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Q século XX se
prepsrou n
o
su
ce
ssõo cada
ve
z m
ois o
e
elerqdq dos inovoçóes técniccs-
N
ovos podróes de percepçoo e
e
xperièncio
se
produzirom
e
aíetarom
diretum
ente o
s
co
rFos, o
s reloçóes so
cicis e
toda a
produç€o
hum
qne (oÉístico, subietivo, etc'). Floiq n
c
cuge desses processosr ü5 n
o
vcls descobertas
parecem
por yezes m
ais obsÍor que viobilizor.
Porque todos e
sse
s o
co
ntecim
entos sóo
sntes de tudo figuras de m
utoçoes dc
ccpitclÍsmo. N
estas n
ctos de fim
de sêculo,
aÍirmqmos que u
m
q, problem
otizoção
intronsigente de n
o
sso
tem
po é a
vio paro
co
n
seguir divissr o
que ele n
o
s proporciono,
É o
,
"
.u
ro
dos ditum
es do presente que n
o
s
abre poro o
utros tem
pósn pcrq u
rnü' tem
Po-
rslidqde crisdors. ïi:lvez e
ntoo pudéssem
os
cpostar nq püssog€m
poro o
n
o
vo
eéculo *
de re
sto u
m
m
crco
srbitrório
*
co
mÊ u
m
o
psssogem
de foto, co
m
o
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Cruen, FAZER
CRLAR
Pur" u
a
rte e
o
pensam
ento é preciso u1 lem
po de re
sso
-
;ât.i^; Ú* pou*u pode produzir
se
u
s efeitos a
n
o
s depoìs
i" Uao porqu" su
a
ação não se
e
sgota e
não sa
cia n
o
m
o
-
*e
*o
a
u
teitura. D
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m
a
obra de
a
rte im
pÌica abrigar a
s repercussões que a
poética vai pro'
u
o
.r., u
podem
os dizer iiso para qualquer a
rte' O
Poem
a
u
oltu'co*o
u
m
a
dádiva n
u
m
lapso de tem
po que pode co
'
brir toda u
m
a
vida. O
pensam
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bém
precisa de u
m
i"C" a
. elaboração lpara o
a
utor e
Para o
leitor) que o
tlìí;*p*tciu
e
u
a
"q''udo para e
xpressar'?or isso a
fi-
gura da "
*pr*" fiã u
niversidade parece m
:sm
o
se
r' co
m
o
ãi" O
"t.lr"., o
fim
de toda pesquisi' O
im
ediatism
o ditado
pJo
*
"t."ao e
a
e
xigência do a
specto
"aplicado" para o
iaber vai co
ntra o
processo de criação n
a
a
rte e
n
o
Pensa-
m
e
nto. Não que obias de a
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se
r tam
bém
m
e
r-
cad.orias co
m
práveis
-
e
nquanto livros' discos o
u
telas
-
m
a
s
utu, ui.r.rao
,u
*pr" de óutra coisa que não se
inscreverá
n
e
sse
eireuits e
m
e
sm
o
trúa]hará
co
ntra ele'
-
-
-
úao e
n
a
relação de co
rsu
m
o
que a
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rte chega a
se
u
des-
tinatário. O
que é co
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su
m
ido
co
m
o
u
m
a
m
e
rcadoria
se
e
s-
gota n
o
m
o
m
e
nto, m
e
sm
o
que Possa satisfazer' O
proble'
ïru é *
*
*o
o
fato de que satisÍaz' Beniam
in observa que'
diante de u
m
a
pintura, o
olhar
"não co
n
segue
se
sa
ciar"'
O
ra, é a
sa
ciedaàe que põe fim
a
o
deseio' M
as a
obra de a
rte
,
"Urf"" o
deseio a
o
*
"àlgu'nt
coisa que alim
enta co
ntinua-
,:d
-
.:t'r
' ;:i.,1
r:,,1çr...
lÍtì'
::E;
$*4;
:rlï-::
frtucr Cerern
m
e
nte e
sse
desejo".l A a
rte e
o
pensam
ento
se
inscrevem
n
e
sse
tem
po e
m
que o
s efeitos não se
e
sgotam
n
o
m
o
m
e
nto
da sede, m
a
s vão repercutir m
ais além
e
e
m
seguida, m
uito
depois, n
u
m
lapso que é o
dom
ínio m
e
sm
o
da criação. O
gesto técnico de abreviar (o click ve
rsu
s o
s m
o
vim
entos dos
pincéis) por si m
e
sm
o
não destrói e
sse
lapso. A fotografia
e
n
co
ntraria
u
m
a
e
xpressão criadora n
u
m
a
a
rte do instante.
Por o
utro Ìado, claro que inovação técnica favorecia a
rela-
ção de co
n
su
m
o
, co
m
o
Benjarnin percebeu n
o
despontar
m
e
sm
o
dessas m
udanças. A reprodução técnica tendia
a
disponibilizar
e
m
e
xce
sso
, oferecer até a
sa
ciedade. M
as o
cinem
a e
a
fotografia atíngem
por se
u
s m
eios u
m
a
singula-
ridade que não se
e
sgota n
a
relação precária do m
o
m
e
nto
do co
n
su
m
o
e
só vive de su
a
s rePercussões. Barthes fala do
punctum
da foto, u
m
re
ca
nto da im
agem
que vai e
xe
rce
r u
m
fascínio justamente por não se
colar a
n
e
nhum
a e
xplicação
im
ediata, vai prender o
observador n
u
m
a
relação duradoura
de fruição.z Serge D
aney vai falar de u
m
sa
u
a
e
nir-éüan para
u
m
film
e, o
m
o
m
e
nto e
m
que ele é forte porque produz
u
m
a
im
agem
desúadora da e
siética dom
ínante e
que vai
se
r a
m
a
rca
"inesquecível" daçeÌe 61m
e. São poéticas n
a
fotografia e
n
o
cinem
a que vão perdurar n
a
relação co
m
a
s
obras e
n
e
ce
ssa
riam
errte
subtraí-las, n
e
sse
s m
o
m
e
ntos, do
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ciedade e
do e
sgotaúento. D
e fato, todas a
s
a
rtes hoje têm
que se
haver co
m
e
sse
problem
a. O
que se
instaura co
m
e
ssa
s inovações
-
e
é isso, creio, que Benjamin
a
n
u
n
cia
*
não é u
m
destino da técnica, m
a
s precisam
ente
u
m
n
o
vo
problem
a que caberá doravante à a
rte e
a
o
PeÍÌsa-
m
e
nto re
volver, deslocar.
