio tecidoneural. Quando osestímulostornam-setãointensosquepodemser
lesivos,a sensaçãosomáticatambémé responsávelpor uma sensaçãodesagra-
dável,porémdevital importância,a dor.
O sistemasensorialsomáticodifere de outros sistemassensoriaisde duas
maneirasinteressantes.Primeiro, seusreceptoresestãodistribuídospor todo
o corpo ao invés de estaremconcentradosem locais restritos,especializados.
Segundo,pelo fato de essesistemarespondera muitos diferentestiposdeestí-
mulos,podemosconsiderá-Iocomoum grupo de,pelomenos,quatrosentidos,
em vez deapenasum: os sentidostátil, da temperatura,da dor e daposiçãodo
corpo. Essesquatro sentidospodem ser,por suavez, subdivididosem muitos
outros. O sistemasensorialsomáticoé, defato, um nome abrangente,umaca-
tegoriacoletivaparatodasassensaçõesque nãosejamvisão,audição,gustação,
olfaçãoeo sentidovestibulardo equilíbrio.A concepçãopopulardequepossuí-
mosapenascincosentidosé, obviamente,muito simplória.
Se algo toca o seu dedo, você pode determinar com precisãoo local,a
pressão,a agudeza,a texturae a duraçãodo toque.Sefor um alfinete,não ha-
verácomoconfundi-10comum martelo.Seo loque sedeslocardesuamãopara
o punho e subir pelo braçoatéo ombro, vocêpoderáacompanharsuaveloci-
dadee posição.Seassumirmosque vocênão estejaolhando, essainformação
deverásertotalmentedescritapelaatividadedosnervossensoriaisdeseubraço.
Um único receptorsensorialpode codificarascaracterísticasdo estímulo,como
a intensidade,a duração,a posiçãoe, algumasvezes,a direção.No entanto,
um único estímulo ativa normalmentemuitos receptores.O sistemanervoso
centralinterpretaa atividadedeum vastoconjunto dereceptoreseutilizaessas
informaçõesparagerarpercepçC'Jescoerentes.
Nestecapítulo,dividiremosnossadiscussãoacercadasensaçãosomáticaem
duaspartesprincipais:o sentidotátil e o sentidoda dor. Como veremos,essas
categoriasdistintasdependemde receptorese viasaxonaisdiferentes.Também
discutiremosbrevementecomo sentimosas modificaçõesda temperatura.A
discussãoda sensaçãodaposiçãodo corpo, chamadade propriocepção,estáre-
servadapara o Capítulo 13, onde estudaremoscomo essetipo de informação
sensorialsomáticaé utilizadoparacontrolaros reflexosmusculares.
, TATO
A sensaçãotátil começana pele (Figura 12.1).Os dois tipos principaisdepele
são chamadosdepilosa(compêlos) eglabra (sempêlos), como,por exemplo,
o dorso e a palma de sua mão, respectivamente.A pele possui uma camada
externa,a epiderme,e uma camadamais interna, a derme.A pele realizauma
função protetora essenciale evita a evaporaçãodos fluidos corporaisno am-
biente secoem que vivemos. Contudo, a pele tambémfornecenossocontato
mais direto com o mundo - de fato,a peleé o maiorórgãosensorialque
possuímos.Imagine a praia semsentira areiaentre seusdedosdo pé, ou con-
sidereter de olharum beijo em vez de experimentá-Iovocê mesmo.A peleé
suficientementesensívelpara que um ponto salientemedindo apenas0,006
mm de altura e 0,04 mm delargurapossaser sentidoquando for tocadopela
ponta de um dedo. Para servir de comparação,um ponto na escritaBraille é
167vezesmaior do que isso.
Nestaseção,veremoscomoum toquena peleé transduzidoemsinaisneu-
rais, como essasinformaçõesseguempara o sistemanervosocentrale comoo
cérebrorealizaapercepçãodelas.
Disco
de Merkel
~
I
I
I
I
I
I
I
I
I
I
Pelepilosa ~- Peleglabra~
I I
I I
I I
I I
I I
I I- - -~ ----------
Epiderme
Limite
epiderme-derme
IITUI I
{, Derme;,
.
"
.
\1
1
. \ 1I I
J
Lu U-
, --
I
Terminação
nervosa livre
Corpúsculo
deMeissner
Receptor do
lolículo piloso
Corpúsculo
dePacini
Terminação
deRultini
Mecanorreceptoresda Pele
A maioriados receptoressensoriais'do sistemasensorialsomáticoé constituída
por mecanorreceptores,os quaissãosensíveisà deformaçãofísicacomo fle-
xãoou estiramento.Presentesem todo o corpo,elesmonitoramo contatocom
a pele,assimcomo a pressãono coraçãoe nos vasossangüíneos,dilataçãodos
órgãosdigestivose dabexigaurinária, alémda forçaaplicadacontraos dentes.
Na porção central de cadamecanorreceptor,estãoterminaçõesaxonais não-
mielinizadas.Essesaxôniospossuemcanaisiônicosmecanossensíveis,cujaabertura
dependedeestiramentoou mudançasna tensãodamembranacircundante.
OsmecanorreceptoresdapelesãomostradosnaFigura 12.1.A maioriadeles
foi designadaem homenagemaoshistologistasalemãese italianosque os des-
cobriramno séculoXIX. O receptormaioremaisbemestudadoéo corpúsculo
de Pacini, situadona camadaprofunda da derme.Ele pode apresentar2 mm
decomprimentoe quase1mm de diâmetro- grandeo suficienteparaservisto
a olho nu. As terminaçõesdeRuffini,encontradastanto na pele pilosacomo na
glabra,sãolevementemenoresdo que os corpúsculosde Pacini. Os corpúsculos
deMeissnersãocercadeum décimodo tamanhodoscorpúsculosdePacini e es-
tãolocalizadosentreaspapilasdérmicasdapeleglabra(sãosaliênciasdérmicas
queacompanhamasreentrânciasda epiderme,como suasimpressõesdigitais,
porexemplo).Localizadosjunto à epiderme,osdiscosdeMerckel consistemem
umaterminaçãonervosaeem umacélulaepitelial,não-neural,achatada.Nesse
caso,a célulaepitelialpoderepresentarapartemecanicamentesensível,porque
fazumajunção semelhanteà sinapsecoma terminaçãodo neurito. Nos bulbos
terminaisdeKrause,situadosnas regiõeslimítrofesentrea pelesecae a mucosa
(aoredordoslábiose nosgenitais,por exemplo),asterminaçõesseassemelham
anovelosdebarbantecomnós.
A pele pode sofrervibraçãoou pressão,ser aguilhoadaou alisada,e seus
pelospodemser dobradosou puxados.Essassãoformasdiferentesde energia
mecânica,asquaispodemossentirindividualmentee,ainda, discriminá-Iasfa-
cilmente.Portanto,temosmecanorreceptoresque sedistinguemquanto a fre-
qüênciasde estímuloe pressõespreferenciaise tamanhosdoscamposrecepti-
vos.O neurocientistasuecoÂke Vallboe seuscolegasdesenvolverammétodos
pararegistroeletrofisiológicode.axôniossensoriaisisoladosno braçohumano,
demaneiraque elespudessemmedira sensibilidadedosmecanorreceptoresna
mão e,simultaneamente,avaliar aspercepçõesproduzidaspor vários estímulos
mecârticos(Figura 12.2a).Quando se utilizou uma sonda estimuladorapara
T TATO 389
FIGURA 12.1
Receptores sensoriais somáticos
na pele. A peleglabrae a pelepilosa
possuemumavariedadede receptores
sensoriaisnascamadasdérmicae
epidérmica.Cadareceptorpossuium
axônio,e,comexceçãodasterminações
nervosaslivres,todaspossuemtecidosnão-
neuraisassociados.
390 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
,
1111111111111 I
(a)
Corpúsculos de Meissner
(b)
Corpúsculos de Pacini
FIGURA 12.2
Testando os campos receptivos dos receptores sensoriais humanos. (a) Coma
inserçãode um microeletrodo no nervo mediano do braço, é possível registrar os potenciais
de ação de um único axônio sensorial e mapear seu campo receptivo na mão com uma
fina sonda estimuladora.(b) Os resultados mostram que os campos receptivos podem ser
relativamente pequenos, como no caso dos corpúsculos de Meissner,ou grandes,como no
caso dos corpúsculos de Pacini.(Fonte:Adaptado de Vallbo e Johansson, 1984.)
tocara superfíciedapelee movimentar-sena região,o camporeceptivodeum
único mecanorreceptorpôde ser mapeado.Os corpúsculosde Meissner e os
discosde Merckel mostrarampossuir camposreceptivospequenos,de apenas
uns poucosmilímetrosde extensão,enquantooscorpúsculosdePacinieaster-
minaçõesdeRuffini apresentaramcamposreceptivosgrandesqueseestendiam
por um dedointeiro ou por metadedapalmadamão (Figura 12.2b).
Osmecanorreceptorestambémvariamquantoà persistênciadesuasrespos-
tasa estímulosde longa duração.Se uma sondaestimuladoraé pressionadade
formarepentinacontraa pele,dentrode um camporeceptivo,algunsmecanor.
receptores,comooscorpúsculosdeMeissneredePacini,respondeminicialmente
de formarápida,mas,a seguir,paramde dispararimpulsos,emborao estímulo
continue;essesreceptoressãoditosdeadaptaçãorápida.Outrosreceptores,como
osdiscosdeMerckel e asterminaçõesdeRuffini, sãoreceptoresdeadaptaçãolenta,
poisgeramuma respostamaissustentávelduranteum estímulolongo.A Figura
12.3resumeascaracterísticasdosquatromecanorreceptoresdapele,quantoao
tamanhodo camporeceptivoe aotipo deadaptaçãoa um estímulocontínuo.
Os pêlosfazemmais do que adornarnossacabeçae manterum mamífero
aquecidono inverno. Muitos pêlossãopartede um sistemareceptorsensorial.
Para demonstrarisso,dobreapenasum pêlo do dorsode seubraçocoma ponta'
deum lápis;é comoa sensaçãodeum mosquitoirritante.Paraalgunsanimais,os
pêlosrepresentamum dosprincipaissistemassensoriais.Imagineum ratopassan-
do furtivamentepor corredorese becosescuros.O ratoseorientaempartepelo
movimentodesuasvibrissasfaciais("bigodes")paratatearo ambientelocaleobter
informaçõessobreatextura,a distânciae o formatodosobjetosqueo cercam.
FIGURA 12.3
Variações dos campos receptivos
e das velocidades de adaptação
para cada um,dos quatro
mecanorreceptoresda pele. (Fonte:
AdaptadodeVallboe Johansson,1984.)
Movimento do
estímulo aplicado
Disparos axonais
Tamanhodocamporeceptivo
Pequeno Grande
Corpúsculode Meissner Corpúsculode Pacini
Rápida
--
o
1m
I1111 I I I 11om
15.
m Disco de Merkel Terminação de Rullini"O«
Lenta
1111111111111I1111 I 111111111111111
UFPA
Instituto de Ciências da Saúde
BIBLIOTECA
Os pêlos crescema partir de folículosinseridos na pele; cadafolículo está
ricamenteinervadopor terminaçõesnervosaslivres, que seenrolam ao redor
deleou alinham-sea ele (Figura 12.1).Existemváriostiposdefolículospilosos,
incluindo algunscom músculospiloeretores (essenciaispara mediar as estra-
nhas sensaçõesque chamamosde arrepios, que levam à erição dos pêlos) e
apresentandotiposdiferenciadosde inervação.Para todosessestipos,o dobra-
~ento do pêlo causauma deformaçãono folículo e em tecidoscircunvizinhos.
Isso,por suavez, leva ao estiramento,inclinação ou achatamentodas termi-
naçõesnervosasdessaregião,aumentandoou diminuindo, dessaforma, a fre-
qüênciade disparosde potenciaisde ação.Os mecanorreceptoresdosfolículos
pilosospodemsertantode adaptaçãolentacomoderápida.
As diferentessensibilidadesmecânicasdosmecanorreceptorespromovem
diferentessensações.Os corpúsculosdePacini sãomaissensíveisa vibraçõesde
cercade200a 300Hz, enquantooscorpúsculosdeMeissnerrespondemmelhor
em torno de 50 Hz (Figura 12.4). Posicione sua mão contra um alto-falante,
enquantoescutasua música favorita em alto volume; vocêpoderá "sentir" a
música,em grandepartepelos seuscorpúsculosde Paccini. Sevocê deslizara
pontadeseusdedossobrea telaprotetoraásperado alto-falante,cadaponto da
peleseráestimuladocomum nível defreqüênciaótimoparaa ativaçãodoscor-
púsculosdeMeissner.Vocêteráa sensaçãode uma texturarugosa.A estimula-
çãoemfreqüênciasaindamaisbaixaspodeativarasterminaçõesdeRuffini eos
corpúsculosdeMeissner,produzindouma sensaçãodepalpitação.
Vibração e o Corpúsculo de Pacini. A seletividadedeum axônio mecanor-
receptivodependebasicamenteda estrutura de sua terminaçãoespecial.Por
exemplo,os corpúsculosde Pacini possuemuma cápsulaem forma debola de
futebol americano,com 20 a 70 camadasconcêntricasde tecido conjuntivo,
como as camadasde uma cebola, com uma terminaçãonervosa dispostano
centro(ver Figura 12.1).Quando a cápsulaé comprimida,a energiaé transfe-
ridaà terminaçãonervosa,suamembranaé deformada,e os canaismecanos-
sensíveisseabrem.A correntequeflui atravésdoscanaisgeraum potencialno
receptor,que é despolarizante(Figura 12.5a). Sea despolarizaçãofor suficien-
Sondaesti-
muladora . . t
Axônio
~
Cápsula
~ Corpúsculo
~intacto
tt
Potencial
doreceptor
Tempo .
(a)
Axônio
~
. t.
Corpúsculo
desprovido
dacápsula
Potencial
doreceptor
Tempo .
(b)
~ TATO 391
Ê
~
Q)
Qj
o..
.ro1.000ro
"O
ro
.~
~ 100
O
.ro
(/)
(/)
~ 10o..
ro
~ro
o..
CorpúsculodeMeissner
(ij
'E
:::i
10 50 100 3001.000
Freqüênciado estímulo(Hz)
FIGURA 12.4
Sensibilidade à freqüência para os
dois mecanorreceptores de adaptação
rápidadapele. Oscorpúsculosde
Pacinisãomaissensíveisaestímulosdealta
freqüência,e os corpúsculosde Meissner
sãomaissensíveisa estímulosde baixa
freqüência.A pelefoiestimuladapor meio
de umasonda,queexerciapressãoemvárias
freqüênciasenquantoerafeitoo registrono
nervo.Aamplitudedo estímuloaplicadofoi
aumentadaatéseremgeradospotenciasde
ação;o limiarfoi medidocomoa quantidade
de depressãodapeleemmicrômetros(~m).
