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Farmacêutico – que profissional é esse? 
 
Daniela R. G. Junqueira 
Centro de estudos do medicamento (Cemed), Depto. de Farmácia Social, Faculdade de 
Farmácia, UFMG. 
 
Texto desenvolvido para a disciplina ‘Farmácia e Sociedade’ 
A enciclopédia livre virtual ‘Wikipédia’ define o farmacêutico como o profissional 
que completou o curso universitário de Farmácia, perito na produção, manipulação e 
dispensação de medicamentos. O dicionário e enciclopédia Koogan/Houaiss explica que é o 
profissional de farmácia; boticário. Muitos ainda o definem como o profissional do 
medicamento. Essas definições são, no entanto, bastante simples e não contemplam as 
diversas habilidades dessa profissão tão versátil. 
 As áreas de atuação farmacêutica são muito diversas devido à formação 
multidisciplinar dessa profissão. Considerando somente a esfera da produção dos insumos 
medicamentosos, esse profissional deve desenvolver conhecimentos e habilidades, em nível 
de pesquisa e também industrial, em áreas que incluem: 
 A gênese de fármacos, incluindo os processos de descoberta e planejamento de novos 
fármacos; 
 Fase de investigação físico-química e farmacotécnica, onde a caracterização físico-
química do fármaco é finalizada e é realizado o estudo de vias de administração e o 
desenvolvimento de formas farmacêuticas passíveis de serem utilizadas nessas vias; 
 Ensaios farmacológicos pré-clínicos, que consiste da avaliação in vitro e em animais 
experimentais do perfil farmacológico, da segurança farmacológica, da toxicologia e 
dos efeitos teratogênicos, mutagênicos e carcinogênicos e da avaliação preliminar dos 
parâmetros farmacocinéticos dos produtos candidatos a medicamentos; 
 O estudo e a produção de substâncias acondicionadas em formas farmacêuticas 
apropriadas que possuam parâmetros farmacocinéticos e de biodisponibilidade que 
viabilizem a ação terapêutica do fármaco bem como sua utilização. 
 Depois de cumpridas essas etapas, temos, em tese, um produto com potencial 
terapêutico. Mas, de fato, ainda não temos um medicamento. Na verdade, apesar de se definir 
o farmacêutico como o profissional do medicamento, poucos farmacêuticos algum dia se 
questionaram sobre o que é um medicamento. Esse produto, esse fármaco acondicionado em 
formas farmacêuticas, é um medicamento? 
 Ora, de fato esse produto é um medicamento em potencial. Mas imagine que alguém 
encontra esse produto e, não sabendo que se trata de um medicamento, o utiliza para fins de 
recreação e lazer. Esse medicamento em potencial passa a ser uma droga nesse exemplo. 
Falta, portanto, em nosso produto, um detalhe crucial: o indivíduo que usa esse produto como 
objeto terapêutico principal ou secundário no tratamento de uma enfermidade. E para que isso 
aconteça é necessário que se conheça como esse produto se comporta nas pessoas. Essa etapa 
de estudos constitui as áreas da Farmacologia Clínica e da Epidemiologia, representadas nesse 
campo de atuação principalmente pelos estudos clínicos e pelas atividades de 
farmacovigilância. Nessa etapa é importante responder a perguntas como: 
 A ação terapêutica pretendida ocorre de fato? 
 O perfil de segurança previsto nos ensaios pré-clínicos se mantém adequado? 
 A farmacocinética e a biodisponibilidade são constantes em pessoas com diferentes 
características, como peso e idade? Senão, como se alteram? Essa alteração pode 
alterar o perfil de segurança? 
 Como e por quanto tempo o medicamento deve ser utilizado para que os pacientes 
obtenham os benefícios terapêuticos? 
 Há algum fator que dificulte a utilização do produto pelo paciente, como gosto, via de 
administração, quantidade por dose pouco cômoda, intervalo entre doses 
inapropriado? 
 Aparecem efeitos colaterais ou reações adversas? 
 As reações adversas são leves, moderadas, graves ou letais? 
 Existe alguma característica que pode tornar perigosa a disponibilizarão desse produto 
a um grande número de pessoas? 
 Como esse medicamento interage com outros? Há alguma restrição para o uso em um 
