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R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 65 A atuação das enfermeiras do DNSP, no Distrito Federal, 1921-1931* Bianca Alves Peres Monteiro de Souza** Wellington Mendonça de Amorim*** RESUMO: O objeto deste estudo é a prática das enfermeiras de saúde pública nas inspeto rias no Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP) no Distrito Federal, na década de 1920. Os objetivos são: identificar as circunstâncias em que se davam as visitas domiciliares enquanto uma atividade das enfermeiras de saúde pública do DNSP no DF; e analisar as estratégias das enfermeiras para consolidação de sua prática no espaço do DNSP frente às ameaças de parte dos sanitaristas de instituir as visitadoras de higiene. Pesquisa de natureza histórico-social. As fontes primárias referem-se às publicações Annaes de Enfermagem e do- cumentos encontrados no acervo do Centro de Documentação da EEAN /UFRJ; as fontes secundárias versaram sobre a história da enfermagem. A Missão Parsons chegou ao Brasil a fim de promover as inovações requeridas pelo DNSP, e deparou-se com a presença das visitadoras de higiene. Concluímos que a Missão Parsons utilizou-se dentre outras estraté- gias, da organização de um Serviço de Enfermeiras, e da criação de uma escola de enfermei- ras, ambos no DNSP, com vistas à consolidação da prática das enfermeiras de saúde pública, inicialmente, ameaçada pela presença das visitadoras de higiene. Palavras-chave: História da Enfermagem. Saúde Pública. 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS O objeto deste estudo é a prática das enfermeiras de saúde pública nas inspetorias de saúde no âmbito do Departamento Nacional de Saúde Pública, no Distrito Federal, na década de 20, do século XX, valendo destacar que o estudo está inserido na linha de pesquisa “O Desen- volvimento da Enfermagem no Brasil” do Laboratório de Pesquisa em História da Enferma- gem, da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. O recorte temporal abrange o período de 1921 a 1931, época que se caracterizou uma ação conjunta dos Estados brasileiro e nor- te-americano, através do Departamento Na- cional de Saúde Pública (DNSP) e da Fun- dação Rockfeller (FR). Nesse momento, as enfermeiras norte-americanas exerceram influência na trajetória da enfermagem * Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Es- cola de Enfermagem Alfredo Pinto/UNIRIO. ** Discente do Curso de Enfermagem da EEAP/UNIRIO. E-mail: alvesbianca@gmail.com – End. Rua Nuno de Andrade 43, Irajá, Rio de Janeiro, CEP 21235-430. *** Doutor em Enfermagem e Professor do Departamen- to de Enfermagem em Saúde Pública, e pesquisa- dor do Laphe da EEAP/UNIRIO, e do Nuphebras da EEAN/UFRJ. R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 66 brasileira, pois em 1921, a enfermeira ameri- cana Ethel Parsons, veio ao Brasil, a pedido do sanitarista Carlos Chagas à Fundação Rockfeller, para a criação de um serviço de enfermeiras no DNSP e de uma escola de en- fermeiras. A Missão Parsons, atuou no Brasil durante dez anos consecutivos (1921-1931), com o patrocínio da Fundação Rockfeller (SAUTHIER; BARREIRA, 1999, p. 66). Inicialmente, a estrutura organizacional do DNSP constava de Diretoria Geral, Diretoria dos Serviços de Profilaxia e Diretoria de De- fesa Sanitária Marítima e Fluvial, que abran- giam nove Inspetorias, Laboratório Bacteri- ológico, Delegacias de Higiene e de Saúde e de Serviços Assistenciais. As Inspetorias fo- ram organizadas sob a influência sanitária francesa, caracterizada pela multiplicidade de serviços especializados, numa organização tipo “arquipélago”, sendo que os dispensários incluíam a assistência aos doentes, “fugindo ao esquema tradicional do dispensário tipo ‘Camellette’, que não oferecia tratamento” (BARREIRA, 1993, p. 47; LAURIANO; BAR- REIRA, 2002, p. 40). Nesse período, os médicos que trabalhavam no DNSP sentiam a necessidade de criar um vínculo entre os dispensários e os lares, em busca de melhores resultados no tratamento aos doentes. Um dos que mais se empenha- ram para a criação desse serviço foi o sanita- rista Plácido Barbosa, diretor do Serviço de Tuberculose do DNSP, pois, para ele, a doen- ça advinha das condições de habitação e há- bitos de vida. Sendo assim, a profilaxia tor- nava-se necessária tanto na correção dos pro- blemas da habitação como da mudança nos hábitos de higiene, o que requeria a forma- ção de profissionais voltados para a educa- ção e saúde (MOREIRA, 1998-1999, p. 624). Desta forma, houve um encontro dos ideais da reforma sanitária com a concepção norte- americana que trouxe a enfermeira de saúde pública como figura central na luta sanitária mundial, logo indispensável na organização sanitária (PARSONS, 1997, p. 11). Não existindo no país enfermeiras de saúde pública, os sanitaristas Plácido Barbosa e J.P. Fontenelle procuraram preencher esta lacu- na criando um corpo provisório de visitadoras, instruídas pelos médicos da própria inspeto- ria, através de um curso de doze horas teóri- cas. Em janeiro 1921, as visitadoras de higie- ne iniciaram as visitas em domicílio a fim de controlar os casos de tuberculose. Mas, em- bora, elas estivessem empenhadas, o resul- tado das visitas foi pouco produtivo, pois lhes faltavam conhecimentos adequados1 (FRAENKEL, 2001, p. 284). Em setembro do mesmo ano, Ethel Parsons chegou ao Brasil, ao analisar a situação do serviço de enfermagem brasileiro constatou que era um serviço precário realizado por profissionais