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PIERO NÁDIO ARÁDIO TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 2 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 3 ÍNDICE INTRODUÇÃO, 5 CAPÍTULO I – O MUNDO ANTIGO, 7 01 – O Mundo Helênico, 7 02 – O Mundo Romano, 9 LEITURA COMPLEMENTAR – A Economia Primitiva, 11 CAPÍTULO II – DE BIZÂNCIO AO FEUDALISMO, 15 03 – O Início da Idade Média, 15 04 – As Invasões Bárbaras, 15 LEITURA COMPLEMENTAR – A Economia e a Filosofia Escolástica, 19 CAPÍTULO III – O MERCANTILISMO, 21 05 – O Período da Renascença, 22 06 – O Regime Colonial, 24 LEITURA COMPLEMENTAR – As Idéias Econômicas do Mercantilismo, 27 CAPÍTULO IV – AS ESCOLAS ECONÔMICAS, 29 07 – A Escola Fisiocrática, 29 08 – A Escola Clássica, 30 09 – A Doutrina de Malthus, 31 10 – A Teoria da Renda de David Ricardo, 32 11 – A Influência da Escola Clássica, 35 12 – Stuart Mill, 36 CAPÍTULO V – A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E A TESE SOCIALISTA, 37 13 – A Ascensão da Classe Burguesa, 37 14 – O Socialismo Pré-Marxista, 39 15 – O Socialismo de Karl Marx, 40 LEITURA COMPLEMENTAR – A Teoria Econômica de Karl Marx, 43 CAPÍTULO VI – A EXPANSÃO DO CAPITALISMO, 45 16 – Imperialismo: A Nova Face do Capitalismo, 45 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 4 17 – Anarquistas e Sindicalistas, 47 18 – O Comunismo Soviético, 48 LEITURA COMPLEMENTAR, Os Neoclássicos, 51 CAPÍTULO VII – A CRISE DO CAPITALISMO, 53 19 – A Grande Depressão, 51 20 – A Economia do Pós-Guerra, 55 LEITURA COMPLEMENTAR – A Teoria Keynesiana, 57 CAPÍTULO VIII – A NOVA REALIDADE ECONÔMICA, 59 21 – Capitalismo versus Comunismo, 60 22 – A Nova Revolução Industrial, 63 23 – Um Novo Mundo Econômico, 66 24 – O Problema dos Países Emergentes, 68 25 – Tecnologia e Desenvolvimento, 71 26 – Haverá Uma Ideologia para a Nova Época? , 72 LEITURA COMPLEMENTAR – A Nova Economia, 73 CAPÍTULO VIII – O PROBLEMA BRASILEIRO, 75 27 – O Brasil e o Cone Sul, 75 28 – Os Problemas da Integração Econômica, 75 APÊNDICE, 77 A MOEDA, 79 A RENDA NACIONAL, 81 A FORMAÇÃO DOS PREÇOS, 83 A POLÍTICA DEMOGRÁFICA, 85 QUESTIONÁRIO, 87 BIBLIOGRAFIA, 91 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 5 INTRODUÇÃO A história do pensamento econômico refere-se ao desenvolvimento progressivo, ao longo da história humana, e retratada em cada um dos povos que surgiram desde a mais antiga civilização, das atividades humanas que se têm por “econômicas”. A procura incessante pelos meios de subsistência, o cultivo da terra, o sistema de trocas, o conceito de propriedade, são fenômenos que se enquadram nestas atividades econômicas, e que evoluíram, de meios bastante rudimentares, para os modernos e complexos sistemas econômicos característicos de nosso tempo atual. Devemos ressaltar a diferença básica que existe entre história do pensamento econômico, ou história da economia,1 entre história das doutrinas econômicas, e história econômica geral. A primeira refere-se, e tem por objetivo, estudar o processo histórico pelo qual surgiu o fenômeno propriamente econômico, através da análise da evolução deste sistema de trocas, do surgimento do dinheiro, do conceito de empréstimos, juros, capitais, bem como da atividade econômica em seu todo. Todo este processo tem um fundamento social, com base nas necessidades humanas de subsistência, proteção contra os elementos e as intempéries, e no progressivo acúmulo de bens econômicos através de trocas mercantis. A história das doutrinas econômicas visa, especificamente, estudar o pensamento dos autores e historiadores que se propuseram a explicar este fenômeno, criando teorias, escolas e sistemas econômicos, cujo exemplo mais claro é a forma como as doutrinas se dividiram ao longo do século XX, em sistema capitalista e sistema socialista, divisão esta que atingiu o próprio cerne das sociedades, dividindo o mundo em dois blocos políticos principais, os países democráticos e os países comunistas. Quanto à história econômica geral, é uma espécie de síntese entre as duas primeiras, cuja especificidade coloca a história sob um prisma econômico, ou seja, busca-se estudar os fatos sociais e históricos dando realce à tessitura econômica sobre a qual eles se desenvolveram. A história econômica geral difere da história do pensamento econômico sob vários aspectos. Enquanto esta procura realçar as teorias econômicas que vão surgindo à medida que as sociedades e a civilização em geral se desenvolvem, a primeira dá ênfase às razões econômicas (embasadas estas, por sua vez, em teorias econômicas diversas) pelas quais surgem os fatos sociais capazes de transformar a própria realidade histórica. Em nossa abordagem, não nos furtamos a incluir um breve escorço sobre as Escolas Econômicas (Fisiocrática e Clássica), cujos conceitos teóricos são indispensáveis para a compreensão mais exata da evolução dos fatos históricos sob o prisma econômico. 1 Mesmo aqui devemos distinguir entre a história dos fatos econômicos (constituídos pelas ações realizadas pelos indivíduos), e a interpretação intelectual (muitas vezes a posteriori), destes mesmos fatos, e que constituem propriamente tanto a teoria econômica (proposta para explicá-los) quanto a história das (várias) teorias econômicas propostas. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 6 Quase sempre, os fatos concretos ocorrem no bojo de um substrato teórico que lhes dá causa. Além disso, o nosso propósito é o de tentar buscar um entendimento acerca da evolução do pensamento, da história e dos fatos econômicos, apelando eventualmente para disciplinas autônomas auxiliares, tais como a História, a Antropologia, Ciência Política, entre outras, mas apenas com o objetivo de elucidar o modo como se deu tal evolução. As leitura complementares têm por objetivo dar um suporte teórico maior, que permita ao leitor entender e interpretar as causas e motivações econômicas que conduzem o desenvolvimento da história. O Capítulo IV em especial, bem como as leituras constantes do Apêndice, ainda que tenham um conteúdo não programático, irão reforçar este suporte teórico, muitas vezes buscado pelo leitor mais exigente. Aqueles que desejarem expandir seus conhecimentos para além destes modestos tópicos, encontrarão na bibliografia uma indicação para auxiliar tal intento. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 7 CAPÍTULO I O MUNDO ANTIGO 1 – O Mundo Helênico O estudo dos povos primitivos levou à conclusão de que a sua conduta, sob o aspecto das relações econômicas, pautava-se por um primitivo sistema de trocas, inexistindo qualquer tipo de moeda como base de troca, ou usando-se, para tal finalidade, objetos tidos como valiosos, tais como dentes ou peles de animais, clavas, arcos e flechas, etc. Em épocas recuadas, supõe-se que os indivíduos não tinham a capacidade de lavrar ou de semear a terra, com a finalidade de garantir umaprovisão constante de alimentos. É possível que houvesse inicialmente apenas um sistema simples de coleta de vegetais, a par de um sistema baseado na caça coletiva de animais, como fonte de alimentação, pela sua carne, e de proteção contra as intempéries, pela sua pele. A subsistência podia ser suprida também através da pesca e do consumo de frutos silvestres. Talvez os alimentos fossem consumidos crus, e, com certeza, não havia como armazená-los para posterior consumo. Isto transformava a atividade de subsistência em um processo permanente, causando a necessidade de os grupos estarem em constante deslocamento, sem se fixarem em definitivo em uma localidade qualquer. Os grupos eram, então, selvagens e errantes, vagando de região a região, entrando eventualmente em conflito com outros grupos, quando invadiam sua área de caça. Aos poucos, os grupos foram se fixando em determinados locais mais amenos, onde puderam desenvolver um sistema de lavratura da terra; foi onde surgiram as primeiras comunidades. Surgiu assim a atividade pastoril, com a domesticação de certos animais, principalmente gado e ovelhas. A nutrição aos poucos mudou para o consumo de grãos e sementes, o que acarretou diversas conseqüências. Entre elas, a necessidade de usar instrumentos e utensílios, ainda que rudimentares, seja para arar a terra, seja para a transformação dos alimentos: trituração; moagem; fermentação; etc. A fixação à terra, ainda que criando grupos comunais, pode ter levado à necessidade de isolar grupos familiares em terrenos restritos e vivendo em cabanas, o que terminou por levar ao conceito de “propriedade”. A necessidade de defender esta propriedade também levou ao desenvolvimento de armas rústicas de defesa. Evidentemente, nada causou tanto impacto quanto a domesticação do fogo, ou seja, a capacidade de acender e manter uma fogueira, sem ter que esperar pela queda de um raio, que o provocasse. O fogo, que podia ser provocado pelo atrito entre galhos secos, serviu para cozer alimentos, e com o tempo permitiu o nascimento de uma incipiente “indústria” de forja, pela manipulação de metais dúcteis e de baixo ponto de fusão: inicialmente criando instrumentos de cobre, e posteriormente desenvolvendo ferramentas de ferro. As primeiras comunidades, se viviam em paz, chegaram a organizar vários sistemas sociais, com a produção de mitos complexos, que normalmente eram memorizados pelos seus integrantes, e que tornavam possível uma vida em comum, pela aceitação TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 8 coletiva de uma origem comum, pelo respeito e culto aos ancestrais, e pelo temor aos fenômenos físicos da natureza. Com o tempo, estas comunidades puderam desenvolver uma complexa arte manufatureira, composta de cestaria (produção de cestas) e de artefatos de cerâmica. O calor do fogo permitiu manipular a argila, produzindo vasos, tijolos e telhas, entre outras coisas. Também a ouriversaria se desenvolveu, com a produção de jóias em geral. O contato progressivo entre várias comunidades levou gradativamente à necessidade de criar métodos de transporte e mecanismos de troca comercial, inicialmente usando objetos considerados valiosos pelos membros das várias comunidades. Mas os contatos comerciais muitas vezes redundavam em conflito, o que também podia provocar a necessidade da comunidade isolar-se e buscar sua auto-suficiência. A partir de 600 a.C., começou a surgir as civilização que mais iria influenciar a civilização ocidental: a civilização grega. A época mais recuada, ou época de Homero (que escreveu a Ilíada e a Odisséia), cada aldeia e cidade era bastante independente, e o tipo de vida econômica e social era bastante simples. A atividade diária de subsistência consistia em lavrar a terra, colher no tempo certo e trocar as mercadorias no mercado da cidade. Por volta de 800 a.C., as cidades começaram a se integrar em organizações políticas mais amplas, tanto devido ao comércio crescente quanto à inevitável necessidade de defesa contra povos invasores. As maiores e mais importantes cidades gregas foram Atenas e Esparta, que compartilhavam a hegemonia política e econômica. No auge de seu poderia, cada uma chegou a ter por volta de 400.000 habitantes. O comércio e a indústria se tornaram as principais atividades, levando ao crescimento da população urbana e criando uma classe de cidadãos que vivia na opulência. A escravidão era bastante comum, e os escravos eram prisioneiros de guerra vencidos em batalhas. O crescimento da riqueza criou uma classe de latifundiários, que começou a explorar os lavradores. Na luta pelo poder, a classe média em ascensão uniu-se aos lavradores, e o descontentamento com o governo despótico levou à fundação de governos democráticos, quando não de oligarquias liberais. O auge da história de Atenas ocorreu com o governo de Péricles (461-429 a.C.), durante o qual as artes foram levadas a um nível extremamente elevado. Foi um período de expansão econômica e de grande comércio realizado com as outras cidades da região do Peloponeso. Em Esparta, entretanto, ao contrário de Atenas, a situação política acabou levando a um sistema político absolutista; enquanto em Atenas floresciam as artes e o comércio, nesta outra, o governo oligarca ditatorial optou por criar uma comunidade voltada para o militarismo e para a conquista. A cidade fechou-se em si mesma, proibindo que seus cidadãos viajassem ou comerciassem com o exterior. A vida social imposta aos cidadãos era caracterizada pelo coletivismo e por rígidas normas de disciplina e de comportamento. Além disso, os cidadãos impunham uma férrea dominação sobre o grande número de escravos existentes. A organização econômica da cidade visava os seguintes objetivos: garantir a eficiência e a supremacia militar contra as cidades vizinhas; garantir a segurança interna TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 9 e a dominação da classe dos cidadãos.2 As melhores terras pertenciam ao Estado, mas a maioria acabava nas mãos da classe dominante (esparciatas). O comércio e a indústria ficavam a cargo dos periecos. Em épocas posteriores, o crescente fortalecimento das comunidades gregas transformou-as em cidades-estado, cuja supremacia era marcada por aquela que se destacava pela sua força guerreira, mas também pela sua hegemonia comercial. O comércio entre as cidades se dava tanto por via terrestre quanto por vias marítimas, e o constante contato comercial entre povos diferentes permitiu que várias conquistas intelectuais se divulgassem entre eles. 2 – O Mundo Romano Roma foi a mais importante cidade dos tempos antigos, em virtude de sua hegemonia militar. Aproximadamente em 265 a.C., toda a Itália já estava sob o jugo romano, e Roma encontrava apenas uma cidade que rivalizava com ela em força militar: Cartago. Ambas eram cidades ricas, prósperas e com grande força militar, e o embate entre elas durou muitos anos, antes que Roma a vencesse. As guerras com Cartago obrigaram a que Roma iniciasse uma expansão militar pelo Mediterrâneo, vencendo e conquistando povos vizinhos. Tais guerras3 tiveram grandes conseqüências; além de mudar a vida cultural romana, iniciaram uma grande revolução social e econômica, cujas características principais foram: um grande aumento da escravidão, como resultado da captura de enorme contigente de prisioneiros de guerra; o lento desaparecimento dos pequenos lavradores, que não podiam competir com o trigo mais barato cultivado nas províncias conquistadas; o aumento explosivo de uma classe de lavradores e camponeses empobrecidos, cujo trabalho fora substituído pelamão-de- obra escrava; o surgimento de uma classe média formada de mercadores, usurários e “publicanos”4 ; o surgimento de uma classe opulenta, que enriquecia com os lucros de guerra. Estas transformações levaram a contínuos conflitos de classes, em razão do profundo abismo que passou a separar ricos e pobres. A situação política degenerou a tal ponto que provocou diversas revoltas dos escravos, sendo que a mais famosa ocorreu quando um escravo chamado Espártaco5 liderou, em 73 a.C., uma revolta contra o jugo romano, à frente de 70.000 revoltosos. Entre os lavradores sem terra, deu-se a chamada “revolta dos Gracos”, que lutavam contra a aristocracia senatorial. Tibério Graco fazia parte da elite, mas defendia o interesse dos lavradores, o que deu motivo a que fosse morto a mando da aristocracia. 2 Havia três classes principais: a classe dos esparciatas, dominante; os periecos, intermediária (que viria a constituir a classe média); os ilotas, classe composta de servos (que eram desprezados pelos seus amos). 3 As famosas Guerras Púnicas. 4 Que detinham o poder de explorar minas, construir e manter estradas e cobrar impostos. 5 Espártaco não era propriamente um escravo, e sim um gladiador que lutava nas arenas romanas. Ele foi capturado e morto em batalha, e mil de seus adeptos foram crucificados. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 10 Nove anos depois, o seu irmão, Caio Graco, também foi morto ao tentar defender os interesses dos desprotegidos.6 Roma, que era uma república, tornou-se politicamente um império. Foi durante esta época que começou o seu declínio. A manutenção de um extenso império, a luta contínua contra os bárbaros, a corrupção interna, eram fatores que corroíam os recursos do Estado e que acabaram levando à sua queda. Outro fator, de ordem econômica, era a balança de comércio desfavorável, com as províncias. Aos poucos, com o contínuo escoamento de metais preciosos para fora, o governo romano, ao invés de incrementar as manufaturas para exportação, optou por aviltar a moeda. Isto teve graves e drásticas conseqüências: o desaparecimento do dinheiro de circulação, e o retorno às trocas de mercadorias; o declínio da indústria e do comércio; o crescimento da escravidão; o aumento da intervenção governamental sobre a economia, com resultados em geral catastróficos. Além disso, o aumento exacerbado da carga tributária sobre a classe média desencorajava qualquer novo empreendimento econômico. 6 Em ambos os casos, eles queriam fazer passar uma legislação que permitisse o acesso dos pobres a um trigo mais barato. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 11 LEITURA COMPLEMENTAR A Economia Primitiva Os primeiros povos civilizados, e que deixaram sua marca na história (egípcios; gregos; romanos), pouco se caracterizaram pelas iniciativas de tentar explicar o fenômeno econômico; apesar de exercerem uma intensa atividade econômica, houve raras tentativas explícitas de tentar entendê-lo. Nos diversos escritos filosóficos, existem apenas idéias esparsas e pouco concatenadas a respeito das idéias econômicas. Os gregos, de uma maneira geral, externavam muito mais idéias monetárias do que propriamente idéias econômicas. Até mesmo Platão, um dos maiores dentre os filósofos gregos, não chegou a compreender a enorme influência da atividade econômica na evolução das sociedades. No que mais se aproximou de uma exegese deste tipo de pensamento, em sua obra “A República” ele expõe o que considera o tipo ideal de Estado. Minimiza e despreza as atividades manuais e de comércio, e não dá valor ao acúmulo de riqueza. Este ponto de vista extremado tornou-se deletério para qualquer pensador que quisesse dedicar-se ao fenômeno econômico. Entretanto, Aristóteles recuperou a importância deste tipo de atividade intelectual, ao voltar-se para alguns temas considerados polêmicos. Entretanto, em sua obra “A Política”, ao analisar o surgimento da moeda, suas conclusões viriam a se tornar o fulcro e influenciar consideravelmente todas as análises sobre doutrinas econômicas que seriam feitas futuramente, pelos autores medievais. Na verdade, a condenação por Aristóteles de todo tipo de lucro (seja comercial, industrial e pelo usurário), orientou para o futuro a própria posição da Igreja Católica no que se refere a este tema, e deu ensejo a perseguições e lutas religiosas sem fim. Aristóteles fez uma distinção bastante precisa (e até hoje usada) quanto às funções da moeda: ela serviria como intermediária de trocas comerciais; como instrumento de comparação de valores; e como uma reserva de valor. Ele propôs também uma questão monetária que só se resolveu em tempos modernos. O valor da moeda depende do valor do metal precioso de que é feita, ou o seu valor depende da autoridade de quem a coloca em circulação?7 Platão era de opinião que a moeda tinha um valor nominal, constituído pelo Estado, talvez porque em sua época as moedas eram cunhadas em metal nobre, de ouro ou prata (mas as havia, também, de chumbo, cobre e bronze). Para Xenofonte, o valor da moeda estava no valor do metal precioso que a constituía. Já Aristóteles não se definiu quanto à questão, admitindo uma posição dúbia intermediária. Aristófanes foi o primeiro a evidenciar o fato de que a moeda de melhor qualidade é expulsa da circulação pela moeda de pior qualidade8 (a primeira passa a ser entesourada ou 7 Quando percebemos, nos tempos atuais, que a moeda foi sendo gradativamente substituída por sistemas cada vez mais abstratos de crédito (os vários tipos de títulos de crédito: o papel-moeda; o cheque, o cartão, etc.; os créditos interbancários nos quais apenas valores eletrônicos mudam de lugar), percebemos cada vez mais que a moeda é, em princípio, um acordo em comum acerca de um valor atribuído a uma ficção monetária instituída pelo Estado (vide A MOEDA, pág. 77). 8 Esta é a chamada Lei de Gresham. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 12 derretida, pelo seu maior valor). Opunham-se, então, as teorias “nominalista”9 e “metalista”, com debates acirrados sobre a questão.10 Entre os romanos, a orientação especulativa acerca das idéias econômicas provinha da política, e não mais da filosofia, como era entre os gregos. Vários fatores contribuíram para que o entendimento romano sobre este assunto se expandisse. A chamada Pax Romana, ou hegemonia militar sobre os povos circundantes (que pressupunha um forte espírito guerreiro); o estabelecimento de extensas vias ou estradas de comunicação interligando Roma com todo o império;11 a navegação segura no Mediterrâneo; o desenvolvimento de um sistema jurídico eficaz; um espírito público administrativo; todas estas foram causas que deram ensejo à expansão das transações comerciais, que levaram à criação de companhias mercantis e de sociedades por ações. “O romano é consumidor, mas não quer ser produtor. Sem dúvida era próspera, a princípio, a agricultura romana; mas logo os lavradores indígenas, pequenos proprietários de suas terras, foram sendo substituídos por escravos, enquanto a pequena propriedade, de cultura intensiva, cedia os passos ao latifúndio, de cultura extensiva. Dentro em pouco passaram as artes e os ofícios industriais e o comércio a ser considerados atividades indignas de um homem livre. Roma faz com que produzam para ela; as províncias, conquistadas e escravizadas,abastecem-na do necessário ao seu consumo.” (HUGON, Paul. Pág. 42). Mas não foi somente a escravatura que provocou a decadência da agricultura. Os pensadores romanos que se dedicaram ao assunto dividiam-se basicamente em duas correntes.12 Uns inclinavam-se pelo intervencionismo do Estado, que seria o único capaz de regulamentar e controlar os mecanismos econômicos; outros tendiam à corrente individualista, afirmando que o indivíduo em si era o único capaz de regular e equilibrar a economia.13 Em duas oportunidades, a tendência intervencionista se sobrepôs, acabando por se mostrar desastrosa. A Lei Semprônia, de 123 a.C., tornava o Estado responsável pela distribuição de cereais a preços abaixo do mercado; em 58 a.C., a Lei Clódia reservou aos indigentes tal responsabilidade. As conseqüências, 9 No período medieval a teoria nominalista foi retomada pelos chamados regalistas, e ela é hoje uma das teorias preferidas pelos economistas. A este respeito, é importante considerar a impossibilidade, atualmente, de qualquer país ou nação conseguir lastrear os seus ativos circulantes. O montante de moeda em circulação no mundo, considerando-se apenas o dólar dos EUA, ultrapassa consideravelmente a quantidade de ouro em estoque, seja em Forte Knox, seja nos cofres-fortes dos Bancos Centrais dos países mais ricos. 10 Os marxistas, para verem justificada a sua teoria do valor-trabalho, aceitavam a teoria metalista. 11 Estas vias romanas começaram a ser edificadas no século IV a.C., continuando até o século IV d.C. (ou seja, durante oitocentos anos elas se expandiram, sendo mantidas e cuidadas de forma a permitir um fácil acesso a todo o império). 12 As quais, curiosamente, ainda prevalecem ainda entre os teóricos modernos, que oscilam entre a duas tendências apontadas no texto. 13 O individualismo veio, mais tarde, a se desenvolver nas chamadas escolas fisiocrata, clássica e no moderno neo-liberalismo. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 13 previsivelmente, foram desastrosas, provocando a derrocada da lavoura.14 Além dessas, outras leis intervencionistas vieram conturbar o sistema econômico romano, provocando déficit orçamentário e fraudes sem fim. Quanto maiores se tornavam os problemas, mais o Estado intervinha, tentando por sob controle a economia. O plantio, a colheita e o transporte dos grãos era todo colocado sob estrito controle monopolista do estado. A tendência individualista surgiu sob a ótica jurídica, que veio dar ênfase ao sistema de propriedade privada, do direito das obrigações, dando um contorno visível à transmissão da propriedade, seja por meio de venda, seja por meio de sucessão. A obra dos jurisconsultos romanos veio a lançar as bases doutrinárias da economia política que começou a se desenvolver no Renascimento, vindo a desembocar nas escolas fisiocrática e clássica, e no chamado Liberalismo Econômico. 14 Alguns cantos ou hinos desta época foram compostos visando levar os romanos de volta à atividade rural, pela celebração da vida rústica. Como exemplos, temos os poemas “De re rustica”, de Catão, e “As Geórgicas”, de Virgílio. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 14 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 15 CAPÍTULO II DE BIZÂNCIO AO FEUDALISMO 3 – O Início da Idade Média A decadência do império romano trouxe por decorrência dois pólos políticos opostos constituídos pelo Império Romano do Ocidente, com sede em Roma, e o Império Romano do Oriente, ou Império Bizantino. A rápida derrocada do primeiro trouxe como conseqüência o afrouxamento dos laços comerciais existentes entre as diversas nações, pela falta de um poder centralizador. Já não existindo a hegemonia militar romana, as fronteiras do império foram cedendo às rebeliões e às invasões de povos bárbaros oriundos do oriente, cujo intuito preponderante era mais o de destruir do que dominar. Os governos centralizados se enfraqueceram, e as cidades e aldeias que sobreviveram fecharam-se em si mesmas, ou simplesmente desapareceram, pela dispersão de seus habitantes, que espalharam-se em centros fortificados (os castelos) para garantir a sua sobrevivência. Na primeira fase da Idade Média, as condições sociais presentes no Império Bizantino eram bastante superiores às do Império do Ocidente. Neste, grandes porções da Itália e do sul da França já tinham regredido a um ruralismo primitivo, em uma total decadência da civilização que Roma tinha imposto em seus tempos áureos. Já no Império do Oriente, mantinha-se ainda o caráter urbano e suntuoso, com uma classe rica que vivia no luxo e no conforto. Constantinopla, Tarso, Edessa e Tessalonica eram cidades populosas, com um comércio ainda florescente. Só em Constantinopla viviam cerca de um milhão de pessoas, e não havia sinais de decadência cultural ou econômica. Mercadores, banqueiros, industriais e ricos proprietários de terras absorviam-se em uma atividade comercial intensa, consumindo artigos de luxo, ricas vestimentas de lã e de seda, tapeçarias, artefatos de vidro e porcelana. O esplendor das artes do Império Bizantino foi tal que até os dias de hoje ainda surpreendem os especialistas. A sua arte do mosaico, por exemplo, influenciou a arte dos vitrais, usados extensamente nas catedrais góticas. Apesar da miséria (comum para a época) das classes inferiores, estes ainda assim estavam em melhores condições econômicas do que a dos cidadãos das partes ocidentais do Império. Havia uma estabilidade política e econômica, que permitia uma prosperidade crescente. Foi somente com a ascensão do império sarraceno que teve início a decadência do Império Bizantino. 