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Civil III – Profº Fernando Fraga TEORIA GERAL DOS CONTRATOS 1.1 Conceito e gênese 1.2 Condições de validade dos contratos 1.3 Princípios fundamentais do direito contratual Procedimentos de ensino 1.1. Conceito e gênese Conceito - Orlando Gomes: negócio jurídico bilateral, ou plurilateral, que sujeita as partes à observância de conduta idônea à satisfação dos interesses que a regulam. (Contratos. 17.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 10) - Roberto Senise Lisboa: trata-se do ajuste de vontades por meio do qual são constituídos, modificados ou extintos os direitos que uma das pessoas tem, muitas vezes, em benefício de outra. (Manual de Direito civil. Vol. 3. 3.ed. São Paulo: RT, 2005. p. 41) - Código Civil Italiano, art. 1.321. il contrato è l’acoordo di due ou più parti per costituire, regolare ou estinguere tra loro um rapporto giuridico patrimoniale. (o contrato é um acordo de duas partes ou mais, para constituir, regular ou extinguir entre elas uma relação jurídica patrimonial). * O Código Civil Brasileiro não estabelece uma definição de contrato. Estrutura do contrato - Partes (bipolaridade da relação contratual: alteridade e composição de interesses). Obs: art. 117, CC/2002: autocontrato. - Objeto - imediato (operação) - mediato (bens jurídicos – materiais ou imateriais) Teorias sobre a natureza jurídica do contrato Objetivas: - teoria normativa (Hans Kelsen): acordo de vontades que possui a função criadora do direito. - teoria preceptiva (Oscar von Bülow): as cláusulas contratuais têm natureza de preceito jurídico. Subjetivas: - voluntarista (Savigny): a vontade é o fundamento dos contratos. - declarativa (Sailleles): a vontade declarada por ambas as partes é o fundamento dos contratos. A teoria que prevalece na doutrina é a teoria declarativa. Evolução histórica No Direito Romano o contrato era instituto solene. Distinguia-se a convenção (conventio) do pacto (pacta) e do contrato (contracto). O compromisso abrangia a mancipatio, a nexum e astipulatio. A obrigação de dar, fazer ou não fazer estabelecida na forma do compromisso assumia a denominação de contracto ou pacta vestia. A punição para o inadimplemento contratual acarretava responsabilidade patrimonial e corporal (a responsabilidade corporal foi abolida com a Lex Poetelia Papiria, de 326 a.C.). Jusnaturalismo e Direito Canônico: princípio da fé jurada. Transformação da concepção de contrato – liberdade das formas. Prestígio ao consensualismo. 1804: Código Napoleão (Código Civil Francês). Liberalismo, igualdade formal e patrimonialismo. Contratos paritários. O código civil francês inspirou toda uma geração de códigos denominados oitocentistas. Revolução Industrial: início da fase da despersonalização da obrigação. Contratos de adesão. Hipossuficiência x igualdade formal. Dirigismo contratual (liberdade positiva e liberdade negativa). Publicização das relações de direito privado. A constitucionalização do direito civil e sua implicação nas relações contratuais. Cláusulas contratuais gerais. Justiça distributiva. O princípio da socialidade. 1.2. Condições de validade dos contratos Os contratos, enquanto negócios jurídicos que são, desdobram-se em três planos distintos, conforme estudado em Direito Civil I: existência, validade e eficácia. (Sugere-se que aqui o professor faça uma breve revisão sobre os pressupostos de existência, requisitos de validade e fatores eficaciais). Quanto à validade, os contratos seguem os mesmos requisitos do art. 104, CC: - agente livre e capaz; Consentimento, no sentido que passamos a analisar, significa a declaração de vontade de cada parte no contrato. O consentimento pressupõe declaração de vontade isenta de vícios (erro, dolo, coação) e esclarecida. Fala-se, então, em consentimento esclarecido, isto é, o declarante deve receber todas as informações relevantes a respeito do objeto e do conteúdo do contrato a ser celebrado, para que possa manifestar sua vontade com consciência. O consentimento representa o acordo de duas ou mais vontades a respeito de uma relação jurídica sobre determinado objeto. O consentimento, para ser válido, deve recair sobre a existência e a natureza do contrato, o objeto e as cláusulas que o compõem. - objeto lícito, possível e determinável; O conteúdo do contrato por vezes é denominado de objeto do contrato. Seria a regulamentação dos próprios interesses pelos contratantes. É o conteúdo que possui caráter normativo hábil para criar, modificar ou extinguir relações jurídicas. - forma adequada. Em regra, a forma no direito contratual é livre (princípio do consensualismo). O estudo das espécies contratuais revelará a forma que cada contrato deve/pode assumir. A forma representa a exteriorização do acordo de vontades. É o modo pelo qual o conteúdo do contrato é exteriorizado. A forma cumpre três funções: torna certa e isenta de dúvidas a manifestação de vontade; demonstra a existência de uma declaração de vontade apta a produzir efeitos jurídicos; e, por último, protege a boa-fé de terceiros. Importante pontuar que a validade do contrato é determinada no momento de sua celebração, o que se faz relevante em contratos de trato sucessivo que foram aperfeiçoados durante a vigência do Código de 1916 e ainda produzem efeitos sob a égide do Código de 2002. Nesse caso, a validade será apurada conforme as regras do CC/16, mas os efeitos que ainda produzem deverão ser adequados ao CC/02, consoante esclarece o art. 2035,caput, CC: Art. 2.035. A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução. 1.3 Princípios fundamentais do direito contratual a) Liberdade de contratar. Autonomia da vontade. Pacta sunt servanda. Autonomia da vontade x autonomia privada. Em um primeiro momento, a liberdade de contratar está relacionada com a escolha da pessoa ou das pessoas com quem o negócio será celebrado, sendo uma liberdade plena, em regra (...) Em outro plano, a autonomia da pessoa pode estar relacionada com o conteúdo do negócio jurídico, ponto em que residem limitações ainda maiores à liberdade da pessoa humana. Trata-se, portanto, da liberdade contratual. (TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. São Paulo: Método, 2006. p. 70). Divergência doutrinária: - autonomia privada (liberdade contratual) ≠ autonomia da vontade (liberdade contratual). - autonomia privada = autonomia da vontade - autonomia da vontade superada pela autonomia privada A autonomia privada é o poder que os particulares têm de regular, pelo exercício de sua própria vontade, as relações que participam, estabelecendo-lhe o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica. Sinônimo de autonomia da vontade para grande parte da doutrina contemporânea, com ela porém não se confunde, existindo entre ambas sensível diferença. A expressão autonomia da vontade tem uma conotação subjetiva, psicológica, enquanto a autonomia privada marca o poder da vontade no direito de um modo objetivo, concreto e real.(AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. 5.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 348). Pacta sunt servanda: princípio da força obrigatória dos contratos. No modelo induvidualista-liberal típico dos códigos oitocentistas, esse princípio era tomado como absoluto. No entanto, na concepção atual do direito civil, à luz dos preceitos constitucionais vigentes e dos próprios princípios consagrados pelo CC/2002, tal princípio foi relativizado com vistas à melhor proteção da dignidade humana. b) Liberdade de forma No direito civil brasileiro vigora o princípio da liberdade das formas (princípio do consensualismo), através do qual é possível que o contrato seja celebrado pela simples manifestação da vontade. Os efeitos jurídicos do contrato serão gerados independentemente da forma pela qual a vontade se manifestou, a menos que a lei tenha estipulado forma específica (contratos formais). Logo, os contratos sem forma determinada pela lei são regra na legislação civil pátria. c) Função econômica e social do contrato. Referências legislativas: art. 421 e 2035, CC/2002. Art. 421. A liberdade de contratar deve ser exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Orlando Gomes: A função econômico-social do contrato foi reconhecida, ultimamente, como a razão determinante de sua proteção jurídica. Sustenta-se que o Direito intervém, tutelando determinado contrato, devido à sua função econômico-social. Em conseqüência, os contratos que regulam interesses sem utilidade social, fúteis ou improdutivos não merecem proteção jurídica. Merecem-na apenas os que têm função econômico-social reconhecidamente útil. (Contratos. 17.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 20) Gustavo Tepedino: Tal como observado em relação à propriedade, em que a estrutura interna do direito é remodelada de acordo com sua função social, concretamente definida, e que se constitui em pressuposto de validade do exercício do próprio domínio, também o contrato, uma vez funcionalizado, se transforma em um instrumento de realização do projeto constitucional. (...) Disto decorre que a norma do art. 421 não pode ser compreendida apenas como uma restrição ocasional à liberdade contratual – como se o direito subjetivo de contratar fosse, em si mesmo, essencialmente absoluto, embora sujeito a restrições externas – mas, antes, o próprio conceito de contrato deve ser reformulado à luz da função social que lhe é cometida. (Código civil interpretado: à luz da constituição federal. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 10) De uma forma ampla, a inserção do princípio da função social do contrato no Código de 2002 está relacionada à revolução copernicana do direito privado. Por outro lado, tal princípio é exigência de uma das diretrizes estruturantes do CC/2002, qual seja, o princípio da socialidade. Traduz a ruptura com o regime individualista da codificação civil anterior e a consagração de um regime com um comprometimento social, inspirado em preceitos constitucionais como a justiça social, a solidariedade social, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e a redução das desigualdades sociais como preceitos de ordem constitucional. O princípio da função social do contrato está contido em uma cláusula geral que se revela vinculante, sobretudo do ponto de vista axiológico, pois permite sejam permeados valores constitucionais a orientar a autonomia contratual. Impõe deveres referentes a interesses extracontratuais socialmente relevantes. Enunciado n° 21, I Jornada de Direito Civil: A função social do contrato, prevista no CC 421, constitui cláusula geral, a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito. Enunciado n° 22, I Jornada de Direito Civil: A função social do contrato, prevista no CC 421, constitui cláusula geral, que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas. Enunciado n° 23, I Jornada de Direito Civil: A função social do contrato, prevista no CC 421, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana. Críticas à letra do art. 421. Sugestão de alteração: a liberdade contratual será exercida noslimites da função social do contrato. O Código Civil, art. 2.035, p. único, atribui à função social caráter de norma cogente: Art. 2.035. A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução. Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos. O parágrafo único do art. 2.035, CC/2002 consagra o chamado princípio da retroatividade motivada ou justificada, elevando a função social do contrato ao patamar de norma deordem pública e, por isso, é aplicável não apenas aos contratos celebrados a partir da vigência do código de 2002, mas também aos contratos celebrados ainda sob a égide do CC/1916 cuja execução se projetou para depois do CC/2002. O princípio da retoratividade motivada é um princípio anexo ao princípio da função social do contrato. d) principio da probidade e boa-fé contratual. Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. O princípio da boa-fé objetiva também está contido em uma cláusula geral e, como tal, se revela vinculante, sobretudo do ponto de vista axiológico, pois permite sejam permeados valores constitucionais a orientar a autonomia contratual. Impõe deveres referentes a interesses extracontratuais socialmente relevantes. Enunciado n° 27, I Jornada de Direito Civil: Na interpretação da cláusula geral da boa-fé objetiva, deve-se levar em conta o sistema do CC e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores metajurídicos. Boa-fé subjetiva x boa-fé objetiva. Princípios da eticidade e da socialidade. Tutela da confiança. A boa-fé objetiva pode ser compreendida como a exigência de conduta leal, proba, dos contratantes, tomada a partir de um enfoque social. Há ínsita relação da boa-fé objetiva com os deveres de conduta (deveres anexos, deveres secundários, deveres laterais), eis que a boa-fé objetiva: Obriga as partes a terem comportamento compatível com os fins econômicos e sociais pretendidos objetivamente pela operação negocial. No âmbito contratual, portanto, o princípio da boa-fé impõe um padrão de conduta a ambos os contratantes no sentido da recíproca cooperação, com consideração aos interesses comuns, em vista de se alcançar o efeito prático que justifica a própria existência do contrato. (Código civil interpretado: à luz da constituição federal. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 16) Judith Martins-Costa (A boa-fé no Direito privado: sistema e tópica no processo obrigacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999) exemplifica os deveres anexos: - dever de cuidado e respeito em relação ao outro contratante; - dever de segurança; - dever de prestação de contas; - dever de omissão de segredo; - dever de esclarecimento de informação; - dever de agir dentro da confiança; - dever de lealdade e probidade; - dever de colaboração (cooperação); - dever de ser razoável e agir com bom senso e eqüidade. Violação positiva do contrato: violação dos deveres de conduta. A violação positiva do contrato, embora não prevista expressamente na legislação civil brasileira, decorre da boa-fé objetiva como fonte de deveres de conduta (análise da obrigação como uma relação jurídica complexa), e vem sendo aceita pela doutrina pátria, conforme entendimento consolidado na I Jornada de Direito Civil: Enunciado n° 24, I Jornada de Direito Civil: Em virtude do princípio da boa-fé, positivado no CC 422, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa. Menezes Cordeiro atenta para o fato de a violação positiva de contrato atualmente também estar relacionada ao cumprimento imperfeito do contrato. Extensão do princípio: envolve toda a conclusão do contrato, incluindo, assim, as fases pré-contratual (culpa in contrahendo) e pós-contratual (culpa post factum finitum). Enunciado n° 25, I Jornada de Direito Civil: O CC 422 não inviabiliza a aplicação, pelo julgador, do princípio da boa-fé nas fases pré e pós-contratual. Enunciado n° 26, I Jornada de Direito Civil: A cláusula geral contida no CC 422 impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como a exigência de comportamento legal dos contratantes. Funções da boa-fé objetiva: a doutrina aponta que a boa-fé objetiva apresenta função tríplice, a saber: - função interpretativa (boa-fé enquanto cânone interpretativo-integrativo): as relações jurídicas decorrentes do contrato devem ser interpretadas à luz da boa-fé. Tal mandamento se direciona tanto às partes envolvidas no contrato quanto ao magistrado. A função interpretativa está contida no art. 113, CC. - função criadora de deveres jurídicos (boa-fé enquanto norma criadora de deveres jurídicos): a boa-fé objetiva é fonte dos deveres de conduta (deveres anexos, deveres secundários, deveres laterais). Nesse sentido, v. Clóvis Couto e Silva (A Obrigação como Processo) - função de controle (boa-fé enquanto norma de limitação ao exercício de direitos subjetivos): a boa-fé objetiva, combinada com a disciplina jurídica do abuso de direito (art. 187, CC/2002) para considerar ilícitos os atos atentatórios à boa-fé objetiva e, por isso, proibir sua execução (Menezes Cordeiro: exercício inadmissível de direitos subjetivos). Ex: teoria dos atos próprios (venire contra factum proprium, tu quoque, supressio, surrectio e duty to mitigate the loss). Obs: Há autores (e.g. Cláudia Lima Marques) que visualizam a equivalência material dos contratos como outra função autônoma da boa-fé objetiva. e) outros princípios importantes: dignidade da pessoa humana; relatividade dos efeitos contratuais; equilíbrio contratual; atipicidade (art. 425, CC/2002). Interpretação e Formação dos Contratos 1.4. Interpretação dos contratos A operação interpretativa pressupõe controvérsia instaurada e não resolvida entre os contratantes a respeito do conteúdo do contrato, no momento de sua execução. A controvérsia sobre o sentido exato e a respectiva extensão e intensidade dos efeitos do conteúdo do contrato decorre da utilização de palavras ou frases confusas, obscuras ou dotadas de significado ambíguo. Instaurada a controvérsia, paralisam-se os efeitos do contrato e, consequentemente, a sua execução, cabendo ao Poder Judiciário dirimir a controvérsia, declarando com força vinculativa para as partes o sentido da palavra, frase ou cláusula controversa. Espécies. A interpretação contratual é dita declaratória quando tem como único escopo a descoberta da intenção comum dos contratantes no momento da celebração do contrato. É chamada de integrativa ou construtiva quando objetiva o aproveitamento do contrato, mediante o suprimento das lacunas e pontos omissos deixados pelas partes. A integração contratual preenche, pois, eventuais lacunas encontradas nos contratos, complementando-os por meio de normas supletivas, especialmente as que dizem respeito à sua função social, ao princípio da boa-fé, aos usos e costumes do local, bem como buscando encontrar a verdadeira intenção das partes, às vezes revelada nas entrelinhas. Seria, portanto, um modo de aplicação do direito pelo qual o órgão jurisdicional, mediante o recurso à lei, à analogia, aos costumes, aos princípios gerais do direito ou à equidade, cria norma supletiva, que completará, então, o contrato, que é uma norma jurídica individual. Princípios básicos Nos contratos e demais negócios escritos, a análise do texto (interpretação objetiva) conduz, em regra, à descoberta da intenção dos pactuantes. Parte-se, portanto, da declaração escrita para se chegar à vontade dos contratantes (interpretação subjetiva), alvo principal da operação. Quando determinada cláusula mostra-se obscura e passível de dúvida, alegando um dos contratantes que não representa com fidelidade a vontade manifestada na celebração da avença, e tal alegação resta demonstrada, deve prevalecer a declaração em detrimento da literalidade do texto, pois, nos termos do art. 112 do CC/2002, nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. Dois princípios hão de ser observados sempre na interpretação dos contratos: o da boa-fé (art. 113, já estudado na semana anterior) e o da conservação do contrato. Segundo o princípio da conservação ou aproveitamento do contrato, entende-se que se uma cláusula contratual permitir duas interpretações diferentes, prevalecerá a que possa produzir algum efeito, pois não se deve supor que os contratantes tenham celebrado um contrato carecedor de qualquer utilidade. Esse princípio informa a denominada conversão substancial do negócio jurídico. Assim, p.ex., se as partes celebraram um pretenso contrato de compra e venda de imóvel sem atenção às formalidades exigidas por lei, pode-se considerar o negócio como uma promessa de compra e venda, que não exige forma solene, para se aproveitar a vontade das partes. Ainda segundo o Código Civil, art. 114, os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente. São aqueles negócios que envolvem uma liberalidade, como na doação. Devem ter interpretação estrita, pois representam renúncia de direitos. Regras esparsas no código civil. Súmulas. Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. Art. 426. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva. Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva. Art. 843. A transação interpreta-se restritivamente, e por ela não se transmitem, apenas se declaram ou reconhecem direitos. Art. 1.899. Quando a cláusula testamentária for suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador. STF, Súmula 454. Simples interpretação de cláusulas contratuais não dá lugar a recurso extraordinário. STJ, Súmula 181. É admissível ação declaratória, visando a obter certeza quanto a exata interpretação de clausula contratual. Critérios práticos para interpretação dos contratos (Maria Helena Diniz – Tratado teórico e prático dos contratos) * a melhor maneira de apurar a intenção dos contratantes é verificar o modo como vinham executando o contrato, de comum acordo; * deve-se interpretar o contrato, na dúvida, da maneira menos onerosa para o devedor; * as cláusulas contratuais não devem ser interpretadas isoladamente, mas em conjunto com as demais; * qualquer obscuridade é imputada a quem redigiu a estipulação, pois, podendo ser claro, não o foi; * na cláusula suscetível de dois significados, interpretar-se-á em atenção ao que pode ser exeqüível (princípio da conservação do contrato); * em relação aos termos do contrato, considerar-se-á que, por mais genéricos que sejam, só abrangem os bens sobre os quais os interessados contratarem e não os de que não cogitaram; * nas cláusulas duvidosas, prevalecerá o entendimento de que se deve favorecer quem se obriga; * nos contratos gratuitos, a interpretação deve proceder-se no sentido de fazê-lo o menos pesado possível para o devedor; nos onerosos, deve-se buscar interpretar de modo a alcançar um equilíbrio eqüitativo entre os interesses das partes; * na dúvida entre a gratuidade e a onerosidade do contrato, presumir-se-á esta e não aquela; * nas convenções que tiverem por objeto uma universalidade de coisas, compreendem-se nela todos os bens particulares que a compõem, mesmo aqueles de que os contraentes não tiverem conhecimento; * no contrato de locação que apresentar dúvidas, resolver-se-á contra o locador; * no contrato seguido de outro, que o modifica parcialmente, a interpretação deverá considerar ambos como um todo orgânico. Unidade 2 - A FORMAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS 2.1 A formação dos contratos Fases da formação do contrato: 1. negociações preliminares (puntuação): nesta fase ocorrem as tratativas para a celebração do contrato. Não há vínculo jurídico entre os negociantes, portanto, a não conclusão do contrato não gera responsabilidade civil contratual. Na fase de puntuação pode ser elaborada minuta contratual. A fase negociatória, por definição, destina-se apenas a conversações tendentes à eventualconclusão de um contrato e à definição de seu conteúdo, conversações que recebem nas línguas italiana, francesa e alemã os nomes de trattative, pouparlers e Verhandugen, respectivamente.(TELLES, Inocêncio Galvão. Manual dos contratos em geral. 4.ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2002. p. 203) Obs: a responsabilidade civil pré-contratual, fundada na culpa in contrahendo (ilegítima frustração de um contrato esperado), é excepcional, cabendo diante da hipótese de violação da boa-fé objetiva. A doutrina diverge se é hipótese de responsabilidade aquiliana ou de uma outra espécie de responsabilidade civil, situada em um meio termo entre a responsabilidade contratual e a extracontratual.. Na verdade, há uma responsabilidade pré-contratual, que dá certa relevância jurídica aos acordos preparatórios, fundada no princípio de que os interessados na celebração de um contrato deverão comportar-se de boa-fé e nos arts. 186 e 927 do Código Civil que dispõe que todo aquele que, por ação ou omissão, culposa ou dolosa, causar prejuízo ao outrem fica obrigado a reparar o dano.(DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. vol. 3. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 46) Em alguns sistemas de Direito positivo, a responsabilidade civil extracontratual está expressa na codificação, a exemplo do Código Civil Português, que em seu art. 227, n° 1, assim dispõe: quem negoceia com outrem para a conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte. 2. Policitação (proposta ou oblação): fase em que é feita a oferta por parte do proponente para que o solicitado emita seu consentimento. A proposta é uma declaração unilateral de vontade receptícia, estando sujeita à aceitação da outra parte para que produza seus efeitos. Vontade contratual: vontade formada a partir da convergência dos interesses das partes negociante, após o consentimento do oblato sobre a proposta do proponente. Sujeitos da proposta: - proponente, policitante ou solicitante: aquele que faz a oferta. - solicitado, policitado ou oblato: aquele para quem a proposta é direcionada. Requisitos da proposta: - séria - completa - clara - dirigida à pessoa a quem se destina A proposta pode ser feita: A) Quanto à presença dos contratantes - entre presentes (inter praesentes) - entre ausentes (inter absentes) O critério utilizado pela lei é o da presença jurídica e não o da presença física, como se extrai do art. 428, I, CC, que considera presente a pessoa que utiliza telefone ou meio de comunicação semelhante para contratar. Assim é que presentes são aqueles em que a aceitação pode ser feita imediatamente à proposta. Se o oblato precisar de prazo para aceitar, a proposta será considerada entre ausentes. Os contratos eletrônicos podem ser tanto entre presentes quanto entre ausentes: Nessa linha de raciocínio, poderemos considerar, mutatis mutandis, entre presentes, o contrato celebrado eletronicamente em um chat (salas virtuais de comunicação), haja vista que as partes envolvidas mantêm contato direto entre si quando de sua formação, e, por outro lado, entre ausentes, aquele formado por meio de envio de mensagem eletrônica (e-mail), pois, nesse caso, medeia um lapso entre a emissão da oferta e a resposta. (GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos. Tomo I. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 89). B) Quanto à validade: - com prazo - sem prazo Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso. Princípio da vinculação ou da obrigatoriedade da proposta: a proposta feita pelo policitante é obrigatória. Tal princípio, contudo, comporta exceções, previstas na segunda parte do art. 427 e no art. 428, ambos do Código Civil/2002. Em assim sendo, o princípio da vinculação será afastado nas seguintes hipóteses: a) quando na proposta estiver facultado ao policitante o direito de retratação. Esta hipótesenão é admitida nos contratos de consumo. b) quando for da natureza da proposta ou quando as circunstâncias do caso assim determinarem. Obscuridade da legislação. c) se a retratação chegar antes ou ao mesmo tempo que a proposta. d) nas propostas entre presentes feitas sem prazo, quando o oblato não aceita imediatamente (contratos com declaração consecutiva). e) nas propostas entre ausentes, quando há tempo razoável (prazo moral) para a chegada da resposta do oblato (contratos com declaração intervalada). f) quando a proposta é feita com prazo (proposta entre ausentes) e a aceitação não é expedida em tempo hábil. Oferta ao público Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta quando encerra os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário não resultar das circunstâncias ou dos usos. Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela mesma via de sua divulgação, desde que ressalvada esta faculdade na oferta realizada. Oferta x proposta. Contraproposta: considerada uma nova proposta, havendo, pois inversão da polaridade da relação inicial (o policitante passa a ser policitado e vice-versa). A discussão ou a modificação do conteúdo da proposta pelo policitado importa em nova proposta, desvinculando-se o policitante do conteúdo anterior. A alteração dos termos da proposta pode se dar: por acréscimo (adição) ou por restrição (LISBOA, Roberto Senise.Manual de direito civil: contratos e declarações unilaterais – teoria geral e espécies. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 217) 3) Fase de Conclusão do Contrato Aceitação – momento da formação do contrato A aceitação faz com que a vontade contratual seja formada, fazendo com que o contrato seja concluído (eficácia da aceitação). O Código Civil adota, regra geral, a teoria da agnição (ou declaração), na modalidade expedição. É dizer, o contrato é formado no momento em que a vontade é expedida, independente do conhecimento imediato do policitante. A adoção da teoria da agnição na modalidade expedição não é absoluta. Há hipóteses em que o Código Civil não reconhece a formação do vínculo contratual somente com a expedição da proposta (proposta entre ausentes), abraçando a teoria da agnição na modalidade recepção: a) quando a retratação do oblato chegar antes da aceitação ou junto com esta. Nesse caso, a aceitação é considerada inexistente (art. 433, CC/2002). b) quando o policitante tiver firmado compromisso de aguardar a resposta, fixando como o momento da conclusão o instante do recebimento da resposta. c) quando a proposta não chegar no prazo convencionado. Aceitação tácita: art. 432, CC/2002. Teoria do silêncio circunstanciado. É evidente, porém, que não têm qualquer respaldo legal as disposições incluídas em algumas propostas no sentido de que o silêncio do destinatário importará na formação do contrato. (TEPEDINO, Gustavo (org). Código civil interpretado: conforme a Constituição Federal. Vol. 2. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 48). Aceitação tardia: a aceitação tardia, quando feita com adições, restrições ou modificações, importará em nova proposta (art. 431, CC/2002). No entanto, quando a aceitação é recebida fora do prazo por motivos imprevisíveis, o policitante deverá imediatamente informar o oblato, sob pena de responsabilizar-se por possíveis perdas e danos (art. 430, CC/02 – aplicação da teoria do duty the mitigate the loss). Obs: nos contratos reais, o momento de formação do contrato é o da tradição da coisa. Lugar da formação do contrato: em conformidade com o art. 435, CC/2002, o contrato se forma no lugar em que foi feita a proposta. A FORMAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS (continuação) 2.2 Classificação dos contratos 2.3 Estipulação em favor de terceiros 2.4 Da promessa de fato de terceiro Procedimentos de ensino 2.2. Classificação dos contratos A. Contratos de Direito Comum e de Consumo Quanto à qualidade dos sujeitos contratantes, os contratos podem ser: a) Contratos de direito comum: são regulados pelo direito civil. São considerados contratos paritários, em decorrência do princípio da igualdade formal que informa o direito civil. b) Contratos de consumo: são contratos cuja polarização se dá entre consumidor e fornecedor. Os contratos de consumo são regulados pelas normas do Código de Defesa do Consumidor (Lei n° 8.078/90). O CDC, em seus arts. 2° e 3°, assim define consumidor e fornecedor: Art. 2°. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Assim, sempre que restar caracterizada relação de consumo (fornecimento de produto e/ou serviço a um consumidor), o contrato será de consumo e, por isso, reger-se-á pelas regras consubstanciadas no CDC. B. Contratos Consensuais e Contratos Reais Quanto ao momento do aperfeiçoamento do contrato, os contratos podem ser: a) Contratos consensuais: são aqueles que se aperfeiçoam simplesmente pela declaração da vontade dos contratantes. Ex: contrato de compra e venda. b) Contratos reais: são aqueles que, para se aperfeiçoarem, precisam da efetiva entrega da coisa (traditio rei). A declaração de vontade é elemento necessário, porém insuficiente, devendo ocorrer a entrega do bem para que o contrato seja celebrado. Ex: contrato de mútuo. Obs: aperfeiçoamento é diferente de cumprimento. C. Contratos Solenes Quanto à forma, os contratos podem ser: a) Solenes: aqueles cuja forma é determinada pela lei. Ex: compra e venda de imóvel cujo valor é supere em trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país (art. 108, CC/2002). Insta observar que a desobediência à forma prevista em lei gera invalidade do negócio jurídico. b) Não solenes: aqueles em que não há forma especial para sua celebração, seguindo, pois, o princípio da liberdade das formas (princípio do consensualismo). Ex: contrato de mandato. Obs: parte da doutrina diferencia o contrato solene do contrato formal. Segundo esta linha de pensamento, os contratos solenes são aqueles em que há exigência de escritura pública para a sua celebração, como o contrato de compra e venda de imóvel cujo valor é supere em trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país. Por outro lado, os contratos formais são aqueles em que há regras especiais para sua formação, como a exigência de forma escrita. Neste sentido, Silvio Venosa. D. Contratos Típicos e Atípicos Quanto à tipicidade, os contratos podem ser: a) Típicos: regulamentados por lei. Ex: contrato de transporte. b) Atípicos: não regulamentados por lei. Ex: contratos eletrônicos. Há parte da doutrina que não identifica como sinônimas as expressões típico e nominado, admitindo hipóteses de contratos nominados e atípicos, como p.ex. o contrato de locação de garagem ou estacionamento, previsto no art. 1°, parágrafo único, da Lei n° 8.245/90 (Lei de Locação). E. Contratos de Direito Público e de Direito Privado Contratos de Direito Público: são os contratos em que a Administração Pública figura em um dos pólos. São regidos pelas normas de direito público e, subsidiariamente, por normas de direito privado, no que não lhe for incompatível. Ex: contratos administrativos, contratos de gestão. Contratos de Direito Privado: travados entre particulares e regidos pelas normas de direito privado. Os contratos de direito privado podem ser de direito comum, mercantis ou de consumo. F. Contratos Bilaterais e Unilaterais Quanto às obrigações recíprocas, os contratos podem ser: a) unilaterais: impõem deveres a apenas uma das partes. Ex: contrato de doação. Obs: atentar para os chamados contratos bilaterais imperfeitos. b) bilaterais: impõem deveres recíprocos a ambas as partes. São chamados de contratos sinalagmáticos. Ex: contrato de locação. c) plurilaterais (contratos plúrimos): há direitos e deveres recíprocos entre todos os sujeitos envolvidos no contrato. Ex: contrato de sociedade. G. Contratos Onerosos e Gratuitos Quanto ao sacrifício patrimonial das partes, o contrato pode ser: a) Gratuito ou benéfico: é aquele em que só há sacrifício de uma das partes. Há uma prestação sem que haja uma contraprestação a ela correlata e proporcional. Ex: doação. b) Oneroso: é aquele em que há sacrifício patrimonial de ambas as partes, de modo que inexiste uma prestação e uma contraprestação a ela correlata e proporcional. Ex: troca. Todo contrato bilateral é oneroso, mas nem todo contrato unilateral é gratuito. Ex: mútuo feneratício, que é unilateral, porém oneroso, pois há pagamento de juros. H. Contratos Comutativos e Aleatórios Os contratos onerosos podem ser a) comutativos, quando ambas as partes sabem com exatidão suas prestações e contraprestações, e b) aleatórios, quando há a presença do risco (álea), que pode recair tanto na própria existência da coisa (contrato aleatório emptio spei – de coisa esperada), quanto na quantidade da coisa (contrato aleatório emptio rei speratae). I. Contratos Principais e Acessórios Quanto às relações recíprocas, os contratos podem ser: a) Principais: são independentes, existindo por si só. Ex: contrato de compra e venda. b) Acessórios: são aqueles que guardam uma relação de dependência com outro contrato, existindo em função dele. Ex: contrato de fiança, que é acessório a um contrato de mútuo. Aplicação do princípio da gravitação jurídica. Obs: contratos coligados. Os contratos coligados constituem situação intermediária entre os contratos principais e acessórios, pois se tratam de dois contratos principais por natureza, mas que, por vontade das partes, estão unidos por um nexo funcional. Ex: A compra de um terreno com imóvel para moradia (contrato principal) e a compra de outro terreno, vizinho, para área de lazer (contrato secundário). O STJ tem entendido que, em sede de contratos coligados, o inadimplemento do contrato principal não enseja, necessariamente, a resolução do contrato secundário, como ocorreria se fosse contrato acessório, em consonância com o princípio da gravitação jurídica. J. Contratos de Execução Imediata e de Execução Sucessiva Quanto ao momento de seu cumprimento, os contratos podem ser: a) de execução imediata (instantâneos): aqueles cujo vencimento ocorre concomitantemente com o aperfeiçoamento do contrato. b) de execução diferida: são contratos a termo, que deverão ser adimplidos em sua totalidade na data do vencimento ajustada. c) de execução continuada (execução sucessiva ou trato sucessivo): aqueles cuja execução se dará de forma periódica. K. Contratos de adesão Referências legislativas no Código Civil: arts. 423 e 424. Não há correspondência com o Código de 1916. Características gerais Conceito – art. 54, CDC: Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. O Código Civil não conceitua o contrato de adesão. O contrato de adesão não é uma espécie contratual propriamente dita, pois nele podem conter diversas modalidades obrigacionais. É um método de contratação (MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. p. 58) cuja forma de aceitação de um dos contratantes se dá com a simples adesão a um conteúdo pré-estabelecido pelo outro contratante. Os contratos de massa suprimem as negociações prévias, cabendo ao aderente aceitar ou recusar em bloco o regulamento contratual que lhe é apresentado. O traço essencial que os singulariza não é tanto a diferença econômica entre as partes, mas o poder de estabelecer unilateralmente as cláusulas que farão parte do instrumento contratual. (AMARAL JUNIOR, Alberto. Proteção do consumidor no contrato de compra e venda. p. 115) Sujeitos: - predisponente ou estipulante – detém o poder negocial. - aderente – aceita cláusulas pré-estabelecidas, sem poder de alterá-las. Características: - predisposição - unilateralidade - rigidez Obs: generalidade e indeterminação como características secundárias. Interpretação Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. Qualquer obscuridade na redação das cláusulas de um contrato por adesão volta-se ao estipulante: a interpretação lhe é contrária, prestigiando sempre o aderente, que não teve poder de negociação no ato de celebração do contrato. Proteção do aderente no plano da formação do contrato de adesão. O art. 47, CDC, é mais amplo, pois estabelece que as cláusulas contratuais serão interpretadas sempre de maneira mais favorável ao consumidor, independente de obscuridade ou ambigüidade da cláusula. Abusividade das cláusulas Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio. Proteção do aderente no plano do conteúdo negocial. O estipulante, por ter o poder de estabelecer unilateralmente as cláusulas contratuais, não pode impor ao aderente renúncia antecipada de direito decorrente das características essenciais do negócio que está celebrando. A jurisprudência brasileira tem levado à nulidade cláusulas que contrariem não só o conceito de natureza, mas ainda a finalidade econômica do contrato, principalmente quando tal renúncia atinja o cerne mesmo daquele pacto. A lógica de tais decisões não se limita às relações de consumo, ainda que este tenha sido o seu cenário original; afinal, como já visto, o art. 422 também prescreve a necessidade de se preservar a boa-fé objetiva no âmbito dos contratos paritários. (TEPEDINO, Gustavo (org). Código civil comentado: à luz da Constituição Federal. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 31.) As cláusulas abusivas são nulas (nulidade absoluta); isso não significa, porém, que necessariamente haverá nulidade de todo o contrato. 2.3. Estipulação em favor de terceiros Princípio da relatividade dos efeitos contratuais: os contratos geram efeitos apenas entre as partes, nos limites impostos pela lei e pelo exercício da autonomia privada. A regra geral é, portanto, que os contratos produzem efeitos tão-somente aos contratantes, excluindo todos aqueles alheios à avença. No entanto, situações há em que os efeitos do contrato alcançarão terceiros, tornando-os interessados na relação contratual. Tais efeitos podem lhes ser benéficos ou prejudiciais. Quando maléficos (contrato em prejuízo de terceiros), pode o terceiro interessado opor-se, por legitimação ordinária ou extraordinária, para resguardar seus direitos. Ex: evicção. É possível, porém, que os efeitos sejam em benefício do terceiro interessado, situação em que há estipulação em favor de terceiro. Art. 436. O que estipula em favor de terceiro pode exigir o cumprimento da obrigação. Parágrafo único. Ao terceiro, em favor de quem se estipulou a obrigação, também é permitido exigi-la, ficando, todavia, sujeito às condições e normas do contrato, se a ele anuir, e o estipulante não inovar nos termos do art. 438. Roberto Senise Lisboa: a estipulação em favor de terceiro é o negócio jurídico por meio do qual se ajusta uma vantagem pecuniária em prol da pessoa que não o celebra, mas se restringe a colher seus benefícios. (Manual de Direito civil: contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. Vol. 