N
ossa época é m
a
rcada por u
m
a
valorização da dispo-
nibilidade. A figura do banco de dados é e
xe
m
plar desse
processo. Tam
bém
o
é o
e
n
altecim
ento das redes de infor-
m
ática n
a
m
edida e
m
que elas n
o
s disponibilizariam
"o
m
u
ndo". Claro que n
o
s é dado e
sPeÍar que algum
a coisa
t
N
osso sÉcuro Xll: N
or.rs so
u
n
r AR
TE, rÉcucl E PoD
ERËs
valiosa possa n
o
s vir daí. A disponibilidade e
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si, co
ntudo,
não garante e
sse
valor. Ao co
ntrário, a
ptofusão e
stabelece
a
relação do co
n
su
m
o
, a
o
preço do co
m
prom
etim
ento de
u
m
a
densidade firndam
ental para a
criação. Por o
utro lado,
é fato que e
ssa
inÍinita disponibilidade, n
o
que tange às re
-
des de inÍormática, vive n
e
ste m
o
m
e
nto m
ais do a
núncio
do que de u
m
a
e
xistência efetiva. O
infinito o
u
o
u
niversal
e
stá m
e
n
o
s n
o
que se
pode co
n
cretam
ente obter (bem longe
de substituir, por e
xe
m
plo, u
m
a
visita a
u
m
a
biblioteca re
al)
do que n
o
s ca
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inhos que se
PercoÍrem n
o
s program
as. Es-
sa
s direções parecem
co
nduzir
m
e
n
o
s do que divertir de
ícone a
ícone o
u
de site a
site, o
que pode co
n
su
m
ir horas.
M
as a
profusão persiste co
m
o
e
m
blem
a,
a
ssim
co
m
o
o
co
rre
co
m
o
s a
núncios de televisão a
cabo que e
nfatizam
a
quan-
tidade de opções e
a
s facilidades de adicionar
m
ais.
Será se
m
pre co
nEa a
s dim
ensões do u
niversal que se
co
n
seguirá traçar a
linha singular da a
rte e
do pensam
ento.
O
capitalism
o
vive m
uito de provocar grandes disponibili-
dades, se
u
s invesllm
entos se
rão cada ve
z m
ais do porte do
u
niversal. Interessa tam
bém
à su
a
a
xiom
ática3 que o
s vín-
culos sejam o
s m
ais precários, que se
so
rva
o
m
áxim
o n
o
e
xce
sso
, que a
sa
ciedade im
peça a
duração. Um
a aposta tal-
ve
z seja que se
co
n
siga e
stabeiecer aí m
e
sm
o
,
n
e
sse
s n
o
vo
s
circuitos, o
utras reiações
-
m
a
s se
rá se
m
pre co
ntra a
cre
nça
fácil de que a
disponibilidade é e
m
si m
e
sm
a
Senerosa'
A re
sposta m
uitas ve
ze
s a
o
e
m
udecim
ento que aTgum
as
m
ídias provocam
,
co
m
o
a
televisão por e
xe
m
plo, é a
"inte-
ração". Essa se
ria a
n
o
va
relação a
se
e
stabelecer co
m
a
in-
form
ação. A n
o
va
o
rganização co
m
u
nicativa que a
s redes
de inform
ática im
plicam
tam
bérn tem
co
m
o
bandeira a
in-
teração, dessa ve
z suPostam
ente potenciada a
o
infinito'
Aqui o
tem
po que se
despende às voltas co
m
a
m
ídia se
ria
qualitaüvam
ente diferente do tem
po de a
ssistir televisão
porque o
u
suário interage co
m
a
m
áquina' A interação vira
4;:::;
i,rri:l
:ì,'',
:;.',
:::,
\
ì:.3'tíIrì:lriiìãí4ì{.l
26
fer.ncr Cruere
e
ntão u
m
m
odo, u
m
desenlace gue vai afetar m
e
sm
o
a
lite.
ratura e
o
utras n
a
rrafivas. O
s livros interativos para crian-
ças já são u
m
a
m
trada do co
m
putador n
a
literatura. N
eles
a
criança é cham
ada a
co
m
pletar
a
história e
se
a
credita n
a
s
virtudes pedagógicas disso. Ao invés de re
ceber a
história
pÍonta, ela a
criaria. O
role playing gam
e guarda o
m
e
sm
o
a
specto interativo. Trata-se de u
m
jogo e
m
que se
incolpo-
ra
m
personagens
e
vai-se criando a
história a
partir de indi-
caçÕes já e
sLipuladas, m
a
s se
m
pre e
m
interação. Com
va
-
ri.ações, são todos e
xe
m
plos da m
e
sm
a
postura diante do
que é criar e
Íazer criar.
A interação co
m
eçou e
nlre nós n
o
protÌama Você decíde,
ainda n
u
m
a
Íorma precária. São grandes telas n
a
s praças
de diversas cidades brasileiras co
m
m
ultidões
se
e
m
pur-
ra
ndo para decidir algum
a coisa co
m
a
televisão. E é sobre-
tudo a
possibilidade de telefonar de ca
sa
re
spondendo à
pergunta, o
u
seja, dessa ve
e
interagindo, saindo da passivi-
dade. Trata-se de u
m
e
xe
m
plo m
ais fraco, porque ali fica
claro que não há decisão n
e
nhum
a quando se
tem
que a
s-
su
m
ir o
s pressupostos da televisão. A única decisão se
ria
re
cu
sa
r a
pergunta o
u
dar u
m
a
re
sposta a
o
utTa pergunta.
