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1 Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas - PPGArC Linha de Pesquisa: Pedagogias da Cena: Corpo e Processos de Criação AA OOffiicciinnaa ddee IIlluummiinnaaççããoo ee aa CCoonnssttrruuççããoo ddoo EEssppeettááccuulloo:: anotações para uma proposta pedagógica. RONALDO FERNANDO COSTA Orientação: José Sávio Oliveira de Araújo Coorientação: Jefferson Fernandes Alves NATAL Abril, 2010. 2 RONALDO FERNANDO COSTA AA OOffiicciinnaa ddee IIlluummiinnaaççããoo ee aa CCoonnssttrruuççããoo ddoo EEssppeettááccuulloo:: anotações para uma proposta pedagógica. Dissertação de mestrado apresentada como pré- requisito para obtenção do grau de mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob orientação do Prof. Dr. José Sávio Oliveira de Araújo e coorientação do Prof. Dr. Jefferson Fernandes Alves. NATAL Abril, 2010. 3 AA OOffiicciinnaa ddee IIlluummiinnaaççããoo ee aa CCoonnssttrruuççããoo ddoo EEssppeettááccuulloo:: anotações para uma proposta pedagógica. por RONALDO FERNANDO COSTA BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. José Sávio Oliveira de Araújo. ORIENTADOR Prof. Dr. Jefferson Fernandes Alves COORIENTADOR (1º. Examinador) (2º. Examinador) (1º. Suplente) 4 Dedicatória À minha mãe, Maria José da Silva Costa Ao meu pai, Orcínio de Medeiros Costa (in memorian) À minha irmã, Verônica Cristina Costa Cruz Ao meu cunhado, Wallace George da Silva Cruz À minha sobrinha, Iasmin da Costa Cruz À minha namorada, Analwik Tatielle Pereira de Lima, pelo amor, carinho, companheirismo e paciência externados durante estes 5 anos de relacionamento. 5 AGRADECIMENTOS ü Ao professor, amigo e orientador, José Sávio Oliveira de Araújo, pela orientação, parceria e amizade nestes últimos 16 anos. ü Ao professor Jefferson Fernandes Alves, pela coorientação e pela atitude exemplar como educador. ü Ao CENOTEC (Laboratório de Estudos Cenográficos e Tecnologias da Cena), pelo espaço institucional fundamental na investigação de estratégias pedagógicas para o ensino de tecnologias cênicas. ü Ao Grupo Estandarte de Teatro co-partícipe desta investigação. Obrigado, obrigado, obrigado e mil vezes obrigado! ü Aos professores Ernani de Castro Maletta, Naira Neide Ciotti, Marta Maria C. A. Pernambuco, pelas críticas e interlocuções. ü Aos amigos Ana Claudia Viana, Lenilton Teixeira e Roseana Melo, pela formação do “quarteto fantástico”. ü Ao Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas/UFRN, aos seus coordenadores, funcionários e alunos que contribuíram direta e indiretamente com minha pesquisa. ü Aos professores José Pereira de Melo, Marcos Bulhões Martins, Makários Maia e Teresinha Petrucia da Nóbrega, pela amizade e incentivo. ü Aos professores do Curso de Teatro e Dança da UFRN, pelo apoio. ü Ao Grupo de Teatro Clowns de Shakespeare, pela parceria, amizade, paciência e profissionalismo. ü Ao Studio Corpo de Baile e seus grupos: Domínio Cia. De Dança, Grupo Clássico e Trupe de Sapateado, pelos 10 anos de carinho, reconhecimento e trabalho. ü A EDTAM e seus grupos: Cia. De Dança do Teatro Alberto Maranhão e Grupo Clássico, pelo reconhecimento e 10 anos de dança. ü Ao querido Grupo de Teatro “O Pessoal do Tarará”, pela parceria, reconhecimento e admiração mútua. ü Ao Grupo de Teatro “Facetas, Mutretas e Outras Histórias”, pela amizade e conversas de boteco. ü Ao Grupo Alfenin de Teatro/PB, pelo início de uma nova parceria. ü Ao Grupo Parafolclórico da UFRN, pela apaixonante cultura popular. ü Aos amigos Grimário Farias, Ivonete Albano e João Marcelino, pelo amizade verdadeira e o exemplo artístico. 6 ü Aos amigos Anna Thereza Miranda, Anízia Marques, Charles Sales, Edeílson Matias, Karenine Porpino, Larissa Marques, Maria Cardoso, Maurício Motta, Marcelo Miranda, Rita Luzia, Rosa Costa, Rosevelt Pimenta, Rubens Barbosa, Sávio de Luna e Wanie Rose Medeiros, pela paixão de iluminar dança, vocês são os culpados! ü Ao casal amigo Nara Kelly e Rogério Ferraz, pela amizade e contribuição artística. ü Às amigas Cris Simon, Giovanna Araújo, Quitéria Kelly e Titina Medeiros pelo carinho e dedicação ao teatro. ü Ao amigo Arlindo Siqueira (Bezerra), pelo companheirismo e dedicação ao Grupo que tanto amo. ü A todos os técnicos do Teatro Alberto Maranhão, pela assistência e amizade. ü Ao compadre Manoelzinho e família. ü À Casa da Ribeira, pelo reconhecimento e parceria. ü Aos fotógrafos Pablo Pinheiro e Maurício Cuca, pelo companheirismo. ü A Eduardo Pinheiro, pela interlocução técnica. ü Aos secretários César Barros, Dejardiere e Íris, pelo salvamento da pátria. ü A ABRIC/OISTAT-BR, pelo desenvolvimento das tecnologias cênicas brasileiras. ü À CAPES, pela bolsa de estudos. ü A todos os meus ex-alunos, em especial a Anderson (Nando) e Janielson, meus anjos da guarda, pelo aprendizado mútuo. ü A Dona Vanilda, Seu Francinaldo, Patrícia, Marla e Érico, pela torcida. ü Aos meus familiares e a todas as pessoas que contribuíram direta e indiretamente com este trabalho. 7 RESUMO O presente trabalho possui como objetivo investigar uma oficina básica de iluminação cênica direcionada aos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro de Natal/RN, a fim de instrumentalizá-los para alguns aspectos relacionados à iluminação. Buscamos o desenvolvimento de estratégicas pedagógicas para a construção dos conhecimentos específicos sobre iluminação cênica, objetivando a mudança de uma práxis, tanto para seu desenvolvimento estético, como para seu ensino. A investigação, caracterizada metodologicamente como uma pesquisa-ação, tenta despertar a criticidade nos sujeitos em relação à criação da luz de maneira mais compartilhada e conta com a “dialogicidade” e a “abordagem problematizadora” como fundamentos metodológicos mobilizadores para a construção dos conhecimentos. Dessa forma, os referenciais teóricos desta dissertação situam-se nos trabalhos de Paulo Freire no que se refere principalmente ao pensamento dialógico, nas sistematizações pedagógicas do Grupo de Estudos de Práticas Educativas em Movimento (GEPEM/UFRN) e nas produções do Laboratório de Estudos Cenográficos e Tecnologias da Cena (CENOTEC/UFRN), no que diz respeito à construção de uma prática educativa desenvolvida coletivamente, levando em conta a realidade dos sujeitos, estabelecendo relações entre os conhecimentos específicos da área ensinada e outras áreas do conhecimento, e, principalmente, que possa ser dinâmica e transformadora. Palavras chaves: Ensino de Iluminação; Iluminação Cênica; Perspectiva Dialógica; Teatro. 8 ABSTRACT The present work has as its object of study a basic stage lighting workshop targeted to scenic agents to enabling them into some aspects related to lighting. We seeked, therefore, the development of pedagogical strategies for the construction of specific knowledge of stage lighting, aiming to change a practice, both for their aesthetic development, as for their teaching. The research, characterized as a methodological action research attempts to arouse criticism in the subjects in relation to the creation of light in a more shared and has the "dialogue" and "problematizing approach" as mobilizers methodological foundations for the construction of knowledge. Thus, the theoretical framework of this thesis lie in the work of Paulo Freire with regard to thinking mainly of dialogue, the pedagogical systematization of the Group for the Study of Educational Practices in Motion (GEPEM/ UFRN) and in the productions of the Laboratory for Scenary and Scene Technology (CENOTEC/ UFRN), regarding the construction of an educational practice developed collectively, taking into account the reality of the subjects in connecting the expertise of the area taught and other areas of knowledge, and especially a practice thar can be dynamic and transforming. Keywords: Lighting Education; Stage Lighting; dialogical perspective; Theater. 9 SUMÁRIO INTRODUÇÃO - E no começo... Era luz ou escuridão?................................................................. 11 Considerações Metodológicas. ..................................................................................................... 17 O partícipe na investigação: O Grupo Estandarte de Teatro. .................................................... 23 A oficina de teatro ..................................................................................................................... 27 1) Primeiras Aproximações com O Grupo Estandarte de Teatro - a Entrevista Coletiva. ........ 29 2) Os Jogos Teatrais. ................................................................................................................. 30 PRIMEIRO CAPÍTULO - Caminhando em direção à luz................................................. 34 1.1 – O entendimento dos contextos. ........................................................................................... 36 1.2 – A Entrevista Coletiva. ......................................................................................................... 51 1.3 – “Uma Luz no Fim do Túnel” - A Estruturação da Oficina Básica de Iluminação Cênica. . 54 1.3.1 – Variáveis da luz (E.R). ................................................................................................. 54 1.3.2 – Espaço Cênico (E.R). .................................................................................................... 63 SEGUNDO CAPÍTULO - À luz do Conhecimento. .......................................................... 71 2.1 - A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica (O.C). ......................................................................................................................... 73 2.2 - Luz versus Iluminação e Tecnologia Teatral (O.C) ............................................................. 82 2.3 - Equipamentos de Iluminação Cênica (O.C) ......................................................................... 90 2.4 – Equipamentos de Iluminação Cênica (continuação) / Princípios básicos de iluminação O.C). ........................................................................................................................................... 105 2.5 - Operação de Luz (O.C). ..................................................................................................... 113 TERCEIRO CAPÍTULO - Faça-se a luz! ........................................................................ 119 3.1 – Definição Angular e Posicionamentos dos Refletores (A.C) ............................................ 121 3.1.1 - Ângulos e Posições dos Refletores. ............................................................................. 125 3.2 – A Iluminação de uma cena (A.C) ...................................................................................... 136 CONSIDERAÇÕES FINAIS - Entre luzes e sombras. ................................................... 150 BIBLIOGRAFIA - À luz de outras obras ......................................................................... 155 10 ANEXOS ........................................................................................................................... 161 1 - O Itinerário do Grupo Estandarte de Teatro entre os anos de 1987 e 2000 .......................... 162 2 - Considerações históricas acerca do uso da luz enquanto linguagem no teatro. .................... 166 3 - Planos de aulas. ..................................................................................................................... 174 4 - Cronograma da Oficina ......................................................................................................... 185 11 INTRODUÇÃO E no começo... Era luz ou escuridão? 12 Fazer luz, decididamente, não é uma profissão exclusivamente técnica. A técnica torna-se arte quando se consegue traduzir uma idéia em um efeito óptico sobre um palco. Jean Jacques Roubine. O ato de iluminar no teatro, durante muito tempo, foi considerado como uma ação ligada, quase que exclusivamente, à possibilidade de clarear a cena para ser vista, possuindo pouca relação de sentido com esta. Hoje, a iluminação enquanto linguagem é uma forte definidora da visualidade do espetáculo, acrescentando um grande poder semântico na cena contemporânea, exigindo-se, cada vez mais, estudos e reflexões a respeito. No Brasil, mesmo admitindo-se a importância da iluminação para o espetáculo cênico, ainda se conta com uma pequena quantidade de pesquisas sobre o tema, sejam elas destinadas ao desenvolvimento de novas tecnologias de trabalho, sejam para ampliação dos limites estabelecidos entre sua criação e ensino. Para termos uma ideia, a grande maioria dos iluminadores cênicos brasileiros encontra na atividade prática a única alternativa viável de formação, devido à inexistência de escolas específicas em nível médio (cursos técnico- profissionalizantes) e superior, definindo-se, comumente, de duas maneiras: 1 - Com a presença de um instrutor: a) Quando o aluno vivencia oficinas de iluminação ministradas por profissionais já estabelecidos no mercado de trabalho. b) Quando um aprendiz trabalha diretamente na assistência técnica de um iluminador, aprendendo na prática cotidiana. 2 - Sem a presença de um instrutor: a) Quando a alternativa de formação reside no autodidatismo. No que diz respeito ao autodidatismo, concordamos com Shön quando afirma que: Aprender uma prática por conta própria tem a vantagem da liberdade – liberdade para experimentar sem os limites das visões recebidas de outros. Mas também oferece a desvantagem de exibir que cada aluno reinvente a roda, ganhando pouco ou nada da experiência acumulada pelos outros (SHON, 2000, p.39). 13 Tal realidade expõe uma forte tendência dos profissionais em direcionar suas atenções para o estudo estrito das técnicas e tecnologias em iluminar espetáculos, revelada pela escolha dos conteúdos a serem ministrados numa oficina ou pela liberdade por optar por qual caminho seguir para sua autoformação. Isso denota, por vezes, o despreparo de muitos iluminadores frente aos seus papéis de educadores e/ou artistas, por desconsiderarem conhecimentos filosóficos, semióticos, semiológicos, artísticos, estéticos, dentre outros, como fundamentais para suas formações. Em se tratando das oficinas de iluminação cênica, podemos ainda considerar que essa tendência tecnicista perpetua um modelo de ensino que se reduz à função de instituir um conjunto de habilidades e competências baseadas em um determinado volume de conhecimentos que alicerçam uma capacidade eminentemente técnica de trabalho e produção. Além disso, verifica-se, em sua maioria, um ensino restrito a uma forma de instrução centrada na tradicional transmissão de conhecimentos que não busca promover a autonomia do educando, muito menos desenvolver a capacidade crítica dos sujeitos do processo educativo. Além desse panorama das oficinas (ensino não formal1), podemos ainda mencionar que, no âmbito formal, principalmente nas universidades, o ensino de iluminação, até pouco tempo, era reduzido a conteúdos disciplinares das cadeiras de Cenografia existentes nos diversos cursos de Artes Cênicas espalhados pelo país. Com a reestruturação curricular desses cursos e o surgimento de outros tantos, os conhecimentos sobre iluminação cênica começaram a ser trabalhados em disciplinas específicas, constituindo um avanço significativo em termos educacionais e pedagógicos para a área. Mesmo assim, tais disciplinas apenas representam pequenas ilhas numa imensidão tecnicista e bancária sob a qual o ensino de iluminação brasileiro está imerso. Outro problema ligado diretamente à formação do iluminador é o número reduzido de publicações específicas no Brasil, obrigando o profissional a montar um enorme quebra-cabeça com livros, apostilas, documentos técnicos e sites da internet. Tal 1 A educação não formal refere-se a uma ampla variedade de atividades educacionais organizadas e desenvolvidas fora do sistema educacional formal a que são destinadas, em geral, a atender a interesses específicos de determinados grupos. A educação formal refere-se a uma estrutura organizada, hierarquizada e administrada sob normas rígidas, ligadas a um sistema educacional estabelecido em escolas ou universidades. 14 problema poderia ser solucionado com a tradução para o português de publicações de outros países, no entanto o mercado editorial brasileiro, no que tange a área de iluminação cênica, ainda não despertou para a necessidade de se investir significativamente nessa área de conhecimento. Se não existem muitas publicações, também não existem, por conseguinte, muitos registros sobre as práticas educativas desenvolvidas pelo país, dificultando o intercâmbio de ideias e a realização de um debate criterioso sobre a estruturação pedagógica dessas práticas. Nesse sentido, podemos afirmar que a formação do iluminador não o qualifica plenamente para as exigências profissionais, exigindo uma reflexão sobre alguns aspectos referentes à inserção do iluminador nos processos criativos, como apresentados no esquema abaixo. Como a formação do iluminador interfere na relação entre luz e a construção do espetáculo? Que relações de produção/criação se oferecem para o iluminador frente às diversas possibilidades de construção cênica? Formação do Iluminador Cênico no Brasil. Necessidades Problemática 1 – Conhecimento Técnico e Tecnológico 2 – Conhecimentos específicos sobre as linguagens artísticas com as quais trabalha 3 – Diálogos com diversos saberes: Estéticos, Filosóficos, Semióticos, Semiológicos, etc. 1 – Pouca sistematização e registro das práticas educativas e suas metodologias. 2 – Escassa Literatura especializada no Brasil, juntamente com a tradução de poucas obras para o português. Contexto – Histórico, Geográfico, Cultural, Social, etc. Cadeias Produtivas Dentro de um Sistema Cultural. (discussão de 4 possibilidades de construção cênica) Textocêntrico Autocrático Coletiva Colaborativa (Construção cênica que toma como base o texto dramático) Unidade Estética Autoria relacionada às ideias do Dramaturgo (Construção cênica baseada unicamente nas ideias do Encenador) Unidade Estética Autoria relacionada às ideias do Encenador (Construção cênica coletiva) Diálogos com o coletivo até se estabelecer um consenso. Unidade Estética Autoria Coletiva (Construção cênica coletiva) Diálogos com o coletivo, sob o ponto de vista das especializações. Hibridismo estético. Campo autoral plural. 15 Ao analisarmos o esquema, notamos que a problemática da formação tende a preparar inadequadamente o iluminador para os intensos diálogos que se estabelecem nos processos criativos entre os diversos artistas da cena, prejudicando a interação interdisciplinar e as cooperações capazes de favorecer o conjunto formador do espetáculo. Ademais, cada sistema de produção exige uma postura dialógica diferente do iluminador no processo criativo. Nos sistemas textocêntricos e autocráticos, as ideias sobre a criação da iluminação, além de serem norteadas por uma estética unificadora, são debatidas com um menor número de agentes cênicos. Já nos sistemas coletivos e colaborativos, as ideias são compartilhadas com um maior número de artistas, como também exigem um caráter mais propositivo e autoral do iluminador, pois sua opinião, muito provavelmente, norteará o processo de concepção da iluminação. Ainda sobre a construção do espetáculo, podemos também mencionar a importância de o iluminador estar presente no processo criativo, pois é muito comum que os profissionais da luz sejam procurados num momento tardio para a criação da iluminação, perdendo-se, por ocasiões, muitas possibilidades que este elemento cênico possa oferecer à estética do espetáculo. Contudo, mesmo quando o iluminador é efetivado no processo criativo, o desconhecimento da materialização da luz na cena enquanto arte por parte de muitos agentes cênicos é um outro fator determinante para as inconsistências nos diálogos durante a criação de um projeto de iluminação. A problemática apontada nessa introdução nos mobilizou a desenvolver este trabalho dissertativo, que se propôs a investigar uma oficina direcionada a outros agentes cênicos com o intuito de instrumentalizá-los sobre alguns aspectos da iluminação na tentativa de minimizar as lacunas de formações existentes sobre este assunto, possuindo as seguintes inquietações: Como pensar uma Oficina de Iluminação Cênica que possa sistematizar pedagogicamente relações de ensino e aprendizagem voltadas tanto para as deficiências de formação do iluminador quanto para a formação dos demais agentes cênicos? Qual a importância de trabalhar questões fundamentais de iluminação com outros agentes cênicos? Em que medida essa formação básica pode contribuir para a melhoria dos diálogos entre o iluminador e os demais agentes cênicos nos processos criativos? 16 Tais questões nos lançam para uma reflexão pedagógica sobre iluminação enquanto linguagem vinculada às práticas espetaculares que, nos limites deste estudo, provoca-nos a construir um percurso investigativo que contemple os seguintes objetivos: 1. Desenvolver uma oficina básica de iluminação cênica que contemple conteúdos históricos, estéticos, semióticos, semiológicos, artísticos, técnicos, tecnológicos, dentre outros. 2. Investigar uma prática educativa na área de Iluminação Cênica destinada a diversos agentes cênicos, instrumentalizando-os para alguns aspectos sobre iluminação cênica. 3. Contribuir para o desenvolvimento didático-pedagógico do Teatro e para a melhoria dos diálogos entre o iluminador os demais agentes cênicos na construção do espetáculo. Tais objetivos constituem-se anteparos que nos orientam na sistematização de uma ação pedagógica no campo de iluminação cênica que busque compreender os mecanismos epistemológicos para a construção de seus conhecimentos específicos, pretendendo a mudança de uma práxis, tanto para seu desenvolvimento estético, como para seu ensino. Sobre essa reflexão Araújo (2005) menciona que: [...] faz-se necessário incorporar novos materiais bibliográficos, novos recursos tecnológicos e novas concepções de ensino de teatro, cuja organização possa contemplar as novas reflexões e sistematizações em áreas antes consideradas como instrumentos técnicos, mas que, cada vez mais, se afirmam como componentes indissociáveis no sistema de representação teatral e, portanto, necessários tanto aos que a elas se dedicam, quanto aos que delas se utilizam, como o dramaturgo, o diretor e o ator. A inclusão destas contribuições no cotidiano de nossas práticas de ensino de teatro ainda se encontra por fazer (p.111). Dessa forma, é condição importante para a transformação dessa práxis, como defendemos nesta pesquisa, que as ações pedagógicas sejam desenvolvidas sobre duas perspectivas: a primeira, dialógica, e a segunda, estética/artística. 17 Considerações Metodológicas. O desenho investigativo que se apresenta nos conduz a pensarmos em uma abordagem metodológica de caráter interventivo, como a pesquisa-ação para o desenvolvimento desta investigação, que visa contribuir com a da área de iluminação cênica, mais especificamente com o seu ensino. O avanço de qualquer segmento profissional necessita de constantes proposições e incentivos para pesquisas, sejam estas destinadas à elaboração de novas técnicas, tecnologias e metodologias para o trabalho ou para o desenvolvimento de práticas educativas que venham qualificar a formação e/ou especialização dos profissionais envolvidos na área. Entendemos a pesquisa como a busca sistematizada para a solução de um problema. Zamboni (2006) se refere à pesquisa como uma atividade que requer um método que implica premeditação para se chegar a um resultado desejado. Contudo, também reconhecemos que seus desdobramentos podem ir além da solução de um problema de estudo, ocasionando profundos reflexos em diversas outras áreas e alcançando resultados inimaginados pelo pesquisador. Para Zamboni (2006) pesquisa é: [...] a busca sistemática de soluções, com o fim de descobrir ou estabelecer fatos ou princípios relativos a qualquer área de conhecimento humano [...] No entanto, como em qualquer atividade humana, pesquisa enquanto processo não é somente fruto do racional; o que é racional é a consciência do desejo, a vontade e predisposição para tal, não o processo da pesquisa em si, que intercala o racional e o intuitivo na busca comum de solucionar algo (p. 51 e 52). Toda pesquisa necessita de um método para se alcançar seus objetivos. “Método é o percurso pelo qual esses objetivos são atingidos por meio da organização de uma seqüência a ser seguida” (Ibid, p.52). Contudo, quando nos referimos a pesquisa em arte, deparamo- nos com dificuldades em colocar questões artísticas subjetivas em parâmetros objetivos e passíveis de análise, classificação, ordenação e conceituação. Nesse sentido, a natureza da investigação em arte que lida concomitantemente com as dimensões inteligível e sensível em seu processo traz desafios que dificultam a escolha de uma metodologia específica, obrigando o pesquisador a criar o próprio percurso metodológico, a fim de se alcançar soluções ou resultados almejados para sua pesquisa. Isaacsson (2006) afirma que: 18 Na medida em que o pesquisador torna-se testemunha sensível das ações e imagens que se constroem e se desfazem diante dele, vivencia momentos ímpares, penetrando efetivamente na dinâmica da ação criativa [...] Assim a exatidão da compreensão do objeto – movimento criador impõe, contrariamente à experiência científica, a necessidade de contato sensível do investigador com o fenômeno em estudo, um contato que desperte sua intuição e imaginação. Impõe o surgimento de um pesquisador criativo (p.85). Nas artes cênicas, podemos destacar a existência de algumas características que dificultam ainda mais o desenvolvimento das investigações, quando nosso objeto de estudo se refere ao processo criativo e/ou à obra de arte em si, a saber: “[...] o caráter processual de grande parte dos projetos de pesquisa e a efemeridade do espetáculo cênico. Como conseqüência, surge a necessidade de encontrar pontos ou aspectos fixos para sustentar as possibilidades de leitura” (CARRERA, 2006, p. 09). Dessa forma, os pesquisadores em artes cênicas que trabalham com a análise da prática do espetáculo devem estar preparados para as flutuações inerentes aos processos de construção cênica que podem redirecionar os rumos da pesquisa científica, instaurando-se, por vezes, um processo de recusa daquilo que se apresenta. Nessas pesquisas o desafio [...] estaria em especificar objetivos que incorporassem as habilidades necessárias à criação artística, evidenciando que uma boa forma é justamente aquela que inclua algum grau de imprecisão que permita o movimento ou deslocamento de conteúdo cada vez que o observador entre em contato com a obra (Ibid, p. 12). Ainda podemos fazer referência ao fato de que muitos pesquisadores em artes cênicas integram o próprio universo de investigação, sendo participantes diretos em processos que se orientam para a construção de obras artísticas ou como propositor de práticas pedagógicas nas artes cênicas. Coloca-se, assim, em um duplo papel de pesquisador e de participante do grupo, vivenciando uma constante dialética entre o envolvimento e o distanciamento do seu objeto de estudo. Além disso, a efemeridade, inerente às obras artísticas cênicas, dificulta seus estudos a posteriori, principalmente quando os espetáculos terminam seu ciclo de apresentações e não estão mais em cartaz, impossibilitando a efetivação presencial do pesquisador “ao vivo”, frente à criação ou fruição do espetáculo cênico. As impressões que esse momento 19 ocasiona no espectador/pesquisador são difíceis de ser estudadas, e o processo de troca apenas pode ser analisado por fotografias, vídeos, diários de bordo, questionários, entrevistas, dentre outras possibilidades. As nuances apresentadas até aqui, embora não sejam determinantes para uma escolha, influenciaram fortemente a opção pela pesquisa-ação como a abordagem metodológica a ser adotada nesta pesquisa. Tal abordagem objetiva a modificação de uma realidade específica, produzindo conhecimentos relativos a essas transformações (BARBIER, 2007). No nosso caso, propomos uma ação pedagógica na área de iluminação cênica para a instrumentalização dos agentes teatrais envolvidos na pesquisa, numa tentativa de ampliar os universos de diálogos frente à iluminação. Nesse sentido, esta pesquisa-ação visa à construção de conhecimentos específicos sobre iluminação cênica de forma compartilhada, respeitando os diversos sujeitos existentes nesses processos educativos, cujas vozes são consideradas como balizadoras de novas problematizações e, por conseguinte, de novas possibilidades de ensino e aprendizagem. Essa postura democrática em relação à construção do conhecimento investe nos sujeitos do processo de ensino enquanto colaboradores ativos na pesquisa, significando dizer que temos uma co-participação para o desenvolvimento da investigação, tornando claro que essas mudanças devem ser percebidas e analisadas por todos os integrantes que, no caso discutido nesta dissertação, objetivam a transformação da percepção e do comportamento dos agentes cênicos2 frente à criação da iluminação cênica. Nesse sentido, concordamos com Franco (2005) ao afirmar que: A pesquisa-ação crítica considera a voz do sujeito, sua perspectiva, seu sentido, mas não apenas para registro e posterior interpretação do pesquisador: a voz do sujeito fará parte da tessitura da metodologia da investigação. Nesse caso, a metodologia não se faz por meio das etapas de um método, mas se organiza pelas situações relevantes que emergem do processo. Daí a ênfase no caráter formativo dessa modalidade de pesquisa, pois o sujeito deve tomar consciência das transformações que vão ocorrendo em si próprio e no processo. É também por isso que tal metodologia assume o caráter emancipatório, pois mediante a participação consciente, os sujeitos da pesquisa passam a ter oportunidade de se libertar de mitos e preconceitos que organizam suas defesas à mudança e reorganizam a sua autoconcepção de sujeitos históricos (p.186). 2 Agentes Cênicos são todos os profissionais envolvidos diretamente com a construção do espetáculo cênico, tais como: diretores, atores, bailarinos, iluminadores, cenógrafos, maquiadores, figurinistas, sonoplastas, cenotécnicos, dentre outros. 20 O proponente do estudo, neste tipo de metodologia, deve assumir dois papéis, o de pesquisador e o de participante do grupo, que, de certa forma, quebra com o ideário positivista de distanciamento entre sujeito e objeto pesquisado. A postura como pesquisador mediador do processo de construção de conhecimentos coloca-nos como um integrante ativo no universo de investigação. Isso significa que inevitavelmente nos encontramos numa dialética que articula constantemente “[...] a implicação e o distanciamento, a afetividade e a racionalidade, o simbólico e o imaginário, a mediação e o desafio, a autoformação e a heteroformação, a ciência e a arte”. (BARBIER, 2007, p.18). Outra característica importante a destacar em uma pesquisa-ação é sua organização em “espiral cíclica”, que permite readequações e alterações de rumo no processo. Franco (2005) expõe que a imprevisibilidade é um componente fundamental da prática de uma pesquisa-ação; considerá-la significa estar aberto à reconstrução do caminho para recolocação de prioridades, sempre no coletivo, por meio de acordos consensuais amplamente negociados. Isso significa dizer que os resultados parciais da pesquisa podem ressignificar os rumos da investigação, alterando o planejamento original, fazendo-nos encontrar e discutir novos caminhos a serem seguidos na tentativa de transformação da realidade. Franco (2005) ainda menciona que existem: [...] várias maneiras de se considerar a “espiral cíclica”, vista como retomada em processo das ações, análises, reflexões, numa dinâmica sempre evolutiva. Kurt Lewin (1946) considerava que a pesquisa-ação é um processo de espiral que envolve três fases: 1. Planejamento, que envolve reconhecimento da situação; 2. Tomada de decisão; e 3. Encontro de fatos (factfinding) sobre os resultados da ação. Esse factfinding deve ser incorporado como fato novo na fase seguinte de retomada do planejamento e assim sucessivamente (p.187). A pesquisa-ação é, por assim dizer, crítica e dialógica, pois procura a emancipação dos sujeitos através da colaboração, ou seja, a reflexão dos sujeitos sobre o processo de ensino; objetiva a conquista da autonomia, por isso é transformadora. Nesse sentido, estamos falando de uma ação dentro da ação, pois defendemos uma ação dialógica como deflagradora da ação pedagógica, que coloca os sujeitos num contínuo diálogo para a construção dos conhecimentos. Esse processo de construção de conhecimento nos conduz às reflexões de Freire (1987) no que se refere à colaboração como sendo uma característica importante da ação dialógica. 21 Na co-laboração, exigida pela teoria dialógica da ação os sujeitos dialógicos se voltam sobre a realidade mediatizadora que, problematizada os desafia. A resposta aos desafios da realidade problematizada é já ação dos sujeitos dialógicos sobre ela, para transformá-la (p.167). Essa ação pedagógica (oficina), portanto, tenta despertar a criticidade nos sujeitos em relação à construção da luz de maneira mais coletivizada e conta com a “dialogicidade” e a “abordagem problematizadora” como fundamentos metodológicos mobilizadores da construção dos conhecimentos. A dialogicidade pauta-se na colaboração mútua entre os sujeitos do processo de ensino para a construção de conhecimentos capazes de modificar uma realidade específica, desmistificando que o ato de ensinar esteja ligado à visão tradicional de transmissão de conhecimentos, enquanto que a abordagem problematizadora é “a construção de relações entre o conhecimento universalmente sistematizado e as questões que emergem da realidade do aluno, levando-o a perceber que o conhecimento não é um objeto de contemplação e sim um instrumento de ação e reflexão” (ARAÚJO, 1998, p.16). Por conseguinte, temos como referenciais fundamentais para as ideias e sínteses contidas nesta pesquisa os trabalhos e produções de Paulo Freire no que se refere principalmente ao pensamento dialógico, e CENOTEC3/UFRN no que diz respeito à construção de uma prática educativa construída coletivamente entre os seus agentes, levando em conta a realidade destes, estabelecendo relações entre os conhecimentos específicos da área ensinada e outras áreas do conhecimento e, principalmente, que possa ser dinâmica e transformadora. Os processos dialógicos inerentes à oficina norteiam-se pelos estudos do GEPEM4/UFRN e se materializam em momentos pedagogicamente organizados e articulados: Estudo das realidades5 (ER), Organização do Conhecimento (OR) e Aplicação do Conhecimento (OC). 3 Laboratório de Estudos Cenográficos e Tecnologias da Cena, sob a coordenação do professor Dr. José Sávio Oliveira de Araújo, vinculado à linha de pesquisa “Pedagogias da Cena: Corpo e Processos de Criação” do Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas da UFRN (PPGarC). 4 Grupo de Estudos de Práticas Educativas em Movimento, sob a coordenação da Profª. Drª. Marta Maria C. A. Pernambuco, ligado à linha de pesquisa Estratégias do Pensamento e Produção de Conhecimento, do Programa de Pós-graduação em Educação da UFRN, em que nosso orientador desenvolveu sua dissertação de mestrado e tese de doutorado. 5 O termo original é Estudo da Realidade no singular. A variação Estudo das Realidades, no plural, apresentada aqui, foi utilizada por ARAÚJO (2005). 22 No Estudo das Realidades (ER), normalmente, apresentamos uma questão e/ou situação geradora que deve ser discutida e debatida pelos alunos, sobre a qual estes devem expor seus conhecimentos prévios, discutindo suas implicações. Nesse momento, o professor deve mediar o debate no qual as ideias são livremente colocadas pelos alunos, a fim de se estabelecer um clima comunicativo e participativo. É importante que o educador, por meio do estudo das realidades, conheça os perfis dos alunos e o contexto em que será inserido o processo de ensino para definir as estratégias, os procedimentos e os instrumentos pedagógicos que irá utilizar durante o desenvolvimento desse processo. Contudo também deve ter clareza de que esse planejamento não pode aprisioná-lo em uma estrutura rígida e imutável, visto que os diálogos estabelecidos entre os sujeitos do processo educativo podem orientá-lo para caminhos que o levem a replanejar e reestruturar a prática de ensino, ou seja, deve estar atento e aberto às necessidades, aos desejos, às curiosidades, às fragilidades, às potencialidades do coletivo em que se instaura o processo de construção dos conhecimentos, que o possibilitem articular as muitas vozes e referências presentes nesse processo. Na Organização do Conhecimento (OC), o professor deve orientar a sistematização da questão e/ou situação geradora para ampliar a compreensão do tema apresentado aos alunos. Essa organização visa aprofundar o diálogo inicial desenvolvido no Estudo das Realidades, introduzindo saberes universalmente sistematizados no processo de ensino e aprendizagem, que, no caso específico, foram conhecimentos técnicos, tecnológicos, estéticos e artísticos sobre iluminação cênica. No terceiro e último momento, a Aplicação do conhecimento (AC), existe uma retomada da questão e/ou situação inicial, generalizando-a para outras atividades que também são explicadas pelo mesmo conhecimento. Nessas atividades, novos desafios são colocados para a análise crítica dos alunos, permitindo-lhes “avaliar até que ponto se conseguiu ampliar uma visão anteriormente construída acerca do objeto de estudo” (ARAÚJO, 2005, p.97). Esses momentos se caracterizam pela organização de um diálogo constante por meio da problematização de situações significativas, em que o educador, como mediador do processo de ensino e aprendizagem, deve instituir uma ponte entre o conhecimento 23 universalmente sistematizado e as questões emergentes das realidades dos alunos, permitindo-lhes perceber diferentes aspectos acerca da iluminação cênica, apontar as contradições e buscar a construção de conhecimentos sobre esse objeto de estudo. Nesse sentido, torna-se necessário avaliar, por meio da continuidade da prática, se houve ruptura em relação às visões iniciais, ponderando se o processo educacional foi realmente transformador. O partícipe na investigação: O Grupo Estandarte de Teatro. Dessa forma, tais momentos articulados na construção compartilhada do conhecimento enfeixam-se na proposta da oficina de iluminação cênica apresentada nesta dissertação. Assumiu como co-participante investigativo o Grupo Estandarte de Teatro6, fundado em 1987, na cidade do Natal/RN, a partir de uma iniciativa de um grupo de jovens atores que desejavam estudar e pesquisar a cultura popular e levar o teatro às comunidades que não tinham acesso às casas oficiais de espetáculo. O Estandarte conta hoje com 12 integrantes com perfis que variam entre estudantes universitários, agentes sociais, professores de teatro e professores universitários. A própria existência do grupo decorre do enredamento dos itinerários e das experiências individuais dos seus componentes, que contribuem para a construção das atividades coletivas e dos objetivos comuns a serem alcançados. Nesse sentido, aproximarmo-nos, minimamente, de fragmentos dos itinerários e das experiências de cada um deles ajuda-nos no mapeamento do próprio Grupo Estandarte de Teatro, dando informações importantes para o desenvolvimento da oficina. A seguir, apresento cada um deles: Asclepíades Fernandes de Souza Campos (Asclé Campos)7 nasceu em Natal/RN. Formado em Licenciatura em Educação Artística com habilitação em Teatro pela UFRN, trabalha como professor de Artes na rede municipal de ensino em Natal/RN. Paralelamente a sua carreira docente, também se dedica ao ofício de “vídeomaker” (videógrafo) amador, produzindo pequenos vídeos e curtas-metragens. É um dos novos integrantes do Grupo 6 Nos anexos desta dissertação apresentamos algumas considerações sobre os espetáculos desenvolvidos pelo Grupo entre os anos de 1987 e 2000. 