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Aula 2-ESTADO_E_SOCIEDADE_NOVAS_REGRAS_DO_JOGO_OSZLAK

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Enviado por Fiama Nadine Ramalho de Sá em

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Estado e Sociedade: Novas Regras do Jogo?1 
 
Oscar Oszlak2 
 
1 Introdução............................................................................................................................1 
2 As fases ou etapas da reforma estatal ...............................................................................3 
3 Sobre papéis e agendas .....................................................................................................5 
4 A tripla relação Estado-Sociedade......................................................................................9 
5 As relações funcionais ......................................................................................................14 
6 As relações materiais ........................................................................................................21 
7 As relações de dominação................................................................................................27 
8 Globalização, Internacionalização e Integração...............................................................36 
9 Reflexões Finais ................................................................................................................43 
10 Bibliografia .........................................................................................................................45 
 
1 Introdução 
 
Em boa parte do mundo, a última década tem sido testemunha de transformações 
fundamentais, tanto nas relações entre os Estados e suas sociedades nacionais como nos 
padrões de organização econômica e política no plano internacional . 
Fenômenos como a desregulação e abertura de mercados, o ajuste do Estado e a 
economia, a desocupação e flexibilização trabalhista, a privatização de empresas e serviços 
públicos, a descentralização administrativa e a integração regional, têm redefinido os papéis 
tradicionais do Estado nacional -principalmente suas funções benfeitoras e empresarias- 
recolocando ao mesmo tempo o papel do mercado, a empresa privada, os atores e espaços 
sub e supranacionais. Estes processos têm contribuído para conformar distintas 
modalidades de um capitalismo desorganizado e difuso, mas hegemônico em relação a 
outras formas de organização econômica. 
Ao mesmo tempo, a história recente registra ondas democratizadoras, lutas por novos 
direitos sociais, desequilíbrios cada vez mais profundos entre pobres e ricos (tratando-se de 
 
1 Revista Reforma y Democracia Nº 9 (1997) CLAD. Caracas. 
2 Tradução do espanhol de Henrique Novaes e adaptação e revisão de Renato Dagnino (GAPI – Unicamp) 
 2
países ou de classes sociais), recrudescimento da xenofobia e os fundamentalismos 
religiosos, fenômenos que também têm contribuído para transformar radicalmente as 
relações sócio-políticas dentro de, e entre, Estados nacionais. 
Estes processos têm voltado a colocar no centro do debate acadêmico a problemática do 
Estado, que tão fertilmente foi tratada pela literatura especializada nos anos 70, e 
praticamente desaparecera da agenda acadêmica dos 80, substituída pelos temas da 
democracia e o renascimento da sociedade civil. Ao final dessa década e, sobretudo, ao 
longo dos 90, o tema do Estado voltou como problema de pesquisa e ação, mas sobretudo a 
partir da constatação de que sua dimensão e formas de intervenção estavam sofrendo uma 
transformação profunda. 
Entretanto, boa parte da recente e prolífica produção acadêmica e técnica em torno da 
reforma do Estado se caracteriza por um tratamento que tende a destacar alguns aspectos 
deste processo e a omitir outros, certamente significativos, razão pela qual se distorce ou 
obscurece sua devida interpretação. Um traço destacado desta nova produção é a alta 
proporção de trabalhos que, junto com a descrição e avaliação de processos concretos de 
reforma, expõem posições normativas ou prescritivas sobre modelos de Estado desejáveis 
que guardam escassa correspondência com a orientação que manifestam boa parte das 
reformas em curso. 
Neste trabalho, me proponho a desenvolver um esquema analítico que permita situar os 
processos de transformação do Estado e sociedade, no marco das profundas mudanças 
que se têm operado no capitalismo como sistema de produção e organização social. Neste 
sentido, analisarei particularmente se, no bojo de tais transformações, também vem sendo 
modificadas as regras do jogo que governam as relações Estado-Sociedade, com a intenção 
de contribuir para a construção de uma agenda de pesquisa mais sensível à 
multidimensionalidade e impacto das recentes transformações. 
Neste sentido, a hipótese central que orientará o trabalho é que as regras fundantes em que 
se baseiam os vínculos entre o Estado e a sociedade não têm variado, porque são as 
mesmas em que se funda o sistema capitalista como modo de organização social; o que 
provavelmente tem mudado são alguns dos atores, suas estratégias e os resultados do jogo 
em si. Antes de examinar esta hipótese, apresentarei sinteticamente algumas das 
tendências fundamentais das transformações que estão operando. 
 
 3
2 As fases ou etapas da reforma estatal 
 
Tanto as experiências recentes de reforma do Estado como a bibliografia que delas se tem 
ocupado tende a enfatizar: (a) a necessidade de menos Estado, mais que de menor 
Estado3; (b) as mudanças no nível nacional, em detrimento dos processos no nível sub-
nacional; (c) os aspectos funcionais da reforma, descuidando dos relativos à redistribuição 
do poder e a renda; e (d) a aparente autonomia estatal -especialmente do Poder Executivo 
- na adoção das decisões sobre reforma, sem levar devidamente em conta sua forte 
dependência com relação às restrições e condicionamentos tanto domésticos como 
supranacionais . 
Em geral, estas ênfases coincidiram com o que se tem chamado a “primeira” fase ou etapa 
da reforma estatal, distinguindo esta de uma “segunda” fase cujas características são 
certamente distintas. 
Como no caso da substituição de importações, que teve sua “etapa fácil”, existiria uma 
semelhança na reforma do Estado, enquanto (en tanto) pareceria que muitos países estão 
completando a etapa mais espetacular deste processo mas, em última instância, mais 
simples desde o ponto de vista de sua implementação e êxito relativo. Esta etapa - que 
poderíamos denominar “cirúrgica”, por sua rapidez e radicalidade- se caracterizou pelos 
traços antes assinalados: uma aparente autonomia dos Poderes Executivos dos países 
latino-americanos para fixar novas fronteiras funcionais com a sociedade e reduzir o 
tamanho e intervenção do Estado nacional (Naim, 1996). 
A etapa que ainda não se iniciou na maioria das experiências nacionais é a “difícil”, a de 
“reabilitação pós-operatória”, a que está implícita em outros termos das opções colocadas 
mais acima, quer dizer, conseguir um melhor Estado (não somente menor), tecnológica e 
culturalmente mais avançado, contemplando o fortalecimento daquelas instituições e 
programas que promoveram novos equilíbrios nos planos da redistribuição da renda do 
poder social, e priorizando, ademais, as mudanças necessárias para introduzir nas 
instâncias sub-nacionais, incluindo especialmente os mecanismos de participação cidadã 
nesses níveis. 
O imperativo reducionista que caracterizou a primeira etapa da reforma teve, obviamente, 
uma íntima relação com a abertura externa, a liberalização econômica e a avassaladora 
 
3 Ainda quando pode se considerar que um aparato estatal mais reduzido é condição necessária e etapa prévia 
para a obtenção de um melhor Estado. 
 4
instauração de uma ortodoxia capitalista desconhecida na experiência histórica mundial,
processos promovidos compulsivamente em países com diferente orientação política ou 
ideológica. Ainda em casos extremos, como na China Popular, a reforma estatal se colocou 
como peça central da transição para uma economia de mercado que, sem renunciar aos 
postulados ideológicos do socialismo, exigia a adoção do que se denominou “Three Fixes” 
ou “Triple Decision Principle”: reduzir o conteúdo e alcances da intervenção estatal; diminuir 
o número de unidades organizativas e contrair o tamanho do quadro de pessoal . 
Com esta observação, quero marcar dois aspectos que parecem caracterizar os atuais 
projetos de reforma do Estado e os diferenciam de experiências prévias. Primeiro, a 
dificuldade para distinguir onde termina a reforma econômica e onde começa a reforma 
estatal; segundo, a relativa independência desta última tendo em vista a natureza da 
organização social e política pré-existente, assim como, até certo ponto, com relação às 
exigências da crise fiscal. 
Acerca deste diagnóstico dominante que observa a hipertrofia do Estado como principal 
responsável dos sérios desajustes produzidos no financiamento do gasto público, a 
associação entre crises fiscais e reforma estatal resulta óbvia: os programas de ajuste 
estrutural aparecem como a resposta tecnicamente racional para recuperar os equilíbrios 
macroeconômicos perdidos. 
Mas o até pouco tempo intocável edifício estatal não teria visto sacudidos seus alicerces se 
sua demolição ou reformulação fosse unicamente uma resposta ao desequilíbrio fiscal, por 
mais crônico que este aparecera aos olhos dos gestores políticos. Depois de tudo, as 
guerras e crises econômicas do passado só deram lugar a mais e não a menos Estado, 
como ilustram particularmente as políticas keynesianas adotadas em seguida à Grande 
Depressão ou às crescentes ampliações do gasto público – inflexíveis à baixa – alcançadas 
por Estados beligerantes em seguida a uma guerra (Peacock e Wiseman, 1961). Ademais, 
muitas das experiências atuais de reforma estatal têm lugar no contexto de economias 
prósperas, onde a crise fiscal não parece ser o fator determinante nem o ajuste ortodoxo de 
uma política que deva ser aplicada custe o que custar. Em países tão contrastantes como 
Nova Zelândia, Chile ou a República Tcheca, para citar só alguns exemplos, a força motora 
dos processos de reforma estatal parece ter se originado muito mais centralmente nas 
necessidades de inserção exitosa dentro de uma nova ordem capitalista globalizada. 
Nestes casos, pode-se afirmar que a reforma do Estado aparece como um complemento 
indispensável de uma transformação no plano da organização social e econômica, que 
 5
resulta muito mais significativa e a ela outorga sentido. Trata-se, no fundo, de um profundo 
re-estabelecimento do papel e da agenda do Estado, assim como de suas relações com a 
sociedade civil. 
 