de baixo nível socioculturais, ignorantes e sem treinamento adequado (FRAENKEL, 2001, p. 284). A opção adotada foi, então, treinar as 44 visitadoras sem que o trabalho delas fossem interrompido e antes que qualquer desastre, causado por sua ignorância, destruísse a con- fiança do povo na enfermagem de saúde pú- blica; e ainda provar aos médicos do DNSP que os elevados padrões de enfermagem estabele- cidos nos EUA eram exeqüíveis e, em sua vi- são, essenciais (PARSONS, 1997, p. 12-14). Este treinamento foi realizado em caráter emergencial para as visitadoras de higiene através de um curso de seis meses; simulta- neamente as enfermeiras norte americanas modificaram a denominação de visiting nurses para health visitors (MOREIRA, 1999, p. 631). Essa mudança serviu como símbolo inicial para diferenciar as praticantes do ser- viço sem formação adequada e as futuras en- fermeiras de saúde pública. Por se tratar de um “curso emergencial”, a visitadora não po- deria exercer posições de responsabilidade, trabalhando apenas como auxiliares de enfer- meiras de saúde pública; e na primeira opor- tunidade as visitadoras deveriam ser substi- tuídas pelas enfermeiras diplomadas (PARSONS, 1997, p. 13-15). R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 67 Em 1922, o DNSP criou o Serviço de Enfer- meiras, sob a direção de uma superintenden- te geral, que estava em pé de igualdade com as demais inspetorias médicas existentes. Neste ano, Ethel Parson trouxe da América do Norte sete enfermeiras de saúde pública para atuarem como professoras e supervisoras das visitadoras de higiene já empregadas nas divisões de Tuberculose, Doenças Contagio- sas e Higiene Infantil (BARREIRA, 1997, p. 164). Em 1923, as visitadoras de higiene das diver- sas inspetorias foram transferidas para o Ser- viço de Enfermeiras a fim de unificar o servi- ço de visitação. A cidade foi dividida em cin- co zonas, cada uma delas subdivididas em distritos. Em cada zona uma enfermeira nor- te-americana ficou responsável pelo serviço de enfermagem2, tendo sob sua direção dois grupos de visitadoras de higiene, para higie- ne infantil e tuberculose. As visitadoras de higiene do serviço de doenças venéreas, tra- balhavam independentes das outras divisões, porém, tendo uma enfermeira norte-ameri- cana supervisionando o serviço (FRAENKEL, 1997, p. 4). Em 1923, houve a criação de uma escola de enfermeiras, que segundo Moreira (1998- 1999, p. 621): A criação de uma escola de enfermagem, e a delimitação de um campo de prática profissional constituíram pré-requisitos necessários para que fossem retirados do cenário os visitadores de saúde, regula- mentando-se, ao mesmo tempo a enfer- magem como profissão estratégica na or- ganização sanitária da cidade. A partir de 1925, parte das enfermeiras diplomadas começou a atuar nas visitas do- miciliares, aperfeiçoando e ampliando o tra- balho que já vinha sendo executado. Em 1927, esta atividade passou a ser feita exclusiva- mente por enfermeiras diplomadas (FRAENKEL, 2002, p. 17). Fontenelle (apud BARREIRA, 1993, p. 52) explica no que consistiria o cotidiano da en- fermeira-visitadora: Ela entra nas famílias onde há doença, incapacidade física ou, necessidade de conselhos para preveni-los. Conforme o caso, cuida do doente que está de cama, diminuindo-lhe o sofrimento, acelera-lhe a cura, pondo nisso a habilidade de uma enfermeira consumada, mas enquanto assim trabalha, vai mostrando aos mem- bros da família ou até aos vizinhos como, em sua ausência, contribuir para o bene- fício do doente. Ensina a cumprir as de- terminações do médico e explica as me- didas a tomar para proteger o resto da família. Ao mesmo tempo, vai observan- do as condições sanitárias da casa: veri- fica se o número de quartos e de leitos é bastante para os moradores, examina a ventilação e isolamento dos cômodos, as condições de asseio, o funcionamento das instalações sanitárias. Faz mais: explica o valor do sol, do ar, da limpeza, ensina o perigo das moscas, mosquitos e outros cevandijas, instruindo sobre o modo de combatê-los; indica a maneira mais con- veniente de alimentar as crianças e adul- tos; procura lobrigar defeitos físicos e doenças em começo, chamando a aten- ção dos responsáveis e encaminhando os médicos para os doentes e os doentes para os médicos. A atividade de visitação era considerada im- própria para médicos “[...] de rua em rua, de casa em casa, de quarto em quarto, [...] co- mecei a perceber que isto não era serviço para médico” (FONTENELLE apud BARREIRA, 1993, p. 50), pois era considerado um serviço fácil que exigia pouco conhecimento, abrin- do espaço para a inserção da enfermeira de saúde pública no Brasil, mas, por outro lado, observamos dificuldades no desenvolvimen- to da enfermagem de saúde pública, pois al- guns sanitaristas desejavam apenas resolver o problema da visitação e para outros sanita- ristas esta atividade poderia ser realizada pe- las visitadoras de higiene. Tal fato serviu de R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 68 desafio para a configuração da prática pro- fissional da enfermeira de saúde pública. Para operacionalizar o estudo delineamos os seguintes objetivos: • Identificar as circunstâncias em que se da- vam as visitas domiciliares enquanto ati- vidade das enfermeiras de saúde pública do DNSP no DF; • Analisar as estratégias das enfermeiras para consolidação de sua prática no espa- ço do DNSP frente às ameaças de parte dos sanitaristas de instituir as visitadoras de higiene. Este estudo pretende buscar nas raízes da enfermagem profissional questões emblemá- ticas para a estruturação das atividades de- senvolvidas pela assistência de enfermagem durante a passagem das enfermeiras de saú- de pública no DNSP, contribuindo para a aná- lise histórica da enfermagem. 