(Fonte:Adaptadode Schmidt,1978.)
FIGURA12.5
Adaptaçãodocorpúsculode
Pacini. UmúnicocorpúsculodePacini
foi isoladoe estimuladoporumasonda,'
queexerciaumabrevepressãosobreele.
O potencialdo receptorfoi registradoem
umaporçãodo axôniopróximaaoestímulo.
(a) No corpúsculointacto,umgrande
potencialdereceptorfoigeradono início
e nofimdo estímulo:durantea pressão
contínua,o potencialreceptordesaparece.
(b) A encapsulaçãoemformadecebolafoi
dissecada,deixandoumaterminaçãoaxonal
desnuda.Quandoessafoipressionadapela
sonda,foigeradonovamenteumpotencial
do receptor,deformaquea cápsulanão
. é necessáriaparaa mecanorrecepção.No
entanto,enquantoo corpúsculointacto
respondiasomenteno inícioe nofinalde
umapressãocontínua,aversãodesprovida
decápsulaforneceuumarespostamuitomais
prolongada.Suafreqüênciadeadaptação
passoua serlenta.Aparentemente,é acápsula
quetornao corpúsculoinsensívela estímulos
debaixafreqüência.
392 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
Dedão
Panturrilha
42mm
Antebraco
FIGURA12.6
Discriminaçãode doispontosna
superfíciecorporal. Os paresde
pontosmostramadistânciamínima
necessáriaparadiferenciarentredois
pontosqueestejamtocandoo corpo
simultaneamente.Observea sensibilidade
dapontadosdedosquandocomparada
comado restodo corpo.
FIGURA 12.7
Os nervosperiféricos.
tementeintensa, o axônio irá dispararum potencial de ação.As camadasda
cápsula,no entanto,sãoescorregadias,por conterum fluido viscosoentreelas.
Sea pressãodo estímulofor mantidaconstante,ascamadasdeslizamumasso-
breasoutrase transferema energiado estímulo,detal formaquea terminação
axonal não mantéma deformaçãoda membrana,e o potencialdo receptorse
dissipa.Quandoa pressãoé aliviada,oseventosocorremdemaneirainversa;a
terminaçãodespolarizanovamenteepodedispararoutro potencialdeação.
Na décadade 1960,Werner
Loewenstein e seuscolegas,da Universidade
de Columbia, retiraramascápsulasde corpúsculosisoladose observaramque
a terminaçãoaxonal desnudatornou-se muito menos sensívelaos estímulos
vibratóriose maissensívelàpressãoestática(Figura12.5b).Evidentemente,éa
cápsulaem camadas(e não algumapropriedadedaterminaçãonervosaemsi)
quetorna o corpúsculodePacini especialmentesensívelà vibração,ou estímu-
los de altafreqüência,e quasenão respondendoàpressãoestática.
Discriminação de Dois Pontos. A capacidadeparadiscriminarmoscaracterís-
ticasdetalhadasdeum estímulovariaconsideravelmenteaolongodocorpo.Uma
medidasimplesda resoluçãoespacialé o testede discriminaçãode doispontos.
Vocêpode fazerem si mesmo,usandoum clipepara papeldobradona forma
de um U. Comececomaspontasdistanciadasentresi doisa trêscentímetrose
encoste-asna pontadeum dedodamão;vocênão terádificuldadeemdizerque
duaspontasseparadasestãotocandoseudedo.Aproxime, agora,um poucoas
duaspontasdo aramee encoste-asnovamentena pontade seudedo.Repitao
testeatéobservarquala distânciaemquedevemestaressaspontasparaquevocê
aspercebacomoum único ponto. (Essetestefica melhor sefor feito comduas
pessoas,umatestandoe a outra sendotestadasemolhar.)Tentedepoisno dorso
damão,emseuslábios,na suapernaou emqualqueroutrolugarquelheinteres-
sar.Compareseusresultadoscomaquelesapresentadosna Figura 12.6.
A capacidadede discriminaçãodedoispontospodevariar em,pelomenos,
vintevezesao longodo corpo.As pontasdosdedosdamãosãoasáreasdemaior
resolução.Ospontosda escritaBraille têm 1mm dealturae sãoseparadospor
uma distânciade2,5mm;até6pontoscompõemumaletra.Um leitorexperien-
te em Braille podepercorrercom o dedoindicadoruma páginacompontossa-
lientese ler aproximadamente600letraspor minuto, o queé aproximadamente
tãorápidoquantoler emvoz alta.Existemváriasrazõesparaexplicarpor quea
pontadosdedosémuito melhorparaler emBrailledo que,digamos,o cotovelo:
(1) existeuma densidademuito maior de mecanorreceptoresna peledaponta
dosdedosdamãodoqueemoutraspartesdocorpo;(2) aspontasdosdedostêm
um maior número de receptorescom camposreceptivospequenos;(3) existe
mais tecido cerebral(e, portanto,um maior poder de computaçãoresultante)
destinadoao processamentoda informaçãosensorialdecadamilímetroquadra-,
do dapontado dedodamãodo quedeoutroslocais,e (4) podehavermecanis-
mosneuraisespeciaisdestinadosàsdiscriminaçõesdealtaresolução.
Axônios Aferentes Primários
A pele é ricamente inervada por axônios que percorremuma vastarede de
nervosperiféricosem seutrajetoem direçãoao sistemanervosocentral (SNC)
(Figura 12.7). Os axônios que levam a informação dos receptoressensoriais
somáticosà medula espinhal ou ao tronco encefálicosão os axôniosaferentes
primáriosdo sistemasensorialsomático.Os axôniosaferentesprimáriosentram
na medula espinhalatravésdasraízesdorsais;seuscorposcelularesestãonos
gângliosdaraizdorsal(Figura12.8).
Os axôniosaferentesprimáriosapresentamdiâmetrosvariados,e seusta-
manhos correlacionam-secom o tipo de receptorsensorialao qual estãoliga-
dos.Infelizmente,a terminologiaparaos diferentestamanhosdeaxôniosbeira
o absurdo,pois utiliza dois conjuntosde nomes,com letrasgregasearábicase
numeraisromanos.Conformemostradona Figura 12.9,por ordemdecrescente
detamanho,osaxôniosdosreceptoressensoriaisdapelesãocomumentedesig-
nadospor Ao.,A~,Ao e C; os axôniosdetamanhosimilar,masque inervamos
Substância branca
" , 'nzenta Raiz dorsal
Sob""",,a" ~ - , .
da raiz dorsal.. ..~ Gângllo
\ " I ,""""ai
I " \~ ~. é-~..1' kRaiz
ventral
Nervo
espinhal
músculose tendões,sãochamadosde gruposI, n, III e IV. Observeque os ner-
vossensoriaisdapelenão possuemo grupodemaior tamanho(Aa). Osaxônios
do grupo C (ou IV) são, por definição, não-mielinizados, enquanto todos os
demaissãomielinizados.
Há uma questãointeressantee fundamentalpor trásdessesváriosnomesde
axônios.Lembre-seque o diâmetrodeum axônio,juntamentecoma quantida-
dede mielina, determinasuavelocidadede conduçãodo potencialde ação.Os
axôniosmenores,as chamadasfibrasC, não possuemmielina e têm diâmetro
menordoque 1mm. As fibrasC transmitema sensaçãodedor edetemperatura
esãoos axôniosmais lentos,conduzindoa uma velocidadede cercade 0,5 a 2
m/s.Parater uma idéiadequãolento é isso,dêum passogrande,conteatédois
e,então,dê outro passo.Essaé, grossomodo, a velocidadede propagaçãodos
potenciaisde açãoao longo das fibras C. Por outro lado, assensaçõesde tato,
Axônios
dapele
Aa
Axônios
dos
músculos
GrupoI
A~ cAo
11 IV111
0,2-1,5
0,5-2
Temperatura,
dor, prurido
'r TATO 393
FIGURA 12.8
As estruturas de um segmento da
medula espinhal e suas raizes.
FIGURA 12.9
Os vários tamanhos dos axônios
aferentes primários. Osaxônios
estãodesenhadosemescala,porémsão
mostrados2,000vezesmaioresdo queo
tamanhoreal.O diâmetrode umaxônio
estácorrelaClonadocomsuavelocidade
de conduçãoe como tipo de receptor
sensorialaoqualestáconectado.
DiâmetroI 13-20
(Jlm)
Velocidade I 80-120
(m/s)
Receporesl
Proprioceptores
sensbnals do músculo
esquelético
6-12 1-5
35-75 5-30
Mecanorreceptores Dor,
da pele temperatura
394 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
transmitidaspelosmecanorreceptarescutâneos,são conduzidaspelosaxônios
A(3relativamentegrandes,osquaispodemconduziravelocidadesdeaté75m/s.
Considere,como comparação,que um bom lançadarprofissionalde beisebol
podearremessarumabola rápidaa cercade 144km/h, queé apenas40 m/s.
A MedulaEspinhal
A maioriadosnervosperiféricoscomunica-secomosistemanervosocentralvia
medulaespinhal,aqualestáenvoltapelacolunavertebralóssea.
Organização Segmentar da Medula Espinhal. O arranjo dasraízesdor-
saise ventraisem paresestámostradona Figura 12.8e se repete30 vezesao
longo da extensãoda medulaespinhalhumana. Cadanervo espinhalconsiste
em axôniosdaraizdarsale daraiz ventral,quepassamatravésdo farameentre
asvértebrasda coluna.Existeo mesmonúmero denervosespinhaisqueosde
farames entre as vértebras.Conforme mostradona Figura 12.10,os 30 seg-
mentos espinhais estãodivididosemquatrogrupos,e cadasegmentorecebea
Medula
cervical
Medula
torácica
Medula
lombar
Medula
sacral
Medulaespinhal
Vertebra
I CervicalI
I TorácicaI
[LombarI
SacralI
FIGURA 12.10
Organização segmentar da medula espinhal. A medulaespinhalestádivididaem
porçõescervical,torácica,lombare sacral(esquerda).O ladodireitomostraa medulaespinhal
dentrodacolunavertebral.Os nervosespinhaissãodenominadospelonívelemque.emergem
damedulaespinhale numeradosseguindoumaordemdo maisrostralaomaiscaudal.
1
2
3
4
5
6
7
8 -
1 T1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
1
2
3
4
5
5
Nervosespinhais
C5
C6
C7
C8
S1
Cervical
Torácico
Lombar
Sacral
T TATO 395
C6
C7
C8
L5
S1
S2
L3
L4
FIGURA 12.11
Dermátomos. Essasilustraçõesmostramo mapeamentoaproximadodosterritóriosdos
dermátomosno corpo.
denominaçãodavértebraseguinteadjacenteà origemdo nervo: cervical(C) 1
a 8, torácico(T) 1 a 12,lombar (L) 1 a 5 e sacral(S) 1a 5.
A organizaçãosegmentardos nervos espinhaise a inervaçãosensorialda
peleestãorelacionadas.A áreadapeleinervadapelasraízesdorsais,direitaees-.
querda,deum único segmentoespinhalsechamadermátomo; existe,portan-
to, uma correspondênciade um-para-um entreosdermátomose ossegmentos
espinhais.Ao seremmapeados,osdermátomosdelineiamuma organizaçãoem
bandasdasuperfíciecorporal,comovisualizadona Figura 12.11.A organização
dosdermátomosé maisbemvisualizadaem um corpoinclinado comambasas
mãose ospésapoiadosno chão (Figura 12.12).Presume-seque essaorganiza-
çãosejaum reflexodenossaremotaancestralidadequadrúpede.
396 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
Cervical Torácico
FIGURA12.12
Dermátomosem umapessoacom o
troncocurvado,de quatro.
Quando uma raiz dorsal é seccionada,o dermátomocorrespondentedo
lado da lesãonão perdetodaa sensação.A sensaçãosomáticaresidualé
expli-
cadapelo fato de que asraízesdorsaisadjacentesinervam áreassobrepostas.
Para perder,portanto, toda a sensaçãoem um dermátomo,três raízesdorsais
adjacentesdevemser seccionadas.Entretanto, a pele inervadapelos axônios
de uma raiz dorsalpode serplenamentereveladaem uma condiçãopatológi-
ca chamadaherpeszoster(cabreiro),quando todososneurônios de um único
gângliodaraiz dorsalsãoinfectadoscomum vírus (Quadro 12.1).
Observena Figura 12.10queamedulaespinhaldosadultosterminaaproxi-
madamenteno nível daterceiravértebralombar.Os feixesdenervosespinhais
que seguemna direçãocaudaldentro da coluna vertebrallombare sacralsão
chamadosde caudaeqüina(emlatim para "caudade cavalo").A caudaeqüina
percorrea coluna vertebralem direçãocaudal,envolvidapor uma cápsulade
dura-máter,preenchidacomlíquido cefalorraquidiano(LCR). No procedimento
chamadopunçãolombar,utilizadona coletadeLCR paradiagnósticomédico,
uma agulhaé inseridana linha médiadessacisternapreenchidapor LCR. En-
tretanto,sea agulhafor inseridaum poucofora do centro,um nervopoderáser
atingido.Não serásurpreendenteseissocausaruma sensaçãodedor agudano
dermátomosupridopor aquelenervo.
Organização Sensorial da Medula Espinhal. A anatomiabásicadamedula
espinhalfoi introduzida no Capítulo 7. A medula espinhalestáconstituídade
um núcleocentraldesubstânciacinzenta,circundadapor um espessoenvoltório
detractosdesubstânciabranca,freqüentementedenominadosdecolunas.Cada
metadedasubstânciacinzentaespinhaldivide-seemumcornodorsal,umazona
HerpesZoster,CobreiroeDermátomos
Quandocrianças,muitosde nósforaminfectadospelovírus
herpeszoster;comumenteconhecidocomovaricelaou ca-
tapora.Após cercade umasemanacobertoscommanchas
vermelhase pruriginosasemnossapele,nosrecuperávamos.
