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INTRODUÇÃO Tradicionalmente, a terapia do câncer tem sido baseada no princípio de que as células tumorais encontram-se freqüente- mente no ciclo celular, sendo, portanto, mais sensíveis do que as células normais à interferência na síntese de DNA e mitose. Na verdade, os antimetabólitos, uma classe de agentes que são análogos dos folatos, das purinas e das pirimidinas endógenos e que inibem as enzimas de síntese dos nucleotídios, foram alguns dos primeiros fármacos a serem testados como agentes quimioterápicos. No final da década de 1940, Sidney Farber e colaboradores administraram o antifolato aminopterina a paciente com leucemia aguda e observaram a ocorrência de remissões temporárias em mais de metade dos pacientes. Em virtude de seu rápido desenvolvimento e divisão, acredita-se também que as células cancerosas sejam mais sensíveis do que as células normais ao efeito de agentes que produzem lesão do DNA. Também no final da década de 1940, as mostardas nitrogenadas — que, após exposições acidentais durante a guerra, haviam causado supressão da medula óssea — foram testadas em pacientes com linfoma e leucemia, induzindo remissões. Estes e outros achados levaram ao desenvolvimento de múltiplas classes de agentes antineoplásicos destinados a interferir nas unidades formadoras na síntese do DNA e mitose, ou a produzir lesão do DNA e instabilidade cromossômica, promovendo, portanto, a citotoxicidade e a morte celular pro- gramada (apoptose). Infelizmente, a janela terapêutica desses fármacos é estreita, visto que as células normais em tecidos como o trato gastrintestinal e a medula óssea sofrem divisão celular e também são suscetíveis aos efeitos desses agentes. O uso da quimioterapia de combinação com fármacos de diferen- tes classes ajudou a aumentar a eficácia e, ao mesmo tempo, a minimizar as toxicidades superpostas que limitam a dose dos fármacos; todavia, a capacidade de curar pacientes com a maioria das formas de câncer avançado permanece limitada. Essa eficácia limitada deve-se, em parte, ao desenvolvimento de múltiplos mecanismos de resistência, incluindo a incapa- cidade das células tumorais de sofrer apoptose em resposta a lesão do DNA ou estresse. Além disso, torna-se cada vez mais evidente que populações de células-tronco cancerosas podem apresentar baixas taxas de proliferação e outras propriedades que as tornam resistentes à quimioterapia citotóxica. Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma 37 David A. Barbie e David A. Frank Introdução Caso Bioquímica da Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma Síntese de Nucleotídios Síntese de Ribonucleotídios de Purinas Síntese de Ribonucleotídios de Pirimidinas Redução dos Ribonucleotídios e Síntese de Timidilato Síntese de Ácidos Nucléicos Reparo do DNA e Manutenção dos Cromossomos Reparo de Pareamento Incorreto Reparo por Excisão de Bases Reparo por Excisão de Nucleotídios Reparo de Quebras de Fita Dupla Biologia do Telômero Microtúbulos e Mitoses Classes e Agentes Farmacológicos Inibidores da Timidilato Sintase Inibidores do Metabolismo das Purinas Inibidores da Ribonucleotídio Redutase Análogos das Purinas e das Pirimidinas que se Incorporam ao DNA Agentes que Modificam Diretamente a Estrutura do DNA Agentes Alquilantes Compostos de Platina Bleomicina Inibidores da Topoisomerase Camptotecinas Antraciclinas Epipodofilotoxinas Ansacrina Inibidores dos Microtúbulos Inibidores da Polimerização dos Microtúbulos: Alcalóides da Vinca Inibidores da Despolimerização dos Microtúbulos: Taxanos Conclusão e Perspectivas Futuras Leituras Sugeridas 632 | Capítulo Trinta e Sete nn Caso Um dia, J. L., um estudante de pós-graduação de 23 anos de idade, até então em boa saúde, percebeu a presença de um nódulo de consistência dura no testículo esquerdo enquanto estava tomando banho. Preocupado com esse achado, o médico de J. L. solicitou uma ultra-sonografia, que revelou a existência de uma massa sólida sugestiva de câncer. O testículo foi removido cirurgicamente, e a revisão patológica confirmou o diagnóstico de câncer testicular. Uma radiografia de tórax também revelou vários nódulos pulmonares, que foram considerados como disseminação metastática do câncer. J. L. foi tratado com vários ciclos de quimioterapia de combinação, incluindo bleomicina, etoposídeo e cisplatina. Os nódulos pulmo- nares desapareceram por completo. Um ano depois, J. L. pôde retomar os estudos, sem nenhum sinal de recidiva do câncer. Entre- tanto, a cada visita subseqüente de acompanhamento, o médico de J. L. indaga se ele está tendo dificuldade respiratória. QUESTÕES n 1. Qual o alvo molecular de cada um dos fármacos no esquema de quimioterapia de combinação de J. L.? n 2. Através de que mecanismos o etoposídeo, a bleomicina e a cisplatina atuam de modo sinérgico contra o câncer testicular de J. L.? n 3. Por que o médico de J. L. indaga sobre a ocorrência de dispnéia a cada visita de acompanhamento? n 4. Como achados incidentais levaram à descoberta da cisplati- na, o fármaco de maior eficácia contra o câncer testicular? BIOQUÍMICA DA SÍNTESE, ESTABILIDADE E MANUTENÇÃO DO GENOMA De acordo como dogma central da biologia molecular, o DNA contém toda a informação necessária para codificar macro- moléculas celulares — especificamente, a transcrição do DNA em RNA e, a seguir, a tradução do RNA em proteínas. Os antimetabólitos inibem a síntese de nucleotídios, que são as unidades formadoras do DNA e do RNA. A Fig. 37.1A fornece uma visão geral da síntese de nucleotídios, enquanto a Fig. 37.1B mostra as etapas em que alguns dos fármacos discutidos neste capítulo inibem o metabolismo dos nucleotídios. SÍNTESE DE NUCLEOTÍDIOS Os nucleotídios, os precursores do DNA e do RNA, incluem os nucleotídios de purinas e os nucleotídios de pirimidinas. As puri- nas e as pirimidinas são as bases empregadas para determinar o código químico dentro do DNA e do RNA. A adenina e a guanina são purinas; a citosina, a timina e a uracila são pirimidinas. Os nucleosídios são derivados de purinas e pirimidinas conjugadas com ribose ou desoxirribose. Os nucleotídios são ésteres mono- fosfato, difosfato ou trifosfato dos nucleosídios correspondentes. Por exemplo, uma base adenina ligada de modo covalente a um açúcar ribose e a um éster difosfato é denominada difosfato de adenosina (ADP). As diversas bases purinas e pirimidinas, nucleosídios e nucleotídios são apresentados no Quadro 37.1. A síntese de nucleotídios envolve três conjuntos gerais de reações seqüenciais: (1) a síntese de ribonucleotídios, (2) a redu- ção dos ribonucleotídios a desoxirribonucletídios e (3) a con- versão de desoxiuridilato (dUMP) em desoxitimidilato (dTMP) A B Precursores das purinas Precursores das pirimidinas Folato Ribonucleotídios Desoxirribonucleotídios DNA RNA Proteína Monofosfato de inosina (IMP) Pirimidinas Metotrexato 6-Mercaptopurina Tioguanina Hidroxiuréia Fludarabina Citarabina Cladribina Precursores das purinas Precursores das pirimidinas Folato Ribonucleotídios Desoxirribonucleotídios DNA RNA Proteína IMP Pirimidinas 6-Mercaptopurinas Tioguanina Fig. 37.1 Considerações gerais da biossíntese de nucleotídios de novo. A. O folato é um co-fator essencial na síntese de monofosfato de inosina (IMP), do qual derivam todos os nucleotídios de purinas. A síntese de pirimidinas não necessita de folato, embora este seja necessário para a metilação do desoxiuridilato (dUMP) a desoxitimidilato (dTMP) (ver Fig. 37.2). Os ribonucleotídios contêm uma das bases purinas ou pirimidinas ligada a fosfato de ribose. A redução subseqüente da ribose na posição 2� produz desoxirribonucleotídios. Os desoxirribonucleotídios são polimerizados em DNA, enquanto os ribonucleotídios são utilizados na formação do RNA (não ilustrado). De acordo com o dogma central da biologia molecular, o código do DNA determina a seqüência do RNA (transcrição), e o RNA é então traduzido em proteína (setas azuis). B. O metotrexato inibe a diidrofolato redutase (DHFR) e, portanto, impede a utilização do folato na síntese de nucleotídios de purinas e dTMP. A 6-mercaptopurina e a tioguanina inibem a formação de nucleotídios de purinas. A hidroxiuréia inibe a enzima que converte ribonucleotídios em desoxirribonucleotídios. A fludarabina, a citarabina e a cladribina são análogos de purinas e pirimidinas que inibem a síntese de DNA. A 5-fluoruracila inibe a enzima que converte o dUMP em dTMP (não ilustrado). (Fig. 37.2). A síntese de ribonucleotídios difere para as purinas e pirimidinas, de modo que a síntese de cada classe de molécu- las é discutida individualmente. Todos os ribonucleotídios são reduzidos a desoxirribonucleotídios por uma única enzima, a ribonucleotídio redutase. Os desoxirribonucleotídios gerados Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 633 QUADRO 37.1 Derivados das Purinas e Pirimidinas: Bases, Nucleosídios e Nucleotídios BASE RIBONUCLEOSÍDIO RIBONUCLEOTÍDIO DESOXIRRIBONUCLEOSÍDIO DESORRIBONUCLEOTÍDIO Purinas Pirimidinas Desoxiuridina Desoxiuridilato (dUMP) NH O ON O HOH HH HH HO NH O ON O HOH HH HH OP-O O- O N NNH N NH2 N NN N NH2 O OHOH HH HH HO N NN N NH2 O OHOH HH HH OP-O O- O N NN N NH2 O HOH HH HH HO N NN N NH2 O HOH HH HH OP-O O- O NH NNH N O NH2 NH N N O NH2N O OHOH HH HH HO NH N N O NH2N O OH HH HH OH OP-O O O- NH N N O NH2N O HOH HH HH HO NH N N O NH2N O H HH HH OH OP-O O O- Adenina (A) Adenosina Adenilato (AMP) Desoxiadenosina Desoxiadenilato (dAMP) Guanina (G) Guanosina Guanilato (GMP) Desoxiguanosina Desoxiguanilato (dGMP) N N H NH2 O N NH2 ON O OHOH HH HH HO N NH2 ON O OHOH HH HH OP-O O- O O HOH HH HH HO N N NH2 O N NH2 ON O HOH HH HH OP-O O- O NH N H O O NH O ON O OHOH HH HH HO NH O ON O OHOH HH HH OP-O O- O NH N H O O O HOH HH HH HO N NH O O NH O ON O HOH HH HH OP-O O- O Citosina (C) Citidina Citidilato (CMP) Desoxicitidina Desoxicitidilato (dCMP) Uracila (U) Uridina Uridilato (UMP) Timina (T) NENHUM NENHUM Desoxitimidina Desoxitimidilato (dTMP) a partir de ribonucleotídios e do dUMP são utilizados na síntese de DNA. Como o folato é um co-fator essencial na síntese de ribonucleotídios de purina e dTMP, o metabolismo do folato é discutido separadamente (ver Cap. 31). Síntese de Ribonucleotídios de Purinas A adenina e a guanina, as bases purinas apresentadas no Quadro 37.1, são sintetizadas como componentes de ribonu- cleotídios (para a síntese de RNA) e de desoxirribonucleotídios (para a síntese de DNA). Os derivados da adenina e da guanina, que incluem o ATP, o GTP, o cAMP e o cGMP, também são utilizados para armazenamento de energia e sinalização celular. A síntese de purinas começa com a montagem do inosinato (IMP) a partir de um fosfato de ribose, componentes derivados dos aminoácidos glicina, aspartato e glutamina e transferências de um carbono catalisadas pelo tetraidrofolato (THF), con- forme indicado na Fig. 37.2. Devido ao papel central do THF na síntese de purinas, uma importante estratégia quimioterápica consiste em reduzir a quantidade disponível de THF para a célula, inibindo, assim, a síntese de purinas. A Fig. 37.3 mostra o papel central desempenhado pelo IMP na síntese de purinas. O IMP pode ser aminado a AMP ou oxidado a GMP. Por sua vez, o AMP e o GMP podem ser convertidos em ATP e GTP, respectivamente, e, em seguida, incorporados ao RNA ou reduzidos a dAMP ou dGMP, respec- tivamente, conforme descrito adiante. As bases, os nucleosídios e os nucleotídios de purinas sofrem rápida interconversão através de múltiplas enzimas presentes no interior da célula. Em uma dessas reações, a enzima adenosina desaminase (ADA) catalisa a conversão irreversível da adenosina ou 2�-desoxiadenosina em inosina ou 2�-desoxiinosina, respectiva- mente. A inibição da ADA faz com que as reservas intracelulares de adenosina e de 2�-desoxiadenosina ultrapassem as das outras purinas, resultando, por fim, em efeitos metabólicos que são tóxi- cos para a célula (ver discussão da pentostatina, adiante). 634 | Capítulo Trinta e Sete básico, orotato, é formado a partir de carbamoil fosfato e aspartato. A seguir, o orotato reage com um fosfato de ribose; o produto de descarboxilação dessa reação produz uridilato (UMP). A exemplo do IMP na síntese de purinas, o UMP desem- penha um papel central na síntese de pirimidinas. O próprio UMP é um componente nucleotídio do RNA e também o pre- cursor comum dos componentes do RNA e DNA, ou seja, o citidilato (CMP), o desoxicitidilato (dCMP) e o desoxitimidi- lato (dTMP). O CTP é formado pela aminação do UTP. Redução dos Ribonucleotídios e Síntese de Timidilato Os ribonucleotídios ATP, GTP, UTP e CTP, que são necessários para a síntese de RNA, são organizados em um molde de DNA e ligados para formar o RNA. Alternativamente, os ribonucleo- tídios podem ser reduzidos na posição 2� da ribose, forman- do os desoxirribonucleotídios dATP, dGTP, dUTP e dCTP. A conversão dos ribonucleotídios em desoxirribonucleotídios é catalisada pela enzima ribonucleotídio redutase. (Na reali- dade, a ribonucleotídio redutase utiliza, como substratos, as formas de difosfato dos quatro ribonucleotídios, produzindo dADP, dGDP, dUDP e dCDP; entretanto, os nucleotídios podem sofrer rápida interconversão entre suas formas de monofosfato, difosfato e trifosfato.) Nas Figs. 37. 