7Em parênteses estão os nomes artísticos adotados pelos artistas do Grupo Estandarte de Teatro. 24 Estandarte Teatro, sendo chamado neste ano de 2009 para participar como ator da remontagem da encenação “Uma Coisa que Não tem Nome”. Danilo Delgado da Costa Vieira (Danilo Vieira) nasceu em Natal/RN. Estudante universitário do curso de Psicologia pela UnP (Universidade Potiguar), trabalha com teatro amador há cerca de 4 anos. Numa das oficinas de iniciação para atores oferecidos pelo Centro Experimental de Pesquisas Teatrais8 de Natal/RN, conheceu Lenilton Teixeira, do Grupo Estandarte de Teatro. Anos mais tarde, em 2009, foi convidado pelo próprio diretor a integrar o elenco da remontagem da encenação “Uma Coisa que Não Tem Nome”. Edna de Paiva Pereira (Edna Paiva) nasceu em Natal/RN. Assistente social formada pela UFRN trabalha na rede de saúde pública do município de Natal/RN. É integrante do Estandarte desde 1996, participando como atriz de diversos espetáculos do grupo: Oropa, França e Bahia e três dramas sem entremeios (1997); Bocas de Lobo (2000); A Ilha Desconhecida (2002); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). Jefferson Fernandes Alves (Jefferson Fernandes) nasceu em Natal/RN. Possui graduação em Pedagogia pela UFRN, mestrado em Ciências Sociais pela UFRN e doutorado em Educação pela UFRN. Professor adjunto do Departamento de Educação da UFRN, ingressa no Estandarte em 1995. Em parceria com Lenilton Teixeira, dirigiu (e adaptou os textos) os espetáculos Uma Coisa que Não Tem Nome (2005) e Matrióchka (2007). João Lins de Oliveira Filho (João Lins) nasceu em Natal/RN. Formado em Licenciatura em Educação Artística, com habilitação em Teatro pela UFRN, trabalha como professor de teatro em dois projetos sociais: PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) e Casa Renascer em Natal/RN. Atualmente coordena a Trupe Lorotas e Presepadas, que trabalha com artes circenses. Ator do grupo Estandarte desde 2002, participou dos espetáculos: Ilha Desconhecida (2002); Remontagem da encenação Oropa França e Bahia e três dramas sem entremeios (2003); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). 8 Vinculada à Fundação José Augusto – Secretaria de Cultura do Estado do Rio Grande do Norte. 25 Jonas de Lima Sales (Jonas Sales) nasceu em Natal/RN. Formado em Licenciatura em Educação Artística, com habilitação em Teatro pela UFRN, especialista em Dança (UFRN) e Mestre em Educação (UFRN). Atualmente é professor de teatro e dança do Instituto de Apoio ao Desenvolvimento da Universidade Estadual Vale do Acaraú, bem como da Rede Municipal de Ensino em Natal/RN. Além disso, é professor da Rede Estadual de Ensino do Rio Grande do Norte e do Centro de Educação Integrada (CEI). É integrante do Estandarte desde 1994, participando dos seguintes espetáculos: Dom Chicote mula manca (1994); Oropa, França e Bahia e três dramas sem entremeios (1997); Bocas de Lobo (2000); A Ilha Desconhecida (2002); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). Juliana Barbosa de Araújo (Juliana Barbosa) nasceu em Natal/RN. Estudante universitária do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFRN, começou sua trajetória no teatro no colégio CEI (Centro de Educação Integrada). Lá conheceu Jonas Sales, diretor de um dos grupos da instituição e um dos principais incentivadores da sua carreira de atriz. Em 2007, foi convidada a integrar o Grupo Estandarte, participando no espetáculo Matrióchka (2007). Lenilton Teixeira dos Santos (Lenilton Teixeira) nasceu em Lajes/RN. Formado em Educação Artística com habilitação em Artes Cênicas pela UFRN, exercendo profissionalmente a função de professor de Artes da Rede Municipal e Estadual de Ensino na cidade de Natal/RN. Atualmente é o diretor da Escola Municipal de Teatro “Carlos Nereu de Souza”, destinada à formação técnica de atores ao nível médio de ensino. É integrante do Estandarte desde 1987, desempenhando, primeiramente, a função de ator, assumindo depois de 10 anos a direção dos seguintes espetáculos do Grupo: Oropa, França e Bahia e três dramas sem entremeios (1997), A Ilha Desconhecida (2002); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). Maria do Carmo Medeiros (Carminha Medeiros) nasceu em Currais Novos/RN. Formada em Educação Artística com habilitação em Artes Cênicas pela UFRN. Professora de artes na rede estadual e municipal de ensino em Natal/RN. É integrante do Estandarte desde 1987, participando como atriz de todos os espetáculos do Grupo: A Greve (1987), Não se paga! Não paga! (1989), Don Chicote mula manca (1994); Oropa, França e Bahia e 26 três dramas sem entremeios (1997); Bocas de Lobo (2000); A Ilha Desconhecida (2002); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). Maria de Lourdes Vitor (Dinha Vitor) nasceu em Cerro Corá/RN. Formada em Pedagogia pela UERN (Universidade Estadual do Rio Grande do Norte), com sede na cidade de Mossoró/RN, e especialista em Artes e Educação Física pela UFRN. Trabalha na função de supervisora na Rede Estadual de Ensino e como professora do ensino fundamental na Rede Municipal de Ensino em Parnamirim/RN, cidade da grande Natal/RN. Há 18 anos integra o Estandarte, participando como atriz da maioria dos espetáculos do Grupo: Don Chicote mula manca (1994); Oropa, França e Bahia e três dramas sem entremeios (1997); Bocas de Lobo (2000); A Ilha Desconhecida (2002); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). Marinalva Nicácio de Moura (Marinalva Moura) nasceu em São Gonçalo/RN. Formada em Licenciatura em Educação Artística com habilitação em Desenho, e Licenciatura em Educação Artística com habilitação em Teatro, ambos pela UFRN. Trabalha como professora de teatro no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRN) na cidade de Natal/RN. Atriz do grupo desde 2003, participou dos espetáculos: Remontagem da encenação Oropa França e Bahia e três dramas sem entremeios (2003); Remontagem da Ilha Desconhecida (2003); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). Thémis Suerda Gonzaga Bezerra (Thémis Suerda) nasceu em Currais Novos/RN. Formada em Licenciatura em Educação Artística habilitação em Teatro pela UFRN, exerce profissionalmente a função de professora na Escola Municipal de Teatro “Carlos Nereu de Souza”, em Natal/RN, lecionando a disciplina “História do Teatro no Rio Grande do Norte”. Atriz do grupo desde 2003, participou dos espetáculos: Remontagem da encenação Oropa França e Bahia e três dramas sem entremeios (2003); Remontagem da Ilha Desconhecida (2003); Uma Coisa Que Não Tem Nome (2005); A Palavra é Gesto (2006) e Matrióchka (2007). Minha9 participação no papel de iluminador fez-me vivenciar, desde o ano de 2000, vários processos criativos no referido grupo, e, por serem estes mais democráticos e 9 Nesse parágrafo utilizarei o verbo na primeira pessoa do singular. 27 coletivizados, comecei a questionar a inserção e a postura profissional nesses contextos de criação, elaborando pensamentos e reflexões encontrados nesta dissertação, por isso, a escolha desse ambiente para o desenvolvimento da oficina proposta para esta pesquisa. A oficina de teatro Os grupos de teatros, na maioria das vezes, desenvolvem a formação de seus integrantes em função das necessidades do coletivo, optando-se, geralmente, por oficinas teatrais como procedimento de ensino e aprendizagem. Tal opção reside no fato de as oficinas serem um importante espaço de formação alternativa para o teatro, responsável por uma grande parcela do aprimoramento técnico e reflexivo do fazer teatral, pois nos dão a possibilidade de aprofundamento específico em certos aspectos da linguagem, o que de certa maneira nos é cabível, por pretendermos construir um conhecimento básico acerca de alguns aspectos da iluminação cênica, objetivando a melhoria dos diálogos com o iluminador na construção do espetáculo. Araújo (1998) faz uma importante alusão ao ensino de teatro a partir das oficinas: A oficina de teatro é um espaço de ensino de curta duração, sua carga horária varia em função das necessidades para as quais se destina. Neste espaço não se pode ter a pretensão de trabalhar o teatro em todos os seus aspectos e nem diplomar pessoas para uma determinada especialidade teatral, o papel da oficina é de instrumentalizar o aluno mediante uma visão panorâmica do teatro, ou do aprofundamento de um determinado aspecto de seu conjunto. Pode-se ainda dispor da oficina para divulgar novas técnicas ou para desenvolver uma determinada aplicação do teatro em outras áreas do conhecimento (p. 67) Dentre os integrantes apresentados anteriormente, a oficina contou com a participação de Carminha Medeiros, Dinha Vitor, João Lins, Juliana Barbosa, Lenilton Teixeira, Marinalva Moura e Thémis Suerda. Os demais integrantes, por incompatibilidade de agendas ou por ainda não integrarem o Grupo, como no caso de Asclé Campos e Danilo Vieira, não participaram desse processo educativo, fato que nos possibilitou analisar no mesmo coletivo teatral os resultados e desdobramentos desta pesquisa com agentes teatrais que experienciaram a oficina básica de iluminação cênica em detrimento de outros que não a experienciaram. Na verdade, contávamos com a voluntariedade dos integrantes do Estandarte, consequentemente a falta de alguns nomes não atrapalhou o planejamento da oficina, tampouco interferiu no resultado final da pesquisa. 28 A oficina proposta teve carga horária de 36 horas. As aulas foram planejadas e distribuídas entre os dias 16/01 a 30/01 de 2009, de segunda a quinta-feira, nos horários das 9 h às 12 h e das 14 h às 17 h. No entanto, ocorreram adaptações no calendário durante o percurso das aulas, devido a problemas de ordem pessoal e coletiva, obrigando-nos a modificar horários e datas, fato constatado no cronograma apresentado nos anexos desta dissertação. Escolhemos o Departamento de Artes (DEART) da UFRN para acomodar a oficina, sendo que as atividades teóricas ocorreram na sala do laboratório CENOTEC, e as atividades práticas foram realizadas no Teatro Jesiel Figueiredo. Cabe aqui salientar que o Teatro do DEART/UFRN é um excelente espaço para o desenvolvimento de práticas que se direcionam para o conhecimento de técnicas e tecnologias10 em iluminar espetáculos cênicos por causa de sua baixa altura (cerca de 3 metros), que traz para os alunos iniciantes a possibilidade de trabalhar certos aspectos da iluminação cênica com maior segurança e rapidez, sem que sejam sujeitados a subirem escadas altas, muito embora essa arquitetura também prejudique trabalhar diferentes características luminotécnicas em função de diferentes alturas. Ademais, é um espaço multiuso que possibilita a configuração de diversas tipologias espaciais para as áreas cênicas (arena, semiarena, corredor, à italiana etc.), permitindo uma grande variedade de projetos de luz, já que um dos suportes de criação para a iluminação cênica é o espaço. Além disso, oferece uma boa quantidade de equipamentos luminotécnicos, pelo menos aqueles mais utilizados nas salas de espetáculos brasileiras. 10 Consideramos técnica como o conjunto de procedimentos normatizados para a manipulação, controle e tratamento de um material, enquanto que tecnologia é um conjunto de conhecimentos, especialmente de princípios científicos, que se aplicam a um determinado ramo de atividade. Figura 2 - Teatro do DEART/UFRN, local das aulas práticas. Foto Lenilton Teixeira Foto Ronaldo Costa Figura 1 - Sala 17 sede do CENOTEC/UFRN, local das aulas teóricas. 29 1) Primeiras Aproximações com O Grupo Estandarte de Teatro - a Entrevista Coletiva. Na perspectiva de uma prática dialógica de ensino é importante problematizar concepções e experiências trazendo-as para os contextos em que se instauram os processos educativos, com o objetivo de construir um planejamento apoiado em estratégias de ensino que tornam dinâmica a prática educativa. Além de conhecer o perfil de cada um dos integrantes do Estandarte, é importante para o desenvolvimento da oficina também conhecer, entender e considerar as concepções prévias que eles possuíam sobre a iluminação cênica antes mesmo do primeiro dia de atividade, no sentido de trazer essas ideias e concepções para um diálogo pedagógico com novas experiências de ensino e aprendizagem que irão vivenciar. Como ponto de partida para essa problematização dialógica, utilizamos como procedimento metodológico a “entrevista coletiva”, com o intuito de identificar pontos de vista dos participantes; reconhecer aspectos polêmicos; provocar o debate e estimular as pessoas a tomarem consciência atual do Grupo em relação à construção do elemento luz nos seus espetáculos. Segundo Kramer (2007), durante as entrevistas coletivas, o diálogo, a narratividade das experiências e a exposição de ideias divergentes ocorrem com intensidade muito maior, na medida em que os participantes podem falar e escutar uns aos outros. Além disso, [...] como não só o pesquisador detém autoridade para fazer perguntas ou comentários sobre a fala dos entrevistados, a influência do poder e da posição hierárquica parecem diminuir; os problemas são apresentados com suavidade e tensão, o conhecimento é compartilhado e confrontado, a diversidade é percebida face a face (p.64). Na entrevista coletiva, o participante se sente estimulado a refletir e comentar sobre as perguntas sugeridas, encontrando balizamentos críticos na voz e experiência do outro, que talvez não fossem possíveis de se alcançar com uma entrevista individual. A problematização gerada nas respostas estabelece um clima de ressignificação e redefinição de conceitos, proporcionando aos indivíduos uma nova maneira de olhar para a iluminação cênica, exigindo novas posturas, individual e grupal, em se lidar com a elaboração estética desse elemento nos processos criativos. 30 Logo após o término da entrevista coletiva, apresentamos e discutimos junto aos participantes da oficina uma proposta de conteúdos para cada encontro posterior. Cabe salientar que essa proposta inicial foi paulatinamente modificada e adequada às necessidades dos sujeitos, contextos e conhecimentos envolvidos no processo de ensino que nos fizeram reestruturar o planejamento das atividades ao longo de sua seqüência. Logo, a organização descrita abaixo é o resultado final do processo da oficina que foi desenvolvido em parceria com o Grupo Estandarte de Teatro, sendo representada da seguinte forma: Momento Pedagógico Conteúdo Carga horária ER 1 - Variáveis da luz. 3 horas - 1 aula ER 2 - Espaço Cênico. 3 horas - 1 aula OC 3 - A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica. 3 horas - 1 aula OC 4 - Luz x Iluminação e Tecnologia Teatral. 3 horas - 1 aula OC 5 - Equipamentos de Iluminação Cênica. 6 horas - 2 aulas OC 6 - Princípios básicos de iluminação. 3 horas - 1 aula AC 7 – Definição Angular e posicionamentos dos refletores. 6 horas - 2 aulas OC 8 - Operação de Luz. 3 horas - 1 aula AC 9 – A Iluminação de uma cena. 6 horas - 2 aulas 2) Os Jogos Teatrais. No planejamento de algumas aulas, mais especificamente no segundo e terceiro encontros, escolhemos como procedimento metodológico os jogos teatrais para a problematização dos conteúdos. Por estarmos trabalhando com a maioria de atores, tais exercícios de expressão, além de dinamizarem a aula, também indicam mais uma possibilidade para o ensino da iluminação cênica, contribuindo para a quebra do estigma Quadro 1 – Estruturação das aulas na oficina. 31 “eminentemente técnico” que está em torno da construção dos conhecimentos dessa linguagem artística. Os jogos teatrais propostos para a oficina investigada nesta dissertação são ressonâncias do trabalho de Viola Spolin, dispostos a partir da definição de papéis que ora atribui a função de atores/jogadores, ora atribui a função de plateia para determinado grupo de participantes. Estruturam-se basicamente sobre três pilares: um problema a ser resolvido cenicamente pelo grupo de atores/jogadores, um ponto de concentração ou foco que determina “uma fronteira adicional (regras do jogo) dentro da qual o ator deve trabalhar” (SPOLIN, 2000, p. 21) e a avaliação da plateia pós-jogo, na qual se analisa se o grupo de atores/jogadores atingiu ou não os objetivos do jogo, apontando limites e possibilidades para as cenas improvisadas. Segundo Japiassu (2001), A finalidade do jogo teatral na educação é o crescimento pessoal e o desenvolvimento cultural dos jogadores por meio do domínio, da comunicação e do uso interativo da linguagem teatral, numa perspectiva improvisacional ou lúdica. O princípio do jogo teatral é o mesmo da improvisação teatral, ou seja, a comunicação que emerge da espontaneidade das interações entre sujeitos engajados na solução cênica de um problema de atuação (p. 61. Grifo do autor). O jogo teatral é, portanto, uma atividade expressiva organizada por um sistema de regras mais ou menos estritas. Na perspectiva deste trabalho, o jogo é abordado como uma variedade de prática social que consiste em reconstruir na ação improvisada, em parte ou em sua totalidade, qualquer fenômeno da vida, à margem de seu propósito real. O que nos interessa aqui é o valor educativo do jogo e a sua importância para o ensino do teatro, pois por meio dele podemos problematizar conteúdos importantes para o ensino da iluminação cênica. Um outro aspecto importante a ser mencionado é que o desenvolvimento do jogo teatral nas aulas de teatro, por suas características lúdicas, cria um ambiente de leveza e prazer, importante para o estabelecimento comunicativo entre os participantes da oficina. Consequentemente, o jogo teatral possui uma tríplice dimensão: lúdica/divertida, cognitiva/formativa e a dimensão socializante mediante as funções interativas e comunicativas. Comunicativas porque a implicação pessoal do aluno no intercâmbio de ideias é necessária. Dessa forma, a comunicação inerente ao jogo teatral numa situação de ensino torna-se o ponto que queremos discutir nessa atividade lúdica, exigindo o 32 estabelecimento de uma interação dialógica entre várias pessoas: participante-participante, oficineiro-participante e participante-oficineiro. Basicamente, utilizamos duas possibilidades de jogos teatrais na nossa oficina: uma que possui como mote de criação provérbios populares, e outra estruturada em torno de fragmentos de textos dramáticos. A discussão e análise desses jogos serão descritas nas atividades 2 (Espaço Cênico) e 3 (A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica) da oficina no primeiro e no segundo capítulos respectivamente. Tais procedimentos metodológicos expressam um caminho, compartilhadamente percorrido, cuja motivação nos lança para uma perspectiva interdisciplinar da ação teatral em que a iluminação como linguagem possa ser apropriada pelos diversos agentes teatrais. Nesse sentido, as marcas desse caminho se estruturam em três capítulos que se pretendem articulados, tendo como eixos os três momentos pedagogicamente organizados: Estudos das Realidades (ER), Organização dos Conhecimentos (OC) e Aplicação dos Conhecimentos (AC). O primeiro capítulo organizado em torno dos Estudos das Realidades (ER) possui duas partes que se interrelacionam. A primeira parte retrata e analisa experiências cênicas do Estandarte com a iluminação dos espetáculos do Grupo desde o ano 2000, recuperando momentos que consideramos importantes para a discussão da luz como elemento de linguagem e das possibilidades que se apresentaram nos processos criativos para a sua construção mais coletivizada. A segunda traz, além da análise da entrevista coletiva, a descrição e discussão das atividades dos conteúdos 1 (Variáveis da luz) e 2 (Espaço Cênico) da oficina. O segundo capítulo é disposto em torno da Organização dos conhecimentos (OC) apresentando a descrição, análise e discussão das atividades dos conteúdos 3 (A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica), 4 (Luz x Iluminação e Tecnologia Teatral), 5 (Equipamentos de Iluminação Cênica), 6 (Continuação equipamentos de luz e eletricidade básica), 7 (Princípios básicos de iluminação), 8 (Operação de luz.) da oficina. Nessas atividades enriquecemos as visões prévias dos alunos com a inserção de saberes universalmente sistematizados no processo de ensino aprendizagem, conhecimentos estes que consideramos importantes para a 33 formação básica dos diversos agentes teatrais, principalmente atores e diretores, em relação à iluminação cênica. O terceiro capítulo é estruturado em torno da Aplicação dos Conhecimentos (AC) e traz a descrição, análise e discussão das atividades dos conteúdos 7 (Ângulos e posicionamentos dos refletores) e 9 (Iluminação de uma cena), nas quais os participantes, considerando os conhecimentos construídos nos encontros anteriores, desenvolvem experimentos com luz. Tais experiências são importantes para investigarmos se os sujeitos do processo de ensino-aprendizagem conseguiram ampliar e/ou romper com as suas visões iniciais acerca da criação da iluminação e da sua utilização como elemento de linguagem na cena. Por fim, apresentamos uma conclusão em que se evidencia a importância da inserção de conteúdos básicos de iluminação cênica na formação dos diversos agentes teatrais, pois, além de estimular a ampliação das discussões sobre o tema, incentiva outras investigações quanto à sistematização de estratégias pedagógicas para seu ensino. Além disso, traz a análise geral do nosso objeto, refletindo se a pesquisa conseguiu responder as questões mobilizadoras deste estudo. 34 PRIMEIRO CAPÍTULO Caminhando em direção à luz. 35 [...] tudo se resume em compreender que nossos olhos de carne já são muito mais do que receptores para as luzes, para as cores e para as linhas: são computadores do mundo, que têm o dom visível como se diz que o homem inspirado tem o dom das línguas. Merleau-Ponty O “dom do visível” de que nos fala o filósofo se constrói no processo de ver-pensar o mundo em que as disposições perceptivas dialogam com as experiências edificadas na trajetória cultural das pessoas. Aprendemos a ver pelas trocas, computando-as como marcas do vivido, que podem se tornar objeto de nossa capacidade natural de revisualizar e entender. Nesse sentido, no início deste capítulo, em um esforço de nos aproximar das experiências construídas pelo Grupo Estandarte de Teatro, empreenderemos um passeio pelos seus espetáculos desde o ano 2000, selecionando momentos que julgamos importantes para discutir sobre a utilização da luz como linguagem e das alternativas que foram apresentadas para a construção da iluminação cênica dessas encenações. Essas experiências, mesmo com a alternância dos seus membros, de uma forma ou de outra constituem uma “memória cênica” no campo da iluminação que pode se projetar, como saberes prévios no universo da oficina que foi oferecida ao Grupo Estandarte de Teatro em Janeiro de 2009, discutida a partir da segunda parte deste capítulo. Tal intenção toma como referência o fato de que temos como interlocutores agentes teatrais que, de alguma forma, lidaram com a questão da luz nos contextos dos processos criativos. Visitar esse itinerário, por outro lado, explicita o nosso entrecruzamento nessa trajetória na medida em que participamos dessas iniciativas. Constitui-se também, um meio de“lançar luz” sobre passagens da nossa própria formação no campo da iluminação cênica. Dessa forma, o processo da oficina que iremos discutir e analisar traz embutidos questionamentos e reflexões de nossa caminhada como artista e educador, principalmente aqueles ligados à criação da iluminação cênica de maneira mais coletivizada, já que defendemos que sua construção não é uma prerrogativa única e exclusiva do iluminador. 36 1.1 – O entendimento dos contextos. O Estandarte vem passando, desde 2000, por um processo de renovação de elenco e principalmente, de repertório. Essa reestruturação ressaltou também uma discussão sobre o papel do espaço nas apresentações dos seus espetáculos desenvolvidos ora na rua, ora em espaços alternativos, ora em ambientes fechados que possibilitam a utilização de um aparato técnico de iluminação mais sofisticado. Tal ecletismo em relação ao espaço possibilitou ao Grupo vivenciar diferentes modos de perceber, conceber e construir as encenações teatrais, verificando a importância de outros elementos cênicos, como a iluminação, que outrora eram pouco considerados na sua prática teatral. Segundo Lenilton Teixeira, o integrante mais antigo do Estandarte, não existia antes de 2000 uma preocupação em trabalhar as iluminações dos espetáculos do Grupo pelo seu potencial expressivo e de linguagem, basicamente sua função era de clarear a cena para ser vista. No entanto, cabe aqui destacar, que ainda em 1990, durante a montagem do espetáculo “Não se paga! Não se paga!”, o grupo utilizou um modesto equipamento de luz, composto de uma mesa de iluminação de fabricação caseira e quatro refletores do tipo “panelão” utilizados comumente em jardins ou ambientes externos. Este equipamento possibilitou ao Estandarte trabalhar a iluminação de maneira expressiva, reforçando aspectos dramatúrgicos do espetáculo como a cena em black-out que aludia a falta de energia elétrica na casa uma das personagens. Em 2000, com o propósito de experienciar novas perspectivas para a construção cênica, o Estandarte estreia o espetáculo “Bocas de Lobo” para palco italiano. O espetáculo contou com a dramaturgia de Maurício Arruda Mendonça11 e direção de João Marcelino. Nele, o Grupo pôde contar com a iluminação do Carioca Aurélio de Simoni, um dos iluminadores mais renomados e conceituados do Brasil. “Bocas de Lobo” foi a primeira experiência do Estandarte com uma iluminação idealizada e personalizada para um espetáculo do Grupo. A partir de então, os integrantes que experienciaram esse processo criativo manifestam um olhar diferenciado em relação à construção estética da luz, valorizando sua dimensão simbólica e reconhecendo-a como uma forte definidora imagética da cena. Segundo Camargo (2000), 11 Dramaturgo, poeta e tradutor paranaense. Trabalhou com importantes grupos teatrais do Brasil, como: Galpão de Minas Gerais e Armazém Cia. de Teatro, radicado, hoje, no Rio de Janeiro. 37 A iluminação rege os elementos visuais do palco, determinando sua importância e revelando sua plasticidade. O cenário, os figurinos, os objetos de cena e principalmente os atores, com seus gestos e expressões, adquirem destaque e importância ao receberem luz. Ela revela os contornos, a matéria e o significado de tudo que está no palco. Não é apenas um iluminante passivo ou algo que se preste a imitar fontes e reflexos de luz, mas um meio de expressão capaz de atuar sobre o conjunto visual do espetáculo, relacionando cenas, objetos e seres dentro do espaço (CAMARGO, 2000, p.79). Particularmente, esta ocasião apresentou-se como uma oportunidade de vivenciar a criação do espetáculo “Bocas de Lobo”, nosso primeiro contato com o Grupo Estandarte de Teatro, ainda como iluminador iniciante, com poucos conhecimentos específicos na área e sem referências no ofício. O contato com Aurélio trouxe-nos grandes contribuições profissionais, tornando-se um espelho para nosso desenvolvimento enquanto artista. No contato do dia a dia aprendemos, mesmo que de forma empírica, diversas questões, como: princípios luminotécnicos, diferença entre os refletores, afinação da luz, variação angular, documentos necessários para o registro da iluminação cênica e, sobretudo, a postura autoral do iluminador frente ao espetáculo de teatro. Apesar da enorme beleza estética da iluminação do “Bocas de Lobo” e da inestimável contribuição artística que Aurélio de Simoni trouxe para o espetáculo, não se pode deixar de assinalar alguns aspectos relacionados à construção da luz nesse espetáculo. O iluminador só foi convidado ao final do processo criativo, sendo que todos os elementos visuais já tinham sido construídos, discutidos e trabalhados, impossibilitando-lhe criar a iluminação dentro do caráter processual e evolutivo da construção cênica. Figura 4 - Espetáculo “Bocas de Lobo”, 2001. Foto Teotônio Roque Foto Teotônio Roque Figura 3 - Espetáculo “Bocas de Lobo”, 2001. 38 A concepção da iluminação nesse espetáculo deu-se em uma única semana e de maneira verticalizada, apresentando-se como uma “voz estranha” (MALETTA, 2005), externa ao processo criativo que já estava em curso havia alguns meses. De certa forma, impunha uma relação artificial com os atores, evidenciada por alguns problemas: posicionamento incorreto na luz; deficiências na compreensão das atmosferas e climas propostos pela iluminação de cada cena. Também foi possível observar dificuldades de interação com o ritmo de entradas e saídas de efeitos de iluminação dadas pela operação de luz do espetáculo. Tais aspectos, referentes à inserção da luz nos processos criativos, remetem-nos a Camargo (2006, p. 65) quando afirma que: “A luz não é um corpo estranho sobre a cena, à qual o ator deva ajustar-se; luz e cena são fenômenos que ocorrem simultaneamente, um se revelando através do outro, trocando experiências de fluxo, de vibração, de impermanência”. No entanto, cabe salientar que dificuldades financeiras e a incompatibilidade com as agendas profissionais só permitiram trazer Aurélio de Simoni para o convívio com o Grupo Estandarte ao final do processo criativo. Esses motivos inviabilizaram tornar a criação da iluminação o mais integrada possível com a construção do espetáculo. De qualquer forma, essa experiência abriu novas perspectivas para as iluminações cênicas do Estandarte, mostrando a importância do elemento luz para o desenvolvimento da sua prática teatral. Com o término do ciclo de apresentações do espetáculo “Bocas de Lobos”, importantes nomes do Estandarte resolveram desligar-se do Grupo, exigindo um processo de renovação de elenco. Pensando nisso, em 2002 foi elaborado o espetáculo “A Ilha Desconhecida”, adaptação do conto de José Saramago, direção de Lenilton Teixeira e iluminação de Ronaldo Costa. Essa encenação foi marcada pela entrada de novos integrantes e por um importante momento de reflexão sobre os rumos estéticos do Estandarte. Adequava-se em quaisquer espaços: na rua, no circo, no teatro, dentre outros lugares, caracterizando uma transição entre os espetáculos teatrais desenvolvidos por anos na rua e em espaços alternativos e aqueles elaborados, a partir de então, em espaços fechados que dispunham de uma organização técnica mais sofisticada. “A Ilha Desconhecida” contava com uma iluminação cênica simples, de fácil adaptação, que foi construída em poucos encontros ao final do processo criativo. Consequentemente, a iluminação apresentava, basicamente, os mesmos problemas 39 manifestados no espetáculo “Bocas de Lobo”, com um agravante de não se poder contar com a mesma estrutura oferecida a ele, o que impossibilitou trabalhar a iluminação antes da estreia do espetáculo. Além disso, a insuficiente imersão no processo criativo e a própria deficiência em se estabelecer um diálogo efetivo com os demais agentes teatrais foram outros problemas constatados ao analisar nossa participação como iluminador desse espetáculo, gerando os seguintes questionamentos: como minimizar os problemas de falta de equipamentos de iluminação no processo criativo? Quais os caminhos a seguir para a melhoria das relações dialógicas entre iluminador e demais agentes teatrais? É importante aqui mencionar que tanto o espetáculo “Bocas de Lobo”, como o espetáculo “A Ilha Desconhecida” foram estruturados em torno das ideias dos seus encenadores. Nesse sentido, as iluminações dessas encenações eram abalizadas pela unificação estética desenvolvida por cada encenador e, basicamente, as discussões em torno da construção da luz nas cenas restringiam-se aos diálogos entre os encenadores e o iluminador, sendo pouco extensivas aos demais agentes teatrais, provocando-nos outras inquietações: que estratégias adotar, como iluminador, para tornar a construção da iluminação extensiva ao maior número de agentes teatrais? Qual deve ser a postura do iluminador frente a processos criativos que exigem um maior compartilhamento de ideias? Em 2005, o Estandarte propôs a montagem da encenação “Uma Coisa que Não Tem Nome”, livre adaptação do livro “O Ensaio Sobre a Cegueira”, também de José Saramago, direção de Lenilton Teixeira e Jefferson Fernandes. Nesse espetáculo, presenciamos todo o Figura 5 - Espetáculo "A Ilha Desconhecida", 2002. Foto Lenilton Lima 40 seu processo de construção, participando das reuniões de planejamento até sua concretização cênica. Essa experiência possibilitou uma imersão que favoreceu no processo coletivo proposto pelo grupo, apontando para o aprofundamento do estudo e da compreensão dos mecanismos dialógicos inerentes a esse sistema de produção. Na nossa opinião, o espetáculo “Uma Coisa que Não Tem Nome” é um divisor de águas para o Estandarte, pois estabelece uma interlocução com o debate contemporâneo do teatro e coloca em xeque muitas concepções teatrais desenvolvidas pelo Grupo até então, tais como: espaço cênico itinerante; adaptação de textos não dramáticos para a cena; a participação interativa da plateia e diálogos com as tecnologias de projeção. A narrativa nos conta acerca de uma epidemia de cegueira por meio da qual as pessoas contagiadas passavam a “ver tudo branco”. Para controlar esse surto epidêmico de cegueira, o governo resolve confinar todos os infectados em um velho hospício abandonado. A opção do grupo foi construir uma encenação itinerante que levava a plateia por diversos ambientes, nos quais os espectadores ora estavam vendo, ora não. A solução dada para a “cegueira branca” foi pedir que a plateia utilizasse óculos de natação com as lentes pintadas de branco. No início da encenação, uma das atrizes conversava com os espectadores estabelecendo um pacto teatral, orientando que todas as vezes em que ela falasse “O Diretor mandou colocar os óculos”, ou “O Diretor mandou tirar os óculos”, ou ainda, “O Diretor mandou fazer determinada coisa”, lhes deveriam obedecer. As pessoas que não se sentissem à vontade com tal determinação, poderiam sair da sala e ser ressarcidas do dinheiro investido na compra do ingresso. Por motivos de segurança, somente eram aceitos 50 espectadores por apresentação, número previamente experimentado nos ensaios pré-estreia e que correspondiam a uma quantidade segura para que os atores lidassem com suas itinerâncias “às cegas”. Figura 6 - Espetáculo “Uma Coisa que Não tem Nome” - Pacto inicial com a plateia: “o diretor mandou ...). Na foto, Thémis Suerda. Foto Lenilton Lima 41 Outra questão bastante interessante nesse espetáculo foi a utilização das tecnologias de projeção. Primeiramente, a plateia apreciava um pequeno vídeo de cerca de um minuto, no qual se intercalavam diversas imagens cotidianas sucessivamente. À medida que se evoluía o filme, as entradas e saídas das imagens começavam a ficar cada vez mais aceleradas até que atingissem um movimento contínuo e esquizofrênico. A iluminação também auxiliava nessa profusão imagética com cores e formas (quadrados, círculos e triângulos feitos a partir de refletores do tipo elipsoidal12) projetadas na tela e na plateia de maneira aleatória e rápida. O objetivo desse momento era fazer com que o espectador vivenciasse uma gama de imagens antes de “ficar cego”, fixando-as no seu inconsciente, para que fossem lembradas subjetivamente como as últimas vistas antes da sua cegueira, tal como acontece no livro. Após assistir a esse pequeno vídeo, a plateia era dividida em duas partes: uma “ficava cega” com o uso dos óculos de natação e se encaminhava para outro ambiente com o auxílio dos atores. A outra parte permanecia sentada nas poltronas ou cadeiras sem o uso dos óculos, o que chamaremos de “espectador vidente”. Quando a “parte cega” da plateia chegava à outra sala (confinamento), um cameraman começava a produzir imagens desse local que eram projetadas em tempo real para a “plateia vidente” localizada no ambiente anterior. Nesse caso, a mídia proporcionou uma nova maneira de apreciar o espetáculo, pois perturbou a relação de continuidade de leitura deste, apresentando aspectos e características até então inexistentes no teatro desenvolvido pelo Estandarte, modificando a percepção estética da plateia, e, por conseguinte, sua leitura da cena. Dessa forma, houve uma transformação na produção artística do Grupo, passando a caracterizar-se por um intenso diálogo entre gêneros, autores, técnicas e recursos, explorando os limites estabelecidos entre as fronteiras da ciência, da tecnologia e da arte, exigindo do espectador um reposicionamento e uma nova forma de perceber e relacionar-se com o espetáculo teatral, principalmente com sua imagem. 12 O projetor elipsoidal recebe esse nome devido a seu espelho rebatedor elíptico. Possui um conjunto de lentes que potencializam sua capacidade luminosa e sua versatilidade, um conjunto de facas que possibilita o recorte da luz modelando-a em quadrados, retângulos e triângulos. No capítulo 2, aprofundaremos a discussão sobre esse equipamento. 42 A utilização de suportes multimídia no teatro e a herança das técnicas audiovisuais do cinema e do vídeo, como flash-back, câmera lenta, aceleração da imagem, efeito caleidoscópio etc, configuram novas perspectivas de produção e leitura da imagem cênica, até então pouco exploradas pela linguagem do grupo. Segundo Plaza e Tavares (1998), O surgimento de novos meios tecnológicos de produção audiovisual, sobretudo os eletrônicos, provoca uma influência de difícil avaliação sobre as formas culturais tradicionais. Esses meios possuem caracteres que renovam a criação audiovisual, reformulam nossa visão de mundo, criam novas formas de imaginários e discursos icônicos, ao mesmo tempo em que recodificam as imagens dos períodos anteriores (PLAZA & TAVARES, 1998, p.15). Como já mencionamos acima, o espetáculo “Uma coisa que não tem nome” foi o contato mais efetivo que tivemos com a metodologia de criação coletiva proposta pelo Grupo Estandarte. Podemos citar como exemplo o proveitoso diálogo que o grupo teve com a coreógrafa Petrucia Nóbrega13 para a criação da “cena do banho”. Antes é preciso mencionar que, no decurso da encenação, parte da plateia que permaneceu no primeiro ambiente (espectador vidente), vendo as situações ocorridas no segundo ambiente do confinamento pela projeção de imagens, também “ficou cega”. Da mesma forma que os primeiros espectadores também foram encaminhados para o local do confinamento com a ajuda dos atores. Novamente, toda a plateia estava reunida em um mesmo ambiente e utilizando óculos de natação pintados de branco. 