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OsSistemasAuditivo
eVestibular
INTRODUÇÃO
A NATUREZA DO SOM
. Quadro11.1 DeEspecíallnteresse:Ultra-someInfra-som
A ESTRUTURA DO SISTEMA AUDITIVO
O OUVIDO MÉDIO
COMPONENTESDO OUVIDO MÉDIO
AMPLIFICAÇÃODA FORÇA DO SOMPELOSOSSíCULOS
O REFLEXODEATENUAÇÃO
O OUVIDO INTERNO
ANATOMIADA CÓCLEA
FISIOLOGIADA CÓCLEA
A Respostada Membrana Basi/arao Som
O Órgão de Corti e as EstruturasAssociadas. Quadro11.2 DeEspecíallnteresse:QueosSurdosOuçam:ImplantesCocleares
A TransduçãopelasCélulasCiliadas. Quadro11.3 A RotadaDescoberta:Do Somà Sensação,porDavidP.Corey
A Inervaçãodas CélulasCiliadas
A AmplificaçãopelasCélulasCiliadasExternas. Quadro11.4DeEspecíallnteresse:OuvidosBarulhentos:As EmissõesOtoacústÍCas
PROCESSOS AUDITIVOS CENTRAIS
AANATOMIA DASVIASAUDITIVAS
PROPRIEDADESDAS RESPOSTASDOS NEURÔNIOS NA VIA AUDITIVA
CODIFICAÇÃO DA"INTENSIDADE E DA FREQÜÊNCIA DO SOM
INTENSIDADEDO ESTíMULO
FREQÜÊNCIADO ESTíMULO.TONOTOPIAESINCRONIADEFASE
TonotoPia
Sincronia de Fase
MECANISMOS DE LOCALIZAÇÃO DO SOM
LOCALIZAÇÃODO SOMNO PLANO HORIZONTAL
A Sensibilidade dos Neurônios com Resposta Binauricular à Localização do Som
LOCALIZAÇÃO DO SOMNO PLANOVERTICAL
CÓRTEX AUDITIVO
PROPRIEDADESDAS RESPOSTASNEURONAIS
. Quadro11.5DeEspecíallnteresse:ComoFuncionao CórtexAuditivo?ConsulteumEspecialista
OSEFEITOSDELESÕESEABLAÇÕESDO CÓRTEXAUDITIVO. Quadro11.6 DeEspecíallnteresse:DistúrbiosAuditivose SeusTratamentos
O SISTEMA VESTIBULAR
O LABIRINTO VESTIBULAR
OS ÓRGÃOS OToLíTICOS
OS CANAIS SEMICIRCULARES
VIASVESTIBULARESCENTRAIS E REFLEXOSVESTIBULARES
, O ReflexoVestíbulo-ocular(RVO)
PATOLOGIA VESTIBULAR
CONSIDERAÇÕES FINAIS
344 C A P íT U L O I I
.....
. OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
T INTRODUÇÃO
Nestecapítulo,descrevemosdoissistemassensoriaisquetêmfunçõesmuitodi-
ferentes,massimilaridadesestruturaise demecanismossurpreendentes:o sen-
tido daaudição e o sentidodo equilíbrio, fornecidopelo sistema vestibular.
A audiçãoé uma partevívida denossavida consciente,enquantoo equilíbrioé
algoquenós utilizamostodo o dia,masraramentepensamosa respeito.
Quando não podemosver um objeto,podemosfreqüentementedetectar
suapresença,identificarsuaorigeme atémesmoreceberuma mensagemsua,
exatamentepor podermosouvi-Io. Qualquer um quejá tenha caminhadopor
uma florestaem uma área onde existemursos ou cobrassabeque o somdo
roçar dasfolhaspode serum poderosoestímulopara chamara atenção.Além
da capacidadeparadetectare localizaro som,somoscapazes,também,deper-
ceber e interpretar suasnuança. Podemos distinguir imediatamenteo latido
de um cão, a voz de um determinadoamigo, uma onda do mar quebrando.
Pelo fato de os humanos seremcapazesde produzir uma amplavariedadede
sons,bem como de ouvi-Ios, a linguagemfaladae suarecepçãopelo sistema
auditivo tornaram-seum meio de comunicaçãoextremamenteimportante.A
audiçãonoshumanostemevoluídoalémdasfunçõesestritamenteutilitáriasde
comunicaçãoe sobrevivência;osmúsicos,por exemplo,exploramassensações
e emoçõesprovocadaspelo som.
Ao contráriodaaudição,o sentidodo equilíbrioéum processoestritamente
pessoale interno. O sistemavestibular informa nosso sistemanervoso onde
estãonossacabeçae nossocorpoe comoelesestãosemovimentando.Essain-
formaçãoé utilizadasemesforçoconscientepara controlarascontraçõesmus-
cularesque colocarãonossocorpoondequeremosque esteja,paranosreorien-
tarmosquando algonos empurraparaum lado e paramover nossosolhosde
maneira que nossocampovisual permaneçafixado em nossasretinasmesmo
quandoestivermosgirandoa cabeça.
Nestecapítulo,estudaremosos mecanismosque,no ouvido e no encéfalo,
fazema transduçãodo somdo meio ambienteem sinaisneuraissignificativose
a transduçãodosmovimentosdenossacabeçaem informaçãoacercadeonde
estamos.Veremosque essastransformaçõessãorealizadasem estágiosemvez
detodasdeuma única vez.No ouvido interno, asrespostasneuraissãogeradas
por receptoresauditivosapartir daenergiamecânicado somepelosreceptores
vestibularesa partir das inclinaçõese rotaçõesda cabeça.Em estágiossubse-
qüentesno tronco encefálicoe no tálamo,os sina'sdos receptoressãointegra-
dosantesde alcançarem,finalmente,os córticesa ditivo e vestibular.Ao exa-
minar aspropriedadesderespostasdosneurôniose váriospontosdo sistema,
passaremosa compreenderarelaçãoentrea atividade eurale nossapercepção
do some do equilíbrio.
T A NATUREZA DO SOM
Os sonssãovariaçõesaudíveisna pressãodo ar.Quasetodasascoisasquepos-
sammover moléculasdo ar podemgerarum som, incluindo ascordasvocais
da laringehumana, a vibraçãodeuma cordana guitarrae a explosãodefogos
de artifício. Quando um objeto semove em uma direção,um trecho dear é
comprimido,aumentandoa densidadedasmoléculas.De maneirarecíproca,o
ar ficararefeito(menosdenso)quandoo objetoseafasta.Issoéparticularmente
fácil de sevisualizar no casode um alto-falanteestéreo,no qual um conede
papelligadoa um magnetovibraparadentroeparafora, rarefazendoe compri-
mindo o aralternadamente(Figura 11.1).EssasmudÇ!nçasna pressãodo arsão
transmitidaspara longe do alto-falantena velocidadedo som,a qual é aproxi-
madamente343m/s parao ar à temperaturaambiente.
Muitas fontesde som,como cordasvibrando ou um alto-falantereprodu-
zindo o som deum instrumento de cordas,produzem variaçõesperiódicasna
pressãodo ar.A freqüência do som é o número de trechosde ar comprimi-
dos ou rarefeitosque passampelos nossosouvidos a cadasegundo.Um ciclo
de som é a distânciaentre trechoscomprimidos sucessivos;a freqüênciado
... A NATUREZA DO SOM 345
Alto-
falante Ar comprimido
cri
o
"O
o
1m
(/)
(/)
<D
O:
UmCiCI~1de onda
Distância
FIGURA 11.1
A produção do som pelas variações na pressão do ar. Quandoo conede papel
deumalto-falanteé empurradoparafora,elecomprimeo ar;quandoo coneé puxadopara
dentro,elerarefazo arSeos movimentosparadentroe paraforasãoperiódicos,ocorre,
também,umavariaçãoperiódicanapressãodo ar,conformemostradono gráfico.A distância
entreos sucessivostrechosde arcomprimido(alta-pressão)é umciclode som(indicado
pelaslinhasverticais).A ondasonorapropaga-sea partirdo alto-falantenavelocidadedo
som.A linhaazulé umgráficodapressãodo ar versusdistância.
som,expressaem unidades chamadashertz (Hz), é o número de ciclospor
segundo.Em decorrênciada propagaçãodetodasasondassonorasna mesma
velocidade,asondassonora.sde altafreqüênciatêmmaisregiõescomprimidas
erarefeitasem um determinadoespaçodo que asondasde baixa freqüência
(Figura11.2a).
Nossosistemaauditivopode respondera ondasdepressãodentro da faixa
detectávelde 20 a 20.000Hz (emboraessafaixa audíveldiminua significativa-
mentecom a idadee a exposiçãoa ruídos, especialmenteàs freqüênciasmais
altas).A percepçãodo som como agudoou grave,ou tom,é determinadopela
Baixafreqüência Altafreqüência
j~~
(a)
Baixaintensidade Altaintensidade
J~rvww
(b) Distância Distância
FIGURA 11.2
A freQÜência e a intensidade das ondas sonoras. (a) Percebemosondasdealta
freqüênciacomosonsmaisagudos.(b) Percebemossonsdealtaintensidadecomosonsde
maiorvolume,ou maisbarulhentos.
346 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
Ultra-someInfra-som
o ultra-som(somacimado limitede20kHzdanossaaudição)
é familiaràmaioriadaspessoas,emfunçãodesuasaplicações
cotidianas,desdelimpadoresultra-sônicosatéexamesmédicos
de imagensdo corpo.Muitosanimaissãocapazesdeescutar
essasaltasfreqüências.Porexemplo,osapitosparacãesfuncio-
namporqueessesanimaispodemouviratécercade40 kHz.
Algunsmorcegosvocalizamemfreqüênciasacimade 100kHz
e podem,portanto,escutarosecosdeseuschamadosparalo-
calizarobjetos(verQuadro11.5).Algunspeixesdafamniadas
savelhase dosarenquesdetectamsonstãoagudosquanto180
kHz,permitindo-osouviro ultra-somqueos golfinhosutili-
zamparalocalizá-Iospeloecodeseuschamadosecapturá-Ios.
Obviamente,osgolfinhostambémsãocapazesdeouvirseus
próprioschamadosultra-sônicos.De formasimilar;asmaripo-
sasnoturnaspodemouviro ultra-somdosmorcegosfamintos,
o queaspermitemescapardeseuspredadores.
Infra-somé o somcomfreqüênciasinferioresàsqueos
humanospodemouvir;abaixode aproximadamente20 Hz.
Algunsanimaispodemouvir freqüênciasinfra-sônicas;um
exemploé o elefante,quepodedetectartonsde 15Hz,ní-
veisde sonsinaudíveisparahumanos.As baleiasproduzem
sonsdebaixafreqüência,quesãoconsideradosummeiode
comunicaçãoparadistânciasde muitosquilômetros.Vibra-
çõesde baixafreqüênciatambémsãoproduzidaspelaterra,
e acredita-sequealgunsanimaispossamsentirumterremoto
iminenteporouvirtaissons.
Emboracomumentenãopossamosouvirfreqüênciasmui-
to baixascomnossosouvidos,essasestãopresentesemnosso
meioe podemprovocardesagradáveisefeitossubconscientes.
O infra-somé produzidoporaparelhoscomocondicionado-
resdear;aquecedoresdeágua,aeronavese automóveis.Ainda
queo infra-somintensodessasmáquinasnãoocasioneperda
deaudição,elepodecausartontura,náuseae dordecabeça.
Muitoscarrosproduzemsomdebaixafreqüênciaemrodovias
de altavelocidade,deixandopessoassensíveiscomcinetose,
doençado movimento.Emníveismuitoaltos,o somdebaixa
freqüênciapodeproduzirressonânciasnascavidadescorporais,
comoo tóraxe o estômago,o quepodeprejudicarórgãos
internos.Vocêpodequererpensarduasvezesantesdeper-
manecerdiretamenteemfrentea umgrandealto-falanteem
umconcerto!
Alémdosequipamentosmecânicos,nossocorpotambém
gerasomdebaixafreqüênciainaudível.Quandoos músculos
mudamseucomprimento,as fibrasvibramindividualmente,
produzindosomdebaixaintensidadea aproximadamente25
Hz.Apesarde,normalmente,nãopodermosouvirestessons,
vocêpodedemonstrá-Iosparasi,colocandocuidadosamente
seusdedospolegaressobreseusouvidosecerrandoospunhos
decadamão.À medidaquevocêforfechandoamão,poderá
ouvirumressôobaixoproduzidopelacontraçãodosmúsculos
deseuantebraço.Outrosmúsculos,incluindoseucoração,pro-
duzemsonsinaudíveisemfreqüênciaspróximasa20Hz.
É provávelque,exatamenteporessarazão,nãosejamos
capazesdepercebero infra-som.Seriadifícilrealizarmosalgum
trabalhosetivéssemosdeouvir;alémdo rumordasmáquinas,
ossonsdenossoprópriocorpo.
freqüência.Para relacionara freqüênciacomexemplosreconhecíveis,lembre
seque uma nota grave (baixa)de um órgãode igreja,capazde fazertremeri
sala,é deaproximadamente20 Hz, euma notaaguda(alta)deum ftautim,qw
pareça"perfurar os tímpanos",é de aproximadamente10.000Hz. Emborao
humanos sejamcapazesde ouvir uma amplafaixa defreqüências,existemfre
qüênciasdeondassonorasagu#,asegravesquenossosouvidosnão conseguen
ouvir, assimcomoexistemondaseletromagnéticasde luz quenossosolhosnãl
podemver (Quadro 11.1),,
Outra importantepropriedadedeuma onda sonoraé suaintensidade, '
qual é a diferençade pressãoentre os trechosde ar rarefeitose comprimido
(Figura 11.2b). A intensidade de som determina o volumeque nós percebe
mos, sons altos, ou de maior volume, têm maiores intensidades.A faixad,
intensidadespara as quais o ouvido humano é sensível é surpreendente:1
intensidade do som mais alto, que não lesione nossosouvidos, é aproxima
damenteum trilhão de vezesmaior do que a intensidadedo som maisbaixo
quepode ser ouvido. Senossosistemaauditivo fosseum pouco maissensíve
seríamoscapazesde ouvir o zumbido constantedos movimentos aleatório
dasmoléculasdo ar.
Na realidade,ossonsraramenteconsistememondassonorasperiódicassim
pIesdeapenasumafreqüênciaeumaintensidade.É a combinaçãosimultânead
sonsdedistintasfreqüênciase dediferentesintensidadesque dãoqualidadeste
naispeculiaresaossonsdosdiferentesinstrumentosmusicaise davoz humana.
... A ESTRUTURA DO SISTEMAAUDITIVO
Antesdeestudarmoscomoasvariaçõesna pressãodoar sãotraduzidasem
atividadeneura!,vamosexaminarrapidamenteaestruturadosistemaauditi-
vo.OscomponentesdoouvidosãomostradosnaFigura11.3.A porçãovisível
doouvidoconsistebasicamenteemcartilagemcobertaporpele,formandoum
tipodefunil chamadodepavilhão daorelhaouaurícula, quepermitecap-
turaro somoriundodeumaextensaárea.A formadopavilhãodaorelhanos
tornamaissensíveisaossonsquechegamdefrentedoquedetrás.As convo-
luçõesdopavilhãoassumemumpapelna localizaçãodossons,comodiscuti-
remosmaisadiantenestecapítulo.Noshumanos,opavilhãotemumaposição
maisoumenosfixa,masosanimaiscomogatosecavalospossuemconsiderá-
velcontrolemuscularsobreaposiçãodeseupavilhãoepodemorientá-Ioem
direçãoaumafontedesom.
A entradaparao ouvidointerno(ouorelhainterna)échamadademeato
acústicoexterno eestende-secercade2,5cmparao ladointernodocrânio
atéterminarnamembranatimpânica,tambémconhecidacomotímpano.Co-
nectadaà superfíciemedialdamembranatimpânica,estáumasériedeossos
conhecidoscomoossículos("pequenosossos";osossículossão,defato,osme-
noresossosdocorpo).Localizadosemumapequenacâmarapreenchidadear,
osossículostransferemosmovimentosdamembranatimpânicaparaumase-
gundamembranaquecobreumorifíciono ossodocrânio,chamadodejanela
oval.Atrásdajanelaovalestáacócleapreenchidaporfluído,a qualcontém
omecanismoquetransformao movimentofísicodamembranadajanelaoval
emumarespostaneural.Assim,osprimeirosestágiosdaviaauditivaseguem
basicamenteumaseqüênciacomoesta:
Ondasonoramoveamembranatimpânica--+
Membranatimpânicamoveosossículos--+
Ossículosmovemamembranadajanelaoval--+
Movimentodajanelaovalmoveo fluídodacóclea--+
Movimentodofluídonacócleacausaumarespostanosneurônios
sensoriais.
Ouvido
I.
\
" ~
\.
, .,
,
~
.~-
- l_médio_1 - Ouvido _I
~ internoI
Ouvido
externo
Ossículos
Janela
oval
\
Nervo
vestíbulo-
coclear
)\ ;>
Pavilhão " Canalauditivo Membranatimpânica
T A ESTRUTURA DO SISTEMAAUDITIVO 347
FIGURA 11.3
Os ouvidos externo, médio e interno.
348 CAPíTULO II . OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
Córtexvisual
11
NGL
11
Outrosneurônios
reti~nos
Fotorreceptores
do olho
FIGURA11.4
Comparaçãoentreasviasauditivae
visual. A partirdosreceptoressensoriais,
ambosossistemaspossuemestágiosiniciais
deintegração,umrelétalâmicoeuma
projeçãoaoneocórtex.
Todasasestruturasapartirdopavilhão,emdireçãoaointerior,sãoconsidera-
dascomponentesdoouvido,econvenciona-sereferiraoouvidocomo,constituído
por trêsprincipaisdivisões.As estruturasdopavilhãoatéa membranatimpânica
constituemo ouvido externo; a membranatimpânicae osossículosconstituem
o ouvido médio, ea estruturamedialàjanelaovaléo ouvido interno.
Uma vezquea respostaneural ao somégeradano ouvido interno, o sinalé
transferidoparauma sériede núcleosno troncoencefálico,ondeé processado.
A eferênciadessesnúcleosé enviadaa um núcleo deretransmissãono tálamo,
o núcleo geniculado media!, ou NGM. Por fim, o NGM projeta-seao cór-
tex auditivo primário, ou AI, localizadono lobo temporal.Sobum aspecto,
a via auditiva é maiscomplexado que a via visual,pois existemmaisestágios
intermediáriosentreosreceptoressensoriaise o córtex.Entretanto,ossistemas
possuemcomponentesanálogos.Cadaum inicia comreceptoressensoriais,os
quaisseconectamparaasetapasiniciaisde integraçãosináptica(naretinapara
a visãoe no troncoencefálicoparaa audição),seguindo,então,a um núcleode
retransmissãotalâmicoe ao córtexsensorial(Figura 11.4).
... O OUVIDO MÉDIO
o ouvidoexternodirecionaosomaoouvidomédio,umacavidadepreenchida
comar,contendoosprimeiroselementosquevibramemrespostaaosom.No
ouvidomédio,asvariaçõesnapressãodoar sãoconvertidasemmovimentos
dosossículos.Nestaseção,exploraremoscomoo ouvidomédiorealizauma
transformaçãoessencialdaenergiasonora.
Componentesdo Ouvido Médio
As estruturasdentrodo ouvidomédiosãoa membranatimpânica,osossículose
doispequenosmúsculosqueseligamaosossículos.A membranatimpânicatem
um formatolevementecônico,comapontado coneestendendo-separadentro
da cavidadedo ouvido médio.Existemtrêsossículos,cadaum denominadode
acordo com um objeto com que seassemelhalevemente(Figura 11.5).O os-
sículo ligado à membranatimpânicaé o martelo, o qual forma uma conexão
rígida com a bigorna. A bigorna forma uma conexãoflexível com o estribo.
