Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original
Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 1 ESTATUTO DO DESARMAMENTO – Lei 10.823/03 Inicialmente é necessário observar que não há coerência na jurisprudência quanto a referida lei. E isso se dá diante da confusão legislativa também existente. 1. Evolução Legislativa: Até 1997 as condutas envolvendo armas de fogo eram consideradas meras contravenções penais. Com o advento da lei 9.437/199, as contravenções dessa natureza foram transformadas em crimes. Sucede que, posteriormente, tal lei fora revogada pelo atual estatuto do desarmamento: Lei 10.823/06 que manteve as condutas envolvendo armas de fogo como crimes. A diferença é a seguinte. A lei 9.537/97 concentrava no art. 10 os crimes de posse, porte, disparo, comércio ilegal, etc. de arma de fogo. Essa concentração dizia respeito a delitos de diferente gravidade que tinham as mesmas penas. Daí que o art. 10 violava o princípio da proporcionalidade e violava o princípio da individualização da pena, lembrando que o Princípio da Individualização da pena já ocorre no Poder Legislativo, quando da cominação de penas. O Estatuto do Desarmamento prevê os crimes nos artigos 12 a 18: posse, porte, disparo, comércio ilegal, tráfico internacional, etc. E aqui se têm crimes diferentes com penas diferentes, de acordo com a gravidade da conduta. Diante disso, houve correção da distorção da lei anterior, atendendo aos princípios da proporcionalidade e individualização da pena. 2. Competência: O Estatuto do Desarmamento prevê o Sinarm – Sistema nacional de Armas de Fogo. Esse Sinarm é uma entidade da União. Diante disso, o controle de armas no Brasil é um controle federal. Em razão disso, logo que entrou em vigor o Estatuto do Desarmamento, setores da Jurisprudência passaram a decidir que a competência para julgar os crimes do Estatuto do Desarmamento era da Justiça Federal. Ex. TJ RJ e TJ SC. Sucede que essa tese não foi admitida pelo STJ, que decidiu que a competência para julgar os crimes do Estatuto do Desarmamento, em regra, é da Justiça Comum Estadual, salvo se houver interesse da União. A exceção diz respeito ao crime de tráfico internacional de armas que é delito, genuinamente, de competência da Justiça Federal. O entendimento do STJ se deu considerando que, o que fixa a competência é o bem jurídico violado e o bem jurídico violado é a segurança pública que se trata de bem da coletividade e não da União. Diante disso, o controle federal de armas de fogo gera apenas um interesse genérico e indireto da União, não sendo capaz de atrair a competência para a Justiça Federal. É a mesma ideia dos crimes ambientais. Duas observações merecem destaque: Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 2 2.1. Porte ilegal praticado por militar em área sujeita à administração militar: A competência é da Justiça Comum federal ou estadual. Não se trata de crime com competência da Justiça Militar, por não se tratar de crime militar. STJ, CC 112.314/MS (julgado em 22.09.2010). 2.2. Competência para determinar o local da entrega de arma apreendida em processo findo: Nessa hipótese, a competência é do Juiz do Processo e não do comando do exército. Ou seja, cabe ao Juiz do processo determinar em qual unidade do exército, a arma será entregue para destruição. Nesse sentido, STJ, Conflito de atribuições 191/BA (julgado em 10.03.2002), entre outros inúmeros julgados em que houve a mesma decisão. 3. Bens jurídicos tutelados no Estatuto do Desarmamento: O objeto jurídico imediato da lei é a segurança coletiva – incolumidade pública. Os bens jurídicos mediatos são: Incolumidade pessoal Segurança individual Patrimônio Liberdade Outros direitos fundamentais. Essa ideia de objetos jurídicos mediato e imediato foi retirada de dois julgados: STF, HC 96.072/RJ e STJ, HC 156.736/SP. Em ambos julgados são indicados como bem jurídicos no Estatuto do desarmamento tais bens jurídicos. Vários outros julgados existem nesse sentido também. 4. Natureza dos Crimes do Estatuto do Desarmamento: Os crimes do estatuto do desarmamento são crimes de perigo abstrato, segundo entendimento pacífico no STJ e STF. Isso quer dizer que, a ofensividade da conduta é presumida na lei. Em razão dessa classificação em crimes de perigo abstrato e de perigo concreto reflete no ônus da prova no processo penal. Nos crimes de perigo abstrato, basta a acusação provar a realização da conduta, não sendo necessário provar que essa conduta tenha causado perigo direto, real e efetivo a alguém. Já nos crimes de perigo concreto, a acusação tem que provar a realização da conduta e a situação de efetivo perigo gerada. 5. Art. 12 – Posse irregular de arma de fogo de uso permitido: Posse irregular de arma de fogo de uso permitido Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 3 Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. 