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Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA 32 Marvin Ryou e Donald M. Coen Introdução Caso Bioquímica da Replicação, Transcrição e Tradução do DNA Procariótico Estrutura do DNA Replicação e Segregação do DNA e Topoisomerases Transcrição Bacteriana Síntese de Proteínas Bacterianas Classes e Agentes Farmacológicos Inibidores das Topoisomerases: Quinolonas Inibidores da Transcrição: Derivados da Rifamicina Inibidores da Tradução Agentes Antimicrobianos Dirigidos Contra a Subunidade Ribossômica 30S Agentes Antimicrobianos Dirigidos Contra a Subunidade Ribossômica 50S Conclusão e Perspectivas Futuras Leituras Sugeridas INTRODUÇÃO As diferenças bioquímicas fundamentais observadas entre as bactérias e os seres humanos são exploradas no desenvolvi- mento e uso clínico de antibióticos. Os processos do dogma central — replicação, transcrição e tradução do DNA — com- partilham muitas semelhanças entre bactérias e seres humanos. Entretanto, existem diferenças importantes na bioquímica dos processos do dogma central dos procariotas (i. é, bactérias), em comparação com aqueles dos eucariotas (i. é, seres humanos). Três dessas diferenças são utilizadas como alvos pelos agen- tes quimioterápicos antibacterianos: (1) as topoisomerases, que regulam o superenrolamento do DNA e medeiam a segregação das fitas replicadas de DNA; (2) as RNA polimerases, que trans- crevem o DNA em RNA; e (3) os ribossomos, que traduzem o RNA mensageiro (mRNA) em proteína. Os antibióticos quinolonas são agentes de amplo espec- tro; não apenas inibem certas topoisomerases, como também convertem essas enzimas em agentes que provocam lesão do DNA. Os derivados da rifamicina ligam-se à RNA polimerase bacteriana e a inibem. (Um desses derivados, a rifampicina, constitui a base do tratamento da tuberculose.) Diversos fárma- cos ligam-se aos ribossomos bacterianos, inibindo a síntese de proteína. Especificamente, os aminoglicosídios, as tetraciclinas e as espectinomicinas ligam-se à subunidade ribossomal 30S, enquanto os macrolídios, o cloranfenicol, as lincosamidas, as estreptograminas e as oxazolidinonas têm como alvo a subu- nidade ribossomal 50S. Em geral, esses inibidores da síntese de proteínas atuam sobre microrganismos tanto Gram-positivos quanto Gram-negativos e, portanto, têm ampla aplicação clínica (ver Cap. 33 para uma discussão das bactérias Gram-positivas e Gram-negativas). Este capítulo procede a uma revisão sucinta da bioquímica dos processos do dogma central nos procariotas e analisa certas diferenças relevantes entre esses processos nos procariotas e eucariotas. A partir dessa base, o capítulo dis- cute os mecanismos pelos quais os inibidores farmacológicos interrompem a replicação, a transcrição e a tradução do DNA bacteriano. nn Caso Verão de 1976. Os participantes de uma convenção dos Legionários Americanos, em Philadelphia, ficam gravemente doentes com um tipo misterioso de pneumonia. O surto ocorre no Bellevue Stratford Hotel, onde 150 hóspedes e 32 visitantes contraem a “doença dos Legionários”. A doença leva 29 vítimas à morte. As colorações convencionais para escarro, as culturas e até mesmo as amostras de necropsia não revelam nenhum patógeno consistente. O terror de uma doença epidêmica desconhecida espalha rumores e relatos inéditos de gases venenosos, suprimentos contaminados de água, terrorismo e vírus mortíferos. Vários meses depois, equipes de pesquisa laboratoriais e de campo dos Centers for Disease Control and Prevention (Centros para Controle de Doença e Prevenção) (CDC) identificam a bac- téria Gram-negativa aeróbica causal e a denominam Legionella pneumophila. Observa-se que os casos tratados com eritromicina e tetraciclina apresentam melhores desfechos do que aqueles tra- tados com outros fármacos. Hoje em dia, a eritromicina e outros macrolídios, a claritromicina e a azitromicina, são freqüentemente utilizados no tratamento da doença dos Legionários, bem como 548 | Capítulo Trinta e Dois no tratamento de muitas infecções por clamídias, estreptococos e estafilococos. QUESTÕES n 1. Quais as etapas no processo de tradução que são bloquea- das pelas tetraciclinas e pelos macrolídios? n 2. Como as bactérias desenvolvem resistência a esses fármacos e a outros inibidores da transcrição e tradução? n 3. Por que os macrolídios são bacteriostáticos, enquanto alguns antibióticos, como as quinolonas e os aminoglicosídios, são bactericidas? n 4. Por que os macrolídios constituem um tratamento efetivo na doença dos Legionários? BIOQUÍMICA DA REPLICAÇÃO, TRANSCRIÇÃO E TRADUÇÃO DO DNA PROCARIÓTICO O dogma central da biologia molecular começa com a estrutura do DNA, a macromolécula que transporta a informação gené- tica. Para transmitir toda a informação genética de uma célula para duas células-filhas, o DNA parental precisa ser copiado em sua totalidade (replicação), e as duas cópias resultantes devem ser segregadas — uma cópia para cada célula-filha. Para expressar os genes que se encontram no DNA, essas porções específicas do DNA são copiadas (transcrição) em RNA. A seguir, ocorre leitura de alguns RNA (mRNA) (tradução) pela maquinaria de síntese protéica para a produção de proteínas. Outros RNA, como o RNA de transferência (tRNA) e o RNA ribossomal (rRNA), desempenham funções complexas, que são essenciais à síntese de proteínas. A discussão que se segue sobre esses processos procarióticos é simplificada para ressaltar as etapas que são inibidas pelos antibióticos. ESTRUTURA DO DNA O DNA é constituído de duas fitas de desoxirribonucleotídios polimerizados que se enrolam um ao redor do outro em uma conformação de “dupla hélice”. O grupo 5�-hidroxila de cada anel desoxirribose do nucleotídio liga-se, através de um grupo fosfato, ao grupo 3�-hidroxila do nucleotídio seguinte, forman- do, assim, o arcabouço fosfodiéster de cada lado da “escada” dupla helicoidal (Figs. 32.1 e 32.2). As purinas adenina (A) e guanina (G) e as pirimidinas timina (T) e citosina (C), que estão ligadas de modo covalente ao anel de desoxirribose, asso- ciam-se entre si (A com T, G com C) através de pontes de hidrogênio, formando os “degraus” da escada (Fig. 32.2). É a seqüência linear de bases que codifica a informação genética de uma célula. O Cap. 37 procede a uma revisão do processo de síntese dos precursores nucleotídicos dessas bases. A estru- tura do DNA é essencialmente a mesma nos procariotas e nos eucariotas. Todavia, os cromossomos procarióticos consistem, habitualmente, em DNA circular, enquanto os cromossomos eucarióticos, incluindo os dos seres humanos, consistem em moléculas lineares. REPLICAÇÃO E SEGREGAÇÃO DO DNA E TOPOISOMERASES A replicação exata e a segregação do DNA bacteriano para as células-filhas envolvem numerosas etapas, muitas das quais podem constituir alvos apropriados para agentes antibacteria- nos. Até o momento, as enzimas nesse processo que têm sido utilizadas como alvo com maior sucesso são as topoisome- rases. Essas enzimas desempenham diversas funções durante a replicação e a segregação do DNA. Durante a replicação do DNA, as fitas complementares de DNA são sintetizadas de modo bidirecional, formando as denominadas duas forquilhas de replicação. Para iniciar esse processo, as duas fitas de DNA que compõem a dupla hélice devem se desenrolar e se separar. Ao fazê-lo, as fitas de DNA formam “superenrolamentos”, em que o polímero helicoidal sofre superenrolamento à medida que gira na mesma direção da volta da hélice. (Esse processo assemelha-se ao que ocorre com os fios de telefone durante o seu uso.) Os superenrolamentos aumentam a tensão nas fitas de DNA e, portanto, interferem no desenrolamento adicional. Na ausência de um processo para aliviar a tensão criada pelos superenrolamentos, todo o cro- mossomo deveria girar; esse processo seria complexo e iria consumir energia, podendo emaranhar toda a molécula. Quando a replicação do DNA é concluída, as duas cópias filhas de DNA enrolam-se uma em torno da outra. Nas bac- térias, como os cromossomos são circulares, as cópias filhas enlaçadas formam anéis entrelaçados (catenanos). Esses anéis entrelaçados devem ser separados (resolvidos) antes de sua segregação para as células-filhas. As topoisomerases desempenham ambas as funções — remoção do excesso de superenrolamento do DNA durante a sua replicação e separação do DNA filho entrelaçado. As topoisomerases catalisam essas atividades através de ruptura, Base nitrogenada O HO HH HH PO O- O Base nitrogenada O HO HH HH PO O- O O HO HH HH O P O- O O 1' 2'3' 4' 5' O HO HH HH O Base nitrogenada Extremidade 5' Extremidade 3' Ligação 3'-5' fosfodiéster β-D-2-desoxirribose Fig. 32.1 Estrutura do arcabouço do DNA. O DNA é um polímero de nucleotídios em que uma ligação fosfodiéster une os açúcares 2�desoxirribose de cada nucleotídio vizinho. A ligação fosfodiéster liga 3�-OH de uma desoxirribose a 5�-OH da desoxirribose seguinte, formando, assim, o arcabouço da fita de DNA. Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA | 549 rotação e religação das fitas de DNA. Existem dois tipos de topoisomerases. As topoisomerases tipo I formam e reúnem quebras de fita simples no DNA, diminuindo o superenrolamen- to positivo (Fig. 32.3). As topoisomerases tipo II executam essas funções de nuclease e ligase em ambas as fitas de DNA (Fig. 32.4). Ambos os tipos de topoisomerases podem remover o excesso de superenrolamento do DNA durante a sua replica- ção. Entretanto, apenas as topoisomerases tipo II podem resol- ver as cópias entrelaçadas de DNA de fita dupla para permitir a segregação do DNA nas células-filhas. As enzimas do tipo II são mais complexas e mais versáteis do que as topoisomerases do tipo I, e a enzima do tipo II é utilizada como alvo molecular mais freqüente para agentes quimioterápicos. O mecanismo de ação da topoisomerase tipo II ocorre em duas etapas. Em primeiro lugar, a enzima liga-se a um segmento de DNA e forma ligações covalentes com fosfatos de cada fita, cortando, assim, ambas as fitas. Em segundo lugar, a enzima produz estiramento do DNA da mesma molécula para passar através da quebra, aliviando o superenrolamento (Fig. 32.4). Essa passagem de DNA de fita dupla através de uma quebra de fita dupla é que permite a separação das cópias entrelaçadas de DNA após a replicação e, portanto, a segregação do DNA nas células-filhas. Existem duas topoisomerases do tipo II bacterianas princi- pais. A primeira a ser identificada, a DNA girase, é uma topoi- somerase tipo II bacteriana que é incomum pela sua capacidade de introduzir superenrolamentos negativos antes da separação das fitas de DNA, neutralizando, assim, os superenrolamentos positivos que se formam à medida que as fitas se desenrolam. A segunda topoisomerase tipo II principal é a topoisomerase IV. A DNA girase é particularmente crucial para a segregação em algumas bactérias, enquanto a topoisomerase IV é a enzima crítica em outras bactérias. Como o superenrolamento é importante tanto para a trans- crição quanto para a segregação, as topoisomerases também influenciam esse processo do dogma central. Em virtude de suas múltiplas funções, as topoisomerases estão habitual- mente envolvidas com o DNA, e esse aspecto é importante para o seu papel como alvo de fármacos. Essas enzimas não apenas são importantes como alvos de agentes antibac- terianos, mas também como alvos para a quimioterapia do câncer (ver Cap. 37). TRANSCRIÇÃO BACTERIANA A expressão gênica começa com uma transcrição, que envolve a síntese de transcritos de RNA de fitas simples a partir de um molde de DNA. A transcrição é catalisada pela enzima RNA polimerase. Nas bactérias, cinco subunidades (2 �, 1 �, 1 �� e 1 �) associam-se para formar a holoenzima. Conforme dis- cutido adiante, a subunidade � é fundamental para iniciar a transcrição, enquanto o restante da enzima RNA polimera se — também conhecida como enzima cerne — contém o mecanismo catalítico para a síntese de RNA. O processo de transcrição ocorre em três estágios: inicia- ção, alongamento e término (Fig. 32.5). Durante a iniciação, a holoenzima, a RNA polimerase, separa as fitas de um segmento curto do DNA de dupla hélice após o reconhecimento de um sítio proximal pela sua subunidade �. Uma vez desenrolada a dupla hélice para formar um molde de fita simples, a RNA polimerase inicia a síntese de RNA em um ponto de iniciação no DNA. Durante o alongamento, a RNA polimerase sintetiza uma fita de RNA complementar, unindo os trifosfatos de ribonucleo- sídio através de ligações fosfodiéster. No processo, a subunida- de � dissocia-se da holoenzima. A síntese de RNA prossegue na direção 5�→3�, de modo que a fita de RNA nascente emerge da enzima até atingir uma seqüência de término. A enzima RNA polimerase difere entre bactérias e seres humanos e, portanto, pode servir de alvo seletivo para a ação de agentes antibacterianos. Nas bactérias, uma RNA polime- rase sintetiza todo o RNA na célula (à exceção dos primers de RNA curtos necessários para a replicação do DNA, que N NN N N N N O O desoxirribose desoxirribose H H H N NN N O N desoxirribose N N N O desoxirriboseH H H H H Adenina Timina Guanina Citosina base ase O HO HH HH PO O- O b se O HO HH HH PO O- O O A C B Fig. 32.2 Pontes de hidrogênio entre fitas de DNA. A e B. As linhas tracejadas indicam pontes de hidrogênio entre bases complementares em fitas de DNA opostas. A adenina (A) e a timina (T) formam duas pontes de hidrogênio, enquanto a guanina (G) e a citosina (C) formam três pontes de hidrogênio. C. Esses pares de bases A−T e G−C formam os “degraus da escada” de dupla hélice do DNA. Observe que os componentes de desoxirribose e as ligações fosfodiéster estão localizados fora da dupla hélice de DNA, enquanto as bases purinas e pirimidinas encontram-se no centro da molécula de DNA. 550 | Capítulo Trinta e Dois Mecanismo de rotação da fita Ligação Topoisomerase tipo I Quebra Rotação Quebra Rotação Junção Passagem Camptotecinas Junção Ligação Fusão Mecanismo de passagem da fita Fig. 32.3 Regulação do superenrolamento do DNA pelas topoisomerases tipo I. Foram propostos dois mecanismos para a ação das topoisomerases tipo I. No modelo de rotação da fita, a topoisomerase tipo I liga-se às fitas opostas da dupla-hélice de DNA. A seguir, a topoisomerase rompe uma fita e permanece ligada a uma das extremidades rompidas (círculo cinza cheio). A extremidade não ligada da fita rompida pode desenrolar-se em uma ou mais voltas e, a seguir, unir-se (religar-se) à fita parental. No modelo de passagem da fita, a ligação da topoisomerase tipo I à dupla-hélice do DNA resulta em fusão (separação) das duas fitas de DNA. A seguir, a topoisomerase ligada ao DNA introduz uma ruptura em uma fita, enquanto permanece ligada a cada extremidade da fita de RNA rompida (círculos azuis cheios). A seguir, a fita rompida passa através da hélice e é unida (religada), resultando no desenrolamento efetivo do DNA. As camptotecinas, que são utilizadas na quimioterapia do câncer (ver Cap. 37), inibem a junção da fita quebrada do DNA após a passagem da fita. B C F E D ATP ATP Segmento G Domínio de ATPase Domínio B' Domínio A' Topoisomerase tipo II Segmento T ADP + Pi Quinolonas (inibem a enzima bacteriana) Antraciclinas Epipodofilotoxinas Ansacrina (inibem a enzima humana) A ATP ATPATPATPATPATPATP Fig. 32.4 Regulação do superenrolamento do DNA pelas topoisomerases tipo II. A. As enzimas topoisomerases tipo II contêm domínios A�, B� e de ATPase. Os domínios A� e B� envolvem um segmento da dupla hélice do DNA (segmento G). B. A interação com o segmento G induz uma alteração na conformação da topoisomerase tipo II, induzindo o seu “fechamento” ao redor do segmento G do DNA. C. O ATP liga-se aos domínios de ATPase da topoisomerase e um segundo segmento da dupla hélice de DNA (segmento T) entra e é “fechado” nos domínios B�. D. Quando a enzima está envolvida com ambos os segmentos de DNA, a topoisomerase corta ambas as fitas do segmento G do DNA. E. Esse corte de fita dupla no segmento G permite a passagem do segmento T através do segmento G para o lado oposto da topoisomerase. F. O segmento T é liberado da topoisomerase, e o corte do segmento G é religado. O ATP é hidrolisado a ADP, este dissocia-se da topoisomerase, e o ciclo recomeça. O resultado de cada ciclo consiste em trocar o número de voltas do DNA por uma ou, quando duas moléculas separadas de DNA circular estão envolvidas, em resolver catenanos. Os antibióticos da quinolona inibem a passagem do segmento T e a religação do segmento G quebrado pelas topoisomerases tipo II bacterianas. Em concentrações terapêuticas, as quinolonas também promovem a dissociação das subunidades da topoisomerase, resultando em quebras de fita dupla do DNA e em morte da bactéria. Diversas classes de agentes quimioterápicos para o câncer, incluindo as antraciclinas, as epipodofilotoxinas e a ansacrina, inibem a passagem do segmento T e a religação do segmento G quebrado pelas topoisomerases tipo II humanas, causando, assim, rupturas do DNA de fita dupla e induzindo a apoptose das células cancerosas (ver Cap. 37). Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA | 551 são produzidos pela primase). Além disso, a RNA polime- rase bacteriana é constituída apenas de 5 subunidades. Em contrapartida, os eucariotas expressam três RNA polimerases diferentes e cada enzima é consideravelmente mais complexa na estrutura de suas subunidades do que a enzima bacteriana correspondente. Por exemplo, a RNA polimerase eucariótica do tipo II, que sintetiza os precursores do mRNA, consiste em 8 a 12 subunidades. SÍNTESE DE PROTEÍNAS BACTERIANAS Uma vez sintetizados os transcritos de mRNA, esses transcri- tos são traduzidos pelo mecanismo de tradução das bactérias. Embora o processo global de tradução seja semelhante nas bac- térias e nos organismos superiores, existem várias diferenças nos detalhes dos mecanismos que podem ser utilizadas para fins farmacológicos. Em particular, o número e a composição de moléculas de rRNA diferem entre os ribossomos bacterianos e humanos. Por conseguinte, os ribossomos bacterianos também podem servir como alvos seletivos para antibióticos. O ribossomo de uma bactéria representativa, Escherichia coli, possui um coeficiente de sedimentação de 70S e é consti- tuído de uma subunidade 30S e uma subunidade 50S. A subu- nidade 30S contém uma única molécula de rRNA de 16S e 21 proteínas diferentes, enquanto a subunidade 50S contém duas moléculas de rRNA — rRNA de 23S e rRNA de 5S — e mais de 30 proteínas diferentes. O rRNA, mais do que os compo- nentes protéicos do ribossomo, é o elemento responsável pelas atividades-chave do ribossomo: a decodificação do mRNA, a ligação dos aminoácidos uns aos outros e a translocação do processo de tradução. O ribossomo 70S contém dois sítios que se ligam aos tRNA durante a tradução: o sítio P ou “peptidil”, que contém a cadeia peptídica em crescimento, e o sítio A ou “aminoacil” (também conhecido como sítio “aceptor”) que se liga às moléculas de tRNA que chegam, transportando os diversos aminoácidos (Fig. 32.6). (Existe também um sítio E ou “de saída” (“exit”), que se liga aos tRNA que foram utilizados durante a tradução antes de serem