A porçãobasalachatadado estribo,a platina,move-separadentro e parafora,
como um pistão,na janela oval, transmitindo,assim,asvibraçõessonorasaos
fluidos dacócleano ouvido
interno.
O ar no ouvido médioestáem continuidadecom o ar nas cavidadesnasais
atravésda tuba (ou trompa) de Eustáquio, emboraessetubo estejanormal-
mente fechadopor uma válvula. Quando você estáem um avião ascendendo
ou em um carro seguindopara o alto de uma montanha, a pressãodo ar cir- '
cundantediminui. Enquanto a válvula na tuba de Eustáquio estiverfechada,
o ar no ouvido médio permanecena pressãodo ar antesde você começara
subir.Pelo fato dea pressãono interior do ouvidomédio estarmaisaltadoque
a pressãodo ar no exterior,a membranatimpânicaprotrai, e você senteuma
pressãodesagradávelou dor no ouvido. A dor pode ser aliviadapor bocejoou
deglutição,que abrema tuba de Eustáquio, igualando,dessemodo, a pressão
do ar no ouvido médio coma pressãodo ar do ambiente.O opostopodeacon-
tecerà medidaque vocêestiverdescendo.A pressãodo ar externoserá,então,
mais alta do que a pressãodentro do ouvido médio, e o desconfortoquevocê
sentirápoderáseraliviadopelaaberturadatubadeEustáquionovamente.
Amplificação da Força do Som pelos Ossículos
Asondassonorasmovemamembranatimpânica,eosossículosmovemamem-
branadajanelaoval.Porqueo ouvidonãoestáarranjadodemaneiraqueas
ondassonorasmovamdiretamenteamembranadajanelaoval?O problema
Martelo Bigorna Estribo
I r~, ~. h' ~~ . . ~..' . . '~(~"'\~l..:"\ r ", ,l'~~'F,.i \ ,
t .. .. \.. ~ -l'''~'~" :
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\ I;-,
Canal
auditivo
Membrana
timpânica
FIGURA 11.5
O ouvidomédio. Como assetasindicam,quandoa pressãodo arempurraa membrana
timpânica,a basedo marteloé empurradaparadentro,e o efeitoalavanca,realizadopelos
ossículos,fazcomquea platinado estriboempurreajanelaovalparadentro,A pressãoque
empurraajanelaovalé maiordo quenamembranatimpânica,emparteporquea áreade
superfíciedaplatinado estriboé menordo quea áreadesuperfíciedamembranatimpânica,
é quea cócleaestápreenchidacom fluido e não com ar. Se as ondassonoras
colidissemdiretamente'sobrea janela oval, a membranairia mover-semuito
pouco,e toda a energiasonora, exceto0,1%, seriarefletidadevido à pressão
queo fluido coclearexerceno lado interno dajanela oval. Sevocêalgumavez
notouquão silenciosoé soba água,vocêteria uma boa idéia de como a água
refleteo somvindo de cima.O fluido no ouvido interno resisteao movimento
muitomais do que o ar (istoé, o fluido tem maior inércia), demaneira que é
necessáriaumapressãomaiorparavibraro fluido do que o ar.Os ossículosfor-
necemessaamplificaçãonecessáriana pressão.
Para compreender o processo, consideremos a definição de pressão.A
pressãosobreuma membrana é definida como a força que lhe é imposta di-
vididapela suaáreade superfície.A pressãona janela oval torna-semaior do
que a pressãona membrana timpânica se (1) a força sobrea membrana da
janelaoval for maior do que sobrea membranatimpânicaou se (2) a áreade
superfícieda janela oval for menor do que a área da membrana timpânica.
O ouvido médio utiliza ambosos mecanismos.Ele aumenta a pressãona ja-
nelaovalpela alteraçãotanto da força como da áreada superfície.A forçana
janelaoval é maior porque os ossículosatuam como alavancas.O som causa
grandesmovimentosdamembranatimpânica,osquaissãotransformadosem
vibraçõesmenores,porém mais fortes da janela oval. E a áreade superfície
dajanela oval é muito menor do que a da membranatimpânica.Taisfatores
combinadostornam a pressãona janela oval 20 vezesmaior do que a pressão
na membranatimpânica,e esseaumento é suficientepara mover o fluido no
ouvidointerno.
... O OUVIDOMÉDIO 349
Platinado
estribosobre
a janelaoval
Cóclea
Tubade
Eustáquio
350 CAPíTULO I I . OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
o ReflexodeAtenuação
Os doismúsculosligadosaosossículostêmum efeitosignificativosobreatrans-
missãodo somao ouvido interno. O músculotensordotímpanoestáancoradono
ossoda cavidadedo ouvido médio por uma extremidadee ligado ao martelo
pela outra extremidade(Figura 11.6).O músculoestapédiotambémseestende
desdeo ponto de suafixaçãono ossoatéonde seliga ao estribo.Quandoesses
músculos se contraem,a cadeiade ossículostorna-se muito mais rígida,e a,
conduçãodo somao ouvido interno fica muito diminuída. O início deum som
barulhento disparauma respostaneural que faz com que essesmúsculosse
contraiam,uma respostachamadadereflexo de atenuação. A atenuaçãodo
somé muito maior em freqüênciasbaixasdo queem freqüênciasaltas.
Uma sériedefunçõestemsidopropostaparaessereflexo.Umafunçãopode
sera deadaptaro ouvidoaosomcontínuodealtaintensidade.Ossonsdemaior
volume, que de outro modo saturariama respostados receptoresno ouvido
interno, podemestarreduzidosa um nível debaixa saturaçãopelo reflexode
atenuação,aumentando,assim,a faixa dinâmicaem que podemosescutar.O
reflexo de atenuaçãotambémprotegeo ouvido interno de sonsbarulhentos
que poderiamdanificá-Ia. Infelizmente,o reflexo temum retardode 50a 100
ms em relaçãoao momento em que o som alcançao ouvido, não oferecendo,
assim,muitaproteçãodossonsintensosmuito repentinos;o prejuízojá podeter
ocorridoquandoosmúsculossecontraírem.Essaé arazãopelaqual,apesardos
melhoresesforçosde seureflexodeatenuação,uma forteexplosãoaindapode
danificarsuacóclea.Como o reflexodeatenuaçãosuprimemaisasfreqüências
baixas(sonsgraves)do queasaltas(sonsagudos),essefacilitadiscernirossons
de altafreqüênciaem um ambienterepletoderuídos debaixafreqüência.Essa
capacidadenos permite compreendera fala mais facilmenteem um ambiente
barulhentodo que seríamoscapazessemo reflexo.Considera-seque o reflexo
de atenuaçãotambémestáativadoquandofalamos,demaneiraque não ouvi-
mosnossaprópriavoz tãoaltaquantoouviríamosemuma situaçãocontrária.
Ossículos Janela ovallabirinto
Músculo
tensor
dotímpano
Membrana
timpânica
Músculo
estapédio
Janela
redonda
Cóclea
FIGURA 11.6
Os ouvidosmédioe interno. Os músculosestapédioetensordotímpanoestãoligados
à parededo ouvidomédiopor umaextremidadee aosossículospelaoutra.
T o OUVIDO INTERNO
Embora consideradocomo parte do ouvido, nem todo o ouvido interno está
relacionadocom a audição. O ouvido interno consistena cóclea,que é parte
dosistemaauditivo, e no labirinto, que não é. O labirinto é uma parteimpor-
tantedo sistemavestibular,o qual auxilia a mantero equilíbrio corporal.O sis-
temavestibularserádiscutidomaisadianteno capítulo.Estamosinteressados,
aqui, somentena cócleae no papelque ela assumena transformaçãodo som
emum sinal neural.
AnatomiadaCóclea
A cóclea (do latim para" caracol") tem uma forma em espiral que lembra
uma concha de caracol. A Figura 11.6 mostra a cóclea seccionadaao meio.
Pode-serepresentara estrutura da cócleaenrolando um canudinho debeber
por duasvoltas e meia ao redor da ponta de um lápis. Na cóclea,o tubo oco
(representadopelo canudo) temparedesconstituídaspor osso.O pilar central
dacóclea(representadopelo lápis) é uma estruturaósseacônica chamadade
modíolo.As dimensõesreais sãomuito menores do que o modelo canudo-e-
lápis;o tubo oco da cócleatem aproximadamente 32 mm de comprimento
e 2 mm de diâmetro. A cócleahumana enrolada é aproximadamentedo ta-
manho de uma ervilha. Na baseda cóclea,existemdois orifícios cobertospor
membrana:a janela oval, a qual vimos que estáabaixo da platina do estribo,
eajanela redonda.
Sea cócleaestivercortadaem secçãotransversal,podemosver que o tubo
estádividido em três câmaraspreenchidaspor fluido: a escala (ou rampa)
vestibular, a escala média e a escala timpânica (Figura 11.7). As trêses-
calasenrolam-seao redor da porção interna da cócleacomo uma escadaem
espiral.A membrana de Reissner separaa escalavestibularda escalamédia,
e a membrana basilar separaa escalatimpânica da escalamédia. Apoiado
na membrana basilar estáo órgão de Corti, o qual contém os neurônios
receptoresauditivos; suspensosobreesseórgãoestáa membrana tectorial.
No ápiceda cóclea,a escalamédiaestáfechada,e a escalatimpânicatem con-
tinuidadecom a escalavestibularatravésde um orifício nas membranascha-
madode helicotrema (Figura 11.8).Na base da cóclea,a escalavestibular
Membranade
Reissner
Membrana
tectorial
Estria vascular
FIGURA11.7
As trêsescalasdacóclea. Vistaemsecçãotransversal,acócleacontémtrêspequenas
câmarasemformadecanaisparalelos.Essascâmaras,asescalas(ourampas),sãoseparadas
pelamembranadeReissnerebasilar.O órgãodeCorticontémosreceptoresauditivoseestá
situadosobreamembranabasilarecobertopelamembranatectorial.
T O OUVIDOINTERNO 351
Escala vestibular
Escalamédia
Escala timpânica
352 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
Cóclea
desenrolada
Ápice
Helicotrema
Estribo
Escalabasilar
Escalatimpânica
FIGURA11.8
A membranabasilarem umacócleadesenrolada. Emboraacócleaestreita-se
apartirdabaseemdireçãoaoápice,amembranabasilaralarga-senessemesmosentido.
Observequeamembranabasilaréapenasafaixaestreitaemazul.O helicotremaéum
orifíCiono ápicedamembranabasilar,queconectaa escalavestibularà escalatimpânica.
encontra-secom ajanela oval, e a escalatimpânicaencontra-secomajanela
redonda.
O fluido na escalavestibulare na escalatimpânica,chamadode perilinfa,
temuma constituiçãoiônicasimilarà dofluido cefalorraquidiano:concentrações
baixasde K+(7 mM) e altasdeNa+(140mM). A escalamédiaestápreenchida
pelaendolinfa,queéumfluidoextracelularincomum,porpossuirconcentra-,
çõesiônicassimilaresàsdo fluido intracelular,comaltaconcentraçãodeK+(150
mM) ebaixadeNa+(1mM). Essadiferençana concentraçãoiônicaé geradapor
processosdetransporteativoque ocorremna estriavascular,o endotélioquere-
cobreaparededaescalamédia(Figura11.7).A estriavascularreabsorvesôdioe
secretapotássiocontraseusgradientesdeconcentração.Devidoàsdiferençasde
concentraçãoiônica e à permeabilidadedamembranade Reissner,a endolinfa
temum potencialelétricoque é aproximadamente80 mV maispositivodoque
o daperilinfa; esseé chamadodepotencialendococlear.Veremosque o potencial
endocodearé importante,poisaumentaa transduçãoauditiva.
FisiologiadaCóclea
Apesar de sua complexidadeestrutural, o funcionamento básicoda côdeaé
consideravelmentesimples.Observea Figura 11.8 e imagine o que acontece
quando os ossículosmovem a membranaque cobrea janela oval.Eles funcio-
nam como um pequenopistão.O movimentopara dentro na janela ovalem-
purra a perilinfana escalavestibular.Sea membranano interiordacôdeafosse
T o OUVIDOINTERNO 353
completamenterígida, o aumento da pressãodo fluido na janela oval subiria
pelaescalavestibular,passariapelo helicotremae desceriapela escalatimpâ-
nica atéa janela redonda. Como a pressãodo fluido não tem nenhum outro
lugarparaescapar,a membranadajanelaredondadeveseabaularparaforaem
respostaao movimento da membranada janela oval para o interior da cóclea.
Qualquermovimento da janela oval deveráser acompanhadopor um movi-
mentocomplementardajanela redonda.Talmovimentodeveocorrerpelo fato
dea cócleaestarpreenchidapor um fluido incompressível,mantido em um
compartimentoósseosólido.A conseqüênciado empurrãosobrea janela oval
ésimilara uma pressãosobreuma extremidadedeum balãotubular contendo
água:a outra extremidadeseexpandiráparafora.
Essasimplesdescriçãodos eventosna cócleanão é totalmenteprecisapor
causade um fator adicional:algumasestruturasinternas da cócleanão sãorí-
gidas.E é o casoda mais importante dessas,a membranabasilar é flexível e
movimenta-seem respostaao som.
A Resposta da Membrana Basilar ao Som. A membranabasilartem duas
propriedadesestruturais que determinam a maneira como ela responde ao
som.Primeiro, a membranaé cercade 5 vezesmais largano ápicedo que na
base.Segundo,a rigidez da membrana diminui da baseem direçãoao ápice,
coma basesendo aproximadamente100 vezesmais rígida. Imagine-a como
umanadadeira (pé-de-pato)usadana natação,com uma baseestreitae rígi-
dae um ápiceamplo e flexível. Quando o som empurra a platina do estribo
sobrea janela oval, a perilinfa desloca-sedentro da escalavestibular,e, como
a membranade Reissner é muito flexível, a endolinfa desloca-sedentro da
escalamédia. O som também pode puxar a platina, invertendo o gradiente
depressão.O som provoca um movimento contínuo de puxa-e-empurra da
platina,comoum pequenopistão.
Devemos muito de nossa compreensão sobre a respostada membrana
basilar à pesquisa do biofísico húngaro-americano Georg von Békésy. Von
Békésyestabeleceuque o movimento da endolinfa, o qual faz a membrana
basilarmovimentar-sepróximo a suabase,inicia a propagaçãode uma onda
em direçãoao ápice.A onda que percorre a membranabasilar assemelha~se
a uma onda que percorre uma corda quando você a seguracom a mão por
uma extremidadee a sacode(Figura 11.9). A distânciaque a onda percorre
namembranabasilardependeda freqüênciado som. Sea freqüênciafor alta,
a basemais rígida da membrana vibrará muito, dissipandoa maior parte da
energia,e a onda não propagarápara muito longe (Figura 11.1Oa).Sons de
baixafreqüência,contudo,geramondasquesepropagarãoatéo ápiceflexível
damembranaantesque a maior parte da energiatenha se dissipado(Figura
Membranabasilar
lr,~
Helicotrema
FIGURA 11.9
Propagaçãode umaondanamembranabasilar. À medidaqueo estribomove-se
para dentroe parafora,elefazcomquea endolinfaflua,comoindicadopelassetas.Issogera
umaondaquesepropaganamembranabasilar.(O tamanhodaondaestáaumentadocerca
de I milhãodevezesnessailustração.)Nafreqüênciade3.000Hz,o movimentodofluidoe
damembranaterminamdeformaabruptamaisoumenosnomeiodotrajetoentreabasee
oápise.(Fonte:AdaptadadeNobili,MammanoeAshmore,1998,FiguraI.)
354 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
FIGURA11.10
A respostada membranabasilar
ao som. A cócleaestámostrada
desenrolada.(a) Sonsdealtafreqüência
produzemapropagaçãodeumaonda,a
qualsedissipapróximoàbaseestreitae
rígidadamembranabasilar.(b) Sonsde
baixafreqüênciaproduzemumaondaque
sepropagaportodoo percursoatéo ápice
damembranabasilarantesdesedissipar.
(Adeformaçãodamembranabasilar
estáexageradaparafinsdeilustração.)
(c) Existeumcódigodelocalizaçãona
membranabasilarparaafreqüênciaque
produzadeflexãodeamplitudemáxima.
Ápicelargo
e flexível 500Hz
Baseestreita
e rígida
(a) Altafreqüência (b) Baixafreqüência (c) Locaisdeamplitudemáxima
dedeflexãoproduzidapor
diferentesfreqüências
11.1Ob).A respostadamembranabasilarestabeleceum códigode localização,
pelo qual diferentesposiçõesdamembranaestãodeformadasaomáximoparaasdi-
ferentesfreqüênciasdesom(Figural1.lOc). Comoveremos,apropagaçãodasondas
produzidaspelasdiferentesfreqüênciassonorassãoresponsáveispelocódigoneural
dotom.
o ÓrgãodeCorti easEstruturasAssociadas.Tudoquediscutimosatéaqui
envolveastransformaçõesmecânicasdaenergiasonoraqueocorremnosouvi-
dosmédioe interno.Agorapassaremosàpartedosistemaonde,pelaprimeira
vez,osneurôniosestãoenvolvidos.As célulasreceptorasauditivas,asquais
convertemaenergiamecânicaemumaalteraçãonapolarizaçãodamembrana,
estãolocalizadasno órgãodeCorti(denominadocomo nomedoanatomista
italianoqueo identificouprimeiramente).O órgãodeCorticonstitui-sedecé-
lulascHiadas,dospilaresdeCortiedeváriascélulasdesustentação.
Osreceptoresauditivossãochamadosdecélulas cHiadas,porquecada
umapossuiaproximadamente100estereocílios(microvilosidadesrígidasque
lembramcílios)queseprojetamdesuaporçãoapical.As célulascHiadaseos
estereocíliossãomostradosnaFigura11.11pormeiodemicroscopiaeletrônica
devarredura.O eventocríticonatransduçãodosomemum sinalneuraléo
deslocamentodessesdlios.Poressarazão,examinaremoso órgãodeCortiem
maisdetalhesparavercomoomovimentodamembranabasilarlevaaodeslo-
camentodosestereocílios.
AscélulascHiadasestãofixadasentreamembranabasilareumafinalâmi-
nadetecido,chamadalâmina reticular (Figura11.12).OspilaresdeCorties-
tendem-seentreessasduasmembranasefornecemsustentaçãoestrutural.As
célulascHiadaslocalizadasentreomodíoloeospilaresdeCortisãochamadas
decélulascHiadasinternas (cercade3.500dispostasemumaúnicafileira),
eascélulasdispostasmaisexternamenteaospilaresdeCortisãochamadasde
células cHiadasexternas (noshumanos,existemaproximadamenteentre
15.000e 20.000,dispostasemtrêsfileiras).Osestereocíliosestendem-sedo
limiteapicaldascélulascHiadasparao interiordaendolinfa,acimadalâmina
reticular,mantendosuasextremidadesnasubstânciagelatinosadamembrana
tectorial(célulascHiadasexternas)ou logoabaixodamembranatectorial(cé-
lulascHiadasinternas).Paraguardarcorretamenteemsuamemóriaasmem-
branasinternasdoórgãodeCorti,lembre-sequea basilarestánabasedo
órgãodeCorti,a tectorialformaumtetosobreaestrutura,ea reticularestáno
meio,apoiandoascélulascHiadas.