3 Sobre papéis e agendas 
 
Apesar de seu crescente descrédito e do virtual desmantelamento a que nos tem submetido 
à investida neo-conservadora, o Estado segue sendo a máxima instância de articulação 
social. 
Utopias extremas, como o anarquismo, o comunismo ou o ultra-liberalismo, jamais se têm 
visto concretadas historicamente sob a forma de sociedades plenamente desestatizadas. 
Contudo, as mudanças produzidas nos últimos anos no papel do Estado têm sido 
vertiginosas e radicais. Pelo menos, têm sido muito mais velozes que o ritmo demonstrado 
ver.Em um trabalho prévio afirmei que estas mudanças encobrem, na realidade, 
transformações muito mais profundas, que transcendem a esfera estatal e abarcam o 
conjunto da sociedade. Para dizer sobre isso em poucas palavras, a reforma do Estado e de 
seu papel entranha, também, uma reforma da sociedade civil. Ou, para ser mais preciso, 
uma redefinição das regras do jogo que governam as relações entre ambas esferas (Oszlak, 
1994). Uma reflexão mais profunda sobre este ponto me leva agora a recolocar: tal como 
formula a minha hipótese central, talvez não se trate de uma mudança de regras senão bem 
mais de jogadores, estratégias e resultados do jogo. 
A mais visível destas regras que governam as relações Estado-Sociedade – e a que maior 
atenção tem recebido nos trabalhos sobre a reforma do Estado – é a relativa ao esquema de 
divisão social do trabalho. Se há algum fenômeno que captura de imediato a atenção do 
observador destes processos é a radical modificação produzida em poucos anos na 
responsabilidade assumida pelos Estados sub-nacionais e o setor privado na produção de 
bens e serviços dos que antes se ocupavam do Estado Nacional. 
Este fenômeno – que tenho caracterizado em termos de “novas fronteiras” traçadas entre os 
domínios legítimos da sociedade e o Estado nacional- (Oszlak, 1994), tem ofuscado os 
acadêmicos e analistas políticos, a ponto de que a reforma do Estado tem tendido 
freqüentemente a ser confundida com a privatização, a descentralização, a desregulação ou 
a lobotomizção de seu aparato institucional, medidas que somente instrumentam este 
 6
deslocamento fronteiriço e o conseqüente novo “tratado de limites” entre Sociedade e 
Estado. 
No referido trabalho, sustentei que para uma interpretação mais acabada das 
transformações que estão sendo produzidas, conviria observar as interações Estado-
Sociedade em termos de uma tripla relação, que leve em conta os três tipos de vínculos 
através dos quais, em última instância, se resolvem os conteúdos da agenda social vigente 
e as formas de resolução das questões que a integram (Oszlak e O'Donnell, 1976). Estas 
relações têm considerável incidência na forma como se distribuem, entre ambas instâncias, 
a gestão do público, os recursos de poder e o excedente social. 
O foco central deste artigo é aprofundar a análise destes três planos de interação entre 
Estado e Sociedade, mostrando suas conexões recíprocas e sua vinculação com as 
características do modelo de organização econômica e reprodução social que subjaz a estes 
processos. Sobre essa base, indica-se a construção de um modelo analítico, com 
pretensões explicativas, que permita observar e interpretar, desde um novo ângulo, a lógica 
global em que parecem inscrever-se os atuais processos de reforma do Estado e deduzir, a 
partir deste, algo acerca dos padrões que estão se configurando nas relações Estado-
Sociedade. 
Para começar a destrinchar o tema, farei uma afirmação categórica: O Estado é aquilo que 
faz. Pode-se inferir sua natureza a partir de suas ações. Estas se executam 
necessariamente através de um aparato institucional, cuja configuração e padrão de 
atribuição de recursos lhe conferem uma determinada identidade. Bastaria esta simples 
observação para sustentar a afirmação efetuada, se não deixasse pendente um 
questionamento prévio: o quê faz com que o Estado faça o que faz? A pergunta evoca de 
imediato – não casualmente – a questão da razão mesma de ser do Estado. Já não se trata 
somente do problema de sua identidade senão também de sua essência, de sua 
“necessidade” e de seu papel na trama das relações sociais. Afirma-se com freqüência que 
a reforma do Estado leva à transformação de seu papel. A afirmação é quase tautológica 
porque, se a reforma é real, o Estado já haverá assumido - nesse mesmo processo- um 
papel diferente. 
Entretanto, num sentido primitivo, genético, poderia se sustentar que o papel do Estado não 
muda porque, pelo contrário, estaria negando sua essência. Com efeito, se definimos o 
Estado como a principal instância de articulação de relações sociais e estas relações 
correspondem a um determinado padrão de organização e controle social -a ordem 
 7
capitalista- cuja vigência e reprodução o Estado contribui para garantir, as supostas 
mudanças de papéis seriam, simplesmente,
adaptações funcionais condizentes para 
reafirmar esse papel originário. O quê é o que muda então? Para responder a esta pergunta 
recorrerei a uma breve digressão histórica. O surgimento do Estado-Nacional como forma de 
dominação, tem Estado identificado com a aparição e desenvolvimento do sistema 
capitalista. Sua formação tem sido parte constitutiva de um processo de construção social 
caracterizado -entre outros atributos- pela delimitação de um espaço territorial, o 
estabelecimento de relações de produção e troca, a conformação de classes sociais e o 
desenvolvimento de sentimentos de pertencimento e destino comum que deram conteúdo 
simbólico à idéia de nação (Oszlak, 1982, 1997). 
Portanto, a formação do Estado é um aspecto do processo de definição e construção dos 
diferentes planos e componentes que estruturam a vida social organizada. Em conjunto, 
estes planos conformam uma certa ordem cuja especificidade depende de circunstâncias 
históricas complexas. 
Contudo, esta ordem social não é simplesmente o reflexo ou resultado da justaposição de 
elementos que confluem historicamente e se encadeiam de maneira unívoca. Pelo contrário, 
o padrão resultante depende também dos problemas e desafios que o próprio processo de 
construção social encontra em seu desenvolvimento histórico, assim como das posições 
adotadas e recursos mobilizados pelos diferentes atores – inclusive o próprio Estado- para 
resolvê-los. Estes problemas e desafios são parte da agenda do Estado-Nacional sempre 
em mudança. 
A agenda estatal representa o “espaço problemático” de uma sociedade, o conjunto de 
questões não resolvidas que afetam a um ou mais de seus setores -ou à totalidade dos 
mesmos- e que, portanto, constituem em objeto de ação do Estado, seu domínio funcional. 
As políticas que este adota são, no fundo, tomadas de posição de seus representantes e 
instituições frente às diversas opções de resolução que essas questões vigentes admitem 
teórica, política ou materialmente. A vigência destas questões, quer dizer, sua presença 
permanente na agenda, revela a existência de tensões sociais, de conflitos não resolvidos e 
de atores mobilizados em torno da busca de soluções que expressem seus interesses 
particulares e valores. 
Disto se infere sobre a inerente conflitividade do processo de resolução de questões sociais 
e de agenda que elas contêm. O papel do Estado em cada momento histórico poderia ser 
concebido como uma expressão político-ideológica desta agenda vigente. Seria, em certo 
 8
sentido, uma decantação das políticas ou tomadas de posição predominantes e de sua 
conseqüência: a conformação de um aparato institucional orientado a resolver as questões 
no sentido escolhido, colocando em jogo para ele os diversos recursos de poder que em 
cada momento está em condições de mobilizar. 
Colocado neste plano de análise, esse papel estatal congênito e transcendente, pode 
expressar-se em termos de umas poucas questões constitutivas da agenda que insinua, 
basicamente, os problemas de reprodução de uma ordem social na qual podem 
desenvolver-se as forças produtivas. No século passado, estas questões se sintetizaram na 
fórmula “Ordem e Progresso”. Já neste século é transformada em tensão permanente da 
expansão do capitalismo, esta fórmula foi sucessivamente rebatizada “Segurança e 
Desenvolvimento”, “Estabilidade e Crescimento”, “Governabilidade e Produtividade” ou, em 
sua versão argentina atual, “Ajuste e Revolução Produtiva”. 
Assim como no século XIX era preciso gerar condições de “ordem” sob a quais pudesse 
prosperar a atividade econômica, a palavra de ordem atual tem características similares: 
demonstrar, mediante uma série de decisões genericamente denominadas “ajuste”, que se 
está apontando para a criação de um horizonte de previsibilidade, de permanência de certas 
regras do jogo, que supostamente deveriam induzir os agentes econômicos a realizar a 
“revolução produtiva”. 
Obviamente, a agenda não se esgota nestas duas grandes questões. Uma terceira, surgida 
e instalada firmemente na cena pública em fins do século passado, foi a “questão social”, 
quer dizer, os conflitos ao redor da distribuição eqüitativa da renda, a riqueza e as 
oportunidades, suscitados em virtude das tensões e contradições sociais geradas pela 
ordem capitalista que foi se conformando. Para enfrentá-la e tentar resolver seus aspectos 
mais críticos, o Estado-Nacional assumiu novas responsabilidades que gradualmente foram 
se formalizando juridicamente e cristalizando institucionalmente, através de sucessivas 
adições ao aparato burocrático existente. 
Esta nova manifestação do papel estatal na moderação do conflito social, se traduziu em 
programas e políticas que apontaram -entre outros objetivos- à redução da pobreza, à 
obtenção de melhores condições de trabalho e negociação trabalhista, enfim, à preservação 
da saúde, a instituição de regimes de previdência social ou a extensão da educação às 
camadas mais despossuídas da população, ações que foram definindo os traços 
característicos do denominado Estado de Bem-Estar . 
 9
Certamente, a adição desta terceira questão tampouco esgota a agenda, mas, em todo 
caso, poderia argumentar com certo fundamento que nas questões de ordem ou 
governabilidade da sociedade, do desenvolvimento das forças produtivas e da redução das 
desigualdades sociais, se concentra grande parte da agenda problemática do Estado. Todas 
elas geram necessidades e opções para sua intervenção mas, paradoxalmente, também 
originam pressões para que a responsabilidade de resolver essas questões seja transferida 
a outras instâncias e atores sociais... ou às forças do mercado. 
Por exemplo, para “descer a terra” estas reflexões abstratas, a reclusão de delinqüentes ou 
o controle do estacionamento de veículos numa via pública –gestões vinculadas 
principalmente com a manutenção da “ordem” - têm sido exercidas tradicionalmente pelo 
Estado, mas as experiências de gestão privada nesta área (geralmente, sob contratos de 
concessão de serviços) estão se estendendo. Outras funções que o Estado exerceu 
intensamente, como o controle de preços, da paridade cambial ou do investimento externo, 
têm sido gradualmente confiadas à mão visível do mercado. 
No que se refere à promoção do desenvolvimento, o papel preponderante cumprido pelo 
Estado como produtor de bens e serviços, como principal responsável pelo avanço científico 
e tecnológico, como regulador do mercado de trabalho, como construtor da infra-estrutura 
material dos países ou, inclusive, como interventor no comércio exterior, tem dado passo a 
um crescente abandono de suas funções reguladoras e empresariais, posição que tem 
tendido a favorecer o grande capital privado, nacional e transnacional. 
Por último, também as funções relativas ao bem-estar (saúde, educação, previdência social, 
moradia) têm sido praticamente abandonadas pelo Estado-Nacional tendo em vista seu 
papel como produtor direto de bens e serviços nestas áreas, as quais têm sido assumidas 
pelos Estados sub-nacionais, a empresa privada e as ONGs. 
Como resultado, a agenda de questões socialmente problematizadas e o papel do Estado-
Nacional em sua resolução, têm sofrido uma profunda mutação quantitativa e qualitativa. 
Meu argumento central é que este processo deve ser interpretado não somente em termos 
funcionais – quer dizer, “de que deve ocupar-se O Estado-Nacional” - senão também desde 
a perspectiva de “quem decide de que tem que se ocupar” e “quanto custa a quem”. 
 
4 A tripla relação Estado-Sociedade 
 
 10
Esta colocação propõe, definitivamente, observar as relações Estado-Sociedade em três 
planos diferentes: no funcional ou da divisão social do trabalho; no material
ou da 
distribuição do excedente social; e no da dominação ou da correlação de poder. Na Figura 
1 se observa que a agenda do Estado se vê modificada pelos processos que tem lugar em 
cada um destes planos, assim como pelos que vinculam aos mesmos entre si. Em cada 
plano tenta-se representar as relações Estado-sociedade em termos de esferas funcionais, 
fiscais e de poder, que tem um âmbito próprio (estatal ou social) e uma zona partilhada4. 
No caso das relações funcionais, ambas as esferas têm responsabilidades exclusivas mas 
também dividem um âmbito de intervenção comum (por exemplo, serviços educativos, de 
transporte, de pesquisa e desenvolvimento) representado na zona partilhada (em cinza) que 
exige, por parte do Estado, não só a prestação dos serviços que lhe cabe mas também – 
segundo os casos- diversas formas de regulação e promoção da atividade privada. 
No plano fiscal e re-distributivo, cada esfera participa na distribuição do excedente social 
mas a zona de superposição expressa a massa de recursos que o Estado nacional extrai da 
sociedade e devolve à mesma através de gastos, transferências ou inversões que 
favorecem a determinados setores, cumprindo um papel re-distributivo. 
 
Internacionalização Integração
Globalização
Governabilidade
Desenvolvimento Equidade
AGENDA
Correlação 
de poder
Redistribuição
de renda
Divisão
Social do 
Trabalho
G + D + E =
Capitalismo Social e
Democrático 
 
4 Cabe esclarecer que a esfera estatal, em todos os casos, abarca exclusivamente o Estado nacional. Por 
razões de simplificação gráfica, as instâncias estatais sub-nacionais estão incluídas globalmente na esfera da 
sociedade. 
 11
 
Por último, nas relações de dominação, também se representam simbolicamente os 
recursos de poder que podem mobilizar o Estado e a sociedade, distinguindo-se uma zona 
comum que pretende expressar o espaço de legitimação do poder por parte da sociedade e 
que, enquanto se mantém, pode-se considerar como recurso de poder do Estado. 
As Figuras 1 e 2 destacam, também, uma dimensão externa ao espaço nacional, na qual 
caberia incluir as variáveis do contexto internacional que incidem sobre as relações dentro 
de, e entre, os três planos considerados, afetando em última instância os conteúdos da 
agenda de questões socialmente problematizadas. Refiro-me, fundamentalmente, aos 
impactos da globalização, à internacionalização do Estado e à integração regional, assim 
como aos atores institucionais que operam nesse âmbito supranacional, desencadeando 
processos que incidem sobre a distribuição do poder, os recursos materiais e a gestão 
pública dos países. 
 
Figura 2
REGRAS DO JOGO ESTADO E SOCIEDADE
Governabilidade
E N
E NE N
Desenvolvimento Equidade
Legitimidade 
de poder
Gestão
LEGITIMIDADE
CO-GESTÃO
REDISTRIBUIÇÃO
Imposição
Representação
Gestão
Imposição
 
Ainda que as relações em cada um destes planos estejam governadas por regras do jogo 
próprias, meu argumento central é que essas regras estão subordinadas, por sua vez, a 
outras de ordem superior, que se origina dos vínculos que se estabelecem entre os três 
planos considerados. 
Talvez a mais antiga destas regras de ordem superior, que remete aos papers do El 
Federalista, é a clássica "no taxatiom without representation", em óbvia alusão ao vínculo 
 12
entre o plano material e o plano das relações de poder entre Estado e sociedade. Num 
vocabulário mais vulgar, equivaleria a dizer: "me nego a pagar impostos se não se me 
outorga, previamente, o poder de designar meus representantes", principal recurso de poder 
cidadão no plano político. 
Mas por sua vez, esta regra suporta sua recíproca: "no power without taxation", já que no 
poder fiscal reside um dos pilares do poder do Estado, e esse poder não se adquire jamais 
sem recursos tributários. 
Poderíamos estender este raciocínio às relações recíprocas entre os outros dois planos. Por 
exemplo, a regra básica na relação entre os planos funcional e material (ou fiscal) seria, se 
me permitem continuar utilizando a forma austera da expressão inglesa, "no taxatiom without 
delivery”, ou seja, “também me nego a pagar impostos se não recebo em troca serviços 
medianamente satisfatórios”. A recíproca "no delivery without taxation” também seria certa, 
já que mal poderia o Estado entregar esses bens e serviços sem obter os recursos materiais 
para isto. 
De igual maneira, nas vinculações entre os planos funcional e de poder, se poderia delinear 
outro par de regras do jogo: "no legitimacy without delivery", mas ao mesmo tempo, "no 
delivery without power". Quer dizer, a legitimidade do Estado, fonte em parte de um poder 
que em última instância deriva da sociedade, dependerá em boa medida da magnitude e 
qualidade dos bens e serviços que presta, mas estes não poderão se originar se o Estado 
não dispõe do poder e a capacidade institucional necessários. 
A Figura 1 tenta representar estas relações. Ainda que as regras subjacentes sejam 
relativamente estáveis e marquem as características básicas do jogo de em que participam 
os atores sociais e atores estatais, o desenvolvimento das partidas em cada momento 
histórico e os resultados em cada um dos planos da relação são incertos, ainda que – e este 
é meu argumento – esses resultados sejam mutuamente determinantes. Esta afirmação 
requer alguns esclarecimentos. 
No plano funcional, a legitimidade do papel cumprido historicamente pelo Estado tem sido 
submetida a um profundo questionamento. A fronteira que separa os domínios funcionais do 
Estado e a sociedade moveu-se, diminuindo o campo de ação admitido de intervenção 
estatal. A divisão do trabalho entre uma e outra esfera fixa hoje limites muito mais extremos 
do que o Estado pode e deve fazer. 
Desde sua particular concepção ideológica, o discurso conservador justifica este novo 
“tratado de limites” em termos puramente funcionais: trata-se de que “a sociedade” recupere 
 13
a iniciativa frente a um aparato estatal parasitário e ineficiente, assumindo ou reassumindo 
tarefas que no momento oportuno foram expropriadas pelo Estado intervencionista. 
Observemos que, nesta perspectiva, os alcances da relação entre Estado e sociedade se 
reduzem a um problema de fixar novas regras do jogo entre ambos, a partir de uma análise 
“técnica” centrada na eficácia e eficiência relativas de uma ou outra gestão social. Deixemos 
de lado a ficção deste suposto novo protagonismo que estaria assumindo “a sociedade”, 
suposta herdeira de franjas de ação estatal privatizadas. Bem sabemos que os que 
efetivamente possuem direitos são os grupos econômicos mais poderosos e que, longe de 
conduzir a uma gestão mais democrática da coisa pública, a divisão da herança tende a 
criar um verdadeiro Estado privado5. 
O ponto que vale a pena destacar é que, ao expor o assunto do jogo novamente, os outros 
planos da relação – o material e o de poder- também sofrem profundas alterações. Com 
efeito, a divisão do trabalho entre Estado e Sociedade (quer dizer, quem gere o quê) 
pressupõe uma relação antecedente e outra resultante. A primeira delas é, simplesmente, a 
particular relação de poder existente entre ambos. É evidente que a decisão de minimizar o 
Estado não responde unicamente às exigências técnicas de sua crise fiscal, sendo 
especialmente a nova correlação de forças que tem se tem estabelecido entre os grupos 
econômicos altamente concentrados e os representantes estatais, em um marco de 
crescente globalização das relações econômicas e políticas. 
A relação resultante se vincula com a distribuição do excedente econômico, através das 
vinculações fiscais existentes entre
Estado e sociedade. Se o Estado cede parcelas de seu 
domínio funcional a certos gestores privados ou a instâncias sub-nacionais, renuncia 
simultaneamente a sua pretensão de obter da sociedade os recursos que se requereriam 
para manter as respectivas funções dentro do âmbito estatal. Em outras palavras, a uma 
menor intervenção corresponderá uma menor participação no excedente, tanto para 
sustentar o funcionamento do aparato institucional do Estado nacional, como para cumprir 
uma função re-distributiva à que tem renunciado de antemão pela simultânea vigência de 
uma nova concepção sobre as responsabilidades estatais e sociais na gestão do público e 
de uma nova correlação de forças. 
 