M
as e
ssa
cre
nça de que algo de im
portante se
cria quando
há interação (mesmo que o
se
u
parceiro seja a
televisão)
pelpassa processos m
ais aliciantes. Para alguns, ela é a
gran-
de virtude da Internet. É interessante e
xa
m
inar u
m
a
e
ntra-
da ainda m
ais a
rriscada desse n
o
vo
m
odo, o
ca
so
dos livros
interaüvos. Estam
os se
ndo passivos quando não
"co
m
ple-
tam
os" u
m
a
história, çando não retrucam
os, por e
xe
m
-
plo, a
D
ostoievski?
As grandes obras são n
e
ce
ssa
riam
ente incom
pletas, m
a
s
não porque falte u
m
final que se
ria preciso lhes fom
ecer. É
por não se
e
sgotarem
n
o
m
o
m
e
nto de su
a
aparição, por não
se
darem
n
u
n
ca
de u
m
a
ve
z por todas, que elas perduram
e
co
ntinuam
provocando re
sso
nâncias. õom
pletàr é sa
ciar-
N
osso
sÉcur,o XXI: N
oras so
snE aR
TE, TÉcMcA E poDEREs
,n
se
(em alguns ca
so
s,
"decidir" u
m
a
banalidade)
e
o
proces-
so
ali se
e
sgota. É quando a
idéia de inform
ação e
nquanto
im
plicando a
disponibilidade
e
a
sa
ciedade pode se
r, e
m
plena profusão, e
m
pobrecedora. Em
"O
n
a
rrador", Benja-
m
in diz que a
n
a
rração e
n
volve se
m
pre u
m
a
vo
ntade de
re
co
ntar a
história. Cada história não se
co
m
pleta n
o
m
o
-
m
e
nto e
m
que é co
ntada, porque o
o
u
vinte vai querer
re
co
ntá-la, fazendo-a perdurar. A Ìiteratura a
ssu
m
e
e
sse
a
specto da n
a
rração que aparece n
a
tradição o
ral. Ao co
n
-
trário do ponto final, a
n
a
rração vive de u
m
desejo de
Sherazade. Em
Ás m
il e
u
m
a
n
oites a
s histórias se
e
nlaçam
se
m
pre re
m
etendo a
u
m
a
o
utra história. Aqui podem
os
pensar tam
bém
a
a
rte de o
u
vir, de ler o
u
de ve
r. O
grande
n
a
rrador co
n
seguirá provocar e
sse
desejo de re
co
ntar n
o
o
u
vinte-leitor, inclinação a
gue ele cederá
"irresistivelm
en-
te". D
a parte do o
u
vinte, a
atitude se
rá de
"e
squecer-se de
si". O
u seja, o
u
vir para re
co
ntar
-
para participar das re
sso
-
nâncias da obra, para criar
-
im
plica e
ntregar-se, ingressar
n
a
duração'ãa obra se
m
e
sgotá-la. O
co
ntrário portanto de
co
n
su
m
ir. Criar co
m
a
obra é e
xperim
entar co
m
ela e
sse
processo de re
sso
nâncias. Não é o
truque técnico de
co
m
pletá-la. Pôr u
m
ponto Íinal é tudo o
que u
m
a
grande
obra não precisa para repercutir n
a
vida-obra do leitor.
Ao co
nhário, é preciso e
vitar
"e
xplicações". É a
infor-
m
ação que se
apóia n
a
e
xplicação im
ediata. A história do
Egiio e
scrita por H
eródoto n
ada e
xplica, diz Benjamin. É
por isso que ela
"atndaêcapaz-rlepois
de m
itCnlos, desus-
citar e
spanto e
reflexão".4
Trata-se de u
m
equívoco a
ssu
m
iÍ que a
atitude de re
s-
ponder a
u
m
a
história n
o
livro o
u
a
u
m
a
co
nfiguração
n
a
m
áquina e
m
si m
e
sm
a
provoque a
criação, m
e
sm
o
que a
dim
ensão dessa co
n
ve
rsa
seja im
ensa o
u
que a
s ligações
sejam m
últiplas e
diretas. Essa m
ultiplicação, inclusive, pode
e
star apenas participando do elogio da disponibilidade e
-
28
|emcr Cerare
não produzir de fato m
ultiplicidade. Tudo vai depender da
qualidade dessas relações. Fazer criar é im
pulsionar n
o
pro-
ce
sso
de duração e
re
sso
nâncias. Seria preciso co
n
seguir
e
n
sejar isso co
m
a
interação.
Um
otim
ism
o não-crítico pode n
o
s im
pedir de buscar
a
s n
o
va
s e
stratégias de que precisam
os. Estratégias para a
o
m
e
sm
o
tem
po fazer u
m
a
crítica intransigente do capitalis-
m
o
e
viver a
s n
o
vidades de n
o
ssa
época n
u
m
a
intensidade
e
n
u
m
a
parcim
ônia que não n
o
s subtraiam
a
dádiva da cria-
ção. Poderíam
os repensar tam
bém
, por e
xe
m
plo, u
m
a
o
u
-
tra virlude a
ssu
m
ida de n
o
ssa
s n
o
va
s m
ídias. O
a
n
o
nim
ato
que é possível n
a
internet aparece m
uitas ve
ze
s co
m
o
posi-
tivo. Um
co
rolário da situação de a
n
o
nim
ato é a
a
u
sência
de a
utoria. A tendência se
ria que o
s textos n
a
vegassem
se
m
a
utores, disponíveis para o
u
so
coletivo. Isso tam
bém
é vis-
to co
m
o
u
m
a
virtude e
é u
m
a
specto que n
o
s in1s1s5s6 Ílis-
cutir porque tam
bém
toca a
questão da criação.