tratamento com outros fármacos? 
 Como deve ser promovido e assegurado o uso racional desse medicamento 
terapêutico? 
 Nesse momento podemos perceber que estamos trabalhando, portanto, com um 
produto que possui uma dimensão química e biológica e uma dimensão social. Os 
medicamentos interferem marcadamente na vida do país e na saúde, individual ou coletiva 
[Souza 2003]. Portanto, a definição do farmacêutico como um profissional do medicamento 
compreendida e focada somente no produto químico pode ser um tanto simples e, de fato, não 
demonstra a importância terapêutica e social desse insumo. A introdução inevitável da 
dimensão social ao medicamento, define outras áreas de atuação desse profissional, áreas 
imprescindíveis para a correta e segura produção, distribuição, armazenamento e 
disponibilização desses insumos terapêuticos em estabelecimentos públicos e privados: 
 Legislação farmacêutica, já que os medicamentos podem também serem perigosos 
para a saúde e, para serem seguros, devem ser produzidos segundo padrões de 
qualidade bem específicos; 
 Farmacoeconomia, já que a saúde, em grande parte, depende da distribuição dos 
recursos na economia [Bevilácqua 2003] 
 Farmácia hospitalar, onde o farmacêutico deve participar da equipe de saúde 
assumindo atividades clínico-assistenciais, e utilizar mecanismos gerenciais para 
garantir uma administração da farmácia eficaz e racional. Nesse campo de atuação o 
farmacêutico é responsável também pelo desenvolvimento e aplicação efetiva de 
sistemas de distribuição de medicamentos e pelo abastecimento e gerenciamento de 
medicamentos e materiais médico-hospitalares. Pode ainda atuar na manipulação de 
medicamentos estéreis e não-estéreis, na terapia antineoplásica, na terapia nutricional 
parentereal e enteral, garantindo a qualidade desses procedimentos e a segurança e 
efetividade de medicamentos administrados através de cateteres de nutrição, no 
controle das infecções hospitalares; 
 Seleção de medicamentos, atividade de padronização de uma lista de medicamentos, 
política a ser implementada nos hospitais por uma comissão de farmácia e terapêutica 
(CFT) com vistas a assegurar uma terapêutica racional e de baixo custo. Em nível 
nacional, a Política Nacional de Medicamentos, por meio da elaboração da Relação de 
Medicamentos Essenciais (Rename), tem como propósito garantir a segurança, 
eficácia e qualidade do medicamento, além da promoção do uso racional e do acesso 
da população aos medicamentos considerados essenciais [Pianetti 2003]. 
 Centros de informação sobre medicamentos, pois uma informação apropriada sobre os 
medicamentos exerce papel de extrema importância na medida em que pode interferir 
de forma decisiva na sua utilização, minimizando risco e potencializando a efetividade 
e a eficiência terapêuticas [Vidotti 2003]. Segundo esse autor, “o medicamento é a 
soma do produto farmacêutico com a informação sobre o mesmo”; 
 Farmácia clínica e atenção farmacêutica, que são modelos de práticas farmacêuticas 
desenvolvidas em função do paciente, visando maior eficácia e segurança do 
tratamento medicamentoso. A profissão farmacêutica, no entanto, possui 
tradicionalmente uma face comercial bastante acentuada, e existem dificuldades em se 
obter aceitação de uma nova postura profissional [Storpirtis 2003]. A atuação segundo 
esses modelos de prática profissional exige o aperfeiçoamento de conhecimentos e 
habilidades específicos, muitas vezes não contemplados pelo currículo acadêmico dos 
cursos de Farmácia no Brasil. 
 Outra atividade constantemente citada na definição do profissional farmacêutico é a 
sua atuação na farmácia, ou seja, na dispensação farmacêutica. A dispensação
farmacêutica é, 
no entanto, somente a ponta de um modelo de prática profissional denominado ‘Assistência 
Farmacêutica’. A assistência farmacêutica é um sistema direcionado para a promoção ou 
recuperação da saúde, que engloba procedimentos relativos à seleção, produção, 
programação, aquisição, armazenamento, distribuição, prescrição e dispensação de 
medicamentos. 
 
