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MMBBAA EEXXEECCUUTTIIVVOO EEMM NNEEGGÓÓCCIIOOSS FFIINNAANNCCEEIIRROOSS GESTÃO DE PESSOAS II Coordenador: Profa. Sandra Regina da Rocha Pinto Autores: Profa. Celisa Gonçalves Prof. Jorge Luiz Cunha da Rocha Prof. José Roberto Gomes Profa. Patricia Amélia Tomei Profa. Sandra Regina da Rocha Pinto Tutoria a Distância IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 2 ÍNDICE Cultura e Poder Na rganização – Tema 1 ................................................................9 1.1 Objetivos do Tema.............................................................................................9 1.2 Introdução..........................................................................................................9 1.3 O Significado do Poder ....................................................................................10 1.4 As Bases de Poder para os Indivíduos e para as Organizações .....................11 1.5 A Delegação de Poder (Empowerment) ..........................................................14 1.6 Relações de Poder nas Novas Configurações Organizacionais......................20 1.7 Administração da Mudança Organizacional: Mudança Reativa e Pró-Ativa ....36 1.8 Modelos do Processo de Mudança..................................................................42 1.9 A Reação Humana à Mudança: Causas de Resistência e o Grau de Resiliência .............................................................................................................44 Resumo do Tema ..................................................................................................50 1.10 Administração da Mudança Organizacional: Mudança Reativa e Pró-Ativa ..53 1.11 Modelos do Processo de Mudança................................................................54 1.12 A Reação Humana à Mudança: Causas de Resistência e o Grau de Resiliência .............................................................................................................54 Referências Bibliográficas .....................................................................................54 Desenvolvimento Gerencial – Tema 02 .................................................................59 2.1 Introdução........................................................................................................59 2.2 A Evolução dos Modelos Gerenciais ...............................................................60 2.2.1 Modelos de Gestão: Uma Perspectiva Evolutiva ......................................60 Os Quatro Modelos em um Único Arcabouço........................................................64 O Uso de Modelos Antagônicos ............................................................................66 Complexidade Comportamental e Eficácia dos Líderes Gerenciais ......................67 2.2.2 Como se Tornar um Gerente: A Necessidade de Novas Competências...67 Oito Papéis ............................................................................................................67 2.2.2.1 Modelo das Metas Racionais: Os Papéis de Diretor e Produtor .........68 2.2.2.2 Modelo dos Processos Internos: Os Papéis do Monitor e do Coordenador...................................................................................................69 2.2.2.3 Modelo das Relações Humanas: Os Papéis de Facilitador e de Mentor .......................................................................................................................69 2.2.2.4 Modelo dos Sist. Abertos: Os Papéis de Inovador e Negociador .......69 2.2.2.5 Os Oito Papéis em Diferentes Níveis Organizacionais.......................70 2.2.3 Organizando o Processo de Aprendizagem..............................................71 2.3 Empowerment: Uma Abordagem Crítica .........................................................72 2.3.1 Os Tipos de Comprometimento ................................................................73 2.3.2 Os Programas de Mudança Aumentam as Contradições Internas ...........77 2.3.3 As Resistências dos CEOs .......................................................................78 2.3.4 Os Empregados Questionam ....................................................................79 2.3.5 Os Agentes de Mudança Inibem o Empowerment ....................................81 2.3.6 Que Deve ser Feito? .................................................................................83 2.4 Considerações Finais...................................................................................85 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 3 Por fim, cabe lembrar que EMPOWERMENT é e não é...:....................................86 Referências Bibliográficas: ....................................................................................86 Gestão do Conhecimento - Tema 3 .......................................................................90 3.1. Introdução.......................................................................................................90 3.2. A Organização Pensada Com o Auxílio de Imagens ......................................91 3.3. A Imagem da Máquina e o Esforço de Construir Previsibilidade ....................92 3.4. A Imagem do Organismo e o Esforço de Construir Adaptabilidade................98 3.5. A Imagem do Cérebro e o Esforço de Produzir uma Organização Inteligente .............................................................................................................................102 3.5.1 Olhando com Mais Atenção Para Algumas Características do Cérebro .103 3.5.2 O Conceito de “Aprender A Aprender” ....................................................105 3.5.3. O Cérebro Visto como um Sistema Holográfico.....................................107 3.5.4. Síntese dos Princípios da Organização Cérebro ...................................110 3.6. A Comparação Entre as Três Imagens.........................................................110 3.7. A Organização Inteligente e Inovadora e a Gestão do Conhecimento .........111 3.8. E Como Construir uma Gestão do Conhecimento Organizacional Voltada Para a Inovação? .........................................................................................................115 3.9. A Gestão do Conhecimento como um Processo Contínuo e Coletivo ..........118 3.10. A Gestão Do Conhecimento Na Prática......................................................122 3.11. Considerações Finais .................................................................................130 3.12. Resumo do Capítulo ...................................................................................131 Referências:.........................................................................................................132 Aprendizagem Organizacional – Tema 4.............................................................135 Aprendizagem Organizacional.............................................................................135 4.1 Introdução......................................................................................................135 4.2 A Organização que Aprende (Learning Organization) ...................................136 4.3 As Condições para o Aprendizado em Grupo................................................143 4.4 As Condições do Aprendizado Individual.......................................................146 4.4.1 Aprender não é Simplesmente se Informar sobre Algo...........................147 4.4.2 Aprender não é Simplesmente Reproduzir Comportamentos .................148 4.4.3 As Principais Abordagens sobre o Processo de Aprendizagem .............148 4.4.3.1 A Abordagem Comportamental ........................................................149 4.4.3.2 A Abordagem Cognitivista ................................................................151 4.4.3.3. A Abordagem Eperimental...............................................................155 4.4.3.4 Os Estilos de Aprendizagem – A Tipologia de Kolb..........................157 4.5. Considerações Finais ...................................................................................160 Referências..........................................................................................................160 Gestão de Competência – Tema 5 .......................................................................166 5.1 Introdução......................................................................................................166 5.2 Que é Competência.......................................................................................167 5.3 Competência e Qualificação Profissional.......................................................170 5.4 Competências Organizacionais .....................................................................174 5.4.1. Identificar as Competências Essenciais .................................................177 5.4.2 Definição de uma Agenda de Aquisição de Competências Essenciais...178 5.4.3 Desenvolvimento de Novas Competências Essenciais...........................179 5.4.4 Proteção e Defesa da Liderança das Competências Essenciais ............179 5.5 Competências Funcionais..............................................................................180 5.6 Das Competências Organizacionais às Individuais .......................................182 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 4 5.6.1 Aprender a Pensar ..................................................................................183 5.6.2 Resolução de Problemas ........................................................................183 5.6.3 Criatividade .............................................................................................183 5.6.4 Aprender a Aprender...............................................................................184 5.7 Considerações Finais ....................................................................................184 Referências Bibliográficas: ..................................................................................188 Políticas de Remuneração Variável e sua Importância Estratégica – Tema 6 .192 Introdução............................................................................................................192 6.1 Formulação e Implementação de Políticas Salariais Coerentes com a Estratégica dos Negócios ....................................................................................192 6.1.1 Política Salarial .......................................................................................192 6.1.2 Elementos da Política Salarial.................................................................193 6.1.3 O Conteúdo de uma Política Salarial ......................................................194 6.1.4 Posicionamento Salarial..........................................................................194 6.2. Aspectos Metodológicos sobre Descrição, Análise e Avaliação de Cargos..195 6.2.1 Análise de Função e Descrição de Cargo ...............................................195 6.2.2 Metodologia.............................................................................................195 6.2.3 Áreas de Análise .....................................................................................197 6.2.4 Titulação dos Cargos ..............................................................................198 6.2.5 Descrição dos Cargos .............................................................................198 6.2.6 Principais Campos do Formulário de Descrição de Cargo......................200 6.2.7 Manual de Descrição de Cargos .............................................................200 6.2.8 Avaliação de Cargos ...............................................................................203 6.2.9 Quando é Necessário Avaliar?................................................................204 6.2.10 Avaliação de Cargos .............................................................................205 6.2.11 PROGRAMA DE SALÁRIOS E BENEFÍCIOS.......................................205 6.2.12 Práticas de Mercado .............................................................................205 6.2.13 Sistema de Remuneração Estratégica ..................................................206 Principais Modelos de Remuneração Variável Praticados no Mercado...............208 6.3 O Conceito de Remuneração Global .............................................................212 6.3.1 Sistema de Remuneração Global ...........................................................212 6.4. Pesquisa de Mercado ...................................................................................214 6.4.1 Pesquisa de Cargos, Salários e Benefícios ............................................214 6.4.2 Metodologia da Pesquisa ........................................................................214 6.4.3 Escolha dos Cargos ................................................................................214 6.4.4 Cargos-Chave e Cargos Diferenciados...................................................215 6.4.5 Escolha das Empresas Participantes ......................................................216 6.4.6 Painel de Empresas ................................................................................217 6.4.7 Planejamento da Pesquisa......................................................................217 6.4.8 Convite aos Participantes........................................................................217 6.4.9 Caderno de Coleta de Dados..................................................................217 6.5. CONCLUSÃO ...............................................................................................218 6.6. Bibliografia ....................................................................................................219 Avaliação de Potenciais e Desempenhos – Tema 7...........................................222 Objetivos:.............................................................................................................222 Introdução............................................................................................................222 7.1 Diferença entre Desempenho e Potencial .....................................................224 7.1.1 Que é Avaliação de Desempenho?.........................................................224 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 5 7.1.2 Que é Avaliação de Potencial? ...............................................................225 7.1.3 Para que Servem as Avaliações de Desempenho e Potencial? .............226 7.2 Variáveis para Identificação de Talentos .......................................................227 A - “HIGH-FLYERS”......................................................................................227 B - “MA NTENEDORES” ..............................................................................228 C - “TRAINEES” / RECÉM-PROMOVIDOS..................................................228 D - “PROBLEMA 1”.......................................................................................228 E - “PROBLEMA 2”.......................................................................................229 7.2.1 Indicadores de Alto Potencial ..................................................................229 7.3 Coleta de Informações para Avaliação de Desempenho e de Potencial .......231 7.4 Erros de Propensão.......................................................................................232 7.4.1 Razões para as Falhas nos Programas de Avaliação.............................234 7.5 Importância da Vinculação da Avaliação de Desempenho e Potencial com Planos de Carreira, Sistemas de Recompensas e Gestão da Eqüidade no Trabalho...............................................................................................................235 7.6 Disciplinando a Subjetividade das Avaliações de Desempenho....................236 7.6.1 Credibilidade e Críticas ...........................................................................237 7.6.2 Como Fazer o Gerenciamento do Desempenho de seu Subordinado....238 7.6.3 Como o Uso da Avaliação pode se Transformar em Fonte de Melhoria da Relação Líder x Equipe....................................................................................241 7.6.4 Conduzindo a Entrevista de Avaliação....................................................244 7.7 Conclusão......................................................................................................247 7.8 Referências Bibliográficas .............................................................................249 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 6 GESTÃO DE PESSOAS II EMENTA prendizagem nas organizações. Gestão do conhecimento. Políticas de remuneração variável e sua importância estratégica. Avaliação de poten- ciais e desempenhos. Gestão por competência. Poder e mudança organizacional. Desenvolvimento gerencial. CARGA HORÁRIA 30 horas. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO Tema Tema 1: 5 Horas Cultura e Poder na Organização Tema 2: 4 Horas Desenvolvimento Gerencial Tema 3: 4 Horas Gestão do Conhecimento Tema 4: 4 Horas Aprendizagem Organizacional Tema 5: 5 Horas Gestão de Competência Tema 6: 4 Horas Políticas de Remuneração Variável e sua Importância Estratégica Tema 7: 4 Horas Avaliação de Potências e Desempenho CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO Os alunos serão avaliados com base nos seguintes critérios: 40% avaliação a distância. 60% avaliação presencial. A MMBBAA EEXXEECCUUTTIIVVOO EEMM NNEEGGÓÓCCIIOOSS FFIINNAANNCCEEIIRROOSS CCUULLTTUURRAA EE PPOODDEERR NNAA OORRGGAANNIIZZAAÇÇÃÃOO TTEEMMAA 0011 Coordenador: Profa. Sandra Regina da Rocha Pinto Autor: Profa. Patricia Tomei Tutoria a Distância IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 8 ÍNDICE Cultura e Poder na Organização – Tema 1..............................................................9 1.1 Objetivos do Tema.............................................................................................9 1.2 Introdução..........................................................................................................9 1.3 O Significado do Poder ....................................................................................10 1.4 As Bases de Poder para os Indivíduos e para as Organizações .....................11 1.5 A Delegação de Poder (Empowerment) ..........................................................14 1.6 Relações de Poder nas Novas Configurações Organizacionais......................20 1.7 Administração da Mudança Organizacional: Mudança Reativa e Pró-Ativa ....36 1.8 Modelos do Processo de Mudança..................................................................42 1.9 A Reação Humana à Mudança: Causas de Resistência e o Grau de Resiliência .............................................................................................................44 Resumo do Tema ..................................................................................................50 1.10 Administração da Mudança Organizacional: Mudança Reativa e Pró-Ativa ..53 1.11 Modelos do Processo de Mudança................................................................54 1.12 A Reação Humana à Mudança: Causas de Resistência e o Grau de Resiliência .............................................................................................................54 Referências Bibliográficas .....................................................................................54 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 9 CULTURA E PODER NA ORGANIZAÇÃO – TEMA 1 1.1 OBJETIVOS DO TEMA ste tema retoma a questão do poder abordada em diferentes tópicos da disciplina Gestão de Pessoas I (liderança, comportamento de grupos, con- flitos, clima e cultura) com o objetivo de correlacioná-la à mudança organizacional. Para isto, apresenta-se uma discussão sobre: ! O significado do poder. ! As bases de poder para os indivíduos e para as organizações. ! A delegação de poder e a estrutura organizacional. ! Administração da mudança organizacional: mudança reativa e pró-ativa. Modelos do processo de mudança. ! A reação humana à mudança: causas de resistência e o grau de resiliên- cia. 1.2 INTRODUÇÃO Hoje as organizações estão no meio de um gigantesco furacão e por todo la- do estão sendo realizadas privatizações, fusões, aquisições, trocas de controle acio- nário, reestruturações internas, downsizings e revoluções tecnológicas que as obri- gam a desenvolver a sua capacidade de adaptação, agilidade e flexibilidade. A necessidade de mudança é uma realidade a qual a maioria dos empresá- rios está acostumada – a duras penas, diga-se de passagem. “A única constante é a mudança” é um clichê muito repetido nos locais de trabalho. Contudo, a velocidade e a freqüência das mudanças agora são muito maiores, exigindo que os profissionais que desejam se manter no mercado estejam conscientes de que as mudanças vie- ram para ficar, isto é, são estados permanentes do universo organizacional. Mesmo as empresas que, vistas de fora, parecem operar dentro de um ambiente estável, estão enfrentando mudanças. Dentro deste contexto, a organização deve oferecer ao empregado a oportu- nidade de desenvolver sua própria carreira, através do aumento do empowerment, do compartilhamento do conhecimento e informação, assim como aumentar a opor- tunidade de participação no processo decisório. Segurança no trabalho pertence ao passado e as organizações não estão mais em condições de prometê-la aos empregados. No mundo corporativo de hoje, a palavra de ordem é adaptabilidade, mais do que estabilidade. A questão da em- pregabilidade muda a noção de lealdade e representa uma mudança no contrato psicológico. Tanto a organização como os indivíduos ganham com essa mudança caso ela seja bem gerenciada. Para as organizações, as mudanças são implementadas mais facilmente e com maior flexibilidade, na medida em que os empregados efetivamen- E IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 10 te participem do processo e forneçam contribuições positivas para a organização. Para os empregados é a possibilidade de gerenciar sua própria carreira e garantir maior qualificação para lidar com as mudanças. Para que a relação indivíduo-organização cresça neste sentido é importante compreender melhor este novo paradigma organizacional. Para tanto, algumas questões precisam ser analisadas: Como as organiza- ções estão gerenciando estas mudanças? Qual é o papel do poder neste processo? Como os indivíduos estão reagindo às novas culturas impostas por esta nova reali- dade? A seguir serão abordadas estas questões da seguinte forma: inicialmente será definido poder e como ele se manifesta nas organizações. Posteriormente serão tra- tados o papel do indivíduo e a sua motivação para mudar e, dentro deste contexto, como implementar um processo de mudança. 1.3 O SIGNIFICADO DO PODER Segundo coloca Robbins (1998) baseado em Bass (1990) “poder refere-se a uma capacidade que A tem de influenciar o comportamento de B, de modo que B aja de acordo com os desejos de A”. A definição supra traz duas variáveis importantes na compreensão do poder: a potencialidade e a dependência. Poder é o potencial ou a habilidade de influenciar decisões e controlar recur- sos. O poder pode existir, mas não ser utilizado. Uma pessoa pode ter poder, mas não dispor dele. Poder é uma função de dependência. Quanto maior o meu grau de depen- dência de uma pessoa, maior poder ela tem sobre mim. Uma pessoa pode ter poder sobre você, se ela controla alguma coisa que você deseja. Conceito de poder está intimamente interligado ao conceito de liderança a- bordado na disciplina anterior. Líderes utilizam o poder como um meio para atingir as metas do grupo, e precisam manter esta compatibilidade entre as suas metas e as metas dos liderados. Por outro lado, o poder não exige compatibilidade de metas, apenas depen- dência. Uma pessoa é poderosa, por exemplo, quando possui qualquer coisa que os outros desejam, mas que ela sozinha controla. Este controle gera dependência e é inversamente proporcional às fontes alternativas de fornecimento, isto é, quanto me- nor a oferta, maior o grau de dependência e, portanto, maior o poder de quem pos- sui o recurso escasso. Isto pode ser traduzido no ditado popular: “em terra de cego quem tem um olho é rei!”. Portanto, a dependência é fruto de: ! Importância: se ninguém quer o que você tem, não haverá dependência. ! Escassez: a relação de oferta e demanda de um produto vai aumentar ou abaixar o seu valor no mercado. ! Insubstitutibilidade: quanto mais um recurso não tem substitutos viáveis, mais poder de controle destes recursos é fornecido. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 11 Por fim, o conceito de poder, não pode ser confundido com o conceito de in- fluência, já que os dois têm significados muito próximos. A influência é também a habilidade de mudar comportamentos, mas tende a ser mais sutil e mais indireta que o poder, já que ela não afeta tão diretamente os resultados e o processo de mudan- ça. 1.4 AS BASES DE PODER PARA OS INDIVÍDUOS E PARA AS ORGANIZA- ÇÕES Se administrar e liderar exige o uso do poder, então como as pessoas nas or- ganizações adquirem poder para influenciar o comportamento das outras? De onde vem o poder? O que determina a influência de um grupo sobre os outros? Em trabalho pioneiro, visando identificar diferentes tipos de poder nas organi- zações, John French e Bertram Raven procuraram responder a estas perguntas i- dentificando as principais bases, ou fontes, do poder nas organizações. Eles propu- seram que existem cinco bases de fontes de poder, conforme reproduzido no quadro abaixo: TIPOS DE PODER FONTE DE PODER DE RECOMPENSA Controle baseado em recompensas valoriza- das como: amizade, aceitação, elogios, dinhei- ro, avaliações de desempenho favoráveis, ta- refas de trabalho interessantes, informação importante, turnos de trabalho preferidos. É também chamado de poder premiador. COERCITIVO Controle baseado em punições como: repre- ensões públicas, designação para tarefas in- desejáveis, descontos no pagamento, suspen- sões, transferências inoportunas e demissões. Dependente de medo. Alguém reage a este poder por medo dos resultados negativos que possam ocorrer se falhar na concordância. É complementar ao poder de recompensa: o primeiro permite a você dar algo a alguém de valor positivo ou tirar algo de valor negativo. Este poder permite que você tire algo de valor positivo do outro ou inflija algo de valor negati- vo sobre ele. LEGÍTIMO O direito ou autoridade de dizer aos subordi- nados o que fazer. Representa o poder que uma pessoa recebe em resultado de sua posi- ção na hierarquia. Inclui a aceitação por mem- bros de uma organização da autoridade de uma posição. DE REFERÊNCIA Posse de características pessoais atraentes para outras pessoas. Sua base é a identifica- ção com a pessoa que tem recursos desejá- veis ou traços pessoais. Desenvolve-se da admiração por alguém e de um desejo de ser IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 12 igual àquela pessoa. É também chamado de poder carismático. DE ESPECIALIZAÇÃO OU DE COMPETÊNCIA Posse de um determinado conhecimento, ex- periência, talento ou habilidade. Pessoas que são vistas como especialistas numa determi- nada área podem influenciar as outras lhes fornecendo conhecimentos para alcançar suas metas. Fonte: FRENCH Jr., J. R. P. e RAVEN, B. “The Bases of Social Power”, in: CARTWRIGHT, D. (Ed.). Studies in Social Power. Michigan: Ann Arbor – Institute for Social Research, University of Michigan, 1959, pp. 150-165. Com base no texto de Yuki e Falbe (1991), Robbins (1998) apresenta um quadro, reproduzido a seguir, que permite mensurar as bases de poder: Uma pessoa tem uma ou mais das cinco bases de poder? Respostas a- firmativas às seguintes questões podem responder a esta pergunta: ! A pessoa pode tornar as coisas difíceis para os outros e você quer evitar zangá-los (poder coercitivo). ! A pessoa é capaz de dar recompensas ou benefícios especiais para os outros e você acha que é vantajoso trocar favores com a mesma (poder de recompensa). ! A pessoa tem o direito, considerando sua posição e responsabilidades de seu cargo, de esperar que você concorde com pedidos legítimos (poder legítimo). ! A pessoa tem experiência e conhecimento para ganhar o seu respeito, e você acata suas avaliações em alguns assuntos (poder de competência). ! Você gosta da pessoa e acha agradável fazer coisas para ela (poder de referência). Fonte: YUIKI, G. e FALBE, C. M. “Importance of Different Power Sources in Downward and Lateral Relations”, in: Journal of Applied Psychology, jun. 1991, p. 417. Para aprender sobre a utilização das bases de poder, é fundamental a análise de duas questões: 1. Como traduzir estas fontes em ações específicas, isto é, qual o subcon- junto de táticas do poder que é visto como aceitável na minha organiza- ção? Segundo pesquisa de Kipnis (1984), resumida por Robbins (1998), há manei- ras padronizadas pelas quais os que detêm poder tentam conseguir o que querem. As descobertas identificaram sete dimensões reproduzidas a seguir: ! Razão: uso de fatos e dados para fazer uma apresentação lógica ou ra- cional de idéias. ! Amizade: uso de adulação, criação de boa vontade, agir de forma humilde e ser amigável antes de fazer um pedido. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 13 ! Coalizão: conseguir o apoio de outras pessoas na organização para dar respaldo ao pedido. ! Barganha: uso da negociação através da troca de benefícios ou favores. ! Asserção: uso de abordagem direta e forte, tal como a exigência de con- cordância com pedidos, a repetição de lembretes, mandar os indivíduos fazerem o que é pedido e indicar que regras exigem obediência. ! Autoridade maior: obter apoio de níveis mais altos na organização para dar respaldo aos pedidos. ! Sanções: uso de recompensas e punições derivadas da organização co- mo impedir ou prometer aumento de salário, ameaçar uma avaliação de desempenho insatisfatória ou reter uma promoção. Vários fatores influenciam na definição de quais táticas de poder serão consi- deradas adequadas para cada organização. As pesquisas demonstraram que os gerentes não utilizam as sete táticas i- gualmente, embora a estratégia mais popular foi o uso da razão, independentemente da cultura e da direção da relação da influência (gerentes para supervisores ou vice- versa). Para a seleção da tática de poder, quatro variáveis devem ser consideradas: ! O poder relativo do gerente: gerentes que controlam recursos que são valorizados por outros, ou que sejam percebidos como estando em posi- ções de domínio, usam uma variedade maior de táticas do que aqueles com menos poder. Gerentes com relativamente pouco poder têm mais probabilidade de parar de tentar influenciar os outros quando eles encon- tram resistência, porque percebem os custos associados com a asserção como inaceitáveis. ! Os objetivos do gerente para querer influenciar: quando os gerentes buscam benefícios de um superior, eles tendem a confiar em palavras amáveis e na promoção de relações agradáveis, isto é, usam a amizade. Gerentes que tentam persuadir seus superiores a aceitarem novas idéias, em geral, baseiam-se na razão. ! A expectativa do gerente quanto ao sucesso: quando a experiência passada indica alta probabilidade de sucesso, os gerentes usam pedidos simples para obter concordância. Onde o sucesso é menos previsível há maior probabilidade da tática escolhida ser a asserção e sansões. ! A cultura organizacional: algumas culturas estimulam o uso da amizade, algumas incentivam a razão, outras se baseiam em punições e medo. 2. Como os trabalhadores/subordinados reagem quando os gerentes utilizam estes diferentes tipos de poder? Segundo pesquisa de Kelman (1958), reproduzida por Wagner III e Hollem- beck (1998), é provável que ocorram três tipos bem distintos de reações de con- formidade ao poder, reproduzidas no quadro a seguir: IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 14 TIPO DE REAÇÃO DESCRIÇÃO OBEDIÊNCIA Conformidade baseada no desejo de obter re- compensas ou evitar punições. Dura enquanto as recompensas forem recebidas ou as punições a- plicadas. O poder coercitivo e de recompensa em geral propiciam este tipo de reação. IDENTIFICAÇÃO Conformidade baseada na atração do influencia- dor.Dura enquanto puder ser mantida a relação com o influenciador.O poder de referência baseia- se no mesmo tipo de atração pessoal que a identi- ficação e os dois estão estreitamente ligados. INTERNALIZAÇÃO Conformidade baseada no caráter intrinsecamen- te gratificante das atitudes ou comportamentos adotados. Dura enquanto durar a satisfação. O poder legítimo e o de especialização podem esti- mular a internalização, ambos recorrem à credibi- lidade pessoal. 1.5 A DELEGAÇÃO DE PODER (EMPOWERMENT) Conforme visto na disciplina anterior, quando foram abordados grupos e equi- pes, a busca da participação no trabalho (da formação de equipes autogerenciáveis, nas quais os seus membros prescindam a necessidade de chefias) tem se tornado uma tendência nos anos 1990, com enormes implicações nos estilos de liderança, nas relações de poder e na forma como as organizações estão sendo estruturadas. Fatores como o downsizing, habilidades maiores de empregados, compromis- so das organizações com treinamento continuado, implementação de programas de qualidade total, entre outros, criam um número crescente de situações que deman- dam que os gerentes abracem o empowerment ou a delegação de poder. Mais es- pecificamente, gerentes estão sendo advertidos de que líderes eficazes partilham poder com seus empregados. O problema com o atual movimento de delegação de poder é que ele ignora a extensão em que a liderança pode ser partilhada e as condições que facilitam o su- cesso de uma liderança compartilhada. As questões abordadas neste item têm por objetivo ajudar a entender melhor estes desafios e paradoxos. Que Significa Delegar? ! Delegar é parte essencial do trabalho de qualquer gerente. ! Delegar é dar a outra pessoa uma tarefa cuja responsabilidade, em última instância, cabe a quem delega. ! A delegação é a atribuição de autoridade para uma outra pessoa executar atividades específicas. Ela permite que um funcionário tome decisões, ou seja, é um deslocamento da autoridade de tomada de decisões de um ní- vel organizacional para outro, inferior. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 15 A Quem Delegar e Até que Ponto? ! Ao escolher a quem delegar, a pessoa que delega está supondo que a- quela pessoa é capaz de realizar uma determinada tarefa com as ferra- mentas disponíveis. ! Depois da escolha, a pessoa que delega deve garantir que o delegado te- nha autonomia suficiente para realizar a tarefa ao seu jeito, obedecendo a orientação preliminar e fornecendo regularmente relatórios sobre a evolu- ção do trabalho. O Processo da Delegação: Principais Fases Fase 1: Análise e Seleção das Tarefas que o Gerente pode – e Deve – Transferir para Outros Tarefas delegadas não fazem parte da extensão dos encargos habituais de uma pessoa. Elas são temporárias, a menos que sejam incorporadas à descrição do cargo. Perguntas a responder: 1. Quais itens pertencem, de fato, à extensão de meus encargos e a meu campo de autoridade? Eu estou realizando algum item que não faz parte de minhas atribuições? 2. Quanto da autoridade que eu gostaria de delegar meus funcionários pode- riam assumir com a autorização da empresa? 3. Quais encargos eu posso delegar? Por que eu os delegaria? Quais os en- cargos que eu não posso delegar? Por quê? Fase 2: Nomeação ou Escolha da Pessoa Apropriada para Transmitir Instruções Precisas As pessoas a quem se delega se beneficiam, no mínimo, de três maneiras: elas se tornam mais produtivas e importantes para a empresa, quanto mais impor- tantes se sentirem, mais satisfação profissional experimentarão, a auto-estima tam- bém aumentará. Quando você delega, há mais braços e mentes participando dos problemas do trabalho. Isto ajuda a agilizar as decisões. Ampliando o poder de decisão do gru- po, você e o grupo tomam decisões mais eficazes. A delegação pode ser utilizada como uma ferramenta para melhorar as habili- dades dos funcionários. Uma vez que o desenvolvimento de pessoal é um dos en- cargos do supervisor, quanto mais bem-sucedido você for nisto, mais reconhecimen- to obterá. Além de melhorar a produtividade individual, através da delegação é possível aumentar a produtividade da área/departamento, favorecendo as oportunidades de trabalho em equipe e substituição de funcionários. Há, portanto, a possibilidade de gerar o seguinte ciclo vicioso: mais pessoas produtivas, mais produtividade, melhor grupo de trabalho, melhores resultados para a área. Perguntas a responder: 1. Quem se beneficiaria se eu delegasse essas tarefas e como? 2. Como o grupo se beneficiaria se eu delegasse essas tarefas? IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 16 3. Quem tem experiência e/ou treinamento para executar este trabalho sem treinamento extra? 4. Quem pode realizar o trabalho mais rápido, com o menor tempo de trei- namento? 5. Quem tem tempo para executar e/ou aprender esta tarefa como um extra à sua carga normal de trabalho? 6. Quem sofreria o pior impacto com esta tarefa delegada no que diz respei- to à atual carga de trabalho? 7. Que pessoa, executando este trabalho, contribuiria mais para os esforços do departamento/área? 8. Se esta tarefa for delegada a alguém do grupo, quem sofreria (outras pes- soas) o pior impacto? Fase 3: Orientação e Controle – Especificação da Amplitude de Liberda- de do Funcionário Todo ato de delegação vem com restrições. A pessoa que delega está repas- sando autoridade de agir, mas não é uma autoridade sem limites, ela vem dentro de certos parâmetros. É importante, nessa fase, deixar claro para a outra pessoa o que a pessoa que delega espera dela e os padrões pelos quais ela será avaliada. Sete critérios guiam a descrição dos objetivos e padrões de uma tarefa: ! Os alvos devem dizer respeito a ações mensuráveis ou observáveis. ! As tarefas devem ter prazo para execução. ! Os objetivos devem delinear os meios e as condições pelos quais a pes- soa executará a tarefa. ! Devem ser realistas e realizáveis. ! Devem ser específicos e, ainda assim, abertos a revisão. ! Devem incluir medidas para monitoramento e revisão do trabalho. ! Devem deixar claras as conseqüências positivas de se executar bem o trabalho e as conseqüências negativas de executá-lo mal, tanto para o in- divíduo quanto para o departamento e a empresa como um todo. Fase 4: avaliação – estabelecimento de controles de feedback Delegar sem instituir controles de feedback é um convite para problemas. Controles para monitorar o progresso dos funcionários aumentam a probabilidade de identificação de problemas importantes no início, e que a tarefa seja completada no prazo e com a especificação desejada. Mesmo quando o supervisor deixa o subordinado executar sozinho a tarefa delegada, o sucesso do projeto depende em grande escala de seu controle. O supervisor sempre mantém a responsabilidade final por qualquer tarefa de- legada, e pelos padrões de qualidade e prazos de qualquer trabalho a ser feito pelo departamento/área. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 17 Perguntas a responder: 1. Como foi o desempenho do funcionário? 2. Que modificações devem ser feitas, nos dois lados da delegação para me- lhorar a eficiência? Por que delegar? Para aumentar o tempo disponível para se dedicar a funções essenciais de gerência. Para motivar a equipe. Delegar toma tempo, mas o custo de não delegar é mais caro no longo prazo. Barreiras dos supervisores no processo de delegação: ! Não confio nos meus funcionários. ! Não me sinto seguro. ! Sou mais eficiente que meus funcionários em muitas funções. ! Tenho receio de sobrecarregar a equipe. ! Não tenho uma equipe competente. ! Tenho medo de perder o controle direto sobre o trabalho. ! Tenho medo de perder o poder, “perder” parte do trabalho diminuindo meu status pessoal. ! Acredito que as tarefas, especialmente as importantes, devem ser feitas “do meu jeito”. ! Tenho uma agenda desorganizada e estou sempre ocupado demais cui- dando de assuntos que deveriam ser delegados. ! Tenho dificuldades de falar com franqueza as minhas expectativas. Barreiras criadas pelos subordinados no processo de delegação: Imposição Os subordinados a quem se delega podem acreditar que a pessoa que delega está passando o seu próprio trabalho ou tirando vantagens de sua boa índole. Para derrubar essa resistência é preciso uma argumentação franca de como os subordi- nados seriam mais produtivos e estariam mais disponíveis para outras questões, e dos benefícios que eles teriam. Ignorância Alguns subordinados erguem a barreira da ignorância porque não entendem que sempre precisam de novas experiências para conseguir o que querem. É preci- so ajudar o funcionário a encontrar, na tarefa adicional, uma contribuição para atingir uma meta ainda não alcançada. Estagnação Algumas pessoas não querem mudar. Estão em seu caminho e nele querem permanecer, se colocando em uma zona de conforto que lhe é conveniente. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 18 Essas pessoas são bons soldados que fazem o que têm de fazer desde que fiquem fora da ribalta, longe dos olhos do público, executando serviços rápida e se- guramente. Medo de Fracasso ou de Rivais Assim como o medo imobiliza muitos supervisores, muitos subordinados rejei- tam novas tarefas por causa dele. Não é apenas o encargo que os assusta. Alguns temem o fracasso e outros temem ser vistos pelos colegas como os “favoritos” do chefe se aceitarem trabalho extra. Impaciência Além de se sobrecarregarem, algumas pessoas estão dispostas a se com- prometer com tarefas para as quais elas não estão preparadas. Ansiosas por agra- dar, precisando de reconhecimento social, passam na frente de si mesmas, execu- tando mal o trabalho com muita freqüência. Jogos de Poder Algumas vezes a impaciência mascara uma barreira mais difícil de ultrapas- sar: o jogo de poder. Os adeptos dos jogos de poder só aceitam tarefas adicionais sob condições que indubitavelmente lhes são favoráveis. Em vez de se sentir pres- sionados, esses tipos aceitam uma tarefa delegada como uma oportunidade de chantagear quem delega. Para lidar com essa barreira é preciso deixar os limites bem claros – falando inclusive das conseqüências negativas de se ficar “jogando”. Para Aumentar a Eficiência da Delegação é Preciso: ! Dividir as tarefas sob a responsabilidade do supervisor em três grupos, segundo a classificação de Drucker: 1. As que não precisam ser executadas – por você ou por outros. 2. As que podem ou devem ser delegadas a alguém. 3. As que não podem ser delegadas (áreas como planejamento estratégico, gerenciamento de crises, negociações com clientes importantes, coman- dar e supervisionar um projeto, garantir canais eficientes de comunicação interna). Estabelecer prioridades e estimar prazos para realizar as tarefas e estruturar a delegação: ! Delegar e distribuir incumbências. ! Evitar atribuir a mesma tarefa a mais de uma pessoa ou desprezar outra a ponto de não ser cumprida. ! Observar quais habilidades terão que ser ensinadas ou desenvolvidas pa- ra capacitar potenciais subordinados a desempenhar suas tarefas satisfa- toriamente. ! Casar pessoas e papéis: estudar as qualidades dos membros da equipe, identificar os subordinados que têm mais iniciativas. Atribuir Responsabilidades com Precisão: ! Para evitar confusão sobre quem é responsável por algo, é preciso que- brar as tarefas delegadas em “pedaços” específicos – atividades – para que cada pessoa tenha a clareza de qual é a sua parte. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 19 ! Escolher a pessoa certa exige análise minuciosa de sua experiência e ca- pacidade. ! A parte mais importante de um processo de orientação e instrução é defi- nir o objetivo geral e traduzi-lo em resultados esperados. Levar em consideração os fatores de contingência da delegação a seguir: ! Tamanho da organização: quanto maior a organização, maior o número de decisões a tomar. Como os altos gerentes em uma organização têm tempo limitado e também um limite nas informações, nas grandes empre- sas eles se tornam cada vez mais dependentes de tomadas de decisão por gerentes de níveis inferiores. Portanto, os gerentes, nas grandes orga- nizações, recorrem a um aumento de delegação. ! Importância do dever ou da decisão: quanto mais importante for um de- ver ou uma decisão, menor a probabilidade de que seja delegado. ! Complexidade da tarefa: quanto mais complexa for uma tarefa, mais difí- cil será para a alta direção ter informações técnicas atualizadas e suficien- tes para tomar decisões eficazes. Tarefas complexas requerem maior es- pecialização e decisões relativas a elas devem ser delegadas a pessoas com o necessário conhecimento técnico. ! Cultura organizacional: se a administração confia e acredita em seus funcionários, a cultura sustentará maior grau de delegação. No entanto, se a alta direção não tiver confiança nas habilidades dos gerentes dos níveis inferiores, ela delegará autoridade somente quando absolutamente neces- sário. ! Qualidade dos funcionários: para aceitar e agir com a autoridade, a de- legação requer funcionários com aptidões, habilidades e motivação. Se essas qualidades estiverem faltando, a alta direção ficará relutante em passar a autoridade. O nível de experiência do subordinado determinará se é preciso adotar um controle mais próximo ou mais distanciado sobre o andamento do trabalho. Com base na avaliação é preciso escolher um dos sistemas de controle lista- dos a seguir: ! Participação na correspondência: a pessoa que delega retém a maior parcela de autoridade e assina circulares, requerimentos etc. ! Relatórios por escrito: o funcionário fornece um relatório por escrito so- bre suas ações, resultados e quaisquer índices que sejam atualizados re- gularmente. ! Relatório pessoal: a pessoa que delega organiza reuniões regulares com o funcionário para discutir o trabalho. ! Política de “portas abertas”: a pessoa que delega estimula o funcionário a lhe trazer os problemas do dia-a-dia, a qualquer hora, para ajuda e es- clarecimento. ! Via computador: a pessoa que delega utiliza sistema de tecnologia da in- formação para checar diretamente o que está acontecendo. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 20 ! Reuniões: a pessoa que delega discute a tarefa delegada em reunião com o subordinado e outras pessoas envolvidas no trabalho. 