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NOTA À 5ª EDIÇÃO Nesta edição, registramos e comentamos uma significativa quantidade de alterações legislativas e jurisprudenciais, as mais importantes apontadas nos parágrafos seguintes. No tocante às alterações legislativas, destacamos: a) as recentes Emendas Constitucionais nos 58 (alteração da composição das Câmaras Municipais), 59 (alteração de dispositivos do Título VIII – “Da Ordem Social”, relativos à educação), 61 (alteração da composição do Conselho Nacional de Justiça – CNJ), 62 (novo regramento do regime de pagamento de dívidas, pelas Fazendas Públicas, mediante precatórios judiciais), 63 (disposições acerca do piso salarial profissional nacional e diretrizes para os planos de carreira de agentes comunitários de saúde e de agentes de combate às endemias) e 64 (inclusão da “alimentação” como direito social); b) a nova lei do mandado de segurança individual e coletivo (Lei nº 12.016/2009); e c) a regulamentação do processo da ação direta de inconstitucionalidade por omissão – ADO (Lei nº 12.063/2009). Dentre os entendimentos firmados pelo Supremo Tribunal Federal, citamos: (a) o afastamento da exigência do diploma de jornalista para o exercício do jornalismo; (b) o reconhecimento da revogação integral da antiga Lei de Imprensa, editada ao tempo do regime militar; (c) a vedação ao Tribunal de Contas da União de manter em sigilo a autoria de denúncia a ele apresentada contra administrador público; (d) a nova orientação sobre a atuação do Advogado-Geral da União no controle abstrato perante a Corte Máxima; e (e) a aprovação de importantes Súmulas Vinculantes, sobre variadas matérias constitucionais. Aproveitamos, ainda, para aperfeiçoar alguns pontos doutrinários e jurisprudenciais, a exemplo do poder constituinte formal e material, da sucessão do chefe do Poder Executivo no caso de dupla vacância determinada pela Justiça Eleitoral e significativa ampliação do Capítulo 14, no tocante à Segurança Pública. Por fim, o Caderno de Questões foi integralmente refeito, passando a apresentar itens extraídos de provas realizadas pelas bancas ESAF, CESPE e FCC nos anos de 2007 a 2009. No intuito de permitir um estudo segmentado, todos os itens são apresentados por capítulo e por banca examinadora. Os Autores. PONTOS DO LIVRO “DIREITO CONSTITUCIONAL DESCOMPLICADO” QUE, EM VIRTUDE DE ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS OU JURISPRUDENCIAIS OCORRIDAS DESDE A 4ª EDIÇÃO, FORAM OBJETO DE ATUALIZAÇÃO NA 5ª EDIÇÃO DA OBRA. CAPITULO 3 1) A parte final do item 2.5. passou a ser esta, transcrita abaixo: 2.5. Características ...................... Diretamente relacionado a essas características é o entendimento jurisprudencial de que são imprescritíveis as ações que visem a reparar violação aos direitos humanos ou aos direitos fundamentais da pessoa humana. Com efeito, a jurisprudência pátria reconhece que violações a tais direitos ensejam ação de reparação imprescritível, sob o fundamento de que“a exigibilidade a qualquer tempo dos consectários às violações dos direitos humanos decorre do princípio de que o reconhecimento da dignidade humana é fundamento da liberdade, da justiça e da paz, razão por que a Declaração Universal inaugura seu regramento superior estabelecendo no art. 1.º que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos". 1 Para mais dessas características, deve-se registrar que Canotilho enfatiza o fato de serem os direitos fundamentais normas abertas (princípio da não tipicidade dos direitos fundamentais), o que permite que se insiram novos direitos, não previstos pelo constituinte por ocasião da elaboração do Texto Maior, no âmbito de direitos já existentes. Enfim, deve-se entender que não existe uma lista taxativa de direitos fundamentais, constituindo eles um conjunto aberto, dinâmico, mutável no tempo. Essa característica dos direitos fundamentais encontra-se expressa no § 2.º do art. 5.º da CF/88, nos termos seguintes: “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. 2) O item 2.8. passou a ter a redação abaixo: 2.8. Relações privadas 1 REsp 959904 / PR, rel. Min. Luiz Fux, 23.04.2009. Os direitos fundamentais regulam, precipuamente, as relações entre o Estado e o particular. Como regra, representam direitos – de índole positiva ou negativa – conferidos ao particular frente ao Estado. Regulam, dessarte, as chamadas relações verticais. Questão enfrentada pela doutrina e jurisprudência pátrias diz respeito à incidência, ou não, dos direitos fundamentais nos negócios celebrados entre particulares, haja vista que nestes, em regra, prepondera o princípio da autonomia da vontade. Trata-se do exame da chamada eficácia horizontal (privada ou externa) dos direitos fundamentais. A Constituição Federal de 1988 não foi expressa no tocante à incidência dos direitos fundamentais nas relações horizontais, isto é, nos negócios privados.2 Limitou-se, o atual texto constitucional, a estabelecer que os direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata (art. 5º, § 1º). Há hipóteses, porém, em que resta clara a incidência dos direitos fundamentais nas relações privadas no vigente texto constitucional, como no caso dos direitos dos trabalhadores, arrolados no art. 7º da Constituição da República. Com efeito, como os destinatários dos direitos constitucionais trabalhistas são, por excelência, os empregados e empregadores privados, resulta indiscutível, nesse caso, a vinculação deles aos direitos fundamentais. Diga-se de passagem, é de suma importância essa vinculação, tendo em conta o histórico de medidas discriminatórias e de condutas violadoras de direitos constitucionais fundamentais dos trabalhadores, adotadas por empresas privadas em relação a seus empregados. Assim, na celebração de um contrato de trabalho entre empresa privada e empregado, os sujeitos atuam sob o princípio da autonomia da vontade, no ajuste das respectivas cláusulas. Entretanto, não poderão afastar os direitos fundamentais incidentes sobre o negócio, por exemplo, estabelecendo cláusula em que o obreiro renuncie ao exercício do seu direito fundamental à liberdade de greve (CF, art. 9.º). Caso ocorresse tal ajuste, o contrato de trabalho seria válido, mas a cláusula obstativa do direito de greve não teria nenhuma validade frente ao ordenamento jurídico. Além dos direitos fundamentais dos trabalhadores, há, ainda, outras situações em que a própria Constituição expressamente impõe aos indivíduos, nas relações entre eles (privadas), o respeito a direitos fundamentais. É o que se observa, por 2 Diferentemente, a Constituição Portuguesa, de 1976, dispõe expressamente, sem seu art. 18: “Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades púublicas e privadas”. exemplo, no inciso V do art. 5.º, que assegura o direito de resposta, proporcional ao agravo (o sujeito passivo será o órgão de imprensa, privado). Ademais, mesmo naquelas situações em que não há uma expressa imposição constitucional, o entendimento doutrinário dominante, no constitucionalismo pátrio, é de que os direitos fundamentais aplicam-se, também, às relações privadas. Segundo essa orientação, não podem os particulares, com amparo no princípio da autonomia da vontade, afastar livremente os direitos fundamentais. Enfim, o entendimento dominante em nosso país é de que não só o Estado deve respeitar os direitos fundamentais, mas também os particulares, nas relações entre si. Desse modo, os direitos fundamentais vinculam o Estado – incluindo o legislador, os órgãos administrativos e o Poder Judiciário –, bem como os particulares. Na jurisprudência do STF, já foi reconhecida como obrigatória a observância do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório no caso de exclusão compulsória de associado de uma cooperativa3, bem como no caso de afastamento de associados em uma sociedade civil4, deixando assente a nossa Corte Maior que “as violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela nossa Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados”. ..................... 3) O item 4.5. passou a ter a redação abaixo (reprodução integral do item): 4.5. Liberdade de expressão (art. 5.º, IV, V, IX, XIV) Neste tópico, analisaremos quatro incisos do art. 5.º da Constituição que estão, direta ou indiretamente, relacionados ao direito à liberdade de expressão. Nos termos do inciso IV do art. 5.º, “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Trata-se de regra ampla, e não dirigida a destinatários específicos. Qualquer pessoa, em princípio, pode manifestar o que pensa, desde que não o faça sob o manto do anonimato. Conforme ensina o Prof. Alexandre de Moraes, “a proteção constitucional engloba não só o direito de expressar-se, oralmente, ou por escrito, mas também o direito de ouvir, assistir e ler”. 3 RE 158.215/-RS, rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 07.06.1996. 4 RE 201.819/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 11.10.2005. Em respeito à ampla liberdade de expressão, o Supremo Tribunal Federal afastou a exigência do diploma de jornalismo e do registro profissional no Ministério do Trabalho como condição para o exercício da profissão de jornalista. Para o Tribunal, essa exigência fere a liberdade de imprensa e contraria o direito à livre manifestação do pensamento inscrita no artigo 13 da Convenção Americana dos Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San Jose da Costa Rica. Conforme deixou assente o relator, Ministro Gilmar Mendes, “o jornalismo é a própria manifestação e difusão do pensamento e da informação de forma contínua, profissional e remunerada”, e, portanto, “o jornalismo e a liberdade de expressão não podem ser pensados e tratados de forma separada”.5 A vedação ao anonimato, que abrange todos os meios de comunicação, tem o intuito de possibilitar a responsabilização de quem cause danos a terceiros em decorrência da expressão de juízos ou opiniões ofensivos, levianos, caluniosos, difamatórios etc. Merece transcrição esta lição do Min. Celso de Mello, proferida em seu voto na questão de ordem suscitada no Inquérito 1.957/PR, julgado em 11.05.2005: Sabemos, Senhor Presidente, que o veto constitucional ao anonimato, nos termos em que enunciado (CF, art. 5.º, IV, “in fine”), busca impedir a consumação de abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e na formulação de denúncias apócrifas, pois, ao exigir-se a identificação de seu autor, visa-se, em última análise, com tal medida, a possibilitar que eventuais excessos derivados de tal prática sejam tornados passíveis de responsabilização, a posteriori, tanto na esfera civil quanto no âmbito penal, em ordem a submeter aquele que os cometeu às conseqüências jurídicas de seu comportamento. (...) Torna-se evidente, pois, Senhor Presidente, que a cláusula que proíbe o anonimato – ao viabilizar, a posteriori, a responsabilização penal e/ou civil do ofensor – traduz medida constitucional destinada a desestimular manifestações abusivas do pensamento, de que possa decorrer gravame ao patrimônio moral das pessoas injustamente desrespeitadas em sua esfera de dignidade, qualquer que seja o meio utilizado na veiculação das imputações contumeliosas. A vedação ao anonimato impede, também, como regra geral, o acolhimento de denúncias anônimas (delação apócrifa), conforme se constata das seguintes conclusões, que encerram o voto do Min. Celso de Mello no Inquérito 1.957/PR (questão de ordem): (a) os escritos anônimos não podem justificar, só por si, desde que isoladamente considerados, a imediata instauração da 5 RE 511.961, rel. Ministro Gilmar Mendes, 17.06.2009 persecutio criminis, eis que peças apócrifas não podem ser incorporadas, formalmente, ao processo, salvo quando tais documentos forem produzidos pelo acusado, ou, ainda, quando constituírem, eles próprios, o corpo de delito (como sucede com bilhetes de resgate no delito de extorsão mediante seqüestro, ou como ocorre com cartas que evidenciem a prática de crimes contra a honra, ou que corporifiquem o delito de ameaça ou que materializem o crimen falsi, p. ex.); (b) nada impede, contudo, que o Poder Público, provocado por delação anônima (“disque-denúncia”, p. ex.), adote medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição”, a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos nela denunciados, em ordem a promover, então, em caso positivo, a formal instauração da persecutio criminis, mantendo-se, assim, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas; e (c) o Ministério Público, de outro lado, independentemente da prévia instauração de inquérito policial, também pode formar a sua opinio delicti com apoio em outros elementos de convicção que evidenciem a materialidade do fato delituoso e a existência de indícios suficientes de sua autoria, desde que os dados informativos que dão suporte à acusação penal não tenham, como único fundamento causal, documentos ou escritos anônimos. Em aresto ulterior, reiterou essa orientação o Supremo Tribunal Federal, ao deferir habeas corpus para trancar, por falta de justa causa, notícia-crime instaurada, por requisição do Ministério Público Federal, com base unicamente em denúncia anônima. Asseverou então a Corte Suprema que a instauração de procedimento criminal originada apenas em documento apócrifo seria contrária à ordem jurídica constitucional, que veda expressamente o anonimato, ofenderia a dignidade da pessoa humana, permitindo a prática do denuncismo inescrupuloso, e impossibilitaria eventual indenização por danos morais ou materiais, contrariando os princípios consagrados nos incisos V e X do art. 5.º da Carta da República.6Os direitos da pessoa que sofra um dano em razão de manifestação indevida por parte de outrem estão explicitados no inciso V do art. 5.º da Constituição, nestes termos: V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; O direito de resposta está orientado pelo critério da proporcionalidade, isto é, a 6 HC 84.827/TO, rel. Min. Marco Aurélio, 07.08.2007. resposta deve ser assegurada no mesmo meio de comunicação em que o agravo foi veiculado, e deve ter o mesmo destaque e a mesma duração (se em meio sonoro ou audiovisual) ou tamanho (se em meio escrito). Deve-se ressaltar que o direito de resposta não afasta o direito à indenização. O direito de resposta e o direito à indenização por danos morais e materiais – anote-se que essas indenizações são cumuláveis – aplicam-se tanto às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas que sejam ofendidas pela expressão indevida de juízos ou opiniões. Segundo o Prof. Alexandre de Moraes, esses direitos são cabíveis “até mesmo em relação às coletividades (interesses difusos ou coletivos)”. Considerando esse dispositivo, entre outros, nossa Corte Suprema firmou entendimento de que o Tribunal de Contas da União (TCU) não pode manter em sigilo a autoria de denúncia a ele apresentada contra administrador público.7 Com efeito, apontando como fundamento os incisos IV, V, X, XXXIII e XXXV do art. 5º da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da expressão "manter ou não o sigilo quanto ao objeto e à autoria da denúncia", constante do § 1º do art. 55 da Lei Orgânica do TCU (Lei 8.443/1992), bem como do disposto no Regimento Interno do TCU, no ponto em que estabelece a permanência do sigilo relativamente à autoria da denúncia. Considerou a nossa Corte Maior que a manutenção do sigilo por parte do Poder Público impediria o denunciado de adotar as providências asseguradas pela Constituição na defesa de sua imagem, inclusive a de buscar a tutela judicial, salientando, ainda, o fato de que apenas em hipóteses excepcionais é vedado o direito das pessoas ao recebimento de informações perante os órgãos públicos (art. 5º, XXXIII). Complementando as normas antes vistas acerca do direito à liberdade de expressão, o inciso IX do art. 5.º estabelece a garantia de vedação à censura prévia, nestes termos: “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. A liberdade de expressão, mesmo com o fim da censura prévia, não dispõe de caráter absoluto, visto que encontra limites em outros valores protegidos constitucionalmente, sobretudo, na inviolabilidade da privacidade e da intimidade do indivíduo e na vedação ao racismo. Conforme salienta Alexandre de Moraes, a liberdade de expressão deve ser exercida com responsabilidade e o seu desvirtuamento para o “cometimento de fatos ilícitos, civil ou penalmente, possibilitará aos prejudicados plena e integral indenização por danos materiais e morais, além do efetivo direito de resposta”. 7 MS 24405/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 3.12.2003. Com fundamento nesse dispositivo constitucional, entre outros, o Supremo Tribunal Federal considerou integralmente revogada, por incompatibilidade material com a Constituição Federal de 1988, a antiga Lei de Imprensa, editada ao tempo do regime militar (Lei 5.250, de 09.02.1967). Para o Tribunal, as disposições de tal lei eram incompatíveis com o padrão de democracia e liberdade de imprensa concebido pelo legislador constituinte de 1988, que se apóia em dois pilares: (a) informação em plenitude e de máxima qualidade; e (b) transparência ou visibilidade do poder, seja ele político, econômico ou religioso. 8 Por fim, merece nota o inciso XIV do art. 5.º, na dicção do qual “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. Consoante afirmado acima, o direito fundamental de acesso à informação, como ocorre com todos os demais, não é absoluto. Ele se refere, essencialmente, a informações que possam ser de interesse público ou geral, não cabendo dele cogitar quando se trate de informações que digam respeito exclusivamente à intimidade e à vida privada do indivíduo, as quais são objeto de proteção constitucional expressa (art. 5.º, X). Por outras palavras, todos têm o direito de acesso a informações que possam ser de interesse geral, mas não existe um direito de acesso a informações que só interessem à esfera privada de determinada pessoa. Conforme sintetiza o Prof. Alexandre de Moraes, há “necessidade de distinguir as informações de fatos de interesse público, da vulneração de condutas íntimas e pessoais, protegidas pela inviolabilidade à vida privada, e que não podem ser devassadas de forma vexatória ou humilhante”. A proteção ao sigilo da fonte, assegurada na parte final do inciso XIV do art. 5.º, tem como mais importantes destinatários os profissionais do jornalismo, uma vez que possibilita que estes obtenham informações que, sem essa garantia, certamente não seriam reveladas. Com efeito, o fato de o sigilo da fonte ser estabelecido como uma garantia fundamental permite que o indivíduo que possua informações que julgue devessem ser tornadas públicas, mas se reveladas diretamente por ele colocariam em risco sua segurança, ou trariam para ele qualquer outra espécie de prejuízo, transmita essas informações a um jornalista em quem confie, para que este as torne públicas, sem declinar o nome de sua fonte. Bastará que o informante confie na palavra do jornalista (ou em outro profissional que trabalhe com divulgação de informações), porque sabe que existe a garantia constitucional de que o Estado não terá possibilidade de impor qualquer sanção ao jornalista que se recuse a revelar a fonte de sua informação. Note-se que a garantia do sigilo da fonte não conflita com a vedação ao anonimato. O jornalista (ou profissional que trabalhe com divulgação de informações) veiculará a notícia em seu nome, e está sujeito a responder pelos eventuais danos indevidos que ela cause. Assim, embora a fonte possa ser sigilosa, a divulgação da informação não será feita de forma anônima, de tal sorte que não se frustra a eventual responsabilização de quem a tenha veiculado – e a finalidade da vedação ao anonimato é exatamente possibilitar a responsabilização 8 ADPF 130, rel. Min. Carlos Ayres Britto, 30.04.2009. da pessoa que ocasione danos em decorrência de manifestações indevidas. 4) A parte final do item 4.21. passou a ser esta, transcrita abaixo: 4.21. Princípio da inafastabilidade de jurisdição (art. 5.