13 Dra. Terezinha Petrucia da Nóbrega professora do Departamento de Educação Física (DEF) da UFRN. Possui no currículo importantes estudos e trabalhos sobre o corpo, sendo seu principal foco de pesquisa e atuação a fenomenologia, a partir das ideias do filósofo Merleau-Ponty. Dirigiu e coreografou o grupo de dança Popular “Parafolclórico”, também do DEF/UFRN. Figura 7 – Espetáculo “Uma Coisa que Não Tem Nome - Imagens do confinamento veiculadas em tempo real para a plateia vidente. Foto Teotônio Roque 43 A “cena do banho” fazia alusão ao episódio do livro “O Ensaio Sobre a Cegueira”, quando as mulheres foram obrigadas, em troca de comida, a fazer sexo com uma horda de cegos que detinham, por força, a guarda dos alimentos fornecidos pelo governo. No primeiro momento dessa cena, todos os espectadores “estavam cegos”, utilizando os óculos de natação, ouvindo gritos e os gemidos das mulheres molestadas. Logo após, a atriz responsável pelo pacto inicial, diz o comando: “O diretor mandou todos tirarem os óculos”. Dessa maneira, os espectadores poderiam ver o banho, em que as seis atrizes lavavam somente uma parte do seu corpo (braço, abdômen, rosto, perna, seios e costas) ininterruptamente, ao som de uma música incidental e dramática. Era como se cada uma delas quisesse purificar seu corpo daquele ato repugnante. A cena culminava na morte de uma delas. Petrucia criou a gestualidade da cena do banho inspirada na obra L’évidence Éternalle (Figura 9), de 1930, do pintor René Magritte. Essa imagem é composta por pequenos quadros que, juntos, compõem uma mulher nua sem braços. A coreógrafa desejava que a luz valorizasse as partes dos corpos das atrizes que estavam sendo lavadas pelo banho, tal qual a obra de Magritte. A partir dessa informação optamos por utilizar seis elipsoidais com gelatinas14 amarelas, recortando seus fachos de luz, transformando-os em quadrados, como a obra de L’évidence Éternalle. A coreografia não possuía grandes evoluções no espaço cênico; na verdade, as atrizes ficavam paradas em suas marcas, lavando a parte do corpo que lhes era cabida. Dessa forma, os refletores, e, por conseguinte, os fachos de luz poderiam ser estrategicamente distribuídos e afinados para a região do corpo da atriz que queríamos evidenciar, criando focos de atenção e direcionando o olhar da plateia. 14 Termo comumente utilizado para denominar filtro de cor que é colocado à frente da lente dos refletores. 44 A “Cena do Banho” é, portanto, um bom exemplo do que entendemos como uma construção coletiva, pois o compartilhamento de ideias entre todos os agentes teatrais possibilitou que a criação dos elementos cênicos acontecesse de maneira sincrônica. A princípio, a ideia do diretor e da coreógrafa foi discutida por todo o grupo de trabalho até se chegar a um consenso em relação à elaboração da cena, mostrando um claro entrecruzamento de saberes específicos e interseções entre a coreografia, a luz, o som, o figurino, o trabalho do ator, a cenografia, dentre outros, que eram contextualizados e direcionados pela situação dramática adaptada do livro de Saramago. Existia, como diria Camargo (2006), um movimento de co-evolução criativa, em que a iluminação era construída mútua e concomitantemente com outros elementos cênicos. Figura 10 - Espetáculo "Uma Coisa que Não Tem Nome" - Cena do banho - na imagem os quadrados de luz. Figura 8 - Espetáculo "Uma Coisa que Não tem Nome" - Cena do Banho - Foco de atenção na parte do corpo lavada pela atriz. Na foto, Dinha Vitor. Foto Lenilton Lima Foto Lenilton Lima Figura 9 - L’évidence Éternalle, René Magritte 1930. Imagem retirada do site: http://www.mediapart.fr/club/edition/les- mains-dans-les-poches /article/250209/les- mains-libres-–-eluard-man-ray 45 [...] a luz cênica deve ser entendida não como um elemento separado, mas como um processo que deve fazer parte da construção da cena, isto é, luz e cena necessitam ser pensadas como um processo vivo e co-evolutivo. Não há como compreender o papel que a luz desempenha nesse processo sem levar em consideração a relação de trocas que ela estabelece com a cena, e vice-versa (CAMARGO, 2006, p.11). No ano seguinte, em 2006, seguindo a nova filosofia de experimentação estética para seus espetáculos, o Estandarte construiu a encenação “A Palavra é Gesto”, com direção de Petrucia Nóbrega para palco Italiano. A parceria estabelecida e estreitada entre a encenadora/coreógrafa com o Estandarte no espetáculo “Uma Coisa que não Tem Nome” fez com que ela viesse a propor para os integrantes do Grupo um experimento que promovia o encontro entre elementos da linguagem teatral e da dança. Estreou na abertura III ENAEF (Encontro Nacional de Ensino Arte e Educação Física) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). A dramaturgia textual e corporal do espetáculo “A Palavra é Gesto” foi criada a partir do material cênico organizado pelos próprios atores, sendo a pergunta O que é uma valsa? a precipitadora de todo o processo de criação. Dessa forma, os textos que aparecem no decorrer do espetáculo foram construídos por “Experiências Vividas” (na vida ou nos acontecimentos do processo criativo) pelos próprios atores, assim como as gestualidades corporais, em que as imagens de René Magritte foram transformadas, tal qual a cena do banho no espetáculo “Uma Coisa que não Tem Nome”, em partituras corporais para serem trabalhadas poeticamente por cada intérprete. Vejamos o que a própria Petrucia, em texto15 intitulado com o mesmo nome do espetáculo, escreve a respeito: Além dos textos escritos pelos atores a partir da pergunta o que é uma valsa, imagens de Magritte como A gigante (1929-30), Os exercícios do acrobata (1928) e A Filosofia na alcova (1966) foram transformadas em partituras corporais e encadeadas cenicamente. Nas partituras, o acento sinestésico e poético busca reunir palavra, conceito, pensamento, imaginação. O corpo, na pintura de Magritte, quer vestido, quer pintado, é cortado, dividido em fragmentos velados e não velados, carne vestida e nua. Nudez abertamente revelada: a da pele, a do rosto e a nudez escondida... Só quando é vista do teatro do corpo é que esta interação se torna visível e então se cumpre a tarefa: esconder, desviar, suprimir, ultrapassar, segurar, transportar, sorrir, expressar, comunicar. As partituras corporais foram criadas por meio da imaginação e da experiência corpórea dos atores, aliando-se aos ensinamentos de Laban sobre a criação do movimento expressivo (NÓBREGA, 2008, p.03). 15 NÓBREGA, Terezinha Petrucia da. A Palavra é Gesto. Anais do III Encontro Nacional de Ensino Arte e Educação Física (ENAEF), Cd-rom, UFRN, 2008. 46 Nessa montagem não participamos efetivamente do seu processo criativo por incompatibilidade de agenda. A iluminação do espetáculo foi elaborada por Uliana Fechine16 com a nossa contribuição nos 3 (três) dias que antecederam sua estreia. A iluminação, assim como na linguagem da dança, foi pensada para valorizar as gestualidades dos intérpretes, por isso investiu-se em refletores posicionados nas laterais do palco para modelar os corpos dos atores. Como os figurinos eram brancos e optou-se pelo uso de ciclorama17 na organização do palco, pois existia uma preocupação com o uso da coloração das luzes, de modo que o branco dos figurinos não se confundisse com o branco do ciclorama. Consequentemente, a cor-luz tinha um papel decisivo, sendo usada estrategicamente na encenação, uma vez que produzia a separação dos atores com o fundo do palco. Ao se colorir o ciclorama, valorizavam-se os figurinos e ajudava-se na compreensão psicológica das atmosferas e climas propostos pela narrativa cênica. O espetáculo “A Palavra é Gesto” não contou com a presença efetiva dos seus iluminadores no processo criativo, não por estes serem desconsiderados, mas por 16 Na época Uliana era recém formada pelo Curso de Artes Cênicas da UFRN. Seu interesse por fotografia levou-a a participar de uma oficina básica de Iluminação Cênica desenvolvida por mim em 2003. 17 Tela Branca localizada no fundo do palco à italiana. Figura 12 - Espetáculo "A Palavra é Gesto", 2006. Em destaque, João Lins e Marinalva Moura. Foto João Mercelino Foto João Marcelino Figura 11 - Espetáculo "A Palavra é Gesto", 2006. Na foto, Jonas Sales. 47 problemas de disponibilidade e incompatibilidade de agenda. Consequentemente, os iluminadores ficaram à margem do processo criativo e alheios ao sistema coletivo proposto pela encenadora à montagem, fato que impossibilitou que a luz fosse criada em concomitância com outros elementos da cena. Sobre a autoria coletiva Trotta (2006) afirma que: [...] se configura por meio do constante e quase exaustivo diálogo coletivo que, se não forma necessariamente um sentido unificador, promove a mútua interferência e mútua contaminação entre os autores. O encenador não toma para si a exclusividade de interlocução das demais funções artísticas, mas, ao contrário, coloca em circulação as diversas subjetividades (TROTTA, 2006, p.162). Dessa forma, as ideias apontadas para a iluminação cênica do espetáculo foram discutidas apenas com a encenadora, sendo pouco circuladas pelo grupo, tornando-se um material desconexo daquele criado pelo coletivo e que pouco contribuiu para valorizar o rico processo de criação cênica. Além disso, “A Palavra é Gesto” possui no seu currículo poucas apresentações, sendo que a maioria delas foi realizada em teatros que possuíam pouca estrutura luminotécnica, não nos permitindo aprimorar sua iluminação durante o estabelecimento das curtas temporadas. Tal problemática nos fez refletir sobre dois aspectos do sistema de produção coletivos que podem ser estendidos também ao sistema colaborativo. O primeiro é que esses sistemas exigem um grande envolvimento dos seus agentes teatrais e demandam tempo e disponibilidade dos profissionais para participarem efetivamente dos processos criativos. O segundo é que, se por algum motivo a figura do iluminador não estiver presente no processo criativo, o grupo pode encontrar ou discutir soluções de iluminação para as cenas, tornando a luz mais próxima ao contexto de criação do espetáculo e minimizando os efeitos da falta do profissional da luz em alguns dias. Essa possibilidade é apresentada pelo Grupo Estandarte de Teatro no espetáculo que discutiremos a seguir. No ano seguinte, em 2007, o Grupo Estandarte se propôs a (re) contar uma história inspirada no livro o “O cavaleiro inexistente” de Ítalo Calvino, elaborando o espetáculo “Matrióchka”, o último do seu repertório atual com direção e adaptação de texto de Lenilton Teixeira e Jefferson Fernandes. Matrióchka é o nome de uma boneca de encaixe de madeira russa, em que as menores ficam dentro das maiores. O grupo utiliza-a como 48 metáfora para construir uma metalinguagem, uma encenação com uma história dentro de outra. Matrióchka foi contemplado por um Edital de Auxílio montagem no Festival de Teatro “Fest em Cena” 2007, organizado pela Cia. Urbana de Teatro de Natal/RN, possuindo pouco mais de dois (2) meses de processo até sua estreia. Pelo reduzido tempo de montagem, o Grupo optou por articular a criação de todos os elementos cênicos mutuamente e concomitantemente, sem depender da presença de um criador em específico. Muitas das ideias de luz, por exemplo, surgiram a partir do material cênico desenvolvido pelo grupo sem nossa participação, demonstrando uma nova postura do Grupo frente à construção do elemento luz em seus espetáculos. Dessa forma, cabia-nos a responsabilidade de colocá-las em prática e aprimorá-las tecnicamente. Nessa encenação, a iluminação cênica basicamente propunha ambiências simbólicas para os diversos espaços sugeridos dramaturgicamente: o campo de batalha, o riacho, a caverna, o fundo do mar, o convento, etc. Como exemplos dessa composição prévia do grupo sem nossa participação, podemos citar o banho no riacho desenvolvido pelo grupo em sombra chinesa18 e a concepção da cena da batalha de Agilulfo (o cavaleiro inexistente) sob luz negra. A cena no riacho possui uma atmosfera de mistério, mostrando um cavaleiro em sombra chinesa banhando-se em suas águas. Queríamos criar uma expectativa, um mistério, para a apresentação da personagem que viria logo a seguir. O cavaleiro, que na verdade é uma mulher, estava sendo bisbilhotado por um outro. A guerreira, para se defender, pega um punhal e parte para cima de seu oponente. Na verdade, o banho no riacho em sombra chinesa também resolve com criatividade um problema cênico. O elenco reduzido e a grande quantidade de personagens desenvolvidos pela dramaturgia exigem que os atores dobrem papéis. Nessa passagem, a narradora que conta o episódio no proscênio do palco é justamente a guerreira a se banhar no riacho. A solução foi criar essa cena com uma outra atriz, para que ela tivesse tempo de passar por trás do pano, sem ser vista, e sair do outro lado segurando o punhal no pescoço do bisbilhoteiro. 18 Sombras projetadas por algum foco de luz através de materiais translúcidos, como: cortina, pano ou papel. 49 A batalha de Agilulfo sob luz negra exigiu um grande envolvimento do grupo para seu sucesso. Primeiramente, é preciso mencionar que a luz negra é o resultado de lâmpadas que emitem uma radiação ultravioleta (invisível para o olho humano) com um componente residual de luz visível. Esse tipo de radiação realça o branco e as cores fluorescentes em detrimento de outras, criando efeitos surpreendentes. A ideia em torno da construção imagética de Agilulfo é garantir que o público entenda seu sentido de inexistência. O figurino dele possui em sua composição uma base preta que cobre todo o corpo do ator; por cima dessa base, coloca-se uma armadura branca, dando-nos a sensação de que a armadura está oca. A maquiagem preta no rosto do ator também garante e refina essa sensação. Na cena da batalha, a narradora conta como o destemido Agilulfo vai derrotando seus oponentes, aparecendo e desaparecendo como um espectro. O cavaleiro entra no palco sozinho, desferindo golpes lentos com sua espada. Nesse momento, apagamos todos os refletores, até mesmo o foco da narradora, deixando acesas apenas as “luzes negras”, valorizando desse modo as partes brancas da armadura e da espada, que parecem flutuar no espaço. O gestual coreografado do ator permitiu que definíssemos uma deixa para apagar rapidamente a “luz negra”, dando a impressão de que Agilulfo desaparecera como por encanto. Figura 13 - Espetáculo "Matrióchka", 2007 - Banho no riacho em sombra chinesa. Foto Lenilton Lima 50 Recuperar essa trajetória nos traz excelentes parâmetros para avaliar a postura e o envolvimento do iluminador frente aos diversos sistemas de produção espetacular. Nos dois primeiros espetáculos “Bocas de Loco” e “A Ilha Desconhecida” os diálogos para a criação da luz ficaram restritos entre encenador e o iluminador. Nos demais, “Uma Coisa que Não Têm Nome”, “A Palavra é Gesto” e “Matrióchka”, considerados sistemas coletivos, os diálogos se caracterizaram por ações intercriativas entre os agentes teatrais na construção dos elementos cênicos, tornaram-se extensivos para todos os profissionais, exigindo tempo e disponibilidade do iluminador para participar de tais processos. Além disso, os sistemas coletivos de produção, dado a suas características dialéticas e dialógicas podem encaminhar alguns aspectos da criação sem a presença do iluminador. Consequentemente, requisitar “o passado significa ter uma compreensão diferente da história; o passado é importante para rever o presente, para colocá-lo numa condição crítica, conferindo-lhe nova significação” (KRAMER, 2007, p. 60). Desse modo, delinear os espetáculos grupo Estandarte desde 2000, tendo como foco a construção da iluminação cênica, foi importante para identificação dos contextos em que se instauraram suas práticas teatrais do Grupo, e por meio deles compreender e analisar as dificuldades do Estandarte em relação à iluminação cênica. Muitas fragilidades apontadas nos processos criativos do Grupo Estandarte deram-se por falta de equipamentos ou pela ausência do iluminador, impedindo que a luz participasse de maneira efetiva nos processos criativos; outras, e talvez as mais preocupantes estavam ligadas à falta de conhecimentos dos integrantes do Grupo sobre Figura 14 – Espetáculo Matrióchka”, 2007 – Agilulfo sob luz negra. Foto Gigi Holanda 51 iluminação, impedindo-os de interagir, perceber e contribuir para a criação desse elemento cênico, já que o grupo aposta em processos coletivos para a construção dos seus espetáculos. Foram detectados recorrentemente, nas encenações construídas pelo Estandarte, problemas como: 1. Posicionamento incorreto na luz; 2. Subaproveitamento da iluminação como elemento expressivo e de linguagem; 3. Deficiências na percepção dos movimentos e das nuances de entrada e saída de luz; 4. Dificuldades em utilizar a iluminação como mais uma possibilidade de matriz criativa do ator. Tais restrições fazem parte de um processo de encenação que assume como princípio a prática teatral grupal, que aposta na continuidade para aprimorar cada vez mais a estruturação dos seus processos criativos. Dessa forma, as dificuldades e fragilidades tendem a ser superadas ou minimizadas ao longo dos anos pelo aprimoramento e pela formação de seus integrantes. Segundo Trotta (2008), “a palavra chave do teatro de grupo está naquilo que gera e frutifica: continuidade de constituição, de formação, de criação, produção e circulação” (p.35). 1.2 – A Entrevista Coletiva. A entrevista coletiva, ao privilegiar a fala dos sujeitos sociais, permite atingir um nível de compreensão da realidade humana que se torna acessível por meio de discursos, sendo apropriada para investigações cujo objetivo é conhecer como as pessoas percebem o mundo. Em outras palavras, a forma específica de conversação que se estabelece em uma entrevista para fins de pesquisa favorece o acesso direto ou indireto às opiniões, às crenças, aos valores e aos significados que as pessoas atribuem a si, aos outros e ao mundo circundante, num processo de influência mútua em que se produz um discurso compartilhado entre os sujeitos do processo educativo. Segundo Kramer (2007) os objetivos da entrevista coletiva são: 52 [...] identificar pontos de vista dos entrevistados; reconhecer aspectos polêmicos (a respeito de que não há concordância); provocar os debates entre os participantes, estimular as pessoas a tomarem consciência de sua situação e condição e a pensarem criticamente sobre elas (p.66). Dessa forma, a entrevista coletiva aqui sistematizada tenta conhecer ideias, concepções e pensamentos prévios dos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro no que se refere à importância da iluminação cênica, tanto para a construção do espetáculo, quanto para sua formação enquanto artistas. Além disso, a entrevista grupal também nos aproxima das experiências vividas pelo coletivo em relação à iluminação cênica, dando-nos pistas e indicativos para o planejamento da oficina a partir do entendimento desse contexto específico. De acordo com o nosso planejamento, a entrevista começou com um depoimento pessoal acerca das trajetórias artísticas de cada um dos integrantes até chegar ao convívio do Grupo Estandarte, focalizando aspectos relativos às suas formações e experiências profissionais. Esse primeiro momento foi importante para entender que no entrecruzamento das histórias artísticas existia uma heterogeneidade de formação que deveria ser levada em conta na oficina, pois alguns integrantes não possuíam formação específica nas artes, exigindo uma organização curricular que contemplasse os vários perfis apresentados. Após esse momento da entrevista, estruturamos o restante da entrevista coletiva a partir de três perguntas básicas: 1. É importante para o ator conhecer aspectos básicos sobre iluminação? 2. Como se estabelece o diálogo do grupo com a luz nos processos criativos? 3. Como ampliar os diálogos entre o iluminador e os demais agentes teatrais nos processos criativos? As respostas a essas perguntas foram fundamentais para compreendermos alguns aspectos relacionados à postura dos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro no que tange à importância dada por cada um deles para o aprendizado de iluminação de cênica, e se existe uma consideração de que essa aprendizagem é realmente significativa para a formação do ator a ponto de ajudá-lo a dialogar com o elemento luz na construção do 53 espetáculo. Ouvindo suas diferentes histórias, pudemos aprender com suas experiências, com suas dúvidas e convicções: “A luz é a última coisa a ser pensada”; “No final do processo é que a gente vai começar a pensar no diálogo com a luz”; “A luz acaba não fazendo parte da cena”; “No dia da estreia é um incômodo se posicionar na luz”; “O iluminador parece ser uma pessoa estranha ao processo”; “O iluminador é uma pessoa estranha ao processo de construção do ator, mas não é estranha ao processo de construção do espetáculo”; “Eu nem me esforço para aprender, porque eu sei que uma outra pessoa vai fazer a concepção”; “Eu acho horrível ir para a marca da luz”; “Depois de Aurélio a gente começou a valorizar mais a luz”; “Eu nem sei o que estou fazendo aqui, mas o grupo se comprometeu a fazer a oficina, aí eu vim”. Os relatos acima descritos nos deram excelentes balizadores para o entendimento das ideias, dos preconceitos, das dúvidas e das inseguranças dos alunos, expondo a relevância de se propor uma oficina que transforme o olhar dos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro frente à iluminação cênica. Dessa forma, tal prática de ensino pretende-se transformadora, no sentido de contribuir para a formação dos atores e diretores do grupo em questão, e por meio dessa formação modificar a postura de ver, entender, apreciar e dialogar com o elemento luz nos processos criativos. 54 1.3 – “Uma Luz no Fim do Túnel” - A Estruturação da Oficina Básica de Iluminação Cênica. Na tentativa de contribuir para o enfrentamento de tais restrições apontadas na primeira parte deste capítulo, desenvolvemos uma oficina básica de iluminação cênica com o Grupo Estandarte, instrumentalizando seus integrantes para alguns aspectos técnicos, tecnológicos e artísticos sobre iluminação cênica, com o objetivo de colaborar para a melhoria dos diálogos entre o iluminador e os demais agentes teatrais nos processos criativos. Dessa forma, o foco de investigação desta dissertação, que envolve o processo educacional, procura contribuir com uma mudança de olhar sobre a construção estética da iluminação cênica de maneira mais coletivizada. É importante que conheçamos os perfis dos participantes e o contexto no qual será inserido o processo educativo (Estudos das Realidades), para definir as estratégias, os procedimentos e os instrumentos pedagógicos que iremos utilizar durante o desenvolvimento desse processo. Contudo, também devemos ter clareza de que esse planejamento não nos pode aprisionar em uma estrutura rígida e imutável, pois os diálogos estabelecidos entre os sujeitos do processo educativo podem nos orientar por caminhos que nos levem a replanejar e reestruturar a prática de ensino, ou seja, devemos estar atentos e abertos às necessidades, aos desejos, às curiosidades, às fragilidades, às potencialidades do coletivo em que se instaura o processo de construção dos conhecimentos que nos possibilitem articular as muitas vozes e referências presentes nesse processo. Em seguida, discutiremos aspectos metodológicos e pedagógicos da oficina realizada em janeiro de 2009. 1.3.1 – Variáveis da luz (E.R) A estrutura desse primeiro encontro, no qual abordamos o conteúdo sobre variáveis da luz, foi desenvolvida e aprimorada em conjunto com o Prof. Dr. José Sávio Oliveira de Araújo e vem sendo aplicada desde nossa primeira oficina19, realizada em 2001. Tem como objetivos: 19 A oficina foi objeto de pesquisa de minha monografia de Especialização em Ensino de Teatro, oferecida pelo DEART/UFRN no biênio de 2003-2004, intitulada “Diálogos com a Iluminação Teatral – Uma Proposta de Ensino”. 55 1. Avaliar os conhecimentos prévios dos alunos ou suas culturas prevalentes, em relação à iluminação cênica (ER), possibilitando-lhes expor suas ideias e conceitos sobre a luz e suas variáveis. 2. Possibilitar que os alunos percebam e compreendam a importância do conhecimento sobre as variáveis da luz para iluminação teatral. Na sua proposição, pedimos para que os participantes da oficina desenvolvam uma experimentação em pequena escala, iluminando um objeto, sendo que os focos de atenção na execução do exercício são as variáveis da luz. O primeiro passo da atividade é dividir a turma em grupos menores, no nosso caso a divisão ficou da seguinte forma: Grupo 1 Grupo 2 Edna, Juliana e Thémis. João Lins, Dinha e Marinalva. Após isso, distribuímos em cada grupo uma pequena fonte de iluminação (um micropar20 ou uma lanterna), um pequeno objeto, uma folha em branco e um pedaço de gelatina com uma cor-luz21 (escala RGB) primária. A quantidade de grupos irá depender do número de pessoas e de equipamentos que podemos dispor para a realização do experimento. Na escolha do objeto, damos a preferência aos pequenos utensílios de uso pessoal trazidos pelos próprios participantes, tais como batons, caixas de fio dental, borrachas, frascos de corretivo, dentre outros. Além disso, temos a preocupação em escolher, se possível, aqueles objetos que possuem, segundo Pedrosa (1982), “cores indecomponíveis de pigmento opacas”, como o vermelho, o amarelo e o azul, que podem ser alteradas radicalmente ao serem iluminadas pelas cores-luz primárias das gelatinas, vermelho, azul e verde, colocadas à frente da fonte de luz usada no experimento. No nosso caso específico, os objetos selecionados para os dois grupos foram uma caixa de fio dental verde e um limão amarelo-esverdeado. Segundo Pedrosa (1982), 20 Miniatura de uma carcaça para lâmpada PAR 64, onde utilizamos, geralmente, uma lâmpada dicróica. 21 As gelatinas de cores-luz primárias no mostruário Supergel da Rosco são: AZUL 74, VERDE 90 E VERMELHO 26. Quadro 2 – Divisão dos grupos. 56 Cor geratriz ou primária é cada uma das três cores indecomponíveis que, misturadas em proporções variadas, produzem todas as cores do espectro. Para os que trabalham com cor-luz, as primárias são: vermelho, verde e azul- violetado. A mistura dessas três luzes coloridas produz o branco, denominando- se o fenômeno síntese aditiva. Para o químico, o artista e todos os que trabalham com substâncias corantes opacas (cores-pigmento, às vezes denominadas cores de refletância ou cores-tinta) as cores indecomponíveis são o vermelho, o amarelo e o azul. [...] A mistura das cores-pigmento vermelho, amarelo e azul produz o cinza neutro por síntese subtrativa (PEDROSA, 1982, p.18, grifo do autor). Em seguida, solicitamos que os subgrupos escolham, dentre as várias possibilidades experimentadas, uma única forma de iluminar o objeto para apresentá-la aos demais, dando o tempo de 20 minutos para a conclusão do exercício. Por motivos óbvios, é importante que o exercício seja realizado em uma sala escura e, se possível, com total isolamento lumínico. Durante a atividade, achamos importante proferir instruções estimulando os participantes a perceberem as diferentes nuances de luz e, por conseguinte, diferentes maneiras em se iluminar o objeto. Instruções como: 1. Dependendo da posição que vocês colocam a fonte de luz, como fica a sombra do objeto? 2. Experimentem novas formas de usar a folha branca na atividade. 3. Experimentem iluminar o objeto ora usando gelatina, ora não usando gelatina, à frente da fonte de luz. Que resultados vocês têm em relação à cor do objeto? 4. Como se comporta a iluminação ao se afastar a fonte de luz do objeto? Figura 16 - Cores Pigmentos Opacas - Síntese Subtrativa. Imagem retirada do livro da “Cor a cor inexistente” de Pedrosa (1982). Figura 15 - Cores-luz Primárias - Síntese Aditiva. Imagem retirada do livro da “Cor a cor inexistente” de Pedrosa (1982) 57 Após o término do tempo, solicitamos que os subgrupos apresentem os resultados dos experimentos uns para os outros. Nesse momento, é uma condição importante para a conclusão da atividade que o “grupo apresentador” revele para o “grupo observador” os motivos que o fizeram decidir por aquela possibilidade de se iluminar o objeto, estimulando, desde a primeira aula, a intencionalidade de linguagem que está embutida (relação entre significante e significado) na iluminação de um assunto. Justificativa do Grupo 1 - Como nosso objeto possui a cor verde, notamos que a gelatina laranja que nos foi dada para realizar o exercício alterava a cor do mesmo, por isso decidimos não usá-la. Posicionamos o refletor de maneira a valorizar toda parte da frente e de cima do objeto, possibilitando sua visualização total. A folha de papel branco apenas como anteparo da sombra. (Registro em áudio, gravado no dia 16/01/2009). Justificativa do Grupo 2 - Amassamos a folha de papel branco para criar uma textura no cenário atrás do limão. Utilizamos a gelatina azul, pois é noite. Posicionamos nosso refletor rente ao chão movimentando-o da esquerda para a direita para projetar sombras diferentes no papel, como se fosse um farol de carro passando (Registro em áudio, gravado no dia 16/01/2009). Em seguida, estimulamos os participantes a construir uma classificação com as características variáveis e constantes da luz nos experimentos. Metodologicamente, íamos registrando no quadro as contribuições, sem discutí-las nesse momento, chegando ao seguinte esquema com as falas dos participantes: Figura 18 - Resultado do Grupo 2. Figura 17 - Resultado do Grupo 1. Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa 58 Características Variáveis da Luz nos Experimentos. Características Constantes da Luz nos Experimentos. · Movimento · Ambiente Modificado Pela Luz · Posição da Fonte de Luz · Cor · Duração · Intensidade · Fonte de Luz · Eletricidade que Alimenta a Fonte de Luz.22 Ao analisarmos o quadro acima, percebemos que essa classificação se aproxima da sistematização que propomos para as variáveis da luz: natureza, intensidade, direção, ângulo, forma, cor e movimento. Cabe aqui mencionar que, em todas as oficinas que ministramos, sempre houve uma aproximação entre a classificação que propomos para a luz e suas variáveis e aquela desenvolvida pelos alunos. Isso se deve à vivência cotidiana que estes trazem consigo ao perceber os efeitos luminosos na natureza ou por terem contato com esse conhecimento em alguma etapa de sua vida, que no caso específico dos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro são, principalmente, as experiências estabelecidas nos seus espetáculos desde o ano 2000, que foram abordadas na primeira etapa desse capítulo. O exercício em pequena escala focaliza e aguça o olhar para a percepção das variáveis da luz e das inúmeras possibilidades que se apresentam para a iluminação de um assunto. Moura (1999) faz uma interessante alusão a esse respeito: Todas as luzes e efeitos estão à mostra para o olho educado. Os efeitos dos filtros, os contrastes das luzes, as densidades das cores, tudo e todos estão na natureza, à vista, para quem quiser ver ( p.20). Ao considerarmos as variáveis da luz como um conteúdo transversal, que perpassa por todos os outros conteúdos abordados nessa oficina de iluminação, o passo seguinte da aula é colocar os alunos diante do conhecimento universalmente sistematizado (OC), com uma apresentação em PowerPoint, a fim de ampliar suas compreensões sobre o tema estudado. Desenvolvemos essa sistematização no mesmo local do exercício prático, a fim de problematizá-lo ainda mais, mostrando “in loco” os resultados que os participantes da oficina poderiam alcançar com cada experimento. Em nossas aulas desenvolvemos a seguinte classificação: 22 O Micropar era ligado diretamente na tomada de 220 volts. Quadro 3 – Classificação das Variáveis da Luz construída a partir das falas dos alunos. 59 1 - Natureza: a) Dura ou difusa. b) Direta ou Indireta. c) Filtrada (gelatinas, difusores, etc.) e Não Filtrada23. 2 – Direção e Sentido (Tridimensionalidade) – Eixo de Coordenadas: a) Eixo vertical Y (perpendicular ao palco) – sentido para baixo ou para cima. b) Eixo da horizontal X (paralelo ao palco) – sentido para a esquerda ou para a direita. c) Eixo horizontal Z (paralelo ao palco) – sentido para a frente ou para trás. 3 – Intensidade (Gradação): a) Forte b) Fraco 4 – Ângulo: a) Ângulo que o refletor faz com o eixo paralelo ao piso do palco. b) Ângulo de abertura do facho de luz (dado característico de cada equipamento). 5 – Forma (Modelagem Geométrica do Facho Luminoso). a) Sem o uso de Gobos24 – Recortes (Facas ou Máscaras). b) Com o uso de Gobos. 6 – Cor a) Cores-luz primárias e secundárias. b) Cores-pigmento opacas primárias e secundárias. c) Cores-pigmento transparentes primárias e secundárias. - Temperatura de Cor. a) Cor fria b) Cor quente 7 – Movimento: a) Movimento da Fonte de Luz (Manual ou Robótico). b) Movimento da Operação de Luz – Entrada e Saída de Efeitos Luminosos. Queremos destacar que essa sistematização preenche os propósitos didáticos almejados para nossas oficinas, no entanto não há a pretensão de ser uma categorização 23 Para o humano é muito difícil considerarmos que luz visível seja percebida sem ser filtrada, pois a atmosfera filtra a grande maioria dos raios solares. No entanto, estas pequenas variações são desprezíveis. 24 Discos fabricados em finas chapas de aço ou vidro (comum ou dicróico) que modelam o facho de luz. Quando colocados em um refletor apropriado (elipsoidal, canhão seguidor, moving-lights ou moving-heads), projetam texturas, fotografias, logotipos e imagens das mais variadas. Quadro 4 – Classificação para as “Variáveis da Luz” que propomos em nossas aulas. 60 definitiva para as variáveis da luz. Para não nos alongarmos demasiadamente na discussão desta aula, apresentamos, a título de exemplo, como a problematização foi construída junto aos alunos escolhendo a variável “natureza da luz” para essa finalidade. Começamos nossa apresentação em PowerPoint logo perguntando: O que são Luzes de natureza Dura e Difusa? Como as identificamos no cotidiano? No caso do Estandarte, integrantes como Marinalva, Thémis e João Lins passaram recentemente pela graduação do curso de Educação Artística habilitação Artes Cênicas da UFRN e, portanto, traziam uma experiência sobre esse conteúdo ao participarem das disciplinas Cenografia I e II. Consequentemente, nessa oficina, as respostas deles para as questões levantadas acima tiveram uma proximidade grande com a sistematização apresentada para a aula, por isso prontamente responderam: “conseguimos identificar a natureza da luz pela sombra do objeto; quando ela é bem demarcada é de natureza dura, quando ela é desfocada é de natureza difusa”. A resposta de Dinha Vitor também é digna de menção, pois complementa a anterior, “a luz de natureza dura como aquela que ilumina diretamente o objeto e a difusa indiretamente”. A luz de natureza dura cria sombras definidas com contornos bem demarcados. Geralmente é produzida por uma fonte de luz pequena e direcionada. A luz difusa produz sombras sem definição exata. Geralmente é produzida por uma fonte de luz ampla. Figura 20 - Luz de natureza difusa - sombra em desfoque. Imagem retirada do site: http://www.iar.unicamp.br/lab/luz Figura 19 - Luz de natureza dura - sombra bem demarcada. Imagem retirada do site: http://www.iar.unicamp.br/lab/luz 61 Analisando novamente as figuras 17 e 18 na página 57, notamos que as sombras tanto da caixinha de fio dental quanto do limão são bem demarcadas, pois o objeto é iluminado por uma pequena fonte de luz de facho direcionado (micropar ou lanterna), consequentemente, a natureza da luz é dura. Para produzir na atividade uma luz de natureza difusa, com sombras em desfoque, demonstramos duas possibilidades para os alunos: 1. Colocando a folha branca à frente do facho de luz, analogamente ao uso de difusor25. 2. Rebatimento da luz utilizando na folha de papel branca – luz indireta. No teatro, as possibilidades de se difundir a luz são basicamente as mesmas: luz indireta por rebatimento, a utilização de uma película difusora à frente do facho luminoso e o acréscimo de refletores para iluminar determinado assunto. A premissa acima é correta, mas também é digna de problematização. Realmente, conseguimos o maior grau de difusão pelo rebatimento, contudo não devemos considerar essa afirmação como uma regra, pois a superfície26 rebatedora é determinante para se obter, ou não, um bom grau de difusão. A luz rebatida num espelho, por exemplo, permanece com as mesmas características anteriores à reflexão, ou seja, um facho de luz de natureza dura vai permanecer assim após refletir no espelho. Uma outra questão importante de ser mencionada é que o rebatimento dispersa a luz em várias direções, dificultando o controle e manuseio por parte do iluminador. A forma mais eficaz de trabalhar a difusão da luz com intencionalidade e total domínio sobre a luz é utilizar difusores à frente do facho luminoso. No mercado especializado existe uma boa variedade de difusores, desde os que difundem discretamente a luz até os que provocam 25 Difusor é uma película como a gelatina, cuja propriedade é difundir a luz que a atravessa, tornando-a mais suave, menos dura, com sombras menos definidas e menos pronunciadas. 26 No mercado especializado em iluminação, existem superfícies próprias para o rebatimento, muito utilizadas por profissionais que trabalham com cinema, vídeo ou fotografia. O maior grau de difusão conseguimos com o rebatimento. 62 grandes difusões, além das gradações intermediárias que chamamos de semidifusões. Artesanalmente muitas pessoas usam folhas de papel vegetal como difusores, mas desaconselhamos seu uso pelo fato de eles não serem resistentes ao calor gerado pelos refletores usados comumente nos teatros. Além do rebatimento e do uso de difusores, ainda podemos difundir a luz pelo acréscimo de refletores, mesmo que eles emitam uma luz de natureza dura. Por exemplo, colocando-se um refletor Plano-convexo (PC) para iluminar frontalmente um ator, iremos notar que a sombra formada no piso do palco é bem definida, pois o assunto é iluminado por um facho de luz direcionado. Se colocarmos seis refletores do tipo PC iluminando o ator frontalmente, iremos difundir a luz pela ação de vários fachos luminosos de direção variada, sendo que cada um deles é de natureza dura. Retomando a atividade prática, demonstramos para os alunos a difusão da luz por acréscimo de refletores, iluminando o pequeno objeto com pelo menos três fontes luminosas. Cabe aqui salientar que a maioria dos refletores de teatro é de natureza dura, mas também existem aqueles, como os de lente Fresnel, que emitem luzes de natureza difusa, encontrando-se naquela zona intermediária de semidifusão. Quanto mais transparente é a lente do refletor, mais dura é a emissão da luz, enquanto que quanto mais trabalhada é a sua lente, mais difusa será sua emissão. Assim como problematizamos a variável “natureza da luz” correlacionando aspectos teóricos e a atividade prática desenvolvida pelos alunos, procedemos da mesma forma com as demais variáveis sistematizadas para este estudo. O conteúdo sobre as variáveis da luz é base para a iluminação, significando dizer que devemos ficar atentos às dificuldades da turma e tentar, na medida do possível, esclarecer as dúvidas teóricas que possam surgir com a atividade prática. Esse encontro também desmistifica a ideia de que uma “aula de iluminação” é refém de um grande arsenal de equipamentos para sua realização, sendo possível realizá-la, como demonstrado, apenas com o uso de lanternas. Consequentemente, o conteúdo sobre “Variáveis da Luz” pode ser trabalhado com segurança com crianças e adolescentes até mesmo no ambiente escolar. 