4 – As Invasões Bárbaras No Império do Ocidente, a invasão dos bárbaros ocorrida entre os anos de 395 d.C. e 571 d.C. deixou terras devastadas e povos trucidados por onde eles passaram. Em sua esteira ficavam apenas ruínas de povoados, de cidades e de terras de cultivo, numa ânsia inconcebível de destruição. Os bárbaros invadiram a Trácia, a Panônia, as Gálias, a TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 16 África, a Itália, e finalmente a própria cidade de Roma, jogando abaixo séculos de refinamento cultural e de civilização. Se é possível situar no tempo o início das trevas que se abateram sobre o ocidente, dando início à Idade Média, é exatamente no período destas invasões. O ano de 410 d.C. representa aproximadamente este limite entre idades, dando fim à idade antiga e iniciando um período que só veio a ter término por volta do ano de 1300. Até a época das primeiras cruzadas pouca coisa tinha mudado após mais de quinhentos anos, no continente europeu. Com o término dos império romanos do Ocidente e depois do Oriente, um marasmo se instalou por todo lado e a evolução histórica e cultural dos povos europeus como que estagnou. O feudalismo, regime estático por excelência, tornou-se dominante. A Idade Média estava começando. Foi com o Papa Urbano II e com Pedro, o Ermitão, que conclamaram à libertação de Jerusalém e do Santo Sepulcro do jugo muçulmano, que tiveram início as primeiras cruzadas. Estas foram movimentos militares de inspiração religiosa que lançaram as bases para uma mudança profunda nas estruturas sociais, políticas e mesmo religiosas até então vigentes. Seguindo o caminho aberto pelas cruzadas, o comércio intensificou- se por toda as rotas asiáticas, com o que as cidadesportuárias de Pizza, Veneza e Gênova alcançaram grande poder marítimo. O comércio intensificou-se a tal ponto que as instituições feudais mostraram-se incapazes de atender a demanda dos territórios conquistados; esta situação, por fim, conduziu à criação de centros urbanos por todo lado, sementes das futuras cidades européias, bem como contribuiu decisivamente para a derrocada do feudalismo e para a ascensão futura de uma nova classe, a burguesia. O contato dos cruzados com a civilização árabe, bem mais refinada e culta nesta época, levou por outro lado a mútuos intercâmbios culturais que mais aproveitaram ao Ocidente. Os árabes tinham traduzido os autores gregos clássicos, os quais chegaram, via as traduções muçulmanas, às mãos de vários estudiosos ocidentais. Os sistemas de filosofia, a medicina, a matemática, a geometria, a literatura, a arquitetura, formaram parte deste legado cultural. Com o surgimento das cidades e o reinício das trocas comerciais, começaram a surgir também associações de trabalhadores artífices. O comércio se dava através de vias de transporte e também de feiras, entre as quais as mais célebres foram as de Flandres15 e de Champagne.16 O contato cultural proporcionado pelas cruzadas permitiu o desenvolvimento de novas cidades-Estado, tais como Veneza, Florença, Gênova e Pizza, com a criação de grandes corporações de comércio. A especialização em ofícios e a divisão do trabalho se intensificaram, expandindo o mercado; a manutenção das cidades passou a depender dos produtos agrícolas, aumentando a interação urbano-rural. Novas profissões surgiram, e as trocas comerciais entre os centros urbanos e as localidades rurais produtivas se consolidaram. * * * 15 Região da Europa localizada ao longo do Mar do Norte. Atualmente, está dividida entre a França, Bélgica e Holanda 16 Região do nordeste da França; no período medieval, foi um importante condado , tendo atingido o seu apogeu no século XIII, graças às feiras que realizava. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 17 A partir do ano 800, já se podia notar, no Ocidente, um lento despertar da letargia da época medieval. O contato com as civilizações bizantina e sarracena, o embate com os nórdicos, foram algumas das causas deste ressurgimento. Nos quinhentos ou seiscentos anos seguintes (principalmente a partir do século XII) houve um surto de progresso, e o aumento do comércio trouxe prosperidade e estimulou as artes, a ciência e a cultura. Basicamente, o feudalismo foi uma estrutura descentralizada da sociedade (ou seja, com um fraco ou inexistente poder central). O poder era dividido entre a nobreza, através de um sistema de suserania e de vassalagem. A partir do século VII, os reis merovíngios costumavam recompensar os condes e duques com benefícios e com terras (que se tornavam condados – no primeiro caso – ou ducados – no segundo caso). Posteriormente, os reis carolíngios recompensavam os nobres locais quando estes forneciam tropas de soldados para lutarem contra os mouros. Quem possuía o feudo tinha o direito de propriedade, e por conseqüência o direito de governar. Entre o suserano e os seus vassalos havia uma relação contratual, que envolvia obrigações recíprocas. Os vassalos pagavam tributos aos seus senhores, que se obrigavam a proporcionar-lhes proteção de assistência econômica. Aos poucos, aumentou a dependência do governo central com relação às diversas suseranias. Como a maioria adquiria imunidade (isenção de pagamento de impostos), a autoridade central foi diminuindo cada vez mais. Apenas nominalmente, o suserano se submetia à autoridade do rei. Além disso, as constantes invasões de nórdicos, turcos e muçulmanos levavam a população a se voltar para os senhores feudais em busca de proteção. Aos poucos, este sistema evoluiu para um tipo de sociedade estratificada; no segundo período da Idade Média (“Alta Idade Média”), o feudalismo (que já se tornara hereditário) chegou a constituir um tipo legalmente reconhecido de estrutura social, até mesmo encarado como um sistema ideal. A lei era produto do costume ou da vontade de Deus. No regime feudal, a principal unidade econômica era a chamada “herdade senhorial”, que era geralmente o domínio de um cavaleiro. Alguns chegavam a possuir várias herdades (às vezes, centenas ou milhares), em que o tamanho médio de cada uma podia chegar a 150 hectares. Em cada uma havia uma ou mais aldeias, e as terras cultivadas pelos camponeses se dividiam em três partes: o terreno de plantio da primavera, o terreno de plantio do outono e o “pousio”. Todos eram revezados a cada ano (era o sistema chamado de “três campos”). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 18 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 19 LEITURA COMPLEMENTAR A Economia e a Filosofia Escolástica As idéias econômicas predominantes neste período tinham forte influência da Igreja Católica, através de seus pensadores (teólogos, canonistas e filósofos moralistas), que procuraram se alicerçar nos escritos sagrados e nas obras aristotélicas, principalmente. Aristóteles é o pensador de maior influência entre os medievos, e sua noção de “equilíbrio” foi a base para a concepção de justiça nas trocas (preço justo e justo salário), e para o princípio de moderação e moralidade como essência do fenômeno econômico. A Igreja Católica admitia a propriedade individual, mas regrada por um princípio social restritivo, que a legitima. O proprietário não deve abusar do seu direito de propriedade em detrimento da coletividade. O direito de propriedade é reconhecido como propiciador de ordem e paz social, além de aumentar o rendimento da produção (essencialmente agrícola). Reconhece, entretanto, que os benefícios da posse da terra não devem ficar restritos a uma minoria privilegiada, porque isto traz desigualdade de condições e injustiça social. Entretanto, tal reconhecimento não foi capaz de evitar a prevalência das condições que exatamente se procurava evitar: a concentração da posse da terra, com a conseqüente ascensão social daqueles que a detinham. O feudalismo, como veremos, foi exatamente isso: a posse privilegiada da terra pela nobreza, que tinha poder total sobre os camponeses que a ocupavam e a faziam produzir. O princípio moral regulador, a proibição da usura (empréstimo a juros) bem como o princípio da troca justa eram basicamente a base do sistema econômico deste período. Os artífices, organizados em corporações, tinham fixado o seu salário como uma retribuição máxima regulamentada oficialmente (não se fixava um valor mínimo, como se procede na atualidade). O lucro resultaria do equilíbrio entre o trabalho empregado (com a perícia envolvida) e a utilidade do serviço. Condenava-se o lucro imoderado, por ser contrário á “justiça nas trocas”. Os chamados Padres da Igreja (Tomás de Aquino; Boaventura, entre outros), acompanhando o raciocínio aristotélico, distinguiam entre bens fungíveis e não fungíveis. O dinheiro seria um bem fungível, que desaparece com o consumo. O bem não fungível, por não desaparecer com o uso, pode ser emprestado ou locado por contrato. O seu detentor, por se privar do uso e gozo da coisa, pode exigir uma compensação. Mas no empréstimo de coisa fungível, o cedente entrega simultaneamente o uso e a propriedade da coisa. A justiça e o justo preço se realizariam pela simples devolução do objeto, sem mais nada (ou seja, sem juros sobre o empréstimo). Desse modo, o dinheiro não pode ser objeto de empréstimo a juros. Tal era a concepção inicialda Igreja. Além da preocupação com o “preço justo”, S. Tomás considerava também a possibilidade de um vendedor vender um produto defeituoso. Ele afirmava que caso isto ocorresse, não deveria ser um ato intencional, e que, se descoberto o defeito, o vendedor deveria compensar o comprador. Esta concepção veio a se modificar gradativamente, quando novas condições foram surgindo. Por exemplo, começou-se a se admitir a possibilidade de recebimento de juros TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 20 pelos empréstimos, nos seguintes casos: se o emprestador sofria danos resultantes do empréstimo; se havia riscos, ou se havia renúncia a um possível lucro imediato. Razões religiosas levaram a liberar a usura para os judeus e para os lombardos,17 que se admitia não estarem submetidos às regras católicas. Com relação às idéias monetárias, havia grandes debates a respeito do valor e da circulação da moeda, bem como da conveniência de alterar ou não o seu valor. Nicolau Orèsme, bispo de Lisieux e conselheiro do Rei Carlos V, e Buridan, reitor da Universidade de Paris, foram teóricos que estudaram o assunto. Orèsme criticou as mutações monetárias; para ele, o rei não tem legitimidade para fazer estas mutações de valor. O valor da moeda é garantido pela autoridade do Rei, que ordena sua cunhagem, e que teria assim, autoridade para mudar o seu valor. O cunho indicava a qualidade da peça e o seu peso. Entrando, entretanto, em circulação, o seu valor passa a depender da comunidade onde ela circula, que decide pela conveniência de lhe alterar o valor.18 Orèsme observou que em sua época praticavam-se cinco diferentes formas de mutações monetárias: 1) mudanças na efígie, o que acontecia normalmente devido à mudança de governantes; 2) mudança da proporção, ou mudança do valor entre o metal nobre (ouro ou prata) e o valor da moeda; 3) mudança nominal, ou modificação dos preços em moeda corrente (havia uma moeda real, cujas subdivisões em moeda corrente podiam variar); 4) mudança oficial do peso da moeda (as fraudes se davam, pela diminuição – ou cerceamento – do peso da moeda, limando suas beiradas circulares); 5) mudança de sua substância: neste caso, mudava-se a sua liga, substituindo um metal por outro. Como já dissemos, a moeda má expulsa a moeda boa do mercado, e se acontecia de haver muitas mutações, quando a situação econômica se deteriorava, a tentativa de restaurar a ordem econômica pela introdução de uma nova moeda esbarrava neste obstáculo: a moeda boa, capaz de trazer estabilidade monetária, era fundida, ou simplesmente tomava rumo para fora do país. 17 Povo germânico que veio a se fixar na Panônia (atual Hungria). 18 Algumas classes sociais mais elevadas, tais como juizes e eclesiásticos, que costumavam ter uma renda fixa, ficavam prejudicados por estas mutações de valor na moeda. O povo também via-se despojado, quando era obrigado a receber moedas de valor nominal muito baixo, em troca de mercadorias de muito maior valor. Foi o que ocorreu, por exemplo, graças a um edito real de Jaime II, que forçou o recebimento, sob pena de morte, de moedas de cobre cujo valor aposto era seis vezes maior do que o seu valor intrínseco. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 21 CAPÍTULO III O MERCANTILISMO Por volta de 1400, aconteceu a chamada “Revolução Comercial”, cujas causas básicas foram as seguintes: a conquista do monopólio comercial do Mediterrâneo pelas cidades italianas; 2) o desenvolvimento de um lucrativo comércio entre estas cidades e os mercadores da Liga Hanseática, no norte da Europa; 3) a introdução de moedas de circulação geral; 4) a acumulação de capitais excedentes; 5) a procura de materiais bélicos e o estímulo ao comércio proporcionado pelos novos monarcas; 6) a procura pelas especiarias do Oriente. A procura das especiarias era uma preocupação constante das coroas portuguesa e espanhola, interessadas que estavam em quebrar o monopólio das cidades italianas. A Península Ibérica, afastada deste comércio, era obrigada a pagar altos preços por sedas, perfumes, especiarias e tapeçarias provenientes do Oriente. Em busca de uma nova rota para o Oriente, os navegadores espanhóis e portugueses acabaram encontrando novas terras. A introdução da bússola e do astrolábio deu também um novo impulso a estas viagens, cuja motivação, muitas vezes, era apenas o intenso fervor proselitista e um excesso de zelo religioso, que ardia por converter os pagãos. As viagens de navegação realizadas por espanhóis e portugueses foram seguidas posteriormente por inglese e franceses. Também os holandeses participaram desta corrida por novas terras, com intenções visivelmente colonialistas. O resultado destas viagens de descobrimento foi uma tremenda expansão do comércio. Os navios das grandes potências mundiais podiam ser encontrados singrando quaisquer dos setes mares, e logo o monopólio das cidades italianas chegou ao seu final. Enquanto Gênova, Pizza e Veneza passavam para segundo plano, cidades como Lisboa, Liverpool, Bordéus, Bristol e Amsterdã se alçavam a cidades de grande importância. Em seus portos, um intenso movimento marítimo mostrava a pujança do seu comércio, e os armazéns custavam a conter a enorme quantidade de mercadorias vindas de toda parte. Ao lado de tecidos e especiarias do Oriente, juntavam-se agora o tabaco, as batatas e o milho da América do Norte; o melaço e o rum das Antilhas; o cacau, o chocolate, a quina e a cochonilha da América do Sul; completando este rol de mercadorias, achavam-se ainda, vindos da África, penas de avestruz, marfim e até mesmo escravos. Outros produtos já conhecidos tiveram também intensificado o seu comércio, tal como o café, o açúcar, o arroz e o algodão, que em razão do extenso comércio acabaram deixando de ser mercadorias de luxo. Entretanto, talvez o maior e mais importante resultado da descoberta e conquista dessas novas terras foi a espantosa quantidade de metais preciosos, ouro e prata, que inundaram o continente europeu. Esse ouro e prata provinha tanto das pilhagens realizadas nos tesouros dos incas e astecas, como também das minas do México, Bolívia e Peru. A acumulação desta riqueza fabulosa e as extensas especulações que propiciou em sua esteira iriam forjar as bases para o capitalismo. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 22 Também durante a época da Revolução Comercial desenvolveu-se o sistema bancário. No século XVI, surgiu a sociedade por ações, que era formada através da subscrição de quotas de capital por um considerável número de investidores. O dinheiro, que tinha ressurgido com força a partir do século XI, mas cujo valor dificilmente era reconhecido fora de sua região de origem, começou, através das moedas de ducado veneziano e florim florentino, começaram a ter ampla aceitação por toda a Itália e nos mercados do norte da Europa. Entretanto, não havia um padrão monetário estável, e os valores sofriam constantes modificações. Foi como conseqüência do desenvolvimento da Revolução Comercial que se buscou adotar um sistema monetário mais estável e uniforme, e de maior eficiência. Esta fase caracterizou-se também por uma maior especulação teórica, de cujos frutos veio a surgir a doutrina econômica conhecida como mercantilismo. * * * É provável que o mercantilismo remonte ao reinado de Eduardo I (1272-1307). Este monarca estabeleceu o comércio de lã com Antuérpia, e tentou por várias formas regulamentar o comércio interno. SobEduardo III, uma guerra prolongada com a França provocou uma inflação desastrosa. Para mitigar o sofrimento dos trabalhadores, este monarca fixou preços e salários em uma proporção favorável a eles, exigindo em troca que se dedicassem a todas as formas de trabalho disponíveis. Uma das características dos escritores mercantilistas era a de que a de que devia alcançar o pleno emprego, por todos os meios. Entre as medidas tomadas para fomentar a indústria, destaca-se a concessão de patentes de monopólio. De um modo geral, davam maior importância às exportações, relegando o comércio interno a segundo plano. Para se entender todas as implicações das idéias surgidas sob o prisma do mercantilismo, necessário se faz estudar o pano de fundo histórico no qual ele se desenvolveu. 5 – O Período da Renascença A partir do ano 1300, as características gerais que definiam o feudalismo começaram a desaparecer. Novas instituições e novos modos de pensar vieram substituir o pensamento escolástico e as dogmáticas e esclerosadas instituições políticas, sociais, econômicas e religiosas que tinham dominado por séculos. A noite prolongada do período medieval foi sucedida por um período de grandes conquistas em todos os campos do conhecimento. Até cerca de 1650, houve um súbito renascimento do interesse pela cultura clássica, caraterizada pelas civilizações grega e romana. O século XVI, principalmente, foi um século marcado por grandes mudanças sociais, geográficas, religiosas e políticas. Foi o século das grandes descobertas, das grandes invenções, das grandes navegações de Magalhães e Colombo, os quais descobriram novos continentes. Entre as grandes invenções do período, encontra-se a da imprensa, que viria a se tornar um poderoso fator de difusão das novas idéias. * * * TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 23 Com a invenção do livro impresso as idéias difundiam-se rapidamente entre todos os países. Lutero e Calvino, insurgindo-se contra o Papa, deram origem à reforma religiosa mais profunda no seio da Igreja Católica. Tiveram seguidores na Alemanha, Suíça, estados escandinavos e sul da França. Neste país, seus seguidores eram chamados de huguenotes e de livres-pensadores. “Lutero, atacando a autoridade, fazendo da palavra evangélica a base de seus ensinamentos, dirigia-se a essas massas inquietas. Ele seguiu as massas enquanto elas exigiam pequenas reformas; mas os camponeses estavam se transformando numa classe que queria uma revolução na ordem social, que a pequena burguesia tinha interesse vital em conservar”. (TRAGTENBERG, Maurício. Pág. 24). A reforma chamada “Protestante” viria a ter enormes conseqüências no desenvolvimento futuro das relações comerciais entre os países. Os seguidores de Lutero e Calvino eram mais liberais no tocante às relações econômicas e não se deixavam tolher pela ética cristã,19 contrária aos juros e sempre temerosa de uma possível punição divina, em razão de uma prática comercial injusta. Os países que primeiro se converteram à pregação luterana e calvinista eram mais pragmáticos; além disso, o crescente fortalecimento do Estado, com o fim das suseranias feudais dava ensejo a um incremento no comércio entre as nações, bem como à busca de novos territórios a serem colonizados. “Assim, precisamente num período em que a expansão dos métodos burocráticos no comércio e no governo e o desenvolvimento da fabricação em grande escala estavam transformando todo o curso da atividade prática numa labuta árdua e cada vez mais destrutiva, o protestantismo desenvolvia uma habilidade especial de tirar prazer dessa árdua labuta. Esta foi a contribuição especial do protestantismo para o desenvolvimento do capitalismo e da indústria mecânica: não iniciá-los, mas torná-los toleráveis e instilar neles todas as energias da vida moral. Os trabalhos penosos serviam ao protestante de preciosa mortificação da carne; preciosa tanto num sentido profano como num sentido espiritual, pois, ao contrário dos cilícios e da autoflagelação da santo medieval, sua firme e constante concentração no trabalho fastidioso rendia lucros tangíveis”. (MUMFORD, Lewis. Pág. 226). 19 O fundamento das concepções religiosas do protestantismo baseava-se na doutrina pela qual os homens se justificam (ou se “salvam”) não pelas obras, mas pela fé. Enquanto esta última favorecia o poder do clero católico (única via “salvacionista”), a primeira admitia uma “verdade do coração”, tornando-se o homem juiz de si próprio. Esta doutrina individualista chamou a atenção da nova classe média de artesãos e negociantes, porque eliminava a culpa que se admitia ser trazida pelo acúmulo de riqueza. Embora a ética protestante (o chamado “espírito puritano”) atribuísse grande importância ao ascetismo e à temperança, por outro lado admitia uma valorização religiosa do trabalho (considerado uma forma de glorificar a Deus) e o próprio lucro, que seria uma mostra da generosidade divina. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 24 * * * A chamada “revolução puritana” veio a se tornar a bandeira ideológica do desenvolvimento (em época posterior) do capitalismo inglês, iniciado com a Revolução Industrial. A revolução puritana tem cinco períodos delimitados, que podem ser assim divididos: de 1642 a 1647, período da guerra civil que derrubou o rei; de 1647 a 1649, período que se caracterizou pela luta entre proprietários e lavradores (vencendo os primeiros); de 1649 a 1660, em que se consolida a revolução e o domínio de Cromwell, que se voltava para o interesse dos novos comerciantes e capitalistas.20 O quarto período transcorreu durante o reinado de Carlos II e Jaime II. Caracteriza-se pelo desaparecimento dos últimos vestígios do feudalismo. O último período vai dos Stuarts até o estabelecimento da monarquia constitucional em 1689, quando a Coroa aceitou a Declaração de Direitos (mas já em 1688 o governo inglês submetera-se ao controle da pequena nobreza e da classe média dos capitalistas). * * * As monarquias absolutistas, sempre com espírito beligerante, exigiam enormes somas de dinheiro para as guerra necessárias, dinheiro este que devia provir tanto dos impostos internos quanto da exploração externa de colônias ricas, capazes de fornecer metais preciosos em grande quantidade. O poder marítimo dividia-se entre Inglaterra, França, Holanda e Portugal, países colonialistas por natureza. A expressão do poder e da riqueza de uma nação era compreendido como produto do acúmulo de metais preciosos, principalmente o ouro e a prata, e eram as colônias que deveriam prover esta riqueza. Outra fonte de riqueza estava na exportação de artigos de luxo, que recebiam uma alta taxação para limitar a venda interna. A Inglaterra buscou incrementar largamente o comércio exterior;21 já a Espanha tendia ao acúmulo irrefreado de ouro, que ia buscar em suas colônias. 6 – O Regime Colonial As grandes navegações iniciadas pelos portugueses, espanhóis, ingleses e holandeses, principalmente, propiciaram o descobrimento de terras desconhecidas fora do continente europeu, que foram reivindicadas pelas coroas (reinos ou impérios) que as descobriram (a que se acrescentam a Bélgica e a França). O continente sul-americano, por exemplo, sofreu colonização espanhola e portuguesa, e foi a fonte de grandes riquezas minerais, seja de ouro, prata ou pedras preciosas, que enriqueceram o erário das nações européias. 20 Este interesse tinha por base a necessidadede Cromwell de arregimentar uma nova classe que o apoiasse contra os interesses da nobreza, que poderia tentar fazer voltar o regime monarquista. 21 Já no século XV a Inglaterra possuía uma grande indústria têxtil, como também a hegemonia do mercado mundial de produtos têxteis. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 25 “O início dessa colonização de povoamento no século XVII abre uma etapa nova na história da América. Em seus primeiros tempos essas colônias acarretam vultosos prejuízos para as companhias que as organizam. Particularmente grandes são os prejuízos dados pelas colônias que se instalam na América do Norte. No êxito da colonização agrícola portuguesa tivera como base a produção de um artigo cujo mercado se expandira extraordinariamente. A busca de artigos capazes de criar mercados em expansão constitui a preocupação dos novos núcleos coloniais.” (FURTADO, Celso. Pág. 21/22). Os territórios reivindicados tornaram-se possessões e/ou colônias, e foram progressivamente ocupados por levas de colonizadores, provindos dos continentes europeus.22 Durante os séculos XVI a XIX, principalmente, os países europeus intensificaram o processo de colonização e dominação (período de expansão colonial), como um meio de conquistar fontes de diversos produtos econômicos (especiarias, metais e pedras preciosas, açúcar e outros produtos tropicais), necessários ao comércio que se intensificava entre as nações. América, Ásia e África foram os continentes colonizados, tornando-se fontes supridoras das matérias-primas ansiadas pelas metrópoles. Neste período colonialista (denominado de “acumulação primitiva”), também os países produtores de especiarias sofreram intervenção militar dos países europeus, interessados em dominar este monopólio. Mas onde quer que existisse um interesse econômico (extração de metais e pedras preciosas, por exemplo), as potência européias colocavam sob o seu jugo militar os países ou nações mais fracos. Um as um, eles tornavam-se colônias da metrópole.23 A política colonial, ou política comercial imposta às colônias tinha um aspecto unilateral, favorável unicamente à metrópole (era o chamado “pacto colonial”). Desta forma, era comum que qualquer manifestação contrária a esta política fosse brutalmente reprimida, bem como qualquer forma de competição, seja da própria colônia, seja de outras nações. Havia um monopólio de compra e venda por parte da metrópole (e a ela favorável), como também de exportação/importação e de transportes de mercadorias.24 Também cabia à metrópole a fixação dos preços das mercadorias. A colônia tinha que aceitar essas imposições, ou aceitar os riscos de uma rebelião.25 22 Em alguns casos, como a colonização do Brasil, por exemplo, as guerras napoleônicas forçaram a transferência de toda a corte para o território da colônia, mudando drasticamente o seu status político (entretanto, deve-se à perspicácia e ao gênio do Visconde de Cairú ter convencido D. João VI a abrir os portos brasileiros ao comércio internacional, em 1808). Antes disso, a colônia não podia comerciar com o exterior. 23 A disputa entre estas potências, entre outras coisas, levou à criação do Tratado de Tordesilhas. 24 Foi esta política monopolizadora que provocou a revolta de várias colônias. A política de comércio do sal, por exemplo, deu ensejo às lutas pela independência por parte dos Estados Unidos da América, bem como foram o motivo unificador da resistência indiana contra a dominação inglesa. 25 Este foi basicamente um fenômeno político (a formação e exploração de colônias), e apenas a forma como se desenvolveu a exploração econômica nos interessa realmente, no contexto que estudamos este assunto. Politicamente, a colonização pressupõe uma relação de dependência entre o colonizado – a colônia – e a metrópole – o colonizador. É um fenômeno que resultou do Mercantilismo, e predominou TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 26 A riqueza resultante da exploração colonial nem sempre se mantinha; muitas vezes, o esforço resultante da colonização esgotava os cofres mais rapidamente do que estes se enchiam pela exploração. Entretanto, muitas das economias nacionais que vieram a se desenvolver propiciaram a formação de um capitalismo incipiente no continente europeu, iniciando uma economia de mercado e um sistema financeiro que permitiram o enriquecimento e um progresso econômico das nações ocidentais. Além disso, nem sempre o processo era extremamente desfavorável para a colônia. Muitas vezes ela sofria um processo civilizatório ou de modernização acentuado, que a tirava de um estado primitivo no qual sequer possuía uma economia nacional; em alguns casos, a colonização forçava a um processo político unificador entre tribos ou etnias rivais, eternos adversários na luta pela hegemonia política e pelo poder. * * * Os mercantilistas, ainda que pecassem pelo excessivo valor dado aos metais preciosos como fonte de riqueza, ainda assim tiveram o mérito de ter desenvolvido uma idéia ou noção nova, qual seja a de economia nacional. Além disso, as formas de comércio que desenvolveram criaram as bases políticas para as florescentes dinastias da Áustria, de Florença e de Frankfurt, entre outras. Foi daí também que surgiriam os modernos e poderosos complexos bancários, base de todo sistema capitalista. até pouco antes da II Guerra Mundial; após esta, as colônias iniciaram um processo irreversível de emancipação política e de independência. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 27 LEITURA COMPLEMENTAR As Idéias Econômicas do Mercantilismo Não existiu apenas um sistema mercantilista, mas vários, de acordo com o país. A Espanha, por exemplo, confundia os conceitos de “riqueza” e “metal precioso”, achando que o mero acúmulo deste levaria àquela. Esta forma rudimentar de mercantilismo era chamada de “metalista” ou de “bulionista”.26 Criavam-se medidas para impedir ou restringir a saída ou evasão de metais valiosos; por outro lado, criavam-se mecanismos para tentar atrair moedas estrangeiras para dentro do país. No comércio entre os países, regrada pela chamada “balança de contratos”, os navios espanhóis eram obrigados a levar mercadorias e a voltar com cargas de ouro. Quanto aos navios estrangeiros que aportavam com suas cargas em portos espanhóis, deveriam voltar com mercadorias, e não com pagamento em moedas ou em metais preciosos. Esta concepção mercantilista de “balança de contratos”, devido ao seu caráter restritivo, veio a evoluir para o sistema denominado “balança de comércio”. Na troca entre metais preciosos, buscava-se sempre uma condição favorável de superávit, que assegurasse ao país uma posição de credor. De qualquer modo, concebia-se a riqueza como resultado do acúmulo incessante de moeda e de metais preciosos. A França tinha outra posição, denominada mercantilismo “industrialista” ou “colbertista”.27 Colbert fomentou a indústria, com a finalidade de aumentar a quantidade de mercadorias exportadas, que seriam trocadas por metais preciosos. Caracterizou-se pelo intervencionismo de Estado, que outorgava monopólios de produção e regulamentava a indústria. O preço do trabalho, ou mão-de-obra, era fixado em um máximo. Também a taxa de juros era determinada pelo Estado. A preocupação metalista, voltada ao acúmulo de metais pela exportação, além de restringiro consumo interno, forçou a ingerência do Estado também em outros campos, como a adoção de uma política demográfica (favorável ao crescimento populacional, que redundaria em mais gente produzindo) e a organização de um exército poderoso. A Inglaterra, por sua vez, adotou um sistema mercantilista de moldes “comercialistas”. Sendo uma grande potência marítima, podia comerciar em grande escala em todo o mundo conhecido. Para conseguir um saldo favorável na balança de pagamentos, o Estado regulamentava a produção e controlava as vendas no exterior, assegurando-se de que a importação de ouro e prata fossem superiores à sua exportação. No século XVIII vemos aparecer a forma de mercantilismo denominada fiduciária. Entres outros teóricos das idéias econômicas e monetárias, temos o nome de John Law, banqueiro escocês que teve extenso papel na evolução destas idéias. Para Law, o aumento da riqueza pública podia ser feito unicamente pelo aumento da quantidade de moeda. Ele não se opunha à exportação de metais ou de moedas; também achava que não era obrigatório o repatriamento de metal precioso no valor das 26 De bullion, ouro em barras ou em lingotes. 27 De Jean Baptiste Colbert (1619-1683), ministro das Finanças do Rei Luís XIV. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 28 exportações realizadas. Achava que a simples criação do papel-moeda deveria permitir a aquisição de mercadorias, por ser o melhor instrumento de trocas. Ele parte de uma análise simples: enquanto persistir a confiança do cliente de um banco, ele não irá solicitar a conversão e reembolso de seus “bônus” (os papéis-moeda) em espécie metálica. A moeda em papel (notas bancárias, ou moeda emitida por bancos) poderia ser emitida em abundância, na proporção de sua procura, sem por em risco o desenvolvimento econômico. Mas Law não se deu conta que o excesso de notas bancárias em circulação tinham grande influência sobre os preços, que tendiam a elevar-se. Juntando-se a isso o excesso de emissões, a confiança dos portadores se evaporou, e houve uma correria para pedir reembolsos. Quando o público percebeu que não havia reservas em metais para cobrir as notas, o valor destas simplesmente desapareceu, ainda que tivessem curso forçado. Law, evidentemente, fez uma análise contrária; ele não percebeu que deveria ser a riqueza que deveria prover o aumento de circulação (por emissão) de moedas, e não o contrário. Se não havia reserva de valor, o volume monetário, por si só, também não conseguiria garantir o valor da moeda-papel ou nota bancária em circulação.28 Ainda que tenha antevisto o sistema de crédito e de trocas comerciais baseado em papel-moeda (e não em moedas metálicas), Law não conseguiu perceber que o uso desta deveria apoiar-se em uma prosperidade real.29 28 Este tipo de equívoco repetiu-se em diversas oportunidades históricas. Logo após a Revolução Francesa, a escassez de moedas levou à emissão de papel-moeda cujo lastro seria formado pelas terras confiscadas da Igreja. Em pouco tempo, a derrocada inflacionária veio mostrar o erro desta concepção. Também no início da República, no Brasil, cometeu-se o erro (a que se chamou “encilhamento”) de tentar fomentar a prosperidade econômica através de largas emissões de notas, além da concessão de crédito fácil e barato. Em breve, percebeu-se que o valor destas notas emitidas, e das ações das sociedades que se criaram eram apenas fumo, fumaça e vacuidade. 29 Com o economista David Ricardo, percebeu-se mais tarde que esta prosperidade deveria resultar do aumento do emprego e do aumento da renda suplementar que resultaria deste fato. Esta renda suplementar aumentaria o consumo, que por sua vez aumentaria a produção. Keynes, futuramente, voltaria a este tema da multiplicação real da renda. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 29 CAPÍTULO IV AS ESCOLAS ECONÔMICAS Denomina-se escola “liberal” às concepções que dão ênfase à iniciativa individual, em detrimento da iniciativa do Estado, para realizar a atividade econômica. Este movimento individualista caracteriza-se por uma divisa: “laissez-passer; laissez-faire” (deixe passar; deixe fazer). O liberalismo econômico, expresso neste sistema individualista, vinha como uma reação aos excessos do mercantilismo, que se caracterizou pelo exagero de regulamentação e pela ênfase dada à indústria, em detrimento da atividade agrícola. Esta política, agravada pelos baixos preços pagos pelos gêneros alimentícios, levou a população rural à miséria, bem como trouxe a ameaça de fome, pela redução das áreas de cultivo. O excesso de intervencionismo estatal acabou gerando grande descontentamento e oposição. Tudo isto veio a provocar uma reação ampla, de índole individualista e liberal, bem como de caráter científico, ao se procurar a explicação dos fenômenos econômicos. Esta reação se materializou através das escolas chamadas fisiocrática, francesa, e clássica, inglesa. 7 – A Escola Fisiocrática A escola fisiocrática surgiu com a obra do médico François Quesnay, que publicou suas investigações sobre economia na Enciclopédia dirigida por Diderot, a partir de 1756. Para os fisiocratas, as leis que regem os fatos econômicos são leis naturais, e assim devem ser compreendidas e estudadas. Há uma ordem natural que tudo rege, e que dá apoio ao direito de propriedade privada. Este direito exercia-se livremente, proporcionando progresso social e assegurando um preço justo ao produto agrícola. Por outro lado, afirma que este preço satisfatório também decorre da concorrência. Os fisiocratas dividem a sociedade em três classes: a classe produtiva, formada pelos agricultores; a classe de proprietários de imóveis; uma classe não-produtiva, ou “estéril”, formada por comerciantes, industriais, bem como por profissionais liberais e outras pessoas que se dedicam ao serviço doméstico. O sistema de circulação da riqueza proposto tem por base a descoberta realizada por William Harvey, em 1628, da circulação do sangue no corpo humano. Quesnay apresenta um sistema de circulação da riqueza análogo à fisiologia humana. A riqueza originalmente produzida pela classe “produtiva” circula pelas classes sociais conforme a sua importância, repartindo os bens produzidos. No fim do ciclo, a riqueza volta às mãos da classe “produtiva”, que volta a reparti-la (seja por pagamentos, ou por custos de produção – a classe “produtiva” obtém o seu lucro pela diferença entre a venda dos produtos agrícolas e o seu custo de produção). Entretanto, este ciclo mostra-se estacionário, pois não há produção de novas riquezas. Entretanto, ele já dá uma idéia do equilíbrio econômico, idéia que viria a ser retomada por Léon Walras em fins do século XIX. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 30 A riqueza somente poderia ser gerada pela produção agrícola, sempre em maior volume do que a riqueza consumida. O lucro obtido é chamado pelos fisiocratas de “produto líquido”. Assim, a idéia de valor está ligada à idéia de produção, confundindo- se riqueza e valor.30 Este erro de concepção levou os fisiocratas a difundirem uma doutrina de aversão ao comércio, de um modo geral, porque ele não seria criador de riqueza. Este erro apenas substituiu o erro cometido pelo mercantilismo, o de não dar importância à agricultura. * * * Como já vimos, aceitava-se a existência de uma ordem natural, que Deus criara para levar a felicidadeaos homens. As leis naturais não deveriam tolher a liberdade do homem, porque esta seria a base do progresso econômico e social. Além disso, este progresso baseava-se no direito de propriedade privada. Uma das preocupações dos fisiocratas era com relação ao “bom preço”. Para Quesnay, “abundância com preço alto é opulência”. O bom preço aproveitaria a todas as classes, pois elevaria todos os preços, trazendo abundância geral. Com relação aos impostos, as taxas deveriam incidir unicamente sobre a terra, por ser ela a riqueza real (dela provinha o “produto líquido”).31 8 – A Escola Clássica A partir do século XVII, as teorias mercantilistas já vinham sofrendo grandes críticas; William Petty (1623-1687), por exemplo, apontava que a riqueza provinha do trabalho, e não do comércio. Os fisiocratas, como vimos, colocavam os bens materiais como a fonte das riquezas: estes eram extraídos do solo, mediante o cultivo. Assim, somente da agricultura poderia provir o excedente que seria distribuído entre as demais classes da sociedade. A partir de Adam Smith surgiu a denominada “concepção clássica da economia”, também chamada de Escola Clássica. Em sua obra mais famosa, “A Riqueza das Nações”,32 publicada em 1776, Smith aponta que a riqueza é constituída pelos valores de uso (seguindo Petty, ele distingue entre o valor de uso e o valor de troca das mercadorias). O que determina a riqueza de uma nação é a sua produção total (que modernamente diz-se: Produto Nacional Bruto, ou PNB). Uma das análises mais penetrantes de Smith se dá quando ele distingue qual é, verdadeiramente, o fundamento do valor de troca.33 Este fundamento não está na utilidade da mercadoria, ou na sua capacidade de satisfação das necessidades humanas; está, isto sim, refletido no trabalho gasto em sua produção. 30 Apenas em épocas posteriores viriam os economistas a ligar a idéia de valor à satisfação das necessidades do homem. Desta forma, a indústria e o comércio, além de gerarem utilidade, aumentariam a utilidade das coisas já existentes. 31 As constantes sugestões modernas a respeito de imposto único têm nos fisiocratas a sua origem conceitual. 32 Cujo nome correto era: Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações. 33 Valor de troca é a quantidade de mercadorias que se pode obter em troca da mesma. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 31 Com base nesta concepção, Smith afirma que a riqueza, para crescer, depende diretamente da produtividade do trabalho. Esta produtividade, por sua vez, depende do grau de especialização, ou seja, do grau de divisão do trabalho atingido. Esta divisão depende ainda da extensão do mercado, o qual é normalmente limitado por todo tipo de obstáculos que se opõem ao comércio interno e externo da nação. A divisão do trabalho, para acontecer, devia resultar também de uma contínua acumulação de capital.34 Este aumento de capital deveria se processar em um regime de liberdade (principalmente sem intervencionismo estatal), e a sua causa imediata seria a poupança. Para Smith, quando o comércio provoca a expansão da divisão do trabalho, todos ganham, porque se beneficiam do aumento da produtividade. Ele via, na divisão do trabalho, a melhor cooperação entre os indivíduos, com vista a um bem comum. Propôs o câmbio livre, pois que somente este poderia conduzir ao desenvolvimento das forças produtivas. Era, igualmente, a favor de remover todas as limitações ao comércio interno.35 A ordem natural defendida pelos fisiocratas é entendida por ele de um modo racionalista; para ele, o equilíbrio do mercado é regulado por uma “mão invisível”, capaz de impedir os excessos de exploração econômica por parte das classes mais favorecidas, ciosas de seus privilégios e voltadas aos seus próprios interesses. Esta “mão invisível” faria com que a luta pelos interesses de cada um traria, ao final, benefícios a todos. Smith mostrou que havia um excedente, ou parte do produto do trabalho. Este excedente tomaria a forma de lucro e renda da terra. Antecipando-se de certa maneira a Karl Marx, ele chegou a demonstrar como ocorria uma apropriação deste excedente. Em oposição aos fisiocratas, afirma que todas as atividades capazes de produzir mercadoria, também produziam valor. Este valor pertencia, originalmente, ao trabalhador, quando este possuía os meios de subsistência e de produção (inclusive a terra). Quando perderam esta propriedade para os capitalistas e para os proprietários fundiários, puderam ter acesso a estes meios apenas em troca de uma parte do produto do trabalho (o qual seria exatamente o lucro). Entretanto, por lhe faltar uma melhor perspectiva histórica, Smith não desenvolveu a idéia, o que viria a ser feito futuramente por Marx. A renda da terra, por sua vez, decorria da diferença de custos de produção provocados pelas diferenças de fertilidade e de localização da mesma (terras férteis davam maior lucro do que terras menos férteis). 9 – A doutrina de Malthus Robert Malthus foi outro teórico da escola clássica. Basicamente, ele preocupava-se com a possibilidade de o crescimento populacional atingir um patamar de crescimento superior à capacidade de produção de alimentos. Em um estudo que realizou, chamado “Ensaio sobre a População”, ele reflete sobre alguns conceitos demográficos e suas conseqüências sobre a população. 34 Smith distinguia entre capitais circulantes (que hoje se chamam capital de giro), e capitais fixos, ou aquele usado para a aquisição de instrumental e maquinaria. 35 Que em sua época caracterizavam-se por regulamentações corporativas; vedação ao exercício de vários ofícios; proibição de migrações internas; etc. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 32 Malthus percebera que existia um descompasso entre o crescimento da população e o aumento dos meios de subsistência. Fazendo uma análise científica, ele demonstrou que, enquanto o crescimento populacional se dava em proporção geométrica, o crescimento da produção de alimentos se dava apenas em proporção aritmética. Sendo assim, podia- se prever uma catástrofe, a qualquer momento.36 Entretanto, ele mostrou ainda que existiam dois tipos de óbices ao crescimento ilimitado da população: os repressivos e os preventivos. Os primeiros resultavam de fatos naturais (epidemias, doenças, etc.) ou provocados (guerras, conflitos, etc.). Os segundos resultariam de um controle espontâneo da natalidade, que entretanto se dava em menor escala, e que, para Malthus, deveria não somente ser colocado em prática, como também recomendado enfaticamente.37 10 – A Teoria da Renda de David Ricardo David Ricardo foi outro pensador vinculado à Escola Clássica. Foi bastante influenciado pela leitura da obra de Adam Smith,38 que dirigiu sua atenção para a economia política. Mas, ao contrário deste e de outros pensadores, Ricardo é menos acadêmico do que um filósofo prático, com extraordinário talento para os negócios, e com uma visão bastante abrangente a respeito do fenômeno econômico. Suas primeiras especulações dirigem-se para a moeda, e ele demonstra que o valor da moeda metálica deriva do trabalho para produzi-la; quanto à moeda fiduciária, ou moeda sem lastro, o seu valor depende da quantidade em circulação. Apontou a relação entre o comércio exterior e o valor desta moeda: se há excesso de moeda, os preços internos sobem, o que leva ao aumento de importação, que por sua vez acarreta déficit na balança comercial. Este déficit deverá ser coberto pelasaída de ouro, que ao sair do país, elimina o excesso. Por outro lado, se os preços internos baixam, há um incremento na exportação, trazendo superávit na balança de pagamentos, e portanto haverá entrada de ouro país (este equilíbrio somente irá ocorrer se a moeda possuir lastro, ou ouro bastante que sustente o seu valor de conversão). 36 Chama-se “transição demográfica”, a relação entre mortalidade e fecundidade. No Ocidente, a partir do século XIX, os índices de mortalidade começaram a declinar lentamente. Mas existe também o chamado “índice de mortalidade infantil”, que indica a quantidade de óbitos infantis por cada mil nascimentos. Enquanto o primeiro diminui em função de medidas adequadas de higiene e da melhoria da alimentação, o último (geralmente endêmico em países do Terceiro Mundo) pode ter causas bem mais complexas. 37 Em países de alta densidade populacional, tais como a Índia e a China, o Estado intervém vigorosamente com uma política drástica de limitação da natalidade (ou de planejamento familiar). Com relação aos temores de Malthus, estes não se concretizaram em virtude da criação de métodos de produção agrícola cada vez mais eficientes (o uso de adubos; técnicas mais eficientes de uso da terra; o uso de defensivos agrícolas; etc.). 38 Contemporâneo de Ricardo, Jean Baptiste Say também sofreu esta influência; na verdade, ele levou as idéias de Smith para a França. Deve-se a Say a famosa lei dos mercados, bastante citada nos livros de texto, até a atualidade. Para ele, da produção de bens provém uma demanda global efetiva, que é capaz de adquirir a oferta global destes bens. Em outra palavras, jamais pode haver uma escassez de demanda, que é a contrapartida da superprodução (esta lei, como veremos oportunamente, foi refutada por John Maynard Keynes, quando ocorreu a Grande Depressão). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 33 Ricardo elaborou uma teoria geral da renda, que ele baseou em hipóteses econômicas. Ele considera que em um primeiro momento, haverá um acesso em comum a terras férteis, que serão cultivadas com o mesmo custo, e vendidas ao mesmo preço; não há, pois, renda, pois que o lucro é igual para todos. Com o aumento da população, novas terras deverão ser cultivadas, para suprir a alimentação dos novos contigentes populacionais. Entretanto, só estarão disponíveis, nesse instante, terras menos férteis, cujo cultivo terá maior custo. Assim, eleva-se o preço de venda (admite-se que a produção feita em terras mais férteis terá seu preço ajustado aos das terras menos férteis; assim, o lucro das primeiras será maior, porque terão um lucro suplementar, independente do capital e do trabalho dedicado à produção). O que não se pode admitir, seria vender abaixo do preço de custo. Em um processo crescente, provocado pelo aumento populacional, novos contigentes de produtores entram no esquema, em uma escala decrescente de lucros. Haverá sempre uma diferença de custos entre os primeiros e os últimos produtores, acarretando o que se denomina renda diferencial. Levando mais longe o seu raciocínio, Ricardo chega ao momento em que já não haverá mais terras disponíveis. Mas como a população continua crescendo, os preços também sofrem aumentos constantes. Esta alta de preços traz uma renda suplementar àqueles que detêm as menos férteis das terras (terras marginais). Neste caso, não se chama de renda diferencial, mas de renda de monopólio. Os proprietários das terras mais férteis, em todos os casos, estarão sempre aumentado os seus preços (e incrementando a sua produção), para aproveitar o preço ditado pelo custo de produção das terras menos férteis. Entretanto, esta produção suplementar exige, por sua vez, quantidades cada vez maiores de trabalho e de capital, os quais deverão ser remunerados.39 A necessidade progressiva de explorar terras sempre menos férteis altera esta repartição. Enquanto a renda aumenta sem limite, o salário e o lucro tendem a diminuir.40 O primeiro, pela crescente oferta de mão-de-obra; quanto ao lucro, tende a uma margem cada vez menor, devido aos custos crescentes de produção. Mas, ainda que a renda aumente, haverá uma queda nas taxas de juros, e com isto uma queda na poupança, o que por fim levaria a uma estagnação na indústria. Analisando os detalhes práticos da política econômica inglesa, Ricardo se opôs às restrições legais à importação de trigo, que só poderia ser feita caso o preço ultrapassasse um determinado patamar. Para ele, o alto preço do produto impunha altos salários nominais, que traziam redução nos lucros. O acúmulo de capital que se daria a partir dos lucros vê-se impedido, e até ameaçada a expansão da atividade econômica, porque a elevação dos preços limitava a acumulação. “Ricardo era contemporâneo do início da Revolução Industrial e identificava-se com a burguesia industrial, cujos interesses supunha que coincidiam com os de toda a sociedade. Verificava que o excedente se repartia lucros e renda da terra e defendia abertamente uma política 39 A remuneração pela venda dos produtos agrícolas tinha três destinatários: a renda, para os proprietários da terra; o salário, para remuneração do trabalho; o juro (na verdade, o lucro), ou remuneração do capitalista empreendedor (esta é a teoria da repartição, de Ricardo). 40 O salário nominal, que acompanha a alta de preços, poderia aumentar; não, entretanto, o salário real. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 34 favorável ao lucro em detrimento da renda. Ricardo tomava, dessa maneira, posição no conflito de classes a favor da burguesia, o que o levou a entrar em polêmica contra o seu amigo Malthus, que era partidário dos proprietários fundiários.” (4) * * * Numerosas críticas surgiram a respeito da explicação generalista que Ricardo tentou estender a todos os casos de renda fundiária (mas não da sua teoria, do modo como ele a expôs). Por exemplo, o economista Charles Henry Carey (1793-1879), que também estudou a renda, contestou a idéia de que a exploração da terra passava forçosamente por estas etapas, como se fosse uma lei histórica imutável.41 Analisando a forma como se deu a exploração de vários países, mesmo na Europa, Carey observa que muitas vezes, o início da exploração agrícola se dá a partir de terras menos férteis, principalmente se se encontram em território a salvo de invasões, ou mesmo se são de maior facilidade de cultivo. Em seguida, podia-se se passar (o cultivo) para terras mais férteis. Essa ordem de cultivo, para Carey, daria origem a uma possível baixa progressiva do preço dos produtos, e com isso, do valor da terra (Carey chegou a negar a possibilidade de existência da renda).42 Para Ricardo, o valor baseia-se estritamente no trabalho;43 ele rejeita a utilidade44 como causa e medida do valor. Para ele, havia duas espécies de bens: aqueles não suscetíveis de reprodução, cujo valor depende de sua raridade e da relação entre oferta e procura; e aqueles suscetíveis de reprodução indefinida, sempre a um mesmo preço de custo. * * * Ricardo também fez interessantes estudos a respeito de moeda, crédito e comércio internacional. Para ele, cada país está, em um determinado instante, em equilíbrio 41 Segundo John Kenneth Galbraith, nos Estados Unidos a civilização e o aumento populacional pressionaram a que o plantio se deslocasse não para solos mais pobres, mas sim para solos muito mais férteis (a colonização do território americano deslocou-seprogressivamente de leste para o oeste, que tinha terras mais ricas para o plantio. Estas terras a oeste, posteriormente, devido ao aumento populacional e às ferrovias, viriam a sofrer extensa valorização, com a conseqüente especulação sobre elas). 42 A chamada lei do rendimento decrescente proposta por Ricardo, apesar de exata, vem-se se mostrando inoperante pela força dos fatos históricos mais recentes. O progresso técnico, o aumento do rendimento ocasionado por novas técnicas de cultivo, o desenvolvimento dos meios de transporte, tem mostrado que esta lei só tem eficácia em determinados momentos históricos de sistema econômico mais simplificado, voltado principalmente para a agricultura. Além do mais, a teoria da renda proposta por ele não leva em conta o fator procura, mas sim a oferta. Stuart Mill, em oposição a este fato, apontou para o fato de que era perfeitamente possível toda a terra de uma nação ser cultivada (qualquer que fosse a sua qualidade), e ainda assim proporcionar uma renda. 43 Esta teoria do valor-trabalho, entretanto, carecia de uma maior fundamentação, e mesmo Ricardo tinha dúvidas a seu respeito. Por exemplo, como explicar o valor de um diamante frente ao trabalho de extração, ou como explicar que alguns produtos tinham variação de preço de um ano para outro, ainda que o trabalho não variasse? (era o caso, por exemplo, das safras desiguais de uvas, que alteravam o preço do vinho). 44 Capacidade inerente a uma coisa, de satisfazer nossas necessidades. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 35 monetário resultante de sua atividade econômica, do sistema monetário e do sistema bancário. Este equilíbrio não está relacionado com a quantidade total de moedas e de metais preciosos que existe em todo o mundo. Admite-se que os metais preciosos possuem a mesma capacidade de aquisição de mercadorias, em cada país. Em sua análise, ele afirma que o equilíbrio decorre da relação entre um superávit inicial, que: 1) provoca a entrada de ouro em função do excedente exportado; 2) provoca uma alta de preços; 3) provoca um aumento das importações (com a saída de ouro correspondente); e que, 4) acaba por levar a um déficit na balança na pagamentos, até que, 5) se atinja o equilíbrio entre os preços e a distribuição do ouro.45 Ricardo notou também que os países de economia mais desenvolvida (e de preços mais baixos) atraíam moedas e metais de países menos desenvolvidos.46 Ao identificar a moeda metálica com a moeda bancária (papel-moeda), ele fez várias ilações, das quais extraiu várias propostas: a criação de um sistema monetário de papel-moeda em circulação e de conversibilidade em ouro; criação de bancos nacionais; políticas de deflação; etc. 11 – A Influência da Escola Clássica As idéias econômicas clássicas tiveram extrema influência no comportamento prático das nações, seja na política fiscal, seja nas idéias monetárias e nos fatos econômicos. As idéias defendidas por Ricardo fizeram-se sentir, por exemplo, quando da promulgação do “Bullion Report”, de 1810, como no “Act” (Lei) de Peel, de 1844, que procedeu à reforma do Banco da Inglaterra. No século XIX procedeu-se à revogação, na Inglaterra, de uma série de leis protecionistas (até criando-se leis antiprotecionistas), e tomaram-se medidas a favor do câmbio livre, bem como outras medidas de forte influência clássica, principalmente ricardiana. No continente (na França), as idéias pessimistas de Malthus não encontraram eco; ao contrário, a maioria dos autores que escreviam acerca de economia tinham propensão ao otimismo. E enquanto a escola inglesa dava ênfase à propriedade rural e à renda, a escola francesa privilegiava o empreendedor e o lucro. Colocou também a indústria como o centro da produção, e a produção como o centro da economia. As idéias econômicas clássicas continuaram a influenciar a próxima geração de economistas de fins do século XIX e início do século XX.47 O economista Mac-Leod 45 Esta análise, por se basear unicamente quantidade do ouro, sem levar em consideração a quantidade de moeda, acabou por ser abandonada. Ricardo acreditava que somente o ouro bastava para fazer variar os preços. Por outro lado, ele também acreditava que a oferta da moeda bastava para regular a procura; mas, por confundir a moeda-ouro com a moeda-papel, não foi capaz de perceber que a primeira tinha função de instrumento de reserva de valor, enquanto que a segunda era apenas um título jurídico, sem valor real e nem sempre conversível ou procurada internacionalmente (modernamente, apenas as moedas “fortes” costuma ser entesouradas). 46 Atualmente, esta relação decorre da relação cambial entre as moedas dos vários países, e de sua produção industrial. Países como China e Japão, de moeda desvalorizada, mas de grande produção industrial, possuem superávits em suas balanças de pagamento em razão da proporção entre os volumes de exportação e de importação. Países deficitários serão aqueles que exportam menos e importam mais (o que provoca desequilíbrio na balança de pagamentos). 47 E continuam a influenciar até os tempos modernos. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 36 fez um amplo estudo a respeito da natureza do crédito, e do papel exercido pelos bancos, em sua criação. Ele apontou a semelhança existente entre a nota de banco e os créditos bancários utilizáveis através de cheques. Achava que se devia substituir a noção de criação de riqueza pela de criação de utilidade. Mostrou, entre outras coisas, que as dívidas e os créditos também são bens econômicos a se levarem em conta. Sendo assim, concluía-se (como ele o fez) que poderiam existir utilidades econômicas em potencial, ou futuras.48 * * * No século XX, surgiram novas tendências no pensamento do classicismo. Registra- se o aparecimento das escolas históricas, hedonista e intervencionista moderada. Deve- se às primeiras a metodologia de análise e de dedução; às segundas, a noção de utilidade, produtividade marginal e de equilíbrio econômico; às terceiras, a concepção de intervencionismo de Estado, permeado por um liberalismo moderado. 