º, XXXV) ................... Segundo orientação do Supremo Tribunal Federal, esse princípio não impede a imposição, por lei, de restrições à concessão de medidas cautelares e de liminares em ações judiciais, desde que haja razoabilidade para tal limitação. Dessa forma, por exemplo, a Lei 12.016/2009, que regula o mandado de segurança, veda a concessão de liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza (art. 7º, § 2º). Outra decorrência desse princípio é que, no Brasil, em regra, o esgotamento da via administrativa não é condição indispensável para a busca da tutela perante o Poder Judiciário (a regra é a inexistência da denominada “jurisdição condicionada” ou da “instância administrativa de curso forçado”). Significa dizer que o indivíduo não precisa, necessariamente, valer-se do processo administrativo para, somente depois de indeferida administrativamente sua pretensão, recorrer ao Poder Judiciário. Poderá, de pronto, sem necessidade de exaurir (ou mesmo de utilizar) a via administrativa, ingressar com a ação judicial cabível. É oportuno, não obstante, anotar a existência de pelo menos três hipóteses em nosso ordenamento jurídico nas quais se exige o exaurimento, ou a utilização inicial da via administrativa, como condição para acesso ao Poder Judiciário, a saber: a) só são admitidas pelo Poder Judiciário ações relativas à disciplina e às competições desportivas depois de esgotadas as instâncias da “justiça desportiva” (CF, art. 217, § 1º); apesar do nome “justiça desportiva”, trata-se de órgãos de natureza administrativa; b) o ato administrativo, ou a omissão da Administração Pública, que contrarie súmula vinculante só pode ser alvo da reclamação ao STF prevista no § 3º do art. 103-A da Constituição depois de esgotadas as vias administrativas (Lei 11.417/2006, art. 7º, § 1º); c) é indispensável para caracterizar o interesse de agir no habeas data “a prova do anterior indeferimento do pedido de informação de dados pessoais, ou da omissão em atendê-lo; sem que se configure situação prévia de pretensão, há carência da ação constitucional do habeas data” (STF, HD 22/DF, rel. Min. Celso de Mello, 19.09.1991). Quanto à utilização simultânea das vias administrativa e judicial, o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional previsão legal que estabelece que a opção pela via judicial implica renúncia tácita ao processo administrativo (Lei n.º 6.830/1980, art. 38, parágrafo único).9 Entendeu a Corte Suprema que a presunção de renúncia tácita à possibilidade de recorrer administrativamente ou de desistência do recurso já interposto na esfera administrativa não implica afronta à garantia constitucional da jurisdição, mas sim regra de economia processual, que informa tanto o processo judicial quanto o administrativo. Desse modo, caso o administrado esteja questionando certa matéria no âmbito de um processo administrativo e decida, simultaneamente, ajuizar ação perante o Poder Judiciário a fim de discutir a mesma matéria, essa opção implicará renúncia tácita à via administrativa, com extinção imediata de seu processo administrativo, na fase em que estiver. Vale ainda anotar que, segundo o Supremo Tribunal Federal, viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa (Súmula 667). O fundamento para esse entendimento da Corte Maior é que, caso fosse permitida a fixação de taxa judiciária incidente sobre o valor da causa, sem limite, essa medida terminaria por quebrar a relativa equivalência que deve existir entre o valor cobrado pelo Estado e o custo da prestação jurisdicional, criando restrição desarrazoada ao acesso à tutela do Poder Judiciário. Como exemplo, suponha-se uma taxa judiciária fixada em percentual incidente sobre o valor de uma causa estimada em dez bilhões de reais. Certamente, o valor apurado – resultante da aplicação do percentual da taxa sobre o valor da causa – seria demasiado vultoso, inviabilizando o acesso ao Poder Judiciário – além de não guardar correspondência razoável com o custo estimado da prestação jurisdicional oferecida pelo Estado. Por último, é importante registrar que o Supremo Tribunal Federal consagrou o entendimento de que viola o inciso XXXV do art. 5º da Constituição (e também a garantia de ampla defesa) a exigência de depósito como condição para o ajuizamento de ação em que se discuta a imposição de tributo. Tal orientação está sedimentada na Súmula Vinculante 28, abaixo transcrita: “28 – É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade de crédito tributário.” 5) Ao item 4.30 foi acrescentado o subitem 4.30.1, conforme abaixo (reprodução integral do subitem): 4.30. Extradição (art. 5.º, LI e LII) ............. 4.30.1. Procedimento 9 RE 233.582/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, 16.08.2007. No Brasil, o processo de extradição obedece, em síntese, a três fases distintas: a) recebimento, pelo Poder Executivo, do pedido de extradição, por via diplomática; Nessa fase, o Poder Executivo decide com plena discricionariedade se dará seguimento, ou não, ao pedido do Estado estrangeiro. Se a decisão for pelo seguimento, o Ministério das Relações Exteriores encaminhará o pedido ao Ministério da Justiça, que o submeterá ao Supremo Tribunal Federal. b) julgamento do pedido pelo Supremo Tribunal Federal, em caráter definitivo, do qual não cabe recurso; c) adoção, pelo Poder Executivo, das providências administrativas necessárias à extradição, ou seja, à entrega do extraditando ao Estado requerente; em regra, o Poder Executivo comunica ao Estado estrangeiro a decisão autorizativa do Supremo Tribunal Federal, para que o seu nacional seja recolhido no prazo de 60 dias. Questão importante enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal diz respeito a essa terceira fase, no tocante à vinculação, ou não, do Presidente da República à decisão do STF que autorizou a extradição. Enfim, caso o STF autorize a extradição, por entender preenchidos os requisitos para tanto, o Presidente da República estará obrigado a entregar o extraditando ao Estado requerente, ou ele dispõe de discricionariedade? Depois de autorizar a extradição de Cesare Battisti para a Itália, por considerar que os crimes imputados a esse cidadão italiano não tiveram conotação política, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que o Presidente da República não está vinculado à decisão da Corte, haja vista que poderá entregar, ou não, o extraditando ao governo italiano. Entretanto, segundo o mesmo Tribunal, não se trata de ato discricionário do Presidente da República, porque este terá de agir nos estritos termos do tratado de extradição específico, firmado entre o Brasil e o Estado requerente (a Itália, nesse caso). Significa que o Presidente da República não se vincula à decisão do Supremo Tribunal Federal que autoriza a extradição – haja vista que há a possibilidade de ele decidir pela não entrega do extraditando ao Estado requerente –, mas essa sua decisão não é discricionária, porque é regrada pelas disposições do correspondente tratado internacional de extradição entre os Estados. “O Presidente da República extradita ou não, mas nos estritos termos do tratado”, observou o ministro Eros Grau (EXT 1.085, rel. Min. Cezar Peluso, 16.12.2009). 6) A parte final do item 4.34 passou a ter a redação abaixo: 4.34. Princípio da presunção da inocência (art. 5.º, LVII) .............. Esse princípio impede, também, a prisão do réu antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Deve-se ressalvar, todavia, a possibilidade de prisão preventiva processual, desde que fundamentada em algum dos pressupostos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal (garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal e garantia da aplicação da lei penal).10 Com efeito, em julgado sobremaneira relevante, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito de o réu, já condenado em primeira ou segunda instâncias, recorrer em liberdade até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.11 Desse modo, embora o recurso especial (perante o STJ) e o recurso extraordinário (perante o STF) não possuam efeito suspensivo, a interposição deles assegura ao réu o direito de permanecer em liberdade até o trânsito em julgado da sentença. Na mesma linha, nossa Corte Suprema decidiu que é incompatível com a Carta de 1988 o art. 595 do CPP, segundo o qual, se o réu condenado fugisse depois de apelar de sua condenação, a apelação não deveria ser analisada pela Justiça.12 Cabe registrar que o art. 594 do CPP – o qual estatuía que “o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão” – foi revogado pela Lei 11.719/2008. Vale lembrar que as prisões cautelares anteriores à fase processual (em flagrante e temporária) continuam sendo admissíveis, desde que fundamentadas concretamente nos pressupostos previstos na legislação penal pertinente.13 Em resumo, a partir desse novo entendimento do Supremo Tribunal Federal, a regra no nosso ordenamento passa a ser o acusado ter direito a recorrer em liberdade e a prisão só ocorrer depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória; no entanto, excepcionalmente, poderá haver prisão cautelar – em flagrante, temporária ou preventiva –, desde que obedecidos os pressupostos exigidos pela legislação penal respectiva. Por derradeiro, ainda em decorrência do postulado da presunção da inocência, o Supremo Tribunal Federal entende que a simples existência de investigações policiais ou de persecuções criminais em curso, sem o trânsito em julgado, não basta, só por si, para a caracterização de maus antecedentes do réu. Na lição do Ministro Celso de Mello, “processos penais em curso, ou inquéritos policiais em andamento, ou, até mesmo, condenações criminais ainda sujeitas a recurso não 10 “Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.” 11 HC 84.078/MG, rel. Min. Eros Grau, 05.02.2009. 12 HC 85.961/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 05.03.2009; HC 98.987 QO/RS, rel. Min. Cezar Peluso, 13.05.2009. 13 A prisão em flagrante está disciplinada no art. 301 do Código de Processo Penal; a prisão temporária, no art. 1.º da Lei n.º 7.960/1989. podem ser considerados, enquanto episódios processuais suscetíveis de pronunciamento judicial absolutório, como elementos evidenciadores de maus antecedentes do réu”.14 7) O item 4.45. passou a ter a redação abaixo (reprodução integral do item, com todos os seus subitens): 4.45. Mandado de segurança (art. 5.º, LXIX e LXX) Reza a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5.º, inciso LXIX: “LXIX – conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;” Incorporado ao texto constitucional desde a Constituição Federal de 1934, atualmente o mandado de segurança é regulamentado pela Lei 12.016, de 07.08.2009. Nos parágrafos seguintes, sem a pretensão de esgotar o assunto, destacamos os principais aspectos desse regramento legal, complementando-os com entendimentos doutrinários e da jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal. 4.45.1. NATUREZA JURÍDICA O mandado de segurança é ação judicial, de rito sumário especial, a ser utilizada quando direito líquido e certo do indivíduo for violado por ato de autoridade governamental ou de agente de pessoa jurídica privada que esteja no exercício de atribuição do Poder Público. O mandado de segurança é ação de natureza residual, subsidiária, pois somente é cabível quando o direito líquido e certo a ser protegido não for amparado por outros remédios judiciais (habeas corpus ou habeas data, ação popular etc.). É sempre ação de natureza civil, ainda quando impetrado contra ato de juiz criminal, praticado em processo penal. 4.45.2. CABIMENTO 14 HC 96.618-MC/SP, Min. Celso de Mello, 04.11.2008. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. Como se vê, o mandado de segurança é cabível contra o chamado “ato de autoridade”, entendido como qualquer manifestação ou omissão do Poder Público, no desempenho de suas atribuições. Ressalte-se que não só as manifestações positivas, comissivas, são consideradas “atos de autoridade”, pois as omissões das autoridades também podem violar direito líquido e certo do indivíduo, legitimando a impetração do mandado de segurança. Equiparam-se às autoridades públicas, quanto à prática de atos reparáveis via mandado de segurança, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições. 4.45.3. DESCABIMENTO Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: I – de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução; II – de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo; III – de decisão judicial transitada em julgado. A vedação constante do inciso I foi abrandada pela jurisprudência pátria. Com efeito, entende os nossos tribunais que o que é vedado é o administrado impetrar o mandado de segurança enquanto está pendente de decisão o recurso administrativo com efeito suspensivo que ele próprio apresentou. Entretanto, mesmo que seja cabível o recurso administrativo com efeito suspensivo, se o administrado simplesmente deixar escoar o prazo sem apresentar esse recurso, não fica impedido de ajuizar o mandado de segurança (desde que, evidentemente, não tenha transcorrido o prazo decadencial de cento e vinte dias para a impetração). É interessante observar que, na hipótese de o mandado de segurança ser impetrado contra uma omissão ilegal, descabe por completo a aplicação da restrição vazada nesse inciso, uma vez que não pode ser cogitada a existência de um recurso administrativo com “efeito suspensivo” de um ato que justamente deixou de ser praticado. Quanto ao inciso III, é oportuno registrar que a impossibilidade de ajuizar mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado é ponto há muito consagrado pela jurisprudência.15 Decisões judiciais transitadas em julgado, na esfera cível, devem ser atacadas, se for o caso, mediante ação própria: a ação rescisória (CPC, art. 485). Já na esfera penal, a ação adequada para desfazer uma decisão transitada em julgado, se for o caso, é a revisão criminal (CPP, art. 621). Também não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público. Essa vedação tem por fim excluir o cabimento do mandado de segurança contra atos de natureza comercial praticados pelos administradores das mencionadas empresas, haja vista que, nesse caso, a atuação deles se equipara à atuação de agente privado, e não à de autoridade pública. Por fim, não cabe mandado de segurança contra lei em tese, salvo se produtora de efeitos concretos.16 Somente as leis de efeitos concretos são passíveis de impugnação mediante mandado de segurança, pois estas equivalem a atos administrativos, e, por terem destinatários certos, podem violar, diretamente, direitos subjetivos. Para a fiscalização da constitucionalidade das “leis em tese” existe a via própria – ação direta de inconstitucionalidade –, no âmbito do nosso sistema de controle abstrato de normas. 4.45.4. DIREITO LÍQUIDO E CERTO Nem todo o direito é amparado pela via do mandado de segurança: a Constituição Federal exige que o direito invocado seja líquido e certo. Direito líquido e certo é aquele demonstrado de plano, de acordo com o direito, e sem incerteza, a respeito dos fatos narrados pelo impetrante. É o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Se a existência do direito for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não será cabível o mandado de segurança. Esse direito incerto, indeterminado, poderá ser defendido por meio de outras ações judiciais, mas não na via especial e sumária do mandado de segurança. Por essa razão, não há dilação probatória no mandado de segurança; as provas devem ser pré-constituídas, em regra documentais, levadas aos autos do processo no momento da impetração. 15 STF, Súmula 268: “Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado.” 16 STF, Súmula 266: “Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.” Segundo a orientação dominante, a exigência de liquidez e certeza recai sobre a matéria de fato, sobre os fatos alegados pelo impetrante para o ajuizamento do mandado de segurança. Estes, sim, necessitam de comprovação inequívoca, de plano. A matéria de direito, por mais complexa e difícil que se apresente, pode ser apreciada em mandado de segurança. É essa a jurisprudência do STF, segundo a qual a alegação de “grande complexidade jurídica” do direito invocado não é motivo para obstar a utilização da via do mandado de segurança. 4.45.5. LEGITIMAÇÃO ATIVA Têm legitimidade ativa para impetrar mandado de segurança (sujeito ativo): a) as pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, domiciliadas ou não no Brasil; b) as universalidades reconhecidas por lei, que, embora sem personalidade jurídica, possuem capacidade processual para defesa de seus direitos (o espólio, a massa falida, o condomínio de apartamentos, a herança, a sociedade de fato, a massa do devedor insolvente etc.); c) os órgãos públicos de grau superior, na defesa de suas prerrogativas e atribuições; d) os agentes políticos (governador de estado, prefeito municipal, magistrados, deputados, senadores, vereadores, membros do Ministério Público, membros dos tribunais de contas, ministros de estado, secretários de estado etc.), na defesa de suas atribuições e prerrogativas; e) o Ministério Público, competindo a impetração, perante os tribunais locais, ao promotor de justiça, quando o ato atacado emanar de juiz de primeiro grau de jurisdição. Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá requerer o mandado de segurança. 4.45.6. LEGITIMAÇÃO PASSIVA Têm legitimidade passiva em mandado de segurança: a) autoridades públicas de quaisquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, sejam de que categoria forem e sejam quais forem as funções que exerçam; b) os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas (incluídas as fundações governamentais com personalidade jurídica de direito público); c) os dirigentes de pessoas jurídicas de direito privado, integrantes ou não da administração pública formal, e as pessoas naturais, desde que eles estejam no exercício de atribuições do Poder Público, e somente no que disser respeito a essas atribuições. Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática. Em mandado de segurança, em se tratando de atribuição delegada, a autoridade coatora será o agente delegado (que recebeu a atribuição), e não a autoridade delegante (que efetivou a delegação).17 Desse modo, a competência para o processo e julgamento do mandado de segurança, quando se tratar de ato praticado por autoridade delegada, tendo sido a delegação efetivada no próprio âmbito das entidades políticas – União, estados e municípios – será do juízo ou tribunal competente para apreciar os atos da autoridade delegada. Assim, se Ministro de Estado pratica um ato por delegação recebida do Presidente da República, o tribunal competente para apreciar mandado de segurança impetrado contra tal ato do ministro será o Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, “b”), não o Supremo Tribunal Federal (que seria o tribunal competente se o ato tivesse sido praticado pelo próprio Presidente da República, nos termos do art. 102, I, “d”, da Constituição). Cabe à autoridade coatora a atribuição de prestar as informações ao magistrado, carreando a este elementos e informações que auxiliem na formação de sua convicção sobre o conflito. Com efeito, ao despachar a petição inicial, o juiz ordenará a notificação da autoridade coatora do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações. Além da notificação da autoridade coatora, para que sejam prestadas as informações, o juiz ordenará também que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito. Desse modo, por exemplo, caso seja impetrado um mandado de segurança em face de ato coator praticado por Delegado da Polícia Federal (autoridade federal), além da notificação a este para que, no prazo de dez dias, preste as informações, será também dada ciência ao Advogado-Geral da União 17 STF, Súmula 510: “Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial.” (representante judicial da União, nos termos do art. 131 da Constituição Federal) para que, querendo, ingresse no processo. 