Entretanto,aquiloquenãovemosaindapodeestaremnos-
socorpo.O víruspermaneceemnossosneurôniossensoriais
primários,dormente,masviável.A maioriadaspessoasnunca
maistemnotíciasdo vírusnovamente,mas,emalgunscasos,
o vírusrevivedécadasmaistarde,infligindoumasériacomo-
çãono sistemasensorialsomático.O resultadoé o cabreiro,
umacondiçãoquepodeapresentarfortesdoresnevrálgicas
durantemesesouatémesmoduranteanos.O vírusreativado
aumentaa excitabilidadedosneurôniossensoriais,levandoà
diminuiçãodo limiardedisparoscomo,também,favorecendo
aatividadeespontânea.A doré comoumaardênciaconstan-
te,acompanhadadeeventuaisdoresintensassúbitase agudas,
deixandoa peleespecialmentesensívela qualquerestímulo.
As pessoascomcobreiroprocuramevitaro usode roupas
devidoa suahipersensibilidade.A peleficainflamadae com
bolhasqueformamcrostaseescamamquandosecam,porisso
o nome(herpesemlatimsignifica"querasteja",alusãoaosrép-
teisescamosos)(FiguraA).
Felizmente,o herpevírus,viade regra,torna-sereativo
apenasnosneurôniosde umgânglioda raizdorsal(ou do
gângliotriger:rinal).lssosignificaqueossintomasficamrestritos
à peleinervadapelosaxôniosdaraizdorsalafetada.O vírus
r
Ut-
.
j
.J.
FIGURAA
Lesõescutâneas
causadaspelo
cobreiro(Herpes
zoster),confinadasao
dermátomoL4 do
ladoesquerdo.
realizaparanós,defato,umexperimentodemarcaçãoanatô-
mica,tornandobemdefinidoo territórionapelecorrespon-
dentea umdermátomo.Praticamente,qualquerdermátomo
podeserafetado,emboraasáreastorácicae facialsejamas
maisfreqüentementeatingidas.As análisesdasáreasafetadas
deváriospacientescomherpeszosterforamrealmenteúteis
nomapeamentodosdermátomos(verFigura12.11).
Os neurocientistasestãoagoraaprendendoa tirarvan-
tagemdautilizaçãodo herpese deoutrosvírus.Os vírussão
ferramentasdepesquisavaliosas,poispodemserutilizadosna
introduçãodenovosgenesnosneurônios.
T TATO 397
Colunas dorsais
Xi,,'. r~ f>' .
/ \0:
.
.\,
~f
,--. --
Zona
- .A - -- ..-/ -
intermedia
' ' - .:.~-
ria C ~orno ventral
FIGURA12.13
O trajeto dosaxôniosAp sensíveisao tato na medulaespinhal.
intermediáriaeum cornoventral(Figura12.13).Osneurôniosquerecebemaferên-
dassensoriaisoriundasdosneurôniosaferentesprimáriossãochamadosdeneu-
rôniossensoriaisdesegundaordem.A maioriadosneurôniossensoriaisde segunda
ordem(ou secundários)damedulaespinhallocaliza-senoscornosdorsais.
OscalibrososaxôniosmielinizadosAI3,queconduzema informaçãotátilda
pele,entramno corno dorsal e se ramificam.Um ramo faz sinapsecom neu-
rônios sensoriaisde segundaordem na parteprofunda do corno dorsal.Essas
conexõespodemdesencadearou modificaruma variedadederespostasreflexas
rápidase inconscientes.O outro ramo do axônio aferenteprimário AI3ascen-
de diretamentepara o encéfalo.Essaaferênciaascendenteé responsávelpela
percepção,tornando-nos capazesde fazerjulgamentos complexosacercados
estímulostáteisna pele.
AVia Coluna Dorsal-lemnisco Medial
A informaçãosobreo tato ou a vibraçãodapele segueuma via em direçãoao
encéfaloqueé totalmentedistintadavia em queseguemasinformaçõesacerca
dador e datemperatura.A via do tatoé chamadadevia coluna dorsal-Iem-
nisco media!, por razõesque veremosa seguir.A organizaçãodessavia está
resumidana Figura 12.14.
O ramo ascendentedosaxôniossensoriaiscalibrosos(AI3)entrana coluna
dorsal ipsilateralda medulaespinhal,o tractode substânciabrancamedial ao
cornodorsal(verFigura 12.13).As colunasdorsaislevaminformaçãoacercada
sensaçãotátil (edaposiçãodosmembros)emdireçãoao encéfalo.Sãoconstitu-
ídasdeaxôniossensoriaisprimários,comotambémde axôniosde segundaor-
demdeneurôniosdasubstânciacinzentaespinhal.Os axôniosdacolunadorsal
terminamnosnúcleos da coluna dorsa!, que estãosituadosno limite entrea
medulaespinhale o bulbo. Observequealgunsdosaxôniosqueterminamnos
núcleosda coluna dorsal,na basede suacabeça,originam-sede áreasda pele
tãodistantesquantoa do dedãodeseupé!Essaéumavia diretarápidaqueleva
informaçãodapeleao encéfalosemsequeruma sinapseno trajeto.
Nesseponto da via, a informação ainda estárepresentadaipsilateralmen-
te, ou seja,a informação tátil do lado esquerdodo corpo estárepresentadana
atividadedas células dos núcleos da coluna dorsal esquerda.Entretanto, os
axônios dos neurônios dos núcleos da coluna dorsal fazem uma curva em
direçãoaobulboventralemediale. então,decussam.A partirdesseponto,o
sistemasensorialsomáticodeumladodoencéfaloestárelacionadocomassensações
originadasdoladoopostodocorpo.
Osaxôniosdosnúcleosda colunadorsalascendempor um tractoconspícuo
desubstânciabranca.chamadolemnisco media!. O lemniscomedialsobeatravés
dobulbo,daponteedomesencéfalo,e seusaxôniosfazemsinapsecomneurônios
398 CAPíTULO 12 . O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
,.'
@
Axôniosde
grandecalibre
da raizdorsal
Córtex
somatossensorial
primário(81)
o......--
Medula espinhal
FIGURA 12.14
A viacolunadorsal-Iemniscomedial. Esta
é a principalviapelaqualo tatoe a informação
proprioceptivaascendemaocórtexcerebral.
donúcleoventralposterior(VP) dotálamo.Estejaatentoparao fatodeque
nenhumainformaçãosensorialseguediretamenteaoneocórtex,semantesfazer
sinapsenotálamo.OsneurôniostalâmicosdonúcleoVPprojetam-se,porsuavez,
pararegiõesespecíficasdocórtexsomatossensorialprimárioouSI.
É tentadorsuporquea informaçãosensorialsejatransferidasimplesmente
semmodificaçõespelosnúcleosdotroncoencefálicoedotálamonoseutrajeto
aocórtexequeoprocessamentorealmenteocorraapenasno córtex.Defato,
essepressupostoimplicouaterminologianúcleosrelê(comoodispositivoelétrico
queintervémnapassagemdecorrente)ounúcleosderetransmissão,termosesses
quesãofreqüentementeutilizadosparadescreverosnúcleossensoriaisespecí-
ficosdotálamo,comoéocasodonúcleoVP.Estudosneurofisiológicostêm,en-
tretanto,demonstradoo oposto.Tantonosnúcleosdacolunadorsalcomonos
talâmicos,ocorreumatransformaçãoconsideráveldainformação.Comoregra,
cadavezquea informaçãopassaporumconjuntodesinapsesdosistemaner-
vosocentral,elapodeseralterada.Em especial,asinteraçõesinibitóriasentre
osgruposadjacentesdeaferências,quechegampelaviacolunadorsal-Iemnisco
medial,aumentamasrespostasaosestímulostáteis(Quadro12.2).Comove-
T TATO 399
Inibição Lateral
A informaçãoé geralmentetransformadaàmedidaquepassa
de umneurônioao seguinte,ao longode umaviasensorial.
Umatransformaçãocomumé aamplificaçãodediferençasna
atividadeemrelaçãoa neurôniosvizinhos,fenômenoconhe-
cido,também,comoaumentodocontraste.Já vimosissonos
camposreceptivosdacélulaganglionardaretina(verCapítulo
9).Setodososfotorreceptoresquefornecemsinaisaferentes
paraumacélulaganglionarfossemigualmenteiluminados,acé-
luladificilmentedistinguiriaos sinais.Contudo,seexisteuma
bordadecontraste- umadiferençadeiluminação- dentrodo
camporeceptivocelular,a respostadacélulaseráintensamen-
te modulada.O aumentodo contrasteé umacaracterística
comumdo processamentoda informaçãonasviassensoriais,
inclusiveparao sistemasensorialsomático.Um mecanismo
geralsubjacenteaoaumentodecontrasteéa inibiçãolateral,
noqualumacélulavizinhainibea outra.Vamosvercomoisso
ocorre,utilizandoummodelosimples.
ConsidereasituaçãodaFiguraA.Os neurôniosdogânglio
daraizdorsal,marcadoscomletrasde a a g, retransmitem
(relésináptico)a informaçãoaosneurôniosmarcadosdeA a
G, no núcleodacolunadorsal.Vamosassumirqueo sinalde
saídadascélulasdo núcleodacolunadorsalé simplesmente
o sinaldeentradapré-sinápticomultiplicadoporumfatorde
ganhoiguala I.Seaatividadedosinalqueentradacélulad for
1O,aatividadequesaidacélulaD tambémserá1°.Essaforma
simplesde retransmissãonãoaumentaemnadaa diferença
entreo neurôniomaisativo,d,e osdemais.
Considere,agora,asituaçãodaFiguraB,ondeinterneurô-
niosinibitóriosqueforamadicionadosprojetam-selateralmente
parainibircadaumadascélulasvizinhas.O ganhosinápticodas
sinapsesinibitórias(triângulospretos)é-I, e o ganhodassinap-
sesexcitatóriasfoiajustado,comomostradonafigura.Calculea
atividadedecadacélulacomamultiplicaçãodosinaldeentrada
emcadasinapsepeloseuganhosinápticoe,então,someoefeito
detodasassinapsessobreacélula.Sevocêrealizaressecálculo,
veráqueexisteumaumentosignificativodecontraste:adiferen-
çaentreaatividadedacélulad emrelaçãoassuasvizinhasfoi
consideravelmenteampliflcadanosinaldesaídadacélulaD.
remosa seguir,algumassinapsesnessesnúcleos tambémpodem ter sua efi-
ciênciamodificada,dependendodesuaatividaderecente.Neurônios tanto dos
núc~osdo tálamocomo dosnúcleosda coluna dorsalsãocontrolados,ainda,
poraferênciasdo córtexcerebral.Conseqüentemente,a eferênciacorticalpode
influenciara aferênciaparao próprio córtex!
+++++
HflItJIf\t
+++++
++++
Sinaisde entrada, Sinaisde saída, Sinaisde entrada,
emdisparaspor emdisparaspor emdisparaspor
segundo 0 segundo segundo+++++5 1X0--- 5 +++++ +++++5
+++++5 $ 1X@--- 5 +++++ +++++5
+++++5 (0 1X@-- 5 +++++ +++++5
{Estímulo ( Estímulotttttttttt1o CV 1X@---- 10 tttttttttt tttttttttt1o
+++++5 0 1X@--- 5 +++++ +++++5
+++++5 Q) 1Xcv---- 5 +++++ +++++5
+++++5 1X@--- 5 +++++ +++++5
FIGURAA FIGURA B
400 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
A ViaTáctilTrigeminal
Até esteponto, descrevemosapenasapartedo sistemasensorialsomáticoque
entra na medula espinhal. Seexistisseapenasessaparte, não teríamossensa-
çõesna face.As sensaçõessomáticasdafacesãosupridasprincipalmentepelos
grandesramosdo nervo trigêmeo (nervo cranianoV). o qual chegaao encé-
falo pelaponte. (O termo origina-se do latim: tria, "três";geminus,"gêmeo".)
O nervo trigêmeodivide-se,de cadalado, em trêsnervosperiféricosque iner-
vam a face, a regiãobucal, os dois terçosexternosda língua e a dura-máter
que recobreo encéfalo.As sensaçõesda pele em torno dasorelhas,da região
nasal e da faringesãofornecidaspor outros nervos cranianos:o facial (VII). o
glossofaríngeo(IX) e o vago (X).
As conexõessensoriaisdo nervo trigêmeosãoanálogasàquelasdasraízes
dorsais.Os axônios sensoriaisde grande diâmetro do nervo trigêmeolevam
informaçãotátil dos mecanorreceptoresda pele.Eles fazemsinapsecomneu-
rônios de segundaordemdo núcleo trigeminalipsilateral,que é análogoa um
núcleo da colunadorsal (Figura 12.15).Os axôniosdo núcleo trigêmeodecus-
same seprojetampara a partemedial do núcleo VP do tálamo.A partir desse
núcleo,a informaçãoé retransmitidaparao córtexsomatossensorial.
Córtex
somatossensorial
primário(81)
Núcleosensorial
principaldonervo
trigêmio
/ ,'r-
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--
-(
Tálamo
(núcleoVP)
Axônios
mecanoceptores
degrandecalibre
daface
./' FIGURA 12.15
A viado nervotrigêmeo. Essaé a via
pelaquala informaçãosomatossensorialdaface
alcançao córtexcerebral.
Nervotrigêmio
(nervocranianoV)
Córtex somatossensorial
(áreas 1, 2, 3a, 3b)
Córtex parietal
posterior (áreas 5, 7)
FIGURA 12.16
Áreas sensoriais somáticas do
córtex. Todasasáreasilustradas
localizam-seno lobo parietal.Ailustração
inferiorrepresentao giropós-centralque
contémSI, áreas3b.
Córtex Somatossensorial
Assimcomoparatodososdemaissistemassensoriais,osníveismaiscomplexos
doprocessamentosomatossensorialocorremno córtexcerebral.A maior parte
do córtexrelacionadacom o sistemasensorialsomáticoestálocalizadano lobo
parietal(Figura 12.16).A áreadeBrodmann 3b,reconhecidaatualmentecomo
o córtexsomatossensorialprimário (S1), é fácil de serlocalizadaem humanos
porqueestásituadano giro pós-central (logo atrásdo sulco central). Junto à
SI, estãooutrasáreascorticaisque tambémprocessama informaçãosensorial
somática.Essasincluem asáreas3a, 1 e 2 no giro pós-centrale áreas5 e 7 no
córtex parietal posterior adjacente(verFigura 12.16).
A área3bé o córtexsensorialsomáticoprimárioporque(1) recebeum grande
númerodeaferênciasdo núcleoVP do tálamo;(2)seusneurôniossãomuito res-
ponsivosaosestímulossomatossensoriais(masnãoa outrosestímulossensoriais);
(3) lesõesnessaáreaprejudicama sensaçãosomática,e (4) a aplicaçãode estí-
muloselétricosnessaárearesultaem experiênciassensoriaissomáticas.A área3a
tambémrecebeumadensaaferênciado tálamo;essaregião,entretanto,estámais
relacionadacomasinformaçõesacercadaposiçãodo corpodo quecomasacerca
dotato.