5 O conceito de “sociedade civil” tem sofrido nos anos recentes novas interpretações e alcances. Os autores 
tendem a coincidir que é preciso distinguir, dentro da sociedade, ao menos quatro setores: o coercitivo ou setor 
público estatal; o lucrativo, que coincide genericamente com o mercado; o voluntário ou não lucrativo, a que 
pode denominar-se mais propriamente sociedade civil e o lar, constituído pela família e a vizinhança. Ver 
Ilchman (1997). 
 14
Delineado assim o jogo, o resultado é previsível, ainda que não inevitável: uma menor 
presença do Estado na gestão dos assuntos sociais, unida a uma menor capacidade de 
extração e alocação de recursos, tenderia a debilitar ainda mais sua posição de poder frente 
aos setores economicamente dominantes da sociedade. 
O quadro revela-se ainda mais complexo quando se considera que este conjunto de 
relações, por sua vez, se vê crescentemente condicionado pelos processos de globalização, 
integração econômica e internacionalização do Estado, cuja influência em cada um dos 
planos analisados não se pode minimizar. Tanto o poder para definir as questões que 
integrarão a agenda estatal, os esquemas adotados para geri-la e as possibilidades de obter 
e alocar os recursos necessários para resolver as questões que a integram, encontram-se 
fortemente influenciados por decisões e ações adotadas por múltiplos atores supra-
nacionais, se trate de governos estrangeiros, meios de comunicação, organismos de 
financiamento externo, investidores, terroristas, narcotraficantes, instâncias regionais ou 
mundiais para a compatibilização de políticas econômicas, de cooperação, de defesa, etc. 
Em seguida a esta apresentação geral das regras do jogo básicas, proponho que nos 
intermemos em cada um dos planos da relação Estado-sociedade, a fim de analisar com 
maior profundidade a natureza do jogo, que esta sendo jogado através da aplicação recente 
dessas regras e as mudanças produzidas como conseqüência disto. 
 
5 As relações funcionais 
 
Consideremos a primeira questão: de que deve ocupar-se o Estado nacional? Desde a sua 
constituição como suprema instância de articulação social, a fixação dos conteúdos e 
alcances de seu papel tem sido tanto resultado de atos relativamente autônomos como de 
influências exercidas por diversas clientelas que circunstancial ou permanentemente têm 
controlado ou tido acesso privilegiado a seus mecanismos de decisão, incluindo à própria 
burocracia estatal vista como cliente6. Em alguns casos, as apropriações funcionais têm sido 
excludentes -como ocorre com as relações exteriores ou a administração da justiça, em que 
por considerações éticas, políticas ou de outra índole, não é aceitável que outro agente 
social -privado ou público- exerça tais funções . 
 
6 Em Oszlak (1977), distingui os papéis "infra-estrutural", "clientelístico" e "setorial" para referir-me aos 
interesses representados no exercício de cada função. 
 15
Em outros casos, o Estado nacional tem partilhado com outros atores (empresas privadas, 
ONGs, governos locais) a responsabilidade de produzir bens ou prestar serviços (como nas 
áreas de transporte, educação ou saúde), entrando inclusive às vezes em situações de 
competição. 
Finalmente, em certas áreas, o Estado nacional tem se privado de intervir, ainda em 
presença de um interesse geral (por exemplo, em serviços de carga portuária, abatedouros, 
coleta de lixo, administração de cemitérios), por considerar que a empresa privada ou os 
municípios, por exemplo, se acham em melhores condições de proporcionar estes serviços 
Não tem existido uma “regra de ouro” para decidir os alcances destas diversas formas de 
intervenção. Dependendo do peso relativo de fatores ideológicos, falhas de mercado, 
capturas burocráticas, debilidade dos Estados sub-nacionais ou de outros fatores sociais 
relevantes (como, por exemplo, a inexistência de uma burguesia nacional), os Estados 
nacionais tenderão a cobrir esferas de atuação mais ou menos extensos. Entretanto, uma 
característica quase universal destes processos de delimitação funcional -e, portanto, de 
definição de seu papel frente à sociedade- tem sido sua contínua expansão. Nesse contexto, 
as reformas do Estado foram, tradicionalmente, tentativas de obter maior eficiência na 
gestão de campos de intervenção estatal cuja legitimidade normalmente não se 
questionava. 
Pelo contrário, a principal diferença das reformas iniciadas na segunda metade dos 80's, 
tendo em vista as levadas a cabo no passado, é que implicaram numa reversão do ciclo 
histórico de expansão permanente de seu aparato institucional. Pela primeira vez, se 
delineia não somente uma maior eficiência na atribuição do gasto público, como uma 
verdadeira demolição do Estado. 
A crise da dívida foi, sem dúvida, o detonador das reformas. Mas o clima ideológico que se 
via instalado no mundo e que se consolidou a partir da queda do Muro de Berlim, 
prepararam o terreno para que as políticas de ajuste incluíssem, centralmente, o recorte de 
um aparato estatal que havia crescido para além das possibilidades de sustentação por 
parte das sociedades em crise. 
No plano funcional se delinearam, de fato, dois tipos de reformas muito diferentes. A 
primeira, como já comentara, foi cirúrgica. A segunda se propõe como de "reabilitação e 
fortalecimento". A primeira eliminou partes completas do organismo estatal, seja diretamente 
através da venda de empresas ou a transferência de serviços, ou indiretamente mediante a 
eliminação de regulações que até então demandavam uma densa trama institucional para 
 16
sua administração. Na Argentina e outros países de América Latina -como Chile, Colômbia e 
Bolívia- foi relativamente fácil, em termos do grau de oposição encontrado para sua 
execução. Em outros casos, como no Uruguai e Brasil, os avanços foram muito mais difíceis 
devido à oposição enfrentada. 
No caso argentino, o Estado nacional se desprendeu até agora da totalidade das empresas 
produtoras de bens ou prestadoras de serviços. Contudo, muitas privatizações se levaram a 
cabo sem consultas, sem estudos prévios, e sem atentar para os passos que aconselham as 
melhores práticas neste campo7. A venda indiscriminada de empresas, freqüentemente 
estado quase falídas, despertaram sérias suspeitas de corrupção. 
As principais privatizações concretizadas nos primeiros ano criaram condições 
excessivamente vantajosas aos concessionários, seja em termos de tarifas, prazos de 
concessão, preço da operação, condições de pagamento, etc. Ao contrário, tanto na 
experiência internacional como nos casos verificados mais recentemente na Argentina, as 
privatizações mais exitosas apelam aos mercados de capitais e a colocação de ações em 
condições mais transparentes. 
Sem pretender realizar uma análise exaustiva destes processos – o que excederia ao 
alcance do presente trabalho – gostaria de marcar algumas conseqüências da privatização, 
particularmente
no caso argentino, que podem ilustrar algumas das hipóteses exploradas no 
trabalho. 
Tem se assinalado, por exemplo, que os processos de privatização não foram, neutros 
tendo em vista a organização econômica preexistente. No caso argentino, a aquisição de 
ativos do setor público se produzir no periodo de muito poucos anos e mobilizou capitais 
consideráveis, gerando um fenômeno de crowding out8 dos projetos de investimento no 
resto do aparato produtivo. Katz (1993) sugere que por esta razão, seu custo de 
oportunidade em termos de crescimento industrial e capacidade exportadora esteve longe 
de ser nulo. 
Por outro lado, a experiência neste campo durante a última década, revela que a 
privatização não se reduziu a simples venda ou transferência de empresas públicas ao setor 
privado. O fenômeno foi muito mais abrangente e alcançado aspectos mais sutis, menos 
 
7 O caso de Nova Zelândia, onde a privatização foi precedida pelos processos de comercialização e 
corporativização, antes de proceder à privatização. 
8 A expressão crowding out descreve o efeito que o déficit público tem sobre a taxa de juros e sobre os 
investimentos das empresas. Crowd quer dizer multidão e também aperto, e um lugar está crowded quando 
muito cheio de gente. Se alguém ou algo está crowded out quer dizer que foi expulso ou deslocado para fora de 
um lugar porque ele ficou muito cheio. [Nota do Tradutor]. 
 17
evidentes. Esta idéia tem sido adequadamente colocada por Feigenbaum e Hening (1994), 
que denominam privatização sistêmica àquela que aponta a re-configurar a sociedade em 
seu conjunto, alterando as instituições e os interesses econômicos e políticos. As 
privatizações sistêmicas tratam de: 1) diminuir as expectativas da sociedade em relação às 
responsabilidades do Estado; 2) reduzir a manutenção e apoio da infra-estrutura por parte 
do setor público e 3) transformar o mosaico de grupos de interesse para fazê-lo menos 
propenso a apoiar o crescimento do aparato do Estado. 
Entre outras coisas, a privatização sistêmica envolve “uma mudança nos valores, cultura e 
expectativas sobre a atividade pública” (Feigenbaum e Hening, 1994). Ela produz uma 
expansão da esfera das atividades consideradas pessoais privadas e um encolhimento da 
esfera de atividades consideradas como áreas legítimas do domínio e da intervenção 
pública. A isto se refere, por exemplo, a tão celebrada noção de "reinvenção do governo", 
uma revisão radical da organização e práticas governamentais, que acompanhe as 
mudanças nas necessidades e expectativas das pessoas acerca do que o governo deve 
fazer e como deve fazê-lo (Gore, 1995) . 
A privatização, deste modo, produz a deslegitimação do setor público, solapando também 
seu poder relativo no jogo global das relações de força. A política de privatizações aparece, 
desde esta ótica, como o mecanismo mediante o qual o Estado se autodeslegitima, 
permitindo que os estratos privilegiados ampliem sua hegemonia cultural. Esta modalidade 
constitui o que Feigenbaum e Hening chamam "deslocamento de percepção”. 
A privatização também implica numa reestruturação irreversível dos acordos institucionais 
da sociedade (legais, políticos e econômicos), deslocando a confiança pública para soluções 
privadas ou orientadas ao mercado. O efeito é a realocação institucional das 
responsabilidades e a reorientação dos processos básicos de decisão para a esfera privada. 
Este “deslocamento institucional” tem como correlato uma transferência dos mecanismos de 
controle social da burocracia e das estruturas políticas para as forças de mercado, menos 
transparentes e responsáveis. Ao aumentar o peso econômico e político de certos atores em 
detrimento de outros, estas formas de “privatização” tendem assim mesmo a produzir 
“deslocamentos de poder”. 
Cabe esclarecer, contudo, que não se trata de fenômenos inteiramente novos. A dinâmica 
do Estado tem estado historicamente ligada a, e interpenetrada com, os processos de 
transformação social. O que se adverte na atual conjuntura é a exacerbação destas mútuas 
 18
determinações, com consideráveis conseqüências sobre a fisionomia que neste processo 
vão adquirindo tanto a sociedade como o Estado. 
Por exemplo, os processos de privatização têm gerado novos atores com peso político 
considerável, deslocando outros que no passado exibiram alto nível de poder. Algo disso 
tem ocorrido, por exemplo, nos países de Europa do Leste, com a nova classe empresarial 
surgida dos ex-executivos das empresas públicas agora privatizadas, a venda de ativos 
nacionais a estrangeiros, ou inclusive a empresas estatais estrangeiras (como sucede 
freqüentemente na América Latina) ou simplesmente o reforço da posição competitiva de 
alguns grupos em relação a outros na mesma sociedade, que como resultado da 
privatização pode tornar-se definitiva. 
Também os processos de descentralização têm sido polêmicos e somente em poucos 
países têm se consumado plenamente, ainda quando não tenham resolvido os problemas 
que-se pretendia resolver com a transferência. Quase em nenhum caso esses processos 
foram precedidos por sérios estudos econômicos ou por avaliações profundas sobre a 
capacidade de gestão disponível nas localidades para assumir estas novas 
responsabilidades. Bem se sabe que tanto a teoria econômica como a administração pública 
dispõem de ferramentas de análise que permitem determinar sob quais condições podem 
otimizar-se estes processos de transferência9. 
Na América Latina, a tendência para a descentralização, acelerada pela dinâmica política da 
democratização, tem tendido a piorar a crise organizativa do setor público. Se bem que os 
níveis sub-nacionais têm, potencialmente, melhores possibilidades de gestão eficaz 
(Streeten, 1992), na prática isso se tem verificado em poucos casos. É provável que a longo 
prazo, a descentralização política e administrativa constitua a única opção para melhorar 
certos serviços públicos que deveriam ser melhor administrados e controlados no nível local. 
Contudo, a curto prazo, o processo descentralizador tem conduzido freqüentemente a um 
pior desempenho do setor público. As decisões improvisadas de transferência de serviços e 
as pressões políticas, sobrecarregaram repentinamente os governos locais e estatais com 
tarefas para as quais não estavam capacitados ou não podiam assumir plenamente (Naim, 
1995) . 
 