5.1. Sujeito ativo: Para a maioria se trata de crime comum. Minoria entende que o crime é próprio pois somente pode ser praticado pelo titular da residência ou do local de trabalho. 5.2. Sujeito passivo: É a coletividade uma vez que o bem jurídico protegido é a segurança pública. Trata-se de crime vago, ou seja, que não possui vítima determinada. 5.3. Condutas puníveis: As condutas são: possuir e manter sob a guarda. Ambas as condutas são idênticas. A lei está se autorepetindo. Diante disso, a expressão manter sob sua guarda é necessária, uma vez que manter sob sua guarda já implica posse. 5.4. Objeto material: Apesar do nome do crime falar em posse irregular de arma de fogo de uso permitido, o objeto material do crime é: Arma de fogo Acessório: tem previsão no art. 3º, II do Dec. 3.665/00: “Art. 3º. Para os efeitos desse regulamento e sua adequada aplicação, são adotadas as seguintes definições: II – acessório de arma: artefato que, acoplado a uma arma, possibilita a melhoria do desempenho do atirador, a modificação de um efeito secundário do tiro ou a modificação do aspecto visual da arma” É pois, qualquer objeto que, acoplado à arma, melhora seu funcionamento e precisão. Ex. Silenciador, mira laiser. Atente-se que partes da arma não são acessórios, assim como o coldre (suporte na cintura em que se coloca a arma). Munição São objetos de uso permitido. Tratando-se se objetos de uso proibido, a posse configura o delito do art. 16 do Estatuto do Desarmamento. 5.5. Elemento especial do Tipo penal: O elemento espacial do tipo está na expressão: “no interior de sua residência ou dependência desta ou no local de trabalho” Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 4 Atente-se que, só há posse se a conduta ocorrer nesses dois locais. Em qualquer outro local tem-se o porte. Posse Porte A posse ocorre na residência ou dependência da residência do infrator ou no local de trabalho do infrator do qual ele seja o proprietário ou o responsável legal. Ex. infrator tem guardada arma no quarto de sua casa; dono de restaurante e garçom trabalham com armas de fogo na gaveta. No que tange ao proprietário do restaurante se trata de posse. Já quanto ao garçom, é porte. O porte ocorre nas demais situações, ou seja, em qualquer outro local. Ex. o agente coloca a arma na cintura e sai para passear com cachorro; Essa distinção entre posse e porte é constantemente feita pelo STF, devendo sempre atentar para isso. 5.6. Elemento normativo do tipo: O elemento normativo do tipo é “em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. Tem-se pois que a posse legal é fato atípico. Posse Legal Posse Ilegal Dá-se quando a arma estiver registrada na Polícia Federal, ou seja, a polícia federal expede registro de propriedade da arma, após autorização do SINARM – art. 5º, caput e §1º do E.D.: Art. 5o O certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa. (Redação dada pela Lei nº 10.884, de 2004) § 1o O certificado de registro de arma de fogo será expedido pela Polícia Federal e será precedido de autorização do Sinarm. A posse ilegal dá-se quando a arma não possui qualquer registro ou a arma possui registro estadual que não possui validade de acordo com o Estatuto do Desarmamento. Desde a entrada em vigor do Estatuto do Desarmamento, foram sendo concedidos prazos para a regularização da posse ilegal. O primeiro prazo foi dado pelo próprio estatuto do desarmamento, que entrou em vigor no dia 23.12.2003 e esse prazo valia para armas permitidas e restritas. Depois, esse prazo inicial foi prorrogado pela Lei 11.191/05, que converteu a MP 235/05. Essa lei estendeu o prazo para regularização até 23.10.2005 e valia para armas permitidas e restritas. Esse prazo foi novamente estendido pela lei 11.796/08, que converteu a MP 417/08, estendendo o prazo até 31.12.2008, mas esse prazo foi estendido apenas para armas permitidas, não mais para armas proibidas (restritas) Houve nova extensão de prazo até 31.12.2009, pela lei 11.922/09, referindo-se apenas às armas de uso permitido. A partir de 1º de janeiro de 2010, não houve mais prorrogação. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 5 Daí que, entre 23.12.2003 a 31.12.2009 houve descriminalização temporária (abolitio criminis temporária, atipicidade momentânea ou vacatio legis especial ou indireta). Diante disso, nesse período, a posse ilegal de arma de fogo de uso permitido deixou, temporariamente, de ser crime. A partir de 1º de janeiro de 2010, a posse ilegal de arma de fogo de uso permitido passou a ser crime. Porém, é necessário observar o previsto no art. 32 do Estatuto do Desarmamento: Art. 32. Os possuidores e proprietários de arma de fogo poderão entregá-la, espontaneamente, mediante recibo, e, presumindo-se de boa-fé, serão indenizados, na forma do regulamento, ficando extinta a punibilidade de eventual posse irregular