As áreas1e2 recebemdensainervaçãodaárea3b.A projeçãodaárea3bpara
aárea1enviaprincipalmenteinformaçãosobretextura,enquantoaprojeçãopara
aárea2 enfatizatamanhoeforma.Pequenaslesõesrestritasàsáreas1ou 2 produ-
zemdeficiênciasesperadasna discriminaçãodatextura,dotamanhoedaforma.
O córtexsomatossensorial,comooutrasáreasdoneocórtex,é umaestrutura
organizadaem camadas.Assim comopara os córticesauditivo e visual,asafe-
rênciastalâmicasparaSI terminamprincipalmentena camadaIV. Osneurônios
dacamadaIV projetam-se,por suavez,paraascélulasdeoutrascamadas.Outra
importantesimilaridadecomasoutrasregiõescorticaisé queosneurôniosdeSI
quepossuemaferênciase respostassimilaresficam dispostosverticalmenteem
colunasqueseestendemao longo dascamadascorticais(Figura 12.17).O con-
T TATO 401
D1
FIGURA 12.17 ,
Organização colunar de S I. Cada
dígito (D I-D3) está representado em
uma área adjacente do córtex. Na área
de representação de cada dígito,existem
colunas alternadas de célulascom respostas
sensoriais de adaptação rápida (verde) e de
adaptação lenta (vermelho). (Adaptado de
Kaasetai.,198I,Figura8.)
402 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
ceitodecolunavertical,tãobrilhantementeelaboradopor HubeleWieselparao
córtexvisual,foi, defato,descritopelaprimeiravezparao córtexsomatossenso-
rial pelocientistaVernonMountcastle,daUniversidadeJohn Hopkins.
Somatotopia Cortical. Estimulaçãoelétricada superfíciede 51 pode causar
sensaçõessomáticaslocalizadasem umaparteespecíficado corpo.A movimen-
taçãodo estimuladorde forma sistemáticapor 51 resultaráem sensaçõesao
longo do corpo. O neurocirurgiãocanadenseWilder Penfield,da Universidade
McGill, utilizou essemétodode estimulação,entreasdécadasde 1930a 1950,
para mapearo córtexde pacientesduranteneurocirurgias.(É interessanteob-
servarque essasoperaçõescerebraispodemserrealizadasempacientesacorda-
doscomanestesialocalapenasno escalpo,poisostecidosneuraisemsi nãopos-
suemreceptoresparasensaçõessomáticas.)Outra maneirademapearo córtex
somatossensorialé
registrara atividadede um único neurônio e determinaro
local de seucamporeceptivosomatossensorialno corpo. Os camposreceptivos
dosneurônios de 51produzemum mapaordenadodo corpono córtex.O ma-
peamentodassensaçõesdasuperfíciecorporalemuma áreado sistemanervoso
centraléchamadodesomatotopia. Vimosanteriormentequeo cérebropossui
mapasde outrassuperfíciessensoriais,como,por exemplo,daretinasensívelà
luz (retinotopia)e dacócleasensívelà freqüênciano ouvido interno (tonotopia).
Os mapassomatotópicosgeradospor métodosde estimulaçãoe deregistro
da atividadeelétricasãosimilarese lembramgrosseiramenteum trapezistade
cabeçaparabaixo, com os joelhos tlexionadosno topo do giro pós-central,as
pernasna direçãodo córtexmedial,entre os dois hemisférios,e com a cabeça
na direçãooposta,na extremidadeinferior do giro (Figura 12.18).Um mapa
somatotópicoé chamadoalgumasvezesde homúnculo(para o diminutivo de
"homem" emlatim; o pequenohomemno cérebro).
Podemosperceberdois aspectosóbviosao observarmoso mapasomatotó-
pico. Primeiro, o mapanão é contínuo, masfragmentado.Observena Figura
12.18que a representaçãoda mão separaasrepresentaçõesdafacedaporção
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Lábio inferior
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rFIGURA 12.18Um mapa somatotópico da superfíciecorporal no córtex somatossensorialprimário. Estemapaé umasecçãotransversaldo giropós-central(mostradoacima).
Os neurôniosdecadaáreasãomaisresponsivos
àquelaspartesdo corpoilustradasjuntoaelas.
(AdaptadodePenfielde Rasmussen,1952.)
\..í~9Ua.
posteriordacabeça,enquantoosgenitaisestãomapeadosnasáreasmaisocultas
deSI, abaixo da representaçãodos dedosdospés. Segundo,o mapanão está
deacordocom a escalado corpo humano. Em vez disso,o mapapareceuma
caricaturahumana (Figura 12.19):a boca, a língua e os dedosdasmãos são
absurdamentegrandes,enquanto o tronco, os braçose aspernas sãopeque-
nos.O tamanhorelativodaáreado córtexdedicadoa cadapartedo corpoestá
correlacionadocoma densidadedasaferênciassensoriaisquerecebedaquelade-
terminadaregião.O tamanhono mapatambémestárelacionadoà importância
dasaferênciassensoriaisde determinadaparte do corpo;a informaçãode seu
dedoindicadoré maisútil do que aquelade seucotovelo.A importânciada in-
formaçãotátil denossasmãose dedosé óbvia,masporquededicartantopoder
decomputaçãocorticalà boca?As duasprováveisrazõessãoque assensações
táteissãoimportantesna produçãodafalae que seuslábiose língua (sensações
somáticas,alémdo paladar)sãoa última linha dedefesaquandosedevedecidir
seum certobocadoé um alimentonutritivo e deliciosoou é algoque poderia
sufocá-Io,quebrarseudenteou arranharsua faringe.Como veremosa seguir,
aimportânciadeuma aferênciae o tamanhodesuarepresentaçãocorticaltam-
bémsãoreflexosdafreqüênciacomqueessainformaçãoé utilizada.
A importânciade umapartedo corpopodevariar consideravelmenteentre
asdiferentesespécies.Por exemplo, as grandesvibrissasfaciais (bigodes)dos
roedoresrecebemuma áreaenormeem SI paraseuprocessamento,enquanto
osdígitosdaspatasrecebemuma árearelativamentepequena (Figura 12.20).
Deformanotável, os sinaissensoriaisde cadafolículo devibrissaseguempara
umagrupamentobem definido de neurônios de SI; tais grupossãochamados
debarris.O mapasomatotópicodasvibrissasdos roedorespode ser facilmente
visualizadoem secçõeshistológicasde SI; as cinco fileiras de barris corticais
coincidemprecisamentecomascinco fileirasdevibrissasfaciais.
A somatotopiano córtexcerebralnão estálimitadaa um único mapa.Exa-
tamenteda mesmaforma que o sistemavisual constróimúltiplos mapasreti-
Vibrissas
Folículos
,I!
,\.
(a)
FIGURA 12.20
Um mapa somatotópico das vibrissas faciais no córtex
cerebral do camundongo. (a) A posiçãodasprincipaisvibrissas
naface.(b) Um mapasomatotópicodentrode SI no cérebro
decamundongo.(c) Os barrisdeSI. Foramfeitasfinassecções
histológicasdo córtexparalelasà superfíciee coradascomatécnica
deNissl.O quadromenormostrao padrãodadisposiçãodos
barrisemcincofileiras;comparecomascincofileirasdevibrissasna
fotografiadapartea. (AdaptadodeWoolseyeVanderLoos,1970.)
(c) 1mm
... TATO 403
FIGURA 12.19
O homúnculo.
Barris
em81
..~~,.,S~,~- !!i:e1".-iS:~~...
404 CAPíTULO 12 . O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
FIGURA 12.21
Mapas somatotópicos
múltiplos. Registrosobtidosdeáreas3be
I deummacaco-da-noite.(a) Os registros
mostramquecadaáreapossuio seupróprio
mapasomatotópico.(b) Examedetalhado
daárea(jamãomostraqueosdoismapas
sãocomoimagensespeculares.As regiões
sombreadasrepresentama superfície
dorsaldasmãose dospés:asregiõesnão-
sombreadasrepresentamassuperfícies
ventrais.(Fonte:Adaptadode KaasetaI.,
1981.)
Perna
Planta
dopé
Coxa
Tronco
Braço
Pulso
Palma
Queixo
Vibrissa
caudal
Lábio
inferior
Lábio
superior
Dentes
Área
Área
1mm
(a) (b)
Dedos
notópicos,o sistemasensorialsomáticopossuiváriosmapasdo corpo.A Figura
12.21mostraa somatotopiadetalhadadeSI emum macaco-da-noite(Aotus
sp.). Comparecuidadosamenteosmapasdasáreas3b e 1;elesrepresentamas
mesmaspartesdo corpo,literalmenteemparaleloao longo defaixasadjacentes
do córtex.Os doismapassomatotópicosnão sãoidênticos,masum é a imagem
especulardo outro, como fica clarono esquemaampliadodasduasregiõesda
mão (Figura 12.21b).
Plasticidade do Mapa Cortical. O que acontece ao mapa somatotópico
no córtex quando for removida uma aferência,como, por exemplo,a deum
dedo? A "área do dedo" no córtex ficaria simplesmentesem utilidade? Ela
atrofiaria? Ou essetecido passariaa ser utilizado pelas aferênciasoriginadas
de outros locais? As respostasa essasquestõespoderiam ter implicaçõesim- ,
portantesparaa recuperaçãodeuma função apóslesãonervosaperiférica.Na
décadade 1980,o neurocientistaMichael Merzenich e seuscolaboradores,da
Universidade da Califórnia em São Francisco,iniciaram uma sériede experi-
mentosparatestaressashipóteses.
OsprincipaisexperimentosestãoresumidosnaFigura12.22.Primeiro,asre-
giõesdeSI quesãosensíveisàestimulaçãodamãoemummacaco-da-noiteadulto
foram cuidadosamentemapeadascommicroeletrodos.Então, um dedoda mão
(dígito3)foi cirurgicamenteremovido.Apósváriosmeses,o córtexfoinovamente
mapeado.O queseregistrou?O córtexoriginalmentedestinadoao dígitoamputa-
dopassouaresponderàestimulaçãodosdígitosadjacentes(Figura12.22c).Houve
umaevidentereorganizaçãodacircuitariasubjacenteà somatotopiacortical.
No experimentoda amputação,o motivo da reorganizaçãodo mapafoi a
ausênciadeaferênciasdo dígitoque estavafaltando.O queacontecequandoa
atividadeaferentede um dígito estáaumentada?Para responderessaquestão,
os macacosforam treinadospara utilizar dígitosespecíficospara realizaruma
tarefa,pela qual eles recebiamum alimento como recompensa.Após várias
semanasde treino,os experimentosdemapeamentocommicroeletrodosmos-
traram que a representaçãodos dígitosestimuladostinha sido expandidaem
comparaçãoà dos dígitosadjacentes,não-estimulados(Figura 12.22d).Esses
"";;:;
T TATO 405
"'\' "R Ari.,;";:~::O~~~/
pnmano 30rial ~
(a) L~calizaçãodo mapa
da maoesquerdano hemisfério
direitodo córtexdo macaco
Superfíciedorsal
Dígito5
Dígito4
Dígito3
Dígito2
Dígito1
(Polegar)
Superfíciedorsal
(b) Mão normal,superfíciepalmar
Detalhesdo mapa
cortical
02
(e) Reorganizaçãodo mapa
corticalapós remoção
cirúrgicadoterceirodígito(D3)
Após reorganização
do córtex
somatossensorial
(d) Reorganizaçãodo mapa
corticalapós treinode
discriminaçãocomas pontas
de doisdedos
FIGURA 12.22
Plasticidade do mapa somatotópico. (a, b) Os dedosdamãode ummacaco-da-
noite estãomapeadosnasuperfíciedocórtexemSI.(c) Seo dígito3forremovido,com
opassardotempo,o córtexsereorganizademaneiraqueasrepresentaçõesdosdígitos
2e4 seexpandem.(d) Seosdígitos2e
3foremestimuladosdeformaseletiva,suas
representaçõescorticaistambémseexpandem.
experimentosrevelaramqueos mapascarticaissãodinâmicose que seuajuste
dependeda quantidadede experiênciasensorial.Experimentossubseqüentes
emoutrasáreasdo córtex(visual,auditiva,motara)têmmostradoqueessetipo
deplasticidadedomapacorticalé comum.
Os relatosacercadaplasticidadedo mapanos animaislevaramà buscade
alteraçõessimilaresno encéfalohumano. Um exemplointeressantefoi obtido
de estudoscom amputados.Uma experiênciacomum entre os amputadosé
a percepçãode sensaçõesque se originariam do membro que estáfaltando,
quando,na verdade,outraspartesdo corpo sãotocadas.V.S. Ramachandran,
daUniversidadeda Califórnia em SanDiego, demonstrouque essassensações
de "membrofantasma"são causadasusualmentepela estimulaçãode regiões
dapele, cujasrepresentaçõessomatotópicasfazemlimite com as do membro
faltante;por exemplo,a sensaçãopodesercausadaem um braçofantasmame-
diantea estimulaçãoda face (Quadro 12.3).Métodos de captaçãode imagens
406 CAPíTULO 12 . O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
QuandoosMapas
CerebraisColidem
Apósterpassadoosprimeiros15anosdeminhacarreiraenvol-
vidocomo estudodavisãohumana,volteiaatençãoàneurologia
comportamental- minhaprimeirapaixão.Possopensaremao
menosduasrazõesparaisso.Primeiro,naneurologiaaindaépos-
sívelfazerpesquisacompoucatecnologia,partindodeprincípios
básicos,tipo"SherlockHolmes",e chegararespostassurpreen-
dentesparaquestõesimportantes.Segundo,comosereshuma-
nos,nadanosé maisfascinantedoquenósmesmos,e aneuro-
logiaéa disciplinaquenoslevadiretoaoâmagodaquestãode
quemsomosnós.Aindalembrodoprimeiropacientequeatendi
nafaculdadedemedicina;eletinhaparalisiapseudobulbareficava
alternandoentregargalhadasexplosivase surtosdechoroem
questãodeminutos.Tratava-semeramentede lágrimasdecro-
codiloe derisadasforçadas?Ou o pacienterealmentesentia-se
tristeealegre,alternadamente,comoacontececomumpaciente
maníaco-depressivo,masemumaescaladetempomenor?
