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REY - Parasitologia - 13. Cisticercose humana (15)

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Enviado por Vinícius Leal em

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PARASITOLOGIA MÉDICA
Luís Rey
Fundação Oswaldo Cruz
Instituto Oswaldo Cruz
Departamento de Medicina Tropical
13. CISTICERCOSE HUMANA
Complemento multimídia dos livros “Parasitologia” e “Bases da Parasitologia”. Para a terminologia, consultar “Dicionário de termos técnicos de Medicina e Saúde”, de
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Cisticercose humana
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O cisticerco da Taenia solium
A cisticercose humana é o resultado da infecção de certos indivíduos pelas formas larvárias da tênia do porco ou Taenia solium.
As proglotes grávidas dessa tênia (1) contêm, cada uma, 30 a 50 mil ovos já embrionados (2), isto é, com oncosferas formadas.
 Os pacientes parasitados elimi-nam quase todos os dias pequenos segmentos do estróbilo com 3 a 6 proglotes, por ocasião das evacua-ções.
As superfícies de apólise (que resultam da fragmentação da cadeia e, portanto, sem tegumen-to) permitem que por aí os fundos de saco uterinos herniem e se rompam, liberando seus ovos.
A condição para que os ovos eclodam é sua passagem pelo estômago e duodeno, onde agem os sucos digestivos e a bile, o que sucede normal-mente no porco.
Quando isso se dá no homem, a oncosfera liberada e ativada invade a mucosa intestinal e penetra na circu-lação, indo localizar-se em algum tecido do organismo.
Ela se transforma então em cisticerco.
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O processo de infecção
O mecanismo envolvido pode ser por:
─ hétero-infecção,
─ por auto-infecção externa,
─ ou por auto-infecção interna.
Na hétero-infecção, que é o caso mais comum, o paciente ingere acidentalmente os ovos da tênia, veiculados pela água, por alimentos contaminados ou por mãos sujas.
O portador de T. solium, em uma casa, representa alto risco para os que aí convivem. Pois, suas fezes são muito ricas em ovos.
Por vezes um conjuge tem a teníase e o outro a cisticercose.
Nesses casos o número de cisticercos adquiridos costuma ser pequeno. 
A gravidade da infecção dependerá da localização dos parasitos (no olho, no sistema nervoso central etc.).
Na auto-infecção externa, o paciente é portador de uma tênia adulta e, por suas mãos sujas, ingere muitos ovos que vão formar cisticercos. 
Na auto-infecção interna, os movimentos antiperistálticos ou de vômito levam proglotes grá-vidas até o estômago, onde são digeridas. Os ovos liberados eclodem e são ativados, indo causar cisticercose maciça e disseminada em todos os teci-dos (chamada ladraria humana).
Condição que é extremamente grave.
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Formação do cisticerco
As oncosferas sofrem elevada mortalidade, mas as que sobre-vivem aos mecanismos imunoló-gicos e já se encontrem nos tecidos, passam por um proces-so de crescimento e, depois, de vacuolização central (A). 
Em um ponto de sua parede vai formar-se uma invaginação onde se distinguem (B):
- um receptaculum capitis (a),
- o escólex invaginado (b) com suas pregas (c), e 
- no fundo, as 4 ventosas e o rostro, com sua dupla fileira de acúleos. 
Tudo mergulhado num líquido (d) segregado pela parede do cisticerco (e). 
 Aos 3 meses a diferenciação está completa. A vesícula pode atingir 15 mm de comprimento por 7 ou 8 mm da largura.
Sua forma varia com as pres-sões que sofre nos tecidos.
 No olho, tende para a esferi-cidade, ou pode desenvaginar-se (como na fig. C).
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Localização dos cisticercos
 Só depois de 1 a 3 dias de ocorrida a infecção, os ovos eclodem, as oncosfe-ras invadem a mucosa intestinal e ganham a cir-culação, indo localizarem-se nos tecidos.
	Na radiografia ao lado, numerosos cisticercos pro-jetam-se sobre a imagem do esqueleto, muitos deles localizados na pele e nos músculos.
 As localizações mais fre-qüentes, quando há raros parasitos, são :
 Olhos e anexos ...... 46,0%
 Sistema nervoso .... 41,0
 Pele e subcutâneo.. 6,3
 Músculos ................ 3,5
 Outros órgãos ........ 3,2
Das localizações oculares, 60% ocor-rem na retina ou no vítreo.
Doc. do Dr. Hélio Moraes, Rio de Janeiro.
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Patologia da cisticercose
As manifestações patológicas do parasitismo só se evidenciam depois que o cisticerco comece a crescer.
Dois fatores respondem por sua variada sintomatologia:
─ a compressão mecânica e o deslocamento das estruturas anatômicas, com as conseqüen-tes alterações da fisiologia; p. ex., obstrução da circulação liquórica, produzindo hidroce-falia;
─ o processo inflamatório, que envolve o parasito, pode esten-der-se às estruturas vizinhas, sendo do tipo celular crônico.
Tudo depende da localização, do número e da vitalidade ou não dos parasitos.
No sistema nervoso
Um ou mais cisticercos podem alojar-se no sistema nervoso central; em geral menos de 10, mas podendo chegar excepcio-nalmente a mais de 2.000. 
Em torno dos parasitos forma-se uma cápsula fibrosa, mas ao morrerem a inflamação aumenta muito, tendendo para a forma-ção de granulomas.
Reabsorvidos os restos larvá-rios, a inflamação diminui, dei-xando um nódulo cicatricial residual, que pode calcificar-se.
Como reações à distância, ocorrem por vezes leptomeningi-tes, endarterites com distúrbios circulatórios, ou lesões tóxicas do tecido nervoso. 
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Neurocisticercose (1)
Depois, podem surgir paralisias, paresias, afasias etc. que regridem em horas ou dias. Se as crises mudam de localização, sugerem a existência de focos epileptógenos distintos.
A doença pode persistir 10 anos ou mais e terminar com a morte em estado de mal epiléptico. A cura espontânea é muito rara.
A localização dos cisticercos no SNC é aleatória, o que explica a va-riedade de quadros clínicos possíveis.
Eles são reunidos em três grupos:
Formas convulsivas – Que se apre-sentam em metade dos casos de neurocisticercose e aparecem em adultos sem antecedentes pessoais ou familiares. 
As convulsões são em geral do tipo bravais-jacksoniano; isto é, crises paroxísticas, focais, com movimentos tônicos e depois clônicos unilaterais, iniciando-se em determinados grupos musculares). Outras vezes são crises generalizadas.
 Corte de cérebro com numerosos cisticercos localizados de preferência na substância cinzenta (Doc. do Prof. Maffei, USP).
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Neurocisticercose (2)
Formas hipertensivas 
e pseudo-tumorais
São as que apresentam sinais de hipertensão intracraniana e sintomas neuropsíquicos focais, associados ou não.
Quase tão freqüente como a forma convulsivante, caracteriza-se por: cefaléia intensa, cons-tante e com paroxísmos aos esforços físicos, vômitos em jato e edema da papila.
Este edema tende a progredir diminuindo a visão e termina com cegueira, por atrofia do nervo óptico.
Ocorrem também bradicardia, distúrbios respiratórios, sono-lência e vertigens. A neurocisti-cercose é causa de 25 a 75% dos casos de convulsões e epilepsia.
As alterações psíquicas que acompanham esse quadro são principalmente: apatia, indife-rença, diminuição da atenção, estado de torpor ou de agitação ocasional.
O processo patológico consis-te em meningite da fossa poste-rior causada por cisticercos aí situados ou à distância.
A localização no 4º ventrículo produz a síndrome de Bruns: vertigens associadas a movi-mentos bruscos da cabeça, com cefaléia e vômitos.
A distensão do 3º ventrículo leva a distúrbios ao nível do quiasma e sela túrcica que simulam tumores dessa região. 
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Neurocisticercose (3)
Formas psíquicas 
Os sintomas psíquicos acom-panham muitas vezes as demais formas clínicas da doença. Mas, aqui as perturbações mentais dominam o quadro ou são as únicas presentes.
Elas não se distinguem das apresentadas em outras psico-ses, como a esquizofrenia, a mania, a melancolia, as síndro-mes delirantes etc.
Oftalmocicticercose
A localização na câmara anterior logo chama a atenção do paciente; mas, na posterior, os sintomas são discretos, indolores, e só percebidos ao interferirem com a visão central ou periférica.
As formas mais graves comprometem a visão por descolarem a retina ou por opacificarem os meios trans-parentes.
Também há dor devida à irite.
As localizações orbitárias
são assintomáticas ou produ-zem exoftalmia, desvio do globo ocular ou miosite com ptose.
Cisticercose disseminada
No tecido subcutâneo e na musculatura esquelética não causam incômodo ou produ-zem apenas mialgias.
Mas são as localizações no sistema nervoso e nos olhos que caracterizam a forma disseminada da cisticercose.
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Diagnóstico da Neurocisticercose (1)
Por sua raridade e pela varie-dade de seus quadros clínicos, que podem ser atribuíveis à outras causas, em geral não se pensa nesta doença.
Só a cisticercose ocular (com os meios transparentes) e a subcutânea são facilmente diagnosticadas.
Entretanto, a origem do pa-ciente, seus hábitos alimentares (consumo de carne de porco) e ter sido ou ser portador de uma tênia devem levar à suspeita clínica.
Os exames de laboratório são essenciais para o diagnóstico diferencial.
Exame de fezes
As técnicas são as mesmas recomendadas para as teníases em geral (ver).
Exame do líquor
É o mais informativo, pois:
─ muitas vezes a pressão está aumentada;
─ o exame citológico mostra aumento de proteínas, hipercito-se moderada (5-50 células/mm³), com predomínio de linfócitos; mas, é a eosinofilia no líquor que tem alto significado diagnóstico.
─ a reação de fixação do complemento é positiva para cisticercose e as reações para sífilis negativas.