2 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA Estudo histórico-social, apoiou-se na análise documental, que segundo Ludke (1986, p. 38) “busca identificar informações factuais nos documentos a partir de questões ou hipótese de interesse”. Assim aplicamos às fontes a crítica externa e interna. Teve como fontes primárias as republicações dos Annaes de enfermagem (precursor da Revista Brasileira de Enfermagem) em fac- símile na Escola Anna Nery Revista de En- fermagem; e outros documentos do acervo do CEDOC da EEAN/UFRJ. As fontes secun- dárias versaram sobre a história da enferma- gem encontradas no acervo bibliográfico do Laboratório de Pesquisa de História da En- fermagem da EEAP; no banco de textos do Nuphebras; na biblioteca setorial da pós-gra- duação da EEAN; e na biblioteca da ENSP\FIOCRUZ. Desta forma, apoiados em Salmon (1979, p.107-132) iniciamos a análise dos documen- tos realizando a crítica externa com a finali- dade de reunir o conjunto dos materiais for- necidos na tentativa de eliminar as suas even- tuais contradições, e a crítica interna que por sua vez consistiu em discernir o que pode ser aceito num testemunho, analisando o produ- to desse trabalho distinguindo possíveis in- correções, para que os resultados fossem acei- táveis. 3 AS CIRCUNSTÂNCIAS DAS VISITAS DOMICILIARES No início do século XX, a produção literária sobre as condições de vida da população ha- via sensibilizado intelectuais nacionalistas e despertado a consciência dos sanitaristas quanto à necessidade de um movimento, a época, denominado “Pró-Saneamento do Brasil”. Esta associação considerava que a construção da nacionalidade e a superação do atraso da sociedade radicavam-se na melhoria das condições de saúde da popula- ção e não poderia ser encontrada em explica- ções como condições climáticas desfavoráveis ou inferioridade racial. Criticou também o viés urbanista da saúde pública brasileira, que nada até então havia feito em relação às endemias rurais, propondo a criação de um ministério ou, pelo menos, de um departa- mento nacional de saúde pública ou de higie- ne (COSTA, 1986, p. 93). A inoperância da saúde pública ficou eviden- te com a epidemia local de gripe, em 1918, que veio da Europa e instalou-se no DF que, em menos de dois meses matou treze mil pes- soas, tornando politicamente imperativa uma Reforma Sanitária (COSTA, 1986, p. 86, 93). A reforma sanitária implementada a partir de 1920, deu-se após sucessivas crises políticas que tornavam cada vez mais difíceis a alter- R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 69 nância no poder entre as oligarquias políti- cas e econômicas de São Paulo e Minas Ge- rais, a chamada “república do café com lei- te”. Novas forças políticas emergiram – ope- rários e camadas médias urbanas – e inseri- dos neste cenário, os jovens sanitaristas, oriundos da classe média e alta urbana, for- mavam um dos mais ativos grupos moder- nizantes (MOREIRA, 1999, p. 623, 624). A sucessão presidencial para o período de 1919 -1922 polarizou em torno das candida- turas de Rui Barbosa e Epitácio Pessoa; ven- cendo este último, que colocou em prática a questão do saneamento no país, enviando para o Congresso uma mensagem com as rei- vindicações do movimento sanitarista (KOSHIBA; PEREIRA, 1991, p. 278-286). O presidente eleito criou o Departamento Nacional de Saúde Pública, nomeando Carlos Chagas como diretor geral do departamento, que passou a acumular a direção do Instituto Oswaldo Cruz com a do DNSP, e liderou a reforma sanitária. Em 1921, Carlos Chagas, visitou os EUA, solicitando ao Internacional Health Board que organizasse um serviço de enfermagem no DNSP. Então, através da Fundação Rockfeller, foi criada a Missão de Cooperação Técnica para o Desenvolvimen- to da Enfermagem no Brasil, patrocinada pela FR, que promoveu inovações no DNSP, efe- tivando a Reforma Carlos Chagas através da cooperação com a FR (PARSONS, 1997, p. 11). Neste período não só a enfermagem moder- na no Brasil começa a construir sua identida- de, mas as ações de saúde pública represen- taram um veículo para a formação da identi- dade nacional, para clínicos, médicos de la- boratório e sanitaristas. Tanto para estes, quanto para as enfermeiras, a parceria com a FR representava uma possibilidade de adqui- rirem bolsas de estudos no exterior e estági- os nos serviços estatais (MOREIRA, 1999, p. 622). Os sanitaristas do DNSP, através de curso de especialização nos Estados Unidos, conhece- ram a atuação das enfermeiras de saúde pú- blica norte-americanas e julgaram necessá- rio treinar enfermeiras de saúde pública no Brasil para auxiliar os médicos nas diversas atividades do DNSP (PARSONS, 1927, p. 201). Vale ressaltar que os médicos sanitaris- tas vinham tentando fazer instruções nos pos- tos sanitários, visitas domiciliares, porém ten- do percebido que, para executar as visitas e as orientações quanto aos cuidados higiêni- cos era necessário pouco conhecimento e que por isso, um médico não deveria perder tem- po com tais atividades. Reconhecendo então a necessidade de criar um vínculo entre os lares dos doentes e os dispensários, foram designadas as enfermeiras de saúde pública para esta tarefa (FRAENKEL, 2001, p. 284). A influência dos sanitaristas nas decisões po- líticas, principalmente nas questões que en- volviam a saúde pública no país, foi de gran- de importância para a viabilização da refor- ma sanitária, bem como a implementação de seus conceitos em saúde pública; e dentro deste contexto entra em cena a enfermeira de saúde pública que criaria um vínculo entre os doentes e os dispensários, complementando o trabalho desenvolvido pelos médicos. 