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 251.) A gratuidade da relação entre o estipulante e o terceiro interessado (beneficiário), bem como entre o beneficiário e o promitente é característica fundamental da estipulação em favor de terceiro, de modo que é inadmissível a exigência de contraprestação por parte do terceiro interessado para que possa este receber os benefícios pactuados. A gratuidade, no entanto, não obsta a aposição de encargo ao terceiro. Compensação: como os efeitos contratuais recairão sobre terceiros, não pode haver compensação entre o promitente e o estipulante. Todavia, há que ser considerada a possibilidade de compensação entre promitente e beneficiário. Legitimação: deve ser observado eventual impedimento de o benefício ser recebido pelo beneficiário diretamente do estipulante. Art. 437. Se ao terceiro, em favor de quem se fez o contrato, se deixar o direito de reclamar-lhe a execução, não poderá o estipulante exonerar o devedor. O terceiro interessado pode aceitar ou recusar o benefício que recebe. Uma vez aceitando, deve se submeter às regras contratuais. Ao direito de exigir o cumprimento da obrigação estipulada, concorrem, regra geral, o estipulante e o beneficiário. Entretanto, pode o estipulante determinar que tal direito seja exclusivo do beneficiário – nessa circunstância, o estipulante não pode mais praticar qualquer ato que importe em perda ou diminuição do direito subjetivo do terceiro interessado em receber o benefício ajustado. Há, pois, dois momentos na estipulação em favor de terceiro: a) Antes da aceitação do beneficiário. Nesta fase, o estipulante pode revogar a qualquer tempo o benefício. b) Depois da aceitação do beneficiário. Nesta fase, a estipulação torna-se irretratável, excetuando somente a situação descrita no art. 438. Art. 438. O estipulante pode reservar-se o direito de substituir o terceiro designado no contrato, indepedentemente da sua anuência e da do outro contratante. Parágrafo único. A substituição pode ser feita por ato entre vivos ou por disposição de última vontade. A possibilidade de substituição revela o caráter dispositivo da irretratabilidade da estipulação. Todavia, a substituição deve ser expressa. 2.4. Promessa de fato de terceiro Art. 439. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este o não executar. Parágrafo único. Tal responsabilidade não existirá se o terceiro for o cônjuge do promitente, dependendo da sua anuência o ato a ser praticado, e desde que, pelo regime do casamento, a indenização, de algum modo, venha a recair sobre os seus bens. Art. 440. Nenhuma obrigação haverá para quem se comprometer por outrem, se este, depois de se ter obrigado, faltar à prestação. A promessa de fato de terceiro é fonte de uma obrigação de fazer, qual seja, fazer com que uma pessoa integre relação jurídica com outra. Em outras palavras, o devedor tem a obrigação de convencer que terceiro celebre negócio jurídico (facere) com o credor. O adimplemento dessa obrigação, portanto, ocorre com a formação da relação jurídica entre o terceiro e o credor (da relação originária), motivo pelo qual o devedor (aquele que prometeu fato de terceiro) não se compromete com o cumprimento do negócio celebrado com o terceiro. A FORMAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS (continuação) 2.5 Dos vícios redibitórios 2.6 Da evicção Procedimentos de ensino 2.5. Dos vícios redibitórios São defeitos ocultos que tornam a coisa imprópria para o uso a que é destinada ou que, se fossem conhecidos, impediriam a realização do contrato. Os vícios redibitórios autorizam o comprador a rejeitar a coisa recebida e redibir o contrato (ação redibitória) ou a pedir o abatimento do preço pago (ação estimatória ou quanti minoris), nos termos do art. 442 do CC/2002. As ações destinadas a combater os vícios redibitórios são também chamadas de ações edilícias (redibitória ou estimatória). Os defeitos aparentes ou de fácil constatação não autorizam o comprador a rejeitar a coisa recebida e redibir o contrato, ou pedir o abatimento do preço pago. Exige-se do comprador a diligência do homem médio, um mínimo de cuidado ao comprar a coisa. A proteção contra os vícios redibitórios aplica-se a todos os contratos comutativos ou onerosos, bem como às doações gravadas com encargos, pois estas se assemelham àqueles (CC, 441). O prazo para a propositura da ação é curto. O adquirente deve propor a ação em trinta dias, em caso de bem móvel, ou em um ano, no caso de imóvel, a contar da data da entrega efetiva (CC, 445). Nos termos do § 1º do referido artigo, quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se tratando de bens móveis; e de um ano, para os imóveis. Importante esclarecer que o prazo para manejo das ações edilícias é decadencial. A responsabilidade por vícios redibitórios independe de culpa ou má-fé do vendedor, de modo que o desconhecimento de tais vícios não o isenta de responsabilidade. Nesse caso, o alienante deve restituir o preço recebido e as despesas efetuadas pelo comprador na celebração do contrato (CC, 443). Contudo, caso o vendedor conhecesse os defeitos ocultos, a sua responsabilidade aumenta, podendo vir a ser condenado a restituir o preço recebido e a indenizar eventuais perdas e danos experimentados pelo comprador (CC, 443). Na sistemática do Código Civil revogado, era permitido ao vendedor incluir uma cláusula excluindo sua responsabilidade por vícios redibitórios (art. 1.101 do CC/1916), o que não foi repetido pelo novo Código. Assim, segundo parte da doutrina, a partir da vigência do Código Civil de 2002 deve ser considerada nula a cláusula que isente a responsabilidade por vício redibitório. Nas relações de consumo, as regras do vício redibitório são distintas. Vide o art. 18 da Lei nº. 8.078/90. 2.6. Evicção A evicção é a perda total ou parcial de um bem em razão de sentença que o atribui a outrem por direito anterior ao contrato. A garantia contra a evicção é obrigação do alienante que deriva automaticamente do contrato. Assim, nos contratos onerosos pelos quais se transfere o domínio, posse ou uso, o alienante deve garantir o adquirente dos riscos da evicção e indenizá-lo na eventualidade de vir a perder o bem por força de sentença que reconheceu direito de outrem. Na redação do art. 447 do novo Código Civil, menos restritiva do que aquela do Código revogado, pode-se considerar evicção, também, a perda do domínio do bem pelo implemento de condição resolutiva, pela apreensão policial de coisa furtada ou roubada em momento anterior à aquisição ou pela privação da coisa por ato inequívoco de qualquer autoridade. A única excludente prevista pelo CC/2002 para a responsabilidade pela evicção é a ciência por parte do comprador de que a coisa adquirida é alheia ou litigiosa. Requisitos da evicção a) a onerosidade da aquisição do bem, o que afasta a figura nos contratos gratuitos; b) a perda, total ou parcial, da propriedade ou da posse da coisa alienada pelo adquirente; c) sentença judicial com trânsito em julgado, reconhecendo a evicção, salvo as exceções mencionadas no parágrafo anterior (p.ex., apreensão policial). Sujeitos - alienante: sujeito que transfere a coisa; - evicto ou evencido: adquirente da coisa; - evictor ou evencente: sujeito que alega direito anterior ao do alienante. Uma vez caracterizada a evicção, o adquirente tem direito de pedir a restituição integral do preço, a indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir, as despesas do contrato e a indenização dos prejuízos que resultem diretamente da evicção (CC, 450), incluindo as custas processuais e os honorários advocatícios. A garantia da evicção pode ser renunciada pelo adquirente. Contudo, a eficácia da cláusula que exclui a evicção varia, conforme o adquirente tenha ou não real conhecimento do risco da evicção (CC, 449). Se o adquirente tinha conhecimento dos riscos da evicção e concordou com a cláusula exonerando a responsabilidade (cláusula de irresponsabilidade pela evicção ou cláusula non praestenda evictione), deve suportar os riscos (CC, 457). A evicção pode ser total ou parcial. Neste último caso, pode o evicto optar entre a extinção do contrato e conseqüente indenização conforme o art. 450, CC, ou a manutenção do pacto com reembolso do que foi perdido ao evictor, mais eventuais perdas e danos. Obs: dificuldade em precisar o conceito indeterminado ‘evicção parcial considerável’ contido no art. 455, CC. Necessidade de denunciação da lide O exercício dos direitos assegurados pela garantia contra a evicção depende de prévia comunicação do adquirente (evicto) ao alienante, que deve ser instrumentalizada através da figura da denunciação da lide (CC/2002, 456; CPC, art. 70, I). Nos termos do parágrafo único do art. 456 do CC/2002, não atendendo o alienante à denunciação da lide, e sendo manifesta a procedência da evicção, pode o adquirente deixar de oferecer contestação, ou usar de recursos. Entretanto, a jurisprudência tem suavizado o aparente rigor do art. 456, CC, entendendo que a denunciação da lide não é obrigatória, sendo somente necessária para que a restituição ao evicto pelo alienante seja feita no mesmo processo. Assim, ainda que o evicto não faça a denunciação da lide, ainda poderá ser indenizado através de ação própria. Sobre o tema, o STJ já se posicionou: Direito civil e processual civil. Recurso especial. Compra e venda de imóvel rural. Evicção. Ação de indenização por perdas e danos. Denunciação da lide. Ausência de obrigatoriedade. Natureza da venda. Reexame de fatos e provas. Interpretação de cláusulas contratuais. Embargos de declaração. Ausência de omissão, contradição ou obscuridade. Juros moratórios. Sucumbência recíproca. - Para que possa exercitar o direito de ser indenizado, em ação própria, pelos efeitos decorrentes da evicção, não há obrigatoriedade de o evicto promover a denunciação da lide em relação ao antigo alienante do imóvel na ação em que terceiro reivindica a coisa. Precedentes. - Adentrar na discussão sobre a natureza da venda, demandaria a incursão no campo de fatos e provas apresentados no processo, bem assim, a interpretação de cláusulas contratuais, expedientes vedados pelas Súmulas 5 e 7 do STJ. - Não se conhece do recurso especial quando o Tribunal de origem decidiu fundamentadamente as questões necessárias ao deslinde da controvérsia, sem omissões, contradições, tampouco obscuridades no julgado, embora em sentido diverso do pretendido pelos recorrentes. - Os juros moratórios são fixados a partir da citação, no patamar de 0,5% ao mês, até a data de 10/1/2003; a partir de 11/1/2003, o percentual dos juros moratórios incide à razão de 1% ao mês. - Verificada a sucumbência recíproca, devem ser compensados os honorários advocatícios. Primeiro recurso especial não conhecido. Segundo recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. Ônus sucumbenciais redistribuídos na lide secundária. (REsp 880698 / DF. Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI. TERCEIRA TURMA. DJ 23/04/2007 p. 268) PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. VEÍCULO IMPORTADO. EVICÇÃO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. AUSÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE. 1. Esta Corte tem entendimento assente no sentido de que "direito que o evicto tem de recobrar o preço, que pagou pela coisa evicta, independe, para ser exercitado, de ter ele denunciado a lide ao alienante, na ação em que terceiro reivindicara a coisa" (REsp 255639/SP, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Terceira Turma, DJ de 11/06/2001). 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no Ag 917314 / PR. Rel. FERNANDO GONÇALVES. QUARTA TURMA. DJe 22/02/2010) Outra situação interessante da jurisprudência é a admissão da denunciação da lide per saltum, a qualquer alienante da cadeia dominial. Aliás, a denunciação per saltum é também autorizada pelo enunciado 29 da I Jornada de Direito Civil: A interpretação do art. 456 do novo Código Civil permite ao evicto a denunciação da lide de qualquer dos responsáveis pelo vício. A FORMAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS (continuação) 2.7 Do contrato preliminar 2.8 Da extinção dos contratos Procedimentos de ensino 2.7. Do contrato preliminar Art. 462. O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado. Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive. Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente. Art. 464. Esgotado o prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação. Art. 465. Se o estipulante não der execução ao contrato preliminar, poderá a outra parte considerá-lo desfeito, e pedir perdas e danos. Art. 466. Se a promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a mesma sem efeito, deverá manifestar-se no prazo nela previsto, ou, inexistindo este, no que lhe for razoavelmente assinado pelo devedor. Contrato preliminar, também conhecido como pré-contrato, promessa de contratar, contrato preparatório ou compromisso, é a convenção de que se valem as partes, em uma fase inicial de entabulamento de negócio, para obrigarem, ou uma delas, à outorga futura de um contrato definitivo. É fonte de uma obrigação de fazer, qual seja, celebrar um contrato definitivo. Nos dizeres de Antônio Chaves, “objeto do contrato preliminar é a celebração de um futuro contrato que será solutório (resolutivo), uma vez que dá cumprimento às obrigações assumidas no contrato anterior, e ao mesmo tempo, constitutivo, pelas novas relações que dele resultarão em caráter definitivo”. Em certos casos, o contrato preliminar, preenchendo determinados requisitos legais, essenciais do contrato definitivo visado, chega a confundir-se com ele, conferindo direito real sobre o objeto da contratação, a possibilitar a concretização negocial futura, por via judicial (adjudicação compulsória), como na hipótese do compromisso de compra e venda de imóvel para pagamento parcelado celebrado na forma dos arts. 1.417 e 1.418, CC/18. O novo Código Civil cuidou das bases do contrato preliminar nos arts. 462 a 466, estabelecendo que, exceto à forma, deve ele apresentar-se com os mesmos requisitos essenciais do contrato definitivo, a ser celebrado (art. 462). Trata-se, portanto, de contrato não formal, mesmo sendo solene o contrato definitivo. 2.8. Extinção dos contratos 1. Modo normal de extinção do contrato. O contrato, assim como as obrigações, possui um ciclo vital. Nasce do acordo de vontades, produz os efeitos que lhe são peculiares e extingue-se. Como nos ensina Humberto Theodoro Júnior, “o vínculo contratual é, por natureza, passageiro e deve desaparecer, naturalmente, tão logo o devedor cumpra a prestação prometida ao credor”. A extinção do contrato se dá, via de regra, pela execução, seja instantânea (imediata ou diferida) ou continuada. O cumprimento da prestação libera o devedor e satisfaz o credor. Este é o meio normal de extinção do contrato. Sobre a prova do cumprimento (ou pagamento, como quer a lei civil), consulte o art. 320 do CC, que trata da quitação. 2. Modos anormais de extinção do contrato. Extinção do contrato sem cumprimento. 2.1. Causas anteriores ou contemporâneas à formação do contrato: As causas anteriores ou contemporâneas à formação do contrato são: a) defeitos decorrentes do não-preenchimento de seus requisitos subjetivos (capacidade das partes e livre consentimento), objetivos (objeto lícito, possível, determinado ou determinável) eformais (forma prescrita em lei), que afetam a sua validade, acarretando a nulidade absoluta ou relativa do contrato; b) o implemento da cláusula resolutiva, expressa ou tácita; e c) o exercício do direito de arrependimento convencionado. Vejamos cada uma. a) Nulidade absoluta e relativa. A nulidade absoluta resulta da ausência de elemento essencial do ato, com transgressão a preceito de ordem pública, impedindo que o contrato produza efeitos desde a sua formação (ex tunc). O Código Civil enumera hipóteses de nulidade em seus artigos 166 e 167. O pronunciamento da nulidade pode ser requerido em juízo a qualquer tempo, por qualquer interessado, podendo ser declarada de ofício pelo juiz ou sob provocação do Ministério Público (CC, 168). Nos termos do art. 170 do CC/2002, se o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade. Seria a hipótese de contrato de compra e venda de imóvel celebrado sem a observância da forma prevista em lei, gerando a nulidade do contrato (CC, 166, IV); no caso, poderá o juiz considerar o contrato de compra e venda nulo como uma promessa de compra e venda, em atenção ao princípio da conservação do negócio jurídico. É a denominada conversão do negócio jurídico. A nulidade absoluta é tratada com rigor pelo legislador civil. Assim, nos termos do art. 169 do CC/2002, o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo. A nulidade relativa ou anulabilidade resulta da imperfeição da vontade: ou porque emanada de um relativamente incapaz não assistido, ou porque contém algum dos vícios do consentimento (erro, dolo, coação etc.). Como pode ser sanada e até mesmo não argüida no prazo prescricional, não extinguirá o contrato enquanto não se mover a ação que a decrete, com efeitos ex nunc. A anulabilidade, diversamente da nulidade, não pode ser argüida por qualquer das partes da relação contratual, nem declarada de ofício pelo juiz. Legitimado a pleitear a anulação é somente o contraente em cujo interesse foi estabelecida a regra (CC, 177). É de se notar que, enquanto a nulidade absoluta visa tutelar interesse público, pois houve violação de normas de ordem pública, a anulabilidade resguarda precipuamente o interesse das partes. b) Cláusula resolutiva. Na execução do contrato, cada contraente pode pedir a resolução do acordo, se o outro não cumpre as obrigações avençadas. Essa faculdade pode resultar de estipulação ou de presunção legal. Quando as partes convencionam, diz-se que estipulam cláusula resolutiva expressa oupacto comissório expresso. Na ausência de estipulação, tal pacto é presumido pela lei, que subentende a existência da cláusula resolutiva. É a denominada cláusula resolutiva implícitaou tácita. Em todo contrato bilateral ou sinalagmático presume-se a existência de uma cláusula resolutiva tácita, autorizando o lesado pelo inadimplemento a pleitear a resolução do contrato, com perdas e danos. Assim: Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. Nestes termos, o contratante pontual tem, diante do inadimplente, duas alternativas: pleitear a resolução do contrato ou exigir-lhe o cumprimento mediante execução específica (CPC, art. 461). Em qualquer das hipóteses, terá direito a indenização por perdas e danos. Nos termos do art. 474 do CC/2002, a cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial. Em ambos os casos, tanto no de cláusula resolutiva expressa quanto tácita, a resolução deve ser judicial, ou seja, precisa ser pronunciada pelo juiz. A sentença que reconhecer a cláusula expressa e o direito à resolução terá efeito meramente declaratório, ex tunc, portanto. Sendo a cláusula tácita, a sentença tem efeito desconstitutivo, dependendo de interpelação judicial, ou seja, a cláusula só produz efeitos após a interpelação. c) Direito de arrependimento. Desde que expressamente previsto no contrato, o arrependimento autoriza qualquer das partes a rescindir o ajuste, mediante declaração unilateral da vontade, sujeitando-se à perda do sinal, ou à sua devolução em dobro, sem, no entanto, pagar indenização suplementar. Estamos diante das arras penitenciais, previstas no art. 420 do CC/2002. O direito de arrependimento deve ser exercido no prazo convencionado, ou antes da execução do contrato, se nada foi estipulado a respeito, pois o cumprimento do contrato implica em renúncia tácita do direito de arrepender-se. O Código de Defesa do Consumidor prevê hipótese especial de direito de arrependimento em seu art. 49, para os casos de contratação fora do estabelecimento comercial (por telefone, fax, internet). O prazo para o consumidor se arrepender é de 7 dias. 2.2. Causas supervenientes à formação do contrato. Verifica-se a dissolução do contrato em função de causas posteriores à sua criação nas seguintes hipóteses: a) resolução, como conseqüência do seu inadimplemento voluntário,involuntário ou por onerosidade excessiva; b) resilição, pela vontade de um ou de ambos os contratantes; c) morte de um dos contratantes, se o contrato for personalíssimo; e d) rescisão, modo específico de extinção de certos contratos. Vejamos. a) Resolução. Nem sempre os contratantes conseguem cumprir com aquilo que foi avençado, em razão de situações supervenientes, que impedem ou prejudicam a execução do contrato. A extinção do contrato mediante resolução tem como causa a inexecução ou incumprimento por um dos contratantes. Segundo Orlando Gomes, “resolução é um remédio concedido à parte para romper o vínculo contratual mediante ação judicial”. O inadimplemento pode ser voluntário (culposo) ou involuntário (sem culpa). a.1) Resolução por inexecução voluntária. Decorre de comportamento culposo de um dos contratantes, com prejuízo ao outro. Produz efeitos ex tunc, extinguindo o que foi executado e obrigando a restituições recíprocas, sujeitando ainda o inadimplente ao pagamento de perdas e danos e da cláusula penal. Entretanto, se o contrato for de trato sucessivo, como no caso de locação ou fornecimento de matéria prima, a resolução não produz efeito em relação ao pretérito, não se restituindo as prestações cumpridas. Há efeito ex nunc. A resolução do contrato por incumprimento é subordinada à condição de que a falta não seja irrelevante ou de importância reduzida, levando-se em conta o interesse da parte que sofre seus efeitos. Seria absurdo se cada parte fosse legitimada a desembaraçar-se do contrato, tomando por pretexto toda a mínima e insignificante inexatidão na execução da outra parte (Enzo Roppo). Por outro lado, se uma parte sempre manifestou tolerância por uma certa margem de atraso ou de pagamento de valor inexato, pouco inferior ao convencionado, isto pode ter relevância para excluir a possibilidade de resolução do contrato por falta de cumprimento