12 – Stuart Mill John Stuart Mill (1806-1873) é o filósofo da “justiça social”, e, ainda que de tendência liberal, inicialmente, voltou-se posteriormente para uma corrente de pensamento de molde socialista e intervencionista. Mill preocupou-se, e fez uma distinção radical entre os fenômenos da produção e da repartição. Para ele, os primeiros eram fixos e rígidos, e não podiam sofrer intervenção humana para modificá-los. Já os segundos, dependiam da vontade humana. Mill achava que a distribuição da riqueza podia ser submetida a regras da sociedade, e ele mesmo propôs algumas medidas de organização social, para melhor repartição desta riqueza. Ele é, a um só tempo, individualista e intervencionista; enquanto defende a expansão da pequena propriedade agrícola, por outro lado volta-se para medidas arbitrárias de restrição da prole (neste caso, mostra-se um neomalthusiano convicto). Propôs o desenvolvimento de cooperativas de produção, pois achava que isto transformaria a classe obreira em capitalista. Mas não deixa também de ansiar por uma ordem futura, baseada no comunismo, como ele a definia. Era, claramente, um reformista social, devido às suas preocupações humanitárias, mas suas idéias sofrem de freqüente contradição, quando buscava conciliar pontos de vista opostos, sobre os quais não tinha uma posição definida; nestes casos, seu pensamento se mostrava nebuloso. 49 Mas suas idéias, principalmente o conceito de dinâmica econômica(ou transformação econômica) viriam a permitir que se fizesse posteriormente, em épocas posteriores, uma distinção entre “Economia Pura” (que lançava mão do método matemático para pesquisar a relação entre os fatos econômicos) e “Economia Aplicada” (os conceitos e ferramentas teóricas utilizados pelas autoridades que podem decidir sobre os fatos econômicos). 48 Muito do atual comércio mundial se faz em compra e venda de bens futuros (é o chamado mercado de futuros). 49 A crítica moderna sobre Mill aponta o fato de que ele separou arbitrariamente dois fenômenos econômicos que são estritamente solidários e interdependentes, e que não podem ser divididos do modo como ele o fez. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 37 CAPÍTULO V A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E A TESE SOCIALISTA 13 – A Ascensão da Classe Burguesa A Revolução Industrial teve início, basicamente, na Inglaterra, nas primeira três décadas do século XVIII (teve seu auge entre 1750 e 1830). Foi uma transição de uma economia de moldes agrícolas e artesanais, para outra predominantemente urbano- industrial. O acúmulo de capital decorrente do extenso comércio com as colônias deu ensejo a um grande crescimento econômico, que por sua vez deu ensejo ao surgimento de novas técnicas de produção. Aliado ao acesso a grandes reservas de recursos naturais, tudo isto permitiu a criação de grandes fábricas equipadas com máquinas que tinham sido inventadas recentemente, graças aos progressos paralelos da ciência e das técnicas.50 Na Inglaterra, a Revolução Industrial provocou dramáticas e repentinas transformações na repartição da demografia nacional, com afluxo em massa de mão-de- obra para as cidades, a partir dos campos. O ritmo de urbanização corria a par de uma intensificação do crescimento demográfico. Se antes de 1840 havia apenas duas cidades na Inglaterra com mais de 100.000 habitantes, depois de 1910 já existiam quarenta e oito. Nos últimos trinta anos do século XIX, cerca de um terço da população rural já havia migrado para as cidades, engrossando o contigente de trabalhadores na indústria e tendo uma vida miserável. A Revolução Industrial teve uma multiplicidade de causas. A Revolução Comercial já propiciara fazer surgir novas invenções, tais como o relógio de pêndulo, o termômetro, a roda de fiar e o tear, bem como novas técnicas metalúrgicas. Progressos paralelos ocorreram em outras indústrias, tais como a vidraria, a relojoaria, a construção naval e a carpintaria. A imensa disponibilidade de capitais que surgira a partir do intenso acúmulo de metais preciosos provocou um surto de novos negociantes que buscavam incessantemente novas formas de lucrar; entretanto, com o correr do tempo havia cada vez menos atividades lucrativas. A procura intensa por produtos “industrializados” (de início, apenas manufaturados, em escala doméstica) provocou a necessidade de aumentar a produção destes produtos, o que se podia fazer unicamente adotando melhoramentos mecânicos. O crescente povoamento das novas colônias obrigava a aumentar constantemente a quantidade de produtos para exportação. A produção de ferro, que exigia inicialmente um grande consumo de carvão, ao passar a usar o coque (cujas minas estavam normalmente inundadas) levou à necessidade de encontrar bombas eficientes capazes de fazer a sucção desta água das minas; isto acabou levando à invenção da máquina a vapor, que se tornou verdadeiramente o ícone da revolução industrial em progresso. Também a necessidade premente de mecanização da 50 Foi a época das grandes máquinas a vapor, que vieram substituir extensamente o trabalho humano. Na verdade, há um paralelo possível entre a industrialização desta época, e a robotização, que é uma característica crescente das fábricas do final do século XX e início do século XXI. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 38 indústria têxtil levou ao desenvolvimento da máquina de fiar e do tear hidráulico, e não tardou a que novas máquinas fossem inventadas para os outros tipos de manufatura. A Revolução Industrial acelerou a divisão da sociedade em duas novas classes: a burguesia industrial e o proletariado. A revolução política representada pela Revolução Francesa já tinha mostrado o abismo existente entre as classes sociais, e os anseios populares de justiça e de inclusão social. A distribuição (ou repartição) da riqueza se dava principalmente entre as classes favorecidas, entre as quais a nobreza e os representantes do clero. A grande massa do povo vivia na miséria, contemplando impotentes a opulência e o luxo das outras classes. Agora, a emergência desta nova classe social (a burguesia) mostrava uma dinâmica social cuja causa só poderia estar nos fenômenos econômicos. Se o fim do feudalismo permitiu maior mobilidade social, o mercantilismo permitia por sua vez que, através do comércio, novos contigentes sociais pudessem ascender economicamente, com o conseqüente aumento de status político. Entretanto, esta ascensão social era privilégio de poucos; o novo liberalismo econômico, bem como o sistema capitalista que teve início com a Revolução Industrial, apesar de propiciarem esta ascensão social, por outro lado escancaravam novos abismos entre as classes, e já em 1848 ocorriam convulsões sociais provocadas pela situação de miséria das populações, miséria esta basicamente provocada pela exploração dos pobres pelos novos ricos. * * * A inexistência total de uma política oficial de proteção ao trabalhador permitiu aos capitalistas que exercessem uma exploração da mão-de-obra trabalhadora, que se submetia a extensas jornadas de trabalho, sem contrapartidas de salário justo, descanso ou mesmo proteção no caso de doença. As condições de vida para os trabalhadores urbanos eram terríveis, e os salários permitiam apenas um mínimo de subsistência, próximo à miséria. Por outro lado, mesmo entre os capitalistas as condições da economia eram desfavoráveis, porque a competição acirrada muita vezes trazia como conseqüência a falência ou a absorção pelos mais fortes (o que acarretava, cada vez mais, a formação de monopólios). “A experiência histórica demonstra que sempre que as sociedades precisaram obrigar parte de seus membros a apertar os cintos e a viver ao nível da subsistência, foram os de menor poder econômico e político que tiveram que arcar com os sacrifícios. Foi o que aconteceu na Inglaterra, à época da Revolução Industrial. Em 1750, a classe operária vivia em condições extremamente precárias, próximas ao nível de subsistência, e seu nível de vida (avaliado em termos do poder aquisitivo dos salários) deteriorou-se durante a segunda metade do século XVII.” (ADAM SMITH/RICARDO. Pág. 246). * * * Como vimos, o liberalismo dos clássicos decorria de uma visão de mundo no qual pensavam existir uma ordem natural. Este liberalismo batia-se pela liberdade econômica, pela livre concorrência e pelo individualismo, opondo-se a qualquer TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 39 restrição legislativa ou regulamentação estatal, somente aceitando a regulamentação do mercado. Mas contra esta concepção viria a formar-se, no início do século XIX, uma reação geral provinda principalmente dos pensadores socialistas. Em 1867, Karl Marx editou a sua obra máxima, “O Capital”, na qual fez uma extensa análise das conseqüências da adoção deste tipo de concepção econômica (o capitalismo) e suas conseqüências deletérias sobre o campesinato e sobre ooperariado. Antes, contudo, veremos o que veio antes. 14 – O Socialismo Pré-Marxista A injustiça flagrante desta nova sociedade fez com que vários filósofos e pensadores se levantassem contra ela. Os socialistas, por exemplo, que se batiam pela igualdade entre os indivíduos, 51 vieram propor formas de repartição, tanto da riqueza, quanto dos meios de produção (que podiam produzi-la). Idéias como participacionismo, apropriacionismo e coletivismo eram bastante comuns, sempre com a idéia de compartilhamento da propriedade como fundo comum. Outro ponto característico do socialismo era a restrição à propriedade; o socialismo não admitia senão um mínimo de propriedade privada. Mas também a liberdade se restringia (e com ela a livre iniciativa, característica do capitalismo). Como substituto à livre concorrência, propunha-se a planificação ou planejamento.52 Os socialistas se dividiam entre voluntaristas (que acreditavam que as medidas econômicas seriam aceitas pelos interessados) e em autoritários (que pensavam que se devia lançar mão da coerção, para obrigar a esta aceitação).53 Contra a ordem natural defendida pelos economistas clássicos, que viam a natureza como um reflexo das leis divinas, o socialismo propôs o materialismo, segundo o qual a vida orgânica seria a principal finalidade da vida humana (e que a matéria determinava a formação da consciência, por ser anterior a ela); contra o livre-arbítrio (que dava fundamento à liberdade econômica), propôs o determinismo (filosofia coerente com o ceticismo, para a qual os fatos humanos são determinados pela história ou pelas correntes sociais preponderantes). 51 A indefinição deste conceito de igualdade provocou extensas polêmicas, tanto entre socialistas quanto entre os seus críticos. Na verdade, jamais se chegou a um consenso sobre ele, e os regimes políticos que se diziam “socialistas” mostraram que sua sociedade ideal podia se mostrar extremamente desigual (foi o caso, por exemplo, da classe burocrática soviética, denominada Nomenklatura, que detinha privilégios não alcançados pela população em geral). 52 A extinção da União Soviética e a abertura política e econômica decorrente puseram a nu os excessos do planejamento oficial, que controlava de modo avassalador todos os aspectos da vida econômica. 53 O socialismo marxista sempre teve esta tendência, e os países que adotaram o socialismo tornaram-se regimes fechados, exatamente para impor suas idéias e reprimir pela força os dissidentes. O Camboja, em época bem recente, sofreu um mortícinio que eliminou mais de três milhões de pessoas, em nome do “purismo” marxista. A própria Rússia sofreu tanto nas mãos de Stálin que Khruschev se viu obrigado a denunciar o “stalinismo”, quando se tornou Primeiro Ministro. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 40 15 – O Socialismo de Karl Marx O socialismo pré-marxista era voltado a ideais de uma sociedade onde fossem abolidas as diferenças sociais, como também a propriedade privada e o princípio do lucro. Nesta época, tornou-se comum a tentativa de criar comunidades ideais, em que se voltaria ao “comunismo primitivo”. Cooperativas (ou falanstérios, como foram denominadas) eram incentivadas, mas todas as iniciativas neste sentido acabaram redundando em fracasso.54 Mesmo os socialistas mais moderados eram a favor de que o Estado se apropriasse da administração da produção e da distribuição. Marx classificava as idéias socialistas anteriores a ele “socialismo utópico”;55 ele propôs uma nova interpretação tanto das leis econômicas quanto das leis históricas, à qual deu o nome de “socialismo científico”. Para ele, os socialistas anteriores eram apenas filantropos, que se indignavam com a exploração desumana que foi uma característica do início do capitalismo. Muitos pertenciam à própria classe que abominavam, e os verdadeiros revolucionários seriam poucos. Marx tinha uma formação filosófica, e foi bastante influenciado por Hegel, um dos maiores filósofos alemães. Ele aderiu ao materialismo histórico, e usou o processo chamado de “análise dialética” de Hegel para explicar a História, os sistemas e as instituições sociais. Para Marx (e seguindo o pensamento de Hegel), a História move-se dialeticamente, devidos às forças sociais antagônicas que se criam em seu seio: a vida econômica, social e política estão em constante transformação. Marx dedicou a sua vida a tentar descobrir quais eram as forças sociais subjacentes a este processo, cujo resultado era a História. De acordo com a lógica dialética de Hegel (ou dialética dos opostos), há três elementos da realidade: a tese; a antítese; a síntese.56 Tais elementos foram apropriados por Marx para a sua explicação da História, que se dava por movimentos sociais que criavam antagonismos internos (que ele chamava de contradições); tais contradições resultavam das relações de produção e das forças produtivas materiais. Em outras palavras, Marx disse que o que movia a História era a economia. A base econômica da sociedade (modo de produção) influenciava todas as demais instituições sociais. Ele a chamou de infra-estrutura. As demais instituições (religião, sistemas políticos, leis, costumes, etc.), ele chamou de superestrutura. Assim, sobre uma infra- estrutura econômica erguia-se uma superestrutura jurídica e política. 54 Talvez uma das poucas iniciativas de vida comunal que deram certo foram as comunidades criadas em Israel, os denominados kibutzim. Kibutz é uma fazenda coletiva, que se baseia no regime de propriedade comunal e na cooperação voluntária. Tiveram início bem antes da formação do Estado de Israel (que se deu em 1948), a partir do início do século XX, em terras palestinas (à época). Os moldes pelas quais foram criados tiveram inspiração nos ideais socialistas dos imigrantes sionistas russos. 55 Entre os nomes mais famosos, representantes de várias tendências do socialismo, temos: Robert Owen; Charles Fourier; Louis Blanc; Gracchus Babeuf; Michael Bakunin; Eugen Dühring; Auguste Blanqui; Peter Kropotkin; William Godwin; Henri de Saint Simon; Pierre Proudhon; Thorstein Veblen. 56 De acordo com Hegel, a história se desenvolve assim: em um primeiro momento surge a tese, um momento da realidade que se impõe; em seguida, surge uma reação, chamada antítese. Posteriormente, surge uma conciliação entre os contrários, chamada antítese (e que se torna uma nova tese, para movimentos futuros). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 41 O modo de produção seria formado por dois elementos: as forças de produção; as relações de produção. As primeiras são constituídas por fábricas, ferramentas, equipamentos em geral; as segundas são formadas pelas relações sociais que os homens mantêm entre si. Ele destacava, entre elas, a relação de propriedade que cada classe estabelecia com os meios de produção. O modo de produção da vida material determinava o desenvolvimento da vida social, política, intelectual, etc. Após um certo estágio de desenvolvimento, as forças de produção entram em contradição com as relações de produção existentes (ou relações de propriedade). Deste choque surge uma época de revolução social, que busca transformar a base econômica, pela mudança das relações de produção. Para Marx, houve quatro sistemas econômicos (modos de produção distintos), ao longo da evolução da civilização européia: o comunismo primitivo; o escravismo; o feudalismo; o capitalismo. Cada um destes sistemas era dominado por um modo de produção,caracterizado por determinadas forças produtivas e relações de produção, com uma estrutura particular de classes. Marx vê com olhos bastante críticos a fase do capitalismo, que ele coloca como uma característica da classe “burguesa”,57 classe dominante que detinha o modo de produção e explorava economicamente a classe de trabalhadores (proletários, operários e camponeses), que se opunham dialeticamente entre si, dando ensejo a uma interminável “luta de classes”.58 Este conceito de luta de classes59 foi aproveitado por ele (juntamente com a análise dialética de Hegel) para definir a História como uma sucessão de movimentos sociais de oposição entre si, compostos por várias fases: a formação de uma classe social; o avanço desta classe em direção a novas estruturas sociais, num movimento contrário às classes já existentes, que buscam o seu status quo; revoluções sociais como forma de transformar os modos de produção em propriedade social (a síntese dialética histórica). Para Marx, o comunismo seria a última forma de sociedade, na qual o proletariado seria a última classe.60 Suprimidas todas as classes, o próprio Estado já não teria razão de existir.61 Entre a sociedade capitalista e a comunista, haveria um período de transformação revolucionária, caracterizado pelo que chamou de “ditadura do proletariado”. Como socialista autoritário, e também em razão de sua análise histórica, Marx acreditava que as classes dominantes não entregariam facilmente o poder (os 57 Que começara a surgir a partir da Revolução Francesa. 58 No Manifesto Comunista, Marx afirma que “a história de todas as sociedades até hoje existentes é a história das lutas de classes”. Curiosamente, Marx, que era contra a exploração dos trabalhadores pelos capitalistas, não tinha uma posição clara contra a escravidão negra, ainda imperante em sua época (os últimos países a aboli-la foram Cuba, em 1880, e Brasil, em 1888). 59 Já conhecido por outros autores anteriores, tais como Maquiavel, Sismondi, Thierry, Thiers, Carlyle, e muitos outros historiadores e economistas. 60 Dialeticamente, seria a síntese histórica final de todos os movimentos sociais passados, cujas teses e antíteses (ou contradições internas, como Marx as chamava) redundavam em sínteses insatisfatórias, por não trazerem o final das lutas de classes. 61 A maioria dos marxistas acreditava que esta fase estaria em um futuro muito distante. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 42 modos de produção), e que portanto deveriam ser desalojadas (pela força da revolução).62 Engels, parceiro teórico das idéias de Marx, afirmava por sua vez que o proletariado deveria se apoderar da força do Estado e começar a transformar e transferir para este os meios de produção. Somente assim ele iria se destruir como proletariado, pela abolição de todas as distinções e antagonismos de classe. E somente assim o próprio Estado poderia ser abolido. Para Engels, a classe antiga, que se move através dos antagonismos de classe, tem necessidade do Estado, pois somente através dele pode manter a sua força exploradora e sua força de opressão contra as classes trabalhadoras. 62 Lênin, a este respeito, manifestou-se assim: “Por dois motivos e em dois sentidos diferentes, a ditadura é necessária na transição do capitalismo para o socialismo. Em primeiro lugar, a vitória do proletariado é impossível sem a opressão mais absoluta exercida sobre as classes dominantes, que não querem renunciar a seus privilégios e que durante muito tempo colocarão todas as forças em movimento para derrubar o governo proletário que odeiam. Por outro lado, nenhuma grande revolução, sobretudo socialista, é possível sem guerra civil, mesmo se reina a paz com as potências estrangeiras” (CASTRO, Paulo. Pág. 155.). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 43 LEITURA COMPLEMENTAR A Teoria Econômica de Marx Marx foi um escritor extremamente prolixo, e sobre economia, suas obras são inúmeras.63 Para ele, toda mercadoria deveria satisfazer uma necessidade (deveria ter um valor de uso). Ele identificou o valor de troca da mercadoria, e afirmou que toda mercadoria acabada (produzida) tinha um valor maior do que o valor dos seus componentes. Assim, um casaco teria um valor maior do que o valor do tecido utilizado em sua confecção. Ele explicava este acréscimo de valor como resultante da quantidade de trabalho. Mas havia o trabalho médio simples, e o trabalho complexo. O primeiro varia conforme o país, enquanto que o segundo seria uma espécie de múltiplo do primeiro, com custos mais altos e de maior duração. A troca de mercadorias se daria através de um equivalente geral, o dinheiro. Este seria a medida padrão para todas as mercadorias, com “consistência objetiva e validade social universal”. Produtos diversos de trabalho são equiparados, e o valor da mercadoria, normalmente, tem o seu valor de troca determinado através do tempo de trabalho. Este valor da mercadoria não é o seu preço, mas está intrinsecamente ligado a ele (na troca de mercadorias simples, predomina o valor de uso). Por fim, preços diferentes podem representar quantidades iguais de trabalho social. Marx afirma que os meios de produção transferem valor ao produto pela perda do valor próprio, durante o processo de trabalho. A diferença excedente entre o valor total do produto e a soma dos elementos que o formam tem origem na força de trabalho humana, que expende mais esforço do que aquele necessário à própria subsistência. Quanto ao capital, uma parte se mantém constante (é o chamado capital constante), quando convertida em instrumentos de produção; já aquela convertida em força de trabalho muda de valor no processo de produção. Além do próprio valor (que ela reproduz), há um valor excedente, que Marx chama de mais-valia.64 Esta parte do capital pode ser maior ou menor; ele a chama de capital variável. Esta parte do capital (a mais-valia) torna-se objeto de litígio entre o capitalista e o trabalhador, principalmente pelo que ela representa de diferença entre o tempo de trabalho excedente e o tempo de trabalho necessário ao sustento da força de trabalho (materializada na jornada de trabalho. Marx afirma que, na história da produção capitalista, a regulamentação da jornada de trabalho é um embate incansável entre a classe capitalista e a classe trabalhadora.65 63 Dos seus vários textos, podemos citar: O Capital; Introdução à Crítica da Economia Política; Contribuição à Crítica da Economia Política; Salário, Preço e Lucro; Teorias sobre a Mais-Valia; etc. 64 O conceito de mais-valia tem sofrido extensas críticas de vários economistas. Ele não surgiu com Marx; na verdade, os fisiocratas já utilizavam um conceito semelhante quando acreditavam que somente a agricultura produzia riqueza, e portanto somente ela produzia um excedente que podia ser tributado. Muitos economistas criticam a noção de que a produção, de algum modo, possa criar um excedente de receita, que é acumulado por determinadas classes. 65 Marx previu que o conceito de mais-valia deveria sofrer revisão em uma época de automatização (como é o caso cada vez mais comum na atualidade). Para ele, o tempo de trabalho poderia deixar de ser a medida da riqueza, se a própria forma de trabalho se modificar (vide nota 130). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 44 Para Marx, o trabalhador sentia-se alienadode seu trabalho, do seu meio cultural e até de seus próprios companheiros. Alienação, no contexto em que ele emprega o termo, significava que o trabalhado era externo ao trabalhador, não lhe pertencia. O seu trabalho não era voluntário, e sim forçado; quando trabalhava, não o fazia para si, mas para outrem. Por isso, por não poder desenvolver livremente a sua energia física e espiritual, o trabalhador era infeliz, e sentia-se degradado e desumanizado. Por ter sido transformada em mercadoria a sua atividade necessária de subsistência, ele sofria uma deformação no desenvolvimento da sua personalidade. A única forma de eliminar a alienação seria fazendo a propriedade dos meios de produção mudar de mãos. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 45 CAPÍTULO VI A EXPANSÃO DO CAPITALISMO Entre 1840 e 1873 houve uma rápida expansão econômica em toda a Europa. O processo de industrialização iniciado na Inglaterra teve prosseguimento nos países do continente, que importavam os bens de capital deste país. Entre 1840 e 1860 as exportações inglesas atingiram níveis incríveis, que levaram a um tremendo progresso interno. A produção de ferro, aço e carvão aumentou consideravelmente, e extensas linhas ferroviárias foram construídas. Este período, caracterizado pela livre concorrência,66 levou também a uma grande concentração de capital, e em pouco tempo as empresas menores sucumbiram às mais poderosas, que se fundiam em cartéis e trustes monopolistas. O mercado se expandiu ainda mais, e surgiram grandes sociedades anônimas e corporações, que controlavam um grande volume de capital. Ao final do século XIX, o excesso de concorrência em um mundo dominado por estas gigantescas corporações forçou a uma maior associação entre elas, como forma a eliminar a concorrência predatória. Companhias ainda maiores começaram a surgir como resultado das concentrações e fusões, e com isto surgiram enormes monopólios e oligopólios, que controlavam instituições financeiras, bancos e grupos industriais. 16 – O Imperialismo – A Nova Face do Capitalismo O antigo colonialismo das grandes potências foi substituído pelo imperialismo, uma nova forma de dominação econômica.67 Um dos primeiros países a sofrer as conseqüências da expansão imperialista foi a Índia. Desde 1757, ano em que Bengala foi conquistada, a Companhia das Índias Orientais manteve intensas relações comerciais com a região. Nesta época, a Índia já era economicamente avançada, com métodos organizados de produção industrial. A partir da conquista de Bengala, a Companhia das Índias iniciou um longo e metódico processo de dominação e de exploração de uma grande parte do território indiano. A exploração foi brutal e gigantesca, arrancando grandes somas de dinheiro deste país.68 66 O capitalismo, como doutrina econômica, sempre pressupôs a existência de alguns princípios: o direito à propriedade individual; a livre-iniciativa; a concorrência livre; a busca do lucro. Caberia ao Estado normatizar alguns parâmetros, tais como, entre outros: o câmbio; as taxas de juros; a emissão e o controle de moedas; o exercício do fisco. Somente em épocas posteriores o Estado preocupou-se em criar uma legislação voltada à proteção do trabalhador (assistência médica, previdência, aposentadoria, etc.). O controle fiscal e financeiro da economia pelo Estado é, também, característica das modernas economias capitalistas 67 O nome imperialismo, que obteve uma conotação depreciativa graças às invectivas marxistas, na realidade tem sua origem no fato de que uma grande parte das ricas nações européias do início do século XX ainda eram estados imperiais, no sentido de que eram governados por um imperador (como era o próprio caso do Brasil). 68 Ainda que o capital das sociedades anônimas que operavam no país não ultrapassasse 36 milhões de libras, calcula-se que entre 1757 e 1815 os ingleses tenham retirado do país entre 500 e 1000 milhões de TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 46 A partir de 1857, para poder atingir e explorar o restante do território, os ingleses começaram a construir uma extensa malha ferroviária.69 O governo assegurava aos investidores ingleses um retorno mínimo de 5% para o dinheiro investido nas estradas de ferro, prometendo que, se os lucros caíssem abaixo deste limite, a diferença seria coberta por meio de impostos lançados sobre o povo indiano. Entre 1875 e 1900, Grã-Bretanha, Bélgica, França, Alemanha, Rússia e Estados Unidos incorporaram imensas áreas aos seus impérios, submetendo ao seu domínio cerca de um quarto da população mundial. No continente africano, 93% das terras estavam sob dominação estrangeira, na busca frenética de seus recursos minerais (necessários à constante expansão industrial) e agrícolas.70 A Inglaterra apoderou-se das mais ricas regiões do território africano, entrando em choque com outra potência colonialista, a Holanda. Após a Guerra dos Boeres (1899 a 1902), a Inglaterra adquiriu o controle da África do Sul, em substituição àquela (o império colonial britânico chegou a abranger uma área de 33,5 milhões de quilômetros quadrados, com cerca de 500 milhões de habitantes, um quarto do total da população mundial, à época). Também o continente asiático sofreu a invasão colonial. Em 1878 o Afeganistão foi conquistado pelos ingleses; em 1858, a França conquistou o território da Indochina.71 Os Estados Unidos, por sua vez, conquistou possessões no Pacífico, tais como as Ilhas Samoa, Pago-Pago e o Havaí. Em 1898 foram anexados Porto Rico, Guam e as Ilhas Filipinas. Em 1903, ao forçar a separação do Panamá da Colômbia, adquiriu direitos sobre a chamada “Zona do Canal do Panamá”. Mas o embate entre as potências colonialistas era constante, e viria a ter enormes conseqüências.72 As potências que emergiram vitoriosas da Primeira Guerra Mundial impuseram às derrotadas as humilhações econômicas inscritas no famoso Tratado de Versalhes, que limitava grandemente o desempenho econômico e militar destes países. A Liga das Nações, organismo criado para reunir em um foro único os países do mundo, teve vida curta, e foi inoperante enquanto existiu. Houve grandes esforços pelo desarmamento mundial, mas tais esforços esbarravam na desconfiança mútua e na indiferença, quando não na rivalidade militar patente. Aos poucos, as potências entraram em uma corrida armamentista irrefreável. No período entre guerras, além da anarquia econômica trazida pelas dívidas de guerra, pelo nacionalismo econômico e pela diminuição do comércio mundial, o espectro da depressão econômica rondava, e veio a fazer a sua aparição em 1929 (como veremos no item 16). libras (em especiarias, jóias, ouro e pedras preciosas). A corrupção interna dentro desta empresa atingiu níveis inauditos, com os funcionários lutando entre si para explorar a miséria dos nativos indianos. 