da referida arma. Atente-se que a entrega espontânea da arma é causa de extinção da punibilidade do agente em relação à posse irregular da referida arma. Aqui devem ser feitas observações sobre essa abolitio criminis momentânea: 5.6.1. Aplicação aos crimes cometidos na vigência da Lei 9.437: De acordo com o STF, não haverá tal aplicação. De acordo com o STF, como se trata de abolitio criminis temporária não há retroação da norma. STF, HC 98.180/SC e HC 90.995/SP. O STJ, na Ação Penal 394/RN, julgada em 15.03.2006, a corte especial decidiu que sim, ou seja, que cabe aplicar a aboltio criminis temporária deveria retroagir para alcançar os crimes praticados na vigência da Lei 9.437. Após essa decisão, a 5ª Turma do STJ passou a decidir que não seria cabível, afirmando que a aboltio criminis dessa lei não retroage. Nesse sentido, o HC 103.029, julgado em 03.02.2009. Agora, a 5ª Turma volta entender que é cabível a aplicação, nos termos do HC 133.231, julgado em 13.10.2009. 5.6.2. Aplicação a posse de arma de uso restrito: Para a 5ª Turma do STJ, aplica-se aos crimes cometidos até 23.10.05, não se aplicando se o crime foi praticado após essa data. Nesse sentido, o Resp. 1.179.276/GO, julgado em 02.09.2010. Já para a 6ª Turma do STJ, aplica-se a abolitio criminis independentemente da data do crime. Nesse sentido, HC 147.692/RJ, julgado em 04.03.2010. No STF não há decisões. A tendência é prevalecer a decisão da 5ª Turma em concursos públicos uma vez que, 90% dos julgados envolvendo Estatuto do Desarmamento são provenientes da 5ª Turma. 5.6.3. Aplicação a posse de arma com numeração raspada: De acordo com a 5ª Turma do STJ, aplica-se aos crimes cometidos até 23.10.2005 e não se aplica aos crimes cometidos a partir de 24.10.2005. Isso porque, arma raspada é igual a arma proibida (equivale à arma de uso restrito) e não tem como ser regularizada. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 6 Tendo em mente a 6ª Turma, entende que se aplica independentemente da data do crime uma vez que até 31.12.2009 o possuidor da arma tinha a opção de regularizá-la, o que inclui a arma raspada. Nesse sentido, HC 147.692/SP. Para o STF, a abolitio criminis temporária não se aplica a posse de arma com numeração raspada considerando que não há como regularizar a arma. Nesse sentido, HC 94.261/SP (STF). 5.6.4. Não aplicação aos crimes de porte de arma, dos arts. 14 e 16 do Estatuto: Não se aplica tal atipicidade em relação aos crimes relativos ao porte de arma. Esse é o entendimento pacífico da jurisprudência. 5.7. Elemento subjetivo do tipo: O elemento subjetivo do tipo é o dolo. 5.8. Consumação e tentativa: O crime consuma-se no momento em que o agente ingressa na posse ilegal da arma. Trata-se de crime permanente: possuir ou manter sob guarda. É também crime de mera conduta. A tentativa não é possível. 6. Art. 13, caput – Omissão de Cautela: Omissão de cautela Art. 13. Deixar de observar as cautelas necessárias para impedir que menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa portadora de deficiência mental se apodere de arma de fogo que esteja sob sua posse ou que seja de sua propriedade: Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa. 6.1. Sujeito ativo: O sujeito ativo é somente o proprietário ou possuidor da arma. Trata-se de crime próprio. 6.2. Sujeito passivo: É o menor de 18 anos e o doente mental, tratando-se crime próprio também. Em razão disso, tem-se aqui um crime bi-próprio. Sucede que, além do menor e do doente mental, a coletividade também figura como sujeito passivo do delito. A coletividade é apontada pela doutrina como sujeito passivo primário. Obs.: Há o crime ainda que o menor de 18 anos tenha adquirido a capacidade civil absoluta. A lei não se interessa pela capacidade civil, mas sim a idade da vítima. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 7 Não é necessária relação de parentesco entre o sujeito ativo e passivo, ou qualquer outra relação. Ex. pai deixa a arma próxima de filho de 12 anos, que pega a arma; amigo do pai que deixa a arma próxima da criança de 11 anos que a pega. A lei somente se refere ao doente mental, nada falando a respeito do portador de necessidades especiais. Isso porque a lei busca proteger aquele que não teria condições de saber dos perigos de uma arma. 6.3. Conduta punível: É “deixar de observar as cautelas legais”. Essa conduta significa a quebra do dever de cuidado objetivo. 6.4. Objeto material: É a arma de fogo, seja ela de uso permitido ou de uso restrito. O tipo penal não especifica a espécie de arma. A espécie de arma será considerada na dosagem da pena. É necessário atentar que o tipo penal não menciona “acessório e munição” e se o objeto for acessório e munição não há o crime do art. 13. 