integral. O juiz, ao avaliar tais circunstâncias caso a caso, deverá levar em conta os princípios da boa-fé e da função social do contrato, bem como as legítimas expectativas das partes em relação à complexidade econômica do negócio. Exceção do contrato não cumprido. Vem prevista no art. 476 do CC/2002, nestes termos: nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro. A sede natural da exceção em comento encontra-se nos contratos bilaterais ou sinalagmáticos, que envolvem prestações recíprocas, atreladas umas às outras. Se uma das prestações não é cumprida, deixa de existir causa para o cumprimento da outra. Repugna ao direito que o contratante inadimplente, nestas condições, pretenda compelir a outra parte a cumprir com a sua prestação. Caso o faça, sua pretensão será paralisada pelaexceptio non adimpleti contractus. Nenhuma das partes, sem cumprir o que lhe cabe, pode exigir da outra que o faça. Para o manejo da exceção do contrato não cumprido é fundamental que, além de recíprocas, as prestações sejam simultâneas, pois, caso contrário, sendo diferente o momento da exigibilidade de cada prestação, não podem as partes invocar tais defesas. Quando as prestações não são simultâneas, mas sim sucessivas, a exceção não pode ser oposta pela parte a quem caiba prestar primeiro. Se não foi estipulado o momento da execução, entendem-se simultâneas as prestações. Se um dos contraentes cumpriu apenas em parte, ou de forma defeituosa, a sua obrigação, quando se comprometera a cumpri-la integral e corretamente, cabível se torna a oposição, pelo outro, da exceção do contrato parcialmente cumprido, ou exceptio non rite adimpleti contractus. Diferencia-se da exceção non adimpleti contractus porque essa pressupõe completa e absoluta inexecução do contrato. Na prática, contudo, a primeira é abrangida pela segunda. a.2) Resolução por inexecução involuntária. A resolução pode também decorrer de fato não imputável às partes, como nas hipóteses de fato de terceiro ou de acontecimentos inevitáveis, alheios à vontade dos contraentes, denominados caso fortuito ou força maior, que tornam impossível o cumprimento da obrigação. A inexecução involuntária caracteriza-se pela impossibilidade superveniente de cumprimento do contrato. Há de ser objetiva, ou seja, não dizer respeito à própria pessoa do devedor, pois deixa de ser involuntária se de alguma forma este concorre para que a prestação se torne impossível. A impossibilidade deve ser, também, total, pois se a inexecução for parcial e de pequena proporção, o credor pode ter interesse em que, mesmo assim, o contrato seja cumprido. Por outro lado, há de ser definitiva, pois via de regra a inexecução temporária acarreta apenas a suspensão do contrato. O inadimplente não fica, no caso de inexecução involuntária, responsável pelo pagamento de perdas e danos, salvo se expressamente se obrigou a ressarcir os prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, ou se estiver em mora (CC, arts. 393 e 399): Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. Art. 399. O devedor em mora responde pela impossibilidade da prestação, embora essa impossibilidade resulte de caso fortuito ou de força maior, se estes ocorrerem durante o atraso; salvo se provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria ainda quando a obrigação fosse oportunamente desempenhada. A resolução opera de pleno direito. Cabe a intervenção judicial para proferir sentença declaratória e obrigar o contratante a restituir o que recebeu. O efeito da resolução por inexecução decorrente do fato fortuito e da força maior é retroativo, da mesma forma como ocorre na resolução por inexecução culposa, com a diferença que, na primeira hipótese, o devedor não responde por perdas e danos. Todavia, deve restituir o que eventualmente tenha recebido, uma vez resolvido o contrato. a.3) Resolução por onerosidade excessiva. Os contratos devem ser cumpridos nos termos em que foram pactuados. Contudo, os negócios jurídicos podem sofrer as conseqüências de modificações posteriores das circunstâncias que os justificaram, com quebra insuportável da equivalência das prestações. Tal constatação deu origem ao princípio da revisão dos contratos ou da onerosidade excessiva. A partir da Idade Média, desenvolveu-se a teoria rebus sic stantibus, que presume, nos contratos comutativos, de trato sucessivo e execução diferida, a existência implícita de umacláusula, pela qual a obrigatoriedade de seu cumprimento pressupõe a inalterabilidade da situação de fato. Se esta, no entanto, modificar-se em razão de acontecimentos extraordinários, como uma guerra, que tornem excessivamente oneroso para uma das partes o adimplemento de sua prestação, poderá esta requerer ao juiz que a isente da obrigação, total ou parcialmente. O Código Civil de 2002 reconheceu o direito à alteração do contrato em situações específicas, dedicando uma seção, composta de três artigos, à resolução dos contratos por onerosidade excessiva. Assim: Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação. Além de exigir que o acontecimento seja extraordinário, imprevisível e excessivamente oneroso para uma das partes, o dispositivo em apreço insere mais um requisito: o da extrema vantagem para a outra – o que limita ainda mais o âmbito de abrangência da cláusula. Critica-se a exigência de tal requisito, bem como o fato de não priorizar o dispositivo a conservação do contrato pela sua revisão, e sim determinar a sua resolução. Os requisitos para a resolução do contrato por onerosidade excessiva são os seguintes: a)vigência de um contrato comutativo de execução diferida ou de trato sucessivo; b)ocorrência de fato extraordinário e imprevisível; c) considerável alteração da situação de fato existente no momento da execução, em confronto com a que existia por ocasião da celebração do contrato; d) nexo de causalidade entre o evento superveniente e a conseqüente onerosidade excessiva. O contratante que estiver em mora quando da ocorrência dos fatos não pode invocar, em defesa, a onerosidade excessiva, pois, estando naquela situação, responde pelos riscos supervenientes, ainda que decorrentes de caso fortuito ou força maior (CC, 399). Segundo o art. 479 do CC/2002, a resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato. Permite-se, portanto, dar solução diversa ao problema da onerosidade excessiva, por iniciativa de uma das partes, evitando assim a resolução do contrato. Por último, prescreve o art. 480 do Código Civil: se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva. b) Resilição. A resilição não deriva de inadimplemento contratual, mas unicamente da manifestação de vontade, que pode ser bilateral ou unilateral. Resilir, do latim resilire, significa “voltar atrás”. A resilição bilateral é denominada distrato, que é o acordo de vontades que tem por fim extinguir um acordo de vontades anteriormente celebrado. A unilateral pode ocorrer somente em determinados contratos, pois a regra é a impossibilidade de um contraente romper o vínculo contratual por sua exclusiva vontade. b.1) Distrato. Nos termos do art. 472 do CC/2002, o distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato. Qualquer contrato pode cessar pelo distrato. É necessário, todavia, que os efeitos não estejam exauridos, uma vez que o cumprimento é a via normal de extinção. Contrato extinto não precisa ser dissolvido. O distrato é, segundo Messineo, em substância, um caso de retratação bilateral do contrato, que se perfaz mediante um novo contrato (solutório e liberatório), de conteúdo igual e contrário ao do contrato originário e celebrado entre as mesmas partes do contrato que se irá dissolver. A sua eficácia é ex nunc, operando sem necessidade de pronunciamento judicial. A exigência de observância da mesma forma do contrato, no distrato, deve ser interpretada com temperamento: o distrato deve obedecer à mesma forma do contrato a ser desfeito quando este tiver forma especial, mas não quando esta for livre. b.2) Resilição unilateral: denúncia, revogação, renúncia e resgate. A resilição unilateral pode ocorrer somente nas obrigações duradouras, contra a sua renovação ou continuação, independentemente do não-cumprimento da outra parte, nos casos permitidos na lei (p.ex., a denúncia prevista nos arts. 6º, 46, §2º. E 57 da Lei 8.245/91 – Lei do Inquilinato), ou no contrato, quando as partes tenham expressamente pactuado a possibilidade de resilição unilateral. A obrigação duradoura é aquela que não se esgota em uma só prestação, mas supõe um período de tempo mais ou menos largo, tendo por conteúdo ou uma conduta duradoura (locação, arrendamento etc.) ou a realização de prestações periódicas (fornecimento de gás, de alimentação, de energia etc.). Nesses casos, a resilição unilateral é denominadadenúncia. A resilição é o meio próprio para dissolver os contratos por prazo indeterminado. Se não fosse assegurado à parte o poder de resilir, seria impossível libertar-se do vínculo se o outro contratante não concordasse. Cumpre mencionar ainda o contrato de mandato, no qual a resilição unilateral denomina-serevogação ou renúncia, conforme a iniciativa seja, respectivamente, do mandante ou do mandatário. A resolução unilateral independe de pronunciamento judicial e produz efeitos ex nunc, não retroagindo. Para valer, precisa ser notificada à outra parte, produzindo efeitos a partir do momento em que chega ao seu conhecimento. Em princípio não precisa ser justificada, mas em certos contratos exige-se que obedeça à justa causa. Na hipótese, a ausência de justa causa não impede a resilição, mas obriga a parte a indenizar perdas e danos. No ponto, deve-se ter em mente o art. 473 do CC/2002: Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte. Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos. c) Morte de um dos contratantes. A morte de um dos contratantes só acarreta a dissolução dos contratos personalíssimos, que não poderão ser executados pela morte daquele em consideração do qual foi ajustado. Subsistem as prestações cumpridas, pois seu efeito é ex nunc. d) Rescisão. Existe o hábito no meio negocial de utilizar a expressão rescisão englobando as figuras da resolução e da resilição. Contudo, tecnicamente falando, a rescisão ocorre nas hipóteses de dissolução de determinados contratos, como aqueles em que ocorreu lesão ou que foram celebrados em estado de perigo. A lesão está prevista no art. 157 do CC: Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta. § 1º Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico. § 2º Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito. O estado de perigo, por sua vez, vem disciplinado no art. 156 do CC: Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa. Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias. CONTRATOS NOMINADOS 3.1 Compra e venda 3.1.1 Conceito, características, natureza jurídica e elementos 3.1.2 Modalidades especiais de venda Procedimentos de ensino 3.1 Compra e venda 3.1.1 Conceito, características, natureza jurídica e elementos 1. Disposições gerais sobre a compra e venda Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe o preço. Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço. Conceito Roberto Senise Lisboa: é o contrato por meio do qual o adquirente (comprador) paga determinado preço em dinheiro com o fim de obter para si a transferência definitiva do bem do alienante (vendedor). Classificação O contrato de compra e venda é: a) oneroso; b) bilateral (sinalagmático) (art. 491, CC/2002). c) típico; d) não solene (exceção à compra e venda de imóvel que exceda a trinta salários mínimos, conforme o art. 108, CC/2002); e) consensual (art. 482, CC/2002) f) comutativo e aleatório. Efeito da compra e venda Meramente obrigacional: há um compromisso de transferência de propriedade. O ato de transferência, em si, faz parte da execução do contrato, e não de sua formação. A transferência pode ocorrer através da tradição, quando se tratar de bens móveis, ou do registro do título translativo do domínio no Cartório de Registro de Imóveis, quando se tratar de bens imóveis. Elementos da compra e venda A) Coisa A coisa é o objeto mediato da obrigação do vendedor para com o comprador, eis que aquele deve transferir a este a propriedade. Em obediência ao art. 104, II, CC/2002, o objeto de todo e qualquer negócio jurídico deve ser idôneo, ou seja, lícito, possível e determinável. O objeto da compra e venda deve ser bem: - Corpóreo. Os bens incorpóreos poderão ser objeto de alienação, porém na modalidade de cessão, negócio ao qual se aplicam as regras referentes à compra e venda; - Próprio. Inexiste no direito brasileiro a venda a non domino. - De coisa atual ou futura. Sendo de coisa atual, o contrato será comutativo, ao passo que se a coisa for futura (art. 483), o negócio será aleatório, podendo traduzir-se na venda de uma esperança (emptio spei) ou na venda de coisa esperada (emptio rei speratate). Não caracteriza coisa futura a herança de pessoa viva, cuja negociação (chamada de pacta corvina) é proibida pela legislação brasileira, a teor do art. 426, CC/2002. B) Preço O preço é a contraprestação do comprador, caracterizando, assim, o sinalagma do contrato de compra e venda. O preço deve ser: - em dinheiro ou expressão fiduciária correspondente. A estipulação de bem diverso do dinheiro desnatura a compra e venda e caracteriza uma troca. O pagamento de coisa diversa do dinheiro é dação em pagamento. Corresponde a pagamento em dinheiro o pagamento feito em cheque ou nota promissória. - em moeda corrente. - sério e certo. O pagamento deve guardar equivalência com o valor da coisa, dado a natureza sinalagmática do contrato de compra e venda. Se o preço for desproporcional ao valor da coisa, pode o contrato ter se desnaturado em doação ou estar viciado de lesão. O preço pode ser fixado: - livremente pelas partes; - por terceiro designado pelos contratantes (art. 485); - por tabelamento ou tarifamento; - conforme a taxa de mercado ou da bolsa em certo dia e lugar. C) Consentimento É o acordo de vontades entre comprador e vendedor com relação à coisa e o preço. Em conformidade com o art. 482, CC/02, o contrato de compra e venda é concluído com o simples consentimento (contrato consensual). Legitimação das partes Apesar de capazes, não têm legitimidade para celebrar contrato de compra e venda: - Nulidade absoluta (art. 497,CC/2002): a) tutores e curadores (compradores), com relação aos bens dos seus tutelados e curatelados (vendedores); b) testamenteiros e administradores, com relação aos bens sob sua administração; c) servidores públicos, com relação aos bens ou direitos da pessoa jurídica a que estejam vinculados; d) juiz e auxiliares da justiça, com relação aos bens que estejam sob sua autoridade. Exceção: quando se tratar de cessão ou venda entre co-herdeiros, para pagamento de dívidas ou para a garantia de bens que já pertençam a essas pessoas. e) leiloeiros e seus prepostos, com relação aos bens que a eles caiba vendem. A compra e venda entre cônjuges é possível, sempre que tiver como objeto bens excluídos da comunhão (art. 499, CC/02). A compra e venda de bem pertencente à comunhão é nula por impossibilidade jurídica do objeto, consoante o art. 104, II, CC/2002. - Nulidade relativa (art. 496, CC/02): Compra e venda entre ascendentes (vendedor) e descendentes (comprador) sem a devida autorização EXPRESSA dos demais herdeiros (incluindo, portanto, o cônjuge do alienante, a menos que se trate de regime de separação legal de bens). O prazo decadencial para anular a venda é de 2 (dois) anos, contados a partir da data da conclusão do contrato. O Código não menciona a necessidade de autorização para a compra e venda entre descendentes (vendedor) e ascendentes (comprador). Inteligência do dispositivo: evitar a fraude à lei com relação à proteção à legítima dos herdeiros necessários. Obrigações do comprador - pagamento prévio do preço, de modo que, salvo estipulação contratual em contrário, o vendedor não é obrigado a entregar a coisa antes de receber o pagamento (exceção de contrato não cumprido); - arcar com as conseqüências de seu eventual inadimplemento (purgação da mora); - arcar, salvo estipulação contratual em contrário, com as despesas da transcrição do título no Cartório de Registro de Imóveis; - responder pelos riscos do transporte do bem feito por ordem do comprador, salvo se o alienante se abster de instruir o transportador. Obrigações do alienante - transferir a propriedade do bem. Salvo estipulação em contrário, quando a compra e venda for à vista, a entrega se dará após o pagamento, enquanto que na compra e venda a prazo, a entrega será feita no momento da celebração do contrato. - arcar com as despesas de conservação e transporte até a tradição. Salvo estipulação em contrário, a tradição se dará no local em que a coisa se encontra. - responder por eventuais vícios redibitórios; - arcar com as despesas da tradição em casos de bens móveis. Responsabilidade pelos riscos Obrigação de dar. 3.1.2. Modalidades especiais de venda A) Venda ad corpus e ad mensuram (art. 500, CC/02): - venda ad corpus: o bem imóvel é vendido como coisa certa e individuada, independente de suas medidas, que, nesta hipótese, têm caráter meramente enunciativo e é irrelevante para a formação da vontade contratual. Toda vez que a diferença entre as medidas for inferior a 5% (cinco por cento) da área total constante do instrumento contratual, há presunção juris tantum de que a venda foi ad corpus. - venda ad mensuram: as medidas do bem imóvel são determinantes para a formação da vontade contratual, de sorte que uma eventual discrepância entre o discriminado no contrato e as medidas reais do bem pode ensejar extinção contratual. Assim, se a venda for ad mensuram e o imóvel for inferior àquilo que foi acertado, tem o comprador as seguintes opções: a) exigir, quando possível, o complemento da área; b) solicitar, através de ação estimatória (quanti minoris) o abatimento proporcional do preço; c) solicitar, através de ação redibitória, resolução do contrato. O prazo decadencial para a propositura dessas ações é de 1 (um) ano a contar do registro do título ou da imissão de posse do comprador caso haja demora de transmissão possessória por culpa do alienante. Obs: na hipótese de diferença a maior (excesso de área), a princípio não afeta a relação contratual. Todavia, se o vendedor justificar satisfatoriamente que desconhecia a diferença de áreas caberá ao comprador escolher se devolve o excesso ou complementa o valor pago. B) Venda à vista de amostras e princípio da vinculação da proposta: inteligência do art. 484, CC/02. C) Venda conjunta: o vício redibitório de uma delas não implica em redibição das demais (art. 503, CC/02). D) Venda em condomínio: direito de preferência aos demais condôminos (art. 504, CC/02). CONTRATOS NOMINADOS 1.1.3 Cláusulas especiais à compra e venda 1.2 Promessa de compra e venda 1.3 Troca ou Permuta 1.3.1 Conceito e caracteres jurídicos 1.3.2 Objeto 1.3.3 Disposições comuns à compra e venda e disposições peculiares Procedimentos de ensino 3.1 Compra e venda (continuação) 1.1.3 Cláusulas especiais à compra e venda As cláusulas especiais de compra e venda consistem em elementos acidentais do negócio jurídico (cláusulas adjetas da compra e venda), provocando, assim, alterações eficaciais no contrato. Em outros palavras, em decorrência da aposição ou não das cláusulas adjetas, pode a transferência da propriedade ser resolúvel ou definitiva. São modalidades especiais de compra e venda: A) Preferência (preempção ou prelação) – arts. 513 a 520, CC. Decorre de cláusula contratual que impõe a preferência do alienante em readquirir o bem transferido, caso o comprador futuramente o venda. Preempção legal: retrocessão dos bens desapropriados. Preempção voluntária: o comprador, atual proprietário da coisa, deve oferecer prazo decadencial (3 dias para bens móveis e 60 dias para bens imóveis) ao proprietário anterior se manifeste no sentido de readquirir a coisa. A cláusula de prelação só pode durar por 180 dias ou 2 anos quando se tratar, respectivamente, de bens móveis ou imóveis, contados da data da celebração do contrato. O direito de preferência é personalíssimo. Prelação em condomínio: deve ser exercida sobre o bem por inteiro, e não somente sobre a quota-parte do condômino que queira exercer a preferência. Responsabilidade: caso o atual proprietário não respeite a prelação, pode o antigo proprietário pedir reparação das perdas e danos. A responsabilidade será solidária se o novo adquirente agiu em conjunto com o alienante. B) Retrovenda (arts. 505 a 508, CC) É a cláusula que possibilita ao alienante readquirir a coisa pelo preço que pagou, mais as despesas que o comprador teve com o bem, dentro do prazo estipulado para o resgate (direito de retratação). O prazo de resgate é decadencial e não pode ser superior a 3 anos. Ao contrário da prelação, a retrovenda não é personalíssima, podendo ser transferida aos herdeiros e legatários do sujeito, bem como ser passível de cessão. Assim é que a compra e venda com cláusula de retrovenda enseja transferência de uma propriedade resolúvel, eis que está sujeita a condição resolutiva, qual seja, o exercício do resgate por parte do alienante. Retrovenda conjunta: pode ser exercida por apenas um dos alienantes, devendo o atual proprietário intimar os demais. O depósito do preço deve ser sempre integral, ainda que apenas um dos alienantes exerça a retrovenda. C) Venda a contento e venda sujeita à prova (arts. 509 a 512, CC) Na venda a contento, a transmissão inicialmente feita é da posse, e não da propriedade – a transferência da propriedade só se dará no momento em que o adquirente manifestar-se em sentido favorável dentro do prazo ajustado. Assim, a venda a contento pode estar sujeita tanto a condição suspensiva quanto à condição resolutiva. Aspectos subjetivos. Venda sujeita à prova: condição resolutiva para garantir que a coisa tem as qualidades e guarda idoneidade com a finalidade. Aspectos objetivos. D) Venda com reserva de domínio (arts. 521 a 528, CC) A transferência incide inicialmente sobre a posse, só havendo transferência da propriedade quando houver o pagamento integral do contrato. Propriedade resolúvel do alienante sobre o bem.Deve ser feita sempre sob a forma escrita e deve ser registrada no domicílio do comprador. A venda com reserva de domínio não precisa ser feita sobre bens infungíveis, mas sim sobre bens individualizáveis. E) Venda sobre documentos (arts. 529 a 532, CC) 1.2. Promessa de compra e venda Aplicação das normas contidas nos arts. 462 a 466, CC, ao contrato de compra e venda. Legislação especial: Decreto 58/37 e Lei 6.766/79. 