Umdosprimeirosexperimentosquerealizeifoiemumpa-
cientecomsensaçãodo braçoesquerdofantasmaapóssuaam-
putação.Inspiradopelotrabalhonosmacacos,eusimplesmente
toqueiasváriaspartesdeseucorpoefacecomumahastedeal-
godão,Imagineaminhasurpresaquandoeutoqueisuabochecha
esquerda,e eledissequesentiao toqueemsuamãofantasma!
Testesadicionaisrevelaramummapacompletodamãonaparte
inferiordaface.Porqueissoacontece?Eusabiaquehaviaum
mapasistemático,topograficamenteorganizadodasuperfíciecor-
poralinteiraesquerdanaárea3bdogiropós-centraldireito.O
mapaécontínuo,excetopelofatosingulardequeafaceestáre-
presentadamaispróximadaáreadamãodoquedopescoço,Isso
medeuumadica.Comoaregiãodamãonocórtexestavaagora
privadadeaferências(devidoàamputação),elaestava"faminta"
pornovasaferências,assim,asaferênciassensoriaisqueeramdes-
tinadasexclusivamenteparaaregiãoadjacenteàdamãopassa-
ram,então,a"invadir"o territóriovago,Assim,umtoquenaface
erainterpretadoerroneamentepeloscentrossuperiorescomo
tendoseoriginadodamão,Obtivemos,então,imagensfuncionais
docérebrodessemesmopacientee descobrimosqueo estímu-
lotátildafaceativava,defato,aáreadamãonocórtex;essafoia
primeirademonstraçãodeumareorganizaçãoemgrandeescala
demapassensoriaisnocórtexdehumanosadultos.
Muitospacientesquesentemmembrosfantasmasquei-
xam-sequeo membrofantasmaestá"paralisado"ou conge-
ladoem umaposiçãodesagradávele dolorosa.Euescorava
verticalmenteumespelhonamesa,defrenteparao paciente
e o faziaolharparao reflexodamãonormalno espelho,de
modoqueo levavaà ilusãodequeo membrofantasmatinha
sidoressuscitadovisualmente.Curiosamente,seelemovesse
a mãonormal,a mãofantasmanãoapenaspareceriaestarse
movendocomoeletambémsentiriacomosea estivessemo-
vendo- pelaprimeiravezemanos.Mesmoempacientescom
umbraçointacto,masparalisadoporumacidentevascularce-
rebral(AVC),o espelhogerailusõesvívidasdemovimento.
porVilayanurS.Ramachandran
Essasduasdescobertas- o "mapa"sobreafaceeamobi-
lidadedosmembrosfantasmascomo usodeespelhos- reali-
zadasnoiníciodadécadade 1990levaramaoreconhecimento
dequeexistiaumaextraordináriaquantidadede plasticidade
latentenocérebroadulto,A utilizaçãoclínicadessefenômeno
necessitadeumaavaliaçãocuidadosa,masosprincípiosgerais
queestabelecemos- quea aferênciade umsistemasenso-
rialintactopodeserutilizadaparaacessare recrutarcircuitos
neuraisdormentesemoutrasregiõescorticais- semantême
possibilitamumaabordagemcompletamentenovananeurolo-
giaparaa reabilitação.
Posteriormente,eumedediqueià sinestesia,umacondi-
çãocuriosanaqualumapessoaconsideradanormalenxerga
osnúmerosindividualmentecomotendosempreumacores-
pecífica;porexemplo,o 5 évermelho,e o 2 é azul.A condição
é hereditáriaeésetevezesmaiscomumentreartistas,poetase
romancistas.Pormaisde 100anos,a sinestesiahaviasidorejei-
tadacomosendoumatapeaçãooubaseadaemconfabulação.
Trabalhamoscompsicofísicadeformasistemáticaparamos-
trarqueasinestesiaé umefeitosensorialgenuíno- aspessoas
realmentevêemascores.Sugerimos,então,queelaresulta,de
maneirasimilaraospacientescommembrosfantasmas,daati-
vaçãocruzadaanormalentreosneurôniosquecodificamacor
e osneurôniosdaáreaqueprocessanúmeros,ambososquais
estãosituadosnogirooccipitotemporallateral.Experimentos
subseqüentescomressonânciamagnéticafuncionalconfirma-
ramnossasuspeita.Quandocomeçamosaspesquisasacerca
dasinestesia,em 1997,issoeraconsideradoumpoucomaisdo
quecuriosidade,mas,atualmente,existemmuitosgruposreali-
zandotrabalhosestimulantes.
Sugerimos,também,queseo "gene(ougenes)dasineste-
sia"fosseexpressodeformadifusaemtodososlocaisdocórtex,
issopoderiaresultaremumamaiorativaçãocruzadaportodo
o córtexcerebral.Devidoaofatodeasconcepçõesemnível
superiorpoderemestarrepresentadas,também,emmapascere-
brais,o resultadofinalseráumamaiorpropensãoparaassociar
conceitosaparentementenão-relacionados,o quechamamosde
metáforas.Issoexplicaamaiorincidênciadesinestesiaemartis-
tase poetas.Essaseriaprovavelmentearazãopelaqualgenes,a
princípiosemutilidade,tenhamsobrevivido;éo programaoculto
paraprocessarinformaçãodeformaquepermitacriatividadee
pensamentoabstrato.Nessecaso,pode-secomeçarcomaabor-
dagemgenéticae seguirpelaneuroanatomiaatéapsicofísicasis-
temática,atéacriatividadeeopensamentoabstrato- tudoisso
como estudod~ssa"curiosidade",asinestesia.
Essatemsidoa minhaestratégiade investigaçãoemter-
mosgerais:revivero interesseemsíndromesneurológicasan-
tigas,trazendo-asdo contextoclínicoparao laboratório.Fre-
qüentementeissoé comoumacaçadamaluca,masdevezem
quandovocêsedeparacomalgorealmenteexcitante,e issoé
o quecompensatodaajornada.
funcionaisdo cérebrorevelamqueasregiõescorticaisoriginalmentedestinadas
aosmembrosfaltantesficam ativadascom a estimulaçãoda face. Apesar do
significadoadaptativodessaplasticidade,no sentidode que o córtexnão fique
ocioso,a correlaçãoequivocadaentrea estimulaçãoe a percepçãonosamputa-
dosindicaque issopossalevarà confusãona interpretaçãodossinaisem S1.
Apesardo fato dequepossuircórtexa maisparao processamentosensorial
deumapartedo corpopodenão sernecessariamentebenéficoaosamputados,
aparentementeo é paraos músicos.Os violinistase outrosmúsicosque tocam
instrumentosde cordadevemdedilharcontinuamenteascordascom suamão
esquerda;os dedosda outra mão, a que segurao arco,recebemconsideravel-
mentemenos estimulaçãoindividual. A imagemfuncional de S1 mostraque
a quantidadede córtex dedicadaaos dedosda mão esquerdaé bem maior em
músicoscomoosviolinistas.É provávelque essasejauma versãoexageradade
umprocessoderemapeamentocontínuo, que ocorreno córtexdecadapessoa,
deacordocomasexperiênciasvividas.
Os mecanismossubjacentesa essestipos de plasticidadedo mapanão são
compreendidos.Entretanto,comoveremosno Capítulo 25, elespodemenvol-
verprocessosrelacionadosao aprendizadoe àmemória.
o Córtex Parietal Posterior. Como vimos, a segregaçãodos diferentestipos
deinformaçãoé umaregrageralparaossistemassensoriais,e o sistemasensorial
somáticonão é exceção.Entretanto,a informaçãodosdiferentestipossensoriais
nãopodepermanecersegregadaparasempre.Quandoapalpamosumachaveem
nossobolso,comumentenão a sentimoscomoumalistadecaracterísticas:deter-
minadostamanhoe forma,bordasestruturadase polidas,superfícieplana lisa,
duraeum certopeso.Em vezdisso,sempensarmuitonosdetalhes,simplesmen-
teconfirmamoscomnossosdedostratar-sedeuma "chave",e nãouma "moeda"
ouuma"caixinhadegomademascarvelha".As característicasseparadasdeum
estímulosãointegradas,semesforçoalgum,para a percepçãodo objetoem si.
Conhecemosmuito pouco acercada maneiracomo issoocorrebiologicamente
emumsistemasensorial,muitomenosquandoenvolvemaisdeum sistemasen-
sorial.Afinal, muitos objetospossuemaparência,som,toqueeodor distintos,e
afusãodessassensaçõesé necessáriaparaa imagemmentalcompletadealguma
coisa,comoo seugatodeestimação,por exemplo.
O que sabemosé que as característicasdos camposreceptivosneuronais
tendema mudar à medida que a informação passapelo córtex, e os campos
receptivosficammaiores.Por exemplo,osneurôniossubcorticaise osdasáreas
3ae 3bnão sãosensíveisà direçãodo deslocamentodo estímulona pele,mas
ascélulasdasáreas1 e 2 são.Os estímulosprocessadospreferencialmentepe-
losneurôniosvão setornando cadavez maiscomplexos.Certasáreascorticais
parecemseros locaisonde fluxos de informaçãosensorialsegregadae simples
convergemparagerarrepresentaçõesneuraisespecialmentecomplexas.Quan-
dodicutimoso sistemavisual, vimos issoocorrer nos camposreceptivoscom-
plexosda área IT. O córtex parietal posterior também é uma área para essa
finalidade.Seusneurôniospossuemcamposreceptivosgrandes,comestímulos
preferenciaismuito difíceisde seremcaracterizadospor seremmuito elabora-
dos.Além disso,essaáreaestárelacionadanão apenascoma sensaçãosomática,
mastambémcomestímulosvisuaise como planejamentodo movimento.
Lesõesdo córtexparietalposteriorpodemcausaralgunsdistúrbiosneurológi-
cosbizarros.Pode-secitar,entreesses,a agnosia, a incapacidadeem reconhecer
objetos,apesardeascapacidadessensoriaissimplespareceremnormais.As pessoas
comestereognosianãoconseguemreconhecerobjetoscomunspelotato(comono
exemploda chave),apesarde a sensaçãotátil sernormal soboutrosaspectose
poderem,inclusive,nãoterproblemasparareconhecero objetopela.visãooupelo
som.Osdéficitssãofreqüentementelimitadosao ladocontralateralà lesão.
As lesõesno córtexparietaltambémpodemcausaruma síndrome de ne-
gligência, na qualuma partedo corpoou uma partedo mundo (todoo campo
visualà esquerdado ponto de fixação,por exemplo)é ignoradaou suprimida,
e suaprópria existênciaé negada(Figura 12.23).O neurologistaOliver Sacks
descreveuum dessespacientesem "O Homem que Caiu da Cama".Após sofrer
Modelo
Á
--:r-
J
T TATO 407
Cópia do paciente
/'/
>ri'
\-I-d
\~
)~
d~
FIGURA 12.23
Um exemplo de síndrome de
negligência. Foisolicitadoa umpaciente
queteveumderramenocórtexparietal
posteriorquecopiasseosdesenhosdos
modelos(acima,àdireita),maselefoi incapaz
de reproduzirmuitasdascaracterísticasdo
ladoesquerdodosmodelos.(Fonte:Springer
e Deutsch,1989,p. 193.)
408 CAPíTULO 12
- !!! ~
. O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
um AVC que presumivelmentedanificou seucórtex,o homempassoua insis-
tir que alguémestavafazendouma brincadeiramacabracom ele,escondendo
uma pernaamputadasobseucobertor.Quandoeletentavaremoverapernade
suacama,elee a pernaacabavamno chão.Naturalmente,a pernaem questão
era sua própria, plenamente ligada ao corpo, no entanto ele era incapazde
reconhecê-Iacomoumapartedeseucorpo.Um pacienteheminegligentepode
ignorar o alimento de uma metadede seu prato, ou tentar vestir apenasum
lado deseucorpo.Síndromesdenegligência(ou heminegligência)sãomaisco-
muns apóslesãodo hemisfériodireitoe, felizmente,elasnormalmentealiviam
ou desaparecemcomtempo.
Em termosgerais,o córtex parietal posterior pareceser essencialparaa
percepçãoe interpretaçãodas relaçõesespaciais,a noção exatado corpoe o
aprendizadodastarefasqueenvolvema coordenaçãodo corpono espaço.Essas
funções envolvemuma complexaintegraçãoda informaçãosomatossensorial
coma deoutrossistemassensoriais,especialmentecomo sistemavisual.
T DOR
Além dos mecanorreceptores,a sensaçãosomáticadependede maneiramui-
to importantedosnociceptores, as terminaçõesnervosaslivres, ramificadas,
não-mielinizadas que sinalizam quando o tecido corporal estásendo lesado
ou em risco de sofrer uma lesão. (O termo origina-sedo latim, nocere,"ferir",
"nocivo".) A informação dos nociceptoressegueuma via para o cérebroque
é muito distintada via pela qual seguea informação dosmecanorreceptores;
conseqüentemente,a experiênciasubjetivacausadapela ativaçãodessasduas
vias é diferente.A ativaçãoseletivadosnociceptorespode levarà experiência
conscientededor.A nocicepçãoe a dor sãoessenciaisà vida (Quadro 12.4).
Entretanto,é importanteserenfatizadoquea nocicepçãoe a dor não sãoa
mesmacoisa.Dor é a sensaçãoou a percepçãode sensaçõestão diversascomo
irritação, inflamação,fisgada, ardência,latejo,ou sensaçõesinsuportáveisque
surgemdeuma partedo corpo.Nocicepçãoé o processosensorialque forneceos
sinais que desencadeiama experiênciada dor. Enquanto os nociceptorespo-
dem disparardeforma violentae contínua,a dor pode aparecere desaparecer.
E o opostotambémpode acontecer.A dor pode seragonizante,mesmosema
atividadedos nociceptores.Mais do que qualquer outro sistemasensorial,as
qualidadescognitivasdanocicepçãopodemsercontroladasinternamente,pelo
próprio encéfalo.
Os Nociceptorese aTransduçãodos EstímulosDolorosos
Os nociceptoressãoativadospor estímulosquetemo potencialdecausarlesão
nos tecidos.Danos aos tecidospodem resultar de estimulaçãomecânicafor-
te, temperaturasextremas,privaçãode oxigênio e exposiçãoa certosagentes
químicos, entre outrascausas.As membranasdosnociceptorescontêmcanais
iônicosquesãoativadospor essestiposde estímulos.