6.5. Consumação e tentativa: A consumação dá-se com o apoderamento da arma pelo menor ou doente mental, o que é pacífico na doutrina. Mas aqui se indaga se o crime é formal ou material. O crime consuma-se com o apoderamento da arma e quanto a isso não há divergência. Já quanto ao fato de ser formal ou material, há divergência: 1ª Corrente: o crime é material. É o entendimento de Fernando Capez. Segundo ele, o apoderamento já é o resultado naturalístico. 2ª Corrente: é encampada por Nucci, que afirma que o crime é formal ou de consumação antecipada. Segundo ele, o crime se consuma com o apoderamento, mas o resultado naturalístico é a ofensa à vida ou a integridade física da vítima. Adotando-se essa segunda corrente, podemos concluir que o art. 13 é uma exceção de crime culposo sem resultado naturalístico. (A outra exceção está na lei de drogas – Prescrever culposamente drogas, ainda que o destinatário não a utilize). No que tange à tentativa, temos que referido delito não admite tentativa. Isso porque se trata de crime omissivo puro e culposo. 7. Art. 13, p. ún. – Omissão de Comunicação: Parágrafo único. Nas mesmas penas incorrem o proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança e transporte de valores que deixarem de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal perda, furto, roubo ou outras Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 8 formas de extravio de arma de fogo, acessório ou munição que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte quatro) horas depois de ocorrido o fato. 7.1. Sujeito ativo: O sujeito ativo é somente o proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança e transporte de valores. 7.2. Sujeitos passivos: São sujeitos passivo a coletividade e o Estado. O Estado é sujeito passivo pois a falta de comunicação prejudica o controle de armas. 7.3. Conduta punível: A conduta punível é deixar de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo, acessório ou munição. A lei estabelece um duplo dever de comunicação e, portanto, prevalece que qualquer das comunicações configura o crime. Esse é o entendimento majoritário. Outros porém, entendem que basta uma única comunicação uma vez que o agente não pode ser responsabilizado pela desorganização do Estado e a falta de integração entre seus órgãos. Assim, para essa parte da doutrina, uma única comunicação é suficiente para não ocorrência do crime. 7.4. Objeto material: É arma de fogo, acessório ou munição, permitidos ou proibidos. A espécie de arma, munição ou acessórios será considerada na fixação da pena. 7.5. Elemento subjetivo: Trata-se de crime doloso, segundo entendimento amplamente majoritário. Isso porque, somente há crime culposo se expressamente previsto em lei e a lei não está prevendo que seja esse um crime culposo. O elemento subjetivo é o dolo e somente haverá o crime se houver a omissão dolosa na comunicação. Tratando-se de omissão culposa, não se tem crime. 7.6. Consumação e tentativa: O crime somente se consuma após 24 horas da ocorrência do fato. A comunicação deve ocorrer em até 24 horas. Somente após esse prazo que configura o crime. Daí que esse crime é denominado crime a prazo. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 9 Obs.: A doutrina diz que esse crime se consuma após 24horas da ciência do fato, e não do fato em si, sob pena de responsabilidade penal objetiva. Isso porque não poderia o agente comunicar o fato antes de sua ciência. A tentativa, de acordo com a doutrina, não é admissível uma vez que esse se trata de crime de mera conduta e crime omissivo puro ou próprio. 7.7. Concurso de crimes: É possível o concurso desse crime com os crimes de porte e posse ilegal de armas. 8. Art. 14 – Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido: Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente. (Vide Adin 3.112-1) 8.1. Sujeito ativo: É qualquer pessoa, tratando-se de crime comum. 8.2. Sujeito passivo: É a coletividade. Trata-se de crime vago. 8.3. Conduta punível: Trata-se de crime de conduta múltipla ou variada (tipo misto alternativo), possuindo vários núcleos verbais. Apesar do nome “porte ilegal de arma de fogo” o crime não é apenas de porte. São treze condutas e a prática de várias condutas no mesmo contexto fático configura crime único. 8.4. Objeto material: É arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido. O objeto material é idêntico ao do crime do art. 12. 8.5. Elemento subjetivo: Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 10 É o dolo. 8.6. Consumação e tentativa: O crime se consuma com a mera prática de qualquer das condutas do núcleo do tipo, atentando-se que em alguns verbos, o crime é permanente: ex. ter em depósito, guardar, ocultar. A tentativa é possível em alguns verbos. Ex. tentar adquirir, emprestar. 