1.3 Troca ou Permuta 1.3.1 Conceito e caracteres jurídicos Flávio Tartuce: É aquele pelo qual as partes se obrigam a dar uma coisa por outra que não seja dinheiro. Operam-se, ao mesmo tempo, duas vendas, servindo as coisas trocadas para uma compensação recíproca. (Direito civil. Vol. III. 5.ed. São Paulo: Método, 2010. p. 308). São características do contrato de troca: a) típico b) não solene ou solene (na hipótese do art. 108, CC); c) consensual; d) comutativo; e) bilateral; f) oneroso. 1.3.2 Objeto A troca recairá sobre dois bens, devendo os sujeitos envolvidos ter capacidade para dispor. 1.3.3 Disposições comuns à compra e venda e disposições peculiares Art. 533. Aplicam-se à troca as disposições referentes à compra e venda, com as seguintes modificações: I - salvo disposição em contrário, cada um dos contratantes pagará por metade as despesas com o instrumento da troca; II - é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante. CONTRATOS NOMINADOS 1.4 Doação 1.4.1 Conceito, elementos característicos e natureza jurídica 1.4.2 Pressupostos e requisitos 1.4.3 Espécies e conteúdo 1.4.4 Invalidade e revogação Procedimentos de ensino 1.4 Doação 1.4.1 Conceito, elementos característicos e natureza jurídica Conceito Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra. Natureza contratual da doação O art. 538 do Código Civil de 2002 suprimiu a parte final do art. 1.165 do Código Civil de 1916, que ressaltava a necessidade de aceitação no próprio conceito do contrato de doação. Em razão de tal supressão, parte da doutrina entende que o aperfeiçoamento da doação se daria independente da aceitação do donatário, como Flávio Tartuce, para quem a aceitação está no plano de eficácia deste negócio jurídico [a doação] e não no plano da validade. Entretanto, o posicionamento majoritário é o de que a doação, como contrato consensual que é, se forma a partir do consentimento de ambos os sujeitos, sendo, por isso, necessária a aceitação do donatário. O contrato de doação não se aperfeiçoará enquanto o beneficiário não manifestar sua intenção de aceitar a doação (RT 186:338). Espécies de aceitação: - expressa - tácita - presumida (art. 539, CC/02) - ficta (art. 543, CC/02 – doação a absolutamente incapazes) Por ter natureza contratual, é imprescindível a capacidade das partes, com exceção da hipótese de aceitação ficta do art. 543, CC/02 (doação feita a absolutamente incapaz), da doação feita a nascituro (art. 542, CC/02) e a da doação a entidade futura (art. 544, CC/02). Classificação a) consensual; b) unilateral; c) gratuito; d) formal; e) típico. Quanto à formalidade do contrato de doação, o art. 541, CC/02, estabelece a forma escrita, seja por instrumento público ou por instrumento particular. O instrumento público é exigido às doações de imóveis com valor superior a 30 (trinta) salários mínimos (art. 108, CC/02). O parágrafo único do art. 541, CC/02 dispensa forma escrita a doação de bens móveis de pequeno valor, seguido da imediata entrega do bem objeto da doação. É a chamada doação manual, que pode ser feita de forma verbal. É necessária razoabilidade para averiguar o pequeno valor do bem, levando em consideração, sobretudo, a capacidade econômica do doador. A doação manual é um contrato real. Por ser um contrato unilateral e gratuito, a doação não está sujeita às garantias contratuais contra os riscos da evicção e dos vícios redibitórios, salvo nas doações remuneratórias, nas doações modais e nas doações proprter nuptias (evicção). - Doador Sujeitos - Donatário Elementos A) Animus donandi (elemento subjetivo); B) Transferência de bens e/ou vantagens do doador ao donatário; C) Aceitação do donatário. 1.4.2 Pressupostos e requisitos Sendo contrato, a doação segue os mesmos requisitos de validade dos negócios jurídicos. É importante atentar para a aceitação fica dos absolutamente incapazes (art. 539, CC) e para as legitimidades específicas que seguem abaixo: Doação feita de ascendente a descendente Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança. Adiantamento de legítima. Não é necessário o consentimento dos demais herdeiros para a doação. Doação entre cônjuges É nula, se feita com relação aos bens da comunhão. Com relação aos bens excluídos da comunhão, aplica-se o disposto no art. 544, CC/02. Doação feita por pessoa adúltera ao seu cúmplice Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal. Hipótese de nulidade relativa. Doação inoficiosa Art. 549. Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento. Princípio da intangibilidade da legítima. A nulidade atinge apenas a parte inoficiosa. Doação da totalidade dos bens Art. 548. É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador. A chamada doação universal (doação de todos os bens do doador sem reserva de patrimônio mínimo para sua subsistência) é nula. A invalidade desse ato apresenta duplo escopo: evitar a miséria do doador e garantir a satisfação dos credores do doador, evitando, assim, possível fraude contra credores. Possibilidade de reserva de usufruto, renda ou alimentos. Obs: Promessa de doação – polêmica. Além da legitimidade, outros requisitos de validade também devem ser observados: Objeto A doação pode ter por objeto coisas corpóreas ou incorpóreas, móveis ou imóveis, assim como universalidades de coisas. Pode ainda ser doado um direito real ou pessoal patrimonial. A questão da doação de direitos futuros é vedada na maior parte dos sistemas legislativos. O Código Civil brasileiro silencia a respeito da matéria. A doação pode ainda consistir em subvenção ou prestações periódicas (CC, 545). Não se trata de uma sucessão de doações, mas sim de doação com execução prolongada. Consentimento. Além da manifestação do animus donandi do doador, que deve ser clara e inequívoca (se houver dúvida, interpreta-se não ter havido doação), a formação do contrato de doação pressupõe a aceitação da oferta pelo donatário. Enquanto não consumada a doação pela aceitação, o doador pode arrepender-se ou revogá-la. A morte ou incapacidade do doador, antes que o donatário a aceite, resulta na extinção da obrigação. Por outro lado, a morte do donatário, antes da aceitação, não obriga o doador a cumprir a doação com os herdeiros, pois o animus donandi existia em relação ao falecido. Nos termos do art. 546 do CC/2002, a doação feita em contemplação de casamento futuro com certa e determinada pessoa, quer pelos nubentes entre si, quer por terceiro a um deles, a ambos, ou aos filhos que, de futuro, houverem um do outro, não pode ser impugnada por falta de aceitação, e só ficará sem efeito se o casamento não se realizar. Forma. O contrato de doação exige escritura pública ou instrumento particular (CC, 541). Contudo, nos termos do parágrafo único do referido artigo, a doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição. 1.4.3 Espécies e conteúdo Doação pura e simples Doação com encargo ou modal Doação remuneratória Doação propter nuptias Doação com cláusula de reversão Doação conjuntiva Doação sob forma de subvenção periódica 1.4.4. Invalidade e revogação a) Invalidade A doação pode ser nula ou anulável. a.1) Hipóteses de nulidade. Será nula por incapacidade absoluta do doador, por ilicitude ou impossibilidade absoluta do objeto e por desobediência à forma prescrita em lei. Além dessas hipóteses, comuns a todos os negócios jurídicos, é nula a doação de todos os bens sem reserva de usufrutos ou bens suficientes para a sobrevivência do doador (CC, 548). A proibição do referido artigo visa ainda tutelar os credores do doador, que com a doação de todos os seus bens teriam esvaziada a garantia patrimonial do devedor (CC, 158). A doação que excede a metade dos bens do patrimônio do doador no momento do contrato também é considerada nula, se o doador tiver herdeiros considerados necessários (CC, 549). a.2) Hipóteses de anulabilidade. É anulável a doação feita pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice (CC, 550). A ação anulatória é privativa do cônjuge, enquanto for vivo. Após a sua morte, seus herdeiros poderão propô-la. b) Revogação. A doação, como qualquer contrato, não pode ser revogada segundo a vontade do doador. Éirrevogável. Contudo, admite-se, excepcionalmente, a revogação da doação, se ocorrer alguma das hipóteses previstas no Código Civil como demonstrativos da ingratidão do donatário. A revogação só é possível na doação pura e simples. As doações puramente remuneratórias, as oneradas com encargo, as feitas em cumprimento de obrigação natural ou para determinado casamento não podem ser revogadas por ingratidão (CC, 564). O direito de revogar a doação pura e simples é personalíssimo, não se transmitindo aos herdeiros do doador, nem prejudica os herdeiros do donatário (CC, 560). Embora o direito seja personalíssimo, nada impede a sucessão processual. O direito de revogar a doação é irrenunciável. Seus motivos estão previstos no art. 557 do CC/2002, de modo exaustivo, não comportando interpretação ampliativa. Os efeitos da sentença proferida na ação revocatória não retroagem. Os direitos adquiridos por terceiros antes da resolução subsistem (CC, 563). Também não está o donatário obrigado a devolver os frutos colhidos antes da citação. O prazo para a propositura da ação revocatória é de um ano, a contar do conhecimento pelo doador do fato que a autorize (CC, 559). CONTRATOS NOMINADOS – VISÃO GERAL 2.1 Locação de Coisas 2.2 Fiança Procedimentos de ensino 1. Locação de Coisas Originariamente, a locação romana englobava três figuras: a) a locação de coisas (locatio res), referente ao uso e gozo de bens infungíveis; b) a locação de serviços (locatio operarum), que consistia na prestação de serviço economicamente apreciável, independentemente do resultado, atualmente denominada prestação de serviços; c) a locação de obra (locatio operis), representada pela execução de obra certa ou de determinado trabalho, visando um resultado específico, hoje denominada empreitada. Conceito: A locação de coisas é o negócio jurídico por meio do qual uma das partes (locador) se obriga a ceder a outra (locatário), por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa infungível, mediante certa remuneração (Gagliano/ Pamplona Filho). OBS.: Reserva-se a expressão “arrendamento”, na prática brasileira, especificamente para certas locações imobiliárias rurais. Partes: Locador e locatário; arrendador e arrendatário. Elementos essenciais: a) o tempo; b) a coisa; c) a retribuição. Analisemos cada um desses elementos: a) O tempo: O contrato de locação é essencialmente temporário. Mesmo que não haja referência expressa no negócio jurídico, deve-se presumir que o contrato é finito, não podendo ser considerado vitalício. Caso estipulado por prazo determinado, o contrato cessa de pleno direito com o seu termo (CC, 573). Nessa hipótese, se o locatário não restitui o bem, sua posse se torna injusta e de má-fé. Se a circunstância é relevada pelo locador, prorroga-se o contrato por prazo indeterminado (CC, 574). Se o contrato é celebrado por prazo indeterminado, é necessária a notificação do locatário para que devolva o bem imediatamente ou em prazo razoável, sob pena de se caracterizar em mora. Nos termos do art. 575, se, notificado o locatário, não restituir a coisa, pagará, enquanto a tiver em seu poder, o aluguel que o locador arbitrar, e responderá pelo dano que ela venha a sofrer, embora proveniente de caso fortuito. Parágrafo único. Se o aluguel arbitrado for manifestamente excessivo, poderá o juiz reduzi-lo, mas tendo sempre em conta o seu caráter de penalidade. É o chamado “aluguel-pena”, que sofre sérias críticas doutrinárias em decorrência da possibilidade unilateral da fixação do valor.. b) A coisa: O objeto do contrato de locação pode ser coisa móvel ou imóvel. De todo modo, é indispensável que se trate de bem infungível. A locação não pode versar sobre bens fungíveis ou consumíveis. A coisa locada pode ser incorpórea (aluguel de patente de invenção, marca etc.). Pode ser também inalienável(como os bens públicos). A coisa dada em locação não precisa, necessariamente, ser de propriedade do locador, pois haverá mera cessão de uso do bem. c) O preço: Locação é contrato essencialmente oneroso. Caso contrário, estar-se-á diante de comodato. A retribuição, denominada de preço, aluguel ou renda, é estabelecida diretamente pelas partes, podendo ser fixada mediante arbitramento administrativo ou judicial, ou ainda imposto por ato governamental, como no caso de taxis e prédios urbanos (Carlos Roberto Gonçalves). O valor, contudo, não pode ser fixado de forma meramente potestativa por uma das partes. O preço, como na compra e venda, deve ser sério e real. Caso estipulado em valor ínfimo ou irrisório será na realidade fictício. O preço pode variar de acordo com índices estabelecidos por lei ou contratados pelas partes (v.g., IGP-M). O pagamento pode ser efetuado periodicamente ou em uma só vez, por todo o período da locação. Características: a) Bilateral; b) Oneroso; c) Consensual ou não-solene; d) Não é personalíssimo (v. art. 577 do CC/2002); Modalidades (casos específicos): a) Locação imobiliária urbana, disciplinada pela Lei nº. 8.245/91, abrangendo a locação residencial urbana, a locação de temporada (time sharing) e a locação não residencial (incluindo a comercial). b) Locação de vagas autônomas de garagem ou espaços para estacionamento (contratos atípicos). c) Locação de espaços para publicidade (Código Civil). d) Locação de apart-hotéis, hotéis residência ou equiparados (sua natureza irá variar). e) Arrendamento mercantil (leasing). f) Arrendamento rural (Estatuto da Terra). Aquisição da coisa por terceiro e contrato de locação: Nos termos do art. 576 do Código Civil, se a coisa for alienada durante a locação, o adquirente não ficará obrigado a respeitar o contrato, se nele não for consignada a cláusula da sua vigência no caso de alienação, e não constar de registro. § 1o O registro a que se refere este artigo será o de Títulos e Documentos do domicílio do locador, quando a coisa for móvel; e será o Registro de Imóveis da respectiva circunscrição, quando imóvel. § 2o Em se tratando de imóvel, e ainda no caso em que o locador não esteja obrigado a respeitar o contrato, não poderá ele despedir o locatário, senão observado o prazo de noventa dias após a notificação. OBS: a regra do parágrafo segundo do art. 576 já estava prevista no art. 8º da Lei nº. 8,245/91 (Lei do Inquilinato). Gagliano e Pamplona Filho defendem uma interpretação ampliativa do art. 576, para incluir não apenas a compra e venda, mas todas as formas de alienação do bem, como a doação e a expropriação judicial, desde que as regras referentes ao registro tenham sido observadas. Os arts. 27 a 34 da Lei do Inquilinato conferem ao locatário direito de preferência sobre o bem. Deveres das partes: 1. Deveres do locador (CC, 566; Lei 8.245/91, art. 22): a) Entregar ao locatário a coisa alugada; b) Manter a coisa alugada no mesmo estado; c) Garantir o uso pacífico da coisa (CC, 568). 2. Deveres do locatário (CC, 569; Lei 8.245/91, art. 23): a) Servir-se da coisa locada para o fim contratado (V. art. 570 do CC); b) Tratar a coisa alugada como se sua fosse; c) Pagar pontualmente o aluguel; d) Levar ao conhecimento do locador as turbações de terceiros; e) Restituir a coisa, ao término da locação, no estado em que a recebeu. Indenização por benfeitorias e direito de retenção: CC, 578. Extinção da locação: a) O termo do contrato (CC, 573; LI, arts. 46 e 47). b) Extinção antecipada (CC, 571; LI, 4º). c) Resilição; d) Descumprimento do contrato (resolução). 2.2. Fiança 1. Generalidades Conceito Art. 818. Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra. Luiz Guilherme Loureiro: contrato pelo qual uma pessoa – o fiador – garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor (afiançado), caso este não a cumpra. Gustavo Tepedino et. al.: contrato pelo qual se estabelece um tipo de garantia pessoal, em que alguém (fiador) se obriga ao cumprimento da obrigação de terceiro (afiançado), se este faltar à sua prestação. Fontes: O Código Civil, nos arts. 818 a 839, define as regras da fiança convencional. No entanto, a fiança pode também ser estabelecida por lei (fiança legal) ou pelo juiz (fiança judicial). Sujeitos O contrato de fiança é estabelecido entre o credor (sujeito ativo) e o fiador (sujeito passivo). O devedor do contrato principal (afiançado) não participa do contrato de fiança, que pode ser celebrada sem o conhecimento deste, ou mesmo contra sua vontade (art. 820[1], CC/02). Classificação a) consensual; b) unilateral; Obs: há autores que classificam a fiança como um contrato bilateral imperfeito. c) gratuito; Existem fianças que são onerosas, como a fiança bancária. Por ser um negócio gratuito, a interpretação da fiança é sempre restritiva (art. 819[2], CC/02) e benéfica ao fiador. Súmula 214, STJ: O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu. Cláusula de exoneração do fiador somente com a entrega definitiva das chaves no contrato de locação urbana: entendimento consolidado do STJ, até 2007, era de nulidade. Há, no entanto, novo posicionamento, já majoritário e pacífico, determinando a validade de tal cláusula, desde que expressamente pactuada. A propósito, a Lei 12.112/2009, que alterou a Lei de Locações, confirmou a atual orientação jurisprudencial, ao prever, no art. 40, X, a possibilidade de: prorrogação da locação por prazo indeterminado uma vez notificado o locador pelo fiador de sua intenção de desoneração, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador. d) formal; e) típico; f) acessório; g) personalíssimo; Art. 836. A obrigação do fiador passa aos herdeiros; mas a responsabilidade da fiança se limita ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças da herança. Obs: subsidiariedade da fiança. O caráter subsidiário da fiança é determinado na parte final do art. 818. A subsidiariedade, no entanto, pode ser afastada através das hipóteses elencadas no art. 828, CC/02, que será objeto de comentário posterior. Requisitos a) Subjetivos Requisito genérico de validade do art. 104, I, CC/02: capacidade das partes. Requisitos específicos: - Outorga uxória: consoante o art. 1.647, III, CC/02, é necessária autorização do cônjuge para a celebração do contrato de fiança (a mera outorga não induz solidariedade entre cônjuges com relação às obrigações decorrentes da fiança). O Código Civil estabelece que a fiança prestada sem a outorga uxória é anulável, contrariando o entendimento consolidado do STJ no sentido de nulidade absoluta do ato. Súmula 332, STJ: A anulação de fiança prestada sem outorga uxória implica a ineficácia total da garantia. O STJ entende que a súmula não se aplica quando o regime for de separação total de bens. Assim é que o entendimento dessa Corte é de que, nesses casos, deve-se afastar a meação do cônjuge que não participou da celebração do contrato (STJ, 5ª T. REsp. 246.829). - O fiador deve ser pessoa idônea (idoneidade moral e econômica), domiciliada no Município onde tenha que ser prestada a fiança e proprietário de bens livres e desembaraçados que sirvam ao cumprimento da fiança (art. 825[3], CC/02). A recusa, pelo credor, do fiador oferecido deve ser sempre motivada conforme as razões descritas no art. 825, CC/02. Obs: se a idoneidade do fiador sofrer alteração após a celebração do contrato, o credor poderá exigir do devedor novo fiador (art. 826[4], CC/02). O não cumprimento da exigência acarretará em vencimento antecipado ou mesmo rescisão do vínculo contratual principal. b) Requisitos objetivos Requisito genérico, art. 104, II, CC/02: a fiança pode incidir sobre qualquer objeto, desde que este seja lícito, possível e, ao menos, determinável. Requisitos específicos: - Certeza, liquidez e exigibilidade da dívida. A fiança pode recair sobre obrigações futuras, pois as mesmas são determináveis. No entanto, a execução da fiança só será possível se a obrigação já for atual, líquida, certa e exigível (art. 821[5], CC/02), o que exclui a fiança de obrigações naturais. - Limitação do valor da fiança ao valor da obrigação afiançada. A autonomia privada incide sobre a extensão da fiança, que pode abranger a totalidade da obrigação afiançada, inclusive seus acessórios (e, nesse caso, sendo demandado o fiador, o regresso compreende ainda as despesas judiciais desde a citação[6]), ou pode ser limitada a parte da obrigação principal. Todavia, é ilícita a parte que exceder a obrigação principal, ainda que expressamente pactuado no contrato de fiança[7]. - Validade da obrigação principal. Em decorrência do princípio da gravitação jurídica, a nulidade da obrigação principal acarreta a nulidade da fiança. O art. 824, CC/02, porém, edifica controvertida exceção: é válida a fiança que garante obrigação celebrada por incapaz. A doutrina discute se essa incapacidade é apenas relativa ou abrange também as hipóteses de incapacidade absoluta. A parte final do art. 824, em consonância com o art. 588, ambos do CC/02, mantém a invalidade da fiança que garante mútuo feito a menor (exceção da exceção). c) Requisito formal Art. 104, III, c/c art. 819, primeira parte, ambos do CC/02: a fiança deve ser feita por escrito, seja através de instrumento público, seja através de instrumento particular. 