63 No nosso caso específico, a aula para o Estandarte nos trouxe excelentes balizadores para a definição dos caminhos a serem seguidos nos próximos encontros, as necessidades da turma, os desejos de aprendizagem dos alunos e os saberes prévios que eles traziam em relação à iluminação cênica. Para comentar sobre os resultados obtidos e a relevância que esse conteúdo trouxe para formação do ator, trazemos o depoimento de Dinha Vitor, escrito em seu diário de bordo: Observei a importância de compreendermos que as luzes sugerem variáveis, contribuindo assim para nosso diálogo em cena. Compreendendo essas variações o ator pode ficar em constante alerta para afinar sua compreensão. As explicações do iluminador já ampliam nossa visão, pois diretamente teremos um novo jeito de dialogar com a luz no sentindo de atentar para as cores, as perspectivas, ângulos, formas, enfim nossa comunicação não será a mesma. (DINHA VITOR, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 16/01/2009). Desta forma, avaliamos que atingimos os objetivos propostos para esse encontro, tendo como parâmetros de análise as questões geradoras desenvolvidas para essa aula: Como a luz afeta a percepção visual do objeto? Como podemos classificar as diferentes características da luz a partir da relação entre a fonte e o assunto iluminado? Pelo fato de as “variáveis da luz” serem consideradas conhecimentos transversais, as questões geradoras apontadas acima irão permear de maneira direta ou indireta todos os conteúdos planejados, sendo retomadas recorrentemente durante o desenvolvimento da oficina. 1.3.2 – Espaço Cênico (ER). Esta aula divide-se em dois momentos: o primeiro, organizado em torno de um jogo teatral, cujo foco é o espaço cênico; e o segundo, destinado ao aprofundamento teórico com as leituras de dois textos. Possui os seguintes objetivos: 1. Explorar e discutir noções sobre espaço cênico. 2. Fazer uma relação das diversas possibilidades de espaço cênico e suas influências para se definir planos de luz de um espetáculo teatral. 64 O mote de criação do jogo teatral que propomos estrutura-se por meio dos provérbios, segundo procedimento utilizado pela profa. Maria Lúcia Pupo (ECA-USP). A professora propõe o trabalho com provérbios com o intuito de impulsionar as construções de narrativas preliminares para as cenas improvisadas que podem ser problematizadas a ponto de estruturar uma construção dramatúrgica ou experienciar a prática teatral em si mesma. Nesse sentido, o Jogo Teatral traz “à tona uma situação dramática vinculada ao provérbio, acrescida de um problema cênico a ser resolvido” (PUPO, 1999, p.50). O primeiro passo da atividade foi dividir a turma em 3 subgrupos de 2 ou 3 integrantes. Logo após, sorteamos 3 possibilidades de provérbios populares conhecidos no Brasil, em torno dos quais serão criadas as cenas improvisadas. Os grupos, em alternância, atuam ora como jogadores, ora como plateia, sendo que esta última dá retorno aos primeiros acerca das soluções por eles obtidas. O quadro abaixo mostra como ficou estruturado o sorteio dos provérbios nos respectivos grupos: Grupos Provérbios Grupo 1 – Dinha e Juliana. A ocasião faz o ladrão. Grupo 2 - Carminha, João Lins e Marinalva. Falar é fácil, fazer é que é difícil. Grupo 3 – Lenilton e Thémis. Nada como um dia após o outro. Nesse jogo teatral, cujo foco é o espaço cênico, o desafio dos jogadores é tornar compreensível para a plateia, por meio de ações cênicas e diálogos, o provérbio que deflagrou a construção da improvisação. Obviamente, pedimos para que os jogadores não pronunciem o provérbio durante o exercício, trazendo uma certa ludicidade ao jogo, uma “brincadeira” de mostra-esconde em que a plateia, ao final da apreciação, deve tentar descobrir qual foi o ditado popular. As improvisações, em relação ao espaço, foram desenvolvidas ao ar livre. Nas instruções aos jogadores, deixamos claro que eles só podem utilizar objetos ou acessórios se estes estiverem no local escolhido para a realização da atividade, procurando não descaracterizar radicalmente a arquitetura do espaço, ou seja, foi explorando-a no seu estado nativo. Nesse exercício, nossa intenção é discutir e problematizar noções Quadro 5 – Divisão dos grupos. 65 preliminares de espaço cênico para depois evoluir, em um outro jogo teatral, para o estudo das suas implicações com a iluminação. A estruturação das cenas ficou da seguinte forma: Grupo 1 – A ocasião faz o ladrão. A cena foi desenvolvida à frente da lanchonete do DEART/UFRN em comum acordo com seu dono. As duas atrizes/jogadoras começavam um diálogo no qual ambas se queixavam de fome, contudo não tinham dinheiro para comprar alimentos na lanchonete. Em um vacilo do dono do estabelecimento, uma das atrizes/jogadoras, incentivada pela outra, rouba um saco de pipocas e sai correndo. Grupo 2 – Falar é fácil, fazer é que é difícil. A cena foi desenvolvida debaixo da copa de um cajueiro localizado atrás do DEART/UFRN. A improvisação consistia na tentativa dos três atores/jogadores pegarem um pedaço de trapo que já estava pendurado em um galho alto. Durante o desenrolar do jogo teatral, uma das atrizes/jogadoras ficava dando ideias esdrúxulas e mirabolantes para pegar o pano, enquanto que os outros dois atores/jogadores tentavam colocá-las em prática. Cabe aqui salientar que esse trapo já se encontrava pendurado na árvore, antes mesmo da escolha do espaço. Figura 22 – O roubo. Figura 23 - Segunda tentativa de subir na árvore. Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Figura 21 - O diálogo antes do roubo. Figura 24 - Primeira tentativa de subir na árvore. 66 Grupo 2 – Nada como um dia após o outro. A cena foi desenvolvida entre as mangueiras que se encontram ao lado do DEART/UFRN. Nessa improvisação, o grupo resolveu considerar a plateia como parte integrante do jogo. Foram definidos 7 estágios que simbolizavam os dias da semana, sendo que em cada um deles foi definida uma ação que deveria ser executada pelas pessoas que lá estivessem. Sob o comando de um dos atores/jogadores, todos deveriam encaminhar-se para a etapa seguinte até completarem o circuito. Tínhamos em cada estágio as seguintes ações: flexão de braços, rolar uma manga (fruta), subir e descer uma pequena mureta, ficar parado, deitar sobre o tronco de uma árvore, enfileirar folhas secas e ficar sentado. Eu e Lenilton pegamos o ditado “Nada como um dia atrás do outro” e construímos nossa improvisação pensando na participação da plateia na cena, na qual as pessoas passam por 7 lugares pré-estabelecidos como se fossem os dias da semana. (THÉMIS SUERDA, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 19/01/2009). Após o término das improvisações, inicia-se o debate para analisar os resultados alcançados e tentar descobrir qual o provérbio que está por trás de cada uma delas. Os alunos devem exercitar sua capacidade crítica em relação à estruturação das cenas indicando aspectos positivos e negativos nelas apresentados. Para evitar a presença de Figura 27 - Enfileirar folhas. Figura 26 - Flexão de Braço, ficar em pé e rolar uma manga. Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Figura 25 - Deitar sobre o tronco da árvore. 67 juízos de valor nas falas dos alunos, do tipo “gostei” ou “não gostei”, é importante mediar o debate com perguntas do tipo: Qual é o provérbio deflagrador da improvisação? Os grupos atingiram os objetivos do Jogo? Quais problemas foram apresentados nas improvisações que impediram os grupos atingirem esses objetivos? Como solucionar esses problemas? Na discussão, primeiramente a plateia se pronuncia e somente quando o último espectador terminar sua avaliação, os integrantes do grupo que está na berlinda podem colocar seus pontos de vista, explicando o que gostariam de ter comunicado e analisando o que faltou para atingir o objetivo. Com exceção do provérbio “Nada como um dia atrás do outro”, todos os outros foram descobertos com facilidade, fato que gerou uma grande discussão em torno dessa cena para se analisar os problemas existentes nessa abordagem do grupo. Se nossa intenção fosse apenas dar continuidade a essa atividade, poderíamos sugerir retomar o jogo visando incorporar as soluções apontadas no debate às novas improvisações. Contudo não foi necessária essa retomada, pois as cenas já estabeleceram excelentes parâmetros para problematização do assunto que queremos abordar nesta aula de iluminação, o espaço cênico. Dessa forma, continuamos o debate com as seguintes perguntas: Avaliando as cenas elaboradas, a que conclusões podemos chegar para a utilização do espaço na cena? Todo espaço pode ser usado para finalidades cênicas? Enquanto as improvisações que utilizaram os provérbios “A ocasião faz o ladrão” e “Falar é fácil, fazer é que é difícil” proporcionavam uma nítida separação entre cena e plateia, a improvisação como o provérbio “Nada como um dia atrás do outro” proporcionou uma fusão entre os espaços da cena e do público, envolvendo, de maneira interativa, os espectadores no jogo teatral. Mantovani (1989) usa a expressão “lugar teatral” para designar o local onde se estabelece a relação cena/público, com ambientes definidos para os espectadores e para a área de atuação ou espaço cênico. Segunda ela, “o espetáculo pode ser apresentado em qualquer lugar, desde a praça a um lugar alternativo – galpão, por exemplo - e não necessariamente em um teatro institucionalizado” (MANTOVANI, 1989, p.7). Concordamos com essa afirmação, acrescentando a ressalva de que todo espaço pode ser cênico se, e apenas se, tiver uma relação com a cena. 68 Nesse sentido, Pavis (1999) afirma que, Considerando-se a explosão das formas cenográficas e a experimentação sobre novas relações palco platéia, o espaço cênico vem a ser um termo cômodo, porque neutro, para descrever os dispositivos polimorfos da área de atuação. O espaço cênico é dado aqui e agora pelo espetáculo, graças aos atores cujas evoluções gestuais circunscrevem este espaço cênico (PAVIS, 1999, p.133). Mas, afinal de contas, qual a relação entre o estudo do espaço e os propósitos da luz na cena? Basta saber que o espaço é o suporte de criação do iluminador, analogamente como a tela o é para o pintor; da mesma forma que esse último manipula tintas coloridas para dar vida a uma tela, o iluminador manipula luzes e cores para animar o espaço cênico. Os resultados da luz no espaço são percebidos dentro de uma dinâmica estabelecida no decorrer das cenas ou pelo encadeamento dessas na narrativa do espetáculo. A luz está no espaço sobre o qual se projeta e transcorre através do tempo durante o qual se observa. A luz é espaço-temporal, a dizer, existe uma morfologia e uma sintaxe da luz, ou seja, uma instauração da forma no espaço e uma articulação das transformações no tempo. Ver-se-á então que a luz se relaciona com a pintura e com a música, artes do espaço e do tempo, as quais desenvolvem uma formalização importante através da história e podem, por ela, serem tomadas como um modelo no desenvolvimento de uma estética da luz27 (RINALDI, 2008, p.1, tradução nossa). Essa característica espaço-temporal da iluminação cênica exige que o iluminador compreenda que ele vive um certo paradoxo, pois ilumina um espaço que é simultaneamente materialidade e subjetividade. Um palco do teatro à italiana, por exemplo, com suas características arquitetônicas definidas, recebe uma encenação cujos espaços cênicos, quase sempre fictícios, não correspondem a ele. Explicando com outras palavras, um espetáculo teatral, mesmo o naturalista, que tem como premissa a imitação da realidade, pode trazer organizações espaciais distintas dentro de uma única cena ou de uma obra, um quarto, um jardim, uma igreja, uma masmorra, uma rua, dentre outras possibilidades, que são totalmente distintas do palco que abriga a encenação. Mesmo o palco vazio pode ser tratado dentro do mesmo pensamento, já que a iluminação é uma forte definidora dos espaços cênicos e pode trazer configurações de luz que remetem a diferentes espaços de cena para cena. 27 La luz está en el espacio sobre el cual se la proyecta y transcurre a través del tiempo durante el cual se la observa. La luz es espacio-temporal, es decir, hay una morfología y una sintaxis de la luz, o sea, una instauración de la forma en el espacio y una articulación de las transformaciones en el tiempo. Se verá entonces que la luz se relaciona con la pintura y con la música, artes del espacio y del tiempo, las cuales han desarrollado una formalización importante a través de la historia y pueden, por ello, ser tomadas como modelo en el desarrollo de una estética e la luz. 69 As inúmeras configurações apresentadas para o lugar teatral na contemporaneidade, desde a utilização de espaços convencionais (teatros institucionalizados à italiana, arena, semiarena, multiuso, dentre outros) até a escolha de espaços alternativos (igrejas, presídios, galpões, dentre outros) para a realização do evento cênico, determinam uma lógica multifacetada para a definição estética dos planos de luz dos espetáculos, estabelecida pela profusão de possibilidades apresentadas para a organização do espaço cênico. A atividade desenvolvida nessa aula tenta desmistificar por meio da problematização do conteúdo a necessidade de uma configuração espacial específica para a realização teatral, como também procura ampliar as possibilidades do ensino da iluminação cênica para atores, inserindo jogos teatrais como metodologia possível na construção dos conhecimentos sobre luz. Por fim, para complementar o conteúdo problematizado na aula, fazemos a discussão de dois textos previamente lidos e que julgamos importantes para ampliação do campo de visão dos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro em relação à utilização do espaço urbano para a construção de espetáculo teatral de rua, saindo da tradicional convenção da roda: Teatro e invasão: redefinindo a ordem da cidade de Carreira (2008) e Inter- relações entre espaço cênico e espaço urbano de Cardoso (2008). Para avaliar os resultados obtidos e a relevância que esse conteúdo traz para o ensino da luz e para a formação do ator, trazemos, novamente, o depoimento de Dinha Vitor, escrito em seu diário de bordo: O diálogo entre luz e espaço na encenação é algo que requer muito compromisso do iluminador, pois é através do estudo do espaço que surge a proposta da luz (DINHA VITOR, atriz, depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 19/01/2009). Dessa forma, avaliamos que conseguimos atingir os objetivos propostos para este encontro, tendo como parâmetro de análise a questão geradora desenvolvida para esta aula: O espaço cênico é definidor da iluminação de um espetáculo? Com a apresentação e discussão desse conteúdo, terminamos o capítulo cujo eixo de construção e atenção estava em torno do momento pedagógico denominado “Estudos das Realidades” (E.R). No nosso caso específico, os “Estudos das Realidades” é uma 70 importante estratégia para conhecer, entender e respeitar os saberes prévios que os educandos trazem consigo em relação à iluminação cênica. Nesse sentido, a validação e a consideração da sua experiência social, cognitiva, afetiva e cultural deve constituir o ponto de partida para a aquisição de novos conhecimentos, na medida em que se edifica uma ponte entre visão de mundo dos educandos e os conhecimentos específicos da área em questão. Numa perspectiva dialógica de ensino, a educação é concebida como um processo incessante, inquieto e, sobretudo, permanente de busca dos conhecimentos. O educador, imbuído desse pensamento, deve estimular, por meio de uma abordagem problematizadora, o espírito crítico dos educandos, a curiosidade, a não aceitação dos conhecimentos simplesmente transferidos, em oposição à denominada educação bancária, caracterizada pela transmissão acrítica dos conhecimentos. A aprendizagem se dá, portanto, com a formulação e a reformulação dos saberes pelos educandos ao lado dos educadores, igualmente sujeitos do processo. Cabe salientar, também, que os outros dois momentos pedagógicos - Organização dos Conhecimentos e Aplicação dos Conhecimentos - característicos da prática dialógica adotada nessa oficina, estão contidos implícita ou explicitamente em todos os outros momentos pedagógicos, como podemos observar com mais clareza na aula sobre “Variáveis da Luz” apresentada neste capítulo, na qual o aluno foi movido a aplicar seus conhecimentos sobre luz em exercício prático em pequena escala, que, problematizado, tornou-se norteador para o desenvolvimento do conteúdo que queríamos abordar e construir. 71 SEGUNDO CAPÍTULO À luz do Conhecimento. 72 “Assim como não posso ser professor sem me achar capacitado para ensinar certo e bem os conteúdos de minha disciplina, não posso, por outro lado, reduzir minha prática docente ao puro ensino daqueles conteúdos. Esse é um momento apenas de minha atividade pedagógica. Tão importante quanto ele, o ensino dos conteúdos, é meu testemunho ético ao ensiná-los. É a decência com que faço. É a preparação científica revelada sem arrogância, pelo contrário, com humildade”. Paulo Freire. Ressignificar o processo do ensinar-aprender possibilita ao educando estabelecer conexões/relações entre os conhecimentos produzidos pela humanidade e a realidade em que está inserido, traduzindo-se em compreensões. Compreensões estas geradas pelos diálogos, provocadas por questionamentos e discussões acerca dos conhecimentos e das suas interseções com o mundo histórico-social. O educador imbuído desse pensamento deve reconhecer que os conhecimentos escolhidos como conteúdos programáticos não são estanques, absolutos e impassíveis de serem reorganizados e recriados a partir das necessidades de compreensão e transformação da realidade. Dessa forma, além de uma seleção intencional, criteriosa dos conteúdos sistematizados, a organização dos conteúdos deve também ser flexível para seguir o movimento do processo educativo em que se instaura. A questão central que serve de pano de fundo para qualquer escolha de conteúdos a serem abordados em determinado contexto de ensino é saber: quais conhecimentos devem ser ensinados? A ampliação dessa pergunta coloca-nos diante de outra pergunta: como selecionar, organizar, apresentar e até mesmo dar seqüência e encadeamento aos conteúdos planejados? As definições do que ensinar e, consequentemente, do como e do quando ensinar identificam, geralmente, as fontes dessas escolhas. Portanto explícita ou implicitamente, os critérios de seleção de conteúdos tentam justificar as respostas que os educadores darão a tais questões. As escolhas que resultam desse movimento tornam efetivos os objetivos pretendidos pelas práticas de ensino. Dessa forma, apresentamos neste capítulo, disposto em torno da Organização dos conhecimentos, a maioria dos conteúdos escolhidos para a estruturação curricular da oficina de iluminação cênica, os quais consideramos importantes para a formação dos diversos agentes teatrais. 73 2.1 - A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica (OC). Esta aula divide-se em dois momentos: um prático, estruturado em torno de dois jogos teatrais, e outro teórico, com a leitura de dois textos. Possui os seguintes objetivos: 1. Perceber a iluminação em diferentes espaços sem utilizar a eletricidade. 2. Perceber como diferentes sociedades e culturas lidaram com a problemática da iluminação teatral antes do advento da luz elétrica. Ao final do encontro anterior, solicitamos aos participantes da oficina que trouxessem pequenos textos dramáticos ou poéticos para serem utilizados nos jogos teatrais planejados para esta aula. O exercício baseia-se na elaboração de uma cena improvisada com um texto para ser apresentada em dois espaços distintos: um ao ar livre e outro no interior do teatro do DEART/UFRN. Ao contrário do jogo teatral elaborado no encontro passado, o foco de atenção deixa de ser somente o espaço e passa a ser também as variáveis da luz e seus efeitos na cena. Logo, planejamos a atividade para ser desenvolvida sob duas circunstâncias diferentes de iluminação: a luz do sol e a luz de velas. Queremos que os alunos experienciem diferentes formas de iluminar o espaço da cena sem a utilização da luz elétrica. Na verdade, esperamos problematizar os resultados alcançados com o jogo teatral, fazendo interseção entre as variáveis da luz e a história da iluminação cênica no teatro ocidental, ou melhor, discutir como diferentes sociedades e culturas ocidentais lidaram com a questão da luz como elemento de linguagem em seus espetáculos teatrais antes do advento da eletricidade. Cabe salientar que a aproximação dos contextos dos alunos de outros contextos de diferentes épocas e lugares é uma escolha pedagógica, importante para a seleção dos conhecimentos que iremos problematizar nesta aula. Nesse sentido, o conteúdo não é definido a priori, mas pelo diálogo que se estabelece com o coletivo, no qual os fatos históricos ganham novas relevâncias de problematização, ou seja, a “história é objeto de uma construção cujo lugar não é o tempo homogêneo e vazio, mas um tempo saturado de agoras” (BENJAMIN, 1994, p.229). 74 Voltando ao exercício propriamente dito, escolhemos, dentre os textos apresentados pelos alunos, trechos que remetem de alguma forma à luz para serem explorados nas cenas improvisadas. Em seguida, dividimos a turma em 3 (três) grupos: Grupos Textos Grupo 1 – Carminha, Marinalva e Thémis. Ele Expulsa um Diabo Bertold Brecht Grupo 2 – Dinha e Lenilton. E tudo Mudou de Luiz Fernando Veríssimo. Grupo 3 – João Lins e Juliana. O Juiz de Paz na Roça Cena II de Martins Pena No primeiro jogo teatral do dia, pedimos para que os participantes desenvolvessem a improvisação ao ar livre, interagindo com os efeitos de luz gerados pelo sol, a partir do conhecimento construído sobre as variáveis da luz. Desta feita, também permitimos a utilização de qualquer objeto que os jogadores julgassem se adequar à cena, na tentativa de ampliar as alternativas de improvisação.. O grupo 1 utilizou um carro para desenvolver sua cena, sendo suas poltronas destinadas à acomodação da plateia, e o seu entorno ao desenvolvimento da cena, com início na lateral direita do veículo e o desfecho no porta-malas. Como a narrativa do texto acontece na calada da noite, o grupo quis aproveitar a sombra do interior do automóvel para sugerir metaforicamente a escuridão e a luz do sol do meio-dia para simbolizar o poste de uma rua, situação propícia, já que o ângulo do sol nesse horário (a pino - 90º.) provoca sombras muito acentuadas nos rostos das atrizes/jogadoras, tal qual a luz de um poste. No entanto a leitura da cena ficou prejudicada, pois o grupo deu maior relevância à exploração do espaço do que propriamente ao diálogo com a luz solar, afastando-se do objetivo proposto para o jogo teatral. Figura 29 - Desfecho da cena no porta- malas. Figura 28 - Início da cena. Perceba as sombras acentuadas no rosto das atrizes/jogadoras. Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Quadro 6 – Divisão dos grupos. 75 Os integrantes do grupo 2 optaram por fazer sua cena trabalhando com as duas possibilidades de natureza da luz simultaneamente: a luz dura, pela ação direta do sol, e a luz difusa28, pela ação indireta dos raios solares. Um dos integrantes direcionava com um pequeno espelho a luz do sol para uma parte do corpo do companheiro que estava à sombra de uma árvore recitando o texto poético. Em um determinado trecho do texto, os dois integrantes trocavam seus lugares; o que estava sob a luz do sol se encaminhava para a sombra, enquanto o outro que estava na sombra se encaminhava para o sol, assumindo, com isso, a ação que o outro desempenhava naquela posição. Ao final do exercício, os dois atores/jogadores, em concomitância, ficavam iluminando partes do corpo do companheiro com seus respectivos espelhos. 28 Parte dela proveniente da difusão dos raios solares nas nuvens e/ou atmosfera, e outra parte pela reflexão no ambiente. Figura 31 – Final da cena quando os dois jogadores se iluminam mutuamente. Perceba os reflexos dos espelhos nos seus pescoços. Figura 30 - Início da cena do Grupo 2, Dinha sob a luz dura do sol, e Lenilton iluminado por uma luz difusa (ação indireta). Perceba que a sombra do ator está imperceptível. Foto Ronaldo Costa Fotos Ronaldo Costa 76 O grupo 3 elaborou uma cena itinerante, dialogando com os efeitos de iluminação que cada espaço proporcionava. No início da cena, os atores/jogadores começavam à sombra de uma árvore, depois passavam a caminhar sob a ação direta do sol, momento em que se posicionavam na lateral de um carro, ficando propositalmente de costas para a plateia que os via pelo reflexo gerado na janela do automóvel. A improvisação do Grupo 3 prosseguia até os atores/jogadores ficarem à sombra da marquise do DEART/UFRN (luz difusa), para depois terminarem a cena com a utilização poética de um guarda-chuva que os protegia da luz do sol, simbolizando um lugar no escuro. Após o término da atividade, começamos o debate para avaliação das improvisações, levantando aspectos positivos e negativos de cada cena. Na discussão, aproveitamos para aprofundar algumas questões que achamos importantes para a Figura 33 - Reflexo visto pela plateia. Figura 35 - Desfecho da cena com o uso poético do guarda-chuva. Figura 34 - Debaixo da Marquise do DEART/UFRN - perceba a suavidade da luz nos rostos dos atores/jogadores devido à difusão da luz. Figura 32 - Início da cena do grupo 3. Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa 77 problematização do conteúdo, traçando um paralelo com o conhecimento universalmente sistematizado que veremos no último momento organizado para esta aula. O grupo 1 foi questionado em relação à falta de clareza da sua proposta de improvisação e o diálogo com as variáveis luz, já que o grupo estava mais preocupado com a apropriação do espaço do que propriamente com o diálogo com a luz solar, ocorrência que foi observada por Thémis Suerda no seu diário de bordo. No exercício com o texto usando a luz do sol, achei que nosso grupo - que éramos eu, Marinalva e Carminha - ficou mais apegado na utilização do espaço, que era o carro, do que com a luz do sol. Foi muito bom ver os outros grupos utilizando os elementos de iluminação que já tínhamos discutido. (THÉMIS SUERDA, atriz, depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 20/01/2009). Além disso, a luz a pino do sol produziu sombras muito marcantes nos rostos das atrizes/jogadoras do grupo 1, que poderiam ser minimizadas com um simples levantar de cabeças, fato que as fez compreender a necessidade de se trabalhar a percepção do ator em relação ao seu correto posicionamento na luz a depender do ângulo da sua fonte. No entanto, para os propósitos da aula, o ponto chave dessa cena estava em discutir como o grupo lidou com as questões representativas da luz, tornando-a legível para a plateia. A ideia de o interior do carro simbolizar escuridão, e o poste de rua, a luz solar só foi compreendida pelos expectadores após as pessoas do grupo a revelarem na avaliação. Aproveitando esse assunto, achamos por bem problematizar a questão com as seguintes perguntas: Como podemos representar noite ou escuridão em uma cena que acontece de dia? Como diferentes sociedades e culturas resolveram esse problema? Segundo Camargo (2000), os antigos gregos utilizavam velas, tochas e archotes para designar noite ou escuridão durante suas representações diurnas, estabelecendo uma convenção simbólica facilmente reconhecida pela plateia, ou seja, utilizaram a luz como elemento de linguagem. Da mesma forma, Keller (2005) se refere ao Teatro Elisabetano, que também acontecia sob a luz do sol, “onde tochas, velas e outras luzes eram usadas geralmente com propósitos dramáticos. Os diversos momentos do dia tinham que ser criados na mente do espectador; se o ator entrasse no palco com uma tocha, era noite” (p.07). Um outro ponto levantado no debate foi a utilização dos espelhos na improvisação do Grupo 2. João Lins fez uma analogia com as superfícies de metal polido que os antigos 78 gregos utilizavam para direcionar os raios solares. Como os teatros gregos geralmente eram construídos nas encostas das colinas, em um determinado período do dia, a área de atuação ficava à sombra dessas encostas; para minimizá-las, foram construídos grandes dispositivos refletores com o intuito de orientar a luz do sol para o espaço de representação, melhorando sua visibilidade. Por fim, a discussão evidenciou a desenvoltura do grupo 3 em dialogar com os efeitos de luz que cada espaço proporcionava, trabalhando desde a natureza da luz, passando pela reflexão na janela de um carro até o seu desfecho com o uso metafórico do guarda-chuva. Essa cena foi retratada por Carminha Medeiros no seu diário de bordo: [...] a melhor estruturação de cena foi a de João e Juliana, pois o texto, o espaço e o objeto usado (sombrinha) estavam inter-relacionados. Ficou poético e o diálogo com o sol ficou bem definido (CARMINHA MEDEIROS, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 20/01/2009). Logo após o término do debate, solicitamos aos grupos refazerem as mesmas cenas no Teatro do DEART/UFRN sob a luz de velas. Com o propósito de não nos alongarmos demais na descrição de cada grupo, apresentaremos sucintamente alguns pontos que consideramos importantes para reflexão desse conteúdo. Primeiramente posicionamos os grupos em 3 espaços diferentes do teatro do DEART/UFRN – camarim, a sala de espetáculo propriamente dita e a cabine de Figura 36 - Desenho representando o dispositivo refletor utilizado pelos antigos gregos, para direcionar os raios solares para a área de atuação. Imagem retirada do livro “Manual Mínimo do Ator” de Dario Fo (1999) 79 iluminação – distribuindo para cada grupo 12 velas e uma caixa de fósforos para a execução da atividade. O grupo 1 organizou a sua improvisação no camarim do teatro, aproveitando o grande espelho que lá existe para rebater as luzes de uma fileira de velas que estavam acesas à frente dele. O grupo 2 utilizou como suporte para as velas uma pequena mesa que possuía na parte da frente uma tela reticulada, através da qual a plateia via os atores/jogadores. O grupo 3 desenvolveu o exercício na cabine de comando de luz do teatro, aproveitando o material dessa sala para colorir e difundir a luz gerada pelas velas. . Em seguida, iniciamos um novo debate pedindo para os participantes da oficina manifestarem as dificuldades que sentiram ao trabalhar com as velas. Foram enumerados alguns problemas: perigo de incêndio, complicações para o direcionamento do facho luminoso, relação entre fumaça e insalubridade, impossibilidade de diminuir a intensidade da chama, pouca luminosidade, complexidade de posicionamento das velas e dificuldades Figura 38 - Grupo 2 - Tela reticulada através da qual a plateia via a cena. Figura 40 - Grupo 3 - amplificação da luminosidade pelo rebatimento. Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Figura 37 - Grupo 1 - Reflexão no espelho. Figura 39 - Grupo 3 - Na parte superior da imagem, tentativa de colorir o facho luminoso. Na parte inferior, difusão por rebatimento. 80 em colorir o facho de luz. Contudo, o principal ponto da discussão foi a relação significante/significado que a vela traz para a narrativa da cena. O símbolo do fogo está muito relacionado com questões ritualísticas e hoje em dia ganha uma nova dimensão, pois a vela relaciona-se como uma alternativa à falta de luz elétrica, ou seja, liga-se inevitavelmente à ausência de luz. Nesse sentido, existe uma grande dificuldade do homem contemporâneo em abstrair o forte símbolo que a vela impõe na representação teatral, tornando complexo o seu uso na cena, já que, na maioria das vezes, ela está presente aos olhos do público, ao contrário dos mecanismos e dispositivos de ocultação da luz empregados nos palcos ilusionistas no passado. Da mesma forma que é complicado representar a noite à luz do dia, também o é significar o dia sob a luz de velas. Sobre a questão da pouca luminosidade da luz de velas, fazemos uma analogia cotidiana da seguinte forma. Antigamente as pessoas se referiam à potência das lâmpadas de uso doméstico (incandescentes) pelo número de “velas” que aquela fonte gerava. Por exemplo, uma lâmpada de 100 watts de potência era designada como uma de 100 velas, ou seja, nessa relação, 1 watt é igual a 1 vela, que em termos físicos se aproxima da realidade. Para termos uma ideia, um único refletor de uso comum nos teatros tem a lâmpada com potência de 1000 watts, necessitando de 1000 velas para atingir uma equivalência luminosa. Consequentemente, a descoberta da luz elétrica estabeleceu uma forma “mais potente” de perceber gradações de luminosidade. Para tirar algumas conclusões em relação ao restante da problemática levantada nesse segundo debate, recomendamos a leitura de dois textos, Luz e Visibilidade (Camargo, 2000), para ser trabalhado em sala de aula, e Considerações históricas acerca do uso da luz enquanto linguagem no teatro, de nossa autoria, como leitura complementar. A indicação desses textos mostra como algumas sociedades e culturas lidaram com problemas similares aos apresentados no jogo teatral antes do advento da luz elétrica. O segundo texto, desenvolvido na trajetória dessa pesquisa, encontra-se nos anexos desta dissertação. Esse encontro, em que abordamos como diferentes sociedades e culturas lidaram com “a problemática da luz em espaços abertos e fechados antes da utilização da eletricidade”, é fundamental para o entendimento dos saberes edificados sobre iluminação cênica e que hoje alicerçam esse campo de conhecimento. Na verdade, a história nos revela que os artistas, desde certa época da humanidade, buscaram se apropriar dos propósitos 81 expressivos da luz, e que nada mais mostraram do que o desejo em dominar as variáveis da luz e adequá-las à linguagem teatral. Obviamente que cada sociedade ou cultura, dentro dos materiais e tecnologias de que dispunha, encontrou maneiras criativas de trabalhar a luz das suas encenações teatrais, a qual passou a ser um importante elemento de linguagem. Nesse sentido, desejamos que os alunos construam propostas estéticas para a luz por meio das inúmeras possibilidades expressivas que se apresentam ao manipular suas variáveis nas improvisações, independente dos espaços, das fontes luminosas e dos materiais e tecnologias de que irão dispor para o desenvolvimento das cenas. O caráter fundamental e a relevância desse conteúdo para o aprendizado dos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro são, novamente, apontados por Dinha Vitor em seu diário de Bordo: O fato é que eu nunca havia parado para pensar nessa contribuição e o recurso que traz a luz do sol a favor de espetáculo na rua, a não ser somente a claridade, o brilho para as pessoas enxergarem as cenas. Nas apresentações na rua a nossa preocupação residia em esperar o entardecer, para que tanto nós como o público, não ficássemos por muito tempo expostos ao sol. Ao meu ver o diálogo com a luz não existia diretamente, apenas queríamos claridade, caso contrário, poderíamos ter apurado a luz de algumas cenas, conseguido efeitos interessantes, por exemplo, a entrada do espantalho que Dom Chicote o confunde com um gigante, poderíamos ter aproveitado primeiramente a chegada da sua sombra ao dialogar com a luz solar. (DINHA VITOR, atriz, depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 20/01/2009). A proposição de um jogo teatral com textos dramáticos, além de servir como um instigante campo para a introdução de conhecimentos de iluminação também nos ajudou a diversificar os estímulos de criação para as cenas improvisadas. Dessa forma, avaliamos que conseguimos atingir os objetivos propostos para a aula, tendo como parâmetros de análise suas questões geradoras: Como as pessoas lidaram com a problemática da iluminação cênica em diferentes épocas? Como fizeram para controlar as variáveis da luz antes do uso da eletricidade? Como as variáveis da luz se comportam em diferentes espaços? Tais questões nos direcionam para um entendimento maior sobre técnica e tecnologia, já que muitas das respostas que queremos encontrar para as perguntas geradoras desta aula estão na necessidade das pessoas de teatro, independente dos contextos de época e de lugar, de desenvolver dispositivos e mecanismos, bem como aprimorar o uso e o manuseio destes, para se obter um melhor controle da luz nos 82 espetáculos cênicos. Nesse sentido, os próximos encontros serão destinados ao estudo e à problematização dessas técnicas e tecnologias de iluminação. 2.2 - Luz versus Iluminação e Tecnologia Teatral (O. C) Esse encontro é organizado em torno da problematização dos conceitos luz, iluminação e Tecnologia Teatral, possuindo o seguinte objetivo: 1. Compreender, explorar e estabelecer paralelos entre os conceitos de Luz, Iluminação e Tecnologia Teatral. O primeiro passo da aula foi solicitar aos participantes da oficina que escrevessem pequenas definições para os termos Luz, Iluminação e Tecnologia Teatral em seus diários de bordo, registrando-as também no quadro sem, a princípio, discuti-las. O resultado encontra-se na tabela29 a seguir: Carminha Medeiros Luz é o que ilumina o objeto, a cena. Iluminação é a utilização da luz como arte, como linguagem. Tecnologia Teatral só é usada no teatro. Dinha Vitor Luz é a presença de claridade. Iluminação é a luz em determinados locais. Tecnologia Teatral são os avanços que as propostas de encenação vêm desenvolvendo no decorrer da evolução humana, ou seja, desde o surgimento do teatro. Juliana Barbosa Luz é um conceito físico, o motivo pelo qual percebemos as coisas a partir da nossa visão. Iluminação é o uso da luz a partir de um estudo próprio, de um esquema feito por alguém. Tecnologia Teatral são as tecnologias que tentam fazer o teatro mais próximo da realidade. Marinalva Moura Luz é o que nos faz perceber os objetos e suas cores, com o uso da visão. Iluminação é como uso a luz para perceber os objetos. Tecnologia Teatral é o uso de mecanismos desenvolvidos tecnologicamente para provocar efeitos de simulacros da realidade. Thémis Suerda Luz é o que ilumina. Iluminação é dar um sentido à utilização da luz. Tecnologia Teatral é todo elemento utilizado para ajudar na cena, desde a maquinaria grega até as mesas de som e luz que usamos hoje. 29 As definições de Lenilton Teixeira não encontram-se devido a perda do seu diário de bordo. Quadro 7 – Definições dos alunos para os termos Luz, Iluminação e Tecnologia Teatral 83 Logo após o debate preliminar sobre os termos, pedimos a leitura em voz alta do texto Luz versus Iluminação30, do coreógrafo Murray Louis, confrontando as ideias do autor com as definições dos alunos. Apesar do tom pessoal, o texto levanta questões, tanto positivas como negativas, sobre interseção dos bailarinos com a iluminação dos espetáculos de dança, que podem ser estendidas, por analogia a qualquer outro artista das artes cênicas. Dessa forma, traremos, a seguir, trechos desse texto com as respectivas problematizações com o intuito de aprofundar o relato desta aula. “Luz é o que o bailarino procura no palco, iluminação é o que o público vê. O bailarino reage fisicamente à luz, enquanto que a platéia reage artisticamente à luz” (LOUIS, 1992 p.144).31 Quando Murray Louis afirma que a “iluminação é o que o público vê” ou “a platéia reage artisticamente à luz”, pressupõe que a iluminação é um objeto a ser contemplado ou fruído esteticamente, consequentemente, precisamos, também, delimitar o conceito de “estética” que queremos abordar neste estudo. Sobre esse assunto concordamos com Rinaldi (2008): A estética é uma disciplina filosófica que tenta definir ou dar uma resposta aos problemas que surgem quando se consideram os objetos que nos produzem uma experiência estética. Aceitada esta definição, temos de indagar: o que faz da luz um objeto estético? Em primeiro lugar, deve ser lembrado que o "objeto" é algo que se constitui como uma figura sobre um fundo, ou como um tema delimitado por um contexto. Ou seja, um objeto é aquele que se apresenta como o centro de nossa atenção, capturando nosso interesse perceptivo. Relacionado com estas considerações, está também o sentido original do termo "estética", que para os gregos significava Aísthesis, capacidade de adquirir conhecimento por meio dos sentidos. Ambas as formas de entender a estética, ou filosofia da arte e da percepção sensível serão consideradas nesta análise estética da luz32 (p.2, tradução nossa). 