8.7. Questões específicas sobre o delito: 8.7.1. Exame pericial: A 2ª Turma do STF e a 5ª Turma do STJ entendem que o exame pericial da arma é dispensável, desde que existam outros elementos de prova nos autos comprovando a prática do crime. Nesse sentido, STF, HC 100.860/RS, julgado em 17.08.2010; STJ, 5ª Turma, HC 107.112/MG de 02.03.2010. Esse entendimento se dá considerando que o crime é de perigo abstrato. Por outro lado, a 1ª Turma do STF entendia que o laudo era indispensável (HC 97.209/SC, julgado em 16.03.2010). Posteriormente, passou a entender que o laudo é dispensável, desde que haja outros elementos para provar nos autos (HC 100.008/RS, julgado em 18.05.2010), restando vencido o Min. Marco Aurélio nesse julgamento. 8.7.2. Arma desmuniciada: Indaga-se se é crime ou não. De acordo com a 1ª Turma do STF e a 5ª Turma do STJ, arma desmuniciada é sempre crime. Há presunção absoluta de perigo, ou seja, se trata de crime de perigo abstrato. STF, HC 96.072/RJ, julgado em 16.03.2010. A 1ªTurma diz expressamente que o porte de arma é crime de perigo abstrato o que conduz ao fato de que haverá crime, pouco importando se se trata ou não de arma municiada. Nesse sentido, também STJ, HC 168.365/RJ, julgado em 03.09.2010. Tendo em base a 2ª Turma do STF, temos que é crime se a arma tiver condições de pronto municiamento. Lado outro, não será crime se não houver condições de pronto municiamento. Nesse sentido, HC 97.811/SP, julgado em 09.06.09 e HC 91.196/SP, julgado em 20.10.2009 (a ementa desse julgado fala de laudo, mas na verdade, o que os ministros decidiram foi saber se a arma desmuniciada e sem condições de pronto municiamento era crime ou não. 8.7.3. Munição desarmada: De acordo com a 5ª Turma do STJ trata-se de crime por dois motivos. Primeiro porque o tipo penal prevê a munição como objeto material. Outro motivo é que se trata de crime de perigo abstrato, cujo perigo é presumido na lei. Acerca da matéria, HC 95.604/PB, julgado em 15.04.2010. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 11 A 2ª Turma do STF não decidiu sobre a matéria, estando o HC 90.070/SC pendente de julgamento em que se discute a matéria. Por enquanto, a situação é a seguinte: os Min. Eros Grau e Joaquim Barbosa entenderam que é crime, por ser crime de perigo abstrato (inf. 457 e 470). O Min. Peluso decidiu que o porte somente de munição não é crime, o que pode ser visto no inf. 583 do STF. Após o voto do Min. Peluso, pediu vista a Min. Ellen Gracie. Diante disso, o que é válido é o entendimento do STJ. 8.7.4. Arma desmontada: Essa matéria é discutida na doutrina. Diz a doutrina que, se a arma tiver condições de pronta montagem e armamento, é crime. Já se arma não estiver em condições de pronta montagem não é crime. 8.7.5. Arma quebrada: Diz a doutrina que, se for arma absolutamente inapta para disparar, tem-se crime impossível por absoluta impropriedade do objeto. Tratando-se de arma relativamente inapta para disparar, trata-se de crime (arma às vezes dispara, outras não). Nesse sentido, Fernando Capez. 8.7.6. Princípio da insignificância: O STJ decidiu que não se aplica o Princípio da insignificância ao porte ilegal de arma ou munição. STJ, HC 120.903/SP, de 23.02.2010. Atente-se que, para o reconhecimento do princípio da insignificância, o STF e o STJ vêm exigindo quatro requisitos: Mínima ofensividade da conduta Nenhuma periculosidade social da ação Reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento Inexpressividade da lesão jurídica provocada. 8.7.7. Porte de arma e homicídio: Sobre essa matéria, duas correntes merecem destaque: 1ª Corrente: haverá sempre concurso de crimes uma vez que os crimes têm momentos consumativos diferentes e objetividades jurídicas distintas. São sempre considerados crimes autônomos. Nesse sentido é o entendimento do TJSP. 2ª Corrente: se o porte foi praticado exclusivamente para a execução do homicídio, fica absorvido pelo homicídio. Já se o agente porta ilegalmente a arma e eventualmente comete o homicídio com ela, há concurso material de crimes. Essa é a corrente majoritária. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 12 Ex. infrator é agredido em um bar, vai até sua casa, pega a arma, volta e mata o agressor o crime de porte fica absorvido pelo homicídio. Se o indivíduo vai todos os dias ao bar, portando ilegalmente a arma e em determinado dia, se desentende e mata alguém nessa hipótese houve concurso material de porte ilegal + homicídio. 8.7.8. Posse ou porte simultâneo de duas ou mais armas: Nessa hipótese, tratando-se de armas da mesma espécie, ou seja, todas permitidas ou todas proibidas, há duas correntes: 1ª Corrente: haverá tantos crimes quantas forem as armas. 2ª Corrente: há crime único pois a situação de perigo gerada é uma só. O número de armas será considerado na dosagem da pena. Essa segunda corrente é amplamente majoritária. No caso em que as armas são de espécies diferentes – uma permitida e uma proibida – haverá concurso de crimes: artigos 12 + 14 ou 12 + 16 ou 14 + 16. Isso é o que acaba de decidir o STJ no HC 161.876 julgado em 12.08.2010 (houve reconhecimento de concurso entre os arts. 12 e 16). 