9 Por exemplo, a existência ou não de efeitos derrame determina a distribuição de funções, e a conseqüente 
provisão de bens públicos, entre os diferentes níveis de governo. O princípio geral é que quanto maior forem as 
externalidades regionais, e menos exclusivo for o consumo do serviço em questão, mais alto será o nível de 
governo que terá a seu cargo sua provisão (Porto e Sanguinetti, 1993). Raras vezes se têm levado em conta 
este tipo de critérios ao se decidir sobre a descentralização de um serviço. 
 19
A descentralização, por outro lado, tem criado a ilusão de que a burocracia estatal tem se 
reduziu. Somados seus efeitos aos da privatização, de desregulação e da terceirização de 
serviços, é evidente que o tamanho da dotação do Estado nacional foi reduzido10. Mas junto 
com isso, as burocracias sub-nacionais têm aumentado suas dotações num n’vel 
incompatível com o volume dos serviços transferidos. Em 1950 havia na Argentina de três 
funcionários públicos nacionais para cada 100 habitantes, enquanto que as dotações 
estaduais registravam ao redor de 1,25 funcionários cada 100 habitantes. Hoje o governo 
federal viu reduzida sua dotação de 900.000 a 294.000 empregados públicos, motivo pelo 
qual sua relação com a população é menor do que 1. Pelo contrário,
os Estados viram 
crescer sua burocracia a valores entre 3 e 20 funcionários por a cada 100 habitantes. Em 
resumo, considerando todos os níveis de governo, a proporção de funcionários públicos em 
relação à população total tem crescido significativamente, o que desfaz a ilusão reducionista. 
No caso das privatizações, as dotações se viram diminuídas em geral antes das 
transferências (sobretudo, pela via de aposentadorias antecipadas e saídas voluntárias), 
entretanto estudos recentes revelam que ao cabo de uns poucos anos, as empresas 
privatizadas continuaram reduzindo o tamanho de seu pessoal. 
Os processos de descentralização, privatização e desregulação têm recolocado a pergunta 
sobre "de que deve ocupar-se o Estado-Nacional", ainda que a mesma tenha sido formulada 
quase sempre desde o ponto de vista "do que não se deve fazer" e não desde que lhe é 
impossível delegar. 
Praticamente em cada um dos âmbitos em que o Estado federal se tem desprendido de 
funções de produção ou prestação direta, é necessário que assuma outras 
responsabilidades, geradas precisamente por essa renúncia funcional. Assim como a opção 
centralização-descentralização não é polar, mas uma fórmula mista, com opções ao longo 
de um contínuo, tampouco a privatização ou a desregulação implicam um abandono 
definitivo de toda responsabilidade de gestão. 
No caso da descentralização, o Estado federal não deve renunciar a certas funções tais 
como velar pela consistência normativa do marco jurídico vigente, analisar e avaliar a 
relação custo-efetividade dos serviços públicos prestados pelos governos locais, monitorar 
os efeitos re-distributivos das transferências ou exercer firmemente a condução 
 
10 Na Figura 2 visualizam-se as tendências e mecanismos fundamentais através dos quais se produzem as 
atuais transformações nas relações Estado-Sociedade. Como se poderá ver, às transferências de funções até 
os níveis sub-nacionais e a sociedade, se agregam os efeitos da inserção internacional, que tende a reduzir a 
capacidade de decisão autônoma do Estado-Nacional. 
 20
macroeconômica resolvendo os desequilíbrios resultantes dos processos de 
descentralização (Kjellberg, 1994) . 
Bresser Pereira (1995) tem distinguido lucidamente os diferentes papéis que correspondem 
ao Estado federal e a outros atores sociais na gestão pública. Considera este autor que a 
regulação e intervenção estatal seguem sendo necessárias nas áreas de educação, saúde, 
cultura, desenvolvimento tecnológico, investimento em infra-estrutura, afirmando que as 
mesmas não somente devem tender a compensar os desequilíbrios distributivos provocados 
pelo mercado globalizado, senão, principalmente, para capacitar os agentes econômicos 
para competir em nível mundial (Bresser Pereira, 1996). 
De qualquer modo, existem setores nos quais, ainda que o Estado renuncie à produção 
direta de bens e serviços, deve continuar exercendo uma função reguladora. Por exemplo, a 
energia, o transporte, as telecomunicações ou o sistema financeiro devem submete-se 
sempre a alguma forma de regulação. A importância social de tais atividades, o interesse 
público envolvido, a assimetria de posições entre empresas e usuários, a dificuldade de criar 
um mercado plenamente aberto e transparente, as limitações técnicas e outros fatores 
assim o exigem (Ariño Ortiz, 1995) . 
Neste sentido, a decisão de privatizar ou descentralizar não deve ser vista simplesmente 
como um ato unilateral e unívoco, senão como o gatilho de um processo simétrico de 
criação de novos papéis que estatizam ou centralizam outras funções de regulação 
econômica ou político-administrativa, ou de coordenação e compatibilização de políticas 
públicas. Na preservação deste papel regulador (de re-regulação ou re-centralização, como 
também se denomina isso), o Estado não deve limitar-se a exercer um “papel arbitrário”. 
Assim como é desaconselhável retornar ao “Estado-babá”, tampouco é aceitável uma 
sociedade desestatizada. A desregulação estatal não deve significar desproteção social 
(Moharir, 1993) . 
 A regulação deve tender a compensar imperfeições do mercado ou suprir a inexistência 
deste, tratando de criar condições as mais semelhantes possíveis às de mercado para 
facilitar a operação das respectivas empresas, proteger e informar os consumidores, 
regulamentar as tarifas e a qualidade dos serviços. A regulação deve emitir sinais e 
incentivos corretos que promovam a eficiente atribuição dos recursos. Como assinala 
Lahera, uma adequada regulação restringe ao mínimo ou elimina a discricionariedade, 
particularmente quanto à fixação de preços; pelo contrário, estabelece mecanismos 
 21
automáticos que aumentam a flexibilidade e a eficácia das normas. O papel indelegável do 
setor público é supervisionar a operação do sistema regulatório. 
Para conseguir esta capacidade reguladora, é preciso um marco normativo adequado, 
equipes técnicas de alto nível e uma institucionalidade que garanta a efetividade do aparato 
regulador (Lahera, 1994) . 
Ademais, o marco regulatório não deve ferir a autonomia dos atores sociais. Se tem 
proposto, inclusive, explorar a figura de uma “controladoria social”, fundada em que a 
exigência de prestação de contas às organizações sociais que são sujeitos da transferência 
de recursos e responsabilidades não pode recair somente no Estado, senão na própria 
cidadania receptora dos serviços (Cunill Grau, 1995) . 
Finalmente, a pergunta acerca “de que deve se ocupar o Estado-nacional” também pode ser 
formulada de outro modo: “sob qual modalidade ele deve cumprir as tarefas que lhe 
correspondem”. Esta é uma preocupação central dos atuais reformadores estatais, que em 
número crescente exploram permanentemente novas formas de gestão pública através de 
mecanismos de outsourcing ou tercerização, partnerships ou empreendimentos conjuntos 
com o setor privado, constituição de empresas públicas espelho, etc. Da mesma forma, se 
postula insistentemente a necessidade de incorporar ao administração pública, concepções 
e técnicas próprias da organização e funcionamento da grande empresa privada. 
Contudo, o alcance efetivo destas novas modalidades de gestão pública é ainda incipiente. 
A autêntica “reforma para dentro” do aparato estatal se encontra em grande medida 
pendente. A reestruturação efetiva das instituições burocráticas; a superação das 
deformidades na função produtiva do Estado; a profissionalização do setor público; a 
desburocratização de processos, normas e procedimentos; a capacitação sistemática do 
pessoal; a introdução de tecnologias que aumentem a eficiência da gestão ou inclusive a 
transformação das pautas culturais vigentes nas organizações estatais, têm tido até a 
presente somente tímidos avanços. Estas são as grandes questões que conformam a 
agenda da segunda reforma do Estado e que vão requerer uma grande dose de imaginação, 
recursos, e vontade política para sua resolução. 
 
6 As relações materiais 
 
No plano das relações materiais, a pergunta essencial é: até que ponto as transformações 
produzidas no plano da divisão social do trabalho entre Estado e Sociedade e na estrutura 
 22
de poder têm modificado os padrões de equidade distributiva segundo níveis de governo e 
classes sociais? Para responder a esta questão, a análise pode ser feita sob diferentes 
perspectivas, examinando alternativamente: (1) os fatores que operam desde o lado dos 
entrantes dos diferentes setores sociais, observando o papel cumprido pelo Estado como 
organizador e executor de políticas tributárias que assegurem uma eqüitativa distribuição da 
carga tributária; (2) outras modalidades de transferências de renda por via de evasão 
tributária,
corrupção ou alteração nos preços relativos, particularmente devidos aos 
processos de privatização e concessão de serviços; (3) as relações fiscais inter-
governamentais, modificadas principalmente devido dos processos de descentralização; e 
(4) os mecanismos redistributivos empregados pelo Estado através do gasto público social, 
avaliando seu impacto sobre os setores de renda mais baixa. 
Desde a perspectiva do Estado, as regras do jogo em termos redistributivos consistem em 
garantir índices aceitáveis de equidade social na alocação dos custos e benefícios do 
desenvolvimento. Trata-se de estabelecer que proporção do produto deve reter cada setor 
social para si, quanto contribui para a sustentação do Estado e, por via de transferências e 
serviços deste último, para a redistribuição desse produto social. Para ele, o Estado deve 
fixar contribuições, exercer sua potestade fiscal para a arrecadação e fiscalização dos 
tributos, dirimir as bases da co-participação impositiva com os poderes subnacionais, decidir 
o tratamento de acordo com certos setores ou organizações, determinar quais setores 
devem contribuir mais e quais menos, e obter os recursos que permitam tanto o exercício 
das atividades estatais, quanto a transferência de recursos com um sentido redistributivo. 
Em última instância, se trata de consensuar um "pacto fiscal", em um sentido amplo, entre o 
Estado e os demais setores da sociedade. 
Além destas vinculações "fiscais", o plano da redistribuição se caracteriza, sob certas 
circunstâncias sociopolíticas, por importantes "desvios" ou transferências de recursos que 
tendem a modificar os padrões de equidade vigentes e, em última instância, a efetiva 
distribuição da renda e da riqueza. Entre eles, a evasão tributária e a corrupção, que 
significam numa apropriação ilegítima de renda por parte de certos setores sociais, com a 
inevitável cumplicidade do Estado, originando uma carga adicional para outros setores 
alheios a estas práticas . 
É significativo, nesse sentido, que a pressão tributária na América Latina continui sendo 
baixa e que a estrutura impositiva se baseie fundamentalmente em impostos ao consumo, 
com forte incidência sobre os setores populares. Na Argentina, a importância dos impostos 
 23
ao patrimônio e à renda constitui uma proporção mínima da arrecadação tributária global. Os 
índices de evasão fiscal, por outro lado, alcançam níveis escandalosos. 
Algo parecido ocorre com a corrupção. Segundo as estatísticas publicadas pela 
Transparency International, a Argentina passou a ocupar o 11o lugar entre os países com 
maiores índices de corrupção do mundo. Frente às denúncias de que a corrupção tem 
estado associada aos negócios realizados sob o amparo das privatizações e concessões 
produzidas durante os últimos oitos anos, o governo argentino sustenta que ao se privatizar 
as empresas públicas, eliminou as fontes de negociatas de todo tipo que se verificavam 
naquelas respectivas empresas. A polêmica parece ociosa porque, no balanço, os níveis de 
corrupção alcançados não têm antecedentes na experiência do país11. 
Dadas as condições em que se conduziu o processo de privatização, também é necessário 
compensa contabilizar como fatores negativos de redistribuição, as transferências 
regressivas originadas nas altas tarifas negociadas nos contratos de concessão, e que 
continuam se elevando sem que os entes reguladores criados nos diversos setores de 
serviço público tenham conseguido - por sua debilidade intrínseca e reduzida capacidade 
institucional- alterar as condições monopólicas ou oligopólicas em que a maioria das 
empresas privatizadas operam. 
Naturalmente, o impacto destas tarifas, usualmente elevadas em termos internacionais e em 
relação aos preços relativos históricos, tem muito maior incidência sobre a renda dos setores 
sociais menos favorecidos. 
O impacto agregado destes fatores é percebido claramente nas estatísticas publicadas 
recentemente pelos organismos financeiros internacionais. O Anuário 1997 do Banco 
Mundial mostra que na atualidade, os 20% mais ricos da população segundo regiões do 
mundo recebe entre 37,8% e 52,9% da renda anual, correspondendo os valores mais baixos 
a Europa e a Ásia Central, e os mais altos a América Latina e o Caribe. Por sua vez, os 20% 
mais pobre obtém nos mesmos blocos 8,8% e 4,5% da renda anual. Hoje em dia, Argentina 
e Chile estão crescendo a taxas verdadeiramente excepcionais, mas os 20% mais rico de 
sua população ganha mais de 12 vezes que os 20% mais pobres. Já nos países do sudeste 
asiático, os valores flutuam entre 9,6 vezes em Singapura e 4,2 em Taiwan12. 
 