Claro e
stá que o
a
n
olim
ato pode provocar u
m
tipo de
liberdade. Não m
o
strar-se, inventar personas etc. Contu-
do, e
sse
a
specto já e
xiste de o
utra form
a e
m
o
utras m
ídias,
co
m
o
o
telefone e
o
co
rreio. As ca
rtas a
nônim
as são o
m
ais
das ve
ze
s a
m
e
açantes, m
a
s podem
trazer hom
enagens. Com
o
teleÍone tem
os o
"trote", a
ntigo e
e
n
e
ryante, m
a
s talvez
tam
bém
co
m
su
a
s virfudes. M
as e
m
todos o
s ca
so
s há o
a
s-
pecto da invasão. O
a
n
o
nim
ato e
n
co
raja a
declarações
o
u
-
sadas. Para re
cu
sá-las, n
o
ca
so
do co
rreio e
do teleÍone, bas-
ta ra
sgar a
ca
rta o
u
desli gar. Já o
tête-à1ête n
viabiliza
o
a
n
o
-
nim
ato e
, e
m
ca
so
de ofensa, é possível afastar-se o
u
re
vidar.
Este é u
m
ponto im
portante de se
r pensado a
re
speito des-
sa
s n
o
va
s co
nfigurações da co
m
u
nicação. Esse tipo e
specí-
fico de a
n
o
nim
ato traz tam
bém
u
m
a
ca
rga de violência. Está-
se
protegido pela possibilidade a
m
pliada agora de e
sco
n
-
der su
a
identidade e
a
o
m
e
sm
o
tem
po inserido n
u
rn
e
sque-
m
a
de e
scrita m
uito m
ais irnediato que a
ca
rta. N
a ca
rta, a
N
osso sÉcrno XXI: N
orns so
rn
e
AtrE, TÉc!ürcA E poDm
Fs
pausa e
ntre a
e
scrita e
o
e
n
vio
e
talvez o
defrontar_se
co
m
a
folha de papel participam
da própria e
n
u
n
ciação que ali vai
vigorar. A im
agem
da situação de e
scre
ve
r u
m
a
caúa é de
alguém
pensativo se
ntado a
u
m
a
m
e
sa
, talvez co
m
algu-
m
a
s folhas a
m
a
ssadas e
m
tom
o (não ra
ro
re
e
scre
ve
m
o
s e
ponderam
os). N
o ca
so
da rede, a
s n
o
va
s co
ndições pare_
ce
m
co
ntribuir para a
franqueza e
m
e
sm
o
para a
agressão.
A co
m
u
nicação e
m
rede, co
m
a
possibilidade a
m
pliada de
a
n
o
nim
ato e
a
instantaneidade, parece criar u
m
a
n
o
va
for_
m
a
de interpelação
e
se
m
dúvida u
m
n
o
vo
tipo de violên_
cia. As potencialidades
criadoras dessa n
o
va
interpelação
não parecem
se
m
o
strar de im
ediato. A co
nfiguração técni-
ca
dessa n
o
va
form
a de falar (com m
uitos e
n
volvidos, co
m
e
n
vio im
ediato da m
e
n
sagem
o
u
m
e
sm
o
e
m
tem
po re
al)
por si m
e
sm
a
não dem
onsha e
ssa
s potenciaiidades,
co
m
o
Lam
bém
não a
s n
ega. O
bservar o
s desdobram
entos desses
processos co
m
u
m
otim
ism
o crítico e
xige que não o
s credi_
tem
os co
m
u
uia virtude de a
ntem
ão. Tratalse de que n
o
vo
s
probÌemas por su
a
ve
z aparecem
, que deveriam
n
o
s obri-
gar a
pensar. A questão da yiolência é u
m
deles.
O
trabalho co
m
a
identidade poderia se
r u
m
a
perspecti-
va
interessante e
ce
rtam
ente guarda u
m
a
potência de cria-
ção. N
ovam
ente, ele já e
xistia e
m
o
utras m
ídias, e
m
bora
agora apareça n
a
s redes co
m
ca
ra
cterísticas e
specíficas
e
m
uiüo rn
aisr a
m
plitude. N
+ irtternet alguem
podená-forjar
totalm
ente para si u
m
n
o
vo
ro
sto o
u
u
m
a
história que não é
a
su
a
e
a
ssim
se
apresm
tar àqueles co
m
quem
interage
n
a
rede. A idéia de incorporar personagens aparece de form
a
se
m
elhante n
a
rede e
n
a
role playing gam
e, a
m
bos são re
ali-
zações particulares do m
e
sm
o
e
squem
a de interação. e
u
al
se
rá a
Íorça desses jogos, se
rá que a
interação n
a
rede tem
o
poder de fazer co
m
que n
o
s tom
em
os o
utros, se
rá que de.
ve
m
o
s tom
ar a
o
pé da leha aqueles que dizem
,
,viver,, e
s-
sa
s personas? Com
o é tudo m
uito re
ce
nte, pouco e
xiste que
30
:
JAìIcE CAIAFA
N
oso sÉcuro XXI: N
orls so
sn
r AR
TE, TÉcMcA Ë PoD
FR
rs
JL
ve
ze
s tenta n
o
s co
n
ve
n
ce
r de gue ela é tudo que e
xiste ("tudo
a
ve
r" etc.). É im
portante
observar que Por ve
ze
s a
s afirm
a-
ções da m
ídia e
a
s de u
m
ce
rto tipo de crítica a
ela a
cabam
por coincidir. Estranham
ente, Parece que e
sse
s poderes
p"ssu* a
se
alim
m
tar tam
bém
dessa denúncia.6 Tom
em
os
co
m
o
e
xe
m
plo o
cham
ado co
co
o
n
e
r da Internet' Esse term
o
referese a
pessoas gue passariam
m
uito tem
po de su
a
s vi-
das
"n
a
vegando", supostam
ente e
vitando safu e
Perm
ane-
ce
ndo n
u
m
"ca
sulo", e
stabelecendo
co
ntato quase que e
x-
clusivam
ente
n
a
rede. Alguém
que m
a
ntivesse e
sse
e
sque-
m
a
, supondo-se que tal figura e
xista, se
rá que
"viveria" n
u
m
u
niverso de relações internacionais,
n
a
diversidade do co
n
-
tato co
m
o
s países m
ais distantes, línguas e
strangeiras etc'?