2. Efeitos Benefício de ordem ou de excussão Art. 827. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito de exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor. Parágrafo único. O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembaraçados, quantos bastem para solver o débito. O benefício de ordem ou de excussão decorre da subsidiariedade da fiança, e significa que o fiador pode exigir que os bens do devedor sejam executados antes dos seus. Para exercer o benefício de ordem, o fiador precisa indicar tempestivamente (até a contestação da lide) bens do devedor existentes no Município em que está sendo executada a obrigação e que sejam suficientes para o pagamento da dívida. O art. 828, CC/02, exclui o benefício de ordem nas seguintes hipóteses: a) renúncia expressa pelo fiador; b) se o fiador se obrigou como pagador principal ou como devedor solidário; c) se o devedor for insolvente ou falido. Fiança conjunta Art. 829. A fiança conjuntamente prestada a um só débito por mais de uma pessoa importa o compromisso de solidariedade entre elas, se declaradamente não se reservarem o benefício da divisão. Parágrafo único. Estipulado esse benefício, cada fiador responde unicamente pela parte que, em proporção, lhe couber no pagamento. Benefício da divisão: ocorre quando há, na mesma obrigação, mais de um fiador, excetuando a regra geral de solidariedade entre co-fiadores. O benefício da divisão deve ser expressamente pactuado. O art. 830, CC/02, determina que os co-fiadores podem definir as proporções da dívida que ficarão obrigados a garantir, não respondendo por valor superior ao estipulado. Fiança conjunta x sub-fiança. A fiança conjunta não se confunde com a sub-fiança. O Código Civil de 2002, ao contrário do Código de 1916, não prevê a possibilidade de fiança da fiança (abonação). No entanto, não há óbice para que seja constituído um fiador do fiador (denominado abonador). Sub-rogação Art. 831. O fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado nos direitos do credor; mas só poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela respectiva quota. Parágrafo único. A parte do fiador insolvente distribuir-se-á pelos outros. Art. 832. O devedor responde também perante o fiador por todas as perdas e danos que este pagar, e pelos que sofrer em razão da fiança. Art. 833. O fiador tem direito aos juros do desembolso pela taxa estipulada na obrigação principal e, não havendo taxa convencionada, aos juros legais de mora. Substituição processual Art. 834. Quando o credor, sem justa causa, demorar a execução iniciada contra o devedor, poderá o fiador promover-lhe o andamento. 3. Extinção da fiança Exceções Art. 837. O fiador pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais, e as extintivas da obrigação que competem ao devedor principal, se não provierem simplesmente de incapacidade pessoal, salvo o caso de mútuo feito a pessoa menor. Exoneração voluntária Art. 835. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante 60 (sessenta) dias após a notificação do credor. Concessão de moratória ao devedor Impossibilidade de sub-rogação nos direitos do credor, por fato imputável ao credor Dação em pagamento Insolvência do devedor após a invocação do benefício de ordem Art. 839. Se for invocado o benefício da excussão e o devedor, retardando-se a execução, cair em insolvência, ficará exonerado o fiador que o invocou, se provar que os bens por ele indicados eram, ao tempo da penhora, suficientes para a solução da dívida afiançada. 4. Penhorabilidade do bem de família do fiador nas fianças de locação urbana [1] Art. 820. Pode-se estipular a fiança, ainda que sem consentimento do devedor ou contra a sua vontade. [2] Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva. [3] Art. 825. Quando alguém houver de oferecer fiador, o credor não pode ser obrigado a aceitá-lo se não for pessoa idônea, domiciliada no município onde tenha de prestar a fiança, e não possua bens suficientes para cumprir a obrigação. [4] Art. 826. Se o fiador se tornar insolvente ou incapaz, poderá o credor exigir que seja substituído. [5] Art. 821. As dívidas futures podem ser objeto de fiança; mas o fiador, neste caso, não será demandado senão depois que se fizer certa e líquida a obrigação do principal devedor. [6] Art. 822. Não sendo limitada, a fiança compreenderá todos os acessórios da dívida principal, inclusive as despesas judiciais, desde a citação do fiador. [7] Art. 823. A fiança pode ser de valor inferior ao da obrigação principal e contraída em condições menos onerosas, e, quando exceder o valor da dívida, ou for mais onerosa que ela, não valerá senão até o limite da obrigação afiançada. CONTRATOS NOMINADOS – VISÃO GERAL 2.3 Empréstimo: Comodato. Mútuo Procedimentos de ensino 1. Noções gerais Conceito Flávio Tartuce: negócio jurídico pelo qual uma pessoa entrega uma coisa a outra, de forma gratuita, obrigando-se esta a devolver a coisa emprestada ou outra de mesma espécie. Espécies Há duas espécies de empréstimo contempladas pelo direito contratual brasileiro: a) comodato: empréstimo de bens infungíveis e inconsumíveis. b) mútuo: empréstimo de bens fungíveis e consumíveis. Classificação O contrato de empréstimo é: a) gratuito (exceção: mútuo feneratício – art. 591, CC/2002); b) unilateral; c) típico (artigos 579 a 592, CC/2002); d) não solene; e) real (antes da tradição pode haver promessa de comodato ou promessa de mútuo – contrato preliminar); f) comutativo. 2. Comodato (empréstimo de uso) Conceito e características Art. 579. O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto. Maria Helena Diniz: contrato unilateral, a título gratuito, pelo qual alguém entrega a outrem coisa (imóvel ou móvel) infungível, para ser usada temporariamente e depois restituída. São características elementares do contrato de comodato: A) Gratuidade A gratuidade faz parte do próprio conceito legal de comodato, inexistindo, por isso, comodato oneroso. É possível a existência de comodato modal (com encargo). COMODATO MODAL OU COM ENCARGOS. NAO DESCARACTERIZA O COMODATO O PAGAMENTO DE ENCARGOS QUE RECAEM SOBRE O IMOVEL, COMO OS RELATIVOS A IMPOSTOS E PRESTACOES DEVIDAS A AGENTE FINANCEIRO, VISTO QUE ADMITIDO O COMODATO MODAL EM NOSSO DIREITO. RECURSO IMPROVIDO. (TJRS, Apelação Cível Nº 193194180, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Alçada do RS, Relator: Luiz Otávio Mazeron Coimbra, Julgado em 01/12/1993) B) Infungibilidade do bem Em caráter de exceção, o comodato pode recair sobre bens fungíveis e consumíveis. É o chamado comodato ad pompam vel ostentationem. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE DE BENS FUNGÍVEIS. CONCESSÃO DE LIMINAR. INSTRUMENTOS DE COMODATO. ALEGAÇÃO DE DETURPAÇÃO MATERIAL NOS MESMOS. QUESTÃO NÃO PROPOSTA EM PRIMEIRO GRAU. Se a parte hostiliza a decisão que lhe é desfavorável com a alegação que o fundamento jurídico da demanda reside em contratos deturpados, em decorrência de serem subscritos por pessoas desconhecidas, a questão deve ser suscitada no Primeiro Grau de Jurisdição, mesmo porque o artigo 394 do Código de Processo Civil impõe a suspensão da tramitação processual em decorrência da suscitação do incidente de falsidade. Agravo de Instrumento desprovido. (TJDF, AGI 2004.00.2.000912-5) C) Tradição do bem D) Temporariedade Obs: discussão a respeito da natureza personalíssima do contrato de comodato. - Comodante: aquele que empresta o bem. É o possuidor indireto. Sujeitos - Comodatário: aquele que recebe o bem emprestado. É o possuidor direto. Restrições O art. 580[1] do Código Civil determina que as pessoas que exercem função de administração de bens não poderão dar em comodato os bens que estão sob sua administração (como, por exemplo, curadores e tutores em relação aos bens de seus curatelados e tutelados), a não ser através de autorização judicial específica para esse fim. Conteúdo Þ De acordo com o art. 582, CC/2002[2], o contrato de comodato é fonte de obrigação cumulativa consistente em: A) Obrigação de fazer: guarda e conservação da coisa durante a vigência do contrato e restituição ao término do mesmo, sob pena de responsabilidade por perdas e danos e possibilidade de resolução contratual por inadimplemento. Ao comodatário cabem as despesas ordinárias relativas ao uso e gozo do bem (art. 584[3], CC/02) o bem, tais como IPTU (comodato de imóvel), gasolina (comodato de carro) ou vacinação (comodato de animal). As despesas extraordinárias devem ser pagas pelo comodante. Regras referentes às benfeitorias e posse de boa e de má fé (arts. 1.219 a 1.222, CC/02): Posse de boa-fé Posse de má-fé Benfeitorias necessárias Indenização + retenção Somente indenização Benfeitorias úteis Indenização + retenção ----- Benfeitorias voluptuárias Possibilidade de retirada ----- Obs: essas regras podem ser alteradas pela autonomia privada. A responsabilidade do comodatário pela perda/deterioração do bem depende de sua culpa, com exceção do preceituado no art. 583[4], CC/2002. Findo o comodato, se o comodatário não restituir o bem, as conseqüências são as seguintes: - estará caracterizado esbulho possessório, podendo o comodante ajuizar ação de reintegração de posse para recuperar a coisa; - os riscos pela perda/deterioração da coisa serão de responsabilidade do comodatário, ainda que os danos decorram de caso fortuito ou força maior, a não ser que ocorra a hipótese descrita na parte final do art. 399, CC/2002; - a posse do comodatário passará a ser injusta e de má-fé, e, consoante a parte final do art. 582, CC/02, o comodante pode cobrar aluguel até que o bem seja restituído. O aluguel pena será fixado unilateralmente pelo comodante, podendo ser revisto pelo juiz caso o valor seja abusivo (princípio da boa-fé objetiva). A cobrança do aluguel-pena não converte o comodato em locação. Enunciado n° 180, III Jornada de Direito Civil: Arts. 575 e 582: A regra do parágrafo único do art. 575 do novo CC, que autoriza a limitação pelo juiz do aluguel-pena arbitrado pelo locador, aplica-se também ao aluguel arbitrado pelo comodante, autorizado pelo art. 582, 2ª parte, do novo CC. É possível a compensação entre a indenização penas benfeitorias e o valor do aluguel-pena. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. COMODATO. BENFEITORIAS. INDENIZAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. COMPENSAÇÃO DOS ALUGUERES PELA OCUPAÇÃO DO IMÓVEL. DIES A QUO. - Inocorrência no caso de julgamento extra petita. - A correção monetária não constitui um plus que se acrescenta, mas mero mecanismo de preservação no tempo do valor aquisitivo da moeda. Precedentes. - Nos termos do disposto no art. 1.252 do Código Civil de 1916, constituído o comodatário em mora no momento em que notificado, a partir daí passam a ser devidos os alugueres ao comodante e não a contar da citação para os termos da causa. Recursos especiais conhecidos, em parte, e providos. (STJ, REsp 111847 / MG) Obs: usucapião e comodato. Ação de reintegração de posse de imóvel. Sentença de procedência, para rescindir o contrato de comodato verbal celebrado entre as partes e reintegrar o Autor na posse do imóvel, rejeitado o pedido contraposto, ante a inocorrência de usucapião. Apelação dos Réus. Provas documental e oral que demonstraram a posse do Autor, adquirida através de escritura pública de cessão e o comodato verbal. Réus que, notificados para rescisão do comodato, não desocuparam o imóvel. Esbulho possessório configurado. Alegação de usucapião rejeitada. Ausência de animus domini, devido à condição de comodatários dos Réus. Direito à retenção das benfeitorias não reconhecido por não terem sido as mesmas comprovadas. Desprovimento da apelação. (TJRJ, APC 2007.001.67387) CIVIL. USUCAPIÃO ESPECIAL. REQUISITOS. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. MERA PERMISSÃO PARA EXPLORAÇÃO DA GLEBA. IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. Não configuram a posse ad usucapionem os atos de simples permissão, tolerância ou ocupação anuída pelos proprietários. (TJSC, APC 2005.021228-4) PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CONTRATO DE COMODATO. USUCAPIÃO. INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS. ESBULHO. CARACTERIZAÇÃO. MATÉRIA DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL. MULTA. ARTIGO 557, § 2°, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES. I - Se o tribunal de origem, com base nos elementos de prova carreados aos autos, conclui pela impossibilidade do reconhecimento da posse, afasta o usucapião, e entende provada a existência do comodato e do esbulho imputado ao demandado, como comodatário, rever tais fundamentos demandaria o reexame de matéria probatória, inadmissível na via eleita, conforme preceitua a Súmula 7 desta Corte. II - Configurada nas instâncias ordinárias a existência de comodato, aplica-se o artigo 1.252 do Código Civil de 1916. III - Descabimento da multa do artigo 557, § 2º, do Código de Processo Civil, se o agravo interno visa a abertura da instância excepcional. Recurso especial parcialmente provido. (STJ, REsp, 765246) B) Obrigação de não fazer: não desviar o uso do bem, conforme a finalidade convencionalmente estabelecida ou decorrente da natureza da coisa, também sob pena de responsabilidade por perdas e danos e possibilidade de resolução contratual por inadimplemento. Duração Art. 581. Se o comodato não tiver prazo convencional, presumir-se-lhe-á o necessário para o uso concedido, não podendo o comodante, salvo necessidade imprevista e urgente, reconhecida pelo juiz, suspender o uso e o gozo da coisa emprestada, antes de findo o prazo convencional, ou eu se determine pelo uso outorgado. O comodato é um contrato temporário, podendo seu prazo de duração ser: A) Determinado (mora ex re); B) Indeterminado (mora ex persona). Uso concedido – prazo razoavelmente outorgado. AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSE. IMÓVEL DADO EM COMODATO A EMPREGADO. CONTRATO DE TRABALHO RESCINDIDO. DESOCUPAÇÃO NÃO EFETIVADA. REINTEGRATÓRIA. PRESSUPOSTOS DELINEADOS. LIMINAR, ENTRETANTO, NEGADA. DECISÃO INSUBSISTENTE. RECLAMO RECURSAL ATENDIDO. Nas relações empregatícias, a ocupação, pelo empregado, de imóvel do empregador, tem seu prazo definido pelo próprio tempo de duração do contrato laboral que os vincula. Rescindido este, mediante aviso prévio, com a consignação em juízo das verbas rescisórias, por não aceitas pelo empregado demitido, inexiste qualquer fomento legal para a continuidade da posse, pelo empregado, de imóvel de propriedade do empregador. Nesse contexto, a renitência do ex-empregado à devolução espontânea do bem ocupado, estampa a prática de esbulho, legitimando a reintegração initio litis do ex-empregador na posse do mesmo bem. (TJSC, AI 99.008917-7) CIVIL E PROCESSUAL. AÇÕES DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE E USUCAPIÃO. DOMÍNIO RECONHECIDO. COMODATO POR PRAZO INDETERMINADO EM PARTE DA ÁREA OBJETO DA REINTEGRATÓRIA. FALTA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO DE DESOCUPAÇÃO SOBRE O TERRENO OBJETO DO COMODATO. MATÉRIA CONHECÍVEL DE OFÍCIO. VIABILIDADE DE SUA PROVOCAÇÃO EM APELAÇÃO APRESENTADA À CORTE ESTADUAL. JULGAMENTO EXTRA PETITA E REFORMATIO IN PEJUS INOCORRENTES. CC, ARTS. 960, 1.250 E 1.252, CPC, ART. 267, IV, VI E § 3º. PREQUESTIONAMENTO INSUFICIENTE. MATÉRIA DE FATO. SÚMULAS NS. 282 E 356-STF, E 211-STJ. I. Firmado pelas instâncias ordinárias que a área de 5.000m2 onde reside o réu decorreu de ocupação autorizada pelos autores, é de se reconhecer a existência de comodato verbal, por prazo indeterminado, de sorte que para a reintegração na posse do bem exigível a prévia constituição em mora do comodatário, aqui inexistente, como condição imprescindível ao pedido reintegratório. (grifamos) II. Tratando-se de condição para a reintegração, possível ao réu suscitá-la em apelação perante o Tribunal de 2o grau, que deveria, inclusive, conhecê-la de ofício, não podendo a tanto escusar-se ao argumento de que não fora aduzida na contestação a falta da notificação e estaria, assim, preclusa. III. Pedido reintegratório procedente, todavia, em relação à área restante também alvo da mesma ação, de 15 hectares, fixado esse direito dos autores com base na prova dos autos, que não tem como ser revista em sede especial, ao teor da Súmula n. 7 do STJ. IV. Reconhecimento, por igual, da titularidade dos autores sobre a área de 5.000m2 alvo do comodato, apenas que, para obter a posse, terão de promover a prévia notificação e intentar novo procedimento. V. Não configura julgamento extra petita, nem reformatio in pejus, a explicitação do acórdão da apelação, em sede de embargos declaratórios, no tocante à definição das áreas compreendidas na decisão da Corte. VI. Ausência de prequestionamento impeditiva do conhecimento do recurso especial em toda a extensão pretendida pela parte, em face dos óbices das Súmulas ns. 282 e 356 do C. STF e 211 do STJ. VII. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido. (STJ, REsp 97859 / MG) Obs: Possibilidade de resilição antes do prazo em razão de motivo urgente e imprevisto: “o comodante pode faze-lo, contudo, por motivo de urgência e necessidade antes de findo o prazo convencional – comodato por prazo determinado – ou prazo razoavelmente concedido – comodato por prazo indeterminado. No entanto, esses motivos devem provar-se em juízo e somente após o reconhecimento pelo juiz da procedência da motivação do comodante é que haverá a suspensão do uso do bem pelo comodatário” (Gustavo Tepedino, et. al). Comodato simultâneo Art. 585. Se duas ou mais pessoas forem simultaneamente comodatárias de uma coisa, ficarão solidariamente responsáveis para com o comodante. 