4 A ATUAÇÃO DAS ENFERMEIRAS DE SAÚDE PÚBLICA DURANTE A MISSÃO PARSONS Em 1921, entra em cena no Brasil, a missão das enfermeiras norte-americanas, patrocina- das pela FR, e chefiadas por Ethel Parsons, objetivando criar no DNSP um serviço de enfermeiras e uma escola de enfermeiras, considerados necessários para a efetivação da Reforma Sanitária. O primeiro passo para adaptação do sistema norte-americano, no Brasil, foi estabelecer um serviço de enfer- meiras no DNSP, em pé de igualdade com as demais estruturas administrativas das R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 70 inspetorias, que dirigiria todas as atividades de enfermagem. Vale destacar, que o Brasil foi o pioneiro em estabelecer essa inspetoria dentro de um Departamento Nacional (PARSONS, 1997, p. 11). Ethel Parsons, fez valer sua opinião de que, para obter sucesso no projeto da reforma sa- nitária, era fundamental a criação de uma escola de enfermagem que preparasse enfer- meiras que se integrassem ao programa de saúde pública. A proposta de Parsons era re- alizar um curso de enfermeiras com duração de dois anos e meio, entretanto, os chefes das inspetorias mostravam-se impacientes devi- do à necessidade urgente em que se encon- travam os serviços, não podendo paralisar o serviço para que as visitadoras domiciliares cursassem a Escola de Enfermeiras. Como solução provisória, e para assegurar a criação da escola, em 1922, foi criado um curso de emergência com seis meses de duração, para ampliar o quadro das visitadoras e manter o controle sanitário da população (PARSONS, 1997, p. 15). O treinamento das visitadoras contava de en- sino teórico-prático sobre procedimentos de enfermagem e de higiene do lar, além de colo- car as visitadoras sob “disciplina e controle”. O ensino prático era feito pelas enfermeiras americanas e o teórico pelos médicos das ins- petorias, à tarde. No entanto, as visitadoras não poderiam assumir posições de responsabilida- de, tendo em vista o pouco preparo que elas recebiam, e deveriam trabalhar sob a super- visão de uma enfermeira diplomada. Das quarenta alunas matriculadas no curso, ape- nas vinte e nove receberam certificados, que foram distribuídos de forma precária, cientes que conforme a Escola de Enfermeiras formas- sem enfermeiras diplomadas estas substituí- ram-nas (PARSONS, 1997, p. 15). Em 1923, foi fundada a Escola de Enfermei- ras do DNSP (atual Escola de Enfermagem Anna Nery). Neste ano iniciou-se um segundo curso de emergência, com dez meses de dura- ção, devido à pressão realizada pelos chefes das inspetorias, pois a formação de enfermeiras era mais demorada e existia a necessidade urgen- te de ampliar os serviços. Dezenove moças re- ceberam os certificados. Em 1924, foi repeti- do pela última vez o curso de emergência, no qual trinta moças receberam os certificados. Foram, portanto, cinqüenta e nove moças for- madas pelos três cursos de emergência, acal- mando os chefes das inspetorias que concluí- ram não haver mais a necessidade de formar visitadoras com um preparo insuficiente e su- perficial (FRAENKEL, 2002, p. 16), principal- mente a poucos meses da formatura da 1a tur- ma da Escola de Enfermeiras do DNSP (1925). Vale ressaltar que nem todas as visitadoras ma- triculadas nos curso de emergência foram aprovadas e receberam certificados. Em 1925, houve uma redução no orçamento da Divisão de Enfermeiras de Saúde Pública, sendo diminuído o número de visitadoras para trinta e cinco. Destas, seis ingressaram na Escola Anna Nery a fim de terminar o cur- so. Neste mesmo ano, teve início a inserção das enfermeiras diplomadas nos serviços do DNSP e o envio de enfermeiras diplomadas ao exterior para realização de um curso de aperfeiçoamento, ainda com financiamento da FR, de forma a garantir maior preparo na sua especialidade. Em 1926, houve a substi- tuição das últimas visitadoras de higiene por enfermeiras diplomadas em saúde pública.3 A partir de 1927, o serviço de saúde pública passou a ser feito exclusivamente por enfer- meiras diplomadas. As enfermeiras chefes- estrangeiras e professoras de enfermagem em saúde pública, em seus relatórios, diziam que mesmo a enfermeira de saúde pública menos capaz, organizava o seu trabalho com mais método, demonstrava mais interesse, cobrin- do um território maior e obtinha melhores resultados do que as visitadoras que eram profissionais despreparadas4. Comparando, assim, a prática das visitadoras com a das enfermeiras mediante exemplos de qualifica- ção profissional, que a formação da enfermei- ra era melhor e mais completa que a de uma R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 71 visitadora com apenas um curso de emergên- cia, desta forma provavam que o trabalho da enfermeira surtia maiores e melhores resul- tados, justificando a substituição das visi- tadoras. Ainda neste ano, foram abertos gabinetes de educação nos dispensários da Inspetoria de Profilaxia de Tuberculose, nos quais a enfer- meira de saúde pública realizava palestras in- dividuais, sob noções de profilaxia e de higie- ne. Este primeiro contato com o doente facili- tou