69 Que viria a se tornar uma das maiores do mundo. 70 O Congo, uma das mais lucrativas possessões, fornecia diamantes, urânio, cobre, algodão e derivados do coco. 71 Atual Vietnã. Obrigada a retirar-se em 1957, a França cedeu o seu lugar aos Estados Unidos, que tinha uma política asiática de aconselhamento militar, visando rechaçar o comunismo. Aos poucos, este envolvimento transformou-se em uma guerra não declarada (em 1964), na qual os Estados Unidos chegaram a enviar cerca de um milhão de soldados para esta região. Em 1975, a tomada da capital sul- vietnamita, Saigon,pelas forças comunistas levou ao fim da guerra e à retirada americana. 72 A Primeira Guerra Mundial (1914) surgiu dos embates e oposições políticas que ocorriam constantemente entre os impérios austro-húngaro e prussiano-alemão, que disputavam a hegemonia imperialista. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 47 * * * Já no início do século XX os Estados Unidos haviam se tornado o maior país industrial do mundo, bem à frente do segundo colocado (a Alemanha). O seu parque industrial, no entanto, era dominado por um pequeno número de empresas. O ramo petrolífero, do aço, do tabaco, as ferrovias e os bancos, principalmente, estavam nas mãos de um reduzido grupo de pessoas. A concentração de renda chegou a atingir níveis alarmantes.73 Naturalmente, este estado de coisas fazia pressupor que havia algo errado com a ideologia liberal clássica ou mesmo neoclássica, que supostamente era a doutrina econômica em voga. Para esta, a economia deveria ser composta de uma infinidade de pequenas empresas. Assim, nenhuma seria capaz de exercer influência significativa sobre os preços, ou sobre o total de mercadorias que seriam vendidas no mercado. Cada decisão econômica dependeria da preferência do consumidor e da concorrência oferecida pelo mercado.74 Ao contratarem ou adquirirem fatores de produção, as empresas os utilizavam de forma a maximizar os seus lucros. Entretanto, os preços dos produtos finais e dos fatores de produção estavam fora de seu controle. 17 – Anarquistas e Sindicalistas Ao tempo em que a agitação marxista-leninista tomava conta da Europa, já existiam outros movimento paralelos que os combatiam, geralmente radicais de outras tendências. Entre 1860 e 1870, o movimento anarquista (membros da Associação Internacional dos Trabalhadores, ou Primeira Internacional)75 lutava por um ideal que se expressava por um tipo de coletivismo não submetido a qualquer controle governamental; eles se batiam pelo fim do Estado e do Capital.76 Na esteira do anarquismo surgiu outro movimento trabalhista que viria a redundar, em 1895, na criação do chamado “sindicalismo revolucionário”,77 por Fernand Pelloutier. Pela sua fórmula, o sindicato operário devia ser utilizado como instrumento da luta de classes por melhores condições de vida, entre cujas armas ele apontou a greve geral e a violência. Nos Estados Unidos, o sindicalismo floresceu entre 1905 e 1920 através da IWW (Industrial Workers of the World). Este sindicato organizava os trabalhadores por 73 Em 1929, apenas 5% da população controlava 34% das rendas. Isso, apesar de o Estado ter feito aprovar uma legislação anti-truste já desde o final do século XIX (a Lei Sherman). Outras se seguiram, tais como a Lei Clayton, e a lei que criou o Federal Trade Commission. 74 Esta concepção se devia basicamente às obras de três economistas de final do século XIX: William Stanley Jevons; Karl Menger; Léon Walras. 75 Foram, entretanto, expulsos em 1872. 76 Os anarquistas mais radicais foram os primeiros a usarem bombas para criar o terror e para matar governantes e autoridades (foi um ato terrorista anarquista executado na região dos Bálcãs que levou à deflagração da Primeira Guerra Mundial). 77 No início do século XIX, punia-se, na Inglaterra, com prisão e deportação, para a Austrália, quem procurasse criar sindicatos trabalhistas. A Revolução Industrial recente tinha provocado desemprego, pela introdução de máquinas; entre 1811 e 1818, os inconformados com esta situação chegaram mesmo a iniciar uma campanha de destruição destas máquinas, no movimento que ficou conhecido como ludita (Luddites, devido ao seu inciador, Ned Ludd). A partir de 1824, a persistência dos trabalhadores levou à revogação dos Combination Acts, que eram leis que proibiam a organização sindical. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 48 indústrias, e não por profissão. Em 1935 foi fundado o Congresso das Organizações Industriais (CIO), que viria a fundir-se futuramente (em 1955) com a Federação Americana do Trabalho, AFL, que já existia desde 1886,78 criando a AFL-CIO. Chegaram a congregar 125 sindicatos, representando 15 milhões de trabalhadores. No final do século XIX e início do século XX as lutas sindicais estiveram principalmente sob a égide do movimento anarquista internacional. Aos poucos, contudo, este movimento foi desaparecendo (muitos de seus membros foram se convertendo ao socialismo), e a condução do movimento trabalhista mundial passou a ser regido pelos vários partidos comunistas dos vários países, que seguiam a orientação central de Moscou. 18 – O Comunismo Soviético A Rússia, que desde o início da Primeira Guerra Mundial estivera em grande agitação interna, viu uma revolução acabar (em 1917) com o império czarista e alçar em seu lugar um governo que tomaria tendência socialista. Os mencheviques (que também lutavam pelo poder) deram lugar aos bolchevistas, que, com Lênin à frente, iriam adaptar as idéias de Marx para eliminar os resquícios da burguesia e do feudalismo que caracterizavam a sociedade russa. Nos anos subseqüentes, a Rússia bolchevista começou a formar um novo império ao espalhar a agitação política pelos países asiáticos vizinhos. Logo conseguiram o controle dos governos da Ucrânia, Azerbaijão, Armênia e Geórgia. A partir de 1923, este bloco de países formou a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Cada república, dominada basicamente pelo partido comunista, era formada tendo à frente um Comissariado do Povo, que respondia ao Comitê Executivo Central. A revolução bolchevista produziu profundas reformas no sistema econômico, político e social da Rússia e países satélites, abolindo quase que por completo a manufatura e o comércio privado. Foram estatizadas fábricas, minas, ferrovias e serviços de utilidade pública, bem como armazéns e cooperativas de produtores e consumidores. A agricultura também foi socializada, e foram organizadas fazendas coletivas sob base cooperativa. Até o final de 1918, a luta contra os ricos latifundiários estava concluída, tendo-se efetuado a nacionalização e a distribuição das suas terras. O monopólio estatal do comércio do trigo foi implantado, visando-se, com tal medida, evitar intermediários na distribuição deste cereal. Entretanto, vários fatores imprevistos começaram a afetar a economia soviética já em seu início. Primeiro, a excessiva politização imposta aos camponeses. Somente em 1918 já existiam 70.000 comitês políticos no campo. Era mais importante tornar-se comunista (oficialmente) do que dedicar-se à produção de grãos. Segundo: nesta época, ainda havia lutas internas contra os “Brancos”, que se opunham aos bolchevistas. Assim, o meio rural era constantemente devastado e saqueado por forças opostas. Os próprios meios de transporte, tais como estradas de ferro e vias fluviais estavam em estado de total anarquia, interrompendo a atividade comercial. Em terceiro lugar, a inflação fora 78 Antes de 1886 existia a organização sindical chamada Ordem dos Cavaleiros do Trabalho. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 49 de controle levou à completa desvalorização do dinheiro, que já não era mais aceito, e forçando a economia a regredir a um estágio de trocas.79 Por último, a excessiva ênfase dada à planificação, com a instituição de Planos Qüinqüenais priorizando a indústria pesada e a fabricação de armamentos levou a escassez de produtos e bens de consumo geral, cujoqualidade também sempre deixava a desejar. Em alguns períodos (por volta de 1925, principalmente), houve fome generalizada em virtude dos métodos ineficazes de agricultura que foram impostos. Durante a Segunda Guerra Mundial a Rússia passou por fortes privações econômicas, ao transformar todas as suas fábricas para que produzissem equipamento bélico para o Exército Vermelho, em luta contra os exércitos nazistas. O parque industrial montado na Sibéria (com forte ajuda dos norte-americanos, que eram aliados contra Hitler), seria levado após a guerra para as estepes russas, e seriam utilizadas posteriormente para manter uma produção militar de armas que seriam usadas contra alguns países europeus. No final da guerra, a pretexto de “libertar” os povos das repúblicas da Europa Oriental do jugo nazista, os russos começaram a ocupar militarmente estes países,80 impondo governos fantoches em todos. Em 1956, a tentativa de criar um governo democrático na Hungria levou a que seu território fosse invadido pelas forças militares do Pacto de Varsóvia, reprimindo brutalmente o movimento popular. Em 1967, foi a vez da Tcheco-Eslováquia, que ao tentar criar uma versão mais amena de socialismo, também foi invadida e ocupada, sofrendo forte repressão. Em ambos os casos, os líderes foram punidos ou executados. Antigos aliados, os Estados Unidos e Rússia iriam passar os próximos quarenta anos em uma corrida armamentista que teria fortes reflexos na economia mundial como um todo.81 79 De um modo ingênuo, muitos dirigentes bolchevistas acreditavam que a abolição do dinheiro estava dentro da política marxista mais ortodoxa, e nada fizeram, de início, para controlar a inflação. 80 Polônia, Hungria, Bulgária, Tcheco-Eslováquia, Alemanha Oriental, Romênia, Iugoslávia, (estes dois últimos foram os únicos países que conseguiram manter uma certa autonomia frente ao intervencionismo soviético). A Ucrânia, Bielo-Rússia, Azerbaijão e outros países asiáticos já estavam sob o domínio da União Soviética de Stálin. 81 Os negócios mundiais que movimentaram maior quantidade de dinheiro nas quatro últimas décadas do século XX foram: petróleo, armas e fretes marítimos (o comércio mundial de armas sempre esteve por trás das principais revoluções políticas em todo o mundo). Na década de 1960, os Estados Unidos gastaram cerca de vinte bilhões de dólares (em valores da época) em seu programa espacial de conquista da Lua, mas quando saíram do Vietnã em 1973, já tinham gasto cerca de dez vezes este valor, em equipamento bélico e com suas forças de ocupação. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 50 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 51 LEITURA COMPLEMENTAR Os Neoclássicos Para os neoclássicos, o consumidor distribuiria a sua renda entre as várias mercadorias que desejavam adquirir, de forma a maximizar a utilidade extraída dessas mesmas mercadorias. Estas constituíam uma fonte de prazer ou de utilidade, que eles criam que podia ser quantificada. Através de uma medida-padrão, poder-se-ia avaliar a intensidade de necessidades ou a utilidade intensiva, seja em unidades similares ou em unidades diversas, de um mesmo tipo ou de vários tipos de riqueza. Esta avaliação podia ser quantificada através do uso de fórmulas matemáticas gerais.82 Para os neoclássicos, em razão da distribuição de riqueza e rendas, quando os consumidores adquiriam mercadorias, eles estavam distribuindo a sua renda, de forma a maximizar o bem-estar de todos. Eles também tinham a firme convicção, derivada das idéias de Adam Smith, de que a mão invisível da concorrência regia o mercado, e defendiam ferrenhamente a política do laissez-faire. A interferência do governo no mercado devia se restringir ao mínimo indispensável. Em épocas posteriores, alguns economistas buscaram modificar esta teoria, por perceberem que não existia a chamada “concorrência perfeita”. Existiam vários e ponderados fatores que influíam nos preços; em certos casos, os custos de produção diferiam enormemente dos custos sociais,83 ainda que o produtor se beneficiasse com a venda da mercadoria, e tivesse bons lucros. Uma das soluções que estes economistas neoclássicos apontaram foi a admissão de uma intervenção governamental limitada. Como sistema econômico, o capitalismo, principalmente aquele praticado nos países europeus e nos Estados Unidos, evoluiu segundo as linhas teóricas da livre concorrência; na prática, a concorrência desleal e o excesso de concentração econômica levaram à falência grande parte dos participantes do mercado.84 Mas a concorrência foi feroz também em várias outras áreas da economia, que se tornaram cada vez mais concentradas. Em alguns casos, a concorrência foi tão destruidora que os próprios participantes solicitaram uma intervenção federal. Entretanto, as empresas monopolistas que sobraram buscaram fazer acordos de preços entre elas, elevando-os de forma a maximizar os lucros. O clamor público em razão do descontentamento se elevou tanto, que forçou o governo a promulgar a Lei Anti-Truste, ou Lei Sherman, em dezembro de 1889. Esta lei forçava ao desmembramento das corporações em partes menores, não sujeitas ao controle acionário dos acionistas originais. Tinha por objetivo principal evitar a formação de monopólios, na economia. Tanto a escola clássica quanto a neoclássica propuseram diversas leis para explicarem os fatos econômicos. As principais delas são: 1) a lei do interesse pessoal. Segundo esta lei, cada indivíduo tem uma tendência natural a buscar o máximo de bem- 82 Estas técnicas deram origem à economia matemática, ou econometria. 83 Na atualidade, a preocupação com o meio-ambiente levou à criação de uma legislação para proteção ecológica, que restringe ou penaliza fortemente as indústrias poluidoras. 84 Através de práticas extremamente desleais, John D. Rockefeller chegou a dominar ente 90 a 95% da produção de petróleo refinado. A maioria de seus concorrentes foi simplesmente esmagada. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 52 estar e prosperidade, com o mínimo de esforço. 2) lei da livre concorrência. Em um regime de liberdade individual, cada indivíduo é livre para escolher o que mais lhe agrade.85 3) lei da oferta e da procura. Talvez a mais famosa e mais popular, estabelece que o valor de troca de uma mercadoria varia na razão direta da procura, e na razão inversa da oferta. Já Stuart Mill tinha compreendido que esta relação não tinha um caráter matemático rigoroso; entretanto, alguns neoclássicos procuram submetê-la a uma forma matemática, representando de forma gráfica a evolução entre os dois fatores (a oferta e a procura).86 A questão da estabilidade da moeda e dos preços também foi uma fonte de perenes discussões entre os economistas clássicos e neoclássicos. O desenvolvimento das operações a crédito e os contratos a prazo levaram a se estabelecer medidas de previsão de preços mais seguras; na Inglaterra, usava-se um sistema no qual tomava-se a média de preços das mercadorias de maior consumo (no atacado), em um determinado ano, e os anos subseqüentes eram referidos a este ano base (este sistema era chamado de “números índices”).87 Quanto à moeda em si, havia a mentalidade predominante pela qual ela deveria ter um lastro de metal precioso, de ouro ou de prata, e o seu valor deveria ser tomado em relação a um deste metais.88 O montante de moeda (papel-moeda) em circulação jamais deveriaultrapassar o lastro disponível, se se quisesse manter a estabilidade da moeda e da economia como um todo. Antes da Segunda Guerra Mundial, existia uma constante drenagem de ouro (em razão dos sistemas de comércio mundial): ora esta se fazia para a Inglaterra, ora para os Estados Unidos,89 ora para a França. Até mesmo quando em 1931 a Inglaterra abandonou o padrão ouro, houve uma grande afluência deste metal para os seus depósitos. Alguns economistas temiam que este excesso de ouro pudesse provocar uma alta excessiva de preços, levando a uma especulação exagerada e a um estado de otimismo infundado. Na verdade, foi o que aconteceu em outubro de 1929, com a quebra da Bolsa de Nova Iorque, que levou os Estados Unidos, e todo o mundo junto, à Grande Depressão. 85 Este princípio aplica-se a todos os aspectos práticos da vida diária, como a procura do melhor trabalho ou o estabelecimento da livre concorrência. Insurge-se contra o intervencionismo de Estado e contra todas as medidas de tutela e de proteção por parte do governo. 86 Outros conceitos também foram desenvolvidos ou melhor teorizados, tais como as noções de riqueza, utilidade, necessidade, valor; renda; moeda; crédito; circulação; consumo. Estes e outros conceitos formam o substrato teórico da moderna teoria econômica. 87 Entre 1845 e 1850 tomaram-se os preços de 45 mercadorias (depois reduzidas a 22). 88 Modernamente, usa-se o chamado deflator implícito, que é um método matemático para calcular o valor real da moeda. Esta medida costuma ser o mais preciso indicador da inflação, em um período determinado (o ano-base tomado para essas medidas, no Brasil, é 1949). 89 Em 1937, os estoques de ouro do Tesouro americano representavam a metade dos estoques mundiais. Isto se devia à pujança do parque industrial dos Estados Unidos, que fornecia mercadorias para o mundo todo. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 53 CAPÍTULO VII A CRISE DO CAPITALISMO 19 – A Grande Depressão A Grande Depressão econômica surgida a partir de 192990 podia fazer supor o fim do capitalismo.91 Esta crise econômica afetou todo o mundo, pondo fim à crescente pujança econômica característica dos anos 1920 e 1930.92 Nenhum país escapou desta crise, e o comércio mundial caiu enormemente.93 Internamente, o desemprego em massa, as falências sucessivas e as perdas de fortuna da noite para o dia trouxeram uma dramática mudança de cenário na vida econômica.94 Não existe uma razão ou motivo único que tenha causado esta crise. Uma série de fatores foi se acumulando e criando o cenário para que ela acontecesse. Em 1929, havia pouco conhecimento econômico teórico sobre mercados de capitais, e sobre a necessidade de regulação governamental sobre este mercado. A euforia da expansão econômica na década de 192095 deixou mais ousadas as pessoas, que arriscavam suas economias em quaisquer papéis que prometessem um enriquecimento rápido. O consumo em massa veio acompanhar este cenário de fartura, através do crédito fácil e rápido. Entretanto, quando em 24 de outubro de 1929 o valor dos títulos negociados na Bolsa de Nova Iorque iniciou uma trajetória descendente, isto veio abalar a confiança nos negócios, e o otimismo foi substituído rapidamente pelo pessimismo. Os 90 A Grande Depressão americana não foi nem de longe semelhante à crise econômica ocorrida na Alemanha na década de 1920. Enquanto que nesta a inflação atingiu níveis estratosféricos, numa rápida deterioração da moeda, a depressão nos Estados Unidos provocou uma deflação, ou queda de preços, que solapou a indústria e a agricultura. Em certos momentos, apesar de os juros estarem praticamente a níveis nominais, quem possuía alguma poupança não desejava consumir, o que fazia retrair ainda mais a economia. 91 Uma das manias mais freqüentes de Marx era a de prever a derrocada do sistema capitalista (ele afirmava constantemente que “a economia capitalista contém em si o germe de sua própria destruição”). A crise de 1929 não foi a primeira das crises do capitalismo (houve crises em 1825, 1836, 1847, 1857 e 1866), mas talvez tenha sido a mais importante, pelas suas conseqüências políticas e sociais (deve-se a ela o surgimento dos regimes fascistas da década de 1930). Em 1937, uma nova crise foi chamada de recessão. 92 O sistema capitalista nos Estados Unidos, em razão de sua extensa base industrial, permitiu o progressivo crescimento do poder aquisitivo dos operários da indústria. O advento das linhas de montagem, com o aumento explosivo da produção em massa, trouxe a necessidade de aumentar os salários, para que os produtos pudessem ser consumidos (foi o caso, por exemplo, da indústria automobilística; Henry Ford aumentou os salários de seus trabalhadores para que estes pudessem comprar os carros que fabricavam). 93 Entre 1929 e 1932 o comércio exterior dos Estados Unidos caiu em mais de dois terços. 94 Era comum encontrar pessoas bem vestidas (ricos que tinham perdido tudo) nas filas de instituições caritativas, à espera de uma sopa. 95 De 1914 a 1929, o produto nacional bruto americano (índice que avalia todos os bens e serviços produzidos no país) crescera 62%. Em 1929, o desemprego estava em 3,2% da população ativa, e o número de veículos vendidos já atingira a cifra recorde de 26 milhões de unidades. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 54 empresários começaram a fazer cortes na produção e nos investimentos, o que por sua vez acarretou novo declínio da renda nacional e do nível de emprego. A corrida aos bancos, por sua vez, provocou uma “quebra” generalizada no sistema financeiro e bancário. De 1929 a 1932, o cenário econômico americano virou um verdadeiro pandemônio; 85.000 empresas foram à falência e mais de 5.000 bancos fecharam, levando ao desemprego cerca de 12 milhões de pessoas. A renda agrícola reduziu-se a menos da metade, e o produto industrial reduziu-se em cerca de 50%. A crise atingiu indistintamente ricos e pobres; enquanto que muitos dos primeiros foram levados ao suicídio pelo desespero de terem perdido suas fortunas, não coube outra solução aos últimos senão conformar-se com a própria miséria. As minoria raciais sofreram ainda mais, sendo mais intenso o desemprego entre elas. A cadeia de inadimplência estendeu- se por todos os segmentos econômicos e afetou um grande contingente de pessoas, e o espectro da fome levou à necessidade de que entidades assistenciais providenciassem uma ajuda humanitária em massa. A pior parte deste cenário é que ele não tinha solução pela economia ortodoxa, representada pelos economistas clássicos e neoclássicos. Nos Estados Unidos, esta ortodoxia, que aceitava em todos os seus termos a famosa Lei de Say (vide nota 38), queria que o governo se mantivesse ao largo dessa crise, esperando que ela desaparecesse por si só.96 O governo de Herbert Hoover caracterizou-se pela inércia, pois amparava a sua política econômica nos conceitos ortodoxos do esquema clássico, e com isso nada fez para intervir na economia. Foi somente com a posse de Franklin Roosevelt que novos conceitos econômicos vieram a ser adotados no combate à depressão; tais conceitos surgiram basicamente a partir dos estudos econômicos de John Maynard Keynes. * * * Já em 1932, alguns economistas à margem da ortodoxia tinham alertado para alguns fatos pouco levados em consideração. Rex Tugwell e Adolf Berle, em um estudo que realizaram abordando a administração e o controle da empresa moderna, tinham96 Até esta época, não existiam estudo consistentes sobre ciclos econômicos, matéria considerada excessivamente “esotérica”, para ser estudada seriamente nos centros acadêmicos. Apenas o economista Wesley C. Mitchell (1874-1948) chegou a realizar um estudo sobre o assunto (Marx acreditava que o capitalismo estava sujeito a crises cíclicas, cuja causa, ele acreditava, decorreria basicamente da introdução de maquinaria pelos capitalistas, propensos a compensar qualquer diminuição de seus lucros). Atualmente, aceita-se a realidade dos ciclos econômicos. Um ciclo econômico é definido como a sucessão de períodos de auge e depressão sofridos pelo sistema econômico. Entende-se por depressão um período de baixa de preços, escassez de negócios e desemprego generalizado. O auge se caracteriza por alta de preços, grande produção, grande consumo, pequeno ou nenhum desemprego. Não há uma explicação plausível para a existência destes ciclos, mas há várias teorias que tentam fazer isso. Algumas delas referem-se a ciclos climáticos; outras, a diferenças entre a demanda de bens de capital (que é indireta) e bens de consumo (que é direta). Outras ainda apelam à flutuação periódica dos preços, suscetíveis de variar em função de vários fatores: inovações tecnológicas; mudanças políticas; erros na política fiscal; políticas recessivas propositais; gastos governamentais excessivos; desequilíbrios cambiais; desequilíbrios da balança de pagamentos; desequilíbrios do mercado resultante de fatores exógenos (por exemplo, se o mercado interno não for protegido, o excesso de importações de mercadorias mais baratas pode destruí-lo). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 55 percebido que, na maioria das grandes empresas americanas (da época), os acionistas já não exerciam qualquer função prática e significativa. Isto significava que quem realmente tomava as decisões eram os administradores (que não eram proprietários das empresas que administravam), e que respondiam unicamente a uma diretoria (conselho diretor) que eles próprios escolhiam.97 Isto conduzia naturalmente ao oligopólio, mais do que à livre concorrência. Este estudo foi ignorado pelos economistas da época, pelo seu conteúdo heterodoxo. A crença predominante na Lei de Say e nas teorias clássicas, juntamente com a ausência de estudos ou teorias a respeito de crises econômicas fazia acreditar que a crise realmente terminaria por si própria. De acordo com a ortodoxia clássica, a economia iria encontrar o seu equilíbrio no pleno emprego, do qual viria o fluxo de demanda capaz de sustentá-lo. Keynes refutou esta crença, quando afirmou que a economia moderna não encontra o seu equilíbrio, necessariamente, no pleno emprego. Ela pode também encontrar este equilíbrio no desemprego. Mas Keynes tinha outras afirmações revolucionárias. Além de mostrar o equilíbrio do desemprego, a teoria keynesiana apelava a que o governo empreendesse gastos sem ter as receitas necessárias para cobri- los, a fim de manter o nível de demanda. 20 – A Economia do Pós-Guerra No cenário do pós-guerra, após 1946, as economias européias estavam completamente destruídas.98 A Inglaterra, em razão do esforço de guerra, estava praticamente falida, e os Estados Unidos emergiu deste período como a principal potência econômica do mundo. O fato da antiga aliada, a União Soviética, ter se expandido politicamente pela Europa oriental, na esteira do Exército Vermelho, que vinha ocupando sistematicamente os países a propósito de “libertá-los” do jugo nazista, alertou os americanos para a necessidade de uma reconstrução econômica da Europa e do Japão.99 97 Posteriormente, os gerentes receberam um respaldo oficial dos empresários. Em 1956, por iniciativa da Universidade de Colúmbia, promoveu-se um ciclo de conferências no qual se abordava em profundidade a ideologia gerencial. Os empresários, em geral, viam o gerente como um “profissional”, que se preocupava “com os consumidores, os empregados, os acionistas, os fornecedores, as instituições educacionais, as instituições de caridade, o governo e o público em geral, tanto quanto com as vendas e com os lucros”. (HUNT & SHERMAN, pág. 188). 98 Também os países da América Latina, Oriente Médio e Extremo Oriente tiveram as suas economias arrasadas em virtude da guerra. Nem todos, entretanto, chegaram a receber a ajuda americana para a sua reconstrução. A ameaça comunista tornou prioritária a ajuda a aliados (Inglaterra e França, principalmente), mas também a ex-inimigos (Alemanha, Itália e Japão). 99 Durante a guerra (a Segunda Guerra Mundial), os Estados Unidos foram os grandes fornecedores de material bélico para os países que lutavam contra o Eixo (formado pela aliança entre Alemanha, Japão e Itália). O ataque japonês a Pearl Harbor levou os Estados Unidos a entrarem na guerra, e a invasão, por Hitler, da Rússia (tomando completamente de surpresa Stálin, que não acreditava nesta possibilidade), colocou esta última entre os chamados “Aliados”. As perdas em equipamento militar da Inglaterra, Rússia e China foram repostas maciçamente graças à enorme produção industrial americana (que Roosevelt chamava de “o Arsenal de Democracia”), que desviou todo o seu parque industrial para a produção de armas. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 56 Para reerguer estas economias, os Estados Unidos criaram um plano econômico chamado de “Plano Marshall”100 Este plano de auxílio econômico destinava cerca de 22 bilhões de dólares (entre 200 a 250 bilhões de dólares, a preços atuais) para a reconstrução econômica e política dos países europeus. A recém formada Organização das Nações Unidas (ONU), criada em 1945, tornou-se o fórum de debates econômicos; a chamada “Carta de Havana” (com todas as suas deficiências e cláusulas duvidosas) tornou-se, na prática, o código de comércio internacional para o pós-guerra. A partir de 1945, novos organismos internacionais entraram em cena, visando regulamentar o comércio mundial. Em 1947 criou-se o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), um tratado sobre comércio internacional. Este órgão criou e regulamentou as regras a serem seguidas neste comércio entre nações, estipulando, entre outras coisas, cotas de importação e exportação e os limites a serem seguidos na proteção tarifária aos produtos internos.101 Em 1954 foi criada a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), instituição destinada a estimular o comércio internacional. No bloco soviético, foi criado o Conselho de Mútua Assistência Econômica (COMECON), órgão que centralizava o comércio e os planos de desenvolvimento econômico. O COMECON, contrariando sua feição marxista, adotou critérios da economia clássica, atribuindo funções especializadas a cada economia do leste europeu.102 O Plano Marshall cumpriu o seu intento, e a economia européia (e por extensão, o comércio mundial) se expandiu, atingindo níveis de prosperidade cada vez maiores. O Japão, que emergira da Segunda Guerra Mundial totalmente aniquilado economicamente, sofreu ocupação militar por parte dos Estados Unidos. O general Douglas MacArthur, responsável pela ocupação, procedeu à implantação de reformas econômicas no país, extinguindo o sistema feudal que ainda prevalecia. Esta reforma se deu basicamente através de uma reforma agrária que distribuiu terras entre colonos, mas também através da criação dos primeiros sindicatos japoneses, e da introdução do sistema de governo democrático (escolha de representantes através do voto). Mas a figura do imperador não foi tocada, mantendo-se como símbolo de uniãodo povo japonês. 100 George Catlett Marshall foi chefe do Estado-Maior do exército americano entre 1939 e 1945. Era altamente respeitado, tanto como militar quanto estadista. Como Secretário de Estado do governo Truman, deu início ao Programa de Recuperação Européia, também chamado Plano Marshall. Participou da criação da Organização do Tratado Militar do Atlântico Norte (OTAN), uma aliança militar ocidental criada em oposição ao Pacto de Varsóvia. 101 Estes pactos comerciais nem sempre ajudavam aos participantes, principalmente os de economia menos desenvolvida. O Brasil, que tem uma participação mínima no comércio internacional (menos de 3% do total), ainda assim sofre constantemente a retaliação por parte dos Estados Unidos, que o acusam de dumping (exportação de mercadorias com preços artificialmente baixos). Por outro lado, este país do norte, além de abusar da proteção alfandegária, recusa-se a admitir que o Brasil crie barreiras alfandegárias contra os seus produtos. 102 Na única, o único país que resistiu a esta tentativa de desenvolvimento segmentado foi a Romênia. Resistindo às pressões soviéticas, optou pelo que chamou de desenvolvimento multilateral, ou industrialização completa. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 57 LEITURA COMPLEMENTAR A Teoria Keynesiana Em 1936 Keynes publicou um livro chamado “Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda”. Esta obra é considerada como um marco na evolução da ciência econômica, e determinou uma virada conceitual profunda e abrangente nas doutrinas econômicas em geral. Keynes contrapõe a sua teoria à teoria clássica, da qual aponta várias contradições. Aponta principalmente a ausência de hipóteses ou teorias sobre a moeda; a desconsideração do desemprego; o tratamento fragmentário da realidade econômica. Contra a crença dos clássicos, a de que o mercado em geral (de trabalho, de capital e de mercadorias) funciona através da lei da oferta e da procura, ele apresenta novos princípios sistematizadores. Para ele, cabe à procura o papel de agente motor de todo o sistema econômico. O emprego varia no mesmo sentido que o rendimento global (que gera a procura global). Afirma que este rendimento pode ser empregado de três modos: entesourado; investido; consumido. Quanto à procura efetiva, depende de três fatores psicológicos e independentes entre si: a preferência pela liquidez; o estímulo para investir; a propensão a consumir. A primeira se traduz pela preferência pelo dinheiro líquido (papel-moeda ou títulos de crédito a vista); tal se dá porque, como a moeda é uma reserva de valor, as pessoas tendem a conservar as suas economias para o fim de transação (trocas comerciais), por precaução ou para especulação. Através da taxa de juros, a moeda transforma-se em um elemento ativo capaz de modificar as condições de equilíbrio econômico. O juro representa a renúncia à liquidez, e a sua taxa representa a diferença entre o volume de moeda em circulação e a sua procura para entesouramento. Para Keynes, é necessária a intervenção do governo na economia, porque nem sempre funcionam os mecanismos auto-reguladores previstos pela economia clássica; situações de desemprego podem prolongar-se no tempo, enfraquecendo a economia. Por outro lado, esta intervenção, feita através de uma política fiscal e monetária adequada, não deve induzir a um entesouramento estéril, e sim estimular despesas (consumo e investimento) capazes de aumentar o emprego. A política tributária deve tornar-se um elemento ativo na distribuição dos rendimentos, bem como na orientação geral da política econômica. A expansão do crédito deve basear-se na redução da taxa de juros (tornando “barato” o dinheiro); na verdade, a política de juros constitui o fulcro do sistema de Keynes. Além de incentivar o mercado livre, o governo deve estimular os investimentos; Keynes recomenda uma política de grandes obras públicas. Também recomenda uma balança econômica favorável.103 103 As idéias de Keynes, apresentadas na Conferência de Bretton-Woods, em 1944 (que iria definir o futuro econômico do pós-guerra) serviram de base à criação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento Econômico (BIRD – mais conhecido como Banco Mundial). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 58 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 59 CAPÍTULO VIII A NOVA REALIDADE ECONÔMICA O Japão, apesar de se submeter à ocupação militar, não se submeteu a uma ocupação econômica. Ainda que totalmente devastado, o parque industrial japonês continuou sob controle nacional, e o gênio e a capacidade de trabalho deste povo logo deu início à sua recuperação. Programas econômicos governamentais em paralelo com a ajuda externa propiciaram a recuperação econômica, e já na década de 1960 o Japão era um dos países de mais rápido crescimento da economia, em todo o mundo, com um crescimento bastante veloz da renda nacional.104 Uma florescente indústria automobilística e eletrônica logo colocou de novo o país como um dos maiores exportadores do mundo.105 A formação de uma comunidade econômica européia na década de 1960 evoluiu para a formação de um bloco político e econômico, a União Européia, com uma moeda única (o Euro)106 e que caminha para um governo unificado (o Parlamento Europeu ainda não tem total autonomia sobre todos os assuntos dos países membros).107 A Alemanha, apesar de ter gasto uma soma fabulosa em sua reunificação, não tem dado mostras de esgotamento econômico. 104 Apesar de uma recessão quase endêmica que o assolou, a economia do Japão ainda é a segunda do mundo, com uma produção nacional de cerca de 10 trilhões de dólares por ano. A renda per capita japonesa, atualmente, é uma das maiores do mundo. 105 O comércio do Japão com o resto do mundo, extremamente favorável para a sua balança de pagamentos (constantemente superavitário), tem permitido a que este país acumule uma grande quantidade de moedas fortes (as reservas monetárias). Este fenômeno, ainda que aparentemente benéfico, talvez explique a paralisia econômica que assolou o país. Com um excesso de poupança, os consumidores, ainda que com dinheiro nas mãos, recusavam-se (tal como na época da Grande Depressão americana) a consumir, agravando o problema e causando desemprego crescente (o Japão sempre se orgulhou de seus níveis de emprego, pois é – ou era – uma característica, da maioria das empresas japonesas, a de jamais demitir). 106 A União Européia é formada por vinte e sete países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária. Chipre, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos (Holanda), Polônia, Portugal, Reino Unido, República, Romênia e Suécia Inicialmente, doze países se uniram economicamente (Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Irlanda, Itália, Luxemburgo e Portugal), com a condução da economia sendo feita por um banco central europeu. Macedônia, Croácia e Turquia caminham para esta integração econômica. Os tratados que definem a União Européia são: Tratado da Comunidade Econômica Européia (CEE); Tratado da Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA); Tratado da Comunidade Européia da Energia Atômica (EURATOM); Tratado da União Européia (UE),o Tratado de Maastricht, que estabeleceu os fundamentos da futura integração política. Neste último tratado, fizeram-se acordos mútuos de segurança e política exterior, bem como a confirmação de um Constituição Política para a União Européia. A integração monetária foi realizada através de uma moeda única, o Euro. 107 A produção de riqueza deste bloco europeu é calculada em cerca de mais de 10 trilhões de dólares por ano. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 60 No continente americano, os projetos de unificação comercial (ALCA e Nafta) esbarram na exagerada desproporção econômica dos países centro e sul-americanos frente ao gigante do norte. Problemas políticos e econômicos sempre foram a regra no chamado Cone Sul, e o crescimento econômico sempre foi descontínuo (o México, ainda que tenha passado recentemente por graves problemas, apresenta atualmente uma economia em franco progresso). As décadas de 1980 e 1990 foram marcadas pelo início do processo de regionalização das relações comerciais mundiais. Este processo, contudo, apenas continuava aquele processo iniciado a partir da década de 1950, quando se iniciou o processo de integração econômica européia. Em 1957, com a assinatura do Tratado de Roma, foi criada a CEE – Comunidade Econômica Européia (ou Mercado Comum Europeu – MCE), na esteira do Plano Marshall, inicialmente com os seguintes países: Alemanha Ocidental, França, Itália, Holanda, Bélgica e Luxemburgo. Em 1973, incorporaram-se à organização a Irlanda, Inglaterra e Dinamarca, que antes participavam da Associação Européia de Livre Comércio. Em 1967, surgiu a Asean, ou Associação das Nações do Sudeste, que atualmente compreende a Indonésia, Filipinas, Malásia, Tailândia, Singapura, Brunei, Vietnã, Mianmar (antigo Ceilão), Laos e Camboja. Em 1969, surgiu o Pacto Andino, ou Comunidade dos Países Andinos, que compreende os seguintes países: Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia. Em 1973, foi formado o Mercado Comum e Comunidade do Caribe (Caricom), integrado por Suriname, Guiana, Honduras, Belize e as Ilhas do Caribe. Em 1988, surgiu o Nafta, reunindo Estados Unidos da América, Canadá e México. Em 1989 veio a Apec, ou Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico, composta por Austrália, Brunei, Canadá, Indonésia, Japão, Malásia, Nova Zelândia, Filipinas, Singapura, Coréia do Sul, Tailândia, Estados Unidos, China, Hong Kong, Formosa (Taiwan), México, Papua, Nova Guiné, Chile, Peru, Federação Russa e Vietnã. A CEE, ou Comunidade dos Estados Independentes, foi criada em 1991, tendo como participantes a Armênia, Belarus (Bielo-Rússia), Cazaquistão, Federação Russa, Moldávia, Quirguistão, Tadjiquistão, Turcomenistão, Uzbequistão, Ucrânia, Geórgia e Azerbaijão. Em 1991 criou-se o Mercosul, ou Mercado Comum do Cone Sul, formado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Em 1992, surgiu a Comunidade da África Meridional para o Desenvolvimento (SADC), integrado por Angola, África do Sul, Botswana, Lesopo, Malauí, Ilhas Maurício, Moçambique, Namíbia, República Democrática do Congo, Ilhas Seicheles, Suazilândia, Tanzânia, Zâmbia, Zimbábue. Este processo de regionalização econômica marcou o modo como se tem se desenvolvido a economia mundial, nas últimas décadas. O Mercado Comum Europeu evoluiu para a integração política do continente europeu (a União Européia), unificando moedas e abrindo fronteiras internas. Ainda hoje estão em processo embrionário de formação outras comunidades; o grande debate hoje em dia, no Brasil, é decidir se o país fará parte da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas), que irá integrar todo o continente americano (com a exceção prevista de Cuba) em um único bloco econômico. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 61 21 – Capitalismo versus Comunismo A constante expansão econômica que se deu no período do após guerra veio desmentir em toda a linha as críticas que sempre se fizera contra o sistema capitalista. No confronto econômico entre os blocos dos países capitalistas e dos países ditos socialistas, a realidade acabou por mostrar a diferença crônica entre os dois sistemas. A derrocada do socialismo e o fim da União Soviética se deu exatamente por motivos econômicos. O planejamento econômico centralizado sucumbiu ante a pujança da economia baseada na propriedade individual e na livre concorrência.108 A economia soviética não pôde suportar os sucessivos aumentos de gastos militares, e acabou ruindo. Mesmo um país como a China, que se declara politicamente marxista, aderiu completamente ao sistema econômico capitalista, admitindo a propriedade privada e a livre iniciativa. A preocupação com o bem-estar do trabalhador, ainda que nebulosamente fizesse parte das considerações teóricas de Karl Marx em sua revolta furibunda contra o capitalismo de sua época,109 realmente jamais fez parte da sua ou das demais preocupações dos marxistas. Assim, quando Lênin subiu ao poder na Rússia, ele estava mais preocupado em fortalecer o Estado contra os inimigos internos ou externos; jamais houve nenhuma iniciativa no sentido de criar uma legislação trabalhista adequada, por exemplo. Qualquer sinal de comportamento “anti-revolucionário” (que incluía a busca do conforto ou da prosperidade pessoal) era severamente punido. 110 Não se pode citar uma só conquista trabalhista que se tenha dado em função da pretensa “proteção” socialista ao trabalhador, constantemente apregoada pelo regime. Na verdade, a regra sempre foi a repressão a qualquer anseio de melhoria, qualquer que fosse ele.111 Durante o período stalinista, faltar ou chegar atrasado ao trabalho era 108 Os países socialistas sempre se caracterizaram por uma agricultura extremamente pobre, incapaz de produzir para as próprias necessidades. Desde os tempos de Stálin, a Rússia sempre foi um grande importador de grãos e cereais do ocidente, por não poder produzi-los em quantidade suficiente. Em 1958, na sessão plenária do Comitê Central, foi lida a seguinte declaração de Khruschev: “o principal objetivo da União Soviética consiste em desenvolver, por todos os meios, o caráter mercantil da economia agrícola, o progresso de relações mercantis, conduzindo à abundância de produtos agrícolas para o mercado (...)”. Isto ocorreu depois de 41 anos de sucessivas planificações econômicas. Apesar da retórica marxista, os sucessivos planos econômicos sempre redundaram em fracasso. O sucesso conseguido na indústria militar e espacial, por sua vez, se deu à custa de um limitado atendimento às necessidades do mercado interno (produzia-se “mais canhões, e menos manteiga”). 109 Revolta esta que se justificava, tendo em vista unicamente a perspectiva histórica que a criou. Mas Marx jamais foi capaz de aceitar que o capitalismo seria capaz de propiciar um bem-estar aos trabalhadores, como realmente acabou acontecendo. Ele não poderia prever que os novos acionistas das grandes corporações seriam exatamente os trabalhadores, cuja riqueza cresceria na proporção do crescimento da empresa (pela distribuição dos dividendos dos lucros acionários). 110 Que se faz normalmente pela elevação do poder aquisitivo. Isto pressupõe a existência de outros fatores, como pleno (ou quase pleno) emprego, bons salários, boa educação, sistemas adequados de previdência e de aposentadoria, etc. 111 Nos pretensos “paraísos” socialistas, era considerado como dissidência política achar que o sistema era menos que perfeito, e o infrator era geralmente punido com o exílio para a Sibéria. A falsificação dos fatos históricos tomou tais rumos na União Soviética, que asua historiografia, mesmo nos dias de hoje em que se tem acesso aos arquivos oficiais, já não é mais possível distinguir entre a falsificação e a verdade. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 62 considerado falta gravíssima, punida com o exílio na Sibéria. Além disso, o Estado soviético não tinha nenhum respeito pelo trabalhador. Em vários momentos, cogitou-se da substituição do salário por bens “úteis”. “Na Rússia, o Estado combina as formas mais evoluídas de controle e dominação burocrática com o que de mais baixo e atrasado existe no que se refere ao desenvolvimento econômico. Daí a consideração da personalidade humana como mero índice de produção, podendo a burocracia dirigente dispor como bem quiser do homem, transferindo-o do Kirkiz à Sibéria ou de Vladivostok a Moscou”. (TRAGTENBERG, Maurício. Pág. 112). A situação do trabalhador soviético só começou a melhorar com a ascensão de Khruschev ao poder, após a morte de Stálin.112 E no entanto, este estado de coisas apenas representava a paranóia que tomava conta dos dirigentes, sempre vendo a ameaça capitalista em tudo. Lênin, assim que tomou o poder na Rússia, procedeu a um verdadeiro expurgo nas próprias fileiras marxistas, exterminando antigos companheiros a pretexto de seu (deles) vezo burguês.113 * * * O sistema capitalista, por sua vez, após ter passado pela fase “selvagem” (que foi a que Marx conheceu), começou gradativamente a mudar. Não foi uma mudança rápida; entretanto, já em 1880 o cenário social alemão viu surgir uma nova mentalidade, que viria a se traduzir no moderno Estado do Bem-Estar. O chanceler Bismarck, temeroso que a ordem do Estado fosse afetada por revoluções sociais,114 começou a exortar para que se atenuasse a face mais cruel do capitalismo. Seu poder de convencimento levou o Reichstag alemão a aprovar, em 1884 e 1887, leis que, ainda que de forma rudimentar, viriam a prover aos trabalhadores proteção e assistência nos casos de doença, acidentes, incapacidade, bem como ampará-los na velhice. Medidas similares foram adotadas na Áustria, na Hungria e no resto da Europa. Na Inglaterra, por volta do final do século A historiografia “oficial” mudou tantas vezes (naquele estilo descrito no romance de George Orwell, 1984), que é quase impossível encontrar documentos idôneos nos arquivos russos. 112 Não se pode afirmar, contudo, que o socialismo tenha morrido (exceto o socialismo “marxista”). Antes de Marx já existiam outros socialistas (que foram menosprezados por ele), cujas teorias sociais ainda continuam válidas, em sua maioria (não é o caso da prática social, que na maioria dos casos redundou em fracasso). 113 Também Stálin procedeu a grandes expurgos entre as suas próprias fileiras: “As primeiras vítimas da repressão stalinista foram todas as organizações populares de caráter esquerdista que não se dobraram ante os fundadores das ‘democracias populares’ ”. Citação extraída de: Planificação – Desafio do Século XX, por Maurício Tragtenberg. Pág. 128. 114 Em vista das agitações promovidas pelas internacionais socialistas, dominadas por Marx e seus seguidores. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 63 XIX e início do século XX, homens e mulheres115 socialmente engajados, bem como os sindicatos (que já eram poderosos e bem organizados), fizeram aprovar leis (em 1911) que instituíam proteção contra doença e invalidez, e mais tarde, contra o desemprego (o seguro-desemprego). Para sustentar todas estas medidas, novos impostos foram criados, que agora alcançavam uma classe que jamais os pagara: os ricos.116 Quando o presidente Roosevelt subiu ao poder em 1933, e tendo como tarefa vencer a Grande Depressão, ele tomou medidas econômicas117 visando combater o marasmo econômico e a queda de produção e de renda nacional. Apesar de que tenha ocorrido outra crise (uma recessão) em 1937, suas medidas118 levaram pouco a pouco o país a recuperar-se, e lançaram as bases da prosperidade que se seguiria à Segunda Guerra Mundial. 22 – A Nova Revolução Industrial Com a derrocada do sistema socialista da União Soviética, e com o predomínio da mentalidade capitalista, o mundo entrou em uma nova era econômica. Se antes se dividia em pólos opostos pela ideologia, agora o mundo se divide em áreas econômicas de influência. A civilização atual, seja ela formada nos moldes capitalista ou provinda dos escombros do socialismo, caracteriza-se por uma forte tendência ao consumismo. “A Revolução Industrial elevou a produtividade do trabalho a níveis sem precedentes na história do homem. A multiplicação das fábricas e a ampla utilização de máquinas constituíram a base mecânica dos ganhos de 115 Que já se batiam pelos seus próprios direitos (eram as chamadas sufragistas, que defendiam o direito de voto da mulher, proibida de manifestar seu direito de escolha política). 116 A legislação social aprovada sofreu forte oposição das classes mais privilegiadas, que se opunham a ser taxados. Conflitos políticos e tumultos criaram uma crise sem precedentes, e em 1910, a Câmara dos Lordes somente aprovou a lei a contragosto. A instituição destes impostos não tinha uma sustentação teórica de fundo clássico; na verdade, a ortodoxia clássica se opunha à redistribuição de renda, porque acreditava que a utilidade marginal do dinheiro para o indivíduo que o adquire não diminui (sua satisfação não é reduzida com cada unidade adicional). Afirmava também que não era possível comparar utilidades interpessoais (não se podia dizer que alguém com mais bens obtinha menor satisfação dos incrementos do que alguém com menos bens). Assim, não havia uma justificativa econômica para a transferência de renda de ricos para pobres. Em 1920 o economista Arthur Pigou demonstrou que desde que a produção global não diminuísse devido às medidas tomadas, o bem estar econômico aumentava, com a transferência de recursos de ricos para pobres. Mas a adoção de uma legislação que assegure proteção aos pobres, seguro-desemprego e pensões de aposentadoria continua sendo condenada por economistas aferrados às concepções clássicas (por exemplo: Ludwig von Mises e Friedrich Hayek). Para eles, a única coisa que se conseguiria com isto seria a destruição do capitalismo. Ainda que radicais, suas idéias são válidas até um certo ponto. Os países escandinavos, por exemplo, foram obrigados a limitar a sua política pública social devido ao esgotamento atingido (crescentes benefícios sociais que já não podiam ser cobertos por novos impostos, que já estavam em um patamar altíssimo). 117 Com base nas teorias de Keynes. As características mais perversas da Depressão (a deflação, o desemprego e a privação trazida aos desfavorecidos) foram combatidas com medidas amplas, algumas de alcance restrito, outras de alcance a longo prazo. As medidas adotadas para amenizar o sofrimento dos grupos mais vulneráveis do sistema econômico lançaram a gênese do Estado do Bem Estar (welfare). 118 Entre as várias medidas econômicas adotadas, criou-se uma política de preços mínimos para os principais produtos agrícolas, políticas de limitação (se necessário) da produção, e a criação de estoques de regulação do mercado. Tais medidas acabaram sendo adotadas pela maioria dos países industriais. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 64 produtividade. Contudo, a canalização do potencialprodutivo para a criação de bens de capital exigiu que uma parte relativamente menor deste potencial fosse dedicada à produção de bens de consumo. A aquisição de bens de capital fez-se, portanto, a um custo social elevado, resultando em grandes privações para as massas”. (HUNT & SHERMAN. Pág. 71). Nos países mais avançados economicamente, o aumento crescente da produtividade, trazendo mais altos salários que propiciassem ao consumo, levou à criação de um forte mercado interno de consumo.119 O bem estar e a aparente tranqüilidade proporcionada pela pujança material, por outro lado, possuem um lado menos racional; a prosperidade pagou o seu preço. “Os direitos e liberdades que foram fatores assaz vitais nas origens e fases iniciais da sociedade industrial renderam-se a uma etapa mais avançada desta sociedade: estão perdendo o seu sentido lógico e conteúdo tradicionais. Liberdade de pensamento, liberdade de palavra e liberdade de consciência foram – assim como o livre empreendimento, que elas ajudaram a promover e proteger – idéias essencialmente críticas destinadas a substituir uma cultura material e intelectual obsoleta por outra mais produtiva e racional. Uma vez institucionalizados, esses direitos e liberdades compartilharam do destino da sociedade da qual se haviam tornado parte integral. A realização cancela as premissas”. (MARCUSE, Herbert. Pág. 23). Entretanto, uma nova consciência vem surgindo por entre os benefieiários desta sociedade de opulência, representada por uma atitude crítica frente ao preço a pagar por ela. Cada vez mais se levantam críticas, oposições e movimentos organizados contra a ação predatória e poluidora120 característica do sistema industrial. Atualmente, aumenta cada vez mais a preocupação pelo equilíbrio ecológico do planeta, ameaçado pela exploração desenfreada de seus recursos. Por todo o mundo, grupos se organizam visando defender não apenas o futuro, mas o próprio presente ameaçado. 119 O grosso da produção industrial de países tais como EUA, Japão, Inglaterra, França e Alemanha, entre os de economia mais desenvolvida, volta-se principalmente para o mercado interno. Apenas o excedente da produção (que por si já é bastante elevado) é exportado. Tal política não é seguida pelos países periféricos (ditos em desenvolvimento), que privilegiam a exportação, em detrimento do seu mercado interno. Ao mesmo tempo, a dificuldade econômica crônica destes países leva-os a ter que seguir as determinações do FMI, cuja orientação econômica volta-se claramente para uma ortodoxia clássica. 120 A poluição trazida por empresas de alta tecnologia não atinge a atmosfera, mas sim a terra e os lençóis freáticos. O chamado “Vale do Silício”, região de tecnologia de ponta localizada na Califórnia, é atualmente o lugar onde o meio-ambiente está mais exposto. Para produzir os chips e outros componentes usados intensivamente em computadores, são necessárias substâncias extremamente tóxicas. Estas substâncias, de acordo com a Enviroment Protection Agency, são: xilênio (que pode causar defeitos em fetos); compostos de chumbo (cancerígeno); ácido nítrico e compostos do nitrato (envenena os pulmões e corrói a carne); éter glicólico (afeta o sistema nervoso e pode interromper a gravidez); ácido hidroclorídrico (corrói a pele e provoca choque anafilático). As empresas que industrializam a celulose (base para a produção do papel, indispensável por formar o substrato físico da civilização intelectual) são as maiores poluidoras dos rios. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 65 “A questão política mais básica, ( ... ) não é quem controla os últimos dias da sociedade industrial, mas quem modela a nova civilização que surgirá rapidamente para substituí-la. Enquanto as escaramuças políticas de curto alcance esgotam a nossa energia e atenção, uma batalha muito mais profunda já está tomando lugar sob a superfície. De um lado estão os guerrilheiros do passado industrial; do outro, crescentes milhões que reconhecem que os problemas mais urgentes do mundo – a comida, a energia, o controle da armas, a população, a pobreza, os recursos, a ecologia, o clima, os problemas da idade, o colapso da comunidade urbana, a necessidade de trabalho produtivo e compensador – não mais podem ser resolvidos dentro da estrutura da ordem industrial”. (TOFFLER, Alvin. Págs. 30/31). A obra de Toffler que citamos acima tem uma penetrante visão sobre o modo como se desenvolveu a nossa civilização. Para este autor, este desenvolvimento pode ser dividido em três fases: a Primeira Onda, de características essencialmente agrícolas; a Segunda Onda, especificamente industrial; e a Terceira Onda, que apenas iniciamos, e que se caracteriza pela desurbanização, des-industrialização e por formas de produção econômicas totalmente novas.121 Para Toffler, a atual revolução está se processando em um eixo cujo motor é a tecnologia, transportes aperfeiçoados e as comunicações. Daniel Bell, um outro teórico da nova civilização, a chama de “sociedade pós- industrial”. Ele diz que esta sociedade se caracteriza por três componentes principais: em economia, pela mudança da manufatura para os serviços; em tecnologia, pela centralização destas nos ramos de computadores, eletrônica, ótica e polímeros; sociologicamente, pela ascensão de novas elites técnicas e novas estratificações de classes sociais122. Para este autor, as mudanças na indústria e na economia irão se caracterizar pela automação em massa, impondo novos ritmos à vida cotidiana, ao modo de vida e ao lazer, pela diminuição dramática do número de horas trabalhadas por semana. A 121 É o caso do surgimento de empresas “virtuais” na Internet, cujo valor não pode ser avaliado por um patrimônio “visível”, como é o caso das empresas tradicionais. Isto não impede que elas atinjam um valor de mercado impressionante. 