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Pesquisa_sobre_religiosos_Incas

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS 
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA 
AMÉRICA COLONIAL 
 
 
 
 
ANÁLISE DA FONTE “ANTIGOS COSTUMES DO 
PERÚ, DESCRITOS PELO JESUÍTA BLAS VALERA” 
RELIGIOSOS ÍNDIOS 
 
 
 
Carlos Eduardo Nicolette – 8572793 
 
Prof.: Horácio Gutiérrez 
 
 
 
 
 
 
 
São Paulo 
2013 
Página | 2 
 
APRESENTAÇÃO ................................................................................. 3 
1. À ÉPOCA DA PRATA ........................................................................ 4 
1.1. Descrição do trecho “religiosos indígenas”................................................. 5 
2. AO CERNE INCA ............................................................................... 6 
2.1. Ayllus ............................................................................................................... 6 
3. BLAS VALERA E SUA IMPORTÂNCIA NA PRESERVAÇÃO 
CULTURAL INCA .................................................................................. 8 
4. CONCLUSÃO .................................................................................. 10 
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................ 11 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Página | 3 
 
APRESENTAÇÃO 
A leitura de fontes relativas ao mundo Incaico sempre revela aspectos 
interessantes, não apenas da religiosidade andina ou suas bases econômicas 
como também as figuras que, sobre o pesar de sua história, dedicaram-se a 
descrevê-la e defendê-la. 
O presente trabalho se dispõe a expor justamente este ponto, com a 
análise da fonte primária de Blas Valera, “Antigos costumes do Peru”, expondo 
de forma primária seu contexto, ideal, consequências e influências sobre a vida 
do autor e para a historiografia andina. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Página | 4 
 
1. À ÉPOCA DA PRATA 
A relação de informações sobre as sociedades pré-colombianas são, na 
maioria dos temas, raras. Não havendo então um corpo extenso de documentos 
para um maior conhecimento sobre seus aspectos mais inquietantes, como suas 
religiões (dizendo de melhor forma, o que a historiografia eurocêntrica chama de 
religião) ou mesmo suas relações de trabalho, pesquisas sobre esses temas são 
sempre de difícil desenvolvimento. Os grandes campos de informação advêm de 
mestiços
1
, que fizeram relatos sobre estas sociedades ainda no século (ou no 
período próximo) da conquista da América Espanhola
2
. 
Neste contexto, se destacam os escritos do jesuíta mestiço Blas Valera
3
, 
que tiveram grande influência sobre diversos autores, como outro mestiço, 
Garcilaso de la Vega
4. Blas, que escreve “Antigos Costumes do Peru” em 1580, 
começa o trecho de um de seus tópicos, “religiosos índios”5, da seguinte forma: 
 A solicitude demasiada em buscar ouro e prata com que os espanhóis 
entraram no Peru contribui para que nem mesmo nos princípios nem nos 
anos futuros se pudesse saber muitas coisas antigas da religião falsa
6
 (...) 
 Assim, o autor demonstra a clara intenção da dominação espanhola no 
Peru: a busca de metais preciosos, não importando os meios para tal.
7 
Visto que 
na chegada dos europeus a esta região da América houve grande deslumbre 
perante a riqueza inca
8
, não só a de minérios, mas a riqueza da quantidade de 
habitantes, das tecnologias observáveis nas edificações (moradias, templos, 
 
1
 No período, devido à pequena quantidade de mulheres europeias que iam para a América, a imensa maioria de 
mestiços eram de homens europeus com mulheres índias. No caso de Blas, a mãe era inca. 
 
2
 Comumente com esse nome, “América Espanhola”, “Nueva España”, mostra o que hoje é grande parte da 
América do Sul (excetuando o Brasil) e a América Central. É o nome encontrado para essa área em toda a 
bibliografia usada nesta pesquisa. 
3
 A vida e influência do autor serão vistas de forma aprofundada noutro capítulo deste mesmo trabalho. 
4
 Em sua principal obra, “Comentarios reales”, de la Vega faz referência em diversos momentos a Blas Valera. 
5
 SUESS, Paulo (org). La conquista espiritual de la América Española: 200 Documentos-Siglos. Editorial Abya 
Yala, 2002. p. 36-38. 
6
 O trecho em castelhano é este a seguir: “La demasiada solicitud de buscar oro y plata con que entraron los 
españoles en el Pirú, fué parte para que ni áun á los principios ni en los años venideros se pudiesen saber muchas 
cosas antiguas de la religion falsa de los peruanos”. Ibid. p.36 
7
 GEBRAN, Philomena. Etnicidade e ocidentalismo na serra e costa peruanas. História: Fronteiras, XX 
Simpósio Nacional da ANOUH. Florianópolis, 1999. p. 711-712. 
8
 . Ibid. p. 711. 
Página | 5 
 
etc.), na irrigação, metalurgia ou mesmo produtos têxteis.
9
 Nada mais óbvio do 
que o fascínio e a facilidade de riquezas levarem o colonizador a explorar cada 
vez com mais intento o novo mundo. 
 