30 LOUIS, Murray. Luz Versus Iluminação in Dentro da Dança. Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1992. 31 Nessa aula, os textos em caixa se referem aos trechos escolhidos pelos alunos para o debate. 32 […] la estética es una disciplina filosófica que pretende definir o dar repuesta a los problemas que surgen cuando contemplamos objetos que producen en nosotros la experiencia estética. Aceptada esta definición, habrá que indagar: qué hace de la luz un objeto estético? En primer lugar, deberá recordarse que “objeto” es todo aquello que se constituye como una figura sobre un fondo, o como un tema delimitado por un contexto. O sea, un objeto es aquello que se presenta como centro de nuestra atención, capturando nuestro interés perceptivo. Relacionado con estas consideraciones, está también el significado originario del término “estética”: para los griegos la aísthesis designaba la capacidad de tener conocimiento por medio de los 84 Dessa forma, podemos considerar a luz como o material estético a ser empregado para a construção de uma imagem visual. Explicando de outra forma, a luz é um meio que sofre uma intervenção sob um ponto de vista pessoal de um artista/iluminador, passando a ser iluminação, que nada mais é do que a obra estética em processo. Ao analisarmos a tabela da página 82, verificamos que existem algumas definições, como as construídas por Carminha Medeiros, Juliana Barbosa e Thémis Suerda, que se aproximam dos conceitos que adotamos para luz e iluminação, pois apontam com clareza a diferença entre as terminologias. O correto uso das expressões, além de evitar confusões de nomenclatura, também elucida que a iluminação é o resultado de manipulação estética, e que, portanto, é fruto da relação entre a intencionalidade de um artista e o público fruidor. Da parte do artista requer tempo, preparo e estudo para sua elaboração. Do público requer o envolvimento necessário para a devida percepção. Após a problematização em torno das terminologias, Lenilton Teixeira questionou o trecho do texto: “Se eu, como ator, estou no proscênio, olho para trás e vejo um companheiro em um facho luminoso, será que além de luz não vejo também iluminação?” Essa interessante pergunta gerou uma nova discussão, levando-nos, no nosso ponto de vista, a uma compreensão mais ampla em relação àquela apontada por Louis no seu texto, já que chegamos a uma conclusão de que o entendimento artístico da iluminação, dado pelo ato de leitura estética, depende de um observador que lhe dê sentido, e não somente do espectador, podendo ser qualquer pessoa que esteja a observá-la no aqui/agora de um espetáculo cênico. No entanto a pergunta esconde em si uma outra questão: Será que a leitura estética desse ator que está a observar o seu companheiro em cena não pode auxiliá-lo na construção de sua personagem, servindo como estímulo criativo? Reconhecemos que o encontro com a iluminação de uma encenação se dá geralmente dias antes, ou na própria estreia, inviabilizando sua utilização como mais uma possibilidade de matriz criativa do ator. Entretanto, se a luz estiver presente, mesmo de forma esporádica, durante a trajetória de construção do espetáculo é perfeitamente possível ser aproveitada como mais um estímulo de criação para o ator. Para isso acontecer, além da necessidade de uma estrutura luminotécnica, é imprescindível que se abram espaços de sentidos. Ambas maneras de entender la estética, o sea, como filosofía del arte y como percepción sensible, serán tenidas en cuenta en este análisis estético de la luz. 85 experimentações entre o ator e o iluminador nos processos criativos, estruturados em torno de ações de mútua interferência, que podem influenciar o trabalho de criação desses agentes cênicos a ponto de aparecerem no resultado final da obra. Vejamos o que Dinha Vitor escreve em seu diário de bordo a esse respeito: A minha preocupação agora aumentou, porque além da interpretação do meu personagem, da marcação da cena, eu vou observar no outro o efeito que a iluminação causa e propõe comigo na cena. [...] Claro que não é nada fácil, para isso o ator terá que se apropriar dessa linguagem para poder identificar o posicionamento dos refletores, a questão do espaço, as misturas das cores-luz com o uso das gelatinas (DINHA VITOR, atriz, depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 22/01/2009). No prosseguimento da leitura, foi destacado um outro trecho do texto para discussão: O bailarino profissional desenvolve uma sensibilidade à intensidade da luz. Consegue sentir “o ponto quente” (central) de um refletor. (LOUIS, 1992 p.147). A correta colocação na luz depende realmente de um apuramento perceptivo e requer treinamento por parte do ator, para começar a sentir se está ou não, no ponto ideal da luz. Muitas pessoas designam essa sensação pela famosa expressão “brilho nos olhos”, que nada mais é do que a zona onde a luz produz maior ofuscamento à visão. Contudo, usar a expressão “ponto central” pode suscitar uma confusão, já que nem sempre o centro da área iluminada pelo refletor coincide com o ponto de melhor colocação na luz, pois essa posição ideal está sujeita ao ângulo que o refletor forma com o piso do palco (Figura 42, página 86). Por exemplo, um refletor com ângulo de 90º (a pino) ilumina uma área e um plano cujos centros coincidem com o lugar de melhor colocação na luz, à medida que os refletores são angulados para a posição de 0o o centro da área iluminada pode coincidir com o que chamamos de “ponto cego” no plano vertical (Figura 44, página 86), uma zona inutilizável, onde o assunto iluminado está parcialmente no escuro. Para avançarmos na discussão, é importante que tenhamos uma definição para os termos área e plano. A área fica restrita às dimensões do comprimento e profundidade da superfície do palco, enquanto que o plano se refere à dimensão vertical (altura) que é perpendicular, a esta superfície. O comprimento divide o palco em três faixas: da esquerda, do centro e da direita; a profundidade divide o palco em outras três faixas: frente, centro e 86 fundo, enquanto que os planos podem ser definidos como: baixo, médio e alto (Figura 44). O encontro entre as faixas do comprimento e profundidade setorizam o palco em nove áreas imaginárias mostradas na figura 41 abaixo. Como a esquerda de quem está em cena é direita do espectador, convencionou-se, para evitar confusões de posicionamento, que o ponto de vista para a definição dessas nove áreas imaginárias é sempre o da pessoa que esteja na plateia de frente para o palco. Dessa maneira, o iluminador: Ilumina áreas e planos do palco, independente das situações fictícias que estão contidas neles. Seja um Castelo de Hamlet, uma escadaria do senado romano, um cerejal russo, uma estalagem medieval ou um quarto com “dois perdidos numa noite suja”, o que o iluminador irá iluminar são áreas e planos de um espaço físico denominado palco (CAMARGO, 2000, p.94). Figura 42 – Ângulo formado entre o refletor e o piso do palco Figura 41 - Nove áreas imaginárias do palco. Figura 44 - Exemplo de ponto cego. Perceba que a pessoa encontra-se próxima ao centro da área iluminada, e mesmo assim, no plano médio, parte do seu corpo está no escuro. Imagem retirada do livro “Lumière Pour lê Spectacle” de Vatentin (1994). Figura 43 - Perceba que a melhor colocação do ator na luz encontra- se na periferia, e não no centro da área iluminada. Imagem retirada do “livro Lumière Pour lê Spectacle” de Valentin (1994). 87 Evidenciamos, mais uma vez, que o conhecimento sobre as variáveis da luz é imprescindível para desenvolver a habilidade do ator em colocar-se no ponto ideal da área ou plano iluminado pelo refletor. Apreender que cada ângulo do refletor produz um resultado diferente faz com que o ator saiba se está totalmente iluminado, se precisa levantar ou não a cabeça, se deve virar o corpo na direção da fonte da luz ou se deve colocar-se no centro ou na periferia do foco. Cabe ao iluminador explicar nos ensaios técnicos a ideia estética que está por trás da iluminação do espetáculo e mostrar para os atores as variações de ângulo e direção dos refletores, com o intuito de trabalhar a colocação dos atores na luz até que estes adquiram intimidade e percepção no posicionamento. Para concluir a problematização desse texto foi indicado o seguinte trecho para o debate: Esperar para ser iluminado é um dos processos desgastantes implícitos nas turnês. (LOUIS, 1992 p.143). Na discussão existiu o reconhecimento de que esperar para ser iluminado é desgastante, mas necessário. Preparar e afinar um plano de luz de um espetáculo, dependendo do seu porte, atravessa o dia e, às vezes, dias inteiros de trabalho. O ator pode ser poupado durante a montagem da luz e só chegar ao teatro quando esta terminar ou estiver próximo do seu fim. Essa oficina também tenta discutir as dificuldades que se apresentam para iluminadores e técnicos de luz na montagem da estrutura luminotécnica de um espetáculo e, de certa forma, apresentar as particularidades da profissão na tentativa de diminuir esse sentimento de desprazer ou desgaste nos demais agentes teatrais. Depois de terminada a discussão do texto Luz versus Iluminação, projetamos para apreciação um trecho do show PULSE33 (1994) em formato DVD, da banda inglesa Pink Floyd, mais especificamente a música Comfortably Numb do disco 2 com aproximadamente 10 minutos de duração. Apesar de passados 15 anos da sua turnê, esse emblemático show apresenta uma precisão e apropriação no uso de altas tecnologias (HI- 33 Show Pink Floyd –Pulse. Direção David Mallet. Sony Music. Show Musical (240 minutos), som, color, 1994. 88 TECH) que ainda são difíceis de serem superadas pelos espetáculos musicais atuais. Vejamos qual foi a sensação de Thémis Suerda ao assistir a esse vídeo: [...] eu fiquei encantada com o que vi, o show do Pink Floyd é um arrebatamento de emoção, confesso que não me ligo muito em música, mas com aquela iluminação passei a sentir a música ao invés de escutá-la (THÉMIS SUERDA, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 22/01/2009). Ao fim da projeção, perguntamos: Vocês acham que o conceito de tecnologia está ligada à sofisticação? Os espetáculos que utilizam as “tecnologias teatrais” são sofisticados? Queremos justamente desmistificar que os conhecimentos tecnológicos utilizados nos diversos espetáculos das artes cênicas não se limitam ao universo “HI-TECH” do show PULSE ou da sofisticação tecnológica dos grandes musicais da Broadway. Como a expressão “tecnologia teatral” é pouco utilizada pelos artistas brasileiros, ainda existe uma certa confusão com o uso dessa terminologia, indicando a necessidade de um maior esclarecimento conceitual. Para nos ajudar na problematização e fundamentação teórica desse conteúdo, solicitamos a leitura em voz alta do texto Tecnologia Teatral Moreira (2001). Nosso primeiro passo, antes mesmo de iniciar a leitura, é mostrar em PowerPoint as acepções dadas pelo dicionário Aurélio do Século XXI às palavras técnica e tecnologia, já que são fundamentais para os direcionamentos desse estudo. Técnica é maneira, jeito ou habilidade especial de executar ou fazer algo, enquanto que tecnologia é conjunto de conhecimentos, especialmente de princípios científicos, que se aplicam a um determinado ramo de atividade. Usando a definição de Moreira (2001), chamamos de Tecnologias Teatrais aquelas áreas que frequentemente utilizam os conhecimentos tecnológicos - baseados em princípios empíricos ou científicos – com finalidades artísticas, como a cenografia, figurino, iluminação, maquiagem e sonoplastia. Contudo preferimos a adoção da expressão Tecnologia Cênica, pois abrange qualquer linguagem das artes que utilize a cena como meio de comunicação estética/artística. Cabe aqui salientar que o fato de essas áreas estarem reunidas no mesmo campo de conhecimento não tira as suas independências como disciplinas específicas do teatro. 89 Em seu texto, Moreira (2009) afirma que: Qualquer coisa que fazemos em teatro envolve tecnologia. A confecção de um boneco, por exemplo, qualquer tipo de boneco, é aplicação de uma tecnologia para o uso do teatro. Há uma tecnologia de costurar, cortar, pintar e colar, e cada um que faz o seu boneco sabe qual é a melhor cola, a melhor tinta, que tipo de tecido é melhor para o fantoche, ou que outro tipo rasga fácil, que um terceiro é muito duro, mais barato, e por aí vai (MOREIRA, 2001, p.1). Textualmente poderíamos complementar esse parágrafo da seguinte forma: técnica seria, portanto, a habilidade desenvolvida por cada profissional de cortar, costurar, pintar e manipular os materiais na construção do boneco. A colocação apontada no trecho acima afasta a ideia de que as tecnologias empregadas nos espetáculos cênicos estão resumidas à sofisticação do HI-TECH, assim como não necessitam de grandes investimentos financeiros para serem aplicadas nas encenações. Logicamente que a indústria ligada ao entretenimento lança periodicamente novos produtos tecnológicos que ampliam as possibilidades de construção artística, tornando viáveis ideias que outrora eram difíceis de serem imaginadas nos espetáculos. Estas sim, requerem um grande investimento financeiro e, por isso, limitam-se a poucas produções no Brasil. É comum as pessoas ligarem tecnologia às coisas milionárias, mas quando falamos em tecnologia, eu repito, não estou necessariamente falando em milhões de dólares. Mas também posso falar em milhões de dólares. Para se fazer uma peça com um ator e um banquinho, é necessária a tecnologia. Você precisa conhecer qual é o espaço adequado que comporta uma peça de apenas um ator e um banquinho, pois há alguns espaços em que essa peça não vai funcionar (MOREIRA, 2009, p.2). Ao término das discussões em torno do texto Tecnologia Teatral, avaliamos que conseguimos atingir os objetivos da aula, tendo como parâmetro de análise as questões geradoras dessa aula: Quais as diferenças conceituais entre luz e iluminação? Como o ator, ao dialogar com a luz, pode auxiliar na leitura estética da iluminação do espetáculo? Quais relações possíveis entre os diferentes elementos que o ator cria e as variáveis da luz? O que são tecnologias teatrais? 90 Na problematização da próxima aula, abordaremos as principais tecnologias utilizadas atualmente para a iluminação dos espetáculos cênicos. 2.3 - Equipamentos de Iluminação Cênica (O. C) Esse conteúdo é dividido em 2 aulas teórico-práticas, nas quais apresentamos os principais equipamentos de iluminação utilizados nos teatros do Brasil. 1. Familiarizar os alunos com as nomenclaturas, características técnicas e funções dos equipamentos de iluminação teatral mais utilizados no Brasil. 2. Estudar e apreender o correto manuseio dos equipamentos de iluminação cênica. 3. Explorar e identificar as particularidades de cada equipamento de iluminação cênica. Antes mesmo de começarmos a aula, distribuímos no chão todos os equipamentos de iluminação que estejam a nossa disposição, principalmente refletores, acessórios em geral (garras, cabos de segurança, Barn-doors, etc), gelatinas, lâmpadas, dentre outros equipamentos. No caso dos refletores, além de retirarmos todas as tampas que dão acesso as suas partes técnico-funcionais, colocamos lâmpadas queimadas para que os alunos tenham liberdade de explorar todos os seus componentes. Temos esse cuidado porque as lâmpadas dos refletores de teatro, em sua maioria, são do tipo halógena, que não podem ser tocadas em seu bulbo. Lâmpadas halógenas são semelhantes às lâmpadas incandescentes para uso doméstico. Uma lâmpada comum é feita com um invólucro de vidro (Bulbo) que possui no seu interior gás argônio e/ou nitrogênio. No centro da lâmpada, há um filamento de tungstênio. A eletricidade esquenta esse filamento, e como qualquer metal quente, o tungstênio fica "incandescente" e a certa temperatura emite grande quantidade de luz visível em um processo denominado incandescência. O tungstênio no filamento evapora a cada acendimento e fica depositado no vidro, consequentemente, o filamento afina até se romper por volta das mil (1000) horas de uso. 91 Uma lâmpada halógena também usa um filamento de tungstênio como as comuns, contudo seu invólucro é de quartzo, em vez de vidro. No interior do bulbo, é injetado um gás do grupo halógeno (bromo ou iodo), que possui a característica particular de reagir com os átomos do vapor de tungstênio que são evaporados na incandescência, depositando-os novamente no filamento. Essa regeneração, ou, como diria Da Silva (2005), “esse ciclo quase milagroso” é responsável pelo aumento da vida útil da lâmpada de 1.000 para 4.000 horas de uso. Como o bulbo de quartzo é feito para suportar altas temperaturas, possui microrranhuras que lhe permite sofrer uma pequena dilatação quando aquecido. Se tocado, a gordura ou sujeira dos dedos pode se alojar nessas microrranhuras, impedindo que o bulbo se dilate de forma ideal, provocando fissuras que podem deixar escapar o gás halogênio do seu interior, diminuindo o tempo de vida da lâmpada. Abaixo, apresentamos duas imagens de lâmpadas halógenas mais utilizadas pelos refletores de teatro no Brasil. O primeiro passo da aula é pedir para que os alunos explorem os equipamentos que foram distribuídos previamente no chão durante 20 minutos, orientando-os para verificarem e anotarem individualmente as semelhanças e diferenças entre os equipamentos, principalmente de lâmpada para lâmpada e de refletor para refletor. Figura 46 – Lâmpada Halógena palito. Imagem retirada do site: www.equipashow.com.br Figura 45 - Lâmpada Halógena T-19. Imagem retirada do site: www.equipashow.com.br 92 Ao término da fase de exploração, registramos em um quadro branco a síntese das principais semelhanças e diferenças dos equipamentos apontadas pelos alunos, sem a princípio problematizá-las, chegando ao seguinte esquema: Semelhanças Diferenças As lâmpadas dos refletores pretos são iguais. As lâmpadas dos refletores de alumínio são diferentes. O mecanismo de ajuste focal dos refletores pretos, com exceção do grande (Elipsoidal), é o mesmo. As lentes dos refletores são diferentes.Uns usam uma lente, enquanto que o maior (Elipsoidal), duas lentes. Os refletores de alumínio são iguais. Alguns refletores pretos são maiores do que outros. Os materiais de confecção das gelatinas são iguais. As cores das gelatinas são diferentes, assim como suas texturas. Logo após, oferecemos em PowerPoint uma sistematização sobre os equipamentos de iluminação mais utilizados nos teatros brasileiros. Á medida que apresentamos nomes, funções e características técnicas de cada equipamento, mostramos também seu manuseio e funcionamento na prática. A opção de fazermos a interrelação entre teoria e prática, a nosso ver, é importante para o ensino, pois, além de movimentar a aula, aproxima em um mesmo momento pedagógico duas dimensões do conhecimento, estimulando os alunos a desenvolverem habilidades para associação dos conhecimentos teóricos com suas Figura 47 – Distribuição dos equipamentos de iluminação no chão. Na foto, João Lins. Foto Ronaldo Costa Quadro 8 – Síntese dos alunos. 93 aplicações práticas ou entre conceito e fenômeno. Queremos com isso questionar a rigidez dos manuais de iluminação cênica que, em geral, introduzem uma enorme quantidade de informação técnica para somente nos últimos dois capítulos mencionar sua aplicação prática. É importante esclarecer que, ao nos referirmos às duas dimensões (teoria e prática), não estamos assumindo que elas devam ser pensadas em separado nos contextos de ensino. Se procedêssemos dessa forma, não seria benéfico, pois isso levaria ao falso entendimento de que existem conhecimentos que podem ser dispensados quando se realiza uma ou outra atividade em separado. Isso gera também “lugares comuns”, como a separação entre os “teóricos” e os “práticos”, que na verdade, não passam de detentores de parte do conhecimento. O que procuramos realizar nesta Organização dos Conhecimentos (O.C) é recuperar técnica e teoricamente informações que os sujeitos já experienciaram, em nível mais elementar, nas primeiras atividades provocadas pelos Estudos das Realidades (E.R). Lembramos que, na aula sobre “Variáveis da Luz”, os participantes da oficina desenvolveram um exercício prático em escala reduzida, no qual iluminavam um pequeno objeto utilizando um pequeno refletor (lanterna ou micropar), ou seja, mesmo de maneira simplificada, os conhecimentos sobre equipamentos de luz já começaram a ser problematizados desde o nosso primeiro encontro. Dessa forma, esclarecemos para os alunos que os refletores apresentados a partir de agora, mesmo com dimensões maiores, possuem o mesmo princípio de funcionamento daquele utilizado no exercício prático, no entanto, produzem efeitos luminosos diferentes. A seguir destacamos a sequência que costumamos realizar em PowerPoint e as respectivas problematizações que surgiram a partir da apresentação de cada equipamento. Como assunto preliminar é importante definirmos o conceito de refletor. Refletores são aparelhos ou dispositivos que possuem, basicamente, a mesma estrutura funcional: uma lâmpada, uma superfície refletora, uma ou mais lentes (óptica) e mecanismos de ajustes34 do facho de luz. A luz gerada pela lâmpada se propaga em todas as direções, a radiação que é emitida para trás é rebatida pela superfície refletora em 34 Esses mecanismos de ajustes podem ser acessórios internos ou externos ao aparelho refletor. Internos: facas de recorte, íris e porta-gobos. Externo: barn-doors (bandeiras de recorte). 94 direção à lente que, por sua vez, orienta e modela o facho de luz, que nada mais é do que a somatória da luz direta e da luz indireta proveniente do rebatimento. Os desenvolvimentos ópticos diferenciam os aparelhos refletores uns dos outros em comparação à qualidade da luz gerada, como bem observado pelos alunos no exercício de exploração, registrado no quadro da página 92: “As lentes dos refletores são diferentes. Uns usam uma lente, enquanto que o maior (Elipsoidal), duas lentes”. No Brasil, essencialmente, existem três configurações distintas entre lâmpada e lente nos refletores: a lente e a lâmpada são fixas; a lâmpada se movimenta em relação a uma lente fixa, ou duas lentes que se movem em relação a uma lâmpada fixa. A ação da lente ou do conjunto delas e os mecanismos de ajustes modelam o facho em relação à sua natureza, forma, abertura e focagem. A seguir, descreveremos os equipamentos explorados nessa aula. O refletor plano-convexo (PC) recebe esse nome porque utiliza uma lente com uma face plana e outra convexa. Gera uma luz concentrada com um contorno bem definido ótima para efeitos gerais e focos. Geralmente, o diâmetro do facho de luz desses refletores pode ser ajustado ao movimentar a lâmpada em relação a uma lente fixa. Isso é possível porque o PC possui um mecanismo que movimenta a fonte de luz por meio de um carrinho interno. À proporção que esse carrinho aproxima a lâmpada da lente, o facho de luz vai “abrindo”. À medida que a lâmpada se distancia da lente, o foco vai fechando. Figura 48 - Desenho esquemático com o princípio de funcionamento do refletor. 95 Nos teatros brasileiros, é muito comum encontrarmos PC’s de 500 watts e 1.000 watts, sendo o primeiro uma versão reduzida do segundo, como constatado pelos alunos na tabela da página 92 – “Alguns refletores pretos são maiores do que outros”. O refletor PC de 1000 watts possui um bom rendimento luminoso quando posicionado até uma altura de 7 metros. Acima dessa elevação, dá-se preferência a um outro tipo de refletor, como, por exemplo, os PC’s de 2000 watts ou projetores elipsoidais, que possuem maior rendimento luminoso. Esses refletores possuem como acessórios o porta-gelatinas e as bandeiras para recorte do facho de luz (Barn-door). O refletor Fresnel recebe esse nome porque utiliza uma lente do tipo Fresnel, criada no século XIX pelo físico francês Augustin Jean Fresnel, para melhoria da luz nos faróis marítimos. Os círculos prismáticos concêntricos encontrados nessa lente possibilitam que o refletor gere uma luz suave (difusa) com uma área mais luminosa ao centro e contornos indefinidos na sua periferia, ótima para gerais uniformes, pois as luzes de diversos equipamentos facilmente se misturam “sem deixar marcas ou contornos acentuados” (CAMARGO, 1999, p.167). Figura 50 - Refletor PC, desenho esquemático de uma lente plano-convexa e Barn- door (bandeiras de recorte do facho). Figura 49 - Desenho esquemático da abertura e fechamento focal do refletor PC. 96 Assim como o PC, o refletor Fresnel também pode obter tanto um facho de luz aberto como fechado, pois conta com o mesmo mecanismo de regulagem de abertura focal descrito anteriormente para o refletor PC. Nos teatros brasileiros, é muito comum encontrarmos refletores do tipo Fresnel de 500, 1.000 e 2.000 watts. Sua versão de 1.000 watts possui um bom rendimento luminoso quando posicionado até uma altura de 7 metros, acima dessa elevação dá-se preferência a sua versão de 2.000 watts. Esses refletores possuem como acessórios o porta-gelatinas e as bandeiras para recorte do facho de luz (Barn-door). Geralmente, durante a apresentação em PowerPoint, optamos por retirar dos refletores as duas lentes, Plano-convexa e Fresnel, para que os participantes da oficina analisem suas diferenças em mãos. Particularmente nesta oficina, Lenilton Teixeira, numa atitude de curiosidade, coloca ambas as lentes à frente do facho luminoso do projetor multimídia, analisando as diferenças de modelagem da luz proporcionadas por cada uma, procedimento didático que acabamos por adotar a partir de então (Figura abaixo). Figura 51 - Refletor Fresnel, desenho esquemático de uma lente Fresnel e Barn-door (bandeiras de recorte do facho). Figura 52 – À esquerda da imagem, lente PC à frente do facho luminoso do projetor multimídia. À direita da imagem, lente Fresnel à frente do facho luminoso do projetor multimídia. Foto Ronaldo Costa 97 Logo após, manuseamos na prática os refletores PC e Fresnel, colocando-os lado a lado, para facilitar a distinção das luzes geradas por ambos. Como procedimento didático saturamos o ambiente com fumaça para que essa distinção também se estendesse para o desenho aéreo, e não apenas para o desenho visualizado no piso do palco (Figura abaixo). Continuando a exploração do conteúdo desse encontro, passamos a abordar o refletor elipsoidal. Tal equipamento recebe esse nome, porque possui um espelho rebatedor elíptico, e não parabólico, como os outros. Essa curvatura elíptica da superfície refletora possibilita que os raios provenientes do rebatimento convirjam para a mesma região, criando-se um importante ponto de concentração de luz antes da modelagem óptica. Somado à evolução do espelho elíptico, o refletor elipsoidal possui duas lentes que lhe garantem um melhor desempenho luminoso aumentando seu fluxo de luz, além de permitir a projeção de imagens através de gobos, geometrizar o facho luminoso por meio de facas (recortes quadrados, retangulares ou triangulares) e diminuir a abertura focal para além da capacidade natural do equipamento utilizando um diafragma ajustável chamado de Figura 53 – Luz gerada pelos refletores Fresnel à esquerda e PC à direita. Figura 54 - Princípio de rebatimento da superfície refletora elíptica. Imagem retirada do site: http://www.d.umn.edu/~mharvey/th1501ellipsoidals.html Foto Ronaldo Costa 98 íris (Figura 55). A maioria desses dispositivos para modelagem de luz, como: facas de recorte, nicho para colocação de porta-gobos e nicho para colocação da íris localizam-se antes das lentes justamente para possibilitar a focalização ou desfocalização do efeito luminoso que queremos obter, precisão dificilmente alcançada pelos equipamentos de uma lente única. O mecanismo de ajuste focal do elipsoidal é diferente dos refletores PC e Fresnel, já que suas duas lentes se movimentam em relação a uma lâmpada fixa, como observado pelos alunos no esquema da página 92: “O mecanismo de ajuste focal dos refletores pretos, com exceção do grande (Elipsoidal), é o mesmo”. Quando temos um refletor elipsoidal com uma pequena movimentação das duas lentes em relação à lâmpada, facultando-o apenas à capacidade de focalizar e desfocalizar a luz gerada ou imagem que, porventura, queremos projetar, chamamos esse equipamento de “Elipsoidal grau fixo” para abertura focal, ou seja, apenas conseguimos fechar o facho luminoso utilizando uma íris. No entanto, se essas lentes possuem uma ampla movimentação em relação ao “Elipsoidal grau fixo”, dando além da capacidade de focar e desfocar a possibilidade de variar a abertura e o fechamento do facho luminoso, independente da íris, chamamos esse equipamento de “Elipsoidal com zoom”. Figura 55 – Na parte superior esquerda da imagem, um porta-gobos com gobo artesanal. Na parte inferior esquerda da imagem, uma íris. No lado direito da imagem, um Refletor Elipsoidal com nomenclatura das suas partes externas. Imagens retirada do site: http://www.d.umn.edu/~mharvey/th1501ellipsoidals.html 99 Encontramos no Brasil Elipsoidais graus fixos (Figura 56), geralmente, nas versões: 5º, 10º, 14º, 19º, 26º, 36 º, 40º, 50º, 70º e 90º (ângulos estes registrados no corpo do refletor) e Elipsoidais com zoom (Figura 57), geralmente, nas versões: de 15º a 30º ou de 25º a 50º. Esses ângulos se referem à abertura focal do equipamento e são aferidos logo depois que o facho de luz sai da “boca” do refletor. Os equipamentos com potências que giram em torno dos 750 a 1000 watts possuem uma boa autonomia até 11 metros de altura. Após mostrar o funcionamento do refletor elipsoidal na prática, passamos a discutir sobre o refletor PAR 64. A sigla PAR significa Parabolic Aluminized Reflector, e o 64 se refere ao diâmetro em oitavas de polegada da circunferência da lente (Figura 58). Existem refletores do tipo PAR com diâmetro de lente inferiores a 64 oitavos de polegada, no entanto, não iremos abordá-los neste conteúdo. Muitas pessoas costumam chamar erroneamente o PAR 64 de lâmpada, quando na verdade é um refletor completo com uma fonte de luz, uma superfície parabólica refletora Figura 57 - Elipsoidal com zoom. Figura 58 - Desenho esquemático do diâmetro da lente do refletor PAR 64. Figura 56 - Elipsoidal grau fixo. 100 aluminizada e uma lente. A lente é blindada à superfície refletora, alojando no interior deste conjunto a lâmpada, significando dizer que, quando o filamento se queima, todo o refletor é jogado fora, como se faz comumente com uma lâmpada, por isso, a confusão na nomenclatura. Essa blindagem torna a relação lente-lâmpada estática, impossibilitando a regulagem de abertura e fechamento focal. Desse modo, a única forma de obtermos uma variação na abertura do facho de luz é adquirirmos refletores PAR 64 com lentes diferentes. O mercado de iluminação disponibiliza 4 (quatro) tipos de refletores do tipo PAR 64 (Figura 59): Foco 1, Foco 2, Foco 5 e Foco 6 (nomenclatura brasileira), sendo que a abertura vai aumentando do Foco 1 (mais estreito) para o Foco 6 (mais amplo), lembrando que, quanto mais trabalhada é a lente, mais difusão terá a luz. O refletor PAR 64 de 110 volts, em sua versão mais comum com filamento mais alongado que sua versão de 220 volts, gera uma luz ovalada com muito brilho e definição, “sendo o eixo mais extenso duas vezes maior, aproximadamente, do que o eixo menor” (TUDELLA, 2008, p.113) (Figura abaixo). Figura 59 - Diferentes Refletores PAR 64. As distintas lentes são uma padronização universal de fábrica. Figura 60 - Desenho esquemático da luz ovalada do refletor PAR 64. 101 Em compensação ao fato de o PAR 64 não permitir regular a sua abertura focal, ele possibilita - diferentemente dos outros refletores descritos anteriormente - posicionar sua lâmpada (refiro-me ao filamento) ora na vertical (foco em pé), ora na horizontal (foco deitado) ou até mesmo na diagonal, ao girar todo o conjunto formador do refletor na carcaça de sustentação, trazendo uma importante variação para seu facho de luz. Na demonstração prática, os participantes da oficina, aproveitando alguns tecidos e figurinos que existiam no depósito do Teatro do DEART/UFRN, propuseram tirar fotos com diferentes caracterizações à medida que experimentavam diferentes formas de posicionar as lâmpadas dos refletores PAR 64 (Figura abaixo). O PAR 64 necessita de uma carcaça em alumínio ou metal para suportá-lo, e é ela quem confere a versatilidade para o refletor ser gelatinado 35 e afinado na posição correta. Na exploração deste conteúdo, trazemos as versões Foco 1, Foco 2, Foco 5 e Foco 6 com o intuito de mostrar na prática as diferenças de lente e, por conseguinte, de facho de cada uma delas. No esquema da página 92, verificamos que os participantes da oficina, na exploração inicial da aula, referem-se à carcaça de suporte, como também designam erroneamente o refletor PAR 64 como uma lâmpada: “Os refletores de alumínio são iguais”; “As lâmpadas dos refletores de alumínio são diferentes”. Existem no mercado brasileiro refletores do tipo PAR 64 em três versões: 35 Termo utilizado pelos profissionais da luz para designar a colocação de gelatinas nos refletores. Figura 61 - Variação do posicionamento da lâmpada do refletor PAR 64 110 volts. Na foto, Dinha Vitor à esquerda, Thémis Suerda ao centro, e Marinalva Moura à direita. Foto Ronaldo Costa 102 Versão Potência Lente 110 volts 1000 watts Blindada 220 volts 1000 watts Blindada Source 4 ou StarPar 220 volts 575 watts Intercambiável Outra informação importante é que as duas versões de 220 volts não possuem o mesmo facho ovalado que a versão de 110 volts, pois os filamentos das suas lâmpadas tendem a tornar os seus fachos arredondados, fato que leva muitos iluminadores a preferirem a versão de 110 volts. Em seguida, apresentamos o Set-light de 1000 watts (Figura 62), o último e mais simples refletor que escolhemos para explorar neste conteúdo. Tal equipamento não possui lente, logo a luz gerada por ele possui uma grande dispersão, sem direcionamento ou modelagem. É utilizado, geralmente, para iluminar grandes superfícies, como cicloramas e painéis cenográficos. Esse refletor possui como acessório o porta-gelatina. Por fim, apresentamos e discutimos a diferença entre os diversos filtros de cor (gelatinas) e difusores colocados na exploração inicial desta aula. Filtros de cor (gelatinas) e difusores são películas semitransparentes que são colocadas à frente dos fachos luminosos com o objetivo de colori-los ou difundi-los, respectivamente. Lembramos que, na aula sobre “Variáveis da Luz”, os alunos dispuseram de um pedaço de gelatina para construir o experimento de iluminação em pequena escala. A partir de agora, eles vão Figura 62 - Set-light de 1000 watts. Quadro 9 – Versões de PAR 64. 103 conhecer o vasto repertório de características e opções disponíveis para esses tipos de filtros de luz. À primeira vista, os participantes da oficina julgaram que “os materiais de confecção das gelatinas fossem iguais”, no entanto podemos destacar que existem basicamente dois tipos materiais diferentes para suas fabricações: o poliéster e o policarbonato. As gelatinas à base de poliéster são mais espessas, soltam a pigmentação facilmente ao serem arranhadas e possuem uma boa resistência ao calor. As gelatinas à base de policarbonato têm uma espessura mais fina, não soltam a pigmentação ao serem arranhadas e possuem uma ótima resistência ao calor. A técnica de fabricação das gelatinas de poliéster e de policarbonato também é diferente. Na primeira o pigmento é apenas sobreposto a uma base transparente, por isso é facilmente removido com arranhões, enquanto que na segunda o pigmento é aprisionado entre duas finíssimas camadas de policarbonato transparente, conferindo-lhe maior resistência aos arranhões e ao calor. O mercado brasileiro dispõe de algumas marcas de gelatinas e difusores, em geral importados, sendo que as das linhas da Rosco e da Lee são as mais conhecidas e confiáveis. Esses dois fabricantes, Americano e Inglês respectivamente, distribuem gratuitamente mostruários (figura 63) de gelatinas e difusores para os profissionais que trabalham no ramo de vídeo, cinema, iluminação cênica ou de entretenimento. Foram estes mostruários que colocamos no exercício de exploração inicial da aula, com o intuito de mostrar a gama de cores das gelatinas e as texturas dos difusores, variedades estas apontadas pelos participantes no esquema da página 92: “As cores das gelatinas são diferentes, assim como suas texturas”. Figura 63 - Mostruários de gelatinas. Foto Ronaldo Costa 104 Embora a apresentação dos equipamentos mostrados anteriormente exija um especial planejamento nessa oficina, cabe destacar que grande parte da estruturação dessa aula foi direcionada a partir do exercício de exploração inicial que visava desenvolver nos alunos habilidades de observação, análise e avaliação dos equipamentos, movendo-os a levantar dúvidas e questões acerca de suas características técnico-funcionais e de manuseio. É nela que os participantes da oficina têm a possibilidade de conhecer preliminarmente a intimidade dos equipamentos, instigando a capacidade e a curiosidade de elencar suas semelhanças e diferenças. É importante frisar que o quadro comparativo construído nesse exercício de prospecção esteve à vista em quadro branco e foi utilizado como balizador para o desenvolvimento e problematização da aula. Dessa forma, esse conteúdo foi discutido e construído coletivamente a partir desse exercício de exploração inicial. Isso aguçou a curiosidade e criou ambiente propício para as problematizações de conteúdo, pois envolveu os alunos na busca de novos e diferentes saberes organizados e apresentados em PowerPoint, bem como pelo manuseio prático dos equipamentos. Assim sendo, toda a organização de conhecimento proposta aqui é fruto das discussões que surgiram em sala de aula. Nesse sentido, avaliamos que conseguimos atingir os objetivos propostos para esse encontro, tendo como parâmetro de análise as questões geradoras: como estimular o ator a compreender o funcionamento dos equipamentos de iluminação cênica mais utilizados nos teatros brasileiros? Que ações pedagógicas devem ser pensadas para tornar atraente o aprendizado das nomenclaturas e das características técnico-funcionais dos equipamentos de iluminação cênica para profissionais que não trabalham diretamente com eles? Na primeira parte da aula seguinte, continuaremos a discutir e explorar o restante do conteúdo sobre os principais equipamentos de iluminação usados nos teatros brasileiros, e na segunda parte, começaremos a problematizar aspectos técnicos de iluminação. 