Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original
* * * PARASITOLOGIA MÉDICA 12. CESTÓIDES: As teníases Luís Rey Fundação Oswaldo Cruz Instituto Oswaldo Cruz Rio de Janeiro Complemento multimídia dos livros “Parasitologia” e “Bases da Parasitologia”. Para a terminologia, consultar “Dicionário de termos técnicos de Medicina e Saúde”, de * * * Cestóides parasitos do homem * * * OS CESTÓIDES As tênias pertencem à classe Cercomeridea, subclasse Cestodaria, que compreende animais com o corpo achatado e em forma de fita - o estróbilo - que é segmentado (os segmentos são as proglotes) e dotado de uma região anterior – o escólex (a), provido de orgãos de fixação variados. A este, segue-se uma zona de crescimento (b), as proglotes jovens (c), as maduras (d) e as grávidas (e). Suas estruturas decorrem de uma estrita adaptação à vida parasitária, com ausência dos sistemas digestório, circulatório e respi-ratório. Possuem um sistema nervoso simples e um sistema excretor. São hermafroditas, cada proglote tendo um conjunto completo de órgãos reprodutores, e seus ovos contêm larvas (oncosferas) dotadas de 6 acúleos. Duas ordens têm interesse médico: Cyclophyllidea e Pseudophyllidea. * * * OS CESTÓIDES O estróbilo compreende toda a parte do corpo que se segue ao escólex e à região de crescimento (colo) do cestóide. Nele estão demarcados os anéis ou proglotes, que crescem e se diferen-ciam à medida que se afastam do colo. Distinguem-se as proglotes jovens, que apresentam apenas esboços dos órgãos reprodutores; as proglotes ma-duras com esses órgãos completamente formados e as grávidas, cujo útero bem desenvolvido está repleto de ovos. Escólex de um cestóide provido de 4 ventosas e de uma coroa de acúleos. Os cestóides variam muito de tamanho, desde alguns milímetros até 10 metros ou mais de comprimento. No verme adulto, o escólex é uma pequena dilatação, situada na extremidade mais delgada do helminto, e destinada a fixá-lo no intestino do hospedeiro por meio de estruturas como acúleos, ventosas, bótrias ou botrídeas. * * * OS CESTÓIDES O tegumento dos cestóides, por onde se dão todas as trocas nutritivas e metabólicas, é complexo. A superfície apresenta microvilosidades ou microtríquias (A) derivadas da membrana (B) que reveste externamente o tegumento sincicial e anucleado (A-F), aumentando-lhe a superfície de contacto com o exterior. Nele são vistos vacúolos (C), vesículas (D), algumas com material electrondenso (E), mitocôndrias e a membrana basal (F). Abaixo do tegumento encontram-se músculos circu-lares (G), longitudinais (I) e transversos (J). Células profundamente situadas (O) ligam-se ao tegumento por pontes citoplásmicas (H). Estas células, muito irregulares e ramifica-das, contêm inclusões lipídicas (K), retículo endoplásmico (L), aparelho de Golgi (M) e mitocôndrias (N), em seu corpo celular (O), além do núcleo (P) e de reservas de glicogênio (Q). Tegumento de pseudo-filídea (Smyth, 1969) A B C D E F G H I J K L M N O P Q * * * OS CESTÓIDES Os órgãos masculinos amadurecem primeiro (pro-tandria), sendo constituídos por testículos (c), canais eferentes e um deferente (d), que termina no cirro, envolvido pela bolsa do cirro (e) e se abre no átrio genital (f). Os femininos compreen-dem um ovário simples ou bilobado (h), oviduto e oótipo (i), de onde partem o tubo uterino (b), o canal das glândulas vitelinas (j) e a vagina (g), que também se abre no poro genital. Estrutura de uma proglote madura * * * Os cestóides como parasitos HABITAT E NUTRIÇÃO Na fase adulta, os cestói-des do homem habitam quase que exclusivamente o tubo digestivo dos hospedeiros. Como não possuem tubo di-gestivo próprio, todas as tro-cas nutritivas do helminto são feitas através do tegumento, mergulhado na luz intestinal, seja por simples difusão, por transporte ativo ou por pinocitose. Algumas espécies ficam com o escólex inserido entre as vilosidades, onde se cria uma interface mais íntima parasito-hospedeiro, rica em O2 e