122 Alguns autores, por sua vez, criticam esta nova sociedade tecnológica. De um modo geral, esta crítica aponta para o fato de que, nas nações industrializadas, o homem moderno tornou-se escravo desta tecnologia, e o vício do conforto material apenas esconde as profundas deficiências e a injustiça social desta sociedade. Além disso, a tecnologia trouxe poluição, envenenamento do solo por defensivos agrícolas e o perigo nuclear. Para Robin Clarke, autor inglês, esta análise é injusta, por não levar em consideração que a tecnologia traz mais benefícios reais do que malefícios. Para ele, a tecnologia pode evoluir para formas não poluentes e menos perigosas para o meio-ambiente. O erro está no modo como se trata a tecnologia. A própria forma de ajuda dos países ricos aos mais pobres mediante o fornecimento de tecnologia avançada, além de ser extremamente dispendiosa, nem sempre resolve os problemas econômicos dos últimos. Além disso, para Clarke, sempre se encontram, integrados na tecnologia, os valores e os ideais da sociedade que a criou. Em contato com outras culturas, esta tecnologia geralmente tem um efeito perverso, capaz de deformar o seu sistema de valores (inclusive a sua atitude frente à natureza e à sociedade). O mau uso da tecnologia poderia decorrer destes equívocos culturais e da assimilação deturpada do conhecimento tecnológico (por exemplo, os conhecimento tecnológicos relativos à pesquisa de defensivos agrícolas podem ser desviados para a pesquisa de armas químicas e biológicas). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 66 composição básica da força de trabalho se altera, à medida que os processos automáticosreduzem o número de operários industriais necessários à produção. Como conseqüência mais importante, Bell aponta o fato de que as indústrias passariam a se localizar distantes das grandes cidades, mais perto das fontes de matéria-prima e combustíveis. A descentralização industrial, além de revolucionar a topografia social, tornaria indistinta as orlas radiais das metrópoles e das fronteiras entre urbano e suburbano. Sob o domínio da automação, a depreciação do maquinário representaria um custo maior do que o dos salários da mão-de-obra; assim, para neutralizar o alto investimento de capital, cada vez mais as fábricas automatizadas passariam a funcionar 24 horas por dia. Como conseqüência, ficariam alteradas todas as formas conhecidas de “turnos de trabalho”, trazendo como conseqüência novas relações trabalhistas, nova legislação e novas formas sociais e jurídicas de interpretação do trabalho.123 Um aspecto que causa calafrios é o gigantismo da nova economia. Fusões sucessivas estão criando corporações tão gigantescas, que fazem parecer insignificantes as corporações de fim do século XIX. O advento da tecnologia da informática e do mundo virtual criado pela rede de computadores (a Internet) propiciou o surgimento de novas corporações cujo valor de mercado ascende a centenas de bilhões de dólares. Atualmente, já não se pode definir uma empresa como sendo de capital intensivo ou de mão-de-obra intensiva. A pesquisa, a engenharia e o design levaram à criação de um novo termo, a inteligência intensiva. No custo final de um chip, por exemplo, apenas 15% referem-se à matéria prima, energia, maquinário e mão-de-obra. Os restantes 85% são gastos com a pesquisa e o design.124 A maioria das gigantescas corporações está migrando o seu pessoal para a produção de softwares e projetos de sistemas; outra parte está ligada ao marketing de vendas. Apenas 5% do pessoal se ocupa com a fabricação propriamente dita. 23 – Um Novo Mundo Econômico A característica mais marcante da nova economia mundial, a globalização, tem efeitos favoráveis e efeitos perversos. As gigantes empresas transnacionais, ao perderem a sua identidade, já não possuem um centro definido; elas procuram se instalar preferencialmente em países de mão-de-obra barata, e buscam também unificar a sua produção, fabricando produtos “mundiais” que se possam rapidamente adaptar para outros perfis de consumo. Globalização, então, é o processo de descentralização industrial, processo este que força a que as economias mundiais (ou seja, que os países 123 Esta análise de Bell foi feita na década de 1970, e mostrou-se extremamente profética quanto às atuais formas de trabalho nos Estados Unidos e no Japão, principalmente. 124 Marx já havia previsto que, no futuro, o advento de instrumentais criados pela ciência e pela técnica iria modificar a relação entre o tempo de trabalho (e da quantidade de trabalho) e a criação da riqueza real. Desta forma, o trabalho humano já não estaria incluído no processo de produção; o homem apenas se relacionaria com este processo como supervisor e regulador. Na verdade, é isto que vem acontecendo nas empresas de alta tecnologia e elevada robotização, onde o trabalho humano está exatamente neste nível previsto por Marx (entretanto, mesmo assim ele condenou esta forma de trabalho, porque, dizia, se apropriava da produtividade universal do homem). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 67 participantes deste processo tenham uma economia aberta, permitindo um maior fluxo tanto de capital quanto de mercadorias e serviços – seja na exportação, seja na importação). Isto implica na necessidade de limitar o controle alfandegário, diminuindo (ou mesmo abolindo) tarifas protecionistas sobre mercadorias. O próprio fato de que a maioria das mercadorias atualmente fabricadas em qualquer país surge da montagem de peças provindas dos mais variados pontos do globo obriga a esta abertura. A característica mais marcante da globalização é o surgimento do chamado “produto mundial”, uma mercadoria que tem basicamente as mesmas características em qualquer dos mercados nacionais onde seja fabricada e vendida. O produto mundial (que surgiu da necessidade de diminuir custos de produção, e da concorrência enorme no mercado) decorre da padronização das linhas de montagem e da unificação e diminuição das peças básicas usadas no produto (ou seja, diminuição do número de fornecedores).125 Novas técnicas de administração, tais com o Controle de Qualidade Total ou de reengenharia vem assolando os manuais de economia e de administração, e em seu nome, crescem as demissões. Neste processo capitalista acelerado, as mercadorias são vendidas em todo o mundo, num processo de competição sem paralelo. Este fenômeno é acompanhado por uma maior circulação de capitais (via empréstimo), que entretanto já não deseja seguir as regras tradicionais de maturação (tempo médio estimado para retorno dos investimentos); em um único dia, uma quantidade inacreditável de dinheiro (chamado “dinheiro volátil”) gira pelos vários mercados financeiros mundiais, sem se fixar por muito tempo em uma ou outra economia nacional.126 Frente a estas quantias astronômicas,127 o dinheiro público disponível para investimentos, na maioria dos países, é simplesmente insignificante. Esta situação, agravada pela contenção orçamentária, obrigou muitos países a desestatizarem a sua economia, pela privatização de empresas públicas, apenas porque não tinham outro meio para conseguir dinheiro para investimentos. Esta movimentação econômica mundial sem precedentes mudou todos os parâmetros e teorias econômicas, incapazes de abarcar todo o processo. Mais do que a Revolução Industrial, que deslocou o foco da sociedade do campo para as cidades,128 a nova 125 A produtividade industrial também decorre desta padronização. Da década de 1980 para cá, o tempo de produção de um carro “mundial” no Brasil baixou de, entre 5 a 10 dias, para 24 horas. O número de fornecedores baixou em média, de 1000, para menos de 100 (Revista Veja, edição 1749, 1º de maio de 2002. Pág. 108). 126 Entre 1971 e 1995, o volume de empréstimos internacionais aumentou em 130 vezes, de um total de 10 bilhões de dólares, para 1,3 trilhão. Este capital volátil, nas duas últimas décadas do século passado, foi o terror das economias nacionais, arrasando economias tão díspares como a mexicana, coreana ou brasileira. 127 Apenas para comparação, as dez maiores corporações mundiais (e tomando-se apenas aquelas da economia tradicional) chegaram a faturar 1,4 trilhão de dólares em 1995, superando o PIB de muitos países. E a maior parte do seu faturamento é feito a nível mundial. Em geral, estas corporações possuem as suas unidades fabris espalhadas pelo mundo. Um único produto tecnológico pode ser composto por componentes físicos fabricados em lugares tão diversos quanto Formosa, Coréia do Sul, Cingapura ou Vietnã. 128 Galbraith chama a atenção para um fato a que se dá pouca atenção, o de que a escravidão é um fenômeno tipicamente agrícola. Assim, é possível que o advento da Revolução Industrial tenha permitido a abolição da escravidão, em todos os países. Não é uma surpresa que a Inglaterra, berço desta revolução, foi a primeira a aboli-la. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 68 economia está lançando as bases para um mundo totalmente diferente, que mal pode ser imaginado.129 Sob um ponto de vista, parece que uma característica marcante desta nova economia seria o desempregomaciço, mesmo em países economicamente avançados. Segundo alguns especialistas, os índices de desemprego na Europa, ao final do século XX eram os mais elevados desde a época da Grande Depressão. Visto sob outra ótica, parece estar havendo, na verdade, uma migração em massa de empregos, originalmente das empresas tradicionais, para empresas de serviços e até mesmo empresas automatizadas. Os países que mais avançaram nestas áreas (Estados Unidos e Japão) atravessaram o período sem graves crises de desemprego (mesmo em recessão, o Japão manteve os seus índices tradicionais de emprego). A globalização, apesar da grande oposição que tem levantado, tem mostrado ser um fenômeno irreversível. Os países que tentaram fechar a sua economia ao comércio mundial regrediram a um nível vegetativo de crescimento, com fome e miséria interna (é o caso da Coréia do Norte e da Albânia). Se a globalização tem uma faceta ruim, ela pode estar no fato de que os governos nacionais vêm perdendo sua autonomia interna (e, em certos casos, até mesmo uma parte de sua soberania), pelo fato de terem de se submeter aos ditames do capital internacional.130 A quebradeira generalizada de vários países deu-se em função, basicamente, da sua incapacidade de controlar os capitais voláteis.131 Reservas de mercado, legislação reguladora, controle de preços, proteção alfandegária, são medidas inócuas e até mesmo deletérias, em uma economia globalizada.132 E se o país tenta simplesmente fechar suas fronteiras, fatalmente deixará de ter acesso aos capitais externos e a novas tecnologias. Caminhando para trás, seus produtos acabam por perder competitividade, a indústria sucateia, e a inflação acaba vindo como corolário deste estado de coisas. 24 – O Problemas dos Países Emergentes 129 Para Kenichi Ohmae, autor do livro “O Fim do Estado Nação”, “trata-se de uma nova espécie de processo social, uma civilização genuinamente transnacional, alimentada pela exposição à tecnologia e pelas mesmas fontes de informação”. 130 Marx afirmava que a concorrência entre os capitalistas levando ao esmagamento dos menores pelos maiores, bem como o aperfeiçoamento da tecnologia (que levaria, segundo ele, a que as empresas precisassem ampliar a produtividade do trabalho, com aumento da escala de produção) levavam inexoravelmente à concentração da riqueza e do poder econômico em um número cada vez mais restrito de capitalistas. A par desta concentração cresceria a miséria e a exploração econômica. Como corolário de sua análise, Marx exortava a que as massas se unissem e se organizassem contra o sistema capitalista. 131 Se o país desvaloriza a moeda tentando proteger a sua economia, estes capitais se volatizam da noite para o dia, pulverizando as suas reservas internacionais. 132 Não significa que a economia não possa ter segmentos protegidos, principalmente nos países de economia mais vulnerável. E no entanto, esta também é uma prática comum nos países mais fortes economicamente. O aço, por exemplo, é um produto que volta e meia entra na pauta de produtos protegidos pelos Estados Unidos (como proteção, é claro, à sua siderurgia). No entanto, sempre que isto ocorre, algum outro segmento da economia americana sofre as conseqüências (quase sempre, a indústria automobilística). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 69 Com a progressiva descolonização que ocorreu após o fim da Segunda Guerra Mundial, um novo problema surgiu. A maioria dos países recém-independentes era muito pobre e subdesenvolvido, sendo a sua pobreza caracterizada por desemprego, baixos salários, analfabetismo, doenças, fome, etc. Enfim, a má qualidade de vida era a principal característica desses países. Mas não eram apenas as ex-colônias que estavam nesta situação. Países há muito independentes politicamente, por seu lado, mostravam-se extremamente dependentes economicamente, apresentando uma economia fraca e incapaz de trazer prosperidade e bem-estar aos seus cidadãos. A solução buscada, adotada ou imposta, na maioria dos casos, voltava-se para um desenvolvimento urbano-industrial, como o único capaz de eliminar o atraso crônico destes países. Vários preceitos foram postulados para se proceder a este desenvolvimento forçado: industrialização urbana maciça; mecanização intensiva da agricultura; desenvolvimento das áreas urbanas; controle demográfico; adoção de uma política de redistribuição de renda; adoção de reformas políticas e administrativas, visando basicamente coibir a corrupção; incremento das exportações. Por outro lado, nada disto funcionaria se não houvesse uma contrapartida externa, materializada na forma de ajuda, investimento direto, transferência de tecnologia e importação. Analisando-se os resultados gerais desta política de desenvolvimento, podemos notar que pouca coisa mudou desde que ela foi adotada. Em geral, e com poucas exceções, os países do Terceiro Mundo que conseguiram sair do “círculo vicioso” da pobreza o fizeram às próprias custas, através de investimento maciço em educação e pesquisa tecnológica.133 De um modo geral, as condições econômicas e sociais bastante instáveis que prevaleceram nas décadas de 1960 a 1980 impediram que diversos países pudessem proceder a um desenvolvimento auto-sustentável. A tentativa de industrialização a qualquer custo redundou em fracasso, em muitos países, principalmente devido ao fato de que eles careciam de know-how tecnológico. A falta de uma estrutura educacional abrangente impede o aproveitamento integral da ajuda tecnológica.134 Por outro lado, a maioria das indústrias tecnológicas estão em mãos de empresas estrangeiras, que repassam apenas uma tecnologia ultrapassada para suas filiais. Alia-se a este fato a relutância dos países avançados em passar para os menos desenvolvidos o que consideram “tecnologia sensível”, principalmente nos campos da mecânica fina, robótica, nanotecnologia, ótica, microprocessadores, polímeros, energia nuclear,135 exploração espacial, etc. 133 Os exemplos mais flagrantes são a Índia e a China, que adotaram uma via própria de desenvolvimento, pressionados pelo seu gigantismo demográfico. 134 No Brasil, é comum encontrarmos equipamentos tecnológicos, que foram fornecidos (e muitas vezes, comprados), ainda encaixotados, enferrujando e tornando-se obsoletos, simplesmente porque não há quem possa montá-los e operá-los. 135 Na década de 1970 o Brasil assinou contratos de ajuda para a implantação de usinas nucleares com a Alemanha Ocidental que vieram a se mostrar extremamente prejudiciais ao país. Paralelamente, e em segredo, havia um projeto secreto de pesquisas que foi capaz de, realmente, fazer o Brasil adquirir know- how neste campo de pesquisas. Infelizmente, no Governo Collor, o excesso de demagogia fez interromper estas pesquisas, as quais tornavam o país autônomo, nesta área. No campo da exploração espacial, o TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 70 Os problemas relativos ao desenvolvimento levaram várias pessoas a repensar esta questão. Acreditar, por exemplo, que o desenvolvimento deva ter como parâmetro único o crescimento econômico, é perigosamente enganoso. Expandir, simplesmente, a produção de bens e serviços, talvez seja uma condição necessária, mas não é suficiente para garantir o desenvolvimento. Distribuir riqueza não é o mesmo que criar um mercado de consumo (que, quase sempre, baseia-se na obsolescência planejada como forma para continuamente criar novos anseios de consumo, em uma espiralinterminável). Os países em desenvolvimento, ou países “emergentes”, geralmente buscam transplantar um ou vários tipos de indústria a partir de países avançados, sem no entanto buscar paralelamente usar os recursos técnicos e culturais disponíveis internamente para complementar a tecnologia estrangeira. Além disso, muitas vezes esquecem que os países avançados dão grande ênfase à sua produção primária, alocando recursos baratos e proporcionando constantes estímulos (via subsídios) à classe de agricultores. Isto quer dizer que os países industrializados o são tanto na parte urbana quanto na parte rural, característica esta facilmente esquecida pelos países do Terceiro Mundo, que dão pouco apoio à agricultura. Em alguns países menos desenvolvidos, a experiência provou que algumas iniciativas simples de mistura de política doméstica e internacional eram capazes de acelerar o desenvolvimento, reduzir disparidades de renda e colocar sob controle o crescimento populacional. Estas iniciativas passam pela oferta generalizada de educação, crédito, tecnologia barata e serviços de saúde a pequenos produtores rurais e urbanos, bem como a trabalhadores sub-empregados. De um modo surpreendente, notou-se que estas iniciativas eram capazes de, por si só, tornar altamente produtivos estes segmentos sociais, que também adquiriam capacidade de poupança e de investimento positivo. Outro fator comumente desconsiderado é o fato de que, nos países avançados, a maioria dos empregos oferecidos geralmente estão no setor de serviços; a indústria e a agricultura, excessivamente mecanizadas, ocupam pouca mão-de-obra. Entretanto, na maioria dos países do Terceiro Mundo, o Estado (o setor público) vem assumindo este mister. O que se nota é que o setor público vem se expandindo e absorvendo áreas do setor privado (indústrias nacionalizadas, bancos, etc.) ou simplesmente aumentando o quadro de pessoal da administração direta e indireta. Na maioria dos países menos desenvolvidos, o excesso de burocracia, a voracidade fiscal e um excesso de leis, regulamentos e decretos, em vários níveis governamentais, aliado a um excesso de impostos, vem onerando a produção de riqueza nacional via o comércio. A soma destes fatores maléficos tem como conseqüência a redução da oferta de empregos e o aumento da sonegação, como forma de sobrevivência econômica. * * * Brasil tem um projeto completo, inclusive com veículos lançadores de satélites (na base de Alcântara), que sofrem a mesma miopia demagógica, pois restringem-se cada vez mais as verbas, o que provoca a dissolução de sofisticados grupos de pesquisa, graças aos baixos salários e à falta de motivação. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 71 Há um último e importante parâmetro a ser considerado, no que tange às necessidades econômicos de um país. Normalmente, considera-se a necessidade de uma poupança interna elevada, como meio de suprir as elevadas demandas de capital necessário para os investimentos. Historicamente, os países menos desenvolvidos tem mostrado uma menor capacidade de poupança. Entretanto, um fator importante normalmente é desconsiderado, aqui. A poupança existente nos países mais ricos somente surgiu após ser satisfeita a demanda de consumo interno. Um país como o Japão, por exemplo, que apresenta índices atuais altíssimos de poupança, criou um mercado interno vigoroso, de intensa demanda, e nele baseou o seu crescimento econômico. A exportação jamais foi a mola-mestre do crescimento econômico japonês (dizendo de outro modo: o Japão jamais necessitou priorizar as exportações, como o fazem os países menos desenvolvidos, que praticam uma política equivocada de desenvolvimento). * * * Todos os fatores apontados mostram claramente a necessidade de mudanças culturais, antes que se proponham mudanças econômicas. O desenvolvimento deve começar pela reorientação das metas, apoiando e estimulando todas as iniciativas que levem à formação de uma verdadeira e coerente base material e tecnológica interna, bem como a uma reforma coerente do sistema produtivo de riqueza. 25 – Tecnologia e Desenvolvimento Na atualidade, pode-se dizer que a tecnologia é sinônimo de desenvolvimento e importante fator para a prosperidade dos países avançados. O alto grau de dependência da ciência em relação à tecnologia força a que as nações lancem cada vez mais mão dos recursos disponíveis com o fim de possibilitar a pesquisa científica, pesquisa esta que, aplicada praticamente, contribui para que estas nações mantenham os seus altos índices de progresso e crescimento econômico. Nenhuma nação que esteja em vias de desenvolvimento deve desdenhar este esforço, ou jamais alcançará a sua emancipação. No entanto, ainda assim parece existir, nestas nações, uma dicotomia entre esta necessidade e o esforço que despende para tal. Um equívoco, contudo, parece imperar entre os responsáveis por este esforço. Quando se trata de adquirir tecnologia, sustentam a tese de que esta deve ser adquirida no exterior, justificando que assim se pode “queimar etapas” inúteis. Agindo assim, ou demonstram má-fé ou parecem ignorar que isso só faz dar continuidade à dependência cultural, científica e econômica do país que age assim. O pior é que, além da tecnologia, o país absorve uma infra-estrutura cultural que não lhe é própria, na forma aparentemente inocente de métodos educacionais (acompanhados por livros didáticos, manuais, técnicas pedagógicas, etc.) estranhos, que apenas fazem tumultuar o esforço nacional. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 72 A dependência tecnológica que se cria é perpetuada pelo fato de que qualquer atualização, além de dispendiosa, não acompanha o desenvolvimento tecnológico interno, porque este fica amarrado à produção de ciência feita no exterior. Este monopólio da tecnologia cria aspectos inusitados de dominação econômica, porque a carência de pesquisa interna não cria os benefícios que se poderia esperar dos avanços científicos. O próprio sistema internacional de patentes cria obstáculos à pesquisa, além de criar monopólios de comercialização em diversas áreas sensíveis, tais como defensivos agrícolas e remédios. Além do mais, a tecnologia transferida sempre constitui, para quem a recebe, autêntica “caixa preta” da qual não tem idéia do conteúdo. Em várias ocasiões, a ONU posicionou-se quanto a este assunto, manifestando uma preocupação neste sentido. Para este órgão internacional, os seguintes fatores devem ser considerados: 1) o custo real da tecnologia é superior ao que se poderia desejar; 2) os modos atuais de transmissão de tecnologia tendem a perpetuar a dependência tecnológica dos países que a recebem, e impedem o incremento de uma tecnologia nacional; 3) a tecnologia estrangeira, ainda que possa fortalecer a capacidade produtiva nacional, freqüentemente se converte em fator de elevação dos custos de produção; 4) a tecnologia transferida nem sempre contribui para a expansão das exportações de produtos manufaturados; 5) muitas vezes, a tecnologia importada é incompatível com as condições locais. A implantação de uma tecnologia genuinamente nacional choca-se muitas vezes com diversos obstáculos. O núcleo natural do qual ela deveria provir, universidade e centros de pesquisa avançadas, muitas vezes sofre de alta de recursos, pela falta de apoio governamental, ausência de uma educação de alto nível, baixos salários, etc. Este último fator tem levadoa uma intensa evasão de talentos, que agrava ainda mais o problema. Outras vezes a pesquisa é mal orientada, dando prioridade a setores não tão importantes. Com isso, recursos preciosos são mal gastos, piorando o problema. Também falta de planejamento ou até mesmo planejamentos errôneos, bem como a falta de técnicos de nível médio capazes de dar suporte (montagem, conserto e manutenção) aos equipamentos de alta complexidade tecnológica acaba por tornar-se um obstáculo absolutamente intransponível. 26 – Haverá Uma Ideologia para a Nova Época? Finalmente, neste mundo novo que se avizinha, a antiga pregação ideológica perde o seu matiz. A “queda” do Muro de Berlim em 1989 foi um marco referencial para uma mudança de paradigma, a passagem para uma nova época na qual perde o sentido qualquer discussão ou separação entre “esquerda” e “direita”, ambos órfãos de uma filosofia social capaz de dar sentido e finalidade a qualquer discussão, debate ou confronto entre ideologias. Doravante, apenas um discurso de novo tipo, voltado para a conservação ecológica,136 para a tentativa de realização de um ideal social baseado em premissas 136 “Calcula-se que, atualmente, os negócios são responsáveis por mais de 25 bilhões de toneladas de poluentes, dispersos no ar e lançados na água e na terra; cerca de 125 toneladas de dejetos, anualmente, TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 73 possíveis, pode conseguir a atenção do habitante deste mundo novo, e será capaz de lançar os modelos para uma nova sociedade, modelos estes calcado em novas teorias sociais e econômicas capazes não só de trazer prosperidade e eliminar o fosso existente entre as classes privilegiadas e as classes desfavorecidas, mas principalmente trazer condições não apenas para que este mundo novo seja, além de próspero e feliz, também mais equilibrado e mais racional. LEITURA COMPLEMENTAR A Nova Economia A chamada economia “globalizada” não se baseia em premissas econômicas recentes. O “neo-liberalismo”, que é o fulcro teórico que sistematiza esta onda econômica atual já existe desde 1938; surgiu pois, às vésperas da Segunda Guerra Mundial. Como doutrina, foi balizada por diversos teóricos da economia, tais como Hayek, Mises, Robbins, Baudin, etc.137 O neoliberalismo procurou examinar os resultados das numerosas intervenções do Estado na economia. Este estudo, além de focalizar o mecanismo dos preços, tentava também avaliar todas as conseqüências de uma economia planificada (cuja característica principal é o controle de preços). Para o neoliberalismo, este controle é daninho para a economia, porque eles não podem ser usados para aferir o mecanismo da oferta e procura. Assim, a única intervenção que aceitam é no sentido de o Estado intervir com uma função reguladora (impedindo cartéis) ou mesmo reformando instituições ineficientes. Aceitam também a possibilidade de vir o Estado a exercer de uma forma permanente uma atuação em certos setores da economia, tomando medidas econômicas que visem reduzir ao mínimo as injustiças sociais, aceitando mesmo uma legislação social para isso. Os neoliberais mais radicais, por seu lado, acreditam que o Estado é perdulário, incompetente e corrupto, e por isto incapaz de intervir de forma eficiente na economia e no sistema econômica; sua tese é a de que os indivíduos deste sistema econômico são capazes de encontrar suas próprias soluções para sanar todos os problemas.138 * * * para cada homem, mulher e criança nos Estados Unidos. Incluídos nessa quantidade estão cerca de 150 milhões de toneladas de fumaça que escurece o céu e envenena o ar, 22 milhões de toneladas de produtos de papel jogados fora, 3 milhões de toneladas de sobras de fábricas, e 50 trilhões de galões de líquidos aquecidos e poluídos que são despejados em rios, cursos d’água e lagos, todos os anos”. (HUNT & SHERMAN. Pág. 216). 137 Especificamente, foi com Jacques Rueff, economista francês, que surgiu inicialmente a fundamentação teórica do neoliberalismo. 