2 a 37.4, observe que a ribonucleotídio reduta- se catalisa a formação dos precursores do DNA — dATP, dGTP e dCTP. Entretanto, o precursor do DNA dTTP não é sintetizado diretamente pela ribonucleotídio redutase. Com efeito, o dUMP precisa ser modificado para formar o dTMP. Conforme observa- do no Quadro 37.1, o dTMP é o produto de metilação do dUMP. A metilação de dUMP a dTMP é catalisada pela timidilato sintase, numa reação em que o metilenotetraidrofolato (MTHF) atua como doador do grupo metila (Fig. 37.4). Quando o MTHF doa o seu grupo metila, é oxidado a diidrofolato (DHF). O DHF deve ser reduzido a THF pela diidrofolato redutase (DHFR) e, a seguir, convertido em MTHF para atuar como co-fator em outro ciclo de síntese de dTMP. A inibição da DHFR impede a regeneração do tetraidrofolato e, portanto, inibe a conversão de dUMP em dTMP, resultando finalmente em níveis celulares insuficientes de dTMP para a replicação do DNA. IMP FolatoAminoácidos Síntese de purinas Síntese de pirimidinas Ribonucleotídios Desoxirribonucleotídios AminoácidosPRPP PRPP AMP GMP UMP CMP dAMP dGMP dTMP dUMP dCMP DNA Fig. 37.2 Síntese de nucleotídios. A síntese de purinas (à esquerda) começa com a formação de monofosfato de inosina (IMP) a partir de aminoácidos, fosforribosilpirofosfato (PRPP) e folato. O IMP sofre aminação a adenilato (AMP) ou oxidação a guanilato (GMP). Os ribonucleotídios AMP e GMP são reduzidos, com formação dos desoxirribonucleotídios, o monofosfato de desoxiadenosina (dAMP) e o monofosfato de desoxiguanosina (dGMP), respectivamente. (A conversão de ribonucleotídios em desoxirribonucleotídios ocorre, na verdade, em nível dos difosfatos e trifosfatos correspondentes, como, por exemplo, ADP → dADP e ATP → dATP.) A síntese de pirimidina (à direita) começa com a formação do orotato a partir do aspartato e carbamoil fosfato (ver Fig. 37.4). O orotato é ribosilado e descarboxilado a uridilato (UMP); a aminação do UMP produz o citidilato (CMP). (A conversão do UMP em CMP ocorre, na verdade, em nível dos trifosfatos correspondentes, isto é, UTP → CTP.) Os ribonucleotídios UMP e CMP são reduzidos para formar os desoxirribonucleotídios, o monofosfato de desoxiuridina (dUMP) e o monofosfato de desoxicitidina (dCMP). O dUMP é convertido em monofosfato de desoxitimidina (dTMP), numa reação que depende do folato. Em nível dos trifosfatos correspondentes (não indicados), os desoxirribonucleotídios são incorporados ao DNA, enquanto os ribonucleotídios são incorporados ao RNA (não indicado). Observe o papel central do folato como co-fator essencial na síntese de nucleotídios de purina e dTMP. GTP GMP XMP Adenilossuccinato Monofosfato de inosina (IMP) Ribonucleotídio redutase Ribonucleotídio redutase 6-Mercaptopurina Tioguanina dGMP dGTP ATP AMP dAMP dATP DNA DNA Hidroxiuréia Hidroxiuréia Fludarabina Cladribina 6-Mercaptopurina IMP desidrogenase (IMPDH) Fig. 37.3 Detalhes da síntese de purinas. O inosinato, ou IMP, ocupa uma posição central na síntese de nucleotídios de purina. O IMP é oxidado pela IMP desidrogenase (IMPDH) a xantilato (XMP), que é convertido em monofosfato de guanosina (GMP). O GMP pode ser incorporado ao DNA ou ao RNA na forma de trifosfato de desoxiguanosina (dGTP) ou trifosfato de guanosina (GTP), respectivamente. Alternativamente, o IMP pode sofrer aminação a monofosfato de adenosina (AMP) através de um intermediário adenilossuccinato. O AMP pode ser incorporado ao DNA ou ao RNA na forma de trifosfato de desoxiadenosina (dATP) ou trifosfato de adenosina (ATP), respectivamente. A 6-mercaptopurina e a tioguanina inibem a IMPDH e, portanto, interrompem a síntese de GMP. A 6-mercaptopurina também inibe a conversão do IMP em adenilossuccinato e, portanto, interrompe a síntese de AMP. A hidroxiuréia inibe a ribonucleotídio redutase e, dessa maneira, inibe a formação dos desoxirribonucleotídios necessários para a síntese de DNA. A fludarabina e a cladribina são análogos da adenosina halogenados que inibem a síntese de DNA. Síntese de Ribonucleotídios de Pirimidinas Os ribonucleotídios de pirimidinas são sintetizados de acordo com a via metabólica ilustrada na Fig. 37.4. O anel piri midínico Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 635 SÍNTESE DE ÁCIDOS NUCLÉICOS Contanto que haja níveis suficientes de nucleotídios dis- poníveis, tanto o DNA quanto o RNA podem ser sintetiza- dos, e podem ocorrer síntese de proteínas, crescimento celular e divisão celular. Numerosos fármacos, incluindo os antimetabólitos discutidos neste capítulo, são capazes de inibir a síntese de DNA e de RNA. Para evitar qualquer repetição, a discussão detalhada da síntese de DNA e de RNA é fornecida no Cap. 32. Para os propósitos deste capítulo, o leitor deve estar atento para o fato de que o RNA e o DNA são formados pela polimerização de ribo- nucleotídios e desoxirribonucleotídios, respectivamente. Os polímeros de RNA são alongados pela enzima RNA polimerase, enquanto o DNA é alongado pela DNA polim- erase. Embora os antimetabólitos inibam primariamente as enzimas que medeiam a síntese de nucleotídios, alguns antimetabólitos também inibem as DNA e RNA polimera- ses (ver adiante). REPARO DO DNA E MANUTENÇÃO DOS CROMOSSOMOS As mutações e outras lesões do DNA podem ocorrer esponta- neamente ou em conseqüência de exposição a agentes químicos ou radiação que provocam lesão do DNA. Existem diversas vias gerais para o reparo dessas lesões, incluindo o reparo de pareamento incorreto (RPI) para erros na replicação do DNA, reparo por excisão de bases (REB) para pequenas modificações nas bases e quebras de fitas simples, reparo por excisão de nucleotídios (REN) para a remoção de complexos volumosos, e recombinação homóloga ou junção terminal não-homóloga para quebras de fitas duplas (Fig. 37.5). As vias de reparo do DNA são importantes não apenas pelo fato de que podem alterar a eficácia da quimioterapia, mas também pelo fato de que a perda dessas vias freqüentemente contribui para o desenvolvimento de tumores através do comprometimento da Aspartato Orotato Ribonucleotídio redutase Ribonucleotídio redutase DHFR Carbamoil fosfato Metotrexato 5-Fluoruracila Hidroxiuréia Citarabina PRPP UMP UTP CTP MTHF DHF THF dTMP dTTP DNA dCTP DNA dUMP Timidilato sintase Fig. 37.4 Detalhes da síntese de pirimidinas. O aspartato (um aminoácido) e o carbamoil fosfato combinam-se para formar o orotato que, a seguir, combina-se com o fosforribosilpirofosfato (PRPP) para formar uridilato (UMP). O UMP ocupa uma posição central na síntese de nucleotídios de pirimidinas. O UMP pode sofrer fosforilação seqüencial a trifosfato de uridina (UTP). O UTP é incorporado ao RNA (não indicado) ou aminado para formar o trifosfato de citidina (CTP). O CTP é incorporado ao RNA (não indicado) ou reduzido pela ribonucleotídio redutase ao trifosfato de desoxicitidina (dCTP), que é incorporado ao DNA. Alternativamente, o UMP pode ser reduzido a desoxiuridilato (dUMP). A timidilato sintase converte o dUMP em desoxitimidilato (dTMP), em uma reação que depende do folato. O dTMP é fosforilado a trifosfato de desoxitimidina (dTTP), que é incorporado ao DNA. A hidroxiuréia inibe a formação de desoxirribonucleotídios e, portanto, inibe a síntese de DNA. A citarabina, um análogo da citidina, inibe a incorporação do dCTP ao DNA. A 5-fluoruracila inibe a síntese de dTMP através da inibição da timidilato sintase. O metotrexato inibe a diidrofolato redutase (DHFR), a enzima responsável pela regeneração do tetraidrofolato (THF) a partir da DHF. Ao inibir a DHF redutase, esse fármaco também inibe a formação do metilenotetraidrofolato (MTHF), que é composto de folato necessário para a síntese de dTMP. Erros de replicação Radicais de oxigênio Radiação ionizante Substâncias químicas (nitrosaminas) Agentes quimioterápicos (agentes alquilantes, temozolomida) Radiação UV Substâncias químicas (2-AAF, benzo(a)pireno) Agentes quimioterápicos (agentes de platina) Radiação ionizante Substâncias químicas (bioflavonóides, substâncias radiomiméticas) Agentes quimioterápicos (bleomicina, topoisomerase I e inibidores II) Pareamento incorreto de bases Alças de inserção/deleção Locais sem base Modificações de bases Quebras de fita simples Complexos volumosos Quebras de fita dupla Reparo de pareamento incorreto Reparo por excisão de base Reparo por excisão de nucleotídios Reparo de quebra de fita dupla Fig. 37.5 Mecanismos de lesão e de reparo do DNA. Em resposta à lesão do DNA, existem várias vias gerais que medeiam o reparo das lesões do DNA. Tipicamente, os erros de replicação resultam em pareamento incorreto de bases ou alças de inserção/deleção em regiões de repetições microssatélites de DNA; o reparo dessas lesões é efetuado pela via de reparo de pareamento incorreto (RPI). A radiação ionizante, os radicais de oxigênio e diversas substâncias químicas e agentes quimioterápicos podem causar a formação de sítios sem bases, modificações de bases e quebras de fita simples, cujo reparo é efetuado pela via de reparo por excisão de bases (REB). A irradiação UV e certas substâncias químicas e agentes quimioterápicos que modificam o DNA podem levar à formação de complexos volumosos, que são excisados e reparados pela via de reparo por excisão de nucleotídios (NER). A radiação ionizante, as substâncias químicas radiomiméticas, a bleomicina e inibidores da topoisomerase naturais (bioflavonóides) e quimioterápicos (camptotecinas, antraciclinas, epipodofilotoxinas) podem induzir quebras de fita dupla do DNA, que induzem o reparo pela via de reparo de quebra de fita dupla (RQFD). 636 | Capítulo Trinta e Sete integridade genômica e facilitação de mutações em oncogenes e em genes supressores tumorais. Em nível cromossômico, tornou-se evidente que os telômeros, as seqüências repetidas que recobrem as extremidades dos cromossomos, desempe- nham um papel importante na manutenção do genoma e na prevenção da fusão de cromossomos. A enzima telomerase, que regula o comprimento dos telômeros, está surgindo como componente-chave no processo de imortalização e transforma- ção oncogênica. Reparo de Pareamento Incorreto Durante a replicação do DNA, erros como pareamentos incor- retos de bases e inserções ou deleções de seqüências repeti- das de microssatélites (instabilidade de microssatélites) são reconhecidos e reparados por proteínas do sistema de reparo do pareamento incorreto (RPI). Para pareamentos incorretos de uma única base, o reconhecimento envolve um heterodímero entre a proteína MSH2 e MSH6, ao passo que, para alças de inserção/deleção, a MSH2 pode atuar com MSH6 ou MSH3 (Fig. 37.6). Esses complexos recrutam as proteínas MLH1 e PMS2 (bem como MLH3 para alças de inserção/deleção), que, por sua vez, recrutam exonucleases e componentes do mecanis- mo de replicação do DNA para excisão e reparo da lesão. As mutações de linhagem germinativa em MLH1, PMS2, MSH2 e MSH6 estão associadas a 70 a 80% dos casos de câncer de cólon sem polipose hereditário. Além disso, a instabili- dade de microssatélites, uma característica essencial de RPI Pareamento incorreto de uma única base A T T A T A G C C G MSH2 MSH6 T C T A A T G C G C C G Alça de inserção/deleção A T T A A T T A A T MSH2 MSH3/6 A T T A A T T A A T T A A T T A T A A T T A A T A T T A T A G C C G T A T A A T G C G C C G A T T A A T T A A T T A A T A T T A T A A T T A A T A T T A T A G C C G MSH2 MSH6 T C T A A T G C G C C G A T T A A T T A A T MSH2 MSH3/6 MLH1 PMS2 MLH1 PMS2/ MLH3 A T T A A T T A A T T A A T T A T A A T T A A T Fig. 37.6 Via de reparo de pareamento incorreto. Erros de replicação podem resultar em pareamento incorreto de bases ou alças de inserção/deleção em regiões repetidas de microssatélites, em conseqüência de pareamento de bases complementares intrafita. Os pareamentos incorretos de uma única base são reconhecidos por um heterodímero MSH2/MSH6, enquanto as alças de inserção/ deleção são reconhecidas pelo heterodímero MSH2/MSH3 ou MSH2/MSH6. A seguir, são recrutados componentes adicionais do mecanismo de reparo de pareamento incorreto, incluindo MLH1/PMS2 para pareamentos incorretos de uma única base ou MLH1/PMS2 ou MLH1/MLH3 para alças de inserção/deleção. Subseqüentemente, ocorre recrutamento de exonucleases e componentes do mecanismo de replicação do DNA para excisão e reparo das lesões. A T T A T A G C C G T A A A T G C NAD Nicotinamida G C C G A T T A T A G C C G T A A A T G C G C C G A T T A T A G C C G T A A A T G C G C C G A T T A T A G C C G T A T A A T G C G C C G XRCC1 PARP1 ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr Histona PARP1 ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr ADPr Histona PARP1 Histona Fig. 37.7 Via de reparo por excisão de bases. A enzima poli (ADP-ribose) polimerase 1 (PARP1) é recrutada para sítios de quebra de fita única em decorrência de radiação ionizante ou excisão por lesão de bases. A PARP1 poli-ADP ribosila (ADPr) uma variedade de alvos no local de lesão, incluindo ele próprio e histonas. As proteínas ADPr-modificadas recrutam então proteínas adicionais, como XRCC1, que, por sua vez, recrutam a DNA polimerase � e a DNA ligase III para reparo da lesão. deficiente, é observada em 15 a 25% dos cânceres colorretais esporádicos. Reparo por Excisão de Bases As quebras de fita simples (QFS) do DNA, que podem ser pro- vocadas diretamente por radiação ionizante ou indiretamente, devido à excisão enzimática de uma base modificada por uma DNA glicosilase, ativam a enzima poli(ADP-ribose) polime- rase 1 (PARP1) (Fig. 37.7). No sítio da quebra, a PARP1 trans- fere grupos de ADP-ribose do NAD para diversas proteínas envolvidas no metabolismo do DNA e da cromatina, incluindo a si própria. A adição covalente de oligômeros de ADP-ribose de carga negativa altera as interações dessas proteínas com o DNA e com outras proteínas. A PARP1 recruta a proteína do REB, a XRCC1; juntamente com a DNA polimerase � e a DNA ligase III, a XRCC1 facilita o reparo da lesão. A PARP1 também foi implicada no reconhecimento de quebras de fita dupla (QFD) de DNA e no recrutamento da proteinocinase DNA-depen- dente no reparo de QFD (ver adiante), bem como em vias de morte celular, modificação da estrutura da cromatina, regulação da transcrição e função do aparelho mitótico. Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 637 Reparo por Excisão de Nucleotídios Em resposta à formação de complexos volumosos que defor- mam a dupla hélice do DNA, como aqueles induzidos por irradiação ultravioleta e agentes quimioterápicos que causam lesão do DNA, um conjunto complexo de proteínas reconhece a lesão e inicia o seu reparo através de um processo denominado reparo por excisão de nucleotídios (REN). O reparo envolve a abertura local da dupla hélice em torno do local de lesão, a incisão da fita lesada em ambos os lados da lesão, a excisão do oligonucleotídio contendo a lesão e, por fim, a síntese de re paro do DNA e ligação. As proteínas envolvidas nesse pro- cesso foram identificadas, e seus nomes derivam das síndromes clínicas xerodermia pigmentosa e síndrome de Cockayne, que são distúrbios de fotossensibilidade raros que exibem defei- tos no reparo por excisão de nucleotídios. Reparo de Quebras de Fita Dupla Em resposta a uma quebra de fita dupla, a ativação da cinase da ataxia telangiectasia mutante (ATM) resulta na geração da histo- na fosforilada gama-H2AX no local da quebra. Juntamente com a proteína MDC1, a gama-H2AX recruta para o lócus de lesão do DNA um complexo (MRN) contendo as proteínas Mre11, Rad50 e gene 1 da síndrome de quebra de Nijmegen (NBS1) (Fig. 37.8). O produto do gene de suscetibilidade do câncer de mama e ovariano, BRCA1, também é fosforilado pelas cinases ATM, ATR e CHK2 em resposta à quebra de fita dupla, e os BRCA1, RAD51 e BRCA2 fosforilados também são recruta- dos para o local da quebra. O reparo subseqüente é mediado por recombinação homóloga, com formação e resolução de uma junção Holliday (Fig. 37.8), ou por junção terminal não- homóloga (JTNH), em que a proteinocinase DNA-dependente e um complexo de proteínas, incluindo XRCC4, catalisam processos nucleolíticos que permitem a junção terminal pela DNA ligase IV. O reparo do DNA efetuado por recombinação homóloga é mais acurado do que aquele mediado por junção terminal não-homóloga. Biologia do Telômero Os telômeros humanos consistem na seqüência de repetições simples de TTAGGG. Essas repetições assumem uma forma e são dobradas e ligadas por um complexo de proteínas que compõem uma estrutura singular, denominada “alça t” (Fig. 37.9). Na estrutura da alça t, uma longa projeção de fita sim- ples na extremidade 3� do DNA invade o componente de DNA de fita dupla proximal; esse processo é facilitado pela TRF1, pela TRF2 e por outros fatores protéicos. Acredita-se que a alça t e seu complexo associado de proteínas desempenham um importante papel na cobertura e proteção da extremidade do cromossomo, bem como na proteção dos telômeros con- tra o reconhecimento pelo mecanismo de controle de lesão do DNA. Como a DNA polimerase é incapaz de replicar por completo as extremidades de cromossomos lineares, ocorre encurtamento dos telômeros a cada divisão nas células normais. O encurta- mento dos telômeros resulta finalmente em ruptura dos caps teloméricos, ativação de um ponto de controle de lesão do DNA e em um estado de parada do ciclo denominado senescência celular (Fig. 37.10). Quando as células são capazes de trans- por esse controle através de inativação da proteína supressora tumoral p53, que normalmente regula a parada do ciclo celular ou a apoptose em resposta à lesão do DNA, observa-se a ocor- rência de fusões cromossômicas. Acredita-se que o encurtamen- NBS1 DSB ATM Cromátides irmãs Modificação por histona Recrutamento do complexo MRN Ressecção mediada pela nuclease Invasão da fita Síntese de DNA; migração do ramo H2AX MRE11 RAD50 RAD52 P P RAD51 BRCA2 BRCA1-P RAD51-BRCA2 RAD54 DNA polimerase DNA ligase Ligação; resolução da junção Reparo acurado do DNA BRCA1ATMATR, CHK2 MDC1 Fig. 37.8 Via de reparo de quebra de fita dupla. A cinase da ataxia telangiectasia mutante (ATM) reconhece sítios de ruptura de DNA de fita dupla e liga-se a eles. Com a sua ativação, a ATM cinase marca o sítio, gerando a histona fosforilada gama-H2AX. A gama-H2AX e a proteína MDC1 recrutam o complexo Mre11/ Rad50/gene 1 da síndrome de quebra Nijmegen (NBS1) (MRN) para o local de lesão. Após o recrutamento de RAD52 e a atuação de nucleases que medeiam a ressecção do DNA, o BRCA1 é recrutado para o local e fosforilado pelas ATM, ATR e CHK2 cinases. Juntamente com RAD51 e BRCA2, o BRCA1 fosforilado facilita o reparo da quebra de fita dupla por recombinação homóloga (ilustrada na figura) ou por junção terminal não-homóloga (JTNH; não ilustrada). 638 | Capítulo Trinta e Sete to progressivo dos telômeros com o envelhecimento promova instabilidade genômica e contribua para a oncogênese. Todavia, as células também continuam morrendo nessas condições. A ativação da enzima telomerase, uma transcriptase reversa que utiliza um molde de RNA para sintetizar repetições de TTA- GGG, permite que a célula restaure o comprimento dos telô- meros e sofra divisão indefinidamente. Observa-se a ativação da telomerase em células normais da linhagem germinativa e em algumas populações de células-tronco, e foi constatado que ela mantém a presença da projeção 3� nas células normais. O processo de imortalização associado à ativação da telomerase também é essencial para a formação e manutenção de tumores. Em uma minoria de tumores, verifica-se a ativação de uma via alternativa de alongamento dos telômeros (ALT, alternative lengthening of telomeres). MICROTÚBULOS E MITOSES Após a replicação de seu DNA, a célula está preparada para sofrer mitose. Nesse processo, uma única célula divide-se, produzindo duas células-filhas idênticas. As transições da re plicação do DNA (fase S) do ciclo celular para a fase G2 e, a seguir, para a mitose (fase M) são complexas e dependem da ação coordenada de várias das denominadas cinases ciclina- dependentes (CDK; ver Cap. 31). Muitas células cancerosas exibem uma desregulação do tempo do ciclo celular. O controle bioquímico das transições do ciclo celular entre a replicação do DNA e o início da mitose constitui uma área ativa de pes- quisa do câncer; espera-se que, num futuro próximo, as cicli- nas possam tornar-se alvos farmacológicos da quimioterapia antineoplásica. Entretanto, no momento atual, os microtúbulos constituem as únicas estruturas farmacologicamente relevantes que atuam como alvos na mitose. Fig. 37.9 Estrutura do telômero. Os telômeros humanos têm 2 a 30 quilobases (kb) de comprimento e consistem em repetições de seqüência simples TTAGGG. Ocorre geração de uma projeção de fita simples 3�-terminal de 50 a 300 nucleotídios (nt) por uma nuclease ainda não identificada. As proteínas de ligação do telômero TRF1, TRF2 e outros fatores facilitam o dobramento e a invasão proximal do DNA telomérico de fita dupla pela projeção de fita simples, produzindo uma estrutura estável de “alça t”. Essa estrutura desempenha um importante papel no revestimento e na proteção das extremidades dos cromossomos. [TTAGGG]n Nuclease desconhecida 3' 3' 5' 3' 3' 5' 5' 5' [AATCCC]n ss [TTAGGG]n Invasão da fita Dobramento 2-30 kb ds ss alça t alça D + outros fatores 50-300 nt + outros fatores TRF1 TRF2 Telômeros Proliferação Morte celular Longos Sim Não Médios Sim Não Curtos Não Não Curtos Sim Sim Longos Duplicação precoce da população Duplicação tardia da população Senescência perda de p53, perda de pRB ativação de p53, ativação de pRB Ativação da telomerase Crise Imortalização Sim Não Fig. 37.10 Manutenção do cromossomo e sua relação com a imortalização. À medida que as células primárias sofrem sucessivas duplicações de sua população, os telômeros encurtam-se progressivamente, devido à incapacidade da DNA polimerase de replicar as extremidades dos cromossomos lineares. Por fim, um ponto de controle é desencadeado, mediado pelas proteínas p53 e pRB, resultando em um estado de parada de crescimento, denominado senescência celular. A senescência pode ser transposta pela inativação de p53 e pRB; todavia, em última análise, os telômeros criticamente curtos induzem as células a entrar em um estado denominado crise e a morrer. A ativação da telomerase permite que a célula mantenha um telômero de comprimento adequado e sofra divisão indefinidamente, resultando em sua imortalização. Notavelmente, a expressão exógena da telomerase isoladamente em células primárias é suficiente para que essas células transponham a senescência celular e se tornem imortalizadas. Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 639 Os microtúbulos são fibras cilíndricas e ocas, compostas de polímeros de tubulina, uma proteína heterodimérica que consiste em subunidades de �-tubulina e �-tubulina (Fig. 37.11). A �-tubulina e a �-tubulina são codificadas por genes separados, que apresentam estruturas tridimensionais seme- lhantes. Tanto a �-tubulina quanto a �-tubulina ligam-se ao GTP; além disso, a �-tubulina (mas não a �-tubulina) pode hidrolisar o GTP a GDP. Os microtúbulos originam-se de um centro organizador central de microtúbulos (o centrosso- mo, que inclui dois centríolos e proteínas associadas), onde a �-tubulina (uma proteína com homologia com a �-tubulina e a �-tubulina) efetua a nucleação da polimerização da tubulina. Os microtúbulos nascentes organizam-se em protofilamentos, que consistem em polímeros longitudinais de subunidades de tubulina. Cada protofilamento interage lateralmente com dois outros protofilamentos, formando um tubo de centro oco, de 24 nm de diâmetro, que consiste em 13 protofilamentos de disposi- ção concêntrica. Como a tubulina é um heterodímero, esse tubo possui assimetria inerente; a extremidade de um microtúbulo mais próximo do centrossomo é delimitada por uma �-tubulina e denominada extremidade (–) (“menos”), enquanto a extremi- dade de um microtúbulo que se estende a partir do centrossomo é delimitada por uma �-tubulina e denominada extremidade (+) (“mais”) (Fig. 37.11). As unidades de tubulina são adicionadas em diferentes taxas às extremidades (–) e (+); a extremidade (+) cresce (com a adição de tubulina) duas vezes mais rapidamente do que a extremidade (–). Os microtúbulos não são estruturas estáticas. Na verdade, possuem uma propriedade inerente, conhecida como instabi- lidade dinâmica (Fig. 37.12). São adicionados heterodímeros de tubulina à extremidade do microtúbulo, com ligação do GTP a ambas as subunidades de �-tubulina e �-tubulina. À medida que o microtúbulo cresce, a �-tubulina de cada heterodímero de tubulina hidrolisa o GTP a GDP. A hidrólise do GTP a GDP introduz uma mudança de conformação na tubulina, que deses- tabiliza o microtúbulo. O mecanismo exato dessa desestabili- zação não é conhecido, mas pode estar relacionado com uma redução na força das interações laterais dos protofilamentos ou a um aumento na tendência dos protofilamentos a “curvar-se”, distanciando-se do microtúbulo reto. Por conseguinte, a estabilidade do microtúbulo é determina- da pela taxa de polimerização do microtúbulo em relação à taxa de hidrólise do GTP pela �-tubulina. Quando um microtúbulo polimeriza a tubulina mais rapidamente do que a hidrólise do GTP a GDP pela �-tubulina, observa-se, então, um cap de �- tubulina ligada ao GTP na extremidade (+) do microtúbulo, no estado de equilíbrio dinâmico. Esse cap de GTP proporciona estabilidade à estrutura do microtúbulo, permitindo uma maior polimerização do microtúbulo. Por outro lado, se a polimeriza- ção da tubulina procede mais lentamente do que a hidrólise do GTP a GDP pela �-tubulina, a extremidade (+) do microtúbulo é enriquecida com �-tubulina ligada a GDP no estado de equi- líbrio dinâmico. Essa conformação de tubulina ligada ao GDP é instável e induz uma rápida despolimerização do microtúbulo. A capacidade rápida de montagem e desmontagem dos micro- túbulos é importante para suas numerosas funções fisiológicas. Os agentes farmacológicos podem interromper a função dos microtúbulos, impedindo a montagem da tubulina em micro- túbulos ou estabilizando os microtúbulos já existentes (e, dessa maneira, impedindo a sua desmontagem). Os microtúbulos possuem funções fisiológicas importantes na mitose, no trânsito de proteínas intracelulares, no movi- mento vesicular e na estrutura e forma das células. A mitose é a função fisiológica que serve de alvo para agentes farma- cológicos; entretanto, as outras funções fisiológicas fornecem uma previsão de muitos dos efeitos adversos dos fármacos que interrompem a função dos microtúbulos. Convém lembrar que os microtúbulos se formam a partir de centrossomos, que consistem em centríolos e outras proteínas associadas. Na mitose, os dois centrossomos alinham-se nas extremidades opostas da célula. Os microtúbulos são extrema- mente dinâmicos durante a fase M; crescem e encurtam-se duran- te a fase M, numa taxa muito maior do que durante as outras fases do ciclo celular. Esse aumento na instabilidade dinâmica durante a fase M permite a localização e a fixação dos micro- túbulos aos cromossomos. Os microtúbulos que surgem a partir de cada centrossomo ligam-se a cinetócoros, que consistem em proteínas que se fixam ao centrômero de um cromossomo. Quan- do o cinetócoro de cada cromossomo fixa-se a um micrótubulo, as proteínas associadas ao microtúbulo atuam como motores, alinhando os cromossomos ligados aos cinetócoros no equador da célula (definido como o ponto médio entre os dois centros- somos). Quando cada cromossomo está alinhado no equador, os microtúbulos encurtam-se, separando um par diplóide de cro- mossomos em cada metade da célula. Por fim, ocorre a citocinese (isto é, a divisão do citoplasma), com formação de duas células filhas. Embora numerosas outras proteínas estejam envolvidas na regulação da mitose, os microtúbulos desempenham um papel crítico no processo. A ruptura na função dos microtúbulos conge- la as células na fase M, levando finalmente à ativação da morte celular programada (apoptose). GTP GTP GDP GTP Subunidade α-tubulina β-tubulina (atividade de GTPase) 24 nm Fig. 37.11 Estrutura do microtúbulo. Os microtúbulos são túbulos cilíndricos ocos que se polimerizam a partir de subunidades de tubulina. Cada subunidade de tubulina é um heterodímero composto de �-tubulina (na cor cinza) e �-tubulina (na cor azul). Tanto a �-tubulina quanto a �-tubulina ligam-se ao GTP (tonalidade escura de cinza e azul); a �-tubulina hidrolisa o GTP a GDP após a adição da subunidade de tubulina à extremidade de um microtúbulo (tonalidade mais clara de cinza e azul). Os microtúbulos são estruturas dinâmicas que crescem e se encurtam no sentido longitudinal; os tubos cilíndricos são compostos de 13 subunidades de disposição concêntrica, resultando em um diâmetro de 24 nm. Observe que os microtúbulos possuem uma assimetria estrutural inerente. Uma das extremidades do microtúbulo é limitada pela �-tubulina e denominada extremidade (–) (“menos”); a extremidade oposta é limitada pela �-tubulina e denominada extremidade (+) (“mais”). 640 | Capítulo Trinta e Sete de fitas. Esses fármacos atuam primariamente durante a fase S do ciclo celular, quando está ocorrendo replicação do DNA nas células. Outra grande classe de agentes, que provoca citotoxici- dade através de modificação na estrutura do DNA e produção de lesão do DNA, inclui os agentes alquilantes, os compos- tos de platina, a bleomicina e os inibidores da topoisomerase. Esses fármacos exercem seus efeitos em diversas fases do ciclo celular. A última categoria de agentes inibe a montagem ou a despolarização dos microtúbulos, rompendo o fuso mitótico e interferindo na mitose. INIBIDORES DA TIMIDILATO SINTASE O timidilato (dTMP) é sintetizado através de metilação do 2�-desoxiuridilato (dUMP). Essa reação, que é catalisada pela timidilato sintase, necessita de MTHF como co-fator (Fig. 37.4). A 5-fluoruracila (5-FU; Fig. 37.13) inibe a síntese do DNA, interferindo primariamente na biossíntese do timidilato. A 5-FU é inicialmente convertida em 5-fluoro-2�-desoxiuridi- lato (FdUMP) pelas mesmas vias que convertem a uracila em dUMP. A seguir, o FdUMP inibe a timidilato sintase através Altas concentrações de tubulina ligada ao GTP Microtúbulo de comprimento aumentado Taxa de hidrólise do GTP = Taxa de polimerização Cap de GTP preservado Taxa de hidrólise de GTP > Taxa de polimerização Constrição do cap de GTP Perda do cap de GTP Microtúbulo instável, despolimerização Baixas concentrações de tubulina ligada ao GTP Microtúbulo preexistente Cap de tubulina ligada ao GTP α-tubulina β-tubulina A B C D Fig. 37.12 Instabilidade dinâmica dos microtúbulos. A. Um microtúbulo preexistente caracteriza-se por subunidades de tubulina que hidrolisaram predominantemente o GTP da �-tubulina a GDP (cinza-claro e azul-claro). Todavia, as subunidades de �-tubulina que foram recentemente adicionadas ao microtúbulo ainda não hidrolisaram o GTP (cinza-escuro e azul-escuro). As subunidades de tubulina ligadas ao GTP formam um cap de tubulina ligado ao GTP na extremidade (+) do microtúbulo. B. Na presença de uma alta concentração de subunidades de tubulina livres ligadas ao GTP, ocorre adição de nova tubulina ligada ao GTP à extremidade (+) do microtúbulo, numa taxa igual ou superior à taxa de hidrólise do GTP pela �-tubulina. A