indispensável para a maturação de Echinococcus, p. ex. Escólex de Echinococcus, inserido na mucosa do intestino de seu hospedeiro. * * * Os cestóides como parasitos CICLO BIOLÓGICO O que se denomina ovo, no caso dos Cyclophyllidea, é um embrião hexacanto - oncosfera - protegido por envoltórios ovulares, até que possa eclodir no interior de seu hospedeiro. Para isso, o envoltório externo ou embrióforo, precisa ser digerido pelas enzimas do hospedeiro e a larva, ativada pela bile. Essa larva deve romper o envoltório interno e penetrar na mucosa mediante a ação de seus 6 acúleos. Na mucosa torna-se um cisticercóide que, após algum tempo, abandona a mucosa e se transforma em verme adulto, na luz do intestino. Hymenolepis nana Hymenolepis diminuta Taenia solium * * * Os cestóides como parasitos Os cestóides costumam ser heteroxenos, isto é, necessitam de dois ou mais hospedeiros em seu ciclo. Os Cyclophyllidea, como as tênias, exigem um só hospedei-ro intermediário, mas possuem cada qual seu tipo de larva: Dentre os Pseudophyllidea, os difilobótrios, utilizam pequenos crustáceos como 1º hospedeiro, para a larva procercóide; e peixes como hospedeiros da larva plerocercóide. Esta pode passar de um peixe a outro, sem alteração, quando um come o outro. Assim: * * * Formas larvárias dos cestóides As formas larvárias são encontradas nos hospedeiros intermediários, podendo ser do tipo: cestóides - policerco (E), vesícula com vários escólices no interior; - cenuro (F), grande vesícula com muitos escólices invaginados a partir da parede (desenho de uma parte do cisto); - hidátide (G), com escólices invaginados a partir de vesículas prolígeras geradas na parede do cisto (desenhado só em parte). - procercóide (A), como a 1ª larva de Diphyllobothrium, em crustáceos, que é sólida e com acúleos num apêndice; - plerocercóide (B), como a 2ª larva de Diphyllobothrium, em peixes; - cisticercóide (C), com o escólex invaginado e acúleos no apêndice; - cisticerco (D), com uma vesícula bem desenvolvida e o escólex invaginado; * * * Taenia saginata e Taenia solium * * * As tênias do homem A Taenia saginata (= Taeniarrhyncus saginatus), ou tênia do boi, e a Taenia solium, ou tênia do porco, são parasitos que na fase adulta têm o homem como único hospedeiro normal. Ambas são conhecidas popularmente como “solitárias” porque os indivíduos com teníase em geral só apresentam um exemplar do helminto em seu intestino. São vermes grandes, medindo a Taenia saginata de 4 a 12 metros de comprimento e tendo por hospedeiro intermediário o gado bovino. Estróbilo de Taenia saginata. O estróbilo inicia-se com um pequeno escólex (E) provido de 4 ventosas, seguido de uma região de crescimento (o colo) e das regiões de proglotes jovens, de proglotes maduras e de proglotes grávidas. Escólex da T. saginata As proglotes (ou ‘anéis da tênia’) vão se destacando uma a uma, na T. saginata (fenômeno dito apólise), ou em pequenas cadeias, na T. solium. Elas são eliminadas com as fezes do paciente. * * * A Taenia saginata Cada proglote madura (C), contêm, entre os canais excretores longitudinais (a), seu sistema reprodutor hermafrodita. Os órgãos femininos compreendem o útero mediano e longitudinal (b), ovário bilobado (h) formado por túbulos muito ramificados, situados na metade distal da proglote e cujo oviduto vai ao oótipo (i). Para trás dele há uma glândula vitelogênica (j) de forma achatada e também formada por túbulos ramificados. Ao oótipo vêm ter ainda o canal das glândulas vitelinas, o canal seminal que é continuação da vagina (g) e o útero. Os testículos são 300 a 400 pequenas massas disseminadas no parênquima central (c), cujos canais eferentes convergem para formar um deferente sinuoso (d) que se continua com o cirro, dentro da bolsa do cirro (e). Na proglote grávida (D), vê-se o útero com cerca de 13 a 20 ramificações, em geral dicotômicas, e cheio de ovos. Nessa fase, o restante dos órgãos sexuais sofreu atrofia. * * * A Taenia saginata Suas proglotes