1.6 RELAÇÕES DE PODER NAS NOVAS CONFIGURAÇÕES ORGANIZACIO- NAIS Para contextualizar as relações de poder na perspectiva de suas estruturas é preciso resgatar as contribuições de Max Weber (1864-1920). Weber (1994) sintetiza a organização como um "sistema de atividade contí- nua e intencional empregando a autoridade e o poder". Para o autor, o poder é a ca- pacidade de uma pessoa, em qualquer relação social, realizar os seus objetivos e superar resistências. Quando o poder é legítimo, a obediência é efetiva e completa. Um poder legítimo, embora não possa ser agradável, facilita a congruência das nor- mas com os valores dos subordinados. Tal verificação levou Weber a descrever três tipos de autoridade: a autoridade tradicional, a carismática e a racional-legal ou bu- rocrática e conseqüentes tipos de organização – a organização tradicional, a caris- mática e a racional-legal ou burocrática. Lembrando sempre que esses tipos de or- ganizações não são mutuamente excludentes, podendo ser encontrados numa mesma organização, dependendo do estilo individual dos administradores ou da na- tureza de suas atividades. Weber conclusivamente indica que a burocracia é clara- mente o padrão mais eficiente para a administração, porque se assenta em princí- pios bem definidos de: a. regras – permitindo a solução de problemas, a padronização e igualdade de tratamento, principalmente nas relações sociais de trabalho da organi- zação; b. esferas de competência – através da divisão sistemática de trabalho, ten- do cada indivíduo direitos e poderes claramente definidos; c. hierarquia – que é condição sine qua non para a sua existência; d. competência baseada em conhecimento – os administradores são nome- ados com base na competência, conhecimento e treinamento para ocupar seus cargos; e. não são proprietários da organização – sua participação é apenas e ex- clusivamente executiva; f. liberdade de alocar seus recursos dentro de suas esferas de influência; g. manutenção dos registros – todo ato ou fato administrativo na burocracia é motivo de registro e fácil identificação de seu(s) autor(es). Hoje as idéias e o modelo weberiano de administração ainda continuam familiares e pre- sentes em nossas organizações, em que pesem as mudanças e investi- das de outros modelos de abordagem e gestão organizacional. Weber, particularmente, teve o mérito de focalizar os problemas mais fundamen- tais dos processos de formalização e legitimação, por meio dos quais são elaborados e sancionados os sistemas de desempenho de papéis que o- correm dentro de nossas organizações. Conclusivamente, os conceitos de Weber formam a vertente do que é comumente conhecido como estrutu- ralismo. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 21 O papel da estrutura nas organizações é tornar previsível o comportamento de seus membros, mapear suas relações de subordinação e mando, e possibilitar o alcance dos objetivos organizacionais. Uma estrutura organizacional é um agrupamento formal das atividades logís- ticas e administrativas da organização. As atividades semelhantes são organizadas em subgrupos organizacionais com responsabilidades, autoridades, tarefas e rela- ções específicas. Conforme a organização vai se tornando mais complexa, elemen- tos dinâmicos são acrescidos a esse esqueleto administrativo-funcional, como o pla- nejamento de recursos humanos, de sistemas de informação e de instalações. A tipologia de Blau e Scott mostra que as organizações existem para propor- cionar benefícios e, estes, por sua vez, são o cerne para a existência da organiza- ção. De acordo com os autores citados (apud Chiavenato, 1993, p. 493), há quatro categorias de participantes que podem se beneficiar com uma organização formal, como fica explicitado no quadro a seguir: Tipologia de Blau e Scott Beneficiário Principal Tipo de Organização Exemplos Os próprios membros da organização. Associação de beneficiá- rios mútuos. Associações profissionais, coo- perativas, sindicatos, fundos mútuos, consórcios. Os proprietários ou a- cionistas da organiza- ção. Organizações de interes- ses comuns. Sociedades anônimas ou em- presas familiares. Os clientes. Organizações de servi- ços. Hospitais, universidades, orga- nizações religiosas e agências sociais, organizações filantrópi- cas. O público em geral. Organizações de Estado. Organização militar, segurança pública, correios e telégrafos, saneamento básico, organiza- ção jurídico e penal. Fonte: Chiavenato, I. Introdução à Teoria Geral da Administração. 4a ed. “Teo- ria Estruturalista da Administração”, Cap. 12. São Paulo: Makron Books, 1993, p. 493. Também Etzioni (apud Chiavenato, 1993, p. 491) leva a refletir sobre tipologi- as em face das observações que realiza sobre os sistemas psicossociais das orga- nizações. Apesar de dar pouca ênfase à estrutura, à tecnologia utilizada e ao ambi- ente externo, reporta a questões do tipo de controle (coercitivo, normativo e utilitário) que uma organização exerce ou pode vir a exercer sobre o indivíduo, conforme se evidencia no quadro a seguir: IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 22 Tipologia de Etzioni Tipos de Or- ganização Tipo de Po- der Controle Utilizado Ingresso e Per- manência dos Participantes Através de: Envolvimento Pessoal dos Participantes Motivação Coercitivas Coercitivo Prêmios e punições Coação, imposi- ção, força, ame- aça, medo Alienativo Negativa. Punições Normativas Normativo Moral e ético Convicção, fé, crença, ideologia Moral e motiva- cional Auto- expressão Utilitárias Remunerativo Incentivos econômicos Interesse, vanta- gem percebida Calculativo Benefícios e vanta- gens Fonte: Chiavenato, I. Introdução à Teoria Geral da Administração. 4a ed. “Teo- ria Estruturalista da Administração”, Cap. 12. São Paulo: Makron Books, 1993, p. 491. A estrutura pode caracterizar-se como uma pirâmide imponente na sua altura e por grandes escalas de poder muito bem definidas e tendo a legitimidade da auto- ridade baseada na sua própria hierarquia, sendo esta constituída por leis e normas. Mas é possível visualizar a estrutura de uma forma menos vertical, tendo como im- ponência sua horizontalidade – pirâmide achatada – composta por uma descentrali- zação da autoridade através da comunicação existente entre os departamentos e destes com o ambiente externo (clientes, fornecedores e concorrentes). Visualiza-se a estrutura de uma organização através da leitura de seus orga- nogramas, de seus estatutos e regimentos e demais normas internas. Os organo- gramas são úteis para mostrar a estrutura formal da organização e quem é respon- sável por determinadas tarefas. Em outros termos, a organização formal é uma es- trutura planejada, que representa a tentativa deliberada de estabelecer relações pa- dronizadas entre seus componentes, de forma que estes possam alcançar os objeti- vos organizacionais de maneira eficiente. Além disso, o simples ato de desenhar um organograma pode assinalar defeitos na organização, com a duplicação de esforços ou os conflitos potenciais. Entretanto, os organogramas tendem a esconder muitas características de estrutura organizacional. As estruturas organizacionais das empresas modernas evoluíram em respos- ta a desafios que eram basicamente de natureza operacional. Quando se compro- vou a importância do planejamento estratégico, os arranjos organizacionais para realizá-lo foram implantados nas estruturas existentes, orientadas para operações, o que acabou por provocar a denominada “resistência ao planejamento” – uma inércia organizacional que frustra os esforços para converter planos em ações. A primeira resposta encontrada a essa resistência ao planejamento foi o com- prometimento da alta administração, que é uma solução viável, mas temporária, pois o entusiasmo do presidente não é infinito e, tão logo ele se volte para outras priori- dades, o comprometimento estratégico generalizado na organização é dissipado. A esse método de introdução de mudanças, Ansoff (1990) denominou de processo co- ercitivo de mudança, que tem se mostrado caro e perturbador do bom andamento da organização, mas tem demonstrado ser muito útil quando há necessidade de uma resposta estratégica rápida. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 23 No dia-a-dia de uma organização, ela necessariamente vivencia inúmeras mudanças estratégicas descontínuas, que não chegam a ser um choque estratégico, mas que a obrigam a se adaptar, modificando (ainda que marginalmente) sua cultu- ra, estrutura de poder e de competências. A este processo gradual de mudança, An- soff (1990) denomina mudança adaptativa. Apesar da mudança adaptativa ser lenta, ela tem a vantagem de minimizar a resistência interna, distribuindo o impacto da mudança ao longo do tempo. Uma crise ocorre quando uma mudança põe em perigo a sobrevivência da organização e quando há pressões de tempo. Nesses momentos, a resistência comportamental à mudança dá lugar ao apoio à alta administração que, por sua vez, estará preocupada em gerar uma resposta rápida e eficaz à crise e em impedir que o pânico se espalhe pela organização. Uma forma de reduzir a resistência à mudan- ça provocada pelo planejamento estratégico está em a alta administração convencer toda a organização que a iminência de uma crise está para ocorrer e, assim, poder contar com o suporte de todos. Um enfoque intermediário em relação ao enfoque adaptativo (lento, mas com baixa resistência) e ao enfoque coercitivo (rápido, mas caro e de alta resistência) é chamado de resistência administrada, ou “método do acordeão”. Sua vantagem está no ajuste da organização aos imperativos externos em termos de tempo, sem provo- car uma grande revolução interna na organização. O planejamento pode ocorrer concomitantemente à sua execução. O método do acordeão possibilita equilíbrio en- tre redução da resistência e uso de poder, dentro dos limites de tempo disponível. Ao se organizar para planejar, Ansoff (1990) descreveu duas estruturas resul- tantes: a funcional e a divisional. A primeira surgiu no início do século XX, em res- posta aos desafios da produção em massa e da maximização da eficiência da pro- dução. Na estrutura funcional, o presidente é o responsável pela elaboração de es- tratégias. Entretanto, ele também precisa se preocupar com o dia-a-dia da organiza- ção, que a mantém viva. Assim, as preocupações operacionais acabam prevalecen- do sobre as estratégias, tornando a estrutura funcional pouco orientada para a ativi- dade estratégica. A estrutura divisional surgiu na década de 1920, em resposta ao desafio do marketing de massa que demandava resposta rápida e eficaz à concorrência e às exigências do mercado. Tais demandas levaram à descentralização de autoridade e responsabilidade tanto no nível estratégico quanto no nível operacional. Assim, há dois níveis de atividade estratégica numa empresa com esse tipo de estrutura: o ní- vel de administração geral, responsável pela carteira estratégica global da empresa, e o nível de divisão, responsável pela postura de competição nas áreas estratégicas de negócio confiadas às respectivas divisões. Para fins de elaboração de estratégia, a estrutura divisional tem se mostrado mais eficaz do que a funcional, pois a carga de trabalho estratégico é dissolvida pela empresa, sendo compartilhada pelo presi- dente e pelos chefes das divisões. Assim como na estrutura funcional, a sua fraque- za está no viés operacional, isto é, o presidente e cada chefe de divisão podem dar maior atenção aos problemas operacionais de curto prazo do que à questões estra- tégicas e de longo prazo. Para lidar com esse conflito, ou viés operacional, algumas empresas forte- mente voltadas para a estratégia, desenvolveram uma estrutura matricial, na qual é adicionada uma suborganização de administração de projetos à forma convencional (seja ela funcional ou divisional). A organização matricial administra e executa todos os projetos estratégicos, possui orçamento próprio e pode extrair parte do seu pes- IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 24 soal das unidades operacionais, via designação especial. Uma vez concluído o pro- jeto estratégico, os novos projetos ou serviços são transferidos às unidades opera- cionais regulares da empresa. Uma extensão da estrutura matricial é a matriz multi- nacional, desenvolvida para lidar com a dispersão de atividades em vários países. Finalmente, existe uma forma organizacional aparentemente capaz de lidar com o aqui denominado “viés operacional”: a estrutura dualista, que separa a em- presa em dois grupos diferentes, cada qual com sua própria administração e recur- sos. Um dos grupos é encarregado da manutenção dos lucros correntes da empresa (foco operacional), enquanto o outro grupo se preocupa com a geração de lucros fu- turos (foco estratégico). Entretanto, essa forma dualista tem sido usada em escala muito limitada. No sistema em questão existe um orçamento operacional e um or- çamento estratégico, denominados por Ansoff (1990) de orçamentos dualistas. O sistema tem como principais vantagens a proteção ao avanço das preocupações operacionais, a reserva de recursos para o trabalho empreendedor e a fácil instala- ção (uma vez que não há interferência com a estrutura organizacional existente). Va- riante da estrutura dualista é a estrutura múltipla, na qual o grupo para potencial de lucro é subdividido em vários centros de esforço estratégico diferenciado com orça- mentos independentes. A arquitetura social estratégica busca a mudança, é flexível e pouco estrutu- rada, enquanto a arquitetura operacional é resistente a mudanças, busca a eficiência e é altamente estruturada. Mintzberg (1995) inova a visão estruturalista na medida em que, teoricamen- te, visualiza a possibilidade de uma organização assumir ao longo do tempo, e em função de diferentes circunstâncias, cinco configurações em sua estrutura orgânica, denominadas: a) estrutura simples; b) burocracia mecânica; c) burocracia profissio- nal; d) forma divisionalizada; e) adhocracia Configuração estrutural Primeiro mecanis- mo de coordenação Parte chave da organização Tipo de descentrali- zação 1 Estrutura sim- ples Supervisão direta Cúpula estratégica Centralização horizon- tal e vertical 2 Burocracia me- canizada Padronização dos processos de traba- lho Tecno-estrutura Descentralização hori- zontal limitada 3 Burocracia pro- fissional Padronização de ha- bilidades Núcleo operacional Descentralização hori- zontal e vertical 4 Forma divisiona- lizada Padronização de re- sultados Linha intermediária Descentralização ver- tical limitada 5 Adhocracia Ajustamento mútuo Assessoria de a- poio Descentralização sele- tiva Fonte: Mintzberg, H. Criando Organizações Eficazes: Estrutura em Cinco Configurações. São Paulo: Atlas, 1995, p. 154. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 25 Características da Estrutura Simples Principal Mecanismo de Coordenação: Supervisão direta. Parte Chave da Organização: Cúpula estratégica. Principais Parâmetros para Delinear: Centralização; estrutura orgânica. Fatores de Contingência: ! Pequena e jovem, sistema técnico não sofisticado; ambiente simples e dinâmico; ! possível hostilidade extrema ou necessi- dades de poder considerável do principal dirigente; ! não acompanhando a moda. A estrutura simples possui pequena ou nenhuma tecno-estrutura poucos as- sessores de apoio, reduzida divisão do trabalho, mínima diferenciação entre suas unidades e pequena hierarquia administrativa. Pouco de seu comportamento é for- malizado, existe pouco planejamento e treinamento, e os instrumentos de interliga- ção são escassos. Por essas características, ela é considerada uma estrutura orgâ- nica. Sua coordenação é feita principalmente pela supervisão direta e o poder sobre todas as decisões importantes tende a ser centralizado nas mãos do principal execu- tivo. Não é raro que todos se reportem ao principal executivo e que a coordenação entre as unidades seja feita por ele. A tomada de decisão é rápida, uma vez que o poder de decisão é concentrado na figura de quem tem visão geral e de quem cen- traliza as informações. É por isso que a cúpula estratégica se destaca como a parte central da estrutura. O logotipo usado para caracterizar essa estrutura não apresen- ta nem tecno-estrutura, nem assessoria de apoio. As condições para que ocorra a estrutura simples são um ambiente simples (que possa ser compreendido por uma só pessoa) e dinâmico (sem padrões, com elevado grau de incerteza, levando a estrutura a se organizar de forma orgânica, no lugar de uma forma burocrática e formalizada). O sistema técnico normalmente é simples e não regulador. A organização nova tende a adotar essa estrutura, não im- portando qual o seu ambiente ou sistema técnico, por um simples motivo: falta de tempo para uma maior elaboração de sua estrutura administrativa. A maioria das or- ganizações passa pela estrutura simples em seus anos de formação. Em tempos de crise, quando a organização passa por uma turbulência muito forte, ela tende a centralizar as decisões no principal executivo de modo a reagir ra- pidamente às ameaças do ambiente. Nesses momentos, não importa qual a estrutu- ra usual da organização, ela corre para a estrutura simples para que as decisões crí- ticas sejam tomadas rapidamente. Outro fator que incentiva a utilização da estrutura simples é a do administra- dor proprietário que cria uma organização empreendedora capaz de ser agressiva e inovadora em um ambiente dinâmico e simples. Muitas vezes a organização empre- endedora é pequena, o que lhe permite manter-se orgânica, com controle cerrado do seu fundador. Tudo gira em torno do empreendedor: as suas metas são as metas da organização e sua estratégia é reflexo da visão do proprietário, de como a organiza- ção deve se posicionar em seu ambiente. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 26 Alguns problemas associados a esse tipo de estrutura estão justamente na centralização do poder nas mãos de poucas pessoas. Se por um lado, esse arranjo facilita decisões ágeis, por outro pode estar comprometendo a própria existência da organização, caso algo aconteça com seu fundador, proprietário ou principal execu- tivo. Outro grande problema é a confusão entre problemas operacionais e estratégi- cos quando é a mesma pessoa que cuida de ambos. Características da Burocracia Mecanizada Principal Mecanismo de Coordena- ção: Padronização dos processos de trabalho. Parte Chave da Organização: Tecno-estrutura. Principais Parâmetros para Delinear: Formalização do comportamento, especiali- zação do trabalho na dimensão vertical e ho- rizontal; agrupamento funcional (em geral); unidades grandes; centralização vertical e descentralização horizontal limitada; planejamento para a ação. Fatores de Contingência: Madura e grande, sistema técnico regulado e não automatizado; ambiente simples e está- vel; controle externo; não seguidora de modas. A burocracia mecanizada é a estrutura mais próxima da burocracia descrita por Weber, com padronização de responsabilidades, de qualificações e de canais de comunicação, assim como normas para o trabalho e uma clara hierarquia de autori- dade. Os principais parâmetros para delinear esse tipo de estrutura são: especiali- zação do trabalho vertical e horizontal; tarefas operacionais rotinizadas e, portanto, padronizáveis por meio de uma grande proliferação de normas, regulamentos e co- municações que formalizam o comportamento; o trabalho é comumente agrupado por função, contando com unidades operacionais com grande dimensão; o poder é relativamente centralizado verticalmente (para a tomada de decisão) e existe uma descentralização horizontal limitada, com nítida distinção entre linha e assessoria. As tarefas executadas pelo núcleo operacional de uma burocracia mecaniza- da são repetitivas, rotineiras, simples, com um mínimo de treinamento exigido e es- treitamente definidas e especializadas, tanto vertical, quanto horizontalmente. Existe uma ênfase na coordenação pela padronização do processo de trabalho, tornando a formalização do comportamento como um parâmetro chave para o planejamento. A padronização dos processos diminui a autonomia no núcleo operacional e reduz o poder dos gerentes de primeira linha, uma vez que a coordenação é exercida mais pela padronização do que pela supervisão direta. A linha intermediária é altamente desenvolvida e diferenciada basicamente por unidades funcionais. Uma das principais funções dos gerentes da linha interme- diária é tratar dos problemas entre os trabalhadores que não podem ser tratados pe- lo ajustamento mútuo, uma vez que a padronização inibe a comunicação entre as unidades altamente especializadas. Como a maioria desses conflitos surge entre trabalhadores que atuam um ao lado do outro (em uma linha de montagem, por e- xemplo), a tendência natural é colocar trabalhadores adjacentes sob uma mesma IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 27 supervisão. Esse é um dos motivos que justificam o agrupamento em unidades fun- cionais. Outra importante tarefa da linha intermediária que reforça o agrupamento em unidades funcionais é a atuação desses gerentes no papel de interligação com os analistas da tecno-estrutura, responsáveis pela padronização. Uma terceira tarefa comumente desempenhada pela linha intermediária é dar suporte ao fluxo vertical na estrutura: levando informações hierarquia acima e descendo com planos de ação hierarquia abaixo. Todos esses contatos: com os trabalhadores do núcleo operacio- nal, analistas da tecno-estrutura e superiores limitam a capacidade dessas linhas in- termediárias incluirem muitas pessoas a serem subordinadas. Por esse motivo, as unidades acima do grande núcleo operacional tendem a ser pequenas de tamanho e a hierarquia administrativa tende a ser mais alta, com mais níveis hierárquicos. A tecno-estrutura tende a ser grande devido à elevada padronização de pro- cessos. Como é na tecno-estrutura que são encontrados os analistas responsáveis pela padronização, essa parte da estrutura é considerada principal na configuração da burocracia mecanizada. Apesar da autoridade formal sobre as unidades opera- cionais permanecer com os gerentes da linha intermediária, os analistas da tecno- estrutura gozam de grande poder informal por sugerirem como estruturar o processo de trabalho, retirando autonomia do núcleo operacional e da linha intermediária. A- lém disso, como abundam as normas e regulamentos internos nessa estrutura, a comunicação formal é promovida em todos os níveis e a tomada de decisão tende a seguir a cadeia formal de autoridade, não deixando muito espaço para a comunica- ção informal e o ajustamento mútuo entre as unidades, o que retira poder de decisão e reforça o poder dos analistas e da cúpula estratégica. Das cinco configurações propostas por Mintzberg, é a burocracia mecanizada que mais enfatiza a divisão de trabalho, a diferenciação entre as unidades e o con- trole sobre o processo. Existe uma verdadeira obsessão pelo controle, de modo a tentar eliminar ao máximo a existência de incerteza, de modo que a máquina buro- crática possa operar suavemente e sem interrupções. Os sistemas de controle tam- bém possuem a tarefa de conter o conflito existente entre as unidades. Não existe espaço para que as pessoas conversem sobre seus problemas. Ao contrário, nor- malmente a atmosfera é fechada e fortemente controlada, priorizando o desenrolar do trabalho. Essa obsessão pelo controle justifica a existência de uma assessoria de razoável tamanho, de forma que as tarefas que poderiam ser terceirizadas sejam, na verdade, "feitas em casa". A vantagem em não terceirizar está em reduzir as incerte- zas e minimizar as interrupções no sistema de fluxos. A grande preocupação da cúpula estratégica neste tipo de estrutura é manter a máquina burocrática funcionando continuamente e para isso é necessário grande dispêndio de energia por parte dos gerentes de topo na manutenção da união da es- trutura, em face aos freqüentes conflitos que emergem das diversas unidades da bu- rocracia mecanizada. Os gerentes do topo são os únicos generalistas na estrutura e, assim, os únicos capazes de ter uma visão geral do funcionamento da organização. Assim, cabe a esses gerentes a coordenação entre as unidades via supervisão dire- ta. Poder-se-ia supor que tal coordenação fosse efetuada via ajustamento mútuo en- tre as unidades altamente diferenciadas no nível intermediário. Entretanto, a elevada padronização, a inibição da comunicação informal, o elevado senso de unidade de comando e a alta centralização vertical da estrutura favorecem a supervisão direta em detrimento do ajustamento mútuo. Na burocracia mecanizada, o poder formal es- tá concentrado na cúpula estratégica, mas existe um poder informal nas mãos dos analistas da tecno-estrutura. A elaboração da estratégia é feita de cima para baixo, com grande ênfase no planejamento para a ação. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 28 As condições para a burocracia mecanizada ocorrer incluem uma organização já madura e grande, com um sistema técnico regulado e não automatizado (pois a automatização aboliria o trabalho operacional rotineiro), que atue num ambiente sim- ples e estável, com elevado grau de controle externo (daí a obsessão pelo controle). A condição que a organização seja grande e madura se justifica pela necessidade de se possuir um volume de trabalho operacional mínimo que possibilite a repetição e a padronização, e pelo fato da organização ter idade suficiente para já ter se deci- dido sobre os padrões que deseja adotar. O sistema técnico regulador aumenta a rotina do trabalho, permitindo sua formalização. O ambiente precisa ser simples e estável porque a padronização existente numa burocracia mecanizada só pode ocor- rer quando as tarefas são simples, facilmente previsíveis e repetitivas, o que é im- possível em um ambiente complexo e dinâmico. Por ter se criado em um ambiente estável, a burocracia mecanizada busca ampliar seu controle para fora da sua orga- nização, tentando regulá-lo de modo a manter o status quo ao máximo, sem que su- as operações rotinizadas e padronizadas sofram perturbações. Outra condição que é comum na burocracia mecanizada é o controle externo. Quanto mais controlada externamente é uma organização, mais sua estrutura é centralizada e formalizada. Órgãos públicos são demasiadamente e com freqüência burocratizados justamente para que haja maior controle de suas ações perante o público. Entretanto, tem se demonstrado que a burocracia demasiadamente rígida permite nichos para manipu- lação e que muitas vezes é melhor adotar estrutura mais dinâmica, clara e transpa- rente, sem necessariamente a rigidez e o controle existentes na burocracia mecani- zada. Quando um conjunto integrado de tarefas simples e repetitivas deve ser reali- zado de forma precisa, a burocracia mecanizada é a estrutura mais eficiente. Entre- tanto, ela apresenta alguns problemas, tais como: o tratamento das pessoas como instrumentos e como classes de posições e funções, ao invés de indivíduos, o que destrói o significado do trabalho em si; a baixa comunicação e a alta especificidade das funções, impedindo a coordenação e incentivando a existência de "feudos"; o fluxo de informações hierárquicas acima faz com que a cúpula estratégica receba informações filtradas, atrasadas e muitas vezes irrelevantes e abstratas, o que atra- palha a qualidade das decisões tomadas e torna a burocracia mecanizada mal ta- lhada para mudar de estratégia, pois é uma organização voltada para desempenho, e não para resolução de problemas, dado que seu forte é a eficiência, ao invés da inovação. Características da Burocracia Profissional Principal Mecanismo de Coordena- ção: Padronização das habilidades. Componente-chave da Organização: Núcleo operacional. Principais Parâmetros para Delinear: Formação; especialização horizontal do trabalho; des- centralização horizontal e vertical. Fatores de Contingência: Ambiente complexo e estável; sistema técnico não sofisticado; acompanha a moda. A burocracia profissional se apóia na padronização das habilidades dos peri- tos e especialistas, aqui denominados profissionais. A padronização das habilidades permite que os profissionais consigam se coordenar por saber exatamente o que IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 29 esperar de seus colegas de trabalho. O treinamento inicial é obtido pela educação em universidades, escolas técnicas ou instituições que programam formalmente as habilidades e conhecimentos que compõem o perfil daquele profissional. O treina- mento no serviço – onde é aplicado, na prática, o conhecimento adquirido – é acom- panhado por outros profissionais mais experientes e completa o processo de doutri- nação. A associação profissional examina o candidato para determinar se tem co- nhecimentos, habilidades e normas para ser admitido na profissão. Enquanto a bu- rocracia mecanizada gera seus próprios padrões, via tecno-estrutura, a burocracia profissional tem seus padrões originados fora de sua estrutura, nas associações pro- fissionais. Enquanto a primeira se apóia na autoridade de natureza hierárquica (po- der e status do cargo), a última enfatiza a autoridade de natureza profissional, pelo poder da perícia. Os profissionais atuam no núcleo operacional da estrutura com grande auto- nomia, uma vez que o trabalho é altamente especializado na dimensão horizontal. O controle sobre seu próprio trabalho significa que o profissional atua relativamente in- dependente de seus colegas, mas de perto com os clientes aos quais serve. O pro- fissional no núcleo operacional possui duas tarefas básicas: diagnosticar, isto é, classificar as necessidades dos clientes em termos de uma contingência, julgando qual o programa padrão é o mais adequado para ser utilizado e aplicar ou executar o programa. Como os clientes são classificados pelo profissional, ou se auto-rotulam, a estrutura da burocracia profissional apóia-se simultaneamente na base funcional e na unidade por mercado. O grande poder existente no núcleo operacional faz com que essa seja a par- te-chave da organização. A única outra parte também completamente elaborada é a assessoria de apoio, apesar do seu foco ser o servir bem ao núcleo operacional. A tecno-estrutura não é altamente elaborada porque há baixa necessidade de plane- jamento e formalização do trabalho dos profissionais. A linha intermediária é estrei- tada porque existe pequena necessidade de supervisão direta dos operadores e o ajustamento mútuo entre eles favorece a existência de unidades operacionais muito grandes, com poucos gerentes na primeira linha de supervisão e, por esse motivo, também acima deles. Assim, a figura abaixo mostra a burocracia profissional como uma estrutura achatada (descentralizada vertical e horizontalmente), com uma fina linha intermediária, uma fraca tecno-estrutura e uma bem desenvolvida assessoria de apoio para dar o devido suporte aos profissionais do núcleo operacional. A burocracia profissional é uma estrutura grandemente democrática para os profissionais do núcleo operacional, pois eles não apenas controlam seu próprio tra- balho, como também buscam o controle coletivo sobre as decisões administrativas que lhes afetam, garantindo que a linha intermediária seja devidamente assessorada pelos seus próprios pares. Os instrumentos de interligação são importantes na linha intermediária, onde existem muitas forças-tarefa e comissões permanentes, cujo ob- jetivo é bem servir os profissionais e, indiretamente, os clientes. A democracia em geral é só para a oligarquia de profissionais. Na assessoria, existem unidades de suporte administradas pelo topo da hierarquia, aparentando ser constelações buro- craticamente mecanizadas, nas quais prevalece a supervisão direta como principal mecanismo de coordenação. Portanto, existe uma democracia de baixo para cima para os profissionais e uma hierarquia burocraticamente mecanizada de cima para baixo para a assessoria de apoio. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 30 Apesar do administrador profissional não poder controlar os profissionais dire- tamente, ele desempenha papéis que, na estrutura, lhe proporcionam considerável poder indireto, tais como: resolver perturbações entre os próprios profissionais, e en- tre os profissionais e a assessoria, por intermédio de negociação com as partes em conflito e representar a organização para o ambiente externo, servindo de figura de proa, mantendo contatos de ligação e negociando com órgãos externos. Entretanto, o administrador só mantém seu poder até quando os profissionais o percebem como servindo de forma eficaz aos seus interesses. A formulação das estratégias na buro- cracia profissional consiste nas estratégias pessoais dos indivíduos no interior da or- ganização, bem como as estratégias das associações profissionais. As condições para a burocracia profissional existem onde haja uma organiza- ção dominada por trabalhadores com habilidades difíceis de aprender e com proce- dimentos bem definidos e específicos. Para tanto, a organização deve atuar em um ambiente complexo (que exija a utilização de procedimentos difíceis) e estável (que permita que as habilidades dos profissionais se tornem bem definidas e padroniza- das). Os fatores idade e dimensões da organização são menos relevantes para a existência da burocracia profissional do que seu ambiente. Quanto ao sistema técni- co, ele é não-regulado e não-sofisticado. Apesar da tecnologia da organização (sua base de conhecimento) ser sofisticada, seu sistema técnico (conjunto de instrumen- tos utilizados para aplicar essa base de conhecimento) é simples, de modo a con- servar a autonomia do profissional, impedindo-o de se tornar operador de uma má- quina muito sofisticada, por exemplo. A burocracia profissional é democrática por possuir profissionais que gozam de grande autonomia para atender seus clientes à sua própria maneira, respeitando os padrões estabelecidos pela profissão e por permitir que os profissionais aperfei- çoem suas habilidades enquanto exercem suas profissões. Assim, os profissionais são altamente motivados e responsáveis, dedicados ao seu trabalho e aos seus cli- entes. Entretanto, nas características de democracia e autonomia existem os maio- res problemas da burocracia profissional, pois não há controle do trabalho, além da- quele da profissão em si, possibilitando que os profissionais omitam suas deficiên- cias. A autonomia não somente permite a certos profissionais inescrupulosos e in- competentes ignorar as necessidades de seus clientes, como também muitas vezes os encoraja a ignorar as necessidades da organização. Outro problema é a fraca capacidade de resolver muitas necessidades que nascem na organização, decorren- tes da frágil coordenação desempenhada pela padronização de habilidades. Assim como a burocracia mecanizada, a burocracia profissional também é mais adequada para produzir resultados padronizados do que para resolver proble- mas. A questão da classificação, ou diagnóstico, realizada pelo profissional, faz com que novos problemas sejam incluídos em velhas rotulações, causando grandes pro- blemas. Enquanto o ambiente se mantém estável, a burocracia profissional não en- contra problemas, pois continua refinando suas habilidades e seu sistema de rótulos (diagnósticos). Já em condições dinâmicas, as mudanças exigem novas habilidades e novas formas de classificar as questões, bem como esforços criativos por parte de equipes multidisciplinares, o que demanda outro tipo de configuração (a adhocracia). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 31 Características da Forma Divisionalizada Principal Mecanismo de Coordena- ção: Padronização dos resultados. Componente-chave da Organização: Linha intermediária. Principais Parâmetros para Delinear: Agrupamento das unidades na base de mer- cados; sistema de controle de desempenho; descentralização vertical limitada. Fatores de Contingência: Mercados diversificados (particularmente no que diz respeito aos produtos e serviços); organização mais velha, de grande porte; necessidade da linha intermediária tem em adquirir poder; acompanha a moda. A forma divisionalizada consiste num conjunto de entidades praticamente au- tônomas, acopladas a uma estrutura administrativa central. Tais entidades são uni- dades na linha intermediária, denominadas divisões, que respondem ao escritório central. O fluxo do poder é de cima para baixo. O relacionamento entre a divisão e o escritório central remete à relação entre a cúpula estratégica e a linha intermediária. As unidades são agrupadas pelo topo da linha intermediária com base no mercado. Cada divisão possui suas próprias funções operacionais, o que minimiza a interde- pendência entre as divisões, permitindo-lhes atuar de forma praticamente autônoma, sem que haja necessidade de coordenação entre si. Essa estrutura permite que um escritório central tenha grande amplitude de controle sobre diversas divisões, ainda que o poder esteja descentralizado com uma limitação vertical, uma vez que os pou- cos gerentes do escritório central delegam poder aos gerentes que administram as divisões. Mesmo diante da grande autonomia de cada divisão, o escritório central consegue controlar cada uma delas por meio do sistema de controle de desempe- nho. Assim, as decisões são tomadas pelas divisões, mas os resultados dessas de- cisões são monitorados pelo escritório central. Portanto, o primeiro mecanismo de coordenação na forma divisionalizada é a padronização de resultados e o parâme- tro-chave para delinear é o sistema de controle de desempenho. No entanto, exis- tem outros mecanismos de coordenação presentes nesta configuração, tais como a padronização das habilidades dos gerentes de cada divisão e a supervisão direta. No primeiro caso, os gerentes são tão importantes para a organização, que no tipo puro da forma divisionalizada a parte mais importante é a da linha intermediária. Ca- be ao escritório central o treinamento desses gerentes divisionais e a doutrinação necessária para garantir que esses gerentes persigam metas mais amplas, no lugar de metas “paroquiais” de suas próprias divisões. O segundo caso, isto é, o meca- nismo de coordenação da supervisão direta, ocorre quando da interferência e substi- tuição do gerente divisional por parte do escritório central. Teoricamente, a forma divisionalizada pode ser superposta a qualquer outra configuração. No entanto, ela trabalha melhor com as estruturas da burocracia me- canizada em suas divisões. Cada divisão é planificada com base na configuração existente na burocracia mecanizada. Como já mencionado, a chave do funciona- mento da estrutura divisionalizada é a padronização de resultados, o que exige uma boa definição dos padrões de desempenho nos quais cada divisão é tratada como IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 32 um único sistema integrado com metas particulares e quantitativas. As configura- ções orgânicas (estrutura simples e adhocracia), que atuam em ambientes dinâmi- cos, não conseguem estabelecer tais padrões em função da constante mudança no meio em que atuam. Na burocracia profissional, a complexidade do trabalho também dificulta o estabelecimento de padrões de desempenho. Portanto, só a burocracia mecanizada atua em um ambiente estável o suficiente e desempenha tarefas sim- ples o suficiente para que possa adotar padrões de desempenho operacionais. A forma divisionalizada conduz as divisões para que sejam mais centralizadas e mais formalizadas do que seriam como entidades independentes. O sistema de controle da forma divisionalizada enfraquece a estrutura orgânica e profissional da divisão. Na forma divisionalizada, as divisões têm poder para operar seus próprios negócios por meio do controle das operações e determinação das estratégias para os mercados sob suas responsabilidades. O escritório central, por sua vez, retém um total de seis atividades que lhe permitem reter poderes. São elas: Escolha e administração da carteira estratégica da organização – estabeleci- mento, aquisição, venda e fechamento de divisões, a fim de mudar o mix de produ- tos e de mercados. ! Alocação de recursos financeiros globais – cabe ao escritório central dis- tribuir os recursos financeiros entre as divisões. ! Delineamento do sistema de controle de desempenho – em geral a avalia- ção de projetos das divisões por parte do escritório central se dá mais em bases financeiras que em bases de estratégia-produto. Para tanto, o escri- tório central conta com a participação da tecno-estrutura para o estabele- cimento de medidas de desempenho e períodos de reporte. ! Substituição e nomeação dos gerentes das divisões – apesar da estrutura impedir a intervenção direta do escritório central sobre as decisões opera- cionais de cada divisão, cabe ao primeiro definir quem ocupará o cargo de gerente da divisão. O sucesso na forma divisionalizada depende da esco- lha certa de gerentes gerais capazes de conduzir bem a operação de cada divisão, além de seguir as metas da organização como um todo. ! Monitoramento do comportamento das divisões em bases pessoais – ape- sar do escritório central poder contar com inúmeros relatórios e informa- ções sobre o desempenho das divisões, muitas vezes o gerente divisional pode manipular as informações fornecidas. Para não correr esse risco, ca- be ao escritório central monitorar as atividades divisionais por intermédio de visitas periódicas às divisões, a fim de conhecê-las melhor e poder pre- ver problemas e desafios futuros. Esse conhecimento em base pessoal, remetendo praticamente à supervisão direta, possibilita aos membros do escritório central avaliarem as requisições efetuadas pelas divisões para aplicações de capital e conhecerem as pessoas das divisões no caso de se tornarem necessárias à realização de substituições de pessoal. ! Provisionamento de serviços coletivos de suporte para as divisões – os serviços que devem ser oferecidos através de uma série de divisões são concentrados em unidades isoladas ou no escritório central. O escritório central é mostrado em três partes: uma pequena cúpula estraté- gica dos gerentes de topo; uma pequena tecno-estrutura à esquerda, dedicada ao delineamento e operação do sistema de controle de desempenho e programas de IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 33 desenvolvimento administrativo; e um grupo um pouco maior à direita, representan- do a assessoria de apoio. A linha intermediária é bastante desenvolvida para enfati- zar a importância dos gerentes divisionais na estrutura. As divisões são representa- das como burocracias mecanizadas, em função da tendência em adotar essa confi- guração por parte das divisões que perdem um pouco de sua autonomia para os pa- drões de desempenho estabelecidos pela hierarquia supra. A forma divisionalizada ocorre quando existe uma diversidade de mercados, pois a organização cria uma unidade para tratar de cada mercado e mantém centra- lizada a administração de sua carteira estratégica. Existe uma relação biunívoca en- tre a divisionalização e a diversificação: ao passo que a estrutura segue a estratégia, ou seja, a divisionalização ocorre como um resultado da diversificação estratégica, a divisionalização também encoraja uma diversificação posterior em função da facili- dade que o escritório central tem em adicionar novas divisões que atendam a novos possíveis mercados. Como os gerentes intermediários recebem treinamento ade- quado, a estrutura divisionalizada serve como uma permanente “escola de gerên- cia”, a qual disponibiliza talentos experientes que podem ser agrupados em pouco tempo, a fim de gerenciar uma nova atividade organizacional. Outro fator situacional que viabiliza a estrutura divisionalizada é a segmenta- ção do sistema técnico da organização, um para cada divisão. Normalmente, isso ocorre quando existem linhas de produtos distintas, que demandam sistemas técni- cos diferentes. O fator ambiental que mais pesa na opção da adoção da forma divisionalizada é a diversidade de mercado e, em particular, a diversidade de produto. Ao contrário dos outros tipos, fatores ambientais como estabilidade, dinamismo, complexidade e simplicidade não são tão determinísticos como a diversidade de mercado. Quanto à idade e dimensão, quão maior uma organização, maior sua propensão a diversificar para depois divisionalizar. A divisionalização, por sua vez, cria um quadro de geren- tes gerais agressivos que pressionam pela diversificação adicional, com o objetivo de crescimento contínuo. Assim como o porte, a idade também é associada com a forma divisionalizada. Nas organizações mais antigas os gerentes comumente ficam entediados com mercados tradicionais e buscam variedade provocando a diversifi- cação. A forma divisionalizada oferece quatro vantagens em relação à estrutura fun- cional com operações integradas, resolvendo muitos dos problemas econômicos e- xistentes na burocracia mecanizada. São elas: a alocação eficiente de capital por parte do escritório central, treinamento de gerentes gerais, a diversificação do risco por mercados diferentes e o fato da forma divisionalizada ser respondente estrategi- camente (enquanto as divisões fazem a sintonia fina de suas máquinas burocráticas, o escritório central se ocupa da carteira estratégica da organização). Para avaliar a eficácia da aglomeração existente na forma divisionalizada, é necessário verificar a real contribuição do escritório central para as divisões. Os ge- rentes do escritório central exercem pressão para centralizar certas decisões, usur- pando os poderes das divisões. Mas como é impossível o gerente do escritório cen- tral estar mais a par do que se passa com o produto-mercado da divisão do que o próprio gerente divisional, os gerentes do escritório central devem lutar contra o de- sejo de centralizar, tendo em mente não administrar as divisões e eliminar eventuais duplicidades entre as divisões. Ao contrário, os gerentes do escritório central devem se restringir a estabelecer os objetivos para as divisões, monitorar seu desempenho, manter limitados contatos pessoais com os gerentes divisionais e aprovar as maio- IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 34 res alocações de capital das divisões. Como os gerentes do escritório central não podem gerenciar as divisões, se estas apresentam problemas, existem duas alterna- tivas: substituir o gerente da divisão-problema ou extinguir a divisão-problema do conglomerado. O sistema de controle do desempenho da forma divisionalizada é um dos seus parâmetros fundamentais para delinear e também a sua principal fonte de efi- ciência econômica. Entretanto, esse sistema produz sérias conseqüências sociais. O foco em medidas de desempenho quantitativas gera um viés financeiro que exclui metas não mensuráveis, como qualidade do produto, satisfação do cliente, proteção ou melhoria do ambiente. Assim, as metas financeiras e econômicas excluem as metas sociais. Como toda decisão estratégica da grande corporação envolve conse- qüências tanto sociais quanto econômicas, o sistema de controle da forma divisiona- lizada a impulsiona para inibir sua responsividade social em prol de melhores resul- tados financeiros. Outro problema da forma divisionalizada está na concentração do poder em grandes conglomerados, que pode comprometer a livre concorrência, e significar custos sociais mais sérios por causa da burocratização intrínseca a essa forma, em função da maior formalização do comportamento organizacional e centralização das decisões, o que aumenta a concentração do poder de grandes decisões em poucas mãos. Esta concentração de poder também conduz para a aglomeração, para a divi- sionalização e para a concentração de poder em esferas externas à organização, de forma que a sociedade se organize em órgãos com poderes capazes de contraba- lançar aqueles das grandes corporações. Características da Adhocracia Principal Mecanismo de Coordenação: Ajustamento Mútuo. Componente-chave da Organização: Assessoria de apoio (na Adhocracia Ad- ministrativa, juntamente com o núcleo operacional na Adhocracia Operacional). Principais Parâmetros para Delinear: Instrumentos de interligação; estrutura orgânica; descentralização seletiva hori- zontal; especialização do trabalho; trei- namento; agrupamento das unidades na base das funções e dos mercados (pro- dutos). Fatores de Contingência: Ambiente complexo, dinâmico (por vezes díspare); organização jovem (sobretudo na Adhocracia Operacional); sistema téc- nico sofisticado e muitas vezes automati- zado (na Adhocracia Administrativa); se- gue a moda. É uma configuração capaz de agregar especialistas de diversas áreas em e- quipes de projeto ad hoc, isto é, para determinado fim específico. Possui uma estru- tura basicamente orgânica, com baixa formalização do comportamento, grande es- pecialização horizontal do trabalho (baseada em treinamento formal), tendência para agrupar os peritos em unidades funcionais ou em pequenas equipes de projeto ba- seadas no mercado, utilizando como instrumento de interligação o ajustamento mú- tuo intra e entre equipes. Trata-se de uma configuração fluida, dinâmica, flexível e IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 35 orgânica, que busca promover sofisticadas inovações. Para tanto, foge de padrões preestabelecidos e das armadilhas de uma estrutura burocrática, tais como nítida divisão do trabalho, alta diferenciação de unidades, grande formalização dos com- portamentos, ênfases nos sistemas de planejamento e controle. De todas as confi- gurações, a Adhocracia é a que demonstra maior irreverência para com os princípios clássicos da administração, principalmente para com a unidade de comando e os sistemas regulados. Como é uma estrutura voltada para a inovação, as informações e os processos decisórios correm flexíveis e informais, se necessário passando por cima da cadeia de autoridade. Tal como na Burocracia Profissional, a Adhocracia admite e dá poder aos peritos (profissionais com conhecimentos e habilidades ad- quiridos por intermédio de treinamento formal). Entretanto, enquanto a coordenação na primeira configuração ocorre via padronização de habilidades, na última tal me- canismo de coordenação compromete sua vocação empreendedora e inovadora. Os conhecimentos e habilidades dos peritos devem servir como base para construir mais conhecimento, decorrente da interdisciplinaridade intrínseca à Adhocracia, a qual reúne profissionais de diversas áreas de conhecimento ao redor de um deter- minado projeto ou inovação específica. Esses profissionais devem manter laços com seu campo de origem, ao mesmo tempo em que devem se desprender de suas raí- zes para que fiquem abertos às idéias de peritos de outras áreas. Por isso, a Adho- cracia tende a utilizar, concomitantemente, as bases funcionais e por mercado em uma estrutura matricial, que agrupa os peritos em unidades funcionais para fins de administração interna (admissões, comunicações etc.) e são, efetivamente, destaca- dos para equipes de projeto coordenadas por ajustamento mútuo, podendo adotar a figura do gerente integrador para coordenar os esforços entre as unidades funcio- nais e as equipes de projeto (forças-tarefa). Na Adhocracia existem muitos gerentes: gerentes funcionais, gerentes integradores e gerentes de projeto, o que faz com que a amplitude de controle seja aparentemente baixa nesta configuração. A descentrali- zação é seletiva nas dimensões vertical e horizontal, pois o poder para a tomada de decisão fica distribuído entre os gerentes e não-gerentes de todos os níveis da hie- rarquia, dependendo do tipo de decisão que deve ser tomada, pois, ninguém mono- poliza o poder para inovar. Existem dois tipos de Adhocracia: a Operacional e a Administrativa. A Adho- cracia Operacional inova e resolve os problemas diretamente em nome dos seus cli- entes. De fato, para cada Adhocracia Operacional, existe uma correspondente Buro- cracia Profissional que executa o mesmo trabalho com uma orientação mais estreita. Em face de problema colocado por cliente, a Adhocracia Operacional empenha-se num esforço de criação para encontrar solução nova, ao passo que a Burocracia Profissional classifica-o entre os casos conhecidos a que pode aplicar um programa- padrão. A Adhocracia Administrativa empreende os seus projetos para servir-se a si própria. E separa distintamente a sua componente administrativa do seu centro ope- racional. Este último está separado do resto da organização, de forma que a compo- nente administrativa que resta possa ser estruturada como uma Adhocracia. Esta separação pode ser efetuada de várias maneiras. Em primeiro lugar, o centro opera- cional pode ser estruturado como uma Burocracia Mecanizada, à parte da organiza- ção. Em segundo lugar, o centro operacional pode ser completamente suprimido e as suas atividades subcontratadas por outras organizações. Uma terceira forma de separação consiste na automatização do centro operacional. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 36 O controle sobre o processo de formulação da estratégia não se encontra cla- ramente localizado, nem na cúpula estratégica nem em parte alguma da organiza- ção. Aliás, é mais correto concebê-lo como um processo de formação da estratégia porque a estratégia, nestas estruturas, não é tanto formulada conscientemente pelos indivíduos como formada de maneira implícita pelas decisões que estes tomam, uma de cada vez. Os quadros dirigentes da cúpula estratégica da Adhocracia podem passar uma parte considerável do seu tempo a tratar das diferenças que surgem inevita- velmente nas escolhas estratégicas, assim como das numerosas perturbações que aparecem nestas estruturas fluidas. Os dirigentes de topo devem dedicar uma boa parte do seu tempo à direção dos projetos. Entretanto, o papel mais importante da direção na Adhocracia (e, particularmente, na Adhocracia Operacional) consiste em assegurar a ligação com o ambiente externo. A Adhocracia está claramente situada num ambiente que é, ao mesmo tempo, complexo e dinâmico. As disparidades no ambiente de uma organização encorajam- na a descentralizar-se em constelações de trabalho diferenciadas, isto é, a adotar a estrutura de uma Adhocracia Administrativa. Os conflitos e a agressividade são ele- mentos vitais na Adhocracia: o trabalho dos quadros consiste em canalizá-los para fins produtivos. A Adhocracia não é uma estrutura competente para fazer coisas co- muns, em função do custo elevado das comunicações, das desequilibradas cargas de trabalho. 1.7 ADMINISTRAÇÃO DA MUDANÇA ORGANIZACIONAL: MUDANÇA REATIVA E PRÓ-ATIVA Diante das exigências do ambiente onde as organizações atuam, as mudan- ças têm sido questão recorrente. Grande parte da literatura a respeito do tema considera que a capacidade de uma organização em realizar mudanças é um dos fatores mais importantes para o seu sucesso. Silva (2001) ressalta que o tema mudança organizacional tem despertado o interesse de teóricos nas últimas décadas, produzindo uma quantidade considerável de reflexões, análises e proposições de soluções com o objetivo de ajudar as orga- nizações a promoverem mudanças de forma eficaz e também de forma pouco trau- mática. Porém, a dificuldade em compor quadro teórico integrado e as experiências mal-sucedidas com relação à aplicação desta teoria, levou ao crescimento do volu- me de críticas. Neste item, para que sejam reduzidas as dificuldades e reduzidos os riscos associados à mudança organizacional, serão apresentados alguns modelos para uma administração pró-ativa. A primeira questão abordada é: qual a diferença entre uma mudança reativa e uma mudança pró-ativa? Segundo Bateman e Snell (1998): ! A mudança reativa ocorre quando alterações no ambiente já afetaram o desempenho da organização. Elas são movidas por problemas, tendem a IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 37 ser incrementais, a imitar outras mudanças e resolvem o problema tardia- mente. Geralmente, a mudança reativa tem alcance menor, impacto menor e claramente indica que a empresa é seguidora e não líder. ! A mudança pró-ativa é iniciada pela direção antes que o problema ocorra e, muitas vezes, surge da identificação e da criação de oportunidades. Na maioria das vezes, a mudança pró-ativa é inventiva e empreendida antes que os concorrentes o façam, e não segue modismos. Ela não ocorre de- vido à percepção de uma necessidade premente. Com o intuito de categorizar o conjunto de teorias que têm sido desenvolvidas na literatura sobre mudança nas organizações, Van de Ven & Poole (1995) identifi- cam quatro diferentes teorias com as quais a questão da mudança tem sido tratada: teoria do ciclo de vida, teoria teleológica, teoria dialética e teoria evolucionária. ! Teoria do ciclo de vida: a mudança é vista como um processo seqüencial de eventos que ocorre numa ordem lógica, previsível e convergente. Sob essa ótica, a mudança é vista como algo iminente, que conduz a organiza- ção de um determinado ponto de partida até um ponto final. ! Teoria teleológica: a mudança é socialmente construída em torno da e- xistência de metas comuns, que fazem com que o grupo de indivíduos em uma dada organização esteja sempre se mobilizando, de forma harmônica e coletiva. Neste caso, não existe a previsibilidade da mudança, uma vez que os resultados do processo são construídos passo a passo, por meio do aprendizado sobre os eventos da realidade. ! Teoria dialética: vê a mudança como um processo de síntese entre as te- ses e antíteses geradas pela existência de entidades oponentes. A mu- dança também é vista como um processo socialmente construído, porém, com um foco não-harmônico, partindo da visão de que a entidade organi- zacional existe em um mundo pluralista de eventos e forças oponentes ou de valores contraditórios que competem entre si por dominação e controle. ! Teoria evolucionária: percebe a mudança como um processo evolutivo e acumulativo de mudanças menores que vão ocorrendo nos processos de variação, seleção e retenção, os quais modificam a configuração do ambi- ente. Segundo Silva (2001), quando uma mudança organizacional é analisada, de- ve-se levar em consideração quatro dimensões: natureza, compatibilidade, tempo da mudança e processo. 1. Quanto à natureza de mudança: ! pode ser parcial ou total, conforme a superfície de impacto; ! pode ser superficial, afetando apenas o nível das práticas; ou profun- da, afetando os postulados de base da estratégia, conforme a profun- didade da mudança; ! pode ser marginal ou radical, conforme as diferenças entre os estágios sucessivos. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 38 2. Quanto à compatibilidade ou à possibilidade de articulação com a es- tratégia atual: ! compatível; ou, ! incompatível. 3. Quanto ao tempo da mudança: ! no que diz respeito ao ritmo: pode ser em ritmo lento ou ritmo rápido; ! no que diz respeito à duração dos impactos: pode ser permanente ou temporária; ! no que diz respeito à urgência: pode possuir uma urgência percebida ou uma 4. Quanto ao processo de mudança: ! deliberada; ou, ! emergente As dimensões de mudança apresentadas podem ser aplicadas aos diferentes tipos de mudança, descritos por Giroux (1990) e citados por Silva (2001). Os tipos são: ! Ruptura: tipo de mudança revolucionária, profunda e radical, de imple- mentação incompatível com a estratégia atual, urgente e deliberada. Esse tipo de mudança implica uma transformação substancial da empresa, seja em resposta a uma crise interna, seja em resposta a uma descontinuidade no ambiente. O caráter crucial e a urgência da situação exigem tipo de a- ção imediata e tipo de ação enérgica, o que pode resultar em uma mudan- ça fortemente deliberada, imposta por novos dirigentes recrutados. ! Sobressalto: refere-se a uma mudança parcial, superficial, de implemen- tação compatível com a estratégia atual, urgente, temporária e deliberada. Possui característica transitória, que é marcada por uma transformação momentânea das atividades para adaptar a organização a uma variação pontual de seu ambiente. A margem de tempo estreita para a sua realiza- ção faz com que a tomada de decisão tenda a ser centralizada. ! Erosão: tipo de mudança total, profunda e marginal, de implementação compatível com a estratégia atual, lenta e emergente, que produz, a longo prazo, transformação global e radical, por acumulação de mudanças mar- ginais. Trata-se de uma mudança involuntária, ou mesmo inconsciente, in- fluenciada por grandes variações no ambiente e que tende a transformar a identidade, o domínio e as práticas organizacionais. ! Elaboração: é uma mudança evolutiva, gradual, durável, de implementa- ção compatível com a estratégia atual, que pode ser de naturezas parcial ou total, radical ou marginal e pode ser tanto emergente quanto delibera- da. Em geral, representa um refinamento da estratégia atual, podendo afe- tar os seus mais diferentes níveis. Esse tipo de mudança é justificado pela necessidade de descoberta e aprendizado, à medida que emergem as e- xigências constantemente renovadas do ambiente em transformação. Po- IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 39 de ser dirigida pelo topo da organização, ou pode emergir da base, ou ain- da pode ser simultaneamente fruto dos dois movimentos. A mudança pode ser conceituada de diversas formas, sob variados aspectos e graus de intensidade. Weick & Quinn (1999) salientam a distinção entre mudanças episódica, des- contínua e intermitente, e mudanças contínua, evolutiva e incremental. O con- ceito de mudança episódica é utilizado para agrupar os tipos de mudanças que não são freqüentes, que são descontínuas e intencionais, as quais ocorrem durante pe- ríodos de divergência, quando a organização modifica suas condições de equilíbrio. É chamada de episódica porque tende a ocorrer em vários períodos de tempo, du- rante os quais acontecem alterações importantes precipitadas por eventos externos (como a mudança de uma tecnologia) ou internos (como a mudança de pessoas- chave). Para os autores, essa distinção entre mudança episódica e contínua reflete di- ferenças nas perspectivas do observador. No nível macro de análise, quando os ob- servadores examinam o fluxo de eventos que constituem a organização, eles vêem o que parece ser ação repetitiva e rotineira. Mas numa visão no nível micro de análi- se, revela adaptação e ajustamento contínuos. Porém, embora esses ajustes sejam pequenos, eles também tendem a ser freqüentes e contínuos, o que significa que eles são capazes de alterar a estrutura e a estratégia. Por isso, alguns pesquisado- res tratam esses ajustes contínuos como a essência da mudança organizacional. Outros consideram-nos como pequenas variações incrementais que ocorrem em pe- ríodos de convergência, que é interrompida esporadicamente por épocas de diver- gência descritas por palavras como revolução, mudança profunda e transformação. Esses períodos de divergência podem ser entendidos como mudanças radicais. Pettigrew (1996) aborda a questão da mudança de uma forma mais abran- gente. Segundo o autor, para que haja uma mudança na organização é preciso ha- ver uma interação contínua entre as idéias a respeito do contexto da mudança, o processo de mudança e o seu conteúdo. Para a formulação do conteúdo de qual- quer mudança é preciso controlar o contexto e o processo. O contexto externo refe- re-se ao ambiente social, econômico, político e competitivo em que a empresa atua. O contexto interno refere-se à estrutura, à cultura organizacional e ao contexto polí- tico da empresa, através do qual as idéias de mudança acontecem. O processo de mudança refere-se às ações, reações e interações das várias partes interessadas. Pettigrew (1996) ressalta que uma das fraquezas da literatura existente, es- pecialmente a relacionada à mudança estratégica, é seu enfoque apenas na ligação entre o contexto externo e o conteúdo e, por esta razão, muitos planejadores depa- ram-se com a falta de aceitação das mudanças propostas. Estudos de Pettigrew et alii (1996) introduziram um novo conceito a respeito de processos administrativos de mudança: (...) a mudança estratégica deve ser vista agora como um processo humano complexo em que todos desempenham sua parte: a percepção diferenciada, as buscas por eficiência e poder, as habilidades de liderança visionária, a du- ração das mudanças e processos sutis que gradativamente preparam o mo- mento propício de apoio para a mudança e, então, a implementação vigorosa da mudança. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 40 De acordo com Tomei (2002), sintetizando o conceito de alguns autores, a e- laboração de uma mudança estratégica envolve três perspectivas principais: o as- pecto técnico, o aspecto político e o aspecto cultural. O técnico está relacionado à aquisição e aplicação de conhecimento científico para desenvolver a organização. O político atua com as diferentes forças de poder e busca o equilíbrio entre elas. E no aspecto cultural, a organização atua como um sistema de valores e símbolos compartilhados pelas pessoas formando a cultura da empresa. Não contemplando todas estas perspectivas, a estratégia tende a se distanci- ar do seu objetivo final. Deve-se buscar o equilíbrio entre estas três forças, não ape- nas na promoção de uma mudança estratégica, mas também no desenvolvimento da organização ao longo de sua existência. Portanto, a função da alta gerência é desenvolver este complexo trio de forma ajustada. Os momentos de crise vivenciados pelas organizações muitas vezes atuam como catalisadores das mudanças. Estas crises podem ser provocadas por fatores externos, como mudanças na economia e na política; ou internos, como o surgimen- to de um novo líder. A mudança é sempre um momento de ruptura, de transforma- ção, de criação, portanto, envolve risco, principalmente com relação às transforma- ções relacionadas à estrutura de poder (Tomei, 2002). Fleury (1996), por sua vez, define as mudanças como mudança revolucio- nária e mudança gradual, que podem ser geradas a partir de problemas no ambi- ente externo à organização ou por problemas internos. A autora explica que a mu- dança revolucionária é aquela em que “os novos valores são antagônicos aos ante- riores, gerando um processo radical de destruição dos elementos simbólicos, de re- definição completa das práticas organizacionais”. E que a mudança gradual se dá quando “novos valores propostos são complementares aos existentes, ampliando leques de alternativas existentes para a solução de problemas”. Morgan (1996) identifica duas linhas às quais se recorre para descrever a mudança. A primeira, de caráter mais descritivo, analisa os dados concretos da mu- dança, como a tecnologia, o mercado e outros fatores socioeconômicos. A segunda é mais analítica e tenta caracterizar a mudança em termos de conceitos mais abstra- tos. O autor afirma que esta visão teve sua importância para classificar a natureza da mudança, mas não foi capaz de identificar sua dinâmica básica. Para Morgan, o mais importante é compreender a lógica da mudança, o que torna possível “adminis- trá-la em um nível mais elevado de pensamento e ação”. Segundo o autor, a mudança tem uma lógica dialética em que tensão e con- tradição sempre estão presentes, mas a sua clareza varia de acordo com as oposi- ções que se manifestam. Entre as definições, pode-se perceber a existência de fatores que levam a in- ferir que a mudança não pode ser considerada isoladamente ou por partes. A mu- dança deve ser compreendida em seu contexto e com suas implicações. A abordagem da mudança nas organizações demanda que os problemas or- ganizacionais não podem ser resolvidos por partes, pois, há uma inter-relação muito forte entre os diversos processos, áreas e públicos das empresas. Assim, a mudan- ça é orgânica. Numa organização, não se pode isolar a mudança, pois tudo que ocorre com uma empresa, interna e externamente, afeta toda a organização. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 41 O sucesso da mudança, portanto, depende da integração entre todos os ele- mentos envolvidos no negócio. Devem ser consideradas as forças externas – con- corrência, variações de mercado e necessidades dos clientes – e devem ainda ser considerados os processos internos da organização, tais como gestão de desempe- nho, comunicação, trabalho em equipe, gestão da informação, treinamentos e capa- cidades dos gerentes. Entretanto, na maioria das vezes, os gestores estão preocupados fundamen- talmente com os custos e muitas vezes se esquecem do mais importante agente da mudança: o público interno. Para Gouillart e Kelly (1995), o segredo da vida eterna da empresa estaria em sua capacidade de orquestrar a transformação simultânea de todos os seus siste- mas numa busca unificada de metas comuns. Para tanto, os sistemas precisam ser examinados e trabalhados concomitantemente, sempre com a preocupação de man- tê-los coesos durante a transformação. A base para que a empresa alcance a vida eterna é o seu capital humano. Considerando que a mudança nas organizações determina novas práticas e valores, automaticamente ela tem impacto sobre a cultura organizacional. Assim, to- da mudança organizacional é uma mudança cultural. O processo de mudança não deve ser considerado apenas como um proble- ma de tecnologias, estruturas, processos e motivação dos empregados. Deve ser considerado também o impacto destas mudanças nos valores da organização, pre- vendo quais serão os comportamentos desejados na nova situação e descobrir co- mo desenvolvê-los, pois, sem o apoio da mudança cultural, outras mudanças não têm sustentação. Contudo, Morgan (1996) alerta que as descobertas sobre a cultura, como um importante fator de desempenho da organização, têm feito com que muitos adminis- tradores e teóricos em administração se apressem em encontrar formas de adminis- trar a cultura corporativa. A maior parte deles está agora consciente das conseqüên- cias dos valores organizacionais e muitas organizações começaram a explorar o pa- drão de cultura e de subcultura que molda as ações do dia-a-dia. De um lado, isso pode ser visto como uma evolução positiva, uma vez que se trata de reconhecer que a natureza verdadeiramente humana das organizações é a necessidade de construí- la em função das pessoas e não das técnicas. Existe, todavia, certo número de ris- cos, como o de tentar manipular a realidade da organização e dos empregados. Segundo Willcoxson e Millett (2000), os agentes de mudança, ou autores que utilizam a perspectiva unitarista (cultura organizacional unificada), procedem às mu- danças da organização de cima para baixo. Sob esta perspectiva, a unidade, essen- cial para a organização, só é possível através do líder ou do grupo que exerce a lide- rança que, de forma efetiva, controla e altera as direções da organização. Para os que seguem a perspectiva pluralista e reconhecem a existência de diversas subculturas em uma mesma organização, o sucesso da organização está na liderança e gerenciamento eficiente da diversidade, e as mudanças e manuten- ção da cultura devem ser feitas através de programas desenhados para os diferen- tes segmentos da organização. Por fim, Tomei (2002) ressalta que uma mudança estratégica envolve muitas ações e, em geral, demanda muitos anos para que seja efetivamente completada. Isto se deve ao fato de que uma mudança estratégica exige que crenças básicas da IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 42 organização sejam reavaliadas, ou seja, a cultura organizacional. Esta mesma cultu- ra pode ser o inibidor do sucesso de um processo de mudança se a empresa não conhecer a sua própria cultura. Esta influência negativa ocorre através de uma dis- torção, onde a organização perde o foco da realidade. Portanto, organizações que não conhecem a sua cultura tendem a tomar decisões baseadas em realidades dis- torcidas e não nas reais condições exigidas pelo mercado. 1.8 MODELOS DO PROCESSO DE MUDANÇA Conforme apresentada no item anterior, a mudança organizacional tem sido estudada de diferentes perspectivas. Assim sendo, os dois modelos descritos a se- guir ajudam a explicar a mudança a partir das perspectivas da organização e dos in- divíduos. 1. Modelo de Três Etapas de Lewin ou Modelo Descongelamento- Mudança-Recongelamento O psicólogo Kurt Lewin (1951) apresentou uma análise em três fases do pro- cesso de mudança resumida na tabela a seguir: FASE DA MUDANÇA CONTEÚDO DA MUDANÇA DESCONGELAMENTO (DO STATUS QUO) Envolve a redução ou eliminação da resistência a mudança. Enquanto os funcionários resistirem à mudança, ela não será implementada eficazmente. Para aceitar as mudanças, os empregados de- vem, em primeiro lugar, lidar com os sentimentos a respeito de abandonar aquilo que é velho. Apenas após as pessoas terem lidado eficazmen- te com o término de uma fase é que elas estão prontas para realizar transições. O status quo pode ser considerado um estado de equilíbrio. Para mudar este equilíbrio é necessário descongelar e superar tanto as pressões da resis- tência individual, como da conformidade do grupo. MOVIMENTO (PARA UM ESTADO NOVO) Envolve um considerável processo de comunica- ção em duas mãos – as pessoas que estão im- plementando as mudanças devem fazer suges- tões, e as pessoas que estão passando pelo pro- cesso de mudança devem ser encorajadas a con- tribuir e participar – incluindo as discussões de grupo. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 43 RECONGELAMENTO (DA NOVA MUDANÇA PARA TOR- NÁ-LA PERMANENTE) Inclui chamar a atenção para o sucesso da mu- dança e procurar meio para recompensar as pes- soas envolvidas na sua implementação. Se este passo não é dado, há uma chance muito alta de que a mudança tenha vida curta e de que os empregados tentem reverter a situação para o estado de equilíbrio anterior. O objetivo de recongelar, então, é estabilizar a nova situação equilibrando as forças impulsiona- doras e as restritivas à mudança. O modelo de Lewin foi re-analisado por Conner (1985) com o objetivo de en- fatizar que os três estágios – que o autor redefine como estado presente, estado de transição e estado desejado – (apresentados na figura abaixo), constituem um pro- cesso contínuo, já que quando alguém chega ao estado desejado ou re- congelamento, precisa iniciar mais um processo de mudança. A MUDANÇA É UM PROCESSO Estado Estado Estado Atual de Desejado Transição Fonte:Conner,D.Fonte:Conner,D.”” Managing at the Speed of ChangeManaging at the Speed of Change””Villard Books, NY,1995Villard Books, NY,1995 2. Modelo da Curva de Crescimento da Mudança nas Organizações Conforme coloca Dubrin (2002), o modelo da curva de crescimento traça a i- nevitabilidade da mudança durante o ciclo de vida da empresa. De acordo com este modelo, as organizações passam por três fases em seqüência: ! Fase formativa: caracterizada pela falta de estrutura, tentativa e erro, e tomada de risco empreendedora. Os erros são vistos como oportunidades de aprendizagem e a inovação é extremamente importante. ! Fase normativa: é a fase em que ocorre a estabilidade. A ênfase é colo- cada na manutenção da estrutura e no desenvolvimento da previsibilidade. Os erros não são bem vistos e podem ser punidos, o que leva a empresa a correr menos riscos. A empresa torna-se burocratizada, as inovações re- cebem apenas apoio verbal, mas não prático. O objetivo é a sobrevivên- cia, e o foco é direcionado menos para o mercado e mais para a manuten- ção do status quo. Entretanto, as mudanças continuam a ocorrer no ambi- ente, o que leva ao término desta fase. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 44 ! Fase integrativa: é a fase na qual a empresa se redefine e encontra uma nova direção. Durante esta fase os gerentes tentam várias mudanças, co- mo a introdução de uma nova visão. Ao mesmo tempo ocorrem as maiores resistências à mudança porque muitos membros da organização tentam resistir ao desconforto que ela causa. Esta fase esta associada à ambigüi- dade e à incerteza. A organização enfrenta simultaneamente as forças a favor da mudança (as forças motrizes: tecnologia, concorrência, pressões gerenciais) e as forças a favor da manutenção do status quo (as forças de restrição: normas de desempenho, medo da mudança, complacência do empregado, dificuldades de aprendizagem). Durante esta fase a liderança, a criatividade e as habilidades interpessoais tornam-se mais importantes do que o gerenciamento de rotina e as habilidades técnicas. 1.9 A REAÇÃO HUMANA À MUDANÇA: CAUSAS DE RESISTÊNCIA E O GRAU DE RESILIÊNCIA Apesar de importante e, muitas vezes necessária, a promoção da mudança organizacional tem sido uma questão problemática para diversas organizações. Segundo Boyett (1999), durante as décadas de 1980 e 1990, muitas organi- zações americanas tentaram implementar programas que envolviam mudanças or- ganizacionais. Porém, de acordo com o autor, estimativas indicam que de 50% a 70% das iniciativas adotadas não obtiveram os resultados esperados. Diante de tantos resultados negativos, torna-se necessário explorar os fatores que dificultam e facilitam mudanças nas organizações. Com relação às dificuldades, a resistência à mudança é o fator principal. Para Ansoff (1981), a resistência à mudança está diretamente relacionada ao grau de descontinuidade da cultura ou a estrutura de poder introduzida pela mudan- ça e, segundo o autor, quando a mudança vem acompanhada por uma transferência de poder, a resistência se intensifica. A resistência à mudança é algo a ser enfrenta- do pela administração, porém, o enfoque escolhido para tratá-la dependerá da orga- nização e do nível de turbulência ambiental a ser enfrentado. Senge (1999) alerta sobre as dificuldades enfrentadas para promover uma mudança, devido ao processo de equilíbrio criado pelas organizações visando à ma- nutenção do status quo: “Em geral, os círculos de equilíbrio são mais difíceis de identificar do que os círculos de reforço; porque, na maioria das vezes, parece que nada está acontecen- do (...). Ao contrário, o processo de equilíbrio mantém o status quo mesmo quando todos os participantes querem mudanças.” Gonçalves (2003), citando Boyett (1999), aponta seis questões principais que marcam a resistência à mudança: 1. preconceito com resultado: os membros afetados pela mudança tendem a fantasiar que as conseqüências serão sempre negativas; 2. receio de mais trabalho: as pessoas ficam predispostas a pensarem que a mudança trará aumento na carga de trabalho e redução de oportunida- des; IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 45 3. necessidade de mudança de hábitos: exigência de mudança de hábitos que já estão internalizados, taken for granted; 4. falha na comunicação: os membros da organização não são devidamen- te comunicados sobre os motivos da mudança e as expectativas que de- vem ser geradas em função dela; 5. incapacidade de alinhar a organização como um todo: problemas para coordenar tudo que envolve a mudança, tais como, estrutura organizacio- nal, sistemas, tecnologias, competências essenciais, conhecimento, cultu- ra e habilidades de seus integrantes; e, 6. revolta por parte dos funcionários: é uma defesa criada pelos funcioná- rios por existir uma percepção de que a mudança é uma imposição e, por- tanto, tira o controle das pessoas. Por outro lado, Boyett (1999) aponta algumas formas de promover a mudança organizacional. São elas: 1. criação da necessidade de promover a mudança: a criação da neces- sidade passa por fazer com que as pessoas compreendam que é preciso mudar, através da criação de uma visão positiva sobre a forma como se- rão afetadas e pela demonstração a essas pessoas, de que existe segu- rança quanto ao que está sendo feito para mudar, e que isto gera desde o início resultados positivos; 2. comunicação: a comunicação eficaz e efetiva é essencial para a trans- missão da mensagem de mudança, bem como para o seu acompanha- mento e reforço; 3. criação de uma aliança: desenvolvimento de um grupo, que envolva a di- reção e os demais níveis da organização, para promover a mudança; 4. desenvolvimento da mudança em larga escala: a mudança acaba obri- gando a organização a enfrentar questões mais profundas, como a cultura organizacional e, portanto, leva a mudanças reais e permanentes, pois, envolvem os fundamentos da organização; 5. promoção da participação: incluir as pessoas nas decisões sobre como o processo de mudança ocorrerá leva a um maior comprometimento, pois, ocorre uma consciência entre as pessoas de que elas têm influência nas decisões que envolvem os seus destinos e os da organização. Os tópicos apontados por Boyett (1999), apesar de genéricos, demonstram as questões essenciais que envolvem o processo de mudança nas organizações. Mui- tos outros elementos poderiam ser citados na questão da mudança; porém, a influ- ência das pessoas neste processo será sempre fundamental. Freitas (1991) lembra que existe um sentimento de dor e sensação de perda que os indivíduos da organização sentem com a chegada da mudança, mas que o conforto e a lealdade à organização devem ser atualizados de forma a trazer maior comprometimento com a nova ordem das coisas. O temor frente ao desconhecido, o medo de correr riscos ao inovar, a tensão com o que pode vir em seguida, a necessidade de adaptação, enfim, todos esses fatores podem transformar o trabalho em uma organização em processo de mudan- ça desgastante. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 46 Nestes casos, o resultado acaba sendo queda na qualidade do trabalho e da produtividade e sensação generalizada de impotência e, em alguns casos, revolta e indignação. Frente a perspectivas de mudança, grande parte do público interno pode a- presentar resistência, ainda que a mudança traga a possibilidade de progresso indi- vidual, ou seja, induzida para facilitar o trabalho de todos. Mas o que é Resistência à Mudança? Segundo Gouillart e Kelly (1995), a resistência consiste em qualquer atitude intencional para desacreditar, atrasar ou impedir a implementação de uma mudança no trabalho e surge quando a mudança é percebida como ameaçadora para a segu- rança, a posição, a auto-estima do indivíduo, ou para uma interação social. Em ge- ral, as pessoas tentam se proteger dos efeitos de mudanças, independentemente da sua natureza. Como as pessoas, as organizações tendem a encontrar um ponto de equilí- brio, a chamada zona de conforto, em suas estruturas sociais. Isto significa que as pessoas nas organizações aprendem a lidar com as relações em seu ambiente: co- mo lidar umas com as outras, como executar seu trabalho e que conseqüências es- perar depois. As mudanças determinam desequilíbrios e a necessidade de ajuste é percebida de maneira diferente, o que resulta em reações variadas. A percepção acerca da mudança depende, principalmente, da história e ca- racterísticas pessoais dos empregados e da cultura do grupo. Estes fatores é que vão, num primeiro momento, determinar seu apoio ou resistência às mudanças pro- postas. Pesquisas mostram que podem ser estabelecidos paralelos entre os ciclos emocionais pelos quais as pessoas passam em sua luta contra a mudança e aque- les que as pessoas experimentam em face da doença ou da morte. Os estudos de Kübler-Ross (1981), de pessoas que aceitaram a morte, evi- denciam estágios emocionais comuns: negação e isolamento, raiva, barganha, de- pressão, aceitação. As pessoas, em determinadas situações, têm de desaprender as formas co- nhecidas de lidar com a situação e aprender novamente; este também pode ser um processo difícil, até doloroso, que as pessoas procuram evitar. A tendência a resistir às mudanças pelos custos psíquicos que as acompanham pode ser parcialmente compensada pelos desejos que as pessoas têm de novas experiências e pelas re- compensas percebidas, associadas às novas experiências. Diante do quadro, as perguntas que os pesquisadores da mudança dos indi- víduos e das organizações têm feito são: Por que alguns indivíduos e algumas orga- nizações conseguem se reinventar, conseguem se adaptar a novas situações e rea- lidades e outros não? As pessoas e as organizações não querem mudar ou não con- seguem? As respostas para as questões estão ligadas à teoria da resiliência. Segun- do coloca Conner (1995), as mudanças são processos que exigem resiliência dos indivíduos e das organizações, isto é, capacidade de adaptação e flexibilidade. Só é possível gerenciar a mudança individual se os indivíduos forem resilientes. Só é possível gerenciar a mudança organizacional se a organização for resiliente. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 47 A resiliência é o ponto central da estrutura da mudança, conforme se pode observar na figura reproduzida a seguir: A ESTRUTURA DA MUDANÇA Sinergia NaturezaSinergia Natureza Cultura Resiliência ProcessoCultura Resiliência Processo Compromisso Resistência PapCompromisso Resistência Papééisis Fonte:Conner,D.Fonte:Conner,D.”” Managing at the Speed of ChangeManaging at the Speed of Change””Villard Books, NY,1995Villard Books, NY,1995 Se há necessidade em identificar indivíduos resilientes para que seja possível mudar as organizações, é preciso definir quais as características de um indivíduo resiliente. Segundo Conner (1995), indivíduos resilientes são: positivos, focalizados, fle- xíveis, organizados e pró-ativos. As cinco características básicas de resiliência se manifestam devido a certas crenças, comportamentos, habilidades e campos de co- nhecimento. ! Apresentam um senso de segurança e autoconfiança que está baseado em sua opinião de que a vida é complexa, porém, cheia de oportunidades (Positivos). ! Possuem uma clara visão do que querem alcançar (Focalizados). ! Demonstram uma especial flexibilidade quando reagem à incerteza (Flexí- veis). ! Desenvolvem abordagens estruturadas da gerência da ambigüidade (Or- ganizados). ! Comprometem-se à mudança, ao invés de se defenderem contra ela (Pró- ativos). Listados abaixo estão os mais notáveis atributos para cada característica. Positivo – Opinião de que a Vida é um Desafio, Porém, Cheia de Oportu- nidades 1. Interpreta o mundo como cheio de facetas e de idas e vindas. Espera que o futuro seja cheio de variáveis que se alterem constantemente. 2. Vê as interrupções como o resultado natural de um mundo desafiante. 3. Acha que a vida é mais cheia de paradoxos do que contradições. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 48 4. Considera inconfortáveis as mudanças principais, mas acredita que as oportuni- dades escondidas geralmente podem existir. Acredita que, com os desafios, geralmente existem importantes lições a serem aprendidas. 5. Encara a vida como recompensadora no geral. Focalizado – Clara Visão do que Há Para ser Alcançado 1. Mantém uma forte opinião que serve tanto como uma fonte de propósito quanto como um sistema de orientação para restabelecer perspectivas quebradas. Flexível – Adaptável Quando Reage à Incerteza 1. Acredita que a mudança é um processo gerenciável. 2. É altamente tolerante com a ambigüidade. 3. Precisa apenas de um curto espaço de tempo para se recuperar da adversidade ou desapontamento. 4. Sente-se poderoso durante a mudança. 5. Reconhece as forças e fraquezas de cada um e sabe quando aceitar os limites internos ou externos. 6. Desafia e, quando necessário, modifica as conclusões ou pontos de referência de cada um. 7. Crê nas alimentações dos relacionamentos de apoio. 8. Demonstra paciência, compreensão e humor quando lida com a mudança. Organizado – Aplica Estruturas para Ajudar no Gerenciamento da Ambi- güidade 1. Identifica os pontos ocultos presentes em situações confusas. 2. Consolida (o que parece ser) vários projetos de mudança não relacionados em um esforço único com um tema central. 3. Determina e, quando necessário, renegocia as prioridades durante a mudança. 4. Administra, com sucesso, muitas tarefas e pedidos simultâneos. 5. Compartimentaliza o stress em uma área, de modo que aquele não se misture com outros projetos ou outras partes da vida de cada um. 6. Reconhece quando pedir ajuda aos outros. 7. Compromete-se com uma ação de maior importância somente depois de ter pla- nejado cuidadosamente. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 49 Pró-Ativo – Compromete-se com a Mudança ao Invés de Evitá-La 1. Determina quando a mudança é inevitável, necessária ou vantajosa. 2. Usa recursos para reestruturar criativamente uma situação de desafio, improvisar novas abordagens e manobrar para ganhar vantagem. 3. Corre riscos, apesar de conseqüências potencialmente negativas. 4. Tira importantes lições de experiências com mudanças que são, então, aplicadas em situações similares. 5. Reage a interrupções investindo energia na solução do problema e na equipe de trabalho. 6. Influencia outros e resolve conflitos. Portanto, para Conner (1995), para gerenciar a estrutura da mudança é preci- so: ! determinar o nível de resiliência básica que existe entre as pessoas-chave envolvidas na mudança. ! reconhecer qual dos princípios destes padrões de apoio pode ser mais útil para o reforço da resiliência básica; e, ! aplicar os corretos princípios de resiliência (capacidade de adaptação, e- lasticidade) com as apropriadas características de resiliência para susten- tar a força básica do padrão de resiliência total de um indivíduo ou grupo. ! identificar qual o padrão (ou padrões) de apoio proporcionará a melhor ori- entação para o resultado desejado. Segundo o autor, para que alguém possa desenvolver a capacidade de resili- ência, é preciso que compreenda a reação humana à mudança (Figura 3) à natureza e ao processo da mudança (Figura 4): A REAÇÃO HUMANA À MUDANÇA Quando perbebida, a realidade atende às expectativas, um As pessoas têm Esta necessidade Expectativas sentido de controle grande pode ser atendida específicas são é alcançado e uma necessidade impondo-se ou, estabelecidas forma de equilíbrio de controle antecipando-se o baseando-se no é gerada futuro daquelas que pode ser imposto ou Quando percebida a antecipado realidade não corresponde às expectativas, o sentimento de controle é perdido e as pessoas precisam se ajustar às mudanças Fonte:Conner,D.Fonte:Conner,D.”” Managing at the Speed of ChangeManaging at the Speed of Change””Villard Books, NY,1995Villard Books, NY,1995 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 50 COMO AUMENTAR A RESILIÊNCIA !! A MUDANA MUDANÇÇA A ÉÉ UM PROCESSO E NÃO UM EVENTO UM PROCESSO E NÃO UM EVENTO BINBINÁÁRIORIO !! O O ‘‘STATUS QUOSTATUS QUO’’ ÉÉ BEM MAIS CARO QUE O CUSTO BEM MAIS CARO QUE O CUSTO DE TRANSIDE TRANSIÇÇÃOÃO !! O DESCONFORTO DA AMBIGUIDADE O DESCONFORTO DA AMBIGUIDADE ÉÉ UMA UMA REAREAÇÇÃO NATURAL ÃO NATURAL ÀÀ TRANSITRANSIÇÇÃOÃO !! O CONTROLE O CONTROLE ÉÉ O QUE TODOS PROCURAMO QUE TODOS PROCURAM Fonte:Conner,D.Fonte:Conner,D.”” Managing at the Speed of ChangeManaging at the Speed of Change””Villard Books, NY,1995Villard Books, NY,1995 RESUMO DO TEMA Este tema foi subdividido em seis itens, que retomam a questão do poder a- bordada em diferentes tópicos da disciplina Gestão de Pessoas I (liderança, compor- tamento de grupos, conflitos, clima e cultura) com o objetivo de correlacioná-la à mudança organizacional. Veja adiante o resumo de cada item: 1. O Significado do Poder ! Poder é o potencial, ou a habilidade de influenciar decisões e contro- lar recursos. ! O poder pode existir, mas não ser utilizado. ! Uma pessoa pode ter poder, mas não dispor dele. ! Poder é uma função de dependência. Quanto maior o meu grau de dependência de uma pessoa, maior poder ela tem sobre mim. A de- pendência é fruto de: importância, escassez e insubstitutibilidade. ! Uma pessoa pode ter poder sobre você se ela controla alguma coisa que você deseja. 2. As Bases de Poder para os Indivíduos e para as Organizações São identificadas cinco fontes de poder e exemplificadas como utilizá-las den- tro da organização: ! DE RECOMPENSA: Ex.: A pessoa é capaz de dar recompensas ou benefícios especiais para os outros e você acha que é vantajoso tro- car favores com essa pessoa. ! COERCITIVO: Ex.: A pessoa pode tornar as coisas difíceis para os outros e você quer evitar zangá-lá. ! LEGÍTIMO: Ex.: A pessoa tem o direito, considerando sua posição e responsabilidades de seu cargo, de esperar que você concorde com pedidos legítimos. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 51 ! DE REFERÊNCIA: Ex.: Você gosta da pessoa e acha agradável fazer coisas para ela. ! DE ESPECIALIZAÇÃO OU DE COMPETÊNCIA: Ex.: A pessoa tem experiência e conhecimento para ganhar o seu respeito e você acata suas avaliações em alguns assuntos. E, por fim, os trabalhadores/subordinados têm três tipos bem distintos de rea- ções de conformidade quando os gerentes utilizam os diferentes tipos de poder: ! OBEDIÊNCIA: Conformidade baseada no desejo de obter recompen- sas ou evitar punições. ! IDENTIFICAÇÃO: Conformidade baseada na atração do influencia- dor. ! INTERNALIZAÇÃO: Conformidade baseada no caráter intrinsecamen- te gratificante das atitudes ou comportamentos adotados. 3. Relações de Poder nas Novas Configurações Organizacionais ! Foi definida uma estrutura organizacional como um agrupamento for- mal das atividades logísticas e administrativas da organização. ! Foi vista a estrutura de uma organização, através da leitura de seus organogramas, de seus estatutos e regimentos e demais normas in- ternas. Os organogramas são úteis para mostrar a estrutura formal da organização e quem é responsável por determinadas tarefas. ! Foi analisado que o papel da estrutura nas organizações é tornar pre- visível o comportamento de seus membros, mapear suas relações de subordinação e mando, e possibilitar o alcance dos objetivos organi- zacionais. ! E, para contextualizar as relações de poder na perspectiva de suas estruturas, foram apresentadas algumas configurações organizacio- nais: a. Segundo Ansoff: ! A estrutura funcional, na qual o presidente é o responsável pela ela- boração de estratégias. ! A estrutura divisional, com descentralização de autoridade e respon- sabilidade tanto no nível estratégico quanto no nível operacional, on- de a carga de trabalho estratégico é dissolvida pela empresa, sendo compartilhada pelo presidente e pelos chefes das divisões. ! A estrutura matricial, na qual é adicionada uma suborganização de administração de projetos à forma convencional (seja ela funcional ou divisional). ! A estrutura dualista, que separa a empresa em dois grupos diferentes, cada qual com sua própria administração e recursos. Um dos grupos é encarregado da manutenção dos lucros correntes da empresa (foco operacional), enquanto o outro grupo se preocupa com a geração de lucros futuros (foco estratégico). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 52 ! A estrutura múltipla, variante da anterior, na qual o grupo para poten- cial de lucro é subdividido em vários centros de esforço estratégico di- ferenciado com orçamentos independentes. b. Segundo Mintzberg: ! estrutura simples: ! A estrutura simples possui pequena ou nenhuma tecno-estrutura, poucos assessores de apoio, reduzida divisão do trabalho, míni- ma diferenciação entre suas unidades e pequena hierarquia ad- ministrativa. ! Em tempos de crise, quando a organização passa por uma turbu- lência muito forte, ela tende a centralizar as decisões no principal executivo, de modo a reagir rapidamente às ameaças do ambien- te. Nesses momentos, não importa qual a estrutura usual da or- ganização, ela corre para a estrutura simples para que as deci- sões críticas sejam tomadas rapidamente. ! burocracia mecânica: ! Os principais parâmetros para delinear esse tipo de estrutura são: especialização do trabalho vertical e horizontal; tarefas operacio- nais rotinizadas e, portanto, padronizáveis por meio de uma gran- de proliferação de normas, regulamentos e comunicações que formalizam o comportamento; o trabalho é comumente agrupado por função, contando com unidades operacionais com grande di- mensão; o poder é relativamente centralizado verticalmente (para a tomada de decisão) e existe uma descentralização horizontal li- mitada, com nítida distinção entre linha e assessoria. ! burocracia profissional: ! A burocracia profissional se apóia na padronização das habilida- des dos peritos e especialistas, aqui denominados profissionais e permite que os profissionais consigam se coordenar por saber e- xatamente o que esperar de seus colegas de trabalho. ! Enquanto a burocracia mecanizada gera seus próprios padrões, via tecno-estrutura, a burocracia profissional tem seus padrões o- riginados fora de sua estrutura, nas associações profissionais. ! forma divisionalizada: ! A forma divisionalizada consiste num conjunto de entidades prati- camente autônomas, acopladas a uma estrutura administrativa central. Tais entidades são unidades na linha intermediária, de- nominadas divisões, que respondem ao escritório central. O fluxo do poder é de cima para baixo. ! A forma divisionalizada ocorre quando existe uma diversidade de mercados, pois, a organização cria uma unidade para tratar de cada mercado e mantém centralizada a administração de sua car- teira estratégica. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 53 ! adhocracia: É uma configuração capaz de agregar especialistas de diversas á- reas em equipes de projeto ad hoc, isto é, para determinado fim es- pecífico. Possui uma estrutura basicamente orgânica, com baixa formalização do comportamento, grande especialização horizontal do trabalho (ba- seada em treinamento formal), tendência para agrupar os peritos em unidades funcionais ou em pequenas equipes de projeto baseadas no mercado, utilizando como instrumento de interligação o ajusta- mento mútuo intra e entre equipes. Trata-se de configuração fluida (dinâmica, flexível e orgânica) que busca promover sofisticadas inovações. Como é uma estrutura voltada para a inovação, as informações e os processos decisórios correm flexíveis e informais, se necessário pas- sando por cima da cadeia de autoridade. A Adhocracia está claramente situada num ambiente, ao mesmo tempo, complexo e dinâmico. 1.10 ADMINISTRAÇÃO DA MUDANÇA ORGANIZACIONAL: MUDANÇA REATIVA E PRÓ-ATIVA Inicialmente, a mudança reativa ocorre quando alterações no ambiente já a- fetaram o desempenho da organização e a mudança pró-ativa é iniciada pela dire- ção antes que o problema ocorra, e muitas vezes surgem da identificação e da cria- ção de oportunidades. Posteriormente, foi analisada mudança organizacional segundo quatro dimen- sões: natureza, compatibilidade, tempo da mudança e processo. Elas podem ser a- plicadas a diferentes tipos de mudança: ruptura, sobressalto erosão e elaboração. E, por fim, a partir da síntese do conceito de alguns autores, verificou-se que a elaboração de uma mudança estratégica envolve três perspectivas principais: o aspecto técnico, o aspecto político e o aspecto cultural. Não contemplando todas as perspectivas, a estratégia tende a se distanciar do seu objetivo final. É necessário buscar o equilíbrio entre as três forças, não ape- nas na promoção de uma mudança estratégica, mas também no desenvolvimento da organização ao longo de sua existência. Portanto, a função da alta gerência é desenvolver este complexo trio de forma ajustada. Finalmente, o processo de mudança não deve ser considerado apenas como um problema de tecnologias, estruturas, processos e motivação dos empregados. Deve ser considerado também o impacto das mudanças nos valores da organiza- ção, prevendo quais serão os comportamentos desejados na nova situação e des- cobrir como desenvolvê-los, pois, sem o apoio da mudança cultural, outras mudan- ças não têm sustentação. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 54 1.11 MODELOS DO PROCESSO DE MUDANÇA Foram apresentados dois modelos que ajudam a explicar a mudança a partir das perspectivas da organização e dos indivíduos. a. o Modelo de Três Etapas de Lewin ou Modelo Descongelamento – (do status quo), Mudança (movimento para um estado novo) – Recongelamen- to (da mudança para torná-la permanente). b. o Modelo da Curva de Crescimento da Mudança nas Organizações, que traça a inevitabilidade da mudança durante o ciclo de vida da empresa: fa- se formativa, fase normativa e a fase integrativa. 1.12 A REAÇÃO HUMANA À MUDANÇA: CAUSAS DE RESISTÊNCIA E O GRAU DE RESILIÊNCIA Neste item foi definida a resistência à mudança como qualquer atitude inten- cional para desacreditar, atrasar ou impedir a implementação de uma mudança no trabalho; e surge quando a mudança é percebida como ameaçadora para a segu- rança, a posição, a auto-estima do indivíduo ou para uma interação social; foram vinculadas seis questões: preconceito com resultado, receio de mais trabalho, ne- cessidade de mudança de hábitos, falha na comunicação, incapacidade de alinhar a organização como um todo, revolta por parte dos funcionários. Foram apontadas algumas formas de promover mudança organizacional: cri- ação da necessidade de promover a mudança, comunicação, criação de uma alian- ça, desenvolvimento da mudança em larga escala, promoção da participação. Por fim, mais complexo do que lidar com indivíduos resistentes a mudanças (que não querem mudar) é lidar com indivíduos que não conseguem mudar, isto é, não são resilientes à mudança, isto é, tem capacidade de adaptação e flexibilidade. E, a partir da definição das características de indivíduos resilientes, (positivos, focalizados, flexíveis, organizados e pró-ativos) foram apresentadas algumas nor- mas para gerenciar a estrutura da mudança. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANSOFF, Igor. Do Planejamento Estratégico à Administração Estratégica. São Paulo: Atlas, 1981. BASS, B. M. Bass & Stogdill’s Handbook of Leadership. 3a ed. Nova York: Free Press, 1990. BATEMAN/SNELL. Administração: Construindo Vantagem Competitiva. São Paulo: Atlas, 1998. BOYETT, Joseph. 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Sandra Regina da Rocha Pinto Autor: Profa. Sandra Regina da Rocha Pinto Tutoria a Distância IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 58 SUMÁRIO Desenvolvimento Gerencial – Tema 2 ...................................................................59 2.1 Introdução........................................................................................................59 2.2 A Evolução dos Modelos Gerenciais ...............................................................60 2.2.1 Modelos de Gestão: Uma Perspectiva Evolutiva ......................................60 Os Quatro Modelos em um Único Arcabouço........................................................64 O Uso de Modelos Antagônicos ............................................................................66 Complexidade Comportamental e Eficácia dos Líderes Gerenciais ......................67 2.2.2 Como se Tornar um Gerente: A Necessidade de Novas Competências...67 Oito Papéis ............................................................................................................67 2.2.2.1 Modelo das Metas Racionais: Os Papéis de Diretor e Produtor .........68 2.2.2.2 Modelo dos Processos Internos: Os Papéis do Monitor e do Coordenador...................................................................................................69 2.2.2.3 Modelo das Relações Humanas: Os Papéis de Facilitador e de Mentor .......................................................................................................................69 2.2.2.4 Modelo dos Sistemas Abertos: Os Papéis de Inovador e Negociador69 2.2.2.5 Os Oito Papéis em Diferentes Níveis Organizacionais.......................70 2.2.3 Organizando o Processo de Aprendizagem..............................................71 2.3 Empowerment: Uma Abordagem Crítica .........................................................72 2.3.1 Os Tipos de Comprometimento ................................................................73 2.3.2 Os Programas de Mudança Aumentam as Contradições Internas ...........77 2.3.3 As Resistências dos CEOs .......................................................................78 2.3.4 Os Empregados Questionam ....................................................................79 2.3.5 Os Agentes de Mudança Inibem o Empowerment ....................................81 2.3.6 Que Deve ser Feito? .................................................................................83 2.4 Considerações Finais...................................................................................85 Por fim, cabe lembrar que EMPOWERMENT é e não é...:....................................86 Referências Bibliográficas: ....................................................................................86 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 59 DESENVOLVIMENTO GERENCIAL – TEMA 2 2.1 INTRODUÇÃO onforme apontado no capítulo anterior, as empresas começaram a rever as suas práticas administrativas em resposta às intensas mudanças ocorridas em seus ambientes de negócios. A globalização, o desenvolvimento de tecnologias de informação e de automação de fábricas, o ingresso de minorias no mercado de trabalho, o excesso de oferta de produtos, entre outros fatores (Nadler et alii, 1994), impuseram às organizações uma série de medidas no sentido de torná-las mais ágeis, pois as pressões anteriormente enumeradas demandavam rapidez no processo decisório. Assim sendo, as estruturas burocráticas perderam o sentido quando a flexibilidade e a criatividade precisaram ser incentivadas. Entre outros paradoxos, as empresas perceberam que precisavam ser globais e locais, grandes e pequenas, centralizadas e descentralizadas (Handy, 1995). Observou-se, então, uma onda de intervenções nas organizações: reengenharia, downsizing, qualidade total, apenas para citar as tentativas mais conhecidas. As estruturas e os processos organizacionais ideais passaram a ser aqueles que criavam a “organização flexível” (Tachizawa e Scaico, 1997). Ao mesmo tempo, as habilidades tradicionalmente requeridas no ambiente de trabalho mudaram de escopo. Espera-se que todos dentro da organização desenvolvam habilidades conceituais: aquelas que permitem enxergar o todo. Nesse contexto, observa-se o desenvolvimento gerencial diretamente relacionado ao desenvolvimento organizacional. A revisão dos pressupostos dos arranjos organizacionais classicamente adotados impõe a expansão dos modelos mentais a respeito do que uma organização é e sobre as maneiras pelas quais ela deve ser gerenciada. Esse capítulo – estruturado em três sessões – abordará a evolução dos modelos gerenciais, assim como as implicações da adoção da prática de empowerment no contexto organizacional. Espera-se que após a leitura desse capítulo o(a) aluno(a) possa: ! Identificar os novos modelos organizacionais e seus impactos sobre o papel e as expectativas em relação aos gerentes; ! Apreender o papel do gerente intermediário como agente de mudança organizacional; ! Reconhecer a natureza do comprometimento e a gestão do contrato psicológico dos indivíduos; ! Avaliar os fatores críticos de sucesso à efetiva ação gerencial e o empowerment. C IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 60 2.2 A EVOLUÇÃO DOS MODELOS GERENCIAIS Ensinam Quinn et alii (2003) que modelos são representações de uma realidade mais complexa. Uma maquete, por exemplo, é uma representação física de um prédio. Os modelos são úteis na medida em que ajudam a representar, comunicar idéias e melhor compreender os fenômenos complexos do mundo real. No mundo social, os modelos costumam representar um conjunto de premissas a respeito de determinados fenômenos, ou uma maneira geral de concebê-los ou considerá-los. Nessa medida, proporcionam uma determinada perspectiva sobre a realidade mais complexa (Quinn et alii, 2003). Embora ajudem a enxergar determinados aspectos de um fenômeno, os modelos também podem impedir a visão de outros. Assim, a existência de crenças fortemente arraigadas sobre a ordem, autoridade e direção que pode impedir a visão de aspectos importantes que circundam os indivíduos (Quinn et alii, 2003 e Senge, 1990). Na medida em que os modelos de gestão estão associados à identidade, formação e emoções, aprender e apreciar novas concepções às vezes é uma tarefa difícil. Ademais, tendo em vista a complexidade da vida, se faz necessário recorrer a múltiplos modelos, a fim de viabilizar a detecção e consideração de um maior número de alternativas. Assim, o grau de escolha e o grau de eficácia potencial de análise podem ser ampliados (Quinn et alii, 2003 e Senge, 1990). 2.2.1 MODELOS DE GESTÃO: UMA PERSPECTIVA EVOLUTIVA Os modelos adotados pelos indivíduos habitualmente refletem modelos alimentados pela sociedade como um todo. Ao longo do século XX, emergiram inúmeros modelos de gestão. Compreendê-los e compreender as suas respectivas origens pode proporcionar aos gerentes um entendimento mais profundo e um leque mais amplo de escolhas. Apresentam-se a seguir os módulos gerenciais em quatro cortes de tempo estabelecidos por Quinn et alii (2003). 1900-1925: Emergência do Modelo de Metas Racionais e do Modelo de Processos Internos Modelo das metas racionais: Foi nesse período que os dois primeiros modelos de gestão começaram a emergir. O primeiro foi o modelo das metas racionais. O símbolo que melhor o representa é o cifrão, já que os critérios últimos de eficácia organizacional são a produtividade e o lucro (Quinn et alii, 2003). A premissa básica concernente aos meios e fins dessa abordagem é a crença de que uma direção clara acarreta resultados produtivos. Assim sendo, há uma ênfase contínua em processos como a elucidação de objetivos, análise racional e tomada de decisões. O clima organizacional é econômico-racional e todas as decisões são motivadas por considerações quanto ao “lucro-líquido” (Quinn et alii, 2003). A Figura 1 ilustra os quatro princípios gerenciais de Frederick Taylor, a principal referência desse tipo de modelo. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 61 Figura 1 Os Quatro Princípios Gerenciais de Taylor ! Desenvolva uma ciência para cada função, substituindo o velho método de princípios gerais. ! Selecione os trabalhos de maneira sistemática, de modo que sejam adequados para suas tarefas, e treine-as. ! Ofereça incentivos, de modo que os trabalhadores se comportem de acordo com os princípios da ciência já desenvolvida. ! Dê apoio aos trabalhadores, planejando minuciosamente seu trabalho e facilitando a consecução de suas atribuições. Fonte: Adaptado de Frederick Taylor. The Principles of Scientific Management. Nova York: Harper and Brothers, 1911, p. 44 apud Quinn et alii, 2003. Modelo dos processos internos: Embora suas disposições hierárquicas mais fundamentais fossem usadas há séculos, foi no primeiro quarto do século XX que ele se transformou rapidamente no que ficaria conhecido como “burocracia profissional”. Seus conceitos básicos, entretanto, só seriam plenamente codificados por ocasião da tradução dos escritos de Max Weber e Henri Fayol, em meados do quarto de século seguinte (Quinn et alii, 2003). Os princípios gerais da administração de Fayol encontram-se ilustrados na Figura 2. Trata-se de um modelo altamente complementar ao das metas racionais. Aqui, o símbolo é uma pirâmide, e os critérios de eficácia são a estabilidade e a continuidade. A premissa referente aos meios e fins em pauta baseia-se na convicção de que a rotinização promove estabilidade (Quinn et alii, 2003). A ênfase é em processos como a definição de responsabilidades, mensuração, documentação e manutenção de registros. O clima organizacional é hierárquico e todas as decisões são ditadas pelas regras, estruturas e tradições existentes. Se a eficiência de um empregado cai, aumenta-se o controle por meio da aplicação de diversas políticas e procedimentos (Quinn et alii, 2003). Nesse modelo, o valor último é a eficiência do fluxo de trabalho, e a função do gerente consiste em ser um monitor tecnicamente competente e um coordenador confiável (Quinn et alii, 2003). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 62 Figura 2 Princípios Gerais da Administração de Fayol " Divisão de Trabalho " Autoridade e Responsabilidade " Disciplina " Unidade de Comando " Unidade de Direção " Subordinação do interesse individual ao interesse do grupo " Remuneração Pessoal " Centralização " Cadeia hierárquica " Ordem " Eqüidade " Estabilidade de Pessoal " Iniciativa " Espírito de Corpo Fonte: Sintetizado a partir de Henri Fayol. General and Industrial Administration. Nova York: Pirman, 1949, pp. 20-41 apud Quinn et alii, 2003. 1926-1950: A Emergência do Modelo das Relações Humanas Modelo das relações humanas: Em fins do segundo quarto do século, a orientação emergente era o modelo das relações humanas. Nele, a ênfase central é no compromisso, coesão e moral. A premissa quanto aos meios e os fins em questão é que o envolvimento resulta em compromissos, e os valores centrais são: participação, resolução de conflitos e construção de consenso (Quinn et alii, 2003). Em virtude de sua ênfase na igualdade e abertura, o melhor símbolo para esse modelo é um círculo. A organização adquire uma atmosfera de clã, centralizada em equipes, em que o processo decisório se caracteriza por um profundo envolvimento (Quinn et alii, 2003). Aqui, se a eficiência de um empregado cai, os gerentes assumem uma perspectiva desenvolvimentista e examinam um complexo conjunto de fatores motivacionais. Podem optar por alterar o grau de participação do indivíduo, ou escolher outras variáveis psicossociais. A função do gerente é assumir o papel de mentor empático e de facilitador centrado em processos (Quinn et alii, 2003). Em 1949 esse modelo estava longe de cristalizar-se, e ia de encontro às premissas dos modelos de metas racionais e processos internos – o que tornava difícil de compreender e, sem dúvida, de pôr em prática. Ensinam Quinn et alii (2003) que as tentativas não raro resultavam numa espécie de benevolência autoritária. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 63 O quarto de século seguinte estaria já bastante avançado até que pesquisas e obras de cunho não acadêmico tivessem explorado melhor essa orientação, e experiências gerenciais engendrassem resultados significativos em organizações de grande porte (Quinn et alii, 2003). 1951-1975: A Emergência do Modelo de Sistemas Abertos No modelo de sistemas abertos, a organização depara-se com a necessidade de competir num ambiente ambíguo e competitivo. Os critérios básicos de eficácia organizacional são a adaptabilidade e o apoio externo. O símbolo aqui é uma ameba – um organismo muito sensível e capaz de mudar rapidamente, ágil nas respostas ao meio, em virtude da ênfase na flexibilidade e da capacidade de respostas organizacionais. (Quinn et alii, 2003). A premissa, no tocante aos meios e fins, é que a adaptação e inovação contínuas promovem a aquisição e manutenção de recursos externos. Os processos fundamentais são a adaptação política, a resolução criativa de problemas, a inovação e o gerenciamento da mudança. A organização tem uma atmosfera inovadora e envolve mais uma “adhocracia” que uma burocracia. O risco é elevado. E as decisões são tomadas com rapidez (Quinn et alii, 2003). Nessa situação, a visão comum e os valores compartilhados são muito importantes. Aqui, uma eventual perda de eficiência de um empregado pode ser entendida como fruto de longos períodos de trabalho intensivo; de uma sobrecarga de estresse e, talvez, como um caso de esgotamento. Espera-se que o gerente seja um inovador criativo e um negociador dotado de substancial astúcia política – alguém que faz uso de poder e influência na organização (Quinn et alii, 2003). 1976-HOJE: A Emergência de Premissas Inclusivas Apontam Quinn et alii (2003) que, em 2000, um levantamento das maiores preocupações dos executivos indicou que os problemas mais prementes eram os seguintes: ! Como atrair, manter e desenvolver bons funcionários; ! Como pensar e planejar estrategicamente; ! Como manter uma atmosfera de alto desempenho; ! Como aumentar a satisfação dos clientes; ! Como administrar o tempo e o estresse; ! Como permanecer à frente da concorrência; ! Como alinhar visão, estratégia e comportamento; ! Como manter o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal; ! Como aprimorar os processos internos; ! Como estimular a inovação. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 64 Na opinião de Quinn et alii (2003) esses problemas aparentemente muito diferentes são, na realidade, sintomas de um dilema maior – a necessidade de atingir a eficácia organizacional num ambiente profundamente dinâmico. Nesse mundo complexo e volátil, as soluções simples tornam-se suspeitas. Nenhum dos quatro modelos apresentados até agora e resumidos na Figura 3 oferecia uma resposta satisfatória. Nem a mais complexa abordagem dos sistemas abertos bastava. Às vezes era necessária a estabilidade; em outras situações a mudança se impunha. Figura 3 Características dos quatro modelos gerenciais Símbolo $ Metas Racionais Processos internos Relações humanas Sistemas Abertos Critérios de eficácia Teoria referente a meios e fins Ênfase Atmosfera Papel do gerente Produtividade, lucro Estabilidade, continuidade Compromisso, coesão, moral Adaptabilidade, apoio externo Uma direção clara leva a resultados produtivos Rotinização leva à estabilidade Envolvimento resulta em compromisso Adaptação e inovação contínuas levam à aquisição e manutenção de recursos externos Explicitação de metas, análise racional e tomada de iniciativas Definição de responsabilidade, mensuração, documentação Participação, resolução de conflitos e criação de consenso Adaptação política, resolução criativa de problema, inovação, gerenciamento de mudança Econômico-racional: “lucro líquido” Hierárquico Orientado a equipes Inovadora, flexível Diretor e produtor Monitor e coordenador Mentor e facilitador Inovador e negociador/mediador Fonte: Quinn, Robert E. et alii. Competências Gerenciais: Princípios e Aplicações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, p. 11. OS QUATRO MODELOS EM UM ÚNICO ARCABOUÇO Apontam Quinn et alii (2003) que, a princípio, os modelos abordados parecem ser quatro perspectivas ou domínios inteiramente diversos. Contudo, pode-se detectar entre eles uma íntima inter-relação e entrelaçamento. São quatro importantes subdomínios de um constructo maior: a eficácia organizacional. Quinn et alii (2003) sugerem que todos os modelos desse arcabouço de eficácia organizacional são interligados; dependendo dos modelos e combinações que se decida utilizar, se poder ver a eficácia organizacional como algo simples e lógico, dinâmico ou complexo e paradoxal. Tomando isoladamente, nenhum desses modelos proporciona a gama de perspectivas, a amplitude de escolhas e a eficácia potencial decorrentes de se considerá-los todos como parte de um arcabouço maior. Quinn et alii (2003) denominam esse constructo mais amplo de quadro de valores competitivos. As relações entre os modelos podem ser entendidas em termos de dois eixos. Conforme pode ser observado na Figura 4, o eixo vertical vai da flexibilidade, no topo, ao controle, embaixo. O eixo horizontal vai do foco organizacional interno, à IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 65 esquerda, ao foco organizacional externo, à direita. Cada um dos modelos se insere em um dos quatro quadrantes (Quinn et alii, 2003). Figura 4 Quadro de valores competitivos: Critérios de eficácia Externo Controle Flexibilidade Interno Produtividade, realização Direção, clareza de objetivos Compromisso, moral Participação, abertura Inovação, adaptação Crescimento, aquisição de recursos Documentação, gerenciamento de informação Estabilidade, controleModelos de Processos Internos $$ Modelos de Metas Racionais Modelos dos Sistemas Abertos Modelos das Relações Humanas O modelo das relações humanas, por exemplo, enfatiza os critérios situados no quadrante superior esquerdo – participação, abertura, compromisso e moral –; o dos sistemas abertos aqueles localizados no quadrante superior direito – inovação, adaptação, crescimento e aquisição de recursos (Quinn et alii, 2003). Enquanto isso, o modelo de metas racionais enfatiza os critérios apresentados no quadrante inferior direto: direção, clareza de objetivos, produtividade e realização. O modelo de processos internos, no quadrante inferior esquerdo, dá ênfase à documentação, gerenciamento de informações, estabilidade e controle (Quinn et alii, 2003). Ensinam Quinn et alii (2003) que cada modelo tem um oposto percebido. O das relações humanas, definido pela flexibilidade e foco interno, entra em contraste com o das metas racionais, definido pelo controle e pelo foco externo. No primeiro, por exemplo, as pessoas têm um valor inerente. No segundo, só têm valor na medida em que fazem uma contribuição significativa para a consecução das metas. O modelo dos sistemas abertos, definido por flexibilidade e foco externo, opõe-se ao modelo dos processos internos, definido por controle e foco interno; enquanto aquele cuida de adaptar-se à transformação contínua do ambiente, este tem em vista a manutenção da estabilidade e continuidade no seio do sistema (Quinn et alii, 2003). Os paralelos entre os modelos também são importantes. Os modelos de relações humanas e sistemas abertos e metas racionais dão relevo ao foco externo. Os modelos de metas racionais e processos internos salientam o controle. Enquanto isso, os modelos de processos internos e relações humanas têm em comum a ênfase no foco interno (Quinn et alii, 2003). Fonte: Quinn, Robert E. et alii. Competências Gerenciais: Princípios e Aplicações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, p.13. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 66 O USO DE MODELOS ANTAGÔNICOS O arcabouço dos quatro modelos antagônicos é empregado por Quinn et alii (2003), como modelo gerencial. Essa estrutura é intitulada pelos autores de quadro de valores competitivos porque os critérios de cada modelo parecem, a princípio, transmitir mensagens conflitantes. Ao mesmo tempo, espera-se que as organizações sejam adaptáveis e flexíveis, mas também que sejam estáveis e controladas. Almeja-se ao crescimento, à aquisição de recursos e ao apoio externo, mas também se aspira a um gerenciamento estrito de informações e à comunicação formal (Quinn et alii, 2003). Pretende-se enfatizar o valor dos recursos humanos, mas também enfocar o planejamento e o estabelecimento de metas. Em qualquer organização concreta, todos esses fatores, em alguma medida, fazem-se necessários (Quinn et alii, 2003). O arcabouço não sugere que esses antagonismos não possam coexistir num sistema real; o que ele indica, sim, é que esses critérios, valores e premissas ocupam pólos opostos em nossas mentes. A tendência é considerá-lo mutuamente excludente – isto é, pressupõe-se ser impossível haver dois contrários ao mesmo tempo. Ademais, quando se valoriza um em detrimento do outro, tende-se a desvalorizar ou menosprezar seu oposto (Quinn et alii, 2003). Quinn et alii (2003) defendem o ponto de visto que não só possível, mas como desejável um bom desempenho nos quatro modelos antagônicos concomitantemente. Os quatro modelos do arcabouço representam os valores invisíveis mediante os quais pessoas, políticas e organizações vivem e morrem. Não raro perseguimos cegamente valores de um dos modelos sem considerar os demais. Como resultado, nossas escolhas e o potencial de efetividade são reduzidos (Quinn et alii, 2003). Para os gerentes, o mundo não pára de transformar-se: muda hora a hora, dia a dia, semana a semana. As estratégias que são eficazes em uma situação não o são necessariamente em outra. Além disso, as estratégias que foram eficazes ontem podem não o ser na mesma situação hoje. Os gerentes tendem a aprisionar-se ao seu próprio estilo e aos valores culturais da organização, empregando estratégias muito similares numa ampla variedade de situações. Cada um dos modelos do arcabouço aponta para os benefícios de estratégias diferentes e até contrárias. A estrutura como um todo reflete a complexidade com que as pessoas se deparam nas organizações do mundo real; constitui-se, por conseguinte, numa ferramenta para ampliar o pensamento e incrementar as possibilidades de escolha e eficácia – o que, no entanto, só poderá ocorrer se forem solucionados três desafios, são eles: 1. Apreciar vantagens e desvantagens de cada um dos quatro modelos. 2. Adquirir e utilizar as competências associadas a cada um dos modelos. 3. Integrar de maneira dinâmica as competências de cada um dos modelos às situações gerenciais. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 67 COMPLEXIDADE1 COMPORTAMENTAL E EFICÁCIA DOS LÍDERES GERENCIAIS Na opinião de Quinn, o fato de um indivíduo vencer o desafio 1 e passar a compreender e apreciar cada um dos quatro modelos sugere que ele aprendeu algo no âmbito conceitual e aprofundou sua complexidade cognitiva no tocante à liderança gerencial. As pessoas dotadas de uma elevada complexidade cognitiva com relação a determinado fenômeno são capazes de enxergar o referido fenômeno sob várias perspectivas; são capazes de refletir sobre ele não de forma simples, mas sofisticada. O ganho de complexidade no nível conceitual é o objetivo primário dos cursos mais tradicionais de gestão. A superação do desafio 1, todavia, não significa por si só que alguém possa se tornar um líder gerencial eficaz. Conhecimento não basta (Quinn et alii, 2003). Ensinam Quinn et alii (2003) que, para aumentar sua eficácia, o líder gerencial precisa ultrapassar os desafios 2 e 3 – o que acarreta um ganho de complexidade comportamental. 2.2.2 COMO SE TORNAR UM GERENTE: A NECESSIDADE DE NOVAS COMPETÊNCIAS O quadro de valores concorrentes integra opostos e não é fácil ponderá-los. A incapacidade de compreendê-los pode comprometer o desenvolvimento de que se necessita como líder gerencial. A fim de facilitar o entendimento do modelo proposto, Quinn et alii (2003) iniciam pela descrição dos papéis antagônicos desempenhados pelos gerentes nas organizações. Em seguida, tratam das competências específicas intrínsecas a cada papel; por fim, descrevem um processo para desenvolver cada uma delas na esfera comportamental. OITO PAPÉIS O quadro de valores concorrentes é útil para especificar alguns dos valores e critérios de eficácia segundo os quais unidades de trabalho e organizações são julgadas. Também ajuda a refletir sobre os papéis conflitantes desempenhados pelos gerentes (Quinn, 1984, 1988). A Figura 5 apresenta uma segunda versão do quadro de valores concorrentes. A estrutura da Figura 5 é muito similar à da Figura 4. Contudo, o foco é na eficácia do líder, não na organização ou unidade, especificando-se funções ou expectativas concorrentes que podem ser experimentadas por um gerente (Quinn et alii, 2003). 1 Ensinam Quinn et alii (2003) que a expressão foi cunhada por Hooijberg e Quinn (1992) para referir-se à capacidade de explorar e utilizar competências e comportamentos dos diversos modelos. Baseada na noção de complexidade cognitiva é definida como “a possibilidade de executar uma estratégia razoalmente em termos complexos e em termos cognitivos, desempenhando papéis variados – e até mesmo antagônicos – de maneira altamente integrada e complementar” (p. 164). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 68 Figura 5 Quadro de valores competitivos: Critérios de eficácia Externo Controle Flexibilidade Interno PRODUTOR DIRETOR MENTOR FACILITADOR INOVADOR NEGOCIADOR MONITOR COORDE- NADOR Modelos das Relações Humanas Modelos de Processos Internos $$ Modelos de Metas Racionais Modelos dos Sistemas Abertos Fonte: Quinn, Robert E. et alii. Competências Gerenciais: Princípios e Aplicações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, p. 17. 2.2.2.1 Modelo das Metas Racionais: Os Papéis de Diretor e Produtor No quadrante inferior direito situam-se os papéis de diretor e produtor. Como diretor, espera-se que o gerente explicite expectativas por meio de processos, tais como planejamento e delimitação de metas, e seja um deflagrador decisivo, que define problemas, seleciona alternativas, estabelece objetivos, define papéis e tarefas, gera regras e políticas e fornece instruções (Quinn et alii, 2003). Quando alguém está desempenhando o papel de diretor, não há dúvidas sobre quem manda. Consideremos, por exemplo, a seguinte descrição oferecida por Quinn et alii (2003), de uma certa gerência diretiva: Ela está em toda parte. Parece que nunca vai para casa. Mas não é só a sua energia; ela nos lembra constantemente os motivos de estarmos aqui. Já trabalhei em muitas organizações, mas nunca com tanta clareza de propósitos. Sei que preciso fazer para satisfazê-la, bem como o que a unidade tem de fazer. Há outras unidades por aqui em que os empregados não se importam; mas ela conseguiu que as pessoas se preocupem em fazer o que precisa ser feito. Quando as pessoas pensam no papel de diretor, elas costumam imaginar alguém em ritmo acelerado, conhecido por uma atitude objetiva e por chamar a responsabilidade para si. Aqueles que se sobressaem no papel de diretores são, em geral, altamente competitivos. Capazes de tomar decisões com grande rapidez e de expor suas expectativas com ampla clareza. Assim, todos ficam sabendo exatamente o que devem fazer. Esses indivíduos não raro defendem que há ocasiões em que as pessoas devem ser simplesmente deslocadas ou mesmo afastadas de seus cargos. Nesse tipo de situação, os diretores tendem a ter uma atuação decisiva (Quinn et alii, 2003). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 69 Por outro lado, espera-se que os produtores sejam orientados para tarefas, mantenham o foco no trabalho e exibam um alto grau de interesse, motivação, energia e ímpeto pessoal. Supõe-se que aceitem responsabilidades, realizem tarefas e sustentem uma elevada produtividade pessoal – o que costuma envolver a motivação dos membros da equipe, de modo a aumentar a produção e atingir as metas estabelecidas. Os estereótipos desse papel em geral manifestam um desejo obsessivo por atingir determinado objetivo (Quinn et alii, 2003). 2.2.2.2 Modelo dos Processos Internos: Os Papéis do Monitor e do Coordenador No quadrante inferior esquerdo encontram-se os papéis do monitor e do coordenador. Como monitor, o gerente deve saber o que se passa em sua unidade, determinar se as pessoas estão cumprindo as regras e averiguar se o setor está fazendo sua parte. O monitor domina todos os fatos e detalhes, e é um bom analista. As características desse papel incluem o gosto por formulários, pela análise e resposta a informações de rotina pela condução de inspeções e vistorias, e pela revisão de relatórios e outros documentos (Quinn et alii, 2003). Eis um exemplo oferecido por Quinn et alii (2003): Ela está aqui há anos; todo mundo a consulta antes de fazer qualquer coisa. É um computador ambulante: lembra-se de todas as minúcias e acompanha cada transação. Por acordos firmados há oito anos, ela sabe que unidade deve equipamentos a que outra seção. Nada lhe escapa: tem um sexto sentido que sempre detecta quando alguém tenta esconder-lhe alguma coisa. Como coordenador, espera-se que o gerente dê sustentação à estrutura e ao fluxo do sistema. Aquele que desempenha esse papel deve ser digno de confiança e crédito; entre seus traços comportamentais figuram recursos diversos para a facilitação do trabalho como, por exemplo, o agendamento, organização e coordenação dos esforços da equipe, o enfrentamento de crises e a resolução de dificuldades de ordem tecnológica, logística e doméstica (Quinn et alii, 2003). 2.2.2.3 Modelo das Relações Humanas: Os Papéis de Facilitador e de Mentor Espera-se que o facilitador fomente os esforços coletivos, promova a coesão e o trabalho em equipe e administre conflitos interperpessoais. Nesse papel, para o gerente é fundamental: o uso de técnicas de resolução de conflitos; o reforço da coesão e do moral coletivo; a obtenção de colaborações e ajuda na solução dos problemas do grupo (Quinn et alii, 2003). 2.2.2.4 Modelo dos Sistemas Abertos: Os Papéis de Inovador e Negociador Os papéis de inovador e negociador, no quadrante superior direito da estrutura, refletem os valores do modelo dos sistemas abertos. Como inovador, o gerente é encarregado de facilitar a adaptação e a mudança; deve prestar atenção ao ambiente em transformação, identificar tendências significativas, conceituar e projetar mudanças necessárias e tolerar as incertezas e riscos. Nesse papel, os gerentes baseiam-se na indução, em idéias e em insights intuitivos; espera-se que sejam sonhadores, inteligentes e criativos, capazes de enxergar longe, vislumbrar IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 70 inovações, apresentá-las em embalagens convidativas e convencer os demais de que são necessárias e desejáveis (Quinn et alii, 2003). Os gerentes, na função de negociadores, devem ter astúcia política, capacidade de persuasão, influência e poder. Encontram-se com pessoas de fora de sua própria unidade para representar, negociar e adquirir recursos; vendem e servem de intermediários e porta-vozes (Quinn et alii, 2003). 2.2.2.5 Os Oito Papéis em Diferentes Níveis Organizacionais Ao incentivar a reflexão sobre os oito papéis de liderança gerencial supracitados, Quin et alii (2003) observam que as descrições se aplicam tanto a supervisores de primeiro escalão quanto a gerentes de nível executivo de grandes organizações; representam descrições genéricas de comportamentos gerenciais que não são necessariamente ligados a um nível específico da hierarquia administrativa. Com efeito, pesquisadores e consultores têm utilizado o quadro de valores competitivos para estruturar programas de treinamento, desenvolvimento e educação gerencial para profissionais das esferas iniciais, intermediária e alta (Quinn et alii, 2003). Figura 6 Os oito papéis de liderança e suas respectivas competências-chave Papel de mentor Papel de facilitador Papel de monitor 1. Compreensão de si mesmo e dos outros 2. Comunicação eficaz 3. Desenvolvimento dos empregados 1. Construção de equipes 2. Uso do processo decisório participativo 3. Administrador de conflito 1. Monitoramento do desempenho individual 2. Gerenciamento do desempenho e processos coletivos 3. Análise de informações com pensamento crítico Papel de coordenador 1. Gerenciamento de Projetos 2. Planejamento do trabalho 3. Gerenciamento Multidisciplinar Papel de diretor 1. Desenvolvimento e comunicação de uma visão 2. Estabelecimento de metas e objetivos 3. Planejamento e organização Papel de produtor 1. Trabalho produtivo 2. Fomento de um ambiente de trabalho produtivo 3. Gerenciamento de tempo e estresse Papel de negociador 1. Construção e Manutenção de uma base de poder 2. Negociação de acordos e compromissos 3. Apresentação de idéias Papel de inovador 1. Convívio com a mudança 2. Pensamento criativo 3. Gerenciamento da mudança Fonte: Quinn, Robert E. et alii. Competências Gerenciais: Princípios e Aplicações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003, p. 25. Não obstante, as responsabilidades gerenciais dependem do nível da hierarquia organizacional em que se situam. Basta um pouco de senso comum para se chegar à conclusão de que as tarefas e atribuições inerentes ao profissional que, num cargo de gerência no primeiro escalão, desempenha o papel de negociador, por exemplo, provavelmente serão inteiramente diversas daquelas de um alto gerente cumprindo o mesmo papel (Quinn et alii, 2003). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 71 Em alguns casos, contudo, embora as tarefas e atribuições específicas variem conforme o nível hierárquico, algumas das competências necessárias para a realização dos vários papéis permanecem as mesmas. Ao concordarem com Kiechel (1994), Quinn et alii (2003) consideram que, por exemplo, todos os gerentes necessitam de boas habilidades interpessoais e de uma alta dose de autoconsciência. Analogamente, todos devem ser capazes de desenvolver planos e adaptá-los quando as circunstâncias mudam. Neste último caso, entretanto, o escopo e a extensão do planejamento provavelmente vão diferir, assim como as etapas do processo de planejamento. Dessa forma, os gerentes talvez precisem adquirir diferentes competências para poderem planejar em diversos patamares da organização (Quinn et alii, 2003). A Figura 6 exibe um resumo dos oito papéis segundo suas respectivas competências-chave. Baseados em Faerman e Peters (1991), Quinn et alii (2003) ensinam que, à medida que vão sendo promovidos de um escalão organizacional para o seguinte, os gerentes têm de identificar que comportamentos associados às várias competências de papel mantêm-se inalterados; que novos comportamentos precisam ser aprendidos; e quais terão de desaprender. Do mesmo modo é imprescindível que os responsáveis pelos processos de Gestão de Pessoas e os mentores dos gerentes em sua trajetória ascendente compreendam que as similaridades e diferenças entre os cargos gerenciais dos vários patamares hierárquicos podem servir de pontos de apoio para que os indivíduos cresçam e se desenvolvam por ocasião dessas transições (DiPadora e Faerman, 1993 apud Quinn et alii, 2003). 2.2.3 ORGANIZANDO O PROCESSO DE APRENDIZAGEM Uma competência implica a detenção tanto de um conhecimento quanto da capacidade comportamental de agir de maneira adequada (Quinn et alii, 2003). No Capítulo 5 essa noção será discutida em profundidade. Para desenvolver determinadas competências é preciso tanto ser apresentado ao conhecimento teórico quanto ter a oportunidade de praticá-las. Muitos livros e métodos didáticos comunicam o conhecimento, mas não dão a oportunidade de desenvolver habilidades concretas (Quinn et alii, 2003). Quinn et alii (2003) fornecem esses dois aspectos. A estrutura utilizada pelos autores baseia-se no modelo de cinco passos elaborados por Whetten e Cameron (1994), que opta por uma abordagem desenvolvimentista-instrucional – a do especialista que profere uma palestra mais as oportunidades dadas aos alunos de experimentarem novos comportamentos –, em detrimento da aprendizagem de uma abordagem instrucional – de um especialista que profere uma palestra. Quinn et alii (2003) modificaram a denominação de um dos componentes do modelo de Whetten e Cameron e batizaram o modelo de AAAPA. As etapas são as seguintes: 1a) Avaliação: Ajuda a descobrir seu grau de habilidade e consciência atuais da competência em questão. Para tanto, pode-se usar uma variedade de ferramentais, tais como questionários, representação de cenas e debates em grupo. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 72 2a) Aprendizagem: Envolve a leitura e apresentação de informações sobre o tópico usando-se ferramentas tradicionais, tais como palestras e material impresso. Aqui, apresentam-se dados de pesquisas pertinentes e sugerem-se diretrizes para a prática. 3a) Análise: Explora comportamentos apropriados e inapropriados mediante o exame do comportamento alheio em determinada situação. Para tanto, o uso de casos é recomendado. Representação de cenas ou outros exemplos de comportamento. O professor também pode utilizar exemplos de filme, programas de televisão ou romances populares para análise dos alunos. 4a) Prática: Permite a aplicação da competência, em sala de aula, a uma situação análoga ao que se encontraria no trabalho. É uma oportunidade de experimentação e feedback. Sugere-se, também, o emprego de exercícios, simulações e representações de cenas. 5a) Aplicação: Oferece a chance de transferir o processo para situações da vida real. Em geral, as tarefas são concebidas de modo a facilitar a experimentação a curtos e longos prazos. 2.3 EMPOWERMENT: UMA ABORDAGEM CRÍTICA A despeito de todo o falatório e programas de mudança, o empowerment ainda é basicamente uma ilusão. Chris Argyris 2 Pergunta Argyris: Quem não gostaria de ter mais empregados altamente motivados para ajudar a galgar o século vinte e um? “Afinal, como disse um CEO” – ilustra o autor – “nenhuma visão ou estratégia pode ser realizada sem empregados capazes e com poderes” (Argyris, 1998). Enquanto os executivos de primeiro escalão aceitam suas responsabilidades de tentar desenvolver o empowerment dos empregados, os profissionais de recursos humanos elaboram impressionantes teorias sobre motivação interna. Além disso, os especialistas ensinam a administração de mudanças, enquanto que os próprios executivos lançam um número indefinido de programas, desde a reengenharia, passando pela melhoria contínua, até o TQM. Mas para Argyris pouco disso funciona (Argyris, 1998), como será ilustrado a seguir. Na opinião do pesquisador (1998), a despeito dos esforços enumerados, uns poucos executivos negariam que o empowerment pouco cresceu durante os últimos 30 anos. Mas o porquê disso permanece um enigma. Na opinião do autor, a resposta é complexa (Argyris, 1998). Tanto os programas quanto as práticas de mudança empregadas estão repletos de contradições internas que mutilam a inovação, a motivação e o ímpeto. Ao mesmo tempo, sutilmente os CEOs boicotam o empowerment. Em teoria, os 2Professor emérito da cadeira James Bryant Conant de Educação e Comportamento Organizacional da Universidade de Harvard, em Cambridge, Massachussets. Autor de “Empowerment: the emperor’s new clothes”, in: Harvard Business Review, v. 76, no 3, pp. 98-105, mai./jun. 1998. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 73 gerentes veneram o empowerment, mas o modelo de comando e controle é aquele que melhor conhecem e confiam (Argyris, 1998). De sua parte, os empregados são geralmente ambíguos quanto ao empowerment – é ótimo conquanto não haja responsabilização pessoal. Mesmo os profissionais de mudança com freqüência sufocam o empowerment (Argyris, 1998). Daí que, pondera Argyris (1998), a despeito de todos os esforços já envidados para fomentá-lo, o empowerment permanece muito semelhante à roupa nova do imperador: em público o louvamos ruidosamente, mas privadamente perguntamo-nos por que não podemos vê-lo. Não houve uma transformação da força de trabalho; nenhuma metamorfose radical ocorreu. 2.3.1 OS TIPOS DE COMPROMETIMENTO Na opinião de Argyris (1998), para entender os motivos pelos quais o empowerment, a despeito das expectativas não provocou transformação concreta, há que se entender a noção de comprometimento. Ensina Argyris (1998), que o comprometimento não é simplesmente um conceito de relações humanas. É uma idéia que é fundamental para o nosso raciocínio sobre economia, estratégia, governança financeira, tecnologia de informações e operações. O comprometimento diz respeito à geração de energia humana e à ativação da mente humana. Sem ele, a implementação de qualquer nova iniciativa ou idéia estaria sob séria ameaça. Os seres humanos podem se comprometer de duas maneiras fundamentalmente diferentes: externa e internamente. Ambas são valiosas no local de trabalho, mas apenas o comprometimento interno reforça o empowerment (Argyris, 1998). Ver Figura 7. Comprometimento externo – se for considerado como uma obediência contratual, o resultado será que os funcionários terão pouco controle sobre seus destinos (Argyris, 1998). Na opinião de Argyris (1998) é uma verdade fundamental da natureza e psicologia humanas que “quanto menos poder as pessoas têm para moldar suas vidas, tanto menor será o seu comprometimento”. Se, por exemplo, a alta administração, isoladamente, define as condições de trabalho para os empregados, estes quase certamente se comprometerão externamente. O comprometimento é externo porque tudo que se permite que os empregados façam é o que se espera deles. Os empregados não se sentirão responsáveis pela forma que a sua própria situação é definida. Como poderiam, se a definição não foi feita por eles? Pergunta Argyris (1998). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 74 Figura 7 Como o Comprometimento Difere Comprometimento Externo • Tarefas definidas por outros. • O comportamento necessário para realizar tarefas é definido por outros. • Objetivos de performance são definidos pela gerência. • A importância dos objetivos é definida por outros. Comprometimento Interno • Importância dos objetivos. • Indivíduos definem as tarefas. • Indivíduos definem o o comportamento necessário para a realização das tarefas. • Objetivos de performance são definidos por indivíduos e pela gerência. • Indivíduos definem a importância dos objetivos. Dois Tipos de Comprometimento Fonte: Argyris, C. “Empowerment: the emperor’s new clothes”, in: Harvard Business Review, v. 76, no 3, pp. 98-105, mai./jun. 1998. Se a administração espera que os empregados assumam mais responsabilidade por seus próprios destinos, deve encorajar o desenvolvimento do comprometimento interno (Argyris, 1998). Estabelece-se dessa forma um tipo de contrato psicológico. Como o próprio nome diz, o comprometimento interno vem de dentro. Afirma Argyris (1998) que “os indivíduos se comprometem com um projeto, pessoa ou programa com base em suas próprias razões ou motivações”. Assim, por definição, o comprometimento interno é participativo e está estreitamente associado com o empowerment. Quanto mais a alta administração quiser o comprometimento interno de seus empregados, tanto mais deve tentar envolver os empregados na definição dos objetivos de trabalho, especificando a forma como atingi-los e estabelecendo metas flexíveis (Argyris, 1998). Um questionamento oportuno é se todos devem participar para que o empowerment exista em uma organização. Sugere Argyris (1998) que, em princípio, a resposta é “sim”; na realidade, há um “porém”. Não é realista esperar que a administração permita que milhares de empregados participem plenamente do autogerenciamento. O grau em que o comprometimento interno é plausível em qualquer organização é certamente limitado. Além disso, o grau da participação nas metas e aspirações corporativas variará com os desejos e intenções de cada empregado (Argyris, 1998). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 75 Para Argyris (1998), o importante é lembrar que o empowerment é uma meta em que as organizações se aproximam, mas nunca chegam a atingir. Contudo, é fato que é possível se ter vários níveis de comprometimento em uma organização e mesmo assim realizar-se o trabalho. Os empregados não têm problemas para compreender a necessidade de manter-se dentro de limites. Para a alta administração, então, o essencial é saber se há limites para o comprometimento interno (Argyris, 1998). Os empregados não compreendem, de fato, e ressentem-se da contínua pregação de comprometimento interno por parte de executivos que continuam a exigir um comprometimento externo da maioria dos trabalhadores. Com efeito, uma grande fonte de descontentamento nas organizações é que os executivos de alto escalão ao abraçar de forma superficial o empowerment, arriscam sistematicamente a credibilidade dessa ferramenta de gestão. (Argyris, 1998). Assim, na medida em que o comprometimento interno proporciona o tipo de resultados que os CEOs dizem querer, então “eles devem ser realistas e judiciosos em suas exigências nesse sentido”. Mas o problema vai mais fundo porque o quadro de referência utilizado pela maioria das organizações para se transformar desestimula os empregados a realmente assumirem responsabilidade em seus trabalhos (Argyris, 1998). A respeito do conceito de comprometimento organizacional, é importante considerar o ponto de vista de Lee & Olshfski (2002). Ensinam os autores que o conceito de comprometimento organizacional tem sido objeto de interesse de diversos teóricos e pesquisadores tanto no setor público quanto no setor privado. Existem estudos que o definem tanto como causa quanto como conseqüência de variáveis relacionadas ao comportamento organizacional. Como conseqüência, o comprometimento organizacional está ligado ao ajuste entre a pessoa e a organização, à satisfação no trabalho e a variações na estrutura e na cultura da organização. Como causa, o comprometimento organizacional tem sido utilizado para prever o comportamento dos funcionários quanto à sua vontade de sair ou permanecer na organização, quanto ao nível de absenteísmo e quanto à sua performance, entre outros (Lee & Olfshski, 2002). Por outro lado, ensina Robbins (1998), que muitos estudos sobre o comportamento organizacional têm se concentrado em três atitudes: satisfação no trabalho, envolvimento com o trabalho e comprometimento organizacional. O termo satisfação no trabalho refere-se à atitude geral do indivíduo em relação a seu emprego. Nessa medida, enquanto uma pessoa com alto nível de satisfação no trabalho tem atitudes positivas em relação ao emprego, uma outra, insatisfeita com relação a seu trabalho, tem atitudes negativas quanto ao emprego. O termo envolvimento com o trabalho, segundo o autor, é uma das mais recentes inserções à literatura sobre o comportamento organizacional. Embora ainda não exista concordância completa quanto ao significado dos termos, uma definição viável afirma que o envolvimento com o trabalho mede o grau em que uma pessoa se identifica psicologicamente com seu trabalho e considera o nível percebido de desempenho importante para sua autovalorização (Robbins, 1998). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 76 Assim, Robbins (1998) define comprometimento organizacional como um estado em que o empregado identifica-se com uma organização especial e suas metas, e deseja manter-se ligado a esta organização. Por sua vez, Siqueira (2001) afirma que a consecução de objetivos, o alcance de metas e a competitividade de uma empresa passam, necessariamente, pelo grau de comprometimento organizacional de seus membros. Enquanto isso, Allen e Meyer (1990) propuseram um modelo de comprometimento organizacional configurado em três componentes: afetivo, instrumental e normativo. Por intermédio dessa abordagem, os autores tanto reconhecem a existência de três estilos de ligação do empregado à organização, distintos e independentes, quanto reafirmam que os três estilos reduzem a possibilidade de rotatividade. São as razões para o empregado permanecer trabalhando na organização que inspiraram os dois estudiosos a distinguir a natureza psicológica entre os três vínculos e a postular que os mesmos constituem três componentes, mas não três estados de comprometimento: o desejo – comprometimento afetivo –, a necessidade – comprometimento instrumental ou calculativo – e a obrigação moral – comprometimento normativo – do empregado que o motivam a permanecer na organização (Allen e Meyer, 1990). Assim, quando o indivíduo internaliza os valores da organização, identifica-se com suas metas ou envolve-se com os papéis de trabalho, desempenhando-os de forma a facilitar a consecução dos objetivos do sistema, considera-se que foi desenvolvida uma ligação psicológica, de natureza afetiva, com a organização. Já o comprometimento calculativo (Mathie e Zajac, 1990) com a organização seria suscitado pela avaliação positiva dos resultados – posição alcançada na organização, acesso a certos privilégios ocupacionais, benefícios oferecidos pelo sistema a empregados antigos, planos específicos de aposentadoria – conseqüentes aos investimentos do empregado e, também, pela possibilidade percebida de perder, ou de não ter como repor, vantagens decorrentes dos investimentos, caso se desligasse da organização. Seu desenvolvimento – ou aparecimento – pode ser atribuído a um raciocínio econômico, podendo ser representado mentalmente por crenças, percepções ou avaliações a respeito de uma relação social de troca. O compromisso normativo significa, segundo Wiener e Vardi (1980, 1990) e Wiener (1982), uma forte tendência do indivíduo para guiar seus atos por valores culturais internalizados sem, muitas vezes, se dar conta de quão pouco racionais certas ações deles decorrentes possam parecer. Diferentemente dos dois enfoques anteriores, em que a concepção de comprometimento com a organização está alicerçada em uma ligação afetiva ou na percepção de custos ou perdas associados ao rompimento de relações de trabalho com ela, o vínculo normativo se constitui num conjunto de pensamentos de reconhecimento de obrigações e deveres morais para com a organização, os quais são também acompanhados ou revestidos de sentimentos de culpa, incômodo, apreensão e preocupação quando o empregado pensa ou planeja se retirar da organização. Segundo os autores, os padrões de comportamento apresentados pelo indivíduo com compromisso normativo revestem-se de "sacrifício pessoal, persistência e preocupação pessoal" (Wiener e Vardi, 1980, 1990 e Wiener 1982). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 77 2.3.2 OS PROGRAMAS DE MUDANÇA AUMENTAM AS CONTRADIÇÕES INTERNAS As contradições internas permeiam os grandes programas de mudança. Com isso, Argyris (1998) quer dizer que mesmo quando esses programas e políticas são implementados corretamente, não fomentam – nem podem – o comportamento que pretendem inspirar. Se as contradições internas forem trazidas à tona e trabalhadas, será possível lidar com elas de maneira bem-sucedida; isto é, elas não irão inibir o tipo de comprometimento pessoal que a administração pretende. Mas se as contradições permanecerem abafadas e não reconhecidas, como geralmente acontece, se tornarão uma força destrutiva. Irão não somente asfixiar o desenvolvimento do empowerment, mas também corroer a eficiência da empresa gerando frustração e desconfiança (Argyris, 1998). Para ilustrar, Argyris (1998) observa a recomendação que atualmente representa a melhor prática para a implementação e promoção da mudança organizacional. Essa recomendação decompõe o processo em quatro passos básicos: ! Definir uma visão. ! Definir uma estratégia competitiva consistente com a visão. ! Definir processos de trabalho organizacionais que, quando executados, implementarão a estratégia. ! Definir os requisitos de trabalho individuais de forma que os empregados possam executar os processos com eficácia. O padrão subjacente a essas recomendações é consistente com o que os pesquisadores e praticantes de mudanças aprenderam sobre implementação eficaz ao longo dos anos. Parte-se de um quadro de referência claro – uma visão – tornando-o progressivamente operacional, a fim de concretizá-lo. Para que ninguém tenha dúvidas sobre como alinhar as quatro partes do processo, é recomendável que a administração fale em uníssono. Esse processo faz sentido. É racional (Argyris, 1998). Contudo, prossegue Argyris (1998), o processo está tão impregnado de contradições internas que os programas de mudança que o tomarem como norma acabarão gerando confusão, particularmente no estágio de implementação. Dado que todos os passos foram precisamente descritos mediante um conjunto de instruções, a recomendação encoraja, na verdade, comprometimento mais externo do que interno. Está claro que quando as ações dos empregados são definidas quase exclusivamente a partir de fora – como acontece na maioria dos programas de mudança – o resultado não é o empowerment (Argyris, 1998). Uma conseqüência imediata é o distanciamento silencioso dos empregados do programa de mudanças, Assim, o programa é bem-sucedido em termos da melhoria do desempenho porque ele ajuda a reduzir os erros – como no caso da Qualidade Total –, ou porque ajuda os empregados a aplicarem as melhores práticas. Mas ao mesmo tempo, ele abafa o comprometimento interno. Em resumo, IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 78 a recomendação para implementar a mudança simplesmente não proporciona a nova fonte de energia que muitos executivos desejam (Argyris, 1998). Alerta Argyris (1998) para o fato de que o perigo real é que os programas de mudança acabam por envenenar toda a organização com mensagens de ambigüidade duradoura. Os empregados internamente comprometidos interpretam essas mensagens como “trabalhe com independência – segundo nossas instruções”. Relutantemente, eles se conformam. Os empregados que preferem o comprometimento externo também captam mensagens ambíguas; estes, entretanto, ficarão aliviados porque se sentem protegidos de terem que assumir qualquer responsabilidade pessoal (Argyris, 1998). Dessa forma, os próprios hábitos de trabalho que os executivos não desejam que permaneçam em sua organização são fortalecidos e revigorados. O resultado é invariavelmente mais contradições internas e mais ineficiência e cinismo, que se somam para obstruir o caminho da verdadeira mudança (Argyris, 1998). 2.3.3 AS RESISTÊNCIAS DOS CEOS Os CEOs trabalham contra o empowerment, de forma tanto consciente quanto inconsciente. Surpreendentemente – pelo menos para os observadores externos –, os executivos nem sempre parecem desejar o que dizem querer. Considere alguns comentários típicos com que Argyris se deparou durante a sua pesquisa. Esses comentários – extraídos de uma discussão de mesa-redonda com executivos de empresas de classe mundial – indicam muito claramente a ambigüidade dos CEOs em relação ao comprometimento interno e o empowerment (Argyris, 1998). O primeiro CEO observou que com “processos bem definidos, onde as variâncias sejam pequenas e os limites operacionais bem definidos”, não se necessita mais da velha abordagem de comando e controle. Os trabalhadores agora têm poderes, “conquanto respeitem o processo”, disse. O segundo CEO concordou que esses “processos são liberatórios”, enquanto o terceiro observava que muitos empregados encontram grandes dificuldades para entender o significado de os processos serem “confiáveis, respeitáveis e sob controle” (Argyris, 1998). Sobre o assunto, Argyris (1998) convida à reflexão: “como pode haver empowerment quando não há esforço de conjecturas, nem desafios...?” Pausa para reflexão: Em sua opinião, é possível um indivíduo se sentir internamente comprometido quando existe um controle de cima para baixo sobre ele? Este não é um meio pelo qual os indivíduos possam aspirar à autogovernança. Ao contrário, conquanto aceitem e sigam os ditames dos processos, os empregados das empresas há pouco descritas, irão se tornar apenas externamente motivados (Argyris, 1998). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 79 O entusiasmo pelo uso de paladinos (champions) em virtualmente todos os programas de mudança contemporâneos passa uma mensagem similarmente ambígua dos CEOs aos empregados (Argyris, 1998). A alta administração está bastante consciente dos perigos da implementação gradativa e da subseqüente dissipação dos grandes programas de implementação; empenha-se por superar estes problemas por intermédio da ação de paladinos. Esses, por seu turno, perseguem os objetivos de desempenho com tenacidade, gerenciando por decreto. Dispõem de generosos recursos para assegurar a conformidade e monitoram com freqüência o progresso dos empregados. No todo, esses comportamentos reforçam os aspectos de controle de cima para baixo do modelo de comprometimento externo (Argyris, 1998). A voz isolada de fervorosos paladinos leva os empregados a acreditarem que a administração tem o controle, afugentando o sentido de responsabilidade interna e empowerment pessoal. Como os empregados podem se sentir com mais poder se alguém de cima os está sempre “vendendo” ou controlando? Pergunta Argyris (1998). Com efeito, tais paladinos não seriam necessários se os empregados estivessem internamente comprometidos. Na opinião de Argyris (1998), o resultado de todas essas intervenções é a desordem. Em desacordo com os programas de mudança que utilizam, os gerentes solapam o empowerment que tão desesperadamente querem atingir. Por que isso ocorre? Poderia ser que os executivos de primeiro escalão dos dias de hoje não querem realmente o empowerment de seus empregados? Responde Argyris (1998): na verdade, é provável que estejam incertos. Ao mesmo tempo, os empregados não censuram os executivos por seu comportamento. Seus próprios sentimentos a respeito do empowerment são ambíguos, como será exposto a seguir. 2.3.4 OS EMPREGADOS QUESTIONAM O comprometimento externo é um mecanismo psicológico de sobrevivência para muitos empregados – é uma forma de comportamento adaptativo que permite aos empregados se sustentarem na maioria dos ambientes de trabalho. A fim de explicar como esse mecanismo funciona hoje em dia, Argyris (1998) lança mão do caso da ex-Alemanha Oriental. Com a queda do muro de Berlim, chegou ao fim um modo de vida rotineiro para os trabalhadores alemães orientais. A maioria deles havia aprendido a sobreviver pela conformidade. Por 40 anos, a maioria das fábricas foi gerida de acordo com os ditames do planejamento central. Se muitos alemães orientais tivessem reivindicado um maior controle sobre seus destinos, suas vidas correriam perigo. Como resultado, ao longo dos anos eles aprenderam a definir o desempenho como sendo o mínimo que se exigia deles (Argyris, 1998). Depois do colapso do comunismo, Argyris participou de muitas discussões com executivos da Alemanha Ocidental que estavam surpresos e desconcertados com a falta de iniciativa e aspiração exibida pelos alemães orientais (Argyris, 1998). Para Argyris (1998), o que esses executivos não puderam compreender é como pode ser perturbador para as pessoas, ou até mesmo assustador, encarar o comprometimento interno seriamente. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 80 Enquanto escutava os executivos da Alemanha Ocidental, que queriam fazer que os empregados da Alemanha Oriental se tornassem mais comprometidos internamente, Argyris (1998) pensou nos vários casos nos Estados Unidos e em outras partes, onde problemas semelhantes existem. Repetidas vezes em sua experiência, o pesquisador referenciado verificou que o comprometimento externo prolongado tornava o comprometimento interno extremamente improvável, visto que o sentido de empowerment não é inato. É algo que tem de ser aprendido, desenvolvido e aguçado (Argyris, 1998). Para Argyris (1998) a pergunta, então, é “Como se pode produzir o comprometimento interno?”. Inegável é o fato de que os programas de incentivo que os executivos têm usado – por exemplo, maior remuneração, melhores planos de carreira, prêmios de reconhecimento ao “empregado do mês” – simplesmente não funcionam (Argyris, 1998). Ao contrário, em todos os seus anos como consultor de mudança, o autor pode repetidamente atestar como oferecer as recompensas “certas” aos empregados cria dependência em vez de empowerment. De forma inevitável, a força desses métodos se desgasta com o uso e tudo o que se pôde criar foi mais comprometimento externo (Argyris, 1998). Considere uma empresa com expressivos problemas financeiros. Nesse caso, o CEO decidiu aumentar, à custa de considerável sacrifício pessoal, os salários de seus empregados. Mas sua própria pesquisa mostrou mais tarde que os empregados meramente consideravam que seus aumentos acompanhavam o seu valor no mercado de trabalho (Argyris, 1998). O comprometimento interno não crescera. Os empregados continuavam a fazer apenas o que lhes era pedido, conquanto fossem aumentadas as recompensas. Seguiam as regras, mas não tomavam nenhuma iniciativa. Não assumiam riscos, nem tampouco mostravam o senso de responsabilidade pessoal que a administração buscava (Argyris, 1998). Foi uma surpresa para o CEO, mas na opinião de Argyris (1998) esses dois resultados eram inteiramente previsíveis por duas razões: 1. O pagamento, como outro esquema de incentivo popular, com freqüência promove o comprometimento externo enquanto cria uma propensão contra o comprometimento interno. 2. Não é com mais entusiasmo do que a administração que muitos empregados acolhem a idéia de empowerment. Para muitas pessoas, o empowerment significa somente excesso de trabalho. Como os trabalhadores da Alemanha Oriental, quase todos os empregados aprenderam a sobreviver baseando-se no comprometimento externo. Quando se trata de empowerment, empregados e executivos estão empenhados em um exercício de simulação: a administração diz querer que os empregados participem mais; os empregados dizem que querem estar mais envolvidos (Argyris, 1998). Mas é difícil saber quem pretende o quê. Trata-se apenas de uma charada? Pergunta-se Argyris (1998). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 81 Os empregados pressionam por maior autonomia; a administração defende os princípios corretos, mas tenta manter o controle através de processos, ferramentas e sistemas de informações (Argyris, 1998). Os empregados vêem vestígios do velho modelo de comando e controle confirmando suas piores suspeitas – de que seus superiores querem poderes indiscutíveis. A administração enuncia que só quer números melhores. Assim prossegue a batalha entre a autonomia e o controle e, entrementes, enquanto as empresas fazem a transição para o próximo século, o potencial para empowerment real é desperdiçado (Argyris, 1998). 2.3.5 OS AGENTES DE MUDANÇA INIBEM O EMPOWERMENT Durante a última década, Argyris teve a oportunidade de trabalhar com mais de 300 profissionais de mudança em diferentes organizações. Tais indivíduos diferem, evidentemente, nas suas práticas e na eficácia, mas mais impressionante do que as diferenças são os padrões recorrentes (Argyris, 1998). Surpreendido no meio da batalha entre a autonomia e o controle, o profissional de mudança tem uma missão espinhosa. Ostensivamente o seu papel, seja ele interno ou externo, é facilitar a mudança organizacional e o aprendizado contínuo. A seu próprio modo, no entanto, a vasta maioria dos profissionais de mudança, na verdade, inibe o empowerment nas organizações (Argyris, 1998). Para entender como isso ocorre, considere o que acontece quando Tom, um agente de mudança, tenta trabalhar com Jack, um gerente de linha. Esclarece Argyris (1998) que ambos são figuras compósitas representativas daqueles que encontrou em seus trabalhos de campo. Jack é instruído por seu chefe a trabalhar com Tom, que está lá para “ajudar” Tom no empowerment de sua organização. O programa de mudança inicia com uma série de reuniões e discussões. Tom discorre passionalmente sobre abertura, honestidade e confiança como as fundamentações do empowerment. Muitos empregados saem dessas reuniões esperançosos quanto à direção que a empresa está tomando em relação a comunicações mais abertas. Com um mês de programa, entretanto, Tom observa que Jack recaiu em seu velho estilo gerencial. Tom decide que o melhor é confrontar Jack: O que Tom pensa, porém não diz: O que Tom e Jack dizem: Tom: As coisas não vão bem. Tom: E então, como vão as coisas? Jack: Tudo indo muito bem. O pessoal de cima está colocando muita pressão, mas estamos em dia com os números das metas. Tom: É demais. Jack não se importa com nada além de números. O empowerment nem consta de sua agenda. Tom: Que bom. Ótimo. Mas eu também estava me perguntando como estamos indo em termos de conseguir maior comprometimento das pessoas para com seus trabalhos. Você acha que elas sentem que têm mais poder? IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 82 Jack: Acho que está tudo indo bem. Quando há problemas, as pessoas vêm até a mim e buscamos a solução. Claro, algumas pessoas nunca estão satisfeitas. Mas são poucas e dá para resolver o caso delas. Tom: Exatamente o que eu temia. Jack não está colocando o discurso em prática. Não assimilou nada. Tom: Mas, Jack, se você resolve todos os problemas dos empregados, como vamos fazer o empowerment deles? Tom: Isso é um caso perdido! Deve haver uma maneira mais fácil de ganhar a vida. Nunca vou conseguir me comunicar com ele. Gostaria de poder dizer tudo a ele, mas não quero colocá-lo na defensiva. Tenho que me manter frio. Jack: Bem, para ser franco com você, Tom, o sinal que me enviam lá de cima é que meu trabalho é garantir que os números sejam atingidos sem ter que, sabe como é, aborrecer as pessoas. E para ser justo, é o que acho que estou fazendo. Fonte: Argyris, C. “Empowerment: the emperor’s new clothes”, in: Harvard Business Review, v. 76, no 3, pp. 98-105, mai./jun. 1998. Que está acontecendo neste caso? Pergunta Argyris (1998). O programa de mudança foi iniciado com grande entusiasmo, mas agora está claro que se encontra seriamente ameaçado. Esse é um padrão que o pesquisador observou inúmeras vezes. Passada a excitação inicial, a realidade inevitavelmente se impõe (Argyris, 1998). Com a retórica agradável colocada à margem, os empregados irão ter problemas. Eles irão recorrer à ajuda de seus gerentes, que irão lhes dizer o que fazer. É assim que a maior parte do trabalho é feita e que as organizações atingem suas metas numéricas. E, em muitos casos, nada há de errado com isso, exceto que entra em choque com a teoria do empowerment (Argyris, 1998). Como Tom age quando observa que Jack diz aos empregados o que eles devem fazer? Questiona Argyris (1998). Em vez de buscar entender se Jack está agindo de maneira acertada nessa situação, especialistas em mudança, como Tom, quase sempre ficarão atônitos porque os gerentes não estão colocando em prática o discurso do empowerment (Argyris, 1998). Raramente Argyris assistiu um profissional de mudança ajudar um gerente a lidar de maneira eficaz com uma situação crítica envolvendo escolhas difíceis. Ainda IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 83 mais incomum é um agente de mudança que ofereça aconselhamento prático ao gerente sobre como agir (Argyris, 1998). Além de não estar disposto a reconhecer o problema real que Jack está tendo, Tom ainda encobre seus próprios pensamentos. Tenta agir como se ainda acreditasse que o programa pode ser bem-sucedido quando, de fato, perdeu a esperança. O próprio Tom é culpado de não colocar em prática o discurso da abertura, honestidade e confiança (Argyris, 1998). Segundo a experiência de Argyris (1998), os gerentes de linha são muito mais dispostos a reconhecer as contradições internas dos programas de mudança – privadamente, pelo menos. Podem admitir que se distanciam dos aspectos menos substanciais – participação interativa, comprometimento interno e pensamento descontínuo – para, em vez disso, focalizar os números. Gerentes como Jack freqüentemente concluem – corretamente, receia Argyris (1998) – que o agente de mudança não sabe ajudá-los. Por isso, Jack escuta polidamente enquanto Tom o avisa sobre os perigos dos retrocessos e o estimula a ser mais persistente. E então Jack continua com seu trabalho (Argyris, 1998). Conclui Argyris (1998): “no final, todos se frustram.” Na teoria, o empowerment deveria tornar mais fácil às organizações alcançarem suas metas numéricas. Mas quando os programas de mudança são impostos sem reconhecer as limitações do empowerment, e quando gerentes e empregados não recebem ajuda para lidar com essas limitações de forma eficaz e aberta, a organização ficará, no mínimo, pior do que estava antes (Argyris, 1998). De forma muito freqüente o empowerment adentra o domínio do politicamente correto, o que significa que ninguém pode dizer o que está pensando. Isso é um despropósito. Nesse cenário, se alguém discorda do agente de mudança, torna-se inimigo da mudança (Argyris, 1998). Em decorrência, ao invés de se sentirem com mais poder, as pessoas, por toda a organização, sentem-se mais aprisionadas e menos capazes de falar abertamente sobre o que está realmente acontecendo. É de espantar, então, que os programas de mudança não logrem êxito e que, na verdade, solapem a credibilidade da alta administração? Provoca Argyris (1998). 2.3.6 QUE DEVE SER FEITO? Na opinião de Argyris (1998), a despeito da retórica em torno da transformação e dos grandes programas de mudança, a realidade é que os gerentes de hoje em dia ainda não encontraram programas de mudança que funcionem. Conforme apontado, as razões para tanto são complexas. Embora os gerentes sejam em parte responsáveis pela redução da motivação interna em suas organizações, os programas de mudança que poderiam criar elevados níveis de comprometimento interno e empowerment nas organizações, de fato, ainda não existem (Argyris, 1998). Considera Argyris (1998), então, que é por essa razão que se deve incrementar o número de pesquisas e estudos a fim de determinar as causas do fracasso nas tentativas de adoção do empowerment. Contudo, sugere algumas recomendações aos executivos: IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 84 1. Reconhecer que todas as empresas possuem tanto os mecanismos de controle de cima para baixo, quanto os mecanismos para o empowerment de empregados e que se algumas inconsistências são inevitáveis, simplesmente devem ser administradas. Quando essas contradições internas tornarem-se aparentes, os indivíduos devem ser encorajados a trazê-las à tona; de outra forma, pode-se criar uma lacuna de credibilidade que irá prejudicar a organização por muitos anos no futuro. 2. Não levar a cabo programas extremamente contraditórios. Por exemplo, não deixe que se criem programas que visem à produção de comprometimento interno, mas que são elaborados de forma a produzir comprometimento externo. Verifique se o que está sendo adotado não está em contradição com o que realmente acontece. 3. Compreender que o empowerment tem seus limites. Saiba quanto pode ser criado e quanto pode ser atingido. Saiba que o empowerment não é uma panacéia. Não o evoque desnecessariamente. Uma vez que tenha sido promovido, não o utilize indevidamente. Seja claro a respeito de quem tem o direito de mudar as coisas. Especifique os limites prováveis de mudanças admissíveis. 4. Perceber que os comprometimentos externo e interno podem coexistir nas organizações, mas a forma como são feitos é crucial para o ulterior sucesso ou fracasso do empowerment na organização. Por exemplo, o comprometimento externo é tudo o que é preciso para realizar a maioria dos trabalhos de rotina. As tentativas de criar empowerment desnecessariamente acabam por apenas criar espirais descendentes de cinismo, desilusão e ineficiência. Como primeira precaução, distinga entre os trabalhos que requerem comprometimento interno e os que não o requerem. 5. Estabelecer as condições de operações para aumentar o empowerment na organização. Se quiser ajudar os indivíduos a se afastarem do comprometimento externo, encoraje-os a examinar o próprio comportamento. A experiência de Argyris (1998) revela que muitos empregados estão dispostos a se tornarem mais comprometidos se a administração for realmente sincera, se o trabalho permitir e se as recompensas forem reforçadas. 6. Estimar fatores, tais como moral, satisfação e mesmo comprometimento em suas políticas de relações humanas, mas não fazer deles o critério fundamental. Eles vêm em segundo lugar. A meta fundamental é o desempenho. Pausa para reflexão: Você concorda com a opinião de Argyris que, de forma muito freqüente, o empowerment adentra o domínio do politicamente correto e, em decorrência, ninguém pode dizer o que está pensando? Os indivíduos podem ter excelentes desempenhos e relatar baixo moral, e ainda assim o que é básico é o desempenho, não o moral. Quando o moral, a satisfação e o sentido de empowerment são usados como o critério fundamental IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 85 para o sucesso nas organizações, encobrem-se muitos dos problemas que as organizações precisam superar no século vinte e um (Argyris, 1998). Concorda-se com Argyris (1998) que é necessário ajudar os empregados a entender as escolhas que fazem sobre o seu próprio nível de comprometimento. Uma das coisas mais úteis nas organizações – de fato, na vida – é requerer que os indivíduos não se ludibriem deliberadamente sobre sua eficácia. Por fim, lembra Argyris, que o empowerment pode entrar em choque com a natureza humana. Assim, há que ser realista sobre as formas sobre como atingi-lo e utilizá-lo. Parafraseando Abraham Lincoln: Pode-se fazer o empowerment de todas as pessoas por algum tempo e de algumas pessoas por todo o tempo, mas não de todas as pessoas o tempo todo. Em última análise, ninguém deve esperar mais do que isso (Argyris 1998). 2.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Há que se concordar com Araújo (2001) que, qualquer que seja a tecnologia a ser empregada na organização será preciso um estilo inovador de gestão de pessoas: o empowerment. Assim, afirma-se que o “empoderamento” – termo assim utilizado em países de língua portuguesa, à exceção do Brasil – constitui um dos pilares fundamentais na gestão das organizações. Araújo (2001) ilustra uma das definições possíveis para empowerment: “A criação ou o fortalecimento do poder decisório nas mãos das pessoas da organização.” Pretende-se com essa ferramenta, portanto, conceder às pessoas oportunidade de participar ativamente do processo de tomada de decisão e, também, decidirem. Este conceito se assenta em três pilares (Araújo, 2001): 1. Visão do futuro; 2. Assumir o poder; 3. Apropriar-se. Respeitando as sugestões de Argyris (1998) todos, na verdade, podem se beneficiar quando se utiliza essa abordagem (Araújo, 2001). A empresa ganha porque pessoas “empoderadas” são pessoas não apenas mais atentas e comprometidas com as tarefas que desempenham, mas também motivadas, criativas e imbuídas do espírito de cooperação, de compartilhamento de missão, metas e interesses organizacionais. Essas são pessoas que farão dos objetivos organizacionais os seus próprios. Concomitantemente, o corpo funcional ganha porque se cresce profissionalmente à medida que se aceita os novos desafios e sente-se livre para expor suas idéias, opiniões e sugestões (Araújo, 2001). A pesquisa desenvolvida na Internet por Araújo (2001) revela outras percepções acerca dos requisitos necessários para a formação de ambientes organizacionais “empoderados”: 1. Questionamento das premissas subjacentes ao modelo hierárquico tradicional, no qual a principal fonte de autoridade é o cargo. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 86 2. Redirecionamento das funções de diretores e executivos/gestores, que devem abrir mão do controle excessivo sobre pessoas para se ocuparem realmente da produção, otimização de resultados. 3. Incutir nas pessoas o desejo pela responsabilidade de seus próprios atos e o desejo por riscos e desafios que estimulem capacidade criativa e habilidades decisórias. Nessa medida, apenas em organizações em que os erros são tolerados, esse tipo de energia inovadora e competitiva pode ser liberado. 4. Eliminação das decisões de cunho arbitrário e do trabalho sem significado que gera somente frustração, desânimo e sentimento de insegurança para as pessoas. 5. Resgate dos valores que emprestam um sentido maior ao trabalho desenvolvido na empresa, ajustando, dessa forma, o alinhamento entre as metas individuais e as metas da organização. É sempre bom lembrar que os indivíduos precisam de uma referência que auxilie a justificar seu esforço, seu empreendimento mais profundo. O excelente resultado financeiro da organização não basta como motivo para que as pessoas doem tudo de si. Araújo (2001) recorre a Blanchard (1996) para destacar os requisitos necessários à criação de uma cultura organizacional que privilegie o empowerment. É fundamental: a) um sistema de crenças da alta administração alicerçado na idéia do “empoderamento” das pessoas; b) garantias de que as pessoas entendem o que é empowerment; c) generalizar o compartilhamento de informações; d) autonomia com limites; e) equipes autogerenciadas. POR FIM, CABE LEMBRAR QUE EMPOWERMENT É E NÃO É...: ! Empowerment não é só participação. ! Formar uma equipe não é implementar empowerment em uma organização. ! Empowerment não se traduz em trajetória anárquica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ALLEN, N. J.; MEYER, J. P. “The measurement and antecedents of affective, continuance and normative commitment to the organization”, in: Journal of Occupational Psychology, v. 63, pp.1-18, 1990. ARAUJO, Luis César G. de. “Empowerment”, in: Tecnologia de Gestão Organizacional. São Paulo: Atlas, 2001. ARGYRIS, C. “Empowerment: the emperor’s new clothes”, in: Harvard Business Review, v. 76, no 3, pp. 98-105, mai./jun. 1998. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 87 MATHIEU, J. E.; ZAJAC, D. M. “A review and meta-analysis of the antecedents, correlates, and consequences of organizational commitment”, in: Psychological Bulletin, v. 108, no 2, pp. 171-194, 1990. MEYER, J. P.; ALLEN, N. J. “Testing the ‘side bet theory’ of organizational commitment: Some methodological considerations”, in: Journal of Applied Psychology, v. 69, no 3, pp.372-378, 1984. QUINN, ROBERT E. et alii. “A Evolução dos Modelos Gerenciais”, in: Competências Gerenciais. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. ROBBINS, S. P. Comportamento Organizacional. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos Editora, 1998. S. LEE, S.; OLSHFSKI, D. “Employee Commitment and Firefighters: It's My Job”, in: Public Administration Review, v. 62, no 4, suplemento 1, pp. 108-114, 2002. SIQUEIRA, M. M. M. “Comprometimento Organizacional Afetivo, Calculativo e Normativo: Evidências Acerca da Validade Discriminante de Três Medidas Brasileiras”, in: XXV Encontro Anual da ANPAD, 2001, Campinas, SP. Anais – A NPAD 2001. WIENER, Y. “Commitment in organizations: A normative view”, in: Academy of Management Review, v. 7, pp. 418-428, 1982. WIENER, Y.; VARDI Y. “Relationship between job, organization, and career commitment and work outcomes: An integrative approach”, in: Organizational Behavior and Human Performance, v. 26, pp. 81- 96, 1980. ______. “Relationship between organizational culture and individual motivation: A conceptual integration”, in: Psychological Reports, v. 67, no 1, pp. 295-306, 1990. Coordenador: Profa. Sandra Regina da Rocha Pinto Autor: Prof. José Roberto Gomes Tutoria a Distância IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 89 Gestão do Conhecimento - Tema 3 .......................................................................90 3.1 Introdução........................................................................................................90 3.2 A Organização Pensada Com o Auxílio de Imagens .......................................91 3.3 A Imagem da Máquina e o Esforço de Construir Previsibilidade .....................92 3.4 A Imagem do Organismo e o Esforço de Construir Adaptabilidade.................98 3.5 A Imagem do Cérebro e o Esforço de Produzir uma Organização Inteligente .............................................................................................................................102 3.5.1 Olhando com mais Atenção para Algumas Características do Cérebro..103 3.5.2 O Conceito de “Aprender a Aprender”.....................................................105 3.5.3 O Cérebro Visto como um Sistema Holográfico......................................107 3.5.4 Síntese dos Princípios da Organização Cérebro ....................................110 3.6 A Comparação entre as Três Imagens ..........................................................110 3.7 A Organização Inteligente e Inovadora e a Gestão do Conhecimento ..........111 3.8 E Como Construir uma Gestão do Conhecimento Organizacional Voltada para a Inovação? .........................................................................................................115 3.9 A Gestão do Conhecimento como um Processo Contínuo e Coletivo...........118 3.10 A Gestão do Conhecimento na Prática........................................................122 3.11 Considerações Finais ..................................................................................130 3.12 Resumo do Capítulo ....................................................................................131 Referências..........................................................................................................132 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 90 este capítulo você terá oportunidade de refletir sobre a Gestão do Conhecimento, um dos temas mais importantes entre aqueles que vêm mobilizando as organizações nos últimos tempos. A popularidade que vem sendo alcançada pelo tema deve-se sobretudo ao fato de que as organizações se percebem em um contexto no qual a capacidade de inovar e de melhor desenvolver competências que conduzam a um diferencial estratégico demonstram ser requisitos essenciais para o seu sucesso e até mesmo para a sua sobrevivência. Espera-se que, ao final do capítulo, o participante atinja os seguintes objetivos: • Compreender as diferenças nos modelos de gestão entre as organizações tradicionais e aquelas que buscam a inovação; • Identificar as características das organizações inovadoras; • Entender o conceito de Gestão do Conhecimento organizacional; • Conhecer algumas das principais idéias e práticas associadas à Gestão do Conhecimento. 3.1 INTRODUÇÃO As organizações estão presentes nas sociedades humanas desde remotas eras. No entanto, até o final do século XIX, ao contrário do que já acontecia com outras áreas do conhecimento, a Administração não dispunha de um corpo teórico próprio, de um conjunto de idéias formalizadas que pudesse atender às necessidades crescentes das organizações, principalmente considerando-se a rápida evolução que elas vinham experimentando desde a revolução industrial. Podemos afirmar, portanto, que, no campo da administração, praticamente não existem idéias ultrapassadas. Estamos falando de teorias que datam de, no máximo, cem anos. É claro que isso não significa dizer que nenhum tipo de evolução tenha ocorrido nas organizações, desde que surgiram as primeiras teorias da administração, no final do século XIX e início do século XX. Mas quando olhamos para as práticas quotidianas das empresas, vemos que mesmo aquelas primeiras teorias estão, ainda, presentes em muitas de suas crenças, políticas e comportamentos observáveis. Talvez muitas destas idéias e práticas mais tradicionais não sejam, porém, suficientes ou até mesmo as mais adequadas para lidarmos com um contexto tão complexo quanto aquele no qual as organizações se encontram hoje. Estamos diante de um novo século, de um novo milênio. Parece- nos, portanto, um bom momento para refletir sobre as seguintes questões: De onde vem, como se situa e para onde caminha o pensamento da administração? Até que ponto as idéias e crenças que têm sido utilizadas, tradicionalmente, nas organizações podem ajudar ou representar dificuldades para que possamos melhor lidar com o contexto atual, tão complexo? N IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 91 A Gestão do Conhecimento é um movimento que vem ganhando importância no discurso da Administração nas últimas décadas, pelo fato de que ela tenta lidar de modo diferente com um tipo de desafio com os qual as organizações vêm sendo forçadas a enfrentar de modo crescente: a incerteza. Afinal, vivemos em um mundo em transformação, no qual as mudanças de natureza política, econômica e social, aliadas a uma explosão da informação, parecem reconfigurar profundamente o campo da gestão. Como em todo período de grandes mudanças, todas as nossas certezas são desafiadas e percebemos que precisamos aprender sobre uma nova realidade que se apresenta, sem, no entanto, perder a capacidade de valorizar aquilo que sabemos. Percebemos claramente estes desafios quando, por exemplo, observamos as inúmeras dificuldades enfrentadas pelas organizações em seus processos de reestruturações, downsizing, fusões e mudanças de estratégia, nos quais se deparam com o risco de perder a sua memória e enfraquecer o seu conhecimento acumulado ao longo de anos. Percebemos também estes desafios quando observamos o enorme esforço que as organizações fazem para construir estratégias inovadoras em um contexto no qual parece ser cada vez mais difícil construir vantagem competitiva sustentável. Parece haver um consenso cada vez mais claro de que, neste contexto de grande incerteza e complexidade, o conhecimento desponta como o grande diferencial de competitividade para as empresas. Ao mesmo tempo, percebemos, entretanto, que as organizações nunca trataram a gestão de seu conhecimento com a atenção devida, preocupando-se em desenvolvê-lo, mantê-lo, compartilhá-lo, aplicá-lo e transformá-lo continuamente e de modo adequado. Mas onde está o conhecimento das organizações? Esta é uma questão sobre a qual precisaremos refletir, assim como precisaremos pensar acerca das dificuldades inerentes ao processo de gestão deste conhecimento, bem como sobre os tipos de práticas que podem ajudar as organizações a melhor realizá-lo. As pessoas parecem ocupar um papel especial nesta discussão, assim como outras dimensões importantes da vida organizacional, tais como a cultura, a estrutura, os processos de trabalho e as estratégias. Iniciaremos a nossa discussão sobre o tema tentando refletir sobre as origens de muitas das dificuldades que as organizações enfrentam para melhor gerir o seu conhecimento. Para isto, procuraremos resgatar a essência do conjunto de idéias que têm povoado a administração ao longo do último século, buscando refletir sobre o impacto dessas idéias sobre a vida das organizações, sobretudo em nossos dias. Não se trata, no entanto, de uma abordagem histórica (não vamos nos preocupar com “nomes e datas”), mas sim de uma reflexão sobre as origens do pensamento administrativo, de modo a que melhor possamos compreender as tendências que hoje observamos, nas teorias e práticas de gestão das organizações e, mais particularmente, na gestão do conhecimento organizacional. 3.2 A ORGANIZAÇÃO PENSADA COM O AUXÍLIO DE IMAGENS É interessante observar como o ser humano lida com a complexidade e com a incerteza. Sempre que estamos diante de um conjunto variado de elementos, sentimos a necessidade de utilizar algum tipo de técnica ou artifício que nos ajude a representar este universo complexo em que vivemos, de modo a que possamos IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 92 compreender tanto o comportamento do conjunto quanto o papel e o comportamento de cada um de seus elementos. Ora, uma organização, por mais simples que seja, é sempre um universo bastante complexo, no qual um amplo conjunto de elementos de natureza diversa convivem, formando um todo que dificilmente tem um comportamento previsível. Nesse esforço de lidar com a complexidade, fazemos uso, muitas vezes, de imagens, metáforas, modelos, enfim: usamos nossa criatividade, de modo a tentar reduzir a complexidade, para que ela “caiba” dentro da nossa capacidade de processar informações. Seja na ciência, nas artes, ou em qualquer área do conhecimento humano, estamos sempre fazendo uso de tais artifícios. A planta de uma casa, por exemplo, jamais será suficiente para representar todos os detalhes que a casa terá após estar inteiramente pronta. Mas ela é uma forma de representação que ajuda a “dividir o problema”, a visualizar parte de sua complexidade. Assim também, uma pauta musical jamais representará todas as características que uma música terá ao ser executada pela orquestra. No entanto, essa é uma representação que ajuda a dividir a complexidade da música, a melhor comunicá-la. Do mesmo modo, muitas vezes quando tentamos explicar a alguém uma situação complexa, abstrata, tentamos fazer uso de metáforas, de imagens, de analogias, que nos ajudem a melhor representar e comunicar as idéias que desejamos transmitir. A Administração sempre foi rica na utilização de imagens para representar as organizações. Mas há dois tipos de imagens que mais se destacaram ao longo do século XX, pela sua capacidade de ajudar a compreender a complexidade das organizações. Elas são, respectivamente, a imagem da máquina e do organismo. Abordaremos primeiramente estas duas imagens, observando como elas ajudaram as organizações a desenvolver dois tipos de respostas ao desafio da incerteza: o esforço de construir maior previsibilidade, por meio de uma analogia com a idéia de uma “máquina perfeita”, e o esforço de construir adaptabilidade, por meio de uma analogia com um “organismo vivo” capaz de sobreviver aos desafios do ambiente. 