ejetados do ribossomo. A tradução, à semelhança da transcrição, também pode ser dividida em três etapas (Fig. 32.7). Durante a iniciação, os componentes do sistema de tradução são montados. Em pri- meiro lugar, o mRNA une-se à subunidade 30S do ribossomo bacteriano e a uma molécula específica de tRNA ligada à metio- nina formilada (fMet), o primeiro aminoácido codificado por todo mRNA bacteriano. A molécula de tRNA-metionina formi- lada (fMet-tRNAf) liga-se a seu códon de iniciação (AUG) no mRNA. A seguir, a subunidade 50S une-se com a subunidade RNA polimerase (holoenzima α2ββ'σ) Início RNA nascente RNA Fita molde Movimento da polimerase Sítio de alongamento A Iniciação B Alongamento C Terminação α2ββ' α2ββ' 5' 3' σ Fig. 32.5 Transcrição dos procariotas. A. Durante a iniciação, a holoenzima RNA-polimerase (�2����) procura e reconhece seqüências promotoras no DNA. A seguir, a holoenzima separa as fitas da dupla hélice de DNA, expondo o sítio de iniciação para transcrição. B. Durante o alongamento, o cerne da enzima (sem a subunidade �) sintetiza a nova fita de RNA na direção 5�→3� utilizando a fita de DNA desenrolada como molde. A RNA polimerase separa as fitas da dupla hélice de DNA à medida que se desloca ao longo da fita molde, expulsando a extremidade 5� do transcrito atrás dela. A rifampicina bloqueia o alongamento através da formação de um complexo com a subunidade � da RNA polimerase (não indicada). C. Ao alcançar uma seqüência de término, o DNA, o cerne da enzima e o RNA recém-sintetizado separam-se. Ribossomo 70S Subunidade 50S (rRNA 23S, rRNA 5S, mais de 30 proteínas) Macrolídios Cloranfenicol Lincosamidas Estreptograminas Oxazolidinonas Aminoglicosídios Espectinomicina Tetraciclinas Subunidade 30S (rRNA 16S, 21 proteínas) P A Fig. 32.6 O ribossomo 70S procariótico. O ribossomo 70S procariótico consiste em uma subunidade 30S e uma subunidade 50S. Cada subunidade é constituída de RNA ribossomal (rRNA) e de numerosas proteínas. Os rRNA são responsáveis pela maior parte das atividades importantes do ribossomo e constituem os alvos de antibióticos que inibem a tradução. Os aminoglicosídios, a espectinomicina e as tetraciclinas ligam-se ao rRNA 16S na subunidade 30S, inibindo a sua atividade. Os macrolídios, o cloranfenicol, as lincosamidas, as estreptograminas e as oxazolidinonas ligam-se ao 23S na subunidade 50S, inibindo a sua atividade. A, sítio aminoacil (sítio de ligação aminoacil tRNA); P, sítio peptidil (sítio de ligação do tRNA que está unido de modo covalente à cadeia peptídica em alongamento). 552 | Capítulo Trinta e Dois 30S para formar o ribossomo 70S completo. Nesse estágio, a molécula fMet-tRNAf ocupa o sítio P do ribossomo 70S. O alongamento envolve a adição de aminoácidos à extre- midade carboxila da cadeia polipeptídica em crescimento, à medida que o ribossomo desloca-se da extremidade 5� para a extremidade 3� do mRNA que está sendo traduzido. As molécu- las de tRNA que transportam aminoácidos específicos (aminoa- cil tRNA) penetram no sítio A ribossômico e formam pares de bases com seus códons complementares no mRNA. A utilização do tRNA correto exige não apenas o reconhecimento anticódon- códon entre tRNA e mRNA, respectivamente, como também funções de decodificação desempenhadas pelo rRNA 16S na subunidade ribossômica 30S. A peptidil transferase, uma enzi- ma cuja atividade deriva do rRNA de 23S da subunidade 50S (i. é, a peptidiltransferase é uma ribozima), catalisa a formação de uma ligação peptídica entre o fMet e o aminoácido seguinte. A ligação peptídica une fMet ao próximo aminoácido, que, por sua vez, está ligado ao tRNA no sítio A (i. é, o tRNA no sítio A “aceitou” a fMET). Uma vez formada a ligação peptídica, o ribossomo avança três nucleotídios em direção à extremidade 3� do mRNA. Nesse processo, o tRNAf, que estava original- mente ligado à fMet, é ejetado do sítio P (e liga-se ao sítio E), o tRNA que está agora ligado a dois aminoácidos desloca-se do sítio A para o sítio P desocupado, o sítio A torna-se dispo- nível, e o peptídio em crescimento emerge do túnel de saída do ribossomo. Esse processo é conhecido como translocação. Dessa maneira, o alongamento da cadeia polipeptídica resulta de múltiplos ciclos de ligação de aminoacil tRNA ao sítio A, formação de ligação peptídica e translocação. Durante o processo de terminação, proteínas específicas, denominadas fatores de liberação, reconhecem o códon de terminação no sítio A e ativam a liberação da proteína recém- sintetizada e a dissociação do complexo ribossoma–mRNA. Em pelo menos alguns casos, esse processo parece envolver um mimetismo estrutural dos tRNA pelos fatores de liberação. Convém ressaltar três aspectos gerais relativos à tradução nas bactérias. Em primeiro lugar, as duas subunidades ribos- sômicas demonstram funções segregadas: a subunidade 30S é responsável pela decodificação exata da mensagem do mRNA, enquanto a subunidade 50S catalisa a formação das ligações peptídicas. Entretanto, a translocação parece envolver ambas as subunidades. Em segundo lugar, o mecanismo catalítico reside no componente de RNA do ribossomo, e não nas proteínas ribossômicas. Em outras palavras, é o rRNA que “executa o trabalho”. Em terceiro lugar, os inibidores da síntese protéica bloqueiam o processo de tradução em diferentes etapas. CLASSES E AGENTES FARMACOLÓGICOS A elucidação dos mecanismos de ação dos agentes descritos adiante teve essencialmente como base o campo da genética bacteriana. Em particular, os alvos moleculares dos antibióticos foram identificados a partir do isolamento de bactérias resis- tentes a determinado antibiótico (p. ex., rifampicina), seguido da demonstração de que a molécula-alvo (p. ex., RNA polime- rase) exibe resistência bioquímica ao antibiótico e, por fim, de que a mutação causadora da resistência a fármaco reside no gene que codifica o alvo. Pesquisas mais recentes, utilizando a espectroscopia de ressonância magnética nuclear e a cris- talografia de raio X, elucidaram ainda mais as estruturas dos alvos, bem como a natureza molecular das várias interações fármaco-alvo. fMet-tRNA mRNA tRNA fMet Complexo de iniciação Ribossomo 70S tRNA carregado Aminoácido Ligação do tRNA Oxazolidinonas? (50S, Sítio P) + 50S 30S tRNA carregado P A P A P A P A Tetraciclinas (30S) Aminoglicosídios (30S) Cloranfenicol (50S, sítio A) Lincosamidas (50S, sítios A e P) Espectinomicina (30S) Oxazolidinonas? (50S, sítio P) Macrolídios (50S, túnel de saída) Estreptograminas Decodificação Formação da ligação peptídica Translocação e movimento do peptídio (saída) Ligação do tRNA Fig. 32.7 Tradução procariótica. A tradução procariótica começa com a montagem de um complexo contendo uma subunidade ribossômica 30S, mRNA, tRNA ligado à formil-metionina (fMet-tRNA) e uma subunidade ribossômica 50S. Esta etapa de montagem depende da ligação do fMet- tRNA a um códon iniciador no mRNA. O ribossomo 70S, após o processo de montagem, contém dois sítios de ligação, designados como sítios aminoacil (A) e peptidil (P). O sítio A recebe os códons tripleto de mRNA que chegam e permite a ligação do tRNA ligado ao aminoácido correspondente (i. é, tRNA carregado) a seu respectivo tripleto. A função decodificadora do rRNA 16S ajuda a assegurar a ligação do códon do mRNA ao tRNA correto. Após a entrada de tRNA carregado no sítio A, a atividade de peptidiltransferase do rRNA 23S catalisa a formação de uma ligação peptídica entre o aminoácido que ocupa o sítio A e a extremidade carboxi-terminal do peptídio nascente que se encontra no sítio P. Uma vez formada a ligação peptídica, o complexo tRNA–mRNA é translocado do sítio A para o sítio P, a molécula de tRNA que ocupou o sítio P dissocia-se deste sítio, e a cadeia polipeptídica em alongamento desloca-se através do túnel de saída. Nesse estágio, o sítio A está vazio e a introdução da próxima molécula de tRNA carregada no sítio A completa o sítio. A tradução prossegue até que um códon de terminação seja encontrado no mRNA, quando a proteína recém-sintetizada é então liberada do ribossomo. Os agentes farmacológicos que inibem a tradução interferem nas atividades do ribossomo procariótico. Os aminoglicosídios ligam-se ao rRNA na subunidade 30S e permitem a ligação de tRNA incorretos ao mRNA; as tetraciclinas bloqueiam a ligação do aminoacil-tRNA ao sítio A; o cloranfenicol e as lincosamidas inibem a atividade de peptidil transferase da subunidade 50S. A espectinomicina, os macrolídios e as estreptograminas inibem a translocação dos peptídios. Os mecanismos de ação das oxazolidinonas são incertos, porém alguns sítios possíveis de ação estão indicados. Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA | 553 INIBIDORES DAS TOPOISOMERASES: Quinolonas As quinolonas constituem uma importante classe de antibióti- cos bacterianos, que atuam através da inibição das topoisome- rases tipo II bacterianas. Uma das primeiras quinolonas de uso clínico foi o ácido nalidíxico (Fig. 32.8), e o mecanismo de ação das quinolonas foi elucidado, em grande parte, através do estudo desse fármaco. As quinolonas mais recentemente introduzidas são, em sua maioria, fluoradas, incluindo o cipro- floxacino, o ofloxacino e o levofloxacino. Estas quinolonas e outras quinolonas fluoradas (fluoroquinolonas) são identifi- cadas pelos seus nomes genéricos, que tipicamente terminam com “floxacino” (Fig. 32.8). As fluoroquinolonas são ampla- mente utilizadas no tratamento de infecções urogenitais, respi- ratórias e gastrintestinais comuns causadas por microrganismos Gram-negativos, incluindo E. coli, Klebsiella pneumoniae, Campylobacter jejuni, Pseudomonas aeruginosa, Neisseria gonorrhoeae e Enterobacter, Salmonella e espécies de Shi- gella. Tipicamente, as bactérias desenvolveram resistência às quinolonas através de mutações cromossômicas nos genes que codificam as topoisomerases tipo II ou através de alterações na expressão das purinas e bombas de efluxo das membranas que determinam a concentração de fármaco no interior das bacté- rias. Os efeitos adversos, que são infreqüentes, podem incluir náusea, vômitos e diarréia. As quinolonas atuam através da inibição de uma ou de ambas as topoisomerases tipo II procarióticas em bactérias sensíveis, a DNA girase (topoisomerase II) e a topoisomerase IV. A seletividade de ação contra as topoisomerases bacterianas resulta de diferenças na estrutura entre as formas procarióticas e eucarióticas dessas enzimas. As quinolonas inibem primariamen- te a DNA girase nos microrganismos Gram-negativos e também inibem a topoisomerase IV nos microrganismos Gram-positivos, como Staphylococcus aureus. Como o S. aureus resistente é dis- seminado, as quinolonas são menos efetivas no tratamento das infecções causadas por essa espécie de bactéria. Por conseguinte, essa classe de fármacos é utilizada com mais freqüência no tra- tamento de infecções por microrganismos Gram-negativos. O mecanismo de ação das quinolonas envolve a subversão da função das topoisomerases tipo II procarióticas. Normal- mente, as topoisomerases II ligam-se a ambas as fitas de uma molécula de DNA e as quebram, permitindo que outro frag- mento da mesma molécula passe através da quebra do DNA de dupla fita (Fig. 32.4). As quinolonas inibem essas enzimas antes que o segundo segmento de DNA possa passar, estabilizando, assim, a forma do complexo em que houve quebra do políme- ro do DNA. As quinolonas, quando presentes em baixas con- centrações, inibem reversivelmente as topoisomerases tipo II, sendo a sua ação bacteriostática. Entretanto, quando presentes em altas concentrações — que são rapidamente alcançadas nos pacientes tratados — as quinolonas convertem as topoisome- rases em agentes que lesam o DNA ao estimular a dissociação das subunidades da enzima do DNA quebrado. O DNA com dupla quebra não pode ser replicado, e não pode haver transcri- ção através dessas quebras. A dissociação da topoisomerase do DNA e/ou a resposta bacteriana à quebra de dupla fita levam finalmente à morte celular. Por conseguinte, as quinolonas em doses terapêuticas são antibióticos bactericidas. INIBIDORES DA TRANSCRIÇÃO: Derivados da Rifamicina A rifampicina e seu derivado estrutural, a rifabutina, são dois derivados semi-sintéticos do antibiótico de ocorrência natural, a rifamicina B (Fig. 32.8). Embora a rifampicina possa ser utilizada para profilaxia da doença meningocócica e tratamento de algumas outras infecções bacterianas, seu prin- cipal uso é no tratamento da tuberculose e de outras infecções micobacterianas. A rifampicina mostra-se particularmente efetiva contra micobactérias que residem em fagossomos, visto que é bactericida para bactérias tanto intracelulares quanto extracelulares. Além disso, a rifampicina aumenta a atividade in vitro da isoniazida, outro fármaco de primeira N OH OH OH N CH3COO CH3O OH O O OH O O N COOH O N COOHF N HN O N N NH OH OH O CH3COO CH3O N O O OH O O NH N NH Ácido nalidíxico Ciprofloxacina Rifampicina Rifabutina Fig. 32.8 Estruturas dos agentes antimicrobianos cujos alvos consistem nas topoisomerases e transcrição bacterianas. O ácido nalidíxico e o ciprofloxacino são antibióticos da quinolona que inibem as topoisomerases tipo II bacterianas. A rifampicina e a rifabutina inibem a RNA polimerase DNA-dependente bacteriana. usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight 554 | Capítulo Trinta e Dois linha utilizado na terapia de combinação da tuberculose (ver Caps. 33 e 39). A rifampicina exerce sua atividade bactericida através da for- mação de um complexo estável com a RNA polimerase DNA- dependente bacteriana, inibindo, assim, a síntese de RNA. O alvo da rifampicina é a subunidade � da RNA polimerase bac- teriana. O fármaco permite o início da transcrição mas bloqueia, em seguida, o alongamento quando o RNA nascente atinge um comprimento de 2 a 3 nucleotídios. O mecanismo exato desse processo ainda não foi totalmente elucidado; no caso de certas RNA polimerases bacterianas há evidências de que a rifampicina provoca oclusão da via pela qual o RNA nascente emerge da enzima. A rifampicina exibe uma alta seletividade para as bac- térias, visto que as polimerases dos mamíferos (até mesmo as das mitocôndrias, que são consideradas semelhantes às dos pro- cariotas) são inibidas pela rifampicina apenas em concentrações muito mais altas. Por conseguinte, a rifampicina é geralmente bem tolerada, e a incidência de efeitos adversos (tipicamente exantema, febre, náusea, vômitos e icterícia) é baixa. Como o rápido desenvolvimento de resistência torna a monoterapia da tuberculose não apenas ineficaz mas também contraproducente, a rifampicina é administrada em associação com outros fármacos antituberculose. Experimentos in vitro mostraram que um em cada 106 a 108 bacilos da tuberculose pode desenvolver resistência à rifampicina através de um pro- cesso de mutação em uma etapa, que parece ocorrer no sítio de ligação do fármaco sobre a polimerase. Entretanto, como componente de um esquema terapêutico de múltiplos fármacos, a rifampicina pode reduzir acentuadamente a taxa de reativação da tuberculose latente (ver Cap. 39). INIBIDORES DA TRADUÇÃO Três considerações gerais aplicam-se aos inibidores da tradução bacteriana. Em primeiro lugar, o alvo dos inibidores da tradução é a subunidade 30S ou 50S do ribossomo bacteriano. Embora os detalhes possam ser confusos, como no caso da nova classe de oxazolidinonas, a discussão dos inibidores da tradução que se segue é apresentada em termos de inibição da 30S versus 50S (Quadro 32.1). O segundo aspecto a ser considerado é a seletividade. Além de seus efeitos inibitórios sobre os ribossomos bacterianos, os inibidores da síntese protéica podem afetar os ribossomos mitocondriais ou os ribossomos citosólicos de mamíferos ou ambos. A inibição dos ribossomos do hospedeiro constitui um mecanismo comum pelo qual esses fármacos provocam efeitos adversos. Para alguns antibióticos, como o cloranfeni- col, a inibição dos ribossomos dos mamíferos representa uma grande desvantagem, podendo levar a efeitos adversos graves e até mesmo letais. As tetraciclinas também podem inibir os ribossomos de mamíferos in vitro; todavia, felizmente, essa classe de fármacos concentra-se seletivamente nas células bac- terianas. Alguns outros inibidores da tradução exercem pouca ou nenhuma inibição sobre os ribossomos de mamíferos em concentrações clinicamente importantes; para esses agentes, as toxicidades que limitam a dose prescrita parecem ser atribuíveis a outros mecanismos. A exemplo da maioria dos antibióticos de amplo espectro disponíveis por via oral, os efeitos adver- sos gastrintestinais parecem ser devidos à eliminação da flora intestinal normal. Uma mudança singular e interessante na questão da sele- tividade surgiu na década de 1990. Foi descoberto que certos antibióticos aminoglicosídios, macrolídios e lincosamidas exi- bem uma certa eficácia contra microrganismos eucarióticos (p. ex., protozoários parasitas) que causam infecções oportunistas em pacientes com AIDS e em outros indivíduos imunocompro- metidos. Nesses microrganismos, parece que a atividade dos antibióticos pode ser atribuída à inibição da síntese protéica das organelas no microrganismo (ver Cap. 35). O terceiro aspecto a considerar é que a inibição completa da síntese protéica não é suficiente para matar uma bactéria. As bactérias são capazes de gerar diversas respostas a vários tratamentos supressores do crescimento, que permitem a sua permanência em um estado dormente até a interrupção do tra- tamento. Uma dessas respostas permite que a bactéria sobreviva à inibição completa da síntese protéica. Em conseqüência, os inibidores da síntese protéica são, em sua maioria, bacterios- táticos. Os aminoglicosídios constituem a principal exceção a essa regra. QUADRO 32.1 Locais e Mecanismos de Ação dos Antibacterianos Inibidores da Tradução FÁRMACO OU CLASSE DE FÁRMACOS LOCAL DE AÇÃO MECANISMO DE AÇÃO Fármacos dirigidos contra a subunidade ribossômica 30S Aminoglicosídios rRNA 16S Induzem uma leitura incorreta; interrompem a síntese protéica em concentrações mais altas Espectinomicina rRNA 16S Inibe a translocação Tetraciclinas rRNA 16S Bloqueiam a ligação de aminoacil tRNA ao sítio A Fármacos dirigidos contra a subunidade ribossômica 50S Macrolídios rRNA 23S Inibem a translocação Cloranfenicol rRNA 23S Inibe a peptidil transferase ao interferir no posicionamento do tRNA Lincosamidas rRNA 23S Inibem a peptidil transferase ao bloquear a cadeia polipeptídica em crescimento e ao inibir o sítio A e o sítio P Estreptograminas rRNA 23S Inibem a peptidil transferase; provável superposição com o mecanismo de ação dos macrolídios Oxazolidinonas rRNA 23S? Ainda não conhecido Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA | 555 Agentes Antimicrobianos Dirigidos Contra a Subunidade Ribossômica 30S Aminoglicosídios Os aminoglicosídios são utilizados principalmente no trata- mento de infecções causadas por bactérias Gram-negativas. Esses agentes são moléculas de carga elétrica que não apre- sentam biodisponibilidade oral, de modo que devem ser admi- nistrados por via parenteral. Os aminoglicosídios incluem a estreptomicina (o primeiro aminoglicosídio, descoberto em 1944), a neomicina, a