4.45.7. MEDIDA LIMINAR Ao despachar a inicial, o magistrado apreciará o pedido de medida liminar, e concederá esta, ordenando que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar eventual ressarcimento à pessoa jurídica. Medida liminar é uma ordem judicial proferida prontamente, mediante um juízo sumário, porém precário, ou seja, não definitivo, de plausibilidade das alegações e de risco de dano de difícil reparação, se houvesse demora na prestação jurisdicional. Os pressupostos de uma liminar, portanto, são a plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris) e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação em decorrência da demora na prestação jurisdicional definitiva (periculum in mora). Presentes esses pressupostos, a medida liminar deve ser concedida, mas isso não impede, de maneira nenhuma, que a decisão judicial definitiva (decisão de mérito), ainda que prolatada pelo mesmo juiz que antes concedeu a liminar, seja contrária ao impetrante, isto é, seja pela improcedência do pedido (ou mesmo que a liminar seja revogada ou cassada ainda antes de ser julgado o mérito da causa). Ademais, a lei passou a facultar ao magistrado a exigência ao impetrante de prestação de caução, fiança ou depósito como condição para a concessão da medida liminar. Essa possibilidade tem recebido duras críticas da doutrina, devido à sua potencialidade de dificultar, ou mesmo impedir ao impetrante, a obtenção dessa medida acauteladora de seu direito, quando não tiver condições econômicas para o cumprimento de tal exigência. Deferida a medida liminar, o processo terá prioridade para julgamento. Assegura-se, aqui, prioridade de julgamento àqueles mandados de segurança em que tenha sido deferida a medida liminar, com o fim de evitar que o conflito permaneça regido durante longo período por uma medida precária (medida liminar). Os efeitos da medida liminar persistirão até a prolação da sentença de mérito, salvo se revogada (pelo próprio magistrado que a concedeu) ou cassada (por instância superior). 4.45.8. VEDAÇÃO À CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR Não será concedida medida liminar que tenha por objeto: a) a compensação de créditos tributários; b) a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior; c) a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. Observe que é possível que as mencionadas matérias sejam objeto de mandado de segurança e que o pedido formulado seja, ao final, no julgamento de mérito, reconhecido. O que não se permite é que tais providências sejam determinadas em decisão precária, mediante a concessão de medida liminar. Cabe destacar que nessas hipóteses em que é vedada a concessão de medida liminar, caso seja, ulteriormente, no julgamento de mérito, concedida a segurança, não será admitida a execução provisória da sentença concessiva. Por exemplo: é vedada a concessão de medida liminar para determinar o pagamento de vantagem a servidor público; essa medida poderá, porém, ser determinada pelo juiz na sentença de mérito (sentença concessiva da segurança); entretanto, caso a sentença do magistrado de primeiro grau seja concessiva da segurança, determinando o pagamento de vantagem a servidor público, o servidor não poderá executá-la provisoriamente. 4.45.9. PRAZO PARA IMPETRAÇÃO O prazo para impetração do mandado de segurança é de cento e vinte dias, a contar da data em que o interessado tiver conhecimento oficial do ato a ser impugnado (publicação do ato na imprensa oficial, por exemplo). Trata-se, conforme orientação do STF, de prazo decadencial, não passível de suspensão ou interrupção. Nem mesmo o pedido de reconsideração administrativo interrompe a contagem desse prazo.18 Se o ato impugnado é de trato sucessivo (pagamento periódico de vencimentos, prestações mensais de determinado contrato etc.), o prazo de cento e vinte dias renova-se a cada ato. 18 STF, Súmula 430: “Pedido de reconsideração na via administrativa não interrompe o prazo para o mandado de segurança.” Se o mandado de segurança é do tipo preventivo, não há que se falar em prazo decadencial de cento e vinte dias para sua impetração, porque não há um ato coator apto a marcar o termo inicial de contagem. Uma vez denegado o mandado de segurança, o pedido poderá ser renovado dentro do prazo decadencial, se a decisão denegatória não lhe houver apreciado o mérito. 4.45.10. COMPETÊNCIA A competência para julgar mandado de segurança é definida pela categoria da autoridade coatora e pela sua sede funcional. Desse modo, se a autoridade coatora é federal e desempenha suas atribuições em Fortaleza – CE, o juízo competente será a Justiça Federal nessa cidade, seja qual for a matéria discutida. Com efeito, é irrelevante, para fixação da competência, a matéria a ser discutida em mandado de segurança, uma vez que é em razão da autoridade coatora da qual emanou o ato dito lesivo que se determina o juízo a que deve ser submetida a ação. Segundo o STF, não lhe cabe julgar, originariamente, mandados de segurança contra atos praticados por outros tribunais e seus órgãos.19 Os próprios tribunais é que têm competência para julgar, originariamente, os mandados de segurança contra os seus atos, os dos respectivos presidentes e os de suas câmaras, turmas ou seções. Assim, mandado de segurança contra ato do Superior Tribunal de Justiça (STJ), do seu Presidente e de seus órgãos (turmas, seções) será julgado pelo próprio STJ; se o mandado de segurança é contra ato do Tribunal Superior do Trabalho (TST), do seu Presidente ou de suas Turmas, a competência para o julgamento será do próprio TST, e assim sucessivamente. No âmbito da Justiça Estadual, caberá aos próprios estados-membros cuidar da competência para a apreciação do mandado de segurança contra ato de suas autoridades, por força do art. 125 da Constituição Federal. 4.45.11. RECURSOS 19 STF, Súmula 624: “Não compete ao supremo tribunal federal conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais.” Da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar caberá agravo de instrumento.20 Do indeferimento da inicial pelo juiz de primeiro grau caberá apelação. Quando a competência para o julgamento do mandado de segurança couber originariamente a um dos tribunais, do ato do relator caberá agravo para o órgão competente do tribunal que integre. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação. Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada ou do Ministério Público e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso suspender, em decisão fundamentada, a execução da liminar e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem efeito suspensivo, no prazo de 5 (cinco) dias. Indeferido esse pedido de suspensão ou provido o mencionado agravo, caberá novo pedido de suspensão ao presidente do tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário. Da decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar caberá agravo ao órgão competente do tribunal que integre. Das decisões em mandado de segurança proferidas em única instância pelos tribunais cabe recurso especial e extraordinário, nos casos legalmente previstos, e recurso ordinário, quando a ordem for denegada. Não cabe, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes. 4.45.12. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição (reexame necessário). Significa que, no mandado de segurança, a sentença de primeira instância, quando concessiva da ordem, fica sujeita a reexame obrigatório pelo tribunal respectivo. Se a pessoa de direito público vencida não apelar, ou se o seu recurso 20 Essa regra, prevista no § 1º do art. 7º da Lei nº 12.016/2009, implicou a suplantação da Súmula 622 do STF: “Não cabe agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança”. não for admissível, porque intempestivo, ou por não atender a qualquer formalidade, haverá a remessa dos autos, de ofício, para o tribunal. A obrigatoriedade de duplo grau de jurisdição, todavia, não impede que a sentença de primeiro grau seja executada provisoriamente, salvo nos casos em que for vedada a concessão da medida liminar. Ademais, não há duplo grau de jurisdição obrigatório se a decisão foi proferida por tribunal do Poder Judiciário, no uso de competência originária. 4.45.13. PAGAMENTO A SERVIDOR O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial. Evita-se, com essa regra, que o mandado de segurança seja utilizado como ação substitutiva de cobrança.21 Significa dizer que a concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais deverão ser reclamados administrativamente, ou pela via judicial própria. 22 Exemplificando: imagine-se que o Poder Público esteja realizando desconto indevido na remuneração mensal do servidor Antônio desde o mês de dezembro de 2004. Antônio, porém, só ajuizou o mandado de segurança em março de 2005. Em setembro de 2005, é prolatada a sentença, reconhecendo a ilegitimidade de tal desconto. Nessa situação, embora a sentença tenha reconhecido a ilegalidade do ato, a ordem mandamental, em relação aos efeitos pecuniários (descontos indevidamente realizados), somente alcançará as prestações relativas ao período posterior à impetração (de março a setembro). Os descontos realizados em período anterior ao ajuizamento do writ (dezembro a fevereiro) não serão devolvidos por força da sentença mandamental; deverão ser reclamados na via própria, judicial ou administrativa. 21 STF, Súmula 269: “O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança.” 22 STF, Súmula 271: “Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria.” 4.45.14. DESCABIMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Não cabe, no processo de mandado de segurança, a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios (ônus de sucumbência),23 sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. 4.45.15. DESISTÊNCIA O mandado de segurança admite desistência em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente do consentimento do impetrado, mesmo que já tenha sido proferida decisão de mérito, desde que, evidentemente, ainda não tenha ocorrido o trânsito em julgado.24 4.45.16. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO O mandado de segurança coletivo constitui remédio constitucional previsto no art. 5.º, LXX, da Constituição Federal direcionado à defesa de direitos coletivos e individuais homogêneos, contra ato, omissão ou abuso de poder por parte de autoridade. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária; ou b) por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial. Anote-se que a exigência de um ano de constituição e funcionamento destina- se apenas às associações, não se aplicando às entidades sindicais e entidades de classe. 23 STF, Súmula 512: “Não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança.” 24 RE 231.509 AgR-AgR/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.10.2009; RE 231.671 AgR-AgR/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 28.04.2009; MS 24.584 AgR/DF, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, 09.08.2007. No mandado de segurança coletivo, o interesse invocado pertence a uma categoria, agindo o impetrante – partido político, organização sindical, entidade de classe ou associação – como substituto processual na relação jurídica. Com efeito, a legitimação das entidades acima enumeradas, para a segurança coletiva, é extraordinária, ocorrendo, em tal caso, substituição processual. Não se exige, por isso, a autorização expressa dos titulares do direito,25 diferentemente do que ocorre no caso do inciso XXI do art. 5.º da Carta Política, que contempla caso de representação (e não de substituição). Assim, se uma associação pleitear judicialmente determinado direito em favor de seus associados por outra via que não seja a do mandado de segurança coletivo, será necessária a autorização expressa, prescrita no art. 5.º, XXI, da Constituição (caso de representação). Entretanto, na hipótese de esse mesmo direito vir a ser defendido pela associação por meio do mandado de segurança coletivo, não haverá necessidade da autorização expressa dos associados (caso de substituição). Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo podem ser: I – coletivos, assim entendidos os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica; II – individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante. Os partidos políticos podem defender, mediante mandado de segurança coletivo, direitos relativos a seus integrantes ou direitos relacionados à finalidade partidária; a legitimação das demais entidades é mais restrita, uma vez que elas só podem defender direitos dos seus membros ou associados – e desde que esses direitos sejam pertinentes às finalidades da entidade (exigência esta introduzida pela lei, não expressa no texto constitucional). É importante frisar que os direitos defendidos por organização sindical, entidade de classe ou associação não precisa ser um direito de todos os seus membros; pode ser um direito de apenas parte dos membros da entidade26 Assim, o sindicato dos Delegados de Polícia Federal, que congrega servidores ativos e inativos, poderá ajuizar um mandado de segurança coletivo na defesa de interesse exclusivo dos Delegados inativos (parte da categoria, portanto). 25 STF, Súmula 629: “A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes.” 26 STF, Súmula 630: “A entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria.” No caso de mandado de segurança coletivo impetrado contra autoridade vinculada a pessoa jurídica de direito público, a liminar só poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas horas. Por fim, vale observar que o mandado de segurança coletivo não é sucedâneo da ação popular.27 Com efeito, o mandado de segurança coletivo deve defender direito subjetivo, líquido e certo, que, embora seja tutelado coletivamente, é de titularidade definida – o direito tutelado, seja um direito coletivo, seja um direito individual homogêneo, é de titularidade dos substituídos processuais, significa dizer, das pessoas determinadas cujos interesses o autor da ação, na qualidade de substituto processual, está defendendo. A ação popular, diversamente, visa a anular ato administrativo lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural, independentemente de o ato impugnado ocasionar lesão direta a quem quer que seja. Os direitos defendidos mediante ação popular pertencem, em regra, a titulares indeterminados, isto é, são direitos difusos, os quais não foram contemplados na Lei 12.016/2009 para tutela mediante mandado de segurança coletivo. 8) No item 4.47 foi acrescentado o parágrafo abaixo, em azul: 4.47. Habeas data .......... Portanto, o habeas data poderá ser impetrado: a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação desses dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo; c) para a anotação nos assentamentos do interessado, de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro, mas justificável e que esteja sob pendência judicial ou amigável. É relevante anotar que, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o habeas data não é instrumento jurídico adequado para pleitear o acesso a autos de processos administrativos.28 Ademais, o direito a receber dos órgãos públicos informações de interesse 27 STF, Súmula 101: “O mandado de segurança não substitui a ação popular.” 28 HD 90/DF, rel. Min. Ellen Gracie, Pleno, unânime, 18.02.2010. próprio, em sede de habeas data, não se reveste de caráter absoluto, cedendo passo quanto aos dados protegidos por sigilo, em prol da segurança da sociedade e do Estado. ........... 9) No item 5.1, a redação do art. 6º da Constituição Federal passou a ser esta, abaixo transcrita: 5. DIREITOS SOCIAIS 5.1. Noções Estabelece o art. 6.º da Constituição Federal: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.29 ..................... CAPÍTULO 4 1) O item 6.3. passou a ter a seguinte redação (reprodução da parte do item que contém as alterações): 6.3. Municípios ................. O município reger-se-á por Lei Orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da câmara municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal, na Constituição do respectivo estado e os seguintes preceitos (CF, art. 29): a) eleição do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos vereadores, para mandato de quatro anos, mediante pleito direto e simultâneo realizado em todo o País; b) eleição do Prefeito e do Vice-Prefeito realizada no primeiro domingo 29 Redação dada pela EC nº 64/2010. de outubro do ano anterior ao término do mandato dos que devam suceder, aplicadas as regras para eleição do Presidente da República, no caso de municípios com mais de duzentos mil eleitores; c) posse do Prefeito e do Vice-Prefeito no dia 1.º de janeiro do ano subseqüente ao da eleição; d) perderá o mandato o Prefeito que assumir outro cargo ou função na Administração Pública Direta ou Indireta, ressalvada a posse em virtude de concurso público, hipótese em que será afastado do seu cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração, mantendo-se a contagem do tempo de serviço para todos os efeitos legais, exceto para promoção por merecimento (CF, art. 29, XIV); e) os subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos secretários municipais devem ser fixados por lei de iniciativa da câmara municipal; f) o total da despesa com a remuneração dos vereadores não poderá ultrapassar o montante de cinco por cento (5%) da receita do município; g) inviolabilidade dos vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do município; h) as proibições e incompatibilidades, no exercício da vereança, devem ser similares, no que couber, ao disposto na Constituição Federal para os membros do Congresso Nacional e na Constituição do respectivo estado para os membros da assembléia legislativa; i) organização das funções legislativas e fiscalizadoras da câmara municipal; j) cooperação das associações representativas no planejamento municipal; k) deve ser prevista iniciativa popular de projetos de lei de interesse específico do município, da cidade ou de bairros, mediante manifestação de, pelo menos, cinco por cento do eleitorado. O subsídio dos vereadores será fixado pelas respectivas câmaras municipais em cada legislatura para a subsequente, observado o que dispõe a Constituição Federal, os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos, fixados como percentuais do subsídio dos deputados estaduais: Nº de habitantes do Município Subsídio máximo do Vereador (em % do subsídio dos deputados estaduais) Até 10.000 20% De 10.001 a 30% 50.000 50.001 a 100.000 40% 100.001 a 300.000 50% 300.001 a 500.000 60% Acima de 500.000 75% A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus vereadores. A EC 58/2009 deu nova redação ao inciso IV do art. 29 da Constituição Federal, aumentando o número de vereadores por municipalidade, mediante a criação de vinte e quatro novos limites máximos para a composição das Câmaras Municipais. De acordo com o novo regramento constitucional, passaram a ser os seguintes os limites máximos para a composição das Câmaras Municipais, considerada a população local: Nº de habitantes do Município Limite máximo de vereadores Até 15.000 9 De 15.001 a 30.000 11 De 30.001 a 50.000 13 De 50.001 a 80.000 15 De 80.001 a 120.000 17 De 120.001 a 160.000 19 De 160.001 a 300.000 21 De 300.001 a 450.000 23 De 450.001 a 600.000 25 De 600.001 a 750.000 27 De 750.001 a 900.000 29 De 900.001 a 1.050.000 31 De 1.050.001 a 1.200.000 33 De 1.200.001 a 1.350.000 35 De 1.350.001 a 1.500.000 37 De 1.500.001 a 1.800.000 39 De 1.800.001 a 2.400.000 41 De 2.400.001 a 3.000.000 43 De 3.000.001 a 4.000.000 45 De 4.000.001 a 5.000.000 47 De 5.000.001 a 6.000.000 49 De 6.000.001 a 7.000.000 51 De 7.000.001 a 8.000.000 53 Mais de 8.000.000 55 A referida EC 58/2009 determinou, também, a incidência retroativa desses novos limites, dispondo que eles seriam aplicáveis a partir do processo eleitoral de 2008, a fim de que fossem refeitos os cálculos relativos ao quociente eleitoral das eleições realizadas em 2008, para a posse dos vereadores suplentes. Entretanto, essa determinação – esdrúxula e oportunista – de aplicação retroativa desses novos limites máximos de vereadores às eleições realizadas em 2008 foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, mediante a concessão de medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade.30 Importante destacar que, ao determinar a suspensão da eficácia do inciso I do art. 3º da referida emenda, que determinava a aplicação retroativa de tais novos limites às eleições ocorridas em 2008, o Supremo Tribunal Federal concedeu, expressamente, efeitos retroativos (ex tunc) à sua decisão, para o fim de invalidar as posses de vereadores suplentes já ocorridas até a respectiva data. Essa mesma EC 58/2009 deu, também, nova redação ao art. 29-A da Constituição Federal, fixando novos percentuais máximos do total de despesas para as Câmaras Municipais, válidos a partir de 1º de janeiro de 2010. Desse modo, a partir de 1º de janeiro de 2010, o total da despesa do Poder Legislativo municipal, incluídos os subsídios dos vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências constitucionais tributárias, efetivamente realizado no exercício anterior: Nº de habitantes Percentual máximo de despesa Até 100.000 7% De 100.001 a 300.000 6% De 300.001 a 500.000 5% De 500.001 a 3.000.000 4,5% De 3.000.001 a 8.000.000 4% Acima de 8.000.001 3,5% Estabelece a Constituição Federal que o Prefeito será julgado perante o Tribunal de Justiça (CF, art. 29, X). Entretanto, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a competência do Tribunal de Justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da justiça comum estadual. Nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau (Súmula 702). 