manutenção de um cap de tubulina ligada ao GTP resulta em um microtúbulo estável. C. Na presença de baixa concentração de subunidades de tubulina livre ligadas ao GTP, ocorre adição de nova tubulina ligada ao GTP à extremidade (+) do microtúbulo, numa taxa inferior à taxa de hidrólise do GTP pela �-tubulina. Isso resulta em constrição do cap de tubulina ligada ao GTP. D. O microtúbulo que carece de cap de tubulina ligada ao GTP é instável e sofre despolimerização. HN O NH O HN O NH O F Uracila 5-Fluoruracila (5-FU) Fig. 37.13 Estruturas da uracila e da 5-fluoruracila. Observe a semelhança estrutural entre a uracila e a 5-fluoruracila (5-FU). A uracila é a base no dUMP, o substrato endógeno da timidilato sintase (ver Fig. 37.4), e a 5-FU é metabolizada a FdUMP, um inibidor irreversível da timidilato sintase. CLASSES E AGENTES FARMACOLÓGICOS A quimioterapia antineoplásica tradicional pode ser subdivi- dida em diversas classes de agentes. Os antimetabólitos são compostos que inibem as enzimas envolvidas na síntese e no metabolismo de nucleotídios ou que se incorporam como análo- gos ao DNA, resultando em terminação da cadeia ou quebras Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 641 INIBIDORES DO METABOLISMO DAS PURINAS A 6-mercaptopurina (6-MP) e a azatioprina (AZA), um pró-fár- maco convertido não-enzimaticamente em 6-MP nos tecidos, são análogos da inosina, que inibem as interconversões entre nucleotí- dios de purina (Fig. 37.14). A 6-mercaptopurina contém um átomo de enxofre em lugar do grupo ceto no C-6 do anel de purina. Após a sua entrada nas células, a mercaptopurina é convertida pela enzi- ma hipoxantina-guanina fosforribosil transferase (HGPRT, ver Cap. 47) na forma de nucleotídio, o 5�-monofosfato de 6-tioinosina (T-IMP). Acredita-se que o T-IMP inibe a síntese de nucleotídios de purina através de vários mecanismos. Em primeiro lugar, o T-IMP inibe as enzimas que convertem o IMP em AMP e GMP, incluindo a monofosfato de inosina desidrogenase (IMPDH) (Fig. 37.3). Em segundo lugar, o T-IMP (a exemplo do AMP e do GMP) é um inibidor por “retroalimentação” da enzima que sintetiza a fosforribosilamina, a primeira etapa na síntese de nucleotídios de purinas. Ambos os mecanismos levam a uma acentuada redução nos níveis celulares de AMP e de GMP, que são metabólitos essen- ciais para a síntese de DNA, a síntese de RNA, o armazenamento de energia, a sinalização celular e outras funções. A 6-MP também pode inibir a síntese de DNA e de RNA através de mecanismos menos bem caracterizados. A principal aplicação clínica da 6-MP é observada na leu- cemia linfoblástica aguda (LLA), particularmente na fase de manutenção de um esquema prolongado de quimioterapia de combinação. A 6-MP também se mostra ativa contra os linfóci- tos normais e pode ser utilizada como agente imunossupressor. Por razões desconhecidas, o pró-fármaco AZA é um imunos- supressor superior em comparação com a 6-MP e constitui, tipicamente, o fármaco de escolha para essa aplicação. A AZA é discutida de modo pormenorizado no Cap. 44. da formação, juntamente com MTHF, de um complexo enzi- ma–substrato–co-fator ternário covalente e estável. As células privadas de dTMP por um período suficiente sofrem a deno- minada “morte por falta de timina”. A 5-FU também pode ser metabolizada a trifosfato de floxuridina (FUTP), que pode ser incorporado ao mRNA em lugar do uridilato, podendo interfe- rir, assim, no processamento do RNA. A inibição da timidilato sintase pelo FdUMP ou a interferência no processamento do RNA pelo FUTP ou uma combinação de ambos os mecanis- mos podem explicar o efeito tóxico da 5-FU sobre as células. Todavia, evidências recentes demonstram que certos congêne- res da 5-FU, que inibem a timidilato sintase, mas que não se incorporam ao RNA, possuem eficácia antitumoral semelhante à da 5-FU. Esse achado aponta a inibição da timidilato sintase como mecanismo dominante de ação da 5-FU. A 5-FU é utilizada como agente antineoplásico, particular- mente no tratamento de carcinomas de mama e do trato gas- trintestinal. A 5-FU também tem sido utilizada no tratamento tópico de ceratoses pré-malignas da pele ou de múltiplos car- cinomas de células basais superficiais. Como a 5-FU provo- ca depleção de timidilato nas células normais, bem como nas células cancerosas, esse fármaco é altamente tóxico e deve ser utilizado com cautela. A capecitabina é um pró-fármaco da 5-FU disponível por via oral. A capecitabina é absorvida pela mucosa gastrintestinal e convertida em 5-FU através de uma série de três reações enzimáticas. A capecitabina foi aprovada para o tratamento do câncer colorretal metastático e como terapia de segunda linha no câncer de mama metastático. Os estudos clínicos demons- traram ser a eficácia da capecitabina oral semelhante à da 5-FU por via intravenosa. A elucidação do mecanismo de ação da 5-FU levou ao uso de uma combinação de 5-FU/ácido folínico (leucovorina) como quimioterapia de primeira linha para o câncer colorretal. Como a 5-FU inibe a timidilato sintase através da formação de um complexo ternário envolvendo a enzima (timidilato sintase), o substrato (5-FdUMP) e o co-fator MTHF, foi aventada a hipó- tese de que um aumento nos níveis de MTHF poderia poten- cializar a atividade da 5-FU. Os estudos clínicos realizados comprovaram que essa hipótese era correta, mostrando que a eficácia do esquema de combinação é superior à da 5-FU admi- nistrada como único medicamento. Trata-se de um exemplo importante do uso do conhecimento dos mecanismos envolvi- dos para melhorar a eficiência clínica de um fármaco. O pemetrexede é um análogo do folato que, à semelhan- ça do folato endógeno e do inibidor da diidrofolato redutase (DHFR), o metotrexato (ver Cap. 31), é transportado para o interior das células pelo carreador de folato reduzido e poliglu- tamatado pela enzima intracelular folilpoliglutamato sintase. O pemetrexede poliglutamatado é um potente inibidor da timidi- lato sintase e um inibidor muito mais fraco da DHFR. À seme- lhança da 5-FU, seu efeito citotóxico deve-se, provavelmente, à indução de morte celular “por ausência de timina”. (Observe que o derivado da 5-FU, 5-FdUMP, inibe a timidilato sintase através de sua ligação ao sítio dUMP [substrato] da enzima, enquanto o pemetrexede inibe a timidilato sintase através de sua ligação ao sítio MTHF [co-fator] na enzima.) O pemetrexede foi aprovado como único agente no tratamento de segunda linha do câncer pulmonar de células não-pequenas e em combina- ção com cisplatina (ver adiante) no tratamento do mesotelioma pleural maligno. Para reduzir a toxicidade nas células normais, os pacientes tratados com pemetrexede também recebem suple- mentação de ácido fólico e de vitamina B12. HN N NH N H2N S HN NH2N O N H N HN N NH N S N N NH N S O2NN N Mercaptopurina Tioguanina Azatioprina (pró-fármaco) Guanina Fig. 37.14 Estruturas da guanina, da tioguanina, da azatioprina e da mercaptopurina. A tioguanina, a azatioprina e a mercaptopurina são análogos estruturais das purinas. A tioguanina assemelha-se à guanina e pode ser ribosilada e fosforilada paralelamente com nucleotídios endógenos. As formas de nucleotídio da tioguanina inibem irreversivelmente a IMPDH (ver Fig. 37.3) e, após a sua incorporação ao DNA, inibem a sua replicação. A azatioprina é um pró-fármaco da mercaptopurina; a azatioprina reage com compostos sulfidrílicos no fígado (por exemplo, glutationa), liberando mercaptopurina. A forma de nucleotídio da mercaptopurina, o monofosfato de tioinosina (T-IMP), inibe as enzimas que convertem o IMP em AMP e GMP (ver Fig. 37.3). O T-IMP também inibe a primeira etapa condicionada na síntese de nucleotídios de purina. 642 | Capítulo Trinta e Sete Tanto a eficiência quanto a toxicidade da 6-MP são poten- cializadas pelo alopurinol. O alopurinol inibe a xantino-oxi- dase, impedindo, assim, a oxidação da 6-MP a seu metabólito inativo, o ácido 6-tioúrico. (Com efeito, o alopurinol foi descoberto em um esforço no sentido de inibir o metabolis- mo da 6-MP pela xantina oxidase.) A co-administração de alopurinol com 6-MP permite uma redução da dose de 6-MP em até dois terços (embora a toxicidade também seja pro- porcionalmente aumentada). O alopurinol é freqüentemente utilizado como único medicamento para prevenir a hiperu- ricemia que pode surgir em conseqüência da destruição das células cancerosas por agentes quimioterápicos (síndrome de lise tumoral). O uso do alopurinol no tratamento da gota é descrito no Cap. 47. A pentostatina (Fig. 37.15) é um inibidor seletivo da ADA. O fármaco é um análogo estrutural do intermediário na reação catalisada pela ADA e liga-se à enzima com alta afinidade. A conseqüente inibição da ADA produz um aumento nos níveis intracelulares de adenosina e de 2�-desoxiadenosina. Os níveis aumentados de adenosina e de 2�-desoxiadenosina possuem múl- tiplos efeitos sobre o metabolismo dos nucleotídios de purina. Em particular, a 2�-desoxiadenosina inibe irreversivelmente a S-adenosil-homocisteína hidrolase, e aumento resultante dos níveis intracelulares de S-adenosil-homocisteína é tóxico para os linfócitos. Essa ação pode explicar a eficiência da pentostatina contra algumas leucemias e linfomas. A pentostatina mostra-se particularmente efetiva contra a leucemia de células pilosas. INIBIDORES DA RIBONUCLEOTÍDIO REDUTASE A hidroxiuréia inibe a ribonucleotídio redutase ao eliminar um radical tirosil no sítio ativo da enzima. Na ausência desse radical livre, a ribonucleotídio redutase é incapaz de converter nucleotídios em desoxinucleotídios, com conseqüente inibição da síntese de DNA. A hidroxiuréia é aprovada para uso no tratamento da anemia falciforme do adulto e certas doenças neoplásicas. O mecanis- mo de ação da hidroxiuréia no tratamento da anemia falciforme pode ou não estar relacionado com a inibição da ribonucleotídio redutase. Como alternativa desse mecanismo, foi constatado que a hidroxiuréia aumenta a expressão da isoforma fetal da hemoglobina (HbF), que inibe a polimerização da hemoglo- bina falciforme (HbS), diminuindo, assim, o afoiçamento dos eritrócitos em condições de hipoxia. A hidroxiuréia diminui significativamente a incidência de crise dolorosa (vasoclusiva) em pacientes com anemia falciforme. O mecanismo pelo qual a hidroxiuréia aumenta a produção de HbF não é conhecido. O papel da hidroxiuréia no tratamento da anemia falciforme é discutido mais detalhadamente no Cap. 43. As aplicações neoplásicas da hidroxiuréia incluem câncer de cabeça e pescoço e distúrbios mieloproliferativos, como poli- citemia vera e trombocitose essencial. No câncer de cabeça e pescoço, a hidroxiuréia é utilizada como agente radiossensibili- zante (isto é, agente que aumenta a eficiência da radioterapia). O mecanismo de radiossensibilização permanece desconhecido, e as teorias atuais sugerem que a hidroxiuréia pode aumentar a sensibilidade das células tumorais à irradiação ao diminuir o reparo do DNA ou ao sincronizar o tempo do ciclo celu- lar das células tumorais. Nos distúrbios mieloproliferativos, a hidroxiuréia pode ser utilizada como único medicamento ou em associação com outros agentes para inibir o crescimento exces- sivo de células mielóides na medula óssea. As aplicações da hidroxiuréia para essas indicações têm sido um tanto limitadas pela preocupação de que o uso a longo prazo do fármaco pos- sa ser leucemogênico. A hidroxiuréia fornece um exemplo do fenômeno segundo o qual certos agentes antitumorais também podem causar câncer. ANÁLOGOS DAS PURINAS E DAS PIRIMIDINAS QUE SE INCORPORAM AO DNA Vários antimetabólitos exercem seu principal efeito terapêutico ao atuar como nucleotídios “trapaceiros”. Esses fármacos são substra- tos nas diversas vias de metabolismo dos nucleotídios, incluindo ribosilação, redução de ribonucleotídios e fosforilação de nucleosí- dios e nucleotídios. As formas de trifosfato de açúcar desses fárma- cos podem ser então incorporadas ao DNA. Uma vez incorporados no DNA, esses compostos atacam a estrutura do DNA, resultando em terminação de sua cadeia, quebra de fitas do DNA e inibição do crescimento celular. A tioguanina é um análogo da guanina em que um átomo de enxofre substitui o átomo de oxigênio em C6 do anel de purina (Fig. 37.14). A exemplo da mercaptopurina, a tioguanina é convertida pela HGPRT em sua forma de nucleotídio, o 5�-monofosfato de 6-tioguanosina (6-tioGMP). Ao contrário do T-IMP, a forma de nucleotídio da mercaptopurina, o 6-tioGMP constitui um bom substrato para a guanilil cinase, a enzima que N NN N NH2 O OHOH HH HH HO N N O OH H H H HH HO N NH OH N N N NH2 ClN O HOH HH HH HO N N N NH2 FN O H HOH HH OH P O HO O OH Adenosina Pentostatina (2'-Desoxicoformicina) Cladribina 5’-Fosfato de fludarabina A B Fig. 37.15. Estruturas da adenosina, da pentostatina, da cladribina e da fludarabina. A. A pentostatina inibe a adenosina desaminase (ADA), a enzima que converte a adenosina e a 2�-desoxiadenosina em inosina e 2�- desoxiinosina, respectivamente. A pentostatina liga-se à ADA com afinidade muito alta (Kd = 2,5 � 10–12 M), devido à sua semelhança estrutural com o intermediário (estado de transição) nessa reação enzimática. B. A cladribina e 5�-fosfato de fludarabina também são análogos da adenosina. A cladribina é um análogo de purina clorado que se incorpora ao DNA e provoca quebras das fitas de DNA. O fosfato de fludarabina é um análogo de purina fluorado que se incorpora ao DNA e ao RNA; esse fármaco também inibe a DNA polimerase e a ribonucleotídio redutase. Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 643 catalisa a conversão do GMP em GTP. Através desse mecanismo, o 6-tioGMP é convertido em 6-tioGTP, que é incorporado ao DNA. Dentro da estrutura do DNA, o 6-tioGTP interfere na transcrição do RNA e na replicação do DNA, resultando em morte celular. O 6-tioGMP também inibe de modo irreversível a IMPDH e, por- tanto, causa depleção das reservas celulares de GMP (Fig. 37.3). A tioguanina é utilizada no tratamento da leucemia mielocítica aguda. Os principais efeitos adversos da tioguanina consistem em supressão da medula óssea e lesão gastrintestinal. O fosfato de fludarabina (Fig. 37.15) é um análogo de nucleotídio de purina fluorado estruturalmente relacionado com o agente antiviral vidarabina (ver Cap. 36). A forma de trifos- fato da fludarabina incorpora-se ao DNA e ao RNA, resultando em terminação da cadeia de DNA. O trifosfato de fludarabina também inibe a DNA polimerase e a ribonucleotídio redutase e, portanto, diminui a síntese de nucleotídios e de ácidos nucléicos nas células. A importância relativa dessas ações na toxicidade celular do fármaco ainda não foi elucidada. O fosfato de flu- darabina é utilizado no tratamento de distúrbios linfoprolifera- tivos, particularmente a leucemia linfocítica crônica (LLC) e os linfomas de células B de baixo grau. A cladribina é um análogo de purina clorado, estrutural- mente relacionado com o fosfato de fludarabina (Fig. 37.15). O trifosfato de cladribina incorpora-se ao DNA, causando quebras de suas fitas. A cladribina também provoca depleção das reser- vas intracelulares dos metabólitos purínicos essenciais, NAD e ATP. A cladribina foi aprovada para uso no tratamento da leu- cemia de células pilosas e tem sido utilizada experimentalmente no tratamento de outros tipos de leucemia e linfoma. A citarabina (araC) é um análogo da citidina metabolizado a araCTP (Fig. 37.16). O araCTP compete com o CTP pela DNA polimerase, e a incorporação do araCTP ao DNA resulta em terminação da cadeia e morte celular (Fig. 37.4). Foi obser- vado um sinergismo entre a citarabina e a ciclofosfamida, pre- sumivelmente devido à redução do reparo do DNA produzida pela inibição da DNA polimerase pela citarabina. A citarabina é utilizada para indução e manutenção da remissão na leucemia mielocítica aguda; mostra-se particularmente efetiva para essa indicação quando associada a uma antraciclina. A 5-azacitidina é um análogo da citidina cujo metabólito trifosfato é incorporado ao DNA e ao RNA (Fig. 37.16). Uma vez incorporada no DNA, a azacitidina interfere na metila- ção da citosina, alterando a expressão gênica e promovendo a diferenciação celular. Na atualidade, a azacitidina é utilizada no tratamento da mielodisplasia e está sendo investigada para uso no tratamento das leucemias agudas. A gencitabina é um análogo da citidina fluorado em que os átomos de hidrogênio no carbono 2� da desoxicitidina são substituídos por átomos de flúor. A forma de difosfato da gen- citabina inibe a ribonucleotídio redutase; a forma de trifosfa- to da gencitabina é incorporada ao DNA, interferindo na sua replicação e resultando em morte celular. A gencitabina mos- tra-se ativa contra tumores sólidos, incluindo câncer pancreá- tico e câncer de pulmão de células não-pequenas; além disso, está sendo avaliada em esquemas de tratamento de neoplasias malignas, como doença de Hodgkin. AGENTES QUE MODIFICAM DIRETAMENTE A ESTRUTURA DO DNA Agentes Alquilantes O advento da quimioterapia moderna data da década de 1940, quando foi observado pela primeira vez que agentes alqui- lantes altamente reativos eram capazes de induzir remissões em neoplasias malignas até então intratáveis. O uso clínico desses agentes foi favorecido por observações em marinhei- ros inadvertidos expostos a mostardas nitrogenadas durante a Segunda Guerra Mundial. Foi constatado que esses homens apresentaram uma drástica supressão das células hematopoié- ticas, sugerindo que os agentes alquilantes podem ter utilidade terapêutica em neoplasias malignas derivadas do sangue, como as leucemias e os linfomas. Pouco depois, foi sugerido que os agentes alquilantes também poderiam ser úteis no tratamento de tumores epiteliais, tumores mesenquimatosos, carcinomas e sarcomas; com efeito, hoje em dia esses agentes são comumente utilizados no tratamento de todas essas doenças. Os agentes alquilantes — como a ciclofosfamida, a meclo- retamina, a melfalana, a clorambucila e a tiotepa — são moléculas eletrofílicas que são atacadas por sítios nucleofílicos no DNA, resultando em fixação covalente de um grupo alquila ao sítio nucleofílico. Dependendo do agente específico, a alqui- lação pode ocorrer nos átomos de nitrogênio ou de oxigênio da base, na estrutura de fosfato ou em uma proteína associada ao DNA. Os átomos N-7 e O-6 das bases de guanina mos- tram-se particularmente suscetíveis à alquilação. Tipicamente, os agentes alquilantes apresentam dois grupos reativos fortes (Fig. 37.17). Essa estrutura confere a capacidade de bis-alqui- lação (duas reações alquilantes), permitindo a ligação cruzada do agente à própria molécula de DNA — através da ligação de dois resíduos de guanina, por exemplo — ou a proteínas. O HOH HOH HH HO N N NH2 O O OHOH HH HH HO N N N NH2 O O OHOH HH HH HO N N NH2 O Citosina arabinosídio (citarabina, AraC) 5-AzacitidinaCitidina Fig. 37.16 Estruturas da citidina, da citarabina e da azacitidina. Tanto a citarabina quanto a azacitidina são análogos do nucleosídio citidina. A citarabina possui um açúcar arabinose em lugar da ribose (observe a quiralidade do grupo hidroxila mostrado em azul). A incorporação do trifosfato de citarabina (araCTP) ao DNA inibe a síntese posterior de ácido nucléico, visto que a substituição da 2�-desoxirribose pela arabinose interrompe o alongamento da fita. A azacitidina possui um grupo azida (indicado em azul) dentro do anel de pirimidina; esse fármaco incorpora-se aos ácidos nucléicos e interfere na metilação das bases de citosina. 644 | Capítulo Trinta e Sete A bis-alquilação (ligação cruzada) parece constituir o princi- pal mecanismo de citotoxicidade (Fig. 37.18A). A alquilação dos resíduos de guanina também pode resultar em clivagem do anel de guanina imidazol, no emparelhamento anormal de bases entre a guanina alquilada e a timina, ou em despurina- ção (isto é, excisão do resíduo de guanina) (Fig. 32.18B-D). A clivagem do anel rompe a estrutura molecular do DNA; o emparelhamento anormal de bases de DNA provoca codifica- ção incorreta e mutação, enquanto a despurinação leva à cisão do arcabouço de açúcar-fosfato do DNA. É importante ressaltar que as mutações causadas por esses processos podem aumentar o risco de desenvolvimento de novos cânceres. Embora todas as mostardas nitrogenadas sejam relativamen- te reativas, cada agente em particular varia na sua velocidade de reação com nucleófilos, e esse aspecto possui impacto signi- N ClCl NH NN N O NH2 Cadeia de DNA Cadeia de DNA Cadeia de DNA Cadeia de DNA Cadeia de DNA Cadeia de DNA Cadeia de DNA N NN N OH NH2 N Cl N NN N OH NH2 N Cl N NN N OH NH2 N N N N N OH H2N N NHN N OH NH2 N Cl O N NN N O N N Cl N N O O H H H H A D B C Mecloretamina Guanina Guanina alquilada Ligação cruzada do DNA Emparelhamento anormal de bases (ligação da guanina alquilante através de hidrogênio à timina) Excisão da guanina do DNA Clivagem do anel Fig. 37.18 Desfechos bioquímicos da alquilação da guanina. Em reações como aquelas exemplificadas aqui com a mecloretamina, a alquilação da guanina pode provocar vários tipos de lesão do DNA. O nitrogênio da mecloretamina efetua um ataque nucleofílico em um de seus próprios �-carbonos, resultando em um intermediário instável altamente eletrofílico (não ilustrado). O N-7 nucleofílico da guanina reage com esse intermediário instável, resultando em guanina alquilada. Existem quatro desfechos potenciais que podem resultar dessa alquilação inicial, e todos eles provocam lesão estrutural do DNA. A. O processo de alquilação pode ser repetido, em que uma segunda guanina atua como nucleófilo. A conseqüente ligação cruzada do DNA parece constituir um importante mecanismo pelo qual os agentes alquilantes causam lesão do DNA. B. A clivagem do anel imidazol rompe a estrutura da base de guanina. C. A guanina alquilada pode ligar-se através de hidrogênio mais à timina do que à citosina, resultando em mutação no DNA. D. A excisão do resíduo de guanina alquilada resulta em fita de DNA desprovida de purina. O P H N O N Cl Cl N N H O Cl Cl N O Ciclofosfamida BCNU (Carmustina, uma nitrosouréia) Fig. 37.17 Estruturas da ciclofosfamida e da BCNU. A ciclofosfamida e a BCNU (carmustina) possuem dois grupos reativos de cloreto. A presença de dois grupos reativos permite a bis-alquilação por esses agentes alquilantes, com conseqüente ligação cruzada de macromoléculas, como o DNA. A capacidade de ligação cruzada do DNA é crucial para a lesão do DNA provocada por esses fármacos. Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 645 ficativo no seu uso clínico. Os compostos altamente instáveis, como a mecloretamina, não podem ser administrados por via oral, visto que esses agentes alquilam moléculas-alvo dentro de segundos a minutos. Em virtude dessa alta reatividade, essas moléculas são poderosos vesicantes (isto é, que produzem vesículas), podendo causar grave lesão da pele e dos tecidos moles se houver extravasamento dos vasos sangüíneos. A rápi- da reatividade dos agentes alquilantes pode ser explorada pela infusão direta do fármaco no local de um tumor. Por exemplo, a tiotepa pode ser instilada na bexiga para tratar os cânceres de bexiga superficiais. Ao contrário da mecloretamina e da tiotepa, a clorambucila e a melfalana são muito menos reativas e, por- tanto, podem ser administradas por via oral. A ciclofosfamida mostra-se particularmente útil, visto que se trata de um pró- fármaco não-reativo, que exige ativação pelo sistema hepático do citocromo P450; esse agente pode ser administrado por via oral ou intravenosa (Fig. 37.19). As nitrosouréias, como a BCNU (carmustina), atuam sobre o alvo de DNA de modo muito semelhante à ciclofosfa- mida e outros agentes alquilantes. A exemplo da ciclofosfami- da, esses compostos devem sofrer bioativação. Entretanto, ao contrário da maioria dos agentes alquilantes, as nitrosouréias fixam também grupos carbamoil a seus alvos associados ao DNA. Ainda não foi esclarecido se a carbamoilação contribui significativamente para a atividade das nitrosouréias. Alguns agentes alquilantes são melhores do que outros na sua ação contra tumores específicos. Assim, por exemplo, as nitrosouréias são úteis no tratamento de tumores cerebrais, visto que a sua elevada lipossolubilidade permite que atravessem a barreira hematoencefálica. De modo semelhante, o antibiótico alquilante mitomicina atua contra células tumorais hipóxicas, como as que se encontram no centro de um tumor sólido, visto que exige a sua ativação biorredutiva, que ocorre mais rapida- mente em ambientes com baixo teor de oxigênio. Três agentes alquilantes não-clássicos também devem ser mencionados como fármacos clinicamente úteis. O primeiro deles é a dacarbazina, uma molécula sintética que é compo- nente de um esquema de quimioterapia de combinação poten- cialmente curativo para a doença de Hodgkin. A dacarbazina também possui alguma atividade no tratamento do melanoma e de sarcomas. A procarbazina é um fármaco ativo por via oral utilizado no tratamento da doença de Hodgkin. Um metabólito da procarbazina atua como inibidor da monoamina oxidase, e pode ocorrer toxicidade relacionada com essa atividade — como sensi- bilidade à tiramina, hipotensão e ressecamento da boca. Por fim, a altretamina mostra-se útil no tratamento do câncer ovariano refratário. Embora seja estruturalmente relacionada com os agen- tes alquilantes da classe da trietilenomelamina (como a tiotepa), ainda existem controvérsias quanto ao fato de o mecanismo de ação desse fármaco envolver a alquilação do DNA. Através da seleção natural, as células tumorais podem desen- volver resistência a um único agente alquilante, bem como resistência cruzada a outros fármacos da mesma classe. Foram relatados diversos mecanismos para o desenvolvimento da resistência. Os fármacos altamente reativos podem ser desati- vados por nucleófilos intracelulares, como a glutationa. Alter- nativamente, as células podem tornar-se resistentes ao reduzir a captação do fármaco ou ao acelerar o processo de reparo do DNA. Uma enzima, a O6-alquilguanina-DNA alquiltransfe- rase, impede a lesão permanente do DNA ao remover com- plexos de alquila na posição O6 da guanina antes da formação de ligações cruzadas no DNA. O aumento da expressão dessa enzima em células neoplásicas está associado a uma resistência a agentes alquilantes. A toxicidade dos agentes alquilantes depende da dose e pode ser grave. Via de regra, os efeitos adversos resultam da lesão do DNA das células normais. Três tipos de células são prefe- rencialmente afetados pelos agentes alquilantes. Em primeiro lugar, a toxicidade manifesta-se tipicamente nos tecidos de rápi- da proliferação, como a medula óssea, o epitélio do trato gas- trintestinal e do trato genitourinário e os folículos pilosos. Isso resulta em mielossupressão, distúrbio gastrintestinal e alopecia (queda dos cabelos). Em segundo lugar, a toxicidade específica de órgãos pode resultar da baixa atividade de uma via de reparo O P N H N O Cl Cl O P N H N O Cl Cl HO O P N H N O Cl Cl O O P NH2N OH Cl Cl O H O P NH2N O Cl Cl H O O P NH2N O Cl Cl HO O + Ciclofosfamida Pró-fármaco (inativo) Oxidase do citocromo P450 do fígado Aldeído oxidase 4-Hidroxiciclofosfamida (ativa) 4-Cetociclofosfamida (inativa) Aldofosfamida (ativa) Acroleína (citotóxica) Mostarda de fosforamida (citotóxica) Carboxifosfamida (inativa) Fig. 37.19 Ativação e metabolismo da ciclofosfamida. A ciclofosfamida é um pró-fármaco que deve ser oxidado por enzimas P450 do fígado para se tornar farmacologicamente ativo. A hidroxilação converte a ciclofosfamida em 4-hidroxiciclofosfamida; esse metabólito ativo pode ser ainda oxidado ao metabólito inativo, a 4-cetociclofosfamida, ou sofrer clivagem do anel ao metabólito ativo, a aldofosfamida. A aldofosfamida pode ser oxidada pela aldeído oxidase ao metabólito inativo, a carboxifosfamida, ou ser convertida nos metabólitos altamente tóxicos, a acroleína e a mostarda de fosforamida. O acúmulo de acroleína na bexiga pode causar cistite hemorrágica; esse efeito adverso da ciclofosfamida pode ser atenuado pela co-administração de mesna, um composto sulfidrílico que inativa a acroleína (não ilustrado). 