138 Enquanto os socialistas acreditam que a intervenção do Estado visa tão somente garantir sua sobrevivência, pela manutenção das formas de produção e das relações tradicionais de dominação, os neoliberais mais radicais possuem as suas próprias razões para não quererem esta intervenção. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 74 Com relação à doutrina econômica neoclássica, a crítica que se faz a ela não ataca os problemas práticos enfrentados pelo Estado e pela sociedade moderna. Não enfrenta desigualdade de crescimento, ou defasagem de crescimento entre segmentos diversos; não ataca a crescente desigualdade na distribuição da renda; não explica porque o abismo entre ricos e pobres aumenta cada vez mais, ainda que aumente a produção geral de riqueza; não explica, nem apresenta alternativas aos problemas de decadência urbana e de poluição ambiental. O atual cenário apresentado pela economia internacional faz crer que as atuais teorias econômicas, apresentadas nos manuais acadêmicos, são apenas adaptações das antigas teorias. Na verdade, desde Keynes não surgiu uma teoria abrangente capaz de explicar o atual panorama econômico, em toda a sua complexidade. As modernas teorias matemáticas que procuram explicar o comportamento econômico apresentam o ranço histórico de sua origem. Nenhuma nova teoria tem ousado ir além dos moldes capitalistas e socialistas tradicionais, em busca de um novo mundo econômico. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 75 CAPÍTULO VIII O PROBLEMA BRASILEIRO 27 – O Brasil e o Cone Sul O Brasil possui atualmente uma economia estabilizada, com uma inflação sob controle, situação esta surgida após um dramático período caracterizado por índices elevadíssimos de inflação. Entretanto, de um modo paradoxal, os remédios econômicos adotados à época, ainda que pouco ortodoxos (correção monetária; câmbio fixo; etc.) permitiram um crescimento relativamente alto durante este período. Por outro lado, a situação atual caracteriza-se por índices nominais de juros altíssimos; elevada distorção na distribuição de renda; um apetite fiscal insaciável e um nível ainda baixo de crescimento econômico. Ainda assim, a economia brasileira apresenta um potencial de crescimento geral, com segmentos da economia apresentando bom desempenho (safra regular e produção industrial estável, por exemplo). Acompanhando a tendência mundial de integração econômica, o país vem tentando consolidar um grupo econômico regional no Cone Sul (o MERCOSUL) através de negociações de alto nível para diminuir barreiras tarifárias e legislações protecionistas. Este esforço, contudo, tem esbarrado no nacionalismo crescente dos países sul- americanos. Por outro lado, o Brasil vem sendo solicitado a se integrar a um mercado econômico mais vasto (ALCA), que abrangeria todo o continente americano. 28 – Os Problemas da Integração Econômica As negociações a nível diplomático e comercial conduzidas no processo da integração econômica (e também na integração à economia globalizada) envolvem grandes e complexos temas. Não está descartado totalmente o uso de barreiras alfandegárias139 para proteção de certos produtos, principalmente devido ao fato (que constitui umatendência histórica) de que certos segmentos da economia estão sempre defasados das áreas tecnologicamente mais adiantadas, e que sucumbem facilmente ante a exposição à importação de produtos mais baratos.140 139 Uma forma de protecionismo é feita através de barreiras não tarifárias, como por exemplo a criação de subsídios agrícolas. Políticas locais de lobby também são responsáveis pela adoção de medidas antidumping, geralmente através de legislação específica. Medidas compensatórias também costumam ser tomadas pelo país que se julga prejudicado por medidas tais como a desvalorização da moeda. 140 Os Estados Unidos costumam criar barreirar alfandegárias contra determinados produtos brasileiros, tais como suco de laranja, aço, produtos siderúrgicos, calçados e fumo. Até bem pouco tempo, o Brasil costumava proteger o seu mercado de eletrônica e de informática. A importação de produtos chineses tem afetado bastante certos setores industriais brasileiros. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 76 Talvez um dos grandes problemas relativos à integração (ou não) do Brasil e de outros países latinos ao ALCA seja a tremenda diferença que separa estes países da dinâmica economia americana (incluindo a economia do Canadá). Enquanto que a integração econômica na Ásia e Europa se deu entre países de mesmo nível (relativamente) econômico, a integração a ser realizada pela ALCA poderia levar a um desequilíbrio econômico insuportável pelos países latino-americanos, que poderia vir a favorecer a economia norte-americana (e inclusive provocar uma ênfase indesejável na produção de produtos primários, pelos países abaixo do Equador), pelo aumento da dependência dos países mais fracos economicamente. Outras considerações a serem levadas em conta incluem o problema relativo a patentes (de informática, fármacos, bio-químicos, eletrônica, etc.), que é fonte perene de discussões acirradas. A falta de uma política nacional voltada para a pesquisa e desenvolvimento, aliado ao (ainda) porte reduzido do mercado interno no Brasil (derivado, por outro lado, da desigual distribuição de renda e dos baixos salários), são, basicamente, a causa do pequeno número de patentes registradas aqui. A defasagem tecnológica atual já faz o país depender completamente das corporações multinacionais, para adequar o seu parque interno de informática, eletrônica, comunicações, telefonia. O Brasil não possui sequer um segmento nacional, no que tange à produção de veículos automotores, fazendo o seu mercado depender exclusivamente das decisões tomadas fora do país. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 77 APÊNDICE TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 78 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 79 A MOEDA Não há notícia acerca do surgimento efetivo da moeda, como meio de pagamento de mercadorias. Na antigüidade, a partir dos “tempos históricos”, inicialmente usavam-se bastões em metais ou fios, como forma de pagamento. Acredita-se que a cunhagem de moedas surgiu a partir de Pheidon, Rei da Ilha de Egina, em 750 a.C. No início, havia moedas redondas, quadradas e com outras formas. No Japão, por exemplo, usavam-se pedaços chatos e oblongos de prata, chamados itbizus. Ao tempo do império romano, a moeda era fundida, e não cunhada. Modernamente, não há distinção básica entre “moeda” e “dinheiro”; entretanto, o costume tem levado a entender por “moeda” apenas os objetos metálicos assim rotulados. A moeda é um objeto que possui um valor intrínseco ou apenas nominal, que é utilizado como meio intermediário de troca, seja como medida, seja como reserva de valor. Há dois tipos de moeda: a moeda-mercadoria, que é este objeto dotado de valor de troca; a moeda-escritural, formada de papel-moeda e recibos de depósitos bancários (esta última concepção surge em uma etapa posterior de civilização, por ser um meio mais abstrato de medida de valor). Intrinsecamente ligados ao conceito de moeda, e derivados de seu uso, surgiram o conceito de crédito, o conceito de câmbio (pela consideração do valor relativo de uma moeda em relação a outra) e a necessidade prática de criar estabelecimentos de troca: os bancos. Ordens de pagamento bancário, por exemplo, já eram utilizados desde o tempo dos egípcios antigos (impostos já eram cobrados, há tempos, pela apropriação de parte da produção agrícola). Atualmente, a “moeda” (seja ela constituída de moeda metálica, papel-moeda, letras de câmbio, ações, recibos de compra de mercadoria, que constituem a quantidade total de dinheiro em circulação) tem um valor intrínseco de mercado superior ao custo de sua manufatura (impressão ou cunhagem). Se em virtude da inflação este valor se iguala ou se torna inferior, a autoridade encarregada do controle de circulação monetária troca-a por outra, de maior valor de mercado, ou procede à troca do meio de circulação, trocando a “moeda” por outra (basicamente, o que se faz é apenas dar outro nome a uma moeda com outra efígie: é que acontece, por exemplo, quando ocorre uma inflação descontrolada). Até por volta do início da segunda metade do século XX, a maioria dos países procurava ter um lastro para a sua moeda, lastro esse baseado no ouro ou na prata. Isto significava que a moeda era conversível, ou seja, que o Banco Central trocaria aquele papel (o papel- moeda) por ouro (foi o que fez a França de De Gaulle, que levou grandes quantidades de ouro dos EUA, em troca do dólar em papel. Isto mudou quando os EUA tornou a sua moeda inconversível. Sendo, entretanto, um país de enorme quantidade de riqueza produzida anualmente (o PNB, ou Produto Nacional Bruto) e com uma gigantesca participação no comércio mundial, isto não teve qualquer conseqüência na aceitação e circulação do dólar-papel em todo o mundo. Atualmente, na verdade, costuma-se basear a quantidade de moeda em circulação já não mais no ouro, e sim nesta riqueza nacional produzida anualmente. Dentro de uma economia em TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 80 crescimento, procura-se medir a produtividade do trabalho, que se considera um índice seguro da relação entre produto social, renda distribuída, uso de mão-de-obra, know- how e capacidade de aproveitamento dos recursos naturais. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 81 A RENDA NACIONAL A renda nacional costuma ser calculada pelo valor líquido das mercadorias e serviços produzidos, e a sua flutuação normalmente141 se reflete na quantidade de moeda existente. Quanto ao poder aquisitivo do indivíduo, este aumenta na relação direta da produção de bens (desde, é claro, que estes bens sejam destinados ao consumo interno). O dinheiro é a expressão material desse maior ou menor poder aquisitivo. Todas as tentativas feitas por diversos governos para aumentar artificialmente esta renda redundaram em total fracasso. Durante o governo Blum, na França, em 1936, e posteriormente no governo de Roosevelt, foram feitas experiências cujo escopo era dar dinheiro a certas classes sociais para que pudessem gastá-lo (e que, achavam os governantes, provocaria um aumento de produção). 142 Todas estas experiênciasredundaram em retumbante fracasso.143 A teoria quantitativa da moeda144 visa explicar as variações do valor do dinheiro em função da quantidade de dinheiro existente. Os partidários desta teoria acreditam que o valor da moeda está ligado a esta quantidade: tendo-se um determinado volume de comércio, os preços irão variar em proporção direta com a oferta de moeda. “Como o valor da moeda é expresso pela comparação desta com o valor das utilidades mediante o índice dos preços, conclui-se que qualquer alteração na quantidade da moeda acarretará correlativa variação nos preços das mercadorias, estabelecendo-se assim rígida dependência entre o valor do dinheiro e a sua quantidade. Eis a teoria de que participaram os economistas da Idade Média, na quadra sintética dos fenômenos econômicos. Sofrendo a evolução peculiar às teorias econômicas, chegou ela até nossos dias desdobrada em novos elementos fornecidos pela análise, que, tornando-se mais percuciente à medida que avançam os conhecimentos da ciência, desagregou o bloco inteiriço de certas noções”. (GOMES, Luiz Souza. Pág. 112). Mas a renda nacional é, também, o total do valor monetário de gastos em todos os bens e serviços que, por sua vez, geram rendas dentro do país. Este valor não é obtido pelo somatório de todos os gastos em todos os bens e serviços, por três motivos: 1) os gastos em compras de matérias-primas e outros insumos se reflete nos preços de venda dos bens produzidos; alguns dos gastos realizados no exterior não revertem em criação de renda interna; enquanto alguns gastos são subsidiados, outros são (menos ou mais) tributados. 141 Entre 1933 e 1934 a quantidade de moeda em circulação na Inglaterra diminuiu um pouco, apesar do aumento sensível da renda nacional, no mesmo período. 142 No Canadá, chegou-se, inacreditavelmente, a distribuir somas de dinheiro entre os cidadãos, para compensar o dinheiro que estes entesouravam. 143 A experiência histórica não impede que novas iniciativas neste sentido sejam tomadas, seja por governos clientelistas, seja por socialistas que vêm propor renda mínima, como se isso resolvesse os problemas econômicos. 144 Esta teoria é atribuída a John Locke (1632-1704). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 82 Uma parte da renda nacional surge através dos chamados “pagamentos de transferência”, ou “rendas de transferência” (por exemplo: pensões de aposentadoria; benefícios da previdência; juros sobre a dívida nacional). Esta renda transferida sempre aumenta o poder aquisitivo de quem os recebe às expensas de outros participantes do processo econômico, que foram tributados para isso.145 145 Alguns economistas dizem jocosamente sobre isso que “não existe lanche grátis” (alguém sempre paga por ele). TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 83 A FORMAÇÃO DOS PREÇOS Define-se “preço” como a relação numérica existente entre a moeda (a moeda corrente) e o valor subjetivo de uma coisa, produto ou serviço. Em geral, o preço decorre de várias circunstâncias, entre as quais podemos citar: o montante ou volume de moeda em circulação; o montante de produção industrial e agrícola; a facilidade ou dificuldade de crédito, em função dos juros (que reflete a política fiscal do governo); o maior ou menor valor intrínseco de um objeto, pela sua raridade, valorização (é o caso das ações, p. ex.), ou da menor ou maior oferta no mercado. A relação cambial da moeda em comparação com outras também se reflete nos preços, devido ao comércio exterior (é o caso, por exemplo, do preço da gasolina, que reflete o preço internacional do petróleo). Evidentemente, o preço também reflete o custo total de produção, o pagamento das taxas de juros envolvidas e a margem de lucro do capitalista. Em uma economia livre (livre de qualquer forma de monopólio), geralmente é o mercado que define os preços, em função da oferta e procura de produtos e serviços, e em função da concorrência (mercado é o conjunto de todos os bens e serviços que são oferecidos aos consumidores que manifestem interesse em adquirí-los; concorrência é a oferta do produto no mercado, a preços iguais ou menores do que os de outros produtos semelhantes, oferecidos por aqueles que estão no mercado). Costuma-se distinguir entre preço de mercado e preço natural (tomando-se o valor intrínseco da mercadoria). Há também o preço de monopólio, que é o preço da mercadoria sem concorrência. O preço normal de mercado é também chamado de preço corrente. O preço corrente pode flutuar, em razão de vários parâmetros: estoque; velocidade de venda; demanda; perecibilidade da mercadoria; encolhimento do mercado (por exemplo, no início de uma feira livre, há bastante gente, e os preços são maiores; à medida que passam as horas, há menos gente comprando, e como ainda há estoque perecível, o feirante diminui o seu preço de venda). O preço das coisas e serviços não se mantém estável; o próprio aumento da renda (tanto individual quanto nacional) tende a aumentá-los, ano após ano. Quando a economia se descontrola ou se desequilibra, este fato pode dar início a um aumento descontrolado de preços, fenômeno este denominado inflação (a inflação muitas vezes resulta do excesso de emissão de papel-moeda). No processo de inflação, o valor de aquisição de uma moeda se deteriora, e os preços aumentam continuamente (quando o ritmo é muito rápido, estamos diante de uma hiper-inflação). Por outro lado, se os preços diminuem, o processo é chamado de deflação. A deflação pode trazer recessão (que é fenômeno da diminuição ou parada da produção de renda e riqueza nacional); mas se estão juntas a recessão e a inflação, temos o terrível fenômeno da estagflação. Em geral, os Bancos Centrais costumam estipular uma taxa de juros anual, que, ainda que baixa, não permite que a economia se torne estática (ou que venha a ocorrer a deflação, tão prejudicial quanto a inflação). Em geral, os preços estão relacionados a vários índices oficiais de medida econômica, que medem o desempenho da economia como um todo: são, por exemplo, os índices (medidos em vários períodos) da variação do preço (seja para o consumidor, seja para os diversos segmentos produtores de riqueza – agricultura, indústria, serviços, TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 84 construção civil, etc.); os índices de inflação; as taxas de juros; a variação cambial; etc. Tais índices podem ser medidos ou avaliados tanto por órgãos oficiais quanto por entidades civis, e servem (os primeiros) de referência para outras decisões econômicas, tais como a estipulação do salário mínimo; as tabelas e taxas de impostos; o orçamento fiscal da União; estipulação de preços controlados e de preços públicos; etc. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 85 A POLÍTICA DEMOGRÁFICA Uma das grandes preocupações modernas é o aumento dramático da população mundial. As intensas medidas de saúde pública, de saneamento e de higiene, de combate às doenças, a par do progresso da medicina preventiva levaram a uma queda progressiva do índice de mortalidade em todos os países. Os antibióticos, as vacinas contra doenças endêmicas, medidas sanitárias diversas (como o tratamento da água) podem ter contribuído para o aumento da população. A fome endêmica também foi vencida pela chamada “revolução verde”, que, com o uso intensivode fertilizantes químicos e usando sementes de trigo e arroz de alto rendimento, proporcionou a colheita de enormes safras agrícolas nos países menos avançados, reduzindo a morte por esta causa. Ainda que a taxa de natalidade tenha decrescido, principalmente devido a políticas deliberadas de anticoncepção, o crescimento populacional ainda ameaça a maioria das políticas econômicas dos países, que nem sempre conseguem incorporar as constantes levas de novos indivíduos em idade de trabalhar. Esta preocupação geral levou alguns especialistas a se voltarem para as idéias de Thomas Malthus, que analisara no século XVIII quais seriam as conseqüências de um crescimento populacional desenfreado. Para Malthus, a terra (a produção agrícola) jamais seria capaz de acompanhar o crescimento da população. Estas idéias de Malthus foram atualizadas e aperfeiçoadas; atualmente, os neomalthusianos apontam para o fato de que os recursos naturais do planeta (metais, petróleo, água potável) estarão em breve exauridos, devido à exploração em alta escala. A poluição e a decadência do meio-ambiente146 acabarão por tornar inabitável grandes porções de território, aumentando terrivelmente, por outro lado, os custos para a sobrevivência. Ainda que a expectativa geral de vida tenha aumentado, nem sempre a oferta de alimentos acompanhou este crescimento. Além disso, ocorre um fenômeno perverso por trás desta estatística. Em certos casos, ainda que a produção total de alimentos tenha registrado aumento, ocorreu um declínio per capita, anunciando uma deficiente distribuição desta produção (e até o desperdício). Se Malthus acertou em sua previsão, seu acerto somente se dá quando se considera a expansão do índice de consumo per capita, quando confrontado com a produção total de alimentos. A renda per capita (tomando-se aqui a renda econômica), ainda que tenha subido na maioria dos países do Terceiro Mundo, nas três últimas décadas do século XX, ainda assim sobem mais lentamente do que do produto nacional bruto, porque sobe muito rapidamente o número de bocas a serem alimentadas.147 Além do mais, o índice de crescimento desta renda entre habitantes do Primeiro Mundo é bem maior do que o 146 O surgimento dos buracos na camada ionizada da atmosfera terrestre são um terrível alerta neste sentido. 147 Atualmente (2008), cresce o espectro da fome. Na disputa entre bio-combustíveis e alimentos, a produção agrícola tende gradativamente para os primeiros, diminuindo a produção de alimentos (em área plantada e colheita). Além disso, o aumento da renda per-capita em países como China e Índia, de enorme contingente populacional, tem pressionado o consumo geral de bens e insumos não-renováveis e de alimentos, aumentando ainda mais o problema. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 86 mesmo índice entre os habitantes dos países mais pobres.148 Desta forma, o rápido crescimento demográfico entre estes últimos os afasta cada vez mais de uma prosperidade econômica.149 De qualquer forma, os neomalthusianos afirmam que, seja como for, qualquer aspiração de riqueza dos países pobres é irrealizável, devido à insuficiência de recursos naturais capazes de sustentar uma industrialização em grande escala. Para alcançar o patamar de prosperidade e o padrão de vida apresentado pelos europeus, por exemplo, estes países iriam consumir um volume de recursos que levaria rapidamente ao esgotamento todas as reservas mundiais.150 148 O pequeno índice de crescimento demográfico entre países ricos traz, por outro lado, conseqüências imprevistas. O aumento da idade média da população tem reflexos na política previdenciária, de aposentadoria e de bem-estar social. De um modo geral, a política interna desses países oscila entre a necessidade de abrirem-se para a imigração de mão-de-obra, e a rejeição à invasão (via esta mesma imigração) de culturas indesejáveis. Atualmente, a maioria dos países europeus que fechar os seus países a esta imigração (o Canadá tem uma política voltada para admitir novos imigrantes – preferencialmente, altamente qualificados). 149 De 1970 para cá, os índices de natalidade tem caído com rapidez em vários países. O declínio da fecundidade tem se apresentado em países tão diversos quanto a China, Coréia do Sul, Formosa, Singapura, Malásia, Chile, Costa Rica, Brasil, Porto Rico, Jamaica, e um longo número de pequenos países. Política de controle demográfico apenas tinham se iniciado nesta época em países de alta densidade demográfica, tais como Índia, Bangladesh, Paquistão, Indonésia, Nigéria e México. 150 A própria crise de energia que assola atualmente todos os países decorre desta exploração. A demanda incessante por petróleo e por gás natural levaram ao encarecimento destes recursos, utilizados como armas estratégicos pelos países produtores. As sucessivas crises no Oriente Médio levaram os preços do barril de petróleo a preços cada vez mais altos (cerca de 114 dólares o barril, em 2008). Por outro lado, a opção da energia atômica traz os seus próprios problemas, tais como contaminação ambiental e ausência de lugares seguros para depositar os resíduos tóxicos provenientes deste tipo de energia. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 87 QUESTIONÁRIO 1. Como se pode descrever os mais simples sistemas de trocas comerciais? 2. Quais as diferenças básicas entre as sociedades ateniense e espartana, sob o aspecto econômico? 3. Qual a orientação seguida pelos filósofos gregos, no tocante às idéias econômicas? 4. A intervenção do Estado foi benéfica para a economia de Roma? Por que? 5. Quais as conseqüências do confronto entre Roma e Cartago? 6. O que se entende por “revolta dos Gracos”? 7. Quais as possíveis causas para a decadência econômica do império romano? 8. Qual a diferença entre as teorias “nominalista” e “metalista”? 9. Como justificava S. Tomás de Aquino a sua oposição à cobrança de juros nos empréstimos? 10. Como era a situação econômica geral durante o império bizantino? 11. Qual a época aproximada do surgimento do feudalismo? 12. Qual a influência comercial propiciada pelas cruzadas? 13. O que significa a noção medieval de “equilíbrio”? 14. Quais são as formas de mutação monetária? 15. Por que a moeda má expulsa a moeda boa do mercado? 16. Por que os protestantes e o luteranos eram mais voltados à produção de riqueza, do que os católicos? 17. Quais os fatos econômicos que caracterizam a fase colonialista? 18. Que artigo econômico chegou a provocar várias guerras pela independência? 19. O que se entende por “bullionismo”? 20. Quais as características da Revolução Comercial? 21. Quais as moedas que mais se impuseram, na época da Revolução Comercial? 22. O que se entende por mercantilismo “fiduciário”? 23. O que foi o “encilhamento”? 24. Cite duas escolas econômicas liberais. 25. Segundo os fisiocratas, qual era a única classe que produzia riqueza? 26. Qual é a origem da riqueza, para Adam Smith? 27. O que é a “mão invisível” de Adam Smith? 28. Para Adam Smith, de onde decorre a renda da terra? 29. Qual é o fundamento do valor de troca, para Smith? 30. Explique sucintamente a doutrina de Malthus. 31. O que significa “transição demográfica”? 32. O que é a Lei de Say? 33. Qual é a causa e a medida do valor, para Ricardo? 34. Explique a relação entre o comércio exterior e o valor da moeda, conforme Ricardo. 35. Explique como, para Ricardo, se dá o equilíbrio monetário de um país. 36. Explique a teoria geral da renda, de Ricardo. 37. ComoCarey analisou a renda fundiária? 38. Explique as idéias de Mac-Leod. 39. Qual a principal contribuição de Stuart Mill ao pensamento econômico? 40. Cite algumas causas que provocaram a Revolução Industrial. TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 88 41. Quais as características da Revolução Industrial? 42. Quais as principais idéias dos socialistas anteriores a Marx? 43. Quais os elementos filosóficos de Hegel utilizados por Marx em sua explicação da evolução da história? 44. O que se entende por mais-valia? 45. O que Marx queria dizer por “alienação”? 46. Fale sobre a fase do capitalismo chamada “imperialismo”. 47. O que se entende por “anarquismo”? 48. O que significa “ludita”? 49. Em que época surgiram os primeiros sindicatos ingleses? 50. Quando foram criados os primeiros sindicatos nos Estados Unidos? 51. O que significa “econometria”? 52. Qual a concepção econômica do neoclassicismo? 53. Para que servia a “Lei Anti-Truste”? 54. Onde, e com quem, surgiram inicialmente as linhas de montagem na indústria? 55. Quais foram as conseqüências da introdução das linhas de montagem? 56. Quais as principais leis das escolas clássica e neoclássica? 57. O que significa “números-índices”? 58. O que quer dizer “Grande Depressão”? 59. Quais foram as características mais perversas da Grande Depressão? 60. Quais as principais medidas econômicas adotadas contra a Grande Depressão? 61. O que se entende por ciclo econômico? 62. Qual a diferença entre as idéias de Keynes e dos clássicos, a respeito de crises econômicas? 63. Quais as idéias de Keynes a respeito do sistema econômico? 64. O que Keynes achava da intervenção governamental na economia? 65. Qual foi a influência de Keynes, na definição de uma política econômica mundial? 66. O que foi o Plano Marshall? 67. Quais os principais órgãos de comércio internacional que surgiram após a Segunda Guerra Mundial? 68. Quais os atuais órgãos econômicos regionais no mundo? 69. O que significa “Euro”? 70. Quais os principais projetos de unificação comercial das Américas? 71. Onde, quando e com quem surgiu inicialmente a concepção do Estado do Bem Estar Social? 72. Por que a ortodoxia clássica se opõe à redistribuição de renda? 73. Quais as conseqüências, para o meio-ambiente, das tecnologias voltadas para a informática? 74. Qual a concepção de Alvin Toffler sobre o desenvolvimento da civilização? 75. O que se entende por sociedade “pós-industrial”, e quem criou este termo? 76. Quais os benefícios e malefícios provindos do uso da tecnologia? 77. O que pode provir da absorção irrefletida de tecnologia estrangeira por um país economicamente menos desenvolvido? 78. Quando surgiu, e quais as concepções do neo-liberalismo? 79. Qual o significado do termo: “empresa de inteligência intensiva”? 80. Quais as idéias de Marx a respeito do advento da tecnologia? 81. O que significa “globalização”? TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 89 82. O que quer dizer “produto mundial”? 83. Quais os países integrantes da União Européia? 84. O que dizem os “neomalthusianos” sobre os recursos naturais mundiais? 85. Em sua opinião, a tecnologia traz benefícios ou malefícios? 86. Quais os fatores que a ONU aponta, no que tange à absorção de tecnologia estrangeira? 87. Cite alguns dos problemas acarretados pela dependência tecnológica. 88. Quais os problemas atuais que impedem uma maior integração econômica no Cone Sul? TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 90 TÓPICOS DE HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ______________________________________________________________________ 91 BIBLIOGRAFIA ADAM SMITH/RICARDO. Coleção Os Pensadores. Abril Cultural. 2. ed. São Paulo. 1979. AMIN, S. O Desenvolvimento Desigual. Forense-Universitária. Rio de Janeiro. 1976. BREAUD, Michel. História do Capitalismo de 1500 aos nossos dias. Brasiliense. São Paulo. 1987. CASTRO, Paulo de. Rosa Luxemburgo – Socialismo e Liberdade. Forum Editora. Rio de Janeiro. 1968. DOBB, M. A. A Evolução do Capitalismo. 5ª edição. Zahar. Rio de Janeiro. 1987. FISCHER, Ernst. 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