11 Ainda que seja impossível medir exatamente a quantidade de corrupção e evasão, todas as estimativas 
responsáveis situam a corrupção-evasão na Argentina acima dos 20.000 milhões de dólares anuais, o qual 
representa 50% do orçamento nacional. Algumas estimativas elevam esta quantidade a 40.000 milhões de 
dólares . 
12 Taiwan e Japão têm uma distribuição mais eqüitativa que a França (7,5 vezes) e que os Estados Unidos (9 
vezes). No caso argentino, as cifras mostram importantes variações a respeito do passado. Enquanto que em 
 24
Observa-se que nas relações fiscais intergovernamentais, os Estados sub-nacionais 
(regiões, Estados, províncias, municípios) disputam atualmente com os Estados nacionais o 
controle de uma parte importante dos recursos financeiros fiscais, a fim de desenvolver as 
novas tarefas incorporadas em seu âmbito funcional. Em alguns países iniciou-se um sério 
endividamento público destas entidades sub-nacionais, colocando em perigo os equilíbrios 
macroeconômicos que estavam evoluindo com muita dificuldade (Sulbrandt, 1995). 
Uma gestão pouco cuidadosa nos níveis locais pode levar a uma deterioração no uso e 
controle dos recursos, especialmente no curto prazo. As metas nacionais podem ser 
seriamente distorcidas e os recursos escassos podem ser desviados para fins inadequados. 
Inclusive, uma radical descentralização pode debilitar seriamente a capacidade do governo 
central para gerir a economia mediante instrumentos monetários e financeiros. Além do 
dano potencial à estabilidade macroeconômica, o Banco Mundial (1992) observa que no 
nível local existe maior possibilidade de captura dos recursos por parte de elites dominantes 
que no nível nacional. É por isto que, dada a baixa capacidade administrativa nos níveis 
locais, que favorecem o gasto desmedido e a corrupção, o enfoque do Banco Mundial sobre 
a descentralização e desenvolvimento do governo local coloca dá mais importância às 
ferramentas financeiras que permitam conseguir maior eficiência, mais que no 
empowerment da sociedade civil neste nível, e/ou ao melhoramento de suas condições de 
vida. 
É evidente que a transferência de competências administrativas e de serviços do governo 
central para unidades subnacionais tem sentido somente se vier acompanhada da entrega 
de instrumentos fiscais e financeiros que permitam sua aplicação. Em outras palavras, de 
nada serve transferir as amplas responsabilidades previstas nos processos de 
descentralização a Estados e municípios se não se lhes prover dos recursos econômicos 
necessários (Shah, 1994; Nzovankeu, 1994)13. 
 
1974 os 10% mais ricos ganhavam 12,4 vezes mais que os 10% mais pobres, em 1997 a proporção se elevou 
a 23,4 vezes mais . 
13 A experiência da Ásia indica que as altas taxas de crescimento nesta região foram acompanhadas de um 
enfraquecimento das autoridades centrais, mas paralelamente se fortaleceram as autoridades a nível
local em 
suas capacidades de arrecadar, gastar e investir (Galbraith, 1995). Um caso particular, neste sentido, é o 
denominado federalismo chinês, que exibe uma grande capacidade dos governos locais para a geração de 
renda. Fórmulas de co-participação entre dos níveis de governo subnacionais, permitem aos de nível inferior o 
acesso a importantes recursos. A isto se agrega uma elevada estabilidade das regras do jogo econômicas e 
fiscais (Montinola, Quiam e Weingast, 1995). No Peru, se tem produzido um fenômeno inverso. Na análise do 
fracasso da reforma descentralizadora no Peru se assinalam déficits na designação jurídica de recursos para o 
financiamento das regiões, situação que se agrava pelo não cumprimento por parte do governo central dos 
compromissos com as regiões, mais preocupado, sobretudo, durante a administração Fujimori- com a perda de 
poder relativo que implicava o processo descentralizador (Thediek, 1994). 
 25
É previsível que em um futuro próximo os Estados subnacionais constituam o eixo principal 
ao redor do qual se estabelecerão as relações Estado-sociedade, de modo que o gasto 
público tenderá a transformar-se em grande medida até estes governos territoriais. A 
composição atual do gasto público nos mostra que, crescentemente, o Estado nacional tem 
assumido o papel de caixeiro, com cada vez menor capacidade para decidir o destino dos 
recursos que obtém e um crescente compromisso de alocação dos mesmos através de 
transferências, seja para o pagamento da dívida pública, seja para os subsídios a serviços 
públicos deficitários em mãos de operadores privados, seja para a coparticipação impositiva 
com as jurisdições subnacionais14 ou os adiantamentos do Tesouro a esses mesmos 
governos15. Ele torna mais crítica a disciplina fiscal nos níveis subnacionais para manter os 
equilíbrios macroeconômicos (Dela Cruz, 1992). 
À margem das relações fiscais entre níveis de governo, interessa também indagar sobre as 
conseqüências da mudança nas regras do jogo entre Estado e sociedade no que respeito às 
políticas estatais dirigidas a resolver as situações de desigualdade e pobreza extrema, 
particularmente através das chamadas políticas sociais focalizadas. 
A respeito, e em relação aos serviços sociais públicos, Draibe defende que, depois de uma 
primeira etapa na qual a preocupação neoliberal se centrou exclusivamente no volume e na 
eficácia do gasto social, se deveria enfrentar o problema da pobreza. As soluções se 
canalizaram através de diferentes mecanismos implícitos de privatização. Por exemplo, 
deixando nas mãos das organizações privados sem fins de lucro a provisão de certos bens 
ou serviços, privatizando empresas de serviços públicos, interrompendo programas públicos 
preexistentes ou abandonando algumas responsabilidades específicas dos governos. 
Também se implantaram diversas modalidades de privatização por atribuição, reduzindo 
 
14 Não obstante, deve se registrar que na Argentina, a concentração de arrecadação em impostos que, segundo 
a lei vigente, deveriam ser compartilhadas com os estados da federação, tem provocado uma briga (puja) no 
destino destes fundos, o que motivou a busca de mecanismos para ludibriar a legislação. Embora a 
arrecadação do IVA e (Ganâncias) tenha registrado, entre 1991 e 1995, um incremento de 152%, as 
transferências por co-participação se mantiveram constantes. Em conseqüência, a participação dos recursos 
efetivamente co-participados no total nacional (sem considerar Seguridade Social) caiu de 65% a 54% neste 
mesmo período. Em vez disto, os recursos de atribuição específica cresceram 122% em moeda constante 
(Cetrángolo e Jiménez, 1996). A meu ver, deste modo se substitui a automaticidade (e conseqüente 
despolitização) da co-participação provincial por transferências específicas, e em boa medida discricionais, que 
constitui um mecanismo de cooptação política desde o momento mesmo da constituição do estado nacional . 
15 A proliferação no Brasil de municípios (e de estados) sem autonomia fiscal e financeira, constitui, segundo 
Camargo (1994), uma verdadeira patologia do processo democrático recente. Em meio a uma difundida 
irresponsabilidade, um número cada vez maior de estados e municípios sobrevive quase integralmente de 
transferências federais, através de Fundos de Participação dos Estados e Municípios, sem que se exija dos 
mesmos nenhuma estrutura operacional e administrativa dos quais estes fundos deveriam ser apenas uma 
forma complementar de apoio. 
 26
(em volume, capacidade e qualidade) diversos serviços produzidos publicamente, induzindo 
sua demanda ao setor privado, alocando financiamento público ao consumo de serviços 
privados e estabelecendo formas de desregulação que permitem a entrada de firmas 
privadas em setores antes monopolizados pelo Estado (Draibe, 1994) . 
A autora critica este enfoque seletivo, "principalmente quando está dissociado de controles e 
garantias públicas e associado a práticas privatizantes stricto sensu" porque a experiência 
indica que introduzem uma precariedade e descontinuidade muito grande na política social, 
tendendo a torná-la assistencialista e abrindo amplo espaço à arbitrariedade dos que 
decidem sobre as necessidades dos beneficiários (Draibe, 1994). Em muitos casos, a falta 
de controles, os abusos da intermediação e a corrupção associada aos programas sociais 
focalizados, tem tornado totalmente ineficiente esta forma de assistencialismo. Confirmando 
isto, temos, por exemplo, o fato de que apesar do gasto social na Argentina ser o segundo 
da América Latina e alcançar um nível similar ao dos Estados Unidos, existe uma extensa 
faixa de setores em situação de extrema pobreza sem assistência oficial. Segundo dados da 
FIEL (Fundação de Investigações Econômicas Latino-americanas), 1/3 do gasto social se 
filtra em direção aos 40% mais ricos da população (cerca de 6 mil milhões de dólares 
anuais) . 
Referindo-se, em particular, ao caso da educação, Coraggio apresenta-nos a dualização da 
política social, ao criar cidadãos de primeira que ascendem aos serviços via renda, e 
cidadãos de segunda, que o fazem por via da ação pública. Deste modo, a focalização pode 
implicar uma redistribuição de recursos públicos dos setores médios em direção aos pobres, 
junto com uma redução na qualidade e complexidade dos serviços públicos (Coraggio, 
1995) . 
Outro efeito importante da alteração de regras é que os princípios implícitos de justiça e 
solidariedade que caracterizava o Estado, já não têm vigência. Como adverte Rosanvallón, o 
caráter distribuído e aleatório dos riscos amparados pelo Estado, derivados das imperfeições 
do sistema de organização econômica, tem sido substituído por um estado permanente de 
precarização cuja irreversibilidade resulta quase "natural". A exclusão social, o desemprego 
crônico, a marginalidade extrema aparecem, assim, sob a luz de uma certeza fatalista que a 
ideologia hegemônica pretende legitimar em termos de pura eficácia econômica . 
Desta constatação nasce a justificação da renda de subsistência como resposta a uma 
situação estrutural criada pela própria lógica dos novos padrões de organização econômica . 
 27
Paradoxalmente, esta nova forma de Estado-providencia se transforma em condição do 
liberalismo selvagem: "um macro-contrato social legitima o funcionamento totalmente não 
social do mercado no nível microeconômico, porque estão completamente desconectadas à 
busca de eficácia e à preocupação com solidariedade. Ao dissociar de maneira radical o 
econômico do social, a renda de subsistência permite relegar a questão do emprego a um 
segundo plano" (Rosanvallón, 1995) . 
Inclusive em países com um desempenho econômico altamente exitoso, como é o caso do 
sudeste
asiático, cabe perguntar-se sobre as possibilidades de continuidade dos modelos 
implícitos em que têm baseado seu êxito, tendo-se em conta - como mostra Evans - que os 
mais elevados níveis de vida alcançados, torna mais difícil a legitimação de um projeto 
nacional exclusivamente a base dos no crescimento do produto. Em tais circunstâncias, ante 
ao previsível ressurgimento de exigências distributivas, tanto políticas como econômicas, as 
estruturas burocráticas e as redes de elites que definiram o projeto original de acumulação 
industrial, não permitiram processar facilmente essas novas demandas (Evans, 1996). 
 
7 As relações de dominação 
 
As novas formas de dominação nas sociedades que já atravessaram -ou nas que ele está 
em curso - a fase mais dura do ajuste estrutural e a reforma do Estado, têm suscitado na 
literatura uma preocupação central. A da governabilidade dessas sociedades devido as 
distorções criadas nos padrões de distribuição da renda e da riqueza, mais além de seu 
êxito ou fracasso relativos na estabilização da economia, redução do déficit fiscal ou 
diminuição da burocracia . 
Esta preocupação se relaciona à terceira e última das relações Estado-sociedade: a 
correspondente ao plano do poder e à dominação política. Ter deixado sua análise para o 
final pode ter interpretado, implicitamente, como uma forma de observar estas relações em 
quanto “variável dependente” das mudanças já examinadas nos planos funcional e material. 
Quer dizer, poderia considerar-se que o poder dos diferentes atores sociais tenha mudado 
seu peso relativo na medida em que se modificou sua participação no plano da divisão 
social do trabalho e a alocação de recursos resultante do novo pacto fiscal e redistributivo. 
Tal interpretação seria, em todo caso, uma meia verdade, já que não é menos certo que só 
na presença de constelações de poder como as que se verificaram nos países que 
avançaram mais decididamente no processo de reforma estatal, poderia ter se produzido 
 28
uma mudança tão profunda nas relações Estado-sociedade. Desta forma, o plano do poder 
adquiriria um caráter sobre determinante sobre os outros planos. A meu ver, como tento 
demonstrar, cada um destes planos tem sua própria dinâmica, que repercute sobre a dos 
outros e, por sua vez, é influenciada por estas. 
Neste plano da relação Estado-sociedade, pode notar-se que o poder estatal inclui três 
componentes principais: autonomia, capacidade institucional e legitimidade. a primeira 
implica a possibilidade de definir preferências em forma independente; a segunda é uma 
medida da capacidade de implementar as opções efetuadas; e a terceira é uma 
manifestação de consenso social acerca da ordem estabelecida e do papel desempenhado 
pelo Estado. A obtenção de um alto grau de consenso dentro do próprio aparato estatal é 
determinante da possibilidade de definir perspectivas independentes das dos grupos de 
interesses que atuam em seu interior. Por sua vez, a efetividade e coesão das instituições 
de governo determinam a capacidade estatal de implementação. Por outra parte, dado seu 
caráter relacional, o poder do Estado deve medir-se também com relação à força dos grupos 
sociais fundamentais e do grau de organização e de consenso dos atores afetados pela 
implementação das ações estatais (Mc Faul, 1995). Consideremos com maior detalhe cada 
um destes aspectos . 
A questão da governabilidade tem trazido novamente o tema da autonomia relativa do 
Estado, antigo problema da teoria marxista, assim como o do fortalecimento estatal, visto 
como condição necessária para que possa reassumir seu papel articulador e orientador da 
dinâmica sóciopolítica, estabelecendo deste modo novos equilíbrios nas relações de 
dominação. É discutido, assim, a nova configuração do cenário público; o surgimento, 
debilitamento ou desaparecimento de atores sociais; o "enraizamento" (embeddedness) do 
Estado na trama de relações sociais, em lugar de seu isolamento, considerando um papel 
catalítico; o novo peso político adquirido pelos Estados subnacionais, tanto no âmbito 
nacional como no local, devido ã assunção de novas funções e o acesso a maiores 
recursos; e, em última instância, a natureza do sistema político resultante da nova estrutura 
de poder e representação cidadã . 
O conceito de "autonomia relativa" é,no mínimo, equivocado. Como quase nenhum Estado é 
totalmente autônomo nem absolutamente prisioneiro de interesses hegemônicos, falar de 
autonomia relativa tem sentido unicamente quando se especificam o grau dessa autonomia, 
o âmbito institucional ou funcional onde se exerce, e os atores econômicos e políticos em 
relação aos quais o Estado pode exibir tal capacidade de ação . 
 29
Tem se considerado a autonomia do Estado como um pré-requisito para uma reforma 
exitosa. O argumento sustenta que inclusive aquelas reformas que tem por objetivo a 
expansão do papel das forças de mercado, precisam de capacidades administrativas e 
técnicas, escassas em países em desenvolvimento. Exigem habilidade para coordenar e 
conciliar reivindicações conflitivas dentro da própria burocracia. As políticas correm o risco 
de ser anuladas se os atores do setor privado forem capazes de utilizar canais burocráticos 
alternativos para garantir as “exceções” que tem os beneficiado. 
Países com mais alta capacidade tecnocrática e administrativa possui um maior leque de 
opções, já que podem combinar mais efetivamente a política de liberalização com uma 
intervenção estatal de apoio e explorar respostas mais heterodoxas (Haggarde e Kaufman, 
1995) . 
Em geral, esta não tem sido a experiência dos países com sistemas democráticos débeis, 
onde se verifica habitualmente que seus aparatos estatais -especialmente parcelas ou 
instituições dos mesmos- estão colonizados por poderosos interesses privados, através do 
controle de certos mecanismos formais ou informais16. Um caso extremo de Estado 
caracterizado por difundidas práticas de captura burocrática é o que Evans denomina 
"predatório". Adotando esta categoria, Naim (1995) destaca a alta correlação existente entre 
Estados predatórios e altos níveis de desigualdade da renda e a riqueza. As políticas 
adotadas por estes Estados, ao reforçar a desigualdade social, facilitam a captura do Estado 
por parte daqueles que possuem quotas desproporcionais de riqueza e poder . 
O próprio Banco Mundial (1992) adverte o problema, especialmente com relação aos 
serviços públicos: o fenômeno de captura dos serviços e recursos públicos por interesses 
especiais relativamente estreitos é um problema sempre presente em todos os países. Está 
agravado pelos monopólios e às vezes pela capacidade limitada do público de demandar e 
monitorar o bom funcionamento, especialmente porque costuma ser difícil monitorar os 
benefícios dos serviços públicos. Estes fatores tornam especialmente complexas e difíceis 
de levar a cabo as melhoras em accountability pública"17. 
Dependendo das características da aliança ou coalizão dominante, o Estado também pode 
ficar preso, às vezes, a outros interesses não necessariamente econômicos, como é o caso 
 