kanamicina, a tobramicina, a paro- momicina, a gentamicina, a netilmicina e a amicacina (Fig. 32.9). Entre esses aminoglicosídios, a gentamicina, a tobrami- cina e a amicacina são os mais amplamente utilizados, em vir- tude de sua menor toxicidade e cobertura mais ampla contra os microrganismos-alvo. (Entretanto, até mesmo esses agen- tes carecem de atividade contra anaeróbios e muitas bactérias Gram-positivas.) Os aminoglicosídios ligam-se ao rRNA 16S da subunidade 30S e produzem efeitos sobre a síntese protéica que depen- dem da concentração do fármaco. Os aminoglicosídios, quando presentes em baixas concentrações, induzem os ribossomos a efetuar uma leitura incorreta do mRNA durante o alongamento, levando à síntese de proteínas que contêm aminoácidos incorre- tos. É lógico deduzir, a partir desse efeito, que os aminoglicosí- dios interferem na função da subunidade 30S de decodificação do mRNA. (Com efeito, estruturas cristalinas de complexos de 30S-aminoglicosídio ajudaram enormemente a elucidar o processo de decodificação.) O modo pelo qual os aminogli- cosídios afetam o processo de decodificação está mais bem esclarecido no caso da paromomicina, cuja ligação provoca uma mudança de conformação que imita a alteração causada pela ligação correta de um anticódon de tRNA a um códon de mRNA. Acredita-se que essa mudança de conformação faça com que a subunidade 30S sinalize a subunidade 50S a for- mar uma ligação peptídica, mesmo na presença do tRNA no sítio A. (A estreptomicina também induz uma leitura incorreta; todavia, acredita-se que isso ocorre através de um mecanismo diferente.) Em concentrações mais altas, os aminoglicosídios inibem a síntese protéica por completo. Ainda não foi elucida- do o mecanismo exato desse processo; todavia, os ribossomos ficam retidos nos códons de iniciação AUG do mRNA. Por fim, o acúmulo desses complexos de iniciação anormais interrompe a tradução, a despeito da presença de ribossomos que não estão ligados ao fármaco. Ao contrário de outros inibidores da síntese protéica, os ami- noglicosídios são bactericidas. Essa característica é importante no tratamento das infecções graves. Embora não se conheça o mecanismo preciso para a atividade bactericida, um modelo interessante, desenvolvido pelo falecido Bernard Davis, teve certa aceitação (Fig. 32.10). O modelo de Davis concebe a ocorrência de morte celular em termos dos efeitos dependen- tes da concentração de aminoglicosídios. Quando o fármaco penetra inicialmente na célula, é precariamente transportado através das membranas bacterianas. Nessas concentrações bai- xas iniciais, ocorre uma leitura incorreta, levando à síntese de proteínas aberrantes. Algumas dessas proteínas são inseridas nas membranas e determinam a formação de poros, permi- tindo o fluxo dos aminoglicosídios para o interior da célula, onde interrompem por completo a síntese de proteínas. Em conseqüência, não pode haver reparo da lesão da membrana, e o extravasamento de íons e, posteriormente, de moléculas maiores leva à morte da célula. Outro aspecto importante da atividade dos aminoglicosídios é que esses fármacos atuam de modo sinérgico com outros agentes, como os �-lactâmicos, que inibem a síntese da parede NH NH HN HO HO HO HO HO HO HO HO NH H N H OH H O HO CHO O NH OH OH OH HO HO HO HO O O NH2 H2N H2N H2N NH2 NHCH3 NHCH3 NH2 O O O O O O O OOH OH OH OH OH N H H NH2 O O OOH OH OH OH OH N H H NH2 O O O O OH OH OH OH NN H H H N N H O O Estreptomicina Espectinomicina Doxiciclina Gentamicina A Tetraciclina Tigeciclina Fig. 32.9 Estruturas dos agentes antimicrobianos dirigidos contra as subunidades ribossômicas 30S. A estreptomicina e a gentamicina são aminoglicosídios. A espectinomicina é um derivado estrutural dos amino- glicosídios. A tetraciclina e a doxiciclina são tetraciclinas. A tigeciclina é uma glicilciclina. usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight 556 | Capítulo Trinta e Dois celular. Por conseguinte, os aminoglicosídios e os �-lactâmicos são comumente utilizados em combinação (ver Cap. 39). A explicação mais comumente sugerida para esse sinergismo é que a inibição da síntese da parede celular aumenta a entrada de aminoglicosídios nas bactérias. O sinergismo entre os �-lac- tâmicos e os aminoglicosídios contrasta acentuadamente com o antagonismo entre os �-lactâmicos e os inibidores bacterios- táticos da síntese protéica, discutidos adiante. Foram estabelecidos três mecanismos gerais para a resistên- cia aos aminoglicosídios. O primeiro deles, que é clinicamente mais comum, consiste na produção codificada por plasmídios de uma enzima transferase ou enzimas que inativam os amino- glicosídios através de adenilação. Em segundo lugar, a entrada do fármaco na célula pode ser dificultada, talvez pela alteração ou eliminação das purinas ou de outras proteínas envolvidas no transporte do fármaco. No terceiro mecanismo, o alvo do fár- maco na subunidade ribossômica 30S pode tornar-se resistente à ligação do fármaco, devido a uma mutação ou à atividade de uma enzima codificada por plasmídio. Além de vários tipos gerais de toxicidade, como reações de hipersensibilidade e febre induzida por fármacos, os aminogli- cosídios podem causar três efeitos adversos específicos: oto- toxicidade, nefrotoxicidade e bloqueio neuromuscular. Desses efeitos adversos, a ototoxicidade (que se manifesta na forma de lesão auditiva ou vestibular) é o único fator mais importante que restringe o uso dos aminoglicosídios. Há evidências excelentes de que a ototoxicidade é causada pela inibição dos ribossomos mitocondriais do hospedeiro pelos aminoglicosídios. Sabe-se que esses fármacos acumulam-se na perilinfa e na endolinfa da orelha interna e que, em altas concentrações, provocam lesão das células ciliadas altamente sensíveis. Os aminoglicosídios também podem provocar insuficiência renal aguda, aparen- temente em conseqüência do acúmulo do fármaco nas células tubulares proximais. A bioquímica envolvida nessa toxicidade é pouco compreendida, embora haja suspeita de intoxicação mitocondrial e perturbação da membrana plasmática. Os ami- noglicosídios, quando presentes em concentrações muito altas, podem provocar bloqueio neuromuscular não-despolarizante, causando potencialmente paralisia respiratória. Acredita-se que esse efeito resulta da competição do fármaco com o cálcio nos sítios pré-sinápticos, resultando em diminuição da liberação de acetilcolina, incapacidade de despolarização da placa terminal pós-sináptica e paralisia muscular. Espectinomicina A espectinomicina é um derivado estrutural dos aminogli- cosídios que também se liga ao rRNA 16S da subunidade ribossômica 30S (embora numa localização diferente do sítio de ligação dos aminoglicosídios). A espectinomicina permite a formação do complexo 70S, porém inibe a translocação. Ao contrário dos aminoglicosídios, a espectinomicina não induz uma leitura incorreta de códons e não é bactericida. A es pectinomicina é administrada por via parenteral e é utilizada clinicamente apenas como terapia alternativa para infecções gonorréicas. Tetraciclinas e Glicilciclinas As tetraciclinas vêm sendo utilizadas clinicamente há muitos anos. Nos Estados Unidos, dispõe-se de sete tetraciclinas: a clortetraciclina, a oxitetraciclina, a tetraciclina, a demeclo- Parede celular Aminoglicosídio Poro da membrana (proteína anormal) “Monossomo” de aminoglicosídio (não-funcional) Polissomo Incorporação de aminoácidos incorretos Membrana interna Membrana externa B C D A Fig. 32.10 O modelo de Davis explica a atividade bactericida dos aminoglicosídios. De acordo com o modelo de Davis de ação dos aminoglicosídios, esses fármacos, quando presentes em baixas concentrações, induzem uma leitura incorreta das proteínas, e essas proteínas de leitura incorreta (anormais) permitem a entrada de concentrações mais altas de aminoglicosídios na célula que interrompem a síntese protéica. A. Inicialmente, os aminoglicosídios estão presentes em baixas concentrações no interior da célula bacteriana, apesar das concentrações extracelulares terapêuticas (altas) do fármaco, visto que as moléculas do fármaco exibem pouca captação através das membranas bacterianas. B. Os aminoglicosídios em baixas concentrações intracelulares ligam-se aos ribossomos bacterianos e induzem a incorporação de aminoácidos incorretos (leitura incorreta) nos polipeptídios nascentes. C. As proteínas anormais são inseridas nas membranas bacterianas, formando poros e causando lesão da membrana. D. As membranas lesadas permitem o afluxo de moléculas adicionais de aminoglicosídios na célula, causando inibição completa da atividade dos ribossomos. O efeito é irreversível, talvez devido à retenção do fármaco no interior da célula (“aprisionamento”). Não pode haver reparo da lesão da membrana, visto que novas proteínas não podem ser sintetizadas, levando à morte da célula. Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA | 557 ciclina, a metaciclina, a doxiciclina e a minociclina. Todas estão estreitamente relacionadas em termos estruturais e podem ser consideradas como grupo. As diferenças na sua eficácia clínica são mínimas e relacionam-se, em grande parte, com a farmacocinética de absorção, distribuição e excreção de cada fármaco. As tetraciclinas são antibióticos bacteriostáticos de amplo espectro amplamente utilizados. As tetraciclinas ligam-se de modo reversível ao rRNA 16S da subunidade 30S e inibem a síntese protéica através do blo- queio da ligação do aminoacil tRNA ao sítio A sobre o com- plexo mRNA-ribossomo. Essa ação impede a adição de outros aminoácidos ao peptídio nascente. Entretanto, a inibição da síntese protéica não explica totalmente a alta seletividade das tetraciclinas para bactérias, visto que esses fármacos também podem interromper a síntese protéica eucariótica in vitro em concentrações não muito mais elevadas. Na verdade, a elevada seletividade das tetraciclinas provém do acúmulo ativo desses fármacos nas bactérias, mas não nas células dos mamíferos. As tetraciclinas penetram nas bactérias Gram-negativas por difusão passiva através de proteínas, denominadas porinas, na membrana externa, seguidas de transporte ativo (dependente de energia) através da membrana citoplasmática interna. A cap- tação nas bactérias Gram-positivas, como Bacillus anthracis (o agente etiológico do antraz), ocorre de modo semelhante através de um sistema de transporte dependente de energia. Em contrapartida, as células dos mamíferos carecem do sistema de transporte ativo encontrado nas bactérias suscetíveis. Como a seletividade bacteriana das tetraciclinas resulta de mecanismos de concentração do fármaco, conclui-se que a resistência pode surgir através de um aumento no efluxo do fármaco ou através de uma redução de seu influxo. Com efeito, as bombas de efluxo codificadas por plasmídios representam o mecanismo mais disseminado empregado pelos microrganis- mos resistentes às tetraciclinas. Uma segunda forma de resis- tência surge através da produção de proteínas que interferem na ligação das tetraciclinas ao ribossomo. Um terceiro mecanismo consiste na inativação enzimática das tetraciclinas. Uma importante característica farmacocinética das tetraci- clinas consiste na interação desses fármacos com alimentos ricos em cálcio, como laticínios, e com medicamentos que contêm cátions divalentes e trivalentes, como os antiácidos. Como esses produtos e medicamentos comprometem a absor- ção das tetraciclinas, esses fármacos são geralmente tomados com estômago vazio. Entretanto, quando as tetraciclinas já se encontram na circulação, a mesma interação com cátions — em particular com o cálcio — pode causar seqüestro do fármaco no osso e nos dentes, levando potencialmente ao aparecimento de anormalidades de desenvolvimento em pacientes pediátricos. Os dentes também podem ficar pigmentados, devido às pro- priedades de absorção da luz ultravioleta (UV) das tetraciclinas; além disso, esses fármacos podem causar fotossensibilidade cutânea significativa. A toxicidade renal e o distúrbio gastrintestinal constituem os dois efeitos adversos mais problemáticos das tetraciclinas, e a ocorrência de náusea e vômitos é a razão mais comum da interrupção prematura de um curso de tetraciclina. Todas as tetraciclinas são excretadas tanto na urina quanto na bile, sendo a urina a principal via para a maioria dos fármacos dessa classe. Em comparação com as outras tetraciclinas, uma fração menor da doxiciclina é eliminada pelos rins, tornando esse fármaco mais seguro para uso em pacientes com insuficiência renal. Além disso, a doxiciclina é excretada nas fezes, em grande parte numa forma inativa, de modo que esse fármaco tem a vantagem adicional de alterar ao mínimo a flora intestinal. Por conseguinte, o uso da doxiciclina está associado a uma menor incidência de náusea, vômitos e superinfecção por microrganis- mos patogênicos em comparação com as outras tetraciclinas, sobretudo em pacientes imunocomprometidos. A tigeciclina (Fig. 32.9) é o primeiro membro de uma nova classe de antibióticos: as glicilciclinas. Este antibiótico foi aprovado para uso em 2005. A estrutura de quatro anéis da tigeciclina assemelha-se àquela das tetraciclinas. A tigeciclina possui amplo espectro de atividade e foi aprovada para admi- nistração intravenosa no tratamento de infecções cutâneas e abdominais graves. Agentes Antimicrobianos Dirigidos Contra a Subunidade Ribossômica 50S Os antibióticos mais extensamente estudados que atuam sobre a subunidade 50S como alvo (i. é, os macrolídios, o cloranfenicol e as lincosamidas) ligam-se a uma pequena região do rRNA 23S próximo ao centro ativo da peptidil transferase. Pequenas diferenças nos seus sítios de ligação podem ser responsáveis por diferenças nos mecanismos detalhados de ação. Macrolídios e Cetolídios Os macrolídios são assim denominados pelos seus grandes anéis de lactona, aos quais estão fixados um ou mais desoxiaçúcares (Fig. 32.11). A eritromicina é o membro mais bem conhecido desse grupo. Dois derivados semi-sintéticos da eritromicina, a azitromicina e a claritromicina, possuem espectro mais amplo do que a eritromicina, de modo que o seu uso está crescendo. Os macrolídios mostraram-se particularmente importantes no tratamento de infecções pulmonares, incluindo a doença dos Legionários. Esses agentes exibem excelente penetração no tecido pulmonar e possuem atividade intracelular igualmente importante contra Legionella. Os macrolídios são antibióticos bacteriostáticos que blo- queiam a etapa de translocação da síntese protéica ao atuar sobre o alvo do rRNA 23S da subunidade 50S. Os macrolídios ligam- se a um segmento específico rRNA 23S e bloqueiam o túnel de saída a partir do qual emergem os peptídios nascentes. O uso dos macrolídios é complicado pelo problema da resis- tência, que é habitualmente codificada por plasmídios. Um mecanismo empregado pelas cepas resistentes (p. ex., Entero- bacteriaceae) consiste na produção de esterases que hidrolisam os macrolídios. A modificação do sítio de ligação ribossômico por mutação cromossômica representa um segundo mecanis- mo de resistência. Algumas bactérias reduzem a permeabili- dade de sua membrana aos macrolídios ou (mais comumente) aumentam o efluxo ativo do fármaco. A produção de metilase responde pela maior parte da resistência a macrolídios obser- vada em microrganismos Gram-positivos. A metilase modifica o alvo ribossômico dos macrolídios, resultando em diminuição da ligação do fármaco. A produção constitutiva de metilase tam- bém confere resistência a compostos estruturalmente não-rela- cionados, porém semelhantes quanto a seu mecanismo, como a clindamicina e a estreptogramina B (ver discussão adiante). As reações adversas à eritromicina tipicamente envolvem o trato gastrintestinal ou o fígado. A intolerância gastrintestinal representa o motivo mais freqüente pela interrupção do fárma- co, visto que a eritromicina pode estimular diretamente a moti- lidade intestinal e causar náusea, vômitos, diarréia e, algumas vezes, anorexia. A eritromicina também pode produzir hepatite colestática aguda (com febre, icterícia e comprometimento da função hepática), provavelmente como reação de hipersensi- usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight 558 | Capítulo Trinta e Dois bilidade. Os metabólitos da eritromicina podem inibir certas isozimas do citocromo P450 no fígado, aumentando, assim, a concentração plasmática de numerosos fármacos que também são metabolizados por essas enzimas hepáticas. Em geral, a azitromicina e a claritromicina são bem toleradas, embora esses fármacos também possam causar comprometimento hepático. A telitromicina, um terceiro derivado semi-sintético da eritromicina, foi aprovada pela FDA em 2004. Formalmente mais conhecida como cetolídio do que como macrolídio, a telitromicina possui um mecanismo de ação semelhante aos dos macrolídios, porém com maior afinidade pela subunidade ribossômica 50S, em virtude de sua capacidade de ligar-se a um sítio adicional no rRNA 23S. Esta maior afinidade permite o uso da telitromicina no tratamento de infecções causadas por certas cepas bacterianas que são resistentes aos macrolídios. À semelhança da eritromicina, a telitromicina pode estar envolvi- da em numerosas interações medicamentosas, e foram relatados casos raros de necrose hepática fulminante. Cloranfenicol O cloranfenicol é um antibiótico de amplo espectro bacteriostático, ativo contra microrganismos Gram-positivos e Gram-ne gativos tanto aeróbicos quanto anaeróbicos. Os microrganismos mais altamente suscetíveis incluem Haemophilus influenzae, Neis- seria meningitidis e algumas cepas de Bacteroides. Todavia, o potencial de toxicidade grave limitou o uso sistêmico do cloranfenicol. O fármaco continua sendo utilizado em certas ocasiões no tratamento da febre tifóide, meningite bacteriana e ricketsioses, porém apenas quando não se dispõe de alternativas mais seguras, como no caso de resistência ou alergia grave a fármacos. O cloranfenicol liga-se ao rRNA 23S e inibe a formação das ligações peptídicas, aparentemente ao ocupar um sítio que interfere no posicionamento correto do aminoacil do tRNA no sítio A. Os microrganismos desenvolveram resistência ao cloran- fenicol através de dois mecanismos principais. Surgiu uma resistência de baixo nível em grandes populações sensíveis ao cloranfenicol através da seleção de mutantes com permeabili- dade diminuída ao fármaco. O tipo mais clinicamente signifi- cativo de resistência ao cloranfenicol surgiu em decorrência da disseminação de acetiltransferases específicas codificadas por plasmídios (das quais foram caracterizados pelo menos três tipos), que inativam o fármaco. O2N CH3 CH3 CH H H H SCH3 OH OH H Cl CH3CH2CH2 H H C NH CH O HO H NH O O O O O HO O O O CHCl2 HO HO OH OH N OH O O O O O OH OH O HN F O O OH N S N O O O O O O O O O N O H N N S N N N N HN N O O N N O H N N NO O Cloranfenicol Clindamicina Linezolida Eritromicina A Quinupristina Dalfopristina Fig. 32.11 Estruturas dos agentes antimicrobianos cujo alvo é a subunidade ribossômica 50S. O cloranfenicol, a eritromicina (macrolídio), a clindamicina (lincosamida), a quinupristina (estreptogramina), a linezolida (oxazolidinona) e a dalfopristina (estreptogramina) inibem a tradução bacteriana ao atuar na unidade ribossômica 50S. usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA | 559 O mecanismo fundamental subjacente à toxicidade do clo- ranfenicol parece envolver a inibição da síntese protéica mito- condrial. Uma manifestação dessa toxicidade é a síndrome do bebê cinzento, que pode ocorrer quando se administra clo- ranfenicol em altas doses a recém-nascidos. Como os recém- nascidos carecem de um mecanismo efetivo de conjugação com ácido glucurônico para a degradação e a destoxificação do cloranfenicol, o fármaco pode acumular-se até atingir níveis tóxicos e provocar vômitos, flacidez, hipotermia, pigmentação cinzenta, angústia respiratória e acidose metabólica. Com mais freqüência, o cloranfenicol provoca depressão reversível da eritro poiese relacionada com a dose e distúrbio gastrintestinal (náusea, vômitos e diarréia). A anemia aplásica, uma toxici- dade rara, porém potencialmente fatal, ocorre através de um mecanismo idiopático que não está relacionado com a dose. Os efeitos adversos que o cloranfenicol pode causar junta- mente com outros fármacos têm interesse especial. A exemplo dos macrolídios, o cloranfenicol aumenta as meias-vidas de certos fármacos, como a fenitoína e a varfarina, inibindo as enzimas do citocromo P450 que metabolizam esses fármacos. O cloranfenicol também antagoniza os efeitos bactericidas das penicilinas e dos aminoglicosídios, assim como outros inibido- res bacteriostáticos da síntese protéica microbiana. Lincosamidas A principal lincosamida de uso clínico é a clindamicina (Fig. 32.11). A clindamicina bloqueia a formação de ligações pep- tídicas, aparentemente através de interações com o sítio A (a exemplo do cloranfenicol) e o sítio P. As indicações mais importantes para a clindamicina consis- tem no tratamento das infecções anaeróbicas graves causadas por Bacteroides e tratamento de infecções mistas envolvendo outros anaeróbios. A clindamicina foi implicada como causa potencial da colite pseudomembranosa causada pela supe- rinfecção por Clostridium difficile. O C. difficile, um membro incomum da flora fecal normal, é selecionado durante a admi- nistração de clindamicina ou de outros antibióticos orais de amplo espectro. O C. difficile elabora uma citotoxina capaz de provocar colite, caracterizada por ulcerações da mucosa, diar- réia intensa e febre. Esse efeito adverso grave representa uma das principais preocupações com o uso da clindamicina. Estreptograminas Em 1999, a FDA aprovou o primeiro fármaco da classe de estrep- tograminas de inibidores da síntese protéica. Esse fármaco foi aprovado para o tratamento de infecções graves ou potencialmente fatais causadas por Enterococcus faecium ou Streptococcus pyo- genes resistentes à vancomicina. O fármaco consiste em uma mistura de duas substâncias químicas distintas: a dalfopristina, uma estreptogramina do grupo A, e a quinupristina, uma estrep- togramina do grupo B (Fig. 32.11). As estreptograminas inibem a síntese protéica através de sua ligação ao centro de peptidil transferase do rRNA 23S bacteriano. As mutações e as modifi- cações que afetam essa região podem conferir resistência. O sítio de ligação do componente B superpõe-se ao dos macrolídios, e, a exemplo destes últimos, acredita-se que as estreptograminas blo- queiam a emergência dos peptídios nascentes do ribossomo. O componente A pode inibir a peptidil transferase in vitro, porém não se sabe ao certo se o mecanismo é igual in vivo. As estreptograminas são notáveis entre os antibióticos diri- gidos para a 50S, visto que são bactericidas contra muitas espé- cies suscetíveis. Ainda não se tem uma explicação precisa para esse fenômeno; a hipótese atual é que, ao contrário dos outros antibióticos, cujo alvo é a subunidade 50S, as estreptograminas induzem uma mudança de conformação no ribossomo que só é reversível após dissociação da subunidade. Oxazolidinonas Em 2000, a FDA aprovou a linezolida (Fig. 32.11), o primeiro fármaco da classe das oxazolidinonas de agentes antibacterianos. A linezolida possui excelente atividade contra bactérias Gram- positivas resistentes a fármacos, incluindo S. aureus resistente à meticilina (SARM), estreptococo resistente à penicilina e entero- coco resistente à vancomicina (ERV). Embora o mecanismo pre- ciso de ação da linezolida permaneça incerto, o fármaco parece atuar na subunidade ribossômica 50S, visto que as mutações no rRNA 23S podem conferir resistência ao fármaco. n Conclusão e Perspectivas Futuras Diversas classes de antibióticos têm como alvo o mecanismo procariótico responsável pelos processos do dogma central, afe- tando a expressão dos genes bacterianos em múltiplas etapas. Esses fármacos demonstram, em sua maioria, uma ligação sele- tiva a enzimas ou RNA procarióticos e exibem relativamente poucos efeitos adversos. Entretanto, todos estão associados a algum grau de toxicidade, e alguns (p. ex., cloranfenicol) pos- suem uso clínico limitado, em virtude de seu potencial de cau- sar efeitos adversos potencialmente fatais. Várias dessas classes de antibióticos — as quinolonas, os derivados da rifamicina e vários dos inibidores da síntese protéica — são bactericidas, porém a maioria dos inibidores da síntese protéica é bacte- riostática. A resistência aos fármacos representa um problema sério e persistente para todos esses agentes. Embora o apare- cimento de resistência seja uma conseqüência esperada do uso de antibióticos, a administração criteriosa desses fármacos, as terapias com múltiplos fármacos e o desenvolvimento contínuo de novos agentes antibacterianos podem combater o desenvol- vimento da resistência. O desenvolvimento das novas classes dos inibidores ribossômicos bacterianos glicilciclina, estrepto- graminas e oxazolidinonas representa um importante progresso na pesquisa de fármacos efetivos contra bactérias resistentes. A maior elucidação do mecanismo de ação desses fármacos irá contribuir para a biologia básica da tradução e definir novos alvos bioquímicos para intervenção farmacológica. n Leituras Sugeridas Campbell EA, Korzheva N, Mustaev A, et al. Structural mecha- nism for rifampicin inhibition of bacterial RNA polymerase. Cell 2001;104:901–912. (Mecanismo de ação da rifampicina.) Ogle JM, Murphy FV, Tarry MJ, et al. Selection of tRNA by the ribosome requires a transition from an open to a closed form. Cell 2002;111:721–732. (Base estrutural do mecanismo de leitura erra- da do códon induzida por aminoglicosídeos.) Sabria M, Pedro-Botet ML, Gomez J, et al. Fluoroquinolones vs. macrolides in the treatment of Legionnaires ʼdisease. Chest 2005; 128:1401–1405. (Estudo prospectivo que sugere que as fluoroqui- nolonas sejam a classe de fármacos preferida para o tratamento das infecções causadas por Legionella.) Steitz TA, Moore PB. RNA, the first macromolecular catalyst: the ribosome is a ribozyme. Trends Biochem Sci 2003;28:411–418. (Revisão da função do RNA como alvo da ação de antibióticos na subunidade 50S.) Walsh CT. Antibiotics: Actions, Origins, Resistance. Washington, DC: ASM Press; 2003. (Revisão da síntese, da ação e dos mecanismos de resistência aos antibióticos.) usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight usuario Highlight 560 | Capítulo Trinta e Dois Re su m o Fa rm ac ol óg ic o Ca pí tu lo 3 2 Fa rm ac ol og ia d as I nf ec çõ es B ac te ria na s: R ep lic aç ão , T ra ns cr iç ão e T ra du çã o do D N A Fá rm ac o Ap lic aç õe s Cl ín ic as Ef ei to s Ad ve rs os G ra ve s e Co m un s Co nt ra -I nd ic aç õe s Co ns id er aç õe s Te ra pê ut ic as IN IB ID O RE S DA S TO PO IS O M ER AS ES : Q U IN O LO N AS M ec an is m o — I ni be m a s to po is om er as es t ip o II p ro ca ri ót ic as . E m c on ce nt ra çõ es t er ap êu tic as , a s qu in ol on as p os su em e fe ito b ac te ri ci da , v is to q ue c au sa m d is so ci aç ão d as t op oi so m er as es d o D N A r ot o, r es ul ta nd o em qu eb ra s de D N A d e fi ta d up la e m or te c el ul ar C ip ro fl ox ac in o G at if lo xa ci no L ev of lo xa ci no M ox if lo xa ci no N or fl ox ac in o O fl ox ac in o In fe cç õe s po r m ic ro rg an is m os G ra m -n eg at iv os L es ão d a ca rt il ag em , ru pt ur a de te nd õe s, n eu ro pa ti a pe ri fé ri ca , au m en to da p re ss ão i nt ra cr an ia na , co nv ul sõ es , re aç ão d e hi pe rs en si bi li da de g ra ve E xa nt em a, d is tú rb io g as tr in te st in al A dm in is tr aç ão c on co m ita nt e de tiz an id in a (c ip ro fl ox ac in o) R ea çõ es d e hi pe rs en si bi lid ad e às qu in ol on as A s ba ct ér ia s de se nv ol ve m r es is tê nc ia a tr av és d e m ut aç õe s cr om os sô m ic as n os g en es q ue c od if ic am a s to po is om er as es t ip o II o u at ra vé s de a lte ra çõ es n a ex pr es sã o da s po ri na s e bo m ba s de e fl ux o da m em br an a, q ue d et er m in am o s ní ve is d o fá rm ac o no i nt er io r da b ac té ri a E vi ta r a co -a dm in is tr aç ão d e tio ri da zi na , de vi do a o ri sc o au m en ta do d e ca rd io to xi ci da de ( pr ol on ga m en to Q T, t or sa de s de po in te s, p ar ad a ca rd ía ca ) IN IB ID O RE S DA T RA N SC RI Çà O M ec an is m o — F or m am u m c om pl ex o es tá ve l co m a R N A p ol im er as e D N A -d ep en de nt e ba ct er ia na , i ni bi nd o, a ss im , a s ín te se d e R N A R if ab ut in a R if am pi ci na Pr of ila xi a da d oe nç a m en in go có ci ca (r if am pi ci na ) In fe cç õe s m ic ob ac te ri an as , in cl ui nd o tu be rc ul os e Tr om bo ci to pe ni a, h ep at ot ox ic id ad e Pi gm en ta çã o da s al iv a, d as l ág ri m as , do su or