9. Análise do art. 15 – Disparo de arma de fogo Disparo de arma de fogo Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável. (Vide Adin 3.112-1) 9.1. Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, podendo o crime ser praticado por qualquer pessoa. 9.2. Sujeito passivo: O sujeito passivo é a coletividade 9.3. Condutas puníveis: É disparar arma de fogo ou acionar munição. O tipo penal pune o disparo e o acionamento de munição sem disparo. Ex. infrator aciona a munição (efetua o movimento do disparo) e esta falha (picota). 9.4. Elemento espacial do tipo penal: Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 13 O elemento espacial do tipo penal está na expressão “em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela” Se o disparo não ocorrer em via pública ou em direção a ela; ou em local habitado não é crime. O crime de disparo de arma de fogo é crime de perigo abstrato, o que significa dizer que o disparo deve ocorrer nesses lugares, mas não precisa gerar perigo concreto, real e efetivo a ninguém. Ex. o agente às 4 horas da manhã em uma rua vazia, efetua o disparo. A quantidade de disparos será considerada na dosagem da pena, o que quer dizer que a quantidade de disparos não gera mutiplicidade de crimes. 9.5. Elemento subjetivo: O elemento subjetivo é o dolo, o que quer dizer que o disparo culposo é atípico. 9.6. Consumação e tentativa: A consumação dá-se com o mero disparo ou acionamento da munição, observando-se que a tentativa é perfeitamente possível, embora de difícil configuração prática. Ex. o infrator é desarmado quando vai efetuar o disparo. O disparo de arma de fogo é crime subsidiário, ou seja, somente se aplica desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime. De acordo com a letra da lei o art. 15 não se aplica se o disparo tenha por finalidade a prática de crime menos grave ou mais grave. Isso porque o art. 15 não diz que seja necessário a prática do crime mais grave. Apenas há menção afirmando que deva ser outro crime. Diz a doutrina que o crime menos grave não pode absorver o crime mais grave, ou seja, o crime mais grave não pode absorver crime menos grave. Em face disso, a doutrina diz que se for disparo com a finalidade de cometer homicídio, o disparo fica absorvido. Na hipótese em que o disparo tenha finalidade de lesão grave, gravíssima ou se ocorrer lesão seguida de morte, o disparo é absorvido. Já se for disparo e crime de lesão leve, a lesão não pode absorver o disparo, havendo dois entendimentos na doutrina: 1ª Corrente: o agente responde apenas pelo disparo, que é o crime mais grave 2ª Corrente: o agente responde pelo disparo + a lesão leve. Não há, atente-se entendimento majoritário vez que a questão é abordada apenas por Capez e Nucci, mas o fato de que a lesão leve não poder absorver o disparo é pacífico. *Crime de disparo + art. 132, CP: Na hipótese em que há o disparo e o delito do art. 132 (perigo para vida ou a saúde de outrem), temos que o disparo é crime subsidiário, assim como o é o art. 132 do CP. Nessa situação, o disparo é o crime mais grave e a questão é solucionada da seguinte forma: o crime do art. 132 não pode absorver o crime de disparo pois é menos grave que aquele. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 14 Daí que será o agente responsável pelo disparo ou por ambos os crimes, de acordo com a doutrina, não podendo haver a absorção do crime de disparo pelo de perigo. *Porte ilegal de arma permitida (art.14) + Disparo: o porte ilegal de arma permitida tem a mesma pena do crime de disparo: daí que, ou o agente responde apenas pelo disparo, ou por ambos os crimes, de acordo com a doutrina. *Porte de arma proibida + disparo: o crime de porte de arma proibida é mais grave e aqui prevalece que o agente responderá apenas pelo crime de porte ilegal de arma proibida, que absorve o disparo. 10. Análise do art. 16 – Posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito: Posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: I – suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato; II – modificar as características de arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a arma de fogo de uso proibido ou restrito ou para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a erro autoridade policial, perito ou juiz; III – possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar; IV – portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado; V – vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança ou adolescente; e VI – produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo. Aqui, o mesmo dispositivo pune tanto a posse como o porte de arma de uso restrito e em razão disso, alguns entendem que esse artigo ofende o princípio da proporcionalidade uma vez que trata de condutas de gravidades diferentes, com a mesma pena. Nesse ponto, é necessário aplicar todas as informações ditas quanto aos crimes de posse (art. 12) e porte (art. 14) com apenas uma diferença, que é o objeto material. Nos artigos 12 e 14, o objeto material é arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido. Já no art. 16, os objetos são: ARMAS DE FOGO, ACESSÓRIOS OU MUNIÇÃO DE USO RESTRITO OU PROIBIDO. Assim, temos que: Arma, acessório, munição permitida: a posse configura o crime do art. 12 e o porte, o crime do art. 14. Arma, acessório, munição de uso proibido ou restrito: a posse ou o porte configuram o delito do art. 16. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 15 Nos termos do art. 3º, XVIII do Dec. 3665/05; arma de uso restrito: é arma que só pode ser utilizada pelas Forças armadas, por algumas instituições de segurança e por pessoas físicas e jurídicas habilitadas devidamente autorizados pelo Exercito e de acordo com legislação específica. Segundo o art. 3º, LXXX: Arma de uso proibido: a antiga designação de uso proibido é dada aos produtos controlados pelo Exercito designados como “de uso restrito” Trata-se pois de norma penal em branco heterogênea. 10.1. Conduta punível: Trata-se de tipo misto alternativo, ou seja, a prática de várias condutas, no mesmo contexto fático, configura crime único. 10.2. Parágrafo único do art. 16: Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: I – suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato; II – modificar as características de arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a arma de fogo de uso proibido ou restrito ou para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a erro autoridade policial, perito ou juiz; III – possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar; IV – portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado; V – vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança ou adolescente; e VI – produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo. O art. 16, caput somente tem como objeto material, arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, mas o p. único tem como objeto material tanto arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido como de uso proibido/restrito, tratando-se de tipo penal autônomo em relação ao caput e isso é pacífico na doutrina e jurisprudência. Nesse sentido, STJ, Resp. 918.867/RS. O Inciso I pune aquele que faz a supressão ou alteração da marca, numeração ou sinal identificador da arma de fogo ou artefato, sendo que “artefato” é sinônimo de acessório. O inciso IV pune aquele que porta, possui, etc... a arma de fogo já raspada ou adulterada, atentando-se que o inciso IV não menciona “artefato”. Ex. A raspa a numeração da arma e vende para B que utiliza A responde pelo art. 16, p. único, I e B pelo inciso IV. Obs.: se o autor de ambas as condutas for a mesma pessoa, haverá crime único. O inciso II exige uma finalidade específica que é tornar a arma de fogo equivalente a arma de uso proibido ou restrito. Ex. alterar cano de arma de calibre permitido para proibido. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 16 Aqui está a prova de que p. único se aplica também para as armas de uso permitido pois somente se pode transformar arma de uso permitido em arma de uso proibido ou restrito. Outra finalidade específica é modificar as características da arma para induzir em erro autoridade policial, perito ou juiz. O inciso II prevalece sobre o crime de fraude processual do art. 347 do CP. É necessário observar ainda que se a finalidade for induzir em erro o MP, por exemplo, em investigação conduzida pelo membro do MP, o fato é atípico. Isso porque o tipo penal não menciona MP. Esse crime se consuma com a simples modificação, ainda que a finalidade não seja alcançada. A tentativa é perfeitamente possível. O inciso III pune a posse, detenção ou emprego de artefato explosivo ou incendiário, sem autorização. Aqui não se tem mero artefato, mas sim artefato explosivo ou incendiário. Ex. bomba caseira, granada. Atente-se que esse inciso III derrogou o art. 253 do CP, na parte em que trata de artefato explosivo ou incendiário. No que tange ao inciso V é necessário observar que sua redação é idêntica à do art. 242 do ECA, o que faz crer que o art. 242 do ECA fora derrogado (revogação parcial), vez que, de acordo com a doutrina, o art. 242 do ECA continua aplicável no que se refere às armas brancas, sejam próprias (criado com a finalidade de arma – ex. soco inglês) ou impróprias (objeto que possa ser utilizado como arma – ex. faca de cozinha). Assim, entregar dolosamente revólver a uma criança se enquadra no inciso V do Estatuto do Desarmamento. Já entregar uma faca de cozinha ou soco inglês é crime do art. 242 do ECA. Relativamente ao inciso VI, é necessário indagar se aquisição de arma de fogo raspada implica em receptação. E a resposta é positiva, desde que a arma seja produto de crime. Ex. agente sabe que a arma raspada é produto de crime e começa a portá-la. Haverá a prática dos dois crimes, em concurso material. Isso porque possuem objetividades jurídicas distintas e momentos consumativos diferentes. Isso foi o que decidiu o STJ no Ag. Reg. no Resp. 908.826/RS. O porte ilegal não absorve a receptação e, além disso, há concurso material entre os crimes. 