a visita em domicílio, à medida que criava uma relação de confiança entre o doente e a enfermeira (FRAENKEL, 2002, p. 17). Em 1928, foram colocadas enfermeiras de saúde pública nos dez consultórios de higiene infan- til. Estiveram sob os cuidados das enfermei- ras de saúde pública nove mil cento e vinte seis crianças, das quais “as mães apreciavam as aulas dadas pelas enfermeiras, sobre o modo de preparo dos alimentos e cuidados higiêni- cos com a criança”5. Essa nova atividade para as enfermeiras de saúde pública surgiu por- que mais uma vez os médicos perceberam o trabalho educativo nos dispensários como pouco científico e inapropriado para a sua pro- fissão. No entanto, para a enfermeira foi mais um espaço, aumentando a sua área de atua- ção junto ao público, que passou a se dar tanto nos domicílios como nos dispensários (BAR- REIRA, 1993, p. 58). Dentre as funções da enfermeira de saúde pública se destacava, o seu papel como edu- cadora sanitária, que através de seus ensinamentos obtinha a mudança nos hábi- tos diários do povo. A enfermeira de saúde pública em conta- to direto com as condições particulares de vida, ponto essencial para o sucesso de uma questão tão nitidamente pessoal como é a higiene, foi considerada a men- sageira da saúde (FRAENKEL, 1933, p. 5). Sendo consideradas instrutoras sanitárias, cooperavam com chefes das inspetorias, au- xiliando o cumprimento dos programas e processos determinados pelos inspetores, as- sim, a enfermeira de saúde pública prestava cuidados de enfermagem e de educação sa- nitária, jamais ultrapassando a linha demarcada da ética nas atribuições do médi- co (LAURIANO; BARREIRA, 2002, p. 41). Devido ao serviço das enfermeiras de saúde pública ser subordinado administrativamente e tecnicamente à Superintendência Geral de Enfermagem, as enfermeiras de saúde públi- ca se organizavam de modo a realizar suas visitas e retornar à sede do serviço de enfer- meiras para anotar os resultados do seu tra- balho e solicitar providências das diversas inspetorias (LAURIANO; BARREIRA, 2002, p. 42). Os relatórios deveriam ser bem redi- gidos, claros e objetivos, visto que não havia comunicação verbal com os médicos dos dispensários. Essa estratégia, segundo Bar- reira (1997, p. 20) demostra “a importância da nova categoria profissional e se evidencia na produção do fluxo de informações sobre o comportamento sanitário das famílias po- bres”. Através desta produção de informações as enfermeiras de saúde pública se destacaram no serviço de epidemiologia, organizando um sistema de fichas com todas as informações relativas não só ao doente e sua família, mas às condições de higiene e moradia. Ela exer- cia forte vigilância, através da notificação de novos casos, conselhos sobre medidas profiláticas, além de estabelecer uma vigilân- cia contínua ao portador da doença até que se restabelecesse (BARREIRA, 1999, p. 80). Nestes relatos fica clara a tentativa de afir- mar que para o exercício da visita domiciliar, deveria haver um preparo profissional, pois as visitadoras de higiene com cursos de emer- gência não fariam um trabalho tão completo quanto o das enfermeiras de saúde pública. Os relatórios de 1930 mostram que o serviço de epidemiologia foi um dos grandes desta- ques dentro da prática das enfermeiras, me- diante a notificação, fiscalização, acompanha- R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 72 mento dos casos, vacinação, instrução sobre formas de prevenção e cuidados higiênicos. Porém, elas enfrentaram dificuldades com alguns médicos particulares que faziam valer de seu prestígio para proteger sua clientela particular das regras do código sanitário6. Portanto, as atividades realizadas pelas en- fermeiras de saúde pública incluíram ações de vigilância epidemiológica, através do con- trole e notificação de novos casos; vigilância sanitária, procurando melhorar as condições de higiene dos estabelecimentos, ensinado- lhes novos hábitos de higiene, fiscalização, assistência domiciliar aos doentes de todas as idades do pré-natal ao idoso, além do contro- le e prevenção de doenças contagiosas, e dos encaminhamentos dos doentes às clínicas, como a da tuberculose e a das venéreas. 5 O FIM DAS VISITADORAS DE HIGIENE E A CONSOLIDAÇÃO DA PRÁTICA DAS ENFERMEIRAS DE SAÚDE PÚBLICA Uma das estratégias adotadas pelas enfermei- ras norte-americanas para acabar com a for- mação das visitadoras domiciliares foi pro- var que o trabalho delas, não era satisfatório, produzindo sempre idéias negativas em seus relatórios, enfatizando a necessidade de ele- var os padrões de qualificação profissional. Ao mesmo tempo, não podiam negar a carên- cia de pessoal nos serviços de saúde, então, para atender as expectativas dos sanitaristas do DNSP, as enfermeiras norte-americanas realizaram cursos de emergência para as visitadoras, deixando claro que à medida que se formassem enfermeiras, essas visitadoras deveriam ser substituídas. Além das atividades em saúde pública, em 1927, as enfermeiras assumiram responsabi- lidade da assistência de enfermagem aos do- entes do Pavilhão Afonso Penna com molés- tias infecto-contagiosas; do Pavilhão Zeferino Meirelles para homens tuberculosos, no Hos- pital São Sebastião. Em 1928, assumiram a responsabilidade do Pavilhão Carlos Seidl, para homens tuberculosos, no Hospital São Sebastião; organizaram e assumiram o servi- ço de enfermagem no Abrigo Hospital Arthur Bernardes7. Mas, apesar do aumento consi- derável da área de atuação, o número de en- fermeiras de 1926 a 