105 2.4 – Equipamentos de Iluminação Cênica (continuação) / Princípios básicos de iluminação (O. C). Como mencionamos na descrição crítica da aula anterior, o conteúdo sobre equipamentos de luz requer dois encontros para ser trabalhado de maneira detalhada e satisfatória na oficina. Dada à interpenetração de saberes cumulativos, construídos na oficina, e a íntima relação com os conhecimentos que abordaremos a seguir, resolvemos discutir a continuação da aula de “Equipamentos de Iluminação Cênica”, juntamente com a aula destinada à exploração dos “Princípios Básicos de Iluminação”, que possui os seguintes objetivos: 1. Apresentar e discutir os princípios básicos de iluminação: ataque, compensação e contra-luz. 2. Estimular a apreciação crítica da luz de filmes e fotografias, tendo como parâmetros de análise os princípios básicos de iluminação: ataque, compensação e contra-luz. Como primeiro movimento da aula, solicitamos aos participantes que avaliassem o andamento da oficina até o presente momento. Lenilton Teixeira, em sua colocação, sugeriu que explorássemos o conteúdo de eletricidade, pois sentia a necessidade, na posição de diretor/ator, de conhecer mais sobre o assunto, até para evitar possíveis acidentes elétricos nas montagens de que participava, sugestão de conteúdo que foi acatada por todos do grupo. Mesmo sem um planejamento prévio, trabalhamos em PowerPoint os seguintes conhecimentos de eletricidade básica: Tensão Elétrica, Corrente Elétrica e Potência Elétrica. Tensão Elétrica – é a força que impulsiona os elétrons livres nos condutores. É medida pela diferença de potencial entre dois pontos, e sua unidade de medida é o Volt (V). Corrente Elétrica – é o movimento ordenado dos elétrons nos condutores. Sua unidade de medida é o Ampére (A). Potência Elétrica – é o produto da ação da Tensão Elétrica e da Corrente Elétrica. Para haver potência elétrica, é necessário que exista um equipamento funcionando ligado à 106 eletricidade, ou seja, se há corrente elétrica (Intensidade de Corrente), é porque existe uma carga elétrica (potência elétrica) consumindo energia elétrica de uma rede qualquer (tensão elétrica). Sua unidade de medida é o Watt (W). Logo após essa rápida exposição teórica, exploramos a rede elétrica do Teatro Jesiel Figueiredo do DEART/UFRN, começando pelos condutores elétricos (fios e cabos), passando pelos dispositivos de proteção (disjuntores termomagnéticos e aterramento), até chegarmos nos rack’s de energia para conexão dos refletores (dimmer’s). Para essa exploração utilizamos como ferramentas um alicate multímetro para aferição da tensão elétrica local (voltagem) e da intensidade de corrente elétrica que passa pelos condutores (amperagem), e uma chave teste para descobrir fases e neutros da rede elétrica (Figura 64 e 65 abaixo). Dimmer’s são dispositivos destinados para regular a tensão elétrica (voltagem) das lâmpadas acopladas a eles. O princípio de funcionamento do dimmer se baseia em controlar a luminosidade das lâmpadas, diminuindo ou aumentando o seu fornecimento de energia. Quanto mais tensão elétrica tem a lâmpada, mais luminosa será sua luz, enquanto que quanto menos tensão, menor a será sua luminosidade. Dessa forma, podemos definir sucintamente os dimmer’s como controladores de luminosidade. No mercado brasileiro, encontramos dimmer’s de uso caseiro que sustentam potências elétricas (cargas) de até 1000 watts, e dimmer’s de uso especial, destinados às artes espetaculares e eventos em geral, que sustentam altas potências elétricas. Estes últimos são integrados a um único equipamento analógico ou digital de seis ou doze canais Figura 65 - Chave teste para descoberta das fases e dos neutros da rede elétrica. Figura 64 – Aferição da voltagem com alicate multímetro Foto Lenilton Teixeira Foto Lenilton Teixeira 107 denominado de Rack36. Cada canal abriga um dimmer específico que pode conectar, geralmente, de 2 a 4 refletores de 1000 watts, a depender do fabricante. Quando multiplicamos a potência sustentada por cada dimmer pelos 6 ou 12 canais do Rack, obtemos uma elevada carga conectada à eletricidade local, consequentemente, os Rack’s precisam de um grande fornecimento de energia elétrica e devem ser conectados a uma rede elétrica que possua disjuntores de proteção adequados e cabos com uma grande bitola (espessura do condutor) para alimentá-los apropriadamente. O Teatro Jesiel Figueiredo do DEART/UFRN dispõe de 4 unidades do Rack GCB modelo analógico de 6 canais (Figura 66). Cada rack suporta uma carga máxima de 24000 watts e possui 24 tomadas divididas em 6 canais de dimmer’s, ou seja, cada canal de dimmer é organizado por 4 tomadas do tipo 2 P + T (Fase, neutro e aterramento), que suporta uma carga de 4000 watts, podendo-se nele acoplar 4 refletores de 1000 watts, 8 refletores de 500 watts, 2 refletores de 2000 watts, e assim por diante. Os Rack’s analógicos são individualmente conectados a uma mesa de comando de iluminação por seus cabos de sinais específicos. A mesa do Teatro Jesiel Figueiredo trata- se de uma GCB analógica de 24 canais (Figura 67), sendo que seus potenciômetros de 1 a 6 comandam o primeiro Rack, de 7 a 12 o segundo Rack, de 13 a 18 o terceiro Rack e de 19 a 24 o quarto Rack. A mesa de comando, por meio dos seus potenciômetros, envia uma 36 “Rack”, que significa prateleira, na verdade é uma estrutura de sustentação dos dimmer’s, por isso passou- se a designar todo o conjunto de Rack. Foto Ronaldo Costa Figura 66 - Rack GCB analógico de 6 canais. Foto Ronaldo Costa 108 mensagem que trafega pelos cabos de sinais para os Rack’s, a fim de regular as intensidades das lâmpadas conectadas a eles dentro de uma faixa que varia de 0 a 100 %. Em seguida, mostramos para os participantes da oficina como devemos proceder para conectar um refletor ao Rack, para depois acioná-lo pela Mesa de Comando de iluminação. Usualmente, as varas de iluminação destinadas para o suporte dos refletores nos teatros possuem tomadas numeradas que se estendem por meios dos fios até os Rack’s para serem alimentadas com energia elétrica, extensões estas chamadas de “vias de conexão”. Dessa forma, quando conectamos um refletor a uma via qualquer numerada, a sua outra extremidade, que também é numerada com o mesmo número da vara, deve ser ligada ao Rack, mais especificamente no canal de dimmer de nossa escolha, procedimento denominado pelos profissionais brasileiros de “Rackeamento”. Até este momento, direcionamos nossa atenção para o reconhecimento da rede elétrica local, a apresentação dos equipamentos que restavam da aula anterior e de como devemos proceder para a conexão dos refletores aos Rack’s de energia, ações registradas por Dinha Vitor e João Lins em seus diários de bordo: Ronaldo expôs suas pretensões daqui para frente, explicou a pesquisa-ação e falou sobre os experimentos desenvolvidos nas aulas anteriores. Lenilton propôs uma aula sobre a questão da energia. O que, de fato, os atores poderiam saber sobre eletricidade? Ronaldo explicou o básico dessas informações até por questão de segurança: o que é o fio terra e fio condutor; quanto uma tomada caseira pode agüentar? Como ligar os refletores? Quais são os cuidados que devemos ter para não tomarmos choques? São estas informações que todos os envolvidos numa encenação necessitam saber, tanto pela segurança, quanto pela melhor compreensão da luz (DINHA VITOR, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 22/01/2009). Figura 67 - Conexão dos Rack’s à Mesa de Comando de iluminação Foto Ronaldo Costa 109 Andamos por todo o teatro, identificando toda a parte elétrica, mesa de luz, os caminhos que cada saída e entrada faz, a questão dos disjuntores que existem, o geral e os parciais, como são divididos os canais e como estão dispostos nas varas. A cada parte Ronaldo explicava cada uma delas e suas devidas funções (JOÃO LINS, ator, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 22/01/2009). Logo após essa primeira parte, desenvolvemos um exercício teórico-prático com o objetivo de explorar os princípios básicos de iluminação: Ataque, Compensação e Contra-luz. Solicitamos aos participantes da oficina a montagem de 3 refletores do tipo PC de 1000 watts para iluminação de um objeto com cerca de 60 a 80 centímetros de altura. Os 3 refletores devem ser devidamente conectados aos canais de dimmer’s 1, 2 e 3 respectivamente (rackeamento), e dispostos em “Y” em duas varas de iluminação (técnica das três posições): dois deles iluminando o objeto frontalmente, e um sua parte de trás (Figura 69). Os conceitos de ataque, compensação e contraluz são mais utilizados por profissionais envolvidos com a fotografia, cinema e vídeo do que propriamente por iluminadores cênicos, mas podem perfeitamente ser utilizados em oficinas destinadas às Artes Cênicas, devido à similaridade entre as técnicas de iluminação. Segundo Moura (1999) o básico da iluminação reside nestes três princípios: Só existem três posições possíveis para se iluminar um assunto: ataque, compensação em relação ao ataque e contraluz. Essas três posições são determinadas, sempre, em função de duas coisas; primeira, a posição da câmera; segunda, a posição do assunto (p.28 e 29). Foto Ronaldo Costa Figura 69 - Disposição dos refletores em "Y". Figura 68 - - Montagem dos refletores do tipo PC de 1000 watts. Na foto, Thémis Suerda. 110 Como vemos na citação acima, “a posição da câmera” é determinante para o posicionamento dos refletores, o que analogamente pode ser trocado nas Artes Cênicas pelo ponto de vista do espectador. Á medida que apresentamos cada princípio de iluminação em PowerPoint, mostramos na prática o seu efeito no objeto, problematizando, ainda mais, tais conceitos: a) O ataque nem sempre corresponde à luz mais forte a iluminar o assunto, mas com toda a certeza é a partir dela que todas as outras luzes são ajustadas. Na demonstração prática decidimos que o refletor número 1, localizado à frente e do lado esquerdo do objeto, seria nossa luz de ataque (Figura abaixo). Ataque ou Key-light é a luz principal que irá dar maior ênfase ao assunto iluminado, que, na maioria dos casos, coincide com a luz mais forte. A luz de Ataque tem como característica o fato de ser a partir dela que as demais luzes são ajustadas caso haja necessidade. Muitas vezes, uma única fonte de luz já é suficiente. Compensação, Preenchimento ou Fill-light é uma luz geral que permeia todo o ambiente ou parte dele, preenchendo espaços escuros e amenizando as sombras provocadas pela luz de ataque. Contra-luz ou back-light é a luz colocada atrás do assunto iluminado, enfatizando os seus contornos e destacando-o do fundo do espaço. Figura 70 - Luz de Ataque. Foto João Lins 111 b) A compensação (figura 71) invariavelmente é uma luz menos intensa e/ou mais difusa que o ataque. Sua função é minimizar as sombras provocadas pela luz principal, dando a possibilidade de as pessoas, câmeras fotográficas ou filmadoras perceberem a região sombreada no assunto iluminado. Na técnica de três pontos em “Y”, quando um refletor destinado à compensação apresentar a mesma natureza e intensidade da luz principal, teremos um ataque cruzado. Na demonstração prática, decidimos que o refletor número 2, localizado à frente e do lado direito do objeto, seria nossa luz de compensação. c) A contra-luz pode ser a única luz a iluminar o assunto, neste caso, também desempenha a função de ataque. Em outras ocasiões, podemos definir a contra-luz como luz principal e compensá-la pela frente, desmistificando que a luz de ataque é sempre frontal (figura abaixo). Figura 71 - Percebam nesta foto de trás do objeto como a compensação é menos intensa que o ataque. Figura 72 - Do lado direito da imagem Contra-luz. Do lado esquerdo, Contra-luz definida como luz de ataque sendo compensada pela frente. Foto João Lins Foto João Lins 112 A definição de que tais e tais refletores irão exercer a função de ataque, compensação e contraluz caberá aos iluminadores cênicos, consequentemente, as variações de naturezas, direções, sentidos, ângulos, intensidades, cores e formas dos refletores irão depender de critérios estéticos, técnicos e também pessoais. Nesse sentido, dado a infinidade de efeitos luminosos que se apresentam aos nossos olhos, combinando as “variáveis da luz”, torna-se difícil acreditar, de início, que é possível resumir essa diversidade a apenas três princípios básicos, inquietação essa, registrada pela atriz Dinha Vitor no seu diário de bordo: Só existem três maneiras de se iluminar um objeto em cena? Com este questionamento fiquei na dúvida: Como é que só existem três maneiras de iluminar algo ou alguém em cena se no teatro existem muitos refletores? Cada um direcionado para um lugar diferente, para uma pessoa ou coisa? Após esse conflito na minha cabeça, o professor mediador esclareceu que realmente só existem três maneiras de iluminar: Luz de Ataque, Contra-luz e Luz de Compensação. Neste momento, fomos ver na prática esses focos apontados para o objeto, [...] assim pude constatar o que de fato ele falou sobre as três maneiras. Os focos dão a beleza da luz, sem perder a sombra, pois ele sempre ressalta que a beleza da luz está no contraste com a sombra (Depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 26/01/2009). No depoimento acima, é possível constatar que a apreensão e a problematização desse conteúdo moveram a aluna a questionar conhecimentos que ela construiu ao longo dos anos de trabalho no teatro, fato que deu abertura a um novo olhar para os fenômenos luminosos. Por fim, exercitamos a percepção para os efeitos de luz e suas influências nos assuntos iluminados, analisando os princípios básicos de iluminação – Ataque, Compensação e Contraluz - em trechos dos filmes Tango37, de Carlos Saura e O Fantasma da Ópera38, de Joel Schumacher, exercício descrito pela atriz Thémis Suerda no seu diário de bordo: Todas as informações de hoje só vêm reafirmar o quanto o mundo vai mudando aos meus olhos, vejo tudo agora com outro olhar. Foi um banho de beleza rever cenas do filme Tango, e um show ver o Fantasma da Ópera (Depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 26/01/2009). 37 Filme “Tango”. Direção de Carlos Saura. Europa Filmes. Bobina Cinematográfica (115 minutos) son, color, 1998. 38 Filme “O Fantasma da Ópera”. Direção Joel Schumacher. Universal Pictures. Bobina Cinematográfica (141 minutos), son, color, 2004. 113 Nesse sentido, avaliamos que conseguimos atingir os objetivos propostos para esse encontro, tendo como parâmetro de análise as questões geradoras: Como educar o olhar do aluno para a observação dos fenômenos luminosos na vida cotidiana? Como podemos exercitar a capacidade perceptiva dos alunos para enxergar os efeitos de luz e suas influências nos assuntos iluminados? Além dos registros contidos nos diários de bordo, também avaliamos os avanços dessa aprendizagem dos alunos quando da realização das atividades de Aplicação do Conhecimento (A.C), que serão discutidas posteriormente no capítulo 3. Na aula seguinte, discutiremos alguns aspectos técnicos referentes à Operação de luz e sua interseção com o trabalho do ato, finalizando o capítulo estruturado em torno da Organização dos Conhecimentos. 2.5 - Operação de Luz (O. C). Este encontro é destinado à abordagem do conteúdo sobre Operação de Luz e suas implicações com o trabalho do ator. Possui os seguintes objetivos: 1. Discutir sobre a importância da Operação de Luz no espetáculo teatral. 2. Analisar como o trabalho do ator pode entrar em consonância com a Operação de Luz de um espetáculo. O primeiro passo da aula é relembrar algumas características semiológicas do signo “luz” abordadas na oficina, mais especificamente sua forma estética manipulada, a iluminação cênica. Como mencionamos na aula sobre “Espaço Cênico”, o suporte de criação do iluminador é o espaço. Consequentemente, os resultados criativos da iluminação são percebidos nele ao longo do tempo, logo a iluminação cênica é um sistema significante espaço-temporal. Rinaldi (2008) defende que, antes de tudo, devemos considerar o signo da luz pelo seu duplo modo de ser: 114 A luz está no espaço sobre o qual se projeta e transcorre através do tempo durante o qual se a observa. A luz é espaço-temporal, a dizer, há uma morfologia e uma sintaxe da luz, ou seja, uma instauração de forma no espaço e uma articulação das transformações no tempo39 (p.1, tradução nossa). Se o sistema significante da iluminação abrange também uma característica temporal, podemos, portanto, relacioná-lo com a música, arte do tempo, cuja formalização e desenvolvimento estético tornam-se importantes balizadores para o tecer teórico do campo da iluminação cênica. Dessa forma, podemos afirmar, por analogia com a música, que as mudanças sucessivas de efeitos de luz determinam um andamento e uma rítmica para a organização temporal do espetáculo. E são essas “mudanças de efeitos luz” ao longo do tempo de duração da cena e/ou do espetáculo que chamamos de Operação de Luz. A Operação de Luz, tal qual uma partitura musical, possui uma eloquência intencional para o encadeamento dos efeitos luminosos (estados de luzes) propostos para as cenas, caracterizando uma escritura sintática atrelada à estética global da obra. Rinaldi (2008) também afirma que essa sintaxe da iluminação pode ser analisada pelos seguintes aspectos temporais: variedade, velocidade, permanência, segmentação, orientação e evolução. Variedade – é a quantidade de estados de luzes que compõem a totalidade do desenho de iluminação, podem ser muitos ou poucos. Velocidade - é o tempo no qual um estado de luzes se transforma no seguinte. A rigor, a velocidade é o tempo de realização de um estado. A velocidade pode ser lenta ou rápida. Permanência – é o tempo durante o qual um estado de luzes permanece no espaço. A permanência de um estado de luzes pode ser larga ou curta. Segmentação – é o agrupamento de estados de luzes sucessivos em função de sua similitude visual. Este agrupamento se denomina segmento. A segmentação dá ao espaço continuidade visual se os estados das luzes são similares, e descontinuidade visual se os estados das luzes são diferentes. Orientação – é o modo de correspondência entre os estados das luzes e a outra ação ou acontecimento. Um estado de luzes pode produzir uma relação de simultaneidade com outra ação ou uma relação de sucessividade com a mesma (antes e depois). Evolução – é o agrupamento de estados de luzes sucessivos em função do desenvolvimento de um significado. Esse agrupamento se denomina forma, já 39 La luz está en el espacio sobre el cual se la proyecta y transcurre a través del tiempo durante el cual se la observa. La luz es espacio-temporal, es decir, hay una morfología y una sintaxis de la luz, o sea, una instauración de la forma en el espacio y una articulación de las transformaciones en el tiempo. 115 que se conhece uma forma quando se sabe seu significado40 (p. 5, tradução nossa). Na verdade, o iluminador, ao criar um desenho de luzes, estabelece primeiramente aspectos morfológicos das luzes (intensidade, cor, ângulo, direção, natureza e forma), definindo os efeitos ou estados que deseja utilizar nas cenas para depois animá-los ao longo do tempo com a Operação da Luz. Camargo (2000) afirma que a Operação de Luz pode propor mutações que agem ora na microestrutura e ora na macroestrutura do espetáculo: Mutação na microestrutura: possibilidade de operar mutações dentro das cenas ou das unidades de tempo – espaço e ação que compõem o espetáculo. Mutação na macroestrutura: mutação de luz de uma cena para outra, funcionando como elemento de articulação da narrativa, separando partes, fechando o ciclo e abrindo outro, estabelecendo pausas no desenvolvimento do espetáculo como um todo (p.154). Desse modo, podemos concluir que a manipulação dos aspectos morfológicos da luz (percebidos no espaço) e dos sintáticos (percebidos ao longo tempo) resultam na escritura poética que o iluminador deseja imprimir ao espetáculo. Logo após essa explanação inicial, pedimos a leitura em voz alta do anexo II do livro “Função Estética da Luz”, de Roberto Gill Camargo, destinado a uma sistematização sobre a Operação de luz. 40 Variedad: Es la cantidad de estados de luces que componen la totalidad del diseño de iluminación, pudiendo éstos ser muchos o pocos. Velocidad: Es el tiempo en el cual un estado de luces cambia deviniendo el siguiente. En rigor, la velocidad es el tiempo de realización de un estado. La velocidad puede ser lenta o rápida. Permanencia: Es el tiempo durante el cual un estado de luces queda sobre el espacio. La permanencia de un estado de luces puede ser largo o corto. Segmentación: Es la argupación de estados de luces sucesivos en función de su similitud visual. Esta agrupación se denomina segmento. La segmentación da al espacio continuidad visual si los estados de luces son similares o discontinuidad visual si los estados de luces son diferentes. Orientación: Es el modo de correspondencia entre los estados de luces y los otros hechos o acontecimientos. Un estado de luces puede producirse en relación de simultaneidad con otro hecho o en relación de sucesividad con el mismo (antes o después). Evolución: Es la agrupación de estados de luces sucesivos en función del desarrollo de un significado. Esta agrupación se denomina forma, ya que se conoce una forma cuando se sabe su significado. 116 É um texto totalmente técnico onde ele trata dos elementos e como devem ser operados em uma iluminação cênica. (JOÃO LINS, ator, depoimento escrito no seu diário de bordo 28/01/2009). Em seguida, começamos a problematizar o assunto na tentativa de se estabelecer uma conexão do conteúdo estudado e o trabalho do ator com a seguinte pergunta: É possível pensar num jogo cênico entre a Operação de Luz e o trabalho do ator na apresentação de um espetáculo? A princípio a pergunta causou certo estranhamento nos participantes da oficina, já que a “atitude de jogo” era apenas pensada e mensurada por eles como uma ação construída de ator para ator na apresentação de um espetáculo. No entanto existiu uma unanimidade em afirmar que é perfeitamente possível que essa “atitude de jogo” seja construída também com a dinâmica da Operação de Luz, desde que exista um propósito interativo entre o iluminador e o ator, e vice-versa. Dessa forma, pode-se afirmar que a Operação de Luz é concretizada apenas no aqui-agora da cena, tornando a iluminação cênica tão efêmera quanto as artes que a utilizam. Também existiu um consenso em apontar a “precisão” na Operação de Luz como um fator importante para o bom desenvolvimento do jogo entre ator-iluminador, cabendo aqui lançar outra questão: mas essa precisão é só relativa à Operação de Luz? Obviamente que as respostas aludiram à necessidade de o ator posicionar-se na “marca” correta no instante em que o efeito de luz foi planejado para entrar em determinado lugar do espaço. Consequentemente, o jogo cênico entre ator-iluminador é construído pelo diálogo entre as partes, já que o pleno estabelecimento desse jogo depende da ação conjunta dos seus jogadores, em que um influencia o outro no momento em que se estabelece a cena aos olhos do público. Ainda sobre a precisão, podemos também considerar que muitas das mesas de comando computadorizadas dão a possibilidade de temporizar os efeitos criados pelo iluminador, regulando os tempos das entradas e saídas das luzes. Se por um lado ganhamos em exatidão, por outro perdemos na organicidade do jogo, pois, se nos deixarmos levar por um princípio da automação, podemos pressupor erroneamente que todas as apresentações são iguais umas às outras, ignorando os imprevistos que possam surgir, o que sabemos ser 117 ontologicamente impossível em se tratando das Artes Cênicas. Ao contrário disso, Operação de Luz deve ser pensada como um movimento harmônico, cadenciado e entrelaçado com o andamento do espetáculo cênico, que dialogue com os erros e acertos; com atrasos e antecipações; com o previsível e o imprevisível de cada apresentação. Terminada essa discussão em torno do jogo existente entre a Operação de Luz e o trabalho do ator, levantamos outro questionamento: Mas será que operação pode ser delineada no processo criativo sem que exista um ensaio de luz sequer? Essa pergunta desencadeou uma forte discussão no grupo mais pelo caráter especulativo que ela sugere do que propriamente por sua indagação central. É muito vago afirmar, baseado apenas em suposições, se é possível ou não delinear uma Operação de Luz sem que haja um ensaio de luz sequer. No entanto foi consensual que a presença do iluminador durante o processo criativo é importante para se definir muitas questões decisivas para a narrativa do espetáculo referentes à Operação de Luz, sendo até mesmo imaginável o desenvolvimento de um roteiro preliminar de entradas e saídas das luzes. Decerto, as maturidades artísticas e as experiências do iluminador e dos integrantes do coletivo de trabalho irão determinar se esse roteiro condiz ou não com as expectativas construídas em torno da encenação no momento em que se concretiza cenicamente. É fato que o aperfeiçoamento da Operação de Luz, assim como qualquer elemento cênico, depende do número de ensaios e apresentações, significando dizer que quanto mais tempo o espetáculo fica em cartaz, maiores serão as chances de se construir uma cumplicidade do ator com a iluminação para o estabelecimento pleno do jogo cênico entre ambos. Por fim, pedimos que os participantes avaliem o desenvolvimento dessa aula destinada à Operação de Luz e suas implicações com o trabalho do ator. Tal avaliação foi registrada por Marinalva Moura no seu diário de bordo: Estou sentindo falta de usar textos para dialogar e fazer pequenas cenas a partir da iluminação. Como o fizemos nos dois primeiros dias da oficina. Também estamos explorando a luz, mas não estamos considerando a cena (MARINALVA MOURA, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 27/01/2009). Dessa forma, avaliamos que a falta de uma prática envolvendo o conteúdo de Operação de Luz e o trabalho do ator nos fez atingir parcialmente os objetivos propostos 118 para esse encontro, tendo como parâmetro de análise as questões geradoras: como se estabelece o jogo interativo entre os diferentes aspectos da iluminação cênica (criação, montagem e operação) e o trabalho do ator? Como a luz se torna um dos elementos de atuação do trabalho do ator? Com a problematização do conteúdo sobre Operação de Luz concluímos o capítulo estruturado em torno da Organização dos Conhecimentos. Ao analisarmos a distribuição das aulas dessa oficina, notamos que existe um desequilíbrio no que se refere aos momentos pedagógicos característicos da prática dialógica que adotamos nesta dissertação, cujo foco acabou se deslocando mais para a Organização dos Conhecimentos do que nos Estudos das Realidades e a Aplicação dos Conhecimentos. A justificativa encontra-se no fato de essa oficina de iluminação ser uma prática pedagógica de curta duração que tentou explorar, num reduzido período de tempo, muitos conteúdos que consideramos importantes para a formação dos diversos agentes cênicos. Ainda assim, a introdução de uma perspectiva dialógica, organizada por meio de momentos pedagógicos, pode ser considerada como uma abordagem diferenciada para o ensino de iluminação cênica, uma vez que esse ensino, como citamos anteriormente, é caracterizado pelo forte predomínio da informação em detrimento da formação. 119 TERCEIRO CAPÍTULO Faça-se a luz! 120 Conte-me e eu esqueço. Mostre-me e eu apenas lembro. Envolva-me e eu compreendo. Confúcio As palavras de Confúcio sintetizam a necessidade ontológica do homem de entender como se dão os mecanismos de apropriação dos conhecimentos e sua busca constante de encontrar melhores meios para aprimorar e incitar sua capacidade de aprendizagem. Saber como se processa esse fenômeno é extremamente importante para os educadores organizarem situações didáticas que estimulem o aprendizado dos educandos, a fim de se construir processos educativos mais eficientes. É inegável o papel primordial e o envolvimento ativo dos alunos no processo de ensino-aprendizagem, uma peça fundamental para a construção dos conhecimentos em um ambiente educativo. No entanto o educador, como mediador desse processo de ensino- aprendizagem, deve articular, na medida do possível, os conhecimentos construídos em sala de aula à realidade contextual dos alunos. O desafio tanto das práticas de ensino mais formais, que geralmente se realizam na escola, como as não-formais, que se desenvolvem em outros espaços da educação, está em interpretar e investigar a dialética existente entre o individual e o contextual no fenômeno da aprendizagem, integrando as compreensões pessoais aos vários elementos que influenciam o aprendizado, tornando-o dinâmico, multifacetado e único para cada um que o vivencia. Só se aprende quando se sabe interpretar, no seio do seu próprio sistema de pensamento, o conhecimento que pretendemos apropriar. Contudo é nas conexões entre o pessoal e o contextual que o aluno dá significado ao que aprende, compreendendo-o. Se não há aprendizagem sem a influência do contexto, também ela não existe sem a contribuição do que é característico de cada indivíduo. Nesse sentido, é fundamental que os alunos sejam envolvidos em atividades didáticas que os movam a fazer relações entre o que é dito, mostrado e problematizado em sala de aula e o contexto em que se instaura o processo de ensino-aprendizagem, a fim de assegurar uma melhor compreensão dos conteúdos estudados. Este capítulo é estruturado em torno da Aplicação dos Conhecimentos (AC) e traz a descrição, análise e discussão das atividades dos conteúdos 7 (Ângulos e posicionamentos 121 dos refletores) e 9 (Iluminação de uma cena), nas quais os participantes, considerando os conhecimentos construídos nos encontros anteriores, desenvolvem experimentos com luz. Tais experiências são importantes para investigarmos se os sujeitos do processo de ensino- aprendizagem conseguiram ampliar e/ou romper com as suas visões iniciais acerca da criação da iluminação e da sua utilização como elemento de linguagem na cena. 3.1 – Definição Angular e Posicionamentos dos Refletores (A.C) Esta aula, destinada a aprofundar o conteúdo sobre Definição Angular e Posicionamento dos Refletores, possui os seguintes objetivos: 1. Exercitar diversas possibilidades de ângulo e posicionamento dos refletores. 2. Perceber como distintos ângulos e posicionamentos dos refletores modificam a imagem dos assuntos iluminados. Podemos dizer que existe uma questão central na exploração desse conteúdo no que se refere ao trabalho do ator, já que é comum encontrarmos atores que não têm idéia de como serão suas aparências em um palco iluminado por refletores, nem tampouco são trabalhados ou ensaiados para se situarem no ponto ideal da luz. Um ator mal colocado na iluminação distorce a própria imagem a ser apresentada para o espectador, interferindo diretamente na fruição imagética da plateia. Sendo assim, é importante que o ator conheça as direções, os sentidos e os ângulos dos refletores, para facilitar o trabalho de orientação da luz, que é realizado por uma pessoa com olhar externo à cena, como o iluminador, o diretor ou qualquer outro agente cênico habilitado para essa função. Muitas vezes, a expressão: “sentir o brilho nas pálpebras” é utilizada para orientar o ator na correta colocação da luz, contudo o simples fato de sentir claridade nos olhos não garante que esteja totalmente iluminado pelo refletor (Figura 73), ou seja, torna-se necessário exercitar essa colocação nos ensaios técnicos e nos dias de apresentação. Consequentemente, a percepção de saber se está ou não no ponto ideal das luzes, como mencionamos na aula “Luz versus Iluminação” do capítulo 2, requer tempo e só é 122 aprimorada pelo ator ao vivenciar situações diferentes nos espetáculos de que participa ao longo da sua trajetória artística. Pensando nessa problemática, propomos um exercício prático em que os alunos possam iluminar um modelo, escolhido entre eles próprios, a partir de uma listagem pré- determinada de ângulos e posicionamentos dos refletores. Tal exercício, além de fazê-los aplicar os conhecimentos construídos nas aulas anteriores, também os estimula a perceber as diferentes luzes que surgem ao variar os ângulos e os posicionamentos dos refletores. Como complemento da atividade, solicitamos ainda um registro fotográfico do assunto iluminado, à medida que se modificam os ajustes dos refletores. É imprescindível que esse registro seja realizado sem flash, para que a câmera fotográfica capte a luz real que incide sobre o modelo, já que pretendemos realizar um estudo comparativo entre as fotografias, verificando as diferentes formas de iluminá-lo no exercício prático. Dessa forma, os alunos, ao vivenciarem a atividade, têm a chance de perceber, tanto in loco como por fotografias, as influências que a variação angular e de posição dos refletores determinam sobre a imagem do modelo. Para isso, pedimos previamente que os participantes da oficina tragam pelo menos duas câmeras fotográficas digitais para uso nesta aula. A seguir, apresentamos a listagem sugerida para a realização da atividade prática: Figura 73 - Colocação incorreta na luz. O ator sente luz nos olhos, mas sua testa está fora da luz. 123 Posicionamento do Refletor Angulação Frontal - iluminação realizada por um único refletor 70º 60º 45º 30º Frontal – iluminação realizada por dois refletores 70º 45º 30º Contraluz - iluminação realizada por um único refletor 70º 45º 30º Contraluz - iluminação realizada por dois refletores 70º 45º 30º A pino – iluminação realizada por um único refletor 90º Lateral direita e esquerda - iluminação realizada por um único refletor 0o Bilateral - iluminação realizada por dois refletores 0o Bilateral vinda de cima - iluminação realizada por dois refletores 70º 45º 30º Bilateral vinda de baixo - iluminação realizada por dois refletores 70º 45º 30º Ribalta – iluminação realizada por um único refletor 70º 45º 30º Quadro 10 – Listagem de ângulos. 124 Na listagem, optamos basicamente pelos ângulos 0o, 30º, 45º, 60º, 70º e 90º para realização dos experimentos com os refletores, por serem recorrentemente mais utilizados pela maioria dos iluminadores cênicos na elaboração dos seus desenhos de luzes. Cabe salientar, que esta lista não representa uma visão estanque, nem muito menos tem a pretensão de ser uma sistematização rígida sobre o conteúdo explorado, podendo ser modificada de acordo com as necessidades de cada processo educativo. No entanto é importante que ela exista para determinar metas a serem cumpridas e garantir a manutenção do foco dos participantes no exercício prático. Logo após a exposição da listagem, dividimos a turma em quatro subgrupos para o desenvolvimento da atividade, sendo essencial uma rotatividade para que cada participante experiencie todas as funções descritas abaixo: 1. Os montadores – responsáveis pela montagem e afinação dos refletores. 2. O operador de luz – responsável pelo “rackeamento” dos refletores e pela regulagem da intensidade das luzes na mesa de controle. 3. O modelo - o assunto a ser iluminado. 4. Os fotógrafos – responsáveis pelo registro fotográfico do modelo. Em seguida, inicia-se o exercício prático propriamente dito, que é dividido didaticamente em 3 etapas que se interpenetram: Montagem, Afinação e Registro Fotográfico. Na etapa de montagem, os Montadores, acompanhando a listagem descrita acima, definem primeiramente qual o tipo de refletores que querem utilizar na atividade, para depois montá-los em suas respectivas posições. Em seguida, o Operador de Luz efetua o “rackeamento” ao alocar as vias utilizadas para conectar os refletores nos canais de dimmer de sua escolha. Na etapa de afinação, o Operador de Luz aciona os refletores por meio dos potenciômetros da mesa de controle, enquanto os Montadores afinam as luzes sobre o Modelo, determinando os ângulos, as direções, os sentidos e as aberturas focais dos refletores. 125 Na terceira e última etapa, os Fotógrafos registram o ângulo experimentado no Modelo, após definirem, juntamente com o Operador de Luz, qual a intensidade de luz que querem fotografar. Na aula seguinte, transferimos todas as fotografias para um arquivo de computador com o intuito de projetar as imagens por meio de equipamento multimídia, dando-nos a possibilidade de comparar as diferentes luzes que incidem sobre o modelo. Ao mesmo tempo, também apresentamos em PowerPoint uma sistematização acerca do conteúdo explorado na aula, sobre a qual inserimos a maioria das fotografias produzidas pelo Grupo Estandarte de Teatro para realizar o desenvolvimento que faremos a seguir. 3.1.1 - Ângulos e Posições dos Refletores. Procuramos dar uma atenção especial à definição angular e ao posicionamento dos refletores de um projeto de luz. Ângulos e posições diferentes permitem modificar a luz e, por conseguinte, a imagem do que será revelado, destacado, transformado e selecionado no espetáculo cênico. Obviamente, quanto mais variado for o desenho das luzes em relação a essas duas variáveis, maiores serão os estímulos imagéticos que poderão ser proporcionados aos olhos do público. Basicamente, os refletores podem ser localizados na posição frontal, contra-luz, lateral e vertical. Apesar do número limitado de opções apresentadas ao iluminador para o posicionamento das fontes de luz, é de se lembrar que a variável de posição está atrelada diretamente a outras duas variantes da luz, direção e sentido, que, juntas, aumentam as possibilidades de configuração dos refletores no espaço tridimensional da cena. Em relação ao ângulo de incidência da luz, os refletores podem ser ajustados dentro de uma zona angular (Figura 74) que varia entre eixo horizontal (0o), que é paralelo ao palco, e o eixo vertical (90º), que é perpendicular a este. 126 É na interseção entre as variáveis de posicionamento, ângulo, direção e sentido dos refletores que o iluminador define a maioria da organização morfológica para seu desenho de luz. Nesse sentido, propomos aqui uma sistematização que concilie teoricamente as variáveis abordadas nessa aula, determinando como recorte teórico os conceitos de Foco, Luz Frontal, Contraluz, Luz Lateral e Luz de Ribalta. Cabe salientar que toda problematização apresentada abaixo é fruto das discussões que surgiram em sala de aula e traz somente alguns pontos fundamentais para o trabalho do ator no que diz respeito ao conhecimento acerca da variação angular e de posicionamento dos refletores, os quais julgamos importante aprofundar aqui. 3.1.1.1 – Foco. Segundo Camargo (2000), [...] a iluminação por focos concentradores, um recurso historicamente mais recente, é associado ao aparecimento da eletricidade e dos aparelhos com lente. Sua principal função é selecionar aquilo que deve ser visto. É um recurso expressivo que pode ser obtido por uma luz frontal, vertical, lateral ou contra- luz, dependendo do caso (CAMARGO, 2000, p.108). Os focos posicionados verticalmente numa angulação de 90º, de cima para baixo, evidenciam a testa, o nariz e parte superior das bochechas (malares); provocam muita É convencionado chamar de foco uma concentração de luz sobre determinada área do espaço, elemento cenográfico ou o corpo do ator, cujas funções são de revelar, destacar e/ou selecionar aquilo que deve ser visto no espetáculo. Figura 74 - Variação Angular. 