“A dispensação é o último elo entre a complexa cadeia de eventos envolvendo o medicamento 
e o paciente. Constitui-se na última oportunidade de garantir que a terapia medicamentosa se 
faça completa e sem erros. Sua prática, entretanto, tem sido negligenciada em sua 
complexidade técnica e legal, tornando-se um ato meramente burocrático e comercial” 
[Perini 2003]. 
 
 Muito conhecida ainda é a atuação do farmacêutico como especialista em Análises 
Clínicas e Toxicológicas, na Indústria e na Manipulação. O conhecimento científico do 
farmacêutico especializado em Análises Clínicas se aplica em dois ambientes. O primeiro é o 
laboratório de Análises Clínicas, onde são realizados exames diagnósticos e toxicológicos 
para seres humanos e animais. O segundo é a Farmácia Comunitária, quando, na dispensação 
do medicamento ao paciente, forem observadas e informadas as possíveis conseqüências de 
seu uso, objetivando a adesão do paciente ao tratamento e a recuperação da saúde, 
proporcionando, deste modo, a efetiva Assistência Farmacêutica [Soares 2003]. Já o 
farmacêutico industrial é um profissional capacitado a atuar em várias etapas do 
planejamento, produção e controle de medicamentos, cosméticos e correlatos em indústrias e 
também em farmácias de manipulação. 
 Outra área que o farmacêutico pode atuar é a indústria de alimentos, onde o 
farmacêutico especialista em alimentos pode trabalhar desenvolvendo métodos de obtenção 
de produtos alimentares para uso humano e veterinário, realizando análises bromatológicas e 
toxicológicas, realizando o controle microbiológico, químico e físico-químico das matérias-
primas e produtos acabados, atuando no desenvolvimento, produção e controle de qualidade 
de alimentos, nutracêuticos e alimentos de uso enteral e parenteral, bem como na 
normatização e fiscalização junto à vigilância sanitária de alimentos. 
 O farmacêutico é ainda um profissional altamente qualificado para trabalhar em áreas 
como a Saúde Pública e a Vigilância Sanitária. O trabalho em Saúde Pública abrange o 
saneamento do meio, controle de infecções, organização de serviços de saúde e educação em 
saúde. A Vigilância Sanitária busca a eliminação, diminuição ou prevenção de riscos à saúde 
por meio do controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionem com a 
saúde, em todas as suas etapas e processos, da produção ao consumo; e da prestação de 
serviços que se relacionam direta ou indiretamente com a saúde. 
 Por fim, a formação multidisciplinar do curso de farmácia capacita esse profissional a 
trabalhar em pesquisa científica nas diferentes áreas de especialização descritas acima, bem 
como em outras áreas dos diferentes campos do conhecimento. 
 O farmacêutico é, assim, um profissional altamente capacitado e versátil para atuar em 
diferentes atividades na área de saúde. A profissão, no entanto, tem vivenciado um processo 
de perda de identidade, encontrando atualmente dificuldades em assumir responsabilidades 
sobre os diferentes processos de saúde nos quais o medicamento está envolvido. Isso porque 
outros profissionais tradicionalmente assumiram a responsabilidade pelas atividades 
envolvidas no processo de atenção à saúde, em escala individual e coletiva, enquanto o 
farmacêutico se afastou desse modelo de prática profissional, assumindo atividades 
essencialmente administrativas e comerciais. No entanto, enquanto a face comercial dominar 
a farmácia, esta permanecerá uma profissão incompleta [Storpirtis 1999]. 
 
Referências Bibliográficas 
 
Storpirtis 1999 
Storpirtis S. Farmácia Clínica. Rev Farm Quím 1999; 32 (1): 33-4. 
Soares 2003 
Soares JFT. O papel das análises clínicas na assistência farmacêutica. Centro Colaborador de 
Vigilância Sanitária (Cecovisa), Escola Nacional Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz 
(Ensp/Fiocruz).Disponível: http://cedoc.ensp.fiocruz.br/visa/opiniao_integra.cfm?opiniao=14. 
Acesso: 2008 Jul 5. 
Perini 2003 
Perini E. Assistência farmacêutica. In: Acurcio FA (org). Medicamentos e assistência 
farmacêutica. Belo Horizonte: Coopmed, 2003: 9-30. 
Storpirtis 2003 
Storpirtis S, Ribeiro E, Marcolongo R. Novas Diretrizes para a assistência farmacêutica 
hospitalar: atenção farmacêutica/farmácia clínica. In: Gomes MJVM, Reis AMM. Ciências 
farmacêuticas: uma abordagem em Farmácia hospitalar. São Paulo: Atheneu, 2003: 521-33. 
Vidotti 2003 
Vidotti CCF, Silva EV, Hoefles R. Centro de informações sobre medicamentos. In: Gomes 
MJVM, Reis AMM. Ciências farmacêuticas: uma abordagem em Farmácia hospitalar. São 
Paulo: Atheneu, 2003: 311-27. 
Pianetti 2003 
Pianetti GA. Política Nacional de Medicamentos. In: Gomes MJVM, Reis AMM. Ciências 
farmacêuticas: uma abordagem em Farmácia hospitalar. São Paulo: Atheneu, 2003: 301-10. 
Bevilácqua 2003 
Bevilácqua LDP. Farmacoeconomia. In: Gomes MJVM, Reis AMM. Ciências farmacêuticas: 
uma abordagem em Farmácia hospitalar. São Paulo: Atheneu, 2003: 191-220. 
Souza 2003 
Souza ZP. Legislação Farmacêutica. In: Gomes MJVM, Reis AMM. Ciências farmacêuticas: 
uma abordagem em Farmácia hospitalar. São Paulo: Atheneu, 2003: 179-91.

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