16 Por exemplo, a integração de Conselhos Diretivos de entidades descentralizadas (minimamente formalizada 
juridicamente em seus mapas orgânicos) ou a consulta à Igreja antes de designar a um Ministro de Educação. 
17 No mesmo sentido, Rueschemeyer e Puttermam (1992) observam que "onde o Estado é débil e/ou dominado 
por interesses particulares, encontramos freqüentemente políticas de desperdício cujo efeito principal é encher 
os bolsos de atores poderosos e/ou reforçar a duvidosa autoridade do estado" . 
 30
do movimento trabalhadores organizados, a corporação militar
ou uma hierarquia religiosa 
inspirada em valores fundamentalistas 
Quando, do contrario, o Estado atua desconsiderando as demandas setoriais, ou quando 
impede seu surgimento, também poderia considerar-se que existe autonomia relativa. É o 
caso de Taiwan e Coréia do Sul, em que seu desenvolvimento econômico exitoso se baseou 
na adoção de políticas de exclusão política e, inclusive, de repressão dos interesses de 
classes subordinadas. Ainda que eficiente, este tipo de autonomia tende, todavia, a ser 
instável ao longo prazo . 
Naturalmente, a incorporação de novos atores pode modificar as relações de força 
existentes. Por exemplo, de ONGs, que através da ampliação do espaço democrático e 
participativo, assumem a prestação de numerosos serviços públicos, ainda que neste 
processo seja importante evitar a apropriação destas organizações sociais por parte de 
grupos que possam utilizá-las como se fossem privadas. Com este propósito, no Brasil se 
propõe adotar disposições legais e administrativas. Será essencial o controle por resultados 
destas organizações, tanto por parte do Estado como da sociedade (Bresser Pereira, 1995) . 
Também é importante a incorporação de certas instituições e grupos sociais autônomos, 
surgidos freqüentemente como resultado inesperado de políticas estatais que precipitam 
respostas coletivas organizadas a fim de assegurar a sua sobrevivência mesma, ainda que 
por sua própria origem, estes novos atores coletivos tendem a estabelecer uma relação 
profundamente antagônica com o Estado (Ducatenzeiler e Oxhorn, 1994) . 
Não é casual que os governos levem adiante algumas reformas estruturais mas não outras. 
Embora a crise econômica possa forçar em certos casos a adoção de algumas reformas 
estruturais profundas, sua efetiva implementação dependerá de outros fatores igualmente 
relevantes: a) o poder político dos grupos afetados pelas medidas, seja para resistir a elas, 
detê-las ou desviá-las; b) a autoridade legal do governo central para impor as reformas 
unilateralmente; e c) a capacidade administrativa disponível para executar as modificações . 
A respeito do primeiro destes fatores, cabe assinalar que muitas reformas importantes têm 
sido facilitadas pela existência de grandes conglomerados econômicos com interesses muito 
diversificados, que têm incrementado a dificuldade de outros setores ou grupos para 
organizar uma oposição eficaz a essas reformas. Em outros casos, outrora poderosos atores 
 31
puderam ser neutralizados trocando seu antigo peso institucional por compensações 
econômicas não utilizáveis como recurso na arena política18. 
Mas talvez o fator mais decisivo tenha sido o elevado desemprego e a precarização do 
trabalho que acompanharam o ajuste, e que debilitou a capacidade dos trabalhadores e 
desalentou as greves e a militância sindical. A esse respeito, Maraval mostrou que os 
generosos auxílios-desemprego tornaram possível a liberalização relativamente não 
conflitiva ocorrida na Espanha, ainda que na maioria dos países os esforços por suavizar os 
custos tenham sido menos efetivos. 
Nesta paradoxal relação entre altos custos das reformas e baixas conseqüências políticas, 
Geddes (1995) observa uma anormalidade no paradigma convencional, concluindo que a 
razão pela qual as reformas econômicas têm prejudicado os governos democráticos menos 
do que o esperado, não se deve a que os custos tenham sido inesperadamente baixos 
senão a que os interesses resultaram inesperadamente débeis . 
Em relação à capacidade institucional do Estado -outro atributo de seu poder-, a literatura 
recente tem colocado sobre o tapete o problema de seu redesenho, cuja solução é vista 
como pré-requisito para que se consiga efetivamente governar. Um melhor desenho lhe 
permitirá uma mais adequada distribuição de competências e responsabilidades, um melhor 
controle, uma mais ajustada relação entre perfis ocupacionais e dotações, etc. O redesenho 
do Estado aparece, neste contexto, não somente como uma exigência para uma gestão 
eficiente, mas também como um meio de relegitimação social e política do mesmo, como um 
mecanismo de recuperação de quotas de poder agora duplamente necessárias frente à 
nova distribuição das responsabilidades sociais na provisão de bens e serviços, e a 
assunção de papéis que exigem capacidade de orientação, direção, coordenação e sanção . 
Observa a respeito Przeworski (1996) que quando o mercado não pode se ajustar por si só, 
é necessario resolver o problema do desenho do Estado, fixando as regras do jogo entre os 
agentes econômicos. Agrega o autor que a relação econômica, que é privada, está 
configurada pelo Estado19 via incentivos, proibições ou mudanças nos preços relativos pela 
via fiscal. Portanto, "os problemas de desenho institucional não podem evitar-se deixando o 
Estado fora da economia. Devem enfrentar-se como tais" . 
 
18 Por exemplo, certos setores sindicais na Argentina se destinaram a desempenhar um papel acomodador dos 
previsíveis conflitos laborais surgidos do ajuste e a reforma do estado, em troca de diversos benefícios aos 
empregados, aos sindicatos ou seus dirigentes, consisti fundamentalmente na participação ativa ou controle de 
diversos negócios e empresas, ou na concessão de vultuosas indenizações aos empregados demitidos nos 
processos de privatização de empresas (Orlansky, 1995) 
19 Nisto coincide com O'Donnell, quando assinala que o Estado co-constitui a relação capitalista . 
 32
Na ausência de um desenho deliberado e autônomo, a debilidade das instituições estatais é 
inevitável, já que sua fisionomia termina sendo o resultado da luta política entre os atores por 
conquistá-las e modelá-las de acordo com o seu desejo a fim de maximizar seus próprios 
interesses, para o que estão dispostos a usar todos os recursos de poder que tenham sob 
seu controle. Como bem se tem assinalado, nenhuma instituição permanece neutra ou 
despolitizada, e o Estado, incapaz de atuar como uma força mediadora entre os diferentes 
atores sociais e políticos, se encontra, no essencial, à sua mercê. (Ducatenzeiler e Oxhorm 
(1994) . 
Os problemas de desenho não foram tão críticos na primeira etapa da reforma estatal 
porque, no essencial, seu propósito foi reduzir a hipertrofia ainda que a custo de uma maior 
deformidade do aparato institucional remanescente. Ao contrário, a segunda reforma do 
Estado resulta mais exigente. Na primeira fase, o espaço político de manobra do Poder 
Executivos, era consideravelmente mais amplo que agora, dado que a legitimidade das 
categóricas medidas adotadas pelo Estado nacional se apoiavam em sua auto-imolação no 
altar do ajuste estrutural, ante o indissimulado, e o repetidamente entusiasta apoio dos 
organismos internacionais e os setores econômicos mais concentrados e poderosos que 
cresciam ao mesmo ritmo que encolhia o Estado. Além disto, a enorme fragmentação dos 
partidos políticos, a debilidade do Parlamento e a reduzida capacidade de mobilização dos 
sindicatos, facilitaram a iniciativa do Executivo . 
O problema agora é a construção de uma nova legitimidade. Mas ao ir em frente apesar de 
tudo, ao privar-se dos recursos e perder o consenso que antes envolvia suas formas de 
intervenção, o Estado deve criar uma legitimidade alternativa que já não se sustenta nos 
recursos que podia mobilizar anteriormente nem em sua capacidade executora. As 
capacidades estabilizadoras, promotoras, reguladoras, orientadoras ou assistencialistas (por 
oposição às redistributivas, que já não cabem no novo discurso hegemônico), se bem claras 
em seu sentido ideológico, não se constroem ao mesmo ritmo em que se destrói a velha 
legitimidade . 
A nova ideologia, que vê o ajuste econômico, as
privatizações e o mercado não só como 
instrumentos mas como modelo da boa sociedade (Garretón, 1994), não tem ainda seu 
correlato em um Estado pró-ativo, com capacidade de iniciativa, e de resolver as 
contradições que coloca o novo modelo: aprofundamento da brecha social, desemprego, 
corrupção. Isto expõe a debilidade do Estado justamente quando, ao iniciar a segunda fase 
 33
da reforma, deve aparecer fortalecido frente à sociedade e, sobretudo, frente aos setores 
afetados nesta nova etapa . 
Agora são os próprios organismos financeiros internacionais, que impulsionaram o ajuste, os 
que "descobriram" a necessidade de consolidar a governabilidade, que demanda um 
componente de liderança, iniciativa e vontade política sustentados na consolidação de uma 
cultura e uma institucionalidade democráticas, e um componente de capacidade de gestão e 
implementação das políticas adotadas. 
Na primeira fase da reforma, o Estado se preocupou em se enxugar, não em se fortalecer. 
Agora, na segunda fase, lhe resta menos para fortalecer; o problema agora é dos estados 
da federação, e municípios, que contam com uma menor tradição de reforma administrativa 
e introdução de modernas técnicas de gestão. Nessa ocasião, o Estado central tenta 
assumir, novamente, um papel paternalista, tratando de introduzir reformas nos níveis 
subnacionais sem saber a exatamente como fazê-lo . 
Talvez uma das áreas em que o Estado central possa vir a se fortalecer, é a correspondente 
ao seu aparato regulatório; justamente aquela parcela de seu âmbito funcional mais 
diretamente enfrentada com os poderosos interesses dos monopólios e oligopólios privados 
criados pelo processo de privatização, desregulação e reestruturação econômica. 
Não devemos estranhar, então, que a questão do fortalecimento do Estado tenha ressurgido 
junto com a questão da governabilidade ante ao aviso expressado pelos próprios 
organismos internacionais de crédito e assistência técnica. Neste sentido, um documento de 
política do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento [PNUD], ainda em 
elaboração no momento da escrita deste trabalho, delineia que o desafio que enfrenta 
qualquer sociedade é criar um sistema de governabilidade que promova, suporte e 
sustenteo desenvolvimento humano, particularmente dos setores mais pobres e marginais20. 
Também Bresser Pereira (1995) vincula ambos conceitos -capacidade estatal e 
governabilidade-, mas chama ao primeiro governança, sugerindo que a diferença entre uma 
proposta de reforma neoliberal e uma social democrata é o feito de que o objetivo da 
primeira é retirar o Estado da economia, enquanto que o da segunda é aumentar a 
capacidade de governo (governança) do Estado, outorgando-lhe os meios financeiros e 
 
