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O Direito Real
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A centralização do poder
A partir do século XII e, principalmente, do século XIII, o poder real se reforça na França, na Inglaterra, na Sicília e na Península Ibérica, permitindo ao soberano intervir em matérias jurídicas cada vez mais numerosas.
O rei fará leis para organizar e administrar seu reino, inicialmente; e, posteriormente, para fazer observar, modificar ou mesmo derrogar certos costumes, e para introduzir novas formas de direito.
É por volta de 1150 a 1200 que aparecem as ordenações (ordonnances) reais, senhoriais e urbanas. A lei, que mesmo na Baixa Idade Média, desempenhou um papel mais reduzido do que o costume como fonte de direito, vai tornar-se preponderante na época moderna, eliminando progressivamente o costume. 
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A centralização do poder e a unificação do direito 
No processo de centralização do poder, um dos objetivos visados pelos reis foi a unificação do direito, eliminando particularismos locais. O rei da França vai realizar esta unificação por via legislativa: as mesmas leis vão reger todos os territórios.
Ao mesmo tempo, determinam que o direito seja cada vez mais escrito: não só a legislação, como também os costumes, os processos e as provas.
Os costumes, que permanecem na Baixa Idade Média sendo a principal fonte de direito civil, são reduzidos a escrito nos séculos XIII e XIV por iniciativas particulares. Depois, nos séculos XV e XVI o são por ordem real e, em seguida, são homologados (reconhecidos oficialmente). Com isto, deixam, na prática, de ser costumes para se tornar uma lei de origem consuetudinária. Os soberanos reservam-se o direito de os modificar e interpretar.
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A centralização do poder e a unificação do direito 
O processo de redação oficial conduziu a uma certa unificação dos costumes. Assim, o número de costumes após o processo de redação oficial foi menor do que antes da redação. Mesmo assim, não se chegou em país algum a uma unificação total, não perdendo os costumes seu caráter territorial (nos séculos XV e XVI contavam-se cerca de 600 costumes territoriais na França). Por outro lado, com a redação, paralisou-se o processo de unificação, fixando os costumes em determinado número (ao final do Antigo Regime, eram 300 costumes locais na França).
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A redução a escrito dos costumes
Desde o fim do século XI, as cidades obtêm privilégios, por vezes consignados em documentos, os quais, em larga medida, confirmam seus costumes locais ou regionais, como no exemplo abaixo, da cidade francesa de Tournai:
“privilégios concedidos à cidade pelo rei de França, Filipe Augusto, em 1188:
‘Em nome da Santíssima Trindade. Amen. Filipe, por graça de Deus, rei dos Franceses.
Porque interessa ao rei ocupar-se das coisas que conduzem à paz, queremos pôr por escrito e encomendar à memória da boa escrit aquilo a que a boa vontade nos conduziu. Saibam todos os presentes, bem como os futuros, que damos e concedemos aos burgueses da nossa cidade de Tournai a instituição da paz e da comuna, bem como os usos e costumes que os ditos burgueses tinham antes da instituição da comuna.
São estes os referidos costumes.
Se alguém matar um homem de Tournai, dentro da cidade ou fora dela, e for capturado, pague com a cabeça, e a sua casa seja destruída. E tudo o que ele deixar na comuna de Tournai fique para esta comuna. E se o homicida escapar, não poderá entrar na cidade de Tournai até que se reconcilie com os pais da vítima e seja paga à comuna a multa de 10 libras.’”
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A redução a escrito dos costumes
Nos séculos XIII e XIV, basicamente, particulares que são muitas vezes agentes da autoridade exercendo funções judiciais redigem compilações de costumes para seu uso pessoal. Estes livros de direito, chamados geralmente coutumiers, conseguiram adquirir grande autoridade.
Os autores destes coutumiers eram em geral práticos do direito, como oficiais de justiça, provenientes de outras regiões, o que lhes fazia sentir a necessidade de reduzir a escrito o resultado de sua experiência. Como esta incluía decisões judiciárias, a jurisprudência foi uma importante fonte dos mesmos.