646 | Capítulo Trinta e Sete da inativação do fármaco através da síntese supra-regulada de nucleófilos, como a glutationa. Conforme demonstrado no caso de J. L., a cisplatina mostra- se eficaz no tratamento dos cânceres genitourinários, incluindo câncer do testículo, da bexiga e do ovário. A cisplatina e o composto relacionado, a carboplatina (Fig. 37.20), também estão entre os fármacos mais eficazes utilizados contra o câncer de pulmão. A exemplo de muitos agentes quimioterápicos, o fundamento lógico para a eficácia da cisplatina e da carbopla- tina no tratamento de certos tipos de tumores em comparação com outros ainda não está bem esclarecido. A cisplatina pode ser administrada por via intravenosa, mas também pode ser efetiva quando exposta diretamente às células tumorais. Um exemplo é o tratamento do câncer ovariano, que se dissemina ao longo do revestimento interno da cavidade peritoneal. Para essa aplicação, a cisplatina pode ser adminis- trada na forma de infusão direta na cavidade peritoneal para obter concentrações locais elevadas do fármaco, diminuindo, ao mesmo tempo, a toxicidade sistêmica. O oncologista de J. L. considerou cuidadosamente as toxici- dades da cisplatina ao estabelecer a dose desse fármaco e dos outros agentes incluídos no esquema de quimioterapia de com- binação. Como as toxicidades que limitam a dose de cisplatina, da bleomicina e do etoposídeo diferem umas das outras, cada um desses fármacos pode ser utilizado na dose máxima tolerada (ver Cap. 39). No caso da cisplatina, a toxicidade que limita a dose do fármaco consiste em nefrotoxicidade. Os sintomas gastrintestinais, como náusea e vômitos, também são comuns; esse fato é preocupante, uma vez que a desidratação que ocorre em conseqüência de vômitos prolongados pode exacerbar a lesão renal induzida pela cisplatina e levar a uma insuficiência renal irreversível. A neurotoxicidade, que se manifesta primariamente na forma de parestesias das mãos e dos pés e perda da audição, também ocorre com freqüência. Os compostos que contêm tiol, como a amifostina, podem melhorar a nefrotoxicidade da cis- platina sem diminuir seus efeitos antitumorais. A carboplatina, um análogo da cisplatina associado a menos nefrotoxicidade, substituiu a cisplatina em muitos esquemas de quimioterapia. A oxaliplatina, um terceiro composto de platina, possui atividade no tratamento do câncer colorretal. À semelhança da cisplatina, a oxaliplatina provoca neurotoxicidade cumulativa; a oxaliplatina também induz neurotoxicidade aguda peculiar, que é exacerbada pela exposição a temperaturas frias. Bleomicina As bleomicinas, uma família de glicopeptídios naturais sin- tetizados por uma espécie de Streptomyces, exibem atividade de lesão do DNA no tecido em questão. Em terceiro lugar, um tecido pode ser preferencialmente afetado devido ao acúmulo do composto tóxico neste tecido específico; por exemplo, a acroleína (um subproduto da ativação da ciclofosfamida ou de seu análogo, a ifosfamida) pode produzir cistite hemorrágica, devido a seu acúmulo e concentração na bexiga. Essa toxicida- de pode ser tratada através do uso de uma molécula contendo sulfidrila, a mesna, que também é concentrada na urina e que inativa rapidamente a acroleína. A resposta imune requer uma rápida proliferação dos linfóci- tos, tornando essas células particularmente vulneráveis à lesão por agentes alquilantes. Por conseguinte, além de sua atividade antineoplásica, os agentes alquilantes, como a ciclofosfamida, também são efetivos na produção de imunossupressão. Essa “toxicidade” tem sido utilizada clinicamente: quando adminis- trados em doses mais baixas do que aquelas necessárias para a terapia antineoplásica, os agentes alquilantes são utilizados no tratamento de doenças auto-imunes e na rejeição de órgãos (ver Cap. 44). Uma abordagem para limitar a toxicidade tem sido o desen- volvimento de agentes que se acumulam preferencialmente no interior das células tumorais. Um exemplo de agente desse tipo é a melfalana, ou mostarda de fenilalanina; esse agente foi pla- nejado para ser dirigido contra as células do melanoma, que acumulam fenilalanina para a biossíntese de melanina. Outro exemplo é a estramustina, cujo componente de mostarda está conjugado com estrogênio; esse agente foi desenvolvido con- tra células do câncer de mama que expressam o receptor de estrogênio. É interessante assinalar que nem a melfalana nem a estramustina atuam conforme se pretendia, embora ambos os fármacos tenham utilidade clínica; através de mecanismos que ainda não foram bem elucidados, a melfalana possui atividade contra o mieloma múltiplo, enquanto a estramustina é utilizada no tratamento do câncer de próstata. Compostos de Platina A introdução da cisplatina (cis-diaminodicloroplatina [II]) para uso clínico na década de 1970 transformou tumores previamente intratáveis, como o câncer testicular, em tumores passíveis de cura. A exemplo dos agentes alquilantes, as propriedades anti- neoplásicas da cisplatina foram descobertas por uma observa- ção casual. Durante o estudo dos efeitos da eletricidade sobre bactérias, foi constatado que um produto do eletrodo de platina estava inibindo a síntese de DNA nos micróbios. Ao ser puri- ficado o composto, foi constatado tratar-se da cisplatina, que consiste em um átomo de platina ligado a duas aminas e dois cloros na conformação cis. Esse achado incidental levou ao uso clínico da cisplatina, que hoje em dia constitui o fármaco mais ativo utilizado no tratamento do câncer testicular (ver o caso de J. L.). Como agente antitumoral, acredita-se que a cisplatina atua de modo semelhante aos agentes bis-alquilantes (isto é, agentes alquilantes com dois grupos reativos), através de sua ação sobre os centros nucleofílicos na guanina (N-7 e O-6), adenina (N-1 e N-3) e citosina (N-3). A conformação cis da cisplatina (Fig. 37.20) permite ao fár- maco estabelecer ligações cruzadas intrafita entre resíduos de guanina adjacentes, resultando em lesão do DNA (Fig. 37.21B). Essa característica estrutural é crítica para a ação da cisplati- na. O isômero trans, apesar de sua capacidade de ligar-se de modo covalente ao DNA, exibe pouca atividade antitumoral. As células tumorais podem desenvolver resistência à cispla- tina através de aumento no processo de reparo das lesões do DNA, diminuição da captação do fármaco ou potencialização Fig. 37.20 Estruturas da cisplatina e da carboplatina. A cisplatina e a carboplatina são complexos coordenados de platina (Pt). A estrutura cis dessas moléculas (isto é, a presença dos dois grupos reativos no mesmo lado da molécula, em lugar de extremidades opostas) proporciona a capacidade de ligação cruzada de guaninas adjacentes na mesma fita de DNA (ligação cruzada intrafita) ou, com menos freqüência, em fitas opostas de DNA (ligação cruzada interfita). Compostos semelhantes com conformação trans não podem efetuar ligações cruzadas efetivas de guaninas adjacentes. Pt H3N H3N Cl Cl Pt H3N H3N O O O O Cisplatina Carboplatina Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 647 citotóxica proeminente. Utiliza-se clinicamente uma mistura de vários desses glicopeptídios, que diferem apenas nas cadeias laterais (Fig. 37.21A). A bleomicina liga-se ao DNA e quela o ferro (II), resultando na formação de radicais livres que provocam quebras de fita simples e de fita dupla do DNA. A exemplo de muitos agentes quimioterápicos, os mecanismos de resistência a múltiplos fármacos, como aumento do efluxo de fármacos das células tumorais, podem reduzir a sensibilidade do tumor à bleomicina. No processo de quelação do ferro, a bleomicina forma um anel semelhante ao heme. Acredita-se que o complexo quelado retira um radical de hidrogênio da posição 4� de um resídio de pirimidina adjacente (timina ou citosina). O intermediário instável decompõe-se na presença de oxigênio, produzindo uma pirimidina abstraída e um fosfodiéster livre em uma ou ambas as fitas de DNA (Fig. 37.21A). Em comparação com outros agentes que provocam lesão do DNA, a bleomicina causa menos toxicidade mielossupressiva. Entretanto, devido à sua reatividade com o oxigênio, a bleomi- cina pode causar fibrose pulmonar, que constitui a toxicidade mais problemática do fármaco, que limita a sua dose. Os efei- tos da bleomicina sobre a função pulmonar são cumulativos e A B C Fig. 37.21 Interações da bleomicina, dos compostos de platina e das antraciclinas com o DNA. A. A bleomicina (indicada pela cor azul) liga-se à dupla hélice de DNA e, dessa maneira, expõe nucleotídios do DNA ao átomo de ferro (II) (esfera em azul) que está complexado com a bleomicina. Na presença de oxigênio molecular, o complexo ferro-bleomicina gera espécies de oxigênio ativado que causam quebras de fita simples e de fita dupla no DNA através de um mecanismo de radicais livres. B. Os complexos de platina (na cor azul) efetuam ligações cruzadas com átomos de N-7 em resíduos adjacentes de guanina, formando ligações cruzadas de DNA intrafita. C. A daunorrubicina, uma antraciclina (indicada pela cor azul), intercala-se na estrutura do DNA (ver vista ampliada à direita) e, dessa maneira, impede as etapas de passagem e religação de fitas que constituem parte do ciclo catalítico da topoisomerase II (ver Fig. 32.4). As antraciclinas também podem causar lesão do DNA através de um mecanismo de radicais livres. 648 | Capítulo Trinta e Sete irreversíveis. Por conseguinte, o uso desse agente restringe-se, em grande parte, a esquemas de quimioterapia de combinação potencialmente curativos para o carcinoma testicular e a doença de Hodgkin. No caso de J. L., foi a preocupação com a possibi- lidade de toxicidade pulmonar que levou o médico a proceder a uma rigorosa monitoração da função pulmonar do paciente durante a terapia e a investigar a ocorrência de dispnéia em cada visita. O agravamento da função pulmonar teria exigido um ajuste na terapia de J. L. INIBIDORES DA TOPOISOMERASE Diversos agentes quimioterápicos provocam lesão do DNA ao explorar a função natural de nuclease/ligase das topoisomera- ses; a fisiologia básica desse processo é discutida no Cap. 32. As camptotecinas, as antraciclinas, as epipodofilotoxinas e a ansacrina antineoplásicas atuam dessa maneira. Esses com- postos interferem na função adequada das topoisomerases e induzem as topoisomerases celulares a participar na destruição do DNA. Camptotecinas As camptotecinas são moléculas semi-sintéticas derivadas de extratos alcalóides da árvore Camptotheca. O alvo das campto- tecinas é a topoisomerase I, causando lesão das fitas de DNA. A topoisomerase I modula as superespirais através da for- mação de complexo com DNA e quebra de uma de suas duas fitas (ver Fig. 32.3). As camptotecinas atuam ao estabilizar esse complexo de DNA fragmentado, impedindo a religação da que- bra da fita pela topoisomerase I. A seguir, outras enzimas de replicação ligam-se ao complexo de camptotecina–DNA–topoi- somerase, convertendo a lesão de DNA de fita simples em uma quebra de fita dupla. Com freqüência, as células neoplásicas são incapazes de proceder ao reparo da lesão assim produzida. Dois derivados das camptotecinas, a irinotecana e a topote- cana, possuem utilidade clínica. A irinotecana foi inicialmente introduzida para o tratamento do câncer de cólon avançado, embora também possa ser efetiva no tratamento de outros tipos tumorais. Trata-se de um pró-fármaco hidrossolúvel, que é clivado pela enzima carboxilesterase, liberando o metabóli- to lipofílico SN-38. Embora o SN-38 seja aproximadamente 1.000 vezes mais ativo do que a irinotecana na inibição da topoisomerase I, liga-se mais intensamente às proteínas do que a irinotecana e apresenta meia-vida muito mais curta in vivo. Por conseguinte, a contribuição relativa do SN-38 para os efei- tos antineoplásicos da irinotecana permanece incerta. O uso da irinotecana é limitado pela sua grave toxicidade gastrintestinal, produzindo diarréia potencialmente fatal. A exemplo de muitos outros agentes quimioterápicos, a irinotecana também provoca mielossupressão dependente da dose. A topotecana tem sido utilizada no tratamento do câncer ovariano metastático, no câncer de pulmão de células peque- nas e em outras neoplasias. Especificamente, esse agente tem sido efetivo no tratamento de neoplasias ovarianas resistentes à cisplatina, que são difíceis de tratar efetivamente. Antraciclinas As antraciclinas, que são antibióticos antitumorais naturais isola- dos de uma espécie do fungo Streptomyces, estão entre os agentes quimioterápicos citotóxicos de maior utilidade clínica contra o câncer. Embora diversos mecanismos pareçam estar envolvidos em sua atividade, a capacidade das antraciclinas de provocar lesão do DNA resulta mais provavelmente de sua intercalação no DNA (Fig. 37.21C). Essa intercalação interfere na ação da topoisomerase II, resultando em lesões do DNA, como cisão das fitas, e por fim em morte celular (ver Fig. 32.4). A exemplo de muitos outros agentes antineoplásicos, as antra- ciclinas provocam mielossupressão e alopecia. As antraciclinas são excretadas na bile, e a sua dose precisa ser reduzida em pacientes com disfunção hepática. Esses agentes são importantes componentes de esquemas de quimioterapia para uma variedade de neoplasias malignas, particularmente cânceres hematológicos (como leucemias e linfomas) e câncer de mama. O fármaco mais bem conhecido desse grupo, a doxorrubi- cina (Adriamicina®), está associado a insuficiência cardíaca. Acredita-se que a doxorrubicina facilita a produção excessiva de radicais livres no miocárdio, com conseqüente lesão das membranas celulares cardíacas. A cardiotoxicidade está relacio- nada com a concentração plasmática máxima e a dose cumu- lativa de doxorrubicina. É possível reduzir a cardiotoxicidade através da co-administração de dexrazoxana, que se acredita iniba a formação de radicais livres através de quelação do ferro intracelular e prevenção da geração de radicais livres mediados pelo ferro. Epipodofilotoxinas À semelhança das antraciclinas, as epipodofilotoxinas pare- cem atuar primariamente ao inibir a religação das rupturas de fitas duplas do DNA mediada pela topoisomerase (ver Sítio de ligação do GTP intercambiável Alcalóides da vinca Taxanos Sítio de ligação do GTP não-intercambiável α-tubulina β-tubulina C T V Fig. 37.22 Sítios de ligação dos fármacos inibidores dos microtúbulos à tubulina. O heterodímero de tubulina é composto de �-tubulina (cinza) e �- tubulina (azul). Tanto a �-tubulina quanto a �-tubulina ligam-se ao GTP. O GTP na �-tubulina não é hidrolisado; por essa razão, o sítio de ligação do GTP na �-tubulina é conhecido como sítio de ligação do GTP não-intercambiável. A �- tubulina hidrolisa o GTP a GDP; por esse motivo, o sítio de ligação do GTP na �- tubulina é denominado sítio de ligação do GTP intercambiável. As duas classes de inibidores dos microtúbulos antineoplásicos ligam-se a sítios distintos no heterodímero de tubulina. Os alcalóides da vinca, que inibem a polimerização dos microtúbulos, ligam-se a um sítio na �-tubulina localizado próximo ao sítio de ligação do GTP intercambiável (V). Os alcalóides da vinca associam-se preferencialmente na extremidade (+) dos microtúbulos e, portanto, inibem a adição de novas subunidades de tubulina ao microtúbulo. Os taxanos, que estabilizam os microtúbulos polimerizados, ligam-se a um sítio diferente na �-tubulina (T). Os taxanos podem estabilizar as interações entre subunidades de tubulina ou a forma dos protofilamentos dos microtúbulos. A colchicina liga-se a um sítio localizado na interface entre a �-tubulina e a �-tubulina (C). A colchicina não é utilizada na quimioterapia do câncer, porém no tratamento da gota (ver Cap. 47). Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 649 Fig. 32.4). Os agentes antineoplásicos etoposídeo (VP-16) e teniposídeo (VM-26) são derivados semi-sintéticos de um composto isolado da planta Podophyllum. Esses fármacos ligam-se à topoisomerase II e ao DNA, retendo o complexo em seu estado clivável. Com freqüência, as células tumorais desenvolvem resistência ao etoposídeo, através de aumento na expressão da P-glicoproteína. Essa proteína atua nor- malmente como bomba de efluxo para livrar a célula de moléculas tóxicas, como subprodutos metabólitos naturais, mas também pode remover agentes quimioterápicos deriva- dos de produtos naturais antes que exerçam seus efeitos citotóxicos. O etoposídeo mostra-se útil no tratamento do câncer testicular, câncer de pulmão e leucemia, enquanto tanto o etoposídeo quanto o teniposídeo são utilizados no tratamento de vários linfomas. A supressão da medula óssea constitui a principal toxicidade dessas duas epipodofilotoxi- nas de uso clínico. A associação de fármacos que provocam lesão direta do DNA, como a cisplatina e a bleomicina, com agentes que inibem a topoisomerase II, como o etoposídeo, pode ter poderosos efeitos antineoplásicos sinérgicos. Esse sinergis- mo pode estar relacionado com o papel das topoisomerases no reparo de lesões do DNA ou com a capacidade combinada dessas classes de fármacos de induzir uma lesão suficiente de DNA para deflagrar o processo de apoptose. Na prática, os fármacos dessas classes são co-administrados em muitos esquemas antineoplásicos bem-sucedidos. Como mostra o caso de J. L., a combinação de etoposídeo, bleomicina e cisplatina pode curar a maioria dos casos de câncer testicular metastático. Ansacrina A ansacrina fornece outro exemplo de agente quimioterápico que atua primariamente através da inibição da religação de quebras de DNA de fita dupla mediada pela topoisomerase II. A ansacrina atua sobre o DNA, intercalando-se entre pares de bases, deformando a dupla hélice, produzindo ligações cruza- das de DNA-proteína e provocando lesões de fita simples e de fita dupla do DNA. Sua aplicação clínica limita-se, em geral, ao tratamento da leucemia recorrente e câncer ovariano. INIBIDORES DOS MICROTÚBULOS Os microtúbulos dependem da instabilidade dinâmica para a sua função fisiológica. Sem a capacidade de modificar rapidamente o seu comprimento, os microtúbulos quase não desem penham nenhuma função, a não ser fornecer um suporte estrutural para uma célula em repouso. Apesar de os microtúbu- los desem penharem papéis importantes em numerosos aspec- tos da fisiologia celular, os fármacos que inibem a sua função são preferencialmente tóxicos para as células na fase M. Os alcalóides da vinca inibem a polimerização dos microtúbulos, enquanto os taxanos inibem a sua despolimerização. Outros inibidores da polimerização dos microtúbulos, incluindo a gris- eofulvina e a colchicina, são discutidos nos Caps. 34 e 47, respectivamente. Inibidores da Polimerização dos Microtúbulos: Alcalóides da Vinca Os alcalóides da vinca, a vimblastina e a vincristina, são produtos naturais originalmente isolados da planta Vinca rosea. Os alcalóides da vinca ligam-se à �-tubulina em uma porção da molécula que se superpõe ao domínio de ligação de GTP (Fig. 37.22). A ligação dos alcalóides da vinca à �-tubulina na extremidade (+) dos microtúbulos inibe a polimerização da tubulina e, portanto, impede a extensão dos microtúbulos. Como os microtúbulos devem adicionar constantemente tubu- lina para manter a estabilidade (isto é, devem manter um cap de tubulina ligada ao GTP), a inibição da adição de tubulina leva finalmente à despolimerização dos microtúbulos já existentes (Fig. 37.12). A vimblastina é utilizada no tratamento de certos linfomas e, como parte de um esquema de múltiplos fármacos (com cisplatina e bleomicina), no tratamento do câncer testicular metastático. A vimblastina em doses farmacológicas provoca náusea e vômitos. A mielossupressão constitui o efeito adverso da vimblastina que limita a sua dose. A vincristina desempenha um importante papel na quimiote- rapia das leucemias pediátricas. Trata-se também de um com- ponente de esquemas de quimioterapia utilizados no tratamento da doença de Hodgkin e em alguns linfomas não-Hodgkin. A vincristina em doses farmacológicas provoca náusea e vômi- tos. A vincristina causa certo grau de mielossupressão, mas não tão elevado quanto a vimblastina. A neuropatia periférica constitui habitualmente o efeito adverso que limita a dose de vincristina; essa toxicidade pode resultar da inibição de função de trânsito dos microtúbulos nos nervos periféricos longos que se estendem da medula espinal até as extremidades. Inibidores da Despolimerização dos Microtúbulos: Taxanos Os taxanos, que incluem o paclitaxel e o docetaxel, são produ- tos naturais originalmente derivados da casca do teicho europeu. Os taxanos ligam-se à subunidade �-tubulina dos microtúbulos, em um local distinto do sítio de ligação dos alcalóides da vinca (Fig. 37.22). Foi constatado que o paclitaxel liga-se à parte interna dos microtúbulos. Ao contrário dos alcalóides da vinca, os taxanos promovem a polimerização dos microtúbulos e ini- bem a sua despolimerização. A estabilização dos microtúbulos em um estado polimerizado interrompe as células em mitose e, por fim, leva à ativação do processo de apoptose. Existem duas hipóteses principais para as propriedades aparentes de estabilização dos microtúbulos dos taxanos. Em primeiro lugar, os taxanos poderiam reforçar as interações late- rais entre os protofilamentos dos microtúbulos. O aumento das interações laterais diminuiria a tendência dos protofilamentos a “descamar” do cilindro de microtúbulos. Em segundo lugar, os taxanos poderiam endireitar os protofilamentos individu- ais. Quando a �-tubulina hidrolisa o GTP a GDP, os protofi- lamentos têm tendência a “enrolar-se”, produzindo distorção na integridade do cilindro de microtúbulos. Ao endireitar os protofilamentos, os taxanos poderiam reduzir a tendência dos protofilamentos a separar-se do microtúbulo intacto. Ambos os mecanismos podem ser importantes in vivo para a estabiliza- ção dos microtúbulos mediada pelos taxanos; entretanto, outros mecanismos também são possíveis. O paclitaxel é utilizado como agente antineoplásico no tra- tamento de muitos tumores sólidos, particularmente câncer de mama, de ovário e de pulmão de células não-pequenas. O paclitaxel possui efeitos adversos importantes. É comum a ocorrência de uma resposta de hipersensibilidade aguda em resposta ao paclitaxel ou, mais provavelmente, ao veículo em que o paclitaxel é solubilizado; esse efeito pode ser evitado pela administração de dexametasona (um agonista dos receptores de glicocorticóides) e de um antagonista dos receptores de hista- 650 | Capítulo Trinta e Sete mina H1 antes do tratamento com paclitaxel. Muitos pacientes apresentam mialgias e mielossupressão em conseqüência do uso do paclitaxel, e o fármaco em altas doses pode causar toxi- cidade pulmonar. A neuropatia periférica, que tipicamente se manifesta na forma de déficit sensitivo em “meia-e-luva” nas extremidades, pode limitar a quantidade cumulativa do fármaco passível de ser administrado com segurança. O abraxane® é uma forma de paclitaxel ligada a albumina, com tamanho médio de partículas de 130 nanômetros. As nano- partículas de paclitaxel ligadas à albumina não provocam reação de hipersensibilidade, não exigem pré-medicação e causam menos mielossupressão do que paclitaxel tradicional com solvente. Estu- dos preliminares de câncer de mama metastático também sugerem que essa formulação de paclitaxel pode apresentar maior atividade antineoplásica do que o paclitaxel em solvente. O docetaxel possui aplicação recente no tratamento do câncer de mama e câncer de pulmão de células não-peque- nas. A exemplo do paclitaxel, o docetaxel produz uma reação de hipersensibilidade aguda que pode ser evitada através de administração prévia de glicocorticóides. Em certas ocasiões, o docetaxel possui o efeito adverso específico de retenção hídrica, que provavelmente resulta de um aumento da permeabilidade capilar. O docetaxel não provoca neuropatia tão freqüentemente quanto o paclitaxel. Entretanto, a mielossupressão associada ao docetaxel é profunda e limita habitualmente a dose a ser administrada. n Conclusão e Perspectivas Futuras Os agentes antineoplásicos descritos neste capítulo exercem seus efeitos sobre o genoma, impedindo a replicação eficiente do DNA, induzindo lesão do DNA e interferindo na mitose. Como muitas células normais, bem como as células cancero- sas, transitam pelo ciclo celular, esses agentes estão associados a múltiplas toxicidades que limitam a sua dose. Além disso, embora as células cancerosas sejam suscetíveis à lesão do DNA, em alguns casos a ocorrência de mutações em proteí- nas-chave de controle, como a P53, pode impedir a apoptose que, de outro modo, seria induzida por esses agentes. Novas abordagens estão sendo desenvolvidas para produzir lesão do DNA mais especificamente. Por exemplo, foi consta- tado que camundongos com deficiência de PARP1 são capazes de superar o defeito no reparo de quebras de fita simples ao converter rupturas de fita simples em rupturas de fita dupla, seguido de reparo do DNA pela via de QFD. Além disso, as células humanas normais tratadas em cultura com inibidores de PARP1 são capazes de sofrer difusão celular normal, embo- ra essas células manifestem um aumento de suscetibilidade à lesão do DNA em conseqüência de reparo deficiente de quebras de fita simples. Em contrapartida, células com deficiência de BRCA1 ou BRCA2, que estão envolvidos no reparo de RFD, são destruídas em resposta ao tratamento com inibidores de PARP1; em comparação com as células normais, as células BRCA1– ou BRCA2– são até 1.000 vezes mais sensíveis à ação de inibidores da PARP1. Presumivelmente, as células BRCA1– e BRCA2– são mais sensíveis, devido ao comprometimento das vias de reparo de quebra de fita simples e quebra de fita dupla, resultando em acúmulo letal de lesão do DNA. Com base nesses achados, acredita-se que os inibidores da PARP1 representem novos agentes promissores no tratamento do câncer de mama ou de ovário deficiente em BRCA1– ou BRCA2–, podendo ser efetivos em outros tumores nos quais a resposta à lesão do DNA está comprometida. A observação de que a telomerase é expressa na maioria das células cancerosas e constitui um componente-chave no proces- so de imortalização destaca essa enzima como importante alvo na futura terapia do câncer. Embora a telomerase seja expressa, em certo grau, em células-tronco e nas células que normal- mente sofrem divisão, a maioria das células normais carece de expressão da telomerase. Por conseguinte, a dependência das células tumorais quanto ao estado imortalizado poderia conferir aos inibidores da telomerase um índice terapêutico favorável. Uma preocupação é a de que possam ser necessárias múltiplas divisões celulares para encurtar o comprimento do telômero a um nível crítico para a sobrevida celular. Estão sendo desen- volvidas pequenas moléculas inibidoras da telomerase, assim como vetores virais utilizando o promotor da telomerase para impulsionar a expressão de genes que promovem a apoptose ou que aumentam a sensibilidade a agentes que induzem destrui- ção celular. Além disso, as combinações de inibidores da telo- merase com agentes citotóxicos tradicionais ou novas terapias com alvos moleculares poderiam produzir efeitos sinérgicos. Essas estratégias, bem como aquelas descritas no Cap. 38, irão ajudar a terapia antineoplásica a progredir, avançando além das abordagens citotóxicas gerais e focalizando o tratamento nas anormalidades moleculares responsáveis pela estimulação da oncogênese. n Leituras Sugeridas Brody LC. Treating cancer by targeting a weakness. N Engl J Med 2005;353:949–950. (Avanços na terapia direcionada contra o cân- cer.) DeBoer J, Hoeijmakers JH. Nucleotide excision repair and human syndromes. Carcinogenesis 2000;21:453–460. (Mecanismos mole- culares do reparo por excisão.) Hahn WC. Role of telomeres and telomerase in the pathogenesis of human cancer. J Clin Oncol 2003;21:2034–2043. (Possíveis apli- cações terapêuticas dos inibidores da telomerase.) Peltomaki P. Role of DNA mismatch repair defects in the pathogenesis of human cancer. J Clin Oncol 2003;21:1174–1179. (Pontos inte- ressantes da fisiopatologia dos mecanismos de reparo do DNA.) Venkitaraman AR. Cancer susceptibility and the functions of BRCA1 and BRCA2. Cell 2002;108:171–182. (Fisiopatologia do BRCA1 e do BRCA2.) Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 651 Re su m o Fa rm ac ol óg ic o Ca pí tu lo 3 7 Fa rm ac ol og ia d o Câ nc er : S ín te se , E st ab ili da de e M an ut en çã o do G en om a Fá rm ac o Ap lic aç õe s Cl ín ic as Ef ei to s Ad ve rs os G ra ve s e Co m un s Co nt ra -I nd ic aç õe s Co ns id er aç õe s Te ra pê ut ic as IN IB ID O RE S DA T IM ID IL AT O S IN TA SE M ec an is m o — I ni be m a t im id ila to s in ta se , d im in ui nd o, a ss im , a d is po ni bi lid ad e ce lu la r de d T M P e c au sa nd o m or te c el ul ar p or “ fa lta d e tim in a” F lu or ur ac ila ( 5- F U ) C ân ce r de m am a C ân ce r ga st ri nt es tin al C ân ce r de p el e (a pl ic aç ão t óp ic a) A te ro sc le ro se c or on ar ia na , tr om bo fl eb it e, úl ce ra g as tr in te st in al , m ie lo ss up re ss ão , sí nd ro m e ce re be la r, al te ra çõ es v is ua is , es te no se d o si st em a la cr im al A lo pe ci a, e xa nt em a, p ru ri do , fo to ss en si bi lid ad e, d is tú rb io g as tr in te st in al , es to m at ite , ce fa lé ia D ep re ss ão g ra ve d a m ed ul a ós se a E st ad o nu tr ic io na l de fi ci en te In fe cç ão g ra ve D ef ic iê nc ia d e di id ro pi ri m id in a de si dr og en as e G ra vi de z A 5 -F U é u m a ná lo go d a ur ac ila q ue , ap ós m od if ic aç ão in tr ac el ul ar , in ib e a tim id ila to s in ta se a tr av és d e su a lig aç ão a o sí tio d e de so xi ur id ila to ( su bs tr at o) n a en zi m a A lé m d e in ib ir a t im id ila to s in ta se , a 5- FU i nt er fe re n a sí nt es e de p ro te ín a ap ós i nc or po ra çã o do m et ab ól ito d o fá rm ac o FU T P ao m R N A Po de -s e ut ili za r o ác id o fo lín ic o pa ra p ot en ci al iz ar a a çã o da 5- FU C ap ec it ab in a C ân ce r co lo rr et al m et as tá tic o C ân ce r de m am a Ig ua is a os d a fl uo ru ra ci la D ef ic iê nc ia d e di id ro pi ri m id in a de si dr og en as e C om pr om et im en to r en al gr av e Pr ó- fá rm ac o da 5 -F U d is po ní ve l po r vi a or al P em et re xe de C ân ce r de p ul m ão d e cé lu la s nã o- pe qu en as M es ot el io m a pl eu ra l m al ig no ( em as so ci aç ão c om c is pl at in a) M ie lo ss up re ss ão , an gi na , in fa rt o do m io cá rd io , ac id en te v as cu la r ce re br al , tr om bo fl eb it e, l es ão h ep át ic a, e xa nt em a cu tâ ne o bo lh os o Fa di ga , ná us ea , vô m ito s, d ia rr éi a, es to m at ite H ip er se ns ib ili da de a o pe m et re xe de C om pr om et im en to r en al gr av e O p em et re xe de é u m a ná lo go d o fo la to q ue , ap ós m od if ic aç ão in tr ac el ul ar , in ib e a tim id ila to s in ta se a tr av és d e su a lig aç ão a o sí tio d o m et ile no te tr ai dr of ol at o (c o- fa to r) n a en zi m a C o- ad m in is tr ad o co m á ci do f ól ic o e vi ta m in a B 12 p ar a re du zi r a to xi ci da de h em at ol óg ic a e ga st ri nt es tin al IN IB ID O RE S D O M ET AB O LI SM O D AS P U RI N AS M ec an is m o — O s m et ab ól ito s in ib em a I M P D H e o ut ra s en zi m as s in té tic as , i nt er fe ri nd o, a