Não a
credito que tais Processos tenham
qualquer densida-
de e
xistencial para se
substituírem
às relações co
n
cretas
dessas pessoas. O
s co
ntatos à distância são m
ais inócuos'
sejam eles interessantes
o
u
banais' Tam
pouco a
credito que
se
ria possível e
vitar o
que se
Passa e
m
torno
-
de fato e
sse
ca
sulo não e
xiste se
m
poros' Se fôssernos im
aginar a
s rela-
ções de u
m
a
-y'essoa
n
e
ssa
situação, elas se
e
stabeleceriam
,
suponham
os,
co
m
a
fam
ília, a
e
m
pregada gue lhe haz co
-
m
ida e
tem
u
m
salário x, o
u
co
m
se
u
irm
ão que habita o
quarto co
ntíguo e
ce
rtanente co
m
u
m
a
m
áquina a
que eie
se
a
copla. Sua so
ciedade induiria, por e
xe
m
plo,
o
e
ntregador
de superm
ercado
e
o
s m
e
ndigos que e
stão pela ru
a
, m
e
sm
o
que ele o
s e
vite à su
a
m
a
n
eira'
Não é que não se
pudessesuPor qusoscorÌfdüos n
a
rede
produzissem
interferência n
u
m
a
vida, m
a
s não m
uito m
ais
que o
s telefonem
as o
u
a
s ca
rtas podem
produzir para al-
guém
que se
dedica a
eìes. lnclusive, o
co
rreio parece m
ais
eficaz co
m
o
veiculador de e
strangeirism
os
e
interferências'
Aí tem
os a
letra do re
m
etente,
o
e
n
velope que veio de fora,
o
selo que pode vir de países distantes' Há u
m
a
m
aior ca
r-
ga de alteridade n
e
sse
ca
so
Para produzir rePelcussões
já tenha sido dito para re
sponder co
m
segurança a
e
ssa
s
perguntas,
m
a
s elas e
stão
por aí a
n
o
sso
redor' n
o
s textos'
n
a
m
ídia, e
m
co
n
ve
rsa
s
D
e toda form
a, não parece que até agora e
ssa
co
m
u
nlca-
ção tenha co
n
stituído u
m
a
"so
ciedade virtual"' o
u
pelo
m
e
n
o
s não m
ais do que poderíam
os suPor Para o
telefone e
o
co
rreio. Poderíam
os talvez dizer que a
co
m
u
nicação
epistolar co
n
stitui n
u
m
ce
rto m
o
m
e
nto
"uÍnn ssçiedade"'
m
a
s o
diríam
os n
u
m
se
ntido bem
re
strito' devido à n
afure'
za
das relações e
stabelecidas' Isso vale para a
co
m
u
nicação
n
a
s redes de co
m
putador' Aqui o
s participantes' e
m
bora
e
m
grande núm
ero, co
n
stituem
u
m
gruPo bem
e
specífico
-
não"se duvide de que a
m
aioria da população do planeta
não é u
suária da rãde e
' co
m
o
o
capitalism
o se
apóia n
a
.
e
xclusão, e
sse
u
so
poderá funcionar co
m
o
m
ais u
m
indica-
dor de desigualdade (como de re
sto o
telefone ainda é n
o
Brasil, e
m
cãrta m
edida)' Quanto à n
atureza das relações' a
*tuçao so
cial im
plica por definição alteridade
e
risco' Cla-
,o
qL" *
indivíãuo n
o
abrigo de u
m
torto fictício de u
m
a
.uiu, rro
a
n
o
nim
ato do trote o
u
n
o
sn
o
vo
s
"ca
sulos" da rede
(onde se
e
stá m
uito m
ais protegido e
o
nde pode haver m
ais
violência, co
m
o
vim
os), vive a
ntes de ludo u
m
a
fantasia
se
m
a
m
e
n
o
r força para se
r tom
ada co
n
cretam
ente
co
m
o
vida so
cial. Trata-se aPenas de u
m
iogo que' dos ca
so
s e
xa
-
m
inados, só n
a
rede parece não se
co
nfessar co
m
o
tal' Tal-
ve
z-poÍque tal co
nÍissão
m
o
straria
n
o
ssa
s n
o
va
s m
ídias e
m
su
a
s va
ntagens e
su
a
s bobagens,
co
m
o
qualquer o
utra'
Está aí presente o
m
e
sm
o
e
xagero que afirm
a que' a
s
transm
issões n
o
tem
Po viriam
a
substituir hoie a
s relações
e
spaciais, o
u
que vivem
os hoje n
a
sideração das n
o
va
s
tárologias. O
utra m
a
n
eira de form
ular isso é dizer que o
so
cial n
"ão passa de u
m
a
aparência's Som
os de fato atingi-
dos e
m
cheio por e
sse
s Processos, m
a
s é duvidoso que se
possa falar e
m
substituição' A televisão tam
bém
m
uitas
lì
a
7)
Jnurcr Cerere
n
u
m
a
vida e
criar relações. Enquanto que n
a
rede a
tendên-
cia é a
u
niform
ização clo texto n
o
s e
-m
ails e
n
o
s chats. Com
a
ca
rta de papel tem
os u
m
a
inegularidade que a
faz u
m
objeto heterogêneo,
capaz de produzir atrito. Produz-se u
m
a
ilegibilidade fundam
ental para n
o
s trazer o
e
straúo
e
que,
por su
a
ve
z, a
literatura co
n
segue por o
utros m
eios. Paie-
ce
que o
a
specto clesn da co
m
u
ni.cação por co
m
putador
tende a
elim
inar e
ssa
ilegibilidade. Não basta falar e
m
in-
teração para garantir a
alteridade
n
a
co
m
u
nicação por rede,
é preciso e
xa
m
inar a
s co
ndìções e
m
que a
s relaçÕes se
e
s-
tabelecem
.