1929, passou de vinte e quatro8 para quarenta e três9 um número ain- da insuficiente para o atendimento das de- mandas da saúde pública. O acordo do governo brasileiro com a FR, para implantação da enfermagem moderna no Brasil, terminou em 1928, a partir de então, a FR permaneceria no Brasil conforme o in- teresse ou apoio do governo de Washington Luís (SAUTHIER; BARREIRA, 1999, p. 79). A crise de 1929 causou uma desorganização econômica mundial, associada à vitória dos bolcheviques na Rússia (1917), dando forças aos ideais comunistas, que prepararam o “ter- reno” para o controle estatal do movimento operário da era Vargas (1930-1945). Enquan- to o presidente Washington Luís apoiava a candidatura de Júlio Prestes, as oposições ao governo formaram a Aliança Liberal que lan- çou a candidatura de Getúlio Vargas à presi- dência e de João Pessoa à vice-presidência. Nas eleições de 1o de março de 1930, houve fraude, saindo derrotada a Aliança Liberal, e o candidato eleito foi Júlio Prestes. Em 3 de outubro de 1930, descontentes com o resul- tado das eleições toda oposição se uniu, e teve início um movimento militar, em Minas Ge- rais e no Rio Grande do Sul, estendendo-se para outros estados do país. Em 24 de outu- bro, Washington Luís foi deposto pelos ge- nerais10 que formaram a Junta Governativa, em 3 de novembro, Getúlio Vargas assume o poder, marcando o fim da Primeira Repúbli- ca (KOSHIBA; PEREIRA, 1991, p. 288-302). R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 73 Tão logo a revolução triunfou, o governo pro- visório de Vargas criou o Ministério da Edu- cação e Saúde Pública que era composto de quatro departamentos independentes entre si imediatamente subordinados ao ministro, dentre os departamentos estava o DNSP, que incorporou todos os serviços que já lhe per- tencia11. O relatório do Serviço de Enfermeiras do DNSP, de 1930, descreveu os “efeitos da re- volução”, comentando que uma mudança tão radical no Governo Federal não poderia dei- xar de produzir efeitos neste Serviço. No dia três de outubro deste ano, com as notícias do estado de Minas Gerais, as enfermeiras ma- nifestaram seus desejos de serem chamadas a prestar serviços de guerra, ou de se apre- sentarem como voluntárias. Porém, o Minis- tério da Justiça e Negócios Interiores reco- mendou que se continuasse o trabalho o mais normalmente possível. No dia 21 de outubro, a pedido do Secretário Geral, as enfermeiras de saúde pública começaram a fazer um le- vantamento das condições financeiras das famílias dos reservistas do DNSP que tives- sem sido chamados para a revolução, que deveriam receber auxílio monetário12. Com a mudança no poder central, a FR perdeu sua base de sustentação; por isso, para garantir a permanência da Missão, as enfermeiras nor- te-americanas mostravam-se comprometidas com a questão política do país manifestando sempre o desejo de servir a “pátria”. Além da aliança, de caráter oficial, com os diretores do DNSP e com os médicos sanita- ristas que a apoiaram, a Missão Parsons, uti- lizou-se de importantes estratégias para a in- serção e consolidação de sua prática no meio científico e social da época (SAUTHIER; BARREIRA, 1999, p. 80). O aumento contínuo de desempregados, o número de crianças doentes, tuberculosos e doenças infecto-contagiosas aumentaram substancialmente. Em agosto, do mesmo ano, houve uma epidemia de sarampo, prejudican- do e complicando ainda mais o Serviço de Enfermeiras, pois, se o número de enfermei- ras de saúde pública era insuficiente para atender todas as atividades, com a epidemia duas enfermeiras de saúde pública foram deslocadas para cuidar dos doentes e fazer isolamento. Em novembro, surgiu a epidemia de febre tifóide, novamente enfermeiras de saúde pública foram deslocadas de seus ser- viços para vacinação em massa; cuidado e vi- gilância dos doentes e dos comunicantes; não esquecendo as fichas epidemiológicas. Para enfrentar o aumento de trabalho que essas epidemias trouxeram ao Hospital São Sebas- tião, foram enviadas enfermeiras de saúde pública para esse hospital, ficando as zonas desfalcadas e só podendo atender os casos agudos13. Tais deslocamentos geraram um confronto com os sanitaristas, que denunciavam que nem a Escola Anna Nery, nem o Serviço de Enfermeiras, estavam atendendo as necessi- dades de saúde pública14. Segundo Fontenelle, em 1930: O importante é diplomar muitas enfer- meiras e saber mantê-las no posto peno- so, difícil, mas indispensável de visitadoras. Essa fuga de visitadoras faz com o sacrifício e as longas vigílias, as- sim como o dinheiro dispensado pela FR, pelo DNSP, venham a perder-se em gran- de parte. O êxodo das enfermeiras diplomadas é, infelizmente, patente (.) todos os que anseiam pelo progresso e desenvolvimento do serviço de enfermei- ras visitadoras, devem apontá-lo, sugerin- do qual a causa para com energia removê- las. Não nos enganemos com palavras. Precisamos é de enfermeiras visitadoras de saúde pública15. Para vencer os obstáculos, que se antepu- nham ao seu plano, Ethel Parsons, tinha a seu favor o apoio da FR, que além de patrocinar a missão conferia-lhe poder e a não subordi- nação aos médicos brasileiros, principalmen- te aos que eram contra ao seu plano de ação. R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 74 Tal apoio conferia-lhe suporte para avançar em seus projetos mesmo diante das sucessi- vas crises políticas e sociais, assegurando à enfermagem a consolidação de sua prática profissional (SAUTHIER; BARREIRA, 1999, p. 80). Antes de encerrar seus trabalhos a Missão, ainda conseguiu garantir a Escola de Enfer- meiras Anna Nery como escola oficial padrão; definindo as condições indispensáveis a equi- paração das demais escolas de enfermagem à EEAN16; e para expedir diplomas que sejam reconhecidos pelo Governo, além de promo- ver a difusão do modelo desta escola de en- fermeiras sem o desgaste da qualidade, pro- videnciando a fiscalização de tais escolas, restringindo deste modo o uso do título de “enfermeiras diplomadas” (FRAENKEL, 1997, p. 6). As antigas alianças políticas e econômicas, que davam sustentação à FR, foram desfei- tas, determinando o encerramento das ativi- dades da Missão Técnica para o Desenvolvi- mento da Enfermagem no Brasil17 (SAUTHIER; BARREIRA, 1999, p. 83). 