30 ADI 4.307 e ADI 4.310, rel. Min. Cármen Lúcia Antunes Rocha, 11.11.2009. ...................... CAPÍTULO 6 1) A parte final do item 4 passou a ter a seguinte redação: 4. NORMAS CONSTITUCIONAIS SOBRE INGRESSO NO SERVIÇO PÚBLICO ............. O inciso IX do art. 37 da CF/88 prevê uma outra forma de admissão de pessoal pela Administração Pública, diversa do preenchimento de cargos efetivos e empregos públicos mediante concurso público, e diversa da nomeação para cargos em comissão. Trata-se da contratação por tempo determinado, para atender necessidade temporária de excepcional interesse público. O pessoal admitido com base no inciso IX do art. 37 do Texto Magno não ocupa cargo público. Eles não estão sujeitos ao regime estatutário a que se submetem os servidores públicos titulares de cargos efetivos e os servidores públicos ocupantes de cargos em comissão. Embora os agentes públicos temporários tenham um contrato com o Poder Público, não se trata do “contrato de trabalho” propriamente dito, previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Aliás, o pessoal temporário da administração pública, em qualquer esfera da Federação, somente se sujeita à CLT nos termos em que determine a lei específica que os reja – caso tal lei o faça. De toda sorte, frise-se, o regime jurídico dos agentes públicos contratados por tempo determinado não é trabalhista, isto é, não são eles empregados celetistas, mas sim agentes públicos estatutários, embora tenham o seu próprio estatuto de regência (isto é, a lei que determina o seu regime jurídico), diferente do estatuto que regula as relações entre a administração pública e os servidores públicos titulares de cargos efetivos e comissionados. Podemos dizer que os agentes públicos contratados por tempo determinado exercem função pública remunerada temporária, tendo o seu vínculo funcional com a administração pública caráter jurídico-administrativo, e não trabalhista. Eles não têm um “contrato de trabalho” em sentido próprio; o contrato que firmam com a administração é um contrato de direito público, que não descaracteriza a sua condição de agentes públicos estatutários. O regime de previdência social a que estão sujeitos os agentes públicos contratados por tempo determinado é o regime geral (RGPS), aplicável a todos os trabalhadores civis, com exceção dos ocupantes de cargos públicos efetivos. É relevante registrar que o Supremo Tribunal Federal, em inúmeros julgados, envolvendo diversos entes federados, firmou a orientação de que as lides entre o Poder Público contratante e os agentes públicos temporários contratados com base no inciso IX do art. 37 da Constituição da República não são da competência da Justiça do Trabalho, e sim da Justiça Comum, federal ou estadual (ou do Distrito Federal), conforme o caso.31 Por outras palavras, os agentes públicos temporários federais, quanto às causas relacionadas à sua relação funcional com a administração pública federal, têm foro na Justiça Federal; os agentes públicos temporários estaduais, municipais ou distritais, quanto às lides atinentes à sua relação funcional com a administração pública do respectivo ente federado, têm foro na Justiça Estadual (ou do Distrito Federal). Na esfera federal, a contratação por prazo determinado encontra-se disciplinada na Lei 8.745/1993, bastante alterada por diversas leis posteriores. O âmbito de aplicação dessa lei restringe-se aos órgãos da administração direta federal, às autarquias e às fundações públicas federais. A contratação temporária na esfera federal não é feita mediante concurso público, mas sim por meio de processo seletivo simplificado sujeito a ampla divulgação, inclusive no Diário Oficial da União. É dispensado processo seletivo na hipótese de contratação para atender às necessidades decorrentes de calamidade pública e de emergência ambiental. Em alguns casos, como no de contratação de professor e pesquisador visitante estrangeiro, a Lei 8.745/1993 permite a seleção baseada somente em análise de currículo que demonstre notória capacidade técnica ou científica do profissional. Em diversos julgados, o Supremo Tribunal Federal tem afirmado que o inciso IX do art. 37 da Constituição deve ser interpretado restritivamente, porque configura exceção à regra geral que estabelece o concurso público como o meio idôneo à admissão de pessoal no serviço público, verdadeiro corolário do princípio republicano.32 Conforme deixou assente em mais de uma oportunidade, a observância cumulativa de quatro requisitos é necessária para que se considere legítima essa contratação temporária, em todos os níveis da Federação, a saber: a) os casos excepcionais devem estar previstos em lei; b) o prazo de contratação deve ser predeterminado; c) a necessidade deve ser temporária; e d) o interesse público deve ser excepcional.33 2) O item 5.8. passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item): 31 Vide, entre outros, RE 573.202/AM, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 21.08.2008; CC 7.201/AM, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 29.10.2008; Rcl 4.489 AgR/PA, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 21.08.2008; Rcl 6.667/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 05.12.2008; Rcl 4.464/GO, rel. orig. Min. Carlos Britto, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 20.05.2009. 32 ADI 1500/ES, rel. Min. Carlos Velloso, 19.06.2002; ADI 890/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 11.09.2003. 33 ADI 2.229/ES, rel. Min. Carlos Velloso, 09.06.2004, unânime; ADI 3.210/PR, rel. Min. Carlos Velloso, 11.11.2004, unânime; ADI 3.430/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.08.2009, unânime; vide Informativo 555 do STF. 5.8. Direitos trabalhistas atribuídos pela Constituição aos servidores públicos O art. 39, § 3.º, da Constituição, alterado pela EC 19/1998, concede aos “servidores ocupantes de cargo público” (estatutários) os seguintes direitos trabalhistas, previstos no art. 7.º da Carta Política: a) salário mínimo; b) garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; c) décimo terceiro; d) remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; e) salário-família; f) duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais; g) repouso semanal remunerado; h) remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal; i) férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que a remuneração normal; j) licença à gestante; k) licença-paternidade; l) proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei; m) redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; n) proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. As principais alterações introduzidas ao § 3º do art. 39 pela EC 19/1998 foram: (i) a supressão da referência ao inciso IV do art. 7º, que trata da irredutibilidade do salário dos trabalhadores em geral, uma vez que já existe regra específica, no art. 37, XV, assecuratória da irredutibilidade dos vencimentos dos servidores públicos; (ii) a supressão da referência ao inciso XXIII do art. 7º, que garante aos trabalhadores em geral “adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei”. Portanto, para os servidores públicos não há um direito constitucionalmente assegurado a esses adicionais, muito embora não exista óbice a que o legislador de quaisquer dos entes federados os conceda; e (iii) autorização para que a lei estabeleça requisitos diferenciados de admissão aos cargos públicos, quando a natureza do cargo assim exija, isto é, quando haja razoabilidade para a discriminação. Seria exemplo a realização de concurso público para a contratação de servidora para ocupar o cargo de agente carcerária numa penitenciária de mulheres. Trata-se, essa ressalva, de uma suavização da regra citada no item “n” acima, vedatória do estabelecimento de diferenças nos critérios de admissão de servidores públicos. Evidentemente, diferenças puramente discriminatórias serão sempre inconstitucionais, sendo mesmo desnecessária regra que explicite essa obviedade. O item “a”, acima, merece um comentário. O Supremo Tribunal Federal já afirmou que a Constituição garante ao servidor público o direito ao salário mínimo, nacionalmente unificado, conforme assegurado aos trabalhadores da iniciativa privada (CF, art. 39, § 3º), mas que, para o fim de obediência ao postulado constitucional, há que se observar a remuneração do servidor, e não o seu vencimento básico. Vale dizer, não há necessidade de que o vencimento básico corresponda ao salário mínimo; basta que a remuneração do servidor (vencimento básico + vantagens pecuniárias permanentes) perfaça o valor do salário mínimo. Essa orientação está, hoje, sedimentada na Súmula Vinculante 16, cuja redação segue transcrita: “16 – Os artigos 7º, IV, e 39, § 3º (redação da EC 19/98), da Constituição, referem-se ao total da remuneração percebida pelo servidor público.” Assunto relacionado ao que acabamos de expor, a merecer breve análise, é abordado na Súmula Vinculante 15. É o seguinte o seu enunciado: “15 – O cálculo de gratificações e outras vantagens do servidor público não incide sobre o abono utilizado para se atingir o salário mínimo.” As situações que deram origem à Súmula Vinculante 15, em linhas gerais, podem ser assim descritas: determinados entes federados têm leis que garantem que, na hipótese de o vencimento básico de algum de seus cargos públicos ser inferior ao salário mínimo a que se refere o inciso IV do art. 7º da Constituição do Brasil, será devido um abono que complementará o valor desse vencimento básico, de tal forma que o somatório do abono com o vencimento básico seja igual ao valor do referido salário mínimo. Essas mesmas leis, usualmente, proíbem que gratificações e outras vantagens pecuniárias integrantes da remuneração total sejam calculadas sobre o valor desse somatório – “vencimento básico + abono”. Vale dizer, essas leis normalmente determinam que as gratificações e outras vantagens pecuniárias incidam unicamente sobre o valor do vencimento básico. Diversos servidores, então, ajuizaram ações questionando essa exclusão do abono no cálculo das gratificações e outras vantagens integrantes de suas remunerações totais, alegando que o abono, uma vez recebido, passaria a integrar o próprio vencimento básico e, por isso, não faria sentido calcular os adicionais sobre um valor que não mais existiria (o valor do vencimento básico sem o abono). Pois bem, o Supremo Tribunal Federal decidiu que seria inconstitucional a incidência das gratificações e outras vantagens pecuniárias sobre o valor representado pelo somatório “vencimento básico + abono”. Isso porque, sendo esse valor (“vencimento básico + abono”) igual ao do salário mínimo, a incidência dos adicionais sobre ele acarretaria, no fim das contas, vinculação do valor das gratificações e outras vantagens ao valor do salário mínimo (toda vez que o salário mínimo aumentasse, as gratificações e vantagens pecuniárias aumentariam também, automaticamente). Ocorre, porém, que qualquer vinculação de valores ao valor do salário mínimo é expressamente proibida pelo art. 7º, IV, da Carta Política. Em suma, o raciocínio desenvolvido pelo STF foi o seguinte: toda vez que o salário mínimo for reajustado, o valor do abono também será alterado, a fim de que o binômio “vencimento básico + abono” iguale o salário mínimo; assim sendo, se as gratificações e vantagens fossem calculadas sobre o valor do conjunto “vencimento básico + abono”, o reajuste do salário mínimo acarretaria, automaticamente, também, a alteração do valor das gratificações e vantagens. Por isso, conforme o literal entendimento do STF, “a incidência de gratificações e outras vantagens sobre o resultado da soma do vencimento com o abono – este utilizado para se atingir o salário mínimo – contraria o art. 7º, IV, da CF, por implicar vinculação nele vedada”. Anote-se que não existe, na esfera federal, previsão de “abono” destinado a complementar o vencimento básico, a fim de que este alcance o valor do salário mínimo. O vencimento básico de cargos federais, cumpre repetir, pode perfeitamente ser menor do que o salário mínimo; o que não pode ser menor do que o salário mínimo, em nenhum ente federado, é a remuneração do servidor público (vencimento básico + vantagens pecuniárias permanentes). CAPÍTULO 7 1) O item 7.4. passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item): 7.4. Desobrigação de testemunhar Estabelece a Constituição que os deputados e senadores não serão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações (art. 53, § 6.º). Como se vê, a norma constitucional não é impositiva, fixando, apenas, uma faculdade ao congressista, que poderá, se entender conveniente para o interesse público e para o bom desempenho de suas atribuições congressuais, ocultar as informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, bem assim sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações. Nada o impede, portanto, de abrir mão dessa prerrogativa constitucional e revelar tais informações. Essa prerrogativa não abrange a sua obrigação de testemunhar quando convocado na condição de cidadão comum, sobre fatos que nada tenham a ver com o exercício da atividade congressual, no interesse de instrução penal ou civil. Nessa hipótese, assim como qualquer do povo, terá o parlamentar o dever de testemunhar. Os congressistas dispõem, ainda, da prerrogativa processual de serem inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e a autoridade competente, quando arrolados como testemunhas ou quando ostentarem a condição de ofendidos (vítimas). Supremo Tribunal Federal tem reiterado, no entanto, que essa prerrogativa não se estende ao parlamentar quando indiciado em inquérito policial ou quando figurar como réu em processo penal. Assim, o congressista, na qualidade de indiciado ou réu, tem apenas, como qualquer outra pessoa, o direito à observância, por parte do Poder Público, das garantias individuais fundadas na cláusula do devido processo legal (due process of law), podendo, inclusive, invocar o privilégio constitucional contra a auto-incriminação, a fim de recusar-se a responder ao interrogatório policial ou judicial. Por fim, vale lembrar que, por força da imunidade processual de que dispõe (art. 53, § 2º), o membro do Congresso Nacional, quando ostentar a condição formal de indiciado ou de réu, não poderá sofrer condução coercitiva, ainda que determinada pelo Supremo Tribunal Federal, se deixar de atender à convocação para responder a interrogatório. 2) As partes inicial e final do item 8.1. passaram a ter a seguinte redação (reprodução dos trechos que contêm todas as alterações havidas no item): 8.1. Tribunal de Contas da União Os tribunais de contas são órgãos vinculados ao Poder Legislativo, que o auxiliam no exercício do controle externo da administração pública, sobretudo o controle financeiro. Não existe hierarquia entre as cortes de contas e o Poder Legislativo. Os tribunais de contas não praticam atos de natureza legislativa, mas tão- somente atos de fiscalização e controle, de natureza administrativa. Não obstante recebam a denominação de “tribunais”, as cortes de contas não exercem jurisdição, isto é, não dizem com definitividade o direito aplicável a um caso concreto litigioso; suas decisões não fazem “coisa julgada” em sentido próprio. Acerca da posição constitucional dos tribunais de contas no Brasil, merece transcrição, pela sua marcante clareza, este excerto da decisão proferida pelo Ministro Celso de Mello, em 01.07.2009, na ADIMC 4.190/RJ, da qual é relator (grifamos): “Cabe enfatizar, neste ponto, uma vez mais, na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que inexiste qualquer vínculo de subordinação institucional dos Tribunais de Contas ao respectivo Poder Legislativo, eis que esses órgãos que auxiliam o Congresso Nacional, as Assembléias Legislativas, a Câmara Legislativa do Distrito Federal e as Câmaras Municipais possuem, por expressa outorga constitucional, autonomia que lhes assegura o autogoverno, dispondo, ainda, os membros que os integram, de prerrogativas próprias, como os predicamentos inerentes à magistratura. Revela-se inteiramente falsa e completamente destituída de fundamento constitucional a idéia, de todo equivocada, de que os Tribunais de Contas seriam meros órgãos auxiliares do Poder Legislativo. Na realidade, os Tribunais de Contas ostentam posição eminente na estrutura constitucional brasileira, não se achando subordinados, por qualquer vínculo de ordem hierárquica, ao Poder Legislativo, de que não são órgãos delegatários nem organismos de mero assessoramento técnico.” O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, podendo exercer, no que couber, as atribuições administrativas do art. 96 da Constituição, outorgadas aos tribunais do Poder Judiciário. .................... Entretanto, o Tribunal de Contas da União – e, em decorrência da simetria, as demais Cortes de Contas – não dispõe de competência para determinar a quebra do sigilo bancário das pessoas submetidas ao seu controle. Com efeito, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, embora as atividades do Tribunal de Contas da União, por sua natureza – verificação de contas e até mesmo o julgamento das contas das pessoas enumeradas no artigo 71, II, da Constituição Federal –, justifiquem a eventual quebra de sigilo, não houve essa determinação na lei específica (Lei Complementar n.º 105/2001) que tratou do tema, não cabendo a interpretação extensiva, mormente porque há princípio constitucional que protege a intimidade e a vida privada (CF, art. 5º, X), no qual está inserida a garantia ao sigilo bancário.34 Não pode o Tribunal de Contas da União, tampouco, alterar determinações constantes de decisão judicial transitada em julgado, ainda que a decisão judicial implique a concessão de benefício a servidor ou a administrado e destoe daquilo que venha sendo decidido, em casos análogos, pelo Supremo Tribunal Federal.35 Assim é porque a autoridade da coisa julgada não pode ser contrastada por nenhuma decisão administrativa – e as decisões das cortes de contas têm natureza administrativa. Sentença judicial transitada em julgado, em matéria cível, só pode ser validamente desconstituída, se for o caso, mediante ação rescisória. É oportuno registrar que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante 3, acerca da abrangência do direito ao contraditório e ampla defesa nos processos que tramitam no TCU, cujo enunciado transcrevemos a seguir: 3 – Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão. A fim de assegurar efetividade ao desempenho de suas atribuições, dispõe a Constituição que as decisões do Tribunal de Contas da União de que resulte imputação de débito ou multa têm eficácia de título executivo, isto é, consubstanciam instrumento idôneo para instruir e subsidiar o processo de execução do devedor perante o Poder Judiciário (art. 71, § 3.º). Vale lembrar, ainda, que, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os Tribunais de Contas, no desempenho de suas atribuições, podem realizar o controle de constitucionalidade das leis,36 isto é, no exame de um processo submetido à sua apreciação, podem afastar a aplicação de uma lei ou ato normativo do Poder Público por entendê-lo inconstitucional (controle incidental). 34 MS 22.801, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 17.12.2007. 35 MS 28.150 MC/DF, rel. Min. Celso de Mello, 08.09.2009 (vide Informativo 561 do STF). 