20 Este documento define governabilidade como o exercício da autoridade política, econômica e administrativa 
para gerir os assuntos de uma nação, agregando que se trata dos complexos mecanismos, processos e 
instituições através dos quais os cidadãos e grupos sociais articulam seus interesses, exercem seus direitos e 
obrigações legais, e medeiam suas diferencias (MDGD, 1997). Resulta sintomático que o nome do organismo 
que tenha preparado este documento, o Management Development Programme, tenha mudado recentemente 
sua denominação para Management and Governance Development Programme (grifo meu) . 
 34
administrativos para que possa intervir eficazmente naqueles casos em que o mercado 
acuse falhas de coordenação. Ao contrário, a questão da governabilidade se relaciona mais 
diretamente com a dinâmica social, tal como o delineia a definição do MGDP, ainda que os 
problemas que a suscitam – na opinião do citado autor- não provém do "excesso de 
democracia" nem do peso excessivo das demandas sociais, senão da ausência de um pacto 
ou coalizão política estável e não maximalista . 
A ilusão de um Estado mínimo, com pouco o que fazer e menores exigências que no 
passado em termos de capacidade de gestão, tem-se desvanecido. Agora, mais que nunca, 
uma crescente convicção vem ganhando consenso: o Estado executor necessita de 
capacidades bem diferentes das do novo Estado, responsável por cuidar para que os novos 
executores façam o devido. Mas ao oferecer o aparato burocrático no altar do ajuste, 
terminou arruinando sua capacidade institucional, deformando sua função de produção. 
"Downsizing" não resultou equivalente a "rightsizing", de forma que embora o futuro 
volume de tarefas externas seja menor, não alcançaria toda a capacidade disponível para 
enfrentá-las eficazmente. Neste sentido, concordo que "o poder e as capacidades dos 
governos permanecem perigosamente desproporcionais em comparação com as suas 
responsabilidades" (Naim, 1995) . 
Moharir destaca o surgimento de maiores demandas qualitativas sobre o Estado e, 
especialmente sobre a burocracia, para administrar criativamente os vínculos Estado-
sociedade, assim como para monitorar e regular o desempenho de um número muito maior 
de atores responsáveis por promover o interesse dos cidadãos. E alude, para demonstrá-lo, 
à experiência britânica, provavelmente uma das mais radicais em matéria de reforma estatal, 
onde a transição do status de "eleitor" ao de "cidadão" e "consumidor", com poderes efetivos 
para reforçar sua "soberania", não tem sido fácil nem para o governo nem para os cidadãos 
(Moharir, 1993). As eleições de 1997, que possibilitaram o acesso ao poder dos Trabalhistas 
depois de longos anos de hegemonia conservadora, pode ser lida justamente como uma 
resposta da cidadania ao relativo fracasso da política anterior. 
Na segunda fase da reforma estatal, já não era simples adotar a postura "salvadora" e 
autocrática que caracterizou à primeira, onde o Executivo pôde obter plenos poderes, ainda 
sob regras formalmente democráticas, para impor transformações fundamentais. Hoje, estas 
mudanças já se produziram em muitos lugares; o cenário institucional é muito diferente. 
Governos locais (estados, municípios) e poderosos conglomerados de empresários provê a 
quase totalidade dos serviços públicos, mobilizando um volume de recursos muito superior 
 35
ao que os governos nacionais alocam às áreas que ainda controlam. Outros participantes, 
como o Parlamento ou as ONGs, têm adotado posições mais discriminadoras tendo em 
vista as iniciativas do Executivo e pedem uma maior participação nas decisões que afetam a 
provisão e financiamento de bens públicos21. 
É possível que a longo prazo, o desmantelamento de seu aparato intervencionista venha a 
fortalecer o Estado, mas no curto prazo, a liberalização econômica tem eliminado muitas 
alavancas políticas mediante as quais o Estado exercia seu poder e levava a cabo suas 
funções. Por exemplo, à medida que o capital privado se volta menos dependente dos 
recursos públicos fiscais, o predomínio relativo do Estado diminui, sobretudo em relação à 
situação em que seu papel subsidiador ou contratista era mais preponderante. A situação é 
menos clara tendo em vista os Estados subnacionais, sobretudo quando, nos processos de 
descentralização, as relações fiscais intergovernamentais ainda não alcançaram acordos 
mais ou menos permanentes, e as transferências de recursos são utilizadas seletivamente 
como instrumento de poder . 
Um último aspecto a se considerar é o relativo aos efeitos dos processos de 
descentralização sobre a estrutura de poder em nível local e, indiretamente, em nível 
nacional. Seguindo Marcou (1993), a descentralização, vista como processo e como reforma 
administrativa, implica profundas mudanças nos modos de ação do Estado. Implica o 
abandono de uma visão hierárquica e coercitiva da ação estatal e um maior respeito à 
autonomia das coletividades
locais. Neste processo, contudo, o Estado nacional pode 
chegar a perder totalmente o controle sobre a execução final de suas próprias políticas, 
entregues agora a uma pluralidade de centros de poder locais, recém constituídos 
(Sulbrandt, 1995) . 
Outras conseqüências sobre a estrutura de poder, resultantes da descentralização, podem 
ser observadas nos programas de reforma impulsionados pelo Banco Mundial. Em sua 
análise deste processo no setor educativo, Coraggio (1995) delineia o paradoxo de que, por 
um lado, esta descentralização se justifica tendo em vista que facilitará a adoção das 
combinações de insumos educativos mais eficientes no nível de cada distrito ou 
estabelecimento, ao sustentar-se num melhor conhecimento das condições locais mas por 
 
21 Um caso atual e extremamente ilustrativo é o novo papel que, logo depois do recente triunfo eleitoral da 
coalizão democrática, tenta assumir o Parlamento na Mongólia como órgão reitor, ou ao menos protagonista, da 
reforma estatal. Da mesma forma, vários países que avançam em direção à democracia e à economia de 
mercado depois do desmoronamento do bloco soviético, colocam em evidência este novo e necessário 
protagonismo do poder legislativo dentro dos processos de reforma do estado em curso. 
 36
outro se espera que reduza a capacidade dos interesses tradicionais (sindicatos de 
professores e burocratas do governo central, associações de estudantes universitários ou 
elites usualmente beneficiadas por subsídios indiscriminados) para influir sobre a política 
educativa22. 
O controle descentralizado pode tender a reforçar o poder das elites locais, agravar as 
disparidades inter-regionais (Streeten, 1992) ou produzir outros efeitos indesejáveis. De 
qualquer forma, as lutas políticas para a construção de uma ordem social alternativa não se 
darão já, necessariamente, no âmbito do Estado nacional. Precisamente, em razão do 
processo de deslegitimação dos Estados, muitas dessas batalhas -talvez a maioria delas- 
prosseguirão nos níveis locais (Wallerstein, 1994). 
 
8 Globalização, Internacionalização e Integração 
 
As transformações das relações Estado-sociedade vêm incidido, creio que não casualmente, 
em uma série de processos no âmbito internacional cujo impacto sobre o cenário político e 
socioeconômico dos países não pode ser subestimado. Três conceitos, estreitamente 
vinculados, tentam dar conta destas transformações, são eles: globalização, 
internacionalização do Estado e integração regional. Ainda que possam ser confundidos, 
cada um deles deve ser analisado separadamente quanto a seu alcance e conseqüências. 
Seguindo as observações feitas em um trabalho recente (Oszkak, 1996), entendo que a 
globalização é uma explicação veiculada pelos deterministas, e a integração regional é 
veiculada pelos voluntaristas. As forças que explicam a globalização são muito mais 
englobantes, poderosas e complexas que as que governam o comércio internacional. 
Existe, hoje, uma “agenda mundial” que é composta, entre outras coisas, de questões 
relativas as migrações, ao meio ambiente, ao terrorismo, a corrupção, ao tráfico de 
entorpecentes, a revolução das comunicações, aos movimentos de capital e aos mercados 
financeiros on-line. Todas estas questões têm um elemento em comum: “desconsideram” as 
fronteiras nacionais, que se tornam móveis e porosas ou, simplesmente, se dissolvem diante 
das novas formas adotadas pelo intercâmbio e inter-relação entre forças e atores muito 
poderosos. 
 
22 Não obstante, isso ainda não ocorreu na recente experiência argentina, no que se refere aos conflitos 
docentes. As greves em nível local se nacionalizaram. A organização sindical empregou novas formas de luta 
política, que tenderam a funcionar como um sistema de vasos comunicantes, produzindo solidariedade e efeitos 
em cadeia. 
 37
A globalização representa, então, a explosão de uma complexidade e de incerteza. Para os 
Estados nacionais supõe-se a necessidade de ir contra alguns de seus efeitos, de “ancorar” 
algumas das regras que governam esta nova dinâmica, numa tentativa de obter capacidade 
de previsão e visibilidade. Trata-se de uma luta desigual porque, em última instância, a nova 
agenda mundial parece originar-se, em grande parte, nas novas modalidades que tem 
adquirido o sistema capitalista como padrão dominante de organização social, o qual 
ultrapassa a capacidade de controle individual por parte de um determinado Estado 
nacional. Nesse caso, a integração regional pode ser vista como uma manifestação de 
voluntarismos não resignados, como uma concatenação de ações deliberadas e conjuntas e 
levadas a cabo por dois ou mais Estados nacionais, para resolver algumas das restrições ou 
efeitos indesejáveis de uma globalização tão determinante. Neste sentido, a integração não 
seria mais uma manifestação da globalização, mas sim o seu oposto, quer dizer, uma 
intenção de ordenar, da fronteira para dentro, o impacto de um mundo sem fronteiras. 
O que foi apresentado, no entanto, não dá conta totalmente da distinção que se pretende 
estabelecer conceitualmente. Se bem que a integração transcenda as fronteiras nacionais, 
fato que outorga a esta questão um caráter diferente ao de outras mais propriamente 
nacionais, também incorporadas à agenda estatal, na origem de muitas desta pressão 
internacional vem tendo um efeito determinante. Cito dois exemplos, o ocorrido com a 
Aliança para o Progresso, geradora da maioria das iniciativas de criação de instituições de 
reforma agrária e a criação dos Conselhos ou agências de desenvolvimento econômico, 
promovidas, em grande medida, pelo Banco Mundial, nos anos 50 e 60. 
Quero destacar com isto o papel decisivo da pressão internacional na conformação das 
relações de força no interior dos Estados e das próprias sociedades nacionais. Essa pressão 
é quase sempre seletiva: aponta para o fortalecimento de determinados atores sociais ou 
estatais e para o debilitamento daqueles que defendem interesses opostos. O jogo dos 
“anéis burocráticos”, que foi descrito por Cardoso (1972), se estende a um plano 
supranacional, tornando muito mais complexas as relações entre agências estatais, clientes 
locais e lobbies forâneos de distintas naturezas. 
Uma maneira de distinguir “esta outra fronteira”, vulnerável às forças internacionais, mais 
“institucionalizadas” (como a Iniciativa para as Américas, Fundo Monetário Internacional, 
OTAN, Fóruns, Conselhos ou lobbies supranacionais organizados), é buscando a noção de 
“internacionalização do Estado”. De uma certa forma, este processo poderia ser visto como 
mais um aspecto da globalização. A diferença, ao meu ver, está em que os efeitos desta 
 38
última são mais onipresentes e menos visíveis, enquanto que os derivados da 
internacionalização, no sentido expresso, podem ser atribuídos com maior facilidade a 
atores e decisões concretas (por exemplo, às condições provenientes de organismos 
financeiros internacionais, pressões de um governo sobre outro sobre legislação relativa a 
patentes de industrias farmacêuticas ao controle do narcotráfico, posições conjuntas sobre 
aborto ou direitos humanos). 
Nessas distinções, pode ser observado que a integração regional tem uma íntima relação 
com os novos rumos que estão tornando os Estados nacionais da região. De certo modo, 
poderia afirmar-se que os processos de integração regional que vêm sendo produzidos nas 
últimas décadas têm implicado a alienação da capacidade de decisão unilateral dos Estados 
nacionais sobre certos aspectos da gestão pública, que anteriormente estavam submetidos 
ao seu exclusivo arbítrio. Apesar de se tratar de uma
submissão voluntário, a integração 
supõe abrir mão de uma porção do poder de decisão com a finalidade de promover 
interesses nacionais cuja realização poderia encontrar, através da integração, um meio 
apropriado. 
Quando a esta semi-vulnerabilidade de poderes e a uma instância supranacional de 
negociação se soma à vulnerabilidade que simultaneamente produzem a internacionalização 
e a globalização, se torna evidente que os Estados nacionais tenderão a diminuir sua 
autonomia decisória, tanto em relação aos assuntos externos quanto aos de sua própria 
agenda interna23. 
Os Estados nacionais estão transferindo recursos e instâncias decisórias a governos sub-
nacionais e a operadores econômicos privados. Também, nesta dimensão interna de sua 
gestão, estão perdendo competências e capacidades decisórias. Paradoxalmente, então, a 
descentralização e a internacionalização operam como redutor dos espaços de decisão 
autônoma dos Estados nacionais. 
O certo é que os atores e processos supranacionais vêm se tornando participantes 
“naturais” dessa cena política nacional. O Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional 
têm, hoje, maiores recursos para orientar as políticas públicas do que a mais poderosa 
coalizão parlamentar. Um narcotráfico globalizado entroniza e derruba governos. Uma crise 
 