saem ativamente pelo ânus, graças a uma eficiente muscula-tura, ou são eliminadas com as fezes do paciente (A), em número de 8 a 9 proglotes por dia. Então, pelas superfícies de apólise (sem tegumento) os fundos dos sacos uterinos fazem hérnia e se rompem, podendo liberar 40 a 80 mil ovos por proglote (B). Esses ovos disseminados pelo solo, são ingeridos, com o pasto, por bovinos. Sob a ação das enzimas proteolíticas e da bile, as oncosferas eclodem no tubo digestivo dos animais, invadem a mucosa e vão, pela circulação, para a muscula-tura ou para outros lugares, onde se transformam em cisticercos (C). Isso constitui a cisticercose animal. Quando as pessoas comem a carne de gado crua ou mal cozida, os cisticercos (D) são liberados no tubo digestivo, desenvaginam os escólex, fixam-se à mucosa e crescem como tênias adultas. Ciclo de T. saginata * * * Taenia solium Os formas adultas de T. solium só foram encontradas, até agora, no organismo humano e suas larvas vivem normalmente na musculatura de suínos. Popularmente é conhecida como tênia do porco. O estróbilo pode medir de 1,5 a 5 metros. O escólex (A) implanta-se no início do jejuno por meio de suas 4 ventosas e de seu rostro armado com dupla coroa de acúleos em forma de foice (B). Diariamente pequenos segmentos da cadeia, formados em média por 5 proglotes maduras, desprendem-se e são eliminados com as fezes. Cada proglote contém de 30 a 50 mil ovos (C). Elas diferem das de T. saginata por serem menores, mais curtas e terem poucas ramifi-cações uterinas, com aspecto dendrítico (D). Os ovos medem de 30 a 40 µm, não sendo distinguíveis dos de T. saginata. A, escólex; B, acúleos do círculo superior e do infe-rior; C, ovo; D, proglote madura com o aspecto dendrítico característico da T. solium. * * * Ciclo da Taenia solium Devido a seus hábitos coprófilos, os porcos costumam infectar-se maciçamente ao ingerir as proglotes desta tênia. Os cisticercos que se formam nos tecidos do deste animal são um pouco maiores que os da T. saginata (pois medem de 5 a 20 mm) e após 60 a 75 dias já são infectantes para o homem. Os cisticercos podem manter-se viáveis, no porco, por muitos anos. * * * Ciclo da Taenia solium A infecção humana decorre do consumo de carne de porco crua ou mal cozida. O parasito evolui no intestino como o faz a tênia do boi. Após algum tempo (60 a 75 dias depois da infecção), os pacientes infectados com a Taenia solium adulta, começam a eliminar pas-sivamente, de mistura com as fezes, pequenas cadeias de proglotes. Se os movimentos anti- peristálticos levarem alguma proglote para o estômago do paciente, ela será digerida, aí, deixando em liberdade os milhares de ovos que contém. Ao voltarem para o intes-tino, esses ovos liberam as oncosferas, sob a ação das enzimas proteolíticas e da bile. Em conseqüência, produ-zem uma infecção maciça do organismo humano com cisticercos: é a cisticercose humana grave ou ladraria. * * * As teníases humanas Geralmente, uma única tênia habita o intestino do paciente. O parasitismo múltiplo varia, segundo diferentes autores, entre 2 e 12% dos casos e é mais raro com a T. saginata. O fato é atribuído à imunidade específica con-comitante com a infecção. Eliminada a tênia, o paciente volta a ser suscetível. A teníase costuma ser assintomática. O paciente dá-se conta dela ao notar a expulsão ativa de proglotes (da T. saginata) que encontra na cama ou na roupa íntima, fora das evacuações. T. saginata causa sobre-tudo distúrbios da motri-cidade e das secreções digestivas, que ficam diminuídas em 70% dos casos. * * * As teníases humanas O período de incubação é, em geral, de dois a três meses. Depois, muitos pacientes se queixam de uma dor epigástrica, com caráter de ‘dor de fome’, e que simula a dor de úlcera duodenal, melhorando com a ingestão de alimentos. Inapetência e perda de peso são freqüentes; mas, em outros casos, o apetite está aumentado, com dores abdominais fugazes. Em um terço dos pacientes, as queixas são de dor