36 STF, Súmula 347: “O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público.” Essa declaração de inconstitucionalidade pelos Tribunais de Contas deverá ser proferida por maioria absoluta de seus membros, por força da cláusula “reserva de plenário”, estabelecida no art. 97 da Constituição Federal. Por fim, cabe ressaltar que, em atenção ao direito de resposta, proporcional ao agravo, e à inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas, cuja lesão enseja indenização por dano moral ou material (CF, art. 5º, V e X), o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que o Tribunal de Contas da União (TCU) não pode manter em sigilo a autoria de denúncia a ele apresentada contra administrador público.37 Com efeito, apontando como fundamento os incisos IV, V, X, XXXIII e XXXV do art. 5º da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da expressão "manter ou não o sigilo quanto ao objeto e à autoria da denúncia", constante do § 1º do art. 55 da Lei Orgânica do TCU (Lei 8.443/1992), bem como do disposto no Regimento Interno do TCU, no ponto em que estabelece a permanência do sigilo relativamente à autoria da denúncia. Considerou a nossa Corte Maior que a manutenção do sigilo por parte do Poder Público impediria o denunciado de adotar as providências asseguradas pela Constituição na defesa de sua imagem, inclusive a de buscar a tutela judicial, salientando, ainda, o fato de que apenas em hipóteses excepcionais é vedado o direito das pessoas ao recebimento de informações perante os órgãos públicos (art. 5º, XXXIII). CAPÍTULO 8 1) Foi acrescentado o parágrafo abaixo ao final do item 3.1.5: 3.1.5. Iniciativa dos tribunais do Poder Judiciário ............... Por fim, cabe destacar que, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a iniciativa legislativa, no que respeita à criação de sistema de conta única de depósitos judiciais e extrajudiciais, cabe ao Poder Judiciário, sendo 37 MS 24.405/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 3.12.2003. inconstitucional a deflagração do processo legislativo pelo chefe do Poder Executivo.38 2) Foi acrescentado ao item 3.2. o subitem abaixo, renumerando-se os subsequentes (reprodução integral do subitem): 3.2.4. Irrepetibilidade (relativa) de matéria rejeitada Estabelece o art. 67 da Constituição Federal o princípio da irrepetibilidade, na mesma sessão legislativa, de matéria rejeitada em projeto de lei, nos termos seguintes: “Art. 67. A matéria constante de projeto de lei rejeitado somente poderá constituir objeto de novo projeto, na mesma sessão legislativa, mediante proposta da maioria absoluta dos membros de qualquer das Casas do Congresso Nacional.” Anote-se que essa irrepetibilidade é relativa, haja vista que a matéria poderá constituir objeto de novo projeto, na mesma sessão legislativa, desde que ocorra solicitação de maioria absoluta dos membros de qualquer das Casas do Congresso Nacional. Não há, também, qualquer vedação à repetição da matéria em novo projeto de lei em sessão legislativa distinta daquela em que se deu a rejeição. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, essa regra aplica-se unicamente aos casos de novos projetos gerados no âmbito do Poder Legislativo, não limitando a iniciativa advinda de órgãos externos a este, por exemplo, do Presidente da República, dos tribunais do Poder Judiciário e do Ministério Público.39 Importante destacar, ainda de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que a regra do art. 67 da Constituição Federal – que prevê a irrepetibilidade (relativa) dos projetos rejeitados na mesma sessão legislativa – não impede o Presidente da República de submeter à apreciação do Congresso Nacional, reunido em convocação extraordinária, projeto de lei versando, total ou parcialmente, idêntica matéria que tenha sido objeto de medida provisória rejeitada pelo mesmo parlamento, em sessão legislativa anterior. No entanto, o Presidente da República não pode, sob pena de ofensa ao princípio da separação de poderes e de transgressão à integridade da ordem democrática, valer-se de medida provisória para disciplinar matéria que já tenha 38 ADI 3.458, rel. Min. Eros Grau, 21.02.2008 39 ADI 2.010-2/DF, rel. Min. Celso de Mello, 12.04.2002. sido objeto de projeto de lei anteriormente rejeitado na mesma sessão legislativa. 3) O item 7.2.5. passou a ter a seguinte redação em sua parte final: 7.2.5. Trancamento de pauta ................. Assim, se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação (não computados os períodos de recesso do Congresso Nacional), ocorrerá o trancamento de pauta, ficando sobrestadas todas as demais deliberações da Casa Legislativa, até que se ultime a votação da medida provisória. Esse instituto – trancamento da pauta das Casas Legislativas em decorrência de medida provisória não apreciado no prazo constitucional de quarenta e cinco dias –, combinado com o número elevado de medidas provisórias editadas pelo Presidente da República, ocasionou, nos últimos anos, uma considerável paralisia do Poder Legislativo brasileiro, que teve a pauta de suas Casas Legislativas trancada em percentual significativo do total de sessões. Em face dessa realidade, o constitucionalista Michel Temer, na qualidade de Presidente da Câmara dos Deputados, desenvolveu uma tese jurídica segundo a qual o trancamento de pauta em decorrência da não apreciação de medida provisória só implicaria o sobrestamento de matérias no âmbito das sessões ordinárias daquela Casa Legislativa, que ocorrem naquela Casa legislativa de terça a quinta-feira. O mencionado sobrestamento não impediria a apreciação, em sessões extraordinárias (que ocorrem de sexta à segunda-feira, ou nos períodos noturnos), daquelas matérias vedadas à espécie normativa medida provisória. Assim, em sessões extraordinárias, seria possível a apreciação de projetos de lei complementar, decreto legislativo, resoluções, emenda à Constituição, bem como todas as matérias vedadas à espécie normativa medida provisória, indicadas no § 1º do art. 62 da Constituição Federal. Em síntese, a tese jurídica desenvolvida por Michel Temer implica interpretar a expressão constitucional “ficando sobrestadas todas as demais deliberações” (art. 62, § 6º) como “ficando sobrestadas todas as demais deliberações no âmbito das sessões ordinárias, sem prejuízo da apreciação, em sessões extraordinárias, daquelas matérias que não podem ser disciplinadas por medida provisória”. Na prática, se perfilhado esse entendimento, o sobrestamento de pauta em razão da não apreciação de medida provisória alcançaria todas as deliberações no âmbito das sessões ordinárias, mas, em se tratando de sessões extraordinárias, apenas aquelas deliberações sobre matérias vedadas à medida provisória. Essa tese jurídica, advogada por Michel Temer, foi referendada, liminarmente, pelo Supremo Tribunal Federal.40 Com efeito, ao denegar a medida liminar em mandado de segurança impetrado por congressistas – impugnando a adoção da mencionada tese pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer –, o Ministro Celso de Mello deixou assente que a decisão de Temer “teria, aparentemente, a virtude de fazer instaurar, no âmbito da Câmara dos Deputados, verdadeira práxis libertadora do desempenho da função primária que, histórica e institucionalmente, sempre lhe pertenceu: a função de legislar”, encontrando-se “apoiada em estrita construção de ordem jurídica, cujos fundamentos repousam no postulado da separação de poderes”. CAPÍTULO 10 1) Foi acrescentado ao item 4. o subitem 4.1., abaixo reproduzido (reprodução integral do subitem): 4.1. Sucessão do Chefe do Executivo no caso de dupla vacância determinada pela Justiça Eleitoral Conforme visto no item precedente, dispõe o art. 81 da Constituição Federal que vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República far-se-á nova eleição, observando-se o seguinte: a) caso a vacância ocorra nos dois primeiros anos do mandato, a eleição será direta, noventa dias depois de aberta a última vaga; b) ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição (indireta) para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei. Por sua vez, o art. 224 do Código Eleitoral, ao regulamentar essa matéria, estabelece o seguinte: “Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.” 40 MS 27.931, rel. Ministro Celso de Mello, 27.03.2009. Por força desse dispositivo legal, temos que, nas eleições por ele especificadas, sempre que a nulidade determinada pela Justiça Eleitoral atingir a mais de metade dos votos, na respectiva circunscrição, será considerado prejudicado todo o pleito eleitoral, e convocada nova eleição. Acontece, porém, que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é firme no entendimento de que esse dispositivo legal só se aplica às hipóteses em que o governante cassado pela Justiça Eleitoral tenha sido eleito no primeiro turno.41 Isso porque, nesse caso, a decretação, pela Justiça Eleitoral, da nulidade dos votos do candidato vencedor já implica, por si, a nulidade de mais da metade dos votos válidos, satisfazendo, portanto, o requisito legal para a nulidade de todo o pleito eleitoral e realização de nova eleição, nos termos do transcrito art. 224 do Código Eleitoral. Em se tratando de cassação de mandato de candidato eleito no segundo turno, o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral é de que não se aplica esse mesmo regramento. Com efeito, nos termos do entendimento prevalente no TSE, os votos do candidato eleito no segundo turno, anulados por decisão judicial, são excluídos do universo dos votos válidos no primeiro turno. Em seguida, faz-se o novo cálculo e se apura se o segundo colocado obteve a maioria absoluta dos votos válidos no primeiro escrutínio. Em caso positivo, o segundo colocado deve ser proclamado eleito. Em caso negativo, deve-se proceder a um novo segundo turno com a participação dos dois candidatos mais votados no primeiro. 42 Assim, em se tratando de vacância da chefia do Poder Executivo determinada pela Justiça Eleitoral, temos o seguinte: a) se o governante houver sido eleito em primeiro turno, aplica-se o regramento do art. 224 do Código Eleitoral: far-se-á nova eleição, obedecendo-se às regras básicas previstas no art. 81 da Constituição Federal (isto é, a eleição será direta, caso a vacância ocorra nos dois primeiros anos do mandato; e indireta, pelo Poder Legislativo local, caso a vacância ocorra nos dois últimos anos do mandato); b) se o governante houver sido eleito em segundo turno, não se aplica o regramento do art. 224 do Código Eleitoral, observando-se o seguinte: os votos do candidato cassado são excluídos do universo dos votos válidos no primeiro turno; em seguida, faz-se o novo cálculo e se apura se o segundo colocado obteve a maioria absoluta dos votos válidos no primeiro escrutínio; em caso positivo, o 41 Acórdão 21.320, rel. Min. Luiz Carlos Madeira, 09.11.2004. 42 Consulta 1.657/PI, Rel. Min. Eliana Calmon, 19.12.2008. segundo colocado deve ser proclamado eleito; em caso negativo, deve-se proceder a um novo segundo turno com a participação dos dois candidatos mais votados no primeiro. Para ilustrar, vejamos, a seguir, algumas situações ocorridas em nosso país na sucessão de Governadores de Estado que tiveram seu mandado cassado pela Justiça Eleitoral. Nas eleições de 2006, para Governador do Estado do Maranhão (MA), o candidato Jackson Lago (PDT) foi eleito no segundo turno, na forma do art. 77, § 3º, da Constituição Federal. Em 2009, o seu mandato foi cassado pela Justiça Eleitoral, por abuso de poder político e econômico. Não houve nova eleição no Estado; no lugar de Jackson Lago, assumiu o mandato a segunda colocada nas eleições, Roseana Sarney (PMDB), proclamada eleita pela justiça eleitoral. Por quê? Ora, porque com a cassação de Jackson Lago, todos os votos por ele obtidos no primeiro turno das eleições foram excluídos do universo dos votos válidos e, depois disso, foram refeitos os cálculos, a fim de se verificar se Roseana Sarney obteria a maioria absoluta dos votos válidos no primeiro escrutínio (desconsiderados os votos de Jackson Lago, que foram excluídos, por nulidade). Como se apurou que, quando excluídos os votos (nulos) de Jackson Lago, Roseana Sarney alcançou a maioria absoluta dos votos válidos no primeiro turno, ela foi proclamada eleita pela justiça eleitoral. Vale registrar que, caso, com a exclusão dos votos de Jackson Lago do universo dos votos válidos do primeiro turno, a segunda colocada, Roseana Sarney, não tivesse obtido a maioria absoluta dos votos válidos, far-se-ia um novo segundo turno, com a participação dos dois candidatos mais votados no primeiro (isto é, haveria um novo segundo turno entre Roseana Sarney e o outro candidato mais votado no primeiro turno). Já no Estado de Tocantins (TO), nas mesmas eleições de 2006, o candidato Marcelo Miranda (PMDB) foi eleito Governador no primeiro turno, por ter obtido a maioria absoluta dos votos válidos, na forma do § 2º do art. 77 da Constituição Federal. Em 2009, o seu mandato foi cassado pela Justiça Eleitoral, por abuso de poder político. O candidato segundo colocado não assumiu o mandato; foi determinada pela Justiça Eleitoral a realização de eleição indireta, pela Assembleia Legislativa. Por quê? Porque, nesse caso, como o governador cassado havia sido eleito no primeiro turno, foi decretada a nulidade de todo o processo eleitoral, em razão da declaração da nulidade de mais da metade dos votos válidos (votos do governador cassado), com fundamento no art. 224 do Código Eleitoral, bem como determinada a realização de eleição indireta, pela Assembleia Legislativa, com fulcro no art. 81, § 1º, da Constituição Federal. Com efeito, foi realizada eleição indireta pela Assembleia Legislativa, sendo eleito o candidato Carlos Henrique Gaguim (PMDB), tendo em vista que a cassação ocorreu no penúltimo ano do mandato (se essa cassação pela Justiça Eleitoral houvesse ocorrido nos dois primeiros anos do mandato, far-se-ia eleição direta, na forma do caput do art. 81 da Constituição Federal). Ainda sobre esse assunto, no tocante ao procedimento para a realização de eleição indireta, pela Assembleia Legislativa, para escolha do Governador de Estado, entende o Supremo Tribunal Federal que “o Estado-membro dispõe de competência para disciplinar o processo de escolha, por sua Assembléia Legislativa, do Governador e do Vice-Governador do Estado, nas hipóteses em que se verificar a dupla vacância desses cargos nos últimos dois anos do período governamental”.43 Para o Tribunal, considerando que a Constituição Federal é silente a respeito, os estados-membros têm autonomia, inclusive, para estabelecer que a mencionada eleição indireta, pela Assembleia Legislativa, dar-se-á mediante votação aberta, e não secreta.44 Por fim, cabe registrar que, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, compete exclusivamente ao município legislar sobre a vocação sucessória dos cargos de prefeito e vice-prefeito, no caso de dupla vacância, tendo em vista sua competência constitucional para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I). Não pode a Constituição Estadual dispor sobre essa matéria, sob pena de ferir a autonomia desses entes locais, mitigando-lhes a capacidade de auto-organização e de autogoverno.45 CAPÍTULO 11 1) Foram acrescentados ao item 7 os parágrafos abaixo: 7. VEDAÇÕES ................... 43 ADI 1.057/BA, rel. Min. Celso de Mello, 20.04.2004. 44 ADI 4.298/TO, rel. Min. Cezar Peluso, 07.10.2009. 45 ADI 3.549/GO, rel. Min. Cármen Lúcia, 17.09.2007. Em relação ao exercício do magistério, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que é permitido aos juízes exercer mais de uma atividade de magistério, desde que compatíveis com o exercício da magistratura. Para o Tribunal, a Constituição Federal não impõe uma única atividade de magistério, mas sim o exercício desta função compatível com a de magistrado, para impedir que a acumulação autorizada prejudique, em termos de horas destinadas ao ensino, o exercício da magistratura.46 Ademais, entende a Corte Maior que não há vedação a que a atividade de magistério seja desempenhada pelos juízes no horário do expediente do juízo ou tribunal, “tendo em vista que o magistrado que eventualmente lecionar pelas manhãs, ou mesmo à tarde, certamente poderá compensar as suas atividades jurisdicionais de diversas outras maneiras, sem comprometimento quanto à prestação judicial”.47 Os magistrados não podem, porém, atuar na Justiça Desportiva, haja vista que a eles só é constitucionalmente permitida a acumulação da atividade judicante com o magistério (art. 95, parágrafo único, I).48 2) A parte inicial do item 9. passou a ter a redação abaixo: 9. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA A Emenda Constitucional n.º 45/2004 criou o Conselho Nacional de Justiça, órgão integrante da estrutura do Poder Judiciário, com sede na Capital Federal, com a incumbência de realizar o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: I – o Presidente do Supremo Tribunal Federal; II – um Ministro do Superior Tribunal de Justiça, indicado pelo respectivo tribunal; 46 ADI 3.126, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.02.2005. 47 ADI 3.508, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.06.2007. 48 MS 25.938, rel. Min. Cármen Lúcia, 24.04.2008. III – um Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, indicado pelo respectivo tribunal; IV – um desembargador de Tribunal de Justiça, indicado pelo Supremo Tribunal Federal; V – um juiz estadual, indicado pelo Supremo Tribunal Federal; VI – um juiz de Tribunal Regional Federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça; VII – um juiz federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça; VIII – um juiz de Tribunal Regional do Trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho; IX – um juiz do trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho; X – um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador-Geral da República; XI – um membro do Ministério Público estadual, escolhido pelo Procurador-Geral da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de cada instituição estadual; XII – dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; XIII – dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal. O Conselho Nacional de Justiça será presidido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal e, nas suas ausências ou impedimentos, pelo Vice-Presidente desse Tribunal (art. 103-B, § 1º).49 A EC 61/2009 afastou a submissão dos nomes do Presidente e do Vice- Presidente do Supremo Tribunal Federal à aprovação da maioria absoluta do Senado Federal como condição prévia para a nomeação para o Conselho, haja vista que eles, como ministros da Alta Corte, já foram anteriormente submetidos a essa aprovação legislativa, por ocasião de sua nomeação para este cargo, por força do art. 101, parágrafo único, da Constituição Federal. Os demais membros do Conselho Nacional de Justiça continuam sendo nomeados pelo presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 103-B, § 2º). 49 Redação dada pela EC nº 61/2009. A EC 61/2009 afastou, também, os limites de idade – mínimo e máximo – para os membros do Conselho Nacional de Justiça (anteriormente, esses limites eram de trinta e cinco e sessenta e cinco anos, respectivamente) e excluiu a vedação à distribuição de processos ao Presidente do Conselho.50 Note-se que, embora seja órgão integrante do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça possui membros alheios ao corpo da magistratura – representantes do Ministério Público, da advocacia e da sociedade, estes últimos indicados pelo Legislativo –, o que, segundo o entendimento do Supremo Tribunal Federal, “além de viabilizar a erradicação do corporativismo, estende uma ponte entre o Judiciário e a sociedade, permitindo a oxigenação da estrutura burocrática do Poder e a resposta a críticas severas”.51 O Ministro do Superior Tribunal de Justiça exercerá a função de Ministro- Corregedor e ficará excluído da distribuição de processos no Tribunal, competindo-lhe, além das atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura, as seguintes: ...................... 3) Foram acrescentados ao item 14 os parágrafos abaixo, em azul: 14. JUSTIÇA DO TRABALHO .............. Em relação ao inciso I do art. 114, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que a competência da Justiça do Trabalho não alcança o julgamento de ações entre o Poder Público e servidores públicos com vínculo estatutário, investidos em cargo efetivo ou em cargo em comissão, haja vista que o vínculo jurídico de natureza estatutária vigente entre servidores públicos e a administração é estranho ao conceito de relação de trabalho.52 Assim, as ações envolvendo servidores públicos federais regidos por regime estatutário, ou seja, pela Lei 8.112/1990, continuam sob a competência da Justiça Federal.53 Também entende o Supremo Tribunal Federal que, com fundamento no inciso II do art. 114 da Constituição, a Justiça do Trabalho é competente para processar 50 Anteriormente, o § 1º do art. 103-B vedava, expressamente, a distribuição de processos ao Presidente. 