ss im , n a sí nt es e de A M P e G M P 6- M er ca pt op ur in a (6 -M P ) A za ti op ri na L eu ce m ia l in fó id e ag ud a, l eu ce m ia m ie ló id e ag ud a, d oe nç a de C ro hn (6 -M P) Im un os su pr es sã o no t ra ns pl an te re na l, ar tr ite r eu m at ói de , do en ça in te st in al i nf la m at ór ia ( az at io pr in a) P an cr ea ti te , m ie lo ss up re ss ão , he pa to to xi ci da de , in fe cç ão G as tr ite G ra vi de z A um en to d a ef ic iê nc ia e t ox ic id ad e pe lo a lo pu ri no l A a za tio pr in a é um p ró -f ár m ac o m en os t óx ic o qu e a 6- M P A a za tio pr in a é ut ili za da p ar a im un os su pr es sã o de d oe nç as au to -i m un es P en to st at in a L eu ce m ia d e cé lu la s pi lo sa s L in fo m a de c él ul as T A rr it m ia c ar dí ac a, i ns uf ic iê nc ia c ar dí ac a, m ie lo ss up re ss ão , he pa to to xi ci da de , ne ur ot ox ic id ad e, n ef ro to xi ci da de , to xi ci da de p ul m on ar E xa nt em as , ca la fr io s co m t re m or es , vô m ito s, m ia lg ia , in fe cç ão d as v ia s re sp ir at ór ia s su pe ri or es , fe br e H ip er se ns ib ili da de à pe nt os ta tin a In ib id or s el et iv o da a de no si na d es am in as e (A D A ) IN IB ID O RE S RI BO N U CL EO TÍ D IO R ED U TA SE M ec an is m o — I ni be m a r ib on uc le ot íd io r ed ut as e, a e nz im a qu e co nv er te r ib on uc le ot íd io s em d es ox ir ri bo nu cl eo tíd io s H id ro xi ur éi a N eo pl as ia s m al ig na s he m at ol óg ic as C ân ce r de c ab eç a e pe sc oç o M el an om a C ar ci no m a ov ar ia no A ne m ia f al ci fo rm e (a pe na s em ad ul to s) M ie lo ss up re ss ão , le uc em ia s ec un dá ri a co m u so a l on go p ra zo To xi ci da de g as tr in te st in al , úl ce ra d e pe le D ep re ss ão g ra ve d a m ed ul a ós se a D im in ui o s ra di ca is l iv re s de t ir os in a cr íti co s pa ra o m ec an is m o de a çã o da r ib on uc le ot íd io r ed ut as e N a an em ia f al ci fo rm e, a cr ed ita -s e qu e a hi dr ox iu ré ia a tu a at ra vé s de a um en to d a he m og lo gi na F (C on ti nu a) 652 | Capítulo Trinta e Sete Re su m o Fa rm ac ol óg ic o Ca pí tu lo 3 7 Fa rm ac ol og ia d o Câ nc er : S ín te se , E st ab ili da de e M an ut en çã o do G en om a (C on tin ua çã o) Fá rm ac o Ap lic aç õe s Cl ín ic as Ef ei to s Ad ve rs os G ra ve s e Co m un s Co nt ra -I nd ic aç õe s Co ns id er aç õe s Te ra pê ut ic as AN ÁL O G O S DA P U RI N A E DA P IR IM ID IN A Q U E SE I N CO RP O RA M A O D N A M ec an is m o — A i nc or po ra çã o no D N A e n o R N A r es ul ta e m i ni bi çã o da D N A p ol im er as e, c om c on se qü en te m or te c el ul ar T io gu an in a L eu ce m ia m ie lo cí tic a ag ud a M ie lo ss up re ss ão , hi pe ru ri ce m ia , pe rf ur aç ão i nt es ti na l, he pa to to xi ci da de , in fe cç ão D is tú rb io g as tr in te st in al R es is tê nc ia p ré vi a à tio gu an in a ou m er ca pt op ur in a A ná lo go d a gu an in a F os fa to d e fl ud ar ab in a L eu ce m ia l in fo cí tic a cr ôn ic a de cé lu la s B L in fo m a nã o- H od gk in A pl as ia d a pe le , an em ia h em ol ít ic a au to - im un e, m ie lo ss up re ss ão , ne ur ot ox ic id ad e, pn eu m on ia , in fe cç ão E de m a, d is tú rb io g as tr in te st in al , as te ni a, fa di ga H ip er se ns ib ili da de à fl ud ar ab in a A ná lo go d e nu cl eo tíd io d e pu ri na C la dr ib in a L eu ce m ia d e cé lu la s pi lo sa s E sc le ro se m úl tip la N eu tr op en ia f eb ri l, m ie lo ss up re ss ão , ne ur ot ox ic id ad e, i nf ec çã o E xa nt em a, r ea çã o no l oc al d e in je çã o, ná us ea , ce fa lé ia H ip er se ns ib ili da de à cl ad ri bi na A ná lo go d a pu ri na C it ar ab in a (a ra C ) L eu ce m ia l in fó id e ag ud a L eu ce m ia m ie ló id e ag ud a L eu ce m ia m ie ló id e cr ôn ic a L eu ce m ia m en ín ge a D oe nç a de H od gk in L in fo m a nã o- H od gk in M ie lo ss up re ss ão , ne ur op at ia , ne fr ot ox ic id ad e, d is fu nç ão h ep át ic a, in fe cç ão T ro m bo fl eb ite , ex an te m a, h ip er ur ic em ia , di st úr bi o ga st ri nt es tin al , úl ce ra s da b oc a ou d o ân us H ip er se ns ib ili da de à ci ta ra bi na A ná lo go d a ci tid in a A za ci ti di na Sí nd ro m e m ie lo di sp lá si ca M ie lo ss up re ss ão , in su fi ci ên ci a re na l E de m a pe ri fé ri co , di st úr bi o ga st ri nt es tin al , co m a he pá tic o, l et ar gi a, t os se , fe br e T um or es h ep át ic os m al ig no s av an ça do s A ná lo go d a ci tid in a G en ci ta bi na C ân ce r pa nc re át ic o C ân ce r de p ul m ão d e cé lu la s nã o- pe qu en as C ân ce r de m am a C ân ce r ov ar ia no C ân ce r ve si ca l Sa rc om a D oe nç a de H od gk in M ie lo ss up re ss ão , ne ut ro pe ni a fe br il , to xi ci da de p ul m on ar , he pa to to xi ci da de , sí nd ro m e he m ol ít ic o- ur êm ic a Fe br e, d is tú rb io g as tr in te st in al , el ev aç ão da s en zi m as h ep át ic as , ed em a, e xa nt em a, pa re st es ia s H ip er se ns ib ili da de à ge nc ita bi na G ra vi de z A ná lo go d a ci tid in a AG EN TE S Q U E M O D IF IC AM D IR ET AM EN TE A E ST RU TU RA D O D N A: A G EN TE S AL Q U IL AN TE S M ec an is m o — L ig am -s e de m od o co va le nt e ao D N A , f re qü en te m en te c om li ga çã o cr uz ad a do D N A ou p ro te ín as a ss oc ia da s C ic lo fo sf am id a D oe nç as a ut o- im un es L eu ce m ia s e lin fo m as M ic os e fu ng ói de a va nç ad a N eu ro bl as to m a C ân ce r ov ar ia no R et in ob la st om a C ân ce r de m am a H is tio ci to se m al ig na M ie lo ss up re ss ão , m io ca rd io pa ti a, sí nd ro m e de S te ve ns -J oh ns on , ci st it e he m or rá gi ca , az oo sp er m ia , pn eu m on ia in te rs ti ci al , in fe cç ão A lo pe ci a, d is tú rb io g as tr in te st in al , le uc op en ia , am en or ré ia G ra ve d ep re ss ão d a fu nç ão da m ed ul a ós se a A a cr ol eí na , um m et ab ól ito d a ci cl of os fa m id a, p ro vo ca c is tit e he m or rá gi ca ; é po ss ív el e vi ta r es se e fe ito a dv er so c om a c o- ad m in is tr aç ão d e m es na Farmacologia do Câncer: Síntese, Estabilidade e Manutenção do Genoma | 653 M ec lo re ta m in a M el fa la na E st ra m us ti na C lo ra m bu ci la M it om ic in a T io te pa C ar m us ti na D ac ar ba zi na P ro ca rb az in a A lt re ta m in a L eu ce m ia e d oe nç a de H od gk in (m ec lo re ta m in a) L in fo m a (m el fa la na ) C ân ce r de p ró st at a (e st ra m us tin a) L eu ce m ia ( cl or am bu ci la ) C ân ce r gá st ri co e p an cr eá tic o (m ito m ic in a) C ân ce r de b ex ig a (t io te pa ) C ân ce r ce re br al ( ca rm us tin a) D oe nç a de H od gk in ( da ca rb az in a) D oe nç a de H od gk in ( pr oc ar ba zi na ) C ân ce r ov ar ia no ( al tr et am in a) Ig ua is a os d a ci cl of os fa m id a Pr es en ça d e do en ça in fe cc io sa c on he ci da (m ec lo re ta m in a) T ro m bo fl eb ite a tiv a ou di st úr bi o tr om bo em bó lic o (e st ra m us tin a) D is tú rb io d a co ag ul aç ão ou c om pr om et im en to r en al (m ito m ic in a) D is fu nç ão h ep át ic a, r en al o u m ed ul ar ( tio te pa ) G ra ve d ep re ss ão d a m ed ul a ós se a (p ro ca rb az in a, al tr et am in a) To xi ci da de n eu ro ló gi ca g ra ve (a ltr et am in a) A t io te pa é i ns til ad a di re ta m en te n a be xi ga A c ar m us tin a é um a ni tr os ou ré ia q ue f ix a um g ru po c ar ba m oi l a pr ot eí na s- al vo AG EN TE S Q U E M O D IF IC AM D IR ET AM EN TE A E ST RU TU RA D O D N A: C O M PO ST O S D E PL AT IN A M ec an is m o — L ig aç ão c ru za da d e ba se s de g ua ni na i nt ra fi ta C is pl at in a C ar bo pl at in a C ân ce re s ge ni to ur in ár io s C ân ce re s pu lm on ar es N ef ro to xi ci da de ( ci sp la ti na ), m ie lo ss up re ss ão , ne ur op at ia p er if ér ic a, ot ot ox ic id ad e D es eq ui líb ri o el et ro lít ic o G ra ve d ep re ss ão d a m ed ul a ós se a C om pr om et im en to r en al o u da a ud iç ão A c is pl at in a po de s er i nj et ad a po r vi a in tr ap er ito ne al p ar a tr at am en to d o câ nc er o va ri an o A c o- ad m in is tr aç ão d e am if os tin a co m c is pl at in a po de l im ita r a ne fr ot ox ic id ad e O xa lip la ti na C ân ce r co lo rr et al N eu ro to xi ci da de a gu da e p er si st en te , m ie lo ss up re ss ão , co li te , di sf un çã o he pá ti ca D is tú rb io g as tr in te st in al , do r lo m ba r, to ss e, fe br e H ip er se ns ib ili da de à ox al ip la tin a A n eu ro to xi ci da de a gu da é e xa ce rb ad a po r ex po si çã o a te m pe ra tu ra s fr ia s AG EN TE S Q U E M O D IF IC AM D IR ET AM EN TE A E ST RU TU RA D O D N A: B LE O M IC IN A M ec an is m o — L ig a- se a o ox ig ên io e q ue la o F e( II ); l ig a- se a o D N A e r es ul ta e m r up tu ra s de f ita s at ra vé s da g er aç ão d e in te rm ed iá ri os o xi da tiv os B le om ic in a C ân ce r te st ic ul ar D oe nç a de H od gk in L in fo m a nã o- H od gk in C ar ci no m a de c él ul as e sc am os as F ib ro se p ul m on ar , do en ça v as cu la r, in fa rt o do m io cá rd io , ac id en te v as cu la r ce re br al , fe nô m en o de R ay na ud , he pa to to xi ci da de , ne fr ot ox ic id ad e, m ie lo ss up re ss ão r ar a A lo pe ci a, e xa nt em a, h ip er pi gm en ta çã o, hi pe rs en si bi lid ad e cu tâ ne a, d is tú rb io ga st ri nt es tin al , es to m at ite H ip er se ns ib ili da de à bl eo m ic in a O s ef ei to s so br e a fu nç ão p ul m on ar l im ita m a d os e e sã o ir re ve rs ív ei s IN IB ID O RE S DA T O PO IS O M ER AS E M ec an is m o — I ni be m a t op oi so m er as e I ou a t op oi so m er as e II , r es ul ta nd o em q ue br a de f ita s de D N A Ir in ot ec an a To po te ca na C ân ce r co lo rr et al ( ir in ot ec an a) C ân ce r de p ul m ão d e cé lu la s pe qu en as , ca rc in om a ce rv ic al , câ nc er o va ri an o (t op ot ec an a) D ia rr éi a po te nc ia lm en te f at al , m ie lo ss up re ss ão , ne ut ro pe ni a fe br il , di sf un çã o he pá ti ca , do en ça p ul m on ar in te rs ti ci al A lo pe ci a, e os in of ili a D ep re ss ão g ra ve d a m ed ul a ós se a A i ri no te ca na e a t op ot ec an a sã o ca m pt ot ec in as q ue i ni be m a to po is om er as e I A a çã o é es pe cí fi ca p ar a a fa se S (C on ti nu a) 654 | Capítulo Trinta e Sete Re su m o Fa rm ac ol óg ic o Ca pí tu lo 3 7 Fa rm ac ol og ia d o Câ nc er : S ín te se , E st ab ili da de e M an ut en çã o do G en om a (C on tin ua çã o) Fá rm ac o Ap lic aç õe s Cl ín ic as Ef ei to s Ad ve rs os G ra ve s e Co m un s Co nt ra -I nd ic aç õe s Co ns id er aç õe s Te ra pê ut ic as D ox or ru bi ci na D au no rr ub ic in a E pi rr ub ic in a L eu ce m ia s, l in fo m as , câ nc er d e m am a, c ân ce r de b ex ig a, c ân ce r da tir eó id e, c ân ce r G I, n ef ro bl as to m a, os te os sa rc om a, c ân ce r ov ar ia no , ca rc in om a de c él ul as p eq ue na s do pu lm ão , sa rc om a de t ec id o m ol e (d ox or ru bi ci na ) L eu ce m ia l in fó id e ag ud a e le uc em ia m ie ló id e ag ud a (d au no rr ub ic in a) C ân ce r de m am a (e pi rr ub ic in a) In su fi ci ên ci a ca rd ía ca ( pa rt ic ul ar m en te do xo rr ub ic in a) , m ie lo ss up re ss ão A lo pe ci a, e xa nt em a, d is tú rb io g as tr in te st in al In su fi ci ên ci a ca rd ía ca pr ee xi st en te D ep re ss ão g ra ve d a m ed ul a ós se a D is fu nç ão h ep át ic a gr av e (e pi rr ub ic in a) A d ox or ru bi ci na , a da un or ru bi ci na e e pi rr ub ic in a sã o an tr ac ic lin as q ue i ni be m a t op oi so m er as e II E xc re ta da s na b ile ( re du zi r a do se e m p ac ie nt es c om di sf un çã o he pá tic a) A a çã o é es pe cí fi ca p ar a a fa se G 2 E to po sí de o Te ni po sí de o C ân ce r te st ic ul ar e d e pu lm ão , le uc em ia ( et op os íd eo ) L eu ce m ia l in fó id e ag ud a, l in fo m a nã o- H od gk in ( te ni po sí de o) Ig ua is a os d a do xo rr ub ic in a H ip er se ns ib ili da de a o et op os íd eo o u te ni po sí de o O e to po sí de o e o te ni po sí de o sã o ep ip od of ilo to xi na s qu e in ib em a t op oi so m er as e II A a çã o é es pe cí fi ca p ar a as f as es S t ar di a e G 2 A ns ac ri na L eu ce m ia r ec or re nt e C ân ce r ov ar ia no A lt er aç õe s E C G , in cl ui nd o pr ol on ga m en to do Q T, í le o pa ra lí ti co , m ie lo ss up re ss ão , co nv ul sã o, a zo os pe rm ia , he pa to to xi ci da de A lo pe ci a, d is tú rb io g as tr in te st in al H ip er se ns ib ili da de à an sa cr in a In ib e a to po is om er as e II AG EN TE S Q U E IN IB EM A P O LI M ER IZ AÇ ÃO D O S M IC RO TÚ BU LO S M ec an is m o — L ig am -s e às s ub un id ad es d e tu bu lin a e im pe de m a p ol im er iz aç ão d os m ic ro tú bu lo s V im bl as ti na C ân ce r te st ic ul ar m et as tá tic o L in fo m a Sa rc om a de K ap os i re la ci on ad o co m a A ID S C ân ce r de m am a C or io ca rc in om a H is tio ci to se m al ig na M ic os e fu ng ói de M ie lo ss up re ss ão , hi pe rt en sã o, n eu ro to xi ci da de , az oo sp er m ia A lo pe ci a, d or ó ss ea , di st úr bi o ga st ri nt es tin al In fe cç ão b ac te ri an a G ra nu lo ci to pe ni a si gn if ic at iv a A s up re ss ão d a m ed ul a ós se a lim ita a d os e ad m in is tr ad a V in cr is ti na L eu ce m ia s D oe nç a de H od gk in L in fo m a nã o- H od gk in R ab do m io ss ar co m a N ef ro bl as to m a N eu ro pa ti a pe ri fé ri ca , m io pa ti a, m ie lo ss up re ss ão A lo pe ci a, d is tú rb io g as tr in te st in al , di pl op ia Sí nd ro m e de C ha rc ot -M ar ie - To ot h U so i nt ra te ca l A n eu ro pa tia p er if ér ic a lim ita a d os e ad m in is tr ad a AG EN TE S Q U E IN IB EM A D ES PO LI M ER IZ AÇ ÃO D O S M IC RO TÚ BU LO S M ec an is m o — L ig am -s e à tu bu lin a po lim er iz ad a e in ib em a d es po lim er iz aç ão d os m ic ro tú bu lo s P ac lit ax el P ac lit ax el l ig ad o à al bu m in a C ân ce r ov ar ia no C ân ce r de m am a C ân ce r de p ul m ão d e cé lu la s nã o- pe qu en as Sa rc om a de K ap os i re la ci on ad o co m a A ID S M ie lo ss up re ss ão , to xi ci da de p ul m on ar , re aç ão d e hi pe rs en si bi li da de g ra ve , m io pa ti a, ne ur op at ia p er if ér ic a A lo pe ci a, d is tú rb io g as tr in te st in al , ar tr al gi a N eu tr op en ia g ra ve A n eu ro pa tia p er if ér ic a lim ita a d os e ad m in is tr ad a D oc et ax el C ân ce r de m am a C ân ce r gá st ri co C ân ce r de p ró st at a C ân ce r de p ul m ão d e cé lu la s nã o- pe qu en as M ie lo ss up re ss ão , sí nd ro m e de S te ve ns -J oh ns on , sí nd ro m e de r et en çã o hí dr ic a re su lt an do e m ed em a gr av e, n eu ro pa ti a, h ep at ot ox ic id ad e, co li te A lo pe ci a, d is tú rb io g as tr in te st in al , as te ni a, f eb re N eu tr op en ia g ra ve A m ie lo ss up re ss ão l im ita a d os e ad m in is tr ad a