abdominal, náuseas, astenia e perda de peso. Em outros há cefaléia, vertigens, cons-tipação intestinal ou diarréia e prurido anal. Eosinofilia (entre 5 e 35%) costuma estar presente. Pode haver apendicite, por penetração do parasito no apêndice, ou obstrução intestinal pela massa total da tênia. * * * As teníases humanas Clinicamente, o parasitismo humano pelos vermes adultos de Taenia solium é menos evidente que pela T. saginata, pois o estróbilo é menor e suas proglotes menos ativas. E por saírem estas passiva-mente de mistura com as fezes, podem passar despercebidas pelo paciente. O quadro clínico, quando presente, é semelhante ao produzido pela tênia do boi, sendo mais freqüentes as forma assintomáticas ou as benignas. As prevalências registradas são afetadas pela sub notifica-ção dos casos. A OMS (1995) estimou que, na América Latina, o número provável de pessoas expostas à infecção é de 30 a 50 milhões. A gravidade da Taenia solium está em poder o homem tornar-se ocasionalmente o hospedeiro de sua forma larvária – o cisticerco – que determina os quadros clínicos da doença denominada cisticercose huma-na (a ver na próxima aula). Donde a necessidade de um diagnóstico rápido da espécie de tênia que parasita um paciente e de seu tratamento imediato. Não há cisticercose humana atribuível à Taenia saginata. * * * Diagnóstico das teníases (1) A O diagnóstico é feito, muitas vezes, pelo próprio paciente ao observar a expulsão de proglotes. Quando elas saem entre as evacuações e são encontradas nos lençóis ou na roupa íntima, trata-se de T. saginata (A). As de T. solium (B) só saem passivamente, durante as evacuações e em geral formando cadeias com 3 a 6 segmentos unidos. Quando é o médico quem levanta a suspeita, deve-se buscar as proglotes nas fezes, para o que o bolo fecal será desfeito na água e tamisado em peneira de malhas finas. Para o diagnóstico de espécie, as proglotes serão comprimidas entre 2 lâminas de vidro grosso; o conjunto posto a clarear no ácido acético e, depois, examinado com lupa para ver as estruturas uterinas: - se com 15 a 30 ramos uterinos em cada lado da haste e aspecto dicotômico, é T. saginata (A). - se com 7 a 16 ramificações de cada lado e aspecto dendrítico, é T. solium (B). B Cuidado com o risco de infecção por T. solium ao manipular o material. * * * Diagnóstico das teníases (2) Nos 3 primeiros meses da infecção não se encontram proglotes nem ovos. Depois, os ovos podem ser encontrados no exame de fezes ou, melhor, pesquisados com a técnica da fita adesiva transparente. Os ovos chegam a ser abundantes na pele do períneo, onde as proglotes, exprimidas ao passar pelo esfíncter anal, deixaram sair muitos deles pelas superfícies de apólise. A fita gomada, montada sobre uma lâmina de microscopia (A) com a parte colante para fora (a) deve ser aplicada contra o ânus (B); e as nádegas comprimidas contra ela, para que os ovos situados na pele adiram. Colar depois a fita na lâmina (C) e examinar ao microscópio. O método só permite o diagnóstico de teníase, sem revelar a espécie e o risco, eventual, de cisticercose. Ovos de tênia aderidos à fita gomada, vistos ao microscópio. * * * Tratamento das teníases Várias drogas tenicidas, são usadas no tratamento : Niclosamida – Medicamento insolúvel na água e não absor-vível pelo intestino. Pratica-mente não apresenta efeitos colaterais. Tomar apenas líquidos, desde a véspera, e 2 gramas de niclo-samida de uma só vez em jejum (crianças tomam 1 a 2 gramas), mastigando bem os comprimi-dos. A taxa de cura fica em torno de 90%, dependendo do grau de micronização do produto. Praziquantel – Muito efetivo no tratamento das teníases; mas, por ser absorvível pelo intestino, é contra-indicado nos casos de cisticercose (que teriam seu quadro clínico agravado). Por essa razão, só se recomen-da contra T. saginata, na dose de 5-10 mg/kg de peso corporal. Sua eficácia é de 96% de curas. Mebendazol – Também usado só contra T. saginata, na dose de 200 mg, duas