51 ADI 3.367/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 13.04.2005. 52 ADI 3.395, rel. Min. Cezar Peluso, 05.04.2006. 53 Por sua vez, as ações envolvendo servidores públicos estatutários estaduais e municipais e as respectivas Administrações Públicas também não são julgadas pela Justiça do Trabalho, mas sim pela Justiça comum estadual. e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada.54 No tocante ao inciso VI do art. 114, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que, após a promulgação da Emenda Constitucional n.º 45/2004, as ações de indenização, inclusive por dano moral, propostas por empregado contra empregador (ou ex-empregador), fundadas em acidente do trabalho, são da competência da Justiça do Trabalho, e não da Justiça comum estadual.55 Frise-se que o Tribunal Maior decidiu que, nessa hipótese – ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, movidas pelo empregado contra seu empregador – o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o advento da EC n.º 45/2004. A nova orientação alcançou os processos em trâmite pela Justiça comum estadual, desde que ainda não proferida sentença de mérito. Essas ações, cujo mérito ainda não fora apreciado, foram remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontravam, com total aproveitamento dos atos praticados até então. Diferentemente, as ações que tramitavam perante a Justiça comum dos estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC 45/2004 (publicada em 31.12.2004), lá continuaram até o trânsito em julgado e correspondente execução. Esse entendimento da Corte Máxima restou consolidado no enunciado da Súmula Vinculante 22, nestes termos: “22 – A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional nº 45/04.” Esclarecemos, porém, que esse entendimento – competência da Justiça do Trabalho – é restrito às ações propostas por empregado contra empregador (ou ex-empregador), visando à obtenção de indenização pelos danos oriundos de acidente de trabalho, não se aplicando às ações, ajuizadas contra o INSS, em que seja pleiteado benefício previdenciário decorrente de acidente do trabalho. Nestas – ações contra o INSS buscando o recebimento de benefício previdenciário decorrente de acidente de trabalho –, a competência é da Justiça comum estadual, por força da ressalva constante da parte final do art. 109, inciso I, da Constituição, que afasta a competência da Justiça Federal, não obstante ser o INSS uma autarquia federal. ................. 54 Súmula Vinculante 23: “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada.” 55 CC 7.204/MG, rel. Min. Carlos Britto, 29.06.2005. 4) O item 22 passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item, com todos os seus subitens): 22. PRECATÓRIOS JUDICIAIS O art. 100 da Constituição Federal estabelece a regra para o pagamento das dívidas das Fazendas Públicas decorrentes de decisões judiciais, submetendo-as ao regime dos precatórios, nos seguintes termos (redação dada pela EC 62/2009): “Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.” Para o cumprimento desse regime de pagamento, as entidades de direito público estão obrigadas a incluir nos seus respectivos orçamentos verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente (art. 100, § 5º). O regime dos precatórios estabelece um cronograma para o pagamento dos débitos das Fazendas Públicas decorrentes de sentenças judiciais, cronograma esse que pode, em síntese, ser assim entendido: conforme transitam em julgado ações judiciais reconhecedoras de débitos da Fazenda Pública, são expedidos precatórios, que são apresentados à Fazenda Pública, em ordem cronológica, para pagamento; anualmente, a Fazenda Pública tem a obrigação de fazer constar da sua lei orçamentária verba necessária ao pagamento de seus débitos, consignados nos precatórios judiciais apresentados até 1º de julho, que deverão ser quitados até 31 de dezembro do ano seguinte. 22.1. Exceção ao regime de precatórios O regime de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendas Públicas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado (art. 100, § 3º). Com efeito, trata-se de uma única hipótese em que deverá ser feito o pagamento direto pela Fazenda, sem seguir a sistemática de precatórios: obrigações de pequeno valor, definidas em lei de cada ente federado. Para esse fim, leis dos diferentes entes federados – União, estados, Distrito Federal e municípios – poderão fixar valores distintos, segundo suas capacidades econômicas, ou seja, as “obrigações de pequeno valor” sujeitas a pagamento direto, sem precatórios, poderão ter valores diferentes para cada ente federado, tendo em vista suas realidades econômicas específicas, desde que seja observado, por todos os entes federados, na fixação desse valor, um teto mínimo, equivalente ao valor do maior benefício do regime geral de previdência social – RGPS (CF, art. 100, § 4º). Se as leis dos respectivos entes federados que estabelecerão a definição de “obrigação de pequeno valor”, para o fim de pagamento direto de dívidas reconhecidas em sentença judicial transitada em julgado, não forem publicadas em até 180 dias, contados da data de publicação da EC 62/2009 (10.12.2009), será considerado em relação aos estados, Distrito Federal e municípios devedores, omissos nessa regulamentação, o valor de: quarenta salários-mínimos para os estados e o Distrito Federal e trinta salários-mínimos para os municípios (ADCT, art. 97, § 12). Entendemos que os entes da Federação têm liberdade para definir, em suas leis próprias, o valor de seus débitos de pequeno valor em patamar inferior a esses fixados pelo § 12 do art. 97 do ADCT. Entretanto, repita-se, essa autonomia do ente federativo deverá respeitar o limite mínimo estabelecido pelo art. 100, § 4º, da Constituição Federal, qual seja, o valor do maior benefício do regime geral de previdência social – RGPS. 22.2. Ordem de pagamento Conforme vimos, os débitos oriundos de sentenças judiciais, constantes de precatórios apresentados até 1º de julho, deverão ser pagos pela Fazenda Pública até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente (art. 100, § 5º). Segundo o regime de pagamento instituído pela EC 62/2009, a Fazenda Pública deverá efetuar o pagamento de seus débitos inscritos em precatórios observando-se a seguinte ordem: a) primeiro, os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para “obrigação de pequeno valor”, admitido o fracionamento para essa finalidade; b) segundo, os demais débitos de natureza alimentícia; c) por último, os débitos de natureza não alimentícia. Essas diferentes categorias de créditos – créditos dos idosos ou portadores de doença grave, créditos de natureza alimentícia e créditos de natureza não alimentícia – não concorrerão entre si; haverá concorrência somente dentro de cada categoria, em função da ordem cronológica de apresentação dos precatórios. Assim, em primeiro lugar, deverão ser pagos os créditos de natureza alimentícia dos idosos e portadores de doença grave até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para “obrigação de pequeno valor” (obedecida a ordem cronológica de sua apresentação), depois, os demais créditos de natureza alimentícia (obedecida a ordem cronológica de sua apresentação) e, por último, os demais créditos, de natureza não alimentícia (obedecida a ordem cronológica de sua apresentação). Em resumo, a sistemática prevista nos §§ 2º e 3º do art. 100 da Constituição resulta na formação de três “filas”, uma só de precatórios relativos a créditos de natureza alimentícia para os idosos e portadores de doença grave até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para “obrigação de pequeno valor”, uma dos demais créditos de natureza alimentícia e uma terceira, de precatórios relativos a créditos de natureza não alimentícia. Cada “fila” é organizada, separadamente, com base na ordem cronológica de apresentação dos respectivos precatórios. Em qualquer caso, os precatórios da primeira “fila” devem ser pagos antes dos da segunda, e estes antes dos da terceira. Para o fim de preferência no pagamento dos precatórios, consideram-se débitos de natureza alimentícia aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado (art. 100, § 1º). 22.3. Atualização monetária e juros A partir da promulgação da EC 62/2009, a atualização monetária de valores de requisitórios, após sua expedição, até o efetivo pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, e, para fins de compensação da mora, incidirão juros simples no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios (art. 100, § 12). Em resumo, o pagamento de débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, obedece à seguinte sistemática: a) se o pagamento for efetuado pela Fazenda Pública dentro do prazo constitucional, isto é, até o final do exercício seguinte, o crédito será atualizado monetariamente, pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, e não haverá incidência de juros; b) se houver atraso no pagamento, isto é, se o pagamento for efetuado em data posterior ao final do exercício seguinte, além da atualização monetária pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, o crédito será acrescido de juros simples no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de quaisquer outros juros compensatórios. Enfim, não são devidos juros moratórios no período compreendido entre a data de expedição e a do efetivo pagamento de precatório judicial, no prazo constitucionalmente estabelecido, à vista da não caracterização, na espécie, de inadimplemento por parte do Poder Público. Nessa situação, sendo o pagamento realizado dentro do prazo constitucionalmente previsto (até 31 de dezembro do ano seguinte), será devida apenas a atualização monetária. Só haverá incidência cumulativa de atualização monetária e juros de mora se o pagamento for realizado após o prazo constitucionalmente previsto, ou seja, após 31 de dezembro do exercício seguinte àquele em que se deu a inscrição do crédito. 22.4. Sequestro de valor As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu direito de precedência ou de não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da quantia respectiva (art. 100, § 6º). Anote-se que o art. 100 da Constituição Federal autoriza o sequestro de quantia necessária ao pagamento de créditos inscritos em precatórios em duas hipóteses: a) preterimento do direito de precedência; b) não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do débito. Nenhuma outra situação, por mais grave que seja, autoriza o sequestro de verbas públicas para o pagamento de precatórios, ressalvadas as hipóteses, de cunho transitório, previstas nos arts. 78 e 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT. Por fim, cabe anotar que, segundo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, quando dois precatórios judiciais têm como devedoras pessoas jurídicas de direito público distintas, ainda que no âmbito do mesmo ente federado (por exemplo, duas autarquias municipais, ou uma autarquia federal e a União), o pagamento de um desses precatórios, de data mais recente, antes do outro, de data mais antiga, não caracteriza quebra de precedência na ordem cronológica, para o fim de determinação do sequestro a que alude o § 6º do art. 100 da Constituição Federal.56 56 Rcl 3.138/CE, rel. Min. Joaquim Barbosa, 04.03.2009. 22.5. Decretação de intervenção Em situações de não pagamento de débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado constantes de precatórios judiciários devidamente inscritos poderá restar configurada a desobediência a ordem judicial, o que autorizará a decretação da intervenção federal, nos termos dos arts. 34, VI, e 36, II, da Constituição Federal. Entretanto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que a desobediência judicial a pagamento de precatório que autoriza a intervenção é somente a dolosa, intencional, sem justificativa razoável. Por outras palavras, em razão das inúmeras prestações sociais que a Constituição impõe aos diversos entes federados, muitos deles, sobretudo os estados- membros, enfrentam efetiva falta de recursos para atender a todas elas, honrar seus outros compromissos financeiros (folha de pagamento de pessoal, gastos com previdência de seus servidores inativos, investimentos em infraestrutura etc.) e, ainda, efetuar o pagamento das dívidas judiciais constantes de precatórios. Assim, se um estado-membro deixa de pagar os precatórios inscritos para não deixar de prestar serviços públicos essenciais à população, a ele impostos pelo ordenamento jurídico, não se pode dizer que haja uma desobediência deliberada, intencional, dolosa. Nesses casos, em que há uma justificativa razoável para o não pagamento dos precatórios, não se caracteriza a desobediência, tornando incabível cogitar intervenção federal no ente federado. O Presidente do Tribunal competente que, por ato comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatórios incorrerá em crime de responsabilidade e responderá, também, perante o Conselho Nacional de Justiça (art. 100, § 7º). 22.6. Vedação ao fracionamento Para evitar fraude à regra de que a única exceção ao sistema de precatórios são os pagamentos das “obrigações de pequeno valor”, definidas em lei, o § 8º do art. 100 proíbe a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução que pudesse acarretar o pagamento da dívida pela Fazenda, em parte, diretamente, fora do sistema de precatórios, e, em parte, mediante expedição de precatório. Imagine-se, por exemplo, que a lei de determinado ente federado estabeleça em R$ 10.000,00 as dívidas de “pequeno valor”, para efeito de pagamento direto, previsto no § 3.º do art. 100. O que a regra do § 8.º proíbe é que, por exemplo, uma pessoa obtivesse sentença transitada em julgado reconhecendo contra esse ente federado um crédito de R$ 24.000,00, e a execução desse valor fosse fracionada, de forma que R$ 10.000,00 fossem pagos diretamente, e se expedisse um precatório com o valor restante de R$ 14.000,00. Essa vedação ao fracionamento, porém, não alcança a hipótese de pagamento preferencial, sob o regime de precatórios, dos débitos de natureza alimentícia aos titulares que tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou que sejam portadores de doença grave, prevista no § 2º do art. 100 da Constituição Federal. Com efeito, nesse caso, poderá ocorrer o fracionamento do valor da execução, para o fim de efetuar-se o pagamento, em parte, com preferência sobre todos os demais débitos (até o triplo daquele fixado em lei, pelo respectivo ente federado, como “obrigação de pequeno valor), e o restante na ordem cronológica de apresentação do precatório. 22.7. Compensação de créditos No momento da expedição dos precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a título de compensação, valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos, ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial (art. 100, § 9º). Em face dessa determinação constitucional, temos que, por exemplo, se reconhecido em sentença judicial transitada em julgado crédito em favor de João no valor de R$ 100.000,00 em face da União, e João for devedor dessa Fazenda Pública federal (débitos de impostos federais, por exemplo) no valor de R$ 70.000,00, será obrigatória a efetivação da compensação de créditos, ou seja, dos R$ 100.000,00 deverá ser abatido o valor de R$ 70.000,00, expedindo-se o precatório no valor de R$ 30.000,00. Para o fim de efetivar a mencionada compensação de créditos, antes da expedição dos precatórios, o Tribunal solicitará à Fazenda Pública devedora, para resposta em até 30 (trinta) dias, sob pena de perda do direito de abatimento, informação sobre os eventuais débitos do credor originário (art. 100, § 10). Ficam convalidadas todas as compensações de precatórios com tributos vencidos até 31 de outubro de 2009 da entidade devedora, efetuadas na forma do disposto no § 2º do art. 78 do ADCT, realizadas antes da promulgação da EC 62/2009 (EC 62/2009, art. 6º). 22.8. Uso e cessão de valor consignado em precatório É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei da entidade federativa devedora, a entrega de créditos em precatórios para compra de imóveis públicos do respectivo ente federado (art. 100, § 11). O credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor (art. 100, § 13). Entretanto, caso seja efetivada a cessão, o cessionário não se beneficiará do recebimento preferencial dos débitos de natureza alimentícia a que se refere o § 2º do art. 100 da Constituição Federal (ordinariamente aplicável ao maior de sessenta anos ou portador de doença grave), tampouco do pagamento direto, sem sujeição ao regime de precatórios (na hipótese de a cessão referir-se a quantia que seria ordinariamente enquadrada como “obrigação de pequeno valor”). A cessão de precatórios somente produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao tribunal de origem e à entidade devedora (art. 100, § 14). Ficam convalidadas todas as cessões de precatórios efetuadas antes da promulgação da EC 62/2009, independentemente da concordância da entidade devedora (EC 62/2009, art. 5º). 22.9. Regras transitórias e matérias legadas ao legislador ordinário Sem prejuízo do regime de precatórios estabelecido pelo art. 100 da Constituição Federal, anteriormente explicado, lei complementar poderá estabelecer regime especial para pagamento de crédito de precatórios de estados, Distrito Federal e municípios, dispondo sobre vinculações à receita corrente líquida e forma e prazo de liquidação (art. 100, § 15). Até que seja editada essa lei complementar pelo Congresso Nacional, o art. 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT estabelece um detalhado regime para que os estados, o Distrito Federal e os municípios efetuem os pagamentos de seus precatórios vencidos até a data da publicação da EC 62/2009, afastando, em relação a esses pagamentos, a aplicação do disposto nos 2º, 3º, 9º, 10, 11, 12, 13 e 14 do art. 100 da Constituição Federal. A seu critério exclusivo e na forma de lei, a União poderá assumir débitos, oriundos de precatórios, de estados, Distrito Federal e municípios, refinanciando- os diretamente (art. 100, § 16). CAPÍTULO 12 1) A parte final do item 2.4. passou a ter a seguinte redação: 2.4. Funções do Ministério Público ...................... Quanto à competência para promover, privativamente, a ação penal pública, é relevante observar que o Supremo Tribunal Federal possui farta jurisprudência reconhecendo que essa atuação do Ministério Público não pressupõe a instauração prévia de inquérito policial, não depende de prévias investigações penais promovidas pela polícia judiciária. Por outras palavras, o Ministério Público, como titular privativo da ação penal pública (ressalvada a hipótese de cabimento da ação penal privada subsidiária da pública, em face de inércia indevida do Parquet – CF, art. 5.º, LIX), pode oferecer a denúncia diretamente, sem que tenha havido, previamente, inquérito policial, contanto que, desde logo, disponha de elementos mínimos de informação, seja evidente a materialidade do fato alegadamente delituoso e estejam presentes indícios de sua autoria.57 Muito se discute sobre o poder de investigação do Ministério Público, tendo em vista a reserva constitucional de competência à polícia judiciária para a apuração de infrações penais, exceto as militares (CF, art. 144, § 1º, IV e § 4º). Há, no Supremo Tribunal Federal, processo em andamento no qual se discute essa importante matéria, não tendo o Plenário daquele Tribunal, até esta data, firmado sua posição. Embora seja certo que o Pleno do STF ainda não tem posição firmada, é importante registrar que, na Segunda Turma dessa Corte, há entendimento incisivo pela legitimidade de exercício do poder de investigação pelo Ministério Público, conforme se constata, por exemplo, pela leitura da decisão exarada no HC 89837/DF, rel. Min. Celso de Mello, em 20.10.2009. De nossa parte, pensamos ser plena a legitimidade constitucional do Ministério Público para realizar investigações. Com efeito, entendemos que a Constituição Federal, ao conferir ao Ministério Público relevantes atribuições institucionais, dentre as quais a competência para exercer o controle externo da atividade policial (art. 129, VII), reconheceu a ele, também, a competência para realizar investigações, ainda que para isso tenha de instaurar procedimento investigatório próprio. A Constituição Federal determina que as funções do Ministério Público só podem ser exercidas por integrantes da carreira, que deverão residir na comarca da respectiva lotação, salvo autorização do chefe da instituição. Determina, também, que a distribuição de processos no Ministério Público será imediata.58 57 São exemplos, dentre muitos outros: RTJ 76/741, rel. Min. Cunha Peixoto; AI AgR 266.214/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence; HC 63.213/SP, rel. Min. Néri da Silveira; HC 77.770/SC, rel. Min. Néri da Silveira; RHC 62.300/RJ, rel. Min. Aldir Passarinho; RTJ 101/571, rel. Min. Moreira Alves; HC 80.405/SP, rel. Min. Celso de Mello. 