23 Os países mais desenvolvidos não são imunes a estes processos e, crescentemente, suas decisões estão 
subordinadas aos condicionantes de sua inserção internacional ou regional. Por exemplo, na Nova Zelândia o 
Clerk of the House of Representatives assinalou há pouco que cerca de 30% da legislação desse país se 
vincula com o cumprimento de compromissos internacionais. Por sua vez, no Reino Unido, cerca de 40% de 
sua legislação é dedicada a questões vinculadas à Comunidade Européia. 
 39
econômica em um país produz efeitos em cascata sobre outras economias aparentemente 
sólidas. As pressões governamentais de um país central conduzem em outros, dependentes 
deste, legislações favoráveis aos interesses econômicos do centro. As mudanças na 
economia mundial, como observado por Lattuada (1996), reformulam as vantagens 
comparativas tradicionais, exigem uma maior articulação e dependência do setor primário 
em relação ao capital industrial, comercial e financeiro, e subordinam os instrumentos de 
política econômica doméstica a decisões supranacionais (Mercosul, GATT, entre outros). 
Sem pretender uma análise ordenada destas repercussões “internas”, vale a pena observar 
algumas de suas manifestações a fim de ilustrar os diversos planos da relação Estado-
sociedade que são afetados. 
Wallersteim (1994) observa que durante o próximo meio século, os processos básicos da 
economia capitalista mundial continuarão funcionando como hoje funcionam. Os indivíduos 
e as empresas seguirão buscando a acumulação de capital de todas as maneiras 
conhecidas; os capitalistas buscarão o apoio das estruturas estatais como fizeram no 
passado e os Estados competirão entre si para se constituir nos principais centros de 
acumulação de capital. 
O que mudará, provavelmente, não será tanto a operação do mercado mundial, mas sim as 
operações das estruturas políticas e culturais mundiais. Basicamente os Estados nacionais 
perderão continuamente legitimidade e, portanto, terão dificuldades para garantir uma 
segurança mínima interna ou externa. 
Já em relação ao plano interno dos países, as novas formas de articulação que se estão 
produzindo entre o mercado globalizado e as economias regionais localizadas em 
determinados espaços do território nacional, rompem com as coordenadas do modelo 
anterior assentado no Estado-nação. A reprodução deste modelo parece depender das 
possibilidades de aprofundar a competitividade interurbana, em condições tais que podem 
resultar na exclusão das regiões que não tenham possibilidade de desenvolver novas 
vantagens comparativas (Loiola e Moura, 1995). 
Esta situação pode gerar movimentos separatistas, favorecidos pelo processo de 
globalização e a livre circulação do capital. Tratando desse tema Camargo (1994), referindo-
se ao Brasil, destaca a importância de medidas políticas, fiscais e administrativas que 
permitam o fortalecimento da União frente ao surgimento desses movimentos. 
Outro aspecto que merece atenção é que, nos atuais processos integracionistas, se 
manifesta uma mudança da importância relativa do papel dos atores que os tornam 
 40
concretos. Como observa Regueira Bello (1995), muitas negociações bilaterais no âmbito do 
Mercosul têm sido diretamente realizadas pelo setor privado, como no caso da industria 
automobilística. As pressões sobre o Estado nacional se fundam na divergência de 
interesses que possuem diferentes atores. As empresas associadas ao capital transnacional 
se pronunciam por uma maior abertura ao exterior e por reduzir a proteção e regulação 
estatal; muitas das empresas privadas de capital nacional, menos competitivas, demandam 
uma maior proteção. Modificam-se, dessa forma, as formas de participação estatal. A 
integração continua sendo um processo vindo de cima, com um caráter inter-governamental, 
mas a presença do setor empresarial – como ator real do processo – descentraliza e 
desconcentra a gestão e decisão estatal, especialmente nas negociações de caráter setorial. 
Também os membros das organizações internacionais e supranacionais podem conduzir à 
mudanças na estrutura de poder e autoridade dos Estados individuais. Por exemplo, a 
pertinência à Comunidade Européia ou ao Mercosul pode outorgar a alguns dos Estados 
membros, os menores, maior voz sobre os assuntos internacionais do que a que teriam 
como nações separadas. Mas, como bem observa Corkey (1993), a mesma pertinência 
ilustra a disfunção legal entre o conceito de soberania e um grupo supranacional. 
A abertura econômica restringe a autonomia dos países na planificação de suas políticas 
socioeconômicas e modifica, inclusive, as formas de organização e gestão empresarial. No 
entanto, alguns autores observam que há uma tendência de se superestimar o grau em que 
as forças globais determinam o destino dos Estados de Bem-estar nacionais ou explicam o 
fracasso da gestão macroeconômica. Como resultado de análises comparativas, Esping-
Andersem (1994), assinala que a permanência dos Welfare States se explica mais pela 
vigência de mecanismos de construção de consenso político. 
Krugmam (1997), também denuncia que a globalização tem sido responsabilizada muitas 
vezes por todos os males (instabilidade, desemprego, baixos salários), afirmando que nem 
os mercados globais são onipotentes e nem a autonomia nacional morreu. O “globalismo 
econômico desenfreado” é, segundo este autor, uma máscara para ocultar a insensatez e 
conseqüente fracasso de certas políticas domésticas (estatais ou privadas) que utilizam o 
argumento da competitividade para justificar reestruturações empresariais, criação de 
empregos ou promoção da flexibilização do trabalho. 
Também pode ser observado como uma intenção cínica, de encobrir um compromisso 
social com os setores mais desprotegidos, a adoção de medidas de defesa ambiental, que 
aumentam custos. Toda essa retórica, conclui o autor, coloca um risco muito sutil: estimula o 
 41
fatalismo, uma sensação de que não se pode enfrentar os problemas porque esses superam 
a capacidade dos países (o denominado horror econômico e seu impetuoso avanço na 
Europa Ocidental), tornando a consideração evidente – ou justificando – as falhas próprias 
das políticas nacionais. 
O último ponto a ser considerado é o do crescimento dos organismos financeiros 
internacionais em relação aos planos funcional, material e de governabilidade, que
emolduram as relações Estado-sociedade. Existe consenso de que os resultados das 
atividades promovidas por instituições como o FMI ou o Banco Mundial não devem ser 
medidas somente a partir do volume de empréstimos outorgados. Seu poder sobre os 
governos dos países em desenvolvimento depende marginalmente de seu aporte financeiro 
(Haggard, Lafay e Morrison, 1995). As condições que acompanham esses empréstimos 
correspondem, nesta visão, à forma mais importante de sua atividade. O que é decisivo é a 
sua capacidade para interferir nas relações econômicas internacionais. 
Por exemplo, vinculando o acesso ao mercado de capitais ou mesmo firmando acordos 
prévios com o FMI ou o Banco Mundial que impõem, definitivamente, a política econômica e 
os parâmetros da relação Estado-sociedade. Isto outorga àqueles governos que controlam 
estes organismos um grande poder com baixos custos (Coraggio, 1995). 
Na atualidade, o volume dos empréstimos internacionais tem alcançado um peso 
considerável na composição da dívida externa dos países que, em alguns casos, vem 
crescendo persistentemente. Inicialmente, este financiamento se orientou a apoiar as 
políticas de ajuste estrutural e estabilização necessárias aos países receptores. Através das 
condições e exigências dos empréstimos (que incluem centralmente a intervenção dos 
organismos financeiros internacionais na avaliação dos conteúdos e orientação das políticas 
macroeconômicas e dos projetos financiados) foram transmitidas e impostas receitas e 
fórmulas cujo efeito comparativo foi uma crescente homogeneização das políticas nacionais 
dos países “beneficiários” dos créditos. Esta influência não se limitou ao domínio dos 
Estados nacionais; também se expandiu aos âmbitos sub-nacionais, à medida que a 
capacidade do Estado nacional se via restringida pelas condições externas (Teune, 1995). 
As preocupações mais recentes dos organismos internacionais mudaram para o 
fortalecimento institucional dos diversos níveis de governo. A prática do ajuste começou a 
assinalar o entorno político como a principal fonte de obstáculos para uma mudança 
econômica sustentada. 
 42
O tema do desenho institucional adequado começou a ocupar um lugar mais destacado nas 
análises de política econômica, refletindo em uma linguagem prescritiva o debate intelectual 
sobre a relação política e economia. 
Frischtak (1994) observa, a esse respeito, que as instituições financeiras internacionais que 
haviam começado a vender um pacote de receitas para que os Estados pudessem obter 
novos empréstimos, correram o risco de cometer excesso em sua própria agenda. Aparecia 
potencialmente questionado, não somente o modelo de desenvolvimento, mais além do 
controle e da capacidade objetiva destas instituições, como também a própria natureza do 
sistema político de países soberanos, consideração que excede tanto a experiência técnica 
como o mandato das instituições internacionais. 
Deve ser admitido, no entanto, que estas jogaram, quase sempre, um papel articulador das 
possíveis conseqüências negativas derivadas da aplicação de suas próprias receitas, 
efetuando oportunamente os ajustes ideológicos necessários. Isto nem sempre se traduz em 
imediata correção das políticas adotadas pelos governos, dado ao efeito inercial das 
políticas já adotadas ou à dificuldade para reorientar os projetos com financiamento externo 
em curso. Talvez, isso resulte do paradoxo do suposto discurso oficial desses organismos e 
se veja prontamente desmentidos pelas expressões retóricas de seus interlocutores, cujas 
manifestações públicas parecem contribuir como pano de fundo ao discurso. 
Atreveria-me a sustentar que nesse discurso travestido, parece existir uma seqüência em 
que os organismos internacionais têm deslocado a ênfase dos problemas vinculados com o 
“papel apropriado” do Estado nacional no plano funcional aos criados no plano do poder, 
para acentuar, finalmente, a problemática social gerada em redor do plano material ou de 
justiça distributiva. Ajuste e estabilização, ligados a um Estado também ajustado e 
descoberto de funções transferíveis; governabilidade, sustentada em um aparato estatal 
com capacidade institucional para observar os equilíbrios macroeconômicos e promover o 
desenvolvimento; e uma rede de contenção social, baseada em programas focalizados e 
assistenciais, parecem dar conteúdo às formas que aqueles organismos foram propondo 
sucessivamente aos países devedores. 
Os organismos multilaterais de crédito não vêm prestando atenção às conseqüências 
sociais e políticas de seus programas. Deve ser reconhecido, no entanto, que as mudanças 
de rumo na orientação de seus programas, geralmente tardias, têm representado muitas 
vezes uma saudável reação frente à cega obsessão dos gurus e aprendizes de feiticeiros 
locais, de empregar as fórmulas dos seus mestres. 
 43
 
 
9 Reflexões Finais 
 
Historicamente, as sociedades latino-americanas tenderam a privilegiar uma matriz sócio-
política que incluía casos de fusão, imbricação, subordinação ou eliminação de certos 
elementos da relação entre Estado e sistema de representação de atores sociais (Garretón, 
1994). O Estado constituía a referência central da ação coletiva e, inclusive, um fator 
decisivo no próprio processo de construção social. O Estado constituía também, portanto, o 
locus principal da política, onde desembocavam todas as pressões, demandas e tomadas de 
posição que deram sucessivos conteúdos à agenda política. 
No entanto, na interpretação entre Estado e sociedade prevaleceram componentes 
mobilizadores ao invés dos representativos ou autenticamente participativos. Capturado ou 
colonizado pelos interesses econômicos de turno o Estado, com escassa autonomia, foi 
orientando suas políticas segundo os ditados e preferências de quem controlava seu aparato 
institucional. 
Alcançados os limites de sua expansão frente a uma crise que se presumia em vias de 
acabar, a antiga matriz Estado-cêntrica foi se encaminhando a um modelo de relação cuja 
forma definitiva, ainda está sendo definida, porém, tendo como característica central uma 
incorporação diferente das instâncias estatais sub-nacionais, os demais setores que 
compõem a sociedade e os atores supranacionais. 
 É ainda prematuro qualificar esta nova matriz como sócio-cêntrica, ainda que tal 
denominação esteja acentuada sobre o novo papel e que corresponderia jogar a sociedade 
na constituição de um novo modo de organização social. Uma ordem que inevitavelmente 
será capitalista, mas cuja adjetivação será o resultado de uma luta política incerta quanto a 
seus resultados. Será democrático no plano da governabilidade ou esse caráter será 
debilitado por um funcionamento da política que somente resgatará as manifestações 
formais da democracia? Será “social” ou “com rosto humano”, quanto aos pressupostos 
éticos de equidade distributiva, ou se limitará a suprir e conter as conseqüências mais 
ostensivamente prejudiciais que conduzem à marginalidade e desigualdade social? 
Qualquer que seja a resposta (e esta somente poderá ser confirmada em um sentido ou 
outro em cada experiência nacional), não há dúvida que a mesma deverá ter o Estado como 
protagonista central. Se me permitem uma tautologia, entenderia que no processo de 
 44
construção de um capitalismo social e democrático, o Estado deverá estatizar-se, o setor 
privado deverá privatizar-se e a sociedade civil deverá publicizar-se. Em outras palavras, 
Estado e sociedade deverão contribuir para a reconstrução de uma esfera pública em que 
nem o Estado tenha um protagonismo excludente nem o cidadão cumpra meramente um 
papel passivo em seu triplo caráter de votante, contribuinte e usuário de serviços. Esta é a
contraparte especular dos três planos de relação entre Estado e sociedade. 
Mesmo que a “autonomia do Estado” e a “impermeabilidade”, típicas dos países asiáticos, 
tenham sido úteis, isso não significa que estas devam ser as características a emular na 
América Latina para resultar em transformações exitosas (Bradford, 1994). 
Para reforçar a autonomia estatal e seu papel como agente de articulação e 
desenvolvimento nacional, devem ser eliminadas suas tendências mais burocráticas para 
promover, ao mesmo tempo, os mecanismos de representação e participação social. Esta 
tarefa não pode ser empreendida exclusivamente pelo Estado. 
Como bem assinala Cunill Grai (1995): “o desafio, em todo caso, que cabe ao Estado, é o da 
mudança de enfoque em suas relações com a sociedade civil. Em vez de pretender que a 
sociedade crie canais institucionais para juntar-se ao Estado, em função de seus objetivos e 
necessidades, o que este último deve fazer é inverter o paradigma buscando apoiar á 
sociedade civil, no interesse da preservação de sua autonomia institucional, de maneira a 
não desprezar sua capacidade para negociar livremente as melhores opções que podem 
contribuir ao seu desenvolvimento”. Os termos que se tem proposto para se referir a este 
novo modelo de Estado desejável, necessário, inteligente, atlético, sensato, reinventado, 
catalítico, segundo a imaginação de cada um constituem, ao meu juízo, simples recursos 
retóricos para assinalar a necessidade de sua transformação ou, um catálogo de receitas, 
que o sentido comum aceitaria quase sem discussão. Tende-se esquecer que a exclusão, o 
apartamento e a atomização da sociedade civil, que têm acompanhado os processos de 
reforma estatal, tornam mais evidente a sensação de que a esfera pública tende a 
desvanecer-se, debilitando ainda mais o Estado pós-reforma. 
Portanto, não se trata unicamente de redefinir o papel do Estado, mas também de 
estabelecer, inclusive como condição necessária de seu reforço, o papel que cabe à 
sociedade na nova matriz sócio-política que se está configurando. Este tipo de preocupação 
recoloca a legitimidade do espaço público e do espaço privado, assim como a fronteira 
desejável entre sociedade e Estado. 
 45
Ele resgata, também, o papel de representação política e de participação social, quer dizer, 
dos novos espaços, atores e mecanismos através dos quais poderiam criar-se contrapesos 
sociais e institucionais inspirados em valores democráticos, para que a agenda pública seja 
efetiva e equivalente às demandas e necessidades do conjunto social. 
 
NIVEL SETORPÚBLICO PRIVADO
SUPRA-
NACIONAL
NACIONAL
S
U
B
N
A
C
I
O
N
A
L
PROVINCIAL
MUNICIPAL
ORG. INTERNAC.
GOV. ESTRANG.
ESTADO 
NACIONAL
Intercionalizaçao
integração
•ONG`S
•EMPRESAS PRIVADAS
•SOCIEDADE CIVIL
Desregulação
Privatização
Terceirização
•ONG`S
•EMPRESAS PRIVADAS
•SOCIEDADE CIVIL
•ONG`S
•EMPRESAS PRIVADAS
•SOCIEDADE CIVIL
ESTADO
PROVINCIAL
ESTADO
MUNICIPAL
Desregulação
Privatização
Terceirização
Desregulação
Privatização
Terceirização
Descentralização
Regionalização
Descentralização
Regionalização
Figura 3
Transformação Estado-Sociedade
Tendências segundo níveis e setores
 
 
 
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