1.1. Descrição do trecho “religiosos indígenas” 
Para uma melhor compreensão do eixo central de “religiosos índios”, um 
maior aprofundamento contextual é importante. 
O texto citado de Valera vem introduzido num documento maior, onde se 
divide em três subtítulos principais: Ministros maiores, Adivinhos, Sacrifícios 
(dentro deste se inserem Humu, Religiosos índios e Acclas virgens)
10
. O autor 
demonstra no documento ter muitas informações da cultura inca, destacando 
pontos importantes dos costumes andinos, dando nomes específicos para as 
funções de destaque na sociedade, como os políticos e religiosos. 
Blas Valera escreve, como veremos mais a frente, seu conhecimento e 
suas opiniões sobre os incas num difícil entrelace entre sua educação cristã e 
sua origem inca
11
. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
9
 . BETHELL, Leslie (org). América Latina Colonial, vol I. Trad. Maria Clara Cescato. São Paulo: Edusp,1997. 
(col. História da América Latina). p. 66. 
10
 . SUESS, Paulo (org). La conquista espiritual de la América Española: 200 Documentos-Siglos. Editorial 
Abya Yala, 2002. p. 36-43. 
11
 . HYLAND, Sabine. The jesuit and the incas: the extraordinary life of Padre Blas Valera. Michigan: 
University of Michigan Press, 2003. p. 9-31. 
Página | 6 
 
2. AO CERNE INCA 
A pesquisa em torno das civilizações pré-colombianas suscita 
pesquisadores, seja pela curiosidade que elas incitam ou mesmo pelos mitos que 
as rodeiam
12
. 
O império Inca ocupava no período da conquista espanhola
13 
cerca de 
4300 km de extensão, que iam do norte de onde se localiza hoje o Equador, ao 
sul do Chile
14.
 Assim, as dificuldades para a sobrevivência de tão vasto império 
são enormes, não apenas por sua dimensão, mas também por sua localização 
nos Andes Centrais
15
.
 
Mas ao contrário do que poderia se esperar por essas 
dificuldades, os Incas tinham para lidar com isso um alto nível de tecnologia e 
organização
16
. 
Um dos maiores feitos dessa sociedade é, sem dúvida, o uso de técnicas 
agrárias baseadas no conhecimento dos astros. O ano inca era dividido 12 
meses, cada um comportando uma série de atividades rituais desenvolvidas em 
todas as regiões do império
17
. 
 
2.1. Ayllus 
A unidade de reprodução social e produção agrícola era o Ayllu, uma 
formação de famílias ligadas por parentesco, cuja cada família recebia lotes de 
acordo com o número de membros que possuísse. Sua distribuição era rotativa e 
anual, assim os privilégios que o usufruto poderia causar eram impossibilitados.
17
 
O trabalho no ayllu era baseado na ajuda mútua entre famílias, e apenas 
após o matrimônio o individuo tinha autonomia para ser um membro efeito do 
ayllu. O chefe dos Ayllu era chamado de Kuraka e ele deveria organizar a 
 
12
 FERREIRA, Jorge Luiz. Incas e Astecas. Editoria Ática: São Paulo, 1888. p. 52 -53. 
13
 As fontes usadas para esse trabalho apontam que a entrada dos espanhóis nos Andes tenha sido em 1532. ver: 
BETHELL, Leslie (org). América Latina Colonial, vol I. Trad. Maria Clara Cescato. São Paulo: Edusp,1997. 
(col. História da América Latina). p. 63-64. 
14
 CONRAD, Geoffrey W. e DEMAREST, Arthur A. Religion and Empire: The dynamics of Aztec and Inca 
expansionismo .Cambridge University Press, 1988. p. 84. 
 