vezes ao dia durante 4 dias. As sementes de abóbora (200 a 400 gramas, sob a forma de decocto ou trituradas com mel, constituem um tratamento tenífu-go recomendado para crianças. Só a eliminação ou destruição do escólex assegura a cura. Por-tanto, se ele não for encontrado nas evacuações, aguardar cerca de quatro meses para ver se as proglotes não reaparecem, exigin-do novo tratamento. Cuidado: nenhum tratamento é ovicida. * * * T. saginata: epidemiologia (1) Sua distribuição é cosmopolita. Prevalências superiores a 10% ocorrem na África, na Região Mediterrânea, no Caucaso e na Ásia Central. Na América do Sul elas estão entre 0,1 e 10%. A incidência relaciona-se com o hábito de comer carne bovina crua ou mal cozida. Seja devido a preferências pessoais, seja pelo consumo de pratos tradicionais em que a carne não é cozida (como o bife tártaro, o quibe e o shish kebab). T. saginata incide mais entre pessoas com 20 a 40 anos de idade. Escapam do risco os vegetarianos, os que preferem peixes e aves e os que, por razões culturais, religiosas ou econômicas não consomem carne bovina. * * * T. saginata: epidemiologia (2) Os ovos atravessam incólumes o tubo digestivo desses transportadores e são amplamente dispersa-dos no meio ambiente com suas fezes. Nas pastagens assim poluídas, os ovos podem ficar viáveis por mais de quatro meses, e asseguram a contaminação do gado, mesmo em lugares situados longe das fontes de poluição humana. Pessoas com tênias constituem as únicas fontes de infecção. Elas podem eliminar cerca de 700 mil ovos do parasito por dia. A dispersão desses ovos resulta do hábito de defecar no chão, em várias circuns-tâncias. Isso permite a dissemina-ção dos ovos por moscas e insetos coprófilos, pelas aves (como as gaivotas, gralhas, pardais etc.) ou por minhocas, que são comidas pelas aves. * * * T. saginata: epidemiologia (3) A resistência dos ovos no meio é tão grande que suportam até o tratamento habitual dos esgotos. Isso permite que os efluentes e os lodos ativados secos, usados como adubo, ou as aves que se nutrem nos leitos de secagem das estações de tratamento, transportem os ovos para longe. Os rios, que recebem esgotos não-tratados ou os efluentes tratados, assim como suas águas, utilizadas para irrigação, podem conter ovos de tênia, contaminando as pastagens, o feno etc. Ciclos vitais das tênias: T. solium (a) e T. saginata (b), passando das fontes de infecção humana (A) para os hospedeiros intermediários (B) e vice-versa. (Modifi-cado de Piekarski, 1962) * * * T. solium: epidemiologia (1) Ocorre no mundo todo, sendo mais freqüente onde se consome carne de porco crua ou mal cozida. As maiores incidências são encontradas na Améri-ca Latina, nos países não-mussulmanos da África e do Sudeste Asiático. Elas dependem das más condições higiênicas pre-valentes e do nível sócio-econômico dos pacientes, pois cada um elimina 5 ou 6 proglotes por dia, com cerca de 50 mil ovos por proglote. Depende, também, das circunstâncias em que os porcos são criados. Se permanecem livres no peridomicílio, por exemplo, isso facilita sua infecção com as fezes humanas que contaminem o terreno. A falta de inspeção nos matadouros e o abate clandestino ou doméstico possibilitam a transmis-são da infecção do porco aos consumidores de sua carne. * * * T. solium: epidemiologia (2) Quando a infecção é introduzida em uma região, tende a tornar-se hiperendê-mica. A razão está na facilida-de com que os porcos se infectam intensamente (coprofagia) e pela grande longevidade (anos) dos cisticercos nos tecidos do animal vivo. Os cisticercos permane-cem infectantes 10 a 15 dias nas carnes conserva-das a 10ºC e dois meses entre 0 e 4ºC. Entretanto, as prevalên-cias reais desta teníase são mal conhecidas. A razão está nas dificul-dades práticas encontradas para diagnosticá-la. Em particular pela se-melhança entre os ovos de Taenia solium e os de Taenia saginata. Mas, também, pela falta de sintomas na generalida-de dos pacientes, exceto