N
ovam
ente há u
m
a
superestim
ação dos poderes dessa
m
ídia. A fuga à identidade não só é m
uito local (embora
alguns e
ve
ntos locais possam
adguirir e
m
ce
rto m
o
m
e
nto
u
m
e
n
o
n
n
e
alcance), m
a
s sobretudo não parece ter m
aiores
repercussões n
a
produção subjetiva do que u
m
a
fantasia
pessoal e
efêm
era. O
personalism
o, aliás, é a
m
a
rca
dessas
diversôes solitárias que a
rigor não co
n
stituem
n
e
nhum
a
relação so
cial. A interação co
m
a
m
áquina ainda não n
o
s
trouxe a
so
ciedade, a
o
co
ntrário, e
m
alguns ca
so
s parece
e
n
volver u
m
desejo de faz&la re
cu
a
r, perm
anecendo n
a
fan-
tasia e
n
o
"ca
sulo". A vida so
cial, o
s e
m
bates hum
anos co
nti-
n
u
a
m
se
dando n
o
local: n
a
s cidades, n
o
s ônibus, n
a
s ca
sa
s,
n
a
s ru
a
s, n
a
s a
ulas. A técnica deve se
r pensada
n
e
sse
co
n
-
texto, co
m
o
u
m
dos vetores desse jogo.
A heteronínia, im
plicando u
m
"tom
ar-se o
utro", é u
m
processo se
m
pre m
ais sério e
m
e
n
o
s inócuo. Não digo que
não pudesse o
coffer tam
bém
n
a
s redes de inform
ática,
m
a
s
não o
se
ria co
m
e
ssa
superficialidade,
n
e
m
se
daria pelo
m
e
ro
huque técnico de não re
velar-se. As personas da co
-
m
u
nicação epistoiar jamais tiveram
a
pretensão de u
m
e
xe
r-
cício efetivo da alterídade e
jamais pensam
os n
a
s brinca-
deiras por telefone co
m
o
u
m
a
form
a de n
o
s.transform
ar-
m
o
s. Precisaríam
os perder a
pom
pa a
o
n
o
s referirm
os
a
e
s-
N
osso sÉcuro XXI N
oras sogne e
n
rr, rÉcruc.l
u
ro
oi*,rs
JJ
sa
s n
o
va
s brincadeiras que tem
os agora, tanto para apro-
veitá-las quanto para dispensá-las.
Todos e
sse
s dispositivos prom
ovem
a
desqualificação
do co
rpo e
co
n
seqüentem
ente a
e
vitação dos riscos que ca
r-
regar u
m
colpo gera. São o
s diversos tipos de co
ntágio n
o
co
nfronto co
m
o
heterogêneo
-
o
nde circulam
doenças,
idéias, afetos. N
a rede, o
a
specto da e
vitação de úcos n
a
co
m
u
nicação fantasm
ática (que já o
telefone, a
s se
cretárias
eletrônicas, a
televisão apresentam)
aparece agravado.
Com
o virFos, a
proteção que se
co
n
sfitui ali para o
e
n
u
n
cia-
dor cria a
o
m
e
sm
o
tem
po u
m
a
franqueza e
u
m
n
o
vo
tipo
de violência. Com
isso fiìa ainda m
at aifcit produzir o
he-
terogêneo e
a
m
ultiplicação de parceiros não parece a
rigor
co
n
stituir m
ultiplicidade. O
parceiro tende a
e
star ali co
m
o
disponibilidade e
dificilm
ente co
m
o
o
utro. N
esse ca
so
, a
interação co
m
o
re
sposfa a
o
m
utism
o do u
suário não pro-
duz alteridade. N
a
"literatura" interativa
-
o
nde o
leitor é
tom
ado co
m
o
u
suário
-
e
sse
equívoco parece querer desa-
fiar a
próp{aliteratura
a
o
tentar im
por-lhe a
obsolescência.
O
s deviresz e
m
que poderíam
os e
ntrar co
m
a
literatura vêm
,
a
o
co
ntrário, das re
sso
nâncias que a
s obras de aÉe provo-
ca
m
a
o
perdurarem
, a
o
não se
e
sgotarem
n
u
m
,
,fim
,, (in-
ve
ntado que seja pelo leitor) o
u
n
u
rn
e
spisódio de intera-
ção. E n
e
sse
processo de duração e
repercussão que pode.
m
o
s n
o
s transform
ar.
D
eleuze e
G
uattari observam
que Kafka u
so
rr xg r"a
ring
que e
scre
via para adiar o
e
n
co
ntro efetivo co
m
a
s n
a
m
o
ra
-
das e
a
ssím
e
vitar o
ca
sa
m
e
nto.S N
as ca
rtas, dizem
o
s a
uto-
re
s, Kafka fez u
m
"u
so
perverso" da dualidade sujeito da
e
n
u
n
ciação-suieito do e
n
u
n
ciado. Essa dualidade é m
ais
u
m
a
"m
áquina binária" co
m
que a
lingüística habalha. O
sujeito da e
n
u
n
ciação é aquele que fala e
o
sujeito
do e
n
u
n
-
ciado é o
sujeito gram
atical. N
as ca
rtas de Kafka, o
sujeiüo
do e
n
u
n
ciado
a
ssu
m
e
o
m
o
vim
ento que o
sujeito da e
n
u
n
-
ciação não quer a
ssu
m
ir
-
trata-se de
,
,u
m
m
o
vim
ento de
papel". As ca
rtas vão para que Kafka não vá e
co
ntinue às
voltas co
m
su
a
m
áquina de e
xpressão. porque Kafka
,
,opu-
nha ca
sa
r a
e
scre
ve
r" e
se
se
rvia desse veículo fantasm
ático
para persistir n
a
e
scritura. A produção m
e
sm
a
da obra e
ra
se
u
m
o
vim
ento
"se
m
sair do lugar". Essa brincadeira de
KaÍka se
rvia-lhe indusive para fazer literatura n
a
s ca
rtas.