11. Análise do art. 17 – Comércio ilegal de arma de fogo: Comércio ilegal de arma de fogo Art. 17. Adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, adulterar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. Parágrafo único. Equipara-se à atividade comercial ou industrial, para efeito deste artigo, qualquer forma de prestação de serviços, fabricação ou comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência. 11.1. Sujeito ativo do crime: Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 17 O sujeito ativo somente pode ser comerciante ou industrial de arma de fogo, acessório ou munição legal ou clandestino. O crime é próprio quanto ao sujeito passivo. Se o indivíduo vende arma ilegal na lojas de arma de um shopping ou no fundo de sua casa, ambos respondem pelo art. 17 do Estatuto. 11.2. Sujeito passivo: O sujeito passivo do crime é a coletividade. 11.3. Conduta punível: Esse crime é de conduta múltipla ou variada – tipo misto alternativo. Daí que, prevendo diversos núcleos verbais a prática de vários deles em um mesmo contexto fático configura crime único. 11.4. Objeto material: O objeto material do crime é arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido ou de uso proibido. Ex. comercializar ilegalmente revolver 38 e metralhadora é o mesmo crime. Sucede que, se for arma de fogo de uso proibido ou restrito, a pena é aumentada da metade, nos termos do art. 19 do Estatuto. 11.5. Consumação e tentativa: A consumação se dá com a prática de qualquer das condutas do tipo penal. A tentativa é possível. Ex. tentar adquirir ilegalmente uma arma de fogo na condição de comerciante de arma de fogo. Indaga-se aqui se esse crime seria habitual ou não. E resposta é negativa. Esse crime não é habitual e uma única conduta configura o delito. Ex. comerciante da loja de armas vende 200 armas legalmente e uma arma ilegalmente. Obs.: comerciante de restaurante vende sua arma a um cliente do restaurante: o crime foi o do art. 14, se for arma permitida, ou o crime do art. 16, se for arma restrita. 12. Análise do art. 18: Tráfico internacional de arma de fogo Art. 18. Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente: Pena – reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. Direito Penal IV - Estatuto do Desarmamento Página 18 12.1. Condutas puníveis: Nas condutas de importar ou exportar, o crime é material e se consuma com a efetiva entrada ou saída do objeto do país. A tentativa é perfeitamente possível. Nas condutas de importar e exportar, o art. 18 prevalece sobre o crime de contrabando do art. 334 do CP. Nas condutas de favorecer a entrada ou saída, o crime é formal ou de consumação antecipada, ou seja, o crime se consuma com o simples favorecimento, ainda que o favorecido não consiga entrar ou sair do país com o objeto. A tentativa é possível. Nas condutas de favorecer a entrada e favorecer a saída, há absorção do art. 318 do CP. O crime do art. 318 do CP é crime funcional (praticado por funcionário público, praticado contra AP). Já o crime do art. 18 do Estatuto do Desarmamento não é crime funcional, o que significa dizer que, se um funcionário público facilita a entrada ou saída de armas do Brasil, ele responde pelo art. 18 do Estatuto do Desarmamento. O art. 18 do Estatuto do desarmamento é crime comum, podendo der praticado por qualquer pessoa. O elemento subjetivo é o dolo, a competência para julgamento é da Justiça Federal. O STJ já decidiu que não é possível a aplicação do princípio da insignificância em tráfico de armas e munições. Isso foi decidido no HC 45.099/AC. Obs.: A venda de arma de fogo configura qual crime? Depende. Se for uma venda entre não comerciantes: a) Art. 14 – permitida b) Art. 16 – proibida Já se a venda for por comerciante de armas, o comerciante pratica o art. 14, enquanto o comprador pratica ou o art. 14 ou o art. 16. Tratando-se de venda internacional, tanto o vendedor como o comprador respondem pelo art. 18 do Estatuto do Desarmamento. 13. Fiança e liberdade provisória; O p. ún. do art. 14, do art. 15 afirmavam que seria inafiançável o delito. O art. 20 afirma que os artigos 16, 17 e 18 falam do não cabimento de liberdade provisória. Mas tais dispositivos foram declarados inconstitucionais nos termos da ADI Os parágrafos relativos ao art. 14 e 15, em razão da aplicação do princípio da razoabilidade. Já o art. 20, o fundamento foi o estado de inocência.