nos casos graves de cisticercose. * * * Controle das teníases Os inquéritos epidemiológicos devem mostrar, previamente, a prevalência e a distribuição da infecção no gado e na popula-ção humana. Nos matadouros, a inspeção deve registrar a proveniência dos animais infectados e conde-nados. Os novos medicamentos e as técnicas modernas de criação, sobretudo de porcos, mais as medidas de controle adotadas reduziram consideravelmente as teníases e praticamente elimina-ram a T. solium e a cisticercose nos países da Europa, EUA, Canadá etc. Os procedimentos adotados foram principalmente: 1. Legislação regulamentando a notificação dos casos, a inspec-ção do gado abatido nos mata-douros e proibindo o abate clandestino. 2. Exame periódico dos que trabalham na indústria da carne. 3. Exigência de instalações sanitárias em matadouros, fazen-das de gado, restaurantes, locais de turismo e de camping, para evitar a poluição ambiental. 4. Melhoria do saneamento e correção das deficiências nos sistemas de esgotos. 5. Técnicas de criação seguras. 6. Educação para o consumo da carne bem cozida e para adoção de bons hábitos higiênicos. * * * Outras teníases humanas Hymenolepis nana Hymenolepis diminuta Dipylidium caninum Diphyllobothrium latum * * * Hymenolepis nana (1) Os cestóides da família Hymenolepididae são tênias de tamanho pequeno ou médio, cujo escólex apresenta um rostro armado de acúleos ou não (B, C, D) e as proglotes têm 3 ou 4 testículos. As larvas são cisticercói-des. Hymenolepis nana (ou tênia anã) é parasito do intestino humano. Mede 2 a 10 cm de comprimento (A) e o escólex (B) possui uma coroa de pequenos acúleos no rostro. As numerosas proglotes (D) são mais largas do que longas, com o poro genital sempre do mesmo lado. Hymenolepis nana: A, um estróbilo; B, escólex; C, ovo. D. uma proglote: a, ovário; b, glândula vitelina; c, testículo; d, canal deferente; e, bolsa do cirro; h, receptáculo seminal; f, poro genital; g, vagina. C D * * * Hymenolepis nana (2) No intestino, a oncosfera eclode dos ovos ingeridos e invade a mucosa, onde se transforma em cisticercóide. Após 10-12 dias, volta à luz intestinal e migra para o íleo onde cresce como verme adulto. O ciclo de ovo a ovo completa-se em 1 mês e a longevidade da tênia é de poucos meses. A infecção é maior em crianças que em adultos, parecendo que a resistência aumenta depois da puberdade. Os anticorpos, que são produzidos na fase de cisticercóide, perdem sua efetividade 5 a 6 meses depois da cura. Os ovos são abundantes nas fezes, têm forma oval, 2 membranas separadas por um espaço ocupado por filamentos polares; dentro está a oncosfera (seta). Medem 40-50 µm. O ciclo é monoxeno: os ovos passam de uma pessoa a outra, ou dá-se uma auto-infecção. * * * Hymenolepis nana (3) Os distúrbios gastrintes-tinais só aparecem quando os parasitos são muitos e, em geral, nas crianças menores de 10 anos. Anorexia, emagrecimen-to, inquietação e prurido, são as manifestações mais freqüentes. Nas formas graves, há congestão e ulcerações da mucosa, diarréia, dor ab-dominal, náuseas e vômitos e, até mesmo, um quadro toxêmico. O diagnóstico é feito pelo exame de fezes, a repetir se negativo. Tratamento Administrar praziquantel, dose única de 25 mg/kg de peso. Ou com niclosamida, dose única de 2 gramas. Em ambos os casos, como os cisticercóides não são afetados por essas drogas, há que repetir o tratamento mais 1 ou 2 vezes com 2 semanas de intervalo. * * * Hymenolepis nana (4) Epidemiologia e controle É doença cosmopolita, preva-lente em regiões temperadas ou subtropicais. No Brasil, os estados sulinos são os mais atingidos, e as zonas urbanas mais que as rurais. Crianças entre 2 e 8 anos são em geral as mais parasitadas. Os ovos têm vida curta no exterior, sendo esta uma doença das mãos sujas. As fontes de infecção pare-cem limitadas aos seres humanos, visto que a H. fraterna (com igual morfologia), encon-trada em ratos e camundongos, não infecta as pessoas. A auto-infecção