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS O contexto social-econômico da década de vinte, do século XX, exigiu uma transforma- ção na saúde pública do DF, de modo a disse- minar novas formas de conduta quanto à hi- giene e hábitos de vida. O agente designado para este trabalho foi a enfermeira de saúde pública. Através da reforma sanitária, as visitadoras de higiene possuíram lugar estratégico no tra- balho dos sanitaristas das inspetorias e eram vistas como solução imediata para os proble- mas mais prementes de sua prática cotidia- na, a visitação domiciliar. Com a chegada da Missão Parsons ao Brasil, esta relação se in- verteu, pois através da implantação da enfer- magem moderna, os sanitaristas passaram a valorizar o trabalho das enfermeiras de saú- de pública, porém não descartando a neces- sidade de manter a visita domiciliar. A pri- meira estratégia das enfermeiras norte-ame- ricanas foi a criação de uma Superintendên- cia de Enfermagem dentro do DNSP em pé de igualdade com as demais Divisões do De- partamento. No início da Reforma Carlos Chagas outra estratégia adotada, pelas norte-americanas a fim de responder as expectativas dos médi- cos sanitaristas do DNSP, e ainda, garantir a implantação do serviço de enfermeiras e a criação da escola de enfermeiras do DNSP, foi o atendimento imediato das necessidades por eles sentidas, ao mesmo tempo em que lançavam mão de argumentos técnicos e po- líticos para implementar um projeto de lon- go alcance. Em seus relatórios, as enfermei- ras norte-americanas, faziam uma avaliação negativa das visitas domiciliares realizadas pelas visitadoras de higiene, contrapondo os resultados positivos da prática das enfermei- ras diplomadas. O curso de emergência oferecido para as visitadoras de higiene foi um modo das en- fermeiras norte-americanas amenizarem as necessidades do serviço relatadas pelos sani- taristas, até que conseguissem formar as pri- meiras turmas de enfermeiras de saúde pú- blica para substituir as visitadoras. A saúde associada às práticas educativas e de controle dos hábitos de vida da população foi considerada uma prática indevida para os médicos sanitaristas, e abriu espaço para a enfermeira de saúde pública que atuou pri- meiramente nos lares e, mais tarde nos dispensários adquirindo respeito e aceitação tanto na visão dos sanitaristas quanto na vi- são do população. Além das atividades em saúde pública, em 1927, as enfermeiras diplomadas expandiram R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 75 seu âmbito de ação, assumindo responsabili- dade da assistência de enfermagem aos do- entes de alguns pavilhões e hospitais, mas apesar do aumento da área de atuação o cres- cimento do número de enfermeiras diploma- das não atingiu suficiência para atender a to- das as atividades assumidas, isso gerou um descontentamento por parte dos sanitaristas que criticavam o deslocamento das enfermei- ras diplomadas pelo DNSP para outras ativi- dades que não o serviço de visitação e dos dispensários. Ao final da Missão Parsons, apesar do des- contentamento de alguns sanitaristas com o deslocamento das enfermeiras de saúde pú- blica, o programa da Missão Parsons foi de- senvolvido de maneira que assegurou a auto- nomia do ensino, a qualificação profissional, além da valorização dos serviços de enferma- gem, colocando a enfermeira de saúde públi- ca sempre em posição estratégica na organi- zação sanitária. A Missão Parsons mostrou-se atenta aos pro- blemas sociais e políticos do país colocando- se à disposição do Governo Brasileiro para as questões de saúde do país. Com o apoio dos médicos sanitaristas e diretores do DNSP, estas alianças políticas foram as principais estratégias da Missão Parsons para sua inser- ção e permanência, pois mesmo diante de sucessivas crises políticas, econômicas e so- ciais, tais alianças garantiam-lhes suporte para implementar a enfermagem de saúde pública nas bases da enfermagem moderna, consolidando sua prática no âmbito do DNSP, no DF, na década de 20, no século XX. The performance of the nurses in the DNSP in the Federal District, 1921-1931 ABSTRACT: The object of this study is the practical one of the nurses of public health in the inspetorias of the National Department of Public Health (DNSP) in the Federal District, in the decade of 1920. The objectives are: to identify the circumstances where if they gave the visits domiciliary while an activity of the nurses of public health of the DNSP in the Federal District; and to analyze the strategies of the nurses for consolidation of its practical in the space of the DNSP front to the threats of part of the sanitaristas to institute the hygiene’s visitors. Research of description-social nature. The primary sources mention publications