As célulascHiadasfazemsinapsescomneurônioscujoscorposcelulares
estãono gânglio espiral, dentrodo modíolo.As célulasdogânglioespiral
sãobipolares,comosneuritosestendendo-separaasparteslateraisebasaldas
célulascHiadas,ondeessasestabelecemconexõessinápticas.Osaxôniosdo
Membrana
Estereocílios tectorial
Cél"',o1l;,d, ~
.
.. .~
e"eco, ~\": ~...""/:;..
/ \~\ '
.
~..'..l~
:i.
Lâmina
reticular
(b)
T O OUVIDOINTERNO 355
FIGURA 11.11
Células ciliadas visualizadas por
meio de microscopia eletrônica de
varredura. (a)Ascélulasciliadaseos
seusestereoCllios.(b) Umavistadealta
resoluçãodosestereoCl1iosemumacélula
ciliadaexterna.Os estereoCl1iospossuem
aproximadamente5 fJmdecomprimento.
(Fonte:Cortesiade I.Hunter-Duvare R.
Harrison,TheHospitalforSickChildren,
Toronto,Ontario,Canada.)
Lâmina
reticular
Modíolo
~-
-/
Membrana
basilar
Pilares
de Corti
FIGURA 11.12
O órgão de Corti. A membranabasilarsustentao tecidoqueincluiascélulasciliadas
internas,asexternase os pilaresde Corti.A membranatectorialestende-sedo modíoloósseo
paracobriraspontasdosestereoClliosqueprotraemdaporçãoapicaldascélulasciliadas.
Gânglio espiral
Nervo auditivo
356 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
gânglioespiralentramno nervo vestíbulo-coclear (VIII nervo craniano),o
qual seprojetaaosnúcleoscoclearesno bulbo. É possíveltratar certasformas
de surdez com a utilização de mecanismoseletrônicos que, sem passarpelo
ouvido médio e célulascHiadas,ativam diretamenteos axônios do nervo au-
ditivo (Quadro 11.2).
A transdução pelas Células CHiadas. Quando a membranabasilarmove-
seem respostaa um movimento do estribo,toda a estruturaque sustentaas
células ciliadas movimenta-se, pois a membranabasilar, os pilares de Corti,
a lâmina reticular e as células ciliadas estão rigidamente conectadasentre
si. Essasestruturasmovem-se como uma unidade, como um pivotante em
direção à membrana tectorial ou afastando-sedessa.Quando a membrana
basilarmove-separa cima,a lâmina reticular move-separa cimae na direção
do modíolo. Inversamente, o movimento para baixo da membrana basilar
faz com que a lâmina reticular mova-separabaixo, afastando-sedo modíolo.
Quando a lâmina reticular semove, aproximando-seou afastando-sedomo-
díolo, também o faz igualmentecom relaçãoà membranatectorial.Pelo fato
de a membrana tectorial firmar a extremidade dos estereocíliosdascélulas
ciliadas externas, a movimentação lateral da lâmina reticular em relaçãoà
Que os SurdosOuçam:
ImplantesCocleares
A lesãoouperdadascélulasciliadasé acausamaiscomumda
surdezhumana(QuadroI 1.6).Na maioriadoscasos,o nervo
auditivopermaneceintacto,tornandopossívelrecuperaralgu-
maaudiçãocomumimplantecoclear,ouseja,umacódeaartifi-
cialeletrônica.A origemdessatecnologiapodeserencontrada
hádoisséculos,notrabalhopioneirodofIsicoitalianoAllesan-
droVolta(foiemsuamemóriao nomedadoàunidadeelétrica
volt).Em 1800,logoapóster inventadoa bateria,Voltainseriu,
porbrincadeira(algunsdiriamportolice),osdoiscontatosde
umabateriade50voltsemseusouvidos.Eiscomodescreveu
o resultado:
No momentoqueo circuitosefechou,recebiumchoque
nacabeçae,algunsmomentosdepois,eucomeceiaouvir
umsom,ou maiscomoumruído,nosouvidos,osquaiseu
nãopudedefinirbem:foiumtipodeestalocomcolisões,
comosealgumacolaou umasubstânciaespessaestivesse
borbulhando...A sensaçãodesagradável,queacreditoser
perigosadevidoao choqueno cérebro,me impediude
repetiresseexperimento...*
Advertimosinsistentementequevocênõodevetentarissoem
casa.
A técnicadeestimulareletricamenteosouvidostemme-
lhoradoconsideravelmentedesdeo experimentosingularde
Volta.De fato,atualmenteos sistemasde implantescodeares
têm revolucionadoo tratamentode lesãodo ouvidointer-
.Extraídode ZengF-G. 2004.Trendsin cochlearimplants.Trendsin
Amplification, 8:1- 34.
no paramuitaspessoas.A maioriadossistemasé realmente
externoao corpo(FiguraA). Eleconsisteem ummicrofone
externoàcabeça,querecebeo some o converteemumsinal
elétrico.Essesinalé enviadoa umprocessadordigitalcomba-
teria.Um pequenorádiotransmissorcolocadosobreo couro
cabeludotransmiteo códigodigitala umreceptorimplantado
cirurgicamenteabaixodapelesobreo ossomastóide,atrásda
orelha.O transmissore o receptorsãopróximosentresicom
magnetos,semfiospenetrandoapele.
O receptortraduzo códigoemumasériedeimpulsoselé-
tricosqueenviaao implantecodear- umfeixedefiosmuito
finose flexíveisqueforaminseridosporumpequenoburaco
nacódea(FiguraB).O aparatodeeletrodoscodearespossui
de 8 a 22 sítiosdeestimulaçãoqueo permiteativaro nervo
auditivoemváriospontosao longodacódea,desdesuabase
atéo ápice.Acaracterísticamaisengenhosado implantecodear
équeelepodeaproveitar-sedoarranjotonotópicodosaxônios
donervoauditivo;aestimulaçãopróximaàbasedacódeagera
umapercepçãodesonsdealtafreqüência,enquantoaestimula-
çãoemdireçãoaoápicecausasonsdebaixafreqüência.
Em2004,haviamaisde60.000usuáriosde implantesco-
dearesno mundo,dentreesses,cercade20.000crianças,e a
popularidadedessesmecanismosseguecrescendo.Infelizmen-
te,elessãomuitocaros.
Os implantescodearespodemfornecerumacapacidade
auditivaextraordináriaparamuitaspessoasqueeramsurdas.
Comtreinamento,aspessoaspodemobterumacompreensão
notavelmenteboadaconversação,atémesmoquandoestiver
ouvindoemumtelefone.O sucessodo implanteémuitovariá-
vel,porrazõesfreqüentementeincertas.Os pesquisadoreses-
Modíolo
Membrana Lâmina -I
E,t,rnociUMÃ~
Z~;:~~ ~~
Células
(a) ciliadas
externas
Pilares
de Corti
Células
ciliadas
internas
Membrana
basilar
... 357o OUVIDOINTERNO
Deslocamento dos
estereocílios para fora
~
-~---
nnn-__h-
(b) Deflexão para cima
da membrana basilar
FIGURA I 1.13
O deslocamento dos estereocílios produzido pelo movimento para cima da membrana basilar. (a) Emrepouso,ascélulas
ciliadasestãomantidasentrea lâminareticulare a membranabasilaée asextremidadesdosestereoCl1iosdascélulasciliadasestãoligadosà,
membranatectorial.(b) Quandoo somprovocaa deflexãoparacimadamembranabasilaéa lâminareticularmove-separacimae parao
centrodacôcleanadireçãodo modíolo,provocandoo deslocamentodosestereoClliosno sentidooposto.
Rád;otrn",m;='~'i)
processador~ "'
tão trabalhandointensamenteparamelhorara tecnologiados
implantescocleares,parareduzirseutamanhoe paradetermi-
nara melhormaneirade treinaro seuuso pelos pacientes.
As criançasmenoressão normalmenteasmelhorescandi-
datasparaos implantescocleares(o seuusoestáaprovadopara
criançascom apenas I ano de idade),sendotambémeficiente
paracriançasmaioresou adultoscujasurdezfoi adquiridaapós
terem aprendido a falar Por outro lado,para os adultoscuja
surdezprecedeua aprendizagemdafala,os implantescocleares
.
1
t'"
~
,.,
..,---'
FIGURA A
pispositivoexternode umimplantecocleaéposicionado
atrásdaorelha.
parecemfornecer apenasuma percepçãogrosseirados sons.
Parecequeo sistemaauditivo,como os demaissistemassenso-
riaisno cérebro,necessitaexperimentaraferênciasnormaisnos
primeirosanosde vidaparao seudesenvolvimentoapropriado.
Se o sistemaauditivofor privado da exposiçãoaos sons em
uma etapaprecoce da vida,nuncadesenvolveráseufunciona-
mento de forma completamentenormalmesmose a audição
for recuperadamaistarde.O conceitode períodoscríticosno
desenvolvimentocerebralestádescritono Capítulo23.
Receptore
estimulador
,
f'
f'
\
"
,
~
,
Janela redonda
.,1
FIGURAB
Disposição de um implante coclear na parte interna do ouvido.
358 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO
EVESTIBULAR
4
:>3
.s
(; 2
õ..
Q)
~1
eu
'g O
Q)
Õ
(L -1
A
-20 -10 O 10 20
(a) Deslocamentodos cílios (nm)
-
Tempo
(b)
FIGURA 11.14
Potenciais receptores das células
ciliadas. (a) A célulaciliadadespolariza
ou hiperpolarizadependendodadireção
paraa qualos estereoClliosdeslocam-se.
(b) O potencialreceptordacélulaciliada
acompanhacom precisãoasvariaçõesda
pressãodo ar duranteumsomde baixa
freqüência.
membranatectorialdeslocaos estereocíliosdascélulasciliadasexternaspara
um lado ou para o outro (Figura 11.13). As extremidadesdos estereocílios
dascélulasciliadasinternas tambémsão deslocadasde maneira similar,pro-
vavelmente por serem empurradaspela endolinfa em movimento. Os este-
reocílios contêm filamentos de actina alinhados que os enrijecem,de modo
que se inclinam como bastõesrígidos, articulados apenasna base,onde se
ligam à porção apical da célula ciliada. Filamentos transversaisconectamos
estereocíliosde cada célula ciliada, entre si, permitindo que todos os cílios
de uma célula ciliada semovam juntos, como uma unidade. Imagine, agora,
uma onda sonora fazendo com que a membranabasilar semovimente entre
asduasposiçõesmostradasna Figura 11.13,e serápossívelvisualizarcomoos
estereocíliosdascélulasciliadassãoinclinadospara um lado e para outro em
relaçãoà membranatectorial.
A compreensãosobrecomo ascélulasciliadasconvertemo deslocamento
dos estereocíliosem sinal neural era um problema muito difícil de resolver.
Devido ao fato de a cócleaestarem um envoltório ósseo,fica muito difícil a
obtençãodo registroeletrofisiológicodascélulasciliadas.Na décadade 1980,
A. J. Hudspeth e colegas, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, foram
pioneiros em uma nova abordagemna qual as células ciliadas são isoladas
do ouvido interno e estudadasin vitro.A técnica in vitrorevelou muito sobre
o mecanismo de transdução. Os registrosdas células ciliadas indicam que,
quando os estereocílios inclinam-se em uma direção, a célula ciliada des-
polariza, e, quando os estereocílios se inclinam na outra direção, a célula
hiperpolariza (Figura 11.14a). Quando uma onda sonora causa o desloca-
mento dos estereocíliospara um lado e para o outro, a célula ciliadageraum
potencial receptor que despolarizae hiperpolariza alternadamentea partir
do potencial de repouso de-70 mV (Figura 11.14b).
Para avaliar exatamentea forma eficiente de funcionamento dos ouvi-
dos, examine com atenção a escalado eixo das abscissasna Figura 11.14a.
Sua unidade estáem nanômetros. Lembre-se que 1 nm equivale a 10-9m.
O gráfico mostra que o potencial receptor da célula ciliada estásaturadono
momento em que as extremidadesde seus estereocíliosse deslocamcerca
de 20 nm para o lado; isso é o que um som extremamentealto pode fazer.
Contudo, o som mais delicado que você pode ouvir move os estereocílios
apenas0,3 nm para cadalado, que é uma distânciaespantosamentepequena
- o diâmetro aproximado de um átomo grande!Uma vez que cadaestereo-
cílio tem cercade 500 nm (ou 0,5 11m)de diâmetro, um som muito delicado
moverá os estereocíliosapenascercade um milésimo de seudiâmetro coma
finalidade de produzir um ruído perceptível.Como a célula ciliada realizaa
transduçãode quantidadesinfinitesimais de energiasonora?
Experimentosrecentesrevelaramque existeum tipo especialde canalde ,
cátion, o canalTRPA1,nas pontas dos estereocílios(Quadro 11.3).Os canais
TRPAl integram a família de canaisiônicos dos potenciaisreceptorestransi-
tórios (TRP). Outros tipos de canaisTRP exercemfunções críticasnas célu-
las gustativase nas terminaçõesnervosassensoriaissomáticasque transmi-
tem sensaçõesde calor e frio (ver Capítulos 8 e 12).É provávelque os canais
TRPAl sejaminduzidos a abrir e fecharpelo deslocamentodos estereocílios,
gerando, assim,mudanças no potencial receptor da célula ciliada. A Figura
11.15mostracomo sesupõeque essescanaisfuncionem. Cadacanalestáco-
nectadopor um filamento elásticoà parededo estereocílioadjacente.Quando
os estereocíliosestãoaprumados,a tensãosobreessasconexõesda pontados
estereocíliosmantém o canal em um estadoparcialmenteaberto,permitindo
umpequenoescoamentodeK+ daendolinfaparadentrodacélulaciliada.O
deslocamentodosestereocíliosemuma direçãoaumentaa tensãosobreasco-
nexõesdaspontas,aumentandoa correnteintracelulardeK+.O deslocamento
na direção opostaalivia a tensãosobreas conexõesdaspontas, permitindo,
dessemodo, que o canal se feche completamente,prevenindo o influxo de
K+.A entrada de K+na célula ciliada causauma despolarização,a qual, por
Canal TRPA 1 ativado
mecanicamente
.
Endolinfa
Canal de cálcio
dependente de
voltagem
Estereocílios
Ligame~tos~ K,+
(Conexoes ~.
das pontas
Célulaciliada
interna
Vesícula preen-
chida com neuro-
transmissor
excitatório
Perilinfa
Neuritodo
gânglioespiral
(b)
FIGURA 11.15
Despolarização de uma célula ciliada.
(a) Os canais iônicos chamados TRPA I das pontas dos
estereocnios abrem quando os ligamentos elásticos das
pontas que unem os estereocnios são estirados. (b) A
entrada de potássio despolariza a célula ciliada,a qual abre
canais de cálcio dependentes de voltagem. O influxo de
Ca+2leva à liberação de neurotransmissor das vesículas
sinápticas,que se difunde às terminações pós-sinápticas
dos neuritos do gânglio espiral.(a)
sua vez, ativa os canais de cálcio dependentes de voltagem (Figura 11.15b).
A entrada de Ca+2dispara a liberação do neurotransmissor,provavelmente
glutamato, o qual ativa os axônios do gânglio espiral, que estão em contato
pós-sináptico com as células ciliadas.
O fato interessante é que a abertura dos canais de K+produz uma despo-
larização na célula ciliada, enquanto que a abertura dos canais de K+ hiperpo-
larizaa maioria dos neurônios. A razão para as células ciliadas responderem
diferentemente dos neurônios está na alta concentração de K+ na endolinfa,
a qual produz um potencial de equilíbrio de K+ de O mV, comparado com o
potencial de equilíbrio de -80 mV dos neurônios típicos. Outra razão para o
K+ ser conduzido para dentro da célula ciliada é o potencial endococlear de
80 mV, o qual auxilia a criar um gradiente de 125 mV através da membrana
dos estereocílios.
A Inervação das Células Ciliadas. O nervo auditivo consisteem axôniosde
neu~ônioscujoscorposcelularesestãolocalizadosno gânglioespiral.Assim,os
~ O OUVIDO INTERNO 359
Células
}dogânglioespiral
Nervo
auditivo
FIGURA11.16
A inervaçãodascélulasciliadaspelos
neurôniosdo gânglioespiral.
360 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
Do Somà Sensação
Duranteaminhafaculdade,semprequisserumfísicoe estudar
físicae eletrônica,masnuncabiologia.A físicapossuiumasim-
plicidadeelegantequeeuachavamuitoatraente,e admirava
seupoderparadescreverumfenômenocomplexocompoucas
equações.Foisomentenomeuúltimoanodefaculdade,quan-
doaFaculdadeAmherstcontratouo biofísicoStephenGeorge
parainiciarumanovaespecialidadeemneurociênciasnagra-
duação,quemedeicontade quea físicapoderiaauxiliarna
descriçãodealgunsfenômenoscomplexosnosneurônios.
Comoeramuitotardeparameespecializaremcursosde
graduaçãoemneurociências,tiveasortedeobterumtrabalho
comotécniconoDepartamentodeNeurobiologianaFaculda-
dedeMedicinadeHarvardcomAnnStuart.Eraumambiente
intelectualexcitante.Fundadopor SteveKuffler;o departa-
mentonadécadade 1970mantinhaa convicçãode Kuffler
de queumacompreensãocompletado sistemanervososó
seriapossívela partirde umaabordagemmultidisciplinarque
combinasseosenfoquesbiofísico,estruturalemolecular.Traba-
lhandotambémnolaboratóriodeAnn,e igualmenteseguidor
dessaconvicção,estavaJim Hudspeth.QuandoJimchegoudo
InstitutodeTecnologiadaCalifórniaem 1975paraformarseu
própriolaboratórioe estudarascélulasciliadas,eucolaborei
comoseuprimeiroestudantedegraduação.
Naquelaépoca,haviaseobtidoumtremendoprogresso
naspesquisassobreaudiçãorealizadasporcientistascomoGe-
orgVonBékésy,quehaviatrabalhadocomengenheiroselétricos
ehaviaestudadoacócleacomoumórgãoporinteiro.Hudspeth
estavacientedequepoucoseconheciasobreascélulascilia-
das,e quemuitasquestõesprementespoderiamserlevantadas
sobreatransduçãosensorial,analisandoascélulasciliadasin-
dividualmente.A primeiraquestão- "comoumacélulaciliada
respondeaumadeflexãodeseusestereodios?"- foirapida-
menterespondidaquandoobservamosumadespolarizaçãoe
umaumentonacondutânciadamembranacomumadeflexão
excitatóriae vimosqueelacorrespondiaà aberturade,cqnais
iônicosnão-seletivos.Hudspeth.tambémrespondeuumaques-
tãoestrutural,quandoeleobservouqueessescanaisestavam
localizadosnasextremidadesdosestereocnios.Outraquestão,
então,foi levantada:"comoa estimulaçãomecânicaabreesses
canaislocalizadosnaspontasdosestereoCllios?".Fui,pelomenos,
inteligenteo suficienteparareconhecerumaboaquestãoaser
levantadae dedicar-meaelaenquantoestudantee dep'oispela
maiorpartedeminhacarreiracientífica.
As respostasforamsimultaneamentebiofísicas,estruturais
e moleculares.Primeiramente,trabalhandocomestimuladores
muitorápidos,descobrimosqueos canaisdetransduçãoda
célulaciliadaabriamemmicrossegundose abriamaindamais
rápidosparaestímulosmaisintensos.Umateoriamecânica
simples,envülvendoalgohipotéticocomo"umatampacom
engateelástico",conectadaa umcanale mantidaestiradapela
deflexãodosestereoCllios,poderiaserresponsávelpelaaber-
por David P. Corey
turadoscanais.O queé maisimportante:essateoriaassumia
queo própriocanalera mecanossensível,ou seja,eraaber-
to diretamentepor açãode umaforça.Jim Hudspethe Joe
Howardconfirmaramissoem 1988,commedidasmecânicas
extraordinariamentesensíveisquerevelarammovimentosem
escaladenanômetrosassociadosàaberturadoscanais.
UmasegundarespostaveiodeJimPickles,daUniversidade
de Birminghamque,em 1984,descobriuqueasextremidades
dosestereoClliosestãoconectadasporfllamentosmuitofinos,
quechamouconexõesdospontos,dispostaslinearmenteao
longode umeixosensorial.Eleimediatamentesugeriucomo
quea deflexãoexcitatóriapoderiaestirarasconexõese des-
taparoscanaisdaspontasdosestereocnios.Aimportânciadas
conexõesdaspontasfoiconfirmadaquandodescobrimosque
a remoçãodo Ca+2extracelulardesfaziatantoasconexões
comoamecanossensibilidadeemsegundos.Enquantoateoria
inicialpropunhaqueasconexõesdaspontaseramo equiva-
lenteestruturaldeumengatetipomolaparaaberturadocanal
emtermosbiofísicos,umtrabalhorecentedeBecharaKachar
e PeterGillespieindicouqueasconexões,defato,sãorígidas,
e queo engateelásticodaaberturado canalestádealguma
formainternamentenosestereocnios.
A questãomaisdifíciltemsido:"Qualé a basemolecular
paraatransdução?".Umacélulaciliadadevepossuirmenosdo
queumaspoucascentenasdecanaisdetransdução,excluindo
purificaçãobioquímica.Supomosqueo canaldetransdução
poderiaserummembrodafamniaTRP decanaisiônicos,pois
muitosdosquaisestãoenvolvidosem ransduçãosensorial,
sendoalgunsespecificamenteem sensaça cânica.Uma
análisedo genomaidentificoutodosos 33genes noca-
mundongo,etestamoscadatipo decanalTRP paradesc rir
de quaissãoconstituídasascélulasciliadas.Uns poucos,in-
cluindooTRPAI,parecemestarnessascélulas.Trabalhosadi-
cionaismostraramqueaproteínaTRPAI estánaextremidade
dosestereocnios,equeTRPAI é necessáriaparaatransdução
dacélulaciliada.Umacaracterísticasingulardaarquiteturade
TRPAI é umacadeialongade repetiçõesde anquirina,cada
umacompostade33aminoácidos,constituindoapartedoca-
nal.EssacaracterísticaocorreemapenasumoutrocanalTRR
TRPN I,quetambémtemsidoimplicadoemmecanotransdu-
ção.A partirdesimulaçõesdedinâmicasmoleculares,Marcos
Sotomayore KlausSchulten,daUniversidadede IlIinois,mos-
traramque essasrepetiçõesse enrolamespontaneamente
emformatodemolae comelasticidade.Talvezumapartedo
TRPAI formao engateelásticodaaberturado canal,e outra
parteformao canal.
Muitotrabalhoaindarestaaserfeitoparainvestigaro en-
volvimentodaTRPAI natransduçãodacélulaciliada;essapro-
teínaaindaéapenasumacandidata.Seforconfirmada,teremos
muitasquestõesintrigantesparafazersobrea estruturae a
biofísicadessamolécula.
neurônios do gânglio espiral, que são os primeiros na via auditiva a disparar
potenciaisde ação,fornecemtoda a informação auditiva enviadaao encéfalo.
Um fato curioso é que existeuma diferençasignificativana inervaçãodascé-
lulasciliadasinternase externaspelo gânglioespiral.Estima-seque o número
deneurônios no gânglioespiralsejada ordem de 35.000a 50.000.Apesar de
ascélulasciliadasinternas seremsuperadasem número pelascélulascHiadas
externasna proporção de 3 para 1, mais de 95% dos neurônios do gânglio
espiralcomunicam-secom um número relativamentepequeno de célulasci-
liadasinternas,e menosde 5% recebemaferênciasinápticadascélulasciliadas
externasmais numerosas (Figura 11.16).Conseqüentemente,um neurito do
gânglio espiral recebeaferência de somente uma célula ciliada interna, en-
quanto cadauma dessassupre aproximadamente 10 neuritos do gânglio es-
piral. Com as célulasciliadasexternasa situaçãoé inversa. Pelo fato de essas
excederemem número às células do gânglio espiral, um axônio ganglionar
espiralestabelecesinapsescom váriascélulascHiadasexternas.
Considerandosimplesmenteessesnúmeros, podemosinferir que a maior
parteda informaçãoque deixaa códea provém de célulasciliadasinternas.Se
issoéverdade,paraqueservemascélulasciliadasexternas?
A Amplificação pelas Células CHiadas Externas. Como ascélulasciliadas
externassuperamemnúmero ascélulasciliadasinternas,pareceparadoxalque
a maioria daseferênciascodearessejaderivadadessasúltimas.Estudosatual-
menteem desenvolvimentosugerem,contudo,que ascélulasciliadasexternas
exerçamuma função muito importantena transduçãodo som. Ironicamente,
umainformaçãosobreanaturezadessafunçãofoi a descobertadequeo ouvido
não somentetransduzo som,mastambémo cria (Quadro 11.4).
Proteínas
motoras
(estendidas)
Membrana tectorial
y
K+ I Lâminareticular
Proteínas motoras
(comprimidas)
y Membranabasilar
(a) (b)
Resposta normal
(com amplificador
coclear)
(c)
~
~ Membranabasilar
Base
Resposta durante o
tratamento com furosemida
(sem o amplificador coclear~
~
"- ~ Membranabasilar
(d) Base
T O OUVIDO INTERNO 361
FIGURA 11.17
Amplificação pelas células ciliadas
externas. (a) As proteínasmotoras
nasmembranasdascélulasciliadas
externas.(b) O deslocamentodos
estereoCl1iosprovocaa entradade potássio
nascélulasciliadas,despolarizando-as,
disparandoa ativaçãodasproteínas
motorase o encurtamentodacélula
ciliada.(c) O encurtamentoe o aumento
do comprimentodacélulaciliadaaumenta
a deflexãodamembranabasilar(d) A
furosemidadiminuiatransduçãodacélula
ciliada,reduzindo,conseqüentemente,a
deflexãoda membranabasilar(Fonte:
AdaptadadeAshmoree Kolston,I994,
Figuras2,3.)
362 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
Ouvidos Barulhentos:
As EmissõesOtoacústicas
Partimosdo princípiodequeossistemassensoriaisdetectam
aenergiadoestímulodoambiente,e nãoagerem.Vocêpode
imaginarosolhosemitindoluminosidadenoescuroeosnarizes
exalandocomorosas?Quetalos ouvidosemitindozumbidos
altos?A verdadeé queasretinasnãoirradiamluz,e os recep-
toresolfativosnãoemitemodores,masalgunsouvidospodem
definitivamentegerarsonssuficientementeintensosparauma
pessoaqueseencontrapróximapossaouvi-Ios.Taissonssão
chamadosdeemissõesotoacústicas.Emumadascitaçõesmais
antigas,umhomemsentadopróximoao seucãonotouque
essepareciaestarzumbindo;apósalgumasansiosasinvestiga-
ções,descobriuqueo somvinhadeumdosouvidosdocão.
Osouvidosdetodososvertebrados,incluindooshumanos,
podememitirsons.Frentea umbreveestímulosonoro,como
umestalido,é geradoum"eco"emumouvidohumanonormal,
quepodesercaptadoporummicrofonesensívelnocanalaudi-
tivo.Geralmenteesseeconãoé observadoporqueeleé muito
fracoparaserouvidoentreosdemaissonsdoambiente.
Os ouvidosqueemitemespontaneamentesonsrelativa-
mentealtos,naausênciadequalquersomqueosatinjam,fre-
qüentementepossuemcócleasdanificadasdevidoàexposição
a sonsextremamentealtos(explosões,máquinas,bandasde
rock), drogasou doenças.Seasemissõesotoacústicasforem
muitoaltas,elaspodemcausaro
tinidoauditivo,umzumbido
nosouvidos(QuadroI 1.6).
O mecanismoquefazcomqueosouvidosgeremseuspró-
priossons- o amplificadorcoclear- éo mesmoquefunciona
paramelhorara detecçãodossonsdoambiente,masatuando
nosentidoinverso.As célulasciliadasexternasnormais,estimu-
ladasporumestalido,reagemcomumrápidomovimentoque
setransmiteparaosfluídose àsmembranascocleares,asquais
movemosossículosque,aofinal,fazemvibraramembranatim-
pânicae produziro somno ladoexterno(o eco).As emissões
espontâneasocorremporqueasensibilidadedoamplificador(0-
clearémuitoalta.A maioriadaspessoascomaudiçãonormalpo-
dempercebê-Iasemumambienteexcepcionalmentesilencioso.
Regiõeslesadasdacócleapodemfacilitardealgumama-
neirao movimentoespontâneode algumascélulasciliadas
externas,de formaque elaspossamvibrartodo o tempo.
Estranhamente,essaspessoasnãopercebemqueseusouvi-
dosestãotransmitindosons.Aparentemente,seusneurônios
auditivoscentraisreconhecemaatividadecoclearespontânea
comoruídoe suprimemsuapercepção.O benefícioéqueelas
sãopoupadasdotinidoenlouquecedorproduzido,maso cus-
to é aperdaparcialdaaudiçãonafaixadefreqüênciaafetada.
Comoasemissõesotoacústicassãoumatributonormal
dosouvidos,elespodemserutilizadoscomumtesterápido
e fácilde suafunção.Váriossonsproduzidospelosouvidose
os ecosqueprovocamsãoregistradose analisados.A partir
dascaracterísticasdosecos,sepodemobter-semuitasinfor-
maçõessobrea funçãodosouvidosmédioe interno.Issoé
especialmenteútilparatestarempessoasquesãoincapazes
dedizeraoexperimentadorseestãoouvindoou nãoossons
deteste,como,porexemplo,emrecém-nascidos.
As célulasciliadasexternasparecematuarcomopequenosmotoresqueam-
plificamo movimentodamembranabasilarduranteosestímulossonorosdebaixa
intensidade.Devidoa isto, ascélulasciliadasexternasda membranabasilarsão
consideradasumamplificadorcoclear.A chaveparaessafunçãosãoasproteínas
mataras,encontradasnasmembranasdascélulasciliadasexternas(Figura11.17a).'
As proteínasmotoraspodemalteraro comprimentodascélulasciliadasexternas,
e verificou-seque ascélulasciliadasexternasrespondemao som,tantocomum
potencialreceptorcomocomumaalteraçãono seucomprimento(Figura11.17b).
As proteínasmotorasnãolembramqualqueroutrosistemademovimentocelular.
O motordascélulasciliadasé acionadopelopotencialreceptore não utilizaATP
comofontedeen~ extremamenterápido,namedidaem
quedevesercapazdeprosseguircomosmovimentosinduzidospelossonsdealta
freqüência.O motordascélulasciliadaspodeserumaproteínachamadaprestina
(termodacinéticamusical,referenteaoandamento"presto",quesignificamuito
rápido).A prestinaestáinseridadeformacompactana membranadascélulasci-
liadasexternaseé necessáriaparao movimentodessasemrespostaao som.
Devidoaofatodeascélulasciliadasexternasestaremligadasà membranaba-
silareà lâminareticular,quandoasproteínasmotorasmudamo comprimentoda
célulaciliada,amembranabasilaréaproximadaou afastadadalâminareticulare
damembranatectorial.Eis por queé utilizadaa palavramotor- ascélulasciliadas
externasmudamativamentea relaçãofísicaentreasmembranascocleares.
O efeitomotor dascélulasciliadasexternascontribuide forma significativa
paraapropagaçãodaondaatravésdamembranabasilar.Issofoi demonstradoem
1991porMario RuggeroeNolaRich,daUniversidadedeMinnesota,pormeioda
administraçãode furosemidaem animaisexperimentais.A furosemidadiminui
temporariamenteatransduçãoquenormalmenteresultado deslocamentodoses-
tereocíliosdascélulasciliadas,e essespesquisadoresconcluiramquea furosemida
reduziusignificativamenteomovimentodamembranabasilaremrespostaaosom
(Figura11.17c,d).Acredita-sequeesseefeitodafurosemidaresultadainativação
dasproteínasmotorasdacélulaciliadaexternae daperda,assim,do amplificador
codear.Quandoascélulasciliadasexternasamplificama respostadamembrana
basilar,osestereocíliosdascélulasciliadasinternasdeslocam-semais,eo processo
detransduçãonessasproduz uma respostamaior no nervo auditivo.Portanto,
porintermédiodessesistemaderetroação,ascélulasciliadasexternascontribuem
significativamenteparaa eferênciadacódea.Semo amplificadorcodear,o movi-
mentomáximodamembranabasilarseriacercade 100vezesmenor.
O efeitodascélulasciliadasexternassobrea respostadascélulasciliadasin-
ternaspodesermodificadoporneurôniosexternosà códea.Além dasaferências
dogânglioespiralqueseprojetamdacócleaao troncoencefálico,existemapro-
ximadamente1.000fibraseferentes,asquaisseprojetamdotronco encefálico
emdireçãoà cóclea.Essaseferênciassãoamplamentedivergentes,estabelecendo
sinapsesnas células ciliadasexternase liberando acetilcolina.A estimulação
dessaseferênciasmuda o formatodascélulascHiadasexternas,afetando,dessa
maneira,as respostasdascélulascHiadasinternas.As aferênciasdescendentes
doencéfaloparaa cócleapodem,assim,regulara sensibilidadeauditiva.
O efeitoamplificadordascélulasciliadasexternasexplicacomo certosan-
tibióticos (p. ex., canamicina) que danificam as células ciliadaspodem levar
à surdez.Após a exposiçãoexcessivaaos antibióticos,muitas célulasciliadas
internasmostramrespostasreduzidasao som. Entretanto, os antibióticosda-
nificamquaseque exclusivamenteascélulasciliadasexternas,não asinternas.
Por essarazão, a surdezproduzida pelos antibióticosé consideradauma con-
seqüênciado dano ao amplificador coclear (i.e., às célulasciliadasexternas),
demonstrandoquão essencialé a funçãodesteamplificador.
Prestina,a proteína essencialpara o motor dascélulascHiadasexternasé
tambémnecessáriapara o funcionamentodo amplificadorcoclear.Quando re-
movemoso genedaprestinaem camundongos-nocante,osanimaissãopratica-
mentesurdos,comuma audiçãocemvezesmenossensívelque o normal.
T PROCESSOS AUDITIVOS CENTRAIS
As viasauditivasparecemmaiscomplexasdo que asviasvisuais,porque ocor-
remmaissinapsesem núcleosintermediáriosentreo órgãosensoriale o córtex.
Também,ao contrário do sistemavisual, existemmuito maisvias alternativas
pelasquaisossinaispodemseguirdeum núcleoaopróximo.Todavia,a quanti-
dadedeprocessamentodainformaçãonosdoissistemasnão diferequandovocê
consideraque ascélulase assinapsesdo sistemaauditivo no tronco encefálico
sãoanálogasàs interaçõesnas camadasda retina. Estudaremos,agora,a cir-
cuitariaauditiva,especialmenteastransformaçõesda informaçãoauditivaque
ocorremao longo davia.
A Anatomia dasViasAuditivas
As~spiral entramno tronco encefálicopelo nervo vestí-
bulo-codear.No nível do bulbo,osaxôniosinervamo núcleo coclear dorsal e
onúcleo coclear ventral ipsilateraisà cóclea,deondeosaxôniosoriginam-se.
Cadaaxônio ramifica-sedemodoa estabelecersinapseemneurôniosdeambos
osnúcleoscocleares.A partir desseponto, o sistematorna-semaiscomplicado,
e asconexõessãomenoscompreendidas,pois existemmúltiplasviasparalelas.
Emvezdetentarmosdescrevertodasessasconexões,seguiremosumavia parti-
cularmenteimportantedosnúcleoscoclearesao córtexauditivo (Figura11.18).
As célulasno núcleo coclearventral projetam seusaxônios à oliva superior
(tambémchamadadenúcleoolivarsuperior)deambososladosdo troncoencefá-
lico.Axônios dosneurôniosolivaresascendempelo lemniscolateral(um lemnis-
co é'um conjunto de axônios) e inervam o colículo inferior no mesencéfalo.
Muitos axônioseferentesdo núcleococleardorsalseguempor uma rotasimilar
à via do núcleo coclearventral,masa via dorsalseguediretamente,semparar
T PROCESSOSAUDITIVOS CENTRAIS 363
364 CAPíTULO II
0 Córtexauditivo
0 NGM
@
Colículo
inferior
- Lemnisco
lateral
CD
Oliva
superior
CD
Núcleo
coclear
ventral
- Nervo
auditivo
Gânglio
esoiral
OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
t/,~.,}
.
.'...~ ...
'Io
~ (~\ '1 .
-
:tr~! 1...' ,--'p ~\!.' ).
0\ /
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~--.1' . Colículoinferior\.
\
@\.
Núcleo coclear
dorsal \
Núcleo coclear
ventral
Lemnisco
lateral
Oliva superior
Fibra do
nervo auditivo
Gânglio
espiralCóclea
Córtex
auditivo
0
FIGURA 11.18
Viasauditivas. Os sinaisneurals
podempercorrerdo gânglioespiralao
córtexauditivopormeiode numerosas
vias.Umaviaprimáriaé mostrada
esquematicamente(esquerda)e
mediantesecçõestransversaisdotronco
encefálico.Observequeestãoilustradas
somenteasconexõesdeumdoslados.
na olivasuperior.Emboraexistamoutrasrotasdosnúcleoscoclearesao colículo
inferior comoutrosnúcleosderetransmissãointermediários,todasasviasauditi-
vasascendentesconvergemparaocolículoinferior.Os neurôniosdo colículoinferior
enviam seusaxônios ao núcleo geniculadomedial (NGM) do tálamo,o qual,
por suavez,projeta-seao córtexauditivo.
Antes de analisarmosaspropriedadesdasrespostasdosneurônios auditi-
vos,devemosfazerváriasconsiderações:
1. Outrasprojeçõese núcleosdo tronco encefálico,além dos descritosante-
riormentecontribuemparaa via auditiva.Por exemplo,o colículo inferior
envia axôniosnão apenaspara o NGM, mastambémao colículo superior,
onde ocorrea integraçãodasinformaçõesauditivae visuale ao cerebelo.
T CODIFICAÇÃO DA INTENSIDADE E DA FREQÜÊNCIA DO SOM
2. Existem amplas retroações nas vias auditivas. Por exemplo, os neurônios do
tronco encefálico enviam axônios que fazem contato com as células ciliadas
externas, e o côrtex auditivo envia axônios ao NGM e ao colículo inferior.
3. Os núcleos auditivos no tronco encefálico, com exceção dos núcleos coclea-
res, recebem aferência de ambos os ouvidos. Isso explica o fato clinicamente
importante de que a única maneira na qual uma lesão no tronco encefálico
possa resultar em surdez para um ouvido é se forem destruídos os núcleos
cocleares (ou o nervo vestíbulo-coclear) de um lado.
PropriedadesdasRespostasdosNeurôniosnaViaAuditiva
Paracompreenderastransformaçõesdossinaisauditivosque ocorremno tron-
coencefálico,devemosconsiderarprimeiramentea naturezadasaferênciasdos
neurônios do gânglio espiral da côclea.Pelo fatode a maioriadascélulasdo
gânglioespiralreceberaferênciade uma única célula ciliada interna de uma
localizaçãodeterminadana membranabasilar,essesneurôniosdisparampoten-
ciaisdeaçãoapenasem respostaao som de uma faixa limitadade freqüência.
Afinal, ascélulasciliadassãoexcitadaspor deslocamentosdamembranabasilar
ecadaporçãodamembranabasilarésobremaneirasensívelaumadeterminada
faixadefreqüências.
A Figura 11.19mostraosresultadosdeumexperimentono qualospoten-
ciaisde açãoforam registradosde uma única fibra do nervo auditivo (ou seja,
umaxôniodeumacéluladogânglioespiral).O gráficorepresentaa freqüência
dedisparoem respostaaos sonsde diferentesfreqüências.O neurônio é mais
responsivoao som de uma freqüência,conhecidacomo freqüência caracte-
rística doneurônio, sendomenosresponsivoàsfreqüênciasvizinhas.O tipo de
sintoniadafreqüênciaé específicopara osneurônios em cadaum dosnúcleos
retransmissoresda côcleaao côrtex.
À medidaqueaviaauditivaascendenotroncoencefálico,aspropriedadesde
respostadascélulastornam-semaisdiversificadasecomplexas,exatamentecomo
navia visual.Por exemplo,algumascélulasdosnúcleoscoclearessãoespecial-
mentesensíveisasonsquevariamdefreqüênciacomo tempo(imagineosomde
umtrombonepassandodenotasgravesa agudas).NoNGM,existemcélulasque
respondemasonsmuito complexoscomoasvocalizações,alémdeoutrascélulas
quemostramsimplesseletividadeparafreqüências,comofazemosneurôniosdo
nervovestíbulo-coclear.Um importanteprocessamentoque ocorrena oliva su-
periordependedeseusneurôniosreceberemaferênciasdosnúcleoscoclearesde
ambosos ladosdo troncoencefálico.Como serádiscutidoa seguir,osneurônios
binauricularessãoimportantesprovavelmenteparaa localizaçãodo som.
T CODIFICAÇÃO DA INTENSIDADE E DA
FREQÜÊNCIA DO SOM
Sevocêparassede ler estelivro por um momento,poderiaprestaratençãoaos
uitos sons ao seu redor.Vocêpoderiaprovavelmenteescutarsonsque você
tem' norado e poderia prestaratenção,seletivamente,a diferentes sons que
estivess ocorrendosimultaneamente.Estamosnormalmenteenvolvidosem
umaimena diversidade de sons - desde conversas entrepessoasatéruídos de
carros,rádio oueletrodomésticos-, enossoencéfalodevesercapazdeanalisar
ossonsimpor tes enquanto ignora o ruído. Ainda não podemosrelacionar
apercepçãode daum dessessonsa determinadosneurônios do encéfalo.
Contudo, a maioria dos sons tem certascaracterísticasem comum, como in-
tensidade,freqüênciae fonte de origem. Cadauma dessascaracterísticasestá
representadademaneiradiferentena via auditiva.
Intensidade do Estímulo
A informaçãosobrea intensidadedo somécodificadadeduasmaneirasin-
ter-relacionadas:pela freqüênciadedisparosdosneurônios e pelo número de
neurônios ativos.À medidaque o estímulotorna-se maisintenso, a membra-
365
li
!tJ
o
'"O
c:
::J
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Cl)
(f)
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Freqüência
característica
~ 150
()
c:
Cl)
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Cl)
'"O
(f) 50
o
()
"<5.
Cl) O
'"O
o
Q;
E
'::J
z
FIGURA 11.19
A resposta de uma fibra do
nervo auditivo frente a diferentes
freqüências sonoras. Esseneurônio
estásintonizadoparaumafreqüência,e
suamaiorrespostaocorrenafreqüência
característica.(Fonte:Adaptadode Rose,
Hind,AndersoneBrugge,1971,Figura2.)
366 CAPíTULO I I . OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
FIGURA 11.20
Mapas tonotópicos natnembrana
basilar e no núcleo cocleàr. A
membranabasilarressoacomfreqüências
progressivamentemenoresdabaseem
direçãoaoápicedacóclea.Essatonotopia
estápreservadano nervoauditivoe
no núcleococlear.No núcleococlear.
existembandasde célulascomfreqüências
característicass1milares;asfreqüências
característicasaumentamprogressivamente
daregiãoanteriorà posterior.
na basilar vibra com maior amplitude, causandouma maior despolarização
ou hiperpolarizaçãodo potencial de membrana dascélulasciliadasativadas.
Isso faz com que os axônios, com os quais as células ciliadas estabelecem
sinapses,disparem potenciais de ação com freqüências maiores. Na Figura
11.19,o axônio do nervo vestíbulo-cocleardisparamais rápido para sonsde
mesmafreqüênciaquando a intensidadeestiveraumentada.Além disso,estí-
mulos mais intensosproduzem movimentosdamembranabasilarquesepro-
pagama distânciasmaiores,osquaislevama ativaçãodemaiscélulasciliadas.
Esse aumento no número de células ciliadas ativadascausauma ampliação
da faixa de freqüênciaparaa qual uma única fibra do nervo vestíbulo-coclear
responde.Considera-seque o volume do som quepercebemosestejacorrela-
cionado com o número de neurônios ativosdo nervo vestíbulo-coclear(eao
longo detoda a via auditiva) e suasfreqüênciasde disparo.
Freqüênciado Estímulo,Tonotopiae Sincroniade Fase
A partir dascélulasciliadasna cóclea,atravésdosváriosnúcleosque levamao
córtexauditivo,amaioriadosneurôniossãosensíveisàfreqüênciado estímulo.
A maioria é sensívela suafreqüênciacaracterística.Como a freqüênciaestáre-
presentadano sistemanervosocentral?
Tonotopia. A sensibilidadeà freqüência é principalmente conseqüênciada
mecânicada membranabasilar,porque o som de diferentesfreqüênciasde-
forma ao máximo diferentesporçõesda membrana.A freqüênciaque produz
uma deformaçãomáxima damembranabasilardiminui progressivamente,ao
longo de sua extensão,no sentidodabaseao ápiceda cóclea.Existe uma re-
presentaçãocorrespondenteda freqüênciano nervo auditivo; os axônios do
nervo auditivo, conectadosàs célulasciliadaspróximas à membranabasilar
apical, têm as freqüênciascaracterísticasmais baixas, enquanto que aqueles
conectadosàs células ciliadas próximas à membrana basilar basal têm fre-
qüências característicasaltas (Figura 11.20). Os axônios auditivos do nervo
vestíbulo-coclearestabelecemsinapsenosnúcleoscoclearesconformeum pa-
drão organizadode freqüênciascaracterísticas.Neurônios vizinhos possuem
freqüênciascaracterísticassimilares,e existeuma relaçãosistemáticaentre a
posição no núcleo cocleare a freqüência característica.Em outras palavras,
existeum mapa da membranabasilar dentro dos núcleos cocleares.A orga-
nização sistemáticade freqüênciascaracterísticasem uma estruturaauditiva
denomina-setonotopia, análogo à retinotopia no sistemavisual. Mapas to-
notópicos existemna membranabasilar,em cadaum dosnúcleosderetrans-
missãoauditivos,nos NGM e no córtexauditivo.
Devido ao fato de a tonotopia ocorrer por todo o sistemaauditivo,
a lo-
calizaçãodosneurônios ativosnos núcleos auditivos é uma indicaçãoda fre-,
Freqüência
característicaCóclea
Célula, ~
ciliadas
Membrana
basilar .
(J
()
Q
Base
/
Gânglio
espiral
Nervo
auditivo
Anterior
@ @
@ @
;0 @
0 @
@
@
0
0
\
Núcleo
Posterior
coclear
CODIFICAÇÃO DA INTENSIDADE E DA FREQÜÊNCIA DO SOM
qüência sonora. Existem duas razões, contudo, para que a freqüência seja
codificadade alguma outra maneira além do local de ativaçãomáxima nos
mapastonotópicos.Uma razãoé que essesmapasnão contêmneurônios com
freqüênciascaracterísticasmuito baixas,comvaloresinferioresa cercade 200
Hz. Conseqüentemente,o local de ativaçãomáxima pode ser o mesmopara
um tom de 50 Hz comopara um de 200 Hz, deforma que devehaver alguma
outra maneira de distingui-Ios. A segundarazão para que algum outro fator
alémda tonotopia sejanecessárioé que a regiãoda membranabasilar que é
maximamentedeslocadapor um somdependedesuaintensidadealémde sua
freqüência(Figura 11.19).Em uma freqüênciafixa, um sommaisintensopro-
duziráuma deformaçãomáxima em uma posiçãomaisdistantena membrana
basilardo que um som menosintenso.
Sincronia de Fase. A principal fonte de informaçãosobrea freqüênciasono-
raquecomplementaa informaçãoderivadado mapatonotópico é o momento
em que ocorre a atividadede disparo na fibra aferente.Registrosobtidosde
neurônios no nervo auditivo mostram sincronia de fase, isto é, o disparo
consistentede uma célulana mesmafasede uma onda sonora (Figura 11.21).
Imagineuma onda sonora como uma variaçãosenoidalna pressãodo ar.Um
neurôniosincronizaseusdisparosdepotenciais'deaçãonospicosou nos cava-
dosou em qualquer outra posiçãoconstanteda onda. Nasbaixasfreqüências,
algunsneurônios disparam potenciais de ação cadavez que o som estáem
uma determinada fase (Figura 11.21a). Isso facilita a determinaçãoda fre-
qüênciasonora:devesera mesmaque a freqüênciadospotenciaisde açãodo
neurônio.
A sincroniade fasepode ocorrer mesmoseum potencialde açãonão dis-
parouuma vezem cadaciclo (Figura 11.21b). Por exemplo,um neurônio pode
respondera um som de 1.000Hz com um potencialde açãoem somente25%
dosciclosdo sinal aferente,mas essespotenciaisocorrerãosemprena mesma
Onda sonora de baixa freqüência
Resposta
sincronizada
emcadaciclo
Resposta
sincronizada,
masnãoem
cadaciclo
Onda sonora de alta freqüência
Resposta
não-sincronizada
(c)
367
FIGURA 11.21
Sincronia de fase na resposta das
fibrasdo nervoauditivo. O somem
baixafreqüênciapodecausarumaresposta
sincronizada,ou a (a) cadaciclodo estímulo
ou (b) emalgunsdosciclos.(C),altasfreqüências,a resposta não tem uma elaçãofixa com uma fase do estímulo.
368 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
Ondas!
sonoras
(a)
oms
0,6 ms
(b)
FIGURA 11.22
Retardo temporal interauricular como
uma informação para a localização do
som. (a) As ondassonorasprovenientes
do ladodireitoalcançarãoprimeiroa orelha
direita,e ocorreráumconsiderávelretardo
interauricularantesdeo somchegaràorelha
esquerda.(b) Seo somvemdiretamente
dafrente,nãoocorrenenhumretardo
interauricular.Sãàmostradososretardas
temporaisparatrêsdireçõesdiferentesdo
som.
fasedo som.Considerando-seum grupodetaisneurônios,cadaum responden-
do a um ciclo diferentedo sinal aferente,épossívelobter-seuma respostapara
cadaciclo (feitapor algunsmembrosdo grupo) e, assim,uma medidaexatada
freqüênciasonora.É provávelque freqüênciasde som intermediáriasestejam
representadaspelaatividadeassociadadeváriosneurônios,cadaum dosquais
disparandode maneirasincronizadacomalgumafasedo ciclo; issoé chamado
de princípio das salvas. A sincroniade faseocorrecom ondassonorasdeaté
cercade4 kHz. Acimadessenível, ospotenciaisdeaçãodisparadospor um neu-
rônio estarãolocalizadosao acasona fasesdaondasonora(Figura11.21c),por-
que a variabilidadeintrínsecana precisãodo tempoem queocorremospoten-
ciaisdeaçãotorna-secomparávelao intervalodetempoentreciclossucessivos
de som. Em outraspalavras,os ciclosdasondassonorasserãorápidosdemais
para que ospotenciaisde açãode cadaneurônio possammostrarsincroniano
tempodeformaprecisa.Dessaforma,acimade4 kHz, asfreqüênciassãorepre-
sentadassomentepelatonotopia.
Para resumir, eis aqui como diferentesfreqüênciassão representadas:em
baixasfreqüências,é utilizadaa sincroniade fase;em freqüênciasintermediá-
rias,tantoatonotopiacomoa sincroniadefasesãoutilizadas;emaltasfreqüên-
cias,somentea tonotopiaserveparaidentificara freqüênciasonora.
'7 MECANISMOS DE LOCALIZAÇÃO DO SOM
Enquanto o uso da informaçãoda freqüênciaé essencialpara a interpretação
dossonsde nossoambiente,a localizaçãodo sompode serde importânciacrí-
tica para a sobrevivência.Se um predadorestápróximo de você, encontrara
fonte de um som repentino e fugir é muito mais importantedo que analisar
assutilezasdo som. Os humanosnão sãomais devoradosfreqüentementepor
animaisselvagens,masexistemoutrassituaçõesnasquaisa localizaçãodosom
podeserútil. Sevocêtentaatravessara rua semnenhum cuidado,a localização
dabuzina deum carropoderásertudo o que o salvará.O conhecimentoatual
dosmecanismossubjacentesà localizaçãodo somsugereque empregamostéc-
nicasdiferentespara localizarasfontesde somno plano horizontal (esquerdo-
direito) e no plano vertical(acima-abaixo).
Sevocêfecharseusolhosetaparum ouvido,vocêpoderálocalizarumpássa-
ro cantandoenquantoelevoasobresuacabeçaquasetãobemcomoseestivesse
comos doisouvidosabertos.Entretanto,sevocêtentarlocalizara posiçãohori-
zontal de um patograsnandoenquantonadaem um lago,vocêdescobriráque
é muito menoscapazde fazê-Io,utilizandoapenasum ouvido. Assim,umaboa
localizaçãohorizontal requeruma comparaçãodos sons que alcançamos dois
ouvidos,enquantoque,paraumaboalocalizaçãovertical,issonãoénecessário.,
Localizaçãodo Som no Plano Horizontal
Uma informaçãoóbviaparaa localizaçãodafonte sonoraé o tempoqueo som
leva para alcançarcadaorelha. Nós temosdois ouvidos, e, senão estivermos
diretamentede frente para a fonte sonora, os sons mais distantesalcançarão
um ouvido antesdo outro. Por exemplo, se um ruído repentino vem da sua
direita,essealcançaráprimeiro a suaorelhadireita (Figura 11.22a)e, depois,a
suaorelhaesquerda,o queéconhecidocomoretardotemporalinterauricular.Se
a distânciaentresuasorelhasfor de20 em,o somquevem dadireita,perpendi-
cular a suacabeça,alcançasuaorelhaesquerda0,6msapósalcançarsuaorelha
direita. Se o som vem diretamentede frente, não há retardo interauricular.
Em ângulosintermediáriosentrea direçãofrontal e a direçãoper endicular,o
retardoterávaloresentreOe 0,6ms (Figura11.22b).Sonsdaesquer produzi-
rão retardosdetempoinversosaosdadireitaAssim,existeuma ela o simples
entrea localizaçãoe o retardointerauricular.Detectadopor neuroniosespecia-
lizadosdo tronco encefálico,o retardonos permitelocalizara fonte sonorano
plano horizontal.Os retardostemporaisinterauricularesque somoscapazesde
detectarsãoimpressionantementecurtos.As pessoaspodemdiscriminara dire-
... MECANISMOSDELOCALIZAÇÃODO SOM
ção de uma fonte sonora no plano horizontal com uma precisão de cerca de 2°.
Paraissoé necessário que se discrimine uma diferença de 11 ps entre o tempo
que o som leva para alcançar as duas orelhas.
Se não ouvirmos o início de um som, por esse ser um tom contínuo e
não um ruído repentino, não poderemos saber sobre o tempo de chegada
inicial do som às duas orelhas. Assim, tons contínuos apresentam uma certa
dificuldade para a localização do som, por estarem sempre presentes a ambos
ouvidos. Ainda podemos, contudo, utilizar o tempo de chegada para localizar
o som contínuo de uma maneira um pouco diferente daquela para localizar o
som repentino. A única coisa que pode ser comparada entre tons contínuos é
o tempo no qual a mesma faseda onda sonora alcança cada orelha. Imagine
que você está exposto a um som de 200 Hz vindo da direita. Nessa freqüên-
cia, um ciclo de som alcança 172 em, o que é muito maior
do que os 20 em
de distância entre as duas orelhas. Após um pico da onda de pressão sonora
passar pela orelha direita, você deverá aguardar 0,6 ms, o tempo que o som
leva para percorrer 20 em, antes de detectar um pico na orelha esquerda.
Obviamente, se o som vem diretamente de sua frente, os picos da onda de
um tom contínuo alcançam as orelhas simultaneamente. Pelo fato de a onda
sonora ter um comprimento maior do que a distância entre as duas orelhas,
podemos utilizar o retardo interauricular do pico da onda de maneira confiá-
vel para determinar a localização do som.
As coisas são mais complicadas com tons contínuos de altas freqüências. Su-
ponha que o som vindo da direita tenha, agora, uma freqüência de 20.000 Hz, o
que significa que um ciclo do som alcança 1,7 em. Após o pico alcançar a orelha
direita, este ainda terá 0,6 ms para alcançar a orelha esquerda? Não! Ele leva
muito menos tempo, porque muitos picos de onda de alta freqüência estarão dis-
postos entre suas orelhas. Não existe mais uma relação simples entre a direção do
som e o tempo de chegada dos picos às duas orelhas. O retardo interauricular do
tempo de chegada simplesmente não é mais útil paraa localização dos sons contí-
nuos com freqüências tão altas que um ciclo da onda sonora seja menor do que a
distância entre suas orelhas (isto é, maior do que aproximadamente 2.000Hz).
Felizmente, o encéfalo dispõe de outro processo para a localização de sons
de altas freqüências. Existe uma diferençade intensidadeinterauricular entre as
duas orelhas, porque sua cabeça efetivamente lança uma sombra sonora (Figu-
ra 11.23). Existe uma relação direta entre a direção do som e a direção paraa
qual sua cabeça gera uma sombra sonora parauma orelha.Seo somvem dire-
tamente da direita, a orelha esquerda o escutará com uma intensidade significa-
tivamentemenor (Figura 11.23a). Com sons oriundos diretamentedefrente,a
mesma intensidadealcançaasduasorelhas(Figura 11.23b),e comsonsvindos
de direções intermediárias, ocorrem diferenças de intensidade intermediárias
(Figura 11.23c). Os neurônios sensíveis às diferenças de intensidade podem uti-
lizar essa informação para localizar o som. A informação da intensidade não
pode ser utilizada para localizar sons com freqüências mais baixas, porque as
ondassonorasnessasfreqüênciassofremdifração,contornando a cabeça,e as
intensidades serão aproximadamente equivalentes para os dois ouvidos. Não se
forma nenhuma sombra sonora sob baixas freqüências.
Vamos resumir os dois processos para localização do som no plano hori-
zon Com sons na faixa de 20 a 2.000 Hz, o processo envolve retardo tem-
poralinte "rular.De 2.000 a 20.000 Hz, utiliza-se a diferençadeintensidade
interauricular. E es dois processos conjuntos constituem a teoria duplex de
localização do som.
A Sensibilidade dos Neurônios com Resposta Binauricular à Localiza-
ção do Som. Do que foi discutidosobreavia auditiva,deveserlembradoque
osneurônios dosnúcleoscoclearesrecebemaferênciassomentedo nervo ves-
tíbulo-coclearipsilateral.Assim, todos essascélulassão neurôniosmonoauricu-
lares,o que significaque somenterespondemao~ue atingiuum ouvido.
Entretanto,em todos os demaisestágiosde processa_meptono sistemaauditi-
vo, existemneurôniosbinauriculares,cujasrespostassãoinfluenciadaspelo som
proveniente de ambos os ouvidos. As propriedadesde respostabinauricular
369
Ondas
sonora
Sombra
sonora
(a)
Sombra
sonora
(b)
~'b-~
\ c:?~o,'b-
0<::'"ó
"'
(c)
FIGURA11.23
Diferença de intensidade
interauricular como uma informação
para a localização do som.
(a) Quandoo somdealtafreqüência
vemdadireita,a cabeçaprojetaráuma
sombrasonoraparaa esquerda.O som
de intensidademenornaorelhaesquerda
é umainformaçãodequeo somveioda
direita.(b) Seo somvemdiretamenteda
frente,umasombrasonoraé geradapara
atrásdacabeça,maso somatingeasduas
orelhascoma mesmaintensidade.(c) O
somvindode umângulooblíquogerauma
sombraparcialà orelhaesquerda.
370 CAPíTULO II . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
o"c:
~300
Q)
(/)
(;c.
o
'r5.200m
Q)"
(/)
"O;
"g 100
Q)
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c.
Q)"
O
Q;
E.:J
z
o 1 2
Retardotemporalinterauricular(ms)
FIGURA 11.24
Respostas de um neurônio da oliva
superior sensívelao retardo temporal
interauricular. Esseneurôniotem
umarespostaótimaa umretardode
aproximadamenteI ms.
~.~
dos neurônios implica o fato de essesassumiremuma função importantena
localizaçãodo somno plano horizontal.
A primeira estruturacom neurônios de respostabinauricular é a oliva su-
perior.Ainda que existaalgumacontrovérsiaacercadarelaçãoentreaativida-
de de taisneurônios e a localizaçãocomportamentaldo som,há váriascorre-
laçõesmuito convincentes.Os neurônios da oliva superiorrecebemaferências
dos núcleos coclearesde ambosos lados do tronco encefálico(Figura 11.18).
As células dos núcleos coclearesque se projetam à oliva superior possuem,
tipicamente, respostascom sincronia de faseàs aferênciassonoras de baixa
freqüência. Conseqüentemente,um neurônio da oliva que recebepotencias
de ação dos núcleos coclearesdireito e esquerdo pode computar o retardo
temporal interauricular. Os registrosobtidos da oliva superior mostramque
cadaneurônio respondedeforma característicamaisintensaa um determina-
do retardointerauricular (Figura 11.24).Devido ao fato de o retardointerau-
ricular variar com a localizaçãodo som, cadaum dessesneurônios pode estar
codificandouma determinadaposiçãono plano horizontal.
Como um circuitoneural podeproduzir neurôniossensíveisao retardoin-
terauricular?Uma possibilidadeé utilizar axônioscomo linhasderetardoe medir
precisamentepequenasdiferençasde tempo.Um somque atingeo ouvidoes-
querdodisparapotenciaisdeaçãono núcleococlearesquerdo,quesepropagam
ao longo de axôniosparaa oliva superior (Figura 11.25).Passados0,6 msapós
atingiro ouvidoesquerdo,o somatingeo ouvidodireito (considerando-sequeo
somvenhadiretamentedaesquerda)edisparapotenciaisdeaçãoemaxôniosdo
núcleococleardireito.Entretanto,devidoàmaneiracomoosaxônioseosneurô-
nios estãoarranjadosna oliva, ospotenciaisdeaçãode cadalado levamtempos
diferentesparachegaraosváriosneurôniospós-sinápticosna oliva.Por exemplo,
o axônio do núcleo coclearesquerdotem uma via mais longaa percorreratéo
neurônio 3 na Figura 11.25do que o axônio do núcleo cocleardireito;a chega-
da do potencialde açãoda esquerdaseatrasa,portanto, exatamenteo tempo
suficientepara que coincidacom a chegadado potencialdeaçãoda direita.Ao
chegaremexatamenteaomesmotempo,ospotenciaisdeaçãodosdoisladospro-
duzempotenciaisexcitatóriospós-sinápticos(PEPS) que sesomam,produzindo
um PEPS maior queexcitao neurônio 3 maisintensamentedo queum PEPSde
cadaouvido separadamente.Quandoum retardointerauricularé maiorou me-
nor doque0,6ms,ospotenciaisdeaçãonão chegamjuntos,e,assim,o PEPSque
osneurôniosdisparamnão resultamemuma somaçãoimportante.
Outros neurônios da oliva superiorestãosintonizadosparaoutrostempos
interauriculares,devidoàsdiferençassistemáticasno arranjo daslinhas dere-
tardo axonais.Para medir as diferençasno tempo de ativaçãodasfibras afe-
rentestão corretamentequanto for possível,muitos neurônios e sinapsesdo
sistemaauditivo estãoadaptadosespecialmentepara operaçõesrápidas;seus,
potenciaisdeaçãoe PEPS sãomuito maisrápidosdo queosdamaioriadosou-
trosneurônios encefálicos.Contudo, existemlimitesparaasmedidasdetempo
auditivo dessetipo. A sincronia de faseé essencialparauma comparaçãopre-
cisadasmarcaçõesde tempo dasaferências,e como a sincronia de faseocorre
somentecomfreqüênciasrelativamentebaixas,os retardosinterauricularessão
úteisapenasparaa localizaçãodossonscomfreqüênciarelativamentebaixa.
O mecanismodescritona Figura 11.25estáclaramentepresenteno encéfalo
de aves,masé menosóbvioquemamíferoscalculemretardosinterauraisdessa
forma.Estudosrecentesemgerbossugeremqueémaisa inibiçãosináptica,que
aslinhasderetardoaxonaL quepermite que osneurôniosolivaressuperiores
sejamsensíveisao
retardointeraural.É, p ém,possívelque ambosprocessos
colaborempara essepropósito,mas pena novos estudospermitirão compre-
endermoso mecanismoque computao etardointerauralnosmamíferos.
Além da sensibilidadeao retardointerauricular,os neurônios da oliva su-
perior sãosensíveisa outrainformaçãoda localizaçãodo som,a intensidadein-
terauricular.Um tipo de neurônio fica moderadamenteexcitadopelo somque
atingecadaouvido, masmostrauma respostamáximasomentequandoambos
osouvidossãoestimulados.O outro tipo deneurônio ficaexcitadopelosomde
um ouvidomasinibido pelo somdo outro ouvido. Presumivelmente,ambosos
T MECANISMOS DE LOCALIZAÇÃO DO SOM
o somdo lado esquerdo inicia a
atividade no núcleo coclear esquerdo;
a atividade é, então, enviada
à oliva superior.
Em seguida o som alcança o ouvido
direito, iniciando a atividade no núcleo
coclear direito. Enquanto isso, o
primeiro impulso já percorreu uma
certa distância ao longo do seu axônio.
Ambos os impulsos alcançam o
neurônio 3 da oliva ao mesmo tempo,
e o somatório dos potenciais
sinápticos gera um potencial de ação.
t
." Olivasuperior
, 1 2 3
1 (~ ~ ~
,,'-A-
Axônio do núcleo
c_oplearesquerdo
Axônio do núcleo
coclear direito
2
Q
3
-1 -Â-
1
Q
tiposdeneurônioscontribuemparaalocalizaçãohorizontaldosomdealtafre-
qüênciaporcodificaçãodediferençasnaintensidadeinterauricular.
Localizaçãodo Som no PlanoVertical
Compararasaferênciasprovenientesdeambosouvidosnãoémuitoútil para
lizarsonsno planovertical,pois,comoasfontessonorasemitemsonsque
semov aracimaouparabaixo,nãoocorreretardodetempointerauricular,
nemvariação intensidadeinterauricular.Eisporquetaparumdosouvidos
afetamuitomenosalocalizaçãodossonsnoplanoverticaldoquenoplanohori-
zontal,comofoimencionadoanteriormente.Paraprejudicarseriamentealocali-
zaçãoverticaldosom,deve-secolocarumtubonocanalauditivoqueseprojete
paraalémdaaurícula.Ascurva sinuosasdoouvidoexternosãoessenciaispara
assegurarapercepçãodaelevaço deumafontesonora.Assaliênciaseossulcos
aparentementeproduzeme xõesquepermitemqueo somentrenoouvido.
Osretardasdetempoentreaviadiretaeaviarefletidamudamàmedidaque
afontesonorasemoveverticalmente(Figura11.26).A combinaçãodossons,
diretoerefletido,ésutilmentediferentequandovemdecimaoudebaixo.Além
disso,oouvidoexternopermitequeossonsdealtafreqüênciaentremnocanal
371
FIGURA11.25
linhas deretardoe sensibilidade
neuronalao retardointerauricular.
372 CAPíTULO II . OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
Pavilhão
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somrefletido
Trajetória1
somdireto
Trajetória 1
som refletido
~
"'-. -
,
/\ Trajetória 3~ somrefletido
Trajetória3
somdireto
FIGURA 11.26
Localização vertical do som com base nas reflexões do som no pavilhão da orelha.
~
auditivoquandoessesvêmdeumafonteelevada.A localizaçãoverticaldosomé
seriamenteprejudicadaseasconvoluçõesdopavilhãoforemcobertas.
Alguns animais são extremamentehabilidosos para localizar sonsverti-
cais,emboranão possuamum pavilhão. Por exemplo, Uma coruja de celeiro
pode arremeter em descidarápida sobre um camundongo que guincha no
escuro, localizando-o precisamentepor meio do som e não com sua visão.
Embora as corujas não possuampavilhão, elas utilizam asmesmastécnicas
que utilizamos para a localização horizontal (diferenças interauriculares),
pois seusouvidos estãoem alturas diferentesna cabeça.Alguns animaispos-
suem um sistemamais "ativo" para a localizaçãodo som do que oshumanos
e as corujas. Certos morcegosemitem sons que são refletidospelos objetos,
e essesecos são utilizados para localizar objetos sem empregar a visão. O
som refletido, análogo ao sonarutilizado pelos navios, é utilizado por muitos
morcegos para caçar insetos. Em 1989, James Simmons, da Universidade
Brown, fez a surpreendentedescobertade que os morcegospodem discrimi-,
nar retardostemporaistãomínimos quanto 0,00001ms. Essadescoberta,em
princípio, desafianossacompreensãode como o sistemanervoso, utilizando
potenciais de ação que duram quaseum milissegundo, pode realizar discri-
minaçõestemporaistão precisas.
CÓRTEX AUDITIVO
Osaxôniosquedeixamo NGMprojetam-seaocórtexauditivoatravésdacáp-
sulainternaemum arranjodenominadoradiaçãoacústica.O córtexauditivo
primário(AI) correspondeà área41 deBrodmannno lobotemporal(Figura
11.27a).A estruturadeAI e dasáreasauditivassecundáriasé,emmuitosas-
ca
ectos,similar àsáreascorrespondentesdo córtexvisual. A camadaI contém
po cos corpos celulares,e as camadasII e III contêm principalmentecélulas
'ramidaispequenas.A camadaIV, onde terminam os axônios do núcleo ge-
niculado media!,é compostade célulasgranularesdensamenteagrupadas.As
camadasV e VI contêmprincipalmentecélulaspiramidais,em geral maiores
do que aquelasdascamadassuperficiais.Analisaremoscomo essesneurônios
corticaisrespondemao som.
(a)
PropriedadesdasRespostasNeuronais
Emgeral,osneurôniosdaáreaAI demacacos(esupostamenteemhumanos)
sãosintonizadosdemaneirarelativamenteprecisaparafreqüênciasonorae
possuemfreqüênciascaracterísticasquecobremtodoo espectroaudível.Nas
penetraçõesdeeletrodosrealizadasperpendicularesàsuperfíciecorticalnos
macacos,ascélulasencontradastendema mostrarfreqüênciascaracterísti-
cassimilares,sugerindoumaorganizaçãocolunar combasena freqüência.
NarepresentaçãotonotópicadeAI, asbaixasfreqüênciasestãorepresentadas
rostrale lateralmente,enquantoqueasaltasfreqüênciasestãorepresentadas
caudalemedialmente(Figura11.27b).As bandasdeisofreqüênâalocalizam-se
mediolateralmenteaolongodeAI. Em outraspalavras,osneurôniosdispos-
tosembandasqueseestendempor AI possuemfreqüênciascaracterísticas
muitosimilares.
No sistemavisual,é possíveldescreverum grandenúmerodeneurônios
corticaisquepossuemalgumavariaçãono camporeceptivogeral,o qualoué
simplesou complexo.Atéagora,nãotemsidopossívelclassificarosdiversos
camposreceptivosauditivosemum númeropequenodecategorias,comono
casodavisão.Comonosestágiosiniciaisdaviaauditiva,osneurôniospossuem
diferentespadrõesderespostatemporal;algunstêmumarespostatransitóriaa
umsombreve,enquantooutrostêmumarespostamaisdemorada.
Alémdasintoniadefreqüênciaqueocorrenamaioriadascélulas,alguns
neurôniosestãosintonizadosparaa intensidade,fornecendoumaresposta
máximaa umadeterminadaintensidadedesom.Mesmonosneurôniosde
acolunaverticalperpendicularàsuperfíciecortical,podehaverconsiderá-
vel 1 sidadenosgrausdesintoniadefreqüênciasonora.Algunsneurônios
estãosinton dosdeformaprecisaparaa freqüência,e outrosestãofraca-
mentesintonizao demaneirageral;o graudesintonianãoparececorrela-
donar-sebemcomascamadascorticais.Outrossonsqueproduzemrespostas
nosneurônioscorticaisincluemosestalidos,asrajadasderuídos,ossonsde
freqüênciamoduladaeasvocalizações.Esclarecera funçãodessesneurônios
querespondemaestímulosaparentementecomplexoséumdosdesafiosque
seimpõeaospe6quisa,dores(Quadro11.5).
Consideran~ande variedadedostiposderespostaqueosneurofisiolo-
gistasencontramaoestudaro córtexauditivo,vocêpodecompreenderporque
é tranqüilizador veralgumtipodeorganizaçãoouprincípiodeunificação.Um
princípioorganizacionaljá discutidoé a representaçãotonotópicaemmuitas
áreasauditivas.Umsegundoprincípioéapresençanocórtexauditivodecolu-
- CÓRTEX AUDITIVO 373
FIGURA11.27
Córtex auditivoprimárioem
humanos. (a) Córtexauditivoprimário
(roxo)easáreasauditivassecundárias
(verde)nolobotemporalsuperior.
(b) Organizaçãotonotópicadocórtex
auditivoprimário.Os númerosindicamas
freqüênciascaracterísticas.
374 CAPíTULO I I . OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
ComoFuncionao CórtexAuditivo?
Consulteum Especialista
A funçãodo sistemanervosode um animalé ajudá-Ioa man-
ter-sevivoe a reproduzir-se.Diferentesespéciespossuemhá-
bitose necessidadesimensamentediferentes,e,em algunsani-
mais,evoluiuum sistemasensorialaltamenteespecializadoem
processarseusestímulospreferidos.Os exemplosde sistemas
sofisticadosdessesespecialistassensoriais,como a coruja de
celeiro e os morcegos,às vezesnos auxiliama compreender
como nós,generalistassensoriais,funcionamos.
As corujasde celeiroencontrama presa(um camundon-
go apressado,por exemplo)no escuroescutando-amuitocui-
dadosamente.Elassão peritasem identificare localizarsons
fracos,e algunsdos mecanismosneuraisde localizaçãodo som
foramcompreendidosprimeironascorujas.Os morcegospos-
suemumatécnicaauditivaúnicae maisativa.Elesencontram
seu alimento (uma mariposaem movimento,por exemplo),
localizando-apelo eco. Os morcegos emitem sons brevese
escutamos fracos ecos refletidos pelos alvos.Os morcegos
necessitamde um córtex adaptadoparaa localizaçãopelo eco.
O estudodo córtex de morcegopode,seguramente,fornecer
umacompreensãosobre o funcionamentodo córtex auditivo
nos morcegose pode,também,nos fornecer idéiasnovasque
possamesclarecersobre o córtex humano.
Os estímulos mais interessantespara a ecolocalização
dos morcegos são seus próprios sons emitidos e seus ecos.
A linguagemde um morcegoé muito limitada.Para a localiza-
ção pelo eco,a maioriados morcegosemite guinchosaltos a
freqüênciasultra-sônicas(20 a 100kHz), utilizandoum voca-
buláriode, essencialmente,uma palavra.O som emitido pelo
morcego de bigode (Pteronotuspame/lii)é muito breve,não
maisdo que 20 ms de duração;esseconsisteem uma parte
invariávelde freqüênciaconstante(FC), seguidade uma parte
da emissãocom freqüênciadescendente- a freqüênciamo-
dulada(FM).A FiguraA é um gráficoda emissãode som do
morcegoe do eco,mostrandoasfreqüênciasdos sons repre-
sentadasem relaçãoao tempo. À medidaquevoa,o morcego
repete a emissãodo som de forma contínuae rápida.Ao es-
cutarseu próprio som e o eco desse,o morcegocompara-os
cuidadosamentede muitasmaneirase constrói uma imagem
auditivanotavelmentedetalhadado mundo que o cerca.Por
exemplo,o retardoentre o chamado e seu eco depende da
distânciaaté o alvo refletor (I ms de retardo para cada 17
cm de distância).Se o alvo está se movendo em direção ao
morcegoou para longedesse,a freqüênciado eco mostraum
desvioDopplermaisalto ou maisbaixo (imaginea variaçãona
freqüência do som da sirene de uma ambulânciaenquanto
ela passapor você; uma variação de 1kHz corresponde a
uma velocidade de aproximadamente 3 m/s). O batimento
das asasde uma mariposacausaum ritmo nos ecos,o que
auxiliao morcegoa reconhecerque estáa suafrente umtipo
particularde inseto,e não outra coisamenoscomestível.Mui-
tas outrasvariaçõessutisnafreqüência,na precisãotemporal,
no volume e no padrão do eco indicamao morcego outras
característicasdo alvo.
Nobuo Suga,daUniversidadedeWashington,tem estuda-
do,muitodetalhadamente,o processamentoda informaçãodo
chamado-e-ecopelo córtex auditivodo morcegode bigode.
nas de células com interação binauricular similar. Como nos níveis subcorticais ,
do sistema auditivo, podem-se distinguir neurônios que respondem maisaes-
timulaçãodeambososouvidosdoqueparacadaum separadamentee,ainda,
neurôniosquesãoinibidosseambososouvidosforemestimulados.Comojá
discutimosemrelaçãoà oliva superior,neurôniossensíveisaosretardostempo-
raisinterauricularese àsdiferençasdeintensidadeinterauricularprovavelmen-
te assumemuma importantefunçãona localizaçãodo som.
Além daAI, outrasáreascorticaislocalizadasna superfíciesuperiordo lobo
temporalrespondemaosestímulosauditivos.Algumasdessasáreasauditivassu-
perioressãotonotopicamenteorganizadas,enquantooutrasaparentementenão.
Como no córtexvisual,existeuma tendênciaparaque os estímulosqueprovo-
camumarespostaintensasejammaiscomplexosdo quenosníveisinferioresdo
sistema. UmexemplodeespecializaçãoéaáreadeWernicke,aqualdiscutiremos
no Capítulo20. A destruiçãodessaáreanão interferena sensaçãodo som,mas
prejudicaseriamenteahabilidadeparainterpretara linguagem falada.