externa ou in-terna contribui para as altas cargas parasitárias observadas. Pequenos coleópteros do gêne-ro Tribolium que vivem na farinha, podem servir de hospedeiros in-termediários albergando os cisti-cercóides. No laboratório, estes infectam animais sem desenvolver imuni-dade. Donde, intenso parasitismo por auto-infestação. A prevenção exige higiene rigo-rosa e tratamento periódico das crianças. Só usar alimentos de boa qualidade. * * * Hymenolepis diminuta H. diminuta ou “tênia do rato” é parasito heteroxeno de ratos e camundongos, com um ciclo vital que inclui como hospedeiros intermediários insetos e miriápodes. Sua importância médica é mínima, mas conta com abundante literatura científica por ser um modelo experimental para o estudo dos cestóides e das cestoidíases. O verme adulto mede 10 a 60 cm de comprimento e possui um escólex com 4 ventosas e rostro sem acúleos. As proglotes assemelham-se às de H. nana e os ovos são maiores (70-80 µm), sem filamentos entre as cascas. O parasitismo humano é raro, sendo devido à ingestão de alimentos (cereais) contendo pequenos artrópodes com cisticercóides. O número de vermes costuma ser pequeno e fácil de eliminar com qualquer tenicida, tenífugo ou purgativo. Prevenção: proteger os alimentos do contato com ratos e insetos; ou cozê-los bem. Combater os ratos. * * * Dipylidium caninum (1) É a tênia parasita de cães, gatos e outros canídeos e felídeos selvagens. Cestóide de tamanho médio que mede 20 a 40 cm de comprimento (mas podendo chegar a 70 cm), possui um escólex com 4 ventosas e rostro armado de pequenos acúleos (A). As proglotes maduras e grávidas são mais longas que largas (B), dotadas de um equipamento duplo e simétrico de órgãos reprodutores hermafroditas, com os poros genitais abrindo-se nas margens opostas. Cerca de 200 testículos dispõem-se entre as malhas de uma rede uterina que, nas proglotes grávidas, fragmenta-se em pequenos sacos cheios de ovos (C). Dipylidium caninum: A, escólex; B proglote madura; C, um de seus sacos ovígeros. C B A As proglotes são eliminadas em geral inteiras (lembram sementes de melão). Saem com as fezes ou ativamente e, no exterior, decompõem-se liberando os ovos. * * * Dipylidium caninum (2) Quando os ovos são ingeridos pelas larvas de pulgas ou pelo piolho do cão, formam cisticercóides. As pulgas adultas já contêm esses cisticercóides infectantes. Cães e gatos, ao ingerir os insetos, infectam-se em elevadas proporções. Mas os casos humanos são muito raros; a maioria ocorrendo nos EUA e na Europa, em crianças de baixa idade. Os parasitos, sendo em geral poucos, o quadro clínico é assintomático. Mas quando são muitos, há desconforto ou dor abdominal, diarréia, prurido anal e irritabilidade. Diagnóstico e tratamento, como nas outras teníases; não oferecem dificuldades. Para evitar o risco, tratar os animais e eliminar seus ectoparasitos ou, melhor, evitar a presença de cães e gatos onde houver crianças. * * * Diphyllobothrium latum (1) As dimensões do D. latum variam em geral de 3 a 10 metros com 3 a 4 mil proglotes; mas pode chegar a 15 m. Depois de um colo delgado e longo estão as proglotes jovens que fazem transição para as maduras e grávidas. Estas últimas constituem 4/5 do estróbilo, pois não há apólise nesta tênia. Diphyllobothrium latum O gênero Diphyllobothrium reúne cestóides habituais ou ocasionais do homem e de outros animais. Deles, o mais importante é Diphyllobothrium latum, conhe-cido também por botriocéfalo ou tênia do peixe. A doença é a difilobotríase. Ele é originário das regiões européias ao norte dos Alpes, tendo-se propagado para a Ásia e América do Norte e, depois, para as regiões andinas do Chile e da Argentina. No Chile e no Peru ocorrem casos devidos a Diphyllobothrium pacificum, cestóide que na fase adulta parasita focas e otárias. * * * Diphyllobothrium latum (2) Cada proglote produz cerca de um milhão de ovos diariamente, que saem de mistura com as fezes, murchando depois de algum tempo. Os demais