A partir do século XV, a redação dos costumes é por vezes ordenada oficialmente pelas autoridades, fossem elas locais ou nacionais, como fez o rei da França, Carlos VII, em sua ordonnance de Montils-lez-Tours em 1454.
No caso de reduções locais, inicialmente não tinham a pretensão de dar conta de todo o direito da cidade ou do território, o que aparece depois. Embora o conteúdo fosse geralmente consuetudinário, começaram a incluir regras provenientes de decisões de tribunais locais ou do conselho municipal e, também, do direito romano, tendo que ser ratificadas pelo rei ou pelo senhor. 
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Consequências da redação oficial dos costumes
O costume passa a ser certo, i.e., não mais precisa ser provado. É proibido, desde então, contestar o texto do costume; apenas o soberano pode completá-lo ou interpretá-lo.
O costume passa a ser estável. Já não pode variar muito, deixando de se adaptar automaticamente à evolução da vida social. Os costumes escritos raramente foram modificados. Pouco a pouco vão se tornar um direito morto.
Os costumes homologados adquiriram as características essenciais da lei: certeza, estabilidade, permanência. Não se igualam a ela na França, por exemplo, porque são menos gerais (territoriais) e porque regem normalmente matérias específicas, como direito civil e processo.
Alguns dos costumes reduzidos a escrito tornaram-se verdadeiros códigos, compilações sistemáticas e completas das regras de direito em certas matérias.
Uma vez reduzidos a escrito, os costumes foram objeto de estudos doutrinais. Os juristas foram pouco a pouco deixando o estudo do direito romano e do direito canônico e debruçando-se sobre os costumes, analisando-os, comentando-os e comparando-os.
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A Legislação
Como vimos, na época moderna a lei adquire preponderância em detrimento do costume. As primeiras ordenações aparecem no final do século XII.
O termo lex (lei) é entendido aqui como “norma de direito imposta por uma autoridade exercendo o seu poder num grupo social dado e sobre um território dado”. (obs: “por via autoritária” – Gilissen)
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As primeiras manifestações de atividade legislativa
Apenas posteriormente (meados do século XII na França) é que aparecem leis reais de iniciativa autônoma, constituindo uma regra de direito nova. Tornam-se mais numerosas no século XIII e, sobretudo, no século XIV. A partir de então, a autoridade legislativa real se torna uma realidade. Por vezes o rei da França consultou os Estados Gerais.
A atividade legislativa se torna relativamente abundante na maior parte das regiões da Europa Ocidental no século XIII.
As primeiras leis reais (século XI na França) estão relacionadas estreitamente com o costume, seja confirmando um costume bom, seja derrogando um mau; muitas vezes tomam a forma de cartas de privilégio.
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As primeiras manifestações de atividade legislativa
Distinguem-se ordonnances que se aplicavam nos domínios reais e as que tinham vigência em todo o reino; também as feitas “a pedido” e as por iniciativa própria (“motu proprio”).
De uma forma geral, as leis do rei tratavam sobretudo de matéria de direito público. As ordonnances visavam, antes de mais nada, a manutenção da ordem pública e de uma boa administração no reino: organização administrativa, judiciária, financeira, militar, econômica etc. O direito penal continuava a ser regido pelo costume local e o processo era próprio de cada jurisdição. Apesar de algumas tentativas, novas normas no campo do direito civil por via legislativa não pegaram.
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A legislação a partir do século XVI
A preponderância da lei sobre o costume é parte de um processo de mudança social em que o individualismo avança e o papel da família e dos grupos privilegiados retrocede. Além disso, é consequência do desenvolvimento da escrita.
Mas a preponderância da lei é, antes de tudo, consequência do reforço
do poder dos soberanos: com o absolutismo, todos os poderes estarão nas mãos do príncipe, que procura unificar o direito de seu país e suprimir os particularismos, através de uma atividade legislativa que invade cada vez mais domínios. “Todo o poder legislativo deste reino reside na pessoa do soberano. O rei não está sujeito às leis” (Colbert, séc. XVII)

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