127 sombra no rosto. Os olhos, por exemplo, desaparecem pela ação das sombras provocada pelas arcadas supraciliares (região acima dos olhos); achatam a imagem do ator. O foco a pino (Figura 75), como é costumeiramente designado no teatro, é utilizado em situações dramáticas em que não existe uma condição precípua de visualização do rosto, próprio para “criar imagens sobrenaturais, fúnebres, associadas à eternidade, à morte e a heróis e deuses” (Ibid, p.103). Os focos posicionados frontalmente entre 70º ou 60º no sentido de cima para baixo ainda provocam algumas sombras na parte inferior do rosto, exigindo que o ator incline levemente o queixo em direção à luz (Figura abaixo). Figura 75 - Foco a pino (90o). Na foto Thémis Suerda. Figura 76 - Ângulo de 60o Na foto Juliana Barbosa está inclinando levemente a cabeça em direção à luz. Foto Lenilton Teixeira Foto João Lins 128 Os focos posicionados frontalmente a 45º (Figura 77) no sentido de cima para baixo são perfeitos para iluminar o rosto do ator mesmo quando ele está com a cabeça baixa, por isso que nos teatros à italiana, pelo menos nos bem planejados, existe uma vara de plateia que nos dá a possibilidade de ajustar os refletores nessa inclinação. Os focos posicionados frontalmente a 30º (Figura 78) no sentido de cima para baixo também são ótimos para iluminar o rosto do ator, no entanto produzem no palco sombras alongadas que invadem, por vezes, elementos cenográficos, cicloramas, coxias e/ou rotundas. Figura 77 - Ângulo de 45o. Perceba que a sombra debaixo do queixo diminuiu em relação à imagem anterior. Na foto, Juliana Barbosa. Figura 78 - Ângulo de 30o. Note a sombra alongada produzida no piso. Na foto, Juliana Barbosa. Foto João Lins Foto João Lins 129 Dessa forma, podemos afirmar, por meio das discussões em torno das análises das imagens, que para se obter uma boa visibilidade do rosto do ator – em se tratando de focos frontais - é preciso ajustar os refletores em um ângulo favorável à valorização das suas expressões faciais, ao mesmo tempo em que deve existir uma preocupação para essa angulação não invadir - com luz ou sombras - elementos cenográficos, vestimentas cênicas ou estruturas do palco. Essa angulação favorável situa-se entre 45 e 70 graus. 3.1.1.2 - - Luz Frontal. Aqui nos ateremos a discutir os conceitos de Luz Cruzada e Luz Geral, sem adentrar especificamente nas questões relacionadas à angulação dos refletores, por já termos tratado no item anterior. Cruzar os refletores na posição frontal evita o efeito direto e chapado da luz sobre o ator, conseguindo-se efeitos dimensionais que evidenciam, além da sua altura e largura (bidimencionalidade), também a profundidade do seu corpo (tridimensionalidade). Além disso, as luzes frontais cruzadas “misturam-se com facilidade e não formam pontos nítidos de separação entre um facho e outro, como acontece com as luzes projetadas diretamente de frente” (Ibidem, p.99). Luz Cruzada – na luz frontal, geralmente, optamos por afinar os refletores de maneira cruzada com a intenção de obtermos um maior efeito dimensional sobre o ator, valorizando ao mesmo tempo os lados direito e esquerdo do seu corpo. Foto Uliana Fechine Foto Uliana Fechine Figura 80 - Frontal cruzada. Na foto, Lenilton Teixeira. Foto Ronaldo Costa Foto Ronaldo Costa Figura 79 - Efeito direto e chapado da luz frontal a 45o. Na foto, Lenilton Teixeira. 130 Ao analisarmos as duas imagens, notamos que o efeito direto (chapado) da luz frontal evidencia apenas duas dimensões (altura e largura) do rosto do ator, criando zonas de sombra debaixo do seu queixo e nas laterais do seu rosto. A frontal cruzada, em contrapartida, valoriza também as laterais do rosto do ator, evidenciando sua profundidade, o que torna claro que o cruzamento das luzes propõe um ganho dimensional em relação ao efeito anterior. Além disso, a luz cruzada frontal também minimiza a área sombreada debaixo do queixo, pois, ao efetuarmos o cruzamento dos refletores na afinação, relegamos a área de sombra a uma linha ao centro do pescoço (princípio da luz lateral de que falaremos adiante). É de se notar, também, que a volumetria do rosto modifica da primeira para a segunda foto, tendo-se um mais afilado em detrimento de outro um pouco mais arredondado. O maquiador, por exemplo, ao conhecer as influências dos diferentes ângulos e posicionamentos de luz sobre a anatomia do corpo do ator, pode propor intervenções diferentes, promovendo o clareamento em certas regiões e o sombreamento em outras a partir do contraste produzido entre luz e sombra. As grandes áreas a serem iluminadas devem ter um tratamento especial na realização da iluminação de um espetáculo. É comum designarmos erroneamente a luz frontal como luz geral, quando na verdade a segunda é resultado da soma da primeira com sua respectiva contraluz. Por exemplo, uma geral azul é o resultado da soma entre a luz frontal azul e a contraluz azul. A luz geral não deve possuir defeitos como áreas de sombra, sobreposição demasiada de luz num único ponto e revelar alguma parte indesejada do espaço cênico. Deve ser tratada como uma massa de luz única e uniforme. No entanto cabe salientar que: A luz geral não é só uma mistura orgânica, como são os efeitos difusos. É um conjunto que pode ser dividido e subdividido em partes menores, as quais podem ser separadas na mesa de controle e reutilizadas para fins seletivos (Ibidem, p. 100). Luz geral – A Geral é resultado da soma entre luz frontal e sua respectiva contraluz. 131 Na afinação da Luz Geral, é importante promover o cruzamento e a sobreposição das luzes. Além disso, é essencial manter uma relação simétrica na Luz Geral ao utilizar refletores do mesmo tipo, distribuindo-os de maneira equidistante uns dos outros, com a mesma abertura focal e o mesmo ângulo de inclinação. Em relação ao trabalho do ator a luz geral possibilita o deslocamento do ator para qualquer direção de maneira rápida e sem maiores preocupações, pois o palco todo se encontra iluminado. 3.1.1.3 – Contraluz. Na aula em que retratamos os Princípios Básicos de Iluminação (O. C), tecemos algumas considerações sobre o posicionamento em Contraluz dos refletores. Dessa forma, os participantes da oficina não encontraram maiores dificuldades em entender como é a imagem do ator sendo iluminado em Contraluz. A Contraluz utilizada nas Luzes Gerais é uma massa de luz única e uniforme que é posicionada em contraposição à Luz frontal, com o intuito de trazer maior dimensionalidade à cena, valorizando a parte de trás do ator. A Contraluz, por si só também pode ser utilizada de maneira isolada e seletiva quando queremos apresentar o ator em silhueta (Figura abaixo). É a luz colocada atrás do assunto iluminado, enfatizando os seus contornos e destacando-o do fundo do espaço. Figura 81 - Contraluz produzida por um único refletor posicionado a 70o. Na foto, Carminha Medeiros em silhueta. Foto Lenilton Teixeira 132 3.1.1.4 – Luz Lateral. A Luz Lateral é uma das únicas possibilidades apresentadas ao iluminador para a utilização dos refletores a 0o (Figuras 82, 83 e 84), a não ser quando a narrativa do espetáculo sugere a utilização de efeitos específicos para simular, por exemplo, um farol de carro ou a luz de um trem. As luzes laterais, em especial as anguladas entre 0 e 30 graus no sentido de baixo para cima, devem ser empregadas com cuidado, pois produzem um grande ofuscamento nos olhos do ator, promovendo, por vezes, o seu desequilíbrio. Tal sensação pode ser minimizada com o uso de filtros de cor e/ou com regulagem da intensidade dos refletores. Ao analisarmos as fotos acima, notamos que a iluminação lateral evidencia as reentrâncias da roupa da atriz pelas nuances existentes entre luz e sombra. O mesmo acontece com qualquer elemento de cena que tenha uma superfície texturada ou cheia de relevo que pode ser valorizado e destacado pela iluminação lateral. Somado a isso, podemos mencionar que a iluminação bilateral (Figura 84) produz uma linha característica É uma luz que incide sobre o ator pelos lados direito e/ou esquerdo do espaço cênico, delineando seu corpo e atribuindo beleza plástica aos seus movimentos laterais. Por essas razões, é muito utilizada nos espetáculos de dança. Figura 84 - Bilateral com incidência a 0o. Na foto, Juliana Barbosa. Figura 82 - Lateral esquerda com incidência a 0o. Na foto, Juliana Barbosa. Figura 83 - Lateral direita com incidência a 0o. Na foto, Juliana Barbosa. Foto Lenilton Teixeira Foto Lenilton Teixeira Foto Lenilton Teixeira 133 que passa ao centro do corpo da atriz e que pode ser notada facilmente no seu rosto e pescoço. Em relação à luz bilateral, também solicitamos aos participantes da oficina posicionarem os refletores em outros dois sentidos: de cima para baixo e de baixo para cima, com o objetivo de comparativamente fazê-los compreender as diferenças existentes entre essas duas perspectivas no tocante à construção e à apresentação da imagem do ator. Nas fotos, notamos nitidamente que as duas incidências de iluminação produzem diferentes imagens e propõem, por conseguinte, distintos usos expressivos na cena. A Luz Lateral no sentido de cima para baixo tem um resultado mais natural aos nossos olhos, por se tratar de uma incidência que o homem está acostumado a conviver no seu dia a dia, o que, de certa forma, estabelece uma compreensão mais cotidiana e convencional para seu uso. Em contrapartida, a lateral com incidência de baixo para cima num ângulo de 60º produz sombras acentuadas na região central do tórax da atriz, que estabelecem uma imagem mais dramática e até mesmo mais fantasmagórica. 3.1.1.5 – Luz de Ribalta. Figura 86 - Bilateral com ângulo de incidência de 30o, sentido de cima para baixo. Na foto, Dinha Vitor. É uma luz posicionada no chão no sentido de baixo para cima. Foto João Lins Foto João Lins Figura 85 - Bilateral com ângulo de incidência a 60o, sentido de baixo para cima. Na foto, Carminha Medeiros. 134 Nos palcos à Italiana, as Luzes de Ribalta são muito usadas na frente do palco para minimizar as sombras provenientes da luz frontal nos rostos dos atores. Isoladamente a Luz de Ribalta pode ser utilizada como uma iluminação de efeito e mudar a perspectiva natural das luzes vindas de cima, lembrando as incidências de fogueiras ou velas que emergem de baixo (Ibidem, p.167). Além disso, a Luz de Ribalta também pode ser aproveitada para produzir efeitos de projeção de sombras, pois, geralmente, ilumina o ator e o fundo do palco ao mesmo tempo. No ator, a Luz de Ribalta destaca “os cílios, as irregularidades da pele, o contorno dos olhos, o pescoço, o desenho dos lábios, dando sombras na extensão do nariz” (Ibidem, p.167). Essa aula, cujo foco pedagógico está na Aplicação dos Conhecimentos (A. C), tenta sintetizar muitos dos saberes construídos ao longo da oficina, movendo os alunos em um exercício prático de montagem e afinação de luz que visa aprofundar aspectos referentes à definição angular e posicionamento dos refletores. Tal exercício não se justifica por si mesmo, mas por fazer uma correlação com o trabalho do ator no que diz respeito a posicionamento de sua movimentação e gestualidade em relação à luz. Figura 87 - Luz de Ribalta. Ângulo de incidência de 30º. Na foto, Carminha Medeiros. Foto João Lins 135 Além disso, o estudo comparativo das imagens, tanto in loco como por fotografias, faz o ator compreender que sua aparência em um palco iluminado por refletores está sujeita a diversidade de ângulos e posicionamentos das fontes de luz. Essa compreensão coloca-o numa nova perspectiva de diálogo com a iluminação enquanto linguagem, possibilitando que o conhecimento construído nesse estudo possa ser encarado como mais uma possibilidade de matriz criativa. Isso se deve porque as comunicações das ideias, dos contextos e dos sentimentos embutidas na formação de cada imagem podem influenciar, caso se queira, no seu trabalho de expressão. Uma outra questão, subjacente ao exercício prático proposto para essa aula, refere- se à conscientização desenvolvida pelos atores em relação à problemática e aos desafios postos ao iluminador durante uma montagem de luz. Dessa forma, além de ação pedagógica, temos uma ação política que valoriza e respeita parcerias estabelecidas entre as especificidades profissionais existentes em um espetáculo cênico e os seus espaços de atuação. Nesse sentido, avaliamos que conseguimos atingir os objetivos propostos para esse encontro, tendo como parâmetros de análise as questões geradoras: Como desenvolver no ator a capacidade de perceber se está no ponto ideal da luz? O conhecimento das imagens produzidas pela ação das diferentes luzes sobre o corpo do ator pode ser utilizado como estímulo criativo? Como conscientizar o ator em relação ao tempo e às peculiaridades existentes numa montagem de luz? Para complementarmos a análise dessa aula, mostramos abaixo o depoimento de Thémis Suerda em seu diário de Bordo: O exercício no qual íamos experimentando as possibilidades da luz e fotografando para comparar depois foi muito bom. Parece que o conhecimento a respeito da luz está se embutindo na minha forma de olhar o mundo ao redor. Hoje acredito que o ator possa realmente desenvolver um diálogo com a luz e vice-versa (THÉMIS SUERDA, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 28/01/2009). Em se tratando do caráter processual da oficina, as questões geradoras apontadas acima servirão como pano de fundo para o desenvolvimento da aula que discutiremos a seguir, já que esta propõe um novo exercício prático que envolve, além da montagem, dois 136 outros momentos importantes para a definição de um plano de luz: a Concepção e a Operação de luz. 3.2 – A Iluminação de uma cena (A.C) Este encontro, organizado em torno do momento pedagógico Aplicação do Conhecimento (A. C), possui os seguintes objetivos: 1. Conceber, montar e operar a iluminação de uma cena. 2. Avaliar como o aluno aplica os conhecimentos desenvolvidos na oficina ao elaborar a iluminação de uma cena. Nesta aula, propomos um exercício prático, no qual os participantes da oficina, individualmente, devem construir a iluminação de uma cena. Tal atividade abre a possibilidade de cada aluno explorar os conhecimentos construídos ao longo da oficina, movendo-os numa prática que aglutina a maioria das etapas de desenvolvimento de um projeto de iluminação cênica. O primeiro passo da aula foi desenvolver um debate em torno da seguinte pergunta: a sequência Concepção, Montagem e Operação de Luz é a melhor a ser seguida para a construção de um projeto de iluminação? Na discussão, nitidamente percebemos que as experiências vividas pelos integrantes do Grupo Estandarte de Teatro, em diversos processos criativos, juntamente com os conhecimentos construídos ao longo da oficina, foram determinantes para avaliar que a sequência apresentada não encerrava todas as etapas necessárias para a elaboração de um projeto de iluminação cênica. Assim sendo, organizou-se uma nova sequenciação a partir das falas dos participantes da oficina: 137 1 – Etapa de Concepção: a) Contato com a obra; b) Pesquisa; c) Planejamento. 2 - Etapa de Montagem; a) Montagem propriamente dita; b) Rackeamento; c) Afinação. 3 - Etapa de Design; 4 - Etapa de Operação da Luz; 5 - Etapa de Amadurecimento do Projeto de Iluminação. Nesse sentido, as vozes dos sujeitos foram fundamentais para uma ruptura epistemológica que resultou na construção de um novo conhecimento que correspondesse às necessidades do coletivo naquele momento. As etapas acima descritas são partes de encadeamento criativo que possui um caráter processual no qual um passo repercute no passo seguinte até a concretização da iluminação cênica aos olhos do público, sendo difícil analisar suas partes em separado sem o entendimento do todo, pois o processo é delimitado por um contexto específico que direciona a criação de modo personalizado. Dessa forma, discutiremos sem um maior aprofundamento a sequência sistematizada nesta aula, pois sabemos que existem diferentes metodologias de trabalho que divergem da proposta construída aqui, não existindo a pretensão de ser uma sistematização definitiva. Na Etapa de Concepção, o iluminador entra em contato com a obra artística ao assistir aos primeiros ensaios, ler o texto e conversar com os demais agentes cênicos envolvidos no processo criativo, na tentativa de encontrar pistas e indicativos para o encaminhamento para seu trabalho de concepção. Esse contato inicial é importante para 138 entender qual o rumo que o espetáculo está seguindo até se definir um plano de ação, considerando-se as opções estéticas, políticas, poéticas e filosóficas que este estudo aponta. Logo após, ainda na etapa de concepção, o iluminador pesquisa as ideias que existem em torno do espetáculo em construção, aprofundando conhecimentos acerca dos universos estético e poético da obra, com o intuito de elaborar uma proposta preliminar de iluminação. Em seguida, começa a planejar sua criação a partir do espaço destinado à estreia do espetáculo e dos equipamentos de que ele necessita ou dispõe para a elaboração do seu mapa de luz. Com o mapa em mãos, já na etapa de montagem, o iluminador procura adequar ou conhecer tecnicamente o espaço, para depois montar todos os equipamentos de iluminação (refletores, rack’s, máquinas de fumaça, canhões seguidores, moving-lights, dentre outros) em suas respectivas posições. Posteriormente, efetua o rackeamento de cada refletor para, logo em seguida, ajustar seus ângulos de incidência e as suas posições ideais (afinação). Lembramos que na aula “Definição Angular e Posicionamento dos Refletores”, os alunos experienciaram um exercício prático que englobava todos os procedimentos utilizados na Etapa de Montagem descrita aqui, por isso não sentiram dificuldades para a concretização dessa etapa no exercício proposto para este encontro. Na Etapa de Design, o iluminador define as intensidades dos refletores que irá utilizar e agir na microestrutura ou macroestrutura41(Camargo, 2000) das cenas, registrando as porcentagens de cada efeito de luz numa planilha de programação que dever ser anexada ao seu projeto de iluminação. Logo em seguida, em ensaios técnicos, o iluminador anima os efeitos de luzes criados ao longo do tempo a partir dos movimentos das cenas por meio da Etapa de Operação de Luz. Por fim, a iluminação entra em um processo ininterrupto de amadurecimento em que novas possibilidades são agregadas ao projeto inicial. Tal Etapa de Amadurecimento só se finaliza quando o espetáculo sai definitivamente de cartaz. Após o debate inicial, pedimos para cada participante definir a cena a ser iluminada na atividade a partir de critérios pessoais, para que não houvesse nenhum tipo de interferência ou dirigismo nessa escolha. No entanto o grupo achou por bem desenvolver o 41 Ver a aula sobre “Operação de Luz”. 139 exercício coletivamente (Figura 88) e decidiu acatar a ideia da atriz Thémis Suerda para a escolha das cenas, como vemos no depoimento abaixo: Hoje discutimos as possibilidades que poderíamos propor para o experimento. Depois de muitas idas e vindas, me veio uma possibilidade que a princípio não acreditava que fosse aceita: pegaríamos trechos de todos os espetáculos do grupo e faríamos uma luz para cada uma destas cenas; no caso daquelas que tinham uma luz muito marcante, desconsideraríamos a que existia e proporíamos uma outra (THÉMIS SUERDA, atriz, depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 29/01/2009). As cenas selecionadas foram as seguintes: Espetáculo Cena A greve. Cena 1 – Na fábrica Não se Paga! Não se Paga! Cena 1- Diálogo de Margarida e Antônia Don Chicote e Mula Manca Cena do Rei e do Secretário. Oropa, França e Bahia: três dramas sem entremeios. Cena do Casarão. Bocas de Lobo. Cena do Mendigo. A Ilha Desconhecida. Cena do sonho. Uma Coisa que Não Tem Nome Cena do estupro. A Palavra é gesto Cena do Solo de Marinalva. Matrióchka. Cena do Enterro. Figura 88 - Debate inicial. Foto Ronaldo Costa Quadro 11 – Cenas selecionadas para a realização do exercício prático 140 Em seguida, o grupo começou a definir como seria a iluminação das cenas, determinando os equipamentos a serem utilizados em cada uma delas para a elaboração de um mapa de luz. Contudo notamos que os alunos tiveram muitas dificuldades para a conclusão da Etapa de Concepção, devido aos longos debates que a construção coletiva impôs ao processo de criação, nos quais se perdia, por vezes, o foco principal do exercício, como apontado por Marinalva Moura no seu diário de bordo: Perdemos muito tempo com tentativas de estudo dos textos e marcação de ações que esquecemos de pensar na iluminação. Quando decidimos fazer a iluminação, começamos da forma mais complicada, tentando colocar refletores aleatoriamente sem decidir suas funções nas cenas. Então pedimos ajuda para o Ronaldo (MARINALVA MOURA, atriz, depoimento escrito no diário de bordo no dia 29/01/2009). Cabe salientar que durante o exercício evitamos, no papel de mediador do processo, intervir ou dirigir no seu desenvolvimento, a não ser quando solicitado. Consequentemente, os educandos tiveram grande autonomia sobre o processo, tomando suas próprias decisões e solucionando os problemas apresentados no decorrer da prática. Neste caso específico, o grupo apresentou muitas dificuldades para a conclusão da Etapa de Concepção, muito pelo fato de a maioria dos participantes não se posicionarem no papel de iluminador, deixando essa tarefa para um grupo de apenas 3 pessoas, como descrito novamente por Marinalva Moura em seu diário de bordo: Achei muito complicado montar o mapa de luz. Senti que houve uma teimosia por parte de João Lins e Thémis para pedir ajuda para o Ronaldo. Já Carminha, Lenilton, Dinha e Juliana não estavam muito preocupados igualmente com a iluminação (MARINALVA MOURA, atriz, depoimento escrito no diário de bordo no dia 29/01/2009). Nesse caso, o exercício individual potencializa a aprendizagem na conclusão desta Etapa de Concepção, na medida em que o participante se vê obrigatoriamente na posição de iluminador. Apesar disso, não queremos descartar que o exercício não possa ser realizado em grupo, porém essa perspectiva implica um maior tempo de execução, pois as ideias precisam ser debatidas e compartilhadas entre todos os integrantes até se chegar a um denominador comum. Além disso, as construções coletivas, em sua maioria, determinam de modo bem específico os papéis dos agentes cênicos durante o processo de trabalho, podendo ser uma das justificativas para o problema apontado pela aluna no que se refere à dificuldade dos 141 alunos em assumir a posição de iluminador. Nesse caso específico, as ideias diferentes em relação ao encaminhamento do exercício foram determinantes para que o problema viesse à tona, pois nesse momento da atividade, a maioria dos alunos achava que a definição do roteiro das cenas era mais importante que a elaboração de suas iluminações, como apontado por Dinha Vitor em seu diário de bordo: Este primeiro momento foi difícil, porque escolher as cenas diante de várias propostas e ideias foi um problema. Surgiram alguns conflitos, uns tiverem que ceder para que o exercício caminhasse (DINHA VITOR, atriz, depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 29/01/2009). Ademais, é muito comum o aluno sentir dificuldades na Etapa de Concepção, pois o exercício de criação requer outros conhecimentos além dos eminentemente técnicos, necessitando de tempo e estudo para ser aprimorado. Outros dois motivos foram determinantes para o problema apontado por Marinalva. O primeiro foi a quantidade de cenas escolhidas, exigindo um maior tempo de planejamento para a procura dos trechos textuais e para relembrar antigas marcações, que poderiam ser minimizadas com a escolha de um número menor de cenas. O segundo foi a experimentação de algumas tipologias espaciais para o espaço cênico, como constatado por Thémis Suerda em seu diário de bordo: Eu fiquei muito feliz de ver todos tentando arranjar soluções, no entanto, perdemos muito tempo com os textos, pois a quantidade de cenas era grande. Depois descobrimos que o local que escolhemos para ser o palco atrapalhava a visão da plateia. No final, com a ajuda do Ronaldo, modificamos e fizemos uma proposta de mapa de luz (THÉMIS SUERDA, atriz, depoimento escrito em seu diário de bordo no dia 29/01/2009). Como o tempo dessa penúltima aula já tinha se esgotado, resolvemos auxiliar na conclusão desta Etapa de Concepção organizando as ideias já levantadas sobre as cenas em um mapa de luz, utilizando o programa Lablux42 para essa finalidade: 42 Lablux é um programa brasileiro de confecção de mapas de luz inteiramente gratuito, desenvolvido pelo Laboratório de Iluminação da Unicamp sob supervisão do iluminador Walmir Perez. 142 Figura 89 - Mapa de Luz construído pelo Grupo Estandarte de Teatro. Nele estão contidas todas as propostas de iluminação para as cenas escolhidas. O mapa foi confeccionado pelos alunos com minha colaboração. Em pontilhado, a demarcação dos praticáveis utilizados para delimitação do espaço cénico. 143 No dia seguinte, já na última aula, resolvemos discutir sobre as dificuldades apresentadas na Etapa de Concepção, “chegando ao consenso de que se pegássemos uma cena ou duas daquelas propostas no dia anterior aproveitaríamos muito mais” (THÉMIS SUERDA, atriz, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 30/01/2009). As cenas escolhidas foram a “Cena do mendigo” e a “Cena do Casarão”. Desta feita, informamos que o exercício poderia continuar sendo desenvolvido em grupo, com a ressalva de cada um deles obrigatoriamente exercitar a função de iluminador, enquanto que os outros seriam assistentes de montagem ou atores. Esse novo exercício foi organizado em torno das Etapas de Montagem e Operação da Luz, no qual o participante/iluminador, num primeiro momento, define a disposição dos refletores enquanto os demais montam, efetuam o seu rackeamento e os afinam; e num segundo momento, regulam as intensidades de cada refletor, definindo seus efeitos de luz, para depois animá-los com uma proposta de Operação de Luz. Antes de começar a montagem, relembramos alguns pontos discutidos nas aulas anteriores sobre segurança do trabalho, para evitarmos possíveis acidentes durante a execução do exercício, tais como: a) Só foram autorizados a subir na escada alunos devidamente calçados com tênis ou botas. b) O uso de luvas durante a montagem e afinação dos refletores foi indispensável. c) A escada esteve devidamente travada e sempre existia uma outra pessoa ao seu pé, a fim de estabilizá-la. d) Durante as subetapas de montagem e “rackeamento”, o sistema elétrico era desligado para evitar possíveis choques. e) As garras de sustentação dos refletores eram devidamente apertadas. f) Evitou-se subir os refletores com porta-gelatinas, porta-gobos, íris ou outros acessórios, evitando que eles caíssem sobre as cabeças das pessoas ao redor. 144 Outra questão importante a ser colocada é que o participante/iluminador na Etapa de Operação da Luz, ao discutir com o ator a sua proposta, também o orientava na correta colocação da luz (Figura abaixo). A maioria dos atores optou pela Cena do Mendigo, do espetáculo Bocas de Lobo, na qual o ator Lenilton Teixeira, ao som de uma música incidental, profere um prólogo. Lenilton, por sua vez, exercitou a função de iluminador na cena do Casarão do Oropa, França e Bahia: três dramas sem entremeios, na qual Carminha Medeiros recita um poema. A título de exemplo, analisaremos a iluminações desenvolvidas por Marinalva Moura e Lenilton Teixeira, pois foram as únicas cenas que obtiveram um registro fotográfico passível de análise. Cena do Mendigo (Iluminação Marinalva Moura) Figura 90 – Juliana Barbosa demonstrando como Lenilton Teixeira deveria se colocar na luz na Cena do Mendigo. Texto Mendigo – Que as santas musas me dêem abrigo, antes que algum infeliz, filho de advogado ou juiz, resolva atear fogo neste indefeso mendigo, que dorme na sarjeta por fatalidade e descrença. Que assiste pasmado a tantas imoralidades – corrupções, surrupios, matanças e atrocidades. Pois este mesmo mendigo pede licença para contar-lhes uma história, tecida de amor e tortura, de incompreensão e desprezo. Uma história de rua contada por andarilhos que ouviram da boca de pessoas que alegam ter presenciado os acontecimentos, há muito tempo atrás. Apesar de todas as imprecisões, incertezas e eventuais falhas de memória, nos esforçaremos para relatá-la da forma mais fiel possível. Sejam pois todos bem-vindos! Peço que por uma hora usemos a imaginação para tornar realidade o que este humilde palco apresenta. Fechem os olhos. E, ao abrirem novamente, que eles vislumbrem por um instante uma velha rua. Silêncio. A Tarde morre no beco. Eis que surgem duendes do sexo em meio ao sereno, em meio ao cheiro de bolor e urina que exala das casas centenárias transformadas em decadente cortiço. Prólogo do Espetáculo “Bocas de Lobo”. Dramaturgia de Maurício Arruda Mendonça Foto João Lins 145 No início dessa cena, a contraluz âmbar entrava lentamente ao som de uma música incidental, apresentando muito sutilmente a silhueta da personagem que se encontrava sentada num banco com a cabeça baixa. Tal opção produzia um clima de expectativa em torno da personagem, que só era quebrado quando a lateral branca iluminava lateralmente sua face. A luz lateral (ataque), uma vez estabelecida na cena, conduzia o olhar do ator em Figura 91 - Cena do Mendigo. Na foto, Lenilton Teixeira. Iluminação, Marinalva Moura. Figura 92 - Cena do Mendigo. Na foto, Lenilton Teixeira. Iluminação, Marinalva Moura Foto João Lins Foto João Lins 146 sua direção, servindo de deixa para começar o texto. No trecho “Fechem os olhos”, instaurava-se uma pequena pausa sobre a qual a iluminadora apagava todas as luzes. O blackout era quebrado, logo em seguida, com o trecho: “E, ao abrirem novamente, que eles vislumbrem por um instante uma velha rua”, o palco era iluminado lentamente por um foco a pino difuso, que visava revelar o espaço cênico, ou melhor, a “velha rua” para a plateia. A aluna conseguiu articular, com muita propriedade, aspectos técnicos e expressivos da luz à narrativa da cena, tais como: a contraluz âmbar retratava a luz amarelada de um poste; a expectativa criada em torno da apresentação da personagem é um recurso muito utilizado no teatro para o envolvimento do espectador; o blackout teve efeito narrativo, assim como a apresentação da velha rua. Além disso, percebemos um nítido diálogo entre os elementos cênicos, onde um elemento influenciava o outro para o estabelecimento da cena aos olhos do público, percebidos mais nitidamente por três ações: 1. A luz entrava de acordo com o andamento da música; 2. O texto foi utilizado como estímulo criativo para a operação de luz; 3. O ator só começava a falar o texto quando a luz estava totalmente estabelecida. A única crítica levantada sobre a cena foi que a aluna não propôs um desfecho para sua operação de luz, como apontado por ela mesma em seu diário de bordo: Acho que consegui fazer uma boa luz para a cena inicial do Espetáculo Bocas de Lobo, apesar de já estarmos influenciados pela luz feita por Aurélio de Simoni. Usei como base uma contraluz âmbar e uma luz frontal branca vindo em lateral. Propus a Operação da seguinte forma: junto com a música a contraluz ilumina gradativamente o ator sentado de lado em um banco. Quando a luz branca acender, o ator vira o rosto para a luz. Depois aparece uma luz a pino no centro do tablado para retratar um poste de rua. Ronaldo observou que faltou finalizar a operação. (MARINALVA MOURA, atriz, depoimento escrito no diário de bordo no dia 29/01/2009). 147 Cena do Casarão (Iluminação Lenilton Teixeira) Figura 93 – Cena do Casarão. Na foto, Carminha Medeiros. Iluminação, Lenilton Teixeira. Texto: Num sobrado arruinado, tristonho, mal assombrado, que dava pros fundos da terra. ("Pra ver marujos, Tirulilluliu! quando vão pra guerra...") E dava fundos pro mar. ("Pra ver marujos, Tiruliluliu! ao desembarcar"). ...Morava Manuel Furtado português apatacado, com Maria de Alencar! Maria era uma cafuza, cheia de grandes feitiços. Ah! os seus braços roliços! Ah! os seus peitos maciços! Faziam Manuel babar... A vida de Manuel, que louco alguém o dizia, era vigiar das janelas toda a noite e todo o dia, as naus que ao longe passavam, de "Oropa, França e Bahia"! — Me dá uma nau daquelas, lhe suplicava Maria. — Estás idiota, Maria. Essas naus foram vintena que eu herdei de minha tia! por todo o ouro do mundo eu jamais as trocaria! (...). Poema “Oropa, França e Bahia” de Ascenso Ferreira Foto Lenilton Teixeira 148 Nessa cena, a iluminação se resumia a um foco âmbar frontal com angulação de 60º, produzido por um refletor do tipo PC de 1000 watts e uma luz de plateia realizada com um refletor do tipo set-light, de 1000 watts. A cor âmbar estabelecia uma atmosfera nostálgica com ares de uma fotografia envelhecida. A luz do foco entrava muito lentamente, à medida que a atriz cantarolava repetidamente as seguintes frases “Eh! Marujo do mar, marinheiro sou. Eh! Somos mas não somos, marinheiro sou”. Quando a atriz começava a pronunciar o poema, o iluminador acendia a luz da plateia, envolvendo-a na narrativa, pois a intenção era propiciar o “olho no olho” entre atriz e público, a fim de se instituir um ambiente de contação de história. Com o fim do poema, a atriz começava a cantarolar novamente as mesmas frases iniciais ao sentar no chão, brincando com um barquinho de papel. A luz, por sua vez, ia apagando muito lentamente até o blackout, coincidindo com o silêncio da atriz. Novamente observamos uma preocupação do aluno em articular a construção da luz com os outros elementos cênicos, sobretudo o texto, uma vez que este possui um caráter narrativo, condizente com a proposta de contação de história proposta para a cena. Dessa forma, a iluminação da plateia foi fundamental para o envolvimento do espectador, tirando-o do anonimato produzido pelo escuro para torná-lo participante direto da narrativa da cena. Além disso, a focalização da atriz evitava uma distração do espectador, pois direcionava seu olhar para um único lugar do espaço. Ademais, a ação da cor-luz âmbar alterava a percepção das cores-pigmento do figurino proposto (a saia, por exemplo, era cinza – figura 93), reforçando a ideia de fotografia desbotada, envelhecida pelo tempo. Ao final de todos os experimentos, analisamos em grupo os limites e possibilidades das iluminações construídas para cada cena. Nesse momento, percebemos que todos os alunos, sem exceção, estavam engajados na discussão, utilizando nomenclaturas técnicas corretas, apontando fragilidades de concepção, propondo soluções para os possíveis problemas, avaliando a proposta da Operação da Luz e percebendo que as relações de diálogos entre os elementos cênicos foram importantes para as construções das iluminações propostas para as cenas. Dessa forma, avaliamos que foi possível atingir os objetivos propostos para esta aula, tendo como parâmetros as questões geradoras deste encontro: qual a importância de 149 desenvolver com o ator uma prática que envolve as etapas necessárias para a construção de um projeto de iluminação? Além dessa questão, a avaliação da aula também se deu pela voz do aluno: No nosso último encontro, fomos exercitar a iluminação de uma cena propriamente dita. Fizemos desde o plano de luz até sua operação. Sentir a cena com o olhar de um iluminador ajudou-me a perceber a luz de outra forma, não mais como um simples adereço de cena, mas como um elemento importante na narrativa. Hoje percebo, ao contrário de antes, a importância do iluminador no teatro. Apesar do pouco tempo que estivemos juntos, deu para aprender muitas coisas com leituras, teorias e a parte prática. Gostaria que tivesse continuidade (JOÃO LINS, ator, depoimento escrito no seu diário de bordo no dia 30/01/2009). O depoimento retrata claramente dois resultados que almejávamos obter não apenas com a aula, mas em toda a oficina: promover no ator uma mudança de olhar frente ao elemento luz e legitimar o iluminador como um artista importante para a construção do espetáculo. Além disso, a aula nos possibilitou verificar uma transformação na atitude frente à construção da iluminação na cena teatral, contribuindo para quebrar as últimas barreiras existentes entre o iluminador e o Grupo Estandarte de Teatro. 150 CONSIDERAÇÕES FINAIS Entre luzes e sombras. 151 Um processo de ensino que se pretende emancipatório, democrático e promotor de autonomia constitui um grande desafio pedagógico, construído nos limites e possibilidades que se organizam pelas lacunas existentes nas situações educacionais observadas para o ensino de iluminação cênica presente em nosso país. Tais lacunas é que justificam a discussão apresentada neste texto dissertativo acerca dos processos educacionais e da avaliação educacional em torno da iluminação cênica. Por pensarmos dessa maneira, é que acreditamos ser a educação o caminho para abertura de possibilidades nas configurações e nas condições sociais impostas às tecnologias cênicas brasileiras. Evidentemente que, para isso, é necessário aos diversos artistas da cena consistência teórica e vivências práticas que promovam análises fundamentadas na práxis artística, possibilitando a eles a adoção de encaminhamentos que primem pelo surgimento de processos educacionais mais significativos, amparados nos diálogos, por seus sentimentos, conhecimentos e responsabilidades na tomada de decisão em suas áreas de atuação pessoal e profissional. Entendemos que o percurso metodológico desta pesquisa-ação, sendo uma investigação sobre ensino em iluminação cênica, pôde colaborar para uma reflexão sobre práticas recorrentes do fazer cênico e de seu ensino, que, muitas vezes, desconsidera a importância da interdisciplinaridade para o desenvolvimento das suas múltiplas subáreas no que se refere à construção de novos espetáculos e/ou elaboração de práticas pedagógicas. Sendo assim, como defendemos ao longo deste texto, colocamos a importância do ensino de iluminação para outros agentes cênicos, na expectativa de contribuir tanto para uma mudança de olhar no que se refere à construção da luz na cena, como para a formação desses profissionais. Cabe salientar que propor uma investigação pedagógica sobre uma prática educativa em iluminação cênica não é uma tarefa fácil, pois além de enfrentarmos as dificuldades que o próprio objeto impõe ao processo de pesquisa, teremos que lidar com uma série de outros problemas da área, principalmente aqueles que se referem justamente à estruturação do ensino de iluminação em nosso país. Lembramos que não existe, no Brasil, no ensino formal, cursos específicos em iluminação cênica, obrigando o profissional a encontrar na atividade prática ou em oficinas uma alternativa viável de formação. Consequentemente, como mencionamos na introdução, esse ensino ainda é muito tecnicista, dando maior 152 importância à informação técnica e tecnológica do que ao desenvolvimento crítico do indivíduo. No entanto o mercado profissional das artes cênicas exige, cada vez mais, iluminadores capazes de romper com os limites desse contexto eminentemente técnico e tecnológico, dialogando com outros saberes importantes para a construção do espetáculo. Além disso, nota-se que muitos profissionais que trabalham indiretamente com o elemento luz, como atores e diretores, não dão tanta importância ao aprendizado de conteúdos específicos de iluminação cênica, criando-se uma lacuna de formação que os impede de colaborar de maneira consistente com o iluminador nos processos criativos. Nesse sentido, compreendemos que esta dissertação procurou trabalhar pedagogicamente alguns aspectos dessa problemática de formação ao propor uma oficina de iluminação para outros artistas da cena, estruturada metodologicamente numa perspectiva dialógica, na qual também estava presente a preocupação de organizar por meio de uma abordagem problematizadora outros conteúdos que não somente os eminentemente técnicos e tecnológicos. Nosso objetivo foi, desde o início, quebrar com o forte tecnicismo que assola o ensino de iluminação. Obviamente que a oficina aqui apresentada como recorte de investigação produziu questões e apresentou limitações que necessitam de discussão e aprofundamento. Todavia, entendemos que se constituiu um avanço significativo em nossa trajetória particular, tratando-se de algo que não pretendemos abandonar ou atribuir um caráter de finalização, pois ainda se constituirá em novos estudos na busca de avanços didático-pedagógicos para a área em questão. A título de ordenação, o primeiro ponto a se discutir está na utilização do jogo teatral para o ensino de iluminação cênica para atores e diretores. Tal possibilidade apresentou-se como uma alternativa viável para a problematização dos conteúdos ao visar propósitos de aprendizado, criando um ambiente de ludicidade e envolvimento no qual o ator está habituado a trabalhar. No entanto o jogo teatral nesta oficina foi utilizado em apenas duas aulas, sendo um desafio empregá-lo de modo eficaz para o ensino de conhecimentos eminentemente técnicos. Mesmo assim, consideramos que poderíamos tê-lo utilizado com eficácia nas aulas de “Definição Angular e Posicionamento dos Refletores” e “Operação de Luz”, como já tivemos oportunidade de trabalhar em oficinas que não foram abordadas no âmbito deste estudo. 