órgãos (ovários, oótipo, vagina, útero etc.), encontram-se na região mediana, havendo um átrio genital (h) e um orifício de postura para os ovos, na linha média. B, Proglote madura: a) o ovário bilobado; b) a vagina; c) oótipo; d) glândulas vitelinas; e) canal osmorre-gulador; f) testículos; g) canal deferente; h) átrio genital; e i) útero sinuoso. O escólex tem como órgãos de fixação as pseudobotrídias (A), 2 dispositivos em forma de fendas) e com musculatura débil. Nas proglotes (B), os testí-culos são pequenas massas disseminadas nas regiões dorso-laterais (f), enquanto as glândulas vitelinas formam massas semelhantes situadas nas regiões ventro-laterais (d). B Escólex A * * * Diphyllobothrium latum (3) Quando um peixe ingere o crustáceo, a larva procercóide transforma-se, em 3 meses, em larva plerocercóide ou espargano (e, B), um organismo vermiforme, com escólex invaginado, que se instala nos tecidos do peixe e se manterá como tal toda vez que um peixe comer outro infectado. Os peixes carnívoros maiores vão, assim, acu-mulando as larvas dos menores. A longevidade das larvas é medida em anos. Ciclo vital de D. latum Os ovos (b) são operculados e embrionam se chegarem a águas bem arejadas de rios e lagos, em climas frios ou temperados, formando uma larva ciliada ou coracídio (c), com 3 pares de acúleos. Este nada até ser ingerido por um pequeno crustáceo (Cyclops ou Diaptomus) onde se torna uma larva procercóide (d, A) em 10-20 dias. * * * Diphyllobothrium latum (4) Só quando o peixe com espar-ganos for comido cru por uma pessoa ou por um mamífero que se alimente de peixes, a larva (já com 3-5 cm) evolui para verme adulto. No homem, o verme adulto se localiza de preferência no jejuno. O crescimento é rápido, sendo estimado em 30 proglotes novas por dia, até alcançar a maturi-dade ao fim de 3 semanas. Depois de um mês, já mede 1,5 metro de comprimento. Ele pode viver 10 a 30 anos. Em um mesmo indivíduo, só costuma desenvolver-se uma tênia; raramente mais de uma. A imunidade, além de concomi-tante, é temporária. O parasitismo pode ser assin-tomático ou apresentar o mesmo quadro que nas outras teníases. Podem ocorrer sintomas tóxi-cos ou obstrutivos. O aparecimento de anemia perniciosa é bem possível nesta doença, mas pouco freqüente. A razão está na grande capaci-dade do verme de absorver a vitamina B12 (cianocobalamina), deixando o organismo carente. * * * Diphyllobothrium latum (5) O diagnóstico é feito pelo en- contro de ovos de tamanho médio, operculados e não embrionados, que aparecem nas fezes dos pacientes em grande quantidade. O tratamento é feito com prazi-quantel ou niclosamida, como nas outras teníases. Nos casos de anemia, adminis-trar também vitamina B12 . Epidemiologia A difilobotríase tem seus princi-pais focos nos países Bálticos, de onde os imigrantes a espalharam pelo norte da Eurásia e da América do Norte. A intodução de peixes euro-peus (salmão, truta etc.) nos lagos andinos trouxe os parasitos para a América do Sul. O hábito de comer peixe cru ou mal cozido é outro fator de sua ocorrência, mesmo longe das áreas endêmicas. Nestas, os esgotos lançados nas águas sem tratamento são responsáveis pela intensidade da transmissão. As medidas de prevenção são óbvias. Ovo não embrionado da tênia do peixe, com opérculo em um dos pólos. Mede cerca de 60 x 45 µm. * * * LEITURAS COMPLEMENTARES ACHA, P.N. & SZYFRES, B. – Zoonosis y enfermedades transmi-sibles comunes al hombre y a los animales. 2a edição. Washington, Organización Panamericana de la Salud, 1997. OPAS/OMS - Relatório de uma Reunião de Consulta da OPAS/OMS sobre o Complexo Teníase/Cisticercose (Brasília, 1995). Washington, DC, OPAS, 1997. REY, L. – Bases da Parasitologia. 2a edição. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 2002 [380 páginas]. REY, L. – Parasitologia. 3a edição. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 2001 [856 páginas]. SMYTH, J.D. – The physiology of Cestodes. Edinburg, Oliver & Boyd, 1969.