15
 Ibid. p. 84-85. 
16
 FEVRE, Henri. Civilização INCA. Trad. Maria Júlia Goldwasser. Ed. Jorge Zahar: Rio de janeiro, 2004. p. 
74-75. 
17
 FERREIRA, Jorge Luiz. Incas e Astecas. Editoria Ática: São Paulo, 1888. p. 40-41. 
Página | 7 
 
produção, distribuir a terra, assegurar o sustento do Ayllu, entre outras. Uma das 
discussões em torno do tema é que o Kuraka teria uma posição social 
diferenciada dos outros membros da comunidade, o que em certo ponto é 
verídico, pois ele acumulava bens, como alimentos e vestuário, o que não era 
permitido a outros membros do Ayllu
18
. 
Havia, no entanto, um Kuraka central, o qual estava no Ayllu dominante, 
coordenando as outras comunidades incas. Cabia a ele analisar as necessidades 
de cada grupo e distribuir a força de trabalho para cada Ayllu, velar pela 
segurança dela, e dependendo do necessário redistribuía a produção para a 
comunidade que mais precisasse
19
. 
O ayllu reconhecia também o líder denominado Waka, ancestral 
(geralmente) do Kuraka e na qual este se amparava para desempenhar sua 
autoridade. Na bibliografia sobre o Waka
20
, há uma predominância de textos 
escritos por missionários espanhóis, onde demonstram a clara intenção de 
destruir esse comando religioso, visto a importância dele perante a sociedade.
21
 
 
 
 
 
 
 
 
 
18
 Ibid. p.41 e 42. 
19
 FEVRE, Henri. Civilização INCA. Trad. Maria Júlia Goldwasser. Ed. Jorge Zahar: Rio de janeiro, 2004. p. 29-
33. 
20
 Ibid. p. 30-32. 
21
 Para um aprofundamento no tema Ayllu, ver: CONRAD, Geoffrey W. e DEMAREST, Arthur A. Religion and 
Empire: The dynamics of Aztec and Inca expansionismo .Cambridge University Press, 1988. p. 87-138. 
Página | 8 
 
3. BLAS VALERA E SUA IMPORTÂNCIA NA PRESERVAÇÃO 
CULTURAL INCA 
O jesuíta de origem inca, Blas Valera, nasceu em Levanto, Chacapoyas, 
Peru, no ano de 1550.
22
 Filho de Luis Valera (um dos conquistadores espanhóis) 
com a índia batizada Francisca Pérez
23
, que antes do batismo era Chacapoya
24
. 
Por ter nascido a menos de 20 anos da conquista espanhola sobre os 
incas, Valera teve chance de um maior conhecimento indígena. Logo as 17 anos 
ingressou na Companhia de Jesus, que aceitava ali um mestiço (algo novo para 
a época e local). Mas antes disso, Blas Valera já falava a língua nativa de sua 
mãe, o Quéchua
25
. Devido ao seu conhecimento Inca, tanto da língua, quanto da 
cultura, teve acesso a informações que influenciaram em seu pensamento 
indigenista
26
. 
Ele participou inclusive do III Concílio Limense
27
, como tradutor e revisor 
de Quéchua para os bispos e arcebispos presentes. Tornou-se então a 
referência na época em línguas nativas. 
Começou então a coletar dados sobre os incas, iniciando suas pesquisas 
sobre o que melhor conhecia, os Chacapoyas. Mas passou também a coletar 
dados entre os espanhóis, com um incrível sucesso, pois era “um mestiço bem 
educado e bilíngue”.28 Seus textos29 causaram na época “estranhamento” aos 
espanhóis e principalmente aos da Companhia de Jesus. Como o analisado 
neste trabalho, Religiosos Incas, em que se insere no contexto de dominação 
espanhola na área andina, insere críticas ao método de dominação espanhola, 
onde se privilegiou apenas os metais preciosos, sem nem mesmo imaginar a 
riqueza das culturas pré-colombianas. 
 
22
 HYLAND, Sabine. The jesuit and the incas: the extraordinary life of Padre Blas Valera. Michigan: 
University of Michigan Press, 2003. p. 11-21. E também, MINELLI, Laura Laurencich. La culpa del cronista 
peruano P. Blas Valera. Museo de America, Annales, nº7, 1999. p. 95-109. 
23
 Sua mãe adotou esse nome após ser batizada, como era chamada originalmente se desconhece. 
24
 . Os Chacapoyas eram chamados de “Guerreiros das Nuvens”, por cultivarem entre 2000m e 3000m de altura. 
25
 MINELLI, Laura Laurencich. La culpa del cronista peruano P. Blas Valera. Museo de America, Annales, nº7, 
1999. p. 96-97. 
26
 . Ibid. p.97. 
27
 Ocorrido ano de 1582, em Lima, no Peru. 
28
 HYLAND, Sabine. The jesuit and the incas: the extraordinary life of Padre Blas Valera. Michigan: University 
of Michigan Press, 2003. p. 74-75. 
29
 Blas Valera se destacou também com traduções para Quéchua. 
Página | 9 
 