of the “Annaes de Enfermagem” and documents to it found in the quantity of the Center of Documentation of EEAN/UFRJ; the secondary sources had turned on the history of the nursing. The Parsons Mission arrived at Brazil in order to promote the innovations required for the DNSP, and were come across with the presence of the hygiene’s visitors. We conclude that the Parsons Mission was used amongst other strategies, the organization of a Service of Nurses, and the creation of a school of nurses, both in the DNSP, with sights to the consolidation of the practical one of the nurses of public health, initially, threatened for the presence of the hygiene’s visitors. Keywords: History of the Nursing. Public health. R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 76 La prática de los enfermeiras del DNSP no Distrito Federal, 1921-1931 RESUMEN: El objeto de este estudio es la práctica de las enfermeras de la salud pública, en los inspetorias del departamento (DNSP) del oficio de enfermera de la salud pública en el Distrito Federal, en la década de 1920. Sus objetivos son: identificar las circunstancias en que ocurrian las visitas domiciliares como actividad de salud las enfermeras que trabajaban en la salud pública del DNSP en el Distrito Federal; y analizar las estrategias usadas por éstas enfermeras para realizar su práctica, frente a las amenazas hechos pontos salubristas de instituir las visitadoras de la higiene. Investigación de la naturaleza histórico-social. Cuja as fuentes primaria son las publicaciones de los Anales de Enfermería y otros documentos en- contrados en el acervo del Centro de Documentación del EEAN/UFRJ. Las fuentes secunda- rias informan sobre la historia de la enfermería. La Misión Parsons, llega al Brasil con el fin de promover las innovaciones exigidas por el DNSP y se encontró con la existencia de las visitadoras de la higiene. Concluimos que la Misión Parsons utilizó dentro de sus estrategias, la organización de un equipe de enfermeras y la creación de la Escuela de las enfermeras, ambos en el DNSP, con el objetivo de consolidar la práctica de las enfermeras en la salud pública, inicialmente amenazada por las visitadoras de higiene. Palabras-clave: Historia de la enfermería. Salud pública. NOTAS 1 “O trabalho destas moças era muito imperfeito, faltava-lhes base técnica” (FRAENKEL, 1998, p. 17). 2 As enfermeiras norte-americanas cuidavam do ensino, da organização, enfim, do aperfeiçoamento das atividades realizadas pelas visitadoras de higiene, respondendo por seu trabalho perante os diretores dos outros serviços. (MOREIRA, 1998-1999, p. 631). 3 Relatório referente as modificações feitas no Serviço de Enfermeiras de DNSP (1926-1930). Localização: EEAN, CD, mód. A, doc. 275, cx 29. 4 Idem. Localização: EEAN, CD, mód. A, doc. 275, cx 29. 5 Relatório do Serviço de Enfermeiras – DNSP. Localização: EEAN, CD, mód A, doc. 169, cx 27, 1930. 6 Relatório do Serviço de Enfermeiras – DNSP. Localização: EEAN, CD, mód A, doc. 169, cx 27, 1930. 7 Relatório referente as modificações feitas no serviço de enfermeiras de DNSP (1926-1930). Localização: EEAN, CD, mód. A, doc. 275, cx 29. 8 Dentre as quais uma na Divisão de Instrução de Enfermeiras e vinte e três na Divisão de Enfermeiras de Saúde Pública.- EEAN CD, mód. A, doc. 169, cx 27, 1930. 9 Dentre as quais vinte e oito na divisão se instrução de enfermeiras e quarenta e três na Divisão de Enfermeiras de saúde Pública –EEAN, CD, mód A, doc 169, cx 27, 1930. 10 A Aliança Liberal baseou sua campanha na necessidade de reformas políticas com vista à assistência dos trabalhadores, ganhando apoio da massa urbana e dos tenentes. Os generais que depuseram Washington Luís e formaram a junta governativa foram: Mena Barreto, Tasso Fragoso; e o almirante Isaías de Noronha Principal- mente depois do assassinato de João Pessoa (KOSHIBA; PEREIRA, 1991, p. 301-302). 11 Decreto no 19.444, de 1 de dezembro de 1930. Pelo Decreto no 19560, de 5 de janeiro de 1931 é aprovado o regulamento que organiza a Secretaria de Estado do Ministério da Educação e Saúde Pública. 12 Relatório do Serviço de Enfermeiras – DNSP. Localização: EEAN,CD, mód A, doc 169, cx 27, 1930 13 Relatório da divisão de Instrução das enfermeiras, Pullen - EEAN, CD, mód A, doc 204, cx 28, 1930. 14 No final de 1930, haviam 109 enfermeiras diplomadas, destas 92 encontrava-se em serviço ativo, das quais 48 encontravam-se na Divisão de Saúde Pública, enquanto que em outras atividades estariam 44 enfermeiras distribuídas. - EEAN, CD, mód A, doc 204, cx 28, 1930. R. de Pesq.: cuidado é fundamental, Rio de Janeiro, ano 9, n. 1/2, p. 65-78, 1./2. sem. 2005. 77 15 “O Jornal”- Discurso de Fontenelle como paraninfo da turma de enfermeiras formadas em 07/01/1930 – EEAN, CD, mód A, doc 275, cx 29, 1930. 16 Decreto no 20.109, de 15 de junho de 1931. 17 Nos “termos de contrato” do Ministério da Justiça e Negócios Interiores com a FR, reza que “O presente acordo vigorará até primeiro de abril de mil novecentos e vinte e oito, podendo ser reformulado ou ampliado, se assim convier às partes”- Localização: EEAN,CD, doc.47, cx07,1925 REFERÊNCIAS BARREIRA, Ieda de Alencar. A. Contribuição da história da enfermagem brasileira para o desenvolvimento da profissão. Revista de Enfermagem da EEAN, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1, p. 125-141, abr. 1999. ______. A enfermeira Anna Néri no país do futuro: a aventura da luta contra a tuberculose. 1993. 355 f. 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