Considere,por exemplo,oseventosquesesucedemquandovocêpisasobre
uma tachinha(lembredo Capítulo3). O simplesestiramentoou dobramentoda
membranado nociceptorativa os canaisiônicos mecanossensíveis,que levam
à despolarizaçãoda célula e ao disparode potenciaisde ação.Além disso,as
célulasdanificadasno localda lesãopodemliberaruma sériedesubstânciasque
provocamaaberturadoscanaisiônicosnasmembranasdosnociceptores.Como
exemplosde substânciasliberadasestãoasproteases(enzimasque degradam
proteínas),ATP e íons K+.As proteasespodemclivarum peptídeoextracelular
abundante,chamadocininogênio,formando o peptídeobradicinina.A bradici-
nina liga-sea uma moléculareceptoraespecífica,que aumentaa condutância
iônica dealgunsnociceptores.De maneirasimilar,o ATP causaa despolarização
dosnociceptorespor meio da ligaçãodiretaa canaisiônicos que dependemdo
ATP para suaativação.E, comoaprendemosno Capítulo 3, o aumentoda [K+]
extracelulardespolarizadiretamenteasmembranasneuronais.
T DOR 409
Quadro 12.4 ~ D E ES P EC I A L I N T E R ESSE.. A Miséria de uma Vida Sem Dor
A dor nosensinaa evitarsituaçõesprejudiciais.Elaprovocares-
postasreflexasde retiradado corpo dos estímulosnocivos.Ela
nos induza manterem repousoumaparte lesionadade nosso
corpo.A dor é vital.Os argumentosmaisconvincentesparaos
benefíciosfuncionaisda dor são os casosmuito raros de pes-
soasquenasceramsema capacidadede sentirdor Elaspassam
a vida inteiraem constanteperigo de autodestruição,pois não
conseguemse darcontadasconseqüênciasprejudiciaisde seus
atos.Essaspessoasfreqüentementemorrem precocemente.
Uma canadensenascidacom insensibilidadea estímulos
dolorosos não possuíaqualquer outro déficit sensoriale era
inteligente.Apesar de umtreinamentodesde cedo paraevitar
situaçõesdanosas,ela desenvolveudegeneraçãoprogressiva
de suasarticulaçõese da coluna vertebral, levandoà defor-
maçãode seuesqueleto,degeneração,infecçãoe, finalmente,
àmorte aos 28 anos.
Aparentemente, baixos níveis de atividadenociceptiva
são importantesdurantesastarefascotidianasparanos avisar
quando um determinado movimento ou uma postura pro-
longadaestiverforçando muito nosso corpo. Mesmo durante
o sono,a nocicepçãopode ser o estimulodeterminantepara
que mudemosde posiçãonacamafreqüentemente,parapre-
vinirescarasou excessode tensãosobre o esqueleto.
Pessoascom ausênciade dor congênitanos revelamque
a dor é uma sensaçãoparticulare não simplesmenteum ex-
cesso de outras sensações.Taispessoaspossuemusualmente
uma capacidadenormal para perceber os demaisestímulos
sensoriaissomáticos.Entreas possíveiscausasestáumafalha
no desenvolvimentoperiférico dos nociceptores,ou, ainda,
transmissãosinápticaalteradanasviasmediadorasda sensa-
ção de dor no SNC. Sejacomo for;a vidasemdor nõoé uma
bênção.
Considere,agora,umasituaçãoemquealguémse encostaa um fogão
quente.O caloracimade43°Cqueimaostecidos,eoscanaisiônicossensíveis
aocalordasmembranasdosnociceptoresabremnessatemperatura.Obviamen-
te,tambémsentimoso calornão-doloroso,quandoapeleéaquecidaentre37
e43°C.Essassensaçõesdependemdostermorreceptoresnão-nociceptivosede
suasconexõesno SNC.queserãodiscutidasemumaseçãoposterior.Entretan-
to,porora,saibaqueassensaçõesdeaquecimentoedequeimaçãosãomedia-
daspormecanismosneuraisdistintos.
Imaginequevocêsejaumcorredordemeia-idadepercorrendooúltimoqui-
lômetrodeumamaratona.Quandoo níveldeoxigêniotecidualfor inferiorà
demandadeoxigênio,suascélulasutilizarãoometabolismoanaeróbicoparagerar
ATP.Umaconseqüênciadometabolismoanaeróbicoéa liberaçãodeácidolático.
OacúmulodeácidoláticolevaaumexcessodeíonsH+nofluidoextracelular.
EssesíonsativamcanaisiônicosdependentesdeH+nosnociceptores.Essemeca-
nismoéresponsávelpeladorcrucianteassociadaao exercíciomuito intenso.
Uma abelhao ferroa. Sua pele e seu tecido conjuntivo contêm mastócitos,
umcomponentedo sistemaimunitário. Os mastócitospodemserativadospela
exposiçãoa substânciasexógenas(comoo venenodaabelha).queprovocama
liberaçãodehistaminapelosmastócitos.A histaminapodeseligar a receptores
desuperfícieespecíficosno nociceptor,que causama despolarizaçãoda mem-
brana.A histaminatambémaumenta a permeabilidadedos capilaressangüí-
neos,o que levaao edemae à vermelhidãono local da lesão.Pomadasconten-
dofármacosque bloqueiam os receptoreshistaminérgicos(anti-histamínicos)
podemauxiliar tantono alívio dador quanto no do edema.
TiposdeNociceptores.A transduçãodosestímulosdolorososocorrenaster-
minaçõesnervosaslivresdasfibrasnão-mielinizadasC enaspobrementemieli-
nizadasAõ.A maioriadosnociceptoresrespondeaosestímulosmecânicos,tér-
micosequímicosesãochamados,portanto,denociceptorespolimodais.Contudo,
assimcomoosmecanorreceptores,muitosnociceptoresmostramseletividade
emsuasrespostasaosdiferentesestímulos.Assimsendo,existem,também,noci-
ceptoresmecânicos,querespondemseletivamentea pressõesintensas;nociceptores
térmiços,que mostram respostasseletivasao calor ou frio extremos (Quadro
12.5),e nociceptoresquímicos, responsivosseletivamenteà histaminae a outros
agentesquímicos. Pesquisadores descobriram recentemente que as menores das
410 CAPíTULO 12 . O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
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QuenteeApimentado
Sevocêgostadecomidaapimentada,vocêprovavelmentesabe
queo ingredienteativode umaamplavariedadedepimentas
quenteséacapsaicina(FiguraA),Essaspimentassão"quentes"
porquea capsaicinaativanociceptorestérmicos,quetambém
sinalizamelevaçõestérmicasquecausamdor(acimade43°C),
Naverdade,foio fatopeculiardeessesneurôniosnociceptivos
seremseletivamenteativadospelacapsaicinaquelevouàdes-
cobertadomecanismodetransduçãoparaasensaçãodecalor.
DavidJulius,daUniversidadedaCalifórniaemSãoFrancisco,
observouque,emalgumascélulasdosgângliosdaraizdorsal,a
capsaicinaativaumcanaliônicoespecífico,denominadoTrpvI,
o qualtambémé ativadoporaumentodatemperaturaacima
de43°C.Essecanaliônicopermitea entradade Ca+2e Na+,
o queocasionadisparosdo neurônio,O TrpvI é ummembro
deumagrandefamniadecanaisTrp relacionados,identificados
originalmentenosfotorreceptoresdamosca-das-frutasDroso-
philo(Trprepresentatronsientreceptorpotentiol,potencialde
receptortransitório).Vemsendodemonstradoquediferentes
canaisTrpcontribuemparamuitostiposdistintosdetransdu-
çãosensorialdesdeorganismosunicelularesatéhumanos.
Porqueumcanaliônicodependentedetemperaturatam-
bémseriasensívelàspimentasquentes?A capsaicinaparece
imitaro efeitodesubstânciasendógenasliberadasportecidos
lesados.Essassubstâncias(eacapsaicina)provocamaabertura
do canalTrpvI emtemperaturasmaisbaixas,o queexplicaa
sensibilidadeaumentadadeáreaslesadasdapeleaaumentos
detemperatura.De fato,a hiperalgesiatérmicainduzidapela
inflamaçãoestáausenteem umalinhagemde camundongos
geneticamentemodificados,naqualfaltao canalTrpvI,Enquan-
to todososmamíferosexpressamnormalmenteo canalTrpvI,
asavesnãoo expressam,o queexplica,portanto,o motivode
asavespoderemconsumiramaisfortedaspimentas.Essefato
tambémexplicaporqueassementesparaaves,acrescidasde
capsaicina,podemserconsumidasporelasseminterferência
do ataquedeesquilos.
Alémdaproteçãodaraçãoparaavese do amplousona
culinária,acapsaicinatemumaaplicaçãoclínicaaparentemente
paradoxal.Quandoaplicadaemgrandesquantidades,elacausa
analgesia,ausênciadedor.Acapsaicinadessensibilizaasfibras
nociceptivase depletao neuropeptídeosubstânciaP deseus
terminaisaxonais.Atualmente,aterapiacomcapsaicinaé utili-
zadacomoumdostratamentosparaadorassociadaàartrite,
mastectomiae herpeszoster(verQuadro12.1).
6 Pimentavermelha
Pimenta
Habanero
Pimenta
Jalapeno
O
CH3°
XY'N~I # H IHO
FIGURAA
Aspimentasquecontêmcapsaicinaeaestruturaquímicadessa
molécula.
fibras C (velocidadede condução::;0,5 m/s) são seletivamenteresponsivasà
histaminae causama percepçãodo prurido.
Os nociceptoresestãopresentesna maioriados tecidosdo corpo,incluindo
apele,osossos,osmúsculos,amaioriadosórgãosinternos,osvasossangüíneos
e o coração.Eles estãonotadamenteausentesno sistemanervoso em si, mas
estãopresentesnasmeninges.
Hiperalgesia. Os nociceptoresnormalmente respondemapenasquandoos
estímulossãosuficientementeintensosparalesionaros tecidos.No entanto,to-
dosnós sabemosquepele,articulaçõesou músculosquejá estãolesionadosou
inflamadosestãomaissensíveisdo queo normal. Um toquelevee condoídode
umamãesobreuma áreaqueimàdadapeledeseufilho podedesencadeargritos
de dor cruciante.Essefenômenoé conhecidocomohiperalgesia e é o exem-
plo maisfamiliarda capacidadecorporaldeautocontroledador.A hiperalgesia
pode ser um limiar reduzidoà dor, uma intensidadeaumentadadosestímulos
dolorososou, atémesmo,dor espontânea.A hiperalgesiaprimáriaocorrenaárea
... DOR 411
II(J
r
nocivo
/
I
I
Substância P ;.
~ ~
Medula espinhal
FIGURA 12.24
Mediadores químicos periféricos responsáveis pela sensação de dor e pela
hiperalgesia.
dotecidolesado,masostecidosqueenvolvema regiãoda lesãotambémpodem
setornar supersensíveis,peloprocessodehiperalgesiasecundária.
Muitos mecanismosdistintospodem estarenvolvidosna hiperalgesia,al-
gunsperifericamenteno nociceptorou no tecidoa seuredor e outrosno SNC.
Como foi comentadoanteriormente,várias substânciassãoliberadasno mo-
mentoem que a pele é lesada.Váriasdessassubstânciasquímicasmodulam a
excitabilidadedos nociceptores,tornando-osmais sensíveisaos estímulostér-
micosou mecânicos(ver Quadro 12.5).Exemplosde substânciassensibilizado-
rassãoa bradicinina,asprostaglandinase a substânciaP (Figura 12.24).
A bradicininafoi apresentadaanteriormentecomoumadassubstânciasque
despolarizamdiretamenteosnociceptores.Além desseefeito,a bradicininaes-
timulamudançasintracelularesdelongaduração,quetornammaissensíveisos
canaisiônicosativadospor calor.As prostaglandinassãosubstânciasproduzidas
pelaclivagemenzimáticadoslipídeosda membranacelular.Apesarde aspros-
taglandinasnão causaremdor em si, elasaumentammuito a sensibilidadedos
nociceptoresa outros estímulos.A aspirina e outras drogasantiinflamatórias
não-esteroidessãoum tratamentoutilizado para tratara hiperalgesia,porque
inibemasenzimasnecessáriasà síntesedeprostaglandinas.
A substânciaP é um peptídeosintetizadopelosprópriosnociceptores.A ati-
vaçãodeum ramo
do neuritoperiféricodo nociceptorpodelevarà secreçãode
substânciaP por outrasramificaçõesdessemesmonociceptornasárea"svizinhas
dapele.A substânciaP causavasodilatação(aumentodo diâmetrodoscapilares
sangüíneos)e a liberaçãodehistaminadosmastócitos.A sensibilizaçãode ou-
trosnqciceptores,nasvizinhançasda lesão,por açãodasubstânciaP é uma das
causasdahiperalgesiasecundária.
412 CAPíTULO 12 . O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
r
o
"C
'"
"C
Q)
"C'"
"C
'00
C
Q)
E
t
Estímulo
nocivo
Tempo-
FIGURA 12.25
Dor primária e secundária. A sensação
dedorprimáriaqueresultadaestimulação
nocivaé mediadapelasfibrasAÓ,maisrápidas,
A sensaçãodedorsecundária,de longa
duração,é mediadapelasfibrasC, lentas,
Mecanismosdo SNC tambémcontribuemà hiperalgesiasecundária.Após
a lesão,a ativaçãodosaxôniosmecanorreceptivosAj3por um toquelevepode
resultarem dor.Portanto,outro mecanismodehiperalgesiaenvolveumalinha
cruzadaentrea via do tatoe a via dador na medulaespinhal.
AferentesPrimários e MecanismosEspinhais
As fibrasAo e C levaminformaçãoao SNC a velocidadesdiferentes,emfunção
dasdiferençasem suasvelocidadesdeconduçãodospotenciaisdeação.Conse-
qüentemente,a ativaçãodosnociceptoresdapeleproduz duaspercepçõesdis-
tintasde dor, uma dorprimária,rápidae aguda,seguidade uma dorsecundária,
lenta e contínua. A dor primária é causadapela ativaçãodas fibrasAo; a dor
secundáriaé causadapelaativaçãodasfibrasC (Figura 12.25).
Assim como as fibras mecanossensoriaisAj3, as fibras depequenocalibre
possuemseuscorposcelularesnos gângliosdaraiz dorsalsegmentare entram
no corno dorsal da medula espinhal. As fibras logo seramificam,percorrem
uma curta distâncianos sentidosrostral e caudalna medula, em uma região
chamadatractodeLissauer,fazendo,depois,sinapseem célulasdaparteexter-
na do corno dorsal, em uma regiãoconhecida como substância gelatinosa
(Figura 12.26).