D
eleuze e
G
uattari co
n
sideram
a
s ca
rtas de Kafka co
m
o
parte integrante de su
a
obra, a
ssim
co
m
o
a
s n
o
velas e
o
s
ro
m
a
n
ce
s. N
esse ca
so
há de fato u
m
u
so
,
,perverso,'do dis-
positivo fantasm
ático, porque m
e
sm
o
que n
u
m
m
o
m
m
to
e
ste inviabilize
o
co
rpo, ajuda a
viabilizar
a
obra. e
u
e
u
so
s
inusitados desses n
o
vo
s veÍculos poderiam
se
r atualizados
hoje, e
não so
m
e
nte para u
m
grande e
scritor co
m
o
Kafka,
m
a
s para todos nós? Cabe-nos descobrir. Seria preciso co
n
_
tudo chegar a
obter ali a
alteridade, que a
o
rdem
que se
e
stipulou até agora co
m
e
ssa
inovação parece suprim
ir.
A questão da n
o
va
o
rganização da idenüdade
n
a
s redes
haz o
ca
so
dos textos se
m
a
utor. Isso n
o
s interessa de perto
para a
questão da criação. N
ovam
ente, e
ssa
situação pode
produzir depressa dem
ais o
se
u
elogio. Interessa a
o
capita-
lism
o fazer tam
bém
da e
scritura disponibilidade. N
o trân-
sito de textos se
m
a
utor à m
e
rcê de gualquer apropriação
_
situação ainda apenas im
aginada, m
a
s perfeitam
ente ve
ro
s-
sím
il n
o
co
ntexto dessa m
ídia
-
,
a
princípio só é possível
ve
r a
m
istura indiÍerenciada. A e
scritura é tratada co
m
o
inÍormação. Ela é trazida im
ediatam
m
te para perto (no se
n
_
tido de Benjamin)
e
portanto prontam
ente obstada n
a
su
a
duração. Será apropriada e
ali se
e
sgotará, e
a
tendência é
que a
colagem
substitua a
criação. Trazer para perto o
u
tor_
n
a
r disponível é elim
inar a
distância de qúe a
olra e
o
dese-
jo n
e
ce
ssitam
e
que a
e
strela cadente re
e
n
ce
n
a
e
m
se
u
per_
cu
rso
. A a
rte não habita o
banco de dados que tem
, pode_
ríam
os dizer, u
m
forte a
specto de choque. O
se
u
circuito é o
Jer.ncr Celare
I
N
osso sÉcwo XX: N
oras so
uR
E AR
TE TÉcl'ttcA E poDEREs
35
de incitar à criação, co
m
o
quando se
quer re
co
ntar u
m
a
n
a
r-
rativa
-
e
não apropriar-se dela o
u
co
m
pletá-la. A n
a
rrativa
tam
bém
vive da distância
-
ve
r, o
u
vir e
ler co
m
o
gestos
criativos im
plicam
se
m
pre a
co
n
stituição da alteridade, que
não podevir do e
xce
sso
de proxim
idade o
nde não se
possa
divisar o
n
a
rrador e
o
nde a
n
a
rrativa seja apropriável e
não
re
co
ntável. Sou co
ntagiado pelo processo de criação quan_
do so
u
charnado a
criar a
partir da obra e
não a
dispoidela
co
m
o
de u
m
a
inform
ação. Porque ela jâ fez u
rn
percurso,
e
de u
m
m
odo que ú ela poderia fazer
-
é a
su
a
singularìda-
de. Só m
e
re
sta fazêJa durar agora, produzindo u
m
ca
m
i-
úo tam
bém
singular.
E toda u
m
a
o
utra coisa que apontam
D
eleuze, G
uattari
e
Foucault quando problem
atizam
a
a
utoria.e Foucault ques-
tiona o
s lim
ites tênues que co
nfiguram
u
m
a
obra e
se
u
vín-
culo se
m
pre precário co
m
a
m
a
rca
a
utoral. Em
u
m
m
o
m
e
n
-
to, reivindica m
e
sm
o
para si próprio a
heteroním
ia
e
o
a
n
o
-
nim
ato, aponta que u
m
a
utor não pode se
r úam
ado
a
se
r
co
e
re
nte co
m
se
u
livro a
nterior, inclusive porque o
proces_
so
da e
scrituna'o hansform
a. O
tornar-seàutrì
ahavés da
obra não é de fato incom
um
n
a
literatura. Fernando pessoa
produz e
stilos diferentes co
m
se
u
s heterônim
os, a
alteridade
aparece diretam
ente n
a
poesia, o
texto ingressa n
o
devir
-
Fem
ando Pessoa ele m
e
sm
o
vira u
m
heterônim
o. O
pseu-
dônim
o pode se
r tam
bém
u
m
re
cu
rso
para driblar a
a
utoria
e
vários e
scritores o
utilizaram
. G
re
cu
rso
s do a
n
o
nim
ato,
co
ntudo, só são criadores quando produzem
re
sso
nâncias
n
a
própria e
scritura, eles são a
ntes u
m
a
figura de u
m
traba-
lho m
ais a
m
plo co
m
a
e
xpressão
-
e
ste sim
a
m
a
rca
criado-
ra
e
m
qualquer texto, seja ele de u
m
a
utor co
n
sagïado o
u
de u
m
hom
em
"infam
e", de u
m
a
nônim
o. D
eieuze
e
G
uattari m
o
stram
co
m
o
Kafka fez re
cu
a
r o
lugar do sujeito
da e
n
u
n
ciação e
criou u
m
a
literafura da e
n
u
ricia$o coleti-
va
, dando precedência a
o
trabalho co
m
a
e
xpressão de vá-
-
-
-
-4
ce
sso
a
m
a
rca
da singularidade, e
não da identidad". irfao
rias m
a
n
eiras: a
o
inhoduzir intensidades
co
m
o
a
m
úsica
desterritorializada que náo se
presta a
se
r u
m
pólo de u
m
a
relação e
strutural sim