3.3 A IMAGEM DA MÁQUINA E O ESFORÇO DE CONSTRUIR PREVISIBILIDADE Já nas primeiras teorias de gestão, a máquina mostrava ser uma metáfora promissora para se compreender a complexidade das organizações e para se pensar uma forma de administrá-las. Vejamos porque: • A máquina pode ser projetada para funcionar de um modo previsível; • Uma vez projetada, podem ser estabelecidos parâmetros de comportamento desejado, que nos possibilitem administrar com mais facilidade o seu desempenho, a sua eficiência; • Em uma máquina, fica claro o papel que se espera que seja desempenhado por cada uma das peças. Então, sob certos aspectos, parece ser (ou, pelo menos, pareceu ser, em um dado momento) bastante interessante pensar que uma organização pode ser projetada e administrada tal qual uma máquina perfeita, cujas rédeas possam ser mantidas firmes em nossas mãos de administradores. Mas, nesse caso, é claro, não IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 93 estamos falando de uma máquina física, mas de uma espécie de máquina burocrática. A burocracia é um conceito que tem constituído a base de grande parte das crenças e comportamentos das organizações modernas. Os princípios da burocracia estão intimamente ligados à idéia de previsibilidade e controle. São princípios que a sociedade moderna já havia desenvolvido significativamente bem antes do final do século XIX, e que caíam “como uma luva” para as necessidades dos administradores, em seu esforço de tornarem as organizações mais previsíveis. Um dos principais estudiosos sobre a burocracia na sociedade moderna foi Max Weber, um sociólogo alemão. Hoje, muita gente pensa na palavra burocracia de modo pejorativo, como sendo sinônimo de procedimentos inúteis, grandes quantidades de papel, carimbos, assinaturas, entre outras coisas. Mas Max Weber definia esse conceito de modo diferente. Para ele, uma burocracia é marcada por algumas características fundamentais, entre as quais: •••• Formalismo: a crença de que a capacidade de regular o funcionamento de uma sociedade (ou de uma organização, no nosso caso) baseia-se em normas e regulamentos racionais que estipulam qual é o comportamento esperado e quais são os deveres e direitos dos participantes (tudo é regido por normas e padrões); • Impessoalidade: As relações entre os integrantes das organizações burocráticas são governadas pelos cargos que eles ocupam. As relações se processam entre os ocupantes de cargos ou papéis, mais do que entre pessoas (se for o José, ou Antonio ou o João, executando um dado papel, ele deve ser executado da mesma forma); • Profissionalismo: O membro de uma burocracia é um funcionário, que faz do cargo um meio de vida mediante o recebimento de um salário regular em troca de seu serviço. A escolha para ocupar o cargo, em geral, deve- se às suas qualificações, que são aprimoradas por meio de treinamento especializado e espera-se que as pessoas tenham sempre um comportamento profissional. Há quem veja em Weber um defensor cego dos princípios burocráticos. Mas, ao contrário do que muitos autores acreditam, Weber, apesar de reconhecer que os princípios burocráticos poderiam ajudar muito a regular a sociedade moderna, mantinha um certo nível de preocupação com relação ao crescente desenvolvimento desordenado do enfoque burocrático, por reconhecer que esse enfoque tinha potencial para rotinizar e mecanizar quase todos os aspectos da vida humana, corroendo o espírito e a capacidade de ação espontânea (Morgan 1986). Os princípios burocráticos foram amplamente adotados pelas primeiras tentativas de desenvolvimento de uma "teoria geral da administração", que tiveram Frederick Taylor e Henri Fayol (dois nomes famosos na administração) como dois de seus maiores expoentes. Deve-se ao trabalho de Fayol, por exemplo, a mais tradicional classificação das funções da administração entre planejamento, organização, direção, coordenação e controle (PODCC), funções essas, perfeitamente compatíveis com os princípios do modelo burocrático. Tais princípios são preservados na maioria das teorias da administração que sucederam a essas IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 94 primeiras abordagens, ao longo de todo o século XX. Alguns princípios que formaram a base dessas primeiras teorias, eram: A Unidade de comando: Um empregado só deve receber ordens de um único superior. A Hierarquia: A autoridade do superior sobre o subordinado caminha do topo para a base da organização; essa cadeia que é resultante do princípio da unidade de comando deve ser usada como canal de comunicação e de tomada de decisão. A Amplitude de controle: O número de pessoas que se reportam a um superior não deve ser tão grande a ponto de criar problemas de comunicação e coordenação. A Assessoria e linha: O pessoal de assessoria pode oferecer importante ajuda de orientação mas deve ter cuidado para não violar a linha de autoridade. A Divisão do trabalho: A administração deve buscar atingir um grau de especialização de forma a permitir que se chegue aos objetivos da organização de maneira eficiente. A Autoridade e responsabilidade: Deve-se levar em conta o direito de dar ordens e exigir obediência, chegando a um bom equilíbrio entre autoridade e responsabilidade. Não tem sentido dar a alguém a responsabilidade por um trabalho caso a essa pessoa não seja dada a adequada autoridade para executar tal responsabilidade. A Centralização da autoridade: Até certo ponto está sempre presente, devendo variar para permitir a máxima utilização da capacidade do pessoal. A Disciplina: Obediência, empenho, energia, comportamento e atitudes de respeito devem ser adaptadas aos regulamentos e hábitos da organização. A Subordinação dos interesses individuais aos interesses gerais: por meio de firmeza, exemplos, acordos justos e constante supervisão. A Eqüidade: Baseada na justiça para encorajar o pessoal nas suas responsabilidades; remuneração justa que leve a elevação do moral, sem ocasionar gastos excessivos. A Estabilidade e manutenção do pessoal: Para facilitar o desenvolvimento das habilidades. O Espírito de união: Para facilitar a harmonia como uma base de fortificação. Como podemos ver na lista acima, esses preceitos ou princípios estão ainda bastante presentes no dia-a-dia das organizações com as quais convivemos. 3.3.1 A visão mecanicista e o ser humano Você já teve a oportunidade de assistir o filme “Tempos Modernos”, de Charles Chaplin, um dos maiores clássicos do cinema de todos os tempos? Nos primeiros trinta minutos do filme, Chaplin faz uma crítica inspirada de uma típica fábrica americana da primeira metade do século XX, na qual predominava uma visão essencialmente mecanicista. Tudo naquela fábrica era absolutamente controlado, desde os mais detalhados movimentos que os empregados faziam para fabricar as IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 95 peças, até o seu tempo para alimentação e descanso. É claro que Chaplin, no filme, constrói uma alegoria exagerada (e bastante cômica) dessa realidade. Mas a verdade é que muitas outras críticas têm surgido, ao longo dos últimos cem anos, às limitações ou distorções produzidas pela visão mecanicista (ou o esforço de comparar a organização a uma máquina). Entre tais críticas, destacam-se: a) O fato de que a previsibilidade é uma utopia, impossível de ser alcançada Que organização, na sociedade atual, pode prever perfeitamente os diferentes tipos de desafios com os quais terá que se deparar? E mesmo que ela consiga prever um determinado conjunto de condições, por quanto tempo essa situação irá durar? De que adianta termos uma organização projetada para funcionar de uma só maneira, se as condições se modificam com uma velocidade cada vez maior? b) O fato de que essa visão mecanicista, burocrática, faz uma separação grande demais entre o “pensar” e o “fazer”. Na visão mais clássica da administração, acreditava-se que ao administrador cabia a tarefa de conceber, de projetar sozinho a organização. Aos demais funcionários, cabia apenas o papel de executar. Existe um ditado popular, muito citado ainda hoje nas empresas, que expressa bem essa visão: “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Um questionamento que se faz a essa visão é: que administrador consegue ser tão onipotente, a ponto de ser infalível em suas decisões e de conseguir manter, sozinho, uma visão detalhada de todos os aspectos da organização? c) O fato de que essa visão valoriza apenas a eficiência O conceito de eficiência está relacionado ao “fazer de modo certo aquilo que é previsto”. Não há problema nenhum nessa idéia, se o que é previsto levar ao melhor resultado. Mas sabemos que nem sempre é assim. Muitas vezes, o que vemos nas organizações são pessoas cumprindo à risca o que mandam as normas e procedimentos e, no entanto, os resultados ficam muito aquém do desejado. O que muita gente alega, ao criticar a visão mecanicista, é que tão importante quanto garantir que tudo seja feito “conforme o projetado” é garantir que chegaremos aos melhores resultados. Em outras palavras, tão importante quanto garantir a simples eficiência (eficiência = fazer tudo direitinho, como “manda o figurino”, do modo como foi planejado) é garantir a eficácia do que fazemos (eficácia = ser capaz de identificar e atingir os melhores objetivos). Há quem ache até mesmo que a eficácia é mais importante do que a eficiência. Mas talvez ambas sejam igualmente importantes, já que de nada adianta fazermos tudo certo e não chegarmos a nenhum resultado, assim como de nada adianta chegarmos aos resultados desejados a qualquer custo. d) O fato de que a visão mecanicista reduz o ser humano à condição de uma “simples” peça de uma engrenagem Uma peça de uma engrenagem é projetada para atuar de uma única forma: não pensa, não tem vontade, não tem sentimentos e, quando falha, pode ser substituída com facilidade. Parece bem pouco parecido com aquilo que conhecemos sobre o ser humano, não? Tratar um indivíduo como peça de uma máquina pode ser interessante para alguém que queira controlar integralmente o comportamento desse indivíduo. Mas, no final das contas, os dois lados da história parecem perder com essa representação: o indivíduo perde, por ter o seu direito de pensar, de criar e de evoluir restrito por um sistema que tenta reduzí-lo à condição de uma “peça mecânica”; o administrador e a organização como um todo também IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 96 perdem, porque perdem a oportunidade de receber a contribuição integral de um ser humano inteligente, capaz de desenvolver soluções para problemas muito mais complexos do que os parafusos que ele deve apertar, da forma como determinamos que ele faça. Quando exigimos das pessoas que elas cumpram apenas aquilo que determinamos, estamos perdendo a possibilidade de que elas contribuam de modo criativo para melhorar o que é feito. O texto a seguir foi extraído de uma obra clássica da administração, um livro intitulado “Princípios da Administração Científica”, escrito no início do século XX por Frederick Taylor, um dos mais importantes autores das primeiras teorias da administração. Taylor escreveu suas teorias com base em sua própria experiência de vida, como trabalhador e supervisor de fábrica. Suas idéias foram amplamente incorporadas pelas empresas ocidentais no início do século XX e, poderíamos dizer, são bastante utilizadas mesmo em nossos dias. Mas essa visão “taylorista” da administração tem sido também criticada por muita gente, ao longo do século XX. No texto a seguir, Taylor narra a situação da escolha de um trabalhador para executar uma determinada tarefa na fábrica. A idéia era a de descobrir quem seria a pessoa ideal para executar tal tarefa. Leia o texto, reflita e tire as suas próprias conclusões. A ESCOLHA DO HOMEM IDEAL Extraído do livro “The Principles of Scientific Management, de F. Taylor “Nosso primeiro passo foi encontrar o homem adequado com quem começar. Nós, portanto, observamos cuidadosamente e estudamos esses 75 homens por 3 ou 4 dias, e ao fim desse tempo escolhemos os que pareciam aptos fisicamente a manejar 47 toneladas por dia. Foi então feito um meticuloso estudo de cada um desses homens. Estudamos sua vida tanto quanto possível e através de inquéritos feitos quanto ao caráter, hábitos e ambições de cada um deles. Finalmente selecionamos um dos 4 como o mais provável para começar. Era um pequeno holandês da Pensilvânia que havia sido observado ao voltar para casa por uma milha mais ou menos, depois do seu trabalho à tarde, e tão logo voltava de manhã para o trabalho. Descobrimos que ganhando o salário de 1 dólar e 15 cents por dia ele conseguira comprar um pequeno terreno e estava empenhado em elevar as paredes de uma casinha para ele, de manhã antes de ir para o trabalho e à noite depois da saída. Tinha também a reputação de ser muito “fechado”, isto é, de atribuir muito valor a 1 dólar. Uma pessoa a quem falamos sobre ele disse: “Um vintém parece do tamanho de uma roda de carroça para ele! ”Chamaremos a esse homem de Schmidt. A nossa tarefa era portanto limitada a fazer com que Schmidt operasse 47 toneladas de ferro por dia e torná-lo alegre com isso. Isso foi feito da seguinte maneira: Schmidt foi destacado da turma de carregadores e falamos mais ou menos o seguinte com ele: - Schmidt, você é um homem valioso? - Bem, não sei o que o senhor quer dizer. - Oh, sim, é claro que sabe. O que desejo saber é se você é um homem valioso ou não. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 97 - Bem, eu não sei o que o senhor quer dizer. - Ora, então responda às minhas perguntas. O que quero saber é se você é um homem valioso ou um desses colegas baratos aqui. O que desejo saber é se você quer ganhar 1 dólar e 85 cents por dia ou se está satisfeito com 1 e 15, o mesmo que todos os colegas baratos estão ganhando. - Se quero $1,85 por dia? Se sou um homem valioso? Bem, sim, sou um homem valioso. - Mas calma, o sr. está me impacientando. É claro que você quer $1,85 por dia – todos querem isto! Você sabe perfeitamente bem que aquilo é muito pouco a fazer para você ser um homem bem pago. Por favor, responda às minhas questões e não percamos mais tempo. Agora venha aqui. Você está vendo aquela pilha de ferro? - Sim. - Vê aquele carro? - Sim. - Bem, se você é um homem valioso, carregará aquele ferro amanhã, por $1,85. Agora acorde e responda à minha pergunta. Diga-me se é um homem valioso ou não. - Bem, ganho $1,85 para carregar aquele ferro no carro amanhã? - Sim, é claro que sim, e você ganhará $1,85 por carregar uma pilha igual àquela todo dia e durante todo o ano. Isto é o que um homem valioso faz, e você sabe disto tanto quanto eu. - Está bem, está certo. Posso carregar aquele ferro no carro amanhã por $1,85 e ganhar isto todo dia, não? - Certamente que sim, certamente que sim. - Bem, então eu sou um homem valioso. - Agora olhe, olhe. Você sabe tanto quanto eu que um homem valioso tem que fazer exatamente como lhe mandam de manhã até de noite. Você viu este homem aqui em frente, não viu? - Não, eu nunca o vi. - Bem, se você é um homem valioso, você fará exatamente como esse homem lhe disser amanhã, de manhã à noite. Quando lhe disser para apanhar uma pilha e andar, você apanha e anda, e quando lhe disser para sentar-se e descansar, você se senta. Você faz aquilo certo o dia todo e, mais, nada de parolagem. Agora um homem valioso faz exatamente o que lhe mandam fazer, e nada de conversa. Entende? Quando esse homem lhe disser para andar, você anda; quando lhe disser para sentar, você senta, e você não lhe responde. Agora você volta para o trabalho amanhã de manhã e eu saberei antes da noite se você é exatamente um homem valioso ou não. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 98 Isto parece ser uma conversa um tanto rude. E de fato seria se nos referíssemos a um mecânico educado, ou mesmo um trabalhador inteligente. Com um homem mentalmente limitado, do tipo de Schmidt, é apropriada e não indelicada, visto que é eficiente para fixar sua atenção nos altos salários que ele quer e fora do que, se lhe fosse chamada a atenção, provavelmente acharia impossível o duro trabalho…” __________ Algumas questões para ajudar a sua reflexão sobre este texto: 1) No texto acima, qual é o papel do administrador? 2) E qual é o papel reservado para Schmidt? 3) Pelo que diz o texto, o que Taylor acredita que motiva uma pessoa para o trabalho? 4) Como Taylor vê a comunicação entre as pessoas? 5) Você concorda com a justificativa final de Taylor, sobre a razão de utilizar esse tipo de discurso com Schmidt? 6) Quais podem ser as conseqüências, positivas e/ou negativas, de se adotar esse tipo de abordagem ou tratamento utilizado com Schmidt? 7) Você acha que esta visão de Taylor sobre “o que é um homem valioso” ainda existe nas organizações atuais? Se sim, procure identificar exemplos. 3.4 A IMAGEM DO ORGANISMO E O ESFORÇO DE CONSTRUIR ADAPTABILIDADE Um outro tipo de imagem, que tem sido bastante utilizado para representar as organizações, por muitas das teorias da Administração propostas ao longo do século XX, é a imagem de um organismo vivo. Poderíamos dizer que tal imagem tem sido utilizada, muitas vezes, como alternativa ou mesmo como contraposição à imagem da organização como máquina. É claro que, sob certos aspectos, as diferenças de se representar as organizações como máquinas ou como organismos vivos saltam aos olhos. Entre outros aspectos, a metáfora do organismo representa, para alguns autores, uma espécie de humanização das idéias da administração, além de trazer uma visão mais realista sobre a complexidade do funcionamento de uma organização. Podemos pensar mais detalhadamente sobre algumas destas diferenças: IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 99 Uma máquina é projetada para funcionar apenas de uma forma. Se há um desvio no comportamento previsto, considera-se que a máquina apresentou um defeito. Nesse caso, precisamos substituir uma ou várias peças. Se o desvio de comportamento se deve a mudanças nas condições do ambiente em torno da máquina (por exemplo, se ela é obrigada a operar em uma temperatura ambiente mais elevada), muitas vezes o próprio projeto da máquina precisa ser refeito. Ou seja, o comportamento da máquina deve seguir à risca o previsto no projeto. Se as condições ambientais mudam, deve-se mudar o projeto. Se uma peça muda o seu comportamento, ela precisa ser consertada ou substituída. Um organismo tem a capacidade de se adaptar continuamente ao ambiente à sua volta. Se ele não se adapta, simplesmente não sobrevive. Mesmo tendo um código genético, que determina o comportamento “natural” (digamos assim…), um organismo vivo é capaz de adaptar seu comportamento, evoluir, de acordo com as condições ambientais, muitas vezes tornando-se até melhor, mais resistente. (Você viu, por exemplo, há pouco tempo, uma matéria no jornal, sobre algumas conclusões a que chegaram os cientistas do projeto Genoma Humano? Entre outras conclusões, eles perceberam que as explicações sobre o comportamento humano estão muito mais relacionadas aos efeitos de sua vida no meio- ambiente do que se imaginava…) Ou seja, se o ambiente se modifica, não é preciso refazer o projeto: o organismo, em inúmeros casos, é capaz de se adaptar às novas condições. Emuma máquina, as partes são peças mecânicas: não pensam, não sentem, não inovam seu comportamento. Apenas obedecem ao comportamento projetado. Em um organismo vivo (por exemplo, o corpo humano), cada parte é também um organismo vivo complexo, capaz de reagir aos estímulos diversos provenientes do ambiente e capaz de modificar seu comportamento, de modo a tentar manter o equilíbrio com o organismo maior. Em uma máquina, quem projeta e comanda a operação da máquina, não se mistura com as suas peças. O projetista e o controlador da máquina (aqueles que pensam que comandam, que decidem e que controlam) não são parte da engrenagem. A sua função é apenas a de comandar e controlar. Enquanto isso, a função da engrenagem e das peças é apenas a de executar. Em um organismo vivo, mesmo que exista um cérebro que comande todo o organismo, ele é parte do organismo como um todo. Ou seja, o cérebro e cada um dos outros órgãos estão todos dentro do mesmo organismo. Um depende do outro para a sobrevivência do todo. O cérebro não é mais importante do que o coração ou do que o fígado, para que o organismo sobreviva. Eles podem até ter funções diferentes. Mas todos são igualmente importantes. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 100 Avaliamos o desempenho da máquina, pela sua capacidade de funcionar exatamente como projetado (ou seja, pela sua eficiência). Avaliamos o desempenho do organismo, pela sua capacidade de sobreviver e evoluir (ou seja, pela sua eficácia, quanto ao objetivo de sobreviver e se desenvolver). Mas a luta do organismo por manter a sua eficácia (ou a sobrevivência) não exclui a necessidade de que ele tente se manter também eficiente, já que ele precisa poupar suas energias, manter a normalidade de seu funcionamento, mesmo diante das situações adversas Em outras palavras, quando substituímos a imagem da máquina pela imagem do organismo, para compreendermos o comportamento das organizações ou para pensarmos a forma de administrá-las, toda a lógica que utilizamos se modifica. Vamos refletir um pouco mais sobre isso? Pense em uma organização como sendo uma máquina. Pense na mesma organização como sendo um organismo vivo. Fazendo esses dois exercícios, procure responder as perguntas a seguir: a) Qual é o papel do administrador… a.1) …em uma organização concebida como uma máquina? a.2) … em uma organização concebida como um organismo vivo? b) Qual é o papel de cada operário… b.1) … em uma organização concebida como uma máquina? b.2) … em uma organização concebida como um organismo vivo? c) O que acreditamos que motiva uma pessoa para o trabalho… c.1) … se pensamos essa pessoa como peça de uma máquina? c.2) … se pensamos essa pessoa como parte de um organismo vivo? d) Como deve ser a comunicação entre as partes… d.1) … em uma organização que se assemelha a uma máquina? d.2) … em uma organização que se assemelha a um organismo vivo? e) O que mantém funcionando… e.1) … a máquina? e.2) … o organismo? f) Quando o ambiente muda… f.1) … como a máquina reage? f.2) … como o organismo vivo reage? IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 101 g) Como podemos controlar o comportamento… g.1) … da máquina? g.2) … do organismo vivo? h) Quando uma parte falha, o que podemos fazer… h.1) … na máquina? h.2) … no organismo vivo? i) Como podemos prevenir que aconteçam falhas… i.1) … na máquina? i.2) … no organismo vivo? j) Como você identifica… j.1) … uma máquina boa? j.2) … um organismo bom? Faz diferença utilizar uma ou outra imagem, não é verdade? Pois bem, pensar a organização como uma máquina ou como um organismo, significa modificar todo o ângulo de visão que escolhemos, para representar a complexidade de uma organização e para traçarmos todo o nosso conceito de como ela deve ser administrada diante da incerteza. Assim como a máquina e o organismo, outros tipos de imagem têm sido utilizados para representar as organizações, em função das respostas a que a Administração se propõe a fornecer. Por exemplo, nesse final de século, estamos percebendo que a velocidade das mudanças que o mundo vem experimentando vem se acelerando a tal ponto, que fica impossível pensarmos em uma organização estática, capaz de responder apenas de modo previsível (como a máquina) ou então apenas capaz de reagir às mudanças do ambiente (como muitas vezes o organismo faz). É preciso pensar, talvez, em um modelo de organização que seja capaz de agir de modo mais inteligente, antecipando-se mesmo às mudanças ambientais e agindo de modo mais criativo, inovador, antes que o ambiente determine as mudanças. Que imagem pode ser melhor para representar uma organização inteligente, mas que preserve a capacidade de manter a previsibilidade, quando é necessário e possível, bem como a capacidade de manter-se adaptável como o organismo? O CÉREBRO HUMANO, é claro!!! Existe, em nosso mundo, algo que seja mais inteligente do que o cérebro humano? Pois bem, esta é justamente a imagem que muitos autores mais recentes, da Administração, têm usado para tentar pensar um novo modelo de organização, muito mais inteligente e muito mais criativa. Trata-se de um movimento que vem ganhando força principalmente nos anos 1990 e 2000. No nosso próximo tópico, teremos a oportunidade de olhar com um pouco mais de atenção para esta imagem. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 102 3.5 A IMAGEM DO CÉREBRO E O ESFORÇO DE PRODUZIR UMA ORGANIZAÇÃO INTELIGENTE Ao analisar as virtudes do cérebro como uma metáfora útil para pensarmos a construção de organizações inteligentes, Gareth Morgan (1986), em seu livro “Imagens da Organização”, resume o que outros autores têm identificado como algumas das características do cérebro humano que demonstram ser interessantes também para as organizações de nosso tempo: • Uma incrível capacidade de processar informações, maior do que qualquer máquina que este mesmo cérebro seja capaz de projetar; • A capacidade (cujos mecanismos ainda são pouco conhecidos pelos estudiosos do assunto) de recompor funções, quando ocorrem danos acidentais a determinadas partes; • Uma inigualável capacidade de criar, de “construir realidades”; • A capacidade de “aprender a aprender” – veremos um pouco deste conceito mais adiante neste capítulo e o aprofundaremos no próximo. E o que torna o cérebro capaz de desenvolver estas características? Entre outras razões, o fato de que a ação do cérebro é o resultado de uma impressionante capacidade de auto-organização e de uma grande integração entre as suas células ou partes constituintes. Na forma mais tradicional de pensarmos as organizações, ou seja, na visão mecanicista, acreditamos que as ligações entre as partes acontecem por meio de todo um aparato hierárquico e burocrático pré-determinado, por meio de centralização das decisões, e das estruturas de comando e controle. Já quando pensamos a organização como um organismo vivo, tendemos a admitir que, como em um corpo vivo qualquer, as partes de uma organização são capazes de interagir de modo um pouco mais flexível do que em uma máquina. Aliás, se não fosse assim, o corpo humano, por exemplo, não seria capaz de reagir às contingências que o ambiente lhe apresenta, adaptando o seu comportamento, de modo harmônico, para manter-se vivo. E, é claro, isso acontece porque cada órgão desse corpo reage individualmente e, ao mesmo tempo, em conjunto com os outros órgãos, de modo a tentar restabelecer o equilíbrio. Assim, quando se tenta construir organizações que funcionem como organismos vivos, procura-se reproduzir esta característica de adaptabilidade, por meio da ação integrada. Mas em um contexto no qual as mudanças são intensas há a necessidade de organizações que sejam capazes de realizar mais do que isto: é preciso desenvolver a capacidade de inovar, de reinventar a realidade, de construir uma ação questionadora e inteligente como a do cérebro humano. É possível que, utilizando a metáfora do cérebro, tentando entender um pouco melhor como ele funciona, o ser humano possa desenvolver a sua capacidade de pensar as organizações de modo a promover uma ação realmente mais criativa, integrada e flexível. Uma vez que organizações são construídas segundo muitos dos princípios mecanicistas, o ser humano muitas vezes desenvolve meramente o que poderia chamar de uma racionalidade instrumental, na qual as pessoas são medidas pela sua capacidade de ajustamento, de contribuir para a operação eficiente de uma IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 103 estrutura previamente determinada. Isso é válido para a execução de tarefas fixas em circunstâncias estáveis, mas quando essas circunstâncias são muito dinâmicas, as organizações projetadas segundo esse perfil encontram muitos problemas. Em situações de constante mudança é importante que os elementos da organização sejam capazes de questionar a propriedade do que eles fazem e de modificar sua ação, de modo a fazer frente às novas situações. Isso requer uma capacidade de organização que representa uma racionalidade mais crítica, mais abstrata, ou, como se costuma chamar, uma racionalidade mais substantiva. A racionalidade instrumental se refere à capacidade de construir caminhos para realizar fins, enquanto a racionalidade substantiva se refere à tentativa de compreender, em profundidade, a lógica de um dado contexto, percebendo suas particularidades, a dinâmica de seus elementos e questionando suas propriedades. Uma ação baseada em uma racionalidade substantiva jamais é vista, cegamente, como uma solução universal para todos os males, mas somente para as circunstâncias nas quais ela se constitui. Trata-se de um tipo de racionalidade capaz de reconhecer, portanto, a subjetividade dos contextos. Cada contexto, cada situação requer uma ação inteligente, consciente e, muitas vezes, inovadora. O fato interessante é que é justamente esse tipo de racionalidade que o cérebro possui. A cada novo estímulo, ele é capaz de perceber, criticamente, quando deve responder de forma padronizada ou previsível (ex.: quando o ser humano faz um movimento automático), quando deve adaptar suas respostas (ex.: quando o ser humano depara com situações que exigem uma tomada de decisão sobre coisas que ele conhece) ou desenvolver respostas inteiramente novas (ex.: quando o ser humano desenvolve um aprendizado totalmente novo). O cérebro oferece, então, uma metáfora interessante para se pensar as organizações, principalmente quando o objetivo é desenvolver a inteligência organizacional. Muitos gerentes e teóricos das organizações concordam com estas idéias, mas na maioria das vezes, eles se limitam a achar que a organização “precisa TER um cérebro” ou uma função semelhante ao cérebro (por exemplo, na forma de equipes de planejamento ou unidade centralizadas de pesquisa e de tomada de decisão) que seria capaz de pensar pelo resto da organização, e controlar e integrar as diversas atividades organizacionais. A maior parte das pessoas que falam sobre o planejamento corporativo e a formulação de estratégias, utiliza a metáfora do cérebro desse modo, vendo os processos de gerenciamento estratégico e de controle como equivalentes ao cérebro e ao sistema nervoso do organismo. Ao contrário, raramente se pensa nas organizações como se elas FOSSEM cérebros e raramente se tenta criar organizações que possuam a capacidade cerebral dispersa, ao invés de confiná-la a unidades específicas. Este é justamente um dos desafios das organizações atuais. Nos tópicos seguintes serão abordadas algumas considerações que Morgan (1986) sintetiza a respeito das características de auto-organização, de integração e de criação do cérebro humano. 3.5.1 OLHANDO COM MAIS ATENÇÃO PARA ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DO CÉREBRO Morgan (1986) inicia a sua reflexão sobre as características do cérebro, citando as observações de G. R. Taylor (ATENÇÃO: É outro Taylor! Não é o Frederick IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 104 Taylor citado nos tópicos anteriores) em um livro intitulado A História Natural da Mente: Em um famoso experimento, o psicólogo americano Karl Lashley removeu partes do cérebro de ratos, que foram colocados em pequenos labirintos. Ele percebeu que, uma vez que não tivesse sido removido o córtex visual, o que poderia cegar o rato, ele poderia remover até 90% do córtex sem que houvesse uma deterioração significativa na capacidade do rato encontrar seu caminho no labirinto. Não existe máquina feita pelo homem que seja capaz disso. Esse experimento sugere que cada memória específica parece estar distribuída, de alguma forma, no cérebro como um todo. Mesmo assustados com os métodos de pesquisa do tal psicólogo (afinal, ninguém gostaria de estar no lugar do “ratinho”!), é possível observar a importância de suas conclusões. Talvez ele nem mesmo precisasse ter realizado tal experimento, já que, mais recentemente, os estudos sobre o cérebro humano (bem menos perversos, felizmente) têm demonstrado que ele também é capaz de recompor funções perdidas. São vários os relatos emocionantes sobre pessoas que, acidentalmente, apresentam perdas de uma parcela considerável de córtex motor e conseguem recuperar seus movimentos. Alguns estudos têm demonstrado que esta “plasticidade” do cérebro é possível de ser constatada com mais freqüência, ainda, nas crianças. É difícil ainda a compreensão plena de como isto acontece. Será maravilhoso quando a ciência puder compreender totalmente este mecanismo! O que é possível perceber é que o cérebro parece possuir um padrão de comportamento gerado por refinamentos sucessivos, por uma contínua capacidade de aprender. As respostas que ele compõe parecem ser construídas, diante de cada situação, com base em uma imensa capacidade de se reconstruir a cada momento, compondo ligações entre as suas partes, e não por meio de uma única relação de causa-efeito, como acontece com as máquinas feitas pelo homem, nas quais o comportamento é previamente estabelecido e “confinado” nas engrenagens projetadas para esse fim. Tomemos o caso do próprio corpo humano: se o corpo sofre o ataque de um organismo estranho qualquer, como uma bactéria, por exemplo, diversos órgãos começam a produzir um comportamento diferente do seu comportamento habitual, de modo a buscar manter o corpo todo funcionando. Mas ainda assim, o coração jamais substituirá as funções do fígado ou o aparelho circulatório jamais assumirá as funções motores. Mas no cérebro isso acontece! Algumas partes são capazes de assumir funções que são diferentes daquelas pelas quais são responsáveis naturalmente. Intrigante esse fato, não? Isso parece sugerir que o cérebro tem uma capacidade de integração e de auto-organização muito maior do que qualquer outro organismo vivo. Pois bem, além dessa característica, é possível pensar em uma outra capacidade do cérebro, que é extremamente intrigante: quando exposto a uma situação, o cérebro é capaz de construir respostas totalmente inovadoras e até muito diferentes das respostas construídas anteriormente. Ou seja, a capacidade de aprendizado do cérebro é também infinitamente maior do que a capacidade de aprendizado de qualquer outro organismo vivo. O cérebro não se adapta simplesmente: ele cria novas soluções. E isto acontece porque, a cada nova situação com que ele se depara, ele é capaz de capturar, por meio das ligações entre suas células (das sinapses), todo o conhecimento existente e, a partir dele, IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 105 construir novos conhecimentos, por meio do estabelecimento de novas ligações (ou sinapses). Ou seja, o cérebro é capaz de, a cada instante, reconstruir a sua visão sobre o mundo. E, mais do que isso, ele é capaz de SE RECONSTRUIR, à medida que aprende. Esta capacidade está ligada ao que muitos autores denominam como o “aprender a aprender”. 3.5.2 O CONCEITO DE “APRENDER A APRENDER” Para melhor ilustrar o conceito de “aprender a aprender”, Morgan (1986) apresenta, como ponto de partida, a noção de cibernética. A cibernética é uma ciência multidisciplinar relativamente nova, que focaliza o estudo da informação, comunicação e controle. O termo foi adotado pór Norbert Wiener, do MIT, como uma metáfora advinda do termo grego “kubernetes”, que significa “piloto de embarcação”. Os gregos desenvolveram esse conceito, provavelmente a partir de sua própria compreensão dos processos envolvidos no controle e navegação de embarcações, estendendo-o ao processo de governo. Wiener usou então esse termo, para caracterizar processos de trocas de informação, através dos quais máquinas e organismos atingem comportamento de auto-regulação que mantém o seu estado de equilíbrio. As origens da moderna cibernética são diversas, mas destacaram-se mais concretamente as pesquisas de Wiener e seus colegas durante a Segunda Guerra Mundial, particularmente na tentativa de desenvolver e refinar dispositivos de controle de disparo. O problema de disparar uma arma para atingir um alvo móvel, tal como um avião, apresenta uma dificuldade de controle envolvendo estatísticas e computações complexas. Além de considerar a velocidade e a posição do avião em um dado instante, e a direção e a velocidade do míssel a ser disparado, deve-se dar atenção especial ao efeito dos eventos e às condições de vôo diversas que o avião enfrenta. Projetar uma arma que possa efetuar tais computações, além de guiar o seu próprio comportamento, requeria uma habilidade especial, de modo que a máquina resultante pudesse ter a flexibilidade e a adaptabilidade semelhantes à de um cérebro. A principal descoberta desse primeiro desafio foi a de que a capacidade de um sistema de assumir um comportamento de auto-regulação depende do processo de troca de informação envolvendo REALIMENTAÇÃO NEGATIVA. Esse conceito é fundamental para o processo de “pilotagem”. Se um bote for tirado do curso, girando o leme para uma dada direção, só seria possível corrigir o seu curso girando o leme no sentido contrário. Os sistemas de realimentação negativa executam esse tipo de detecção e correção de erros de forma automática, de modo que os movimentos que excedem os limites em uma direção iniciam movimentos na direção oposta, mantendo, assim, um determinado curso de ação, como representado na figura a seguir : IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 106 = ? N S P A D R Ã O D E C O M P O R T A M E N T O A S E R S E G U I D O S E G U E O P A D R Ã O ? M E C A N I S M O S D E R E A L I M E N T A Ç Ã O O conceito de realimentação negativa explica os vários tipos de comportamento de rotina de um modo não convencional. Por exemplo, para pegar um objeto na mesa a pessoa considera que a sua mão, guiada pelos olhos, se move em direção ao objeto. A cibernética sugere que não. Essa ação ocorre por meio de um processo de eliminação de erros, no qual os desvios entre a mão e o objeto são reduzidos passo a passo, até a sua eliminação. A pessoa pega o objeto, evitando “não pega-lo”. Esses princípios cibernéticos são evidentes em muitos tipos de sistemas: mais gera menos e menos gera mais. Assim acontece, por exemplo, com os termostatos domésticos e com os organismos vivos. Quando a temperatura do corpo aumenta ou diminui, o cérebro e o sistema nervoso central iniciam uma ação comandada no organismo, que nos conduz à direção oposta. A cibernética conduz, então, a uma teoria de comunicação e aprendizagem que contempla quatro princípios: os sistemas devem ter a capacidade de sentir, monitorar e pesquisar aspectos significativos em seu ambiente; eles devem ser capazes de relacionar suas informações com as normas de operação que guiam o comportamento do sistema; eles precisam ser capazes de detectar desvios significativos dessas normas; eles precisam ser capazes de iniciar ações corretivas quando forem detectadas discrepâncias. Se essas quatro condições forem satisfeitas, é criado um processo contínuo de troca de informação entre um sistema e seu ambiente, permitindo monitorar mudanças e iniciar respostas apropriadas. Desse modo, o sistema pode operar de uma forma inteligente e auto-regulada. Entretanto, a capacidade de aprendizagem é limitada, no sentido de que o sistema só pode manter o curso de ação determinado pelos padrões e normas operacionais que o dirigem. Isso é bom, enquanto a ação definida por tais padrões é apropriada para o tipo de situação encontrada. Mas quando não é o caso, a “inteligência” do sistema fracassa, já que o processo de realimentação negativa tentará manter o padrão de comportamento existente. No entanto, reflitamos juntos: não é justamente esse, o mecanismo de aprendizagem, ao qual estamos habituados? Alguém (em geral, um professor), nos diz qual é o padrão que devemos aprender. Passamos, então, por um processo (muitas vezes mecânico, exaustivo, “decorando” longos textos) de “assimilação” desse padrão. No final do processo, somos testados. Se não aprendemos, somos reprovados ou precisamos “repetir” o processo (espero que, ao longo do nosso curso, na medida do possível, possamos fugir a esse tipo de relacionamento… apesar de que sabemos que não é totalmente possível romper um paradigma de um IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 107 momento para outro…). É assim também, na maioria das vezes, que as pessoas são treinadas nas organizações: ensinamos um funcionário a fazer coisas, a realizar tarefas, a reproduzir padrões estabelecidos. Não o ajudamos a desenvolver a capacidade de refletir, de descobrir novos caminhos, (possivelmente melhores) para os problemas da organização. Sistemas cibernéticos simples como os termostatos, são capazes de aprender, no sentido de conseguir detectar e corrigir desvios de normas pré- estabelecidas. Mas não são capazes de questionar a validade do que estão fazendo. Por exemplo, um termostato não é capaz de determinar que nível de temperatura é apropriado à preferências dos habitantes de uma casa e de fazer ajustes para atingí- lo. Sistemas cibernéticos mais complexos como o cérebro humano ou computadores muito avançados, têm essa capacidade. Eles são capazes de detectar e corrigir erros nas normas operacionais e, então, influenciar os padrões que dirigem sua operação. O que caracteriza os sistemas que conseguem aprender a aprender é justamente essa capacidade de autoquestionamento. No aprender a aprender, os padrões reproduzidos são questionados, ao longo do próprio processo de aprendizado, o que significa que as pessoas devem ser capazes de atingir um tal nível de compreensão e discernimento sobre o seu contexto, que possam exercer seu questionamento crítico, sua criatividade para propor novos padrões. Quando os padrões são aplicáveis, eles podem e devem ser reproduzidos, até mesmo de modo automático (como o cérebro faz). Porém, é preciso ter a sensibilidade de perceber quando eles não o são, como representado na figura a seguir: 3.5.3 O CÉREBRO VISTO COMO UM SISTEMA HOLOGRÁFICO Morgan (1986) observa também que, mais recentemente, o cérebro tem sido comparado com um sistema holográfico, uma das maravilhas da ciência do laser. A holografia, inventada em 1948 por Dennis Gabor, usa uma câmera especial para registrar informações de modo que o todo da imagem é gravado em todas as partes do registro. Por meio de um efeito de luz, a informação original é reconstituída em uma placa holográfica denominada de “holograma”, que, uma vez iluminada de forma adequada, fornece um efeito tridimensional à imagem. Uma das características interessantes do holograma é que se ele for partido em várias partes separadas, cada parte elementar pode ser utilizada para reconstituir o todo da imagem. Tudo está registrado em toda parte (é como se o holograma fosse uma superposição de várias imagens completas). = ? N S SERIA ESTE O MELHOR PADRÃO A SER SEGUIDO? SEGUE O PADRÃO? MECANISMOS DE REALIMENTAÇÃO ? DESCOBERTA DE UM NOVO PADRÃO, MAIS ADEQUADO = ? N S SERIA ESTE O MELHOR PADRÃO A SER SEGUIDO? SEGUE O PADRÃO? MECANISMOS DE REALIMENTAÇÃO ? DESCOBERTA DE UM NOVO PADRÃO, MAIS ADEQUADO IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 108 A holografia demonstra, de modo concreto, como é possível criar processos nos quais o todo pode estar em todas as partes, de modo que cada parte represente o todo. O neurocientista Karl Pribam, da Universidade de Stanford, sugeriu que o cérebro funciona de acordo com os princípios holográficos: que a memória está distribuída pelo cérebro e então pode ser reconstituída a partir de qualquer uma das partes. Se ele estiver correto, isso pode explicar os resultados dos (terríveis) experimentos de Karl Lashey com os ratos. É possível estender esta imagem para conceber um tipo de organização no qual as capacidades requeridas no todo sejam criadas nas partes, de modo a que o sistema possa se auto-organizar e manter o seu funcionamento, mesmo quando partes específicas apresentem um mau funcionamento ou sejam removidas. A característica holográfica do cérebro acontece, porque ele tem uma característica extremamente importante: A CONECTIVIDADE ENTRE AS SUAS PARTES. Cada neurônio está conectado a centenas de milhares de outros, permitindo um esquema de funcionamento que é, ao mesmo tempo generalizado e especializado. Diferentes regiões do cérebro parecem se especializar em diferentes atividades, mas o controle e a execução de comportamentos específicos pode não estar associada, necessariamente, a uma única região. Assim, embora nós possamos distinguir as funções realizadas no córtex (o carro-chefe que controla as atividades não rotineiras e talvez a memória), no cerebelo (o computador ou piloto automático que cuida das atividades de rotina) e na região intermediária do cérebro (o centro de sentimentos e emoções), sabe-se hoje que eles são intimamente interdependentes e são capazes de agir uns pelos outros quando necessário. Hoje sabe-se que até mesmo a memória está distribuída por todo o cérebro. É conhecido ainda o fato de que o lado direito e o lado esquerdo do cérebro se combinam para produzir padrões de pensamento e que a distinção entre as funções desses hemisférios é acompanhada de padrões mais gerais de conectividade. Esse princípio de conectividade e função generalizada é também refletido no modo como os neurônios servem a ambos os hemisférios como um canal de comunicação. O rico padrão de conectividade entre os neurônios permite um processamento simultâneo de informações em diferentes partes do cérebro, uma receptividade de diferentes tipos de informação, ao mesmo tempo, e uma capacidade de perceber o que acontece em todas as partes. Essa capacidade é a base da difusão holográfica. O cérebro é composto de unidades repetitivas do mesmo tipo (há três tipos de células cerebrais) de modo que vemos diferentes funções sendo executadas por estruturas bastante similares… MAS ESTRUTURAS QUE SÃO INTELIGENTES! Um aspecto interessante desta conectividade reside no fato de que ela cria um grau de ligações e trocas maior do que é realmente necessário. Isto mesmo: algo que as organizações burocráticas tanto temem: a redundância! É comum entender redundância como sinônimo de desperdício… E talvez, em muitos casos, seja mesmo, mas não quando falamos em termos do conhecimento organizacional. Pensemos um pouco: é possível manter uma organização integrada, com suas partes bem conectadas, se uma parte não faz a menor idéia do que a outra executa? Há um nível de conhecimento mínimo sobre as IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 109 outras atividades, ou seja, UMA REDUNDÂNCIA mínima de conhecimentos, que precisa existir, para que as pessoas sejam capazes de se integrar. Um defensor ferrenho da visão mecanicista clássica perguntaria, então: “Isso significa que agora todos na organização terão que saber fazer tudo???”