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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL CICLO BÁSICO GABRIELA ISAIAS DE SOUSA RESENHA SOBRE O LIVRO COMUNICAÇÃO, PÚBLICO E MULTIDÃO EM GABRIEL TARDE (ANÁLISE) Rio de Janeiro 2012 AS VERSÕES NÃO INDIVIDUALISTAS DE TARDE GABRIELA ISAIAS DE SOUSA ANTUNES, Marco Antônio. Comunicação, Público e Multidão em Gabriel Tarde. “Comunicação, Público e Multidão em Gabriel Tarde”, do especialista em Comunicação Marco Antônio Antunes, traz uma teia de pensamentos e teorias do sociólogo e criminologista francês Gabriel Tarde. Nesta obra, é confrontada a crença de que Tarde – o grande pai da microssociologia e da micropolítica – é um pensador acentuadamente individualista e as facetas interpsicológicas e sociais do estudioso são trazidas à discussão. Nos onze pequenos capítulos que compõem a obra, o autor Marco Antônio Antunes conceitua os tipos de comunicação expostos por Tarde (recíproca e unilateral), diferencia as camadas receptoras da mensagem em público e multidão, estabelece os juízos de invenção, imitação e oposição e analisa o método interpsicológico do sociólogo francês. Antunes também apresenta a etimologia e os significados da palavra “público”, sistematiza o debate teórico entre Tarde e Durkheim e associa subjetividade e intersubjetividade à comunicação, além de relacionar as funções do indivíduo e da democracia em uma sociedade. O estudioso de Gabriel Tarde, licenciado em Comunicação na Universidade de Beira Interior (Portugal) e master em Direção de Comunicação, Relações Públicas e Protocolo pela ESERP Business School leva o leitor a compreender os dois sentidos de “povo” existentes na palavra “público”: o primeiro consiste na ideia de acessibilidade (o espaço público era um local de liberdade e igualdade), enquanto o segundo centraliza-se a noção de bem comum (questões de interesse geral). Antunes relembra alguns autores que problematizaram e figuraram um tratamento científico à questão do público, além da sistematização regulada por Tarde sobre públicos, multidões e massas. Para o francês, o público concentra agentes críticos guiados por publicistas, enquanto as multidões estão imersas na alienação de informações expressas por um líder. A massa abrigaria uma camada de pessoas cujas respostas e opiniões seriam formadas sem qualquer debate ou discussão, fruto da opinião de uma figura influente. Discernir com rigor público de multidão pode levantar, também, algumas questões abordadas no livro: surgimento e características dessas duas vertentes, seus métodos de classificação, os males do público, entre outras. A Revolução de 1789 e a invenção da tipografia, do telégrafo e do caminho-de-ferro contribuíram para o crescimento da imprensa e, consequentemente, da expansão do público e da multidão. Enquanto no primeiro cada indivíduo apresenta-se como agente crítico e seus componentes exercem uma influência fraca entre si, a multidão está mais vulnerável, visto que, como defende Tarde, existe um estado de hipnose e sugestão nas multidões: “(...) uma multidão de homens unidos é muito mais crédula do que cada um deles em separado (...)”. Para Gabriel Tarde, tanto público quanto multidão podem ser classificados em função do sexo, da idade, dos fins e da fé ou ainda por critérios étnicos, econômicos, culturais, profissionais, políticos, religiosos, estéticos e filosóficos. Em Tarde, as coletividades sociais estão divididas em dois momentos interpsicológicos: a Comunicação Unilateral e a Comunicação Recíproca. Para ele, a interpsicologia pode ser compactada na seguinte posição nominalista: “a sociedade é um fato social de imitação, na qual apenas existem os indivíduos e as interações dos indivíduos”. O público facilita a imposição de opiniões de jornalistas e publicistas através da Comunicação Unilateral, enquanto a multidão favorece a Comunicação Recíproca – resultado das inevitáveis ações e reações intermentais entre os indivíduos. Correspondem, ainda, à Comunicação Unilateral, a invenção e a subjetividade (conduta inerente à um indivíduo) e à Comunicação Recíproca, a intersubjetividade (conduta comum à vários indivíduos) e a imitação. Ademais, a obra de Antunes retoma o polêmico e histórico debate entre Tarde e Durkheim , que colocou frente a frente posições opostas sobre a concepção de solidariedade social, o valor da Ciência, a autonomia da Sociologia perante a Psicologia, o conceito de Comunicação, entre outros. Se para Émile Durkheim a comunicação é um fato social coercivo e exterior, da sociedade para o indivíduo, Gabriel Tarde concebe-a como um processo livre intermental do indivíduo para a sociedade. Na perspectiva de Tarde, a sociedade é imitação e não há vida social sem paródias. Na sua definição, sociedade é “uma coleção de seres com tendência a se imitarem entre si, ou que, sem se imitarem, atualmente se parecem, e suas qualidades comuns são cópias antigas de um mesmo modelo”. Tarde vai além, de forma clara: “nós imitamos os outros a cada instante, a não ser que nós inventemos, o que é raro”. Muito raro: “pois nossas invenções são em sua maior parte, combinações de exemplos anteriores e permanecem estranhas à vida social se não forem imitadas”. A obra Comunicação, Público e Multidão em Gabriel Tarde reflete as ideias de Gabriel Tarde, expostas em algumas obras do francês, tais como Les lois de l’imitation, Le public et la foule, Logique sociale, entre outras. Apesar de o autor centralizar sua análise nessas obras de 1890, é possível afirmar que a contribuição de Tarde não se limita apenas a esse período, visto que ela é fundamental para entender a lógica social e até mesmo a internet, por exemplo, cerca de 110 anos depois. Em Les lois de l’imitation, Tarde analisa o processo de formação de opinião a partir das interações entre os componentes da sociedade. Traduzindo a linguagem tardiana para a situação atual: os veículos de comunicação e publicidade distribuem variadas informações que são “filtradas” pelos indivíduos. Para assumi-las como opinião, o indivíduo testa-as com alguém em cuja opinião confie. Na medida em que há aceitação, ele afirma a informação como opinião e a transmite a outros. E assim prossegue essa trajetória infinita de imitações. A lógica da internet é justamente essa: um constante repassar de informações repetidas. Sendo assim, é clara a contribuição de Gabriel Tarde para a sociologia da informação e, ainda que ignorada pela comunidade científica (em boa parte partidária de Durkheim), sua tese interpsicológica merece extrema atenção e conhecimento por parte dos membros da sociedade para que se possa compreender com maior clareza a lógica da comunicação atual. Embora o leitor necessite de um conhecimento prévio com bases sociológicas e filosóficas para compreender boa parte do texto de Antunes, o livro tem o mérito de reunir, em uma mesma obra, a convincente argumentação tardiana acerca da Comunicação como instrumento de poder de jornalistas, publicistas, líderes e outras figuras de caráter influente na sociedade, a tese da “Era do Público” e a não unânime, mas coerente linha de pensamento da “sociedade composta por sucessivas imitações”. Ótima aliada dos estudantes de Humanas (sobretudo os comunicólogos), o livro de Marco Antônio Antunes desvenda os mitos que rondam Gabriel Tarde e expõem a faceta desconhecida do sociólogo francês: além da doutrina individualista, existe um Tarde voltado para o interpsicológico e para a interação entre os grupos humanos. GRADUANDA EM COMUNICAÇÃO SOCIAL PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO