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Imunologia e Alergologia

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SEÇÃO
 12
146 / BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE ................................. 988
Células T e imunidade celular ...................................... 993
Redes imunológicas .............................................996
Células B e imunidade humoral ................................... 998
Regulação das respostas imunes humorais ......... 1001
Sistema complemento .............................................. 1001
Resolução de uma resposta imune ............................ 1007
147 / DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS ..................... 1008
Imunodeficiências primárias e secundárias ................. 1008
Imunodeficiências específicas .................................... 1020
148 / DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE ..................... 1026
Distúrbios com reações de
hipersensibilidade Tipo I ........................................ 1027
Doenças atópicas ............................................... 1034
Rinite alérgica ............................................. 1034
Conjuntivite alérgica ................................... 1036
Outras doenças alérgicas do globo ocular ... 1037
Alergia e intolerância alimentar ................... 1037
Doença pulmonar alérgica .......................... 1039
Anafilaxia ........................................................... 1039
Distúrbios dos mediadores vasoativos ............... 1041
Urticária e angioedema ............................... 1041
Angioedema hereditário ............................. 1042
Mastocitose ................................................ 1043
Alergia física ............................................... 1043
Distúrbios com reações de
hipersensibilidade Tipo II ....................................... 1044
Distúrbios com reações de
hipersensibilidade Tipo III ...................................... 1046
Distúrbios auto-imunes ...................................... 1047
Distúrbios com reações de hipersensibilidade Tipo IV ... 1050
Hipersensibilidade a drogas ............................... 1051
149 / TRANSPLANTES ........................................................ 1054
Imunobiologia da rejeição ......................................... 1055
Sistema de antígeno linfocítico humano ............. 1056
Compatibilidade tecidual ................................... 1058
Imunossupressão ............................................... 1059
Transplante de rim ..................................................... 1061
Transplante de fígado ................................................ 1062
Transplante de coração .............................................. 1063
Transplante de pulmão e de pulmão/coração ............ 1064
Transplante de pâncreas ............................................ 1065
Transplante de medula óssea ..................................... 1066
Transplante de outros órgãos e tecidos ..................... 1069
IMUNOLOGIA;
DISTÚRBIOS
ALÉRGICOS
987
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35987
988 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
146␣ /␣ BIOLOGIA DO
SISTEMA IMUNE
O componente celular é o linfócito e as imunoglo-
bulinas (Ig) são os componentes solúveis.
Os linfócitos estão divididos em dois subtipos:
timo-derivado (célula T) e o derivado da medula
óssea (célula B). Os linfócitos são distribuídos por
clonagem; cada clone se especializa em reconhe-
cer um Ag específico por meio de seu receptor de
Ag. Visto que o número de Ag é potencialmente
limitado, esta especialização pareceria colocar uma
carga inadequada sobre o sistema imune. O dilema
de fornecer um número infinito de clones únicos é
resolvido pela capacidade dos genes responsáveis
pelo receptor antigênico do linfócito combinarem-
se em arranjos potencialmente ilimitados.
A função do receptor de Ag sobre as células B é
mediada por imunoglobulinas de superfície. De-
pois que as células B se ligam ao Ag solúvel atra-
vés da sua imunoglobulina de superfície, uma sé-
rie de eventos (por exemplo, proliferação, diferen-
ciação) culmina na secreção da Ig que é anticorpo
(Ac) específica para aquele Ag. Acredita-se que o
repertório de Ac de um microrganismo antes da ex-
posição ao Ag seja devido aos Ac gerados durante a
maturação das células B através de rearranjos gênicos
da Ig. Para entender a natureza de recombinação
gênica da Ig, deve-se conhecer a estrutura da Ig (ver
também Estrutura do Anticorpo, adiante).
As imunoglobulinas são compostas por duas ca-
deias pesadas e duas leves, cada qual com os do-
mínios constante e variável. O Ag se liga ao domí-
nio variável. Em nível genético, a região C é codifi-
cada pelos genes da região C; a região V (para as
cadeias leves), pelos genes da região V e J e (para as
cadeias pesadas) pelos genes da região V, D e J. Es-
tes segmentos gênicos não estão situados em conti-
nuidade sobre o cromossomo; ao invés disso, estão
descontínuos e devem ficar justapostos durante a
maturação da célula B. Assim, para sintetizar uma
cadeia pesada, um dos vários segmentos D (pelo me-
nos 12 estão identificados) se liga a um dos 6 segmen-
tos J. Esse agrupamento, então, se une a uma das vá-
rias centenas (possivelmente milhares) de segmentos
do gene da região V, para produzir uma unidade
transcricional completa para uma cadeia pesada de Ig.
Dependendo do segmento em particular de cada
região gênica usado, é possível um vasto número
de moléculas de Ig com especifidades variadas. O
potencial para a diversidade é aumentado ain-
da mais pela adição de nucleotídeos, ao acaso,
nos pontos de junção (entre as regiões V, D e J),
O sistema imune é uma rede de componentes ce-
lulares e solúveis interagindo. Sua função é distin-
guir entidades dentro do corpo como “próprias” e
“não próprias” e eliminar aquelas que não são pró-
prias. Os microrganismos são as principais entida-
des não próprias, porém neoplasias, transplantes e
certas substâncias estranhas (por exemplo, toxinas)
também são importantes. Para realizar estas tarefas,
o sistema imune desenvolveu dois mecanismos:
imunidade inespecífica e imunidade específica, que
estão ligadas entre si e se influenciam.
Imunidade inespecífica (inata)
Este tipo de imunidade é mais antigo filogeneti-
camente, está presente ao nascimento, não neces-
sita de um encontro prévio com a substância
agressora e não desenvolve memória. A imunidade
inata inclui barreiras, tais como a pele e proteção
química, como o ácido gástrico. Há dois compo-
nentes celulares: 1. o sistema fagocitário, cuja fun-
ção é ingerir e digerir os microrganismos invaso-
res; e 2. células exterminadoras naturais
 
 (NK), cuja
função é matar alguns tumores, microrganismos e
células viralmente infectadas (ver adiante). Os com-
ponentes solúveis consistem em proteínas-comple-
mento, reagentes da fase aguda e citocinas.
Os fagócitos incluem neutrófilos e monócitos (no
sangue) e macrófagos (nos tecidos). Amplamente dis-
tribuídos, os macrófagos estão situados estrategica-
mente nas interfaces de tecidos com sangue ou espa-
ços cavitários; por exemplo, os macrófagos alveola-
res (pulmões), células de Kupffer (sinusóides hepáti-
cos), células sinoviais (cavidades articulares), células
microgliais perivasculares (revestimento do SNC, sis-
tema nervoso central) e fagócitos mesangiais (rins).
As citocinas são polipetídeos não imunoglobuli-
nas secretados por monócitos e linfócitos em res-
posta à interação com um antígeno (Ag) específico,
um Ag inespecífico ou um estímulo solúvel inespe-
cífico (por exemplo, endotoxina, outras citocinas).
As citocinas afetam a magnitude da resposta infla-
matória ou imunológica. Apesar da secreção de ci-
tocinas poder ser desencadeada pela interação de
um linfócito com seu Ag específico, as citocinas
não são Ag específicas; sendo assim, elas conectam
as imunidades inata e aprendida.
Imunidade específica (adaptativa)
A imunidade específica possui as característi-
cas de aprendizado, adaptabilidade e memória.Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35988
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 989
pelas mutações somáticas e pelas imprecisões na jun-
ção dos vários segmentos.
As células T não possuem Ig de superfície, mas
reconhecem o Ag através do seu principal instru-
mento de reconhecimento, o receptor de célula T
(RCT) e outras moléculas acessórias de aderência.
Os genes que codificam o RCT pertencem à super-
família dos genes da Ig; da mesma forma que os
genes da Ig, também estão sujeitos a recom-
binações, dando origem, assim, a um grande nú-
mero de clones de célula T, cada um com uma res-
ponsividade Ag específica.
A porção do RCT que se liga ao Ag consiste
em duas cadeias (αβ ou γδ); cada uma possui
um domínio constante e um variável. Diferente
da Ig, que existe independentemente sobre a su-
perfície da célula B, o RCT está associado à
molécula CD3; a unidade inteira é chamada de
complexo RCT/CD3. Embora as cadeias do RCT
estejam sujeitas ao rearranjo gênico e sejam va-
riáveis, as cadeias do CD3 (que consiste em pelo
menos 5 cadeias) são invariáveis e Ag-inespecí-
ficas. Alguns Ac anti-CD3 ativam as células T
diretamente, transpondo, assim, a necessidade de
Ag. Portanto, o CD3 é importante para a
transdução do sinal de ativação através da mem-
brana linfocitária.
Os linfócitos ainda podem ser subdivididos em
subtipos, ou pelas funções ou pelos marcadores de
superfície. Os subtipos de linfócitos foram identi-
ficados através de combinações de certas moléculas
sobre sua superfície. Estes marcadores de superfí-
cie foram chamados de grupos de diferenciaão
(CD). Até o momento, 166 CD foram identifica-
dos. A informação atualizada sobre antígenos de
CD pode ser encontrada na Internet (http://
www.ncbi.nlm.nih.gov/prow).
Complexo de
histocompatilidade principal
A capacidade do sistema imune de diferenciar
o próprio do não próprio é determinada, em gran-
de parte, pelos produtos do complexo de
histocompatilidade principal (MHC), cujos ge-
nes estão no cromossomo 6, pertencem à super-
família gênica da Ig e estão sujeitos à recombi-
nação. A Classe I do MHC consiste em HLA-A,
B e C; seus produtos possuem uma ampla distri-
buição e estão presentes na superfície de todas as
células nucleadas e nas plaquetas. A Classe II do
MHC consiste em HLA-D, -DR, -DP e -DQ; seus
produtos possuem uma distribuição mais limita-
da sobre as células B, macrófagos, células
dendríticas, células de Langerhans e células T
ativadas (mas não em repouso).
As células B podem responder a Ag solúvel, mas
as células T raramente o fazem e reconhecem o Ag
apenas quando encaixado dentro do MHC; portan-
to, as células T reconhecem o complexo Ag-MHC.
O mecanismo pelo qual o Ag é processado e se as-
socia ao MHC antes de ser apresentado às células
T é realizado pelas células apresentadoras de Ag
(CAA) – por exemplo, células de Langerhans,
monócitos, macrófagos, células dendríticas foli-
culares e células B. Embora os detalhes não sejam
totalmente compreendidos, parece que, para ser pro-
cessado, o Ag deve ser desdobrado, degradado e
fragmentado. Por processamento exógeno, o Ag
sofre endocitose e degradação nos lisossomas, é
associado aos produtos da Classe II do MHC e
transportado para a superfície da célula. Por pro-
cessamento endógeno, o Ag é produzido interce-
lularmente (por exemplo, por infecção viral) e so-
fre degradação, fora dos lisossomas, nas organelas
chamadas proteossomas. Os peptídeos resultantes
são transportados através do retículo endoplasmá-
tico rugoso (RER) pelas proteínas transportadoras.
Uma vez no RER, estes peptídeos são associados
aos produtos de Classe I do MHC antes do trans-
porte à superfície celular. É importante saber se o
Ag está associado aos produtos de Classe I ou II do
MHC, pois as moléculas CD4 e CD8 atuam como
moléculas de aderência acessória pela união a Clas-
se II ou I, respectivamente. O aumento de RCT com
o complexo MHC/Ag pode não ser suficiente para
a indução da ativação da célula T. Um sinal de
co-ativação precisa estar presente; este segundo si-
nal é mediado pelo encaixe do CD 28 na superfície
da célula T com CD80 ou CD86 na CAA. A ausên-
cia da interação CD28/CD80-CD86 pode tornar a
célula T anérgica ou tolerante (ver FIG. 146.1).
Citocinas
Apesar do contato celular íntimo ser necessário
para as respostas ótimas da célula T, as células T e
os monócitos secretam citocinas que podem in-
fluenciar os eventos próximos ou distantes. As cito-
cinas interagem com receptores de superfície celu-
lar específicos e podem atuar de maneira autócrina
ou parácrina.
As citocinas podem ser divididas em vários gru-
pos, que incluem interferons (IFN-α, β e γ), fator
de necrose tumoral (FNT-α e β), interleucinas (IL-
1 a IL-8), fatores de transformação de crescimento
e fatores estimulantes de colônias (CSF) hemato-
poiéticas. Quanto a principais citocinas, suas fon-
tes celulares e efeitos principais, ver TABELA 146.1.
Apesar das várias citocinas e seus efeitos serem
usualmente relacionados separadamente, é impor-
tante lembrar que as citocinas atuam em comum
acordo, em seqüência ou em conflito, numa certa
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35989
990 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
resposta imune; por exemplo, a IL-1 pode induzir
a secreção de IL-2. A IL-2, IL-4 e IL-6 podem fa-
zer sinergismo na geração de linfócitos T citotóxi-
cos. A IL-4 e o IFN-γ podem agir contrariamente,
um sobre os efeitos do outro, na indução da ex-
pressão de Classe II sobre as células B e na indu-
ção da secreção de IgE.
A orquestração simultânea de várias respostas
e a redundância do sistema imune talvez sejam
melhor ilustradas pela estrutura de alguns dos
receptores de interleucina. O receptor IL-2 é cons-
tituído de três cadeias: α, β e γ. A expressão de
todas as três cadeias resulta em receptor de IL-2 de
alta afinidade; a expressão de cadeias β e γ resulta
apenas em receptor IL-2 de afinidade intermediá-
ria, enquanto a cadeia α representa apenas um
receptor de baixa afinidade. Foi recentemente
mostrado que as mutações ou extinção do recep-
tor de IL-2 de cadeia γ são a base molecular da
imunodeficiência grave combinada ligada ao cro-
mosssomo X (SCID). De modo interessante, as
mutações nas cadeias α ou β do receptor de IL-2
não resultam em SCID (pelo menos em modelos
animais). Esta discrepância aparente surge porque
a cadeia γ do receptor de IL-2 também é parte do
complexo receptor para IL-4, IL-7, IL-9 e IL-15;
esta cadeia é agora chamada de cadeia γ comum
(γc). O receptor de IL-15 compartilha as cadeias β
e γc com o receptor de IL-2. A cadeia α do recep-
tor de IL-13 é idêntica à cadeia α dos receptores
FIGURA 146.1 – Modelo de dois sinais para ativaão da célula T. Ausência do segundo sinal resulta em
anergia e intolerância. MHC = complexo de histocompatibilidade principal; RCT = receptor de célula T.
Pept’deo
antignico
Primeiro
sinal
CD4/
CD8
Estimulador ou
alvo
Linf—cito T
MHC CD80 ou
CD86
Segundo
sinal
CD28
Complexo
RCT/CD3
TABELA 146.1 – CITOCINAS SELECIONADAS
Massa
Citocina molecular Fonte Efeitos principais
Interleucinas (IL)
IL-1α 15 – 17 Monócitos, Febre (pirogênio endógeno), sono, anorexia, inflamação, expressão
IL-1β macrófagos de célula endotelial de CD54 e liberação de fator tecidual, ati-
vação de linfócito, produção de IL-6 e CSF
IL-2 14 – 15 Células T Induz o crescimento de célula T, co-estimula o crescimento e
diferenciação de célula B, aumenta NK, LAK
IL-3 14 – 28 Células T, Induz o crescimento de mastócito, crescimento celular
mastócitos hematopoiético pluripotente
IL-4 20 Células T, Induz o crescimento de célula T e geração de LTC, co-estimula
mastócitos o crescimento de célula B, sinergiza com IL-3 no crescimento
de mastócito, ↑ produção de IgE e IgG4, induz expressão e
liberação de CD23, ↑ MHC de Classe II nas células B, altera
TH para TH2
Merck_12.p65=02/02/01, 15:35990
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 991
TABELA 146.1 – CONTINUAÇÃO
Massa
Citocina molecular Fonte Efeitos principais
IL-5 45 Células T, Induz a diferenciação de eosinófilos, ↑ produção de IgA,
mastócitos co-estimula o crescimento de célula B em camundongos
IL-6 23 – 30 Monócitos, Pirogênico, induz o crescimento de plasmacitomas e hibridiomas,
fibroblastos, intensifica a produção de Ig, ↑ Classe I nos fibroblastos,
células T sinergiza com IL-2 na produção de proteínas da fase aguda
(camundongo) pelos hepatócitos, sinergiza com IL-3 no crescimento de células
hematopoiéticas, induz diferenciação de LTC
IL-7 25 Células de Induz proliferação de células pró e pré-B e timócitos imaturos
medula óssea
e estroma
de timo
IL-8 6,5 Monócitos, Induz quimiotaxia e ativação de neutrófilos e células T
(quimio- células
cina) endoteliais,
macrófagos
alveolares,
fibroblastos
IL-9 30 – 40 Células T Induz proliferação de algumas células T, intensifica o crescimento
de mastócitos induzido por IL-3
IL-10 17 – 21 Células T, ↓ Classe II do MHC, inibe ativação de CAM, ↓ apresentação
células B de antígeno, estimula a proliferação de célula B e produção
ativadas, de Ac, estimula mastócitos, altera TH para TH2
monócitos
IL-11 24 Células do Estimula produção de Ac, sinergiza com IL-3 na proliferação
microambiente de megacariócito, estimula progenitores de macrófago
hematopoiético
IL-12 75 Monócitos, ma- Ativa NK para secretar IFN-γ, altera TH para TH1, inibe
crófagos, algu- secreção de IgE induzida por IL-4
mas células B,
alguns mastócitos
IL-13 10 Células B, Induz secreção de IgE
macrófagos
IL-14 ? Células T Induz fator de crescimento das células B
IL-15 14 – 15 Células não lin- Induz crescimento e citotoxicidade das células NK,
fóides, músculos diferenciação das células NK
IL-16 56 Células T (pré- Quimiotaxia de CD4, indução de CD25, ↑ Classe II do MHC,
formadas em repressão de transcrição do HIV
CD8)
IL-17 20 – 30 Células CD4 de Co-estimula proliferação de célula T, induz IL-6, IL-8 e secreção
memória de G-CSF a partir de células epiteliais, endoteliais e fibroblásticas
IL-18 ? ? Induz fator de indução de IFN-γ, similar a IL-1
(nome
não
oficial)
Continua
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35991
992 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
TABELA 146.1 – CITOCINAS SELECIONADAS
Massa
Citocina molecular Fonte Efeitos principais
Interferons (IFN)
IFN-α 18 – 20 Leucócitos Inibe replicação viral e crescimento de tumor, ↑ expressão de
MHC de Classe I e Classe II, ↑ atividade de NK, modula res-
posta de Ac
IFN-β 20 Fibroblastos Mesmas atividades que IFN-α
IFN-γ 20 – 25 Células T, NK ↑ Classe I e II de MHC, ativação de macrófago, ↑ atividade de
NK, ↓ secreção de CD23 e IgE induzida por IL-4, co-estimula
crescimento e diferenciação de células B
Fator de
necrose tumoral (FNT)
FNT-α 17 Monócitos, Induz IL-1, ↑ moléculas de adesão e Classe I de MHC nas
(caquec- macrófagos células endoteliais, pirogênio, induz GM-CSF, efeito
tina) citotóxico/citostático, induz secreção de IFN-γ
FNT-β 25 Células T Fator citotóxico
(linfo-
toxina)
Fatores estimulantes
de colônias (CSF)
GM-CSF 14 – 35 Células T, ma- Induz crescimento de progenitores de granulócitos e monócitos,
crófagos, mo- ativa macrófagos, ↑ produção de leucotrienos eosinofílicos,
nócitos, células ↑ atividade tumoricida de monócitos
endoteliais
G-CSF 18 – 22 Monócitos, fibro- Induz crescimento granulocítico
blastos, células
endoteliais
M-CSF 70 – 90 Monócitos, fibro- Induz crescimento de monócitos
blastos, células
endoteliais
Fatores de transformaão
de crescimento (TGF)
TGF-α 5 – 20 Tumores sólidos Induz angiogênese, proliferação de ceratinócitos, reabsorção
(carcicomas > do osso, crescimento do tumor
sarcomas),
monócitos
FNT-β 25 Plaquetas, placenta, Induz proliferação de fibroblastos; síntese de colágeno e fibronectina;
rim, osso, células inibe LTC, NK, LAK; inibe proliferação de células T e B;
T e B intensifica cicatrização de feridas e angiogênese
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35992
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 993
TABELA 146.1 – CONTINUAÇÃO
Massa
Citocina molecular Fonte Efeitos principais
Quimiocinas
C 15 CD8 ativado, Induz quimiotaxia de células T e células NK
(ausência NK?, mastócitos
do primei-
ro e terceiro
resíduos
de cisteína
conserva-
dos). Exem-
plo: linfotac-
tina (LPTN)
C-C Variável Variável Induz quimiotaxia de células T, células NK, basófilos e eosinófilos
Vários
exemplos:
MIP-1 α
RANTES,
MIP-1β,
Eotaxinas,
MCP-1,
MCP-3
C-X-C Variável Variável Induz quimiotaxia de células T, mastócitos, monócitos e eosinófilos
Vários
exemplos;
IL-8, IP-10,
SDF-1
C-X3-C Variável Variável Não bem caracterizados ainda
Fractal-
cinas
recente-
mente
descritas
↑ = aumenta; ↓ = diminui; Ac = anticorpo; CSF = fator estimulante de colônias; LTC = linfócito T citotóxico;
G = granulócito; GM = granulócito-macrófago; LAK = exterminadora ativada por linfocina; CAM = complexo de
ataque de membrana; MHC = complexo de histocompatilidade principal; NK = “natural killer” – exterminadoras
naturais; TH = T auxiliar.
de IL-4. Os receptores de IL-3, IL-5 e GM-CSF
possuem uma cadeia β idêntica.
Uma nova família de citocinas é a convenien-
temente chamada de quimiocinas; as quimio-
cinas induzem a quimiotaxia e a migração de
subtipos de leucócitos. Há quatro subtipos de qui-
miocinas, que são definidos pelo número de ami-
noácidos intermediários entre os dois primeiros
resíduos de cisteína na molécula. Alguns dos re-
ceptores nas quimiocinas podem servir como co-
receptores para entrada de HIV nos monócitos/
macrófagos.
CÉLULAS T E
IMUNIDADE CELULAR
As células T maduras adquirem repertórios fun-
cionais e aprendem o conceito de “próprio” no timo.
O timo realiza tarefas duais de seleão positiva
(clones que reconhecem o Ag/MHC podem proli-
ferar, maturar e emigrar para a periferia) e seleão
negativa (clones que reagem como se fossem es-
tranhos são eliminados). Os mecanismos celular e
molecular exatos desta seleção não estão comple-
tamente elucidados.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35993
994 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
A célula tronco T, derivada da medula óssea, mi-
gra para o timo, durante o desenvolvimento fetal,
onde matura e aprende o conceito de “próprio”.
O processo da seleção tímica ocorre e os linfócitos
maduros podem deixar o timo; eles são encontra-
dos no sangue periférico e nos tecidos linfóides.
Todas as células T maduras expressam CD4 ou CD8
em um estilo mutuamente exclusivo.
Células T-“helper”
As células T que expressam CD4 são geralmen-
te chamadas de linfócitos T-“helper” (TH), ou seja,
linfócitos T-auxiliares. Estas células podem ser di-
vididas em duas categorias principais, dependendo
de suas funções, respostas às várias citocinas e ca-
pacidade de secretar citocinas. O pensamento atual
é que as células TH começam como células precur-
soras que fabricam IL-2. Na estimulação inicial,
estas células se desenvolvem em células THO, que
podem secretar várias citocinas, inclusive IFN-γ,
IL-2, IL-4, IL-5 e IL-10. Dependendo da citocina
disponível, as células THO podem se desenvolver
em células TH1 ou TH2, com IFN-γ, favorecendo o
desenvolvimento de TH1 e IL-4 e IL-10 favorecen-
do o desenvolvimento de TH2. TH1 e TH2 diferem
no perfil das citocinas que secretam: as células TH1
secretam IFN-γ, enquanto as células TH2 secretam
IL-4, apesar de ambas secretarem várias outras
citocinas (por exemplo, IL-3, GM-CSF, FNT-α)
igualmente bem. Em geral, TH1 favorece a promo-
ção da imunidade celular, enquanto a TH2 favorece
a promoção da imunidade humoral.
O delineamento das respostas de TH1 e TH2 mu-
dou o pensamento sobre a relação do sistema imune
com a doença. Uma resposta imune deve ser não ape-
nas vigorosa, como também apropriadaà infecção ou
doença. Talvez o melhor exemplo desta estratégia seja
a lepra, na qual se acredita, hoje, que a resposta da
TH1 resulta em lepra tuberculosa, enquanto a respos-
ta da TH2 resulta em lepra lepromatosa. Além disso,
uma resposta de TH1 pode agravar a doença auto-imu-
ne, enquanto a resposta da TH2 favorece a secreção
de IgE e o desenvolvimento de atopia.
Células T supressoras/citotóxicas
As células T que expressam CD8 são menos
bem caracterizadas do que os subtipos TH, ape-
sar de parecer que elas também podem ser divi-
didas em dois tipos, dependendo das citocinas
que secretam, com a segregação sendo idêntica
aos subtipos CD4. Foi sugerido que os tipos de
linfócitos fossem chamados Tipo 1 e Tipo 2
(T1,T2) ao invés de TH1 e TH2, porque a mesma
subdivisão pode ser vista nas células CD8.
As células T citotóxicas (TC) se referem aos linfó-
citos T citotóxicos (LTC – ver adiante) restritos ao
MHC específico de Ag. As células CD4 e CD8 po-
dem funcionar como LTC, dependendo de reconhe-
cerem o MHC de Classe I ou Classe II, respectiva-
mente. Vários tipos de células citotóxicas ou exter-
minadoras são também reconhecidos; apenas algu-
mas delas expressam marcadores CD8 ou CD4.
Células exterminadoras
A identificação de cada tipo (dos vários) depen-
de da restrição do MHC, demandas para sensibili-
zação, especificidades-alvo e resposta às citocinas.
Embora os macrófagos possam ser citotóxicos, tal
toxicidade é inespecífica e resulta da ativação por
algumas citocinas. Os vários tipos de células ex-
terminadoras podem ser simplificados em restritas
ao MHC (por exemplo, LTC) e irrestritas ao MHC
(por exemplo, células NK). Nenhum tipo requer Ac,
complemento ou fagocitose para matar a célula-
alvo; ao invés disso, liberam o sinal lítico através
da membrana da célula-alvo após estabelecer ínti-
mo contato célula a célula.
Exterminadoras restritas ao MHC – Os lin-
fócitos T citotóxicos (LTC) são células extermina-
doras geradas sob sensibilização específica ou con-
tra células que expressam produtos estranhos do
MHC (alogênicas) ou contra células autólogas –
contanto que estas células tenham sido modifica-
das por infecção viral ou um hapteno químico
(singênicos). A vida de um LTC tem 3 fases: uma
célula precursora pode tornar-se citotóxica sob es-
timulação apropriada; uma célula efetora diferen-
ciou, podendo fazer a lise de seu alvo apropriado;
e uma célula de memória, quiescente e não mais
estimulada, está pronta para tornar-se uma efetora,
sob reestimulação com as células originais. As cé-
lulas intactas são os estimuladores mais potentes
na geração de LTC; o Ag solúvel é ineficiente, ex-
ceto sob certas condições. Conforme mencionado
anteriormente, o Ag é processado e um fragmento
é capturado no sulco que apresenta o Ag do MHC.
É possível, agora, identificar os peptídeos que pos-
suem encaixe perfeito para vários haplótipos do
MHC. Se tais peptídeos forem usados para estimu-
lação, eles podem se encaixar no MHC e, desta
maneira, estimular uma resposta da célula T.
Os LTC alogênicos podem ser gerados pronta-
mente in vitro, em cultura de linfócitos normais com
células estimuladoras alogênicas irradiadas que
diferem, em parte ou totalmente, da barreira do
MHC. Os LTC alogênicos podem ser gerados in
vivo no transplante de um órgão de doador, cujos
produtos do MHC sejam diferentes daqueles do
receptor e, provavelmente, desempenhem um pa-
pel importante na rejeição do transplante de ór-
gãos. A geração bem-sucedida de LTC requer
dois sinais: o sinal antigênico (células estimu-
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35994
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 995
ladoras) e o sinal de amplificação (citocinas). A
ação eficiente desses dois sinais requer células apre-
sentadoras de Ag (CAA), TH e precursores de TC.
O sinal de amplificação é mediado por citocinas
que atuam em seqüência; as mais importantes são
IL-1, IL-2 e IL-4. Acredita-se que outras citocinas
(inclusive IL-6, IL-7, IL-10 e IL-12) estejam en-
volvidas na geração de LTC, pelo menos in vitro.
Outro tipo de LTC importante na eliminação de
certos patógenos intracelulares (especialmente cé-
lulas infectadas por vírus) é o chamado LTC Ag-
específico (LTC singênico). O LTC singênico re-
conhece apenas células-alvo que expressam o Ag
usado para sensibilização em associação com MHC.
Tais LTC são gerados contra células autólogas, uma
vez que as células não tenham sido “modificadas”
pela infecção viral ou haptenos químicos. A expres-
são dos produtos virais, ou haptenos, na superfície
celular em associação com MHC desencadeia uma
cascata de diferenciação celular e liberação de
citocina e resposta similar ao LTC alogênico. Am-
bos, LTC alogênico e singênico, usam o complexo
RCT/CD3 para reconhecimento de célula-alvo.
Exterminadoras irrestritas ao MHC – As cé-
lulas exterminadoras – “natural killer” (NK),
diferentemente dos LTC, não necessitam de sensi-
bilização para expressar a função exterminadora. As
células NK constituem 5 a 30% dos linfócitos nor-
mais do sangue periférico. As células NK são linfó-
citos, mas não pertencem às linhagens de células T
ou B. Portanto, as células NK não expressam Ig ou
RCT/CD3 na sua superfície. Os marcadores de su-
perfície que melhor caracterizam as células NK são
CD2+, CD3–, CD4– e CD56+, com um subtipo sen-
do CD8+. As células NK matarão certas células
autólogas, alogênicas e até tumorais xenogênicas
independentemente de seus alvos expressarem ou
não MHC; na realidade, elas podem, de preferência,
matar células-alvo que expressam pouco ou nenhum
MHC de Classe I. A suscetibilidade à morte pelas
células NK pode ser reduzida se a célula-alvo for
induzida a aumentar sua expressão do MHC (por
exemplo, por transfecção ou por IFN).
Esta aparente inibição da atividade de matar da
NK pela expressão do MHC de Classe I levou à
identificação de vários receptores de MHC de Clas-
se I na superfície das células NK. Estes receptores
são estruturalmente diferentes do RCT e, em geral,
chamados de receptores inibidores de células ex-
terminadoras (RIE). Enquanto o encaixe do MHC
pelo RCT nas células T leva à ativação da célula T,
o encaixe do MHC pela maioria dos RIE leva à
inibição da atividade da NK, apesar de alguns RIE
poderem levar à ativação. RIE também foram
identificados nas células T. Isto apresenta um
enigma interessante: as células T possuem recep-
tores diferentes (RCT/CD3 e RIE) para a mesma
molécula (MHC de Classe I), porém com efeitos
opostos. Não se sabe bem, o que decide se uma
célula T será ativada ou inibida e o resultado pode
variar dependendo do clone de célula T.
Acreditou-se, por muito tempo, que as células
NK eram importantes na monitoração do tumor,
porque elas podem matar algumas células-alvo tu-
morais e porque a maioria dos tumores não possui
a expressão do MHC. As células NK também ma-
tam algumas células infectadas por vírus e algu-
mas bactérias (por exemplo, Salmonella typhi). A
estrutura de reconhecimento de Ag das células NK
permanece evasiva.
Além de sua propriedade de matar, as células
NK podem secretar várias citocinas, IFN-γ e
GM-CSF (fator estimulante de colônias de granu-
lócitos e macrófagos) em particular. As células NK
podem ser a fonte mais potente de IFN-γ. Por se-
cretar IFN-γ, as células NK podem influenciar o
sistema imune adaptativo, por favorecer a diferen-
ciação de TH1 e inibir a diferenciação de TH2.
Citotoxicidade mediada por célula
dependente de anticorpo
As células NK expressam CD16, um receptor
para IgG-Fc (ver Estrutura de Anticorpos, adiante)
e pode usar este receptor para mediar um outro tipo
de exterminadora não restrita ao MHC. A cito-
toxicidade mediada por célula dependente de Ac
(CCDA) depende da presença de Ac para reconhe-
cer uma célula-alvo (portanto, a especificidade da
CCDA é conferida pela especificidade do Ag). Após
ligar seu Ag, a região Fc do anticorpo fica expostae ligará seu receptor sobre a célula NK, para for-
mar uma ponte. Uma vez formada a ponte, um si-
nal lítico pouco compreendido é liberado para a
célula-alvo, resultando em morte.
Uma forma interessante de CCDA é chamada
de CCDA inversa. Certas células exterminadoras,
inclusive os LTC restritos ao MHC, que expres-
sam o CD3 em suas superfícies, podem perder a
especificidade na presença de anticorpos anti-CD3.
O anti-CD3 une-se ao seu ligante na superficie da
célula exterminadora, deixando sua porção Fc li-
vre para ligar-se às células-alvo que expressam re-
ceptores Fc. Novamente, uma vez formada a pon-
te, o sinal lítico é liberado para a célula-alvo que
carrega Fc. Provou-se que algumas formas de
CCDA são úteis para ter como alvo as células tu-
morais in vivo, como uma forma de imunoterapia.
Exterminadoras T irrestritas ao MHC
Além das células NK que são CD3– RCT– CD56+,
outro subtipo é CD3+ CD56+ e pode expressar CD2,
CD5, CD8. A maioria são RCT-γδ, apesar de al-
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996 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
guns clones RCT-αβ terem sido identificados. Este
subtipo pode mediar alguma atividade espontânea
similar à da NK e pode aumentar tal atividade após
estimulação com IL-2. Um outro subtipo de célu-
las T (CD3+ RCT-γδ CD4– CD8– CD56– CD16–)
pode ser citotóxico, apesar da maioria ser clones
ou linhagens de células. Deve-se verificar se os lin-
fócitos recém-isolados deste fenótipo são ou não
espontaneamente citotóxicos.
Exterminadoras ativadas
por linfocinas
Alguns linfócitos em cultura com IL-2 se transfor-
mam em potentes exterminadoras ativadas por linfo-
cinas (LAK), capazes de matar um amplo espectro
de células-alvo tumorais, assim como linfócitos autó-
logos que foram modificados pela cultura, alguns ví-
rus ou haptenos. As LAK são vistas como um fenô-
meno ao invés de um único subtipo de linfócitos. Os
precursores de LAK são heterogêneos mas podem
ser divididos em duas categorias maiores: Tipo NK e
Tipo T. Em geral, concorda-se que as células NK clás-
sicas constituem os principais precursores de LAK
no sangue periférico, mas isto pode não ser verdadei-
ro nos tecidos extravasculares.
Teste de imunidade celular
A avaliação quantitativa mínima da imunidade
celular deve incluir contagem de linfócitos, núme-
ro de subtipos de células T (CD3, CD4, CD8) e
número de células NK pela análise de fluorescên-
cia. A avaliação qualitativa inclui testes cutâneos
de hipersensibilidade do tipo tardia (HTT) e os se-
guintes testes in vitro: 1. proliferação em resposta
ao Ag solúvel, ao Ac anti-CD3 e ao alo-Ag; 2. a
atividade lítica das células NK, tanto espontanea-
mente como após a estimulação com IL-2 ou IFN;
3. capacidade de elaborar citocinas com ênfase em
IFN-γ, FNT-α, IL-2 e IL-4; e 4. capacidade de ge-
rar LTC restritos ao MHC. Uma análise posterior
dependerá dos resultados destes testes. O teste com-
pleto da imunidade celular está limitado aos labo-
ratórios de pesquisa.
Testes cutâneos de HTT estabelecem a norma-
lidade de alguns aspectos do sistema de imunidade
celular. Entretanto, eles não testam o estado de cé-
lulas CD8, células CD4 virgens, células NK e CAA
além das células de Langerhans. Por exemplo, um
paciente pode ter ausência completa de células NK
e ainda ter HTT normal. Assim sendo, enquanto
um teste cutâneo de HTT negativo indica imunida-
de celular anormal, o contrário não é verdadeiro
(ver REDES IMUNOLÓGICAS, adiante).
Os testes cutâneos de HTT devem ser lidos
em 48h. Uma resposta precoce pode ser devido
à reaão de Arthus (que começa 4 a 6h após o
teste e pode permanecer até 24h). Tal reação ocor-
re devido à presença de Ac que se liga ao Ag inje-
tado, resultando em formação do complexo imune,
ativação do complemento e quimiotaxia de neutró-
filos. O infiltrado celular na reação de Arthus con-
siste principalmente de neutrófilos, enquanto o in-
filtrado na HTT é composto de células mononu-
cleares. A resposta de HTT começa a se resolver
após 48h e se alguém ler o teste cutâneo às 72h,
uma reação positiva limítrofe (> 5mm de insensi-
bilidade) pode parecer negativa.
REDES IMUNOLÓGICAS
O sistema imune opera como um todo e nenhum
componente opera com autonomia. Em qualquer
resposta imune, os componentes trabalham em co-
mum acordo, em seqüência ou em conflito, como
exemplificado pela capacidade do sistema imune
de eliminar microrganismos. Os microrganismos
extracelulares (na maioria, bactérias encapsuladas)
necessitam apenas ser fagocitados para ser digeri-
dos; entretanto, os microrganismos intracelulares
(por exemplo, micobactérias) são prontamente in-
geridos, mas não podem ser digeridos, a menos que
o macrófago receba um sinal de ativação.
A estratégia para eliminar os microrganismos
extracelulares é, portanto, direcionada à fagocito-
se, que é facilitada pela opsonizaão (revestimen-
to de um microrganismo com Ac e/ou produtos de
complemento). Como a maioria dos fagócitos pos-
sui receptores para a porção Fc do Ac e para pro-
dutos de C3, a presença dessas moléculas numa
bactéria facilita sua aderência e ingestão. Esta res-
posta imune “simples” depende da síntese bem-
sucedida de Ac, da ativação da cascata do comple-
mento e de um sistema fagocitário intacto. Os Ac
são produzidos pelas células B, ainda que as célu-
las B estejam sujeitas a auxílio e supressão pelas
células T. Além disso, as células fagocitárias são
recrutadas pelos fatores quimiotáticos, alguns dos
quais são produzidos pelas células T.
A estratégia para eliminar alguns microrganis-
mos intracelulares que infectam fagócitos envolve
a ativação de células hospedeiras, que se tornam
“armadas” e capazes de matar estes microrganis-
mos de maneira inespecífica. A capacidade de ati-
var macrófagos está no centro da típica reação de
hipersensibilidade do tipo tardia (HTT) e o teste
cutâneo é um exemplo excelente das várias casca-
tas envolvidas numa dada resposta imune. A pre-
missa de um teste cutâneo de HTT é que a injeção
intradérmica de um Ag, ao qual o paciente foi ex-
posto previamente, leva à insensibilidade local em
48h. A intrincada rede envolvida em tal resposta
está ilustrada na FIGURA 146.2. Após a injeção, as
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35996
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 997
células de Langerhans, na pele, captam o Ag, pro-
cessam e apresentam-no (formam um complexo
com MHC de Classe II) a uma célula CD4+ que foi
exposta previamente ao Ag (isto é, uma célula de
memória de vida longa). Assim que a célula CD4+
prende o complexo Ag-MHC, ela expressa recep-
tores de IL-2 e libera várias citocinas (por exem-
plo, IFN-γ, IL-2 e fatores quimiotáticos de linfóci-
to e macrófago). O IFN-γ induz as células endote-
liais a aumentarem sua expressão de moléculas de
adesão, facilitando, assim, o ingresso de linfócitos
e macrófagos através da barreira endotelial. A IL-2
e o IFN-γ também atuam como sinais de prolifera-
ção/diferenciação, permitindo a expansão dos
clones de memória de células T e das células T re-
cém-chegadas. Quando os macrófagos chegam ao
local da injeção, são impedidos de sair pelos fato-
res inibidores da migração (MIF), secretados pelas
células T ativadas. O IFN-γ e GM-CSF, ambos se-
cretados pelas células T, atuam como fatores
ativadores de macrófago (MAF). Os macrófagos
ativados agora estão “armados” e podem matar mi-
crorganismos intracelulares e quaisquer células tu-
morais circunvizinhas.
Os macrófagos ativados secretam IL-1 e FNT-α,
que potencializam a secreção de IFN-γ e GM-CSF,
aumentam a expressão de moléculas de aderência
sobre as células endoteliais e permitem que estas cé-
lulas secretem o fator tecidual, que desencadeia a
cascata da coagulação, terminando na deposição de
fibrina. Concomitantemente, os linfócitos ativados
secretam fator indutor pró-coagulante de macrófa-
go (MPIF), que permite a expressão da atividadepró-coagulante de macrófago (MPCA) sobre os ma-
crófagos ativados; a MPCA também ativa a casca-
ta da coagulação resultando em deposição de fibri-
na. A deposição de fibrina é responsável pela in-
sensibilidade vista nos testes cutâneos de HTT.
A via da HTT é importante para eliminar mi-
crorganismos que infectam células fagocitárias. Al-
guns microrganismos (por exemplo, vírus) podem
infectar células que não possuem o mecanismo
lítico e, portanto, não podem ser ativadas para me-
diar a morte intracelular. Tais patógenos são elimi-
FIGURA 146.2 – Resposta à injeão intradérmica de antígeno. Ag = antígeno; CD = grupos de diferen-
ciação; GM-CSF = fator estimulante de colônia de granulócitos e macrófagos; IFN = interferon;
IL = interleucina; MAF = fator ativador de macrófago; MIF = fator inibidor da migração; MPCA = ativi-
dade pró-coagulante de macrófago; MPIF = fator indutor pró-coagulante de macrófago; Mø = macrófa-
go; T = linfócito T; RCT = receptor de célula T; FNT = fator de necrose tumoral.
Mem—ria
de CD4
CŽlulas
endoteliais
Ant’genos de ativa‹o
T M¿
MolŽculas de ades‹o
Ant’genos de ativa‹o
IFN-γ Fatores
quimiot‡ticos IL-1, FNT
Morte
intracelular
Lise
tumoral
Granuloma
M¿ ativado
MIF
MAF
(GM-CSF
IFN-γ)
IL-2
CD4
Ag-Classe II
RCT/
CD3 Diferencia‹o
de prolifera‹o
MPIF IL-1
TNF
Fator
tecidualCŽlulas endoteliais
Deposi‹o de
fibrina
Cascata da
coagula‹o
Ag
Processa-
mento de Ag
MPCA
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35997
998 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
nados por LTC. Após a infecção por vírus, as célu-
las expressarão o Ag viral sobre sua superfície em
associação com o MHC. Este complexo vírus-MHC
estimulará a geração de LTC singênicos que mata-
rão as células que o expressam. Dependendo do
produto viral estar associado ao MHC de Classe I
ou II, o LTC pertencerá aos subtipos CD8 e CD4,
respectivamente. Como discutido anteriormente, a
associação com cada uma das classes do MHC de-
pende da via processadora de Ag; por exemplo, a
maioria dos LTC gerados contra o vírus do saram-
po e do herpes simples pertence ao subtipo CD4.
Na infecção pelo vírus da influenza, os LTC diri-
gidos contra o Ag nucleoproteico são CD8, en-
quanto aqueles dirigidos contra o Ag hemaglutinina
são CD4.
CÉLULAS B E
IMUNIDADE HUMORAL
As células B constituem 5 a 15% dos linfócitos
e são morfologicamente indistinguíveis das célu-
las T. Entretanto, as células B podem ser fenotipi-
camente distinguidas pela Ig de superfície (IgM
de superfície nas células B imaturas; IgM de su-
perfície e IgD de superfície nas células B madu-
ras inalteradas); IgG de superfície, IgA de super-
fície ou IgE de superfície nas células B alteradas)
e por CD19, CD20, CD21 (CR2), CD49c, CD72
e CD80. As células B podem também expressar
MHC de Classe II e uma variedade de outros CD
não específicos às células B. Nos linfonodos, as
células B são encontradas na área cortical subcap-
sular externa, nos folículos primário e secundário
e cordões medulares; no baço, elas compreendem
a zona marginal e folículos.
As células B parecem se desenvolver numa
série de etapas programadas. Estas etapas ini-
ciam-se na medula óssea com a célula-tronco
comprometida, continuam pelos estágios iniciais
e finais da célula pró-B (com rearranjo de cadeia
gênica pesada D-J) e o estágio da célula pré-B
(com rearranjo de cadeia gênica pesada V-DJ bem-
sucedido e aparência de cadeias µ de superfície
celular e citoplasmáticas) e, finalmente, resul-
tam na célula B imatura (com rearranjo de ca-
deia leve V-J e aparência de IgM de superfície
celular). Não se sabe se o Ag desempenha um
papel no decorrer desta seqüência, mas a intera-
ção de células B imaturas com o Ag leva à ina-
tivação clonal ou tolerância. As células B imatu-
ras que não são inativadas podem continuar a se
desenvolver em células B maduras inalteradas e
deixam a medula para entrar nos órgãos linfói-
des periféricos. Ali, a interação entre IgG de su-
perfície e Ag estranhos as converte em linfoblas-
tos. Finalmente diferenciadas, estas células B se
tornam células plasmáticas, que secretam Ig de
uma única classe.
As células B nos tecidos periféricos estão
pré-comprometidas em responder a um número li-
mitado de Ag. A primeira interação Ag-célula B é
conhecida como a resposta imune primária, e
as células B comprometidas que respondem a este
Ag são submetidas à diferenciação e proliferação
clonal. Algumas se tornam células de memória;
outras se diferenciam em células plasmáticas ma-
duras que sintetizam Ac. As principais caracterís-
ticas da resposta imune primária são um período
latente antes do aparecimento de Ac, a produção
de apenas uma pequena quantidade de Ac, ini-
cialmente IgM e, então, uma alteração do isótipo
de Ig (com auxílio da célula T) para IgG, IgA ou
IgE. Isto leva à criação de muitas células de me-
mória capazes de resposta futura ao mesmo Ag.
A resposta imune secundária (anamnéstica ou
“booster” – de reforo) ocorre durante encontros
subseqüentes com o mesmo Ag. As principais ca-
racterísticas incluem a rápida proliferação de célu-
las B, diferenciação rápida em plasmócitos madu-
ros e a produção imediata de grandes quantidades
de Ac, principalmente IgG, que são liberados para
o sangue e outros tecidos do organismo, onde po-
dem encontrar e reagir efetivamente com o Ac.
IgM, IgG e IgA podem ser geradas contra o
mesmo Ag. Assim sendo, as células B derivadas de
uma única célula B madura inalterada podem se
diferenciar numa família de células B geneticamen-
te programada para sintetizar Ac de uma única
especifidade antigênica, com clones representati-
vos comprometidos com a produção de cada clas-
se de Ig (por exemplo, IgM, IgG, IgA).
As células B podem responder ao Ag de ma-
neira T-dependente ou T-independente. Os Ag T-
independentes (por exemplo, polissacarídeos
pneumocócicos, lipopolissacarídeos da Escherichia
coli e polivinil pirrolidina) possuem alto peso mo-
lecular com determinantes antigênicos linearmente
arranjados repetidos e são altamente resistentes à
degradação por enzimas corpóreas. Os Ag T-in-
dependentes evocam primariamente uma respos-
ta de IgM.
Os Ag mais naturais são T-dependentes e neces-
sitam de processamento de Ag por células que apre-
sentam Ag (CAA). Estas CAA apresentam os Ag a
ambas as células, T e B. As células T liberam
citocinas que fazem com que a célula B responda
ao Ag fabricante de Ac. Durante a estimulação an-
tigênica das células B, ocorre uma mudança na pro-
dução de IgM para IgG. Esta mudança é depen-
dente da célula T “helper” (TH) e pode necessitar
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:35998
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 999
s
s
s
F(abÕ)2 Fab
Fc
VH
CH1
CH2
CH3
VL
CL
Regi›es
hipervari‡veis
Regi‹o da dobradia
Regi‹o de ativa‹o
do complemento
Regi‹o de liga‹o do Fc
de diferentes subtipos de células TH e citocinas es-
pecíficas. Por exemplo, IL-4 ou IL-13 são neces-
sárias para alternar de IgM para IgE.
Antígenos e anticorpos
Estrutura do Ag e antigenicidade – Um Ag é
uma substância que pode evocar respostas imunes
específicas. Uma vez formados, os Ac podem se
combinar com Ag específicos, muito semelhante a
peças de um quebra-cabeças. Os Ac reconhecem os
locais de combinação dos Ag, que são configura-
ções específicas (epítopos ou determinantes antigê-
nicos) presentes nas superfícies de grandes molé-
culas de alto peso molecular (por exemplo, proteí-
nas, polissacarídeos e ácidos nucleicos). A presença
de um tal epítopo torna uma molécula um Ag.
Os locais de combinação de Ac e Ag adaptam-se fir-
memente com uma grande força de atração, porque
as áreas de ligação presentes na superfície de cada
molécula são relativamente extensas. A mesma mo-
lécula de Ac também pode realizar reação cruzada
com Ag relacionados, se seus determinantesde su-
perfície forem suficientemente semelhantes aos de-
terminantes presentes no Ag original.
As substâncias são imunogênicas (antigênicas) se
o sistema imune for capaz de reconhecer os determi-
nantes antigênicos como “estranhos” (não próprios)
e o peso molecular da substância for suficientemente
grande. Um hapteno é uma substância de peso mole-
cular mais baixo que um Ag, que pode reagir especi-
ficamente com o Ac, mas incapaz de induzir à forma-
ção de Ac, a menos que se ligue a uma outra molé-
cula, geralmente uma proteína (proteína carreadora);
por exemplo, a penicilina é um hapteno que pode se
ligar sozinho à albumina.
Estrutura dos anticorpos (ver FIG. 146.3) –
As moléculas de Ac são Ig que possuem uma se-
qüência particular de aminoácidos e estrutura terciá-
ria para se ligar a uma estrutura complementar no
Ag. Apesar de todas as Ig serem provavelmente Ac,
não é sempre possível conhecer o Ag ao qual cada
Ig é direcionada. A reação Ag-Ac pode desempe-
nhar um papel específico na proteção do hospedei-
ro contra vírus, bactérias e outros patógenos. As Ig
são responsáveis pela maior parte da fração de γ-
globulina das proteínas plasmáticas.
As Ig são notavelmente heterogêneas e coleti-
vamente podem se combinar com um número qua-
se ilimitado de Ag, ainda compartilhar algumas pro-
priedades comuns. Dentro de cada classe, a Ig
monomérica possui uma estrutura similar. Cada
molécula é composta de quatro cadeias de poli-
peptídeos – duas cadeias pesadas idênticas e
duas cadeias leves idênticas. As cadeias pesadas
possuem, cada uma, pesos moleculares de cerca
de 50.000 a 70.000 dáltons e as cadeias leves
possuem cada uma pesos moleculares de cerca de
23.000 dáltons. As ligações de dissulfeto ligam as
cadeias e forçam a molécula para a configuração Y
comumente reconhecida.
A molécula de Ig em forma de Y é dividida em
regiões variável (V) e constante (C). A região V
está localizada nas extremidades distais dos bra-
ços do Y e é assim chamada devido à alta diversi-
dade de aminoácidos encontrados ali que, por sua
vez, determinam a capacidade da Ig de se combi-
nar com Ag. A região C, proximal ao sítio de com-
binação de Ag, contém uma seqüência relativamen-
te constante de aminoácidos, que é diferente para
cada classe de Ig (ver também Imunidade Especí-
fica [Aprendida], anteriormente).
As regiões hipervariáveis dentro da região V
contêm os determinantes idiotípicos, aos quais Ac
naturais (chamados Ac antiidiotípicos) podem se
ligar. A ligação do anticorpo antiidiotípico com seu
determinante idiotípico é importante na regulação
das respostas da célula B. Em contraste, os deter-
minantes alotípicos na região C dão origem ao Ac
FIGURA 146.3 – Molécula de imunoglobina mostrando as cadeias pesadas e leves. CH = região cons-
tante da cadeia pesada; CL = região constante da cadeia leve; Fab = fragmento ligante do antígeno;
Fc = fragmento cristalizável; VH = região variável da cadeia pesada; VL = região variável da cadeia leve.
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1000 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
antialotípico, que é classe-específico. Sendo assim,
cada clone de células B produz sua própria Ig espe-
cífica, apresentando uma seqüência específica de
aminoácidos que combina com uma configuração
de Ag em particular. Entretanto, membros deste clo-
ne podem mudar a classe da molécula de Ig, mas
ainda irão conservar a cadeia leve e as regiões V.
As moléculas de Ac foram fragmentadas usan-
do-se enzimas proteolíticas para estudar a relação
de estrutura e função (ver FIG. 146.3). A papaína
cliva a Ig em dois fragmentos univalentes, Fab
(ligante ao Ag) e um fragmento único, Fc (cristali-
zável). O Fab consiste em uma cadeia leve e um
fragmento de cadeia pesada, contendo as regiões
V das moléculas de Ig (os sítios de combinação).
O Fc contém a maior parte da região C; este frag-
mento é responsável pela ativação do complemen-
to e se une aos receptores de Fc nos fagócitos. A
pepsina produz um fragmento designado F(ab’)2
que consiste em 2 Fab e uma parte da cadeia pesa-
da com ligações de dissulfeto.
Cada classe principal de Ig no homem possui uma
cadeia pesada correpondente: as cadeias pesadas µ,
γ, α, ε e δ são encontradas na IgM, IgG, IgA, IgE e
IgD, respectivamente. Há apenas dois tipos de ca-
deias leves, λ e κ, encontradas nas cinco classes da
Ig humana. Portanto, há dez tipos diferentes de mo-
léculas de Ig (por exemplo, IgG-λ, IgG-κ). Três classes
de Ig existem apenas na forma monomérica (IgG,
IgD e IgE). A IgM circula numa forma penta ou
monomérica. Como um pentâmero, a IgM contém
cinco moléculas em forma de Y (10 cadeias pesadas
e 10 cadeias leves). A IgA ocorre como um monômero,
um dímero e um trímero. A IgG possui quatro
subclasses (IgG1, IgG2, IgG3, IgG4); a IgA possui
duas subclasses (IgA1 e IgA2). As funções biológi-
cas específicas estão começando a ser associadas às
várias subclasses (por exemplo, IgG4 não fixa com-
plemento, nem se liga a monócitos, e a IgG3 possui
meia-vida significativamente mais curta que as ou-
tras três subclasses da IgG).
Tem-se identificado estruturas adicionais. As
cadeias de união (J) unem as cinco subunidades de
IgM, bem como as subunidades de IgA. A IgA se-
cretora possui uma cadeia polipeptídica adicional,
o componente secretor (CS), produzido pelas célu-
las epiteliais e adicionado à molécula de IgA após
a síntese de IgA.
Os coeficientes de sedimentação, determinados
por análise de ultracentrifugação, têm sido utiliza-
dos tradicionalmente para denotar cada classe de
Ig. A IgM têm o maior coeficiente de sedimenta-
ção em 19S e a IgG possui um coeficiente de apro-
ximadamente 7S.
Propriedades biológicas de anticorpos – A es-
trutura dos aminoácidos na região C da cadeia pe-
sada determina o isótipo daquela classe de Ig. Cada
classe de Ig cumpre funções diferentes.
A IgM, o primeiro Ac formado após imuniza-
ção primária (exposição ao novo Ag), protege o
espaço intravascular da doença. As moléculas
pentaméricas de IgM ativam prontamente o com-
plemento e servem como opsonizantes e aglutina-
dores para auxiliar o sistema fagocitário na elimi-
nação de vários tipos de microrganismos. As iso-
hemaglutininas e muitos Ac para microrganismos
Gram-negativos são IgM. A IgM monomérica atua
como um receptor de Ag na membrana da superfí-
cie da célula B.
A IgG, o tipo mais prevalente de Ac sérico, é
encontrada nos espaços extravasculares; é produ-
zida quando os títulos de IgM começam a diminuir
após a imunização primária. A IgG é a principal Ig
produzida após a reimunização (resposta imune da
memória ou resposta imune secundária). A IgG
protege os tecidos das bactérias, vírus e toxinas.
A IgG é a única Ig que cruza a placenta. As dife-
rentes subclasses de IgG neutralizam as toxinas
bacterianas, ativam o complemento e facilitam a
fagocitose através da opsonização. A γ-globulina
comercial é quase inteiramente constituída por IgG,
com pequenas quantidades de outras Ig.
A IgA é encontrada nas secreções das mucosas
(saliva, lágrimas, tratos respiratório, GU e GI e
colostro), onde a IgA constitui uma defesa antibac-
teriana e antiviral inicial. A IgA secretora é sinteti-
zada nas regiões subepiteliais dos tratos GI e respi-
ratório, estando presente em combinação com o
componente secretor (CS) produzido localmente.
As poucas células produtoras de IgA são encontra-
das nos lifonodos e no baço. A IgA sérica não con-
tém CS. A IgA sérica fornece proteção contra
Brucella, difteria e poliomielite.
A IgD está presente no soro em concentrações
extremamente baixas, embora apareça na superfí-
cie das células B em desenvolvimento, podendo
ser importante em seu crescimento e desenvol-
vimento.
A IgE (anticorpo da reagina, sensibilizador cu-
tâneo ou anafilático), como a IgA, é encontrada
principalmente nas secreções mucosas respiratórias
e GI. No soro, a IgE está presente emconcentra-
ções muito baixas. A IgE interage com os mastóci-
tos; a ligação de duas moléculas de IgE pelo
alérgeno pode causar desgranulação das células,
com a liberação dos mediadores químicos que cau-
sam uma resposta alérgica. Os níveis de IgE são
elevados nas doenças atópicas (por exemplo, asma
alérgica ou extrínseca, febre do feno e dermatite
atópica), doenças parasitárias, mal de Hodgkin avan-
çado e no mieloma monoclonal de IgE. A IgE pode
ter um papel benéfico na defesa contra parasitas.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351000
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 1001
Ensaios para imunoglobulinas
IgG, IgM e IgA estão presentes no soro em con-
centrações altas o suficiente para poderem ser quan-
tificadas por várias técnicas que mensuram qualquer
Ag. Uma técnica mais antiga é a imunodifusão radial
(técnica de Mancini), na qual o soro contendo Ag é
colocado num alvéolo de uma placa de ágar conten-
do Ac; o tamanho dos arcos de precipitina que se
formam no ágar é proporcional à concentração de
Ag no soro. Para quantificar as concentrações espe-
cíficas de muitas proteínas séricas, inclusive Ig,
muitos laboratórios estão usando, atualmente, a ne-
felometria, um método rápido e altamente reprodu-
zível que utiliza o princípio da dispersão molecular
da luz. A imunoeletroforese também é utilizada, oca-
sionalmente, para identificar Ig, particularmente Ig
monoclonal (ver MIELOMA MÚLTIPLO no Cap. 140).
A IgE está presente no soro em quantidades tão pe-
quenas que deve ser medida por radioimunoensaio
ou por ensaio imunoabsorvente ligado à enzima
(ELISA). A IgE dirigida contra Ag específico é me-
dida utilizando-se o teste radioalergoabsorvente
(RAST – ver Cap. 148). As subclasses de Ig podem
ser medidas por radioimunoensaio ou ELISA.
Anticorpos monoclonais
Os Ac in vivo quase sempre são policlonais (pro-
duzidos por > 1 clone), exceto no caso de uma ga-
mopatia monoclonal. Da mesma forma, até recen-
temente, os Ac produzidos em animais para testes
diagnósticos eram policlonais. A técnica do hibri-
doma permite a produção de grande quantidade de
Ac monoclonal em animais. Primeiro, um camun-
dongo é imunizado com o Ag desejado. Quando o
camundongo produz Ac, seu baço é removido para
preparar uma suspensão de células, algumas das
quais produzem o Ac desejado. Então, estas célu-
las que produzem Ac são fundidas com uma linha
celular de mieloma que foi mantida em cultura
tecidual e não produz anticorpo. As células fun-
didas individualmente que produzem o Ac mono-
clonal desejado são isoladas, cultivadas em cul-
tura tecidual para aumentar o número de células,
e reinjetadas no peritônio do camundongo.
O líquido ascítico contendo o Ac monoclonal
pode ser facilmente produzido e coletado para
proporcionar altas concentrações de Ac. Os la-
boratórios de fermentação produzem preparações
comerciais de Ac monoclonais.
Os Ac monoclonais são agora amplamente uti-
lizados para: 1. medida de níveis séricos de pro-
teínas e drogas; 2. tipagem de tecidos e sangue;
3. identificação de agentes infecciosos; 4. iden-
tificação de grupos de diferenciação (CD) para
classificação e acompanhamento de leucemias e
linfomas; 5. identificação de antígenos tumorais;
e 6. identificação de auto-anticorpos numa va-
riedade de doenças. O uso do Ac monoclonal
favoreceu a identificação da miríade de células
envolvidas na resposta imune.
REGULAÇÃO DE
RESPOSTAS IMUNES HUMORAIS
A capacidade de organizar uma resposta imune
humoral é, em grande parte, determinada genetica-
mente. Os genes do MHC regulam o reconheci-
mento do Ag pelas células T. Também são impor-
tantes a capacidade das células apresentadoras de
Ag (CAA) apontarem o Ag e o potencial da célula
B em produzir Ac.
O controle da resposta imune é crítico. De outro
modo, a produção ilimitada de Ac (particularmente
ao Ag próprio) poderia levar à autodestruição. A res-
posta imune humoral é regulada, primeiro, pelo de-
saparecimento natural da substância estranha esti-
mulante (por exemplo, bactéria) na medida em que
ela é eliminada do corpo. A regulação adicional é
pelo Ac e células T, pela rede idiotípica de Ac e pe-
las citocinas. O Ag pode realizar uma ligação cruza-
da com o receptor de Ag específico nas células B
para alguns receptores Fcγ e, deste modo, suprimir
a ativação das células B inalteradas. O Ac anti-
idiotípico reage com os determinantes idiotípicos na
região V da molécula de Ig. Isto ocorre porque
a região V de cada molécula de Ac é única para o Ac
produzido por aquele clone. Por sua vez, cada
Ac antiidiotípico pode possuir idiotipos que serão
reconhecidos por outros Ac antiidiotípicos e o pro-
cesso de uma Ig reagindo com outra pode continuar.
Desta maneira, o Ac antiidiotípico pode suprimir a
produção de Ac idiotípico pelo bloqueio de recepto-
res nas células B e T. Este fenômeno explica como a
doença do Rh no recém-nascido pode ser evitada
através da administração passiva de Ac IgG anti-Rh
(anti-D) à mãe.
SISTEMA
COMPLEMENTO
É um sistema de > 34 proteínas interagindo numa
cascata (semelhante à do sistema de coagula-
ção) que leva a uma variedade de processos bio-
lógicos.
Muitas proteínas do complemento são enzimas
que existem no soro como precursores inativos
(zimógenos); muitas outras estão presentes nas su-
perfícies celulares. As proteínas do complemento
constituem cerca de 10% das proteínas séricas, com
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1002 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
o terceiro componente (C3) presente na maior par-
te da concentração (cerca de 1,5mg/mL). Quanto
aos componentes do sistema complemento, ver TA-
BELAS 146.2 e 146.3.
As três vias de ativação do complemento são
chamadas de clássica, alternativa e lectina ligante
a manan (LLM) (ver FIG. 146.4). Todas são dire-
cionadas à única etapa mais importante da ativa-
ção, a clivagem de C3. A via final comum é cha-
mada de via terminal ou complexo de ataque de
membrana (CAM).
Nomenclatura – Os componentes da via clássi-
ca estão rotulados com uma letra C e um número
(por exemplo, C1, C3). Devido à seqüência na qual
eles foram identificados, os primeiros quatro com-
ponentes são numerados C1, C4, C2 e C3. Os com-
ponentes da via alternativa receberam letras (por
exemplo, B, P, D). Alguns componentes são chama-
dos de Fatores (por exemplo, Fator B, Fator D).
Os componentes ou complexos ativados possuem
uma barra sobre eles para indicar ativação (por exem-
plo, , , , ). Os fragmentos de clivagem
são designados como uma letra minúscula após o
componente (por exemplo, C3a e C3b são fragmen-
tos de C3). O C3b inativo é designado como iC3b.
As cadeias de polipeptídeos de proteínas do com-
plemento são designadas como uma letra grega após
o componente (por exemplo, C3α e C3β são as ca-
deias α e β de C3). Os receptores de membrana ce-
lular para C3 são abreviados CR1, CR2, CR3 e CR4.
Via clássica
Ativaão – A via clássica (ver FIG. 146.5) é ati-
vada normalmente pelos Ac que se fixam ao com-
plemento (Ac que se liga ao complemento), que
está nos complexos Ag-Ac ou aos quais o Ac (IgG
ou IgM) está agregado. Sendo assim, a via clássica
satisfaz a imunidade específica porque apenas Ac
de classes específicas, formado em resposta à esti-
mulação de Ag, é capaz de ativar esta via. A ma-
cromolécula C1 é um complexo dependente de Ca++
de uma molécula de C1q, duas de C1r e duas de
C1s. A macromolécula C1 permanece intacta ape-
nas quando Ca++ estiver presente; de outro modo,
as subunidades individuais se dissociam uma da
outra. A ativação ocorre quando dois dos seis mo-
nômeros de C1q se ligam às regiões Fc de duas
moléculas de IgG ou a uma molécula de IgM
pentamérica. As duas moléculas de IgG devem ser
apropriadamente espaçadas para causar ativação,
enquanto uma molécula pentamérica única de IgM
possui aquela proximidade em sua estrutura. Por-
tanto, a IgM é muito mais eficientena ativação do
complemento do que a IgG. A atividade da IgG está
na ordem IgG3 > IgG1 > IgG2. A IgG4 não fixa o
complemento.
Uma vez a Ig estando unida ao C1q, a molécula
C1q é submetida a uma mudança na estrutura
terciária, causando ativação autocatalítica de C1r
para . O C1r, então, cliva uma ligação em C1s
para produzir . Nenhum fragmento de clivagem
é liberado quando C1r ou C1s são clivados.
A também é chamada de esterase. A 
pode clivar C4 em C4a e C4b. O C4b, o principal
fragmento de clivagem, se liga à membrana se esta
estiver presente. O pode clivar C2 livre para
produzir C2a e C2b, que é um processo ineficaz,
ou clivar C2 em um complexo C4b,C2 para produ-
zir C4b,C2a e C2b livre, que é um processo muito
eficiente. O C2a é o principal fragmento de cliva-
gem de C2. Se C2 livre tiver sido clivado, então
C2a deve se unir a C4b para formar um complexo
C4b,2a ou o C2a degradará e ficará inativo. C4b,2a
é a via clássica da C3 convertase, que pode clivar
C3 em C3a e C3b. O C2a contém o sítio enzimáti-
co para clivagem de C3. C4b,2a necessita da pre-
sença de magnésio e se degrada, com o decorrer do
tempo, em temperaturas fisiológicas.
FIGURA 146.4 – Vias do complemento. Os componentes estão relacionados entre parênteses; as pro-
teínas reguladoras estão colocadas entre colchetes em itálico. LLM= lectina ligante a manan.
Complexos
ant’geno-anticorpo
Ativa‹o da
via cl‡ssica
(C1,C4,C2)
[C1INH,C4BP,I]
Carboidratos Ativa‹o da via de LLM
(LLM, MASP-1, MASP-2)
Clivagem
de C3
Via terminal
(C3,C5,C6,C7,C8,C9)
[CD59, HRF]
Lise
Subst‰ncias naturais
(por exemplo, paredes de
fungos, hem‡cias de coelhos)
Ativa‹o da via
alternativa
(C3b,B,P,D)
[H,I]
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CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 1003
A via clássica também pode ser ativada por me-
canismos independentes de Ac. A heparina (um an-
ticoagulante polianiônico) e a protamina (um poli-
cátion usado para bloquear a heparina), quando
presentes em concentrações equimolares, podem
ativar a via clássica. Pensou-se que vários outros
poliânions (por exemplo, DNA e RNA) fossem
capazes de reagir diretamente com o C1q para ati-
var a via clássica. A proteína C-reativa é capaz de
levar à ativação da via clássica sem a presença de
Ac. As vias de desvio de C1 também foram des-
critas, as quais não utilizam componentes da via
TABELA 146.2 – COMPONENTES DO COMPLEMENTO E PROTEÍNAS REGULADORAS
Concentração
Número de Peso plasmática
cadeias na molecular ou sérica
Nome do molécula (dálton – (µg/mL – Fragmentos
componente ativa aproximado) aproximado) de clivagem Cromossomo
Via C1q 18 410.000 70 – 300 1
clássica C1r 1 83.000 34 – 100 12
precoce C1s 1 85.000 30 – 80 12
C 4 3 204.000 350 – 600 C4a, C4b, 6
C4c, C4d,
C2 1 102.000 15 – 30 C2a, C2b 6
Terceiro C3 2 190.000 1.200 – 1.500 C3a, C3b, 19
componente C3c, C3d,
C3f, C3g,
C3dg,
C3d-K
iC3b
Complexo de C5 2 196.000 70 – 85 C5a, C5b 9
ataque C6 1 125.000 60 –70 5
de mem- C7 1 120.000 55 – 70 5
brana C8 3 150.000 55 – 80 1,9
(complexo C9 1 66.000 50 – 160 5
de comple-
mento ter-
minal)
Via Fator B 1 100.000 140 – 240 Ba, Bb 6
alternativa P 4 224.000 20 – 30 X
Fator D 1 24.000 1 – 2 ?
Via da Lectina ligante 18 540.000 1 10
lectina a manan
ligante MASP-1 1 94.000 ?
a manan MASP-2 1 76.000 ?
Controle C1INH 1 105.000 180 – 275 11
da via C4BP 7 550.000 250 1
clássica
Controle Fator H 1 150.000 300 – 560 1
da via Fator I 2 100.000 34 – 50 4
alternativa
 Controle AI 310.000 35 ?
misto Proteína S 83.000 150 – 500 17
(vitronectina)
Fator J 1 20.000 2,6 – 8,2 ?
SP40,40 80.000 50 8
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1004 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
clássica, mas resultam em clivagem de C3. Uma
destas foi caracterizada como a via de LLM.
Regulaão – A via clássica é regulada pelo ini-
bidor da C1 esterease (C1INH), que se liga estoi-
quiometricamente (1:1) ao C1r e C1s e ao e
 para inativar estas proteínas permanentemen-
te. O C1INH também se liga estoiquiometricamente
à plasmina, calicreína, Fator de Hageman ativado
e Fator XIa da coagulação. Sua ausência leva a an-
gioedema hereditário (ver Cap. 148). O Fator J é
uma glicoproteína catiônica que também inibe a
atividade de C1. A proteína ligante de C4 (C4BP)
desune o complexo C4b,2a, permitindo que o Fa-
tor I inative C4b.
Via alternativa
Ativaão – A via alternativa (ver FIG. 146.6)
é ativada por substâncias naturais (por exemplo,
paredes de fungos, fator do veneno de cobra,
fator nefrítico, parede celular bacteriana [endo-
toxina] e hemácias de coelho [in vitro]) e por
IgA agregada como uma resposta imune inespe-
cífica (inata), isto é, não é necessário uma sensi-
bilização prévia. A via alternativa não envolve
C1, C4 ou C2, mas leva à clivagem de C3. Esta
via depende da clivagem constante de pequenas
quantidades de C3 em C3a e C3b. Essa clivagem
natural de C3 é pouco compreendida e acredita-
se que ocorra através da ação inespecífica de
enzimas sobre C3 ou pelo baixo nível de ativida-
de das outras duas vias. O C3b serve, assim, como
um substrato para o Fator B produzir o complexo
C3b,B. O Fator D (uma enzima ativada no plas-
ma) cliva o Fator B para produzir C3b, Bb. A
properdina (P) estabiliza este complexo C3b,Bb
para retardar a sua deterioração. C3b,Bb e
C3b,Bb,P são as C3 convertases da via alternativa,
as enzimas que clivam C3 em C3a e C3b. O Bb
contém o sítio enzimático para clivar C3. O C3b,
Bb requer a presença de magnésio e se deteriora
com o tempo.
A via alternativa também é vista como uma via
de amplificação, pois um complexo C3b,Bb pode
clivar muitas moléculas de C3. Entretanto, também
ocorre amplificação quando é produzido e
quando C4b,2a é formado. Cada uma destas enzi-
mas pode clivar centenas de moléculas, levando à
rápida ativação do complemento.
TABELA 146.3 – PROTEÍNAS DA MEMBRANA
Número de Peso
cadeias na molecular
Nome do molécula (dálton –
componente nativa aproximado) Especificidade Células Cromossomo
CR1 (CD35) 1 160.000 – C3b, C4b M, RBC, B, 1
250.000 G
CR2 (CD21) 1 140.000 C3d, C3dg, iC3b B 1
CR3 (CD11B) 2 265.000 iC3b G, M, Mac 21, 16
α-165.000 16
β-95.000 21
CR4 1 ? C3dg Plt ?
DAF (CD55) 1 70.000 C4b, 2a, C3b, Bb RBC, Plt 1
MCP (CD46) 1 45.000 – C3b, C4b B, T, Neut 1
70.000 M
gp150,95 2 245.000 iC3b G, M, Mac 21, 16
α-150.000 16
β-95.000 21
C3aR ? ? C3a, C4a G, Mast, Plt ?
C5aR 1 45.000 C5a, C5a desarg G, Mast, M, 19
Mac, Plt
HRF 1 65.000 C8, C9 RBC ?
CD59 1 20.000 C8, C9 M, RBC, T, 11
Neut
C1qR 1 65.000 C1q B, M, Mac, 12?
Plt, Endo
B = células B; Endo = células endoteliais; G = granulócitos; M = monócitos; Mac = macrófagos; Mast = mastócitos;
Neut = neutrófilos; Plt = plaquetas; T = células T.
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CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 1005
Regulaão – O complexo C3b,Bb da via alter-
nativa é regulado por vários fatores. A properdina
retarda a deterioração do complexo C3b,Bb, au-
mentando a sua meia-vida de aproximadamente
4 para 40min. As substâncias aceleradoras da de-
gradação (por exemplo, Fator H ou fator acele-
rador da degradação[FAD]), competem com B
para a ligação ao C3b (por exemplo, para produ-
zir C3b,H), diminuindo a meia-vida do comple-
xo C3b,Bb e provocando dissociação do com-
plexo em C3b e Bb. O Fator I atua em C3b,H
para degradar C3b (levando à produção de iC3b,
C3c, C3d, C3f e C3dg).
As circunstâncias sob as quais o complexo
C3b,Bb se forma determinarão se a via alternativa
será ou não ativada. As superfícies sobre as quais o
complexo C3b,Bb pode se ligar são superfícies
ativadoras (por exemplo, parede de fungos, hemá-
cias de coelho) ou superfícies não ativadoras (por
exemplo, hemácias de carneiro). As superfícies
ativadoras impedem que o Fator H se ligue ao C3b,
enquanto as superfícies não ativadoraspermitem
que o Fator H se ligue ao C3b e dissocie o C3b,Bb.
Portanto, o complexo C3b,Bb permanece ativo
muito mais tempo numa superfície ativadora do que
numa não ativadora.
Os mecanismos anteriormente descritos expli-
cam como a via alternativa é ativada in vivo. O fa-
tor do veneno de cobra (FVCo) é como C3b de
cobra; o complexo FVCo,Bb é muito estável e não
é suscetível à ação de degradação do Fator H. Por-
tanto, O FVCo,Bb pode levar à ativação e cliva-
gem quase total de C3. O fator nefrítico C3 (FNeC3)
é encontrado no soro de aproximadamente 10% dos
pacientes com glomerulonefrite membranoprolife-
rativa e é uma Ig dirigida ao complexo C3b,Bb.
O FNeC3 atua como a properdina, exceto pelo fato
FIGURA 146.5 – Ativaão da via clássica.
FIGURA 146.6 – Ativaão e regulaão da via al-
ternativa.
+
C4
C4b
+
C2a
C2
C2b
C4b,2a
C4a
C1s
iC3b
H
P H B
C3b, Bb
Ba
IiBb
C3b
C3b,B
C3b ,Bb ,P
D
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351005
C1q
C1(C1q2C1r2C1s)
C‡lcio
2C1r e 2C1s
Ag-Ac+
Ac- Ac-
C1q2C1r2C1sC1q2C1r2C1s C1q2C1r2C1s
Ag Ag
1006 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
do complexo C3b,Bb, FNeC3 ser relativamente
resistente à atividade degradante do Fator H.
As paredes de fungos (zimosan) e certas membra-
nas (por exemplo, hemácias de coelho) são super-
fícies ativadoras, nas quais um complexo C3b,Bb
é protegido da atividade de degradação do Fator H.
Via de lectina ligante a manan
A via de lectina que se liga a manan (LLM) de-
pende do reconhecimento inato de substâncias es-
tranhas (isto é, carboidratos) para a ativação. Esta
via possui similaridades estruturais e funcionais
com a via clássica. A LLM é similar ao C1q, e
MASP-1 e MASP-2 parecem ser similares a C1r e
C1s na via clássica, respectivamente. Sendo assim,
MASP-2 pode clivar C4 e levar à formação de C3
convertase derivada da via de LLM.
Clivagem de C3 e
suas conseqüências
As C3 convertases clivam C3 em C3a e C3b,
que gera um ponto de ligação metastável em C3b
para as membranas. Se uma superfície ou mem-
brana estiver disponível imediatamente após C3
ter sofrido a atuação da C3 convertase, o C3b
pode se ligar covalentemente. Se uma membrana
ou superfície não estiver disponível, então o C3b
se torna C3b de fase fluida e é incapaz de se ligar
covalentemente às superfícies celulares. O C3
também pode tornar-se similar ao C3b, se trata-
do com metilamina. Uma vez que o C3b tenha se
ligado à membrana através do ponto de união
metastável lábil, ele pode participar das ativida-
des biológicas por ligar-se a uma variedade de
receptores de C3, funcionar como um ponto de liga-
ção eficiente para B para causar mais clivagem de
C3 através da via alternativa, participar da forma-
ção de uma C5 convertase, ou sofrer a atuação do
Fator I e um co-fator para formar iC3b.
Assim, o C3b pode ligar-se covalentemente às
membranas através de seu ponto de ligação tiolester
metastável e, uma vez ligado, pode interagir com vá-
rios receptores dependendo da disponibilidade dos
receptores de C3 nas células e do estado de degrada-
ção do C3. Não se deve confundir ligação à membra-
na através de ponto de ligação metastável covalente
com ligação não covalente aos receptores.
Complexo de ataque de
membrana – via terminal
A C3 convertase (por exemplo, C3b,Bb) pode tor-
nar-se uma C5 convertase (por exemplo, C3b,Bb,3b)
pela adição de um C3b ao complexo (ver FIG. 146.7).
A C5 convertase cliva C5 em C5a e C5b, começando
a formação do complexo de ataque de membrana
(CAM). O C6 pode, então, ligar-se a C5b para produ-
zir C5b,6. Depois, C7 pode ligar-se para formar
C5b,6,7, que se pode ligar às membranas e camadas
lipídicas duplas. Quando isto ocorre sobre uma cé-
lula que, por outro modo, não possui qualquer pro-
duto do complemento sobre si, é chamado de fenô-
meno do espectador inocente (e pode causar hemó-
lise da célula inocente). O C8 pode ligar-se ao com-
plexo C5b,6,7 para formar C5b,6,7,8, que pode cau-
sar lise lenta e ineficiente da célula. Finalmente, o
C9 se liga ao complexo para produzir C5b,6,7,8,9,
que inicia a lise celular substancial. Conforme as mo-
léculas adicionais de C9 são acrescentadas ao com-
plexo C5b-9, aumenta a lise. O CAM é regulado pela
proteína S, também chamada de vitronectina (que con-
trola a atividade de C5b-7), pelo fator de restrição
homólogo (FRH), por SP 40,40 e CD59 (que regula a
atividade de C8,9).
Atividades biológicas associadas à
ativação do complemento
A lise celular é apenas uma das muitas ativida-
des biológicas associadas à ativação do complemento
e pode não ser a mais importante. A lise é vista clini-
camente em pacientes com hemoglobinúria noturna
paroxística, uma doença rara na qual há deficiências
do fator de aceleração da degradação (FAD) das pro-
teínas da membrana, do FRH (fator de restrição
homólogo) e CD59.
Os receptores de complemento estão presentes
numa variedade de células. O CR1, a proteína
co-fator de membrana (PCM,CD46) e o FAD (CD55)
regulam a quebra do C3b. O FRH e CD59 impedem
a formação do complexo de ataque da membrana
sobre células homólogas. O CR1 (CD35) também
desempenha um papel no “clearance” dos comple-
xos imunes. O CR2 (CD21) regula as funções da
célula B (produção de Ac) e é o receptor do vírus
FIGURA 146.7 – Formaão das C5 convertases.
C5 convertase
alternativa
+C3b, Bb C3b, Bb, 3b
C3b+C3a
C3
C3b+C3a
C3b, Bb
C4b,2a
+C4b,2a C4b,2a,3b
C5
C5a+C5b
C5
C3 convertase da
via alternativa
C3 convertase
da via cl‡ssica
C5 convertase
cl‡ssica
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351006
CAPÍTULO 146 – BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNE / 1007
Epstein-Barr. O CR3 (CD11b/CD18) participa da
fagocitose, mediando a aderência de partículas co-
bertas por iC3b para fagocitose. O CR4 aparece so-
bre plaquetas e tem sido bem menos estudado do
que outros receptores C3. O gp150,95 desempenha
um papel na migração de monócitos. Os receptores
de C3a e C4a ligam C3a e C4a, respectivamente. O
receptor C5a liga C5a de C5adesarg (C5a sem a
arginina terminal). O receptor C1q liga a porção de
colágeno de C1q, permitindo a ligação de comple-
xos imunes a fagócitos.
O C3a e C5a possuem uma atividade de anafi-
latoxina e o C4a possui fraca atividade de ana-
filatoxina. As anafilatoxinas promovem aumento da
permeabilidade vascular, contração de músculos li-
sos e desgranulação de mastócitos. As anafilatoxinas
são reguladas pelo inativador de anafilatoxina (car-
boxipeptidase N) que, dentro de segundos, remove
a carboxiarginina terminal.
Quimiotaxia é a atração de células para a área
de inflamação. A C5a possui ambas as atividades
de anafilatoxina e quimiotaxia, porém C3a e C4a
não são quimiotáticos. A quimiotaxia também foi
descrita com iC5b-7.
As atividades de neutrófilos e monócitos são
reguladas por C5a e C5adesarg. O C5a pode provo-
car aumento da aderência das células, desgranula-
ção e liberação de enzimas intracelulares dos gra-
nulócitos, produção de O2 tóxico e início de outros
eventos metabólicos celulares.
O “clearance” dos complexos imunes é uma
função importante do complemento. A via clássica
pode impedir a formação de grandes complexos
imunes, e a via alternativa pode aumentar a solubi-
lidade dos complexos imunes.
As proteínas do complemento também podem ter
uma variedade de outras atividades biológicas.
Os fragmentos de C3 (C3d ou C3dg) podem auxi-
liar a regular a produção de Ac através de CR2 nas
células. O angioedema hereditário, que é causado
por uma deficiência de inibidor de C1, pode ser me-
diado por uma substância pouco descrita do tipo
cinina. Um fragmento mal definido de C3 (C3e, fa-
tor mobilizante de leucócitos) pode provocar a mo-
bilização dos leucócitos da medula óssea. O fragmen-
to Bb do Fator B aumenta a disseminação e aderên-
cia de macrófagos. A ativação do complemento tam-
bémpode neutralizar vírus e provocar leucocitose.
Testes para a atividade funcional
do complemento
O teste do complemento hemolítico total
(CH50) mede a capacidade da via clássica e do
CAM de lisar uma hemácia de carneiro ao qual um
Ac foi ligado. O CH 50 da via alternativa (CH 50
de coelho ou APCH 50) mede a capacidade da via
alternativa e do CAM de lisar uma hemácia de coe-
lho. Podem-se utilizar os testes hemolíticos para me-
dir a atividade funcional de componentes específi-
cos de cada via. As proteínas do complemento tam-
bém podem ser medidas utilizando-se técnicas an-
tigênicas (por exemplo, nefelometria, difusão em
ágar gel ou imunodifusão radial).
O complemento também pode ser usado como
um reagente para auxiliar no diagnóstico. No teste
de fixaão do complemento, o soro do paciente é
aquecido para destruir as enzimas do complemento.
Então, o Ag (por exemplo, partícula viral) e comple-
mento adicional são acrescentados ao soro do pa-
ciente e a mistura é incubada. Finalmente, as hemá-
cias de carneiro são adicionadas e a incubação é con-
tinuada. Se o sistema complemento for ativado pela
presença de Ac no soro do paciente, a atividade he-
molítica do complemento será esgotada e não have-
rá lise das hemácias. Se não houver Ac no soro do
paciente, então as hemácias serão lisadas.
RESOLUÇÃO DE UMA
RESPOSTA IMUNE
Uma resposta imune pode ser associada à proli-
feração maciça e diferenciação de linfócitos (por
exemplo, amígdalas dilatadas por inflamação de
garganta). O que acontece com os linfócitos quan-
do a infecção é controlada? Conforme menciona-
do anteriormente, uma resposta imune está asso-
ciada à secreção de várias citocinas. Quando a in-
fecção é controlada e os Ag são removidos, a secre-
ção de citocina cessa. Quando a secreção de citocina
cessa, os linfócitos são submetidos à apoptose. Há
duas maneiras pelas quais uma célula morre.
1. A necrose se refere às mudanças morfológi-
cas que ocorrem quando uma célula morre por le-
são grave e repentina (por exemplo, lise osmótica,
isquemia, hipertermia, trauma químico). A maior
parte da lesão está na membrana plasmática, levan-
do à perda da capacidade de regular a pressão os-
mótica, resultando em ruptura da célula, espalhan-
do seu conteúdo no tecido circundante. Isto desen-
cadeia uma resposta inflamatória.
2. A aoptose (também chamada de morte celu-
lar programada) é muito comum nos invertebra-
dos. Por exemplo, após uma borboleta sair de seu
casulo, ela não precisa mais dos músculos que usa-
va para aquele processo; estes músculos são subme-
tidos à morte celular programada. Nos mamíferos, a
apoptose se refere ao processo pelo qual uma célula
“comete suicídio” e é caracterizada por uma série
de mudanças morfológicas. A apoptose começa pela
condensação de cromatina (secundária à ativação de
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351007
1008 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
endonuclease endógena, que degrada o DNA) e que-
bra do núcleo em colapso em pequenos fragmentos.
A zeiose (empolamento da membrana plasmática)
ocorre simultaneamente e pode servir como sinal para
fagocitose pelos macrófagos circundantes. Diferen-
temente do que ocorre na necrose, esta fagocitose ime-
diata não permite mais o espalhar do conteúdo celu-
lar e impede o desenvolvimento da inflamação.
A apoptose é um processo ativo e envolve a in-
dução das várias moléculas e vias. Duas vias en-
volvidas na apoptose ilustram as possíveis doen-
ças que podem resultar da apoptose normal. Uma
enzima chamada Bcl-2 pode inibir a apoptose. Por-
tanto, se um linfócito for induzido para expressar
Bcl-2, ele não morrerá e irá persistir; isto ocorre
em alguns linfomas (Bcl defende a célula B do
linfoma, onde o Bcl-2 foi observado pela primei-
ra vez). Uma interação molécula-ligante na super-
fície celular também está envolvida na apoptose.
Muitas células expressam Fas (CD95) na sua su-
perfície. A ligação cruzada de Fas ativa a via de
apoptose. Este é um mecanismo principal pelo
qual LTC mata suas células-alvo de modo que o
LTC adquire o Fas ligante; o Fas ligante une o
Fas à célula-alvo, levando à ativação da apoptose
na célula-alvo. A ausência de Fas ou Fas ligante
pode, teoricamente, levar à persistência de linfó-
citos e linfadenopatia maciça. Isto ocorre em mo-
delos animais onde a deficiência de Fas (lpr de
camundongos) ou Fas ligante (gld de camundon-
gos) acarreta linfadenopatia maciça e auto-imu-
nidade. As anormalidades de Fas foram relatadas
em humanos e são a causa subjacente da síndro-
me Canale-Smith.
Certos órgãos (por exemplo, retina, testículos)
são “locais privilegiados” ignorados ou tolerados
pelo sistema imune. Hoje, parece que estes órgãos
expressam uma alta densidade de Fas ligante na
sua superfície celular. Qualquer linfócito que tenta
atacá-los terá seu Fas com ligação cruzada e o lin-
fócito em si será submetido à apoptose. Tal estraté-
gia de evasão imune também é empregada por
muitos tumores; alguns expressam Fas ligante na
sua superfície e, deste modo, induzem apoptose em
qualquer linfócito que os tente atacar.
147␣ /␣ DOENÇAS POR
IMUNODEFICIÊNCIAS
É um grupo de condições diversas causadas por um ou mais defeitos no siste-
ma imune e clinicamente caracterizado por suscetibilidade aumentada para
infecções com conseqüente doença grave, aguda, recorrente ou crônica.
Um distúrbio por imunodeficiência deve ser consi-
derado em qualquer indivíduo que apresente episódios
de infecções com gravidade e freqüência incomuns,
infecções resistentes, ausência de períodos assintomá-
ticos; de um microrganismo não usual; ou com com-
plicações graves e não esperadas. Como as doenças
por imunodeficiências são relativamente incomuns,
outras condições que levam a infecções recorrentes
devem ser consideradas primeiro (ver TABELA 147.1).
Se estes distúrbios puderem ser excluídos, deve-se sus-
peitar de um defeito na defesa do hospedeiro.
IMUNODEFICIÊNCIAS
PRIMÁRIAS E
SECUNDÁRIAS
As imunodeficiências podem ser primárias ou
secundárias. A imunodeficiência primária é clas-
sificada em quatro grupos principais, de acordo com
o componente deficiente do sistema imune: célu-
las B, Células T, células fagocitárias ou comple-
mento. (Uma visão geral dos componentes do sis-
tema imune é dada no Cap. 146.) Mais de 70
imunodeficiências primárias foram descritas e pode
existir considerável heterogeneidade dentro de cada
distúrbio. A classificação das deficiências primá-
rias é mostrada na TABELA 147.2 (variantes não
usuais são excluídas).
Os defeitos de célula T incluem vários distúr-
bios graves com defeitos associados das células
B (anticorpos), o que é compreensível, uma vez
que as células B e T se originam de uma cadeia
de células comum primitiva e as células T influen-
ciam a função das células B. As doenças fagoci-
tárias incluem distúrbios nos quais o defeito pri-
mário é de movimento celular (quimiotaxia) e
aqueles nos quais o defeito primário é de ativi-
dade microbiana.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351008
CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1009
TABELA 147.1 – DISTÚRBIOS COM SUSCETIBILIDADE AUMENTADA
A INFECÇÕES INCOMUNS
Distúrbios
circulatórios e
sistêmicos
Distúrbios
obstrutivos
Defeitos
integumentares
Imunodeficiências
secundárias
Anemia falciforme, diabetes me-
lito, nefrose, veias varicosas, de-
feitos cardíacos congênitos
Estenose ureteral ou uretral,
asma brônquica, bronquiec-
tasia, rinite alérgica, tuba de
Eustáquio bloqueada, fibrose
cística
Eczema, queimaduras, fraturas do
crânio, trato sinusal de linha
média, anormalidades ciliares
Desnutrição, prematuridade,
linfoma, esplenectomia,
uremia, terapia imunossu-
pressora, enteropatia com
perda de proteínas, doenças
virais crônicas
Tipo de Tipo de
distúrbio Condições distúrbio Condições
Imunodeficiências
primárias
Fatores microbioló-
gicos incomunsCorpos estranhos
Agamaglobulinemia ligada ao
cromossomo X, síndrome de
DiGeorge, doença
granulomatosa crônica,
deficiência de C3
Supercrescimento antibiótico, in-
fecções crônicas com micror-
ganismos resistentes, reinfecção
contínua (suprimento de água
contaminada, contato infeccio-
so, equipamento de terapia de
inalação contaminado)
“Shunts” ventriculares, cateter
venoso central, válvulas
cardíacas artificiais, cateter
urinário, corpos estranhos
aspirados
Modificado a partir de Stiehm ER: Immunologic Disorders in Infants and Children, 4» ed. Philadelphia, WB Saunders
Company, 1996, p. 202; utilizado com permissão.
TABELA 147.2 – CLASSIFICAÇÃO, HERANÇA E ASPECTOS ASSOCIADOS DOS
DISTÚRBIOS DE IMUNODEFICIÊNCIA PRIMÁRIA
Distúrbio Achados associados
Deficiências de célula B (anticorpos)
Agamaglobulinemia ligada ao cromossomo X
Deficiência de Ig com hiper IgM (XL)
Deficiência de IgA
Deficiências da subclasse de IgG
Deficiência de anticorpo com Ig normais ou elevadas
Imunodeficiência com timoma
Imunodeficiência variável comum
Hipogamaglobulinemia transitória da infância
Deficiências de célula T (celulares)
Deficiência predominante de célula T
Síndrome de DiGeorge
Candidíase mucocutânea crônica
Imunodeficiência combinada com Ig (síndrome de
Nezelof)
Deficiência de fosforilase nucleosídeo (AR)
Deficiência de célula exterminadora natural
Linfocitopenia idiopática de CD4
Deficiências combinadas de células T e B
Imunodeficiência combinada grave (AR ou XL)
Infecção piogênica após 6 meses de idade
Neutropenia, linfadenopatia
Auto-imunidade; alergia respiratória ou alimentar; in-
fecção respiratória; freqüentemente assintomática
Deficiência de IgA
–
Anemia aplásica
Auto-imunidade
Prematuridade
Hipocalcemia, fácies peculiar, anormalidades do arco
aórtico, cardiopatia
Endocrinopatias
Bronquiectasia
–
Infecção viral herpética grave
Freqüentemente assintomática
–
Continua
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1010 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
Das imunodeficiências primárias, os defeitos de
célula B ou de anticorpos predominam; a deficiên-
cia de IgA seletiva (usualmente assintomática) pode
ocorrer em 1/400 das pessoas. Excluindo a defi-
ciência assintomática IgA, os defeitos da célula B
são responsáveis por 50% das imunodeficiências pri-
márias; as deficiências de célula T, por cerca de 30%;
deficiências fagocitárias, por aproximadamente 18%
e deficiências do complemento, 2%. A incidência
total da imunodeficiência primária sintomática é
Anormalidades esqueléticas
Pancitopenia
Ausência de HLA
Dermatite, deterioração neurológica
Eczema, trombocitopenia
Hipoplasia de cartilagem capilar, varicela grave
Infecção grave pelo vírus Epstein-Barr
Infecções estafilocócicas, eczema, dermatite
União prolongada do cordão umbilical, leucocitose,
periodontite
Linfadenopatia
–
–
Albinismo oculocutâneo, grânulos gigantes de neutró-
filos
Imunodeficiência combinada; síndrome similar a LES
Síndrome similar a LES, glomerulonefrite
Infecções piogênicas
Infecções por Neisseria
Nenhum provado
Angioedema, LES
Infecções piogênicas
Síndrome hemoliticourêmica, glomerulonefrite
Infecções piogênicas
Infecções por Neisseria
TABELA 147.2 – CLASSIFICAÇÃO, HERANÇA E ASPECTOS ASSOCIADOS DOS
DISTÚRBIOS DE IMUNODEFICIÊNCIA PRIMÁRIA
Distúrbio Achados associados
XL = ligada ao cromossomo X; Ig = imunoglobulina; AR = autossômica recessiva; ACD = autossômica co-dominante;
AD = autossômica dominante.
Deficiência de adenosina desaminase (AR)
Disgenesia reticular
Síndrome do linfócito nu
Ataxia-telangiectasia (AR)
Síndrome Wiskott-Aldrich (XL)
Nanismo de membros curtos
Síndrome linfoproliferativa XL
Distúrbios fagocitários
Defeitos de movimento celular
Síndrome de hiperimunoglobulinemia E
Defeito Tipo I de aderência leucocitária (AR)
Defeitos de atividade microbicida
Doença granulomatosa crônica (XL ou AR)
Deficiência de G6PD neutrofílica
Deficiência de mieloperoxidase (AR)
Síndrome de Chédiak-Higashi (AR)
Distúrbios de complemento
Defeitos de componentes do complemento
Deficiência de C1q . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C1rs . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C1s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C3
C5
C6 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C7 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C8 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
C9 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
Defeitos de proteínas de controle
Deficiência de inibidor de C1 (AD)
Deficiência de Fator I (inativador de C3b) (ACD)
Deficiência de Fator H (ACD)
Deficiência de Fator D (ACD)
Deficiência de properdina (XL)
(ACD)




. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
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CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1011
estimada como sendo 1/10.000; cerca de 400 no-
vos casos ocorrem a cada ano nos EUA. Como a
maioria das imunodeficiências primárias são here-
ditárias ou congênitas, elas aparecem inicialmente
em bebês e crianças; aproximadamente 80% dos
afetados tinham < 20 anos de idade e, devido à he-
rança ligada ao X de muitas síndromes, 70% ocor-
rem no sexo masculino.
A imunodeficiência secundária é um prejuízo
do sistema imune que resulta de enfermidade em
uma pessoa anteriormente normal. O prejuízo fre-
qüentemente é reversível se a condição ou enfer-
midade subjacentes se resolverem. As imunode-
ficiências secundárias são consideravelmente mais
comuns do que as imunodeficiências primárias e
ocorrem em muitos pacientes hospitalizados. Qua-
se todas as enfermidades graves prolongadas inter-
ferem no sistema imune, em algum grau. A classi-
ficação das imunodeficiências secundárias é mos-
trada na TABELA 147.3.
Etiologia
Não há uma causa comum responsável pelas imu-
nodeficiências, embora um defeito genético único
possa estar freqüentemente implicado. O defeito ge-
nético pode levar à ausência de uma enzima (por exem-
plo, deficiência de adenosina desaminase), ausência
de uma proteína (por exemplo, deficiência de compo-
nentes do complemento) ou parada no desenvolvimen-
to em um estágio específico da diferenciação (por
exemplo, parada no estágio da célula pré-B, que ocorre
na agamaglobulinemia ligada ao cromossomo X). As
localizações de cromossomos dos genes defeituosos
foram identificadas para muitas das imunodeficiên-
cias primárias. Em certas doenças, eventos intra-ute-
rinos podem estar implicados (por exemplo, alcoolis-
mo materno, em alguns casos de síndrome de DiGeor-
ge); em outras, a ingestão de drogas pode estar
implicada (por exemplo, fenitoína na deficiência de
IgA). A anormalidade biológica exata presente na
maioria das doenças é desconhecida.
TABELA 147.3 – DISTÚRBIOS DE IMUNODEFICIÊNCIAS SECUNDÁRIAS
Fatores Fatores Fatores Fatores
predisponentes específicos predisponentes específicos
Bebês prematuros e
recém-nascidos
Doenças hereditárias
e metabólicas
Agentes imunos-
supressores
Imunodeficiência fisiológica de-
vido à imaturidade do siste-
ma imune
Anormalidades cromossômicas
(por exemplo, síndrome de
Down)
Uremia
Diabetes melito
Desnutrição
Deficiências de vitaminas e mi-
nerais
Enteropatias com perda de pro-
teínas
Síndrome nefrótica
Distrofia miotônica
Anemia falciforme
Radiação
Drogas imunossupressoras
Corticosteróides
Globulina antilinfócito ou
antitimócito
Anticorpos monoclonais anti-
célula T
Doenças infecciosas
Doenças infiltrativas
e hematológicas
Cirurgia e trauma
VariadosRubéola congênita
Exantemas virais (por exemplo,
sarampo, varicela)
Infecção por HIV
Infecção por citomegalovírus
Mononucleose infecciosa
Doença bacteriana aguda
Doença micobacteriana ou
fúngica grave
Histiocitose
Sarcoidose
Doença e linfoma de Hodgkin
Leucemia
Mieloma
Agranulocitose e anemia
aplásica
Queimaduras
Esplenectomia
Anestesia
LES
Hepatite ativa crônica
Cirrose alcoólica
Envelhecimento
Drogas anticonvulsivantes
Doença do enxerto versus
hospedeiro
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1012 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
Sintomas e sinais
A maioria das manifestações das imunodeficiências
resulta de infecções freqüentes, começando comu-
mente com infecções respiratórias recorrentes. (En-
tretanto, muitas crianças pequenas imunologicamen-
te normais apresentam 6 a 8 infecções respiratórias
por ano, particularmente quando expostas aos irmãos
mais velhos ou outras crianças. Além disso, a maio-
ria dos pacientes imunodeficientes eventualmente de-
senvolve uma ou mais infecções bacterianas graves,
que persistem, recorrem ou levam a complicações;
por exemplo, sinusite, otite crônica e bronquite fre-
qüentemente seguem episódios repetidos de dor de
garganta ou IRA. A bronquite pode progredir para
pneumonia, bronquiectasia e insuficiência respirató-
ria, que constitui a causa mais comum de óbito.
As infecções por microrganismos oportunistas (por
exemplo, Pneumocystis carinii ou citomegalovírus)
podem ocorrer, particularmente em pacientes com de-
ficiência de células T.
A infecção da pele e membranas mucosas tam-
bém é comum. Aftas resistentes podem ser o pri-
meiro sinal de imunodeficiência de células T. As
úlceras orais e periodontite também são observa-
das, em particular nas deficiências de granulóci-
tos. A conjuntivite ocorre em muitos adultos com
deficiência de anticorpos. Pioderma, verrugas gra-
ves, alopecia, eczema e telangiectasia são comuns.
Os sintomas comuns incluem diarréia, malabsor-
ção e déficit de crescimento. A diarréia não é in-
fecciosa, embora possa estar associada à Giardia
lamblia, rotavírus, citomegalovírus ou Cryptos-
poridium. Em alguns pacientes, a diarréia pode
ser exsudativa, com perda de proteínas séricas e
linfócitos.
As manifestações menos comuns das imunode-
ficiências incluem anormalidades hematológicas
(anemia hemolítica auto-imune, leucopenia, trom-
bocitopenia), fenômenos auto-imunes (vasculite,
artrite, endocrinopatias) e problemas do SNC (por
exemplo, encefalite crônica, desenvolvimento len-
to e convulsões).
Diagnóstico
Uma história familiar deve ser obtida. Se hou-
ver uma história de morte precoce, doença similar,
doença auto-imune, alergia, doença maligna pre-
coce ou consangüinidade, então um mapa genealó-
gico ajudará a identificar um padrão hereditário. A
história de reações adversas para imunizações ou
infecções virais devem ser anotadas, assim como
as cirurgias prévias (por exemplo, esplenectomia,
tonsilectomia ou adenoidectomia), radioterapia do
timo ou nasofaringe e terapias prévias com anti-
bióticos e imunoglobulina (Ig), incluindo seus be-
nefícios clínicos aparentes.
O tipo de infecão pode sugerir a natureza da
imunodeficiência. As infecções pelos principais
microrganismos Gram-positivos (pneumococos, es-
treptococos) são observadas nas imunodeficiências
de anticorpos (células B). As infecções graves por
vírus, fungos e outros microrganismos oportunis-
tas são comuns nas imunodeficiências celulares
(células T). As infecções recorrentes por estafilo-
cocos e bactérias Gram-negativas são comuns em
deficiências fagocitárias. A infecção recorrente por
Neisseria é característica em pacientes com defi-
ciências de vários componentes do complemento.
Determinadas infecções oportunistas (por exemplo,
por P. carinii, Cryptosporidium ou Toxoplasma) po-
dem ocorrer em vários tipos de imunodeficiências.
A idade do início da doença também pode au-
xiliar no diagnóstico; crianças pequenas com <
6 meses de idade usualmente apresentam um de-
feito de células T. Entretanto, o início da doença
em torno dos 6 meses de idade, quando os
anticorpos adquiridos da mãe através da placen-
ta desapareceram, sugere deficiência congênita
de anticorpo.
No exame físico, os pacientes com imunodefi-
ciência, parecem estar cronicamente doentes, com
palidez, mal-estar, desnutrição e abdome distendi-
do. A pele pode apresentar erupções maculares, ve-
sículas, pioderma, eczema, petéquias, alopecia ou
telangiectasias. A conjuntivite é comum, particular-
mente em adultos. Os linfonodos cervicais, adenói-
des e tecido tonsilar estão tipicamente ausentes nas
imunodeficiências de células B ou T, apesar de uma
história de infecções recorrentes da garganta. Estes
dados podem ser confirmados por uma radiografia
lateral da faringe, que pode demonstrar a ausência
de adenóides. Ocasionalmente, os linfonodos estão
aumentados e supurados. Com freqüência, as mem-
branas timpânicas estão lesadas ou perfuradas. As
narinas podem estar escoriadas e com crostas, indi-
cando a presença de secreção nasal purulenta. Pode
haver corrimento nasal e diminuição do reflexo de
vômito. Muitas vezes, ocorre tosse crônica.
Estertores estão presentes com freqüência, especial-
mente em adultos. O fígado e o baço freqüentemen-
te estão aumentados. A massa muscular está dimi-
nuída, assim como os depósitos de gordura nas ná-
degas. Em bebês, pode haver escoriações perianais
como resultado da diarréia crônica. O exame neuro-
lógico pode revelar retardo nas diversas etapas do
desenvolvimento ou ataxia.
Uma constelação característica de achados per-
mite que se faça uma tentativa de diagnóstico clíni-
co, em uma série de síndromes por imunodefi-
ciências: recém-nascidos com síndrome de DiGiorge
que apresentam infecções, tetania, fácies peculiar e
cardiopatia congênita; meninos com síndrome de
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CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1013
Wiskott-Aldrich, que apresentam infecções piogêni-
cas, eczema e manifestações de sangramento; crian-
ças com ataxia-telangiectasia portadoras de infecções
sinopulmonares recorrentes, ataxia e telangiectasia; e
meninas ruivas com variante de Job da síndrome de
hiper-IgE, que apresentam pele clara, eczema e in-
fecções estafilocócicas recorrentes. Estes distúrbios
serão discutidos adiante e na TABELA 147.4.
Testes laboratoriais
Em todos os casos de imunodeficiências, os
testes selecionados são necessários para confir-
mar ou estabelecer os diagnósticos; os testes
avançados são freqüentemente necessários para
subclassificar o distúrbio necessário para ra-
dioterapia (ver TABELA 147.5). Testes de tria-
gem podem ser realizados na maioria dos con-
TABELA 147.4 – PADRÕES CLÍNICOS CARACTERÍSTICOS EM ALGUNS DISTÚRBIOS
DE IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS
Grupo etário Características Diagnóstico
Hipocalcemia, cardiopatia, fácies incomum
Cianose, cardiopatia, fígado de linha média
União retartada do cordão umbilical, leucocito-
se, infecções recorrentes
Diarréia, pneumonia, sapinho, falha de desen-
volvimento
Erupção maculopapular, alopecia, linfadenopa-
tia, hepatosplenomegalia
Melena, ouvidos com secreção, eczema
Albinismo oculocutâneo, infecções recorrentes,
neutropenia
Infecções piogênicas recorrentes, sepse
Gengivite crônica, úlceras aftosas recorrentes e
infecções cutâneas, neutropenia grave
Mononucleose infecciosa progressiva grave
Doença paralítica após imunização oral para pólio
Infecções estafilocócicas cutâneas e sistêmicas
recorrentes, caracterísiticas faciais grosseiras
Sapinho persistente, distrofia das unhas, endo-
crinopatias
Dermatomiosite progressiva com encefalopatia
por echovírus crônica
Infecções sinopulmonares, deterioração neuro-
lógica, telangiectasia
Linfadenopatia, dermatite, obstrução antral, pneu-
monias, osteomielite de ossos pequenos
Meningitepor Neisseria recorrente
Infecções sinopulmonares, malabsorção, esple-
nomegalia, auto-imunidade
Síndrome de DiGeorge
Asplenia congênita
Síndromes de deficiência de ade-
são de leucócitos
Imunodeficiência combinada grave
Imunodeficiência combinada gra-
ve com doença do enxerto versus
hospedeiro
Síndrome de Wiskott-Aldrich
Síndrome de Chédiak-Higashi
Deficiência de C3
Neutropenia congênita grave
Síndrome linfoproliferativa ligada
ao cromossomo X
Agamaglobulinemia ligada ao cro-
mossomo X
Síndrome de hiperimunoglobulina E
Candidíase mucocutânea crônica
Agamaglobulinemia ligada ao cro-
mossomo X
Ataxia-telangiectasia
Doença granulomatosa crônica
Deficiência de C5, C6, C7 ou C8
Imunodeficiência variável comum
Adaptado a partir de Stiehm ER, Conley ME: “Immunodeficiency diseases: general considerations,” in Immunologic
Disorders in Infants and Children, 4» ed., editado por ER Stiehm. Philadelphia, WB Saunders Company, 1996, p.212;
utilizado com permissão.
Recém-nascidos e bebês
< 6 meses de idade
Bebês e crianças de 6
meses a 5 anos de
idade
Crianças > 5 anos de ida-
de e adultos
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1014 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
TABELA 147.5 – TESTES LABORATORIAIS EM IMUNODEFICIÊNCIA
Testes de triagem Testes avançados Pesquisa/testes especiais
Fenotipagem avançada de células B
Biópsias: por exemplo, linfonodos
Respostas de anticorpos a
antígenos especiais: por
exemplo, φX, KLH
Sobrevida de Ig in vivo
Níveis de Ig secretora
Síntese de Ig in vitro
Análise de ativação celular
Análise de mutação
Fenotipagem avançada de célula T
Ensaios de citocina e receptor: por
exemplo, IL-2, IFN-γ, FNT-α
Ensaios citotóxicos: por exemplo,
NK, CCDA, LTC
Ensaios enzimáticos: por exemplo,
ADA, FNP
Biópsias: por exemplo, pele,
fígado, timo
Ensaios de hormônios tímicos
Análise de ativação celular
Análise de mutação
Ensaios de adesão molecular: por
exemplo, CD11b/CD18, ligante
de selectina
Janela cutânea de Rebuck
Deformação, aderência e
agregação
Metabolismo oxidativo
Ensaios enzimáticos: por exemplo,
MPO, G6PD, NADPH oxidase
Análise de mutação
Atividade da via alternativa
Ensaios funcionais: por exemplo,
fator quimiotático, aderência
imune
Sobrevida do componente in vivo
Análise do alotipo C
Enumeração de células B (CD19 ou
CD20)
Níveis de subclasse de IgG
Níveis de IgD e IgE
Títulos de Ac naturais, por exemplo,
antiestreptolisina O, Escherichia coli
Respostas de Ac a novas vacinas:
por exemplo, vacinas tifóide,
pneumocócica
Radiografia faríngea lateral para
tecido adenóide
Enumeração de subgrupos de
células T (CD3, CD4, CD8)
Respostas proliferativas a mitógenos,
antígenos, células alogênicas
Tipagem de HLA
Análise cromossômica
Quimioluminescência
“Turnover” de leucócitos
Morfologia especial
Mobilidade ao acaso e quimiotaxia
Ensaios de fagocitose
Ensaios bactericidas
Ensaios opsônicos
Ensaios de componente
Ensaios de ativação: por exemplo,
C3a, C4a, C4d, C5a
Deficiência de células B
Níveis de IgG, IgM, IgA
Títulos de isoaglutinina
Resposta de Ac a
antígenos de vacinas:
por exemplo, tétano,
difteria, rubéola,
Haemophilus influenzae
Deficiência de células T
Contagem e morfologia
de linfócitos
Radiografia torácica para
o tamanho tímico*
Testes cutâneos tardios:
por exemplo,
Trichophyton, caxumba,
Candida, toxóide
tetânico, painel
multiteste
Deficiência de células
fagocitárias
Contagem de leucócitos,
morfologia
Teste de corante NBT
Nível de IgE
Deficiência de complemento
Atividade de CH50
Nível de C3
Nível de C4
* Apenas em bebês.
Ig = imunoglobulina; Ac = anticorpo; φX = antígeno fago; KLH = antígeno de hemocianina de lampreia (“keyhole-
limpet hemocyanim”); IL = interleucina; IFN = interferon; FNT = fator de necrose tumoral; NK = “natural killer”;
CCDA = citotoxicidade celular dependente de anticorpo; LTC = linfócito T citotóxico; ADA = adenosina desaminase;
PNP = nucleosídeo fosforilase da purina; NBT = tetrazólio nitroazul; MPO = mieloperoxidase; NADPH = dinucleotídeo
de nicotinamida adenina fosfato; CH50 = complemento hemolítico; C = complemento.
A partir de Stiehm ER: Immunologic Disorders in Infants and Children, 4» ed. Philadelphia, WB Saunders Company,
1996, p. 213; utilizado com permissão.
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CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1015
sultórios e hospitais, e os testes avançados, na
maioria dos grandes centros hospitalares; por
outro lado, os testes especializados podem ser
realizados apenas em laboratórios ou hospitais
que possuam equipamentos sofisticados para
imunologia clínica.
Quando houver suspeita de uma imunodeficiên-
cia, os testes laboratoriais de triagem recomenda-
dos incluem hemograma com contagem diferen-
cial de leucócitos e contagem de plaquetas; deter-
minação dos níveis de IgG, IgM e IgA; avaliação
da função de anticorpo e avaliação clínica e labo-
ratorial da infecção.
O hemograma estabelecerá anemia, trombocito-
penia, neutropenia ou leucocitose. A contagem total
de linfócitos deve ser observada, sendo que a pre-
sença de linfopenia (< 1.500/µL) é sugestiva de imu-
nodeficiência de células T. O esfregaço periférico
deve ser examinado quanto a corpúsculos de Howell-
Jolly e outras formas de hemácias incomuns sugesti-
vas de asplenia ou função esplênica deficiente. Os
granulócitos podem demonstrar anormalidades mor-
fológicas (por exemplo, grânulos da síndrome de
Chédiak-Higashi).
Apesar dos níveis de imunoglobulinas (Ig) tam-
bém constituírem uma parte da triagem inicial,
os níveis de IgD e IgE inicialmente não são de-
terminados. Os níveis de Ig devem ser interpre-
tados cuidadosamente, tendo em vista as altera-
ções acentuadas com relação à idade; todos os
bebês entre 2 e 6 meses de vida são hipogama-
globulinêmicos em relação aos padrões estabe-
lecidos para adultos. Sendo assim, os níveis de-
vem ser comparados com aqueles de controles
da mesma idade. Em geral, os níveis de Ig dentro
de 2 desvios padrão para a idade são considera-
dos normais. Um nível de Ig total (IgG + IgM +
IgA) > 600mg/dL ou um nível de IgG > 400mg/dL
com testes normais de avaliação funcional de
anticorpos exclui uma deficiência de anticorpos.
Um nível de Ig total < 200mg/dL comumente
indica significativa deficiência de anticorpos. Ní-
veis intermediários (isto é, níveis de IgG entre
200 e 400mg/dL e Ig totais entre 400 e 600mg/dL)
não são diagnósticos e devem ser correlaciona-
dos com testes funcionais para anticorpos.
Os testes de triagem de anticorpos também são
recomendados durante o exame inicial. A função
de IgM é estimada pelos títulos de isoaglutininas
(anti-A e/ou anti-B). Todos os pacientes, exceto
bebês < 6 meses e pessoas pertencentes ao grupo
sangüíneo AB, terão anticorpos naturais em títu-
los de 1:8 (anti-A) ou 1:4 (anti-B) ou acima destes
valores. Os anticorpos para estes e certos polis-
sacarídeos bacterianos estão seletivamente dimi-
nuídos em certos distúrbios (por exemplo, síndro-
me de Wiskott-Aldrich, deficiência de IgG2). No
paciente imunizado, os títulos de anticorpos con-
tra Haemophilus influenzae Tipo B, hepatite B,
vírus do sarampo, tétano ou antígenos diftéricos
podem ser utilizados para estimar a função de
IgG. Uma resposta de anticorpos adequada a um
ou mais destes antígenos constitui uma evidência
contra a deficiência de anticorpos. Finalmente, a
triagem deve incluir uma pesquisa de infecções
crônicas. A VHS com freqüência é elevada, em
geral proporcional ao grau de infecção. Exames
radiológicos apropriados (tórax, seios da face) e
culturas devem ser realizados.
Geralmente, se os resultados de todos os testes
de triagem estiverem normais, a presença de imu-
nodeficiências (particularmente a deficiência de
anticorpo) pode ser excluída. Entretanto, se fordo-
cumentada uma infecção crônica, se a história for
incomumente suspeita ou se os resultados dos tes-
tes de triagem forem positivos, devem ser realiza-
dos testes avançados.
Testes para deficiência de células B (anticor-
po) – Se os níveis de Ig estiverem muito baixos
(total < 200mg/dL), um diagnóstico de deficiên-
cia de anticorpos é estabelecido e outros proce-
dimentos são indicados somente para definir a
enfermidade exata e identificar outros defeitos
imunológicos. Se os níveis de Ig e os títulos de
anticorpos preexistentes estiverem baixos, mas
não ausentes, deve-se avaliar a resposta de anti-
corpo a um ou mais antígenos padronizados. Os
títulos de anticorpos são determinados antes e 3
a 4 semanas após a imunização com vacinas para
toxóide tetânico ou H. influenzae Tipo B (para a
responsividade a Ag proteico) ou após a imuni-
zação com vacina de pneumococos ou meningo-
cócica (para a responsividade a antígeno polis-
sacarídico). Uma resposta inadequada (elevação
do título menor do que 4 vezes os valores ini-
ciais) é sugestiva de deficiência de anticorpo,
independentemente dos níveis de Ig.
Se os níveis de Ig estiverem baixos, a quantifi-
cação das células B é realizada pelo cálculo da por-
centagem de linfócitos que reagem com anticorpos
fluorescentes a antígenos específicos de células B
(por exemplo, CD19, CD20), conforme avaliado
pela citometria de fluxo. Normalmente, 10 a 20%
dos linfócitos do sangue periférico são membrana
de superfície Ig-positiva (células B).
A seguir, devem ser obtidos os níveis de soro
das subclasses de IgG, IgD e IgE. Os níveis da
subclasse IgG1 (como os níveis de IgG) são in-
tensamente dependentes da idade. Em geral, após
os 2 anos de idade, devem estar presentes níveis
de IgG1 < 250mg/dL, de IgG2 < 50mg/dL, de IgG3
< 25mg/dL ou de IgG4 não detectável para diagnos-
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1016 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
ticar uma deficiência da subclasse de IgG. Níveis
altos e baixos de IgD e IgE são comuns nas sín-
dromes de deficiência incompleta dos anticorpos.
Os níveis de IgE são altos em distúrbios quimio-
táticos, imunodeficiências parciais de células T,
distúrbios alérgicos e parasitários. As ausências
isoladas de IgG4, IgD e IgE não são clinicamente
importantes.
Outros testes de laboratório para deficiências de
células B estão indicados em certas circunstâncias
(ver TABELA 147.5). Uma biópsia de linfonodos (al-
gumas vezes precedida por imunização na extremi-
dade adjacente) é indicada na presença de linfadeno-
patia, para excluir malignidade ou infecção. As deter-
minações da subclasse de IgG estão indicadas se os
níveis de IgG não estiverem normais ou próximos
do normal, mas a função de anticorpo for deficiente.
As deficiências seletivas de uma das quatro subclasses
podem estar presentes. Caso se suspeite de catabo-
lismo rápido de IgG ou perda desta através da pele
ou do trato GI, um estudo de sobrevida de IgG pode
estar indicado. Se o paciente apresentar níveis bai-
xos de IgG, administra-se uma dose alta de Ig IV e os
níveis de IgG devem ser medidos diariamente para
determinar a meia-vida. Se as infecções locais fo-
rem graves, os níveis de Ig nas secreções (por exem-
plo, lágrimas ou saliva) podem ser medidos. A sínte-
se de IgG in vitro e a resposta de anticorpo a antíge-
nos especiais (por exemplo, antígeno fago [φx] ou
hemocianina de lampreia) são avaliadas para deter-
minar a localização exata do bloqueio sintético. Numa
enfermidade na qual o defeito genético foi identifi-
cado, o gene mutante ou produto do gene mutante
pode ser identificado (por exemplo, gene Btk [tirosi-
na cinase de Burton] na agamaglobulinemia ligada
ao X) por testes de laboratório especiais.
Testes para deficiência de células T – A pre-
sença de linfopenia profunda e prolongada é su-
gestiva da imunodeficiência de células T; entretan-
to, a linfopenia usualmente não está presente.
A radiografia de tórax constitui um teste de tria-
gem útil em bebê; uma sombra tímica ausente no
período de recém-nascido é sugestiva de deficiên-
cias de células T, particularmente se uma radiogra-
fia for obtida antes do início da infecção ou de ou-
tro estresse que possa retrair o timo.
Os testes cutâneos para a hipersensibilidade tar-
dia são testes de triagem valiosos após os 2 anos de
idade. São empregados os seguintes antígenos: da
caxumba, Candida (1:100), toxóide tetânico solú-
vel (1:10) e Trichophyton. Quase todos os adultos
e a maioria dos bebês e crianças imunizados reagi-
rão a um ou mais destes antígenos com eritema e
induração (> 5mm) após 48h. A presença de um ou
mais testes cutâneos tardios positivos geralmente
indica um sistema de células T intacto.
O teste avançado mais freqüentemente disponí-
vel para avaliação de imunodeficiências celulares
é a quantificação de células T e subtipos T (auxi-
liar/indutor e supressor/citotóxico), feita geralmente
por citometria de fluxo, utilizando-se anticorpos
monoclonais específicos para células T obtidos de
camundongo. As células T totais são enumeradas
utilizando-se um pan-anticorpo de célula T (por
exemplo, anti-CD3, anti-CD2), as células T “hel-
per”/indutora são enumeradas utilizando-se um an-
ticorpo anti-CD4; e as células supressora/citotóxi-
ca são medidas utilizando-se um Ac anti-CD8. (Tais
ensaios, em geral, substituíram as técnicas de for-
mação de rosáceas com eritrócito de carneiro para
enumerar as células T.) A contagem de células T
auxiliar (CD4) < 500 células/µL é altamente su-
gestiva de uma imunodeficiência de célula T e uma
contagem de CD4 < 200 células/µL indica imuno-
deficiência profunda de células T. A proporção de
células CD4/CD8 (auxiliar/supressora) deve ser >
1,0; a inversão desta proporção também sugere a
imunodificiência de células T (por exemplo, na
AIDS, redução na proporção de CD4/CD8 indica
piora imunológica progressiva). Também estão dis-
poníveis anticorpos monoclonais para identificar
antígenos de células ativadas (CD25), de células
exterminadoras naturais (CD16 e CD56) e de célu-
la T imatura (timócito) (CD1).
Outro teste avançado muito útil mede a capaci-
dade dos linfócitos proliferarem e aumentarem de
tamanho (transformação) quando cultivados na pre-
sença de mitógenos (por exemplo, fito-hemaglu-
tinina, concanavalina A), de leucócitos alogênicos
irradiados (nas reações mistas de leucócitos) ou de
antígenos aos quais o paciente foi exposto previa-
mente. Sob estes estímulos, os linfócitos normais
sofrem divisão rápida, que pode ser avaliada mor-
fologicamente ou pela captação de timidina radio-
ativa pelas células em divisão. Geralmente, a pro-
liferação é expressa sob a forma de um índice – a
relação entre contagens por minuto das células esti-
muladas e as contagens por minuto de um número
igual de células não estimuladas. Os pacientes com
imunodeficiências de células T apresentam respos-
tas proliferativas diminuídas ou ausentes, propor-
cionais ao grau de comprometimento imunológi-
co. As respostas proliferativas a mitógenos (que
ativam todas as células) são consideravelmente
mais altas (índice de estimulação, 50 a 100) do que
a resposta a antígenos ou células alogênicas (índi-
ce de estimulação, 3 a 30).
Testes especiais também avaliam a produção de
linfocinas após estimulação por mitógenos ou por
antígenos. Embora haja > 30 linfocinas descritas,
o interferon-γ, a interleucina-2, a interleucina-4 e o
fator de necrose tumoral α são os mais freqüente-
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351016
CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1017
mente avaliados. Certos pacientes apresentam res-
postas proliferativas adequadas, porém produção
deficiente de linfocinas (por exemplo, deficiência
de fator de inibição da imigração na candidíase
mucocutânea crônica). Outros testes avaliam a fun-
ção citotóxica. Os diferentes tipos de citotoxicidade
(exterminadoras naturais, dependentedo anticor-
po ou células T citotóxicas) são quantificados uti-
lizando-se diferentes células tumorais ou células-
alvo infectadas por vírus. Os defeitos citotóxicos
estão presentes de modo variável nas imuno-
deficiências celulares. Em algumas formas de imu-
nodeficiência combinada, as enzimas da via das
purinas (adenosina desaminase, nucleotídeo fosfo-
rilase) estão deficientes e podem ser avaliadas por
hemácias. Os níveis de vários hormônios tímicos
(timosina, fator tímico sérico) podem ser analisa-
dos; estes são baixos em certas imunodeficiências
celulares. A tipagem do HLA pode ser valiosa para
avaliação da presença de duas populações celula-
res (quimerismo) e para excluir deficiências do
antígeno de HLA (síndrome do linfócito nu).
Uns poucos defeitos da ativação da célula T fo-
ram identificados e são analisados pela avaliação
da integridade do receptor da célula T e da via do
sinal de transdução.
Testes para deficiência de fagócitos – A inves-
tigação está indicada quando um paciente com uma
história sugestiva de imunodeficiência possuir imu-
nidade normal de células B e T. A ausência de for-
mação de secreção purulenta no local da inflama-
ção e retardo na queda do cordão umbilical com
leucocitose marcante são indicações sugestivas de
um defeito quimiotático.
Além da contagem de células sangüíneas, a tria-
gem inicial deve incluir o nível de IgE, que é elevado
em muitos distúrbios quimiotáticos e o teste de redu-
ção do corante tetrazólio nitroazul (NBT) para o
diagnóstico da doença granulomatosa crônica, o dis-
túrbio de fagocitose mais comum. O teste do NBT
baseia-se no aumento da atividade metabólica de gra-
nulócitos durante a fagocitose e a morte com redução
do NBT incolor para o radical formazan, que é azul.
Esta mudança de cor, ausente na doença granuloma-
tosa crônica, pode ser analisada visual, microscopi-
camente, ou por espectrofotometria.
O primeiro teste especial é a coloração dos gra-
nulócitos pela mieloperoxidase, fosfatase alcalina ou
esterase. A ausência de coloração para estas enzi-
mas deve ser seguida por ensaios quantitativos. A
seguir, o movimento celular pode ser analisado usan-
do-se a técnica da janela cutânea de Rebuck, na qual
a pele é submetida a uma abrasão superficial com
bisturi, sendo então colocadas lamínulas no local
afetado; estas são removidas e recolocadas em in-
tervalos determinados e coradas para pesquisa de
células migrantes. Nas duas primeiras horas, deve
ocorrer um influxo inicial de células polimorfonu-
cleares, que são substituídas por monócitos em 24h.
Uma anormalidade de quimiotaxia pode ser con-
firmada por um ensaio in vitro, no qual a migração
de granulócitos ou monócitos é medida, utilizan-
do-se uma câmara especial para quimiotaxia
(Boyden) ou uma placa de agarose; é analisado o
movimento celular em direção a um agente qui-
mioatraente (por exemplo, zimosan opsonizado).
A seguir, a fagocitose é avaliada pela medida da
captação de partículas de látex ou bactérias por gra-
nulócitos ou monócitos isolados. A morte micro-
biana é analisada misturando-se os granulócitos do
paciente em soro fresco com um número conheci-
do de bactérias vivas, seguindo-se testes bacteria-
nos quantitativos sucessivos durante um período
de 2h.
Outros testes especializados definem os defei-
tos de fagocitose: ensaios de mobilização granu-
locítica após administração de corticosteróides,
adrenalina ou endotoxina; testes quantitativos para
enzimas de granulócitos (mieloperoxidase, G6PD,
etc.); métodos para produtos de granulócitos oxi-
dativos (peróxido de hidrogênio, superóxidos) e mé-
todos para proteínas granulocíticas específicas (gli-
coproteínas adesivas CR3 [CD11], componentes de
nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato
oxidase). O último pode ser distinguido dos quatro
tipos genéticos de doença granulomatosa crônica.
Testes para deficiência de complemento – Uma
anormalidade de complemento é triada pela medi-
da da atividade do complemento sérico total (CH
50 ) e de níveis séricos de C3 e C4. Níveis baixos de
qualquer um destes componentes deve ser segui-
dos da titulação das vias clássica e alternativa do
complemento e da medida dos componentes indivi-
duais do complemento. A deficiência dos compo-
nentes da via clássica é associada também a doença
renal imunológica, reações de doenças séricas ou
infecções agudas. Anti-soros monoespecíficos ou
hemácias sensibilizadas e soluções que contenham
todos os componentes, com exceção daquele que es-
tiver sendo analisado, são utilizados para se medir
os componentes do complemento.
Também estão disponíveis anti-soros para me-
dir as proteínas de controle do complemento.
A deficiência do inibidor C1 está associada ao an-
gioedema hereditário e a deficiência do Fator I (ini-
bidor de C3) está associada à deficiência de C3 com
hipercatabolismo de C3. Os ensaios de atividade
opsônica sérica, atividade quimiotática sérica ou
atividade bactericida sérica podem ser usados para
testar indiretamente a função do complemento. Para
uma discussão detalhada do sistema complemen-
to, ver Capítulo 146.
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1018 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
Prevenção
A prevenção das imunodeficiências primárias
limita-se ao aconselhamento genético quando são
conhecidos os padrões da herança genética. O diag-
nóstico pré-natal, utilizando cultura de células
amnióticas ou sangue fetal, só é exeqüível em al-
guns destes distúrbios, incluindo a agamaglobu-
linemia ligada ao cromossomo X, a síndrome de
Wiskott-Aldrich, a maioria das formas de imuno-
deficiência grave combinada, deficiência de ade-
nosina desaminase e doença granulomatosa crôni-
ca. A determinação do sexo também pode ser utili-
zada para exclusão dos distúrbios ligados ao cro-
mossomo X. Em vários desses distúrbios, pode-se
detectar a herança heterozigota.
Prognóstico
A maioria das imunodeficiências primárias é
genética em origem e para a vida toda. O prognós-
tico é altamente variável (ver TABELA 147.6), mas
algumas imunodeficiências são curáveis pelo
transplante de linhagem celular. A maioria dos pa-
cientes com deficiências de anticorpo ou deficiên-
cia de complemento possui bom prognóstico, com
um ciclo de vida próximo do normal, uma vez que
eles foram diagnosticados precocemente, são tra-
tados regularmente e não possuem uma doença
crônica concomitante (por exemplo, doença pul-
monar). Outros pacientes imunodeficientes, por
exemplo, aqueles com distúrbios fagocitários, com
distúrbios combinados ou com distúrbios de anti-
corpos com infecção crônica, possuem um
prognóstico cuidadoso por toda a vida; a maioria
é cronicamente doente e necessita de tratamento
intensivo (por exemplo, Ig IV, antibióticos, dre-
nagem postural, operações, etc.). Alguns pacien-
tes imunodeficientes possuem um prognóstico
muito ruim para a continuidade da vida (aqueles
com ataxia-telangiectasia, imunodeficiência com-
binada grave não transplantados).
Duas fundações para apoio ao paciente com
imunodeficiência, educação e pesquisa são a Jeffrey
Modell Foundation (1-800-JEFF-844) e a Immune
Deficiency Foundation (1-800-296-4433).
Tratamento
O tratamento geral dos pacientes com imunodefi-
ciência necessita de uma quantidade extraordinária
de cuidados para se manter um estado ótimo de saúde
e nutrição, tratamento de infecções (ver Cap. 151),
prevenção de problemas emocionais relacionados à
sua doença e disponibilidade financeira para custear
o tratamento médico. Devem ser protegidos de expo-
sições desnecessárias às infecções, dormir em suas
próprias camas e, preferencialmente, ter seus próprios
quartos. Vacinas mortas devem ser dadas regularmen-
te, se houver evidência de alguma função de anticor-
po. Os dentes devem ser mantidos em bom estado de
conservação.
Os antibióticos são fundamentais para o trata-
mento de infecções; seleção e dosagem são idênti-
casàquelas normalmente utilizadas. Entretanto,
como muitos pacientes imunodeficientes podem
sucumbir rapidamente à infecção, a febre ou ou-
tras manifestações de infecção devem ser conside-
radas secundárias a infecções bacterianas, deven-
do-se iniciar imediatamente o tratamento com an-
tibióticos. Culturas de orofaringe, sangue ou ou-
tras devem ser colhidas antes da maioria das tera-
pias; elas são especialmente úteis quando a infec-
ção não responde ao antibiótico inicial e quando o
organismo infeccioso for incomum.
Em geral, a profilaxia contínua com antibióticos
é benéfica, particularmente quando houver risco de
TABELA 147.6 – PROGNÓSTICO NAS IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS
Prognóstico ruim1 Prognóstico reservado2 Prognóstico bom3
Imunodeficiência Imunodeficiência variável Hipogamaglobulinemia
combinada grave4 comum transitória
Outras imunodeficiências Síndrome de hiper-IgM4 Agamaglobulinemia ligada
combinadas Doença granulomatosa ao cromossomo X
Síndrome de Wiskott-Aldrich4 crônica4 Deficiência seletiva de IgA
Ataxia-telangiectasia Síndrome de DiGeorge4 Candidíase mucocutânea crônica
Deficiência de aderência Síndrome de hiper-IgE Deficiência de subclasse de IgG
leucocitária4 Deficiências de complemento
Síndrome linfoproliferativa
ligada ao cromossomo X4
1
 Ciclo de vida acentuadamente diminuído. 3 Ciclo de vida normal com terapia ótima.
2
 Ciclo de vida freqüentemente diminuído. 4 Curável por transplante.
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CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1019
superinfecção súbita (por exemplo, síndrome de
Wiskott-Aldrich, síndromes asplênicas); quando
outras formas de imunoterapia não estiverem dis-
poníveis (por exemplo, nos distúrbios de fagocito-
se) ou forem insuficientes (por exemplo, infecções
recorrentes na agamaglobulinemia, apesar da tera-
pia com Ig) e quando houver alto risco de uma in-
fecção específica (por exemplo, P. carinii nos dis-
túrbios de imunodeficiências celulares).
Os antivirais, inclusive amantadina ou rimanta-
dina para gripe, aciclovir para infecção por herpes
(inclusive varicela zóster) e ribavirina para vírus
sincicial respiratório, podem ser fundamentais para
pacientes imunodeficientes com infecções virais.
A imunoglobulina (Ig) é uma terapia de reposi-
ção eficaz na maioria das formas de deficiência de
anticorpos. Ela é uma solução a 16,5% de IgG com
quantidades mínimas de IgM e IgA IM ou para inje-
ção subcutânea, ou uma solução a 3 a 12% para infu-
são IV (IgIV). A dose de carga usual é 200mg/kg
(1,4mL/kg da preparação a 16,5% ou 400mg/kg
[8mL/kg] de uma preparação a 5%) administrada
em 2 ou 3 doses durante 2 a 5 dias, seguidas de in-
tervalos mensais por 100mg/kg (0,7mL/kg da solu-
ção a 16,5% ou 200mg/kg [4mL/kg] da solução a 5%).
Doses menores são ineficazes. Uma vez que uma dose
de IgG de 100mg/kg aumenta o nível deprimido de
IgG sérica em apenas 100mg/dL, alguns pacientes
precisam de doses maiores ou mais freqüentes.
A maior dose IM em um ponto é de 10mL, em adul-
tos e 5mL, em crianças; do mesmo modo, injeções
múltiplas em vários pontos podem ser necessárias.
Altas doses de IgIV (400 a 800mg/kg/mês) podem
ser administradas e são benéficas para alguns pacien-
tes deficientes em anticorpos que não respondem bem
às doses convencionais, particularmente aqueles com
doença pulmonar crônica. O propósito com IgIV de
alta dosagem é manter os níveis deprimidos de IgG
na variação normal (isto é, > 500mg/dL). As infu-
sões subcutâneas lentas de IG ou 10% de IgIV ad-
ministradas em intervalos semanais também têm sido
usadas para administrar uma terapia de alta dosa-
gem Ig (isto é, > 400mg/kg/mês).
O plasma tem sido utilizado como uma alterna-
tiva para Ig, mas devido ao risco de transmissão de
doenças, seu uso é raramente indicado. O plasma
contém muitos fatores além das Ig, apresentando um
valor especial em pacientes com enteropatia com
perda de proteínas, deficiências de complemento e
diarréia refratária. O plasma deficiente de IgA tem
sido utilizado, com êxito, em pacientes agudamente
sensíveis à IgA contida nas preparações de Ig.
Outras terapias, inclusive drogas imunoestimu-
ladoras (levamisol, isoprinosina), substâncias bio-
lógicas (fator de transferência, interleucinas,
interferons) e hormônios (tímicos) têm apresenta-
do valor limitado no tratamento das imunodeficiên-
cias celulares ou fagocitárias. A reposição de en-
zimas com adenosina desaminase bovina conju-
gada a polietilenoglicol (PEG-ADA) tem benefi-
ciado alguns pacientes com deficiência de adeno-
sina desaminase.
O transplante de células-tronco, usualmente
pelo transplante de medula óssea, pode freqüente-
mente atingir a correção completa de imunodeficiên-
cia (ver também Cap. 149). Na imunodeficiência
combinada grave e suas variantes, o transplante de
medula óssea entre irmãos HLA-idênticos, que apre-
sentam uma reação de cultura mista de leucócitos
negativa, resultou na restauração de imunidade em
> 300 casos. Em pacientes com imunodeficiência
celular intacta ou parcial (por exemplo, síndrome de
Wiskott-Aldrich), deve ser realizada uma imunos-
supressão prévia para assegurar o enxerto. Quando
não houver disponibilidade de um irmão doador
compatível, pode ser tentado o transplante de me-
dula óssea de um doador haploidêntico (semi-idên-
tico), de um dos pais. Nestas circunstâncias, as cé-
lulas T maduras que podem causar doença do en-
xerto versus hospedeiro devem ser removidas da me-
dula óssea do doador antes de sua administração.
Esta remoção pode ser realizada por aglutinação com
lectina de soja, ou pelo uso de anticorpos monoclo-
nais da célula T. Alternativamente, a medula óssea
de uma pessoa semelhante, mas não familiar, iden-
tificada pelo Registro Internacional de Transplante
de Medula Óssea, pode ser usada. O sangue de cor-
dão umbilical de um irmão HLA-idêntico também
pode ser usado como fonte de células-tronco, ou um
cordão de sangue HLA-compatível de banco. Estes
procedimentos especializados estão disponíveis ape-
nas em alguns centros.
O timo fetal, timo de cultura neonatal, célula
epitelial tímica e transplante de fígado fetal oca-
sionalmente são bem-sucedidos, em particular os
transplantes de timo fetal na síndrome DiGeorge.
Precauões – Os pacientes com imunodeficiên-
cias de célula B ou T não devem receber vacinas
vivas (por exemplo, poliovírus, sarampo, caxumba,
rubéola, BCG) devido ao risco da enfermidade in-
duzida pela vacina e os membros da família não de-
vem receber vacina de poliovírus vivos. Os pacien-
tes com imunodeficiência celular não devem rece-
ber produtos de sangue fresco que podem conter lin-
fócitos intactos devido ao risco da doença do enxer-
to versus hospedeiro; sendo assim, o sangue total ou
frações de sangue (por exemplo, hemácias, plaque-
tas, granulócitos e plasma) devem ser irradiados (15
a 30Gy) antes de serem infundidos. Os pacientes tam-
bém devem receber produtos do sangue de doado-
res anticorpos-negativos para citomegalovírus. A Ig
ou plasma usualmente não são administrados em
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1020 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
pacientes com deficiência de IgA seletiva, porque os
anticorpos anti-IgA podem desenvolver ou causar rea-
ções. Os pacientes com esplenomegalia devem evitar
esportes de contato. Os pacientes com trombocito-
penia devem evitar injeções IM (por exemplo, Ig).
Os antibióticos devem ser administrados no momen-
to da cirurgia ou tratamento odontológico.
IMUNODEFICIÊNCIAS
ESPECÍFICAS
HIPOGAMAGLOBULINEMIA
TRANSITÓRIA DA INFÂNCIA
É uma deficiência de anticorpos autolimitada de
ambos os sexos, com início entre 3 e 6 meses de
idade, geralmente persistindo dos 6 aos 18 meses.
Algumas vezes, há aumento de freqüência asso-
ciada a infecções. Este distúrbio resulta de um retar-
do no início da síntese de Ig, apesar da existência de
números normaisde células B. As células T auxilia-
res podem estar diminuídas. Os bebês prematuros
encontram-se especialmente em risco de desenvol-
ver doença, tendo em vista os níveis baixos de IgG
transplacentária que apresentam no nascimento. O
distúrbio não tem caráter familiar.
Tratamento
Apesar dos níveis baixos de IgG (total < 400mg/dL),
muitos destes bebês não necessitam da administra-
ção de Ig, particularmente se houver alguma evidência
de atividade funcional de anticorpos, se os níveis de
IgG estiverem aumentando e se as infecções estive-
rem ausentes ou forem de natureza comum. Os pacientes
que necessitarem de Ig devem receber doses terapêuti-
cas completas durante um período que varia de 3 a 6
meses, com reavaliação freqüente dos níveis de IgG. A
antibioticoterapia é indicada durante cada episódio in-
feccioso. A perspectiva de recuperação completa é ex-
celente. Os recém-nascidos com menos de 32 semanas
de gestação e/ou < 1.500g ao nascimento apresentam
níveis presumivelmente baixos de IgG e tem-se utili-
zado IgIV para tratar a suspeita de sepse bacteriana ou
para prevenir a infecção bacteriana nos primeiros me-
ses de vida (ver Estado Imunológico do Feto e Recém-
Nascido no Cap. 256).
DEFICIÊNCIA SELETIVA DE IgA
É a ausência ou redução acentuada (< 5mg/dL)
da IgA sérica com níveis normais de outras imu-
noglobulinas e imunidade celular intacta.
A deficiência seletiva de IgA é a imunodeficiên-
cia mais comum (e menos grave), ocorrendo freqüen-
temente em 1/400 indivíduos. Em geral, a deficiên-
cia seletiva de IgA é esporádica, embora ocasional-
mente seja familiar. Pode ocorrer como conseqüên-
cia do tratamento com fenitoína e em indivíduos com
alterações do cromossomo 18. Também pode ser
observada em familiares de pacientes com imuno-
deficiência comum variável (ver adiante).
A maioria dos pacientes é assintomática e a defi-
ciência é diagnosticada casualmente. Outros apre-
sentam infecções respiratórias recorrentes, diarréia
crônica, alergia ou doença auto-imune. Os pacien-
tes com deficiência de IgA não apresentam IgA em
suas secreções, embora possam compensar esta au-
sência pela secreção de outras Ig. Os indivíduos com
deficiência de IgA podem desenvolver anticorpos
anti-IgA como conseqüência da exposição à IgA no
plasma ou Ig; estes anticorpos podem causar rea-
ções anafiláticas quando Ig ou sangue forem admi-
nistrados subseqüentemente. Alguns pacientes com
deficiência de IgA possuem uma imunodeficiência
de subclasse de IgG2 associada; muitos desses indi-
víduos apresentam infecções recorrentes.
Tratamento
O tratamento não é necessário na maioria dos
casos. Recomenda-se o uso de bracelete para aler-
ta médico, para evitar a administração inadvertida
de Ig ou plasma com sensibilização ou reação. O
uso contínuo de antibióticos é necessário nos ca-
sos com infecções respiratórias persistentes. A te-
rapia de reposição de IgA não se encontra disponí-
vel. Geralmente, a administração de injeções de Ig
ou infusões de IgIV são contra-indicadas, embora
um pequeno número de pacientes com deficiência
de IgA associada à deficiência de subclasses de IgG
tenha respondido bem ao tratamento com Ig. Um
pequeno número de pacientes deficientes em IgA
pode apresentar remissão espontânea.
AGAMAGLOBULINEMIA
LIGADA AO CROMOSSOMO X
(Agamaglobulinemia de Bruton; Agamaglobuline-
mia Congênita)
 É pan-hipogamaglobulinemia de crianças do sexo mas-
culino, caracterizada pelos níveis de IgG < 100mg/
dL e outros níveis de Ig baixos ou ausentes, dimi-
nuição ou ausência de células B, preservação da
imunidade celular e início de infecções em algum
momento após os 6 meses de idade, quando os anti-
corpos maternos desaparecem.
Estes bebês apresentam infecções piogênicas
recorrentes nos pulmões, seios da face e ossos, cau-
sadas por microrganismos como pneumococos,
haemophilus e estreptococos. Elas também são sus-
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CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1021
cetíveis à infecção por poliovírus induzida pela va-
cina e à encefalite crônica pelos echovírus. Alguns
desses bebês apresentam artrite, que desaparece
com a terapia de Ig. Em aproximadamente 20% dos
casos foi demonstrado um tipo de herança ligada
ao cromossomo X. Um defeito do gene Btk (tirosi-
na cinase de Bruton) no Xq22 impede a diferencia-
ção de células pré-B em células B. Diferentes va-
riantes do gene defeituoso existem em cada família.
Tratamento
É essencial administrar Ig, IM ou IV, por toda a
vida, na dose mais baixa que previna a recorrência da
infecção. A administração imediata e adequada de an-
tibióticos durante cada episódio infeccioso é crucial;
algumas vezes, está indicada a antibioticoterapia con-
tínua. Apesar destas medidas, muitos pacientes desen-
volvem sinusite persistente, bronquite e bronquiecta-
sia. A suscetibilidade a neoplasias acha-se aumentada.
IMUNODEFICIÊNCIA
COMUM VARIÁVEL
(Agamaglobulinemia Adquirida)
É um distúrbio heterogêneo que ocorre igualmente em
ambos os sexos, caracterizado pelo início de infec-
ções bacterianas recorrentes, geralmente na 2» ou
3» décadas da vida, como resultado de diminuição
acentuada dos níveis de Ig e anticorpos.
A presença de números normais de células B di-
ferencia a imunodeficiência comum variável da aga-
maglobulinemia ligada ao cromossomo X. Geralmen-
te, a imunidade celular encontra-se preservada, em-
bora possa estar comprometida em alguns pacientes;
em outros, são descritas anormalidades imunorregu-
ladoras das células T, inclusive mal de Addison, ti-
reoidite e AR são comuns nestes pacientes e em seus
familiares. Diarréia, malabsorção e hiperplasia lin-
fóide nodular do trato GI algumas vezes se desenvol-
vem. O carcinoma e linfoma ocorrem em 10% dos
pacientes. Os mecanismos imunológicos variam; por
exemplo, atividade T supressora excessiva, atividade
deficiente de célula T auxiliar, defeitos intrínsecos da
função de células B e auto-anticorpos para as células
B ou T. Como na agamaglobulinemia ligada ao cro-
mossomo X, é necessária a administração de Ig du-
rante toda a vida do paciente e os antibióticos devem
ser usados para tratar cada infecção.
IMUNODEFICIÊNCIA DE HIPER-IgM
É uma imunodeficiência congênita, usualmente li-
gada ao cromossomo X, caracterizada por ní-
veis elevados de IgM, níveis diminuídos de IgG
e IgA, neutropenia intermitente, níveis normais
de célula B e suscetibilidade à infecção.
Podem estar presentes linfadenopatia e auto-imu-
nidade (por exemplo, anemia hemolítica positiva de
Coombs). A suscetibilidade aos principais patóge-
nos Gram-positivos e infecções oportunistas (inclu-
sive Pneumocystis carinii e Cryptosporidium) fica
aumentada. A maioria dos pacientes (> 70%) de-
senvolve doença hepática crônica em torno de 30
anos de idade. O defeito imunológico na forma li-
gada ao cromossomo X é uma deficiência de gp39
da célula T, o ligante para CD40 nas células B que
induz a alteração de IgM para IgA, IgG e IgE.
O gene mutado foi identificado no Xq27.
Tratamento
O tratamento é similar ao da agamaglobuline-
mia ligada ao cromosssomo X. O fator estimulante
de colônias de granulócitos pode ser usado para
neutropenia. O transplante de linhagem celular foi
bem-sucedido em alguns casos.
DEFICIÊNCIA DE SUBCLASSES
DE IgG
É uma deficiência de anticorpos associada à maior
suscetibilidade a infecções e ausência ou redu-
ção acentuada dos níveis (> 2 desvios padrão
abaixo da média por idade) de 1 ou 2 subclas-
ses de IgG, mas com níveis normais ou aumen-
tados das outras subclasses.
A maioria dos pacientes apresenta níveis de IgG
total e outros anticorpos normais ou quase normais,
mas com resposta de anticorpos diminuída a certos
antígenos. Têm-se descrito infecções respiratórias
recorrentes ou crônicas, otite média, doença pulmo-
nar crônica e meningite recorrente. Visto que a IgG1
constitui 70% da IgG total, uma deficiênciaisolada
de IgG1 está associada à pan-hipogamaglobulinemia
e não é considerada uma deficiência de subclasse. A
deficiência seletiva ou combinada de IgG2 ou IgG3,
com ou sem deficiência de IgG4, é a deficiência de
subclasse mais comum. Pacientes com deficiência
de IgG2 (seletiva ou combinada com outra defi-
ciência de subclasse) freqüentemente apresentam
respostas de anticorpos prejudicadas aos antígenos
polissacarídicos e/ou deficiência de IgA associada
(< 5mg/dL). A deficiência de IgG4 assintomática
isolada ocorre em muitas pessoas. As deficiências
de subclasse em crianças pequenas pode ser transi-
tória e desaparecer com o decorrer do tempo. Al-
guns pacientes foram descritos apresentando res-
posta debilitada a polissacarídeos, mas com os ní-
veis normais das subclasses de IgG.
Tratamento
Os pacientes com deficiências de subclasses de
IgG documentadas podem se beneficiar da IG (ver
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1022 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
Tratamento, AGAMAGLOBULINEMIA LIGADA AO
CROMOSSOMO X, anteriormente)
SÍNDROME DE DIGEORGE
(Hipoplasia Tímica; Síndrome da Terceira e Quar-
ta Bolsas Faríngeas)
 É uma imunodeficiência congênita, caracterizada
patologicamente pela ausência ou hipoplasia do
timo e glândulas paratireóides e, imunologica-
mente, por imunodeficiência parcial ou completa
de célula T, porém imunidade de célula B nor-
mal ou próximo do normal.
Os bebês afetados apresentam implantação baixa
de orelhas, fissuras faciais de linha média, mandí-
bula pouco desenvolvida, hipertelorismo, um filtro
mais curto e cardiopatia congênita. A tetania ocorre
nas primeiras 24 a 48h de vida. Ambos os sexos são
igualmente afetados e casos familiares são raros. As
anormalidades do cromossomo 22 (por exemplo,
deleção ou monossomia) podem ser identificadas em
90% dos casos. Parece haver interrupção do desen-
volvimento normal das estruturas da bolsa faríngea
próximo da 8» semana de gestação. As infecções
recorrentes começam logo após o nascimento. O grau
da imunodeficiência varia consideravelmente de
paciente para paciente e, algumas vezes, a função
da célula T melhora espontaneamente, em especial
em pacientes com células CD4 > 400/µL.
Tratamento
Tem sido bem-sucedido o transplante de medu-
la óssea. Algum êxito também tem sido obtido com
o transplante tímico fetal. Freqüentemente, o que
determina o possível prognóstico é a gravidade da
cardiopatia. A deficiência parcial é compatível com
uma sobrevida prolongada.
CANDIDÍASE MUCOCUTÂNEA
CRÔNICA
É uma imunodeficiência celular caracterizada pela
infecção persistente por Candida das membra-
nas mucosas, couro cabeludo, pele e unhas, e
freqüentemente associada a uma endocrinopa-
tia, em especial ao hipoparatireoidismo e hipoa-
drenalismo.
Pode ter início na infância, com a ocorrência de
candidíase oral persistente ou pode começar mais
tardiamente, já na idade adulta. A doença é discre-
tamente mais comum no sexo feminino. Ela varia
consideravelmente quanto à gravidade, desde o
envolvimento de uma única unha até o comprome-
timento generalizado de membranas mucosas, pele
e cabelos e lesões granulares desfigurantes da face
e couro cabeludo. A candidíase sistêmica, assim
como a suscetibilidade aumentada a outras infec-
ções, não ocorrem. Existem vários padrões clíni-
cos, inclusive uma doença autossômica recessiva,
associada ao hipoparatireoidismo e mal de Addison
(síndrome por Candida-endocrinopatia). Os acha-
dos imunológicos característicos são anergia cutâ-
nea à Candida, ausência de respostas proliferati-
vas aos antígenos da Candida (mas com respostas
proliferativas normais a mitógenos) e boas respos-
tas de anticorpo à Candida e outros antígenos.
Os achados associados em alguns casos incluem
alopecia, bronquiectasias, displasia dental, hepati-
te e deficiência de biotina com deficiência da enzi-
ma carboxilase.
Tratamento
O tratamento consiste na administração local
(nistatina, clotrimazol) ou sistêmica (cetoconazol,
fluconazol, anfotericina B – ver Princípios Gerais
de Tratamento no Cap. 158) de drogas antifúngi-
cas. As unhas afetadas podem necessitar de remo-
ção cirúrgica. A imunoterapia com fator de trans-
ferência, epitélio tímico, hormônios tímicos e lin-
fócitos imunes não apresenta benefícios permanen-
tes. O transplante de medula óssea foi bem-sucedi-
do em um único caso.
IMUNODEFICIÊNCIA
COMBINADA
É um grupo de distúrbios caracterizados pela defi-
ciência congênita e freqüentemente deficiência
hereditária dos sistemas das células B e T, apla-
sia linfóide e displasia tímica.
As imunodeficiências combinadas incluem imu-
nodeficiência combinada intensa, agamaglobuline-
mia suíça, imunodeficiência combinada com defi-
ciência de adenosina desaminase ou deficiência de
nucleotídeo fosforilase e imunodeficiência combi-
nada com imunoglobulina (síndrome de Nezelof).
A maioria dos pacientes apresenta início precoce
(durante os 3 primeiros meses de vida) de infecções
com candidíase oral, pneumonia e diarréia . Se não
forem tratados, a maioria dos pacientes morre antes
dos 2 anos de idade. A maior parte deles apresenta
deficiência profunda de células B e Ig. As caracte-
rísticas são as seguintes: linfopenia, número dimi-
nuído ou ausência de células T, respostas prolifera-
tivas diminuídas para mitógenos, anergia cutânea,
ausência de sombra tímica e diminuição do tecido
linfóide. A pneumonia por Pneumocystis e outras
infecções oportunistas são comuns.
Existe uma série de variedades da doença. Em
67% dos casos, pode ser estabelecido um padrão
de herança ligado ao cromossomo X ou autossô-
mico recessivo. A maioria dos pacientes com he-
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CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1023
rança ligada ao cromossomo X possui imunodefi-
ciência combinada intensa ligada ao cromosso-
mo X, associada a mutações da cadeia γ do recep-
tor de IL-2. Esta cadeia γ é um componente dos
receptores para outras citocinas (IL-4, IL-7, IL-9,
IL-13, IL-15), possivelmente explicando a gravi-
dade da enfermidade.
Aproximadamente metade dos pacientes com o
padrão de herança autossômica recessiva apresen-
ta deficiência de adenosina desaminase (ADA),
uma enzima pertencente à via de salvamento das
purinas e que converte a adenosina e a desoxiade-
nosina em inosina e desoxiinosina, respectivamen-
te. A deficiência de ADA resulta em níveis eleva-
dos de trifosfato de desoxiadenosina (dATP), que
inibe a síntese de DNA. Os pacientes deficientes
em ADA podem ser normais ao nascer, embora
desenvolvam comprometimento imunológico pro-
gressivo à medida que a dATP se acumula. Na sín-
drome de Nezelof (imunodeficiência combina-
da com Ig), ocorre uma imunodeficiência celular
profunda, porém níveis normais, próximos ao nor-
mal ou elevados de Ig – embora com a função do
anticorpo deficiente.
Outros bebês possuem lesões de pele que lem-
bram mal de Letterer-Siwe, linfadenopatia e hepa-
toesplenomegalia e alguns podem ter a doença do
enxerto versus hospedeiro a partir de linfócitos
maternos ou de transfusões sangüíneas anteriores.
Outras variantes incluem deficiências de citocina
(deficiência de IL-1, deficiência de IL-2, deficiên-
cia de citocina múltipla), defeitos estruturais do
receptor da célula T, defeitos no sinal de transdução,
ausência de Classe II de HLA e/ou antígenos de
Classe I (síndrome do linfócito nu), nanismo de
membros curtos, hipoplasia pilosa de cartilagem
com imunodeficiência e imunodeficiência combi-
nada com eosinofilia (síndrome de Omenn).
Tratamento
O tratamento com Ig e antibióticos (incluindo a
profilaxia para P. carinii) é indicado, embora não
seja curativo. O tratamento de escolha para todas as
variantes consiste no transplante de célula-tronco.
Pacientes com deficiência de ADA têm sido trata-
dos, com êxito, com polietilenoglicol conjugado
com ADA bovina (PEG-ADA). Os pacientescom
deficiência de IL-2 foram tratados com IL-2 recom-
binante humana. A terapia gênica tem sido utiliza-
da com algum sucesso na deficiência de ADA.
SÍNDROME DE WISKOTT-ALDRICH
É uma doença recessiva ligada ao cromossomo
X, em meninos, caracterizada por eczema, trom-
bocitopenia e infecções recorrentes.
Em geral, as primeiras manifestações são hemor-
rágicas (comumente diarréia sanguinolenta), segui-
das por infecções respiratórias recorrentes. Neo-
plasias (especialmente linfomas e leucemia linfo-
blástica aguda) são comuns (10%) nos pacientes
com > de 10 anos de vida. Os defeitos imunológi-
cos característicos incluem resposta deficiente de
anticorpos a antígenos polissacarídicos, anergia cu-
tânea, imunodeficiência parcial de célula T, níveis
elevados de IgE e IgA, níveis baixos de IgM e
hipercatabolismo de IgG, embora com os níveis
normais desta imunoglobulina. Como decorrência
da deficiência combinada das funções de células B
e T, ocorrem infecções por bactérias piogênicas,
vírus, fungos e P. carinii. Sob o ponto de vista he-
matológico, estes pacientes apresentam plaquetas
de pequeno tamanho e aumento da destruição pla-
quetária no baço; como decorrência, a esple-
nectomia pode melhorar a trombocitopenia. O de-
feito genético foi localizado no Xp11.
Prognóstico e tratamento
Sem transplante, a maioria dos pacientes mor-
re em torno de 15 anos de idade; entretanto, os
pacientes com formas incompletas da doença
podem sobreviver até a idade adulta. O trata-
mento consiste em esplenectomia, uso contínuo
de antibióticos, administração de Ig IV (não por
via IM, devido ao risco de hemorragias) e trans-
plante de medula óssea.
ATAXIA-TELANGIECTASIA
É uma doença recessiva multissistêmica e progres-
siva caracterizada pela presença de ataxia
cerebelar, telangiectasia da pele e conjuntiva,
infecções sinopulmonares recorrentes e distúr-
bios imunológicos variáveis.
Os sintomas imunológicos e as evidências de imu-
nodeficiência variam quanto ao seu início. Geralmente,
a ataxia se desenvolve quando a criança começa a
andar, embora possa retardar seu início até os 4 anos
de idade. Sua progressão leva à grave incapacidade.
A fala torna-se desarticulada, surgem movimentos
coreoatetóides e oftalmoplegia e, comumente, a fra-
queza muscular progride para atrofia da musculatura.
Pode ocorrer retardo mental progressivo. Entre o pri-
meiro e o sexto anos de vida, surgem as telangiecta-
sias, predominantemente na conjuntiva bulbar, pavi-
lhão auditivo, fossas antecubital e poplítea e laterais
do nariz. As infecções sinopulmonares recorrentes,
resultantes da deficiência imunológica, levam a pneu-
monias recidivantes, bronquiectasias, doença obstru-
tiva crônica e restrição pulmonar.
Podem ocorrer alterações endócrinas, incluindo
disgenesia gonadal, atrofia testicular e uma forma in-
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351023
1024 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
comum de diabetes melito, caracterizada por hiper-
glicemia elevada, resistente à cetose e acentuada res-
posta de insulina plasmática à glicose ou tolbutamida.
A doença está associada à incidência elevada de
neoplasias (especialmente leucemia, tumor cerebral e
câncer gástrico), além de freqüência aumentada de
quebras cromossômicas, provavelmente indicativas
de um defeito no reparo de DNA. Freqüentemente, os
pacientes apresentam ausência de IgA e IgE, além de
anergia cutânea e um defeito imunocelular progressi-
vo. Em geral, a α2-fetoproteína sérica está elevada.
Tratamento
O tratamento da imunodeficiência com antibióti-
cos ou Ig é de algum valor, embora não haja trata-
mento eficaz para anormalidades do SNC. Assim, o
curso da doença é da degeneração neurológica pro-
gressiva com coreoatetose, fraqueza muscular, demên-
cia e óbito, usualmente em torno dos 30 anos de idade.
SÍNDROME LINFOPROLIFERATIVA
LIGADA AO CROMOSSOMO X
É uma imunodeficiência primária caracterizada
por rara sensibilidade às infecções pelo vírus
Epstein-Barr (EBV).
Apesar de poucos pacientes (10%) possuírem hi-
pogamaglobulinemia congênita, a maioria é normal
até que ocorram as infecções pelo EBV. A infecção
pelo EBV usualmente resulta em mononucleose in-
fecciosa progressiva grave com insuficiência he-
pática, uma síndrome linfoproliferativa de célula
B, anemia aplástica e hipogamaglobulinema. Cer-
ca de 75% dos pacientes morrem em torno dos 10
anos de idade.
Os pacientes afetados possuem hipogamaglobuli-
nemia, respostas de anticorpos diminuídas (particu-
larmente ao antígeno nuclear do EBV), respostas pro-
liferativas precárias aos mitógenos, função de células
exterminadoras naturais diminuída e células T dimi-
nuídas com uma proporção CD4:CD8 invertida.
O diagnóstico genético, pelo polimorfismo do com-
primento dos fragmentos de restrição do DNA dos
genes no locus XLP (Xq25-26) idêntico ao de um
membro familiar ou pessoa responsável afetados, pode
ser feito. O transplante de medula óssea é curativo em
poucos casos. O aciclovir e a administração IV de Ig
para evitar a infecção por EBV são ineficazes.
SÍNDROME DE HIPER-IgE
(Síndrome de Job-Buckley)
 É uma síndrome de imunodeficiência caracteriza-
da por infecções estafilocócicas recorrentes, em
particular da pele e de níveis notavelmente ele-
vados de IgE.
Alguns pacientes apresentam um padrão de he-
rança autossômica dominante. A infecção estafilo-
cócica pode atingir pele, pulmões, articulações e
outros locais. Alguns pacientes apresentam traços
grosseiros, enquanto outros são claros e com cabe-
los ruivos. São comuns osteopenia e fraturas recor-
rentes. Em muitos casos, ocorrem defeitos da qui-
miotaxia de neutrófilos.
Todos os pacientes apresentam níveis excepcional-
mente elevados de IgE (> 1.000UI/mL [> 2.400µg/L]).
Sinais de alergia (por exemplo, eczema, rinite e asma)
algumas vezes estão presentes. Outras característi-
cas incluem defeitos discretos da imunidade de cé-
lulas B e T, além de eosinofilia sangüínea e tecidual.
O distúrbio básico pode ser uma anormalidade
imunorreguladora da célula T.
O tratamento consiste em antibioticoterapia in-
termitente ou contínua. O trimetropim-sulfametoxa-
zol é particularmente eficaz como droga profilática.
DOENÇA GRANULOMATOSA
CRÔNICA
É uma doença hereditária decorrente de um defei-
to na capacidade bactericida dos leucócitos, ca-
racterizada pela presença disseminada de lesões
granulomatosas na pele, pulmões e linfonodos;
hipergamaglobulinemia; anemia; leucocitose e
um defeito na capacidade de eliminação de de-
terminadas bactérias e fungos.
A maioria dos pacientes pertence ao sexo mascu-
lino com herança recessiva ligada ao cromossomo
X; em poucos pacientes de ambos os sexos, o tipo
de herança é autossômico recessivo. Os leucócitos
não produzem peróxido de hidrogênio, superóxido
e outras espécies ativadas de O2 devido à atividade
deficiente de dinucleotídeo de nicotinamida adeni-
na fosfato (NADPH). Os quatro componentes es-
truturais da NADPH oxidase são duas subunida-
des de membrana (gp91 phox e p22 phox) do
citocromo b558 e duas subunidades de proteína
citosólica (p47 phox e p67 phox). Na variante liga-
da ao cromossomo X (57% dos casos), o gene mu-
tante envolve gp91 phox e, nas três formas autossô-
micas recessivas, o gene mutante envolve p47 phox
(33%), p22 phox (5%) ou p67 phox (5%).
Sintomas, sinais e diagnóstico
A doença usualmente se manifesta no início da in-
fância, mas pode demorar até o início da adolescên-
cia, em alguns pacientes. O padrão clínico é caracte-
rizado pela ocorrência de infecções recorrentes por
microrganismos produtores de catalase, por exemplo,
Staphylococcus aureus, Serratia, Escherichia coli e
Pseudomonas, que usualmente não causam granulo-
mas; porém, devido ao defeito de exterminação bac-
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351024
CAPÍTULO 147 – DOENÇAS POR IMUNODEFICIÊNCIAS / 1025
tericida, estes microrganismosconseguem sobre-
viver dentro da célula.
As características clínicas são linfadenite supu-
rativa, hepatoesplenomegalia, pneumonia e evidên-
cias hematológicas de infecção crônica. Também
ocorrem rinite persistente, dermatite, diarréia,
abscessos perianais, estomatite, osteomielite, abs-
cessos cerebrais, lesões obstrutivas dos tratos
gastrointestinal e genitourinário (decorrentes da for-
mação de granulomas) e retardo de crescimento. O
diagnóstico laboratorial baseia-se na redução de gra-
nulócitos corados com tetrazólio nitroazul deficien-
te ou pela identificação de um defeito bactericida.
 Tratamento
O tratamento consiste em antibioticoterapia
interminente ou contínua. O transplante de medula
óssea também tem sido bem-sucedido. A terapia
com interferon está sob investigação.
DEFICIÊNCIA DE ADESÃO
LEUCOCITÁRIA
(Deficiência de MAC-1/AFL-1/CR3)
É um distúrbio autossômico recessivo da função
dos leucócitos, caracterizado por infecção
necrótica recorrente ou progressiva do tecido
mole, periodontite, má cicatrização de feridas,
leucocitose e desligamento tardio (> 3 semanas)
do cordão umbilical.
Os bebês gravemente afetados apresentam in-
fecções múltiplas com curso em declínio rapida-
mente progressivo. Pacientes moderadamente
afetados possuem um curso menos grave, com
sobrevida até a idade adulta; a gravidade está cor-
relacionada com o grau de deficiência das glico-
proteínas adesivas na superfície dos leucócitos
que facilitam as interações celulares, o movimen-
to celular e a interação com fragmentos do com-
plemento. Como resultado, seus granulócitos (e
linfócitos) não exibem boa quimiotaxia, partici-
pam de reações citotóxicas ou fagocitam bem as
bactérias.
O diagnóstico é estabelecido demonstrando-se
ausência ou deficiência grave desses antígenos na
superfície dos leucócitos, utilizando-se anticorpos
monoclonais (por exemplo, anti-CD11 ou anti-CD18
para AFL-1) e citometria de fluxo.
Tratamento
O tratamento consiste em antibioticoterapia vi-
gorosa (freqüentemente contínua). A terapia com
interferon-γ reduz a gravidade e freqüência das
infecções, provavelmente por aumentar a ativida-
de oxidativa antimicrobiana. A dose usual é
50µg/m2 administrados 3 vezes por semana s.c. O
transplante de medula óssea tem sido bem-suce-
dido em vários pacientes.
SÍNDROMES DE DEFICIÊNCIA
ESPLÊNICA
É suscetibilidade à infecção decorrente de esple-
nectomia, ausência congênita de baço ou
asplenia funcional devido à trombose de vasos
esplênicos (doença falciforme) ou a doenças
infiltrativas (doenças de depósito).
O baço constitui o principal órgão fagocitário
do sistema reticuloendotelial (mononuclear-fago-
citário), que capta os microrganismos circulantes.
O baço atua também como o principal local de sín-
tese de aticorpos (ver Cap. 141). Os pacientes
asplênicos, especialmente os bebês, são suscetíveis
às superinfecções bacterianas de desenvolvimento
rápido por Haemophilus influenzae, Escherichia
coli, pneumococos e estreptococos, além de outras
infecções,em menor grau. Estes pacientes devem
receber antibioticoterapia profilática contínua, pelo
menos durante os 2 ou 3 primeiros anos de vida e,
após este período, receber antibióticos no início de
cada episódio febril ou durante procedimentos ci-
rúrgicos. Também se recomenda o uso de vacina
pneumocócica, meningocócica e para Haemophilus.
Com tal terapia, o prognóstico é bom.
IMUNODEFICIÊNCIAS
PERDEDORAS DE PROTEÍNAS
É a perda de proteínas séricas que leva à deficiên-
cia de anticorpos secundária, com graus sur-
preendentes de hipogamaglobulinemia.
A hipogamaglobulinemia pode ser devido a per-
das de proteína séricas pelo rim síndrome nefróti-
ca), pele (queimaduras graves ou dermatites) ou
trato gastrointestinal (enteropatia perdedora de
proteínas, linfangiectasia intestinal). Ocorre per-
da simultânea de albumina e de outras proteínas
séricas.
Nas doenças gastrointestinais perdedoras de pro-
teínas, também pode ocorrer perda de linfócitos,
resultando em linfopenia e imunodeficiência celu-
lar. Estes pacientes são suscetíveis a infecções pe-
los principais microrganismos Gram-positivos,
porém, uma vez que ocorra aumento compensató-
rio na produção de anticorpos, as infecções podem
ser relativamente raras, apesar da surpreendente hi-
pogamaglobulinemia.
A correção da doença básica resolverá a imuno-
deficiência. Quando isso for impossível, os trigli-
cerídeos de cadeia média podem trazer benefícios
parciais para diminuir a perda de imunoglobulinas e
linfócitos pelo trato gastrointestinal nestes distúrbios.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351025
1026 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
IMUNODEFICIÊNCIA
RELACIONADA À DESNUTRIÇÃO
A desnutrição com imunodeficiência e infecções
associadas constitui a principal causa mundial de morte
na infância. Quando a desnutrição for grave o sufi-
ciente para reduzir o peso para < 80% da média espe-
rada, algum prejuízo da função imune é observado;
quando o crescimento for < 70% da média esperada,
usualmente ocorre um prejuízo grave da função imu-
ne. A maioria de tais pacientes (exceto aqueles com
anorexia nervosa) é extraordinariamente suscetível a
infecções respiratórias, doenças virais e gastroenterite.
Estas infecções aumentam as necessidades metabó-
licas e diminuem o apetite, levando a mais desnutrição
e imunodeficiência.
O defeito imunológico é, principalmente, uma
imunodeficiência de célula T com anergia cutâ-
nea, diminuição do número de células T, respos-
tas proliferativas deficientes a mitógenos ou an-
tígenos e deficiência de linfocinas (interferon) e
de atividade citotóxica. Os níveis secretores de
anticorpo podem estar diminuídos, embora, em
geral, os níveis de Ig e anticorpos séricos este-
jam normais ou elevados, particularmente os da
IgE. O grau de comprometimento imunológico
depende da gravidade e duração da desnutrição e
das doenças associadas (por exemplo, infecções,
outras deficiências nutricionais). Com a reabili-
tação nutricional, o defeito imunológico se re-
verte rapidamente (ver também Cap. 2).
148␣ /␣ DISTÚRBIOS DE
HIPERSENSIBILIDADE
A hipersensibilidade se refere a processos pa-
tológicos que resultam de interações imunologi-
camente específicas entre antígenos (exógenos
ou endógenos) e anticorpos humorais ou linfóci-
tos sensibilizados. Esta definição exclui alguns
distúrbios nos quais os anticorpos não apresen-
tem qualquer significado fisiotopalógico conhe-
cido (por exemplo, o anticorpo para tecido car-
díaco, que surge após cirurgias cardíacas ou in-
farto do miocárdio), embora sua presença possa
ter um certo valor diagnóstico.
Qualquer classificação de hipersensibilidade
está fadada a ser excessivamente simplificada.
Algumas baseiam-se no tempo necessário para
o aparecimento dos sintomas ou de reações a
testes cutâneos após exposição a um antígeno
(por exemplo, as reações de hipersensibilidade
imediata e tardia), no tipo de antígeno (por exem-
plo, nas reações a drogas) ou na natureza do
envolvimento orgânico. Além disso, as classi-
ficações não levam em consideração o fato de
que possa estar ocorrendo mais de um tipo
de resposta imune ou que mais de um tipo de
resposta possa ser necessária para produzir uma
lesão imunológica.
Classificação de Gell e Coombs
Esta classificação de reações, consistindo em
quatro tipos, é amplamente utilizada apesar de suas
limitações, pois é a mais satisfatória.
Nas reações do Tipo I, os antígenos (alérge-
nos) se combinam com anticorpos IgE específicos
que estão ligados aos receptores de membrana
sobre mastócitos teciduais e basófilos sangüí-
neos. A reação antígeno-anticorpo provoca a li-
beração rápida de potentes mediadores vasoati-
vos e inflamatórios, que podem ser pré-forma-
dos (por exemplo, histamina, triptase) ou recen-
temente gerados a partir dos lipídeos da mem-
brana (por exemplo, leucotrienos e prostaglandi-nas). Durante horas, os mastócitos e basófilos
também liberam citocinas pró-inflamatórias (por
exemplo, interleucina-4 e interleucina-13). Os
mediadores produzem vasodilatação, maior per-
meabilidade capilar, hipersecreção glandular,
espasmo da musculatura lisa e infiltração teci-
dual com eosinófilos e outras células inflamató-
rias.
As reações do Tipo II (citotóxicas) ocorrem
quando o anticorpo reage a componentes antigêni-
cos de uma célula ou elementos teciduais, ou a um
antígeno ou hapteno que ficou intimamente ligado
a uma célula ou tecido.
A reação antígeno-anticorpo pode ativar certas
células citotóxicas (células T exterminadoras ou
macrófagos) para produzir citotoxicidade mediada
por células anticorpo-dependentes. Ela geralmente
envolve a ativação do complemento e pode causar
aderência opsônica através do recobrimento da cé-
lula com anticorpos; a reação se desenvolve pela
ativação dos componentes do complemento atra-
vés de C3 (com conseqüente fagocitose de célula)
ou pela ativação de todo o sistema complemento,
com subseqüente citólise ou lesão tecidual.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351026
CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1027
As reações do Tipo III – de imunocomplexos (IC)
– resultam da deposição de imunocomplexos Ag-
Ac circulantes solúveis em vasos ou tecido. Os IC
ativam o complemento e iniciam, desta forma, uma
seqüência de eventos que resulta na migração de
células polimorfonucleares e liberação de enzimas
proteolíticas lisossômicas e fatores de permeabili-
dade em tecidos, produzindo uma inflamação agu-
da. As conseqüências da formação de IC depen-
dem, em parte, das proporções relativas de antíge-
no e anticorpo contidas no IC. Com um excesso de
anticorpo, os IC se precipitam rapidamente onde o
antígeno está localizado (por exemplo, dentro das
articulações, na artrite reumatóide) ou são fagoci-
tados por macrófagos e, desta maneira, não cau-
sam nenhum dano. Com um leve excesso de antí-
geno, os imunocomplexos tendem a ser mais solú-
veis e podem causar reações sistêmicas ao serem
depositados em vários tecidos.
As reações do Tipo IV são de hipersensibilidade
celular, mediada por células, tardia ou do tipo tu-
berculina, causadas por linfócitos T sensibilizados
após contato com um antígeno específico.
Os anticorpos circulantes não estão envolvidos
e nem são necessários para desenvolver a lesão te-
cidual. A transferência da hipersensibilidade tar-
dia de pessoas sensibilizadas para outras não sen-
sibilizadas pode ocorrer com leucócitos periféri-
cos, mas não com soro.
Os linfócitos T sensibilizados que foram desen-
cadeados ou ativados pelo contato com um antíge-
no específico podem provocar lesão imunológica
por um efeito tóxico direto ou através da liberação
de substâncias solúveis (linfocinas). Na cultura de
tecidos, os linfócitos T ativados destroem as célu-
las-alvo após sensibilização pelo contato direto. As
citocinas liberadas dos linfócitos T ativados incluem
vários fatores que afetam a atividade de macrófa-
gos, neutrófilos e células linfóides exterminadoras
(ver TABELA 146.1).
DISTÚRBIOS COM
REAÇÕES DE
HIPERSENSIBILIDADE
TIPO I
Os distúrbios que compreendem reações de hi-
persensibilidade do Tipo I são as doenças atópicas
(rinite alérgica, conjuntivite alérgica, dermatite
atópica e asma alérgica [extrínseca] [ver Cap. 68])
e alguns casos de urticária e reações alimentares
gastrointestinais e anafilaxia sistêmica. A inci-
dência de asma tem aumentado em demasia, ape-
sar das causas serem desconhecidas. Recentemente,
observou-se um aumento acentuado nas reações do
Tipo I em relação à exposição a proteínas hidros-
solúveis dos produtos do látex (por exemplo, luvas
de borracha, diques de borracha para isolamento
dental absoluto, preservativos, tubos de equipamen-
to respiratório, cateter e pontas de enema com
“cuffs” de látex inflável), particularmente entre
pessoas da área médica e pacientes expostos ao lá-
tex e crianças com espinha bífida e defeitos uroge-
nitais congênitos. As reações comuns ao látex são
urticária, angioedema, conjuntivite, rinite, bron-
cospasmo e anafilaxia.
Como regra, os pacientes com doenças atópicas
(inclusive dermatite atópica) apresentam uma pre-
disposição hereditária a desenvolver hipersensibi-
lidade mediada por anticorpo IgE contra substân-
cias inaladas ou ingeridas (alérgenos), que não são
perigosas para pessoas não atópicas. Exceto na der-
matite atópica, os anticorpos IgE usualmente são
mediadores da hipersensibilidade. Apesar da aler-
gia alimentar mediada pela IgE poder contribuir
para os sintomas da dermatite atópica em bebês e
crianças pequenas, ela é amplamente independen-
te dos fatores alérgicos nas crianças mais velhas e
em adultos, mesmo que a maioria dos pacientes con-
tinue a ter alergias específicas.
Diagnóstico
História – A revisão dos sintomas, sua relação
com o meio ambiente e com as variações sazonais e
situacionais, seu curso clínico e história familiar de
problemas similares devem fornecer informações
suficientes para a classificação da doença como
atópica. Para determinar se um indivíduo é alérgico,
a anamnese é mais valiosa do que os testes e o pa-
ciente não deve ser submetido a testes cutâneos ex-
tensos, a menos que existam evidências clínicas ra-
zoáveis para a presença de atopia. A idade na qual a
doença teve início pode constituir uma informação
importante (por exemplo, a asma que ocorre na in-
fância tem maior probabilidade de ser relacionada à
alergia do que a asma que tem início após os 30 anos).
Também são indicativos os sintomas sazonais (por
exemplo, correlacionam-se com o pólen específico
de estações do ano) ou sintomas que aparecem após
exposição a animais, feno ou poeira ou os que se
desenvolvem em ambientes específicos (por exem-
plo, no lar). Devem ser avaliados os efeitos de fato-
res contribuintes (por exemplo, fumaça de tabaco e
outros poluentes, ar frio, exercício, álcool, certas
drogas e estresse da vida).
Testes inespecíficos – Os eosinófilos no san-
gue e secreções são freqüentemente associados à
doença atópica, particularmente asma e dermatite
atópica. Os níveis de IgE estão elevados, aumen-
tarão durante exacerbações e diminuirão durante
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351027
1028 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
remissões da dermatite atópica. Apesar de usual-
mente elevados, os níveis de IgE não são úteis para
diagnóstico na asma atópica e na rinite alérgica.
Ocasionalmente, níveis muito altos de IgE podem
ajudar a confirmar o diagnóstico de aspergilose pul-
monar alérgica (ver Cap. 76) ou síndrome de hiper-
IgE (ver Cap. 147).
Testes específicos – Os testes específicos são
utilizados para confirmar a sensibilidade a um ou
mais alérgenos em particular. Os testes cutâneos
são a maneira mais conveniente de confirmar a
sensibilidade específica. Eles devem ser seletivos
e baseados nos achados da anamnese. As soluções
utilizadas nos testes são preparadas a partir de ex-
tratos de materiais inalados, ingeridos ou injeta-
dos (por exemplo, pólens disseminados pelo ven-
to, de algumas árvores, gramíneas ou ervas dani-
nhas, poeira domiciliar, descamações epidérmi-
cas [caspas] de animais, venenos de insetos, ali-
mentos e penicilinas e seus derivados). Até recen-
temente, alguns extratos de alérgenos eram padro-
nizados e sua potência era altamente variável.
Muitos extratos comumente utilizados são agora
padronizados.
Para o teste de punão, usualmente o primeiro
a ser realizado, coloca-se uma gota do extrato de
alérgeno diluído na pele, faz-se uma punção atra-
vés do extrato, puxando a pele para cima com a
ponta de um estilete ou agulha de # 27 num ângulo
de 20º até que a ponta fique solta.
Para o teste intradérmico é injetado apenas o
suficiente de uma diluição de extrato estéril (uti-
lizando-se uma seringa de 0,5 ou 1mL e uma agu-
lha de biselcurto # 27) para produzir uma pápula
de 1 ou 2mm. Cada bateria de testes cutâneos deve
incluir o diluente sozinho como controle negati-
vo e histamina (10mg/mL da base para o teste de
punção ou 0,1mg/mL para o teste intradérmico)
como controle positivo. Um teste cutâneo é con-
siderado positivo se produzir uma reação do tipo
papuloeritematoso, em 15min, com diâmetro no
mínimo 5mm maior que o controle.
O teste cutâneo de punção é, geralmente, sufi-
ciente para detectar a sensibilidade à maioria dos
alérgenos. O teste intradérmico mais sensível pode,
então, ser usado para testar alérgenos inalados sus-
peitos que produziram teste de punção negativo ou
duvidoso. Para os alimentos, os testes de punção
isolados são diagnósticos. Os testes intradérmicos
são passíveis de produzir reações positivas sem ne-
nhum significado clínico para alimentos, como
mostrado pelos testes de provocação de sintomas
orais em estudo duplo-cego.
O teste radioalergoabsorvente (RAST) pode
ser utilizado quando o teste cutâneo direto não for
possível devido a dermatite generalizada, dermo-
grafismo acentuado ou pela incapacidade de coo-
peração do paciente, ou por este não parar de usar
anti-histamínicos. Um RAST detecta a IgE sérica
específica para o antígeno. Um alérgeno conheci-
do sob a forma de conjugado polímero-alérgeno
insolúvel é misturado ao soro do paciente para ser
testado. Qualquer IgE no soro que seja específica
para o alérgeno se ligará ao conjugado. A quanti-
dade de IgE específica para o alérgeno na circula-
ção do paciente é determinada pela adição de uma
imunoglobulina anti-IgE marcada com 125I e a
medida da quantidade da radioatividade captada
pelo conjugado.
A liberaão de histamina por leucócitos, um
teste in vitro, detecta a IgE alérgeno-específica nos
basófilos sensibilizados pela dosagem da histamina
induzida pelo alérgeno liberada pelos leucócitos do
paciente. Esta valiosa ferramenta de pesquisa tem
fornecido critérios dos mecanismos da resposta alér-
gica; como o RAST, não fornece nenhuma infor-
mação diagnóstica e é raramente, se alguma vez,
utilizada na clínica.
O teste de provocaão pode ser realizado quando
um teste cutâneo positivo originar dúvidas sobre o
papel do antígeno, em particular na produção dos sin-
tomas. O alérgeno pode ser aplicado nos olhos, nariz
ou pulmões. O teste oftalmológico não oferece qual-
quer vantagem sobre o teste cutâneo, sendo raramen-
te utilizado. O teste nasal, realizado ocasionalmente,
é também um instrumento primário de pesquisa, bem
como o teste brônquio, algumas vezes usado quando
o significado clínico de um teste cutâneo positivo não
foi claro ou quando os reagentes cutâneos não estive-
rem disponíveis para mostrar que os sintomas estão
relacionados com os materiais aos quais um paciente
é exposto (por exemplo, asma relacionada à profis-
são). Os testes de provocação oral devem ser usados
quando houver suspeita de que os sintomas ocorridos
regularmente estejam relacionados a alimentos, por-
que os testes cutâneos positivos não são necessaria-
mente significantes na clínica. Um teste cutâneo ne-
gativo com uma preparação de antígeno confiável,
entretanto, exclui a possibilidade dos sintomas clíni-
cos para aquele alimento. O teste de provocação é o
único meio de testar aditivos alimentares. (Ver adian-
te Dietas de Eliminação e Teste de Provocação.)
Testes de efetividade não comprovada – Não
há evidências para justificar o uso do teste de pro-
vocação sublingual ou cutâneo ou teste leucocito-
tóxico no diagnóstico de alergia.
Tratamento
Evitar – O tratamento preferencial é eliminar o
antígeno. Isto pode exigir mudança de dieta, pro-
fissão ou residência, suspensão de uma droga ou
afastamento de um animal de estimação. Alguns
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1029
locais, livres de alérgenos tais como a ambrósia (por
exemplo, ambrósia americana), constituem verda-
deiros refúgios para as pessoas sensibilizadas. Quan-
do a eliminação completa do alérgeno for impossí-
vel (como no caso da poeira domiciliar), a exposi-
ção pode ser reduzida pela remoção da poeira acumu-
lada em móveis, tapetes e cortinas; uso de cobertu-
ras plásticas em colchões e travesseiros; lavagens
freqüentes e retirada de pó com panos úmidos; re-
dução do nível de umidade e instalação de um siste-
ma de filtração de ar de alta eficiência.
Imunoterapia alérgena – Quando não for pos-
sível evitar um alérgeno ou controlar suficientemente
a exposição e a medicação for inadequada para ali-
viar os sintomas da doença atópica, pode ser tentada
a imunoterapia alérgena (também chamada de hi-
possensibilizaão ou dessensibilizaão) pela inje-
ção de um extrato do alérgeno por via s.c. e em do-
ses gradualmente crescentes. Diversos efeitos po-
dem ocorrer, embora nenhum teste apresente corre-
lação absoluta à melhora clínica. O título do anti-
corpo bloqueador de IgG (neutralizador) aumenta
proporcionalmente à dose administrada. Algumas ve-
zes, especialmente quando doses altas do extrato de
pólen puderem ser toleradas, os níveis de anticorpos
séricos IgE-específicos caem significantemente. A
responsividade (proliferação) dos linfócitos ao antí-
geno também pode estar diminuída.
Os resultados são mais satisfatórios quando as
injeções são contínuas por um ciclo de um ano.
Dependendo do grau de sensibilidade, a dose de
início é de 0,1 a 1,0 unidade biologicamente ativa
(UBA) para alérgenos padronizada pela FDA. A
dose é aumentada semanalmente, ou a cada 2 se-
manas, por valor ≤ duas vezes a dose até uma con-
centração máxima tolerada ser atingida (por exem-
plo, para extratos de pólen padronizados, a dose de
manutenção é de 1.000 a 4.000 UBA). Uma vez
atingida, a dose máxima pode ser mantida em in-
tervalos de 4 a 6 semanas, por um ano; até nas aler-
gias sazonais, o tratamento perene é superior aos
tratamentos pré-sazonais ou co-sazonais.
Os principais alérgenos utilizados para dessen-
sibilização são aqueles que geralmente não podem
ser evitados de modo efetivo: pólens, poeira domi-
ciliar e ácaros da poeira, fungos e venenos prove-
nientes de picadas de insetos. Os venenos de inse-
tos são padronizados pelo peso; a dose inicial típi-
ca é de 0,01µg; a dose comum de manutenção é de
100 a 200µg. Geralmente, a dessensibilização para
epitélios de animais limita-se somente aos pacien-
tes que não podem evitar a exposição (por exem-
plo, veterinários e laboratoristas), mas há pouca
evidência de que seja útil. Não há indicação para a
dessensibilização para alimentos. Os procedimen-
tos para dessensibilização para penicilina e soro
estranho estão descritos em HIPERSENSIBILIDADE
A DROGAS, adiante.
Reaões adversas – Em geral, os pacientes são
extremamente sensíveis, especialmente a alérge-
nos de pólens e, se eles receberem uma dose ex-
cessiva, as reações variam de tosse leve ou espir-
ros até urticária generalizada, asma grave, choque
anafilático e, muito raramente, pode ocorrer óbi-
to. Deve-se fazer o seguinte para evitar tais rea-
ções: aumentar a dose por meio de pequenos in-
crementos; repetir a mesma dose (ou mesmo di-
minuí-la) se a reação local a uma injeção prévia
for grande (≥ 2,5cm de diâmetro) e reduzir a dose
quando um novo extrato for usado. Muitas vezes,
também é prudente reduzir a dose dos extratos de
pólen durante as estações de polinização. As inje-
ções IM e IV devem ser evitadas.
Apesar de todas as precauções, ocasionalmente
ocorrem reações. Como as mais graves, que repre-
sentam risco de vida (anafilaxia) se desenvolvem no
espaço de 30min, os pacientes devem permanecer sob
observação durante este período. As manifestações
de uma reação indesejável podem ser espirros, tosse
e opressão torácica, ou rubor generalizado, sensação
de formigamento e prurido. Detalhes maiores sobre
sintomas e tratamento são descritos em ANAFILAXIA,
adiante.
Anti-histamínicos– Não se deve negligenciar
o alívio sintomático com drogas enquanto o pa-
ciente estiver sendo avaliado e enquanto estiver
sendo desenvolvido o controle ou tratamento es-
pecífico. O uso adequado de anti-histamínicos,
simpatomiméticos, cromolina e glicocorticóides
está descrito em cada uma das doenças, adiante.
Em geral, o uso precoce de glicocorticóides é apro-
priado para condições potencialmente incapaci-
tantes, autolimitadas e de duração relativamente
curta (crises sazonais de asma; doença pulmonar
infiltrativa; dermatite de contato grave), podendo
ser necessário o uso prudente de glicocorticóides
quando outras medidas forem insuficientes para
tratar as condições crônicas.
As diferenças farmacológicas entre anti-hista-
mínicos são mais aparentes em suas propriedades
sedativas, antieméticas e outros efeitos no SNC e
em suas propriedades anticolinérgicas, anti-sero-
tonina e anestésica local. Os anti-histamínicos an-
ticolinérgicos são particularmente problemáticos
nos idosos.
Os anti-histamínicos são úteis para tratar os sin-
tomas de alergias, inclusive de febre do feno sazo-
nal, rinite alérgica e conjuntivite. São levemente
eficazes na rinite vasomotora. A urticária aguda e
crônica e certas dermatoses alérgicas com prurido
respondem bem a eles. Também são úteis para tra-
tar pequenas reações de incompatibilidade trans-
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1030 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
fusional e reações sistêmicas aos meios de contraste
radiológicos administrados IV. Fornecem pouco be-
nefício no tratamento do resfriado mas, devido a
seus efeitos anticolinérgicos (ver adiante) podem
controlar a rinorréia.
A histamina está amplamente distribuída nos teci-
dos de mamíferos. No homem, as maiores concentra-
ções estão na pele, pulmões e mucosa GI. Ela está
presente principalmente nos grânulos intracelulares
de mastócitos, embora também exista importante acú-
mulo extramastócito na mucosa gástrica, com quan-
tidades menores no cérebro, coração e outros órgãos.
A liberação de histamina dos grânulos de armazena-
mento celular dos mastócitos pode ser desencadeada
por ruptura tecidual física, várias substâncias quími-
cas (inclusive irritantes teciduais, opiáceos e agentes
ativos de superfície) e, de forma mais proeminente,
por interações de antígeno-anticorpo.
A função homeostática específica da histamina
continua obscura. Suas ações, que no homem são
exercidas primariamente no sistema cardiovascular,
na musculatura lisa extravascular e nas glândulas
exócrinas, parecem ser mediadas por dois recepto-
res distintos: H1 e H2 . Este capítulo discutirá os re-
ceptores H1 e seus antagonistas (bloqueadores de H1).
Para os receptores e antagonistas de H2, ver Trata-
mento em ÚLCERA PÉPTICA, no Capítulo 23.
No sistema cardiovascular, a histamina é um
potente dilatador arteriolar que pode provocar gran-
de acúmulo periférico de sangue e hipotensão. Tam-
bém aumenta a permeabilidade capilar pela distor-
ção do revestimento endotelial das vênulas pós-ca-
pilares, com alargamento do espaço entre as célu-
las endoteliais e exposição das superfícies da mem-
brana basal. Esta ação acelera a perda de plasma e
proteínas plasmáticas do espaço vascular e, em
combinação com a dilatação arteriolar e capilar,
pode produzir choque circulatório. A histamina tam-
bém dilata os vasos cerebrais, o que pode ser um
fator na cefaléia vascular.
A resposta tríplice é mediada pela liberação
intracutânea local de histamina, provocando erite-
ma local a partir da vasodilatação, pústula devido a
edema local, a partir do aumento da permeabilida-
de capilar e rubor, a partir de um mecanismo de
reflexo neuronal, produzindo uma área circundan-
te de vasodilatação arteriolar. Em outros músculos
lisos, a histamina pode provocar broncoconstrição
grave e estimular a motilidade GI. Nas glândulas
exócrinas, ela aumenta as secreções das glându-
las salivar e brônquica; nas glândulas endócrinas,
ela estimula a liberação de catecolaminas pelas
células cromafins das adrenais, que também pare-
cem ser mediadas por receptor H1 . Nas termina-
ções nervosas sensoriais, a instilação local de
histamina pode produzir prurido intenso.
Bloqueadores H1 – Os anti-histamínicos conven-
cionais possuem uma cadeia lateral de etilamina subs-
tituta (semelhante àquela da histamina) ligada a um
ou mais grupos cíclicos. A similaridade entre a meta-
de etilamínica da histamina e a estrutura etilamínica
substituída dos bloqueadores H1 sugere que esta con-
figuração molecular é importante nas interações de
receptor. Os bloqueadores H1 parecem agir por inibi-
ção competitiva; não alteram significativamente a pro-
dução ou metabolismo da histamina.
Os bloqueadores H1, administrados por via oral
ou retal, geralmente são bem absorvidos pelo trato
GI. O início da ação geralmente ocorre em 15 a
30min, com efeitos máximos em 1h; a duração da
ação é de 3 a 6h, embora alguns bloqueadores atu-
em num tempo consideravelmente maior.
Os efeitos anti-histamínicos dos bloqueadores
H1 são observados somente na presença de ativida-
de histamínica aumentada. Eles bloqueiam os efei-
tos da histamina na musculatura lisa do trato GI
embora, no homem, a reação alérgica da muscula-
tura lisa brônquica não seja primariamente depen-
dente da liberação de histamina e não responda efe-
tivamente aos anti-histamínicos isolados. Os blo-
queadores H1 obstam efetivamente a permeabili-
dade capilar aumentada induzida pela histamina e
a estimulação nervosa sensorial, inibindo, assim,
as respostas de pústula, rubor, prurido, espirros e
secreção mucosa. Entretanto, estas drogas são ape-
nas parcialmente eficazes na reversão da vasodila-
tação e hipotensão induzidas pela histamina.
Os efeitos clinicamente úteis que não o antagonis-
mo da histamina estão discutidos adiante.
A TABELA 148.1 resume dosagem, via de admi-
nistração e freqüência de alguns bloqueadores H1
comumente disponíveis. As doses podem precisar
ser administradas com mais freqüência a crianças
do que a adultos, devido às meias-vidas mais curtas
do anti-histamínico (exceto conforme observado na
tabela). Estas drogas todas bloqueiam receptores de
H1; suas diferenças farmacológicas são, principal-
mente, no tipo e intensidade de seus outros efeitos.
Como muitos bloqueadores H1 causam depres-
são do SNC e sonolência, eles ocasionalmente são
usados como sedativos e hipnóticos. Entretanto, as
alquilaminas e as novas drogas não sedativas –
astemizol, cetirizina e loratidina – são úteis quan-
do a sedação for indesejável. Porém, elas são con-
sideravelmente mais caras e algumas estão asso-
ciadas a interações medicamentosas prejudiciais
(ver adiante). As etanolaminas são depressores sig-
nificativos do SNC; embora menos potentes e se-
guros que barbitúricos e outros depressivos cen-
trais, são úteis como sedativos e hipnóticos, embo-
ra apresentem acentuadas propriedades anticolinér-
gicas e, portanto, podem ser mal toleradas pelo ido-
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TABELA 148.1 – DOSAGEM, ADMINISTRAÇÃO E PREPARAÇÕES DE ALGUNS BLOQUEADORES H1
Via de
Droga administração Dosagem comum para adultos Dosagem comum pediátrica Preparações disponíveis
Alquilaminas
Maleato de bromofeniramina
Maleato de clorfeniramina
Maleato de dexclorfeniramina
HCl de triprolidina
Etanolaminas
Fumarato de clemastina
Oral
IM ou IV
Oral
IV, IM ou s.c.
Oral
Oral
Oral
4 – 8mg a cada 4 – 6h
5 – 20mg a cada 6 – 12h
4mg a cada 4 – 6h
5 – 20mg (dose máxima 40mg/dia)
2mg a cada 4 – 6h
2,5mg a cada 4 – 6h
1,34mg, 2 vezes ao dia a 2,68mg, 3
vezes ao dia
< 6 anos de idade: 0,125mg/kg a cada 6h
(dose máxima 6 – 8mg/dia); 6 – 12 anos:
2 – 4mg a cada 6 – 8h (dose máxima 12 –
16mg/dia)
 < 12 anos de idade: 0,5mg/kg/dia dividi-
dos a cada 6 – 8h
0,35mg/kg/dia em doses divididas a cada
4 – 6h
NA
 2 – 5 anos:0,5mg a cada 4 – 6h (dose
máxima 3mg/dia)
6 – 11 anos: 1mg a cada 4 – 6h (dose
máxima 6mg/dia)
4 meses – 2 anos: 0,313mg a cada 4 – 6h
(dose máxima 1,25mg/dia)
2 – 4 anos: 0,625mg a cada 4 – 6h (dose
máxima 2,5mg/dia)
4 – 6 anos: 0,938mg a cada 4 – 6h (dose
máxima 3,74mg/dia)
6 – 12 anos: 1,25mg a cada 4 – 6h (dose
máxima 5mg/dia)1
6 – 12 anos: 0,5mg a cada 12h (dose má-
xima 3mg/dia)2
Comprimidos de 4, 8 e 12mg
Elixir de 2mg/5mL
Comprimidos de 8 e 12mg (liberação
cronometrada)
Injeção de 10mg/mL
Comprimidos mastigáveis de 2mg
Comprimidos de 4mg
Xarope de 2mg/5mL
Comprimidos de 8 e 12mg, cápsulas
(liberação cronometrada)
Injeção de 10mg/mL
Comprimidos de 2mg
Xarope de 2mg/5mL
Comprimidos de 4 e 6mg (liberação
prolongada)
Comprimidos de 2,5mg
Xarope de 1,25mg/5mL
Comprimidos de 1,34 e 2,68mg
Xarope de 0,67mg/5mL
Continua
1031
M
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1031
HCl de difenidramina
HCl de difenilpiralina
Etilenodiaminas
Citrato de tripelenamina
HCl de tripelenamina
Piperazinas
HCl de hidroxizina
Fenotiazinas
HCl de metidilazina
HCl de prometazina
Oral
IV, IM
profunda
Oral
Oral
Oral
Oral
IM
Oral
Oral
Retal
IV ou IM
IM apenas
25 – 50mg 3 ou 4 vezes ao dia ou a
cada 6 – 8h
10 – 50mg a cada 3 – 4h
5mg a cada 12h
25 – 50mg a cada 4 – 6h
25 – 50mg a cada 4 – 6h
25 – 100mg 3 ou 4 vezes ao dia
25 – 100mg a cada 4 – 6h
8mg a cada 6 – 12h
12,5 – 25mg 2 vezes ao dia
12,5 – 25mg a cada 4h prn ou a cada 6h
12,5 – 25mg a cada 6h
50mg para sedação
 5mg/kg/dia divididos a cada 6h (dose
máxima 300mg/dia)
NA
(1mL de citrato = 5mg de sal HCl)
5mg/kg/dia divididos em 4 – 6 doses (dose
máxima 300mg/dia)
2mg/kg/dia divididos a cada 6 – 8h
> 3 anos de idade, 4mg a cada 6 – 12h
0,1mg/kg a cada 6h
Cápsulas ou comprimidos de 25 e 50mg
Xarope de 12,5mg/mL
Elixir de 12,5mg/5mL
Injeção de 10 e 50mg/mL
Cápsulas de 5mg (ação constante)
Elixir de 37,5mg/5mL
Comprimidos de 25 e 50mg
Comprimidos de 100mg™
(liberação cronometrada)
Comprimidos de 25, 50 e 100mg
Comprimidos de 10, 25, 50 e 100mg
Xarope de 10mg/5mL
Suspensão oral de 25mg/5mL
Injeção de 25 e 50mg/mL
Comprimidos de 8mg
Comprimidos mastigáveis de 4mg
Xarope de 4mg/5mL
Comprimidos de 12,5, 25 e 50mg3
Xarope de 6,25 e 25mg/5mL
Supositórios de 12,5, 25 e 50mg
Injeção de 25mg/mL
Injeção de 50mg/mL (IM apenas)
TABELA 148.1 – DOSAGEM, ADMINISTRAÇÃO E PREPARAÇÕES DE ALGUNS BLOQUEADORES DE H1
Via de
Droga administração Dosagem comum para adultos Dosagem comum pediátrica Preparações disponíveis
1032
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02/02/01, 15:35
1032
1
 Doses máximas maiores são utilizadas fora dos EUA: < 1 ano de idade: 1mg a cada 8h; 1 – 6 anos: 2mg a cada 8h; 6 – 12 anos: 3mg a cada 8h.
2
 Não aprovado para crianças < 6 anos de idade, porém uma dose de 0,05mg/kg/dia (dose máxima 1mg/dia) tem sido utilizada, com segurança, neste grupo etário.
3
 Não aumentar a freqüência em crianças.
4
 CUIDADO – As interações com algumas drogas, incluindo antifúngicos e antibióticos, podem apresentar risco de vida.
NA = não aplicável, prn= quando necessário.
Tartarato de trimeprazina
Piperidinas
Maleato de azatadina
HCl de cipro-heptadina
Não sedativos
Astemizol4
Cetirizina
Loratidina
Fexofenadina
Oral
Oral
Oral
Oral
Oral
Oral
Oral
2,5mg 4 vezes ao dia
1 – 2mg 2 vezes ao dia
4mg 3 ou 4 vezes ao dia (não
> 0,5mg/kg/dia)
10mg 1 vez ao dia
5 – 10mg 1 vez ao dia
10mg 1 vez ao dia
60mg 2 vezes ao dia
6 meses – 3 anos de idade: 1,25mg na
hora de dormir ou 3 vezes ao dia
> 3 anos de idade: 2,5mg na hora de dor-
mir ou 3 vezes ao dia
> 12 anos apenas
0,25 – 0,5mg/kg/dia divididos a cada
8 – 12h
> 12 anos apenas
> 12 anos apenas
> 12 anos apenas
> 12 anos apenas
Comprimidos de 2,5mg
Xarope de 2,5mg/5mL3
Cápsulas de 5mg (liberação
cronometrada)
Comprimidos de 1mg3
Comprimidos de 4mg3
Xarope de 2mg/5mL
Comprimidos de 10mg3
Comprimidos de 5 e 10mg
Comprimidos de 10mg
Comprimidos de 60mg
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1033
1034 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
so. As etilenodiaminas produzem menos depres-
são do SNC, porém mais efeitos colaterais gastro-
intestinais do que as etanolaminas.
O derivado da etanolamina, difenidramina e seu
sal cloroteofilinado, dimenidrinato, o congênere da
fenotrazina, prometazina e as piperazinas (ciclizina
e meclizina) são utilizados para evitar ou tratar a
doença da motilidade e aliviar as náuseas e verti-
gens associadas à labirintite. Ciclizina, hidroxizina
e meclizina têm sido implicadas como teratogênicas
em animais e, provavelmente, não devem ser ad-
ministradas durante a gravidez.
Os bloqueadores H1 fenotiazínicos, notavelmente a
prometazina, são úteis como sedativos e eficazes no
controle da náusea associada à radioterapia e certas
drogas anticâncer; para esta última utilização, são me-
nos eficazes que a proclorperazina e a clorpromazina.
A maioria dos bloqueadores H1 apresenta pro-
priedades anticolinérgicas que podem ser respon-
sáveis, centralmente, por uma modesta atividade
antiparkinsoniana e, perifericamente, por alívio sin-
tomático da rinorréia nas infecções do trato respi-
ratório superior. Combinados a drogas para anes-
tesia local, alguns bloqueadores H1 têm sido apli-
cados na pele, na forma de cremes e loções, para
reduzir o prurido. Entretanto, a aplicação tópica
de anti-histamínicos etilenodiamínicos incorre em
risco considerável de sensibilização à droga e não
são mais aprovados para este propósito.
Os efeitos colaterais indesejáveis e a toxici-
dade dos bloqueadores H1 são muito incomuns;
incluem anorexia, náusea, vômito, constipação, di-
arréia, desconforto epigástrico, diminuição do es-
tado de alerta, piora na capacidade de concentra-
ção, sonolência e fraqueza muscular. Raramente
ocorrem discrasias sangüíneas (por exemplo, leu-
copenia, agranulocitose, trombocitopenia, anemia
hemolítica). A superdosagem é acompanhada por
efeitos anticolinérgicos: boca seca, palpitações,
opressão torácica, retenção urinária, distúrbios vi-
suais, convulsões, alucinações e, posteriormente,
depressão respiratória, febre, hipotensão e
midríase. Estas são, com freqüência, mais proble-
máticas em idosos.
Os anti-histamínicos não sedativos astemizol e
cetirizina não devem ser adminsitrados junto com
antibióticos macrolídeos, pois eles bloqueiam o seu
metabolismo. Algumas destas drogas causam ar-
ritmia (menos loratidina e fexofenadina). Finalmen-
te, todas, exceto loratidina, possuem risco de cate-
goria C para gravidez.
Os bloqueadores de leucotrieno antagonizam os
receptores D de leucotrieno ou inibem a geração
de leucotrienos, bloqueando o broncospasmo. Eles
possuem efeitos clínicos positivos, mas seu lugar
na terapia da asma não está estabelecido.
DOENÇAS ATÓPICAS
Rinite alérgica
 É a rinite mediada por IgE, caracterizada por es-
pirros sazonais ou perenes, rinorréia, conges-
tão nasal, prurido e, com freqüência, conjunti-
vite e faringite.
FEBRE DO FENO
(Polinose)
É a forma sazonal aguda de rinite alérgica.
A febre do feno é, geralmente, induzida pelos pó-
lens trazidos pelo vento. O tipo da primavera é devi-
do a pólens de árvores (por exemplo, carvalho, olmo,
bordo, vidoeiro, junípero, oliveira); o tipo de verão,
a pólens de várias gramíneas (por exemplo, Bermu-
da, capim rabo-de-gato, vernal doce, pomar, John-
son) e a pólens de plantas arbustivas (por exemplo,
cardo russo, fúnquia inglesa); a forma outonal, a pó-
lens de certos arbustos (por exemplo, ambrósia ame-
ricana). Em algumas ocasiões, a febre do feno pode
ser devida, primariamente, a esporos de fungos trans-
portados pelo ar. Também ocorrem importantes di-
ferenças geográficas regionais.
Sintomas e sinais
O nariz, palato, faringe e olhoscomeçam a co-
çar gradual ou abruptamente após o início da esta-
ção da polinização. Acompanhando o prurido, ou
seguindo-se imediatamente a ele, surgem lacrime-
jamento, espirros e secreção nasal aquosa. Também
podem aparecer cefaléia frontal, irritabilidade. Mais
raramente podem ocorrer anorexia, depressão e in-
sônia. A conjuntiva mostra-se congesta e a mucosa
nasal edemaciada e com coloração vermelho-
azulada. À medida que a estação progride, podem
surgir tosse e ofegar asmático.
Diagnóstico
A anamnese sugere a natureza do processo alér-
gico e, freqüentemente, os pólens responsáveis. O
diagnóstico é baseado nos achados físicos e eosi-
nófilos nas secreções nasais. Os testes cutâneos são
úteis para confirmar ou identificar os pólens res-
ponsáveis.
Tratamento
Os sintomas podem diminuir ao se evitar a exposi-
ção ao alérgeno (ver anteriormente). Os anti-hista-
mínicos por VO freqüentemente fornecem alívio; se
os comuns forem muito sedativos, pode-se usar um
não sedativo (ver Anti-histamínicos, anteriormente).
O tratamento tópico pode ser utilizado (ver anterior-
mente). Os simpatomiméticos são, às vezes, admi-
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1035
nistrados juntamente com anti-histamínicos. A
fenilpropanolamina, fenilefrina ou pseudoefedrina
estão disponíveis em muitas preparações de anti-
histamínicos-descongestionantes. Como os simpa-
tomiméticos orais podem elevar a pressão arterial,
os pacientes com tendência à hipertensão não de-
vem fazer uso delas sem controles periódicos.
Se os anti-histamínicos não apresentarem resul-
tados satisfatórios, pode ser utilizado um aerossol
nasal contendo 4% de cromalina (liberada do fras-
co por pressão manual). A dosagem indicada é a de
um aerossol (5,2mg) 3 a 4 vezes ao dia. Pode ser
mais eficaz para evitar do que para aliviar os sinto-
mas agudos. Como a cromalina possui maior custo
e alivia apenas os sintomas nasais, geralmente ou-
tras drogas são utilizadas primeiro. A azelastina,
um aerossol nasal anti-histamínico, é eficaz e cau-
sa menos efeitos colaterais do que os anti-histamí-
nicos orais.
Quando os sintomas nasais não são aliviados pe-
los anti-histamínicos, a administração de glicocorti-
cóides sob a forma de aerossol intranasal costuma ser
eficaz. Inicialmente, são empregadas duas doses, 2 a
4 vezes ao dia (ver TABELA 148.2). Quando os sinto-
mas foram aliviados, a dosagem é reduzida conforme
o tolerado. Quando usadas como indicado, estas dro-
gas possuem poucos efeitos colaterais. Vários sinto-
mas intratáveis podem necessitar de um pequeno ci-
clo de corticosteróides sistêmicos (prednisona 30mg
ao dia, VO, com redução gradual da dose, em 1 se-
mana, para zero ou para 10mg em dias alternados).
A imunoterapia de alérgeno (dessensibilização)
(ver anteriormente) está indicada, se não se puder
evitar o alérgeno, quando o tratamento com drogas
não for bem tolerado ou se for necessário o uso de
glicocorticóides durante a estação. Se o paciente for
alérgico a pólens, o tratamento deve ter início assim
que a estação de polinização terminar, para se prepa-
rar para a estação seguinte.
RINITE PERENE
É a rinite não sazonal, que pode ou não ser alérgi-
ca, algumas vezes complicada por sinusite,
pólipos nasais ou sensibilidade à aspirina e ou-
tras DAINE.
Sintomas, sinais e diagnóstico
Contrastando com a febre do feno, os sintomas
da rinite perene variam quanto à gravidade (fre-
TABELA 148.2 – DROGAS ANTIINFLAMATÓRIAS NASAIS INALADAS
Via de Dose por Dose inicial (em Doses por
Droga administração pulverização pulverizações por narina) cannister
Corticosteróides locais com
efeitos sistêmicos mínimos
Dipropionato de Pressurizada 42µg > 12 anos, uma, 2 a 4 vezes ao dia 200
beclometasona 6 a 12 anos, uma, 3 vezes ao dia
Aquosa 42µg ≥ 6 anos de idade, uma a duas, 200
2 vezes ao dia
Flunisolida Aquosa 25µg > 6 anos de idade, duas, 2 vezes ao dia 125
Acetonido de triancinolona1 Pressurizada 55µg Duas, diariamente 100
Fluticasona1 Aquosa 50µg Uma a duas, diariamente 120
Budesonida Pressurizada 32µg ≥ 6 anos de idade, duas, 2 vezes 200
ao dia ou quatro, diariamente
Cromolina e nedocromil2 Aquosa 5,2mg ≥ 6 anos de idade, uma, 200
3 ou 4 vezes ao dia
Corticosteróides com
efeitos sistêmicos
Dexametasona Pressurizada 84µg > 12 anos, duas, 2 ou 3 vezes ao dia 170
6 – 12 anos, uma a duas, 2 vezes ao dia
1
 Não aprovado para uso em crianças < 12 anos de idade.
2
 A forma nasal de nedocromil ainda não está disponível nos EUA.
Tabela cortesia de Platts-Mills TE, Wheatley LM: “Chronic rhinitis caused by dust mite and other indoor allergens” in
Current Therapy in Allergy, Immunology, and Rheumatology, editado por L Lichtenstein e A Fauci, Philadelphia, Mosby,
1996, p. 19.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351035
1036 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
qüentemente de modo imprevisto) ao longo do ano.
Os sintomas extranasais (por exemplo, conjuntivi-
te) são incomuns, embora a obstrução nasal crôni-
ca seja em geral proeminente e possa se estender
até a tuba de Eustáquio. A conseqüente dificuldade
auditiva é particularmente comum em crianças. O
diagnóstico baseia-se na história positiva de doen-
ça atópica, a mucosa nasal vermelho-azulada ca-
racterística, detecção de numerosos eosinófilos na
secreção nasal e testes cutâneos positivos (particu-
larmente para a poeira domiciliar, ácaros da poei-
ra, penas, epitélios de animais ou fungos). Alguns
pacientes apresentam infecções de seios da face
com complicações e pólipos nasais.
Diagnóstico diferencial – Alguns pacientes
com testes cutâneos negativos e numerosos eosi-
nófilos em suas secreções nasais sofrem de rinite
crônica, sinusite e pólipos, chamada de rinite
não alérgica eosinófila ou rinite não alérgica
com eosinofilia. Estes pacientes são não atópicos,
mas, com freqüência, possuem sensibilidade à
aspirina e outras DAINE; um subgrupo sofre
somente de rinite crônica.
Alguns indivíduos sofrem de rinite vasomotora,
que é caracterizada por obstrução nasal leve, po-
rém contínua ou rinorréia e alergia, pólipos, infec-
ções, eosinofilia ou sensibilidade a drogas não de-
monstráveis (ver Cap. 86). Um grupo adicional de
pacientes sofre de rinite pelo uso excessivo de des-
congestionantes tópicos (α-adrenérgicos) (rinite
medicamentosa).
Tratamento
Se algum alérgeno específico for identificado, a
conduta é semelhante àquela para a febre do feno,
com exceção do uso de glicocorticóides sistêmi-
cos; embora eficazes, devem ser evitados devido à
necessidade do uso prolongado. O tratamento ci-
rúrgico (antrotomia e irrigação dos seios da face,
polipectomia, ressecção submucosa) ou criotera-
pia são, algumas vezes, tentados depois que os fa-
tores alérgicos tiverem sido controlados ou elimi-
nados. Não existe nenhum dado que prove que a
cirurgia é eficaz para a rinite perene por si própria.
Em geral, o grupo de pacientes portadores de rinite
não alérgica eosinofílica responde melhor ao trata-
mento tópico com glicocorticóides. Para muitos
pacientes com rinite vasomotora, o único tratamen-
to consiste em tranqüilização, uso de anti-histamí-
nicos e drogas vasoconstritoras orais, além da ad-
vertência para que sejam evitados descongestio-
nantes tópicos, que produzem uma congestão tardia
e, quando usados continuamente durante uma sema-
na ou mais, podem agravar ou perpetuar uma rinite
crônica (rinite medicamentosa). Alguns pacientes
podem ser beneficiados com o uso freqüente de
lavagens salinas, brometo de ipratrópio tópico ou
aerossóis nasais.
Conjuntivite alérgica
É a inflamação alérgica da conjuntiva.
A conjuntivite alérgica na forma catarral aguda ou
crônica é, geralmente, parte de uma síndrome alérgi-
ca maior (por exemplo, febre do feno), mas ela pode
ocorrer isoladamente, através do contato direto com
substâncias transportadaspelo ar (por exemplo, pó-
lens, esporos de fungos, vários tipos de poeira e des-
camações epiteliais de animais). (Ver também CERA-
TOCONJUNTIVITE PRIMAVERIL, no Cap. 95.)
Sintomas, sinais e diagnóstico
O prurido intenso pode estar acompanhado por
lacrimejamento excessivo. A conjuntiva apresen-
ta-se edemaciada e hiperemiada. A causa é, freqüen-
temente, sugerida pela história do paciente e pode
ser confirmada pelo teste cutâneo.
Tratamento
Todo alérgeno suspeito ou identificado como
causador deve ser evitado. O uso freqüente de uma
solução suave para lavagem dos olhos (por exem-
plo, solução salina tamponada a 0,65%) pode re-
duzir a irritação. Lentes de contato são desaconse-
lhadas. Geralmente, a administração de anti-hista-
mínicos, VO, pode ser benéfica. Existem anti-
histamínicos disponíveis para uso tópico (anta-
zolina a 0,5%, feniramina a 0,3%), mas somente
em soluções oftálmicas em associação com vaso-
constritores, como nafazolina a 0,025 a 0,05% ou
fenilefrina a 0,125%. O uso, por longo período, de
vasoconstritores pode causar o mesmo fenômeno
de repercussão nos olhos, como ocorre no nariz. O
anti-histamínico de uso tópico ou os conservantes
presentes nos preparados podem ser sensibilizantes
e a maioria dos pacientes responde tão bem ou
melhor à administração VO de um anti-histamínico
associado a um vasoconstritor tópico, do que à com-
binação destes medicamentos para uso tópico (ver
também CONJUNTIVITE PRIMAVERIL no Cap. 95).
A cromalina (solução oftálmica a 4%) pode ser be-
néfico, particularmente na prevenção do desenvol-
vimento dos sintomas, quando a exposição ao
alérgeno puder ser prevista (ver Rinite Alérgica,
anteriormente). Uma suspensão oftálmica de cor-
ticosteróide (por exemplo, medrisona a 1% ou fluo-
rometolona a 0,1% aplicada 4 vezes ao dia) pode
ser usada, em muitos casos, como o último recurso
e em consulta com um oftalmologista. A pressão
intra-ocular deve ser avaliada antes e regularmente
durante tal tratamento, que deve ser suspenso tão
logo seja possível.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351036
CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1037
Outras doenças alérgicas
do globo ocular
As pálpebras podem estar acometidas por angioe-
dema ou urticária, dermatite de contato ou der-
matite atópica. A dermatite de contato palpebral,
uma reação de hipersensibilidade celular (tardia, Tipo
IV), pode ser causada por diversas medicações of-
tálmicas ou por drogas transportadas até a região
ocular por meio dos dedos (por exemplo, antibióti-
cos por manipuladores de drogas) ou por pó facial,
esmalte de unhas ou tinturas de cabelos. A córnea
pode estar envolvida, como decorrência da proxi-
midade da conjuntivite alérgica ou constituindo
uma variante de ceratite puntiforme superficial,
raramente levando à escarificação.
A presença de dor, fotofobia, lacrimejamento e
inflamação circuncorneal ciliar constitui indicação
de provável uveíte anterior. A causa é usualmen-
te desconhecida. Acredita-se que a oftalmia sim-
pática seja uma reação de hipersensibilidade a pig-
mentos uveais. A endoftalmia facoanafilática é
alergia a proteínas próprias do cristalino. Esta rea-
ção grave ao cristalino remanescente ocorre, tipi-
camente, horas após a remoção rotineira de catara-
ta, apesar de poder envolver trauma ou inflamação
acometendo a cápsula do cristalino. Nestas condi-
ções graves, é imprescindível que uma avaliação
rápida e a conduta terapêutica sejam realizadas por
um oftalmologista (ver também Cap. 98).
Alergia e intolerância alimentar
Alergia alimentar são sintomas reproduzíveis que
ocorrem após a ingestão de um alimento espe-
cífico para o qual está provada uma base imu-
nológica (anticorpos IgE para o alimento).
A intolerância alimentar envolve reações GI clí-
nicas, nas quais o mecanismo não é imunológi-
co ou é desconhecido.
São muito comuns algumas reações adversas a
alimentos (provavelmente de causa psicofisiológica)
serem atribuídas à alergia alimentar, mesmo na au-
sência de evidências da relação causa/efeito, pelo
menos do tipo de alergia que possa ser avaliada por
testes cutâneos e esteja associada a anticorpos IgE
específicos para alimentos. Determinadas afirmações
são controversas e quase totalmente inverídicas; por
exemplo, que a intolerância (ou alergia) alimentar
ou aditivos presentes em alimentos possam ser res-
ponsáveis por crianças hiperativas, pela “síndrome
de tensão-fadiga” e enurese. Também algumas afir-
mações pouco consistentes têm responsabilizado a
alergia alimentar por quadros de artrites, obesidade,
desempenho esportivo insatisfatório e depressão,
entre outras condições.
Ocasionalmente, queilite, aftas, espasmo de pi-
loro, constipação espástica, prurido anal e eczema
perianal têm sido atribuídos à alergia ou intolerân-
cia alimentar, embora esta associação seja de difí-
cil comprovação. Recentemente, a intolerância ali-
mentar foi considerada responsável pelos sintomas
presentes em alguns pacientes com síndrome do
cólon irritável, confirmada por testes de provoca-
ção duplo-cegos. Um aumento dos níveis de pros-
taglandina no reto foi observado quando a reação
ocorre. Informações preliminares sugerem que o
mesmo fenômeno pode estar presente, em deter-
minadas ocasiões, em pacientes com colite ulcera-
tiva crônica.
A enteropatia eosinofílica, que pode estar re-
lacionada à alergia alimentar específica, constitui
uma doença pouco habitual caracterizada por dor,
cólicas e diarréia associada à eosinofilia sangüínea,
a infiltrados eosinofílicos no intestino, à enteropa-
tia perdedora de proteínas e a uma história de doen-
ça atópica. Raramente ocorre disfagia, indicativa
de envolvimento esofágico.
A alergia alimentar mediada por IgE verdadeira
usualmente se desenvolve na infância, com mais
freqüência naqueles com uma sólida história fami-
liar de atopia.
Sintomas e sinais
A primeira manifestação pode ser o eczema (der-
matite atópica), sozinho ou em associação com sin-
tomas GI. Comumente, ao final do primeiro ano, a
dermatite diminui e os sintomas alérgicos respirató-
rios começam a se manifestar. A asma e a rinite alér-
gica podem ser agravadas pela alergia alimentar, que
pode ser identificada por testes cutâneos. Entretan-
to, à medida que a criança cresce, os alimentos tor-
nam-se menos importantes e o paciente passa a rea-
gir cada vez mais aos alérgenos inalados. Quando a
criança portadora de asma e febre do feno atinge os
10 anos de idade, é raro que algum alimento consti-
tua o fator desencadeante dos sintomas respiratórios,
embora os testes cutâneos continuem positivos. Se a
dermatite atópica persistir ou aparecer em crianças
de mais idade ou em adultos, sua atividade parece
ser totalmente independente da alergia mediada por
IgE, embora os pacientes atópicos portadores de
dermatite extensa apresentem níveis muito mais al-
tos de IgE sérica do que aqueles que não apresen-
tam doença cutânea.
A maioria dos pacientes jovens alérgicos a
alimentos são sensíveis aos alérgenos potentes
(por exemplo, alérgenos em ovos, leite, nozes,
amendoim e soja). As pessoas mais velhas po-
dem reagir violentamente à ingestão de quan-
tidades mínimas destes e de outros alimentos
(especialmente moluscos), apresentando qua-
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1038 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
dros intensos de urticária, angioedema e até
mesmo anafilaxia. Esta pode ocorrer em pacien-
tes com baixo grau de sensibilidade somente se
eles praticarem algum exercício físico após a
ingestão do alimento prejudicial.
Algumas vezes, a intolerância ao leite é cau-
sada pela deficiência de uma dissacaridase intes-
tinal, manifestando-se por sintomas gas-
trointestinais (ver também INTOLERÂNCIA A CAR-
BOIDRATOS no Cap. 30). Em outros pacientes, o
leite pode desencadear sintomas gastrointestinais
e até mesmo respiratórios por razões não identi-
ficadas. Osaditivos alimentares podem produzir
sintomas sistêmicos (glutamato monossódico);
asma (metabissulfeto, tartrazina – um corante
amarelo) e possivelmente urticária (tartrazina).
Estas reações não são causadas pelos anticorpos
IgE. Poucos pacientes padecem de um tipo de
enxaqueca agravada ou desencadeada por ali-
mentos, o que pode ser confirmado pelo empre-
go de teste de provocação oral cego.
Na maioria dos pacientes adultos, a digestão pre-
vine eficazmente os sintomas alérgicos alimenta-
res. Isto é ilustrado por pacientes alérgicos que rea-
gem à inalação ou contato, mas não à ingestão de
um alérgeno (por exemplo, asma do padeiro: os
indivíduos afetados sibilam após exposição ao pó
da farinha e apresentam testes cutâneos positivos
ao trigo e/ou outros grãos, embora permaneçam
assintomáticos após ingestão destes mesmos pro-
dutos sob a forma de grãos).
Diagnóstico
Em geral, a alergia alimentar grave apresenta-se
sob uma forma evidente em adultos. Quando isto
não acontece, ou na maioria das crianças, o diag-
nóstico pode ser difícil de ser estabelecido e a con-
dição deve ser diferenciada dos distúrbios funcio-
nais gastrointestinais.
Nas pessoas com suspeita de reações a ali-
mentos ingeridos, a relação dos sintomas aos ali-
mentos é avaliada primeiro por testes cutâneos
apropriados. Um teste positivo não prova clini-
camente alergia relevante, porém um teste nega-
tivo a elimina. Com um teste cutâneo positivo, a
sensibilidade clinicamente relevante pode ser
determinada por uma dieta de eliminação e, se
os sintomas melhorarem, pela reexposição ao
alimento para determinar se ele é capaz de indu-
zir os sintomas. Todas as provocações positivas
devem ser seguidas de um desafio duplo-cego
para serem consideradas definitivas. A dieta bá-
TABELA 148.3 – DIETAS DE ELIMINAÇÃO – ALIMENTOS PERMITIDOS
Dieta nº 1* (sem Dieta nº 2* (sem Dieta nº 3* (sem
carne bovina, carne bovina, carne de carneiro,
suína, aves, leite, carneiro, aves, centeio, arroz,
Gênero alimentício centeio, milho) leite, arroz) milho, leite)
*Dieta n… 4: Se os sintomas persistirem nas três dietas de eliminação anteriores e a dieta ainda for suspeita, a dieta diária
pode ser restrita a uma elementar, tal como Vivonex.
—
Feijões lima, beterrabas, ba-
tatas (branca e doce), va-
gem, tomates
Carne bovina, bacon
Feijões lima, feijões de soja,
batatas
Toronja, limões, pêssegos,
damascos
Óleo de caroço de algodão,
azeite de oliva
Chá, café (preto), limonada,
suco da fruta permitida
Pudim de mandioca, gelati-
na, açúcar de cana, açúcar
de bordo, sal, azeitonas
Produtos de milho
Milho, tomates, ervilhas,
aspargos, abóbora, vagem
Galinha, bacon
Milho, centeio 100% (pão
de centeio comum
contém trigo)
Pêssegos, damascos, amei-
xas secas, abacaxi
Óleo de milho, óleo de ca-
roço de algodão
Chá, café (preto), limonada
Açúcar de cana, gelatina,
xarope de milho, sal
Produtos de arroz
Alface, espinafre, cenouras,
beterrabas, alcachofras
Carneiro
Arroz
Limões, pêras, toronja
Óleo de caroço de algodão,
azeite de oliva
Chá, café (preto), limonada
Pudim de mandioca, gelati-
na, açúcar de cana, açúcar
de bordo, sal, azeitonas
Cereais
Vegetais
Carne
Farinha (pão ou
biscoitos)
Fruta
Gordura
Bebidas
Variados
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351038
CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1039
sica é determinada pela eliminação dos alimen-
tos suspeitos, pelo paciente, de causarem sinto-
mas ou colocando-se o paciente numa dieta com-
posta de alimentos relativamente não alérgicos
(ver TABELA 148.3).
Os alimentos que comumente causam alergia
são leite, ovos, mariscos, nozes, trigo, amendoim,
soja e todos os produtos que contêm um ou mais
desses ingredientes. Os alérgenos mais comuns e
todos os alimentos suspeitos devem ser elimina-
dos da dieta desde o início. Nenhum alimento ou
líquido deve ser consumido, senão aqueles espe-
cificados no início da dieta. Não é aconselhável
comer em restaurantes, visto que o paciente (e o
médico) devem conhecer a composição exata de
todas as refeições. Deve-se sempre utilizar produ-
tos puros; por exemplo, o pão de centeio comum
contém um pouco de farinha de trigo.
Se não ocorrer nenhuma melhora após 1 sema-
na, deve-se tentar uma outra dieta. Se os sintomas
cederem, adiciona-se um novo alimento e mais do
que a quantidade habitual consumida por > 24h ou
até que os sintomas ocorram novamente. Alterna-
tivamente, pequenas quantidades de alimento a ser
testado são ingeridas na presença do médico, ob-
servando-se as reações do paciente. A piora ou re-
crudescência dos sintomas após a adição de um
novo alimento é a melhor evidência de alergia. Tal
evidência deve ser verificada observando-se o efeito
da remoção daquele alimento da dieta por vários
dias e, depois, introduzindo-o.
Tratamento
O único tratamento é a eliminação dos alimen-
tos prejudiciais. As dietas de eliminação podem
ser usadas tanto para diagnóstico como para o tra-
tamento. Quando poucos alimentos estiverem en-
volvidos, prefere-se a abstinência. A sensibiliza-
ção a um ou mais alimentos pode desaparecer es-
pontaneamente. A dessensibilização oral (primei-
ramente eliminar o alimento prejudicial durante
um certo tempo e, a seguir, reintroduzir em pe-
quenas quantidades crescentes, diariamente) não
parece ser eficaz, assim como também a adminis-
tração sublingual de pastilhas contendo extratos
de alimentos. Os anti-histamínicos são de pouco
valor, exceto nas reações gerais agudas com urti-
cária e angioedema. A cromalina para uso oral tem
sido empregado, com aparente êxito em outros pa-
íses, embora a forma oral não tenha sido aprova-
da para uso nos EUA, exceto para a mastocitose
(ver adiante). O tratamento prolongado com gli-
cocorticosteróides não está indicado, exceto na en-
teropatia eosinofílica.
Para tratamento das crises agudas graves, poten-
cialmente fatais, ver ANAFILAXIA, abordada adiante.
Doença pulmonar alérgica
Os pulmões podem ser envolvidos de várias
maneiras durante reações alérgicas conhecidas ou
consideradas apenas prováveis, dependendo da
natureza do alérgeno e de sua via de entrada. Os
distúrbios específicos serão discutidos em ASMA,
nos Capítulos 68 e 76.
ANAFILAXIA
É uma reação aguda sistêmica, geralmente
eruptiva, mediada por IgE que ocorre em pes-
soas previamente sensibilizadas que recebem o
antígeno sensibilizante.
A anafilaxia ocorre quando um antígeno (pro-
teínas, polissacarídeos ou haptenos ligados a uma
proteína carregadora) atingem a circulação. Os an-
tígenos mais comumente implicados incluem as
enzimas parentais, os derivados sangüíneos, os an-
tibióticos β-lactâmicos e várias outras drogas, imu-
noterapia por alérgeno (dessensibilização) e pica-
das de insetos. As drogas β-bloqueadoras, até mes-
mo como colírios, podem agravar as reações
anafiláticas. A anafilaxia pode piorar ou, mesmo,
ser induzida de novo por exercício e alguns pacien-
tes apresentam sintomas recorrentes devido a fato-
res não identificados. Histamina, leucotrienos e ou-
tros mediadores são gerados ou liberados quando
o antígeno reage com a IgE ligada a basófilos e
mastócitos. Estes mediadores causam contração da
musculatura lisa (responsável pelos sintomas GI e
por ofegar) e dilatação vascular que caracterizam a
anafilaxia. A vasodilatação e a transudação do plas-
ma para os tecidos causam urticária e angioedema
e resultam em diminuição do volume plasmático
efetivo, que constitui a principal causa de choque.
Os fluidos extravasam para os alvéolos pulmona-
res e podem causar edema de pulmão. Também
pode ocorrer angioedema obstrutivo das vias aé-
reas superiores. Se a reação for prolongada, podem
surgir arritmias e choque cardiogênico.
As reaões anafilactóides são clinicamente se-
melhantes à anafilaxia, embora possam ocorrer após
a primeira injeção de determinadasdrogas (poli-
mixina, pentamidina, opióides) e meios de contras-
te. Elas possuem um mecanismo relacionado à dose,
tóxico idiossincrático, ao invés de um mecanismo
imunologicamente mediado. O ácido acetilsalicíli-
co e outras DAINE podem causar reações em pa-
cientes suscetíveis.
Sintomas e sinais
Os sintomas variam e quase nunca um paciente
desenvolve todos eles. Tipicamente, entre 1 e 15min
(mas raramente depois de 2h) o paciente sente-se
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1040 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
inquieto, fica agitado e ruborizado e reclama de
palpitações, parestesias, prurido, pulsação nos ou-
vidos, tosse, espirros, urticária, angioedema e difi-
culdade para respirar decorrente de edema de la-
ringe ou broncospasmo. Menos comumente estão
presentes náuseas, vômitos, dores abdominais e
diarréia. O choque pode se desenvolver dentro de
outros 1 ou 2min e o paciente pode ter convulsões,
ficar incontinente, não responsivo e morrer. O co-
lapso cardiovascular primário pode ocorrer sem sin-
tomas respiratórios. Episódios recorrentes de
anafilaxia na mesma pessoa são usualmente caracte-
rizados pelos mesmos sintomas.
Profilaxia
Os pacientes com maior risco de desenvolver rea-
ções anafiláticas a drogas são os que já reagiram
anteriormente àquela droga, embora algumas mor-
tes por anafilaxia possam ocorrer sem tal história.
Como o risco de uma reação a anti-soro xenogênico
é alto, sendo obrigatória a realização de testes cu-
tâneos de rotina antes da administração do soro,
podem ser necessárias medidas profiláticas. A reali-
zação de testes cutâneos de rotina antes do tratamento
com outras drogas costuma ser impraticável ou não
confiável, com exceção, talvez, daqueles para a pe-
nicilina (os testes serão discutidos em Mecanismos
de Hipersensibilidade a Drogas, adiante).
A imunoterapia de longa duração (dessensibi-
lização) é eficaz e apropriada para a prevenção da
anafilaxia devido a picadas de inseto, mas rara-
mente tem sido tentada em pacientes com antece-
dentes de anafilaxia por drogas ou soro. Ao invés
disto, se o tratamento com uma certa droga ou soro
for considerado essencial, deve ser efetuada a
dessensibilização rápida sob condições cuidado-
samente controladas (ver HIPERSENSIBILIDADE A
DROGAS, adiante).
Um paciente com prévia reação anafilactóide a
agentes de contrastes radiológicos pode receber o
agente novamente (se seu uso for essencial) pelo
pré-tratamento com prednisona 50mg, VO, a cada
6h e em 3 doses, difenidramina 50mg, VO, 1h an-
tes e efedrina (se não for contra-indicada) 25mg,
VO, 1h, antes para adultos. O uso de meios de con-
traste isosmóticos é preferido como medida de se-
gurança adicional.
Tratamento
É imperativo o tratamento imediato com adre-
nalina, um antagonista dos efeitos dos mediadores
químicos na musculatura lisa, vasos sangüíneos e
outros tecidos.
Para reaões leves (por exemplo, prurido ge-
neralizado, urticária, angioedema, discreta
sibilação, náuseas e vômitos) devem ser adminis-
trados 0,01mL/kg de adrenalina aquosa a 1:1.000
s.c. (dose usual de 0,3 a 0,5mL em adultos). Se um
antígeno injetado em uma extremidade causar
anafilaxia, deve-se colocar um torniquete acima
do local da injeção e metade da dose de adrena-
lina citada também injetada dentro do local para
reduzir a absorção sistêmica do antígeno. Em al-
gumas ocasiões, pode ser necessária uma segun-
da injeção de adrenalina por via s.c. Após a reso-
lução dos sintomas, um anti-histamínico VO deve
ser prescrito durante um período de 24h.
Para reaões mais graves, acompanhadas por
angioedema intenso, mas sem evidência de envol-
vimento cardiovascular, os pacientes adultos devem
receber difenidramina, 50 a 100mg IV, além do tra-
tamento anteriormente prescrito, visando evitar o
edema de laringe e bloquear o efeito de uma libe-
ração posterior de histamina. Quando o edema res-
ponder ao tratamento, pode ser administrado
0,005mL/kg de uma suspensão aquosa de adrena-
lina de longa ação, 1:200, por via s.c. (dose máxi-
ma, 0,15mL) para obtenção de efeito por 6 a 8h;
também deve ser prescrito um anti-histamínico oral
durante as 24h seguintes.
Para as reaões asmáticas que não respondem
à adrenalina, deve ser iniciada a infusão IV de flui-
dos e (se o paciente não estiver recebendo teofilina),
teofilina 5mg/kg IV deve ser administrada no perío-
do de 10 a 30min e, a seguir, na dose de aproxima-
damente 0,5mg/kg/h, aproximadamente, para a
manutenção de níveis sangüíneos de teofilina en-
tre 10 e 20µg/mL (55 a 110µmol/L). Podem ser
necessárias intubação endotraqueal ou traqueosto-
mia, com O2, 4 a 6L/min.
As reaões mais graves freqüentemente envol-
vem o sistema cardiovascular, levando a hipoten-
são grave e colapso vasomotor. Os fluidos IV de-
vem ser rapidamente infundidos e o paciente deve
estar deitado, com as pernas elevadas. Adrenalina
(1:100.000) deve ser administrada IV, lentamente
(5 a 10µg/min) com observação rigorosa quanto
ao desenvolvimento de efeitos colaterais, incluin-
do cefaléias, tremores, náuseas e arritmias. A hi-
potensão grave de base pode ser devido a vasodi-
latação, hipovolemia por perda de líquidos, insu-
ficiência do miocárdio (raramente) ou uma com-
binação de todos esses fatores. Cada reação requer
um tratamento específico e, freqüentemente, o tra-
tamento de um fator exacerba os outros. A adoção
de uma terapia adequada pode ser evidenciada se
for possível medir a pressão venosa central (PVC)
e a pressão atrial esquerda também pode ser medi-
da (ver também Cap. 198). A PVC baixa e pres-
são atrial esquerda normal indicam a presença de
vasodilatação periférica e/ou hipovolemia. A va-
sodilatação deve responder à administração
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1041
de adrenalina (que também irá retardar a perda de
fluido intravascular).
A hipovolemia é, usualmente, a principal causa
de hipotensão. A PVC e a pressão atrial esquerda
estão baixas, devendo ser administrados grandes
volumes de solução salina com controle rígido da
pressão arterial até que a PVC se normalize. Rara-
mente torna-se necessário o uso de expansores plas-
máticos colóides (por exemplo, dextrano). Apenas
quando a reposição de fluidos não restaura os ní-
veis normais de pressão arterial deve ser iniciado o
tratamento cauteloso com drogas vasopressoras
(por exemplo, dopamina, noradrenalina).
Pode ocorrer parada cardíaca, sendo necessária
a ressuscitação imediata (ver Cap. 206). O trata-
mento a ser adotado posteriormente dependerá dos
achados no ECG.
Quando todas as medidas anteriormente descritas
já tiverem sido instituídas, difenidramina (50 a 75mg
IV, lentamente, em 3min) pode então ser administra-
da para o tratamento de urticária de início lento, asma,
edema de laringe ou hipotensão. As complicações (por
exemplo, IM, edema cerebral) devem ser procuradas
e tratadas com prioridade. Pacientes que apresentam
reações graves devem permanecer internados, sob
observação, durante as primeiras 24h após a recupe-
ração, em caso de recidiva de sintomas.
Aqueles que já tiverem apresentado uma reação
anafilática a picada de insetos devem carregar e usar
uma seringa com adrenalina para automedicação ime-
diata em qualquer futura reação. Eles deverão também
ser submetidos à avaliação, para o estabelecimento da
imunoterapia com veneno (dessensibilização).
DISTÚRBIOS DOS MEDIADORES
VASOATIVOS
São distúrbios com manifestações dos mediadores
vasoativos derivados de mastócitos e de outras
fontes (mesmo que um mecanismo mediado por
IgE ou outro mecanismo imunológico possa não
estar envolvido).
Urticária e angioedema
(Urticária; Urticária Gigante; Edema Angioneurótico)
Urticária são placas de urticária local e eritema
na derme superficial. O angioedema é um in-
chaço mais profundo devido a áreas edemato-
sas na derme profunda etecido subcutâneo e
podem também envolver membranas mucosas.
Etiologia
A urticária aguda e o angioedema são reações
essencialmente anafiláticas limitadas à pele e aos
tecidos subcutâneos e podem ser devido à alergia a
drogas, picadas ou mordidas de insetos, injeções
para dessensibilização ou ingestão de determina-
dos alimentos (particularmente ovos, moluscos ou
nozes). Algumas reações alimentares são desenca-
deadas de modo explosivo após ingestão de quan-
tidades mínimas do alimento. Outras (por exem-
plo, reações a morangos) podem ocorrer apenas
após um excesso de ingestão, possivelmente de-
correntes da liberação direta (tóxica) de media-
dores. A urticária pode acompanhar ou mesmo cons-
tituir o primeiro sintoma de diversas infecções vi-
rais, incluindo hepatite, mononucleose infecciosa
e rubéola. Algumas reações agudas permanecem
sem explicação, mesmo quando apresentam cará-
ter recorrente. Se o angioedema agudo for recor-
rente, progressivo, doloroso, ao invés de apresen-
tar prurido e não se associar à urticária, deve-se
suspeitar de uma deficiência enzimática hereditá-
ria (ver Angioedema Hereditário, adiante).
A urticária crônica e o angioedema persisten-
tes há mais de 6 semanas são difíceis de esclare-
cer e apenas em casos excepcionais pode-se en-
contrar alguma causa específica. As reações rara-
mente são mediadas por IgE. Ocasionalmente, a
ingestão crônica de uma droga da qual não se sus-
peita ou substância química é responsável; por
exemplo, penicilina no leite; uso de drogas sem
prescrição médica, assim também a ingestão de
conservantes ou outros aditivos alimentares. Uma
doença crônica de base (LES, policitemia vera,
linfomas ou infecções) deve ser descartada. Em-
bora freqüentemente lembrados, os fatores psico-
gênicos controláveis não são, em geral, identifi-
cados. A urticária causada por agentes físicos será
discutida em Alergia Física, adiante. Alguns pa-
cientes que apresentam urticária não responsiva
ao tratamento possuem doença tireóidea. Ocasio-
nalmente, a urticária pode ser o primeiro ou úni-
co sinal visível da vasculite cutânea.
Sintomas e sinais
Na urticária, o prurido (em geral o primeiro sin-
toma) é seguido imediatamente pelo aparecimento
de pápulas, que podem permanecer com pequeno
tamanho (1 a 5mm) ou aumentar. As maiores ten-
dem a apresentar uma região central clara, podendo
ser inicialmente descritas como grandes (> 20cm de
diâmetro) anéis de eritema e edema. Comumente,
a urticária surge em surtos que aparecem e desapa-
recem; uma lesão pode permanecer em determina-
do local durante várias horas, desaparecendo, a se-
guir, para reaparecer em outro lugar qualquer. Se
uma lesão persistir por ≥ 24h, a possibilidade de
vasculite deve ser considerada.
O angioedema é caracterzado por edema mais
difuso e doloroso de tecido subcutâneo frouxo,
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1042 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
dorso das mãos ou pés, pálpebras, lábios, genitália
e membranas mucosas. O edema das vias aéreas
superiores pode produzir desconforto respiratório
e o estridor pode ser confundido com uma crise de
asma.
Diagnóstico
Freqüentemente, a causa da urticária aguda
ou angioedema agudo é óbvia. Mesmo quando
não for aparente, a realização de testes diagnós-
ticos raramente torna-se necessária, tendo em vista
a natureza autolimitada e não recorrente destas
reações. Na urticária crônica, a presença de uma
doença crônica de base deve ser afastada por
anamnese e exame físico minuciosos e testes
rotineiros de triagem. A eosinofilia é incomum
na urticária. Outros testes (por exemplo, pesqui-
sa de ovos e parasitas nas fezes, complemento
sérico, anticorpos antinucleares e exame radio-
lógico de seios da face e dentes) não são úteis
sem indicações clínicas adicionais.
Tratamento
Como a urticária aguda geralmente regride no
período de 1 a 7 dias, o tratamento é, principal-
mente, paliativo. Se a causa não for óbvia, todas
as medicações consideradas não essenciais devem
ser suspensas até que a reação tenha desapareci-
do. Em geral, os sintomas podem ser aliviados pela
administração de anti-histamínicos por VO, tais
como difenidramina 50 a 100mg, a cada 4h;
hidroxizina 25 a 100mg, duas vezes ao dia; ci-
pro-heptadina 4 a 8mg, a cada 4h. Se estas causa-
rem sonolência (que ocorre numa minoria de pa-
cientes), um dos anti-histamínicos não sedativos
(ver anteriormente) deve ser utilizado. A adminis-
tração de um glicocorticóide (por exemplo, predni-
sona, 30 a 40mg ao dia, VO) pode tornar-se ne-
cessária para reações mais graves, particularmente
quando associadas ao angioedema. Os glico-
corticóides de uso tópico não apresentam qual-
quer valor terapêutico. A adrenalina 1:1.000,
0,3mL, por via s.c., deve ser o primeiro tratamento
para o angioedema agudo de faringe ou laringe.
Pode também ser acrescentada ao tratamento uma
medicação tópica; por exemplo, um agente α-adre-
nérgico nebulizado e um anti-histamínico VO (por
exemplo, difenidramida 50 a 100mg). Isto comu-
mente previne a obstrução das vias aéreas, porém
a intubação ou traqueostomia e administração de
O2 podem ser necessárias.
Na urticária crônica as remissões espontâneas
ocorrem no período de 2 anos em aproximadamente
metade dos casos. Em geral, o controle do estresse
auxilia a reduzir a freqüência e gravidade dos epi-
sódios. Certas drogas (por exemplo, aspirina) po-
dem agravar os sintomas, assim como bebidas al-
coólicas, café e fumo; se isto ocorrer, eles devem
ser evitados. Quando a urticária for desencadeada
pela aspirina, deve ser investigada a sensibilidade
a DAINE e à tartrazina (aditivo alimentar e corante
de drogas) (ver também Rinite Perene, descrita an-
teriormente). Os anti-histamínicos orais com efei-
to tranqüilizante são usualmente benéficos (por
exemplo, para adultos, hidroxizina, 25 a 50mg, 2
vezes ao dia; cipro-heptadina, 4 a 8mg a cada 4 a
8h; para crianças, hidroxizina 2mg/kg ao dia divi-
didos a cada 6 a 8h e cipro-heptadina 0,25 a
0,5mg/kg ao dia, divididos a cada 8 a 12h). A doxe-
pina, 25 a 50mg, 2 vezes ao dia, pode ser o agente
mais eficaz para alguns adultos. Com freqüência,
os bloqueadores H2 (como ranitidina 150mg, duas
vezes ao dia) são adicionados. Todas as medidas
razoáveis devem ser tentadas antes da introdução
de glicocorticóides, pois estes podem precisar ser
administrados indefinidamente.
Angioedema hereditário
É uma forma de angioedema transmitido como um
traço autossômico dominante e associado à de-
ficiência do inibidor sérico do primeiro compo-
nente ativado do complemento.
Etiologia, sintomas e sinais
Em 85% dos casos, a deficiência é devido à
ausência do inibidor de C1 esterase; em 15%,
à disfunção do inibidor de C1 esterase. Uma pos-
sível história familiar é a regra, com algumas
exceções. O edema é tipicamente unifocal, endu-
recido, mais doloroso do que pruriginoso e não
acompanhado por urticária. Em geral, as crises
são desencadeadas por traumas ou doenças vi-
rais, sendo agravadas por tensões emocionais.
Freqüentemente, ocorre envolvimento do trato
gastrointestinal com náuseas, vômitos, cólicas e
até mesmo sinais de obstrução intestinal. Esta
condição pode causar obstrução fatal das vias
aéreas superiores.
Diagnóstico
O diagnóstico pode ser estabelecido pela quan-
tificação de C4, que está baixo mesmo no período
intercrise ou, mais especificamente, pela demons-
tração da deficiência quantitativa do inibidor de C1
por meio de imunoensaio e teste funcional, se os
resultados do imunoensaio forem inesperadamen-
te normais.
Uma forma adquirida de deficiência de inibidor
de C1 secundária a doenças neoplásicas, como lin-
foma, é diferenciada por baixos níveis de C1 e por
níveis diminuídos de C4.
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1043
Profilaxia
Para a profilaxia a curto prazo de um pacien-te não tratado previamente (como antes de um pro-
cedimento dental, endoscopia ou cirurgia), 2U de
plasma fresco congelado podem ser administradas.
Apesar de, teoricamente, um substrato de comple-
mento no plasma poder provocar um ataque, isto
não foi observado em pacientes sem sintomas. Re-
centemente, uma fração de inibidor de C1 esterase
parcialmente purificado de plasma acumulado mos-
trou ser seguro e eficaz para profilaxia, porém, não
está disponível para uso geral. Se o tempo permi-
tir, o paciente deve ser tratado por 3 a 5 dias com
um androgênio (ver adiante).
Para profilaxia a longo prazo, os androgênios
são eficazes. Um dos androgênios de efeito retardado
deve ser utilizado. O tratamento começa com estano-
zolol oral 2mg, três vezes ao dia ou danazol 200mg,
três vezes ao dia. O estanozolol é menos oneroso.
Uma vez que se atinja o controle, a dosagem deve
ser reduzida o máximo possível para baratear o cus-
to e, nas mulheres, para minimizar os efeitos colate-
rais masculinizantes. Estas drogas não apenas são
eficazes, mas também comprovadamente elevam o
inibidor C1 esterase baixo e C4 até o normal.
Tratamento
O edema progride até que os componentes do
complemento sejam consumidos. Assim, as crises
agudas que apresentam risco de desencadearem
obstrução aérea devem ser tratadas imediatamente,
estabelecendo-se uma via aérea. O uso de plasma
fresco congelado é controverso. A administração de
adrenalina, um anti-histamínico e um glicocorticóide
está indicada, embora não haja evidências conclusi-
vas de que estas drogas sejam eficazes.
Mastocitose
É uma condição de etiologia desconhecida, ca-
racterizada por acúmulo excessivo de mastóci-
tos em vários órgãos e tecidos corpóreos.
Os mastócitos teciduais podem contribuir para
a defesa do hospedeiro por intermédio da libera-
ção de potentes mediadores pré-formados (por
exemplo, histamina), a partir de seus grânulos e
pela geração de mediadores neoformados (por
exemplo, leucotrienos), a partir de lipídeos de mem-
brana. Os mastócitos presentes em tecidos normais
também são mediadores dos sintomas de reações
alérgicas comuns, agindo através dos anticorpos IgE
ligados a seus receptores de superfície específicos.
A mastocitose pode ocorrer sob três formas:
mastocitoma (tumor cutâneo benigno); urticária
pigmentosa (pequenas coleções cutâneas múltiplas
de mastócitos, que se desenvolvem como máculas
e pápulas de cor salmão ou castanha, que produ-
zem urticária quando traumatizadas e podem se
transformar em lesões vesiculares ou até mesmo
bolhosas) e mastocitose sistêmica (infiltração de
mastócitos na pele, linfonodos, fígado, baço, trato
gastrointestinal e ossos).
Sintomas, sinais e diagnóstico
Os pacientes com mastocitose sistêmica apresen-
tam artralgias, dores ósseas e sintomas anafilactóides.
Outros sintomas (aumento das secreções ácida e
mucosa do estômago) são desencadeados pela esti-
mulação dos receptores H2. Assim, a úlcera péptica
e a diarréia crônica constituem complicações co-
muns. A quantidade de histamina determinada por
biópsias de tecidos pode estar extremamente alta,
proporcional ao aumento da concentração de mas-
tócitos. Na mastocitose sistêmica, a excreção uriná-
ria de histamina e seus metabólitos é alta e a
histamina plasmática pode estar elevada. Também
têm sido descritos níveis plasmáticos aumentados
de triptase, heparina e prostaglandina D2.
Prognóstico e tratamento
A mastocitose cutânea pode desenvolver-se
em crianças ou adultos. A mastocitomia solitária
pode involuir espontaneamente; a urticária
pigmentosa pode apresentar regressão completa
ou melhora substancial antes da adolescência. É
muito raro que estas condições progridam para a
mastocitose sistêmica. Em geral, o único tratamen-
to necessário é o do prurido, com o uso de um
bloqueador H1 (ver Urticária e Angioedema, des-
critos anteriormente).
Os sintomas de mastocitose sistêmica devem
ser tratados com bloqueadores H1 e H2. Uma vez
que se acredita que as prostaglandinas, em espe-
cial a prostaglandina D2, possam contribuir para
os sintomas relacionados aos mastócitos, a tera-
pia com aspirina pode ser tentada cautelosamen-
te; enquanto inibem a síntese das prostaglandinas,
a aspirina e drogas similares podem aumentar a
produção de leucotrienos. A cromolina 200mg, 4
vezes ao dia, VO (100mg, 4 vezes ao dia, para
crianças de 2 a 12 anos [não excedendo 40mg/kg
ao dia]), deve ser administrada, se os sintomas
não forem controlados. Não existe qualquer tra-
tamento eficaz disponível para reduzir o número
de mastócitos teciduais.
Alergia física
É uma condição na qual os sintomas e sinais alér-
gicos são produzidos pela exposição aos estí-
mulos físicos, por exemplo, frio, luz solar, calor
ou traumas leves.
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1044 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
Etiologia
Na maioria das vezes, a causa fundamental é
desconhecida. Em algumas ocasiões, a fotossen-
sibilidade pode ser induzida por drogas ou subs-
tâncias de uso tópico, incluindo determinados cos-
méticos (ver Cap. 119 e DERMATITE DE CONTATO
no Cap. 111). Em alguns casos, a sensibilidade
ao frio e à luz pode ser removida passivamente
com soros que contenham anticorpo IgE especí-
fico, sugerindo um mecanismo imunológico que
envolve uma proteína cutânea fisicamente altera-
da, atuando como antígeno. Um mecanismo al-
ternativo é sugerido pelo achado recente de auto-
anticorpos IgG e IgM em alguns pacientes com
urticária do frio. O soro de alguns pacientes com
sintomas induzidos pelo frio contém crioglo-
bulinas ou criofibriogênio; estas proteínas anor-
mais podem estar associadas a uma grave doença
de fundo (por exemplo, neoplasias, doenças vas-
culares do colágeno, infecções crônicas). O frio
pode agravar asma ou rinite vasomotora, mas a
urticária do frio é independente de qualquer ou-
tra tendência alérgica conhecida.
A sensibilidade de cerca de metade dos casos
idiopáticos estudados pode ser passivamente re-
movida através do soro e parece ser mediada por
IgE. Comumente, a sensibilidade ao calor desen-
cadeia urticária colinérgica, que também é induzi-
da nos mesmos pacientes por exercícios, tensões
emocionais ou qualquer estímulo que provoque
sudorese. A urticária colinérgica parece ser causa-
da por rara sensibilidade à acetilcolina.
Sintomas, sinais e diagnóstico
O prurido e uma aparência repugnante são as
queixas mais comuns. A sensibilidade ao frio ma-
nifesta-se usualmente por urticária e angioedema,
que se desenvolvem tipicamente após exposição ao
frio e durante ou depois da natação. Em casos ex-
tremos, podem ocorrer broncospasmos e choque
mediado por histamina, resultando em afogamen-
to. A luz solar pode desencadear urticária ou uma
erupção cutânea polimorfa mais crônica. A urticária
também decorreu de exposição a um estímulo
vibratório persistente (familiar), após exposição à
água (aquagênico) e como uma reação imediata ou
tardia à pressão (4 a 6h, ocasionalmente 24h). A
possibilidade de protoporfiria deve ser considera-
da (ver Cap. 14).
O dermografismo (reação papuloeritematosa vista
depois de escarificar ou pressionar firmemente, ma-
chucando a pele) é geralmente idiopática mas, por
vezes, é o primeiro sinal de uma reação de urticária a
drogas. As lesões de pele na urticária colinérgica são
pequenas, altamente pruriginosas, pústulas discretas
rodeadas por uma grande zona de eritema. Um teste
cutâneo que utilize metacolina 1:5.000 pode repro-
duzir as lesões, mas em apenas cerca de um terço dos
casos. O teste mais confiável é provocar sintomas com
exercício, usando vestimentas herméticas para pro-
mover transpiração.
Profilaxia e tratamento
O uso de drogas ou cosméticos deve ser reava-
liado junto ao paciente, particularmente se houver
suspeita de fotossensibilidade. A proteção contra
estímulos físicos torna-se necessária.
Para o prurido, deve ser administrado,VO, um
anti-histamínico com efeito sedativo (difenidrami-
na, 50mg, 4 vezes ao dia; cipro-heptadina, 4 a 8mg,
4 vezes ao dia, é o mais eficaz na urticária por frio).
A hidroxizina 25 a 100mg, 4 vezes ao dia, VO, é a
medicação de escolha na urticária colinérgica; as
drogas anticolinérgicas são ineficazes quando uti-
lizadas em doses toleráveis. A prednisona 30 a
40mg ao dia, VO, deve ser administrada nas erup-
ções claras graves que não urticária, para encurtar
o curso clínico; a dose é gradualmente reduzida
conforme a melhora do paciente.
DISTÚRBIOS COM
REAÇÕES DE
HIPERSENSIBILIDADE
TIPO II
Exemplos de lesão celular na qual o anticorpo
reage com os componentes antigênicos de uma cé-
lula incluem as anemias hemolíticas positivas de
Coombs, púrpura trombocitopênica induzida por
anticorpo, leucopenia, pênfigo, penfigóide, síndro-
me de Goodpasture e anemia perniciosa. Estas
reações ocorrem em pacientes que receberam
transfusões incompatíveis na doença hemolítica
do recém-nascido e na trombocitopenia neonatal,
podendo também desempenhar um papel nas
doenças multissistêmicas de hipersensibilidade
(por exemplo, LES). Para discussão dos efeitos
renais, ver Capítulo 231.
O mecanismo da lesão pode ser melhor exempli-
ficado pelo efeito sobre as hemácias. Nas anemias
hemolíticas, as hemácias são destruídas por hemóli-
se intravascular ou pela fagocitose por macrófagos,
predominantemente no baço. Estudos in vitro evi-
denciaram que, na presença do sistema comple-
mento, alguns anticorpos fixadores de comple-
mento (por exemplo, os anticorpos de grupos san-
güíneos anti-A e anti-B) causam hemólise rápi-
da; outros (por exemplo, os anticorpos anti-LE)
causam lise celular lenta, enquanto outros não le-
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1045
sam a célula diretamente, mas promovem sua ade-
rência a fagócitos e sua conseqüente destruição
por eles. Ao contrário, os anticorpos anti-Rh nas
hemácias não ativam o complemento, destruindo
as células predominantemente por fagocitose ex-
travascular.
Exemplos nos quais o antígeno constitui um com-
ponente tecidual são rejeição de enxerto precocemente
aguda (hiperagudas) de um rim transplantado, devi-
do à presença de anticorpos contra o endotélio vascu-
lar e síndrome de Goodpasture, decorrente da reação
de um anticorpo com endotélio de membrana basal
glomerular e alveolar. Na síndrome de Goodpasture
experimental, o complemento constitui um media-
dor importante da lesão, embora seu papel na rejei-
ção aguda precoce de enxertos ainda não tenha sido
claramente determinado.
Exemplos de reações devido à ligação haptênica
com células ou tecidos incluem muitas das reações
de hipersensibilidade a drogas (por exemplo, ane-
mia hemolítica induzida pela penicilina – ver HI-
PERSENSIBILIDADE A DROGAS, adiante).
As reações de hipersensibilidade anti-recep-
tores alteram a função celular como resultado
da ligação do anticorpo aos receptores de mem-
brana. Em muitas doenças (por exemplo, mias-
tenia grave, mal de Graves, diabetes resistente
à insulina), os anticorpos para receptores de
membrana celular têm sido descritos. Em mo-
delos animais de miastenia grave, a produção
de anticorpos pela imunização com receptor de
acetilcolina resulta em fadiga muscular e fra-
queza típicas observadas em humanos. Nos hu-
manos, este anticorpo também é demonstrado
no soro ou nas membranas musculares. Além
disto, quando o soro ou a fração de IgG obtidos
de pacientes com miastenia grave são injetados
em primatas não humanos, uma síndrome
miastênica autolimitante é produzida. Este an-
ticorpo impede a ligação de acetilcolina endo-
genamente produzida ao seu receptor, prejudi-
cando, conseqüentemente, a ativação muscular.
Em alguns pacientes diabéticos com resistência
extrema à insulina, têm sido detectados anti-
corpos para receptores de insulina, que impe-
dem, desta forma, a ligação de insulina a seu
receptor. Em pacientes com mal de Graves foi
identificado um anticorpo para o receptor de
hormônio tireóide-estimulante (TSH), que esti-
mula o efeito do TSH no seu receptor, resultan-
do em hipertireoidismo.
As reações de citotoxicidade mediada por an-
ticorpo ocorrem quando uma célula recoberta por
anticorpo é lesionada por células exterminadoras.
Existem técnicas disponíveis para identificação
das subpopulações de células B e T dos linfócitos
circulantes. Há, também, uma subpopulação que
não expressa os marcadores de células B ou T;
estas são chamadas de células nulas, incluindo as
células exterminadoras e exterminadoras naturais.
As células exterminadoras ligam-se às células re-
cobertas pela IgG através de seus receptores Fc e
podem destruir a célula-alvo. As células extermi-
nadoras naturais não necessitam de anticorpos
recobrindo a célula para reconhecimento e podem
promover a lise de células tumorais, células in-
fectadas por vírus e células fetais. Estes mecanis-
mos foram demonstrados em modelos animais e
em estudos in vitro, embora seu papel na doença
humana não esteja estabelecido.
Diagnóstico
Os testes que apoiam este mecanismo de lesão imu-
nológica incluem a detecção de anticorpo ou com-
plemento na célula ou em tecidos ou detecção, no
soro, de anticorpos para antígeno de superfície celu-
lar, antígeno tecidual, receptor ou antígeno estranho
(exógeno). Embora o sistema complemento freqüen-
temente seja necessário para a lesão celular do Tipo
II e possa ser detectado nas células ou no tecido, a
atividade hemolítica sérica total do complemento não
está diminuída com tanta freqüência como ocorre nas
reações de hipersensibilidade por imunocomplexos
(IC) (Tipo III; ver adiante).
Os testes diretos de antiglobulina (Coombs) e
anti-não-γ-globulina detectam anticorpos e com-
ponentes do complemento nas hemácias, respecti-
vamente. Estes testes utilizam anti-soro de coelho,
um para imunoglobulina (Ig) e o outro para com-
plemento. Quando estes reagentes são misturados
às hemácias recobertas com imunoglobulina ou
complemento, ocorre uma reação de aglutinação.
Os anticorpos que foram eluídos destas células apre-
sentaram especificidade tanto para os antígenos de
grupos sangüíneos presentes nas hemácias, como
também foram capazes de fixar o complemento,
mostrando, assim, que eles são verdadeiros auto-
anticorpos e são responsáveis pelo complemento
presente nos eritrócitos durante o teste direto da
não-γ-globulina.
O teste indireto da antiglobulina detecta anti-
corpos circulantes específicos para antígenos de
hemácias. O soro do paciente é incubado com he-
mácias do mesmo grupo sangüíneo (para impedir
falsos resultados devido à incompatibilidade) e, a
seguir, o teste da antiglobulina é realizado nestas
hemácias. A aglutinação confirma a presença de
anticorpos circulantes para eritrócitos.
Na anemia hemolítica induzida pela penicili-
na, o paciente apresenta um teste de Coombs
direto positivo enquanto está recenbendo a peni-
cilina, embora apresente um teste de antiglobulina
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1046 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
indireto negativo utilizando hemácias do mesmo
grupo sangüíneo do paciente. O soro do pacien-
te, entretanto, irá aglutinar hemácias, se elas fo-
rem recobertas por penicilina.
A microscopia de fluorescência é usada mais
freqüentemente para detectar Ig ou complemento
nos tecidos (pela técnica direta) e também pode
ser usada para determinar a especifidade de um
anticorpo circulante (pela técnica indireta). Na
técnica de imunofluorescência direta, um anti-
corpo animal específico para Ig ou complemen-
to humanos é marcado com um corante fluores-
cente (usualmente a fluoresceína) e, então, co-
locado sobre o tecido. Quando o tecido é exa-
minado em microscópio de fluorescência, uma
coloração fluorescente típica (verde para fluores-
ceína) indica a presença de imunoglobulina oucomplemento humanos no tecido. A imunofluo-
rescência direta também pode ser usada para
detectar outras proteínas séricas, componentes
teciduais ou antígenos exógenos, enquanto os
anticorpos animais específicos para eles pude-
rem ser produzidos. A técnica, em si, não indi-
ca um antígeno específico celular, a menos que
o anticorpo possa ser eluído do tecido e sua
especificidade para antígenos teciduais possa
ser determinada.
Na síndrome de Goodpasture, o padrão de imu-
nofluorescência é visto como uma imunofluo-
rescência linear na membrana basal de rim e pul-
mão. Quando o anticorpo é eluído do rim de um
paciente com síndrome de Goodpasture e estratifi-
cado sobre um rim ou pulmão normais, ele se liga
à membrana basal e produz o mesmo padrão de
fluorescência linear obtido quando testado com um
anticorpo marcadao com fluoresceína para a γ-glo-
bulina humana (imunofluorescência indireta).
No pênfigo, a técnica de imunofluorescência di-
reta revela anticorpo para um antígeno no cimento
intercelular da camada de células espinhosas; no
penfigóide, para um antígeno da membrana basal.
Em ambas as doenças, o anticorpo sérico pode ser
detectado pela técnica de imunofluorescência indi-
reta. Esta técnica de imunofluorescência é utilizada
para detectar anticorpos circulantes específicos para
tecidos em muitas outras patologias; por exemplo,
anticorpos antitireóide em tireoidite e anticorpos
antinucleares e anticitoplasmáticos em LES.
Os testes anti-receptores para detectar anti-
corpos para receptores de acetilcolina estão dis-
poníveis comercialmente, mas os testes para os
receptores de insulina e tireóide não estão. Não
existem situações clínicas nas quais o teste de
citotoxicidade dependente de anticorpos seja
necessário. Ver também DISTÚRBIOS AUTO-IMU-
NES, adiante.
DISTÚRBIOS COM
REAÇÕES DE
HIPERSENSIBILIDADE
TIPO III
As condições clínicas nas quais os imunocom-
plexos (IC) parecem desempenhar algum papel
são a doença do soro devido a antígeno do soro,
de drogas ou hepatite viral; LES; AR; poliarterite;
crioglobulinemia; pneumonites de hipersensibi-
lidade; aspergilose broncopulmonar; glomerulo-
nefrite aguda; a glomerulonefrite membranopro-
liferativa crônica e as doenças renais associadas
(ver Cap. 231). Acredita-se que na aspergilose
broncopulmonar, na doença do soro induzida por
soro ou drogas e em algumas formas de doença
renal, uma reação mediada por IgE possa prece-
der a reação do Tipo III.
Os modelos animais padrão das reações do Tipo
III são a reação de Arthus local e a doença do soro
experimental. Na reaão de Arthus (tipicamente
uma reação cutânea local), os animais são primei-
ramente hiperimunizados para a indução da sínte-
se de grandes quantidades de anticorpos IgG cir-
culantes e, então, recebem uma pequena quantidade
de antígeno por via intradérmica. O antígeno se
precipita com a IgG em excesso e ativa o sistema
complemento; desta forma, uma lesão altamente
inflamatória, edematosa e dolorosa aparece rapi-
damente (em torno de 4 a 6h) e pode progredir para
abscesso estéril contendo muitas células polimor-
fonucleares e para necrose tecidual. Microscopi-
camente, pode-se observar de vasculite necrosante
com oclusão do lúmen arteriolar. A reação não é
precedida por um período de latência, uma vez que
o anticorpo já esta presente.
Na doena do soro experimental, uma gran-
de quantidade do antígeno é injetada em animal
não imunizado. Após um período de latência, o
anticorpo é produzido; quando o anticorpo al-
cança um nível crítico (10 a 14 dias, no homem),
são formados complexos antígeno-anticorpo que
se depositam em vasos endoteliais, onde produ-
zem lesão vascular disseminada e caracterizada
pela presença de leucócitos polimorfonucleares.
Quando ocorre vasculite, pode-se detectar que-
da nos níveis de complemento sérico e antígeno,
anticorpo e complemento podem ser observados
nas áreas de vasculite. No entanto, os comple-
xos antígeno-anticorpo não podem induzir lesão
por si mesmos, sendo necessário que haja per-
meabilidade vascular aumentada, tal como ocor-
re nas reações mediadas por IgE (Tipo I) e quan-
do o complemento é ativado para intensificar a
deposição vascular do IC.
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1047
Diagnóstico
Pode-se suspeitar de reações de Tipo III em
humanos quando ocorre vasculite. Na poliar-
terite, a presença de vasculite é a única evi-
dência clínica para sustentar um papel para o
IC. Evidências adicionais podem ser obtidas
pelos testes de imunofluorescência direta (con-
forme descrição anterior), que podem indicar
antígeno, imunoglobulina (Ig) e complemento
na área de vasculite.
Nos estudos experimentais, quando os glomé-
rulos animais são corados para a pesquisa de Ig e
complemento, a microscopia de fluorescência re-
vela um depósito granular grosseiro (saliências
encrespadas), ao longo da membrana basal. Uma
distribuição similar pode ser observada nas doen-
ças renais humanas do Tipo III (ver Cap. 231).
A microscopia eletrônica também pode ser utili-
zada para detectar depósitos eletrodensos (simi-
lares àqueles observados na doença do soro expe-
rimental), que se acredita serem complexos antí-
geno-anticorpo. Raramente, ambos, antígeno e an-
ticorpo, podem ser observados nos tecidos infla-
mados pela técnica de imunofluorescência – isto
foi demonstrado na doença renal do LES e nas
lesões vasculíticas da doença do soro associada
aos antígenos da hepatite.
Evidências adicionais sugerindo a participa-
ção de reações Tipo III são obtidas pela de-
monstração de anticorpos circulantes para os
antígenos, tais como soro de cavalo, antígenos
da hepatite, DNA, IgG alterada (fator reuma-
tóide) e alguns bolores. No LES, por exemplo,
durante exacerbações da doença renal, ocorre
um aumento dos anticorpos para o DNA nativo
de dupla hélice e queda nos níveis do comple-
mento sérico. Se o antígeno for desconhecido,
os níveis de complemento total sérico e dos
componentes iniciais (C1, C4 ou C2) podem
ser testados; nível diminuído indica ativação
do complemento pela via clássica e, portanto,
uma reação do Tipo III.
Na aspergilose pulmonar alérgica, um teste cu-
tâneo intradérmico com antígenos Aspergillus pode
causar uma reação papuloeritematosa mediada por
IgE, seguida por reação similar à de Arthus.
Até recentemente, o IC era detectado no soro
pela crioprecipitação (utilizando a propriedade, de
alguns complexos, de precipitarem em baixas tem-
peraturas). Os imunocomplexos solúveis também
podiam ser detectados por meio de equipamentos
sofisticados por ultracentrifugação analítica e cen-
trifugação por gradiente de densidade de sacarose.
Atualmente, diversos testes que detectam os IC cir-
culantes são usados com base na capacidade dos
complexos de reagir com os componentes do com-
plemento (por exemplo, ensaios de ligação do C1q)
e na capacidade dos complexos de inibir a reação
entre o fator reumatóide monoclonal e a IgG. En-
saios como o de células Raji são baseados na intera-
ção dos IC que contêm componentes do complemen-
to com receptores celulares (por exemplo, um re-
ceptor para C3 na célula Raji). Embora outros mé-
todos estejam disponíveis, tais testes são os mais
comumente empregados. Não existe um método
único que detecte todos os tipos de IC e seu uso na
prática médica limita-se ao acompanhamento da ati-
vidade de determinadas doenças.
DISTÚRBIOS AUTO-IMUNES
 São distúrbios nos quais o sistema imune produz
auto-anticorpos específicos para um antígeno
endógeno, com conseqüente lesão tecidual.
Serão abordados, a seguir, os mecanismos
imunopatogênicos implicados nas doenças auto-
imunes (ver também TABELA 148.4). Os aspectos
clínicos de cada distúrbio específico são apresen-
tados em outros locais deste MANUAL.
Desenvolvimento da resposta
auto-imune
Embora os detalhes precisos da resposta auto-imune não estejam completamente compreendidos,
o resultado da estimulação antigênica, seja ele a
formação de anticorpos, a ativação de células T ou
a tolerância, parece depender dos mesmos fatores,
tanto com auto-antígeno como com antígeno exó-
geno. São reconhecidos cinco mecanismos possí-
veis para o desenvolvimento de uma resposta imu-
ne a auto-antígenos:
1. Antígenos seqüestrados ou ocultos (por exem-
plo, substâncias intracelulares) podem não ser re-
conhecidos como “próprios”; se liberados na cir-
culação, podem induzir uma resposta imune. Isto
ocorre na oftalmia simpática com a liberação trau-
mática de um antígeno normalmente seqüestrado
dentro do olho. O auto-anticorpo, isoladamente, não
pode produzir a doença, uma vez que ele não pode
se combinar com o antígeno seqüestrado. Por exem-
plo, os anticorpos contra antígenos do esperma e do
músculo cardíaco são bloqueados, respectivamente,
pela membrana basal dos túbulos seminíferos e pela
membrana da célula miocárdica. As células T imu-
nologicamente ativas podem não estar sujeitas a tais
restrições e provocariam lesão mais efetivamente.
2. Os antígenos “próprios” podem se tornar
imunogênicos em decorrência de alterações quími-
cas, físicas ou biológicas. Certos agentes químicos
ligam-se a proteínas corpóreas, tornando-as imuno-
gênicas (como na dermatite de contato). As drogas
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1048 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
podem provocar diversas reações auto-imunes (ver
HIPERSENSIBILIDADE A DROGAS, adiante). A fotos-
sensibilidade exemplifica auto-alergia fisicamente
induzida: a luz ultravioleta altera a proteína da pele
contra a qual o paciente se torna alérgico. Antíge-
nos biologicamente alterados são descritos no ca-
mundongo da Nova Zelândia, que desenvolve uma
doença auto-imune similar ao LES quando persis-
tentemente infectado por um vírus do RNA, que
reconhecidamente se combina com tecidos do hos-
pedeiro, alterando-os o suficiente para induzir a for-
mação de anticorpos.
3. Antígenos estranhos podem induzir uma res-
posta imune que apresenta reação cruzada com
antígenos “próprios” normais; por exemplo, a rea-
ção cruzada que ocorre entre a proteína M estrepto-
cócica e o músculo cardíaco humano.
4. A produção de auto-anticorpos pode ser con-
seqüente a uma alteração mutacional em células
imunocompetentes. Isto pode explicar os auto-an-
ticorpos monoclonais encontrados, ocasionalmen-
te, em pacientes com linfoma.
5. Fenômenos auto-imunes podem ser epifenô-
menos e, a patogênese primária, o resultado de uma
resposta imune a um antígeno oculto (por exem-
plo, um vírus).
É provável que a reação auto-imune normalmen-
te esteja mantida sob controle pela ação de uma
população de células T supressoras específicas.
Qualquer um dos processos descritos anteriormen-
te poderia induzir ou estar associado a defeitos das
células T supressoras. Uma perturbação na regula-
ção da atividade de anticorpo por anticorpos
antiidiotipos (anticorpos específicos para os pon-
tos de combinação do antígeno de outro anticorpo)
pode desempenhar algum papel.
Os papéis de outros mecanismos complexos ex-
perimentalmente demonstráveis necessitam de
maiores esclarecimentos. Por exemplo, os adju-
vantes não antigênicos (por exemplo, alume, endo-
toxinas bacterianas) aumentam a antigenicidade de
outras substâncias. O adjuvante completo de Freund,
uma emulsão do antígeno em óleo mineral com mi-
cobactérias inativas pelo calor, geralmente é neces-
sário para provocar auto-imunidade em animais de
experimentação.
Os fatores genéticos também desempenham um
papel. Freqüentemente, os familiares de pacientes
com doenças auto-imunes apresentam alta inci-
dência dos mesmos tipos de auto-anticorpos, as-
sim como também a incidência de doenças auto-
imunes é maior em gêmeos idênticos do que em
gêmeos fraternos. As mulheres são acometidas com
maior freqüência do que os homens. A contribui-
ção genética parece atuar como um fator de predis-
posição. Em uma população predisposta, numero-
sos fatores ambientais poderiam provocar a doen-
ça; por exemplo, no LES, estes fatores podem estar
representados por infecção viral latente, drogas ou
lesões teciduais como as que ocorrem com exposi-
ção à luz ultravioleta. Esta situação seria análoga
ao desenvolvimento da anemia hemolítica como
conseqüência dos fatores ambientais em pessoas
com deficiência de G6PD (ver Cap. 127), uma anor-
malidade bioquímica determinada geneticamente
e predisponente.
Patogênese
Na maioria das vezes, os mecanismos patogê-
nicos das reações auto-imunes são melhor com-
preendidos do que o modo de formação dos auto-
anticorpos. Em algumas anemias hemolíticas au-
to-imunes, as hemácias ficam recobertas por auto-
anticorpos citotóxicos (Tipo II); o sistema com-
plemento responde a estas células recobertas por
anticorpos exatamente como faz com partículas
estranhas recobertas e a interação do comple-
mento com o anticorpo conectado ao antígeno
de superfície da célula leva à citólise e fagocito-
se das hemácias.
A lesão renal auto-imune pode ocorrer como
resultado de uma reação mediada por anticorpos
(Tipo II) ou por IC (Tipo III). A reação mediada
por anticorpo ocorre na síndrome de Goodpasture,
na qual a doença renal e pulmonar estão associa-
das à presença de um anticorpo antimembrana ba-
sal (ver Cap. 77). O melhor exemplo conhecido de
lesão auto-imune associada a complexos antígeno-
anticorpo solúveis (IC) é a nefrite associada ao LES
(ver LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO no Cap. 50
e adiante). Outro exemplo é uma forma de glome-
runolefrite membranosa que está associada a um
imunocomplexo que contém antígenos do túbulo
renal. Embora não provado, a glomerulonefrite
pós-estreptocócica poderia ser decorrente, em
parte, às reações cruzadas de anticorpos induzi-
das por estreptococos.
Uma grande variedade de auto-anticorpos é for-
mada no LES e em outras doenças auto-imunes sis-
têmicas (ao contrário do que ocorre nas doenças es-
pecíficas de órgãos). Os anticorpos contra os elemen-
tos figurados no sangue são responsáveis pela ane-
mia hemolítica auto-imune (ver Cap. 127), tromboci-
topenia e, possivelmente, leucopenia; os anticorpos
anticoagulantes podem causar problemas de coagu-
lação desordenada. Os anticorpos para material nu-
clear resultam na deposição de IC, não somente nos
glomérulos, mas também nos tecidos vasculares e
na pele, na junção derme-epiderme. A deposição
sinovial de complexos constituídos por IgG agre-
gada-fator reumatóide-complemento ocorre na AR.
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1049
TABELA 148.4 – DISTÚRBIOS AUTO-IMUNES PRESUMÍVEIS
Probabilidade Distúrbio Mecanismo ou evidência
Citotoxicidade tireóidea humoral e mediada
por células
Imunocomplexos generalizados localmente
e circulantes
Anticorpo de membrana antibase
Anticorpo acantolítico epidérmico
Anticorpo receptor de TSH (estimulador)
Anticorpo receptor de acetilcolina
Anticorpo receptor de insulina
Fagocitose de hemácias sensibilizadas por
anticorpos
Fagocitose de plaquetas sensibilizadas por
anticorpos
Imunocomplexos nas articulações
Anticorpos nucleolares e outros nucleares
Anticorpos para antígeno nuclear extraível
(ribonucleoproteína)
AAN não-histona
Célula antiparietal, microssomos e anticor-
pos de fator intrínseco
Citotoxicidade adrenal humoral e (?) media-
da por células
Anticorpos antiespermatozóides
Anticorpo de membrana de base glomerular
ou imunocomplexos
IgG e complemento na membrana basal
Anticorpos teciduais múltiplos, um anticor-
po específico não-histona anti-SS-B
Anticorpos da célula da ilhota humoral e
mediados por células
Anticorpo do receptor β-adrenérgico
Anticorpo de músculo liso
Anticorpo mitocondrial
Anticorpos teciduais específicos em alguns
casos
Anticorpo para melanócitoIg e complemento nas paredes dos vasos,
componente sérico baixo, em alguns casos
Anticorpo miocárdico
Tireoidite de Hashimoto
LES
Síndrome de Goodpasture
Pênfigo
Auto-imunidade do receptor
Doença de Graves
Miastenia grave
Resistência à insulina
Anemia hemolítica auto-imune
Púrpura trombocitopênica auto-imune
AR
Escleroderma com anticorpos
anticolágeno
Doença do tecido conjuntivo misto
Polimiosite
Anemia perniciosa
Doença de Addison idiopática
Infertilidade (alguns casos)
Glomerulonefrite
Penfigóide bolhoso
Síndrome de Sjögren
Diabetes melito (alguns)
Resistência à droga adrenérgica (algumas
com asma ou fibrose cística)
Hepatite ativa crônica
Cirrose biliar primária
Outras insuficiências glandulares
endócrinas
Vitiligo
Vasculite
Pós-infarto do miocárdio, síndrome de
cardiotomia
Altamente provável
Provável
Possível
Continua
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1050 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
O fator reumatóide é, usualmente, uma IgM (às
vezes, IgG ou IgA) com especificidade para um re-
ceptor da região constante da cadeia pesada da IgG
autóloga. Os complexos IgG-fator reumatóide-com-
plemento também podem ser encontrados no inte-
rior de neutrófilos, onde podem provocar a libera-
ção de enzimas lisossômicas que contribuem para
a reação inflamatória articular. Muitos plasmóci-
tos estão presentes no interior da articulação e po-
dem sintetizar anticorpos anti-IgG. As células T e
linfocinas também são encontradas nas articulações
reumatóides e podem contribuir para o processo in-
flamatório. O processo que deflagra os episódios
imunológicos é desconhecido; pode ser uma infec-
ção bacteriana ou viral. No LES, o baixo nível do
complemento sérico reflete a ocorrência de reações
imunológicas disseminadas; na AR, ao contrário, o
complemento sérico é normal, embora esteja redu-
zido no espaço intra-sinovial.
Na anemia perniciosa, auto-anticorpos capazes
de neutralizar o fator intrínseco são encontrados no
lúmen do trato GI. Auto-anticorpos contra frações
microssomais das células da mucosa gástrica são ainda
mais freqüentes. Está postulado que um ataque auto-
imune mediado por células contra as células parietais
resulta na gastrite atrófica que, por sua vez, reduz a
produção do fator intrínseco mas ainda permite a absor-
ção de vitamina B12 o suficiente para prevenir a ane-
mia megaloblástica. Se ocorresse também a forma-
ção de auto-anticorpos contra o fator intrínseco no
lúmen GI, entretanto, cessaria a absorção de vitami-
na B12 e poderia desenvolver a anemia perniciosa.
A tireoidite de Hashimoto está associada a
auto-anticorpos para tireoglobulina, os microsso-
mas das células epiteliais da tireóide, um antíge-
no de superfície da célula tireóidea e um segundo
antígeno colóide. A lesão tecidual e o eventual
mixedema podem ser mediados pela citotoxicidade
do anticorpo microssomal e pela atividade de
células T especificamente sensibilizadas. Títu-
los baixos de anticorpos também são encontra-
dos em pacientes com mixedema primário, su-
gerindo que este é o resultado final de uma ti-
reóide auto-imune não reconhecida. Uma reação
auto-imune também está envolvida na tireotoxi-
cose (doena de Graves) e cerca de 10% dos
pacientes eventualmente desenvolvem mixede-
ma espontaneamente; um número maior desen-
volve mixedema após terapia ablativa. Outros
anticorpos característicos da doença de Graves
são denominados anticorpos estimuladores da
tireóide. Eles reagem com os receptores para o
hormônio tireóide-estimulante (TSH) na glân-
dula e possuem o mesmo efeito que o TSH na
função da célula tireóidea.
DISTÚRBIOS COM
REAÇÕES DE
HIPERSENSIBILIDADE
TIPO IV
Algumas condições clínicas nas quais as reações
do Tipo IV são consideradas importantes: dermati-
te de contato, pneumonite por hipersensibilidade,
rejeição de enxerto, granulomas devido a microrga-
nismos intracelulares, algumas formas de sensibi-
lidade a drogas, tireoidite e encefalomielite após
vacinação anti-rábica. A evidência para as duas úl-
timas baseia-se em modelos experimentais e na
doença humana na presença de linfócitos no exsu-
dato inflamatório da tireóide e cérebro.
Diagnóstico
Pode-se suspeitar de uma reação do Tipo IV
quando uma reação inflamatória for caracterizada
histologicamente por linfócitos perivasculares e ma-
crófagos. Os testes cutâneos de hipersensibilidade
tardia (ver discussão de Testes para Deficiência de
Células T no Cap. 147) e os testes de contato (“patch
tests”) são os métodos mais facilmente disponíveis
para testar a hipersensibilidade tardia.
Para evitar a exacerbação da dermatite de con-
tato, os testes de contato são realizados após esta
ter sido amenizada. O alérgeno suspeito (em con-
centrações apropriadas) é aplicado à pele, sob uma
compressa adesiva não absorvente e deixado por
AAN = anticorpo antinuclear; Ig = imunoglobulina; TSH = hormônio tireóide-estimulante.
Urticária, dermatite atópica, asma (alguns
casos)
Muitos outros distúrbios inflamatórios,
granulomatosos, degenerativos e
atróficos
Anticorpos IgG e IgM para IgE
Nenhuma explicação alternativa razoável
TABELA 148.4 – DISTÚRBIOS AUTO-IMUNES PRESUMÍVEIS
Probabilidade Distúrbio Mecanismo ou evidência
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CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1051
48h. Se precocemente ocorrerem ardor ou prurido,
a compressa é removida. Um teste positivo consis-
te de eritema com alguma induração e, ocasional-
mente, formação de vesículas. Pelo fato de algu-
mas reações não ocorrerem até a remoção das com-
pressas, os locais do teste devem ser reexaminados
após 72 e 96h.
HIPERSENSIBILIDADE A DROGAS
As erupções por drogas são discutidas no Ca-
pítulo 118. Aqui são discutidas outras reações de
hipersensibilidade que podem ocorrer após ad-
ministração por via oral ou parenteral. A derma-
tite de contato, uma reação de hipersensibilida-
de celular (tardia – Tipo IV) decorrente do uso
tópico de drogas, é discutida no Capítulo 111; as
reações a drogas causadas por mecanismos não
imunológicos estão discutidas no Capítulo 302. Para
reações alérgicas a componentes do sangue do doa-
dor, ver REAÇÕES ALÉRGICAS no Capítulo 129.
Antes de se atribuir uma determinada reação às
drogas, deve-se analisar se o uso de placebos tam-
bém pode causar uma grande variedade de sinto-
mas e até sinais objetivos, como as erupções cutâ-
neas. Não obstante, as reações a drogas constituem
um problema médico primordial. A literatura refe-
rente a drogas específicas deve ser consultada quan-
to às reações adversas mais prováveis.
No caso de superdosagem de drogas, os efei-
tos tóxicos correlacionam-se diretamente à quanti-
dade total da droga introduzida no microrganismo
e podem ocorrer em qualquer paciente se a dose
for suficientemente grande. A superdosagem abso-
luta resulta de erro na quantidade ou freqüência das
doses individuais. A superdosagem relativa pode
ser observada em indivíduos que, devido a doença
hepática ou renal, não metabolizam ou excretam
as drogas de modo normal.
Na intolerância a drogas, as reações adversas
surgem após a primeira administração da medicação.
Ela pode ser a mesma reação tóxica normalmente
observada com dosagens mais altas ou pode ser ma-
nifestação exagerada de um efeito colateral normal
leve (por exemplo, a sedação causada pelos anti-his-
tamínicos). A idiossincrasia é uma condição na qual
a reação adversa na primeira administração da droga
é condição farmacologicamente inesperada e única.
As reações decorrentes de deficiências enzimáticas
geneticamente determinadas estão sendo identifica-
das em números crescentes (por exemplo, anemia he-
molítica, que se desenvolve em pacientes com defi-
ciência de G6PD durante o tratamento com diversas
drogas; apnéia pela succinilcolina; neuropatia perifé-
rica pela isoniazida: (ver tambémREAÇÕES MEDI-
CAMENTOSAS ADVERSAS no Cap. 302).
A maioria das reaões tóxicas e idiossincrási-
cas diferem bastante das reações alérgicas, com
poucas exceções. As reações tóxicas ou idiossin-
crásicas devido a drogas com liberação direta de
histamina (por exemplo, meios de contraste radio-
lógicos, opiáceos, pentamidina, polimixina B) po-
dem apresentar-se sob a forma de urticária ou, mes-
mo, de uma reação anafilactóide. A anemia hemo-
lítica pode ser alérgica (por exemplo, devido a pe-
nicilina) ou resultante de deficiência de G6PD. A
febre causada por drogas pode ser alérgica, tóxica,
(por exemplo, devido a anfetaminas, tranil-
cipromina) ou mesmo farmacológica (por exem-
plo, etiocolanolona).
Características das reaões alérgicas às dro-
gas – Uma reação mediada por IgE ocorre somen-
te após exposição do paciente à droga (não necessa-
riamente para terapia) por uma ou mais vezes, sem
incidente. Uma vez desenvolvida a hipersensibili-
dade, a reação pode ser produzida por quantidades
bem abaixo da dosagem terapêutica e, usualmente,
abaixo dos níveis que desencadeiam reações idios-
sincrásicas. Os aspectos clínicos são restritos quan-
to às suas manifestações. As erupções cutâneas (par-
ticularmente a urticária), síndrome semelhante à
doença do soro, febre inesperada, anafilaxia e infil-
trados pulmonares eosinofílicos que aparecem du-
rante a terapia com drogas são, normalmente, de-
correntes de hipersensibilidade; alguns casos de ane-
mia, trombocitopenia ou agranulocitose também
podem constituir uma resposta de hipersensibilida-
de a drogas. Raramente, pode-se desenvolver uma
vasculite após repetida exposição a uma droga (por
exemplo, sulfonamidas, iodetos e penicilina) e nefrite
intersticial (por exemplo, meticilina) e a lesão hepáti-
ca (por exemplo, halotano) foram relatadas em cir-
cunstâncias compatíveis com o desenvolvimento de
uma hipersensibilidade específica.
O exemplo mais sério de hipersensibilidade a dro-
gas é a anafilaxia. Entretanto, a reação a drogas mais
comum, de longe, é a erupção morbiliforme, nova-
mente de etiologia desconhecida. As reações de fe-
bre e urticária também são conseqüências relativa-
mente comuns de alergia a drogas. Quando o soro
de animais foi utilizado para terapia, a doença do
soro foi uma complicação, mas hoje o soro animal é
raramente utilizado. Uma síndrome semelhante à
doença do soro, de etiologia desconhecida, sem ní-
veis altos de anticorpo IgG circulante, porém usual-
mente associada aos anticorpos IgE, pode ocorrer,
especialmente com drogas como penicilina.
Mecanismos de
hipersensibilidade a drogas
As drogas constituídas por proteínas e cadeias
polipeptídicas extensas podem estimular a produ-
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1052 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
ção específica de anticorpos pela ação direta de me-
canismos imunológicos. Talvez a menor molécula
potencialmente antigênica seja o glucagon, com
peso molecular de aproximadamente 3.500. A
maioria das moléculas constituintes das drogas é
muito menor e não pode agir isoladamente como
antígenos. Entretanto, como haptenos, algumas
delas ligam-se covalentemente a proteínas, sendo
que o conjugado resultante estimula a produção
específica de anticorpos para a droga. Esta droga,
ou um de seus metabólitos, deve reagir quimica-
mente com a proteína. A ligação habitual com pro-
teínas séricas, comum a muitas drogas, é muito
mais fraca e de força insuficiente para deflagrar a
antigenicidade.
A reação imunológica específica foi determina-
da somente para a benzilpenicilina. Esta droga não
se liga de modo suficientemente forte a tecidos ou
proteínas séricas para formar um complexo antigê-
nico, mas seu principal produto de degradação, o
ácido benzilpenicilênico, pode se combinar com
proteínas teciduais para formar o benzilpeniciloil
(BPO), o principal determinante antigênico da pe-
nicilina. Diversos determinantes antigênicos me-
nores são formados em quantidades relativamente
pequenas, por meio de mecanismos ainda não bem
definidos. As reações de hipersensibilidade (I, II, III,
IV) mais comumente envolvem o determinante
BPO. Os anticorpos IgE para os determinantes
menores podem ser responsáveis, em alguns pa-
cientes, pela anafilaxia e pela urticária. Foram en-
contrados anticorpos IgG para os determinantes
maiores, mas não para os menores. Acredita-se que
estes atuem como “anticorpos bloqueadores” para
BPO, modificando, ou até mesmo prevenindo, uma
reação ao BPO, enquanto a ausência de anticorpos
bloqueadores de IgG para os determinantes meno-
res pode explicar a capacidade destes determinantes
de induzir anafilaxia.
Todas as penicilinas semi-sintéticas (por exem-
plo, amoxicilina, carbenicilina, ticarcilina) atuam
potencialmente em reação cruzada com a penicili-
na, de forma que os pacientes sensíveis à penicilina
freqüentemente reagem a elas da mesma maneira.
As reações cruzadas ocorrem com as cefalospori-
nas, em grau menor. O tratamento com uma cefa-
losporina deve ser iniciado com grande cuidado se
o paciente tiver uma história de grave reação (por
exemplo, anafilaxia) à penicilina.
As reaões a drogas do tipo hematológico e
mediadas por anticorpos (Tipo II, citotóxicas)
podem se desenvolver por qualquer um dos três
mecanismos: na anemia induzida pela penicili-
na, o anticorpo reage com o hapteno que está
firmemente ligado à membrana da hemácia, pro-
duzindo aglutinação e aumentando a destruição
de hemácias. Na trombocitopenia induzida pelo
estibofeno e pela quinidina (ver também TROM-
BOCITOPENIA no Cap. 133), a droga forma um
complexo solúvel com seu anticorpo específico.
A seguir, o complexo reage com as plaquetas
que estão nas proximidades (as células-alvo de-
nominadas “transeuntes inocentes”) e ativa o
complemento, que permanece sozinho na mem-
brana da plaqueta e induz a lise celular. Em ou-
tras anemias hemolíticas, a droga (por exemplo,
metildopa) parece alterar quimicamente a super-
fície da hemácia expondo, deste modo, um antí-
geno que induz e então reage com um auto-anti-
corpo, geralmente de especificidade Rh.
Diagnóstico
As reações tóxico-idiossincrásicas e as reações
anafiláticas são suficientemente peculiares em tipo
ou no período, de forma que as drogas implicadas
são, em geral, facilmente identificadas. As rea-
ções do tipo doença do soro são comumente devi-
do à penicilina embora, em algumas ocasiões, as
sulfonamidas, a hidralazina, as sulfoniluréias ou
os tiazídicos sejam responsáveis. A fotossensibili-
zação é característica da clorpromazina, de certos
anti-sépticos presentes em sabões, sulfonamidas,
psoralenos, demeclociclina e griseofulvina. Todas
as drogas, com exceção daquelas consideradas ab-
solutamente indispensáveis, devem ser suspensas.
Quando houver suspeita de febre induzida por dro-
gas, a medicação mais provável é suspensa (por
exemplo, alopurinol, penicilina, isoniazida, sulfo-
namidas, barbitúricos e quinidina). A redução da
febre dentro de 48h sugere intensamente aquela
droga. Se a febre estiver acompanhada por granu-
locitopenia, toxicidade por droga é mais provável
que alergia e é muito mais grave (ver Cap. 135).
As reaões pulmonares alérgicas a drogas
geralmente são infiltrativas, com eosinofilia e po-
dem ser produzidas por sais de ouro, penicilina e
sulfonamidas, entre outras. A nitrofurantoína é a
causa mais comum de uma reação infiltrativa agu-
da. Esta é provavelmente alérgica, embora em ge-
ral não seja eosinofílica.
As reaões hepáticas podem ser primariamen-
te colestáticas (as fenotiazinas e o estolato de eri-
tromicina estão mais comumente envolvidos) ou
hepatocelulares (alopurinol, hidantoínas, sais de
ouro, isoniazida, sulfonamidas, ácido valpróico e
muitas outras). A nefrite intersticial constitui uma
reaão renal alérgica usual, mais comum à
meticilina; outros antimicrobianos e a cimetidina
também foram implicados.
Uma síndromesemelhante ao LES pode ser
produzida por diversas drogas, sendo as mais co-
muns hidralazina e procainamida. Esta síndrome
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351052
CAPÍTULO 148 – DISTÚRBIOS DE HIPERSENSIBILIDADE / 1053
está associada a um teste positivo para anticorpos
antinucleares e é relativamente benigna, poupando
os rins e o sistema nervoso central. A penicilina
pode produzir o LES e outras donças auto-imunes,
mais notavelmente a miastenia grave.
O diagnóstico de qualquer reação de hipersensi-
bilidade à droga pode ser confirmado por um teste
de provocaão, isto é, pela readministração da dro-
ga; entretanto, a reprodução de uma reação alérgi-
ca para confirmá-la pode ser arriscada e é raramente
indicada.
Os testes laboratoriais existentes para a hi-
persensibilidade específica a drogas (por exemplo,
RAST, liberação de histamina, desgranulação de
basófilos ou mastócitos, transformação blástica de
linfócitos) não são confiáveis ou ainda estão sendo
empregados em caráter experimental. Os testes dis-
poníveis para as reações hematológicas desenca-
deadas por drogas são uma exceção (ver Diagnós-
tico em DISTÚRBIOS COM REAÇÕES DE HIPER-
SENSIBILIDADE TIPO II, anteriormente). Para trata-
mento por dessensibilização, ver adiante.
Os testes cutâneos para a hipersensibilidade
do tipo imediato (mediada pela IgE) são muito
úteis para o diagnóstico das reações a penicilina,
enzimas, soros xenogênicos e algumas vacinas e
hormônios polipeptídicos, embora não sejam con-
fiáveis para a maioria das drogas. Um conjugado
BPO-polilisina está disponível para o teste cutâ-
neo. Os determinantes menores não foram apro-
vados, pela FDA, como reagentes de testes cutâ-
neos para alergia à penicilina. Felizmente, a maio-
ria dos pacientes sensíveis à mistura do determi-
nante menor irão reagir com um dos reagentes, a
penicilina G, que pode ser utilizada para teste cu-
tâneo em concentração de 1.000U/mL. O teste
cutâneo é realizado, a primeira vez, por uma téc-
nica de punção. Se um paciente possuir uma his-
tória de reação de erupção grave, os reagentes de-
vem ser diluídos 100 vezes para o teste inicial.
Os testes de punção negativos podem ser segui-
dos de teste intradérmico. Se os testes cutâneos
forem positivos, o paciente corre o risco de rea-
ção anafilática, se tratado com penicilina. Os tes-
tes cutâneos negativos minimizam, mas não ex-
cluem, o risco de uma reação séria. Apesar de não
haver evidência, em humanos, de que o teste cu-
tâneo de penicilina alguma vez induziu de novo a
sensibilidade, é prudente, na maioria dos casos,
testar o paciente para excluir a alergia à penicili-
na imediatamente antes de se começar a terapia
essencial com essa droga. Uma vez que, detectem
apenas reações mediadas por IgE, os testes cutâ-
neos não predizem a ocorrência de erupções
morbiliformes ou anemia hemolítica. No caso do
soro xenogênico, um paciente que não for atópico
e não recebeu soro de cavalo anteriormente, pri-
meiro deve fazer um teste de punção numa dilui-
ção de 1:10; se for negativo, 0,02mL de uma di-
luição 1:1.000 é injetado intracutaneamente. Se o
paciente for sensível, desenvolver-se-á uma pápula
> 0,5cm de diâmetro em 15min. Todos os pacien-
tes que podem ter recebido soro anteriormente
(com ou sem reação) e aqueles com história de
suspeita de alergia devem ser testados primeiro
com uma diluição de 1:1.000. O resultado do tes-
te cutâneo negativo exclui a possibilidade de
anafilaxia (reação mediada por IgE), mas não pre-
diz a incidência de subseqüente doença do soro.
Tratamento
É usualmente necessário cessar o tratamento
com a droga ofensora se a reação parecer alérgi-
ca, em contraste com reações tóxicas, nas quais a
dose freqüentemente pode ser reduzida e ainda ser
eficaz, sem causar reação. A maioria das reações
alérgicas se resolve alguns dias após a droga ser
interrompida. O tratamento usualmente pode ser
limitado ao controle da dor ou do prurido. As
artralgias da doença do soro geralmente podem
ser controladas com aspirina ou DAINE. Algumas
condições, como febre induzida por drogas, erup-
ções cutâneas não pruriginosas ou reações sistê-
micas orgânicas leves não necessitam de tratamen-
to. Entretanto, se um paciente estiver agudamente
doente e possuir sinais de envolvimento múltiplo
de sistemas ou dermatite esfoliativa, é necessária
a administração intensiva de glicocorticóides (por
exemplo, prednisona, 40 a 80mg ao dia, VO). Mais
informações sobre o tratamento de reações clíni-
cas específicas estão disponíveis nos capítulos
correspondentes, no MANUAL.
Algumas vezes, uma droga que pode ser essen-
cial para a manutenção da vida deve ter sua admi-
nistração mantida, apesar de induzir manifesta-
ções alérgicas; por exemplo, o tratamento da en-
docardite bacteriana com penicilina pode ser man-
tido apesar do aparecimento de erupções mor-
biliformes, urticária ou febre induzida pela dro-
ga. A urticária deve ser tratada como já descrito,
incluindo a administração de um glicocorticóide,
se necessário.
A dessensibilizaão rápida a uma droga pode
ser necessária se a hipersensibilidade for estabele-
cida pela anamnese e por testes de provocação po-
sitivos ou teste cutâneo positivo (no caso da peni-
cilina, insulina e anti-soros) e se o tratamento for
essencial, não existindo alternativas. Como exem-
plos, citam-se a dessensibilização à penicilina e a
soros heterólogos.
Dessensibilizaão à penicilina – A dessen-
sibilização à penicilina é talvez mais necessá-
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351053
1054 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
ria para preparar uma pessoa alérgica para o tra-
tamento de endocardite bacteriana. Se possível, a
dessensibilização deve ser realizada em colabora-
ção com um especialista. Se somente o teste intra-
dérmico for positivo, então a dose inicial deve ser
administrada IV: 100U (ou µg)/mL em uma bolsa
de 50mL, no início muito lentamente. Se não apa-
recerem sintomas, a velocidade do fluxo pode ser
aumentada gradativamente, até que a bolsa esteja
vazia após 20 a 30min. Isto é, então, repetido com
concentrações de 1.000 e 10.000U/mL, seguidas
pela dose terapêutica total. Se não se desenvolve-
rem quaisquer sintomas alérgicos, a velocidade
do fluxo deverá ser diminuída e o paciente rece-
ber o tratamento com a droga apropriada (ver
ANAFILAXIA, anteriormente). A dessensibilização
IV é mais segura que a s.c. ou IM, uma vez que
tanto a concentração como a velocidade de admi-
nistração da droga são controladas. A dessen-
sibilizaão oral também é freqüentemente eficaz.
A dose inicial é de 100U (ou µg); as doses seguin-
tes são dobradas a cada 15min e os sintomas são
aliviados, se ocorrerem com drogas antianafi-
láticas adequadas. Seja qual for a via utilizada, a
dose inicial deverá ser mil vezes menor no raro
caso do paciente apresentar um teste de punctura
positivo para a penicilina.
Dessensibilizaão a soros heterólogos – Caso o
teste cutâneo a um soro heterólogo seja positivo, o
risco de anafilaxia é alto. Se o tratamento com soro
for essencial, primeiro é necessária a dessensibili-
zação. Os testes cutâneos, utilizando concentrações
mais fracas preparadas por diluição em série, são
realizados para determinar a dose inicial apropriada
para dessensibilização, que está na concentração que
proporcionou uma reação fraca ou negativa. Um
décimo de mL é injetado por via s.c.ou lentamente,
por via IV; embora não seja o método padrão, a ad-
ministração IV, como com a dessensibilização com
penicilina, proporciona ao médico o controle sobre
concentração e velocidade de administração. Se ne-
nhuma reação ocorrer no período de 15min, a dose é
dobrada a cada 15min, até que seja injetado 1mL do
soro não diluído. Esta dose é repetida IM e, se não
ocorrer nenhuma reação em outros 15min, a dose
total pode ser administrada. Se um paciente reagir,
ainda será possível prosseguir cautelosamente, re-duzindo-se a dose, tratando com um anti-histamínico,
como para urticária aguda e aumentando-se a dose
com incrementos menores.
Sempre que a dessensibilização for realizada,
devem estar disponíveis O2, adrenalina e um equi-
pamento para reanimação, para o tratamento ime-
diato de anafilaxia.
149␣ /␣ TRANSPLANTES
É a transferência de células, tecidos ou órgãos vivos de um doador para um
receptor, com a intenção de manter a integridade funcional do material trans-
plantado no receptor.
(Ver também TRANSPLANTE DE CÓRNEA no Cap. 96.)
Desde o primeiro transplante renal bem-suce-
dido, há mais de 40 anos, tem ocorrido grande
expansão do transplante para o tratamento de
insuficiência de órgãos em estágio final. As ta-
xas de sobrevida projetadas melhoraram (ver TA-
BELA 149.1) e muitos órgãos são agora trans-
plantados. Esta expansão é atribuída aos novos e
mais seletivos imunossupressores, às medidas me-
lhoradas para detectar a imunidade preexistente
em certos doadores, intervenção precoce, técni-
ca cirúrgica melhorada, detecção mais precoce e
mais precisa de episódios de rejeição e melhor
compreensão da rejeição.
Entretanto, o transplante é ainda de algum
modo limitado, principalmente devido à rejei-
ção, que pode destruir o tecido logo após trans-
plantado, exceto em circunstâncias especiais (por
exemplo, a maioria dos enxertos de córnea e
cartilagem e transplantes entre gêmeos idênti-
cos). Mais lentamente, a rejeição crônica tam-
bém emergiu como um fator significante na so-
brevivência a longo prazo e estado funcional dos
órgãos transplantados. As limitações da disponi-
bilidade de órgãos de doadores humanos tam-
bém continuam a ser importantes.
Os transplantes são classificados de acordo com
o local do enxerto e com o relacionamento genéti-
co entre doador e receptor. Um enxerto de tecido
ou órgão ortotópico é transferido para um local
receptor anatomicamente normal (por exemplo,
em um transplante cardíaco). A transferência para
um local anatomicamente anormal é chamada de
heterotópica (por exemplo, transplante de um rim
na fossa ilíaca do receptor). A transferência de te-
cido de um local para outro num mesmo indiví-
duo é denominada auto-enxerto (por exemplo,
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351054
CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1055
enxerto ósseo para estabilizar uma fratura).
O transplante entre gêmeos idênticos é chamado
de singênico (isoenxerto); um aloenxerto
(homoenxerto) é aquele entre membros da mesma
espécie, sem semelhança genética. Os xenoen-
xertos (heteroenxertos) são transplantes entre
membros de diferentes espécies. Os xenoenxertos
são, em geral, confinados a um material fixo
inerte, por exemplo, válvulas cardíacas de suíno.
A imunossupressão melhorada pode permitir que
os xenoenxertos bem-sucedidos de órgãos ajudem
a superar a atual escassez crítica de doadores.
Com raras exceções, os transplantes são aloen-
xertos ou de parentes vivos (ocasionalmente, indi-
víduos não relacionados) ou de doadores cadáveres.
Os doadores vivos são utilizados principalmente nos
transplantes renal e de medula óssea, porém os trans-
plantes de segmentos de fígado, pâncreas e pulmão
estão cada vez mais sendo doados por parentes vi-
vos dos receptores. A aceitação do conceito de mor-
te cerebral aumentou o uso e a necessidade de ór-
gãos cadavéricos, fazendo com que seja comum pro-
curar muitos órgãos em um único doador. Não obs-
tante, a necessidade excede de longe o número dis-
ponível de familiares de pacientes e o número de
pacientes que espera por transplantes de órgãos con-
tinua a crescer (ver TABELA 149.2).
IMUNOBIOLOGIA DA
REJEIÇÃO
Os aloenxertos podem ser rejeitados, por uma
reação imune mediada por células ou humoral
do receptor contra os antígenos de transplante
(histocompatibilidade) presentes nas membranas
das células do doador (ver também Cap. 146).
Os antígenos mais potentes são regidos por um
complexo de loci genéticos denominados antí-
genos linfocíticos humanos do Grupo A (HLA);
juntamente com os antígenos do grupo sangüí-
neo ABO, estes constituem os principais antíge-
nos de transplantes detectáveis no homem. Como
os antígenos de transplantes podem ser identifi-
cados por seus efeitos in vitro, é possível a rea-
lização da tipagem de tecidos (ver COMPATIBILI-
DADE TECIDUAL, adiante).
A reaão imune mediada por linfócitos (célu-
las) contra os antígenos de transplante (isto é, a
reaão do hospedeiro versus enxerto [RHVE]) é
o principal mecanismo de rejeição aguda. Reação
de hipersensibilidade tardia similar àquela obser-
vada na reação tuberculínica, a RHVE provoca
destruição do enxerto no período de alguns dias ou
meses após o transplante e é caracterizada, histolo-
gicamente, pela presença de infiltrado de células
mononucleares do aloenxerto, com graus variáveis
de hemorragia e edema. A integridade vascular ge-
ralmente é conservada, embora o endotélio arterial
pareça ser um alvo primário da RHVE. A rejeição
mediada por células pode ser revertida, em muitos
casos, pela intensificação do tratamento imunossu-
pressor. Após a reversão bem-sucedida de um epi-
sódio agudo de rejeição, os elementos gravemente
lesados do enxerto cicatrizam por fibrose e o res-
tante do enxerto parece normal. Após resolução da
rejeição aguda, o aloenxerto geralmente sobrevive
por períodos prolongados, mesmo que as dosagens
TABELA 149.1 – SOBREVIDA DE
1 ANO EM TRANSPLANTES
DE ÓRGÃOS*
Órgão 1980 1991 1995
Rim 60% 98% 98%
Coração 60% 82% 85%
Fígado 30% 79% 84%
Coração- – 62% 78%
pulmão
Pâncreas 20% 93% 94%
Pulmão – 70% 77%
*As taxas de sobrevida foram computadas utilizando-se
o método Kaplan-Meier, com base em dados registrados na
“Organ Procurement Transplantation Network/Scientific”
da “United Network of Organ Sharing” (UNOS) de 5 de
julho de 1997. Dados sujeitos à submissão ou correção de
dados futuros.
TABELA 149.2 – LISTA DE ESPERA DE
UNOS* PARA TRANSPLANTE
DE ÓRGÃOS
Pacientes
na lista de espera (nº)
Órgão 1988 1996 AUMENTO (%)
Rim 13.943 34.550 147
Coração 1.030 3.698 259
Fígado 616 7.467 1.112
Coração- 205 237 13
pulmão
Pâncreas 163 227 39
Pulmão 69 2.309 3.246
*UNOS (“United Network of Organ Sharing”) é o órgão de
obtenção nacional e rede de transplante dos EUA. Dados basea-
dos no “snapshot” das listas de espera da “Organ Procurement
Transplantation Network” da UNOS no último dia de cada ano.
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1056 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
das drogas imunossupressoras sejam reduzidas a
níveis muito baixos. Este processo de adaptação do
enxerto provavelmente seja explicado pela perda de
leucócitos passageiros altamente imunogênicos, in-
cluindo células dendríticas (ver adiante) e, talvez, pelo
desenvolvimento de supressão específica ao doador
da resposta imune do receptor.
A deterioraão tardia do enxerto às vezes ocor-
re e este tipo crônico de rejeição quase sempre pro-
gride insidiosamente, apesar de aumentada a tera-
pia de imunossupressão. Acredita-se ser devido, em
grande parte, ao dano mediado por anticorpos. O
quadro patológico difere daquele da rejeição agu-
da. O endotélio arterial é primariamente envolvi-
do, com proliferação extensa que pode, gradual-
mente, ocluir o lúmen vascular, resultando em is-
quemia e fibrose do enxerto.
O papel dos anticorpos humorais na rejeição ao
enxerto é evidente quando o receptor foi previamente
sensibilizado (por gravidez, transfusão de sangue ou
transplante anterior) aos antígenos HLA presentes
no enxerto. O transplante, nestas circunstâncias, qua-
se invariavelmente leva à rejeião hiperaguda me-
diada por anticorpos, causando a destruição do en-
xerto dentro de algumas horas ou, até mesmo, mi-
nutos após a revascularização (ver COMPATIBILIDA-
DE TECIDUAL, adiante). Esta reação de rejeição é ca-
racterizada pela trombose dos pequenos vasos e o
infarto do enxerto é indiferentea terapias conheci-
das de imunosupressão. Os enxertos de fígado pare-
cem ser menos suscetíveis a tal forma de rejeição
hiperaguda mediada por anticorpos. O papel dos
anticorpos humorais nas formas mais tardias de des-
truição do enxerto também é importante, porém ain-
da não está esclarecido.
Um resultado similar ao da rejeição mediada por
anticorpos usualmente ocorre quando o enxerto é trans-
plantado desafiando a barreira dos grupos sangüíneos
habitualmente respeitada nas transfusões de sangue.
Desta forma, a avaliaão pré-transplante geralmente
inclui a verificação da compatibilidade ABO entre
doador e receptor e a existência de prova de reação
cruzada negativa para anticorpos teciduais (ausência
de reatividade significativa entre os leucócitos do do-
ador e o soro do receptor in vitro), assim como a
tipagem tecidual para a compatibilidade HLA.
SISTEMA DE ANTÍGENO
LINFOCÍTICO HUMANO
É um grupo de antígenos teciduais governados por
uma região cromossômica contendo um número
de loci genéticos, cada um com alelos múltiplos,
que possuem relevância para reações de rejei-
ção de transplante e que marcam a prevalência
de várias doenças.
Os antígenos linfocíticos humanos (HLA) são
encontrados, em diferentes concentrações, em vir-
tualmente todas as células nucleadas. A resposta
imunológica a estes antígenos é a principal da maio-
ria dos episódios de rejeição a enxerto.
O HLA é uma designação para antígenos que
são produtos de um complexo de genes em vários
loci intimamente ligados, coletivamente denomi-
nados complexo de histocompatibilidade principal
(MHC), localizado no cromossomo 6 (ver também
Complexo de Histocompatibilidade Principal no
Cap. 146). Os genes são alélicos; isto é, um núme-
ro de formas diferentes de cada gene é encontrado
na população; todos os alelos são co-dominantes.
Pelas leis mendelianas, cada pessoa possui dois
alelos para cada locus ou, possivelmente, um par
de alelos idênticos (ver FIG. 149.1).
Os antígenos são divididos em duas classes, com
base na estrutura e função. A cadeia pesada dos
antígenos de Classe I está codificada pelos genes
nos loci HLA-A, B ou C. As moléculas de Classe I
são polipeptídeos heterodiméricos que consistem
da cadeia pesada ligada à molécula de β2-micro-
globulina. Estes antígenos são encontrados na maio-
ria das células nucleadas no organismo, assim como
nas plaquetas e são homólogos aos antígenos de
transplante detectados sorologicamente em outras
espécies. Os antígenos de Classe II compreendem
duas cadeias de polipeptídeos, ambas codificadas
pelos genes dentro da região HLA-D. A rgião HLA-
D é dividida em sub-regiões, cada qual com genes
que codificam as cadeias α e β das diferentes mo-
léculas de Classe II (HLA-DR, DQ e DP). Os antí-
genos de Classe II são preferencialmente expres-
sos nas células que apresentam antígenos, tais como
os linfócitos B, macrófagos, células dendríticas e
algumas células endoteliais. Eles são homólogos
aos produtos genéticos de resposta imune (rI) de
outras espécies.
Devido ao fato dos alelos terem sido numerados
antes que seus loci fossem identificados, aqueles
nos loci A e B não estão numerados de modo con-
secutivo. Desde 1975, o comitê da OMS para fato-
res do sistema HLA estabeleceu designações acei-
tas universalmente para os alelos individuais de
cada loci (por exemplo, HLA-A1, HLA-B5, HLA-
Cw1, HLA-DR1). No passado, os alelos provisóri-
os eram designados como “w”. Entretanto, com os
desenvolvimentos mais recentes na determinação
da seqüência do DNA dos genes HLA, o “w” foi
eliminado das especificidades mais sorológicas (o
locus C mantém o “w” para distingui-lo de outros
componentes). Os alelos definidos pelas seqüên-
cias de DNA são denominados de modo que o gene
seja identificado e cada alelo receba um número
único que inclui a especificidade sorológica mais
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351056
CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1057
intimamente aproximada (por exemplo, A*0201,
DRB1*0103, DQA1*0102).
Na reação de rejeição, os antígenos das Classes
I e II induzem respostas diferentes. As células T,
que respondem às Classes I e II, podem ser dife-
renciadas não apenas funcionalmente, mas também
pelos antígenos de diferenciação presentes na su-
perfície das células T responsivas. Com o desenvol-
vimento dos anticorpos monoclonais (anticorpos
uniformemente idênticos produzidos por células
hibridizadas) que reagem com estes antígenos de di-
ferenciação, tais antígenos podem ser utilizados
como marcadores para monitorar as subpopulações
de células T na reação de rejeição.
Os linfócitos reativos de Classe I expressam os
antígenos CD8 freqüentemente associados às fun-
ções efetora citotóxica e supressora celular. A ativi-
dade de função de célula auxiliar comumente é de-
sempenhada por células T, que expressam antígeno
CD4, que caracteriza os linfócitos reativos com pro-
dutos da Classe II. Desta forma, enquanto a maior
parte da destruição imune da reação de rejeição pode
estar direcionada aos antígenos de Classe I, tanto
pelos anticorpos anti-HLA como pelos linfócitos efe-
tores citotóxicos, os linfócitos que respondem a an-
tígenos da Classe II parecem ser necessários para
facilitar, ao máximo, a reação de rejeição.
Entretanto, o HLA não existe apenas para ser
alvo da resposta ao aloenxerto. Na resposta imune
normal, as automoléculas de HLA ligam-se aos
peptídeos estranhos e apresentam estes antígenos
aos receptores específicos para antígenos nas célu-
las T. Como as moléculas de HLA são altamente
polimórficas, as moléculas de HLA alogênicas nas
células de um órgão transplantado são reconheci-
das pelo receptor da célula T não como auto-HLA,
mas da mesma maneira que auto-HLA mais um
peptídeo estranho. Somente a ligação do receptor
do HLA do enxerto não inicia a resposta do aloen-
xerto. Alguns tipos celulares específicos dentro do
corpo parecem funcionar como células apresenta-
doras de antígenos e liberar um segundo sinal para
a célula T no momento da ligação do antígeno. Além
disso, outras glicoproteínas da superfície celular,
chamadas de integrinas, aderem às estruturas com-
plementares da superfície celular para estabiliza-
rem a ligação do receptor da célula T ao antígeno
apresentado. As células dentríticas, uma população
celular do tipo macrófago, parecem agir muito bem
neste papel de apresentador do antígeno. A ativa-
ção da célula T, após a ligação do receptor aos an-
tígenos na célula T apresentadora, é uma cadeia
complexa de eventos intracelulares que leva à trans-
crição de vários genes anteriormente quiescentes
FIGURA 149.1 – Esquema do complexo de histocompatibilidade principal (MHC) em seres humanos.
Os genes alélicos em cada um dos loci determinam os antígenos da membrana celular. As células de cada
indivíduo expressam dois antígenos para cada locus. Entretanto, devido à possibilidade da homozigosidade
em um locus, ou à presença de alelos para os quais a sorotipagem não está disponível, a tipagem de tecido
utilizando técnicas sorológicas pode falhar ao identificar todos os antígenos do HLA que um indivíduo
possui. Um indíviduo pode ter até quatro genes DRB (dois em cada cromossomo); desta forma, pode haver
até quatro antígenos DR diferentes numa superfície da célula. (Número de alelos possíveis em 1996.)
MHC no cromossomo 6MHC no cromossomo 6MHC no cromossomo 6MHC no cromossomo 6MHC no cromossomo 6
Regi‹o HLA-D (Classe II)Regi‹o HLA-D (Classe II)Regi‹o HLA-D (Classe II)Regi‹o HLA-D (Classe II)Regi‹o HLA-D (Classe II) Genes HLA de Classe IGenes HLA de Classe IGenes HLA de Classe IGenes HLA de Classe IGenes HLA de Classe I
LOCI: DP DO DR B C A
DPB DPA DOB DOA DRB DRA
Alelos genŽticos: 77 10 31 18 216 2 186 42 83
determinar
DPW3 DO2 DR1 B5 CW1 A1
Especificidades do DPW5 DO7 DR2 B39 CW2 A2
ant’geno HLA etc. etc. DR52 etc. etc. etc.
etc.
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1058 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA;DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
nas células T auxiliares antígeno-reativas CD4+ de
Classe II. A produção de uma citocina, a interleu-
cina-2 (IL-2) e sua expressão na superfície da cé-
lula auxiliar é fundamental no processo de ativa-
ção. A IL-2 atua de forma autócrina/parácrina para
estimular a proliferação da célula T. As células T
auxiliares ativadas também produzem uma série de
outras linfocinas; elas promovem uma cascata de
eventos que resulta em mecanismos efetores de des-
truição do enxerto.
Associaões de antígenos das Classes I e II não
relacionadas ao transplante – Estão aumentando
as evidências de que os genes que codificam para
estes antígenos (e outros genes do MHC intimamente
ligados) são importantes para a função imune geral
e saúde do indivíduo. Vários componentes do com-
plemento e Fator B da properdina são governados
por genes ligados ao MHC. Também, antígenos
HLA-específicos apresentam uma associação esta-
tística com diversas doenças presumivelmente auto-
imunes e com neoplasias de células linfóides, em-
bora o significado patogenético destas associações
seja desconhecido. Por exemplo, a incidência de
psoríase aumenta à medida que está associada a B13
e B17, mas diminui com B12. A espondilite anqui-
losante e a síndrome de Reiter apresentam acentua-
da correlação positiva com o genótipo B27. Os
genótipos DR3 e DR4 parecem ter associação posi-
tiva com o diabetes melito Tipo I; DR2, com escle-
rose múltipla e DR4, com artrite reumatóide. Con-
trariamente, indivíduos com linfomas malignos pa-
recem ter acentuada redução na incidência de A11.
Possivelmente ainda mais intrigante em termos de
transplante seja a associação descrita do DR6 com
um gene de resposta imune, que controla a intensi-
dade da rejeição aos enxertos renais.
COMPATIBILIDADE TECIDUAL
É o grau de similaridade dos antígenos teciduais ge-
neticamente determinados do doador e do receptor.
A tipagem de histocompatibilidade (ou teci-
dual) dos linfócitos presentes no sangue periféri-
co ou nos linfonodos é realizada antes do trans-
plante, em muitos centros, para identificar o HLA
sorologicamente e, pela seleção de um doador apro-
priado, minimizar as diferenças antigênicas entre
doador e receptor. A combinação de HLA tem me-
lhorado de, modo significativo, a sobrevida funcio-
nal de transplantes entre indivíduos relacionados. Os
resultados entre indivíduos não relacionados tam-
bém mostra correlação com o grau de compatibili-
dade do HLA, embora com menos clareza, uma
vez que as diferenças no complexo de histocom-
patibilidade numa população não singênica intro-
duz muito mais variáveis.
Nos grandes estudos multicêntricos de transplan-
te renal, o grau de compatibilidade do HLA é um
dos muitos fatores que se correlaciona com a so-
brevida do enxerto do doador-cadáver, especialmen-
te quando a sobrevida é avaliada em longos inter-
valos após o transplante.
Ao contrário, em várias séries realizadas em al-
guns centros, o papel da compatibilidade do HLA
não é grande. Portanto, a prática nos EUA é dividir
os rins de cadáveres por todo o país apenas se hou-
ver total compatibilidade de HLA com um prová-
vel doador. Do contrário, os órgãos são transplan-
tados em um receptor da mesma região do doador.
A tipagem do HLA no transplante de coração, fí-
gado, pâncreas e pulmão não tem sido avaliada
extensivamente, pois estes órgãos necessitam ser
transplantados rapidamente, antes da tipagem teci-
dual poder ser realizada. No transplante de cora-
ção e pâncreas, a sobrevida do enxerto parece estar
correlacionada com a compatibilidade do HLA. Em
particular, a compatibilidade do antígeno da Clas-
se II parece levar, a longo prazo, a uma melhor so-
brevida do enxerto.
A detecão de pré-sensibilizaão específica do
potencial receptor contra antígenos do doador é muito
importante para determinar se o transplante deve ou
não ser feito. A pré-sensibilização mais comumente
resulta de exposição anterior a antígenos de doado-
res por meio de transfusões sangüíneas, transplan-
tes prévios ou gestações; ela é avaliada por um teste
linfocitotóxico entre o soro do receptor e linfócitos
do doador na presença de complemento. Outras téc-
nicas também estão disponíveis. A prova de reação
cruzada positiva usualmente indica anticorpos no
soro do receptor dirigidos contra os antígenos da
Classe I do doador. Isto é, geralmente, uma contra-
indicação ao transplante, porque a rejeição
hiperaguda é comum.
O risco/benefício das transfusões de sangue em
pacientes de diálise, com relação ao transplante de
rim, é controverso. As transfusões em pacientes com
insuficiência renal em estágio terminal podem
sensibilizá-los ao transplante renal potencial.
No entanto, a sobrevida do aloenxerto melhorou nos
receptores que receberam transfusões e que não se
sensibilizaram. Algumas formas alteradas (por exem-
plo, supressão) da responsividade imune pareciam
ser induzidas pelas transfusões. Com o uso da ci-
closporina (ver adiante), o efeito benéfico das trans-
fusões pré-transplante parecem ser bastante reduzi-
dos. Devido ao risco da transmissão de doenças in-
fecciosas (por exemplo, hepatite e HIV – ver TRANS-
MISSÃO DE DOENÇAS VIRAIS no Cap. 129) e a dis-
ponibilidade de eritropoietina biossintética, muitos
centros não insistem, como rotina, na transfusão pré-
transplante dos receptores de órgãos.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351058
CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1059
IMUNOSSUPRESSÃO
Exceto com isoenxertos, a terapia imunossupres-
sora raramente pode ser interrompida por comple-
to após o transplante. Entretanto, a terapia imunos-
supressora intensiva é usualmente necessária ape-
nas durante as primeiras semanas após o transplante
ou durante uma crise de rejeição. Subseqüentemen-
te, o enxerto parece tornar-se acomodado e pode
ser mantido com doses relativamente pequenas de
imunossupressores e menos efeitos adversos.
Drogas imunossupressoras
As drogas imunossupressoras são utilizadas
para controlar a reação de rejeição e são prima-
riamente responsáveis pelo sucesso do transplan-
te. Entretanto, estas drogas suprimem todas as rea-
ções imunológicas, fazendo, assim, a superin-
fecção ser a causa principal de morte nos recepto-
res de transplantes.
Prednisona (IV), um corticosteróide, geralmen-
te é administrada em altas doses (2 a 20 mg/kg) no
momento do transplante e, então, reduzida grada-
tivamente até alcançar uma dose de manutenção
de 0,2mg/kg ao dia, indefinidamente. Vários me-
ses após o transplante, a droga pode ser adminis-
trada em dias alternados, para reduzir os efeitos
colaterais, o que é particularmente importante em
crianças na fase de crescimento. A interrupção da
prednisona pode ser possível em alguns regimes
que utilizam várias drogas, mas esta conduta au-
menta discretamente o risco de rejeição. Se esta
ocorrer, a dose é aumentada, com rapidez, inde-
pendentemente dos efeitos colaterais.
Azatioprina, um antimetabólito, é usualmente
administrada no momento do transplante. As dosa-
gens oral ou IV de 1,0 a 2,5mg/kg ao dia são tole-
radas por tempo indefinido. Os efeitos tóxicos pri-
mários são depressão da medula óssea e hepatite
(rara). Com o advento da ciclosporina, muitos cen-
tros de transplante utilizam juntas azatioprina e bai-
xas doses de ciclosporina.
Ciclofosfamida, um agente alquilante, é usada
em pacientes que não toleram a azatioprina. Doses
equivalentes são aparentemente iguais em atividade
imunossupressora. A ciclofosfamida também é uti-
lizada, em doses muito maiores, como uma das dro-
gas imunossupressoras primárias no transplante de
medula óssea. A toxicidade grave é comum, com
cistite hemorrágica, alopecia e infertilidade.
Ciclosporina, um metabólito derivado de fun-
gos, ultimamente tem sido usada como a imu-
nossupressora primária no lugar das drogas
antimetabólicas, durante as duas últimas déca-
das. Ao contrário destas, a ciclosporinapoupa a
medula óssea, atuando mais seletivamente para
inibir proliferação e ativação das células T.
O mecanismo molecular exato de sua ação é des-
conhecido.
Embora a ciclosporina possa ser utilizada sozi-
nha, ela é usualmente administrada com outras dro-
gas, tais como a azatioprina e prednisona, permi-
tindo rápida redução da dosagem de corticosterói-
de. As doses iniciais de ciclosporina variam de 6 a
12mg/kg ao dia, VO, reduzida imediatamente após
o transplante para uma dose de manutenção de 3 a
5mg/kg ao dia.
Contrabalançando à eficácia da ciclosporina, está
a sua considerável toxicidade. Nefrotoxicidade,
hepatotoxicidade, hipertensão refratária, aumento
da incidência de neoplasias e vários efeitos colate-
rais menos graves (por exemplo, hipertrofia gengi-
val e hirsutismo podem ocorrer). Os linfomas de
células B e os distúrbios linfoproliferativos policlo-
nais de célula B estão relacionados à ativação do
vírus Epstein-Barr (EBV) e foram observados mais
freqüentemente em pacientes que recebem altas
doses de ciclosporina ou combinações da mesma
com outros imunossupressores direcionados con-
tra as células T. A nefrotoxicidade é uma preocu-
pação especial. A ciclosporina parece causar va-
soconstrição das arteríolas pré-glomerulares afe-
rentes, levando, por fim, à mionecrose e hipoper-
fusão glomerular refratária. O uso prolongado da
ciclosporina pode levar à insuficiência renal crô-
nica irreversível. Embora o nível sangüíneo da ci-
closporina seja facilmente mensurável, não existe
um meio adequado para se determinar a dose te-
rapêutica eficaz necessária para um determinado
paciente. Além disso, os níveis sangüíneos da ci-
closporina não se correlacionam, confiavelmente,
com seus efeitos tóxicos.
Tacrolimus é uma droga imunossupressora
para receptores de transplante de fígado. É um
subproduto liberado no crescimento de uma cul-
tura de microrganismo (Streptomyces tsukubaen-
sis). Seus efeitos colaterais são similares aos da
ciclosporina, apesar de hipertrofia gengival e hir-
sutismo serem menos proeminentes. Também
pode induzir diabetes. O tratamento pode ser ini-
ciado no momento do transplante ou depois,
podendo-se administrar nas formas IV ou VO.
A dosagem usualmente começa com 0,15 a
0,30mg/kg ao dia, quando administrada oralmen-
te e 0,05 a 0,1mg/k ao dia, quando administrada
IV. A regulação da dosagem é auxiliada por tes-
tes periódicos de níveis sangüíneos e o conheci-
mento das interações indesejáveis com drogas é
essencial. Tacrolimus pode ser útil para pacien-
tes nos quais a ciclosporina provou ser excessi-
vamente tóxica ou ineficaz.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351059
1060 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
Outras terapias
imunossupressoras
As tentativas para se obter imunossupressão mais
seletiva incluem o uso de anti-soro humano para
linfócitos humanos ou células do timo, num esfor-
ço de suprimir a imunidade celular enquanto deixa
a resposta imunológica humoral do receptor intacta.
Os anticorpos monoclonais e a irradiação também
são usados. As terapias imunossupressoras em de-
senvolvimento incluem agentes químicos de vários
tipos e substâncias biologicamente produzidas, tais
como anticorpos selecionados por suas proprieda-
des especiais.
A globulina antilinfocitária (ALG) e globuli-
na antitimocítica (ATG) são adjuntos úteis, per-
mitindo que outros imunossupressores sejam usa-
dos em doses menores, menos tóxicas. O uso de
ALG e ATG no momento do transplante pode ser
benéfico devido à incidência diminuída de rejei-
ção; além disso, seu uso permite retardo no início
da terapia com ciclosporina e sua toxicidade. O uso
de ALG ou ATG no controle de episódios de rejei-
ção estabelecida tem levado, nitidamente, ao au-
mento das taxas de sobrevida dos enxertos. As pos-
síveis reaões adversas aos soros heterológicos in-
cluem as relações anafiláticas, a doença do soro ou
a glomerulonefrite induzida por complexos antí-
geno-anticorpo. O uso de frações do soro altamen-
te purificadas, administradas IV e associadas a ou-
tros agentes imunossupressores, tem reduzido muito
a incidência destas reações.
Os anticorpos monoclonais contrários às célu-
las T fornecem uma concentração muito maior de
moléculas de anticorpos especificamente reativos
e uma quantidade menor de proteínas séricas, quan-
tidade esta irrelevante em comparação àquela obti-
da nas frações antiglobulínicas policlonais. O anti-
corpo murino monoclonal OKT3 pode reverter a
rejeição. Este anticorpo monoclonal liga-se ao com-
plexo antígeno-receptor da célula T (RCT/CD3),
levando inicialmente à ativação inespecífica da cé-
lula T e a uma síndrome clínica proeminente pro-
vocada pela subseqüente liberação de citocina, ca-
racterizada por febres, calafrios, mialgia, artralgia
e irritação do SNC e GI. Subseqüentemente, o
OKT3 bloqueia a ligação do RCT ao antígeno e
resulta na modulação de todo o complexo RCT/
CD3 da superfície da célula T. No momento de um
episódio agudo de rejeição, administram-se 5mg
ao dia de OKT3, IV, por 10 a 14 dias. O OKT3
também tem sido utilizado no momento do trans-
plante; da mesma forma que a ALG, parece retar-
dar o início e reduzir a incidência dos episódios de
rejeição. Entretanto, os benefícios obtidos pela
profilaxia com este agente devem ser pesados con-
tra seus efeitos colaterais tóxicos, o risco de
superimunossupressão e o risco do paciente desen-
volver anticorpos neutralizantes contra o anticor-
po monoclonal heterólogo que seria ineficaz, quan-
do necessário posteriormente, no tratamento de um
episódio de rejeição. Tal como nas altas doses de
ciclosporina, tem-se observado maior incidência de
doenças linfoproliferativas de células B induzidas
por EBV com o uso repetido de OKT3.
Como o papel das diferentes subpopulações de
células T na reação de rejeição é melhor conheci-
do, o uso de anticorpos monoclonais reativos com
subpopulações específicas poderá permitir uma
seletividade ainda maior durante a imunossupres-
são. Por exemplo, as experiências clínicas com an-
ticorpos monoclonais que reagem com antígenos
presentes apenas nas células T ativadas (poucas
células T que não participam da reação de rejei-
ção) estão em andamento.
A irradiaão para imunossupressão é de uso li-
mitado nos transplantes. Em algumas ocasiões, o
enxerto e os tecidos que os circundam no receptor
são irradiados, como medida profilática imunos-
supressora adjuvante ou durante tratamento de re-
jeição já estabelecida. A dose total (usualmente 4 a
6 Gy) situa-se em níveis abaixo do limiar que po-
deria provocar lesões graves por irradiação no pró-
prio enxerto. No tratamento da leucemia refratária,
a irradiação corpórea total em doses de 12Gy, as-
sociada à quimioterapia, destrói a capacidade
imunológica do hospedeiro (e células leucêmicas
residuais). Tal irradiação é seguida por um enxerto
de medula óssea.
O interesse pela terapia de irradiação foi reno-
vado devido à seguinte observação: tratamento di-
recionado (com blindagens adequadas, semelhan-
tes àquelas utilizadas para o tratamento da doença
de Hodgkin) contra todos os centros linfóides
(irradiaão linfática total) parece induzir uma pro-
funda, porém relativamente segura, supressão da
imunidade celular. Isto pode ser mediado, de iní-
cio, pelas células T supressoras, que podem ser de-
tectadas após a irradiação linfática total. Em alguns
pacientes, tem-se observado deleção clonal poste-
rior das células que reagem específicamente com o
antígeno. A aplicação desta técnica aos transplan-
tes é promissora, porém experimental.
Tolerância imunológica
Algum grau de tolerância parece ser atingido
com os regimes imunossupressores não específi-
cos utilizados atualmente. Entretanto, os biologis-
tas que estudam a transplantação esperam fornecer
uma supressão seletiva, específica da resposta do
receptor somente para os antígenos estranhos pre-
Merck_12.p65=02/02/01, 15:351060
CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1061
sentes no enxerto, possibilitando, assim, a interrup-
ção das drogas imunossupressoras inespecíficas.
Nos animais, tal tolerância aos antígenos encontrada
no período neonatal, quando o sistema imunológi-
co ainda está amadurecendo, tem sido relativamente
fácil de se atingir; entretanto, os animais adultos
têm sido, a maior parte do tempo, refratários à in-
dução de tolerância específica ao antígeno. Nos ani-
mais adultos, a indução de tolerância a antígenos
estranhos tem sido obtida pela seleção cuidadosa
de uma séria de condições (por exemplo, dose do
antígeno, via de administração e emprego de ou-
tros agentes imunossupressores, durante períodos
curtos de tempo, em doses tóxicas). Métodos cada
vez mais confiáveis para produzir uma não respon-
sividade específica ao antígeno estão sendo projeta-
dos para o transplante clínico e podem atingir ex-
periências clínicas no futuro.
TRANSPLANTE DE RIM
Todos os pacientes com insuficiência renal ter-
minal devem (ver Cap. 222) ser considerados para
transplante, exceto aqueles em condições de de-
senvolver outra doença de alto risco. O transplan-
te de rim atualmente é comum: para todas as crian-
ças com mais de 6 meses de idade com insufi-
ciência renal, o transplante é o tratamento de es-
colha. Um transplante bem-sucedido não apenas
liberta o paciente da diálise por toda a vida, como
também fornece ao rim outras funções metabóli-
cas (por exemplo, estimulação eritropoiética e
homeostasia de cálcio).
A sobrevida do paciente um ano após o trans-
plante de um doador vivo relacionado é > 95%, com
aproximadamente 90% dos enxertos funcionantes.
Subseqüentemente, observa-se uma perda anual de
enxerto de 3 a 5%, inclusive devido à morte dos
pacientes. A taxa de sobrevida do paciente após um
ano de transplante de doador cadáver é de aproxi-
madamente 90% e a sobrevida do enxerto varia
entre 70 e 90%, em vários centros. Nos anos se-
guintes, cerca de 5 a 8% dos enxertos são perdidos
anualmente. Vários receptores de transplantes re-
nais atualmente possuem enxertos funcionantes por
> 30 anos. Embora o transplante em pacientes com
idade > 55 anos fosse considerado como sendo de
risco inaceitável, o uso de drogas imunossupresso-
ras e a monitoração imunológica intensa permi-
tem um aloenxerto em pacientes selecionados na
sétima década de vida e até além disso.
Seleão do doador e preservaão do enxer-
to – Os aloenxertos renais são obtidos de parentes
vivos, ou de doadores cadáveres, excluindo-se aque-
les com antecedentes de hipertensão, diabetes ou
doenças malignas (exceto, possivelmente, aqueles
com neoplasias que se originam no SNC). Os doa-
dores vivos potenciais também são avaliados em
relação à estabilidade emocional, função renal nor-
mal bilateral, ausência de outras doenças sistêmi-
cas e histocompatibilidade. Um doador vivo, cons-
ciente de estar perdendo sua capacidade renal de
reserva, pode desenvolver conflitos psicológicos
graves e apresentar um certo grau de morbidade de-
corrente da nefrectomia; ainda assim, o prognós-
tico significativamente aumentado, a longo prazo,
para um receptor de enxertos bem-selecionados, jus-
tifica a escolha de um doador relacionado.