. A resposta é: não! Isso significa que a organização continua precisando ter os melhores especialistas em cada atividade, mas que esses especialistas precisam ter uma grande capacidade de integração e, para isso, precisam entender o que os outros especialistas estão fazendo, assim como precisa entender a importância do que ele faz para o todo. Do mesmo modo, os especialistas de uma mesma atividade precisam ser capazes de agir de fato como uma equipe (o que, sabemos, raramente acontece nas empresas). É claro que isso também implica alguma redundância de conhecimentos e até de funções, porque precisaremos ter gente que seja capaz de substituir o outro em suas funções quando necessário, de modo a que a integridade do todo não entre em colapso. Em outras palavras, o analista financeiro por formação pode continuar atuando como um analista financeiro na organização. Um engenheiro de produção pode continuar atuando como um engenheiro de produção. Um especialista em marketing, por continuar atuando como um especialista em marketing. Mas eles precisam ser capazes de falar uma mesma língua, de entender as necessidades uns dos outros. Logo, não há nenhum mal em que o analista financeiro entenda um pouco do marketing da organização e que o engenheiro de produção saiba compreender as dificuldades de administrar as questões financeiras da empresa. E mais, que todos eles sejam capazes de entender muito bem a estratégia da organização como um todo e de agir para colaborar com o sucesso dessa estratégia. Do mesmo modo, não parece nada saudável para o sistema de produção de uma empresa, ter um operador de máquinas que só sabe operar a máquina A, enquanto outro só sabe operar a máquina B, ou ter um comprador que só sabe comprar o produto X, enquanto outro só sabe comprar o produto Y. É só pensarmos o que seria do cérebro humano, se os neurônios não conseguissem se falar, ou se cada área do cérebro não enxergasse o que fazem as outras áreas. Essa redundância é crucial para criar um potencial holográfico e para garantir a flexibilidade da operação. A redundância permite que o cérebro opere de um modo flexível e cria um excesso de capacidade que permite o desenvolvimento de novas atividades e funções, facilitando o processo de auto-organização diante de circunstâncias de mudança ou até de pane. É como se o cérebro fosse capaz de projetar a si mesmo no curso da sua evolução. Mas como podemos utilizar essas idéias sobre as características holográficas do cérebro para criar organizações que, como ele, sejam capazes de aprender a se auto-organizar? O teórico de sistemas australiano Fred Emery (citado por Morgan, 1986) sugeriu que existem duas formas de se incluir a redundância em um sistema: A primeira delas seria a criação de uma redundância das partes, na qual cada parte é projetada para realizar uma função específica e criam-se partes adicionais para realizar aquilo que as partes tradicionais não são capazes de fazer a contento. Um exemplo é quando as empresas montam uma equipe adicional de especialistas em marketing para lançar um novo produto, ou criam um grupo específico para tratar uma mudança que se pretenda realizar. Essa forma de redundância, de origem mecanicista, é facilmente encontrada em grande parte das organizações de nossos dias. Nela, a responsabilidade pelas mudanças estruturais no sistema é atribuída a IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 110 partes que possuem a função específica de fazê-lo. Assim, tais sistemas podem ser organizados e re-organizados, mas existe muito pouca capacidade de auto- organização. O segundo método sugerido por Emery incorpora a redundância de funções. Ao invés de partes especiais serem adicionadas ao sistema, funções extras são adicionadas a cada parte operacional, de modo que cada parte seja envolvida em um conjunto de funções, ao invés de executar uma única atividade. Ou seja, pessoas com diferentes habilidades participam de forma realmente coletiva em um mesmo processo de trabalho, interagindo e aprendendo umas com as outras. Um exemplo desse princípio é encontrado nas organizações que empregam grupos de trabalhos autônomos e bastante integrados, nos quais os membros adquirem múltiplas habilidades, de modo a que eles sejam capazes de manter a visão de todo o projeto e até de realizar alguns trabalhos uns dos outros, quando necessário, mesmo tendo, cada um, suas especialidades. Os sistemas baseados em funções redundantes são holográficos, na medida em que as capacidades relevantes para o funcionamento do todo estão incluídas nas partes. Mas é importante frisar: isso não significa que cada indivíduo tem que carregar todo o conhecimento do mundo (a idéia do “faz-tudo”, que termina por não se aprofundar em nada). Ter uma organização holográfica significa ter uma organização na qual cada indivíduo é capaz de enxergar o todo, é capaz de interagir com os outros, de falar a mesma língua que seus companheiros, de colaborar e até de assumir parte das funções de seus colegas, quando for o caso (O QUE NÃO SIGNIFICA QUE CADA INDIVÍDUO PRECISA REALIZAR O TRABALHO DE DOIS, como pensam muitos administradores!). 3.5.4 SÍNTESE DOS PRINCÍPIOS DA ORGANIZAÇÃO CÉREBRO Relembrando a essência de toda esta nossa discussão, podemos resumir, então os princípios que podem ajudar uma organização a desenvolver características que se assemelhem à capacidade de um cérebro inteligente: • Manter a visão do todo nas partes; • Criar forte conectividade entre as partes; • Criar uma certa redundância de conhecimentos e até de funções; • Criar especialização e generalização simultâneas; • Criar uma capacidade de auto-organização e • Ser capaz de “aprender a aprender”. 3.6 A COMPARAÇÃO ENTRE AS TRÊS IMAGENS Comparando as três imagens que mencionamos nos tópicos anteriores, a máquina, o organismo vivo e o cérebro, vemos que a analogia com elas pode representar três maneiras bem diferentes de pensarmos a lógica de funcionamento das organizações e o modo como elas podem lidar com a complexidade e a incerteza: • a máquina nos faz direcionar a atenção para a possibilidade de produzir previsibilidade; • o organismo nos faz destacar as possibilidades de pensa a IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 111 adaptabilidade; • o cérebro nos faz refletir sobre a possibilidade de construir inovação. De qualquer modo, é importante lembrarmos que, qualquer que seja a metáfora ou ângulo de visão que tenhamos escolhido para representar a complexidade de uma organização, ela será sempre limitada! Cada modelo de representação escolhido pode ajudar a ressaltar características importantes de uma realidade, as quais, olhando-se sob outra ótica, não seriam ressaltadas. Precisamos lembrar, também, que as idéias que a Administração produz para ajudar as organizações a lidarem com a complexidade não são independentes do tempo e do espaço: elas surgem em função de todo um contexto produzido pela própria sociedade na qual estão inseridas e, portanto, refletem visões de mundo que vão muito além das “quatro paredes” das organizações. As sociedades humanas são dinâmicas e diversas. Por que as idéias da Administração não o seriam? Finalmente, toda esta reflexão inicial serve, principalmente, para dizer que aqueles que tentar estudar as idéias da Administração pensando que, deste modo, poderiam, finalmente, descobrir a chave do caminho do sucesso na gestão de uma organização, irão se frustrar. Do mesmo modo, os administradores que dedicam grande parte de seu tempo procurando desesperadamente descobrir o que a grande multinacional X ou a empresa Y fizeram para aplicar nas suas próprias organizações, correm o risco de seguir corretamente a “receitinha” e ver o bolo “desandar” no seu forno. Assim também, aqueles que, ao iniciarem a leitura de um artigo escrito por um guru de uma conceituada universidade americana, imaginarão estar diante de uma verdade incontestável, logo perceberão estar comprando gato por lebre... Na Administração não existem verdades absolutas, nem respostas definitivas para qualquer tipo de problema. Felizmente, por sinal. Antes de avançarmos na nossa discussão, é interessante, então, que você reflita sobre as seguintes questões: Você acha que o modo como acontece a dinâmica do dia-a-dia do trabalho na sua empresa tende a valorizar mais a busca da previsibilidade, a adaptabilidade aos desafios ou o desenvolvimento de uma ação inteligente? Por que? Qual(is) das três imagens mais se assemelha(m) ao tipo de dinâmica que acontece na organização? Em que aspectos? 3.7 A ORGANIZAÇÃO INTELIGENTE E INOVADORA E A GESTÃO DO CONHECIMENTO O que torna uma organização inteligente e inovadora como um cérebro? Esta é uma das questões sobre as quais viemos tentando refletir até o momento. Já tivemos a oportunidade de perceber o quanto os modelos tradicionais de gestão das organizações eram limitados, em termos de criar condições para que estas capacidades “cerebrais” se desenvolvessem. Falta, então refletirmos sobre como uma organização pode construir um um modelo de gestão capaz de impulsionar o desenvolvimento de uma cultura de inovação que a ajude a enfrentar os grandes desafios de competitividade do nosso tempo. Pois bem, esta tem sido uma das grandes preocupações, tanto dos teóricos quanto dos praticantes das idéias sobre a gestão das organizações nas últimas IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 112 décadas. Cada vez parece ficar mais claro que, nestes novos tempos, uma organização que não for capaz de gerir o seu conhecimento de modo estruturado, integrado e inovador corre o risco de ver destruídas as suas chances de sucesso. E cada vez se torna mais evidente que mesmo as empresas que possuem longas histórias de liderança em seus mercados não estão imunes a este desafio. Assim, a Gestão do Conhecimento (GC), ou Knowledge Management (KM) é uma das expressões que mais vêm se popularizando no discurso da Administração nos últimos anos. Mas o que significa realizar uma gestão do conhecimento que ajude a organização a produzir inovação? Em primeiro lugar, é importante pensarmos que todas as organizações, mesmo aquelas mais “mecanicistas”, sempre foram geradoras de conhecimento e, de algum modo, sempre foram capazes de gerí-lo. Se não fosse assim, elas nem sequer existiriam, pois o simples fato de se produzir alguma coisa já significa que existe um conhecimento que foi gerado, retido e traduzido em capacidade de realização. Isto não significa, no entanto, que este conhecimento seja, necessariamente, bem compartilhado ou bem utilizado e, o que parece ser mais importante em nossos dias, que ele seja continuamente transformado. È preciso reconhecer que ter conhecimento não é garantia de este conhecimento está sendo adequadamente gerido. Em primeiro lugar, é preciso observar que o saber é condição para o saber, ou seja: o conhecimento é matéria- prima do próprio conhecimento. Em outras palavras, quanto mais conhecemos, mais temos a possibilidade de desenvolver novos conhecimentos. Por outro lado, o fato de se ter conhecimento não é garantia de que novos conhecimentos serão gerados ou de que as inovações serão produzidas. É preciso mais, principalmente se levarmos em conta que as organizações se renovam, as pessoas não permanecem eternamente em seus quadros (em nossos dias, menos ainda, por sinal) e elas precisam continuar cumprindo a sua missão. Em segundo lugar, é preciso fazermos uma distinção entre dois conceitos que muitas vezes são tomados como sinônimos, mas que, de fato, não o são: invenção e inovação. Vamos recorrer às idéias de Peter Senge, um pesquisador do MIT, para pensarmos sobre isto: O avião foi inventado em 1903, mas passaram-se mais de trinta anos antes que a aviação comercial se tornasse viável e pudesse ser colocada a serviço do público. Os engenheiros dizem que uma nova idéia é um “invento” depois de ser testa em laboratório. Mas ela só se torna uma “inovação” quando pode ser reproduzida em escala significativa e a um custo viável. Se a idéia é suficientemente importante, como foi o caso do telefone, do computador digital e do avião comercial, ela é chamada de “inovação básica” e dá origem a uma nova indústria ou transforma uma indústria já existente (Peter Senge, 1990, in: A Quinta Disciplina, p.14). Em outras palavras, o que Senge quer dizer, neste fragmento de texto, é que há uma distância considerável entre inventar e inovar. A habilidade de inventar depende da criatividade, da capacidade de gerar idéias. Mas a habilidade de inovar, além da criatividade, depende da capacidade de realizar, de transformar uma invenção em algo concreto que transforma uma realidade. Todos nós conhecemos, por exemplo, pessoas que são extremamente criativas, mas que não são capazes de materializar suas idéias. Mas também conhecemos pessoas que são muito hábeis em “fazer as coisas acontecerem”, mas que não conseguem dar vazão a IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 113 novas idéias. Quando estes dois tipos de habilidades se encontram, temos um indivíduo com grande potencial de ajudar a transformar o mundo à sua volta. Com as organizações também é assim que as coisas acontecem. São muitas as definições que têm sido atribuídas ao conceito de Gestão do Conhecimento. Há autores que, como Klasson (1999), apresentam definições mais simples, como “o conjunto de ações gerenciais sistematizadas que permitem usar ou renovar a informação e a experiência acumulada nas companhias, de forma eficaz para atingir objetivos vinculados aos seus negócios”. Verifica-se, porém, uma tendência a que, cada vez mais, este conceito esteja associado à idéia de inovação. Fahey et alii (2001) destacam que a Gestão do Conhecimento emergiu em torno dos últimos dez anos como uma importante disciplina de gestão com seu próprio corpo de conceitos, linguagem e práticas. A pesquisa, a consultoria e a atenção gerencial devotadas à Gestão do Conhecimento indicam uma presença visível dos esforços das empresas em criar e sustentar estratégias vencedoras e construir organizações mais eficientes e efetivas. Segundo estes autores, a gestão do conhecimento organizacional deve possibilitar, suportar e encorajar os três seguintes focos inter-relacionados: • Os processos de descoberta e criação de novos conhecimentos e de refinamento dos conhecimentos existentes (desenvolvimento dos ativos de conhecimento); • O compartilhamento de conhecimento entre indivíduos e entre todas as fronteiras organizacionais (gestão do fluxo de conhecimento); • O desenvolvimento e uso continuado como parte do trabalho do dia-a-dia dos indivíduos e como parte do processo de decisão (disponibilização do conhecimento para uso). Na visão de Teixeira (1999), as principais atividades da gestão do conhecimento, seriam, de modo mais detalhado: • Compartilhar o conhecimento internamente; • Atualizar o conhecimento; • Processar e aplicar o conhecimento para algum benefício organizacional; • Encontrar o conhecimento internamente; • Encontrar o conhecimento externamente; • Adquirir conhecimento externamente; • Reutilizar conhecimento; • Criar novos conhecimentos; • Compartilhar o conhecimento com a comunidade externa à empresa. Tuomi (2002), por sua vez, percebe que o conceito de Gestão do Conhecimento tem sido associado a quatro tipos diferentes de disciplinas: o processamento de informação, a inteligência, a cognição e o desenvolvimento organizacionais. Davenport e Prusak (1998) lembram que é preciso distingüir com clareza a Gestão do Conhecimento da gestão de dados ou de informação. Esta idéia é compartilhada por Fahey et al. (2001), para quem a Gestão do Conhecimento vai IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 114 muito além do projeto e uso de ferramentas e tecnologias envolvidas na coleta, análise e transmissão de dados. Trata-se de um conceito centrado nos indivíduos e grupos, como criadores e usuários do conhecimento. Eles ocupam o papel de liderança no desenvolvimento da “compreensão profunda” dos meros dados e informação. Criar e usar conhecimento é um desafio humano: isto requer que os indivíduos pensem e usem a razão, ou seja, façam sentido sobre o mundo em torno deles. Assim, estes autores identificam alguns princípios básicos que sustentam a noção de Gestão do Conhecimento: a) Conhecimento não é sinônimo de dados • Dados descritivos não são suficientes para a tomada de decisão; • É preciso análise, para transformar dados em padrões (ou insights) e em compreensão; b) O conhecimento precisa mudar, na medida em que o mundo muda • O conhecimento, como um ativo, raramente se mantém estagnado: as crenças e os pressupostos mudam ao longo do tempo; • Precisamos manter o que sabemos em sincronia com as mudanças no mundo à nossa volta; c) Os processos de conhecimento requerem o uso da razão • A transformação de dados em padrões requer inferências e julgamentos ou, em outras palavras, exige pensar; • É preciso, portanto, fornecer condições para que os indivíduos e grupos se engagem em um processo organizado de raciocínio; d) O conhecimento é freqüentemente implícito ou tácito • Nós sabemos mais sobre os clientes, a tecnologia, etc, do que somos capazes de articular; • Muito do “know-how” que possuímos permanece tácito (nem sempre estruturado em nossas mentes) mas é crítico para o que fazemos e como fazemos; e) O conhecimento não pode ser separado dos “conhecedores” • Não se pode separar “o que se sabe” de quem sabe; • É praticamente impossível separar o que sabemos do que fazemos em nosso trabalho e em nossa vida do dia-a-dia; • O saber e o fazer estão intimamente interconectados (ao ponto de ser extremamente difícil distinguir como um influencia o outro); f) O conhecimento é difícil, ou até mesmo impossível, de ser diretamente gerenciado • Só se pode “gerenciar” o conhecimento quando se é capaz de influenciar o “conhecedor”; • Pode-se gerenciar conhecimento de modo indireto, gerenciando a organização: sua cultura, as pessoas, a tecnologia, as estruturas, os sistemas, as estratégias, etc.; • Gerenciando estes fatores, pode-se gerenciar indiretamente os ativos de conhecimento (o que os indivíduos e grupos sabem) e o fluxo do conhecimento (como o conhecimento é compartilhado entre os indivíduos e grupos). IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 115 Alguns autores como Cavalcanti e Gomes (2000) e Sveiby (1998) têm, ainda, procurado definir a Gestão do Conhecimento como a gestão de um conjunto de “capitais” importantes para a organização. Entre estes capitais de conhecimento, Cavalcanti e Gomes (2000) destacam: • Capital Ambiental – definido como o conjunto de fatores que descrevem o ambiente onde a organização está inserida. Monitorar o ambiente externo à empresa, através da Inteligência Competitiva é, no entanto, uma condição necessária, mas insuficiente para o bom desempenho das organizações na economia do conhecimento. O conjunto ambiente externo/ambiente interno da empresa tem que estar em perfeita sintonia com os objetivos dos negócios da empresa para que esta possa ganhar, com este monitoramento, vantagem competitiva. Este acompanhamento só é possível se a empresa e seus integrantes, estiverem cientes e comprometidos com a visão estratégica da empresa/organização. • Capital Estrutural – definido como um conjunto de sistemas administrativos, conceitos, modelos, rotinas, marcas, patentes e sistemas de informática, que permitem à organização funcionar de maneira efetiva e eficaz. Faz parte do capital estrutural a cultura organizacional. De uma maneira mais simples, Edvinsson (1998, apud Cavalcanti e Gomes, 2000) define o capital estrutural como tudo aquilo que fica na organização quando as pessoas deixam o escritório e vão embora para casa. De todos os capitais, o capital estrutural é o mais fácil de se mensurar. • Capital Intelectual – refere-se tanto à capacidade, habilidade e experiência quanto ao conhecimento formal que os empregados detêm e que agregam a uma empresa. O capital intelectual é um ativo intangível que pertence ao próprio indivíduo, mas que pode ser utilizado pela empresa para gerar valor. • Capital de Relacionamento – definido como a rede de relacionamentos de uma organização e seus empregados com seus clientes, fornecedores e parceiros. 3.8 E COMO CONSTRUIR UMA GESTÃO DO CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL VOLTADA PARA A INOVAÇÃO? Para refletirmos sobre esta questão, vejamos um estudo de caso que tem se tornado um clássico, nas discussões mais importantes sobre a inovação organizacional: IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 116 CASO PARA REFLEXÃO: EXISTE VIDA CRIATIVA DEPOIS DO POST-IT? Extraído de: STONER, J.A.F. FREEMAN, R.E. Administração. Rio de Janeiro, Prentice-Hall do Brasil. Fonte original do caso: “Lessons from a Successful Intrapreneur”. The Journal of Business Strategy 9, no. 2 (março-abril de 1988): 20- 24. Art Fry estava um pouco preocupado. Agora que era considerado um inventor, sentia uma certa pressão para repetir o seu sucesso; infelizmente não tinha muita certeza de consegui-lo. De onde vinha a criatividade? Seria possível criar por encomenda? O ambiente ao redor poderia contribuir para o processo? Sem dúvida, seu empregador pensava que sim, mas será que as expectativas da 3M eram realistas? Art havia inventado o Post-it – bloquinhos de papel com uma tira adesiva, que agora são um equipamento padrão em todo escritório nos EUA. Originalmente eram apenas amarelos, mas agora vêm num arco-íris de cores e com frases inteligentes impressas. Existem muitas imitações – a forma mais sincera de elogio. O produto é definitivamente um sucesso. Art não tinha partido do objetivo de dar início a uma revolução, nem mesmo entre o pessoal do escritório. Inventou os bilhetes adesivos porque seus marcadores de livros viviam caindo do seu hinário na igreja. Para resolver esse problema de menor importância, ele pegou uma tira adesiva que era um produto interessante porém de nenhum sucesso, criado pelo setor de pesquisas da 3M, e grudou-o em pedaços de papel. O adesivo for a rejeitado pela 3M, onde Fry trabalhava como cientista, porque só ficava colado enquanto não fosse mexido. Mas essa qualidade foi precisamente a responsável pelo sucesso do Post-it. Depois de “bolar” um formato e de brincar por algum tempo com ele, Art soube que tinha um produto que as pessoas poderiam usar. Entretanto, convencer seus superiores na 3M seria outra coisa – eles não estavam muito convencidos que as pessoas pagariam por papel de rascunho com uma tira de adesivo atrás. De fato, os primeiros resultados de vendas pareciam confirmar seu ceticismo. Os bilhetes adesivos só começaram a vender mesmo depois da estratégia de marketing ser mudada. Trocaram o programa de mandar anúncios e folhetos por um que mandava amostras do produto. Assim que as pessoas puderam brincar com os Post-it e descobrir por elas mesmas uma quantidade de usos, as vendas dispararam. Todo mundo que recebia amostras, de administradores de topo a office-boys, logo se tornou usuário leal. Obviamente a 3M adorou o sucesso dos Post-it. Como empresa, a 3M trabalha duro para estabelecer políticas que ajudem seu pessoal a criar exatamente esse tipo de sucesso. Ela vê seu papel como o de proporcionar as ferramentas de que as pessoas criativas precisam para transformar uma idéia numa realidade vendável. Um indivíduo isolado, com uma boa “cachola”, pode não ter a especialização ou o equipamento para manufaturar itens como aqueles em que a 3M se especializa. Mesmo que ele consiga nos primeiros estágios da vida do produto, o problema começa assim que a concorrência esquenta e entram em campo a fabricação eficiente e a publicidade em grande escala. Assim, a 3M administra o processo global, contribuindo com os recursos e os talentos combinados de uma grande corporation. (continua) IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 117 Para isso a 3M precisa de idéias originais. Por isso a companha permite e até mesmo encoraja que seus empregados gastem tempo pago pela companha com projetos pessoais ou de que gostem. Os bilhetes adesivos são apenas um exemplo do que pode resultar desses esforços pessoais. Além disso, a empresa tem o cuidado de dar todo o crédito aos seus criadores assalariados permitindo que se sintam responsáveis pelas suas contribuições à companhia. Voltemos ao dilema pessoal de Art Fry. Ele sabia que a 3M esperava um pouco mais dele, agora que provara que poderia ter uma idéia, ser o “campeão de produto” dela, fazê-la passar por todo o sistema e criar um sucesso comercial. Ele também esperava mais de si próprio. Tinha conseguido uma vez e queria conseguir de novo. Tudo de que precisava era de uma boa idéia, e era exatamente isso, juntamente com o impulso de ir adiante e chegar ao sucesso com ela, que nenhuma empresa poderia proporcionar. Art Fly tinha resolvido o problema de achar os hinos no seu hinário. Agora, que problema ele poderia resolver? ________________________________________ Procure refletir sobre a seguinte questão: Na maioria das organizações que conhecemos, que tipos de dificuldades poderiam levar a um fracasso um processo de inovação como aquele de qual Art Fry tornou-se protagonista? No caso do Post-it, podemos observar a existência de alguns aspectos que podem ser considerados como facilitadores do processo que levou a inovação. • Parece que a empresa possui uma filosofia de gestão que recebe com bons olhos os esforços de seus empregados em buscar a inovação; caso contrário, seria difícil de imaginar que Art Fry tivesse coragem de levar a sua idéia para a empresa. • Mais do que aceitar as idéias, a empresa parece valorizá-las, como mostra o reconhecimento dado a Art Fry. • De algum modo, o erro não parecia ser encarado pela empresa segundo uma visão punitiva; caso contrário, provavelmente a “tira adesiva que não fez sucesso” e que serviu de inspiração para a idéia de Art Fry teria sido lançada em alguma “lata de lixo”, teria sido escondida pelos seus inventores, ou teria sido arquivada como um fracasso. • O fato de Art Fry ter utilizado a tira adesiva também mostra que a empresa não descartava as suas descobertas, ainda que elas não se mostrassem imediatamente aplicáveis e eficientes. • Havia, na empresa, um bom fluxo de informação; caso contrário, Art Fry jamais teria tomado conhecimento da existência da tal tira adesiva e seus colegas que colaboraram no teste e melhoria do Post-it jamais teriam tomado conhecimento de sua idéia. • Havia entre as pessoas da empresa um senso de colaboração; afinal, embora a idéia inicial do post-it tenha sido de Art Fry, ele só se tornou um produto viável por meio da participação de seus colegas de diferentes áreas. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 118 Em outras palavras, o caso do Post-it nos mostra uma situação na qual uma empresa conseguiu criar condições para que os conhecimentos existentes em seus processos e nas mentes de seus empregados dessem margem a um processo de inovação. E isto só foi possível porque, como em um cérebro, as diferentes células da organização atuassem de maneira compartilhada. Mas a preocupação de Art Fry, narrada no final do texto é válida: ainda que o Post-it tenha sido um sucesso, é necessário que o processo de inovação não se encerre neste produto. Afinal, o sucesso futuro da organização depende de sua capacidade de continuar inovando, já que logo os concorrentes estarão prontos para copiar as boas idéias. A preocupação dele parece ser exagerada, no entanto, se percebermos que a inovação do Post-it não foi produzida por ele sozinho: houve a articulação de uma rede de pessoas que, ao disponibilizarem seus esforços e seus conhecimentos, construíram um produto novo. Em outras palavras, a atual preocupação de Art Fry sugere que talvez ele não tenha compreendido plenamente que ele é apenas um elemento desta rede, porém um elemento importante, como são todos os demais. 3.9 A GESTÃO DO CONHECIMENTO COMO UM PROCESSO CONTÍNUO E COLETIVO Para nos ajudar a fechar a nossa reflexão sobre o caso do Post-it, vamos olhar, então, para algumas idéias apresentadas por Ikujiro Nonaka, um dos autores que mais têm se destacado na discussão sobre a Gestão do Conhecimento. Nonaka (2000) discute que o desenvolvimento da capacidade de inovação deve ser a meta essencial para a construção de uma organização criadora de conhecimento. Essa capacidade de inovação seria fortalecida pela implementação de uma ESPIRAL DO CONHECIMENTO, quando são criadas condições para que os conhecimentos tácitos (aqueles que estão nas mentes das pessoas) possam ser transformados em conhecimentos explícitos (implementados de modo claro na vida da organização), os quais, uma vez compartilhados, podem propiciar o desenvolvimento de novos conhecimentos tácitos, fazendo com que o conhecimento organizacional possa estar em constante evolução, dando margem, portanto, a um processo de inovação continuada. Essas duas formas de manifestação do conhecimento são definidas pelo autor através da seguinte conceituação: Conhecimento Tácito: O conhecimento tácito é algo difícil de ser visível e descrito. É altamente pessoal e difícil de formalizar, o que dificulta sua transmissão e compartilhamento com os outros. Está profundamente enraizado nas ações e experiências de um indivíduo, bem como em suas emoções, valores ou ideais. Nonaka e Takeuchi (1997) classificam esse tipo de conhecimento em 2 dimensões: • uma dimensão técnica, que abrange um tipo de capacidade informal e difícil de definir, ou habilidades capturadas no termo “know-how”; • uma dimensão cognitiva, que consiste de esquemas, modelos mentais, crenças e percepções tão arraigadas que os tomamos como certos. É a dimensão que define nossa imagem de realidade e nossa visão de futuro. Apesar desses modelos implícitos não poderem ser articulados muito IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 119 facilmente, eles moldam a forma com que percebemos o mundo à nossa volta. Conhecimento Explícito: É o conhecimento que se encontra na organização de forma mais estruturada, palpável, que pode ser mais facilmente “processado” em computador, transmitido como uma informação organizada, documentado, ou armazenado em um banco de dados, implementado em uma tecnologia, uma regra organizacional, etc. A espiral do conhecimento é representada na Figura 1. Figura 1 – A Espiral do Conhecimento Organizacional Nonaka (2000) exemplifica o ciclo da espiral do conhecimento organizacional por meio de um exemplo real, reproduzido a seguir: EXEMPLO: A máquina de fazer pão da Matsushita Fonte: Nonaka (2000, p.32-33) Em 1985, os especialistas em desenvolvimento de novos produtos da Matsushita Electric Company, com sede em Osaka, trabalhavam arduamente no projeto de um novo equipamento doméstico para a produção de pães. Mas enfrentavam problemas em conseguir que a máquina amassasse corretamente a farinha. Apesar dos esforços, a casca do pão ficava muito torrada, enquanto o miolo continuava cru. Os empregados analisaram exaustivamente o pbroblema. Até mesmo compararam por meio de raios X a massa produzida pela máquina com a massa batida por padeiros profissionais. Mas não chegaram a qualquer resultado. Finalmente, a projetista de software Ikuko Tanaka propôs uma solução criativa. O Osaka International Hotel tinha a reputação de fazer o melhor pão de Osaka. Por que não usá-lo como modelo? Tanaka submeteu-se a treinamento pelo chefe dos padeiros do hotel para estudar suas técnicas de mistura da massa. Com o tempo, ela observou que o padeiro tinha um modo próprio de estirar a massa. Depois de um ano de tentativas e erros, trabalhando em estreita cooperação com os engenheiros projetistas, Tanaka propôs especificações para o produto – entre elas a inclusão de estrias especiais no interior da máquina – que reproduziram com sucesso as técnicas de estiramento do padeiro e a qualidade do pão, com base em seu aprendizado no hotel. Resultado: o método exclusivo de “torção da massa” da Matsushita é um produto que, no primeiro ano, superou o recorde de vendas de novos eletrodomésticos para cozinha. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 120 A espiral do conhecimento organizacional compreende quatro padrões básicos de compartilhamento que envolvem os conhecimentos explícitos e tácitos, os quais podem ser melhor entendidos com auxílio do exemplo da máquina de produzir pães. O primeiro tipo de padrão é a transformação de conhecimentos tácitos em conhecimentos tácitos. Em uma organização as pessoas compartilham conhecimentos tácitos umas com as outras, ou seja, aprendem por meio da socialização, sem que, necessariamente, os conhecimentos precisem ser explicitados. Quantas vezes em nossa vida, ao trabalharmos com um colega no dia- a-dia, temos a sensação de aprendermos muito com ele, sem que ele jamais tenha explicado de modo estruturado aquilo que ele conhece? Nestes casos, aprendemos por meio da observação, da imitação, da prática conjunta. Foi o caso de Tanaka, durante o período que ela passou com o chefe dos padeiros do hotel. Observe que o chefe não “transferiu” o seu conhecimento para Tanaka, mesmo porque o conhecimento não se transfere da mente de um indivíduo para o outro. O que ocorreu foi que, durante este período de convivência, Tanaka foi capaz de construir um conhecimento semelhante àquele que o chefe possuía (observe que utilizamos a palavra “semelhante”, não “igual”, pois nunca dois conhecimentos serão idênticos na mente de dois indivíduos distintos, já que os seus cérebros não são iguais). Outro tipo de padrão é a transformação de conhecimentos tácitos em conhecimentos explícitos. Nonaka (2000) nos chama a atenção para o fato de que quando Ikuko Tanaka foi capaz de expressar os fundamentos de seu conhecimento tácito sobre fabricação de pão, ela o converteu em conhecimento explícito, permitindo o seu compartilhamento com a equipe de desenvolvimento de projetos. Podemos pensar, ainda, outros exemplos deste tipo de trasnformação, tais como: um gerente de serviços que alimenta um banco de dados com informações sobre o perfil de comportamento de seus clientes, com base na experiência adquirida nas suas interações com eles; um profissional de contabilidade que documenta uma rotina de lançamentos que será útil a diferentes áreas da organização, construída com base em seus conhecimentos tácitos desenvolvidos nas operações do dia-a- dia. É possível pensarmos também na existência de um padrão de transformação de conhecimentos explícitos em conhecimentos explícitos. Vejamos o exemplo da máquina de produção de pães: uma vez que Tanaka expressou (ou explicitou) de forma estruturada o conhecimento que ela adquiriu no hotel, este conhecimento explícito foi levado até a equipe de projeto que pôde associá-lo com outros conhecimentos explícitos relativos à tecnologia de fabricação das máquinas, gerando discussões entre os membros da equipe, construções de protótipos, etc. Já no exemplo do gerente de serviços anteriormente apresentado, as informações explicitadas sobre o comportamento dos clientes podem ser combinadas por outro gerente de serviços com o seu plano de vendas, de modo a gerar uma estratégia de abordagem de seus próprios clientes. Finalmente, no exemplo da rotina de lançamentos contábeis, um profissional de uma área de compras que recebe o documento enviado pelo profissional de contabilidade, pode, por exemplo, adaptar esta rotina à sua planilha de lançamentos, dando a ela um formato aplicável ao seu tipo de tarefa. Finalmente, pode-se falar em um padrão de transformação de conhecimentos explícitos em conhecimentos tácitos. Nonaka (2001) nos lembra que, à medida que um novo conhecimento explícito é compartilhado em toda a IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 121 organização, outros empregados começam a internalizá-lo, ou seja, o utilizam para ampliar, estender e reformular seus próprios conhecimentos tácitos. No exemplo da máquina de fazer pão, a experiência vivida proporcionou aos membros da equipe de projeto a possibilidade de repensarem sua maneira de conceber a tecnologia dos produtos que fabricavam e, provavelmetne, a partir desta experiência, eles pensarão segundo uma outra lógica. No exemplo dos gerentes de serviços, o segundo gerente pode, após um certo tempo, refazer toda o tipo de abordagem que ele realiza diante de seus clientes e, tacitamente, construir novos conhecimentos sobre eles. Assim também, o uso da nova planilha, no caso do profissional de compras pode levá-lo, após um certo tempo, a desenvolver um novo modo de lidar de maneira ainda mais eficiente com as rotinas de lançamento, criando tacitamente um jeito novo de realizar sua tarefa (a qual, se for compartilhada, pode realimentar a espiral). Todo este processo é representado de modo mais detalhado na Figura 2.Por meio da construção de um campo de interação propício, se possibilita a socialização, ou o compartilhamento dos conhecimentos tácitos entre os indivíduos. Através do diálogo intenso, esse conhecimento compartilhado passa a ser externalizado ou conceitualizado, de modo a que possa ser associado aos outros conhecimentos explícitos. Essa "combinação" de conhecimentos explícitos, permite a ampliação do conhecimento sistêmico na organização. O conhecimento sistêmico, uma vez praticado na forma de conhecimento operacional, passa a ser internalizado pelos indivíduos, dando margem ao desenvolvimento de novos conhecimentos tácitos. Nonaka e Takeuchi (1997) procuram também identificar a sua lista de requisitos essenciais para a criação de uma espiral do conhecimento nas organizações: • a clareza nas intenções organizacionais, através da criação e implementação de uma visão compartilhada. Os autores identificam a necessidade de um forte engajamento da liderança no uso da comunicação e do exemplo, como fonte importante na criação dessa visão compartilhada; • autonomia nas ações de cada parte, atribuindo a cada indivíduo ou grupo as responsabilidades e condições necessárias aos processos de decisão envolvidos nos seus trabalhos • flexibilidade e incentivo ao caos criativo, permitindo que os paradigmas organizacionais sejam constantemente questionados, viabilizando a busca e assimilação de novos conhecimentos • criação de redundância de conhecimentos, que encoraje o diálogo e a comunicação em geral, auxiliando na criação de um “terreno cognitivo comum” • criação do princípio da variedade de requisitos em cada parte da organização, que permita que, através de um conjunto variado de conhecimentos e habilidades desenvolvidos em cada indivíduo ou equipe, possam ser mantidas diferentes visões sobre um mesmo problema, o que facilita o processo de geração de soluções IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 122 Figura 2 – O processo de construção da espiral do conhecimento Adaptado de: Nonaka, I. Takeuchi, H. Criação de Conhecimento na Empresa. Rio de Janeiro: Campus, 1997. Nessa espiral, o conhecimento começa num nível individual, move-se para o nível do grupo e então para o nível da organização como um todo. Na medida em que a espiral do conhecimento caminha na direção do nível organizacional, retornando ao individual de modo continuado (Inkpen 1996). Observa-se, então, que a disposição e as condições de engajamento dos indivíduos, bem como as condições de compartilhamento nos grupos e na organização como um todo são fundamentais para este processo. Assim, sugerimos que você procure fazer a seguinte reflexão: QUESTÕES PARA REFLEXÃO – A Espiral do Conhecimento Organizacional Quais são as dificuldades que você observa nas organizações, para que aconteçam da melhor forma possível cada um dos quatro tipos de “transformação” que compõem a espiral do conhecimento: - de tácito para tácito? - de tácito para explícito? - de explícito para explícito? - de explícito para tácito? Que tipos de iniciativas concretas (programas, rotinas, instrumentos, etc.) uma organização pode criar, para melhorar cada um destes quatro padrões de transformação? 3.10 A GESTÃO DO CONHECIMENTO NA PRÁTICA Como você pode observar, com base nas idéias de Nonaka, para que uma organização possa gerir o seu conhecimento visando à inovação, é preciso que ela seja capaz de construir uma série de condições que envolvem diferentes aspectos Socialização Conhecimento Compartilhado Externalização Conhecimento Conceitual Internalização Conhecimento Operacional Combinação Conhecimento Sistêmico Diálogo Co n s tr u çã o do c a m po de in te ra çã o Aprender fazendo As so ci a çã o do c o n he c im e n to e x pl íc ito TÁCITO => TÁCITO TÁCITO => EXPLÍCITO EXPLÍCITO => EXPLÍCITOEXPLÍCITO => TÁCITO IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 123 de seu funcionamento, de seus processos de gestão e da dinâmica da interação dos indivíduos. Os quatro padrões presentes na espiral do conhecimento descrita por aquele autor nos fazem refletir sobre as diversas dificuldades para que a Gestão do Conhecimento possa ser plenamente implementada em uma organização. Por outro lado, eles também nos inspiram a imaginar uma série de ações que poderiam ajudar a organização a caminhar nesta direção. Alguns autores (ex: Davenport e Prusak, 1998; Rodriguez y Rodriguez, 2002; Siemieniuch et. al., 2004) têm se dedicado a pensar sobre estas possibilidades de construção de uma autêntica gestão do conhecimento, envolvendo um conjunto variado de dimensões da vida da organização. Na medida em que avançam as discussões sobre o tema e que as organizações se empenham em implementá-lo, fica cada vez mais claro que a Gestão do Conhecimento é uma espécie de “conceito guarda-chuva” que envolve outras diferentes dimensões da gestão, conforme sugere a Figura 3. Figura 3 – Algumas das principais dimensões envolvidas na Gestão do Conhecimento Organizacional Pode-se fazer algumas reflexões sobre as dimensões apresentadas na Figura 3: a) Gestão da estratégia • Parece cada vez mais claro que uma das grandes motivações para a Gestão do Conhecimento é o desenvolvimento da capacidade de inovação das organizações e, como vimos nos itens anteriores, esta capacidade de inovação não é possível sem a participação dos indivíduos. Assim, a estratégia da organização passa a ser vista como um processo participativo, no qual cada indivíduo e equipe contribui com os seus conhecimentos e competências para a construção de uma vantagem competitiva sustentável. Isto não significa dizer que todas as decisões estratégicas têm que ser discutidas por todos na organização (o que seria inviável), mas sim que, cada um, no seu nível de responsabilidade, tem uma contribuição a dar para a concepção e, principalmente, para a construção da ação estratégica. Ou seja, a G e s tã o d o C o n h e c im e n to G e s tã o d a e s t r a té g ia D e s e n v o lv im e n to d a c u ltu r a G e s tã o d e p e s s o a s G e s tã o d a in f o rm a ç ã o G e s tã o d o d e s e m p e n h o o r g a n iz a c io n a l G e s tã o d a e s t ru tu ra G e s tã o d e c o m p e tê n c ia s G e s tã o d a c o m u n ic a ç ã o D e s e n v o lv im e n to d o t r a b a lh o e m e q u ip e G e s tã o d o s p ro c e s s o s G e s tã o d a te c n o lo g ia G e s tã o d o re la c io n a m e n to c o m o s s ta k e h o ld e rs e o u t r o s p a rc e iro s IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 124 capacidade de pensar estrategicamente deve ser algo difuso por toda a organização. b) Desenvolvimento da cultura • No início deste texto tivemos a oportunidade de discutir como a visão mais tradicional das organizações tendia a seguir uma lógica pautada na burocracia, no controle, na busca pela previsibilidade, ou então na construção de uma capacidade adaptativa. Estas duas lógicas ajudaram a delinear o desenvolvimento de uma cultura organizacional que, no contexto atual, não favorece a formação de um foco na inovação. Durante muito tempo dissemos para os indivíduos que “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Logo, como podemos esperar que, de um momento para o outro, ele aja naturalmente de modo inovador? Como podemos esperar que as equipes se tornem cooperativas de um momento para o outro, se durante muito tempo as organizações favoreceram apenas a competição, a especialização máxima e até a fragmentação das atividades? Como podemos esperar que aqueles que sempre detiveram o poder de decisão, de um momento a outro, passem a compartilhar este poder com os seus pares e até com os seus subordinados? A Gestão do Conhecimento compreende o desenvolvimento de novos tipos de crenças sobre a organização, de novos valores, de novos tipos de prática coletiva. Trata-se de uma grande transformação cultural e, como sabemos, uma transformação deste tipo não ocorre do dia para a noite. c) Gestão de pessoas • Se as pessoas da organização são os grandes agentes da Gestão do Conhecimento, é preciso que haja uma coerência plena entre este discurso e as práticas de gestão de pessoas. Entre outros aspectos: a seleção dos indivíduos precisa levar em conta a diversidade requerida para a inovação, o potencial de contribuição de cada um para o processo inovador; as políticas de capacitação precisam estar alinhadas com as necessidades de promover o desenvolvimento continuado dos indivíduos e a sua capacidade de aprender a aprender; as pessoas precisam ser avaliadas e reconhecidas tanto pelo seu grau de contribuição para os resultados quanto pelo seu valor em termos do conjunto de conhecimento e competências de que a organização precisa; o empowerment deve ser uma prática cada vez mais presente; o clima organizacional deve favorecer a cooperação. d) Gestão da informação • Alguns dos grandes problemas, ainda presentes em muitas organizações, dizem respeito à existência de informações fragmentadas, pouco estruturadas, de sistemas que “não se falam”, de bases de dados cujas informações são difíceis de serem extraídas quando necessário. A gestão do conhecimento requer uma boa gestão da informação, embora seja importante diferenciar estes dois conceitos. A tecnologia da informação tem possibilitado a construção de soluções que podem melhorar a integração, o processamento, a confiabilidade e a disponibilidade da informação, o que é fundamental para a gestão do conhecimento. Mas não se pode esquecer que o IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 125 conhecimento requer a capacidade de extrair significado da informação e esta capacidade não está nos computadores ou nas bases de dados, mas sim nas pessoas. e) Gestão do desempenho organizacional • Na visão mais tradicional da gestão, o bom desempenho organizacional era medido apenas pela capacidade de atingir os resultados finais desejados, normalmente associados a resultados financeiros ou de produção no curto prazo. Uma organização inovadora, no entanto, é aquela que consegue não apenas atingir resultados satisfatórios a curto prazo, mas que consegue também construir o seu futuro, preparando-se para enfrentar os desafios de longo prazo. Assim, diversos autores têm sugerido modelos de gestão do desempenho organizacional que procuram lidar com indicadores que saiam da visão exclusivamente financeira ou dos resultados de curto prazo, para focalizar também como os resultados são construídos a longo prazo, ou seja, as dimensões que mais diretamente contribuem para os resultados finais. Um exemplo que tem se popularizado entre as empresas de diferentes países e também no Brasil (embora não seja o único) é o Balanced Scorecards (Kaplan e Norton, 1997), um modelo de gestão do desempenho que compreende indicadores e sistemas de gestão construídos em torno de quatro dimensões básicas: a perspectiva financeira, a perspectiva da relação com o cliente, a perspectiva dos processos internos e a perspectiva da aprendizagem e inovação. f) Gestão do relacionamento com os stakeholders e outras organizações parceiras • O termo stakeholders tem sido utilizado, na linguagem da gestão, para representar todos os tipos de entidades presentes no ambiente de atuação de uma organização, que, de algum modo, influenciam ou dependem de seus resultados, ou seja, que possuem alguma parcela de interesse no sucesso da organização. Exemplos de stakeholders são, então, os clientes, os fornecedores, a comunidade (ex: a sociedade, o Governo), os acionistas e os empregados. O conhecimento sobre cada um destes tipos de stakeholders, suas necessidades e suas relações com a organização compõem uma importante base para a construção do conhecimento de valor para a estratégia. Ou seja, o foco da gestão do conhecimento não pode ficar limitado à parte interna das fronteiras organizacionais e, neste sentido, os diferentes stakeholders precisam ser vistos como parceiros com quem se constrói conhecimento valioso para eles e para a organização. É cada vez mais clara também a necessidade de construir parcerias entre organizações, não apenas para compartilhar a ação estratégica, mas para construir conhecimento de forma conjunta. É crescente o número de alianças que as organizações constróem, por meio de joint-ventures, fusões, aquisições, projetos compartilhados, etc. A gestão destas parcerias é um elemento essencial da gestão do conhecimento organizacional. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 126 g) Gestão da estrutura • Conforme discutido no início deste texto, as estruturas burocráticas mais mecanicistas têm representado, muitas vezes, um entrave à inovação organizacional, na medida em que os elevados níveis de hierarquia, de especialização dos papéis e de controle prejudicam o desenvolvimento de uma ação integrada e cooperativa. A flexibilização das estruturas, com redução das hierarquias, maior horizontalização da ação e maior flexibilização dos papéis, torna-se, então, um elemento essencial para a gestão do conhecimento organizacional. Mexer nas estruturas não é, no entanto, um processo fácil (sobretudo porque ele envolve mecanismos de poder). Alguns autores têm sugerido, portanto, que este seja um processo gerido com atenção, começando pela redefinição dos tipos de papéis presentes na organização. Nonaka e Takeuchi (1997) sugerem, por exemplo, que os empregados da base passem a ser vistos como trabalhadores do conhecimento, que os gerentes sejam preparados para atuar como articuladores (ou, na expressão utilizada por aqueles autores, como engenheiros) do conhecimento e que os executivos de mais alto nível sejam os grandes mentores da gestão do conhecimento. Quanto ao nível executivo, visando a assegurar um foco estratégico para a gestão do conhecimento, alguns autores sugerem até mesmo a criação de um papel especial de Diretor do Conhecimento (ou CKO – Chief Knowledge Officer). Outro tipo de sugestão que vem sendo apresentada é a transformação dos organogramas tradicionais (verticais) para um formato mais matricial. h) Gestão de competências • Um dos resultados importantes da gestão do conhecimento deve ser o incremento das competências organizacionais. Assim também, as competências existentes na organização formam a base para a construção de conhecimentos, como nos mostra o modelo da espiral tratado anteriormente. Ora, uma das grandes dificuldades das organizações de hoje é ainda a de conhecer, localizar, auferir e planejar as suas competências. Mapear o conjunto de competências presentes na organização, planejar o seu desenvolvimento e construir sistemas de acompanhamento e localização destas competências, são, portanto, iniciativas importantes para auxiliar a Gestão do Conhecimento. i) Gestão da comunicação • Na disciplina Gestão de Pessoas I você teve a oportunidade de refletir sobre uma das questões que mais incomodam, ainda, as organizações de hoje: as dificuldades de gerir a comunicação. Naquela ocasião, refletimos que, quando falamos de gestão da comunicação, não estamos falando apenas do modo como a empresa “formata” as suas mensagens, dos canais que ela utiliza para isto ou da maneira como acontece o fluxo de informação. Principalmente quando se busca a inovação, a comunicação precisa ser capaz de ajudar a organização e seus participantes a construírem significado. A construção de um diálogo organizacional intenso é fundamental neste processo e a IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 127 gestão da comunicação deve criar as condições para que este diálogo aconteça de modo natural, melhorando o texto e a conversação (para lembrar destes conceitos, volte ao Capítulo 4 da nossa apostila de Gestão de Pessoas I). j) Desenvolvimento do trabalho em equipe • Uma das bases importantes para a Gestão do Conhecimento é o desenvolvimento do espírito de colaboração no dia-a-dia da ação. A gestão das equipes de trabalho é, então, um elemento essencial para que o compartilhamento de conhecimentos aconteça, tanto no nível tácito quanto no explícito. Iniciativas que promovam a integração de conhecimentos nas equipes de trabalho, tais como, por exemplo, a composição de círculos de qualidade, são importantes para a criação de bases para a gestão do conhecimento. Neste sentido, os gerentes de equipe possuem um papel especial neste processo, dado que, no dia-a-dia, eles precisarão ser os grandes articuladores da integração entre os indivíduos, o que requer um perfil diferente daquele do “gerente controlador” presente nas organizações mecanicistas. Também o modo como as pessoas são avaliadas dentro das equipes precisa ser revisto elas precisam ser reconhecidas tanto pelo seu nível de contribuição para a equipe quanto pela capacidade de trazer contribuições para a inovação e para o desenvolvimento do conhecimento organizacional. k) Gestão dos processos • As dificuldades de integração são um dos entraves mais comuns à Gestão do Conhecimento. Particularmente no que concerne à integração entre funções, este é um tipo de dificuldade ainda bastante presente nas organizações. Ainda pensamos na gestão das organizações mais pelo seu lado estático, o do organograma, do que pelo seu lado dinâmico, o dos processos. Quase todas as atividades que uma organização realiza envolvem, entretanto, a necessidade de integração entre diferentes áreas. E são ainda poucas as organizações que possuem um sistema adequado de gerenciamento de seus processos multifuncionais. O resultado é que acabam produzindo visões fragmentadas, nas quais todo o esforço é concentrado na gestão de cada departamento ou função, sem que se gerencie os “espaços em branco” existentes entre eles (Rummler e Brache, 1992). Mapear os processos interfuncionais, dinamizá-los e construir um sistema de gestão para eles (Hammer e Stanton, 1999) são condições fundamentais para promover a integração organizacional e, portanto, a Gestão do Conhecimento. l) Gestão da tecnologia • Por tecnologia, entenda-se não apenas as sofisticadas técnicas de produção, mas todo o modo de se realizar atividades na organização. Em muitas organizações a atividade de desenvolvimento de tecnologia é restrita a alguns poucos departamentos, tais como, por exemplo, o de Pesquisa e Desenvolvimento, no caso das tecnologias mais sofisticadas de produto, ou o de Organizações e Métodos, no caso de tecnologias gerenciais. Como o caso do Post-it e o modelo da espiral IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 128 do conhecimento nos sugerem, estes tipos de departamentos podem ter um papel importante nas organizações, por ajudarem a estruturar o processo de criação. Mas, em uma organização inovadora, todos os indivíduos e áreas precisam estar prontos a disponibilizar as suas competências para participar deste processo de criação. A gestão da tecnologia diz respeito também aos mecanismos de manutenção da memória organizacional e de proteção dos ativos do conhecimento, da gestão do capital intelectual que constrói o diferencial de competitividade da organização. A gestão de patentes é um dos tipos de aspectos envolvidos e, como sabemos, ainda pouco trabalhados pelas empresas no Brasil. Fahey et. al. (2001) relacionam alguns tipos de iniciativas que vêm ajudando as organizações a construir o conceito da Gestão do Conhecimento: a) Adoção de mentores experientes como apoio aos novos membros •••• Com a missão de comunicar os valores, as normas e práticas da organização e expor a compreensão tácita de como o mundo funciona; Treinamento e desenvolvimento •••• Permitindo que indivíduos e grupos tenham acesso a conhecimentos estruturados e explicitados; •••• Agregando grupos de indivíduos, freqüentemente de múltiplas áreas, os quais se reúnem para compartilhar o que sabem, para aprender juntos; Desenvolvimento de projetos de conhecimento •••• Reunindo um grupo de indivíduos com um foco e intenção declarados e visíveis para produzir um conhecimento requerido pela organização; Organização de repositórios de conhecimento •••• Fornecendo uma localização central para vários produtos de conhecimento, tais como melhores práticas ou análise de diferentes tópicos; indivíduos e grupos desenvolvem produtos para o repositório, os quais fornecem inputs para futuras discussões e reflexões; Criação de comunidades de prática •••• Congregando um grupo de indivíduos que compartilham os mesmos valores, especialidades ou interesses, ou que trabalham em um projeto coletivo, de modo a dialogarem abertamente e criticamente uns com os outros (pessoalmente ou por meio de uma mídia interativa); Atribuição de papéis intermediários •••• Exercidos por um ou mais indivíduos que assumem a responsabilidade por desenvolver um ativo específico de conhecimento, um plano para ser compartilhado com os outros, etc. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 129 Stotytelling ou desenvolvimento de narrativas organizacionais •••• Feito por meio do desenvolvimento de estórias narradas pelos empregados sobre “como algumas coisas acontecem aqui” ou “o que nós fizemos neste projeto”; Incentivo à colaboração •••• Reunindo formalmente um grupo de indivíduos em torno de uma tarefa ou projeto específico, de modo que eles possam aprendem uns com os outros; Desenvolvimento de uma análise da rede social •••• Identificando e comunicando quem fala com quem, como a informação é transmitida de um indivíduo a outro ou de um grupo ou departamento a outro; Desenho de cenários •••• Trazendo indivíduos, tanto de dentro quanto de fora da organização, para desenvolver ativos explícitos de conhecimento sobre o futuro (tais como o modo como uma indústria pode evoluir ou como uma configuração de tecnologia pode convergir ao longo do tempo); Mapeamento do conhecimento (páginas amarelas) •••• Identificando quem sabe o quê, como os ativos de conhecimento estão relacionados uns com os outros, como a informação é armazenada e onde, etc. Realização de experimentos •••• Permitindo que um ou mais indivíduos façam alguma coisa ou experimentem praticamente alguma atividade em pequena escala que, em sua rotina normal de trabalho, não teriam como aprender. Outros autores citam outros tipos de iniciativas que contribuem para a Gestão do Conhecimento, envolvendo as diferentes dimensões da vida organizacional anteriormente identificadas, entre as quais: •••• A implementação de redes de informação e ferramentas de workgroup (ex: Notes); •••• A implementação de sistemas integrados (Sistemas de Informação Empresarial – ex: SAP/R3); •••• A criação de portais do conhecimento (sites organizacionais de acesso a conhecimentos variados); •••• Mapeamento, engenharia e gestão dos processos; •••• Implementação de sistemas de gestão do relacionamento com o cliente (CRM); •••• Formação de Universidade Corporativa; •••• Treinamento e desenvolvimento com múltiplos recursos, incluindo recursos de treinamento à distância; IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 130 •••• Construção de Banco de Competências; •••• Programas diversos de incentivo à inovação; •••• Remuneração por habilidades e por competências; •••• Formação de multiplicadores de conhecimento. 3.11 CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme mencionado no tópico anterior, a Gestão do Conhecimento é um conceito amplo que abrange os mais variados aspectos da gestão, mas, acima de tudo, quando comparado com os modelos tradicionais da Administração, representa a construção de uma nova filosofia, de uma nova maneira de conceber a dinâmica organizacional. Se, por um lado, a motivação principal do surgimento deste conceito tem sido a necessidade de desenvolver a capacidade de inovação das organizações, por outro lado é um conceito que permite também ajudá-las a melhor estruturar, aplicar e até mesmo preservar o conhecimento que constróem ao longo de sua existência. Trata-se de um conceito que, sem dúvida, tem sido tratado por meio de um discurso estimulante, humanizado, que prega o reconhecimento da importância das pessoas, o sentido de participação e colaboração, a aprendizagem, a criatividade, a integração, o desenvolvimento da inteligência organizacional. Como toda nova idéia que surge, no entanto, é um conceito que ainda precisa ser melhor compreendido, aprofundado e aplicado. Percebe-se, por exemplo, que ocorrem, ainda, algumas reduções sobre o conceito que, ao longo do tempo, podem levá-lo ao destino de outras idéias importantes surgidas nas últimas décadas, tais como a reengenharia e a própria qualidade total que, em função de inúmeras expectativas frustradas em sua implementação, terminaram por perder a adesão e até mesmo a crença das organizações. Como já citamos anteriormente, observa-se, por exemplo, que algumas organizações têm tratado a Gestão do Conhecimento como sinônimo de gestão da informação, o que é, na verdade, um requisito para a primeira. Assim, tais organizações acreditam que, apenas implementando uma rede de computadores e um (custoso) sistema empresarial, estarão produzindo a inovação e integração requeridas, quando, de fato, estarão apenas melhorando algumas condições instrumentais para que elas aconteçam. Outra redução sobre o conceito é a tentativa de tratar a Gestão do Conhecimento apenas como sinônimo de qualificação da mão- de-obra (por meio de inúmeros treinamentos estruturados), o que é também um requisito importante, mas não é suficiente para construir todo o grau de transformação organizacional que o conceito pressupõe. Há ainda interpretações bem mais distorcidas, como quando se enxerga a Gestão do Conhecimento como um instrumento que permite “assimilar” os conhecimentos dos empregados mais experientes, “transferindo-os” para os bancos de dados da empresa ou para a mente dos novos contratados, facilitando, deste modo, os processos de downsizing ou as reestruturações pretendidas. Distorções como esta só tendem a impossibilitar a aplicação do conceito em algumas organizações, uma vez que um dos princípios básicos da Gestão do Conhecimento é construção de uma visão de parceria, de confiança entre os indivíduos e entre eles e a organização. A Gestão do Conhecimento só tem chance de ser uma transformação de sucesso, se for algo que melhore a vida das organizações e de seus parceiros internos e externos. Caso IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 131 contrário, torna-se apenas um instrumento a serviço de interesses específicos que dificilmente é capaz de conquistar a adesão e o compromisso entre as partes. Cabe ressaltar, ainda, um outro tipo de interpretação limitada desta idéia: a crença de que a Gestão do Conhecimento é um projeto de curto-prazo, com início, meio e fim. Se até mesmo nós, como seres individuais, passamos toda a nossa vida desenvolvendo conhecimentos, como podemos acreditar que uma organização (uma coletividade de indivíduos) poderá, em dois ou cinco anos, ter concluído o seu projeto de Gestão do Conhecimento? Conhecimento é algo que se gera e se administra durante toda a nossa existência, e com as organizações não é diferente! A Gestão do Conhecimento é, antes de tudo, uma transformação contínua e coletiva – um processo para toda a vida da organização. Não acontece sem as pessoas e sem que elas desejem caminhar juntas neste processo. Por isso, finalizamos a nossa reflexão com uma lista de alguns requisitos mais essenciais à Gestão do Conhecimento, os quais permearam todas as nossas discussões ao longo deste texto: • calma e perseverança; • clareza de propósitos; • coerência entre os discursos e as práticas; • confiança; • espírito de colaboração; • respeito e valorização integral do outro; • ética. 3.12 RESUMO DO CAPÍTULO Neste capítulo tivemos a oportunidade de refletir sobre um dos principais temas que têm mobilizado as organizações e as idéias da Administração nos últimos anos: a Gestão do Conhecimento. Iniciando com uma comparação com os modelos tradicionais de gestão, pudemos observar como a construção de um foco na inovação, capaz de lidar com os desafios do contexto atual, requer o desenvolvimento de um novo tipo de modelo organizacional, mais inteligente, que se assemelharia ao cérebro humano, em complemento às imagens da máquina e do organismo vivo, tão familiares às idéias da Administração. A partir da observação das características e implicações da organização “cerebral”, observamos como o conceito de Gestão do Conhecimento tem sido utilizado para tentar prover as organizações de indicações de caminhos para realizar uma transformação naquela direção. Ao abordarmos mais detalhadamente o conceito, identificamos na noção da espiral do conhecimento um modelo interessante para pensarmos o processo continuado de criação e gestão do conhecimento organizacional e encerramos a nossa discussão observando a maneira como este conceito tem sido tratado na prática, os requisitos mais essenciais para a sua implementação e as possíveis distorções na sua adoção. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 132 REFERÊNCIAS CAVALCANTI, M. GOMES, E. A nova riqueza das organizações: os capitais do conhecimento. Revista TN Petróleo, Rio de Janeiro, n. 16, ano III, p. 26-29, 2000. DAVENPORT, Thomas H. PRUSAK, Laurence. Conhecimento Empresarial. Editora Campus, 1998. FAHEY, L. SRIVASTAVA, R. SHARON, J.S. SMITH, D.E. Linking e-business and Operating Processes: the role of knowledge management. IBM Systems Journal, v.4, n.4, 2001. HAMMER, M. STANTON, S. How Process Enterprises Really Work. Harvard Business Review, November-December 1999. INKPEN, A.C. 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Sandra Regina da Rocha Pinto Autor: Prof. José Roberto Gomes Tutoria a Distância IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 134 ÍNDICE Aprendizagem Organizacional – Tema 4.............................................................135 Aprendizagem Organizacional.............................................................................135 4.1 Introdução......................................................................................................135 4.2 A Organização que Aprende (Learning Organization) ...................................136 4.3 As Condições para o Aprendizado em Grupo................................................143 4.4 As Condições do Aprendizado Individual.......................................................146 4.4.1 Aprender não é Simplesmente se Informar sobre Algo...........................147 4.4.2 Aprender não é Simplesmente Reproduzir Comportamentos .................148 4.4.3 As Principais Abordagens sobre o Processo de Aprendizagem .............148 4.4.3.1 A Abordagem Comportamental ........................................................149 4.4.3.2 A Abordagem Cognitivista ................................................................151 4.4.3.3. A Abordagem Eperimental...............................................................155 4.4.3.4 Os Estilos de Aprendizagem – A Tipologia de Kolb..........................157 4.5. Considerações Finais ...................................................................................160 Referências..........................................................................................................160 IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 135 APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL – TEMA 4 APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL o capítulo anterior foi realizada uma reflexão sobre um dos principais desafios das organizações de hoje: a construção de uma ação inteligente, capaz de produzir inovação e, deste modo, lidar com um contexto de grande incerteza. Foi observado, então, que a construção deste tipo de ação pressupõe uma grande transformação do modelo de gestão, o qual se aproximaria das características de um cérebro inteligente. Foi visto também que uma das características requeridas para a organização-cérebro é o desenvolvimento de uma capacidade de “aprender a aprender”, ou seja, uma organização que não apenas é capaz de assimilar modelos de conhecimento, mas também de questioná-los e reconstruí-los de modo continuado. Neste capítulo, serão abordadas as dificuldades individuais e coletivas de se construir uma organização capaz de aprender a aprender e observar como as idéias da Administração têm proposto caminhos para lidar com a necessidade de desenvolver este modelo de organização, o qual, a partir de agora, será denominado de “A ORGANIZAÇÃO QUE APRENDE”. Ao final da leitura, espera-se que o participante seja capaz de identificar a importância, as características e os tipos de dificuldades envolvidas: ! nos processos de aprendizagem organizacional; ! nos processos de aprendizagem em grupo; e, ! nos processos de aprendizagem individual nas organizações. 4.1 INTRODUÇÃO O aprendizado é algo inerente à condição humana. O ser humano aprende desde que o cérebro é formado e não deixa de aprender ao longo de toda a sua existência. Apesar de natural, este processo está longe de ser, no entanto, simples. Durante toda a vida de estudante, o ser humano percebe, por exemplo, como determinados tipos de conhecimentos são difíceis de ser construídos e como as condições a que eles são expostos no processo de aprendizado afetam o desempenho. Nas organizações não é diferente: o ser humano vive nelas um dia a dia repleto de oportunidades para desenvolver o aprendizado contínuo e, no entanto, as condições nem sempre são as mais facilitadoras para que este processo aconteça plenamente. Como seres sociais, seria de se esperar ainda, que, quando o ser humano se reúne em torno de um tipo de experiência qualquer, a capacidade de aprendizado coletivo deveria ser, no mínimo, a soma das capacidades individuais. Mas na prática não é o que acontece em muitas situações de vida e, particularmente, nas experiências nas organizações. N IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 136 Mas o que leva a estas dificuldades? Por que seres humanos inteligentes, capazes de aprender, quando se reúnem, nem sempre são capazes de gerar organizações inteligentes e também capazes de aprender com elas? O que faz com que os indivíduos não possam aproveitar toda a sua capacidade de aprendizado nas organizações, dado que esta capacidade seria interessante também para elas? Quais são as características de uma organização que aprende e que facilita a aprendizagem dos indivíduos que dela participam? São algumas das questões, as quais serão abordadas no texto a seguir. Será adotado um conceito de aprendizagem organizacional semelhante ao definido por Antonello (2005, p. 27), como o processo contínuo de apropriação e geração de novos conhecimentos nos níveis individual, grupal e organizacional, envolvendo todas as formas de aprendizagem – formais e informais. A reflexão inicial será voltada para o lado coletivo deste processo, ou seja, para o nível organizacional e o nível de grupo. A partir de então, serão analisados os aspectos individuais da aprendizagem nas organizações. 4.2 A ORGANIZAÇÃO QUE APRENDE (LEARNING ORGANIZATION) Quando se pensa em uma organização que busca ser integrada e inovadora como um cérebro (vide capítulo anterior, no qual este modelo foi tratado), fala-se de algo que vai além do simples somatório de capacidades individuais. A organização que aprende deve ser aquela na qual o aprender a aprender acontece de modo coletivo, na qual cada indivíduo encontra as bases para o seu próprio aprendizado e, junto com os outros, é capaz de realimentar continuadamente este processo, gerando benefícios concretos para a organização. Garvin (2000) sintetiza o conceito de "organização que aprende" com a seguinte descrição (p. 54): Uma "organização que aprende" é uma organização capaz de criar, adquirir e transferir conhecimento e de modificar seu comportamento para refletir os novos conhecimentos e "insights". É importante observar na definição que Garvin não associa a noção de aprendizado organizacional simplesmente à capacidade de construir um novo conhecimento, mas também à capacidade de aplicá-lo para promover algum tipo de transformação. Peters (1998) considera que, do ponto de vista de uma empresa, aprender é um processo que implica a necessidade de entender o passado – para evitar a repetição de erros –, capacitação no presente e preparo adequado para o futuro. Com base nessa premissa, o autor define um programa de estudos para uma empresa orientada para a aprendizagem. Este programa de estudos inclui seis pontos principais: ! Aprender sobre o trabalho na organização e como fazê-lo melhor. ! Aprender como alinhar a organização com a estratégia. ! Aprender sobre o futuro, por meio do planejamento de cenário e do desenvolvimento antecipado de competências. ! Aprender sobre o ambiente operacional (ambiente externo com o qual a organização interage diretamente), inclusive as cadeias de suprimentos. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 137 ! Aprender como questionar os paradigmas existentes; evitar a miopia, considerar possibilidades atuais e futuras, não ficar preso à defesa de paradigmas e a valores de grupos. Criar uma memória organizacional, ou seja, a capacidade de captar, armazenar e recuperar conhecimentos gerais e específicos. Segundo Maira e Bragar (1998), neste modelo de organização o aprendizado não é meramente reativo, mas sim intencional, eficaz e conectado ao objetivo e à estratégia da organização. Ele também é oportuno, prevendo os desafios, as ameaças e as oportunidades e não simplesmente reagindo às crises. Ele cria flexibilidade e agilidade para que a organização possa lidar com a incerteza. Mais importante ainda: neste modelo de organização as pessoas se consideram capazes de gerar continuamente novas formas de criar os resultados que mais desejam. Por isso, na opinião destes autores, as mudanças que caminham lado a lado com o aprendizado criam raízes, em vez de ser transitórias. Peter Senge (1990) identifica cinco tipos de "disciplinas" que as organizações precisam desenvolver e que representam os requisitos essenciais para que o conceito de "Organização que Aprende" seja efetivamente praticado. São eles: o raciocínio sistêmico, o domínio pessoal, os modelos mentais, o objetivo comum e a aprendizagem em grupo. Veja como Peter Senge define cada um destes aspectos em seu famoso livro A Quinta Disciplina (pp.15-19): AS CINCO DISCIPLINAS FUNDAMENTAIS DA ORGANIZAÇÃO QUE APRENDE (segundo Peter Senge) “O Raciocínio sistêmico As nuvens se acumulam, o céu escurece, as folhas viram para o alto e sabemos que vai chover. Também sabemos que, depois da chuva, a enxurrada penetrará nos lençóis de água subterrâneos a quilômetros de distância e, no dia, seguinte, o céu estará limpo. Todos estes eventos são distantes no tempo e no espaço, no entanto estão todos interligados em um mesmo esquema. Cada um deles influencia todos os outros, influência esta que geralmente não se encontra ao alcance da vista. Só se pode entender o sistema de chuvas observando-se o conjunto, não apenas uma das partes. Os negócios e os outros trabalhos realizados pelo homem também são sistemas, o que significa que são amarrados por fios invisíveis de ações inter- relacionadas, que levam anos para desenvolver plenamente os efeitos que uma exerce sobre as outras. Como nós também fazemos parte desta estrutura, é duplamente difícil ter uma visão global das mudanças ocorridas, e o que acontece é que nós tendemos a nos concentrar em partes isoladas, sem conseguir entender por que nunca conseguimos resolver nossos problemas mais profundos. O raciocínio sistêmico é uma estrutura conceitual, um conjunto de conhecimentos e instrumentos (...) que tem por objetivo tornar mais claro todo o conjunto e nos mostrar as modificações a serem feitas a fim de melhorá-lo. Domínio Pessoal Pelo domínio pessoal aprendemos a esclarecer e aprofundar continuamente nosso objetivo pessoal, a concentrar nossas energias, a desenvolver a paciência e a ver a realidade de maneira objetiva. Assim sendo, esta é uma disciplina fundamental IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 138 da organização de aprendizagem, sua base espiritual. O empenho e a capacidade de aprendizado de uma organização não pode ser maior que a dos membros que a compõem. As raízes dessa disciplina provêm das seculares tradições espirituais e culturais dos povos ocidentais e orientais. Todavia, são poucas as organizações que incentivam o desenvolvimento de seus membros neste aspecto, o que resulta numa vasta quantidade de recursos não aproveitados (...). E é surpreendente como são poucos os adultos que trabalham no sentido de desenvolver rigorosamente seu domínio pessoal. Quando você pergunta à maioria dos adultos o que querem da vida, eles quase sempre falam primeiro do que gostariam de se livrar: ‘Eu queria que minha sogra saísse de minha casa’, dizem eles, ou: ‘Eu queria me ver livre dos problemas da coluna.’ O domínio pessoal, em contraste, começa por esclarecer as coisas que são realmente importantes para nós, levando-nos a viver de acordo com as nossas mais altas aspirações. Modelos Mentais São idéias profundamente arraigadas, generalizações ou mesmo imagens que influenciam nosso modo de encarar o mundo e nossas atitudes. Muitas vezes não temos consciência de nossos modelos mentais ou das influências que eles exercem sobre o nosso comportamento. Por exemplo, é comum julgarmos uma pessoa pelo seu modo de se vestir: se um colega de trabalho anda bem vestido, achamos que ele é uma pessoa de fino trato; por outro lado, ao vermos alguém mal- ajambrado, pensamos: ‘Ele não se importa com o que os outros pensam.’ Na área administrativa, os modelos mentais do que pode ou não ser feito estão igualmente enraizados e muitas modificações não podem ser postas em prática por serem conflitantes com modelos mentais tácitos e poderosos. O trabalho com modelos mentais começa por virar o espelho para dentro, aprendendo a desenterrar nossas imagens interiores do mundo, trazê-las à superfície e expô-las a um meticuloso exame. Inclui também a capacidade de desenvolver conversas ‘instrutivas’ nas quais as pessoas expõem suas idéias com clareza e as deixam abertas à influência dos seus interlocutores. Objetivo Comum Se existe uma idéia sobre liderança que tenha inspirado organizações por milhares de anos, é a capacidade de transmitir aos outros a imagem do futuro que pretendemos criar. É difícil lembrar de uma organização que tenha se mantido numa posição de grandeza sem objetivos, valores e compromissos que sejam compartilhados em conjunto pelos membros da organização inteira. Quando existe um objetivo concreto e legítimo, as pessoas dão tudo de si e aprendem, não por obrigação, mas por livre e espontânea vontade. Muitos líderes, porém, têm objetivos pessoais que nunca chegam a ser compartilhados pela organização como um todo e o que acontece com muita freqüência é que os objetivos comuns giram em torno do carisma do líder ou de uma crise que galvaniza a todos temporariamente. Tendo uma opção, contudo, a maioria prefere lutar por um objetivo grandioso, não só em tempo de crise, mas em qualquer tempo. O que falta é uma disciplina que transforme um objetivo individual em um objetivo comum – não um ‘livro de receitas’, mas um conjunto de princípios e técnicas. A técnica de criar um objetivo comum consiste em buscar ‘imagens do futuro’ que promovam um engajamento verdadeiro ao invés de simples audiência. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 139 Aprendendo esta disciplina, os dirigentes passam a ver como é contraproducente tentar impingir um objetivo, por melhores que sejam suas intenções. Aprendizado em Grupo Como é possível que um grupo de administradores com QI individual acima de 120 tenha um QI coletivo de 63? A disciplina do aprendizado em grupo enfrenta este paradoxo. Nós sabemos que as equipes podem aprender; no esporte, nas artes cênicas, na ciência e até, ocasionalmente, nos negócios existem exemplos extraordinários em que a inteligência da equipe supera a inteligência dos indivíduos que a compõem e onde as equipes desenvolvem uma capacidade extraordinária para ações coordenadas. Quando as equipes estão realmente aprendendo, além de produzirem resultados extraordinários em conjunto, seus integrantes também se desenvolvem com maior rapidez no sentido individual. O aprendizado em grupo começa com o ‘diálogo’, a capacidade de os membros de um grupo levantarem idéias preconcebidas e participarem de um ‘raciocínio em grupo’. A prática do diálogo – que entre os gregos antigos significava livre fluxo de idéias entre um grupo de pessoas – foi preservada em muitas culturas ‘primitivas’ como a dos índios americanos, porém foi praticamente esquecida na sociedade moderna. Atualmente, os princípios e a prática do diálogo estão sendo redescobertos e colocados em um contexto contemporâneo. A disciplina do diálogo também consiste em aprender a reconhecer os padrões de interação que prejudicam o aprendizado em grupo. As táticas de defesa estão geralmente entranhadas no modo de operar do grupo e, se não forem reconhecidas, atrapalham o aprendizado; por outro lado, se reconhecidas e trazidas à superfície com criatividade, podem inclusive acelerá-lo. O aprendizado em grupo é vital porque a unidade fundamental de aprendizagem nas organizações modernas é o grupo, não os indivíduos. O fato é que a organização só terá capacidade de aprender se os grupos forem capazes de aprender.” As disciplinas podem ser, então, assim resumidas: ! o raciocínio sistêmico – a habilidade de ver e compreender o todo, cada parte e seus inter-relacionamentos; ! o domínio pessoal – a capacidade de ter claro os desejos e objetivos pessoais e aplicar conscientemente os princípios e valores mais importantes para atingi-los; ! os modelos mentais – a capacidade de compreender, representar e questionar as idéias profundamente arraigadas, generalizações, ou mesmo as imagens que influenciam o modo como é visto o mundo; ! os objetivos/visões comuns – a capacidade de compartilhar a visão de futuro, objetivos, valores e compromissos; ! a aprendizagem em grupo – a capacidade de desenvolver o diálogo, o raciocínio comum e a ação coordenada como o melhor resultado da aprendizagem. Na visão de Garvin (2000), as organizações que aprendem são habilidosas em cinco tipos de atividades principais: solução de problemas de maneira sistemática; experimentação de novas abordagens; aprendizado com as próprias IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 140 experiências e antecedentes; aprendizado com as experiências e melhores práticas alheias; compartilhamento de conhecimentos rápido e eficiente em toda a organização. Cada uma destas atividades pode ser assim descrita: a. Solução de problemas de maneira sistemática Esta atividade se refere à disciplina da aprendizagem, à atitude mental das pessoas, em estar atentas aos detalhes, à preocupação com a exatidão e precisão. Trata-se de um tipo de atividade que encontrou bases fortes na filosofia e nos métodos do movimento da qualidade e que, segundo Garvin, inclui, entre outras, as seguintes idéias: ! confiar em métodos científicos para o diagnóstico de problemas; ! insistir em dados, no lugar de pressupostos, como alicerce do processo decisório; ! utilizar ferramentas estatísticas simples para organizar os dados e extrair inferências. b. Experimentação Esta atividade envolve a busca sistemática e o teste de novos conhecimentos. Diferentemente da atividade de solução de problemas, a experimentação geralmente almeja o aproveitamento de oportunidades e a ampliação de horizontes, e não a solução de dificuldades vigentes. Trata-se de uma atividade que, segundo Garvin, assume duas formas básicas: a de programas contínuos e a de projetos de demonstração. Os programas contínuos são os pequenos experimentos que se desenvolvem na rotina do dia-a-dia, destinados a produzir ganhos incrementais no conhecimento. São eles que compõem a base da melhoria contínua e, por isto, precisam ser incentivados e apoiados pela organização por meio de sistemas que favoreçam a assunção de riscos. Caso contrário, dificilmente as pessoas se sentirão seguras para realizá-los. Isto implica também a necessidade de haver de uma atitude favorável das gerências, que precisam abrir mão de parte do controle, de modo a gerar um grau de liberdade responsável, para que as pessoas possam praticar a experimentação. Este tipo de atividade exige ainda que empregados e gerentes sejam capacitados a realizá-la e avaliá-la de modo consciente. Já os projetos de demonstração tendem a ser maiores e mais complexos do que os programas contínuos. Envolvem mudanças holísticas, abrangendo todo um sistema, geralmente introduzidos em uma única localidade (como um piloto) com o objetivo de desenvolver novas capacidades organizacionais. Por suas características, eles representam, em geral, mudanças mais difíceis de serem administradas, pois tendem a alterar os padrões do dia-a-dia. Ao mesmo tempo, exigem uma disciplina apurada e, em muitos casos, o envolvimento de equipes multifuncionais, pois, geram definições e aprendizado de novos padrões que deverão ser depois difundidos para outras atividades. c. Aprendizado com as próprias experiências Refere-se à atividade de analisar sucessos e fracassos, avaliá-los de maneira sistemática e registrar os ensinamentos de modo aberto e acessível para os empregados. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 141 d. Aprendizado com os outros Trata-se do tipo de atividade que se baseia da extração de insights para o aprendizado da organização, com base na observação do mundo externo. Um exemplo deste tipo de atividade é aquela que tem se popularizado sob o termo de benchmarking, definido por Garvin como uma experiência contínua de investigação e aprendizado, que promove a adoção e implementação das melhores práticas setoriais. Outro exemplo são as coletas de informações que ocorrem diretamente com os clientes, acerca de suas necessidades, nas inúmeras situações de interação com eles. e. Compartilhamento de conhecimentos Garvin lembra que, para que o aprendizado não seja apenas pontual, o conhecimento deve ser disseminado com rapidez e eficiência por toda a organização. Para ele, as idéias causam maior impacto quando são amplamente compartilhadas e não mantidas em poucas mentes. Esta noção foi bastante discutida no capítulo anterior, quando foi tratada a noção da espiral do conhecimento. No mesmo capítulo anterior foram abordadas as condições para que este compartilhamento aconteça de modo intenso e continuado nas organizações. Quando são observadas as cinco disciplinas abordadas por Senge (1990) e analisados os cinco tipos de atividades identificadas por Garvin (2000), relativos às características das organizações que aprendem, percebe-se que, apesar de importantes, elas não são tão simples de serem construídas. Pare um pouco e reflita: PARA AJUDAR A SUA REFLEXÃO: Na sua opinião, que aspectos podem fazer com que uma organização tenha dificuldade de aprender coletivamente, praticando as cinco disciplinas identificadas por Senge e os cinco tipos de atividades identificados por Garvin? Como você vê a prática destas disciplinas e atividades na sua empresa? Você se recorda de alguma situação em que você tenha vivenciado um importante processo coletivo de aprendizado na organização? Quais foram os aspectos que mais facilitaram para que as pessoas pudessem compartilhar o processo de aprendizado naquela situação? Em termos das práticas que conduzem à construção das organizações que aprendem, Maira e Bragar (1998) destacam que: a. Elas cultivam uma visão holística das coisas que fazem com que as organizações complexas funcionem, das coisas que fazem a mudança criar raízes e de como usar a lógica sistêmica para diagnosticar necessidades e projetar novas ações, de modo que o aprendizado seja eficaz e a mudança permanente. b. Elas não reservam estes insights somente para um pequeno grupo de pessoas em cargos-chave. As organizações que aprendem sabem que, somente com uma participação ampla na geração do conhecimento e na criação da mudança, é possível criar o desejo e o entusiasmo pela mudança contínua. O amplo envolvimento também melhora a eficácia das IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 142 ações, porque insights múltiplos entram em ação e aumentam a flexibilidade e a agilidade da organização. c. Elas patrocinam programas para aperfeiçoar e diversificar continuamente as capacidades dos funcionários e aumentar sua capacidade de mudar. As descrições de cargo são relativamente fluidas e baseiam-se nas tarefas que precisam ser executadas no momento. d. Elas têm plena consciência de que o aprendizado organizacional ocorre por meio de processos específicos e fazem esforços explícitos e contínuos para melhorá-los. Estes mesmos autores propõem um instrumento simples para reflexão sobre o quanto uma empresa conseguiu caminhar na direção de se tornar uma Organização que Aprende, por meio da avaliação de sua capacidade de aprendizado. Este instrumento é apresentado no Quadro 1. Procure utilizá-lo para refletir sobre a sua empresa. Mas não esqueça de que é apenas um quadro para reflexão e não um diagnóstico infalível. O resultado do teste pode ser analisado, considerando que a organização mostre uma capacidade maior de aprendizado quando as respostas concentram-se mais do lado esquerdo do quadro. Quadro 1 O TESTE DA ORGANIZAÇÃO QUE APRENDE Sempre Com freqüência Às vezes Raramente Nunca 1. A organização “aprende com a experiência” e não repete os erros. 2. Quando alguém sai da organização, seu conhecimento permanece. 3. Quando conclui uma tarefa, uma equipe dissemina e documenta o que aprendeu. 4. O conhecimento gerado em todas as áreas da empresa é investigado, legitimado e disponibilizado para toda a organização através de bancos de dados, treinamento e outros eventos de aprendizagem. 5. A organização reconhece e recompensa o valor do conhecimento criado e compartilhado por pessoas e equipes. IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 143 6. A organização avalia sistematicamente suas necessidades futuras de conhecimento e desenvolve planos para atendê-las. 7. A organização facilita a experimentação como um modo de aprender. 8. A organização aprimora suas capacidades de gerar, adquirir e aplicar o conhecimento aprendendo com os processos de aprendizado de outras organizações. Fonte: Maira e Bragar (1998). Finalmente, Maira e Bragar (1998) identificam alguns tipos de elementos da infra-estrutura que algumas organizações buscam construir para facilitar os seus processos de aprendizado coletivo: ! Bibliotecas de conhecimento, inclusive bancos de dados eletrônicos que armazenam o conhecimento sobre coisas. ! Mecanismos de sondagem para monitorar tecnologias, concorrentes e clientes. ! Programas integrados de ensino, treinamento e aconselhamento. ! Instalações para ensino, treinamento e aconselhamento. ! Instalações e sistemas para testar novas idéias (protótipos, simulações, conceitos de teste de mercado etc.). ! Sistemas de comunicação, como e-mail, voice-mail, videoconferência e outros tipos de comunicação sem fio. ! Sistemas que facilitem o trabalho em equipe, como salas de groupware. ! Sistemas que facilitem o compartilhamento do conhecimento tácito, como transferência de pessoal, centros de excelência e equipes multifuncionais. 4.3 AS CONDIÇÕES PARA O APRENDIZADO EM GRUPO Conforme visto no tópico anterior, o aprendizado em grupo é uma das disciplinas identificadas por Senge (1990) como fundamentais para o desenvolvimento de uma Organização que Aprende. Este não é, no entanto, um processo fácil de ser desenvolvido nas organizações, principalmente se for considerado um contexto no qual a pressão por resultados tende a ser intensa, a cultura da organização nem sempre colabora para o desenvolvimento de uma visão coletiva e as estruturas de poder, e até mesmo das tarefas, nem sempre favorecem a criação de um senso de cooperação. Senge observa, ainda, que as disciplinas de raciocínio sistêmico, modelos mentais e objetivos comuns são tão fundamentais para o desenvolvimento do IAG – A Escola de Negócios da PUC-Rio 144 aprendizado em grupo como o são para o aprendizado organizacional. Druskat e Pescosolito (2002) lembram também que, sobretudo quando se pensa em uma equipe autogerenciável, o compartilhamento dos modelos mentais entre os indivíduos torna-se um elemento essencial para o aprendizado conjunto e para o desempenho das tarefas. Kasl, Marsick e Dechant (1997) identificam quatro tipos de aprendizagem que podem ocorrer em um grupo de trabalho: fragmentada, compatilhada, sinergística e contínua. A aprendizagem fragmentada ocorre quando o aprendizado é individual, não dividido com o grupo e, nem mesmo, necessariamente, entre indivíduos. Na aprendizagem compartilhada, os indivíduos compartilham informações e perspectivas, assim como pequenos grupos de pessoas aprendem juntos, mas o grupo como um todo não aprende coletivamente. Na aprendizagem sinergística o grupo como um todo cria conhecimento conjunto, integrando perspectivas divergentes de novas formas. Neste caso, o conhecimento do grupo é integrado aos esquemas de significado individuais. Na aprendizagem contínua, o aprendizado sinergístico se torna habitual no grupo. O objetivo maior de uma Organização que Aprende seria o de construir em todas as suas equipes de trabalho este último tipo de aprendizagem. Kasl, Marsick e Dechant identificam também as condições para que os processos de aprendizagem em grupo funcionem efetivamente: ! Apreciação dos membros pelo trabalho em grupo (a abertura de cada um para ouvir e considerar as idéias dos outros, bem como o valor que ele atribui ao seu papel no grupo). ! O grau de expressão individual (o quanto cada membro tem a oportunidade de dar opiniões, influenciar a operação do grupo e expressar objeções). ! Os princípios de operação (o grau de organização do grupo para a operação efetiva,