58 CF, art. 129, §§ 2.º e 5.º. 2) Ao final do item 2.10. foi acrescentado o parágrafo abaixo: 2.10. Ministério Público junto aos tribunais de contas ............... Em consonância com esse entendimento – de que os Ministérios Públicos que atuam junto aos Tribunais de Contas constituem órgãos autônomos, organizados em carreiras próprias –, o STF firmou orientação de que membros de outras instituições (por exemplo, do Ministério Público comum, ou da Procuradoria da Fazenda) não podem exercer perante as Cortes de Contas a função daquele Ministério Público.59 3) O final do item 3. passou a ter a seguinte redação: 3. ADVOCACIA PÚBLICA ................ Aos procuradores dos estados e do Distrito Federal é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias. Conforme anteriormente exposto, o cargo de Advogado-Geral da União é de livre nomeação e exoneração pelo Presidente da República, cuja escolha poderá recair em profissional estranho à carreira da advocacia pública (art. 131, § 1º). Já a forma de nomeação do Procurador-Geral do Estado não foi prevista na Constituição Federal (art. 132). Em face desse silêncio, entende o Supremo Tribunal Federal que essa competência se insere no âmbito de autonomia de cada estado-membro, que poderá defini-la na Constituição estadual. Entretanto, ao disciplinar a matéria, o estado-membro não poderá subtrair do Governador a prerrogativa de nomear e exonerar, livremente, o Procurador-Geral do Estado.60 Especificamente no tocante à atuação dos advogados públicos, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que o fato de emitirem pareceres jurídicos que subsidiarão a tomada de decisão pelos administradores públicos não autoriza a sua responsabilização solidária com estes pela prática do ato administrativo, salvo na hipótese de erro grave, inescusável, ou de ato ou omissão praticado com culpa, em sentido amplo.61 Assim é porque, para a Corte Excelsa, o parecer da advocacia pública não é 59 ADI 328, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 02.02.2009. 60 ADI 2.682, rel. Min. Gilmar Mendes, 12.02.2009. 61 MS 24.073-3/DF, rel. Carlos Velloso, 06.11.2002. ato administrativo propriamente dito, mas sim ato de “administração consultiva”, que visa, tão somente, a informar, elucidar, sugerir providências administrativas a serem posteriormente adotadas mediante atos de administração ativa. Por exemplo, se um advogado público emite parecer favorável à contratação de certo serviço sem a realização de licitação pública, por entender que se trata de hipótese de inexigibilidade, não poderá ser ulteriormente responsabilizado solidariamente com o administrador pelo ato de contratação, salvo se ficar demonstrado que houve erro grave, inescusável, na emissão do parecer, ou ficar demonstrada atuação dolosa ou culposa do advogado público. Entende a Corte Suprema, também, que a multa pessoal a suposto litigante de má-fé não pode ser imposta a advogado de órgão público, mas apenas à entidade a que pertença o órgão que ele defende.62 4) A parte final do item 4. passou a ter a redação abaixo: 4. ADVOCACIA ...................... O Supremo Tribunal Federal reconheceu, ainda, o direito de os advogados terem acesso a provas já documentadas em autos de inquéritos policiais que envolvam seus clientes, inclusive os que tramitam em sigilo. Esse entendimento está consolidado no enunciado da Súmula Vinculante 14, nos termos seguintes: 14 – É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa. Por fim, cabe destacar que, em importantíssimo julgamento, o Supremo Tribunal Federal examinou a constitucionalidade de diversos dispositivos do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB (Lei 8.906/94). Devido à importância da matéria, apresentamos, abaixo, os dispositivos do Estatuto da OAB que tiveram a sua constitucionalidade questionada e as respectivas decisões firmadas pela nossa Corte Maior.63 “Art. 1º São atividades privativas de advocacia: 62 RCL 5.133, rel. Min. Cármen Lúcia, 20.05.2009. 63 ADIs 1.127 e 1.105, rel. Min. Marco Aurélio , 17.05.2006. I – a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais;” O Tribunal declarou a inconstitucionalidade da expressão “qualquer” contida nesse inciso I, sob o fundamento de que não se pode impedir o acesso da população aos juizados especiais, à Justiça trabalhista e na apresentação de habeas corpus e ações revisionais penais que não exigem a atuação de advogados, e que, ademais, não é absoluta a vedação ao legislador de dispensar a participação do advogado em determinadas causas, sujeita essa dispensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. “Art. 2º O advogado é indispensável à administração da justiça. .............. § 3º No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta lei.” Esse dispositivo teve a sua constitucionalidade confirmada pelo Supremo Tribunal Federal. “Art. 7º São direitos do advogado: .............. § 2º O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer.” O Tribunal declarou a inconstitucionalidade da expressão “ou desacato”, contida nesse dispositivo. Portanto, a imunidade de que gozam os advogados, no exercício de sua atividade, não mais alcança o crime de desacato. “Art. 7º São direitos do advogado: .............. II – ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca ou apreensão determinada por magistrado e acompanhada de representante da OAB;” O Tribunal declarou a constitucionalidade da expressão “e acompanhada do representante da OAB”, contida nesse inciso II do artigo 7º, do Estatuto da OAB. Os ministros deixaram assente, porém, que o juiz poderá comunicar a OAB para que seja designado representante para acompanhar o cumprimento de mandado de busca e apreensão em caráter confidencial para ser garantida a eficácia das diligências. “Art. 7º São direitos do advogado: IV – ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB;” O Tribunal declarou a constitucionalidade desse dispositivo, mantendo a necessidade de representante da OAB para a prisão em flagrante de advogado por motivo relacionado ao exercício da advocacia. Ressalvaram, porém, que se a OAB não enviar um representante em tempo hábil, mantém-se a validade da prisão em flagrante. “Art. 7º São direitos do advogado: .................. V – não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar;” O Tribunal declarou a inconstitucionalidade da expressão "assim reconhecidas pela OAB" constante desse dispositivo. Com isso, a OAB não dispõe mais da prerrogativa de atestar a natureza condigna das instalações e comodidades para o recolhimento dos advogados. “Art. 7º São direitos do advogado: ................ IX – sustentar oralmente as razões de qualquer recurso ou processo, nas sessões de julgamento, após o voto do relator, em instância judicial ou administrativa, pelo prazo de quinze minutos, salvo se prazo maior for concedido;” Esse inciso foi julgado inconstitucional pela Corte, ou seja, foi afastada a possibilidade de o advogado fazer sustentação oral após o voto do relator. “Art. 7º São direitos do advogado: ................... § 3º O advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da profissão, em caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste artigo.” Esse dispositivo foi julgado integralmente constitucional. Para o Tribunal, esse regramento legal é plenamente compatível com as normas em vigor, no que restringe a prisão em flagrante em caso de crime inafiançável e determina que, então, deve haver a comunicação prevista no inciso IV do artigo 7º à OAB e a lavratura do auto, presente representante da classe. “Art. 7º São direitos do advogado: ............... § 4º O Poder Judiciário e o Poder Executivo devem instalar, em todos os juizados, fóruns, tribunais, delegacias de polícia e presídios, salas especiais permanentes para os advogados, com uso e controle assegurados à OAB.” Nesse dispositivo, o Tribunal declarou a inconstitucionalidade da expressão “e controle”, ou seja, firmou o entendimento de que a OAB não deve controlar as salas especiais destinadas a advogados nos órgãos públicos. “Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades: .................. II – membros de órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas, dos juizados especiais, da justiça de paz, juízes classistas, bem como de todos os que exerçam função de julgamento em órgãos de deliberação coletiva da administração pública direta e indireta;” Nesse dispositivo, o Tribunal firmou entendimento de que a possibilidade de membros do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas, dos juizados especiais e da justiça de paz advogar é inconstitucional. Já os juízes eleitoriais – não togados – e seus suplentes podem advogar. “Art. 50. Para os fins desta lei, os Presidentes dos Conselhos da OAB e das Subseções podem requisitar cópias de peças de autos e documentos a qualquer tribunal, magistrado, cartório e órgão da Administração Pública direta, indireta e fundacional.” O Tribunal conferiu interpretação conforme a Constituição a esse dispositivo, a fim de firmar o entendimento de que os presidentes dos Conselhos da OAB e das Subseções, ao “requisitar” cópias de peças de autos e documentos a qualquer tribunal, deve motivar o pedido, desde que seja compatível com as finalidades da lei, além de se responsabilizar pelos custos da requisição, ressalvados os documentos cobertos por sigilo. 5) A parte final do item 5 passou a ter a seguinte redação: 5. DEFENSORIA PÚBLICA ..................... As Defensorias Públicas serão organizadas em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais (CF, art. 134, § 1.º). A Lei Complementar 132, de 07.10.2009, estabelece importantes disposições acerca da organização da Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios, além de prescrever normas gerais para sua organização nos estados- membros. Essa lei complementar estatui que a Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal Ainda segundo a nova lei, os defensores públicos da União passam a ser chamados defensores públicos federais e seu chefe, o defensor público geral federal, será nomeado pelo Presidente da República, dentre membros estáveis da carreira e maiores de 35 anos, escolhidos em lista tríplice formada pelo voto direto, secreto, plurinominal e obrigatório de seus membros, após aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado. A Emenda Constitucional 45/2004 trouxe regra de fortalecimento da autonomia das defensorias públicas estaduais, assegurando-lhes autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias.64 Essa ampliação da autonomia administrativa e orçamentária, porém, só foi conferida às defensorias públicas estaduais, não alcançando a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e Territórios. Por fim, determina a Constituição que, assim como os servidores integrantes da carreira da advocacia pública (isto é, integrantes da Advocacia-Geral da União e dos órgãos a ela vinculados), os servidores das defensorias públicas serão remunerados na forma de subsídio (art. 135). CAPÍTULO 13 64 CF, art. 134, § 2.º, introduzido pela EC n.º 45/2004. 1) Foi acrescentado ao item 12.2. o subitem 12.2.10. (foram renumerados os demais), abaixo transcrito (reprodução integral do subitem): 12.2.10. Suspeição e impedimento de Ministro Não cabe arguição de suspeição65 nos processos do controle abstrato, tendo em vista a natureza objetiva das ações que o integram.66 Segundo o Supremo Tribunal Federal, as exceções de suspeição são típicas do processo subjetivo – aquele em que está em jogo interesse específico de pessoas ou grupos determinados. Não há, portanto, razão para cogitar o cabimento de exceção de suspeição nos processos que questionam abstratamente a constitucionalidade de normas, haja vista que nestes a Corte aprecia a legitimidade da norma em tese, sob o aspecto objetivo, no âmbito de um processo sem sujeitos, destinado pura e simplesmente à defesa da integridade do ordenamento constitucional. Porém, é possível a alegação de impedimento,67 nos casos em que o Ministro do Supremo Tribunal Federal tenha atuado anteriormente no processo na condição de Procurador-Geral da República, Advogado-Geral da União, requerente ou requerido. 65 CPC, art. 135: “Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando: I – amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes; II – alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu cônjuge ou de parentes destes, em linha reta ou na colateral até o terceiro grau; III – herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de alguma das partes; IV – receber dádivas antes ou depois de iniciado o processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou subministrar meios para atender às despesas do litígio; V – interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.” 66 AS 37, rel. Min. Gilmar Mendes, 06.03.2009. 67 CPC, art. 134: “É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário: I - de que for parte; II - em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha; III - que conheceu em primeiro grau de jurisdição, tendo-lhe proferido sentença ou decisão; IV - quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau; V - quando cônjuge, parente, consangüíneo ou afim, de alguma das partes, em linha reta ou, na colateral, até o terceiro grau; VI - quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa.” 2) O item 12.2.12 (renumerado), passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item): 12.2.12. Admissibilidade de amicus curiae Entidades e órgãos que não possuem legitimação para a propositura de ação direta de inconstitucionalidade poderão pedir ao relator da ação em curso perante o Supremo Tribunal Federal para manifestarem-se sobre a questão constitucional discutida. É o que dispõe o art. 7.º, § 2.º, da Lei n.º 9.868/1999, nos termos seguintes: § 2.º O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades. Esse dispositivo, consoante têm assinalado de modo homogêneo a doutrina e o próprio Supremo Tribunal Federal, introduziu entre nós a figura do amicus curiae (literalmente, “amigo da corte”). Trata-se da possibilidade de ser admitida no processo manifestação formal de órgãos ou entidades, que efetivamente representem interesses passíveis de serem afetados pelo resultado do julgamento da ADI. Embora haja alguma divergência acerca dos limites dessa participação, não há dúvida de que se trata de possibilidade de manifestação formal e que essa inclui, pelo menos, a juntada de documentos, pareceres, ou memoriais, auxiliando o Tribunal a vislumbrar aspectos técnicos ou concernentes aos eventuais reflexos da declaração da inconstitucionalidade da norma atacada. A instituição do amicus curiae, embora não chegue a conferir caráter contraditório ao processo, sem dúvida colabora para aumentar a participação de setores organizados da sociedade, tornando mais democrático e pluralista o controle abstrato em nosso País. Ademais, tendo em vista o fato de que tais processos, sendo objetivos, têm causa de pedir aberta (o STF, na apreciação do pedido, não está limitado aos fundamentos ou argumentos apresentados, devendo apreciar todos os aspectos que possam ser relevantes para a verificação da compatibilidade entre a norma impugnada e a Constituição), a participação do amicus curiae reveste patente importância por reduzir sobremaneira a possibilidade de o Tribunal Constitucional deixar de apreciar argumentos ou consequências relevantes que possam vir a modificar a posição que, sem eles, teria sido adotada. Além da apresentação de memoriais com informações e argumentos, o Supremo Tribunal Federal passou a admitir a possibilidade excepcional de sustentação oral pelo amicus curiae, afastando o entendimento de que sua manifestação somente poderia se dar por escrito.68 Atualmente, a manifestação do amicus curiae está disciplinada no Regimento Interno do STF, que admite a 68 ADI 2.675/PE, rel. Min. Carlos Velloso e ADI 2.777/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 26 e 27.11.2003. sustentação oral do interveniente pelo prazo máximo de quinze minutos, e, ainda, se houver litisconsortes não representados pelo mesmo advogado, pelo prazo contado em dobro.69 Quanto ao momento de admissão da intervenção do amicus curiae no processo, o Supremo Tribunal Federal entende que o ingresso do amigo da Corte deverá ocorrer até a entrada do processo em pauta de julgamento. Depois que é concluída a instrução, ouvida a Procuradoria Geral da República e encerrada a participação do relator, com o encaminhamento do processo para ser incluído em pauta, não cabe mais o ingresso de amigos da Corte.70 Entretanto, sua manifestação poderá ocorrer posteriormente à instrução, já na fase do julgamento, haja vista que o STF passou a aceitar, em casos determinados, a sustentação oral do amicus curiae durante a sessão de julgamento.71 Cabe ressaltar que os órgãos e entidades interessados não têm direito subjetivo à intervenção no processo de ação direta na qualidade de amicus curiae. Poderão eles solicitar a intervenção ao Ministro relator, mas cabe a este deferir (ou não) o pedido, em despacho irrecorrível, levando em conta a relevância da matéria e a representatividade dos requerentes. Ademais, segundo a jurisprudência do STF, a admissão de terceiros na qualidade de amicus curiae não lhes assegura o direito à interposição de recursos no respectivo processo de ação direta de inconstitucionalidade. Para o Tribunal, “não são cabíveis os recursos interpostos por terceiros estranhos à relação processual nos processos objetivos de controle de constitucionalidade, nesses incluídos os que ingressam no feito na qualidade de amicus curiae”.72 Portanto, os não legitimados intervenientes no processo de ação direta, na condição de amicus curiae, não poderão, por exemplo, interpor embargos de declaração em face da decisão definitiva de mérito prolatada pelo Supremo Tribunal Federal. O ingresso de órgãos e entidades não legitimados pelo art. 103 da Constituição Federal, na qualidade de amicus curiae, tem sido largamente admitida pelo Supremo Tribunal Federal nos processos de natureza abstrata, dada a sua natureza eminentemente objetiva. Ademais, o Tribunal já admitiu a intervenção de amicus curiae em recurso extraordinário, no âmbito do controle incidental. Segundo o Tribunal, a admissão de amicus curiae no controle incidental tem fundamento, especialmente, na Lei n.º 10.259/2001 (arts. 14, § 7.º, e 15), que autoriza, em recurso extraordinário, a manifestação de eventuais interessados, ainda que não sejam partes no 69 RISTF, art. 131, § 3.º. 70 ADI 4.071, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 22.04.2009. 71 ADI 2.548/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 18.10.2005. 72 ADI-ED 3.615/PB, rel. Min. Cármen Lúcia, 17.03.2008. processo.73 Cabe destacar, ainda, que o legislador ordinário passou a prever a possibilidade de manifestação de amicus curiae no exame da repercussão geral, requisito exigido para a interposição de recurso extraordinário, bem como no procedimento de aprovação de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal. Enfim, o processo normativo abstrato instaurado perante o Supremo Tribunal Federal não comporta a intervenção de terceiros, instituto processual disciplinado pelo Código de Processo Civil (CPC). Porém, admite a atuação de órgãos e entidades interessados na qualidade de amicus curiae, como colaborador informal da Corte, situação que não configura, tecnicamente, hipótese de intervenção de terceiros. 