Aproximadamente dois terços dos transplantes
renais são de doadores cadáveres que eram pes-
soas previamente sadias e apresentaram morte ce-
rebral, porém com funções cardiovascular e renal
mantidas estáveis. Após a morte cerebral, os rins
são removidos o mais rápido possível e resfria-
dos por perfusão. Para simples estocagem
hipotérmica, são utilizadas soluções resfriadoras
especiais contendo substâncias pouco permeáveis
(por exemplo, manitol ou hetamido) e concentra-
ções de eletrólitos que se aproximam dos níveis
intracelulares para a perfusão rápida do rim, que
é então mantido em solução com gelo. Os rins pre-
servados por este método comumente apresentam
boa função, se forem transplantados dentro de 48h.
Usando-se técnicas mais complexas de perfusão
hipotérmica pulsátil contínua, que utilizam um
perfusado oxigenado baseado no plasma, os rins
têm sido transplantados, com êxito, após perfu-
são ex-vivo de até 72h.
Preparo pré-transplante e procedimento de
transplante – O preparo pré-transplante inclui a
hemodiálise, objetivando assegurar um estado me-
tabólico relativamente normal e trato urinário in-
ferior funcional e livre de infecções. Podem ser
necessárias a reconstrução vesical, nefrectomia de
rins infectados ou construção de uma alça ileal
para drenagem do aloenxerto. O transplante de rim
costuma ser posicionado retroperitonealmente na
fossa ilíaca. As anastomoses vasculares são feitas
até os vasos ilíacos e a continuidade uretral é es-
tabelecida.
Tratamento de rejeião – Apesar da profila-
xia com imunossupressores começar exatamente
antes ou no momento do transplante, a maioria
dos receptores é submetida a um ou mais episó-
dios de rejeição aguda no período pós-transplante
imediato. A rejeição é sugerida por deterioração
da função renal, hipertensão, aumento de peso e
sensibilidade e aumento de volume do enxerto,
febre e sedimento urinário com proteínas, linfó-
citos e células tubulares renais. Se o diagnóstico
não for claro, realiza-se uma biópsia percutânea
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351061
1062 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
com agulha para avaliação histopatológica do teci-
do. Às vezes, nos receptores tratados com ciclos-
porina, torna-se difícil diferenciar entre nefro-
toxicidade induzida por esta droga e rejeição mes-
mo com o auxílio da biópsia. A rejeição, geralmente
é revertida pela intensificação da imunossupressão.
Se ela não puder ser revertida, a terapia de imu-
nossupressão é suspensa e o paciente retorna à he-
modiálise, para aguardar um novo transplante.
A nefrectomia do rim transplantado é necessária
se houver hematúria, sensibilidade do enxerto ou
febre resultante da resposta de rejeição com a reti-
rada dos imunossupressores.
A maioria dos episódios de rejeição e de outras
complicações (ver adiante) ocorre entre o 3… e o 4…
meses após o transplante; a maior parte dos pacien-
tes retorna às condições de saúde e atividades mais
próximas do normal. Entretanto, a menos que a to-
xicidade ou infecção grave ocorram, os imunossu-
pressores devem ser mantidos, uma vez que sua
interrupção, mesmo breve, pode precipitar uma cri-
se de rejeição.
Complicaões – Alguns pacientes desenvolvem
rejeição crônica irreversível do enxerto. Outras
complicações tardias incluem toxicidade por dro-
gas, recidiva da doença renal de base, efeitos cola-
terais da prednisona e infecções. Além disso, a in-
cidência de neoplasias em receptores de aloen-
xertos é aumentada. O risco de ocorrência de car-
cinoma epitelial é 10 a 15 vezes maior que na po-
pulação normal; em relação aos linfomas, este
risco é 30 vezes maior. O tratamento destas neo-
plasias é semelhante àquele adotado em pacientes
com câncer e não imunossuprimidos. Geralmente,
a redução ou a interrupção da imunossupressão não
são necessárias em pacientes com epitelioma de cé-
lulas escamosas, porém são recomendadas nos ca-
sos de tumores mais agressivos e nos linfomas. Os
linfomas de células B associados ao vírus Epstein-
Barr tornaram-se muito mais freqüentes nos indiví-
duos transplantados, nos últimos anos. Embora te-
nham sido postuladas associações individuais com
o uso de ciclosporina e com os protocolos que utili-
zam ALG ou OKT3, a correlação mais provável é
com o grau de imunossupressão geral obtido com
agentes imunossupressores mais potentes.
TRANSPLANTE DE
FÍGADO
O transplante de fígado é necessário para dis-
função hepática terminal. As taxas de sobrevida
melhoraram muito com os avanços nas técnicas
cirúrgicas, o uso da ciclosporina e melhor seleção
do paciente. As taxas de sobrevida de um ano au-
mentaram de 30 para 80 ou 85%, dependendodo
estado pré-operatório dos pacientes. Os óbitos tar-
dios têm sido raros e, com freqüência, foram atri-
buídos a doenças recidivantes (por exemplo, cân-
cer, hepatite) ao invés de dificuldades pós-transplan-
te. Um número crescente de pacientes possui, hoje,
aloenxertos funcionantes há mais de 2 décadas.
Os receptores de transplante bem-sucedido podem
retornar às atividades social e de trabalho normais.
O advento da ciclosporina permitiu a redução pre-
coce da dosagem de corticosteróide, resultando em
melhor cicatrização pós-operatória e maior resistên-
cia à superinfecção. Com resultados melhores, mais
pacientes estão sendo aceitos para transplante antes
de atingirem um estágio debilitante terminal. Se um
enxerto falhar, o retransplante de fígado é impossí-
vel. No momento atual, 5 a 15% dos pacientes de
transplante de fígado que morreram receberam se-
gundos transplantes, com taxa de sucesso > 60%.
As taxas de sucesso melhoradas devem-se não ape-
nas à ciclosporina, mas também a muitos detalhes
do tratamento do paciente.
As indicaões para o transplante de fígado têm
sido principalmente as doenças que causam insufi-
ciência hepática crônica. Na insuficiência hepáti-
ca aguda, o prognóstico é difícil de ser estabeleci-
do; o tempo para se obter um doador adequado é
freqüentemente insuficiente e o risco de infecção
viral recorrente no fígado transplantado é substan-
cial. Isto é encontrado em muitas intoxicações, por
exemplo, por acetaminofeno. Não obstante, se hou-
ver possibilidade de se procurar um fígado a tem-
po, o transplante poderá salvar pacientes com in-
suficiência hepática aguda e fulminante, mesmo
após o início de coma hepático.
A hepatite crônica em estágio final e a cirrose
biliar são as indicações mais freqüentes para trans-
plante de fígado em adultos, como o são atresia e
deficiências metabólicas inatas na criança. Os pa-
cientes com neoplasia hepática primária apresen-
tam um prognóstico relativamente ruim; o tumor
freqüentemente recorre após o transplante no pa-
ciente imunossuprimido, levando à sobrevida de 1
ano de apenas 20%. Entretanto, se o carcinoma he-
pático, especialmente o tipo fibrolamelar, for con-
finado ao fígado, resulta uma sobrevida de longo
prazo sem tumor.
Seleão de doadores – Os doadores cadavéri-
cos de fígado devem ter sido indivíduos saudá-
veis e apresentar compatibilidade com o receptor
em relação ao tamanho corpóreo e ao sistema
ABO. Os antecedentes de disfunção hepática, hi-
potensão com suporte vasopressor prolongado ou
evidência de isquemia ou danos hepáticos sugeri-
dos pela elevação de enzimas hepáticas excluem
a utilização do órgão.
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CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1063
Preservaão do fígado e procedimentos para
o transplante – Os métodos para a preservação
hepática extracorpórea durante longos períodos não
estão disponíveis; os fígados são mantidos em so-
luções geladas, geralmente por 8 a 16h após a sua
remoção. Alguns enxertos armazenados por > 24h
são transplantados com sucesso, mas a incidência
de não função do enxerto aumenta com o arma-
zenamento prolongado. A tipagem tecidual e a pro-
va de reação cruzada, em geral são realizadas re-
trospectivamente. A fase mais trabalhosa do pro-
cedimento de transplante é a hepatectomia do re-
ceptor, que pode, ocasionalmente, resultar em per-
da intra-operatória de sangue > 20U e freqüente-
mente é realizada em pacientes com hipertensão
portal e após cirurgia hepatobiliar prévia. As ne-
cessidades da transfusão nos receptores adultos de
transplante de fígado são quase sempre inferiores
a 8 a 10 unidades. Para completar o transplante,
são necessárias cinco anastomoses: das veias ca-
vas supra e intra-hepática, da veia porta, da artéria
hepática e do ducto biliar. A localização heterotópica
do fígado, proporcionando um fígado auxiliar, eli-
mina uma série de dificuldades técnicas. Entretanto,
como os resultados foram desencorajadores, a téc-
nica tem sido utilizada apenas experimentalmente.
Devido às dificuldades de se conseguir doadores com
estaturas compatíveis, no caso de receptores pediá-
tricos, os enxertos de tamanho reduzido consistin-
do de segmento de um fígado adulto estão sendo
utilizados; os resultados parecem ser equivalentes
aos dos enxertos pediátricos de tamanho total. O
transplante de segmento lateral esquerdo de um fí-
gado dos pais para a criança também tem sido rea-
lizado com sucesso, mas o papel final dos parentes
vivos como doadores espera avaliação.
Tratamento da rejeião – Surpreendentemen-
te, os aloenxertos de fígado são rejeitados menos
agressivamente que os aloenxertos de outros órgãos.
Por exemplo, a rejeição hiperaguda de um trans-
plante de fígado não ocorre invariavelmente em
pacientes que foram pré-sensibilizados aos antíge-
nos HLA ou incompatíveis pelo grupo ABO. As
razões para isto são desconhecidas. Entretanto,
quando ou rejeição aguda fulminante ou rejeição
crônica forem refratárias à terapia imunossupres-
sora, o retransplante é o tratamento. A síndrome
do ducto biliar definhante, caracterizada por co-
lestase intra-hepática com função hepatocelular pre-
servada é um padrão de rejeição crônica.
O tratamento imunossupressor típico do pacien-
te adulto consiste na administração da ciclospori-
na IV, na dose de 4 a 6mg/kg ao dia, iniciado no
momento do transplante e, a seguir, quando a die-
ta for reinstituída, a ciclosporina passa a ser ad-
ministrada VO, na dose de 8 a 14mg/kg ao dia.
Com a ocorrência de disfunção renal, as doses de-
vem ser reajustadas para baixo e os níveis sangüí-
neos são utilizados como medidas aproximadas da
dosagem adequada. As crianças freqüentemente ne-
cessitam de doses mais altas para manter níveis
sangüíneos adequados. Se for utilizada a drenagem
biliar via tubo T no pós-operatório, doses maiores
de ciclosporina poderão ser necessárias, devido à
perda da mesma através da bile. Habitualmente, me-
tilprednisolona IV ou prednisona VO são iniciadas
na dose de 10mg/kg ao dia e, a seguir, reduzidas
gradativamente até a obtenção de uma dose de ma-
nutenção de 0,2mg/kg ao dia. A azatioprina 1 a
2mg/kg ao dia VO ou IV também é utilizada al-
gumas vezes.
Os episódios leves de rejeição aguda costumam
ser autolimitados. Suspeita-se de rejeição se houver
o desenvolvimento de hepatomegalia, se as fezes ou
a bile se tornarem descoradas (observadas no tubo T
de drenagem biliar) ou se ocorrerem sintomas de
anorexia, dor no hipocôndrio direito e febre. A icte-
rícia e a elevação dos níveis séricos de enzimas he-
páticas são achados corroborativos para o diagnós-
tico. A biópsia por agulha pode fornecer a confirma-
ção patológica. Os episódios suspeitos de rejeição
são tratados, por via IV, com corticosteróides, glo-
bulina antitimocítica (ATG) ou com anticorpos mo-
noclonais. Uma variedade de complicações deve ser
esperada, inclusive aquelas atribuíveis à operação
complexa em si, além da rejeição e as conseqüên-
cias das tentativas de controlá-la.
TRANSPLANTE DE
CORAÇÃO
Estudos recentes de transplantes de coração têm
demonstrado resultados com taxas de sobrevida a
longo prazo e grau de reabilitação semelhantes
àqueles observados nos pacientes que recebem
aloenxertos renais de doadores cadáveres, levando
ao uso crescente do transplante para tratar doenças
cardíacas em estágio final. A reabilitação dos
receptores de transplante cardíaco que sobrevivem
por > 1 ano é excelente; > 95% destes pacientes
atingem a Classe I de condição cardíaca, definida
pela “New York Heart Association” (Associação
Cardíaca de Nova York) e > 70% retomam suas
atividades normais de trabalho.
As indicaões mais comuns são as miocardio-
patias, as coronariopatias em estágio final e a inca-
pacidade de ser mantido a partir de recursos auxi-
liares cardíacos após infarto do miocárdio ou ci-
rurgia cardíaca sem transplante. Os critérios de se-
leãodo receptor são rigorosos; aproximadamen-
te um quarto dos pacientes considerados adequa-
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351063
1064 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
dos para o transplante falece em decorrência de sua
cardiopatia antes que ocorra a disponibilidade de
um doador adequado. Recursos auxiliares para o
ventrículo esquerdo e corações artificiais podem
ser utilizados, como apoio, neste intervalo de tem-
po. A avaliaão do doador inclui a avaliação da
função cardíaca, do estado pulmonar, do tamanho
adequado do órgão e da compatibilidade do gru-
po sangüíneo ABO. Os doadores de coração são
preservados por armazenamento hipotérmico sim-
ples. O tempo isquêmico total é mantido < 4 a 6h,
desta forma excluindo consecução em hospitais
distantes.
Procedimento de transplante – O coração é
transplantado em posição ortotópica com anasto-
moses aórtica, nas artérias e veias pulmonares. O
retorno venoso é fornecido por uma única anasto-
mose, que faz a ligação entre a parede posterior
conservada e o átrio direito do receptor para aque-
le do órgão do doador.
Tratamento da rejeião – Os esquemas imu-
nossupressores são semelhantes aos utilizados no
transplante de rim ou fígado. A sobrevida atuarial
de 1 ano é de aproximadamente 80% para os pa-
cientes que recebem ciclosporina, até 60% para os
que utilizam a azatioprina. A rejeição no período
pós-operatório inicial também tem sido reduzida;
aproximadamente 40% dos pacientes não apresen-
taram rejeição comparados a < 10% dos que rece-
bem azatioprina.
O início da rejeição pode ser prenunciado pelo
aparecimento de febre, mal-estar, taquicardia, hi-
potensão e insuficiência cardíaca predominante do
lado direito do coração. As arritmias são comuns
nos episódios mais graves de rejeição. Nos casos
mais leves, a rejeição pode ser sugerida apenas por
achados de biópsia. Com o uso de ciclosporina, a
biópsia endomiocárdica transvenosa protocolar de
rotina tem sido utilizada cada vez mais para
diagnosticar rejeição, pois outros sinais e sintomas
que estão freqüentemente ausentes e a rejeição po-
dem ser detectados antes da função do enxerto se
deteriorar. A rejeição é tratada com corticosterói-
des e, se necessário, com ATG ou OKT3. A rejei-
ção leve, por um critério histológico sem seqüelas
clínicas detectáveis, não necessita de tratamento.
Complicaões – A infecão é responsável por
mais da metade de todos os óbitos após o trans-
plante cardíaco; outras causas importantes são re-
jeição, arteriosclerose da artéria coronária do en-
xerto e neoplasias malignas, cada qual colaboran-
do com 5 a 20% dos óbitos. A arteriosclerose ace-
lerada do enxerto ocorre como seqüela em cerca
de 25% de todos os transplantes cardíacos bem-
sucedidos. Isto pode ser também resultado de re-
jeição indolente, crônica humoralmente mediada.
Parece que a ciclosporina, que aumenta intensamente
a incidência de hipertensão pós-transplante, pode
exarcebar a aterosclerose coronária no enxerto, tal-
vez pela toxicidade direta à vasculatura coronária,
semelhante àquela observada no rim. Suspeitou-se
de uma incidência aumentada de aterosclerose co-
ronária do enxerto em pacientes acometidos por in-
fecções por citomegalovírus após o transplante, su-
gerindo que uma resposta imune aos antígenos vi-
rais possa estar envolvida no desenvolvimento des-
sa complicação tardia devastadora.
TRANSPLANTE DE
PULMÃO E DE
PULMÃO/CORAÇÃO
O transplante de pulmão apresenta problemas
especiais devido ao risco de infecções devastado-
ras num órgão transplantado que está continuamen-
te exposto ao ar ambiente não estéril e dependente
do mecanismo de tosse, o qual é interrompido pelo
transplante. A sobrevida de 1 ano dos receptores
de transplante de pulmão é de cerca de 70% em
uma população de pacientes que essencialmente não
possui chance de sobrevivência sem o transplante.
A taxa de sobrevida a longo prazo após o trans-
plante de pulmão não está completamente estabe-
lecida, porém a incidência de perda de enxerto tar-
dia após o transplante parece ser menor do que
aquela dos outros aloenxertos de órgãos. A rea-
bilitação funcional é boa; a maioria dos receptores
reassume as suas atividades diárias. A capacidade
de fazer exercícios é levemente limitada devido a
uma resposta hiperventilatória.
As opções para um transplante de pulmão são
transplante de pulmão único, duplo ou combina-
ção de coração/pulmão. O primeiro tem sido feito
com maior freqüência. As vantagens do transplan-
te duplo de pulmão e coração-pulmão são a remo-
ção de todo o tecido potencialmente doente do
tórax e para o transplante de coração-pulmão, uma
cicatrização mais dependente da anastomose tra-
queal devido à presença de colaterais coronário-
brônquicos dentro do bloqueio coração/pulmão.
As desvantagens são a natureza mais extensa das
operações, com a reposição de coração/pulmão
que necessita de desvio cardiopulmonar, a íntima
compatibilidade necessária para o tamanho torá-
cico, a utilização de 2 ou 3 órgãos do doador para
um receptor e, em alguns casos, a substituição de
um coração normal por um que pode desenvolver
disfunção pós-transplante. As indicaões para o
transplante de coração/pulmão são a doença vas-
cular pulmonar ou a doença pulmonar parenqui-
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351064
CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1065
matosa difusa, na qual é indicada a remoção de
todo o tecido pulmonar (por exemplo, certos ca-
sos de fibrose cística). Quando não houver nenhu-
ma anormalidade intrínseca ou secundária, o co-
ração natural do receptor de transplante de cora-
ção/pulmão poderá ser um órgão de doação para
transplante cardíaco.
Um transplante pulmonar único é mais clara-
mente indicado para pacientes com doença pulmo-
nar restritiva. As vantagens são a simplicidade rela-
tiva do procedimento cirúrgico, que evita anticoa-
gulação sistêmica e “bypass” cardiopulmonar; maior
variação aceitável para a compatibilidade de tama-
nho entre doador e receptor e uma ótima utilização
de órgãos com o coração (e o pulmão contralateral)
que fica disponível para outros receptores. As des-
vantagens incluem a possibilidade de incompatibi-
lidade na ventilação/perfusão entre os pulmões ori-
ginais e os transplantados e a má cicatrização da
anastomose brônquica. O envolvimento da anasto-
mose brônquica com o omento tem melhorado, mas
não eliminado, este último problema.
Um transplante pulmonar duplo remove todo
o tecido pulmonar doente e teoricamente é aplicá-
vel em todos os pacientes que não apresentam ne-
nhuma anormalidade cardíaca irreversível. Entre-
tanto, a divisão das artérias brônquicas e as colate-
rais broncocoronárias do doador torna a cicatriza-
ção traqueal muito problemática.
Seleão do doador e preservaão – Os doadoes
cadáveres de pulmões devem ter sido previamente
não fumantes com < 40 anos de idade. Deveria ha-
ver uma evidência mínima de consolidação na ra-
diografia de tórax e a oxigenação auxiliada por ven-
tilador deve ser normal. A preservação do pulmão
não está bem desenvolvida; um transplante de pul-
mão deve ser realizado rapidamente. Mais freqüen-
temente, a solução cristalóide fria que contém
prostaciclina é infundida nas artérias pulmonares
do doador in situ antes da excisão. De modo alter-
nativo, o pulmão doado pode ser resfriado siste-
maticamente, utilizando-se o “bypass” cardiopul-
monar, evitando-se a introdução de cristalóide na
vasculatura pulmonar.
Procedimentos do transplante – Para um trans-
plante de pulmão único, uma toracotomia lateral é
utilizada no receptor. “Cuffs” da artéria pulmonar,
veia pulmonar e brônquio são usados para anasto-
mose. Se o clampeamento da artéria pulmonar não
for tolerado, será necessário o “bypass”. Um trans-
plante de coração/pulmão é feito sob “bypass” por
esternotomia mediana com anastomoses aórtica e
atrial direita. A anastomose traqueal é realizada num
pontoimediatamente acima da bifurcação. Os trans-
plantes de pulmão duplo necessitam de reconstru-
ção cirúrgica mais elaborada dos vasos e vias aé-
reas, mas alcançam êxitos crescentes para pacien-
tes cujos corações são normais.
Tratamento da rejeião – O tratamento é com
corticosteróides administrados rapidamente, IV,
em alta dosagem, ATG ou OKT3. A ALG profi-
lática ou OKT3 também são freqüentemente ad-
ministradas durante as 2 primeiras semanas após
transplante. A rejeição aguda ocorre em > 80%
dos pacientes, mas pode ser tratada, com suces-
so em uma porcentagem muito alta dos casos. A
rejeição de pulmão ocorre mais do que a rejei-
ção de coração em receptores de transplantes
combinados de coração-pulmão, de modo que as
biópsias endomiocárdicas nem sempre são úteis.
A rejeição é caracterizada por febre, dispnéia e
SaO2 diminuído e volume expiratório forçado em
1segundo (VEF1). O infiltrado intersticial visto
na radiografia é difícil de distinguir daquele de
uma infecção. A broncoscopia com lavagem e
biópsia transbronquial são freqüentemente utili-
zadas para diagnóstico.
Complicaões – As complicações precoces mais
problemáticas estão relacionadas à má cicatrização
da anastomose brônquica ou traqueal. Até 20% dos
receptores de pulmão único desenvolvem estenose
brônquica, que pode geralmente ser tratada com di-
latação ou colocação de uma prótese. Para evitar a
interferência com a cicatrização da anastomose
brônquica, os corticosteróides são omitidos do es-
quema imunossupressor no período pós-operató-
rio imediato. São utilizadas doses relativamente
altas de ciclosporina (10 a 14mg/kg ao dia, VO) e
azatioprina (1,5 a 2,5mg/kg ao dia,VO ou IV).
Uma complicação tardia do transplante de pul-
mão é a bronquite obliterativa, que causa obstru-
ção de via aérea lentamente progressiva. Ela pode
ser manifestação de rejeição crônica. Há diminui-
ção de VEF1 sem evidência de qualquer processo
pulmonar.
TRANSPLANTE DE
PÂNCREAS
O transplante de pâncreas é único entre os
transplantes de órgãos vascularizados: ao invés
de ser usado para salvar a vida, ele tenta estabi-
lizar ou prevenir as complicações devastadoras
do órgão-alvo do diabetes Tipo I. Se as complica-
ções do diabetes Tipo I (por exemplo, nefropatia,
retinopatia, neuropatia, aterosclerose acelerada)
forem resultado direto da má homeostasia da gli-
cose, então o retorno do paciente à normoglicemia
pode estabilizar a progressão destes processos
secundários. Há dados insuficientes para saber
se tais resultados serão ou não atingidos.
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351065
1066 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
O sucesso do transplante de pâncreas é medido
pela capacidade do paciente permanecer normo-
glicêmico sem insulina exógena. Na última década,
as taxas de sucesso total melhoraram de < 40% a >
80%, com vários centros relatando que > 85% dos
pacientes permanecem insulino-dependentes. A
melhora nas taxas de sucesso têm sido devidas, prin-
cipalmente, a regimes de imunossupressão melho-
rada e a avanços técnicos.
Seleão de receptor e doador – O transplante
de pâncreas não é apropriado para todos os pacien-
tes diabéticos. Como o receptor troca o risco da
injeção de insulina pelos riscos de imunossupres-
são, o transplante de pâncreas tem sido limitado,
principalmente a pacientes que já necessitam rece-
ber drogas imunossupressoras (isto é, diabéticos
com insuficiência renal que estão recebendo trans-
plante de rim). Entretanto, alguns centros estão
agora realizando transplantes de pâncreas isolado
em pacientes diabéticos sem nefrosclerose diabéti-
ca de estágio terminal, mas que possuem outras
complicações graves de diabetes. Os transplantes
simultâneos de pâncreas-rim de um único doador
cadáver têm sido cada vez mais utilizados, com
resultados metabólicos excelentes. O receptor é,
desta forma, exposto à indução de imunossupres-
são de alta dosagem apenas uma vez e como am-
bos os órgãos vêm do mesmo doador, a rejeição
pode ser monitorada no rim, que parece mais pro-
penso a este processo do que o pâncreas, onde a
detecção da rejeição é difícil. Apesar da morbida-
de pós-operatória estar aumentada após o trans-
plante combinado, a sobrevida do aloenxerto de
rim não é prejudicada.
Os doadores estão usualmente entre 10 e 55 anos
de idade, sem nenhuma história de intolerância à
glicose ou abuso crônico de álcool. (Glicose sérica e
amilase no momento da morte não são úteis, pois
estes valores estão freqüentemente elevados no es-
tabelecimento de lesão da cabeça e ressuscitação de
trauma, mesmo quando o pâncreas estiver normal.)
Procedimento de transplante – As técnicas
avançadas incluem transplante do pâncreas intei-
ro, o que fornece mais células secretoras de insuli-
na, ao invés de um segmento. Também, a incidência
de trombose do enxerto pós-transplante tem sido
muito reduzida. A drenagem das secreções exócri-
nas do pâncreas na bexiga urinária, através de con-
duto de um pequeno segmento do duodeno do doa-
dor, também provou ser superior ao procedimento
anteriormente utilizado. Entretanto, com a drena-
gem do pâncreas na bexiga, há perda obrigatória
de bicarbonato e aumento nas ITU. A união do seg-
mento duodenal do doador diretamente no intesti-
no delgado do receptor tem sido cada vez mais uti-
lizada, nos últimos anos.
O aloenxerto é posicionado lateralmente no ab-
dome inferior. As anastomoses vasculares num
transplante de pâncreas são as artérias celíaca e
mesentérica superior e a veia porta do doador para
artéria e veia ilíaca do receptor, respectivamente.
Isto fornece liberação de insulina sistêmica ao in-
vés de portal, resultando em hiperinsulinemia ba-
sal de jejum.
Tratamento da rejeião – A imunossupressão
é a mesma que a utilizada para pacientes com trans-
plante de rim (ver anteriormente). A terapia de in-
dução e o tratamento de rejeição geralmente en-
volvem o uso de ALG ou OKT3.
Complicaões – As principais complicações,
além daquelas já mencionadas, são rejeição, infec-
ção e pancreatite do enxerto. Em pacientes que
possuem um transplante de pâncreas isolado, a de-
tecção da rejeição é difícil, pois a maior parte do
enxerto pode ser destruída por reação de rejeição
antes das anormalidades no metabolismo de glicose
se tornarem evidentes. Entretanto, com uma com-
patibilidade excelente de HLA, é atingida uma taxa
de sobrevida do enxerto de 80%, comparável com
a taxa de sucesso total de transplante combinado
de rim-pâncreas.
ALOENXERTO DE CÉLULAS DAS
ILHOTAS PANCREÁTICAS
O transplante isolado de células das ilhotas têm
sido limitado, em humanos, devido aos problemas
de se obter e fornecer células suficientes das ilhotas
isoladas. Recentemente, a independência da insu-
lina tem sido atingida em pacientes diabéticos re-
ceptores de aloenxertos de ilhota utilizando-se cé-
lulas obtidas de vários pâncreas de doadores cadá-
veres. É incerto se a normoglicemia a longo prazo
pode ou não ser mantida. O transplante de células
das ilhotas possui várias vantagens: as células po-
dem ser colocadas facilmente na circulação portal
do receptor através de uma canulação na veia um-
bilical, sem uma operação maior e as ilhotas po-
dem ser criopreservadas. Também existe um po-
tencial para tratar células das ilhotas, para reduzir
sua imunogenicidade.
TRANSPLANTE DE
MEDULA ÓSSEA
Nas duas últimas décadas, o transplante de me-
dula óssea (TMO) alogênico evoluiu de um proce-
dimento experimental reservado a pacientes com
leucemia refratária para uma área de investigação
clínica em rápida expansão, que oferece altas taxas
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351066
CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1067
de cura para pacientes com anemia aplásica, leuce-
mia aguda e crônica, câncer de mama e tipos sele-
cionados de linfoma. O objetivo do TMO é prover o
receptor com uma população saudável de células pri-
mordiais, que irão se diferenciarem células do san-
gue para substituir as células deficientes ou patoló-
gicas do hospedeiro. Os regimes preparatórios in-
tensivos, a profilaxia eficaz da doença do enxerto
versus hospedeiro (GHVD), o tratamento com regi-
mes à base de ciclosporina e melhoras no cuidado
de apoio (por exemplo, antibióticos, profilaxia de
citomegalovírus e herpesvírus) têm fornecido me-
lhoras significativas na sobrevida prolongada sem
doença em pacientes que são submetidos a TMO. O
tratamento com citocina após TMO (por exemplo,
com fator estimulante de colônia) está sendo testa-
do, a fim de ver se o enxerto pode ser melhorado ou
acelerado.
Indicaões – Os pacientes com leucemia mielói-
de aguda ou linfoblástica podem se beneficiar do
TMO. Os pacientes com leucemia mielóide transplan-
tados na primeira remissão atualmente podem espe-
rar por aproximadamente 50 a 60% de probabilidade
de sobrevida a longo prazo sem a doença. Probabili-
dades similares também são alcançáveis após o trans-
plante de adultos com leucemia linfoblástica aguda
nas primeiras remissões. A probabilidade da reinci-
dência se correlaciona com o estado de remissão no
momento do transplante, variando de 20%, na pri-
meira remissão a 60%, com doença mais avançada.
A sobrevida a longo termo para pacientes com leuce-
mia mielocítica crônica que receberam TMO na fase
de remissão é de 60 a 70%.
O TMO pediátrico tem se expandido devido
ao seu potencial para curar crianças com doen-
ças genéticas (por exemplo, talassemia, anemia
falciforme, imunodeficiências e erros inatos do
metabolismo).
Limitaões dos doadores – O fator-chave limi-
tante para o uso de TMO é a ausência de doadores.
Como apenas 25 a 30% dos pacientes possuem um
parente com HLA idêntico, os doadores alternati-
vos são freqüentemente necessários. Existem duas
possibilidades: 1. A medula pode ser procurada em
outros doadores vivos não parentes; a doação de
medula é um procedimento simples e seguro. Os
registros nacionais e internacionais de doadores
voluntários prováveis estão sendo expandidos para
aumentar a probabilidade de encontrar um HLA
compatível exato para qualquer receptor; 2. Os
doadores relacionados que não são HLA-idênticos
têm sido utilizados com crescente freqüência. Os
resultados com ambos os procedimentos sugerem
probabilidades de sobrevida a longo prazo sem
doença de 30 a 50% em pacientes com leucemia
aguda e crônica ou anemia aplástica; isto é, na
maioria das situações, os resultados são um pou-
co inferiores aos de medula de parentes com
HLA idênticos.
Uma outra opção para TMO é o transplante
autólogo (remoção da medula óssea de um paciente
quando uma remissão completa tiver sido induzi-
da, seguida pelo tratamento ablativo do paciente
com a esperança de destruição de qualquer tumor
residual e auxílio com a própria medula óssea do
paciente). Como um auto-enxerto é utilizado, ne-
nhuma imunossupressão é necessária além da qui-
mioterapia de alta dosagem a curto prazo, utilizada
para erradicação de tumor e ablação da medula ós-
sea; os problemas pós-transplante com GHVD são
mínimos. As indicações para TMO autólogo são
linfoma recidivante sensível à quimioterapia, no
qual uma taxa de sucesso de 30 a 40% foi atingida
e leucemia aguda em remissão, na qual foram ob-
servadas taxas de sucesso de 20 a 50%. As taxas de
sucesso são inferiores com doença mais avançada
e com cânceres sólidos responsivos (por exemplo,
tumores de mama ou célula germinativa). Os dois
principais obstáculos permanecem para a aplica-
ção bem-sucedida de TMO autólogo: a possibili-
dade de contaminação do inóculo da medula óssea
com células tumorais e a ausência da atividade do
enxerto versus tumor (em contraste com aquela
vista no TMO alogênico), os quais contribuem para
as taxas mais altas observadas de recidiva do tu-
mor. Sendo assim, os esquemas em desenvolvimen-
to para purgação da medula ex vivo e para a modu-
lação imune do receptor pós-transplante são uma
área de pesquisa ativa.
Preparaão do receptor – O desenvolvimento
de regimes preparatórios agressivos melhorou o
resultado, reduzindo a incidência de rejeição e re-
cidiva. Estes regimes aumentaram o potencial anti-
tumor ou antileucêmico, assim como liberaram a
mieloablação superior, necessária para destruir a
medula do hospedeiro e criar espaço para o enxer-
to do doador sem comprometer os elementos do
estroma da medula, essenciais para o estabeleci-
mento bem-sucedido do transplante. Os regimes
preparatórios também suprimem o sistema imune
do paciente para permitir a aceitação do enxerto.
Os pacientes recebem altas dosagens de ciclo-
fosfamida e/ou irradiação corpórea total nos regi-
mes de preparação padrão. A taxa de rejeição é
< 5% nos transplantes para pacientes com leuce-
mia a partir de doadores com HLA idêntico. Para
pacientes com transfusões múltiplas, com anemia
aplástica, a taxa de rejeição também tem sido sig-
nificativamente diminuída devido à imunossupres-
são aumentada durante a indução do transplante.
Os dois regimes preparatórios mais comuns são
ciclofosfamida em alta dosagem (por exemplo,
Merck_12.p65= 02/02/01, 15:351067
1068 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
60mg/kg ao dia por 2 dias) e irradiação corpórea
total ou um regime de bussulfam (por exemplo,
4mg/kg ao dia por 4 dias) e ciclofosfamida e ciclo-
fosfamida sem irradiação corpórea total. Outras
drogas (por exemplo, etoposida e citarabina) são
algumas vezes adicionadas a estes regimes de trans-
plante, para maximizar as propriedades antitumor,
mieloablação e imunossupressão.
Procedimento de transplante – O procedi-
mento de transplante é relativamente fácil de com-
preender. Os pacientes recebem altas doses de
quimioterapia e/ou irradiação corpórea total. A
medula é então aspirada, por via das cristas ilía-
cas de um doador HLA-compatível e infundida
IV, no paciente. Os pacientes são gravemente
pancitopênicos até o estabelecimento bem-suce-
dido do transplante, em geral em 2 a 3 semanas
após a reinfusão da medula.
Complicaões – As complicações iniciais in-
cluem rejeição, pelo hospedeiro, da medula trans-
plantada, GHVD aguda e infecções. As complica-
ções tardias incluem GHVD crônica, imunodefi-
ciência prolongada e recidiva da doença.
Doena do enxerto versus hospedeiro – A
GHVD é uma doença na qual as células T imunolo-
gicamente competentes do doador reagem contra os
antígenos em um receptor imunologicamente depri-
mido. Um grande problema no transplante alogênico
é a prevenção e controle da GHVD. Os sintomas e
sinais da GHVD aguda são febre, dermatite esfolia-
tiva, hepatite com hiperbilirrubinemia, vômitos, diar-
réia e dor abdominal, que podem progredir para íleo
e perda de peso. Embora o melhor conhecimento do
complexo de histocompatilidade principal tenha au-
xiliado na compreensão da etiologia da GHVD, os
pacientes com compatibilidade para os loci A, B, C
e DR ainda apresentam incidência de 30 a 60% de
GHVD. Surpreendentemente, a síndrome da GHVD
tem sido relatada até mesmo em pacientes que rece-
bem transplantes singênicos (entre gêmeos idênti-
cos) ou transplantes autólogos (com sua própria
medula). Apesar da introdução da ciclosporina, no
início dos anos 80, ter reduzido muito a incidência e
a gravidade da GHVD, esta continua a ser a princi-
pal causa de mortalidade e morbidade grave após o
TMO alogênico.
Cerca de um terço da metade dos receptores de
TMO desenvolve uma forma crônica mais indolen-
te de GHVD. Embora pele, fígado e intestino sejam
os órgãos primeiramente afetados, outras áreas de
envolvimento (por exemplo, articulações e pulmão)
também são observadas. É interessante observar que
também pode ocorrer bronquiolite obliterante seme-
lhante àquela vista após transplante pulmonar. Fi-
nalmente, 20 a 40% dos pacientes morrem de com-
plicações associadas à GHVD, a incidência sendo
maior quando a medula do doador não for de um
parenteHLA-idêntico. Nos pacientes sem seqüelas
crônicas da GHVD, toda a imunossupressão pode
ser interrompida 6 meses após o TMO, tornando ra-
ras as complicações tardias nestes pacientes, em con-
traste com a necessidade contínua de imunossupres-
sores e complicações resultantes nos receptores de
transplante de órgãos sólidos.
Uma área de intensa pesquisa clínica com o
objetivo de reduzir a incidência de GHVD tem sido
a remoção das células T da medula do doador com
anticorpos monoclonais, utilizando a técnica de
roseta ou separação mecânica antes da reinfusão
da medula. A depleção de célula T tem sido muito
eficaz em diminuir tanto a incidência como a gravi-
dade da GHVD; entretanto, as incidências de perda
do enxerto e recidiva são aumentadas. Uma possí-
vel explicação é que as citocinas geradas na reação
do enxerto versus hospedeiro promovem a multi-
plicação e maturação de células primordiais essen-
ciais para estabelecimento bem sucedido do enxer-
to. Os pacientes que desenvolvem GHVD apresen-
tam taxas de recidiva significativamente menores,
sugerindo que as células T responsáveis pela GHVD
provavelmente estejam envolvidas num efeito de
enxerto versus leucemia. Outros agentes utilizados
para impedir ou tratar a GHVD incluem
metotrexato, corticosteróides, ATG e anticorpos
monoclonais contra antígenos que se expressam so-
bre as células T maduras.
A GHVD também pode ser decorrente de trans-
fusões sangüíneas em casos excepcionais, visto que
até mesmo um pequeno número de células T doa-
das pode induzir esta reação. Tais situações incluem
transfusões sangüíneas fetais intra-uterinas e trans-
fusões em pacientes imunodeprimidos, (por exem-
plo, receptores de TMO, leucemia, linfoma, neuro-
blastoma, mal de Hodgkin e linfoma não-Hodgkin).
Os produtos sangüíneos a serem administrados em
pacientes em risco devem ser irradiados para evi-
tar o desenvolvimento de GHVD (ver Cap. 129).
Infecão – Após os procedimentos preparató-
rios para TMO, a contagem de leucócitos pode
levar 2 a 3 semanas para se recuperar. Durante
este tempo, os pacientes ficam muito suscetíveis
a infecções. A profilaxia com aciclovir tem di-
minuído dramaticamente o risco de infecções por
herpes simples durante o período. Mesmo após
o estabelecimento bem-sucedido do enxerto, os
pacientes continuam imunocomprometidos e em
risco de infecções devido às drogas utilizadas
para tratar a GHVD. A infecção tardia preocu-
pante é a pneumonite intersticial por citomega-
lovírus, que geralmente ocorre 40 a 60 dias após
o transplante. Os pacientes apresentam ta-
quipnéia, dispnéia, hipoxemia e radiografia to-
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CAPÍTULO 149 – TRANSPLANTES / 1069
rácica com infiltrados pulmonares bilaterais. A
taxa de mortalidade da pneumonite intersticial
por citomegalovírus foi de 80 a 90%, porém o
tratamento com ganciclovir e imunidade passiva
com imunoglobulina diminuíram a taxa de mor-
talidade em aproximadamente 25 a 40%. Os
pacientes também estão em risco de desenvolver
pneumonia pneumocística, porém o uso profilá-
tico de trimetoprim-sulfametoxazol diminuiu
dramaticamente a incidência dessa infecção.
TRANSPLANTE DE
OUTROS ÓRGÃOS
E TECIDOS
Os aloenxertos de pele são muito valiosos para
os pacientes que apresentam queimaduras exten-
sas ou outras causas de perda cutânea maciça. Quan-
do os locais insuficientes do doador negam o uso
de auto-enxertos apenas, tiras de auto e aloenxer-
tos são alternadas, recobrindo toda a área desnuda
para reduzir as perdas de fluidos e de proteínas e
dificultar as infecções invasivas. Os aloenxertos são
rejeitados, mas estas áreas secundariamente des-
nudas podem ser, então, recobertas com auto-en-
xertos obtidos de locais já cicatrizados do doador
original. Os aloenxertos também servem como cu-
rativos para queimaduras ou ferimento infectados
que se tornam estéreis rapidamente e desenvolvem
áreas de granulação bem-vascularizadas, sobre as
quais os auto-enxertos irão aderir prontamente.
As células da pele, expandidas em cultura antes de
serem retornadas ao paciente queimado, também
podem ajudar a recobrir queimaduras extensas,
como pode a “pele artificial” recentemente intro-
duzida, a qual é composta de células em cultura
em base sintética.
O transplante de cartilagem é único pelo fato de
que os condrócito se situam em um restrito grupo de
células de mamíferos que podem ser aloenxertadas
sem sucumbirem à resposta imune, aparentemente
porque a população esparsa de células em cartilagem
hialina está protegida do ataque celular pela matriz
cartilaginosa ao seu redor. Em crianças, a cartilagem
obtida de doadores cadáveres pode ser utilizada para
a reparação de defeitos congênitos nasais ou do pavi-
lhão auditivo. Em adultos, os auto-enxertos (geral-
mente da cartilagem costal) são mais usados no trata-
mento de esões graves. A utilização de aloenxertos
de cartilagem para a reconstrução de superfícies arti-
culares destruídas pela artrite está sendo tentada.
O enxerto ósseo é utilizado amplamente, porém,
excetuando-se os auto-enxertos, nenhuma célula viá-
vel do doador sobrevive no receptor. A matriz óssea
remanescente, no entanto, possui uma capacidade
de indução óssea que estimula os osteoblastos do
hospedeiro a recolonizar a matriz e depositar um
novo tecido ósseo, desta forma servindo como pon-
te para estabilizar os defeitos até que um novo mate-
rial ósseo seja formado. A ressecção maciça de tu-
mores ósseos malignos e a reconstrução através do
implante de osso composto e auto-enxertos de carti-
lagem constituem abordagens práticas para preser-
var extremidades que, de outra forma, seriam am-
putadas. Os aloenxertos de cadáveres são preser-
vados por congelamento, para reduzir a imunoge-
nicidade do osso (que está inerte no momento do
implante) e glicerolização para manter a viabilidade
dos condrócitos. Não se usa nenhum tratamento
imunossupressor no período pós-implante. Embora
estes pacientes desenvolvam anticorpos anti-HLA,
o acompanhamento precoce não revela nenhuma
evidência de destruição da cartilagem.
O transplante de intestino delgado é um pro-
cedimento em desenvolvimento, aplicável apenas
a um pequeno grupo de pacientes com área de su-
perfície absortiva intestinal inadequada devido a
problemas intra-abdominais (por exemplo, vólvulo,
enterocolite tóxica e trauma). Os transplantes de
intestino delgado devem ser posteriormente limi-
tados aos pacientes que não toleram a nutrição pa-
renteral crônica, não possuindo outras opções para
a sobrevivência. As sobrevidas de mais de 1 ano
com função enteral intacta estão agora sendo atin-
gidas após o transplante de intestino delgado. Os
aspectos que precisam ser discutidos são o com-
primento ótimo do segmento a ser transplantado, o
uso de drenagem venosa sistêmica versus portal do
enxerto, a conveniência da continuidade imediata
do transplante no trato GI do receptor e o papel da
doação de parentes vivos para os aloenxertos de
intestino delgado. Devido à grande quantidade de
tecido linfóide associado ao intestino, a GHVD é
um problema muito maior nos transplantes de in-
testino delgado do que de outros aloenxertos de
órgãos vascularizados. O pré-tratamento do enxer-
to para remover as células que provocam GHVD
e, talvez, também para reduzir a imunogenicidade
do órgão, é uma abordagem experimental.
Relatou-se que tratar pacientes com mal de
Parkinson com auto-enxertos de tecido medular
adrenal estereotaticamente posicionados dentro do
SNC levam à melhora sintomática. Também são
propostos aloenxertos de tecido adrenal, em espe-
cial dos doadores fetais. Relatou-se a melhora da
rigidez e da bradicinesia de um paciente com mal
de Parkinson por meio de tecido mesencefálico ven-
tral de feto implantado por estereotaxia no putame
destes pacientes. Entretanto, com as discussões éti-
cas e políticas que existem sobre a propriedade de
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1070 / SEÇÃO 12 – IMUNOLOGIA; DISTÚRBIOS ALÉRGICOS
se utilizar tecido fetal humano, é improvável que
se realize um grande estudo controlado suficiente
para avaliar adequadamente o transplante neural fe-
tal. Os xenoenxertos de células endocrinologicamente
ativas de doadores suínos estão sendo testados.
Os implantes de timo fetal obtidos de bebês
natimortos podem restaurar a responsividade imu-
nológica de crianças com aplasia tímica e con-
seqüente ausência de desenvolvimento normal do
sistema linfóide. Como o receptor é não imunolo-
gicamente responsivo, a imunossupressão não é
necessária; a GHVD (ver anteriormente), entretan-
to, pode ser grave.
Os auto-enxertos teciduais da paratireóide
(e mais raramente os aloenxertos) têm sido utilizados
com sucesso. O autotransplante da paratireóide é re-
comendado, por alguns grupos, para o tratamento de
pacientes com hipercalcemia devido à hiperplasia se-
cundária. A técnica envolve a remoção de todo o teci-
do paratireóideo do pescoço com a colocação de pe-
quenos fragmentos de tecido em uma bolsa muscular
no antebraço, onde o tecido possa ser facilmente iden-
tificado mais tarde, se houver recidiva de hipercalce-
mia. Os aloenxertos podem ser utilizados para pacien-
tes com hipoparatireoidismo iatrogênico e cuja evolu-
ção com cuidados médicos ótimos seja insatisfatória.
Devido ao fato da necessidade da imunossupressão,
este procedimento raramente é indicado, a menos que
o paciente também esteja recebendo um aloenxerto
renal, para o qual a imunossupressão será necessária.
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	146 /null BIOLOGIA DOnullSISTEMA IMUNE
	CÉLULAS T EnullIMUNIDADE CELULAR
	REDES IMUNOLÓGICAS
	CÉLULAS B EnullIMUNIDADE HUMORAL
	REGULAÇÃO DEnullRESPOSTAS IMUNES HUMORAIS
	SISTEMAnullCOMPLEMENTO
	RESOLUÇÃO DE UMAnullRESPOSTA IMUNE
	147 /null DOENÇAS PORnullIMUNODEFICIÊNCIAS
	IMUNODEFICIÊNCIASnullPRIMÁRIAS EnullSECUNDÁRIAS
	IMUNODEFICIÊNCIASnullESPECÍFICAS
	148 /null DISTÚRBIOS DEnullHIPERSENSIBILIDADE
	DISTÚRBIOS COMnullREAÇÕES DEnullHIPERSENSIBILIDADEnullTIPO I
	DOENÇAS ATÓPICAS
	Rinite alérgica
	Conjuntivite alérgica
	Outras doenças alérgicasnulldo globo ocular
	Alergia e intolerância alimentar
	Doença pulmonar alérgica
	ANAFILAXIA
	DISTÚRBIOS DOS MEDIADORESnullVASOATIVOS
	Urticária e angioedema
	Angioedema hereditário
	Mastocitose
	Alergia física
	DISTÚRBIOS COMnullREAÇÕES DEnullHIPERSENSIBILIDADEnullTIPO II
	DISTÚRBIOS COMnullREAÇÕES DEnullHIPERSENSIBILIDADEnullTIPO III
	DISTÚRBIOS COMnullREAÇÕES DEnullHIPERSENSIBILIDADEnullTIPO IV
	HIPERSENSIBILIDADE A DROGAS
	149 /null TRANSPLANTES
	IMUNOBIOLOGIA DAnullREJEIÇÃO
	SISTEMA DE ANTÍGENOnullLINFOCÍTICO HUMANO
	COMPATIBILIDADE TECIDUAL
	IMUNOSSUPRESSÃO
	TRANSPLANTE DE RIM
	TRANSPLANTE DEnullFÍGADO
	TRANSPLANTE DEnullCORAÇÃO
	TRANSPLANTE DEnullPULMÃO E DEnullPULMÃO/CORAÇÃO
	TRANSPLANTE DEnullPÂNCREAS
	ALOENXERTO DE CÉLULAS DASnullILHOTAS PANCREÁTICAS
	TRANSPLANTE DEnullMEDULA ÓSSEA
	TRANSPLANTE DEnullOUTROS ÓRGÃOSnullE TECIDOS
	Voltarnull