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Diagnóstico da Neurocisticercose (2)
Testes imunológicos
Atualmente os testes mais usados são:
─ a técnica de ELISA, que mostra sensibilidade próxima de 80%
─ a imunoeletroforese, reco-mendada por não apresentar resultados falsos positivos, mas apenas 54 a 87% dos positivos;
─ a imunofluorescência indire-ta, tida por altamente especí-fica, mas faltando-lhe a sensibi-lidade.
A limitação maior da sorologia é que a presença de anticorpos nem sempre significa infecção atual; assim como não localiza os parasitos e pode dar reações cruzadas com outras cestoi-díases.
Exames radiológicos
A demonstração radiológica da cisticercose é feita pelo encontro dos nódulos calcifica-dos, com aspecto mais ou menos característico.
A calcificação só se processa após a morte do parasito e não em todos os casos. 
As calcificações intracrania-nas ocorrem apenas em 15 a 35% dos pacientes. Elas são mais freqüentes nos músculos.
A tomografia computadorizada fornece dados importantes para a localização das lesões no sistema nervoso central, tanto com parasitos vivos como com parasitos mortos.
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Diagnóstico da Neurocisticercose (3)
As figuras ao lado mostram tomografias computadorizadas de crânios de pacientes com neurocisticercose.
A ─ Paciente com cisticercos vivos, três dos quais situados nos lobos frontais (áreas circula-res claras e com escólex bem visível). 
Por apresentar hipertensão intracraniana, foi-lhe implantada uma válvula de derivação intraventricular-peritoneal, visível na região póstero-lateral da cabeça (lado esquerdo).
B ─ Caso com vários cisticercos vivos (áreas circulares claras) e outros calcificados (manchas negras).
C ─ Cérebro com um grande número de cisticercos calcificados.
(Tomografias do Dep. de Neurologia Clínica, da Escola Paulista de Medicina, São Paulo)
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Tratamento da cisticercose
Tem sido aplicado de várias maneiras:
A neurocirurgia encontra indi-cação quando o número de parasitos é pequeno e a localiza- ção favorável para a interven-ção.
Na cisticercose ocular, a ci-rurgia não oferece dificuldades quando o parasito se encontra na câmara anterior do olho; ou em situação subconjuntival ou sub-cutânea.
No vítreo, os sucessos são da ordem de 85%; e na sub-retina de 71%, em algumas estatís-ticas.
A quimioterapia é feita com praziquantel ou com albendazol.
Esses medicamentos pene-tram rapidamente no liquor e lentamente nos cisticercos.
Os parasitos levam cerca de três meses para desaparecerem da pele, após medicação.
A tolerância ao tratamento é boa em 80% dos casos. Nos demais aparecem sintomas atri-buídos à reação dos pacientes aos produtos dos cisticercos mortos.
Em alguns casos houve hiper-tensão aguda intracraniana por edema cerebral, que exigiram cuidados de urgência.
O praziquantel é contra-indica-do na cisticercose ocular.
Todo tratamento deve ser feito com paciente internado em uma enfermaria de Clínica Neuroló-gica e sob estrita vigilância mé-dica, mesmo por alguns dias após terminada a medicação.
Pacientes assintomáticos ou com cisticercos mortos não devem ser tratados.
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Profilaxia e controle da cisticercose
A profilaxia da cisticercose humana é essencialmente a da prevenção e do controle das teníases (analisada no Capítulo 11).
Mas algumas palavras devem ser ditas sobre a prevenção da auto-infecção e da hétero-infecção com ovos da Taenia solium.
Os portadores de infecção por Taenia solium e todos os casos suspeitos devem ter seu diagnóstico assegurado o mais cedo possível. 
Eles devem ser tratados imediatamente com algum dos tenicidas mencionados no capí-tulo anterior sob a rubrica: “Tratamento das teníases” (Capítulo 11). 
A educação sanitária deve alertar as pessoas para o perigo de consumir carne crua ou mal cozida, assim como a carne que não passou pelo controle sanitário. E ensinar às pessoas como reconhecer a eliminação de proglotes.
A higiene pessoal é muito importante: tomar banho e lavar as mãos freqüentemente, em especial depois das evacuações e antes de manipular alimentos ou fazer as refeições. 
Lembrar que as mãos sujas dos portadores de teníase e certas práticas sexuais (como sodomia e felação) podem levar à ingestão de ovos de Taenia solium e causar cisticercose no portador da teníase ou em seus próximos.
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Leituras complementares
ACHA, P.N. & SZYFRES, B. – Zoonosis y enfermedades transmisibles comunes al hombre y a los animales. 2a edição. Washington, Organización Panamericana de la Salud, 1997.
LIGHTOWLERS, M. W. et al. – Vaccination against cysticer-cosis and hydatid disease. Parasitology Today, 16 (5): 191-196, 2000.
OPAS/OMS - Relatório de uma Reunião de Consulta da OPAS/OMS sobre o Complexo Teníase/Cisticercose (Brasília, 1995). Washington, DC, OPAS, 1997. 
REY, L. – Bases da Parasitologia. 2a edição. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 2002 [380 páginas].
REY, L. – Parasitologia. 3a edição. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 2001 [856 páginas].
SMYTH, J.D. – The physiology of Cestodes. Edinburg, Oliver & Boyd, 1969.

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