e d a ur in a, d oe nç a de t ip o gr ip al , pr ov as d e fu nç ão h ep át ic a el ev ad as , di st úr bi o ga st ri nt es tin al In fe cç ão a tiv a po r N ei ss er ia m en in gi ti di s A r if am pi ci na n ão é u til iz ad a co m o ag en te i so la do , de vi do a o rá pi do d es en vo lv im en to d e re si st ên ci a A r if am pi ci na p od e di m in ui r a co nc en tr aç ão e a e fi cá ci a da ci cl os po ri na E vi ta r a ad m in is tr aç ão c on co m ita nt e de c la ri tr om ic in a e ri fa bu tin a, v is to q ue a c la ri tr om ic in a au m en ta a c on ce nt ra çã o pl as m át ic a de r if ab ut in a, e nq ua nt o es ta ú lti m a di m in ui a co nc en tr aç ão p la sm át ic a de c la ri tr om ic in a AG EN TE S AN TI M IC RO BI AN O S CU JO A LV O É A S U BU N ID AD E RI BO SS Ô M IC A 30 S M ec an is m o — L ig am -s e ao r R N A 1 6S d a su bu ni da de r ib os sô m ic a 30 S e pr ov oc am e fe ito s so br e a sí nt es e pr ot éi ca q ue d ep en de m d a co nc en tr aç ão . E ss es f ár m ac os s ão , e m s ua m ai or ia , b ac te ri os tá tic os . O s am in og lic os íd io s sã o ba ct er ic id as , d ev id o à in du çã o da l ei tu ra i nc or re ta d o m R N A ; a le itu ra i nc or re ta d o m R N A l ev a à sí nt es e de p ro te ín as a be rr an te s qu e sã o in se ri da s na m em br an a, f or m an do p or os q ue f in al m en te l ev am à m or te c el ul ar A m in og lic os íd io s: A m ic ac in a E st re pt om ic in a G en ta m ic in a K an am ic in a N eo m ic in a N et ilm ic in a P ar om om ic in a To br am ic in a In fe cç õe s gr av es p or m ic ro rg an is m os G ra m -n eg at iv os O to to xi ci da de , in su fi ci ên ci a re na l ag ud a, bl oq ue io n eu ro m us cu la r, pa ra li si a re sp ir at ór ia H ip er se ns ib ili da de a os am in og lic os íd io s A tu am d e m od o si né rg ic o co m o s an tib ió tic os � -l ac tâ m ic os Po de o co rr er r es is tê nc ia p or m ei o de t rê s m ec an is m os : 1. Pr od uç ão c od if ic ad a po r pl as m íd io s de u m a en zi m a tr an sf er as e ou e nz im as q ue i na tiv am o s am in og lic os íd io s 2. C om pr om et im en to d a en tr ad a do f ár m ac o, p os si ve lm en te at ra vé s de a lte ra çã o ou e lim in aç ão d e pu ri na s ou o ut ra s pr ot eí na s en vo lv id as n o tr an sp or te d e fá rm ac os 3. M ut aç ão d o al vo d o fá rm ac o na s ub un id ad e ri bo ss ôm ic a 30 S E sp ec ti no m ic in a G on or ré ia ( te ra pi a al te rn at iv a) D or n o lo ca l de i nj eç ão , ná us ea , to nt ur a, in sô ni a H ip er se ns ib ili da de à es pe ct in om ic in a Pe rm ite a f or m aç ão d o co m pl ex o 70 S, p or ém i ni be a tr an sl oc aç ão Te tr ac ic lin as : C lo rt et ra ci cl in a D em ec lo ci cl in a D ox ic ic lin a M et ac ic lin a M in oc ic lin a O xi te tr ac ic lin a Te tr ac ic lin a U til iz ad as n o tr at am en to d e um a va ri ed ad e de i nf ec çõ es , no ta ve lm en te aq ue la s ca us as p or C or yn eb ac te ri um ac ne s, H ae m op hi lu s in fl ue nz ae , Vi br io c ho le ra e, e sp ir oq ue ta s, M yc op la sm a pn eu m on ia e, e sp éc ie s de C hl am yd ia e e sp éc ie s de ri qu ét si as Pr of ila xi a da m al ár ia ( do xi ci cl in a) F on ta ne la a ba ul ad a, p ig m en ta çã o e hi po pl as ia d os d en te s e pa ra da te m po rá ri a do c re sc im en to , he pa to to xi ci da de , ps eu do tu m or c er eb ra l Fo to ss en si bi lid ad e, e xa nt em a, d is tú rb io ga st ri nt es tin al , di st úr bi o ve st ib ul ar (m in oc ic lin a) , in fe cç ão p or C an di da Se gu nd a m et ad e da g ra vi de z L ac tâ nc ia In fâ nc ia a té 8 a no s de i da de O s pa ci en te s co m g ra ve co m pr om et im en to r en al n ão de ve m s er t ra ta do s co m n en hu m a da s te tr ac ic lin as , ex ce to a do xi ci cl in a A s te tr ac ic lin as s ão t ra ns po rt ad as a tiv am en te n as c él ul as ba ct er ia na s O co rr e re si st ên ci a at ra vé s de b om ba s de e fl ux o co di fi ca da s po r pl as m íd io s, p ro du çã o de p ro te ín as q ue i nt er fe re m n a lig aç ão da s te tr ac ic lin as a o ri bo ss om o ou i na tiv aç ão e nz im át ic a da s te tr ac ic lin as A s te tr ac ic lin as d ev em s er t om ad as c om e st ôm ag o va zi o, v is to qu e os p ro du to s de c ál ci o in te rf er em n a ab so rç ão G lic ilc ic lin as : T ig ec ic lin a In fe cç ão c ut ân ea o u su bc ut ân ea In fe cç ão a bd om in al c om pl ic ad a D is tú rb io g as tr in te st in al H ip er se ns ib ili da de à t ig ec ic lin a E vi ta r a co -a dm in is tr aç ão c om a ci tr et in a, d ev id o ao r is co au m en ta do d e el ev aç ão d a pr es sã o in tr ac ra ni an a E st ru tu ra s em el ha nt e às t et ra ci cl in as Farmacologia das Infecções Bacterianas: Replicação, Transcrição e Tradução do DNA | 561 AG EN TE S AN TI M IC RO BI AN O S CU JO A LV O É A S U BU N ID AD E RI BO SS Ô M IC A 50 S M ec an is m o — L ig am -s e a um a pe qu en a re gi ão d o rR N A 2 3S d a su bu ni da de r ib os sô m ic a 50 S, p ró xi m o ao c en tr o at iv o da p ep tid il tr an sf er as e. T od os o s fá rm ac os s ão b ac te ri os tá tic os , e xc et o as e st re pt og ra m in as , q ue s ão ba ct er ic id as M ac ro líd io s e C et ol íd io s: A zi tr om ic in a C la ri tr om ic in a E ri tr om ic in a Te lit ro m ic in a A e ri tr om ic in a é ut ili za da n o tr at am en to d e um a va ri ed ad e de in fe cç õe s, n ot av el m en te a qu el as ca us ad as p or C or yn eb ac te ri um a cn es , L eg io ne ll a pn eu m op hi la , Tr ep on em a pa ll id um ( sí fi lis ), M yc op la sm a pn eu m on ia e e es pé ci es d e C hl am yd ia A c la ri tr om ic in a po ss ui a tiv id ad e au m en ta da c on tr a H . in fl ue nz ae A a zi tr om ic in a po ss ui a tiv id ad e au m en ta da c on tr a H . in fl ue nz ae e M or ax el la c at ar rh al is H ep at it e co le st át ic a ag ud a, ot ot ox ic id ad e, n ec ro se h ep át ic a fu lm in an te ( ra ra , te li tr om ic in a) D is tú rb io g as tr in te st in al D is fu nç ão h ep át ic a A r es is tê nc ia p od e se r co nf er id a po r m ut aç õe s cr om os sô m ic as qu e le va m a u m a al te ra çã o do s íti o de l ig aç ão d o ri bo ss om o 50 S, p ro du çã o de m et ila se s qu e al te ra m o s íti o de l ig aç ão 5 0S ou p ro du çã o de e st er as es q ue d eg ra da m o s m ac ro líd io s O s m ac ro líd io s e os c et ol íd io s in ib em o m et ab ol is m o he pá tic o da c ic lo sp or in a, d a ca rb am az ep in a, d a va rf ar in a e da t eo fi lin a, po de nd o re su lta r em n ív ei s tó xi co s de ss es f ár m ac os . O s m ac ro líd io s el im in am c er ta s es pé ci es d a fl or a in te st in al q ue in at iv am a d ig ox in a, l ev an do , as si m , a um a m ai or a bs or çã o or al de d ig ox in a em a lg un s pa ci en te s C lo ra nf en ic ol A nt ib ió tic o de a m pl o es pe ct ro a tiv o co nt ra b ac té ri as ( es pe ci al m en te an ae ró bi os e r iq ué ts ia s) A ne m ia h em ol ít ic a em p ac ie nt es co m b ai xo s ní ve is d e G 6P D , an em ia ap lá si ca , sí nd ro m e do b eb ê ci nz en to H ip er se ns ib ili da de a o cl or an fe ni co l O c lo ra nf en ic ol a nt ag on iz a os e fe ito s ba ct er ic id as d as pe ni ci lin as e d os a m in og lic os íd io s O s ef ei to s ad ve rs os d ev em -s e, e m s ua m ai or ia , à in ib iç ão d a fu nç ão m ito co nd ri al In ib e o m et ab ol is m o he pá tic o da v ar fa ri na , da f en ito ín a, d a to lb ut am id a e da c lo rp ro pa m id a, p ot en ci al iz an do a ss im o s se us ef ei to s L in co sa m id as : C lin da m ic in a In fe cç õe s ba ct er ia na s ca us ad as p or m ic ro rg an is m os a na er ób ic os C ol it e ps eu do m em br an os a, v al or es au m en ta do s da s pr ov as d e fu nç ão he pá ti ca , ic te rí ci a D is tú rb io g as tr in te st in al , ex an te m a H ip er se ns ib ili da de à c lin da m ic in a A c lin da m ic in a es tá a ss oc ia da à p ro lif er aç ão e xc es si va d e C . di ff ic il e, p od en do r es ul ta r em c ol ite p se ud om em br an os a E st re pt og ra m in as : D al fo pr is ti na / qu in up ri st in a In fe cç ão p or e nt er oc oc o re si st en te à va nc om ic in a (E R V ) In fe cç õe s cu tâ ne as e s ub cu tâ ne as ca us ad as p or e sp éc ie s de es ta fi lo co co s ou e st re pt oc oc os In fl am aç ão n o lo ca l de i nj eç ão , di st úr bi o ga st ri nt es tin al , hi pe rb ili rr ub in em ia , ar tr al gi a, m ia lg ia , ce fa lé ia H ip er se ns ib ili da de à da lf op ri st in a/ qu in up ri st in a N ão d ev e se r co -a dm in is tr ad a co m I SR S, d ev id o ao r is co d e sí nd ro m e de s er ot on in a D ev e- se e vi ta r a co -a dm in is tr aç ão c om p im oz id a, d ev id o ao ri sc o au m en ta do d e ca rd io to xi ci da de ( pr ol on ga m en to Q T, to rs ad es d e po in te s, p ar ad a ca rd ía ca ) O xa zo lid in on as : L in ez ol id a In fe cç õe s po r ba ct ér ia s G ra m -p os iti va s, pa rt ic ul ar m en te E R V , S . a ur eu s re si st en te à m et ic ili na ( SA R M ), S. ag al ac tia e, S . p ne um on ia e (i nc lu in do ce pa s re si st en te s a m úl tip lo s fá rm ac os ) e S. p yo ge ne s Pn eu m on ia h os pi ta la r In fe cç õe s de p é di ab ét ic o co m pl ic ad as M ie lo ss up re ss ão , ne ur op at ia p er if ér ic a, ne ur op at ia ó pt ic a D is tú rb io g as tr in te st in al , ce fa lé ia H ip er se ns ib ili da de à l in ez ol id a O m ec an is m o pr ec is o de a çã o da l in ez ol id a pe rm an ec e in ce rt o A l in ez ol id a é di sp on ív el e m f or m ul aç ão t an to o ra l qu an to I V