Acredita-seque o neurotransmissordosaferentesnociceptivossejao glu-
tamato;entretanto,comofoi mencionadoanteriormente,essesneurôniostam-
bémpossuemo peptídeosubstânciaP (Figura 12.27).A substânciaP localiza-se
em grânulosde secreçãonas terminaçõesaxonais (ver Capítulo 5) e podeser
liberadapor salvasdepotenciaisde açãode alta freqüência.Experimentosre-
centesdemonstraramque a transmissãosinápticamediadapela substânciaP é
necessáriaparaa sensaçãodedor moderadaeintensa.
É interessanteobservarque osaxôniosdenociceptoresvisceraisentramna
medula espinhalpelo mesmotrajetoque os denociceptorescutâneos.Na me-
dula espinhal,ocorreuma misturasubstancialdainformaçãodessasduasfontes
de aferências.Essalinha cruzadaorigina o fenômenodor referida, no quala
ativaçãodo nociceptorvisceralé percebidacomo uma sensaçãocutânea.Um
exemploclássicode dor referidaé a angina,que ocorrequando o coraçãonão
recebeoxigênio em quantidadesuficiente.A dor é localizadafreqüentemen-
te pelo pacientena paredesuperior do tórax e no braço esquerdo.Um outro
exemplocomumé a dor associadaà apendicite,que é referida,em seuestágio
inicial, na paredeabdominalao redordo umbigo (Figura 12.28).
FIGURA 12.26
Conexões espinhais dos axônios nociceptivos.
ViasAscendentesdaDor
Vamosressaltar,brevemente,algumasdiferençasqueencontramosentreasvias
dotato e da dor. Primeiro, essasvias diferem em relaçãoas suasterminações
nervosasna pele.A via do tatocaracteriza-sepor possuirestruturasespecializa-
dasna pele;a via da dor possui apenasterminaçõesnervosaslivres. Segundo,
elasdiferem em relaçãoao diâmetro de seusaxônios.A via do tato é rápida,
porconstituir-sede fibrasAI3 mielinizadas;a via da dor é lenta e utiliza fibras
depequenocalibreAo, pobrementemielinizadas,e fibras C não-mielinizadas.
Terceiro,asviasdiferemem relaçãoassuasconexõesna medulaespinal.Osra-
mosdosaxôniosAI3terminamno corno dorsalprofundo;asfibrasAI3e C rami-
ficam-se,seguempelo tractode Lissauere terminamna substânciagelatinosa.
Veremos,ainda,que asduasviastambémdiferemsubstancialmentequantoao
trajetoutilizadoparatransmissãoda informaçãoao encéfalo.
A Via da Dor Espinotalâmica. A informação sobrea dor (comotambéma
temperatura)corporal é conduzida da medula espinhal ao encéfalopela via
espinotalâmica. Diferenteda via coluna dorsal-lemniscomedial,os axônios
dosneurônios de segunda ordem decussamimediatamentee ascendematra-
vésdo tractoespinotalâmicoao longo da superfícieventral da medula espinhal
(compareasFiguras 12.13e 12.26).De acordocom o nome, as fibrasespino-
talâmicasascendempelamedula espinhal,passampelobulbo,ponte emesen-
céfalosemfazer sinapse,até alcançaremo tálamo (Figura 12.29). À medida
queosaxônios espinotalâmicospercorremo tronco encefálico,posicionam-se
aolongo do lemnisco medial, mas permanecemcomo um grupo axonal dis-
tintodavia mecanossensorial.
Pele
Gânglioda
raizdorsal
Víscera
Gânglio
simpático
do SNV
Axônio aferente
primário
FIGURA 12.28
A convergênciadaaferênciade nociceptoresvisceraise dapele.
T DOR 413
FIGURA 12.27
Localizaçãoimunocitoquímicada
substânciaP namedulaespinhal. A
setaapontaparaaregiãodemaior
quantidadedesubstânciaPnasubstância
gelatinosa.(Fonte:Mantyhetai.,1997.)
414 CAPíTULO 12 . O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
@
Axôniosde
pequenocalibre
daraizdorsa
Córtex
somatossensorial
primário(81)
Bulbo
Tracto
espinotalâmico
Medula
espinhal
FIGURA12.29
A viaespinotalâmica.Essaéaprincipal
rotapelaqualasinformaçõesdadoreda
temperaturaascendemaocórtexcerebral.
A Figura 12.30resumeasdiferentesviasascendentesparaa informaçãodo
tatoe da dor.Observequeasinformaçõesacercado tatoascendeipsilateralmen-
te,enquantoasinformaçõesda dor (e da temperatura)ascendemcontralateral-
mente.Essaorganizaçãopode levara um curioso,ainda que previsível,tipo de
déficit em situaçõesde danosao sistemanervoso.Por exemplo,seum ladoda
medula espinhalsofrer lesão,certosdéficitsde mecanossensibilidadeocorrem
no mesmolado da lesãoespinhal:insensibilidadeao tato leve, àsvibraçõesde
um diapasãosobrea pele e à posiçãode um membro.Por outro lado, déficits
desensibilidadeàdoreàtemperaturaocorrerãonoladodocorpoopostoaoda
lesãoespinhal. Outros sintomas,como a deficiênciamotora e o mapeamento
exatodosdéficitssensoriais,forneceminformaçõesadicionaisacercado localda
lesãomedular.Por exemplo,osmovimentosficarãodificultadosno lado ipsila-
teral. O conjunto de sintomassensoriaise motoresque seseguema uma lesão
em um lado damedulaespinhalé chamadodesíndromedeBrown-Séquard.
.., DOR 415
Via espinotalâmica
Via coluna dorsal -
lemnisco medial
Córtex
cerebral
Bulbo
Medula espinhal
Tracto
espinotalâmico
lateral
Axônioda'
raizdorsal
(AO,C)
Linha média
Tato, vibração,
discriminação de
dois pontos,
propriocepção
Dor, temperatura,
algum tato
FIGURA 12.30
Um resumo das duas principais vias ascendentes sensoriais somáticas.
A Via da Dor Trigeminal. A informaçãodador (edatemperatura)dafaceedo
terçoanteriordacabeçasegueumavia aotálamo,análogaàviaespinhal.As fibras
depequenodiâmetrodo nervotrigêmiofazema primeirasinapsecomosneurô-
niossensoriaissecundáriosno núcleoespinhaldotrigêmiono troncoencefálico.Os
axôniosdessascélulasdecussame ascendemaotálamopelo lemniscotrigeminal.
Além dasviasespinotalâmicae trigeminotalâmica,outrasviasrelacionadas
dador (edatemperatura)enviamaxôniosparaumavariedadedeestruturas,em
todososníveisdo troncoencefálico,antesqueelesalcancemo tálamo.Algumas
dessasviassãoespecialmenteimportantesparafornecersensaçõesdedorlenta,
dequeimaçãoe agonizante,enquantooutrasestãoenvolvidasno alerta.
o Tálamoeo Córtex. O tractoespinotalâmicoe osaxôniosdo lemniscotrige-
minalfazemsinapseem uma regiãomaisextensado tálamodo que osaxônios
dolemniscomedial.Algunsdosaxôniosterminamno núcleoVP comoo fazem
osdolemniscomedia!,emboraossistemasparaadoreparao tato aindaper-
maneçamsegregados,ocupandoregiõesdistintasdessenúcleo.Outrosaxônios
espinotalâmicosterminamnospequenosnúcleosintralaminaresdo tálamo (Figu-
ra 12.31). A partir
do tálamo, as informações de dor e temperatura projetam-se
paraváriasáreasdo córtex cerebral.Assim como fazemno tálamo, essas vias
cobremumterritóriomuitomaisextensodoqueasconexõescorticaisdavia
colunadorsal-lemniscomedial.
A RegulaçãodaDor
o fatodequeapercepçãodadorévariávelestábemestabelecido.Dependendo
daatividadesimultâneadeaferênciassensoriaisnão-dolorosase do contexto
comportamenta!,o mesmonível deatividadedo nociceptorpodeproduzirmais
oumenosdor.É muito importantecompreenderessacapacidadedemodulação
Lemnisco
medial
Núcleos
dacoluna
II idorsal ,,
Coluna
-r-l!dorsal ,,,,,
Axônioda-- I\>,iraizdorsal
(Aa, A, AO)
Linha média
416 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
FIGURA 12.31
Núcleos sensoriais somáticos no
tálamo. Alémdo núcleoventral
posterior(VP),osnúcleosintralaminares
fazema retransmissãodainformação
nociceptivaa umagrandeextensãodo
córt«xcerebral.
-I
"
:r.,
I
".,"
IJ
!<,
",
I"~,".''.~,
r,'
Anterior Núcleosintralaminares
Posterior
da dor, pois pode oferecernovas estratégiaspara o tratamentoda dor crônica,
urna condiçãoqueafligeaté20% dapopulaçãoadulta.
Regulação Aferente. Vimos que um toque levepode causardor pelomeca-
nismodahiperalgesia.Entretanto,a dorcausadapelaatividadedosnociceptores
tambémpodeserdiminuídapelaatividadesimultâneaemmecanorreceptoresde
baixo limiar (fibrasAI)). Presumivelmente,isso explicaa sensaçãoagradável
que sesentequando semassageiaa caneladepoisde contundi-Ia. Essemeca-
nismo tambémpode explicar o efeito de um tratamentoelétricopara alguns
tipos de dor crônica, intratável.Fios condutoressãofixos à superfíciedapele,
e, quandoo pacientesimplesmenteligaum estimuladorelétricoplanejadopara
ativaraxôniossensoriaisdegrandediâmetro,a dor é suprimida.
Nos anos 1960,Ronald Melzack e Patrick Wall, do MIT (Instituto Temo-
lógico de Massachusetts),propuseramurna hipótesepara explicaressesfenô-
menos.A teoriadoportãodadorpropostapor elesestabeleceque determinados
neurônios dos cornos dorsais,os quais projetam seusaxônios pelo tractoes-
pinotalâmico. são excitadostanto por axônios sensoriaisde grandediâmetro
cornopor axônios não-mielinizadosde nociceptores.O neurônio de projeção
(secundário)tambémé inibidoporum interneurônio,eesseé tantoexcitado
por axônios sensoriaiscalibrososcorno inibidopelo axônio nociceptivo (Figu-
ra 12.32).Por meio dessecircuito, a atividadeapenasdo axônio nociceptivo
resultariaem excitaçãomáxima do neurônio de projeção,permitindo queos
sinaisnociceptivosalcancemo cérebro.Contudo, seosaxôniosdemecanorre-
ceptoresdispararemconjuntamente,elesativarãoo interneurônio que supÜ-
mirá os sinaisnociceptivos.
Regulação Descendente. Há inúmerashistóriassobresoldados,atletaseví-
timas de tortura que sofreramferimentos terríveis.mas aparentementenão
sentiram dor. Emoções fortes, estresseou determinaçãoestóicapodem su-
primir demaneira poderosaassensaçõesdolorosas.Váriasregiõesencefálicas
estãoenvolvidasna supressãoda dor (Figura 12.33).Urna delasé urna região
contendo neurônios no mesencéfalo,chamadade substância cinzenta pe-
riaquedutal (PAG. periaqueductalgraymatter).Estimulação elétricada PAG
pode causaranalgesiaprofunda quetem sido,algumasvezes,exploradaclini-
camente.
A PAG recebe,normalmente, aferênciasde váriasestruturasdo encéfalo,
muitas dasquais responsáveispela transmissãode informaçõesrelacionadas
ao contexto emocional. Os neurônios da PAG enviam axônios descendentes
a várias regiõeslocalizadasna linha média do bulbo, especialmentepara os
núcleosda rafe (cujos neurônios usam o neurotransmissorserotonina). Esses
neurônios bulbaresprojetam os axônios, por sua vez, para os cornos dorsais
da medula espinhal. onde podem deprimir de maneira eficientea atividade
dosneurônios nociceptivos.
FIGURA 12.32
Teoria do portão da dor. A retransmissão
sinápticadasinformaçõesnociceptivaspelos
neurôniosde projeçãoé controladapela
atividadede uminterneurônioinibitório.
AxônioAa ouA~
(mecanoceptores
não-nociceptivos)
Neurônio
deprojeção
Para o tracto espinotalâmico
Os Opióides Endógenos. O ópio era conhecido, provavelmente,pelos an-
tigossumérios,por volta de4.000 a.C. Seupictogramaparaa palavrapapou-
la traduz-se, grossomodo, por "planta da alegria". No século XVII, o valor
terapêuticodo ópio já eraincontestável.O ópio, osseusingredientesnarcóti-
cosativose seusanálogos- incluindo a morfina, a codeína e a heroína - são
hoje amplamente usados e abusados,na maioria das culturas. Os opióides
=q-ÁPAGI'I
' l
Mesencélalo
,
~ ""
," .,,", \
@\
"'G) I
I'
1
Bulbo -------
@
Núcleos da rale
T DOR 417
FIGURA 12.33
Vias descendentes de controle
dador. Váriasestruturas encefálicas,
muitasdas quais são afetadaspelo estado
comportamental, podem influenciar
a atividadeda substânciacinzenta
periaquedutal (PAG) do mesencéfalo.A
PAG pode influenciaros núcleos da rafe do
bulbo, que, por suavez,modulam o fluxo de
informação nociceptiva nos cornos dorsais
da medula espinhal.
418 CAPíTULO 12 . O SISTEMA SENSORIAL SOMÁTICO
Dor eEfeitoPlacebo
Paratestaraeficáciadeumanovadroga,testesclínicossãofre-
qüentementeconduzidosde maneiraqueumgrupode par-
ticipantesrecebea droga,enquantooutrogruporecebeuma
substânciainerte.Ambososgruposdepessoasacreditamesta-
remrecebendoadroga.Surpreendentemente,osparticipantes
muitasvezesatribuemàsubstânciainerteosefeitosesperados
deumadrogasobreaqualforaminformados.O termoplocebo
é utilizadoparadescrevertaissubstâncias(Ia pessoado futu-
ro indicativodo verboemlatimplocerequesignifica"agradar",
"agradarei"),e o fenômenoé chamadodeefeitoplocebo.
Os placebospodemser analgésicosaltamenteeficazes.