Devido a seus comentários favoráveis aos Incas, foi acusado de heresia, e 
durante um pequeno período foi obrigado a sair da Companhia de Jesus.
30
 Com 
isso, vemos a grande influência dos textos denominados “indigenistas”31 em sua 
vida. 
Outro grande escritor “indigenista”, Garcilaso de la Vega, em seu escrito 
mais famoso, Comentarios Reales
32
, menciona Blas Valera. Conta de suas 
ideias, sua documentação e ações perante a preservação da história inca. 
A morte de Valera é um assunto ainda não resolvido pela historiografia. A 
forma melhor aceita pela historiografia e o citado na bibliografia deste trabalho 
mostra como local de sua morte a Espanha, em 1597, após um exílio devido 
suas acusações de heresia.
33
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
30
 HYLAND, Sabine. The jesuit and the incas: the extraordinary life of Padre Blas Valera. Michigan: 
University of Michigan Press, 2003. cap.5. 
31
 Denominação para escritores que defendiam os índios, ou mesmo criticavam as atitudes dos europeus perante 
a colonização. 
32
 DE LA VEGA, Garcilaso. Comentarios Reales. Madrid: Ed. Espasa-Calpe, décima edição, 1976. 
33
 HYLAND, Sabine. The jesuit and the incas: the extraordinary life of Padre Blas Valera. Michigan: University 
of Michigan Press, 2003. cap.2. 
Página | 10 
 
4. CONCLUSÃO 
Nota-se ao final a grande importância do jesuíta mestiço Blas Valera para 
o atual estágio do conhecimento sobre a cultura Inca. Religiosos Índios, 
documento aqui discutido, em muito demonstra a vontade e vida do autor: 
mostrar em língua europeia a história Inca, a memória de seus antepassados, e 
não deixar que todo aquele conhecimento se perca ali, por aquela dominação 
espanhola. 
Em todo o documento o jesuíta acena com seu conhecimento adquirido 
em Quéchua, e toda a inteligibilidade de seu ensino europeu, onde além de 
guardar a história dos povos pré-colombianos, também inspira outros autores ao 
mesmo, como já dito, o também mestiço de la Vega. 
À época da prata
34
 houve, como lembra Blas Valera, um forte contato com 
a cultura andina, e isso permitiu a ele o recolhimento de dados e outras 
informações com a população indígena, para a posterior escrita de seus 
documentos. Isso mostra o forte entrelace entre a cultura pré-colombiana que 
resistiu, a força da colonização no local e a persistência de um mestiço que 
influenciaram e influenciam até hoje a historiografia
de um povo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
34
 HYLAND, Sabine. The jesuit and the incas: the extraordinary life of Padre Blas Valera. Michigan: University 
of Michigan Press, 2003. cap.5. 
Página | 11 
 
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
BETHELL, Leslie (org). América Latina Colonial, vol I. Trad. Maria Clara Cescato. 
São Paulo: Edusp,1997. (col. História da América Latina). p.64-66 
CONRAD, Geoffrey W. and DEMAREST, Arthur A. Religion and Empire: The 
dynamics of Aztec and Inca expansionismo .Cambridge University Press, 1988. 
p. 84. 
DE LA VEGA, Garcilaso. Comentarios Reales. Madrid: Ed. Espasa-Calpe, 
décima edição, 1976. 
FERREIRA, Jorge Luiz. Incas e Astecas. Editoria Ática: São Paulo, 1888. p. 40-
41 e p. 52 -53. 
FEVRE, Henri. Civilização INCA. Trad. Maria Júlia Goldwasser. Ed. Jorge Zahar: 
Rio de janeiro, 2004. p. 29-33 e p. 74-75. 
GEBRAN, Philomena. Etnicidade e ocidentalismo na serra e costa peruanas. 
História: Fronteiras, XX Simpósio Nacional da ANOUH. Florianópolis, 1999. p. 
711-712. 
HYLAND, Sabine. The jesuit and the incas: the extraordinary life of Padre Blas 
Valera. Michigan: University of Michigan Press, 2003. 
MINELLI, Laura Laurencich. La culpa del cronista peruano P. Blas Valera. Museo 
de America, Annales, nº7, 1999. p. 96-97. 
SUESS, Paulo (org). La conquista espiritual de la América Española: 200 
Documentos-Siglos. Editorial Abya Yala, 2002. p. 36-43.

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