3. Mútuo (empréstimo de consumo) Conceito e características Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade. Roberto Senise Lisboa: contrato por meio do qual uma pessoa (o mutuário) obtém de outra (o mutuante) a transferência provisória de um bem fungível e consumível. São características elementares do contrato de mútuo: A) Transferência da propriedade; Carlos Roberto Gonçalves: constitui empréstimo para consumo, pois o mutuário não é obrigado a devolver o mesmo bem, do qual se torna dono (pode consumi-lo, aliená-lo, abandoná-lo, p.ex.), mas sim coisa da mesma espécie. Por transferir a propriedade, os riscos decorrentes da perda/deterioração da coisa são do mutuário desde a tradição (art. 587). Além disso, não cabe ao mutuário ser ressarcido pelas benfeitorias, nem ao mutuante ajuizar reintegração de posse. Apesar de ser contrato translativo de domínio, o mútuo não é um contrato de alienação. B) Fungibilidade e consuntibilidade do bem; C) Temporariedade Sujeitos e legitimidade Os sujeitos do mútuo são: A) Mutuante: aquele que empresta. Deve ser o proprietário do bem, já que o mútuo é um contrato translativo da propriedade. B) Mutuário: aquele que recebe o bem para consumo. Tem o dever de restituir não o bem que recebeu, mas sim outro da mesma espécie e na mesma quantidade. Mutuário menor de 18 anos: em regra, em conformidade com o art. 588[5], CC/2002, o mútuo feito a menor de 18 anos, sem a devida representação ou assistência, é obrigação natural (inclusive para os fiadores), exceto as hipóteses contempladas no art. 589: - se a pessoa, de cuja autorização necessitava o mutuário para contrair o empréstimo, o ratificar posteriormente. Esta regra só se aplica aos menores relativamente incapazes. - se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair o empréstimo para os seus alimentos habituais. - se o menor tiver ganhos com o seu trabalho. Mas, em tal caso, a execução do credor não lhe poderá ultrapassar as forças. Importante: conflito aparente entre o art. 589, III, e o art. 5°, parágrafo único, V (emancipação), ambos do CC/2002. - se o empréstimo se reverteu em benefício do menor. - se o menor obteve o empréstimo maliciosamente. Esta regra só se aplica ao menor relativamente incapaz (art. 180, CC/2002). Mútuo e exceção de inseguridade Art. 590. O mutuante pode exigir garantia da restituição, se antes do vencimento sofrer notória mudança em sua situação econômica. Aplicação da regra da exceção de contrato não cumprido a contrato unilateral. Mútuo feneratício Art. 591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual. Mútuo feneratício é o mútuo oneroso. No mútuo oneroso, o mutuário deve restituir não apenas a mesma espécie e mesma quantidade do bem emprestado, mas também os juros (presumidos quando o mútuo tiver finalidade econômica), que são remuneração pela utilização da coisa alheia. O mútuo feneratício, a despeito de parte minoritária da doutrina (a exemplo de Maria Celina Bodin de Moraes e Pontes de Miranda), é contrato unilateral, pois institui obrigações a apenas uma das partes contratantes (o mutuário). Limites à taxa de juros: Discussão sobre a incidência da taxa SELIC ou do art. 161, § 1°, CTN, que institui juros de 1% ao mês. Durante algum tempo a orientação do STJ foi no sentido de aplicar o art. 161, § 1º, CTN. Recentemente, porém, a jurisprudência foi modificada, em julgamento de recurso especial no procedimento do art. 543-A, para fazer incidir a taxa SELIC. Com efeito, é a consolidação feita no item 6.3 do REsp 1003955: 6.3 JUROS MORATÓRIOS: Sobre os valores apurados em liquidação de sentença devem incidir, até o efetivo pagamento, correção monetária e juros moratórios a partir da citação: a) de 6% ao ano, até 11/01/2003 (quando entrou em vigor o novo Código Civil) - arts. 1.062 e 1.063 do CC/1916; b) a partir da vigência do CC/2002, deve incidir a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. Segundo a jurisprudência desta Corte, o índice a que se refere o dispositivo é a taxa SELIC. Em precedente mais recente, o STJ assim se posiciona: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVOS REGIMENTAIS NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. JUROS DE MORA. Agravo Regimental do Estado do Paraná: 1. Esta Corte de Justiça tem firme posicionamento no sentido de que, tratando-se de fato gerador que se protrai no tempo, a definição legal dos juros de mora deve observância ao princípio do direito intertemporal segundo o qual tempus regit actum. 2. Sendo assim, os juros de mora hão de ser calculados a partir do evento danoso (súmula 54/STJ) à taxa de 0,5% ao mês (art. 1.062 do CC/1916) até a entrada em vigor do Código Civil de 2002, quando então deverão observar a taxa que estiver em vigor para a mora no pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (artigo 406 do CC/2002), ou seja, a SELIC. 3. Agravo regimental parcialmente provido tão somente para fixar em 0.5% ao mês a taxa de juros moratórios para o período entre o evento danoso (08.09.2002) e a entrada em vigor do Novo Código Civil. Agravo Regimental da União: 1. O Superior Tribunal de Justiça já assentou que a alteração do texto do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, conferida pela Lei 11.960/09, não pode ser aplicada aos feitos em curso, já que se trata de norma de natureza instrumental e material. Precedentes: REsp 1.124.471/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 01/07/2010; REsp 1125195/MT, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 01/07/2010. 2. Agravo regimental não provido. AgRg no REsp 1157093 / PR. Rel. Min. Benedito Gonçalves. 1ª Turma. DJe 28/09/2010. Mútuo bancário e de instituições financeiras: inaplicabilidade da Lei da Usura (Decreto-lei n° 22.626/33) e incidência do CDC. A limitação do art. 591 não se reflete nos mútuos bancários e de instituições financeiras, consoante jurisprudência dominante do STJ e dos Tribunais Estaduais. A fixação dos juros, portanto, se dá com de acordo com as taxas de mercado. Bem a propósito, já houve julgamento de recurso especial no procedimento dos recursos repetitivos (REsp 1061530[6]) que firmou a orientação de que aos mútuos bancários não se aplica o art. 406 c/c art. 591, CC. Prazos Art. 592. Não se tendo convencionado expressamente, o prazo do mútuo será: I – até a próxima colheita, se o mútuo for de produtos agrícolas, assim para consumo como para semeadura; II – de 30 (trinta) dias, pelo menos, se for de dinheiro; III – do espaço de tempo que declarar o mutuante, se for de qualquer outra coisa fungível. Obs: razoabilidade na fixação do prazo na hipótese do inciso III. [1] Art. 580. Os tutores, curadores e em geral todos os administradores de bens alheios não poderão dar em comodato, sem autorização especial, os bens confiados à sua guarda. [2] Art. 582. O comodatário é obrigado a conservar, como se sua própria fora, a coisa, não podendo usá-la senão de acordo com o contrato ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos. O comodatário constituído em mora, além de por ela responder, pagará, até restituí-la, o aluguel da coisa que for arbitrado pelo comodante. [3] Art. 584. O comodatário não poderá jamais recobrar do comodane as despesas feitas com o uso e gozo da coisa emprestada. [4] Art. 583. Se, correndo risco o objeto do comodato juntamente com outros do comodatário, antepuser este a salvação dos seus abandonando o do comodante, responderá pelo dano ocorrido, ainda que se possa atribuir a caso fortuito, ou força maior. [5] Art. 588. O mútuo feito a pessoa menor, sem prévia autorização daquele sob cuja guarda estiver, não pode ser reavido, nem do mutuário, nem dos fiadores. [6] ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. CONTRATOS NOMINADOS – VISÃO GERAL (continuação) 2.4 Depósito – voluntário e necessário 2.5 Empreitada Procedimentos de ensino 2.4. Depósito 1. Definição (CC, 627). Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame. Depósito é o contrato em que uma das partes, nomeada depositário, recebe da outra, denominada depositante, uma coisa móvel, para guardá-la, com a obrigação de restituí-la na ocasião ajustada ou quando lhe for reclamada. A sua principal finalidade é, portanto, a guarda de coisa alheia. 2. Características. A principal característica do depósito é a sua finalidade, que, como foi dito, consiste na guarda de coisa alheia. É o que o distingue do comodato e de outros contratos similares, pois o comodatário recebe a coisa para seu uso. No depósito, todavia, não pode o depositário dela se servir sem licença expressa do depositante (CC, 640). Por outro lado, Se o depositário, devidamente autorizado, confiar a coisa em depósito a terceiro, será responsável se agiu com culpa na escolha deste (CC, 640, parágrafo único). O segundo traço característico do depósito é a sua natureza real, pois há a necessidade da entrega da coisa para que o contrato se aperfeiçoe. A natureza móvel da coisa dada em depósito é sua terceira característica. Contudo, nos dias de hoje, admite-se que o depósito recaia sobre bens imóveis, como no exemplo do depósito judicial que recaia sobre bens dessa espécie (contudo, a disciplina do depósito judicial encontra-se no Código de Processo Civil). A obrigação de restituir é também da essência do contrato de depósito, implicando na suatemporariedade, pois o depositário recebe o bem para guardar, até que o depositante o reclame. Ainda que as partes tenham fixado prazo para a restituição, o depositante pode pedir a coisa mesmo antes do seu término, devendo o depositário entregá-la logo que se lhe exija, salvo algumas hipóteses previstas no art. 633 do Código Civil, pois se presume que o depósito regular é feito em benefício do depositante. Por outro lado, o depósito caracteriza-se pela gratuidade, exceto se houver convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão (CC, 628). Quando gratuito, o depósito é unilateral; caso oneroso, será bilateral. 3. Requisitos do depósito. As partes devem ser capazes. O depositante deve ter capacidade para depositar, que no caso exige apenas a capacidade de administrar e não a de alienar, pois não há alienação do bem. O depositante, no depósito regular, não precisa ser proprietário da coisa, bastando que tenha a posse direta da mesma, pois com o depósito, frise-se, não ocorre a transferência da propriedade do bem. O depositário deve ser capaz, pois contrairá obrigações com o contrato. Caso venha a se tornar incapaz no curso do depósito, a pessoa que lhe assumir a administração dos bens deverá diligenciar imediatamente para restituir a coisa depositada e, não querendo ou não podendo o depositante recebê-la, recolhê-la-á ao Depósito Público ou promoverá nomeação de outro depositário (CC, 641), por constituir a incapacidade do depositário verdadeira causa de resolução do contrato. 4. Espécies de depósito. 4.1 Depósito voluntário. O depósito voluntário é aquele realizado espontaneamente pelo depositante, isto é, por sua livre decisão, sem a ocorrência de causa externa que o obrigue a tanto. Pelo depósito voluntário, o depositante escolhe o depositário e celebra com ele o contrato de depósito. O depósito voluntário pode subdividir-se em regular ou irregular em razão da natureza do bem confiado à guarda do depositário. Denomina-se regular o depósito de coisa individuada, não consumível, infungível, que deverá ser restituída em espécie findo o contrato. Depósito irregular é o que recai sobre coisa fungível, assumindo o depositário a obrigação de restituir outra coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade, como na hipótese do depósito bancário. Ao depósito irregular são aplicadas as regras do mútuo (CC, 645). Nos termos do artigo 646 do Código Civil, o depósito voluntário provar-se-á por escrito. Assim, embora seja o depósito contrato consensual, é necessário, para provar-se, um começo de prova escrita, que pode ser suprida, p.ex., por recibos ou tíquetes de entrega da coisa, ou ainda documentos equivalentes. O depósito voluntário pode ser gratuito ou oneroso. 4.2. Depósito necessário. Depósito necessário é aquele no qual o depositante, por imposição legal ou premido por circunstâncias imperiosas, realiza com pessoa não escolhida livremente. São as hipóteses do art. 647 do Código Civil. Essas circunstâncias impõem não só a realização do depósito, como a designação do depositário. Nos termos do art. 649 do Código Civil, é também considerado depósito necessário o depósito das bagagens dos viajantes ou hóspedes nas hospedarias onde estiverem. Pode-se afirmar, assim, existirem três hipóteses de depósito necessário: o depósito legal, o depósito miserável e o depósito do hospedeiro ou hoteleiro. 4.2.1. Depósito legal (CC, 647, I). É o que decorre do desempenho de obrigação imposta por lei, como nas seguintes hipóteses, enumeradas por Washington de Barros Monteiro: a) aquele que é obrigado a fazer o descobridor da coisa perdida (CC, 1.233); b) o que deve ser feito pelo administrador dos bens do depositário que tenha se tornado incapaz (CC, 641). Nos termos do art. 648 do CC/2002, o depósito legal reger-se-á pela disposição da respectiva lei, e, no silêncio ou deficiência dela, pelas concernentes ao depósito voluntário. 4.2.2. Depósito miserável (CC, 647, II). É o que se realiza em situações de calamidades, sendo que o Código Civil enumera exemplificativamente as hipóteses de cabimento. A premente necessidade de salvar seus bens o impele a deixá-los com a primeira pessoa que aceite guardá-los. O depositário se dispõe a prestar um serviço ao depositante necessitado, e, por isso, o depósito necessário não se presume gratuito (CC, 651). Nos termos da parte final do parágrafo único do art. 648 do Código Civil, tanto o depósito legal quanto o miserável podem ser provados por quaisquer meios de prova, inclusive a testemunhal. 4.2.3. Depósito do hospedeiro e hoteleiro. É também denominado depósito necessário por assimilação, que se equipara ao depósito lega, conforme prescreve o art. 649 do CC/2002, tendo por objeto as bagagens dos viajantes ou hóspedes. Nos termos do art. 649, parágrafo único, os hospedeiros responderão como depositários, assim como pelos furtos e roubos que perpetrarem as pessoas empregadas ou admitidas nos seus estabelecimentos. Cessa, porém, tal responsabilidade, se provarem que os fatos prejudiciais aos viajantes ou hóspedes não podiam ter sido evitados, como nas hipóteses de culpa do hóspede, que esqueceu a porta do quarto aberta, ou de roubo à mão armada. A obrigação legal dos hoteleiros restringe-se aos bens que, habitualmente, costumam levar consigo os que viajam, como roupas e objetos de uso pessoal, não alcançando quantias vultosas ou jóias, exceto se o hóspede fizer depósito voluntário junto à administração do hotel (a maioria dos hotéis oferece cofres para o depósito de objetos valiosos). 5. Obrigações das partes. 5.1. Obrigações do depositante. No depósito gratuito, o contrato aperfeiçoa-se com a entrega da coisa, após a qual só o depositário terá obrigações. Nesse caso é unilateral. Por conseguinte, eventuais obrigações do depositante decorrerão de fatos posteriores à sua formação, resumindo-se a duas: a) A obrigação de reembolsar as despesas feitas pelo depositário com o depósito; b) A de indenizar o depositário pelos prejuízos que advieram do depósito, como nos casos de prejuízos decorrentes de vício ou defeito da coisa. Já quando o depósito é oneroso e, portanto, bilateral, constitui obrigação do depositante pagar ao depositário a remuneração convencionada. O art. 644 do Código Civil assegura ao depositário o direito de retenção da coisa dada em depósito, como meio de defesa para forçar o devedor a efetuar o pagamento da retribuição devida e das despesas e indenizações mencionadas, concedendo-lhe ainda a faculdade de exigir caução, ou, na sua falta, a remoção da coisa para o depósito, até que se liquidem as dívidas (parágrafo único). 5.2. Obrigações do depositário. a) A guarda da coisa alheia, devendo o depositário cuidar dela como se fosse sua. Pode confiar a coisa, para maior segurança, a um banco, a cofres de aluguel ou terceiros, por não se tratar de dever personalíssimo e intransmissível. Neste caso, deve obter autorização prévia do depositante, pois, nos termos do art. 640 do CC/2002, sob pena de responder por perdas e danos, não poderá o depositário, sem licença expressa do depositante, servir-se da coisa depositada, nem a dar em depósito a outrem. Acrescenta o parágrafo único do referido artigo que, se o depositário, devidamente autorizado, confiar a coisa em depósito a terceiro, será responsável se agiu com culpa na escolha deste. A obrigação de guardar a coisa pode, porém, cessar antes do término do contrato, havendo motivo justificável. O art. 635 do Código Civil concede ao depositário a faculdade de resilir o contrato unilateralmente, havendo motivo justificável. Assim, nos termos do referido artigo, ao depositário será facultado, outrossim, requerer depósito judicial da coisa, quando, por motivo plausível, não a possa guardar, e o depositante não queira recebê-la. b) A conservação da coisa alheia deixada em depósito, devendo o depositário zelar para restituir a coisa no estado em que a recebeu. O depositário responde por culpa ou dolo, se a coisa perecer ou deteriorar-se, seja o depósito gratuito ou remunerado. O depositário só se exonera da responsabilidade nos casos deforça maior, nos termos do art. 642 do CCB. Mas, para que lhe valha a escusa, terá de prová-los. Há, portanto, em princípio, uma presunção de culpa do depositário, que deverá demonstrar a ocorrência da força maior. No dever de conservar a coisa insere-se o de não devassá-la, se estiver fechada e não houver expresso consentimento do depositante. Nos termos do art. 630 do CCB, se o depósito se entregou fechado, colado, selado, ou lacrado, nesse mesmo estado se manterá. c) Restituir a coisa, com os seus frutos e acrescidos, quando o exija o depositante (CC, 629, segunda parte). Segundo o art. 633 do CCB, ainda que o contrato fixe prazo à restituição, o depositário entregará o depósito logo que se lhe exija, salvo se: a) tiver o direito de retenção a que se refere o art. 644; b)se o objeto for judicialmente embargado; c) se sobre ele pender execução, notificada ao depositário; d) ou se houver motivo razoável de suspeitar que a coisa foi dolosamente obtida. Salvo as hipóteses mencionadas, não poderá o depositário furtar-se à restituição, alegando não pertencer a coisa ao depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar (CC, 638). A não-devolução da coisa, com quebra de confiança e da boa-fé, é reprimida severamente pela lei, com a cominação de pena de prisão ao depositário infiel (CC, 652), prisão esta que tem caráter coercitivo, não sancionatório, e está entre as duas únicas hipóteses de prisão civil por dívida (CF/88, art. 5º, inciso LXVII). 6. Ação de depósito (CPC, 901 a 906). Só há interesse para a propositura da ação de depósito quando se tratar de depósito contratual(voluntário ou necessário) e o depositário não restituir a coisa que recebeu para guardar. Quando a hipótese é de depósito judicial, a ação não se faz necessária, uma vez que o depositário é mero detentor, podendo o juiz, nos próprios autos em que se constituiu o encargo, determinar, por simples mandado, a busca e apreensão da coisa, restituindo-a a quem de direito, tudo nos termos da Súmula 619 do STF. Além das hipóteses de depósito contratual previstas no Código Civil, existem outras, previstas em legislação esparsa, que justificam a ação de depósito, como no caso da alienação fiduciária, quando o credor poderá requerer a conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito, nos mesmos autos (Decreto-Lei nº. 911/69, art. 4º). Também é considerada depositária, nos termos da Lei nº. 8.866/94, a pessoa a quem a legislação tributária ou previdenciária imponha a obrigação de reter ou receber de terceiro, e recolher aos cofres públicos, impostos, taxas e contribuições, inclusive à Seguridade Social. A ação de depósito tem natureza cognitiva e obedece a procedimento especial, previsto nos arts. 901 a 906 do Código de Processo Civil. Nos termos do art. 902 do CPC, na petição inicial instruída com a prova literal do depósito e a estimativa do valor da coisa, se não constar do contrato, o autor pedirá a citação do réu para, no prazo de 5 (cinco) dias: I - entregar a coisa, depositá-la em juízo ou consignar-lhe o equivalente em dinheiro; II - contestar a ação. Conforme prescreve o art. 903 do CPC, Se o réu contestar a ação, observar-se-á o procedimento ordinário. Julgada procedente a ação, ordenará o juiz a expedição de mandado para a entrega, em 24 (vinte e quatro) horas, da coisa ou do equivalente em dinheiro. Não sendo cumprido o mandado, o juiz decretará a prisão do depositário infiel (CPC, 904). A decretação da prisão depende de pedido expresso do autor, que pode ser formulado na petição inicial, ou no curso do processo (CPC, 902, §1º). É importante lembrar que conforme a Súmula Vinculante nº 25, a prisão civil do depositário infiel é ilícita, motivo pelo qual as disposições legais relativas a tal procedimento não podem mais ser aplicadas no Brasil. CONTRATOS NOMINADOS – VISÃO GERAL (continuação) 2.6 Prestação de serviço 2.7 Mandato 2.8 Comissão Procedimentos de ensino 2.6. Prestação de serviço Noções gerais Do contrato de prestação de serviços (locação de serviços, na terminologia antiga), que inicialmente abrangia toda e qualquer prestação de atividade remunerada, destacou-se o contrato de trabalho, que pressupõe a continuidade, a dependência econômica e a subordinação. Continuam sob o manto da prestação de serviços o trabalho autônomo (exercido por profissionais liberais e representantes comerciais), o trabalho eventual e o trabalho a cargo de pessoas jurídicas (empresas prestadoras de serviços de limpeza, segurança, administração imobiliária etc.). Conceito Para Caio Mário da Silva Pereira, a prestação ou locação de serviço é o contrato em que uma das partes se obriga para com a outra a fornecer-lhe a prestação de uma atividade, mediante remuneração. Classificação a) Bilateralidade; b) Onerosidade; c) Consensualidade. Objeto da prestação de serviços O Objeto da prestação de serviços é uma obrigação de fazer, ou seja, a prestação de atividade lícita, não vedada pela lei e pelos bons costumes, oriunda da energia humana aproveitada por outrem, e que pode ser material ou imaterial (CC, 594). Qualquer serviço pode ser objeto nesse contrato: material ou imaterial, braçal ou intelectual, doméstico ou externo; apenas se exige que seja lícito, isto é, não proibido por lei e pelos bons costumes. Se o executor não foi contratado para certo e determinado trabalho, entender-se-á que sua obrigação diz respeito a todo e qualquer serviço compatível com as suas forças e condições (CC, 601). Nos termos do art. 605 do CC/2002, nem aquele a quem os serviços são prestados, poderá transferir a outrem o direito aos serviços ajustados, nem o prestador de serviços, sem aprazimento da outra parte, dar substituto que os preste. Remuneração A remuneração é elemento essencial no contrato de prestação de serviços, podendo os contratantes estipulá-la livremente. Contudo, se não o fazem, incide o art. 596 do CC: não se tendo estipulado, nem chegado a acordo as partes, fixar-se-á por arbitramento a retribuição, segundo o costume do lugar, o tempo de serviço e sua qualidade. A retribuição pagar-se-á depois de prestado o serviço, se, por convenção, ou costume, não houver de ser adiantada, ou paga em prestações (CC, 597). Nos termos do art. 606 do CC/2002, se o serviço for prestado por quem não possua título de habilitação, ou não satisfaça requisitos outros estabelecidos em lei, não poderá quem os prestou cobrar a retribuição normalmente correspondente ao trabalho executado. Mas se deste resultar benefício para a outra parte, o juiz atribuirá a quem o prestou uma compensação razoável, desde que tenha agido com boa-fé. Contudo, não se aplica a segunda parte do referido artigo, quando a proibição resultar de lei de ordem pública. Em regra, essa remuneração é em dinheiro, mas nada obsta que a que parte dela seja em alimentos, vestuário, condução, moradia etc. Tempo de duração A prestação de serviço não poderá ser convencionada por mais de quatro anos (CC, 598), tendo-se em vista a inalienabilidade da liberdade humana. Ao término desse prazo, ainda que a obra esteja inacabada, o contrato é extinto. Contudo, nada impede que novo contrato seja celebrado. Nos termos do art. 599, se não houver prazo estipulado, nem se puder inferir da natureza do contrato ou do costume do lugar, qualquer uma das partes, a seu arbítrio, mediante aviso prévio, poderá rescindir o contrato, com antecedência de oito dias, se o salário foi fixado por um mês ou mais; com antecipação de quatro dias, se o salário foi ajustado por uma semana ou quinzena; de véspera, se por menos de sete dias. O prestador de serviço contratado por tempo certo, ou por obra determinada, não se pode ausentar, ou despedir, sem justa causa, antes de preenchido o tempo, ou concluída a obra (CC, 602). Se o prestador de serviço se despedir sem justa causa, terá direito à retribuição vencida, mas responderá por perdas e danos. O mesmo dar-se-á, se despedido por justa causa. 