3) O item 12.2.13 (renumerado), passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item): 12.2.13. Atuação do Advogado-Geral da União Decorrido o prazo das informações, serão ouvidos, sucessivamente, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, que deverão manifestar-se, cada qual, no prazo de quinze dias. A atuação do Advogado-Geral da União está regulada pelo art. 103, § 3.º, da Constituição, que determina a sua citação quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, para que defenda o ato ou texto impugnado. O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento segundo o qual o Advogado- Geral da União, nesses processos, não atua na sua função ordinária, prevista no art. 131 da Constituição, como órgão de representação, consultoria e assessoramento da União. O parágrafo 3.º do art. 103 lhe dá uma competência especial: a defesa da constitucionalidade da norma que, em tese, é inquinada de inconstitucional, o que implica dizer que a Constituição lhe atribui o papel, nesses processos objetivos, de verdadeiro curador da presunção da constitucionalidade da lei atacada (defensor legis). Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal havia firmado entendimento de que o Advogado-Geral da União estava, sempre, obrigado a se manifestar em defesa do ato questionado, em razão da redação imperativa do texto constitucional, segundo o qual o Advogado-Geral da União “defenderá o ato ou texto impugnado” (CF, art. 103, § 3º). Essa posição do Supremo Tribunal Federal, reiteradamente criticada pela 73 RE 416.827/SC e RE 415.454/SC, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.09.2005. doutrina, terminava por obrigar o Advogado-Geral da União a defender a norma legal ou ato normativo impugnado, federal ou estadual, a todo preço, em qualquer caso e circunstância, mesmo que a inconstitucionalidade da norma seja irrefutável, salte aos olhos de forma gritante. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal alterou a sua jurisprudência sobre o papel a ser desempenhado pelo Advogado-Geral da União no controle abstrato de normas, passando a entender que este pode deixar de defender a constitucionalidade de norma questionada perante aquela Corte.74 Significa dizer que, de acordo com a novel jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o Advogado-Geral da União dispõe de plena autonomia para agir, e poderá escolher como se manifestará – pela constitucionalidade, ou não, da norma impugnada –, de acordo com sua convicção jurídica. Poderá ele, portanto, deixar de defender a constitucionalidade da norma impugnada, segundo, exclusivamente, seu entendimento jurídico sobre a matéria. O Supremo Tribunal Federal entende que a audiência do Advogado-Geral da União, prevista no citado art. 103, § 3.º, da Constituição, é necessária tão somente em sede de ação direta de inconstitucionalidade – ADI e arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF, o mesmo não ocorrendo na ação declaratória de constitucionalidade – ADC. Segundo o Tribunal, a desnecessidade da atuação do Advogado-Geral da União em ação declaratória de constitucionalidade justifica-se porque, nessa ação, não há ato ou texto impugnado, uma vez que o autor da ação pleiteia o reconhecimento da constitucionalidade da norma (e não de sua inconstitucionalidade). Não haveria, portanto, contraditório a ser assegurado, em razão da ausência de ato a ser defendido. Pelo mesmo fundamento – ausência de contraditório –, entendia o Supremo Tribunal Federal que não cabia a atuação do Advogado-Geral da União em sede de ação direta de inconstitucionalidade por omissão – ADO, porquanto nessa ação não há norma inquinada de inconstitucional (a ação é proposta, justamente, em face da ausência de norma regulamentadora de direito constitucional). Esse entendimento, porém, restou suplantado pela edição da Lei 12.063/2009, que acrescentou à Lei 9.868/1999 a disciplina do procedimento da ação direta de inconstitucionalidade por omissão perante o Supremo Tribunal Federal. Com efeito, essa lei estabelece que, em se tratando de ação direta por omissão, o relator poderá solicitar a manifestação do Advogado-Geral da União, que deverá ser encaminhada no prazo de 15 (quinze) dias. Cabe ao relator, portanto, a decisão de ouvir, ou não, o Advogado-Geral da União em ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Por fim, vale lembrar que o Advogado-Geral da União não é legitimado ativo para instaurar o controle abstrato, vale dizer, não dispõe de legitimidade para propor ao Supremo Tribunal Federal nenhuma das ações diretas existentes. 74 ADI 3.916, rel. Min. Eros Grau, 07.10.2009. 4) Foi acrescentado ao item 12.3. o subitem 12.3.5 (renumerados os demais), abaixo transcrito (reprodução integral do subitem): 12.3.5. Procedimento A petição deverá indicar a omissão inconstitucional, total ou parcial, quanto ao cumprimento de dever constitucional de legislar ou quanto à adoção de providência de índole administrativa, bem como o pedido, com suas especificações. A petição inicial inepta, não fundamentada, e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator, cabendo, contra essa decisão, agravo. Assim como as demais ações do controle abstrato perante o Supremo Tribunal, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão submete-se ao princípio da indisponibilidade, ou seja, uma vez proposta a ação, não se admitirá desistência. Proposta a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, os demais legitimados pelo art. 103 da Constituição Federal poderão manifestar-se, por escrito, sobre o objeto da ação e pedir a juntada de documentos reputados úteis para o exame da matéria, no prazo das informações, bem como apresentar memoriais. Nos demais aspectos, estabelece a lei que se aplicam ao procedimento da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, no que couber, as regras relativas ao procedimento da ação direta de inconstitucionalidade genérica (Lei 9.868/1999, art. 12-E, acrescentado pela Lei 12.063/2009). 5) Os itens 12.3.6., 12.3.7. e 12.3.8. (renumerados) passaram a ter a seguinte redação (reprodução integral): 12.3.6. Atuação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República Inicialmente, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal afastou a necessidade de citação do Advogado-Geral da União – AGU no processo de ação direta de inconstitucionalidade por omissão, uma vez que, nessa ação, não há norma legal impugnada, a ser defendida. Entretanto, suplantando essa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – segundo a qual o Advogado-Geral da União não seria ouvido nas ações direitas de inconstitucionalidade por omissão, para o fim do disposto no § 3º do art. 103 da Constituição Federal –, a Lei 9.868/1999, que disciplina o procedimento da ação direta de inconstitucionalidade por omissão perante o Supremo Tribunal Federal, passou a dispor que o relator poderá solicitar a manifestação do Advogado-Geral da União, que deverá ser encaminhada no prazo de 15 (quinze) dias (art. 12-F, acrescentado pela Lei 12.063/2009). Observa-se, assim, que a oitiva do Advogado-Geral da União em ação direta de inconstitucionalidade por omissão continua não sendo obrigatória, podendo o relator ouvi-lo, ou não. Já a manifestação do Procurador-Geral da República, nas ações diretas de inconstitucionalidade por omissão em que não for autor, é obrigatória. Com efeito, estabelece a mencionada lei que o Procurador-Geral da República, nas ações em que não for autor, terá vista do processo, por 15 (quinze) dias, após o decurso do prazo para informações (art. 12-E, § 3º, com a redação dada pela Lei 12.063/2009). Anote-se que a lei suprimiu do Procurador-Geral da República o direito de manifestação nas ações diretas de inconstitucionalidade por omissão que ele tenha proposto no uso da legitimação que a Constituição Federal lhe confere (art. 103, VI). 12.3.7. Concessão de medida cautelar A Lei 9.868/1999 estabelece que em caso de excepcional urgência e relevância da matéria, o Tribunal, por decisão da maioria absoluta de seus membros, desde que presentes à sessão de julgamento pelo menos oito ministros, poderá conceder medida cautelar, após a audiência dos órgãos ou autoridades responsáveis pela omissão inconstitucional, que deverão pronunciar-se no prazo de 5 (cinco) dias (art. 12-F, acrescentado pela Lei 12.063/2009). A medida cautelar poderá consistir na suspensão da aplicação da lei ou do ato normativo questionado, no caso de omissão parcial, bem como na suspensão de processos judiciais ou de procedimentos administrativos, ou ainda em outra providência a ser fixada pelo Tribunal. No julgamento do pedido de medida cautelar, será facultada sustentação oral aos representantes judiciais do requerente e das autoridades ou órgãos responsáveis pela omissão inconstitucional, na forma estabelecida no Regimento do Tribunal. Essa previsão legal para a concessão de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade por omissão, trazida pela Lei 12.063/2009, torna superada jurisprudência consagrada do Supremo Tribunal Federal, que entendia ser incabível tal medida em sede de ADO. 12.3.8. Efeitos da decisão de mérito Declarada a inconstitucionalidade por omissão, por decisão da maioria absoluta de seus membros, desde que presentes à sessão de julgamento pelo menos oito ministros, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias (Lei 9.868/1999, art. 12-H, acrescentado pela Lei 12.063/2009). Em caso de omissão imputável a órgão administrativo, as providências deverão ser adotadas no prazo de 30 (trinta) dias, ou em prazo razoável a ser estipulado excepcionalmente pelo Tribunal, tendo em vista as circunstâncias específicas do caso e o interesse público envolvido. É sobremaneira relevante destacar que essa natureza mandamental é percebida com maior intensidade em relação a órgão administrativo, para o qual deverá ser fixado o prazo de trinta dias para sanar a omissão, ou outro prazo razoável a ser estipulado excepcionalmente pelo Tribunal, tendo em vista as circunstâncias específicas do caso e o interesse público envolvido. Assim, se a omissão for de um dos Poderes do Estado não há que se falar em fixação de prazo para a edição da norma faltante. Porém, se a omissão for de um órgão administrativo (subordinado, sem função política, meramente executor de leis ou políticas públicas), será fixado um prazo de trinta dias, ou outro prazo razoável a ser estipulado excepcionalmente pelo Tribunal, para sua atuação visando a suprir a omissão inconstitucional. Nos demais aspectos, determina a lei que se aplicam à decisão da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, no que couber, as disposições referentes ao procedimento da ação direta de inconstitucionalidade genérica (ADI) e da ação declaratória de constitucionalidade (ADC), a seguir explicitados, com as adequações devidas (Lei 9.868/1999, art. 12-H, § 2º, acrescentado pela Lei 12.063/2009). Efetuado o julgamento, proclamar-se-á a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da omissão ou da norma impugnada, no caso de omissão parcial, se num ou noutro sentido se tiverem manifestado pelo menos seis Ministros. Se não for alcançada a maioria necessária à declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, estando ausentes Ministros em número que possa influir no julgamento, este será suspenso a fim de aguardar-se o comparecimento dos Ministros ausentes, até que se atinja o número necessário para prolação da decisão num ou noutro sentido. A decisão em ação direta de inconstitucionalidade por omissão é irrecorrível, ressalvada a interposição de embargos declaratórios, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória. Tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, modular os efeitos temporais de sua decisão em ação direta por omissão, restringindo os efeitos daquela declaração ou decidindo que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado (ex nunc) ou de outro momento que venha a ser fixado. As decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade por omissão têm eficácia contra todos (erga omnes) e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal. CAPÍTULO 15 1) A parte final do item 3.3. passou a ter a seguinte redação: 3.3. Taxas ................. Esse entendimento está, hoje, cristalizado na Súmula 670: 670 – O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa. Pelas mesmas razões, conquanto não haja súmula, o STF considera inconstitucional a instituição de taxa de limpeza pública e de conservação de vias e logradouros públicos.75 De outra parte, há tempo o Pretório Excelso assentou que os serviços públicos de coleta domiciliar de lixo, bem como de tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis determinados são específicos e divisíveis, possibilitando, portanto, a cobrança de taxas para sua remuneração. É necessário, entretanto, que a taxa a ser instituída para remunerar esses serviços públicos, que são específicos e divisíveis, não tenha por fato gerador, também, a prestação de outros serviços públicos, que sejam gerais e indivisíveis, tais quais a limpeza de ruas e logradouros públicos ou a remoção de lixo de ruas e logradouros públicos. Foi exatamente para explicitar esse ponto que o Supremo Tribunal Federal, editou a Súmula Vinculante 19, em cujo enunciado da consta que a usualmente denominada “taxa de lixo” deve ter por fato gerador exclusivamente serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, mas não, simultaneamente, outros que sejam gerais e indivisíveis, a exemplo dos serviços públicos de conservação e limpeza de logradouros e bens públicos (praças, calçadas, vias, ruas, bueiros). É o seguinte o texto da Súmula Vinculante 19: 75 RE 188.391/SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 15.06.2000. “19 – A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis não viola o art. 145, II, da CF.” Em alguns precedentes que deram origem à Súmula Vinculante 19, municípios haviam instituído taxas cujos fatos geradores eram, simultaneamente, a coleta domiciliar de lixo (o que seria legítimo) e a limpeza e conservação de logradouros públicos (o que é ilegítimo). Nessas situações, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a taxa era integralmente inconstitucional, porque era impossível separar a parcela legítima da parcela ilegítima de seu fato gerador (a parte inconstitucional do fato gerador “contaminou” a totalidade do tributo). Quanto ao conceito de utilização efetiva ou potencial, diz o CTN que os serviços públicos consideram-se utilizados pelo contribuinte: a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título; b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento. No uso potencial, o sujeito passivo será devedor mesmo que não utilize o serviço. Para isso, é imprescindível que exista lei estabelecendo que aquele serviço público é de utilização obrigatória (geralmente são os serviços relacionados à saúde pública, como a coleta domiciliar de lixo e o esgotamento sanitário). O § 2.º da Constituição, reproduzido no início deste tópico, estabelece que “as taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos”. Esse dispositivo consagra vetusta lição da doutrina, segundo a qual necessariamente deve haver um liame lógico entre a hipótese de incidência de um tributo e sua base de cálculo. Com efeito, a base de cálculo de um tributo é o padrão ou critério quantitativo que permite dimensionar financeiramente o fato econômico eleito pela lei como gerador da obrigação tributária. Teoricamente, a base de cálculo de uma taxa deve guardar relação com o custo da atividade estatal que ensejou a sua instituição, ou seja, o valor despendido com a prestação do serviço público ou com a atividade de polícia deve ser o parâmetro para a cobrança da taxa. Não existe, todavia, estrita correspondência entre os valores despendidos e os arrecadados. A base de cálculo da taxa deve, simplesmente, traduzir um critério de proporção: os elementos integrantes da base de cálculo devem levar à presunção de que a sua variação para mais ou para menos afeta o montante exigido da atividade estatal correspondente ao fato gerador da taxa. É muito importante registrar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está consagrada quanto à legitimidade de utilização de alguns elementos que integrem a base de cálculo de um determinado imposto pela lei que estabeleça a base de cálculo de uma taxa. Entende a Corte que só o que não pode é haver coincidência completa entre a base de cálculo da taxa e a de um determinado imposto. A matéria está cristalizada no enunciado da Súmula Vinculante 29, abaixo reproduzido: “29 – É constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra.” 2) Foram acrescentados ao item 4.4. os dois parágrafos abaixo: 4.4. Princípio da anterioridade do exercício financeiro ............... Também merece registro a orientação adotada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADIMC 4.016/PR, segundo a qual a lei que reduza ou extinga um desconto legalmente previsto para o pagamento de tributos em determinadas condições pode ter aplicação imediata, não cabendo alegar ofensa ao princípio da anterioridade.76 Por outras palavras, entende nossa Corte Excelsa que a redução de um desconto previsto, por exemplo, para o pagamento antecipado de um tributo não configura majoração desse tributo. Assim, supondo que determinada lei estadual previsse um desconto de quinze por cento no valor do IPVA devido, na hipótese de o contribuinte pagar antecipadamente o imposto, e outra lei, posterior, reduzisse esse desconto para dez por cento (ou mesmo extinguisse o desconto), a nova lei poderia ser exigida imediatamente, descabendo cogitar observância do princípio da anterioridade do exercício financeiro (tampouco da noventena estabelecida no art. 150, III, “c”, da Carta Política). ............... CAPÍTULO 17 1) Foi acrscentado ao item 1.1. o parágrafo abaixo: 1.1. Saúde (arts. 196 a 200) ......... Lei federal disporá sobre o regime jurídico, o piso salarial profissional nacional, as diretrizes para os planos de carreira e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias, competindo à 76 ADIMC 4.016/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 01.08.2008. União, nos termos da lei, prestar assistência financeira complementar aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios, para o cumprimento do referido piso salarial. (art. 198, § 5º, com a redação dada pela EC 63/2010). ........ 2) O item 2.3. passou a ter a seguinte redação (reprodução integral): 2.3. Deveres do Estado em relação ao ensino Estabelece o art. 208 da Constituição Federal que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria (redação dada pela EC 59/2009); II – progressiva universalização do ensino médio gratuito; III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; VII – atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde (redação dada pela EC 59/2009). A garantia de educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, bem como sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria (art. 208, I), deverá ser implementada progressivamente, até 2016, nos termos do plano nacional de educação, com apoio técnico e financeiro da União (EC 59/2009, art. 6º). O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. Assim, o não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente. 3) O item 2.8. passou a ter a seguinte redação (reprodução integral): 2.8. Plano nacional de educação A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: I – erradicação do analfabetismo; II – universalização do atendimento escolar; III – melhoria da qualidade do ensino; IV – formação para o trabalho; V – promoção humanística, científica e tecnológica do País; VI – estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto. 4) Ao item 7., depois da transcrição, foi acrescentado o parágrafo abaixo: 7. MEIO AMBIENTE (ART. 225) ............... Em respeito ao art. 225 da Constituição Federal – que assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado –, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade da legislação brasileira que proíbe a importação de pneus usados, tendo em conta que a incineração e o depósito de pneus velhos representa uma relevante ameaça ao meio ambiente. Conforme asseverou o Ministro Carlos Ayres Britto, os pneus usados importados para o País "não passam de um lixo ambiental que se exporta, fazendo do Brasil uma espécie de quintal do mundo".77 ............. FIM 77 ADPF 101, rel. Min. Cármen Lúcia, 24.06.2009.