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Como ao dinheiro não se pode notar o que se transformou nele, converte-se tudo, mercadoria ou não, em dinheiro. Tudo se torna ven- dável e comprável. A circulação torna-se a grande retorta social, na qual lança-se tudo, para que volte como cristal monetário. E não es- capam dessa alquimia nem mesmo os ossos dos santos nem as res sacrosanctae, extra commercium hominum.192, 193 Como no dinheiro é apagada toda diferença qualitativa entre as mercadorias, ele apaga por sua vez, como leveller194 radical, todas as diferenças.195 O dinheiro mesmo, porém, é uma mercadoria, uma coisa externa, que pode con- verter-se em propriedade privada de qualquer um. O poder social tor- na-se, assim, poder privado da pessoa privada. A sociedade antiga o denuncia, portanto, como elemento dissolvente de sua ordem econômica e moral. A moderna sociedade, que já em seus anos de infância arranca Plutão pelos cabelos das entranhas da Terra,196 saúda no Graal de ouro a resplandecente encarnação de seu mais autêntico princípio de vida. A mercadoria, como valor de uso, satisfaz a uma necessidade particular e constitui um elemento específico da riqueza material. Mas o valor da mercadoria mede o grau de sua força de atração sobre todos os elementos da riqueza material, portanto mede a riqueza social de OS ECONOMISTAS 252 192 Coisas sacrossantas, excluídas do comércio humano. (N. dos T.) 193 Henrique III, rei cristianíssimo da França, rouba aos mosteiros etc. suas relíquias para convertê-las em prata. Sabe-se qual o papel que desempenhou o roubo dos tesouros do templo de Delfos pelos fócios, na história grega. Para o deus das mercadorias, o templo, na Antiguidade, servia de moradia. Eles eram “bancos sagrados”. Aos fenícios, um povo comerciante par excellence, o dinheiro valia como a figura alienada de todas as coisas. Era, entretanto, lógico que as virgens que se entregavam aos estranhos por ocasião da festa da deusa do amor ofertassem à deusa a moeda recebida em pagamento. 194 Nivelador. (N. dos T.) 195 "Ouro! Ouro vermelho, fulgurante, precioso! Uma porção dele faz do preto, branco, do feio, bonito; Do ruim, bom, do velho, jovem, do covarde, valente, do vilão, nobre. ... Ó deuses! Por que isso? Por que isso, deuses; Ah, isso vos afasta o sacerdote e do altar; E arranca o travesseiro do que nele repousa; Sim, esse escravo vermelho ata e desata Vínculo sagrados; abençoa o amaldiçoado; Faz a lepra adorável; honra o ladrão, Dá-lhe títulos, genuflexões e influência, No conselho dos senadores; Traz à viúva carregada de anos pretendentes; ... Metal maldito, És da humanidade a comum prostituta." (SHAKESPEARE. Timão de Atenas.) "Nada suscitou nos homens tantas ignomínias Como o ouro. É capaz de arruinar cidades, De expulsar os homens de seus lares; Seduz e deturpa o espírito nobre Dos justos, levando-os a ações abomináveis; Ensina aos mortais os caminhos da astúcia e da perfídia, E os induz a cada obra amaldiçoada pelos deuses." (SÓFOCLES. Antígona.) 196 "A avareza espera arrancar o próprio Plutão do interior da Terra." (ATHEN[AEUS]. Deipnos.)