--~
Os Efeitosde LesõeseAblaçõesdo Córtex Auditivo
Apesarde a ablação bilateraldo córtexauditivoresultarem surdez,essaocorre
commaisfreqüênciaemfunçãodeumalesãodosouvidos(Quadro11.6).Mes-
... CÓRTEX AUDITIVO 375
Sugaverificouqueo córtexdo morcegoé umamesclade
distintasáreasauditivas.Muitassãoespecializadasemdetec-
tardeterminadascaracterísticasimportantesparaaecolocali-
zação,e outrasparecemsermaisgeneralizadas.Porexemplo,
umagranderegiãoé dedicadaao processamentodosdesvios
Dopplerdosecosao redorde60kHz,a partedo somemiti-
do pelomorcegocommaiorintensidade;essaáreaprocessa
a informaçãosobrea velocidadee a localizaçãodo alvo.Três
áreasseparadasdetectamo retardodoschamado-e-ecos,e
geraminformaçãosobrea distânciado alvo.Estamosapenas
começandoa entenderosmecanismosneuraisqueextraem
talinformação.
Os aspectosbásicosdasemissõessonorasde ummor-
cegoe daspalavrasfaladaspor um humanosão similares,
90 DesvioDoppler
Chamado{ Eco
I l ~
FC t ~~,FM Retardo
N
I
6 60
(ti
'uc:
,C])
.::J
CT
.t 30
o 10 20
Tempo(ms)
FIGURAA
Umchamadodeummorcegoeseueco.
(Fonte:AdaptadodeSuga,1995,p.302.)
emboraa falahumanaé muitomaislentae comfreqüên-
ciassonorasmaisbaixas.As sOabashumanasconsistemem
combinaçõesdeterminadasde períodosde FC,seqüências
de FM,pausasbrevese "explosões"deruídos.Porexemplo,
a sOaba"ca"diferede"pa"porquesuasvarredurasiniciaisem
FM desviamparadiferentesdireções(FiguraB).O som"a"
longodiferedo"i"longoporquecadaumutilizacombinações
diferentesdeFC.É muitoprovávelqueoscircuitosneuronais
queprocessamos sonsdafalano córtexauditivohumano
utilizemprincípiosmuitosimilaresàquelesdo córtexdemor-
cego.A interpretaçãodaquelessonsdafalacomopalavrase
a compreensãodosconceitosqueessasimplicamsãotemas
do domínioda linguagem.Os mecanismoscerebraisda lin-
guagemserãodiscutidosnoCapítulo20.
2,0
."'\ FM
~.. a"
p FC2
N
I
6
.~ 1,2
c:
<C])
'::J
CT
C])
u:
0,4
o 0,1 0,2
Tempo (ms)
0,3
FIGURA B
Palavrasfaladasde umhumano.(Fonte:
Adaptadode Suga,1995,p.296.)
moapóslesõesunilateraisdocórtexauditivo,émantidoumnívelsurpreenden-
tedefunçãoauditivanormal.Issoénotadamenteocontráriodoqueseobserva
nosistemavisual,noqualumalesãocorticalunilateraldocórtexestriadoleva
àcegueiracompletaemumhemicampovisual.A razãoparaumamaiorpreser-
vaçãodafunçãoapóslesõesnocórtexauditivoéqueambososouvidosenviam
erênciasaocórtexdeamboshemisférios.Emhumanos,odéficitprimárioque
resu e umaperdaunilateraldeAI éa incapacidadeparalocalizara fonte
daqualem um som.Podeserpossíveldeterminardequalladodacabeça
vemumsom,m sexistepoucahabilidadeparalocalizaro somdeformamais
precisa.A realizaçãodetarefascomoadiscriminaçãodafreqüênciaoudainten-
sidadedosomestápróximadonormal.
Estudoscomanimaisexperimentaisindicamquelesõesmenorespodem
produzirdéficitsespecíficosdelocalização.Em decorrênciadaorganizaçãoto-
notópicadeAI, épossívelfazerumalesãocorticalrestritaquedestruaneurô-
nioscomfreqüênciascaracterísticasdentrodeumafaixalimitadadefreqüên-
cias.Ocorre,demaneirainteressante,um déficitna localizaçãoapenaspara
sonsquecorrespondam,grossomodo,àsfreqüênciascaracterísticasdascélulas
queestãofaltando.Esseresultadoreforçaa idéiadequea informaçãodasdi-
ferentesbandasdefreqüênciapodeserprocessadaemparalelopor estruturas
tonotopicamenteorganizadas.
376 CAPíTULO II . OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
DistúrbiosAuditivos e Seus
Tratamentos
Emboraosefeitosde lesõescorticaisforneçamimportante
informaçãosobreo papeldocórtexauditivonapercepção,o
déficitperceptivoqueassociamosao sistemaauditivo,a sur-
dez,resultanormalmentedeproblemasnacódeaoupróximo
aessa.Convencionalmente,asurdezestásubdivididaemduas
categorias:asurdezdeconduçãoe asurdezneural.
A perdadaaudiçãoresultantedeumdistúrbionacondu-
çãodosomdoouvidoexternoàcódeaé chamadadesurdez
deconduçõo.Essedéficitsensorialpodesercausadoporalgo
tãosimplescomoceraemexcessonoouvidoou porproble-
masmaissérioscomoa rupturadamembranatimpânicaou
umapatologiadosossículos.Váriasdoençaspodemcausara
fusãodosossículosaoossodo ouvidomédio,prejudicandoa
transmissãosonora.Felizmentea maioriadosproblemasme-
cânicosdo ouvidomédioqueinterferemnacondutânciado
sompodesertratadacirurgicamente.
A surdezneurolestáassociadaà perdadeneurônios,
tantodo nervoauditivocomodascélulasciliadasdacódea.
A surdezneuralresultaalgumasvezesdetumoresqueafe-
tamo ouvidointerno.Podesercausadatambémpor dro-
gasquesejamtóxicasàscélulasciliadas,comoo quininoe
certosantibióticosou,ainda,exposiçãoa sonsaltos,como
umaexplosãoou músicaemaltovolume.Dependendoda
extensãodaperdacelular,váriostratamentossãopossíveis.
Seacódeaou o nervoauditivodeumladoestácompleta-
mentedestruído,a surdezé totalnaqueleouvido.Contudo,
é maiscomuma perdaparcialde célulasciliadas.Nesses
casos,umaparelhoauditivopodeser utilizadoparaampli-
ficaro somparaascélulasciliadasrestantes.Emcasosmais
severos,nosquaisa perdaauditivafor bilateral,mantendo
o nervoauditivointacto,os implantescodearessãouma
importanteopção(verQuadro I 1.2).
Coma surdez,umapessoaescutamenossonsdo queo
normal.Como distúrbioauditivochamadotinidoauditivo,uma
pessoaescutaruídosnosouvidosnaausênciade qualquer
estímulosonoroexterno.A sensaçãosubjetivapodeassumir
muitasformas,induindozumbido,sussurroe sibiloVocêpode
ter umaformamoderadaetemporáriadetinidoapósteres-
tadoemumafestacommúsicamuitoalta;osseusneurônios
corticaispodemtersedivertido,massuascélulasciliadases-
tãoemchoque!O tinidoé umdistúrbiorelativamentecomum
quepodeinterferirseriamentenaconcentraçãoe notrabalho,
casopersista.Vocêpodeimaginarquantadistraçãohaveriase
estivesseconstantementeouvindosussurros,zumbidosouo
somdepapéissendoamassados.
O tinidopodeserumsintomadeváriosproblemasneu-
rológicos.Emborafreqüentementeacompanhedoençasenvol-
vendoa códeaouo nervoauditivo,o tinidopoderesultarda
exposiçãoa sonsaltosouàvascularizaçãoanormaldo pesco-
ço,ou,ainda,envelhecimentonormal.Atualmente,considera-se
quemuitosdossonsfantasmasdotinidosãocausadosporal-
teraçõesdasestruturasauditivascentrais,indusivedo córtex
auditivo.Lesãodacódeaou do nervoauditivopodeinduzir
alteraçõesencefálicas,comoumasubsensibilizaçãodainibição
sináptica.Emborao tratamentodínicodotinidoseja,freqüen-
temente,apenasparcialmentebemsucedido,o aborrecimento
do ruídopodeserdiminuído,utilizando-seummecanismoque
produzaumsomdeformaconstantenoouvido(s)afetado(s).
Porrazõesdesconhecidas,o somrealconstanteé menosdesa-
gradáveldoqueo somdotinidoqueconsegueserbloqueado.
" O SISTEMA VESTIBULAR
Podeparecerestranhoque o ato de escutarmúsicae de andardebicicletaen-
volvemsensaçõesquesãotransduzidaspor célulasciliadas.O sistemavestibular
informa sobreaposiçãoe o movimentodacabeça,provendo-noscomo sentido
do equilíbrio,eauxilia na coordenaçãodosmovimentosdacabeçae dosolhose
nosajustesdaposturacorporal.Quandoo sistemavestibularoperanormalmen-
te, estamos,em geral,desatentosde seu funcionamento.Quando, entretanto,
sua função é interrompida,resultamsensaçõesdesagradáveis,comosensações
"devirar o estômago",que normalmenteassociamosa doençasdo movimento
(ou cinetose):vertigem,náuseaemaisuma sensaçãodedesequilíbrio,acompa-
nhadademovimentosincontroláveisdosolhos.
O labirinto Vestibular
O sistemavestibular, assim como o sistemaauditivo, utiliza células ciliadas
para transduzir os movimentos. Estruturas biológicas comuns possuemfre-
qüentemente origens comuns. Nessecaso, os órgãos do equilíbrio e da au-
dição dos mamíferosevoluíram dos órgãosda linha lateralpresentesem todos
Canais
semicirculares
(a)
Utrículo Sáculo
' v----
Órgãos
otolíticos
- -
,~
.
~
(b)
Nervo vestibular
Cóclea
,
(
Canais
semicirculares
vertebradosaquáticos. As linhas laterais consistem em pequenas fossas ou
tuB ao longo das superfícies laterais de um animal. Cada fossa contém agru-
pamen de células sensoriais similares às ciliadas, cujos dlios projetam-se
para uma su ância gelatinosa que se abre no meio aquático externo ao ani-
mal. A função das 'nhas laterais em muitos animais é detectar as vibrações ou
mudanças na pressão da água. Em alguns casos, ocorre também sensibilidade
à temperatura ou a campos elétricos. As linhas laterais desapareceram com a
evolução dos répteis, mas a sensibilidade mecânica especial das células ciliadas
foi adotada e adaptada para o uso em estruturas do ouvido interno, que deri-
varam da linha lateral.
Nos mamíferos, todas as células ciliadas estão confinadas em conjuntos
de câmaras interconectadas denominadas de labirinto vestibular (Figura
11.28a). Já discutimos a respeito da porção auditiva do labirinto, a cóclea espi-
raladà (Figura 11.6). O labirinto vestibular inclui dois tipos de estruturas com
diferentes funções: os órgãos otolíticos, que detectam a força da gravidade e as
T O SISTEMAVESTIBULAR 377
FIGURA 11.28
O labirinto vestibular. (a) Localização
dos órgãosotolíticos (utrículo e sáculo) e
canaissemicirculares,(b) Há um labirinto
vestibular localizado de cada lado da cabeça,
com os canaissemicircularesarranjados em
planos paralelos,
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378 CAPíTULO I I . OS SISTEMASAUDITIVO EVESTIBULAR
inclinaçõesda cabeça,e oscanais semicirculares, que sãosensíveisà rotação
dacabeça.O propósitobásicodecadaestruturaétransmitira energiamecânica,
derivadado movimentodacabeça,àscélulasciliadas.Cadauma ésensívelaum
tipo diferentedemovimento,não por diferençasnascélulasciliadas,maspelas
estruturasespecializadasdentrodasquaisestãodispostasascélulasciliadas.
Osórgãosotolíticossãoumpardecâmarasrelativamentegrandes,osáculo
e o utrículo,próximosao centrodo labirinto.Os canaissemicircularessãoastrês
estruturasem formade arco do labirinto.Eles estãocolocadosem planosapro-
ximadamenteortogonaisentresi, o quesignificaqueexisteum ângulodecerca
de 90graus entrecadadoisdessesarcos(Figura11.28b).Existeum conjuntode
órgãosvestibularesde cadalado da cabeça,dispostoscomoa imagemespecular
do outro.
Cada célula ciliada dosórgãosvestibularesestabeleceuma sinapseexcita-
tória com a terminaçãode um axônio sensorialde nervovestibular,um ramo
do nervo vestíbulo-coclear(VIII nervo craniano). Existemaproximadamente
20.000axôniosdo nervo vestibulardecadalado da cabeça,e seuscorposcelu-
laresestãosituadosno gângliovestibulardeScarpa.
~
Os ÓrgãosOtolíticos
o sáculoeo utrículodetectammudançasno ângulodacabeça,comotambém
a aceleraçãolineardacabeça.Quandovocêinclinaa cabeça,o ânguloentreos
órgãosotolíticoseadireçãodaforçadegravidademudam.A aceleraçãolinear
tambémgeraforçaemproporçãoàmassadeumobjeto.As forçasdecorrentes
daaceleraçãolinearsãoasdotipoquevocêencontraquandosobeoudescede
elevadorouemumcarro,enquantoessearrancaoupára.Ao contrário,quando
umcarroouelevadormove-seaumavelocidadeconstante,aaceleraçãoézero,
demaneiraquenãoexistenenhumaforçaalémdagravitacional.Eisporque
pode-sevoara960quilômetrosporhoradeformaestávelemumaviãoeainda
sentir-seperfeitamenteimóvel;o repentinopuloquesesente,contudo,duran-
teumaturbulênciaaéreaé outroexemplodasforçasgeradaspelaaceleração
linearedosmovimentosdetectadospelosórgãosotolíticos.
Cadaórgãootolíticocontémum epitéliosensorialchamadomácula,a
qualestáorientadaverticalmentedentrodosáculoehorizontalmentedentro
doutrículoquandoacabeçaestáaprumada.(Nãoconfundirmáculavestibular
commácularetiniana,quesãoestruturastotalmentediferentes.)A máculaves-
tibularcontémcélulasciliadas,queestãodispostasemumacamadaconstituída
decélulasdesustentação,comseusestereocíliosprojetando-separadentrode
umacoberturagelatinosa(Figura11.29).Osmovimentossãotransduzidospe-
lascélulasciliadasnamáculaquandoosfeixesdeestereocíliossãodeflectidos.
A característicaespecialdosórgãosotolíticoséapresençadediminutoscristais,
decarbonatodecálciochamadosdeotolitos,de1-5j..lmdediâmetro.(OtoUtoem
gregosignifica"pedradoouvido".)Osotolitosestãoincrustadosnacobertura
gelatinosadamácula,próximosàsextremidadesdosfeixesdeestereocíliosesão
o elemento-chaveparacompreendermosa sensibilidadedamáculaa inclina-
ções.Osotolitospossuemdensidadesuperioradaendolinfacircundante.
Quandoo ângulodacabeçamudaou quandoessaé acelerada,umaforça
(inérciaaomovimento)éexercidasobreosotólitosque,porsuavez,atuamsobre
acoberturagelatinosa,movendo-alevementeecurvando,assim,osestereocílios
dascélulasciliadas.Contudo,nãoéqualquerdeslocamentodoestereocílioque
produziráresultado.Cadacélulaciliadatemumcílioespecialmentecomprido,o
cinocílio.Odeslocamentodosestereocíliosemdireçãoaocinocílioresultaemuma
despolarização,opotencialexcitatóriodoreceptor.O deslocamentodosestereo-
cíliosnadireçãoopostaaocinocíliohiperpolariza,inibindoacélula.A célulaées-
pecializadadeformaseletivaàdireçãodosestereocílios.Seosestereocíliosestão
perpendicularesàdireçãopreferencial,elesrespondemfracamente.O mecanis-
modetransduçãodascélulasciliadasvestibulareséessencialmenteomesmoque
o dascélulasciliadasauditivas(Figura11.15).Assimcomoocorrecomascélulas
Cobertura
gelatinosa
Célula
ciliada
Célulasde -
sustentação
Axôniosdo
nervovestibular
Cabeçaaprumada
T O SISTEMAVESTIBULAR 379
FIGURA 11.29
Células ciliadas da mácula respondendo à
inclinação. Quandoa máculado utrículoestáno plano
horizontal(cabeçaaprumada),osestereocl1iosdascélulasciliadas
tambémpermanecemretos.Quandoa cabeçae a mácula
inclinam-se,agravidadepuxaos otólitos,os quaisdeformama
coberturagelatinosae encurvaosestereocl1ios.
Cinocílio
;\
(.".i~ "
/'1 4
/1t'~'
,
'
,
,
-I t\, ~.,
"\J\ ~
~~ r
~
Cabeçainclinada
cHiadasauditivas,sãonecessáriossomentemovimentosmínimosdosestereocí-
lios.A respostasaturaquandoosestereocíliosdeslocam-semenosdo que0,5!J.m,
queéaproximadamenteo diâmetrodeum estereocílio.
A cabeçapode se inclinar e se movimentar em qualquer direção,mas as
célulasciliadasdo utrículo e do sáculoestãoorientadaspararesponderefetiva-
mentea todasdireções.As máculasdo sáculoestãoorientadasmaisou menos
'calmente,enquantoque asmáculasdo utrículo estãoem orientaçãohori-
zontal . ura 11.30).Em cadamácula,a direçãopreferencialdascélulascilia-
dasvariasis aticamente.Existemcélulasciliadassuficientesemcadamácula
paracobrirvárias ireções.O conjunto sáculoe utrículo de um lado da cabeça
éumaimagemespeculardo conjunto do outro lado,demodo que,quandoum
determinadomovimentoda cabeçaexcitaascélulasciliadasde um lado, tende
a inibir ascélulasciliadasna localizaçãocorrespondentedo outro lado.Assim,
qualquer inclinação ou aceleraçãoda cabeçaexcita algumascélulasciliadas,
inibe outrase não exerceefeitoalgum sobreasdemais.Por meio da utilização
simultâneada informação codificadapela população total de célulasciliadas
otolíticas,o sistemanervoso centralpode interpretartodos os possíveismovi-
ment?slinearesdeformainequívoca.
380 CAPíTULO I I . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
FIGURA 11.30
Orientação na mácula. (a) A máculado
utrículoestánahorizontal.(b) A máculado sáculo
estánavertical.As setasemcadamáculamostram
comoascélulasciliadasestãopolarizadas.O
deslocamentodosestereoCl1iosnadireçãodas
setasa$despolariza.
Os Canais Semicirculares
"~
Os canaissemicircularesdetectammovimentosde rotaçãoda cabeça,comosa-
cudi-Ia deum ladopara o outro ou acenar,inclinando a cabeçaparafrenteou
paratrás.Os canaissemicircularestambémsentema aceleração,assimcomoos
órgãosotolíticos,masde uma maneiradiferente.A aceleraçãoangularé gerada
por movimentosrotacionaisrepentinose constitui-seno estímuloprimáriopara
oscanaissemicirculares.
As célulasciliadasdoscanaissemicircularesestãoagrupadasem umacama-
dadecélulas,acrista,localizadadentrodeumaprotuberânciado canalchamada
de ampola (Figura 11.31a).Os estereocíliosprojetam-separadentrodacúpula
gelatinosa,a qual seestendeno lúmen do canaldentroda ampola.Todasascé-
lulas cHiadasna ampolapossuemseuscinocíliosorientadosna mesmadireção,
indicandoquetodasessasficamexcitadasou inibidasconjuntamente.Oscanais
semicircularessãopreenchidoscom endolinfa, o mesmofluido do interior da
cóclea.O deslocamentodosestereocíliosocorrequandoo canalsofreumarápida,
rotaçãosobreseueixo comouma roda;à medidaquea parededo canale a cú-
pula começama girar,a endolinfatendea seatrasarem relaçãoao movimento,
devidoà inércia.O movimentomais lento da endolinfaexerceuma forçasobre
a cúpula, como o vento sobrea vela de um barco (Figura 11.31b).Essaforça
encurvaa cúpula, que dobraos estereocíliosque,por suavez (dependendoda
direçãodarotação),podemestimularou inibir a liberaçãodeneurotransmissor
dascélulascHiadasparaasterminaçõesaxonaisdo nervovestibular.