6. Extinção Art. 607. O contrato de prestação de serviço acaba com a morte de qualquer das partes. Termina, ainda, pelo escoamento do prazo, pela conclusão da obra, pela rescisão do contrato mediante aviso prévio, por inadimplemento de qualquer das partes ou pela impossibilidade da continuação do contrato, motivada por força maior. 2.7. Mandato Generalidades e conceito Mandato é o contrato pelo qual alguém (mandatário ou procurador) recebe de outrem (mandante) poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses (CC, 653). É uma representação convencional, em que o representante pratica atos que dão origem a direitos e obrigações que repercutem na esfera jurídica do representado. O mandatário, como representante do mandante, fala e age em seu nome e por conta deste. Logo, é o mandante quem contrai as obrigações e adquire os direitos como se tivesse tomado parte pessoalmente no negócio jurídico. A procuração é o instrumento do mandato. Consiste no instrumento de outorga do poder de representação. Características Características do contrato. O mandato é contrato, pois requer a manifestação de duas vontades. Além da outorga da representação pelo mandante, será preciso que o mandatário aceite o mandatoexpressa ou tacitamente (CC, 656 e 659). O mandato é um contrato: a) Bilateral; b) Gratuito ou oneroso, conforme se estipule ou não uma remuneração ao representante. Há presunção de onerosidade (CC, 658) do mandato quando o seu objeto corresponder ao daqueles que o mandatário trata por ofício ou profissão lucrativa (advogado, despachante etc.). c) Intuitu personae, pois se baseia na confiança entre as partes; d) Consensual, pois, nos termos do art. 656 do CC, o mandato pode ser expresso ou tácito, verbal ou escrito. Representatividade. A idéia de representação é inerente e imprescindível ao mandato. A representação estabelece um liame obrigacional entre o representado e terceira pessoa, por meio do representante. O mandatário é representante por vontade do representado. Daí ser o mandato representação convencional, em que o representante recebe poderes para agir em nome o representado. Os atos do representante, mesmo contrariando instruções recebidas do mandante, vincularão o representado, desde que praticados em seu nome e dentro dos limites dos poderes constantes da procuração. Se o representante estabelecer negócios além dos poderes conferidos no mandato, tais atos negociais só estabelecerão um liame contratual em relação ao mandante se ele os ratificar. O mandatário que exceder os poderes do mandato, ou proceder contra eles, ao assumir obrigações com terceiros, sem que haja ratificação do mandante, estará obrigado a responder, a qualquer tempo, pelo excesso cometido, e reputar-se-á mero gestor de negócios(CC, 665). Revogabilidade e renunciabilidade (CC, 682, I). Qualquer dos contratantes poderá, ad nutum, pôr fim ao contrato, sem anuência do outro, sem qualquer justificativa, mediante simples manifestação volitiva unilateral:revogação por parte do mandante e renúncia por parte do mandatário. Isso se dá por se tratar o mandato de contrato personalíssimo, em que a confiança entre as partes é fundamental. Todavia, o Código Civil (arts. 683, 684, 685 e 686, parágrafo único) apresentaexceções a esta característica, determinando a sua irrevogabilidade: a) Quando se tiver convencionado que o mandante não possa revogá-lo; b) Quando for em causa própria a procuração dada; c) Nos casos em que o mandato for condição de um contrato bilateral ou meio de cumprir uma obrigação contratada. d) Quando contiver poderes de cumprimento ou confirmação de negócios encetados aos quais se ache vinculado. Fora destas hipóteses, o mandato é tipicamente revogável. As hipóteses de mandato irrevogável não comportam substabelecimento. Requisitos Subjetivos: CC, 654, caput; CC, 666. Objetivos: deve o objeto do mandato ser lícito, possível, determinado ou determinável. Estão excluídos do mandato atos personalíssimos, como o exercício do voto, a elaboração de testamento, a prestação de serviço militar, o exercício de cargo público. Contudo, nada obsta a prática pelo mandatário de atos extrapatrimoniais, como reconhecimento de filho, casamento etc. Formais: pois, apesar de o mandato constituir, via de regra, contrato consensual, aprocuração deve observar certos requisitos, indicados no §1º do art. 654: a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos. Nos termos do art. 655 do CC, ainda quando se outorgue mandato por instrumento público, pode substabelecer-se mediante instrumento particular. Mandato em termos gerais e mandato com poderes especiais O mandato em termos gerais confere apenas poderes de administração ordinária, como pagar imposto, fazer reparações, contratar e despedir empregados (CC, 661). Já o mandato com poderes especiais envolve atos de alienação ou disposição, exorbitando dos poderes de administração ordinária (CC, 661, §§1º e 2º), como p.ex., a aceitação de doação com encargo, a efetivação de novação, remissão de dívida, transação, imposição de ônus reais como hipoteca, ou emitir cheque. Mandado ad judicia CC, arts. 692 e 658, 2ª parte; Lei nº. 8.906/94, arts. 3º e 4º; CPC, arts. 36 a 38. Direitos e deveres do mandatário Direitos a) Exigir a remuneração ajustada, as despesas de execução do mandato e eventual pagamento de perdas e danos, cabendo direito de retenção do objeto do mandato apenas em relação às despesas (CC, 681); b) Substabelecer os seus poderes representativos. O substabelecimento (CC, art. 667, §§ 1º a 4º) vem a ser a outorga de poderes recebidos pelo mandatário a um terceiro de sua confiança. Se o substabelecimento for feito com reserva de poderes, tanto o substabelecente quanto o substabelecido podem praticar o ato, pois o substabelecente permanece como procurador; caso se dê sem reserva de poderes, equivale à renúncia por parte do substabelecente, havendo transferência definitiva dos poderes. Deveres a) Dar execução ao mandato, agindo em nome do mandante e de acordo com as instruções e os poderes dele recebidos e a natureza do negócio que deve efetivar; b) Aplicar toda a sua diligência habitual na execução do mandato (CC, 667, 1ª parte); c) Prestar contas, sempre que solicitado, e ao término do mandato; d) Responder pelos prejuízos advindos do substabelecimento, nos termos do art. 667; e) Enviar ao mandante as somas recebidas em função do mandato, ou depositá-las em nome do mandante, sendo que, se empregá-las em proveito próprio, inclusive as recebidas para as despesas, pagará juros, desde o momento em que abusou (CC, 670); f) Não compensar os prejuízos a que deu causa com os proveitos que, por outro lado, tenha granjeado ao seu constituinte (CC, 669); g) Concluir, por lealdade, o negócio já iniciado, se houver perigo na demora, embora ciente da morte, interdição ou mudança de estado do mandante (CC, 674). Direitos e deveres do mandante Direitos a) Revogar ad nutum o mandato, exceto nas hipóteses já ventiladas; b) Ratificar ou não o negócio realizado pelo mandatário; c) Exigir que as somas recebidas pelo mandatário, em função do mandato, lhe sejam entregues ou depositadas em seu nome; d) Exigir a prestação de contas por parte do mandatário; Deveres. a) Remunerar os serviços do mandatário, quando assim ficar convencionado ou for da natureza do contrato; b) Adiantar as despesas necessárias à execução do mandato, quando o mandatário lhe pedir; c) Ressarcir o mandatário dos prejuízos que sofreu em conseqüência do mandato; d) Honrar os compromissos em seu nome assumidos; e) Responder extracontratualmente pelos prejuízos causados a terceiros com o exercício do mandato (CC, 932, III, e 933). Extinção do mandato a) Revogação e renúncia; b) Morte de qualquer dos contratantes; c) Interdição de uma das partes por incapacidade superveniente(CC, 682, II); d) Mudança de estado (CC, 682, III); e) Término do prazo (CC, 682, IV); f) Conclusão do negócio (CC, 682, IV). 2.8. Comissão Conceito Flávio Tartuce: aquele pelo qual o comissário realiza a aquisição ou venda de bens, em seu próprio nome, à conta do comitente (Curso de direito civil. Vol. 3. 5.ed. São Paulo: Método, 2010. pp. 519-520). É característica marcante do contrato de comissão o exercício em nome próprio dos poderes contratuais. É, por isso, contrato personalíssimo. Em virtude da semelhança, ao contrato de comissão são aplicáveis, no que couber, as regras atinentes ao mandato. Características a) bilateral; b) oneroso; c) consensual; d) comutativo; e) típico; f) não-solene; g) fiduciário. Direitos e deveres do comissário a) atuação limitada aos poderes conferidos pelo contrato Art. 695. O comissário é obrigado a agir de conformidade com as ordens e instruções do comitente, devendo, na falta destas, não podendo pedi-las a tempo, proceder segundo os usos em casos semelhantes. Parágrafo único. Ter-se-ão por justificados os atos do comissário, se deles houver resultado vantagem para o comitente, e ainda no caso em que, não admitindo demora a realização do negócio, o comissário agiu de acordo com os usos. b) dever de cuidado Art. 696. No desempenho das suas incumbências o comissário é obrigado a agir com cuidado e diligência, não só para evitar qualquer prejuízo ao comitente, mas ainda para lhe proporcionar o lucro que razoavelmente se podia esperar do negócio. Parágrafo único. Responderá o comissário, salvo motivo de força maior, por qualquer prejuízo que, por ação ou omissão, ocasionar ao comitente. c) poder de prorrogação do vencimento do contrato Art. 699. Presume-se o comissário autorizado a conceder dilação do prazo para pagamento, na conformidade dos usos do lugar onde se realizar o negócio, se não houver instruções diversas do comitente. Art. 700. Se houver instruções do comitente proibindo prorrogação de prazos para pagamento, ou se esta não for conforme os usos locais, poderá o comitente exigir que o comissário pague incontinenti ou responda pelas conseqüências da dilação concedida, procedendo-se de igual modo se o comissário não der ciência ao comitente dos prazos concedidos e de quem é seu beneficiário. d) direito à remuneração Art. 701. Não estipulada a remuneração devida ao comissário, será ela arbitrada segundo os usos correntes no lugar. Art. 702. No caso de morte do comissário, ou, quando, por motivo de força maior, não puder concluir o negócio, será devida pelo comitente uma remuneração proporcional aos trabalhos realizados. Art. 703. Ainda que tenha dado motivo à dispensa, terá o comissário direito a ser remunerado pelos serviços úteis prestados ao comitente, ressalvado a este o direito de exigir daquele os prejuízos sofridos. Art. 705. Se o comissário for despedido sem justa causa, terá direito a ser remunerado pelos trabalhos prestados, bem como a ser ressarcido pelas perdas e danos resultantes de sua dispensa. Art. 707. O crédito do comissário, relativo a comissões e despesas feitas, goza de privilégio geral, no caso de falência ou insolvência do comitente e) direito de retenção Art. 708. Para reembolso das despesas feitas, bem como para recebimento das comissões devidas, tem o comissário direito de retenção sobre os bens e valores em seu poder em virtude da comissão Direitos e deveres do comitente a) pagamento ao comissário pelos serviços prestados; b) alteração unilateral do contrato Art. 704. Salvo disposição em contrário, pode o comitente, a qualquer tempo, alterar as instruções dadas ao comissário, entendendo-se por elas regidos também os negócios pendentes. Responsabilidade contratual do comissário Art. 697. O comissário não responde pela insolvência das pessoas com quem tratar, exceto em caso de culpa e no do artigo seguinte. Art. 698. Se do contrato de comissão constar a cláusula del credere, responderá o comissário solidariamente com as pessoas com que houver tratado em nome do comitente, caso em que, salvo estipulação em contrário, o comissário tem direito a remuneração mais elevada, para compensar o ônus assumido. Cláusula del credere: modalidade contratual através da qual o comissário assume a responsabilidade pela solvência daquele com quem contratar e por conta do comitente. É pacto acessório à comissão. Não há forma específica para a estipulação da cláusula del credere. Espécies de comissão a) comissão imperativa: os poderes do comissário estão restritos ao estabelecido no contrato. b) comissão indicativa: o comissário tem margem de atuação por decisão própria, porém comunicada ao comitente. c) comissão facultativa: o comissário tem ampla margem de atuação e decisão própria, independente de comunicação ao comitente. CONTRATOS NOMINADOS – VISÃO GERAL (continuação) 2.9 Agência e distribuição 2.10 Corretagem 2.11 Compromisso 2.12 Transação 2.13 Constituição de renda Procedimentos de ensino 2.9. Agência e distribuição Conceito Os contratos de agência e distribuição são contratos originariamente mercantis e atípicos, que a freqüência no âmbito das relações negociais fez com que o Código Civil os disciplinasse. Alguns autores entendem que agência e distribuição tratam da mesma figura contratual, enquanto que outra parte da doutrina diferencia a agência da distribuição. Para Pablo Stolze e Rodolpho Pamplona Filho: No contrato de agência, o agente, sem vínculo de subordinação, e sem deter a coisa que comercializa, realiza negócios, em área determinada, fazendo jus a uma remuneração fixa ou percentual; diferentemente, no contrato de distribuição, posto deva também empreender negócios à conta e no interesse de terceiro, o distribuidor já tem à sua disposição a coisa negociada. Este elemento (ter consigo ou não a coisa a ser comercializada), pois, é a nota distintiva entre as duas espécies contratuais. (Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 386). Características a) típicos; b) não-solenes; c) bilaterais; d) onerosos; e) consensuais; f) comutativos; g) fiduciários. Disciplina legal: arts. 710 a 721, CC. 2.10. Corretagem Conceito Pablo Stolze e Rodolpho Pamplona Filho: negócio jurídico por meio do qual uma pessoa, não vinculada a outra em decorrência de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer outra relação de dependência, se obriga a obter para segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas (Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 404). Sujeitos Corretor: sujeito que se obriga a conseguir a celebração de um ou mais negócios em favor de outrem. É o devedor da relação contratual de corretagem. Comitente: sujeito em favor de quem o corretor conseguirá os negócios. É o credor da relação contratual de corretagem. Características a) típico; b) bilateral; c) oneroso; d) aleatório; e) consensual; f) não-solene. Disciplina legal: arts. 722 a 729, CC. 2.11. Compromisso Conceito Pablo Stolze e Rodolpho Pamplona Filho: negócio jurídico mediante o qual os pactuantes se obrigam a submeter um litígio, que os envolveu, a uma solução consistente no estabelecimento de uma ou mais obrigações (Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 644). Em razão do crescimento das medidas de autocomposição de conflitos, o compromisso vem ganhando destaque, a exemplo do anteprojeto de CPC atualmente em tramitação. Características a) típico; b) bilateral, como regra, podendo ser unilateral quando houver renúncia ou reconhecimento integral do alegado pela outra parte; c) oneroso ou gratuito; d) comutativo; e) consensual; f) não-solene. Disciplina legal: arts. 851 a 853, CC. 2.12. Transação Conceito Flávio Tartuce: consiste no contrato pelo qual as partes pactuam a extinção de uma obrigação por meio de concessões mútuas ou recíprocas, o que também pode ocorrer de forma preventiva (Direito civil. Vol. 3. 5.ed. São Paulo: Método, 2010. p. 621). A partir do conceito é possível concluir que apenas estão sujeitos à transação bens patrimoniais disponíveis. Ademais, também infere-se que há duas modalidades de transação: judicial (extintiva) e extrajudicial (preventiva). De acordo com o entendimento do STJ, a homologação da transação extingue o processo com resolução de mérito: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ACORDO JUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO. TRANSAÇÃO ACARRETA A EXTINÇÃO DO PROCESSO, COM JULGAMENTO DO MÉRITO. A ação anulatória, prevista no art. 486 do CPC, é sede própria para a discussão a respeito dos vícios na transação homologada judicialmente. Alegação de vícios no contrato. Inadequação do meio. Precedentes. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 915705 / SP. Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO. 4ª Turma. DJe 13/10/2010) Características a) típico; b) bilateral; c) oneroso; d) comutativo; e) consensual. Disciplina legal: arts. 840 a 850, CC. 2.13. Constituição de renda Conceito Flávio Tartuce: por meio desse negócio jurídico, uma determinada pessoa, denominada instituidor, censuísta ou censuente, entrega determinada quantia em dinheiro, bem móvel ou imóvel ao rendeiro, censuário ou censatário, obrigando-se este último, se for o caso, a pagar ao primeiro, de forma temporária, certa renda periódica. Essa renda pode ser instituída a favor do próprio rendeiro ou de terceiro. (Direito civil. Vol. 3. 5.ed. São Paulo: Método, 2010. p. 617). Características a) unilateral; b) gratuito; c) comutativo; d) real; e) formal e solene (há discussão na doutrina quanto a essa característica); f) típico. Disciplina legal: arts. 803 a 813, CC. CONTRATOS NOMINADOS – VISÃO GERAL (continuação) 2.14. Contrato estimatório 2.15. Promessa de recompensa Procedimentos de ensino 2.14. Contrato estimatório Conceito Art. 534. Pelo contrato estimatório, o consignante entrega bens móveis ao consignatário, que fica autorizado a vendê-los, pagando àquele o preço ajustado, salvo se preferir, no prazo estabelecido, restituir-lhe a coisa consignada. O contrato estimatório é fonte de obrigação facultativa, e não alternativa. Sujeitos Consignante: realiza a tradição dos bens. É o credor da obrigação. Consignatário: recebe os bens. É o devedor da obrigação, sendo responsável pelo pagamento da prestação principal (preço de estima) ou, facultativamente, pelo cumprimento da prestação acessória (restituição da coisa ou de parte dela). Características a) típico; b) não-solene; c) bilateral (apesar de haver doutrina minoritária que entenda ser unilateral); d) comutativo; e) consensual. Efeitos: arts. 535 a 537, CC. 2.15. Jogo e aposta Conceito Maria Helena Diniz: jogo é o contrato em que duas ou mais pessoas prometem, entre si, pagar certa soma àquela que conseguir um resultado favorável de um acontecimento incerto, ao passo que a aposta é a convenção em que duas ou mais pessoas de opiniões discordantes sobre qualquer assunto prometem, entre si, pagar certa quantia ou entregar determinado bem àquela cuja opinião prevalecer em virtude de um evento incerto. Como regra, as dívidas de jogo ou aposta constituem obrigações naturais. Características a) típicos; b) não-solenes; c) bilaterais; d) onerosos; e) consensuais; f) aleatórios. Espécies a) jogo proibido b) jogo tolerado c) jogo permitido Os jogos permitidos são lícitos e, por isso, são obrigações dotadas de exigibilidade. Os jogos tolerados têm a exigibilidade discutível. Disciplina legal: arts. 814 a 817, CC. � PAGE \* MERGEFORMAT �1