ples; a
o
produzir persoìagens des_
teritorializados
n
a
n
a
rrativa; a
o
utilizar o
alem
ão
,
,m
e
n
o
r,,
de Praga etc. O
a
utor re
cu
a
para dar lugar a
u
m
frabalho
se
m
pÍe a
rriscado co
m
a
e
xpressão. e
u
etíonar a
dim
ensão
a
utoral não é e
scre
ve
r u
m
a
banalidade
e
não a
ssináìa. O
que não quer dizer que u
m
a
utor de n
o
m
e
obscuro não pos_
sa
produzir u
m
a
literatura re
volucionária. Ao co
nhário, foi
tornando-se de ce
rta form
a obscuro que Kafka produziu su
a
obra. D
igam
os a
ntes tom
ando-se
,
,m
e
n
o
r,,,
n
o
se
ntido des_
se
trabalho que co
n
stituina
"a
s co
ndições re
voiucionárias
de toda literatura". Trata-se a
ntes de tudo de u
m
a
posição
que se
atinge, o
u
de u
m
devir e
m
que o
s a
utores m
ais m
o
_
destos poderiam
ingressar. Essa posìção não é obtida co
m
o
m
e
ro
gesto de não a
ssinar u
m
texto. É u
m
a
co
nquista
cuja
re
co
m
pensa é a
criação
-
que vai co
ntagiar o
ukos, se
r dádi_
va
para o
utros, produzir alhures devires. Vem
os
n
e
sse
pro-
36
!çoDv q u
.4rLd u
..r ürn8-urarnqaoe,
e
nâo cla identidade. Não
n
o
s interessa ter textos de Kafka, Em
ily D
ickinson o
u
R
im
baud disponíveis e
a
nônim
os. A aiitude criadora
advinda de u
m
a
síngularidade n
o
s toca quando a
deixa-
m
o
s re
sso
a
r e
n
o
s incitar à criação, n
u
m
e
xe
rcício tam
bém
singular. Que pode ter o
n
o
sso
n
o
m
e
: u
m
n
o
m
e
é u
m
efeito,
u
m
a
figura provisória
e
tênue. A e
xpressão deveria se
r vi_
gorosa o
suficiente para e
m
punhá-lo dessa m
a
n
eira, co
m
o
pura singularidade. D
essa form
a, ele poderia até se
rvir para
Iry*
a
e
ssitura de ingressarno tum
ulto da disponibiiida_
{e.. E até im
agiúvel que o
n
o
m
e
e
nquanto
efeito o
u
singula_
ridade pudesse se
r u
m
protetor da ábra, m
ais u
m
a
palavra
n
o
e
xe
rcício criador da e
scritura.
^
. Esles eqúvocos parecem
de fato figuras do e
sforço de
abreviar, de u
su
rpar'os a
co
ntecim
entorã. ru
" a
u
raçaá. É o
úoque que Baudelaire tanto so
ube su
scitar e
aparar e
que
f.lrucr Cerera
N
osso sÉcuto XX: N
ot,rs so
rnt n
atr, ïÉcNrcA
E poDEREs
ó/
hoje a
figura da inform
ação gostaria que fosse para nós u
m
a
fatalidade
-
o
tum
ulto de im
agens n
a
TV (,todas se
valem
,,,
co
m
o
observa D
eleuze) o
u
a
e
scritura co
m
o
disponibilida-
de. A e
m
presa n
a
u
niversidade é u
m
grande dilegado da
m
odalidade da inform
ação. São o
s
,
"rultudo, im
ediatos e
aplicáveis que de fato a
cabarão co
m
toda a
pesquisa. E só
se
rão aplicáveis
se
houver a
preparação prév1a de u
m
co
n
_
texto para e
ssa
aplicação, o
que já é re
sultado de u
m
a
ope.
ração de poder. É de fato o
pensam
ento apoiado n
a
s re
sso
-
nâncias de u
m
a
duração que poderá produzir re
sultados
criadores co
n
cretos.
R
m
nnÊrucns Bm
lrocnÁRcAs
1. Benjamin, l99S, p. 139.
2. Barthes, I981a.
3. G
illes D
eleuze
e
Félix G
uattari m
o
stram
co
m
o
a
dom
inação capi_
talista ca
ra
cteriza
u
m
a
a
xiom
ática. por e
xe
m
plo, pelo Íato de su
_
portar u
rÍra heterogeneidade dos m
odelos de re
alização, desde
que isom
oúos
a
o
s a
xiom
as que efetuam
; o
u
pela possibilidade
de adicionar o
u
subtrair a
xiornas etc. Cf. D
eleuze e
iuattari, 1997.
4. Benjamin, I99Sa, p.204.
5. Jean Baudrillard desenvotve e
ssa
tese e
m
À l,om
bre des m
aioritês
silencieuses o
u
Ia fin du so
cial.
6. Cf. janice CaiaÍa, 1992. Cf. tam
bém
M
unú Sodré, 1990 p. 33. O
a
utor, a
o
elaborar o
co
n
ceito de
,
,telenealidade,,, afirm
a que não
há re
e
ngendram
ento-absoluts-da vid.+soei+ì
n
e
sseproeesso,
mÍü,
u
m
"proieto hegem
ônico,, por parte dos
,
,sim
ulacrás da so
cieda_
de pós-industrial,,.
t. Iï,"T"r*"la
definição breve de
',devjr,,,segundo aparece n
o
texto de D
eleuze
e
G
uattari. Trata-se de u
m
a
cãm
unicação
trans_
ve
rcal co
m
u
m
heterogêneo. N
o nivel,,m
olar,,
a
so
ciedade n
o
s
segm
enta bìnariam
ente, produzindo categorias identitárias (ho-
m
e
m
x m
ulher, n
egro x branco etc.). Contudo, o
s fluxos de dese-
jo e
stão se
m
pre e
scapando dessas dicotom
ias n
u
m
nÍvel
"m
olecular", Um
hom
em
pode se
r tom
ado por u
m
,
.devir_m
u-
lher" o
u
u
m
"devir<riança,,,
e
m
que ele n
a
o
e
o
u
im
ita, m
a
s se
I
-
_
*
.qryFj.