Sea rotaçãodacabeçafor mantidaemvelocidadeconstante,a fricçãodaen-
dolinfanasparedesdo canaldeterminará,ao final, queosdoissemovamjuntos,
o que reduz,atécessar,o encurvamentodacúpulaapós15a 30 segundos.Essa
adaptaçãoà rotaçãopodeservisualizadaclaramentenasfreqüênciasde disparo
dosaxôniosvestibularesdoscanais(Figura11.32).(Essetipo derotaçãoprolon-
gadadacabeçanão é umasituaçãoà qualquevocêseexponhamuito freqüente-
mente,a menosque apreciecertosbrinquedos"desagradáveis"encontradosem
parquesdediversões.)Quandoa rotaçãodacabeça(e deseuscanais)finalmente
cessa,a inérciadaendolinfaprovocaa inclinaçãodacúpulana outradireção,ge-
randouma respostaopostadascélulasciliadase umasensaçãotemporáriadero-
taçãono sentidocontrário.Essemecanismoexplicapor quevocêsente-setontoe
perdeo equilíbriosempreque,assimcomofazumacriança,vocêpararderepente
UFPA
Instituto de Ciências da Saúde
BIBLIOTECA
(a)
Axônios
vestibulares
Cabeçaemrepouso
(b) ~
Cabeça em rotação para a esquerda (sentido horário)
FIGURA 11.3I
Uma secção transversal através da ampola de um canal semicircular. (a) Os
estereocOiosdas célulasciliadaspenetram na cúpula gelatinosa,a qual está banhada pela
endolinfaque preenche os canais.(b) Quando o canal rota para a esquerda (vistafrontal),
a endolinfase atrasae aplica uma força de sentido oposto sobre a cúpula,dobrando os
estereocOiossituados no seu interior.
degirarseucorpocomoumpião- seuscanaissemicircularesestavamenviandoa
mensagemdequeseucorpoaindaestavagirando,agorana direçãooposta.
Juntos, os três canais semicircularesde cadalado da cabeçaauxiliam na
percepçãodetodososângulospossíveisderotaçãodacabeça.Issoé assegurado
porquecadacanalfazparcomoutro demesmaorientaçãodo ladoopostodaca-
beça(Figura 11.28b).Cadamembrodeum par posiciona-sedentro do mesmo
lanodeorientaçãodeseucorrespondenteerespondeàrotaçãosobreo mesmo
eixo. tretanto,enquantoa rotaçãoexcitaascélulasciliadasdeum canal,ela
inibeas / ulas ciliadasdo seu canalcorrespondentecontralateral.Os axônios
vestibulares' aramemaltasfreqüênciasmesmoemrepouso,demaneiraque
suaatividadepo eraumentadaou diminuída, dependendodadireçãodaro-
tação.Essesistemade "liga-desliga"- cadarotaçãocausauma excitaçãode um
ladoe uma inibição do outro (Figura 11.32)- otimizaa habilidadedo encéfalo
emdetectarmovimentosrotacionais.
ViasVestibulares Centrais e ReflexosVestibulares
As vias vestibularescentraiscoordename integram as informaçõessobre os
movimentosda cabeçae do corpo e as utilizam para controlara eferênciados
neurôniosmotoresque ajustama posiçãoda cabeça,dosolhos e do corpo. Os
axôniosvestibularesprimários do VIII nervo cranianofazemconexõesdiretas
T O SISTEMAVESTIBULAR 381
o
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60
Tempo(s)
120
FIGURA11.32
Ativaçãodoscanaissemicirculares.
A rotaçãodacabeçaexcitaascélulas'
ciliadasde um canalsemicirculare inibe
asdo outro.O gráficomostraque a
rotaçãode longa duraçãodacabeçaleva
à adaptação dos impulsos nos axônios
vestibulares.Quando a rotação cessa,os
axônios vestibularesde cada lado começam
a disparar novamente,mas com padrões de
excitação e de inibição inversos.
382 CAPíTULO I I . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
FIGURA 11.33
Resumoesquemáticodasconexões
vestibularescentraisde um ladoda
cabeça.
Cerebelo NúcleoVP
dotálamo
Neurôniosmotores
extra-oculares
(III,IV,VI)
Núcleovestibularmedial
Núcleovestibularlateral
Fascículo
~ longitudinal
medial
Neurônios
motoresdos
membros
Neurônios
motoresdo
pescoço
com o núcleo vestibular, no mesmolado do tronco encefálico,e como ce-
rebelo (Figura 11.33).Os núcleosvestibularestambémrecebemaferênciasde
outraspartesdo sistemanervoso,incluindo o cerebelo,e dossistemassensoriais
somáticoe visual, combinando,dessemodo, a informaçãovestibularaferente
com osdadossobreo sistemamotor e de outrasmodalidadessensoriais.
O núcleovestibular,quepossuiváriassubdivisões,projeta-se,por suavez,
paraváriosalvosrostraisa esse,no troncoencefálico,e caudais,na medulaespi-
nhal (Figura 11.33).Por exemplo,osaxôniosdosórgãosotolíticosprojetam-se
para o núcleo vestibularlateral, o qual seprojeta,então,via tractovestíbulo-es-
pinhal,aosneurôniosmotoresespinhaisque controlamosmúsculosdosmem-
brosposteriores,auxiliando na manutençãodapostura(ver Capítulo 14).Essa
via auxilia na manutençãodaposturaeretacorporal,mesmono convésdeum
barcoquebalança.Os axôniosdoscanaissemicircularesprojetam-seao núcleo
vestibularmedial, o qual envia axônios atravésdo fascículolongitudinalmedial
para excitar os neurônios motoresdos músculos do tronco e do pescoçoque
orientama cabeça.Estavia auxilia no endireitamentodacabeça,mesmoquan-
do o corpoestejagirandoou balançando.
De maneirasimilar aosdemaissistemassensoriais,o sistemavestibularfaz
conexõescomo tálamoe, então,como neocórtex.Osnúcleosvestibularesen-
viam axônios ao núcleoventralposterior(VP) do tálamo,o qual seprojetapara
regiõespróximasà representaçãoda face,no córtexsomatossensorialprimário
e na áreacorticalmotoraprimária (verCapítulos12e 14).Ocorreconsiderável,
integraçãocorticaldasinformaçõessobreosmovimentoscorporais,dosolhose
do campovisual.É provávelqueo córtexmantenhacontinuamenteumarepre-
sentaçãodaposiçãoe daorientaçãodo corpono espaço,o que é essencialpara
nossapercepçãodeequilíbrioeparao planejamentoea execuçãodemovimen-
tos complexose coordenados.
o Reflexo Vestíbulo-Ocular (RVO). Uma função particularmenteimpor-
tante do sistemavestibularcentral é manter seusolhos orientadosparauma
determinadadireção,mesmoenquantovocê estiverdançandofreneticamen-
te. Isso é realizado pelo reflexo vestíbulo-ocular (RVO). Lembre-se que,
paramanteruma visãoprecisa,é necessárioque a imagempermaneçaestável
nas retinas,apesardo movimento dacabeça(ver Capítulo 9). Cadaolho pode
ser movido por um conjunto de seismúsculos extra-oculares. O RVO atua
pela detecçãodas rotaçõesda cabeçae imediatamentecomanda um movi-
mento compensatório dos olhos na direção oposta. O movimento ajudaa
manter sua linha de visão fixa em um alvo visual. Como o RVO é um refle-
xo disparadopela aferênciavestibular,mais do que pela aferênciavisual,ele
opera surpreendentementebem, até mesmo no escuro ou quando os olhos
estãofechados.
... o SISTEMAVESTIBULAR 383
Movimento de rotação da cabeça
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Direção do movimento dos olhos
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Músculo reto
lateral\
Núcleoabducente
nervocranianoVI-
esquerdo
núcleovestibula~
esquerdo
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Fascículo longitudinal
mediar direito
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+
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Canalsemicircular
horizontalesquerdo
FIGURA 11.34
Conexõesvestibularesqueintervêmnosmovimentoshorizontaisdosolhos
duranteo RVO. Essasviasestãoativasquandoacabeçavirarepentinamenteparaa
esquerda,resultandonomovimentodosolhosparaadireita,Asconexõesexcitatóriasestãoem
verdecomsinalde"mais";asconexõesinibitóriasestãoemvermelho,comumsinalde"menos",
Imagine dirigir em uma estradamuito acidentada.Por meio de ajustes
c stantesrealizadospelo RVO, suavisãodo mundo a frenteé completamen-
tees 'vel porque cadasolavanco,e os conseqüentesmovimentos da cabeça,
é com nsado pelo movimento dos olhos. Para apreciar quão eficiente é o
RVO, co pare a estabilidadede um objeto passandodurante os solavancos
darodovia, olhando-o primeiro com seusolhos e depoisatravésdo visor de
umacâmera. menos que você possuauma câmeramuito sofisticada(com
umdispositivoeletromecânicoequivalentea um RVO), vocêperceberáque a
imagemda câmerapula para todos os lados desesperadamente,porque seus
braçosnão sãosuficientementerápidoseprecisosparacorrigirosmovimentos
dacâmeraa cadasolavanco.
A eficiência do RVO depende de conexões complexasdos canais semi-
circularesno núcleo vestibulare desseaos núcleos cranianosque excitamos
músc:ulosextra-oculares.A Figura 11.34 mostra apenasa metadedo com-
ponentehorizontal dessecircuito e ilustra o que acontecequando a cabeça
girapara a esquerdae o RVO induz os dois olhos a virarem para a direita. Os
384 CAPíTULO 1I . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
axônios do canalhorizontal esquerdoinervam o núcleo vestibularesquerdo,
o qual envia axônios excitatórios ao núcleo do VI nervo craniano (núcleo
abducente) contralateral (lado direito). Os axônios motores do núcleo ab-
ducente, por sua vez, excitam o músculo reto lateral do olho direito. Outra
projeção excitatóriado abducentecruza a linha médio-sagital,de volta para
o lado esquerdo,e ascende(via fascículolongitudinal medial) para excitaro
núcleo do lU nervo craniano (núcleo óculo-motor), o qual excita o músculo
reto medial do olho esquerdo.
Com a missãocumprida,ambososolhos sãogiradosparaadireita.Paraas-
seguraruma rápida operação,contudo, o músculo retomedial esquerdopode
ser estimulado,também,por uma projeçãodo núcleo vestibulardiretamente
ao núcleo óculo-motor esquerdo.A velocidadetambém é maximizadapela
ativaçãodasconexõesinibitórias aosnúcleosque controlamosmúsculosque
se opõem a essemovimento (no caso,o reto lateral esquerdoe o reto medial
direito). Para responderàsrotaçõesda cabeçaem qualquer direção,o circuito
RVO completo inclui conexõessimilaresentre o canalhorizontal direito eos
outros canaissemicircularescom os outros músculosextra-ocularesquecon-
trolam o movimento dosolhos.
PatologiaVestibular
o sistemavestibular pode ser lesado de várias maneiras.Por exemplo,pela
toxicidadede altasdosesde antibióticoscomo a estreptomicina.Pessoascom
lesõesbilaterais dos labirintos vestibularesmostram grandedificuldadepara
fixar a visão nos alvos em movimento. Até mesmo as diminutas pulsações
da cabeçadevido à variação da pressãosangüíneadecorrente dos batimen-
tos cardíacospodemserproblemáticasem algunscasos.Quando pessoascom
distúrbiosvestibularesnão podem estabilizaruma imagemsobrea retinaem
movimento, elaspodem ter a sensaçãodesconcertantede que o mundo está
constantementese movendo a suavolta. Essasensaçãopode resultar emdi-
ficuldadespara caminhar e manter-seem pé. Ajustes compensatóriospodem
ser desenvolvidoscom o tempo, à medida que o sistemanervoso aprendea
substituir as informaçõesvestibularespor outras,mais visuaise propriocepti-
vas,para ajudar nosmovimentosprecisose regulares.
... CONSIDERAÇÕES FINAIS
A audição e o equilíbrio iniciam com receptoressensoriaisquase idênticos,
as células ciliadas,as quais são especialmentesensíveisàs deflexõesde seus
estereocílios.Essesdetectaresdemovimento estãocircundadospor trêstipos'
de estruturasdo ouvido interno que oferecemseletividadepara três tiposde
energia mecânica:as ondas periódicas de pressãodo ar (som), a força rota-
cional (giros da cabeça)e as forças lineares (inclinação da cabeça).Exceto
pela similaridadena etapade transduçãoe pelo fato de ascélulasciliadasde
ambos localizarem-se no ouvido interno, os sistemasauditivo e vestibular
são completamente diferentes. Os estímulos auditivos originam-se princi-
palmente do meio externo, enquanto o sistemavestibular sente somente
seus próprios movimentos. As vias auditivas e vestibulares são totalmente
separadas,exceto, talvez, nos níveis mais superiores do córtex. A informa-
ção auditiva está freqüentemente à frente
na nossa consciência, enquanto
a sensaçãovestibularnormalmente opera sem ser notada,para coordenare
calibrar cadaum dosnossosmovimentos.
Acompanhamos asvias auditivasdo ouvido ao córtex cerebrale analisa-
mos asformasde como a informação sonora é transformada.As variaçõesna
densidadedasmoléculas do ar são convertidasem movimentos dos compo-
nentesmecânicosdos ouvidos médio e interno, os quaissãotransduzidosem
respostasneurais.As estruturasdo ouvido e da cócleasãoaltamenteespeciali-
zadaspara a transduçãodo som.Entretanto, essefato poderianos impedir de
observarasconsideráveissimilaridadesentre a organizaçãodo sistemaauditi-
vo e a dosoutros sistemassensoriais.Muitas analogiaspodem serfeitasentre
ossistemasauditivo e visual. Nos receptoressensoriaisde ambosos sistemas,
um códigoespacialé estabelecido.No sistemavisual, o códigonos fotorrecep-
toresé retinotópico;a atividadede um dado receptorindica a presençade luz
emuma determinadalocalização.Os receptoresdo sistemaauditivo estabele-
cemum códigoespacial,o qual é tonotópico, de acordo com aspropriedades
únicasda cóclea.Em cadasistema,a retinotopia ou a tonotopia estápreser-
vadanos sinaisque sãoprocessadosem neurônios secundários,no tálamo e,
finalmente,no córtexsensorial.
A convergência das aferências dos níveis inferiores resulta, nos níveis
superiores, em neurônios com propriedades de resposta mais complexas.
Combinaçõesdas aferênciasdo NGL originam camposreceptivossimples e
complexosno córtex visual; de forma similar, no sistemaauditivo, a inte-
graçãodas aferênciassintonizadas às várias freqüências sonoras resulta em
neurônios de ordem superior que respondem a combinaçõescomplexasde
freqüências.Outro exemplo da crescentecomplexidade visual é a conver-
gênciade aferênciasdos dois olhos, que resulta em neurônios binoculares
que são importantes para a percepçãode profundidade. De forma análoga,
no sistemaauditivo, a aferência dos dois ouvidos é combinada para criar
neurônios com respostabinauricular, utilizados para localizar sonsno plano
horizontal. Essassão algumas dentre as muitas similaridadesdos dois siste-
mas.Os princípios que governam um sistemapodem freqüentemente nos
auxiliar a compreenderoutros sistemas.Mantenha isso em mente enquanto
estiverlendo sobreo sistemasensorialsomáticono próximo capítulo, e você
serácapazdeprever algumascaracterísticasde organizaçãocortical combase
nostrês tipos de receptoressensoriais.
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Introdução
audição(p,344)
sistemavestibular(p,344)
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A Naturezado Som
freqüência(p.344)
hertz(Hz)(p.345)
intensidade(p.346)
A Estruturado Sistema
Auditivo
pavilhão(p.347)
canalauditivo(p.347)
membranatimpânica(p.347)
ossículo(p.347)
janelaoval(p.347)
cóclea(p.347)
ouvidoexterno(p.348)
ouvidomédio(p.348)
ouvidointerno(p.348)
núcleogeniculadomedial(NGM)
(p.348)
órtexauditivoprimário(AI)
(p.348)
o Ouvido Médio
martelo(p.348)
bigorna(p.348)
estribo(p.348)
tubadeEustáquio(p.348)
reflexodeatenuação(p.350)
O Ouvido Interno
janelaredonda(p.35I)
escalavestibular(p.35I)
escalamédia(p.35I)
escalatimpânica(p.35I)
membranade Reissner(p.35I)
membranabasilar(p.351)
órgãodeCorti (p.35I)
membranatectorial(p.35I)
helicotrema(p.35I)
perilinfa(p.352)
endolinfa(p.352)
célulaciliada(p.354)
estereoCllio(p.354)
lâminareticular(p.354)
célulaciliadainterna(p.354)
célulaciliadaexterna(p.354)
gânglioespiral(p.354)
nervovestlbulo-coclear(p.354)
amplificadorcoclear(p.361)
ProcessosAuditivosCentrais
núcleococleardorsal(p.363)
núcleococlearventral(p.363)
... CONSIDERAÇÕESFINAIS 385
olivasuperior(p.363)
colículoinferior(p.363)
freqüênciacaracterística(p.365)
Codificação da Intensidade
e da Freqüência do Som
tonotopia(p.366)
sincroniadefase(p.367)
princípiodassalvas(p.368)
Mecanismosde Localização
do Som
teoriaduplexdelocalizaçãodo
som(p.369) .
O Sistema Vestibular
labirintovestibular(p.377)
órgãosotolíticos(p.378)
canaissemicirculares(p.378)
mácula(p.378)
ampola(p.380)
núcleovestibular(p.381)
reflexovestlbulo-ocular(RVO)
(p.382)
386
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CAPíTULO I I . OS SISTEMAS AUDITIVO EVESTIBULAR
I. Comoosossículosdoouvidomédiofacilitamaconduçãodosomatéacóclea?
2. Porqueajanelaredondaé essencialparao funcionamentodacóclea?O queaconteceriaàaudiçãoseela
nãoexistisse?
3. Porqueé impossívelpredizera freqüênciade umsomsimplesmentepelaobservaçãode qualporçãoda
membranabasilarestámaisdeformada?
4. Porqueo processodetransduçãonascélulasciliadasnãoaconteceriaseosestereocniose o corpo celular
dascélulasciliadasfossemcircundadospelaperilinfa?
5. Seascélulasciliadasinternassãoasresponsáveisprimáriaspelaaudição,qualé afunçãodascélulasciliadas
externas?
6. PorqueumalesãounilateraldocolículoinferioroudoNGMnãolevamàsurdezdesomenteumouvido?
7. Que mecanismossãoutilizadospara localizaro som nos planos horizontal e vertical?
8. Quaissintomasvocêesperariaencontrarem umapessoa quetivessesofridorecentementeumacidente
vascularcerebralqueafetasseA I unilateralmente?Qual o grau de severidadedessessintomassecompara-
doscomos efeitosde um acidentevascularunilateralenvolvendoV I?
9. Quala diferençaentresurdezde conduçãoe surdez neural?
10. Cada mácula contém células ciliadascom cinocniosorientadosem todas asdireções.Qual é a vantagem
dessaorganizaçãocomparada com a orientação de todas as célulasem uma mesmadireção?
11. Imagineumcanalsemicircularmovendo-sede duas maneiras:rotando ao redor de seu eixo (como uma
moeda girando) ou girando primeiro sobre uma extremidade e depois sobre a outra(comouma moeda
arremessadaao ar).Como responderiam suascélulasciliadasem cada caso e por quê?
12. Como vocêesperariaque asfunçõesdosórgãosotolíticose os canaissemicircularesfuncionassemno espa-
ço,onde não há gravidade?
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