Grandepartede pacientessofrendode dor pós-operatória
relataramobteralíviode umainjeçãode soluçãofisiológica
estéril!Issosignificaqueessespacientesestariamapenasima-
ginandosuasdores?De formaalguma.O antagonistado re-
ceptoropióide,naloxona,podebloquearo efeitoanalgésico
do placebo,exatamentecomoantagonizaosefeitosdamor-
fina,umanalgésicoreal.Aparentemente,a crençade queo
tratamentofuncionarápodesersuficienteparacausarativação
de sistemasendógenosencefálicosde alívioà dor.O efeito
placeboé umaexplicaçãoprovávelparao sucessodeoutros
tratamentosparaa dor,comoacupuntura,hipnosee,paraas
crianças,umbeijocarinhosodamãe.
produzem intensa analgesiaquando administradosde forma sistêmica.Eles
tambémpodem produzir alteraçõesdehumor, sonolência, confusãomental,
náusea, vômito e constipação.A décadade 1970 trouxe as impressionantes
descobertasde que essescompostosatuamligando-sedeforma firme e espe-
cífica a vários tipos de receptores opióides no sistemanervoso, e dequeo
próprio sistemanervoso produz substânciasendógenassemelhantesà morfi-
na, chamadascoletivamentede endorfinas. As endorfinas sãopeptídeos.
As endorfinas e seusreceptoresestãoamplamentedistribuídosno SNC,
mas estãoparticularmenteconcentradosem áreasque processamou modu-
lam a informaçãonociceptiva.Pequenasquantidadesde morfina ou endorfi-
nas injetadasna PAG, nos núcleosda rafeou no corno dorsalpodemproduzir
analgesia.Pelo fato de esseefeito ser suprimido com a administraçãodeum
bloqueadorespecíficodereceptoresopióides,naloxona,asdrogasinjetadasde-
vem ter agidoligando-sea receptoresopióidesnessasáreas.A naloxona tam-
bém pode bloquear os efeitosanalgésicosinduzidos pela estimulaçãoelétrica
dessasáreas.No âmbito celular,asendorfinasexercemmúltiplos efeitos,que
incluem supressãoda liberaçãode glutamatodasterminaçõespré-sinápticase
inibição dos neurônios pela hiperpolarizaçãodasmembranaspós-sinápticas.
Em geral,os extensossistemasdeneurônios quecontêmendorfinasna medu-,
Ia espinhal e no tronco encefálicoreduzema passagemde sinaisnociceptivos
no corno dorsale nosníveis encefálicossuperiores,onde é geradaapercepção
da dor (Quadro 12.6).
T TEMPERATURA
Assim comopara o tatoe a dor, assensaçõestérmicasnão-dolorosasoriginam-
sedereceptoresna pele (entreoutroslocais)e dependemdoprocessamentono
neocórtexparaa apreciaçãoconsciente.Descreveremosbrevementecomoestá
organizadoessesistema.
Termorreceptores
Como a velocidadede uma reaçãoquímica dependeda temperatura,o fun-
cionamento de todasas célulasé sensívelà temperatura.Entretanto, os ter-
morreceptores sãoneurônios especialmentesensíveisà temperatura,devido
a mecanismosespecíficosde sua membrana.Por exemplo,podemosperceber
mudançastão mínimas quanto 0,0I DCna temperaturamédiada pele. Grupos
deneurôniossensíveisà temperaturano hipotálamoe na medulaespinhalsão
importantespara as respostasfisiológicasque mantêma temperaturacorporal
estável,mas são os termorreceptoresda pele que aparentementecontribuem
paranossapercepçãodatemperatura.
A sensibilidadeà temperaturanão estádistribuídauniformementeemtoda
apele.Vocêpodefazerum testecomum pequenobastãoaquecidoou resfriado
emapeara sensibilidadedapeleàsmudançasde temperatura.Pequenasáreas
dasuperfície,decercade 1mm dediâmetro,podemsersensíveisao calorouao
frio,masnão aambos.O fatodea localizaçãoparaa sensibilidadeao calorou ao
frio serdiferentedemonstraquereceptoresdistintosfazema transduçãodessas
sensações.Além disso,pequenasáreasdapelesituadasentreospontoscapazes
depercebercalorou frio sãorelativamenteinsensíveisà temperatura.
A sensibilidadede um neurônio sensoriala uma mudançade temperatu-
radependedostipos de canaisiônicos que o neurônio expressa.A descoberta
doscanaisiônicos que respondema um aumento na temperaturaacima de
43°C,que leva à sensaçãodolorosa (ver Quadro 12.5), levou os pesquisado-
resa investigarseoutros canaisrelacionadospoderiamestarsintonizadospara
perceberoutrasfaixasde temperatura.Assim como o ingredienteativo daspi-
mentas"quentes"foi utilizadoparaidentificaraproteínareceptorapara"calor",
chamadaTrpvl, o ingredienteativo da hortelãfoi utilizadopara identificarum
receptorde "frio". Foi observadoque o mentol, que produz uma sensaçãore-
frescante,estimulaum receptorchamadoTrpmS,o qual tambémé ativadopor
diminuiçõesnão-dolorosasna temperatura,abaixode25°C.
Atualmente,sabemosque existemseistiposdistintosde canaisTrpnos ter-
morreceptores,que conferemsensibilidadesdiferentesde temperatura(Figura
12.34).Como regra,osneurônios termorreceptoresparecemexpressarapenas
um tipo de canal,o que explicaria,então,como diferentesregiõesda pelepo-
~
.
'
.
,;;'
@ti' ~
Anktm1
(a)
uuu_---
Cij
o::
ro
()
o"
<D"ro"
.:;:
~
'\................
Anktm1\.
\.
'o 10 20 30 40 50
(b) Temperatura (OC)
T TEMPERATURA 419
FIGURA 12.34
Os canais termorreceptores Trp
sintonizados para detectar diferentes
temperaturas. (a) O arranjodas
moléculasconhecidasde proteínasem
canaisTrp termossensíveisnamembrana
neuronal.Trpm8eTrpvI respondemao
mentole à capsaicina,respectivamente.
(b) Essegráficorepresentao nívelde
ativaçãodosvárioscanaisemfunção
de diferentestemperaturas.As linhas
tracejadasindicamasrespostasesperadas
queaindanãoforamdemonstradas
experimentalmente.(Adaptadode
Patapoutian et 01.,2003, Figura3.)
420 CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
FIGURA 12.35
Adaptaçõesdostermorreceptores.
As respostasdosreceptoresdefrioede
calorsãomostradasduranteumperíodo
dereduçãodatemperaturadapele.
Ambososreceptoresrespondemmelhor
amudançasrepentinasdetemperatura,
masadaptam-seapósalgunssegundosde
temperaturaconstante.
dem mostrarsensibilidadesdistintasà temperatura.Exceçõesà regraparecem
seralgunsreceptoresdefrio quetambémexpressamTrpv1e,portanto,também
são sensíveisa aumentosde temperaturaacima de 43°C. Se um calor desse
nível for aplicadoa amplasáreasdapele,elenormalmenteserádoloroso;mas
seo calor for restritoa pequenasregiõesda peleinervadaspor um receptorde
frio, eleproduziráuma sensaçãoparadoxaldefrio. Essefenômenoenfatizauma
questãoimportante:o SNC não sabequaltipo deestímulo(no caso,o calor)re-
sultouno disparodo receptor,mascontinuaa interpretartodaaatividadedesse
receptordefrio comouma respostaao frio.
Da mesmaforma que os mecanorreceptores,as respostasdos termorre-
ceptoresadaptam-sedurante estímuloscontínuosde longa duração.A Figura
12.35mostraque uma quedarepentinana temperaturadapelefaz comqueo
receptorparafrio disparedemodo intenso,enquantosilenciaum termorrecep-
tor para calor.Contudo, apósuns poucossegundosa 32°C,o receptorparafrio
diminui a freqüênciade seusdisparas(masaindadisparamaisrápido do quea
38°C),enquantoo receptorparacaloraceleralevementea emissãodeimpulsos.
Observeque um retorno à temperaturaquente inicial da pelecausarespostas
opostas- o silênciotransitóriodo receptorparafrio e um pico de atividadedo
receptorpara calor - antesde ambosretornaremassuasfreqüênciasestáveis,
adaptadas.Portanto,asdiferençasentre asfreqüênciasde respostasdosrecep-
toresde calore de frio sãomaioresduranteou logo apósmudançasde tempe-
ratura.Nossaspercepçõesdetemperaturafreqüentementerefletemasrespostas
dessesreceptoresna pele.
Tenterealizarum experimentosimples.Encha doisbaldescomágua,sen-
do um comáguafria e o outro com águaquente (masnão queimando).Mer-
gulhe, então, suamão direitapor um minuto em cadaum dessesbaldes,um
por vez. Observeasnítidas sensaçõesde calor e de frio que ocorremem cada
troca, mas note, também, como são transitórias essassensações.Para a ter-
morrecepção,assimcomo para a maioria dos demaissistemassensoriais,é a
variaçãorepentinana qualidadede um estímuloque geraasrespostasneurais
e perceptivasmais intensas.
. A Via da Temperatura
A estaaltura,vocêpodeficaraliviadoemsaberquea organizaçãodaviada
temperaturaépraticamenteidênticaàdaviadador,já descrita.Osreceptores
parafrioestãoligadosafibrasAo eC,enquantoosreceptoresdecalorestãoli-
gadosapenasafibrasC.Comojá aprendemos,osaxôniosdepequenodiâmetro
fazemsinapsenasubstânciagelatinosadocornodorsal.Osaxôniosdosneurô-
niosdesegundaordemdecussamemseguidae ascendempelotractoespino-
38° 38°
Temperatura
da pele(°e)\ 32°
Receptor
de frio
Receptor
de calor
58
talâmicocontralateral.Dessaforma,seamedulaespinhalfor seccionadaemum
lado,haveráuma perda da sensibilidadeà temperatura(bem como à dor) do
ladoopostodo corpo,especificamentedaquelasregiõesdapeleinervadaspelos
segmentosespinhaisque estãoabaixodo nível dasecção.
... CONSIDERAÇÕES FINAIS
Issoencerranossadiscussãosobreossistemassensoriais.Apesardecadaum de-
lesterevoluídoparasera interfaceentreo sistemanervosoe formasdiferentes
deenergiado ambienta,ossistemassãonotoriamentesimilaresemorganização
efuncionamento.Os diferentestiposde informaçãosensorialsomáticasãone-
cessariamentemantidossegregadosnosnervosespinhais,poiscadaaxônio está
conectadoa somenteum tipo de terminaçãoreceptorasensorial.A segregação
dostipossensoriaiscontinua dentro da medulaespinhale é mantidana maior
partedo caminhoatéo córtexcerebral.Dessaforma,o sistemasensorialsomá-
ticorepeteum temacomum a todo o sistemanervoso:vários fluxos de infor-
maçãorelacionada,mas distinta,seguemem paralelo atravésde uma sériede
estruturasneurais.A misturadessesfluxos ao longo dasvias ocorreapenasde
maneirajudiciosa,atéalcançarosníveissuperioresdeprocessamentono córtex
cerebral.Vimos outrosexemplosde processamentoem paraleloda informação
sensorialnossentidosquímicos,na visãoe na audição.
Exatamentecomo os fluxos paralelosde informaçãosensorialsão combi-
nadosparaformara percepção,imagense idéiasainda continuasendocomo a
buscado SantoGraalnasneurociências.Assim,a percepçãodequalquerobjeto
manipulado envolve a coordenaçãosem falhas de todas as facetasda infor-
maçãosensorialsomática.A avena mão é arredondada,morna, maciae leve
quantoao peso;seusbatimentoscardíacospalpitamem seusdedos;suasgar-
rasarranham,e suasasascomum texturaparticularroçamem suapalma.De
algumaforma, seucérebrosabetratar-sede um pássaro,mesmosemvê-Io ou
ouvi-Io, e nunca seráconfundido com uma rã. Nos capítulosque seseguem,
descreveremoscomo o encéfalocomeçaa utilizar a informaçãosensorialpara
planejare coordenaro movimento.
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~~
Introdução
sensaçãosomática(p.388)
núcleoventralposterior(VP)(p.
398)
córtexsomatossensorialprimário
(5I) (p.398)
nervotrigêmeo(p.400)
córtexparietalposterior(p.40I)
somatotopia(p.402)
agnosia(p.407)
síndromedenegligência(p.407)
I LU
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Tato
mecanorreceptor(p.389)
corpúsculodePacini(p.389)
segmentoespinhal(p.394)
dermátomo(p.395)
viacolunadorsal-Iemniscomedial
(p.397)
colunadorsal(p.397)
núcleodacolunadorsal(p.397)
lemniscomedial(p.397)
Dor
nociceptor(p.408)
analgesia(p.41O)
T CONSIDERAÇÕES FINAIS 421
hiperalgesia(p.41O)
substânciagelatinosa(p.412)
dor referida(p.412)
viaespinotalâmica(p.413)
substânciacinzentaperiaquedutal
(PAG) (p.416)
receptoropióide(p.418)
endorfna(p.418)
Temperatura
termorreceptor(p.418)
422
rlf,
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CAPíTULO 12 . O SISTEMASENSORIAL SOMÁTICO
I. Imagine-sefriccionandoa pontadosdedosao longode umvidro lisoe depoisem umtijolo.Que tiposde
receptoresdapeleo ajudama distinguirasduassuperfícies?Qual é a diferençaentreasduassuperfíciesdo
pontodevistado seusistemasensorialsomático?
2. Qualé o motivodaexistênciadeenvoltóriosemalgumasdasterminaçõesnervosassensoriaisnapele?
3. Sealguémarremessarparavocêumabatataquenteevocêaapanhar,qualinformaçãoalcançaráo seusistema
nervosocentralprimeiro:a informaçãorelativaaofatode a batataestarquenteou de elaserrelativamente
lisa?Por quê?
4. Emqualníveldo sistemanervososeencontramasrepresentaçõesdo ladocontralateralde todosos tipos
de informaçãosensorialsomática:namedulaespinhal,no bulbo,naponte,no mesencéfalo,notálamoou no
córtex?
5. Qualo lobodocórtexquecontémasprincipaisáreassensoriaissomáticas?Ondeficamessasáreasemrela-
çãoàsáreasvisuaiseauditivasprincipais?
6. Emquepartedocorpoadorpodesermoduladaeo quecausasuamodulação?
7. Paraonde,noSNC,convergemasinformaçõessobreo tato,aforma,atemperaturaeador?
8. Imagineo seguinteexperimento:enchadoisbaldescomágua,sendoumrelativamentefrioeo outroquente.
Enchaumterceirobaldecomáguaemumatemperaturaintermediária.Coloquesuamãoesquerdanaágua
quentee amãodireitanafriaduranteumminuto.Logoemseguida,mergulheambasasmãosnaáguade
temperaturaintermediária.Atenteparaasensaçãotérmicaqueemcadamão.Elassentemamesmatempe-
ratura?Porquê?
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