153 Somado a isso, também consideramos que os encontros destinados à “Aplicação do Conhecimento” não ficaram no mesmo nível de estruturação e problematização das aulas cujos focos pedagógicos estavam nos “Estudos das Realidades” e “Organização do Conhecimento”, apontando para uma necessidade de se dar um maior espaço para os alunos aplicarem os conhecimentos construídos ao longo da oficina. Esse desequilíbrio observado entre os momentos pedagógicos ainda retrata a dificuldade de trabalhar a informação técnica em harmonia com a formação pedagógica, mesmo assim, avaliamos que as problematizações desencadeadas em torno dos exercícios práticos dessas aulas foram suficientemente relevantes para os objetivos que queríamos atingir com a pesquisa. Ademais, sentimos que em algumas situações de ensino a dialogicidade entre os sujeitos do processo tornou-se enfraquecida, apresentando um maior predomínio da voz do educador em relação à voz dos educandos. Esse aspecto, muito embora tenha sido ocasional, fez-nos notar que a construção de uma prática de ensino numa perspectiva dialógica requer também atenção do educador em reconhecer que os desequilíbrios na dialogicidade entre os sujeitos fazem parte do processo de construção pedagógica. Nesse momento, os conflitos representaram um papel tão importante nessa trama das relações quanto os momentos de êxito e entendimento, pois, assim, vão se tecendo as características dos comportamentos sociais desse mesmo grupo, obrigando-nos a uma práxis que nos leva a refletir sobre nossa própria prática. Encontrar um caminho para um entendimento através do diálogo entre os sujeitos sociais no contexto de ensino, superando as situações de conflito que nos impede de promover o equilíbrio necessário para a efetivação do trabalho coletivo, deve ser um caminho a ser compreendido e praticado pelos que se colocam como educadores. Assim, as conclusões aqui apresentadas constituem-se, acima de tudo, questões que propõem a problematização da realidade investigada, no constante ir e vir que caracteriza a construção do conhecimento, e estão abertas ao diálogo, à crítica e à discussão das convergências e divergências. Dessa forma, avaliamos que a investigação atingiu os objetivos propostos inicialmente para a pesquisa, na medida em que foi desenvolvida uma prática educativa direcionada para atores e diretores que contemplasse conhecimentos históricos, estéticos, semióticos, semiológicos, artísticos e técnicos, tecnológicos, 154 contribuindo para a melhoria dos diálogos entre o iluminador e os demais agentes cênicos do Grupo Estandarte de Teatro nos futuros espetáculos a serem construídos. É com essa visão que remetemos este estudo aos iluminadores, especialmente àqueles que trabalham com as artes cênicas, como fonte de reflexões, questionamentos e novos estudos. Nesse sentido, as limitações apresentadas neste trabalho podem ser preenchidas por outros estudos, considerando-se possibilidades de levantamento, sugestões e experiências que venham a enriquecer os dados aqui apresentados em outros contextos de ensino. Por exemplo: 1 - Como os alunos passaram a incorporar os conhecimentos adquiridos em iluminação nas suas apreciações críticas em relação a outros espetáculos externos à produção do Grupo? 2 - Considerando que alguns membros do Grupo Estandarte atuam como professores de teatro nas redes de ensino, em que medida eles passarão a introduzir os conteúdos de iluminação cênica em suas programações pedagógicas? 3 - Na perspectiva da análise do papel da iluminação cênica na construção do espetáculo, como avaliar a contribuição desses conhecimentos numa pedagogia do espectador? Acredita-se, no entanto, que a leitura crítica deste trabalho contribuirá para uma tomada de consciência em relação à importância da iluminação cênica na formação dos agentes envolvidos com a construção do espetáculo, levando a uma reflexão sobre a necessidade de se aperfeiçoar, cada vez mais, os processos de ensino e aprendizagem nesta área do conhecimento. A quebra paradigmática da iluminação cênica como uma área eminentemente técnica aponta para uma postura cooperativa para a construção dos espetáculos e no fortalecimento das práticas de ensino no que se refere às tecnologias cênicas brasileiras. Obviamente, que as indagações colocadas neste texto dissertativo devem ser fortalecidas por reflexões pessoais produzidas por este estudo e por outras investigações que venham a complementar e aprofundar as ideias aqui apresentadas, na tentativa de levantar respostas aos questionamentos aqui suscitados em torno do ensino de iluminação cênica desenvolvido em nosso país. 155 BIBLIOGRAFIA À luz de outras obras 156 APPIA, Adolphe in Estética Teatral – Textos de Platão a Brecht. Serviço de Educação Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1996. ______________. La Música y la puesta em Escena. La Obra de Arte Vivente. Série Teoría e práctica del teatro, no. 14. Publicaciones de la Asociación de Directores de Escena da España, 2000. 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Foi apresentada em diversos espaços alternativos, como creches, igrejas, conselhos comunitários, praças públicas, colégios estaduais e municipais, grêmios estudantis, conselhos de mães, dentre outros lugares, possuindo uma forte conotação política, pois no texto Vieira retrata a “Greve dos Queixadas”, que nada mais é do que uma alusão ao movimento sindical operário. Segundo Bezerra (2004), o trecho escolhido para estruturar a dramaturgia do espetáculo conta a história de uma greve acontecida em uma fábrica que narra todo o conflito de classes, os empenhos dos operários e as posturas destes na luta sindical. Em 1989, o Estandarte estreia o espetáculo inspirado no texto “Não se paga! Não se paga!” de Dario Fo, o segundo do Grupo, com direção de Vera Rocha44. Novamente a encenação tem uma forte conotação política, porém agora temperada pelo humor ácido e anarquista de Fo. O texto lança um olhar crítico sobre os problemas de uma sociedade perpassada pela luta de classes, na qual os menos favorecidos são os mais penalizados. No palco as personagens vivenciam de maneira bem humorada os dramas sociais, como: a luta pela sobrevivência, a miséria do trabalho fabril e os escrúpulos religiosos arraigados no subconsciente coletivo. “Não se paga! Não se Paga!” conta a história de duas mulheres que se veem involuntariamente envolvidas num saque a um supermercado. Diante da dificuldade financeira que as duas atravessam, não resistem à tentação do momento e levam para casa as mercadorias que podem carregar. O problema é que os maridos são operários sindicalistas que jamais podem admitir a ideia de ver suas esposas envolvidas em um ato anarquista como saquear um supermercado. 43 Carlos Nereu de Sousa, diretor teatral, geólogo e graduado em licenciatura curta no curso de Educação Artística – habilitação Artes Cênicas pela UFRN. 44 Vera Lourdes Pestana da Rocha, diretora teatral, graduada em Artes Cênicas - UNI Rio (1979), mestre em Educação pela UFRN (1993) e doutora em Educação pela UFRN (2000). 163 Antônia, a mais velha e esperta, convence a amiga Margarida a esconder dos maridos as mercadorias saqueadas do supermercado e tecem uma longa trama de mentiras e confusões para manter o segredo. A história se complica ainda mais com a chegada da polícia, que começa a revistar as casas dos bairros para descobrir os saqueadores e prendê- los. As amigas, acuadas, usam o subterfúgio de uma falsa gravidez para esconder as mercadorias sob a roupa e assim driblarem a fiscalização policial, no entanto a quantidade de mulheres grávidas na cidade aumenta assustadoramente, levando os policiais a desconfiar da tática utilizada pelas duas. Da mesma forma que o primeiro espetáculo do Grupo, “Não se Paga! Não se Paga!” foi idealizado para diversos espaços alternativos, sendo apresentado, prioritariamente, em conselhos comunitários, grupo de jovens ou de mães nos bairros da cidade de Natal/RN. Destacamos que: Essa montagem foi um marco para o grupo, pois com ela seus componentes iniciaram um trabalho de pesquisa e estudos que continuam até hoje. Com ela também participaram do I Encontro Brasileiro de Teatro de Grupos, em Ribeirão Preto, São Paulo. (JORNAL DIÁRIO DE NATAL, Caderno Muito, 22 de Abril de 2007, p.2). Em 1994, o Grupo iniciou um novo processo criativo, desta vez explorando o espaço da rua para montar o espetáculo “Don Chicote Mula Manca”, inspirado no texto “As Aventuras do Mui Nobre Cavaleiro Don Chicote Mula Manca e seu Fiel Companheiro Zé Chupança”, do paulista Oscar Von Pfuhl, tendo a direção de João Marcelino45. O texto questiona de forma leve e bem humorada o poder, a cobiça e a guerra. A história se passa num reino pobre, onde Don Chicote e Zé Chupança são designados pelo rei para procurarem ladrões de carneiros. É, então, nessa viagem, que os dois, montados em seus cavalos, Ilusão e Ilusinho, vão conhecer a verdadeira amizade, além de encontrarem bruxas, feiticeiras e outros seres inimigos no meio do caminho. O espetáculo “Don Chicote Mula Manca”, segundo Bezerra (2004), apresentou elementos que fazem referências às manifestações artísticas da cultura popular do Rio 45 João Marcelino, renomado diretor, ator, cenógrafo e figurinista do Rio Grande do Norte. Em seu currículo possui trabalhos importantes com Paulo Autran e com o Armazém Cia. de Teatro (RJ), dirigido por Paulo de Morais. 164 Grande do Norte, como os Caboclinhos e o Boi de Reis, que inspiram a construção do cenário, dos figurinos, das músicas e dos passos de dança dessa encenação. Apesar do “Don Chicote Mula Manca” direcionar-se para uma construção cênica mais lírica, a dimensão política que ideologicamente alicerça todos os trabalhos do grupo ganha um enfoque diferente, menos evidente que os dois últimos espetáculos, mas ainda questionador de muitos problemas sociais e existenciais. Em 1997, o Estandarte monta o espetáculo lúdico “Oropa, França e Bahia: Três Dramas sem Entremeios”, com direção de Lenilton Teixeira, o integrante mais antigo do Grupo. Dramaturgicamente foi estruturado em torno do poema/romance “Oropa, França e Bahia”, de Ascenso Ferreira, sobre o qual foram enxertados três dramas de domínio público ao longo da narrativa do texto base: Don Jorge e Juliana; Matei Maria e Madalena. Os textos possuem em comum um enredo que faz referência à relação entre um homem e uma mulher. O poema “Oropa, França e Bahia”, que estrutura a encenação, conta a história do português Manuel Furtado, que vivia com Maria de Alencar, uma cafuza. Por morar perto do mar, Manuel ficava vigiando da janela da sua casa as Naus que passavam ao longe em direção ao cais, tratando-as como uma herança que recebera de sua tia. Um certo dia, Maria pede para Manuel a menor das Naus (que assim parecia por estar distante da costa), entretanto seu pedido foi negado. Numa noite de luar, mais de 400 naus vindas do sul surgem na linha do horizonte. Maria, ao ver aquela imagem pela janela, num ato insano, joga-se ao mar e nada em busca da pequena nau que desejava, obrigando Manuel a também mergulhar atrás da mulher na tentativa de salvá-la de um possível afogamento, no entanto seus esforços foram em vão e os dois acabam morrendo. Na encenação “Oropa, França e Bahia: Três Dramas sem Entremeios” propriamente dita, a música ganha um destaque especial na narrativa, pois os três dramas de origem Ibérica retratam por meio de poemas musicados a bravura dos cavaleiros cristãos nas cruzadas para a terra santa. Tais dramas influenciaram a cultura popular brasileira, principalmente a nordestina, e eram transmitidos oralmente de geração em geração. Novamente, o universo popular direcionava a criação de um espetáculo do Grupo Estandarte de Teatro, fato também constatado na caracterização das personagens, pois os 165 figurinos e as maquiagens faziam alusão a elementos do folclore, possuindo certo rebuscamento nas cores e nos detalhes. Entre o ano de 1998 e 2000, o Estandarte volta a trabalhar com o diretor João Marcelino, mergulhando na construção de um espetáculo intitulado “Bocas de Lobo”, o primeiro idealizado para um palco à italiana. Como no primeiro capítulo desta dissertação delineamos o itinerário das encenações do Estandarte desde o ano 2000, recuperando experiências do Grupo com a Iluminação Cênica, vamos apenas mencionar, sem um maior detalhamento, os demais espetáculos construídos desde então. Em 2002, o Grupo Estandarte de Teatro monta a encenação “A Ilha desconhecida” dirigida por Lenilton Teixeira e baseada na obra de José Saramago, “O conto da Ilha Desconhecida”. Em 2005, constrói o espetáculo “Uma coisa que não tem nome”, uma livre adaptação do romance “Ensaio sobre a cegueira”, de José Saramago, dirigido por Lenilton Teixeira e Jefferson Fernandes. Em 2006, é convidado para participar do III Encontro Nacional de Artes e Educação Física, estreando o espetáculo “A Palavra é Gesto”, com direção de Petrucia Nóbrega. Por fim, em 2007, monta o espetáculo “Matrióchka”, inspirado no texto de Ítalo Calvino, “O cavaleiro inexistente”. 166 2 - Considerações históricas acerca do uso da luz enquanto linguagem no teatro. (Texto desenvolvido no percurso desta pesquisa para a aula 3 - A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica). Cada sociedade, à sua maneira e dispondo dos materiais existentes em seu tempo, encontrou modos de trabalhar a luz criativamente nos espetáculos. A utilização expressiva da luz sempre rondou o imaginário e o pensamento das pessoas envolvidas com as artes cênicas, e as contribuições que se deram por toda a trajetória do teatro ocidental foram decisivas para a construção dos conhecimentos e teorias que hoje alicerçam a profissão do iluminador cênico. Tomando como referência autores como APPIA (2000), ARREGUI (2005), BERTHOLD (2001), CAMARGO (2000), CRAIG (1996), KELLER (2005), ROUBINE (1998), RYNGAERT (1998), SÁNCHEZ (2002), WAGNER (1996), dentre outros, buscamos tecer algumas considerações sobre a utilização da luz como linguagem nas artes cênicas, numa tentativa de contextualizar como se deu a legitimação da iluminação cênica enquanto arte. A iluminação cênica, tal qual conhecemos hoje, é um ofício recente com um pouco mais de um século de existência. A inserção do iluminador como um dos autores cênicos só veio a se estabelecer, de fato, no fim do século XIX e começo do século XX, com a concretização tecnológica desencadeada pela eletricidade e a descoberta da lâmpada incandescente46 de Edson em 1879. Antes, a iluminação geralmente ficava sob a responsabilidade dos arquitetos e cenógrafos, sendo uma ocupação voltada, quase que integralmente, para a manutenção das fontes luminosas. Isso não significa dizer que a iluminação - mesmo tendo como condição primeira clarear as salas de espetáculos - era totalmente desconsiderada na construção cênica. Ao contrário disso, sempre foi motivo de reflexão, tornando-se, por muitas vezes, elemento significante, funcional e indispensável. 46 A lâmpada incandescente foi inventada em 1879 por Thomas Alva Edison (1847 - 1931). A invenção foi experimentada em 21 de outubro daquele ano e teve a duração de 45 horas. 167 Uma das primeiras utilizações expressivas da luz na cena deu-se sob a luz do sol do teatro grego, com a entrada de velas, archotes e tochas “usados para designar noite e escuridão. Esse artifício foi um dos primeiros indícios do que seria a iluminação séculos mais tarde: um meio de representação tão poderoso quanto outros elementos cênicos” (Camargo, 2000, p.14). Max Keller (2005), em um artigo publicado na revista Espaço Cenográfico News no. 22, refere-se à utilização da chama como recurso representativo na Inglaterra Elisabetana, onde os teatros também eram iluminados pela luz do sol. Segundo ele, “as tochas, velas e outras luzes eram usadas geralmente com propósitos dramáticos. Os diversos momentos do dia tinham que ser criados na mente do espectador; se o ator entrasse no palco com uma tocha, era noite” (KELLER, 2005, p.07). Quando o teatro passou a ser desenvolvido em recintos fechados, a partir da renascença, o homem viu-se obrigado, como diria Camargo (2000), a reinventar a luz. Diversos materiais e invenções foram utilizados à base de fogo para iluminar os ambientes até a descoberta da lâmpada elétrica. Apesar de todas as tentativas de aprimoramento das condições de visibilidade, a única fonte de energia de que se dispunha ainda era muito precária. Velas de cera, de sebo, lampiões de azeite e querosene, não representavam mais que um fraco substitutivo da luz solar, sem outra função a não ser clarear a sala internamente, de modo difuso. Produziam uma luminosidade instável, difícil de controlar, sem direcionamento, foco, extinção gradativa e outros recursos que se encontram hoje nos teatros (Camargo, 2000, p.16). Figura 94 - Ajudante acendendo as luzes de ribalta durante o espetáculo. (imagem retirada do site: www.stage-lighting-museum.com). 168 Ainda que alguns autores considerem que a primitiva iluminação à base de velas não tinha uma função dramática consciente, os contínuos ensaios para seu emprego em função das características da realização cênica (cilindros para graduar as intensidades, colorir a radiação, adequar a luz à cenografia, etc.) constituem uma reflexão constante, que passa pela superação e a renúncia de um esclarecimento dos quadros genérico e invariável. Nesse sentido, podemos encontrar exemplos claros do uso expressivo da luz à base de fogo nessas épocas, principalmente em vários registros no barroco italiano. Sebastião Serlio (1475-1554) arquiteto e cenógrafo, em seu “Trattato sopra lê scene” contido no segundo dos seus sete livros sobre arquitetura, além de defender a ocultação e o encobrimento das fontes luminosas, colocava-as atrás de vidros com líquidos coloridos (figura 95), numa tentativa de modificar a cor do ambiente. Essa nova perspectiva possibilitou a visualização da imagem cênica de outra forma, diferente da luminosidade amarelada da luz de velas, o que, de certa maneira, antecipa o uso da cor como recurso modificador do espaço e da percepção do espectador e, por conseguinte, do significado que essa luz pode sugerir à cena. O mesmo Serlio distinguia iluminação geral como luz decorativa que iluminava o palco; iluminação móvel, como efeitos que representavam o sol, as estrelas e os relâmpagos; e iluminação dramática, que mudava de acordo com a ação (KELLER, 2005). Nicola Sabbatini (1574-1654), em seu livro Pratica de fabricar scene e macchine ne’ teatri, descreve dispositivos que foram desenvolvidos para modificar a luminosidade da sala de espetáculos. Um deles “consistia em descer lentamente tubos de metal sobre as velas” (KELLER, 2005, p.06) (Figura 96). A mudança de intensidades da iluminação, ora Figura 95 - Utilização das fontes luminosas atrás de vidros com líquido colorido (imagem retirada do site: www.stage-lighting-museum.com). 169 mais clara, ora mais escura, possibilitava - e possibilita - diferentes leituras estéticas da cena. Leoni De’Sommi, dramaturgo e produtor (1527-1592) italiano, por exemplo: […] pensava que uma luz alegre era melhor para a comédia, enquanto um teatro escurecido era mais propício a colocar os espectadores em apropriado estado mental para as mudanças de humor da tragédia. Ao mesmo tempo, Ingegneri47 reparou que um palco parecia mais luminoso e despertava mais atenção se a platéia permanecesse no escuro. Por essa razão, as luzes foram apagadas no teatro Italiano antes do espetáculo começar. Essa separação entre o palco e a platéia (a divisão entre os dois espaços), que nós costumamos não valorizar, se tornou a chave do teatro Barroco (KELLER, 2005, p.06). O mesmo Sommi externava “à vontade de estipular preceitos gerais do uso da luz desde um ponto de vista puramente técnico, mas também de regência, conferindo a luminotécnica capacidade narrativa, como ingrediente dramatúrgico significante carregado de conotações simbólicas”.48 (MAZZANTI apud ARREGUI, 2005, p.07, tradução do autor). Fato que denota uma preocupação em ter-se a iluminação como “outro signo teatral” (ARREGUI, 2005), e não apenas como uma tecnologia desenvolvida para melhorar a visibilidade dos espetáculos. 47 Aqui ele se refere a Angelo Ingegneri (1550-1613), tratadista Italiano. Foi uma das primeiras pessoas a propor o escurecimento completo da plateia no séc. XVI. Lembremos que o teatro, naquela época, era um espaço de grandes encontros sociais, onde as pessoas iam para serem vistas, por isso Ingegneri encontrou vários obstáculos para concretização de sua ideia, que não foi levada a cabo de maneira radical. 48 “la voluntad por estipular preceptos generales de uso de la luz desde un punto de vista no sólo puramente técnico sino también ‘regístico’, confiriendo a la luminotecnia capacidad narrativa como ingrediente dramatúrgico significante cargado de connotaciones simbólicas”. Figura 96 - De: Nicola Sabbatini Pratica di fabricare scene e macchine ne’ teatri, Ravenna 1638, ao lado, uma réplica. (imagens retiradas do site: www.stage-lighting-museum.com). 170 Outro nome importante para ser citado é o de Giovanni Battista Aleotti (1546- 1636), que desenvolveu vários dispositivos interessantes não apenas para iluminação, mas também para estruturas que tinham por finalidade suportar os cenários e atores (cenários que entram sob trilhos, mecanismos para suspender atores e fazê-los voar, etc.). Aleotti aperfeiçoou minuciosamente os efeitos da iluminação à base de fogo de alguns efeitos especiais. Usava explosões com pólvora para representar relâmpagos e trovões; queimava peixe moído e estopa para expressar o fogo de inferno e apresentá-lo através de transparências do cenário; aperfeiçoou luzes móveis; dentre outras invenções (KELLER, 2005). Benito Bails (1730 - 1797), matemático espanhol, e os franceses Pierre Patte (1723- 1814) e Charles-Nicolas Cochin (1715-1790) escreveram livros sobre arquitetura teatral, contribuindo com importantes modificações nos teatros de seu tempo. Como elementos centrais nos seus estudos luminotécnicos estavam a segurança e visibilidade da cena, defendendo modificações para tornar a luz o mais verossímil possível com a natureza, fruto do desejo de representação mimética da realidade, que atingiu o seu ápice com o naturalismo finissecular do séc. XIX. Para Bails/Patte49, As luzes que se colocam nas varas entre os bastidores ocasionam incêndios e tendem a manchar os vestidos dos Cômicos. Poderíamos precaver esses dois danos com lanternas de reflexão, cuja luz é muita e pode dirigir-se aonde se queira. [...] Também com superfícies refletoras poderia equipar as ribaltas que existem à frente do tablado para iluminar o proscênio. Estas encandeiam os cômicos e os espectadores, enchem de fumaça a sala, enegrecem as pinturas e adornos, formando uma névoa entre os cômicos e os espectadores. Nada disso aconteceria colocando lanternas de reflexão em toda extensão do proscênio e nos anteparos do segundo, terceiro e quarto pisos dos teatros; a luz desses refletores iluminaria o alto e a extensão do proscênio, e os objetos teatrais não estariam iluminados de baixo para cima, que é uma coisa ridícula, mas de cima para baixo como ilumina o sol, o que por si mesmo é mais natural50 (BAILS apud ARREGUI, 2005, p.09, tradução nossa). 49 Na verdade existe uma controvérsia quanto a essas reflexões serem realmente de Bails ou um plágio dele das palavras de Pierre Patte em seu Essai surl'architecture théâtral,. O texto de Bails foi escrito em 1796, enquanto o de Patte em 1782, possuindo as mesmas questões e palavras. Sobre esse assunto ler “Luminotecnia teatral en la primera mitad del siglo XIX: de la herencia barroca a la introducción del gas” de Juan P. Arregui, 2005. 50 “Las luces que se ponen en los varales entre los bastidores ocasionan incendios, y suelen manchar los vestidos de los Cómicos. Estos dos daños podrian precaverse con faroles de reverbero, cuya luz es mucha y 171 As novas tecnologias das lanternas de reflexão (reverberos, figura 97 acima) permitiam iluminar uma região e escurecer outras, pois possuíam superfícies refletoras que direcionavam o facho luminoso, possibilitando a utilização das luminárias em pontos estratégicos das salas e diminuindo os riscos de incêndios. Somado a isso, conseguiam efeitos expressivos “mais complexos, como a imitação da saída do sol, um dos recursos, que, no plano da literatura dramática, só começam a difundir-se em obras escritas e representadas no fim dos anos oitenta (1780), e se notam sobretudo nos noventa (1790) e começo do século XIX”51(GLENDINNING apud ARREGUI, 2005, p.17, tradução nossa). Nesse sentido, o enriquecimento dos sistemas de representação dados pelos novos dispositivos indicou novos caminhos para a dramaturgia da época, modificando a maneira de se pensar a narrativa cênica. Com o advento da iluminação a gás, muitos problemas referentes à luminosidade das salas de espetáculos foram solucionados devido à maior estabilidade e intensidade dos fachos luminosos. Mas, sem sombra de dúvida, a maior contribuição que a tecnologia a gás puede dirigirse adonde sequiera [...] Tambien con reverberos podrian escusarse las candilejas que hay delante del tablado para alumbrar el proscenio. Estas incomodan, encandilan á los cómicos y á los espectadores de los palcos, llenan el corral de humo, enegrecen las pinturas y adornos, formando una como niebla entre los cómicos y los espectadores. Nada de esto sucederia poniendo reverberos en cada lado ancho del corral cerca del proscenio al extremo de los antepechos del segundo, tercero y quarto pisos de los palcos; la luz de estos reverberos alumbraria todo el alto y ancho del proscenio, y los objetos teatrales no estarian alumbrados”. desde abaxo arriba, que es cosa ridícula, sino desde arriba abaxo como alumbra el sol, lo que por lo mismo es mas natural”. 51 “o el conseguir efectos aun más complejos, como la imitación de la salida del sol», unos recursos que en el plano de la literatura dramática «sólo comienzan a difundirse enobras escritas o representadas a fines de los años ochenta (…) y se notan sobre todo en losnoventa y a principios del siglo XIX»”. Figura 97 - Lanternas de reflexão (Reverbero) – Século XVIII (imagem retirada do artigo “Luminotecnia teatral en la primera mitad del siglo XIX: de la herencia barroca a la introducción del gás” ARREGUI, 2005). 172 pôde trazer para o teatro, até então, foi seu controle centralizado. As válvulas de regulagem eram colocadas numa única sala, permitindo, por meio das tubulações o controle das luminárias a distância. “Com a luz a gás, foi possível que se criassem novas disposições de fontes de luz e inclusive efeitos individualizados para isolar cenas e criar zonas de atenção” (CAMARGO, 2000, p.18). Juan P. Arregui (2005), em seu artigo “Luminotecnia teatral en la primera mitad del siglo XIX: de la herencia barroca a la introducción del gas”, refere-se a essa ao controle à distância do gás: [...] a aptidão prática mais significativa do referido sistema de iluminação: a possibilidade de regular sua intensidade de maneira diferenciada, por zonas, mecanizando a manipulação da iluminação para obter distintos – e contrastantes – efeitos de acordo como fossem requeridos. Tal opção, como é óbvio, foi crucial na conquista da ilusão cênica; por sua parte, a sala respondia ao progresso de um lento, mas gradual – e convertido – processo de concentração da atenção dos espectadores sobre a representação dramática52 (p.35, tradução nossa). As instalações anteriores estavam tecnicamente impossibilitadas para graduações de intensidade da luz; uma vez acendidas as luminárias de azeite, por exemplo, só poderiam ser apagadas no final do espetáculo. O gás, ao contrário, com seu controle a distância, 52 “La aptitud práctica más significativa de dicho sistema de iluminación: la posibilidad de regular su intensidad de manera diferenciada, por zonas, mecanizando la manipulación del alumbrado para obtener distintos —y contrastantes— efectos según fueran requeridos. Sobre las tablas, como es obvio, tal opción resultaba fundamental en la consecución de la ilusión escénica; por su parte, en la sala, respondía a los progresos de un lento pero gradual —y controvertido proceso de concentración de la atención de los espectadores sobre la representación dramática”. Figura 98 - Válvulas de controle centralizado da iluminação a gás ( imagem retirado do site: www.hatii.arts.gla.ac.uk ). 173 permitia diminuir rapidamente a luz da plateia e deslocar a atenção do espectador para o palco, favorecendo seu envolvimento com a representação. Além disso, os meios oferecidos pela tecnologia a gás modificaram as condições de iluminação conhecidas até então, passando de uma estática iluminação (velas, lamparinas, lampiões e suas variantes), para uma dinâmica com variações significativas de intensidade e cor. A possibilidade de evolução diegética da luz durante a ação dramática dada pela iluminação a gás (ARREGUI, 2005) deslocaram o eixo de preocupação com a luz, passando do simples iluminante da sala e do cenário, para um importante elemento de significação e expressão do espetáculo. Com ela foi possível representar de modo mais convincente a natureza como almejava a corrente naturalista, mas também propor efeitos mais abstratos, como mais um símbolo - isolado ou articulado a representação - a ser lido pela plateia. Com a descoberta da eletricidade e da lâmpada elétrica, as dificuldades de se utilizar a luz expressivamente nos espetáculos foram solucionadas de maneira plena e viável, tornando-se, para muitos teóricos, um elemento revolucionário para as artes cênicas modernas. Todavia, mesmo considerando a profissão do iluminador como jovem, o arcabouço teórico do ofício foi construído durante séculos, encontrando, embora de forma incipiente, conhecimentos que hoje consideramos como estruturais dos sistemas significativos da luz na cena, tais como: intensidade, cor, ângulo, direção, natureza, forma e movimento. Figura 99 - O primeiro refletor teatral a gás (imagem retirada do www.stage-lighting-museum.com). 174 3 - Planos de aulas. Aula 1 Aula Teórica e Prática - Variáveis da luz. Objetivos da aula. 1) Avaliar os conhecimentos prévios dos alunos ou suas culturas prevalentes, em relação à iluminação cênica (ER), possibilitando-lhes expor suas ideias e conceitos sobre a luz e suas variáveis. 2) Possibilitar que os alunos percebam e compreendam a importância do conhecimento sobre as variáveis da luz para iluminação teatral. Questões Geradoras. 1) Como a luz afeta a percepção visual do objeto? 2) Como podemos classificar as diferentes características da luz a partir de relações entre a fonte e o assunto iluminado? Duração. 3 horas. Procedimentos Apresentação e discussão do programa da oficina e entrega dos diários de bordo para cada integrante do Grupo Estandarte de Teatro. 25 min Atividade Prática: formação de 2 grupos que irão iluminar pequenos objetos coloridos utilizando uma lanterna refletor ou um refletor micropar 20 min Apresentação dos resultados da atividade pelos dois grupos. 15 min Análise e discussão acerca dos resultados alcançados pelos grupos na atividade prática, registrando falas importantes dos alunos em quadro branco, a fim de se construir uma classificação preliminar sobre as variáveis da luz. 35 min Apresentação sistematizada das variáveis da luz em PowerPoint. 60 min Avaliação final. Logo após, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 25 min Materiais Necessários 1. Sala com isolamento lumínico com quadro branco/lousa e pincel/giz; 2. 2 pequenos objetos coloridos (1 verde ou 1 vermelho ou1 azul); 3. 2 lanternas ou 2 refletores do tipo micropar (uma para cada três ou quatro alunos); 4. 02 folhas de papel ofício branco e 2 pedaços de gelatina, a depender da cor do objeto escolhido; 5. Projetor Multimídia. 175 Aula 2. Aula Teórica e Prática - Espaço Cênico. Objetivos da aula. 1) Explorar e discutir noções sobre espaço cênico. 2) Fazer uma relação das diversas possibilidades de espaço cênico e suas influências para se definir planos de luz de um espetáculo teatral. Questões Geradoras 2) O espaço cênico é definidor da iluminação de um espetáculo? Duração. 3 horas. Procedimentos Atividade Prática: Formação de 3 grupos que irão desenvolver cenas improvisadas em diferentes espaços, tendo como mote de construção provérbios populares segundo procedimento utilizado por Maria Lúcia Puppo. 30 min Apresentação das cenas criadas pelos grupos. 20 min Análise das cenas. 30 min. Leitura e discussão do verbete “Espaço” do Dicionário de Teatro de Patrice Pavis. 20 min Apresentação em PowerPoint da aula “Panorama Histórico da Evolução dos Espaços Cênicos” do CD de Cenografia CENOTEC. 40 min Discussão sobre o conhecimento construído acerca do espaço cênico, fazendo-se uma co-relação com a iluminação cênica. 30 min Avaliação final. Logo após, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 10 min Leitura para a próxima aula: 1 – CARREIRA, André. Teatro e invasão: redefinindo a ordem da cidade in Espaço e Teatro: do edifício teatral à cidade como palco. Rio de Janeiro, editora 7letras, 2008. Leitura Complementar: 1 – CARDOSO, Ricardo José Brugger. Inter-relações entre espaço cênico e espaço urbano in Espaço e Teatro: do edifício teatral à cidade como palco. Rio de Janeiro, editora 7letras, 2008. 2 – ROUBINE, Jean-Jacques. A Linguagem da Encenação Teatral. 2º. Edição, Rio de Janeiro, editora Jorge Zahar, 1998. Páginas 81 a 118. 176 Aula 3. Aula Teórica e Prática – A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica. Objetivos da aula. 1) Perceber a iluminação em diferentes espaços sem utilizar a eletricidade. 2) Perceber como diferentes sociedades e culturas lidaram com a problemática da iluminação teatral antes do advento da luz elétrica. Questões Geradoras. 1) Como as pessoas lidaram com a problemática da iluminação teatral em diferentes épocas? 2) Como fizeram para controlar as variáveis da luz antes do uso da eletricidade? 3) Como as variáveis da luz se comportam em diferentes espaços? Duração. 3 horas. Procedimentos Atividade Prática 1: Dividir a turma em 3 grupos que irão propor cenas improvisadas a partir de um texto dramático. Tais cenas deverão ser desenvolvidas sob a luz do sol. 40 min Apresentação das cenas criadas para a atividade prática 1. 15 min Atividade Prática 2: as mesmas cenas criadas na atividade prática 1deverão ser apresentadas sob a luz de velas em um espaço fechado. 30 min Apresentação dos resultados alcançados com a atividade prática 2. 15 min Análise dos experimentos listando pontos importantes para a discussão em quadro branco. 30 min Leitura do texto “Luz e Visibilidade”. CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz. Sorocaba/SP, editora TCM-comunicação, 2000, páginas 11 a 23. 20 min Avaliação dos resultados alcançados nos dois exercícios práticos, fazendo relações com o texto explorado na aula. Nos 10 minutos finais, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 30 min Leitura Complementar: KELLER, Max. A História da Luz no Teatro in Espaço Cenográfico News No. 22. São Paulo, 2005. Para a próxima aula: Pedir para os alunos escreverem uma definição nos diários de bordo sobre os termos Luz, Iluminação e Tecnologia Teatral. 177 Aula 4. Aula Teórica - Luz x Iluminação e Tecnologia Teatral. Objetivos da aula. Compreender, explorar e estabelecer paralelos entre os conceitos de Luz, Iluminação e Tecnologia Teatral. Questões Geradoras 1) Quais as diferenças conceituais entre luz e iluminação? 2) Como o ator, ao dialogar com a luz, pode auxiliar na leitura estética da iluminação do espetáculo? 3) Quais relações possíveis entre os diferentes elementos que o ator cria e as variáveis da luz? 4) O que são tecnologias teatrais? Duração. 3 horas. Procedimentos Apresentação e discussão das definições escritas em seus diários de bordo sobre os termos Luz, Iluminação e Tecnologia Teatral, que deverão ser registradas em quadro branco. 40 min Leitura grupal dos textos: 1 - LOUIS, Murray. Dentro da Dança. Rio de Janeiro, editora Nova Fronteira, 1992. Páginas 143 -148. 2 - MOREIRA, José Henrique. Tecnologia Teatral. Rio de Janeiro. CBJJ. 2001. Site: http://www.cbtij.org.br/arquivo_aberto/artigos.htm, acesso 12/01/2009. 30 min Discussão dos textos. 40 min Apreciação estética e discussão de trechos do Show: Pink Floyd –Pulse. Direção David Mallet. Sony Music. Show Musical (240 minutos) son, color, 1994. O show é um excelente exemplo para se discutir aspectos referentes à sofisticação tecnológica usada para se iluminar espetáculos, mostrando uma espetacularidade distante, na grande maioria dos casos, das obras teatrais. Queremos desmistificar com os alunos que a tecnologia teatral está ligada tão somente às altas tecnologias (High-tech) desenvolvidas pelo homem na atualidade, mas sim, mostrar que faz parte de qualquer ramo de atividade, por mais simples e artesanal que seja. 40 min Avaliação final. Nos 10 minutos finais, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 30 min 178 Aula 5. Aula Teórica e Prática - Equipamentos de Iluminação Cênica. Objetivos da aula. 1) Familiarizar os alunos com as nomenclaturas, características técnicas e funções dos equipamentos de iluminação teatral mais utilizados no Brasil. 2) Estudar e apreender o correto manuseio dos equipamentos de iluminação cênica. 3) Explorar e identificar as particularidades de cada equipamento de iluminação cênica. Questões Geradoras Como estimular o ator a compreender o funcionamento dos equipamentos de iluminação cênica mais utilizados nos teatros brasileiros? Que ações pedagógicas devem se pensar para tornar atraente o aprendizado das nomenclaturas e das características técnico-funcionais dos diversos equipamentos de iluminação cênica para profissionais que não trabalham diretamente com eles? Duração. 3 horas. Procedimentos Exercício de prospecção no qual os alunos exploram os equipamentos de iluminação distribuídos pelo chão, verificando suas partes externas e internas. 30 min Escrever em quadro branco as principais diferenças e semelhanças dos equipamentos a partir das falas dos alunos. 10 min Apresentação em PowerPoint dos principais equipamentos utilizados na iluminação teatral no Brasil. À medida que discutimos teoricamente cada equipamento, mostramos seu funcionamento na prática. 110 min Avaliação final. Nos 10 minutos finais, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 30 min 179 Aula 6. Aula Teórica e Prática - Equipamentos de Iluminação Cênica (Continuação). Objetivos da aula. 1) Familiarizar os alunos com as nomenclaturas, características técnicas e funções dos equipamentos de iluminação teatral mais utilizados no Rio Grande do Norte e no Brasil. 2) Estudar e apreender o correto manuseio dos equipamentos de iluminação cênica. 3) Explorar e identificar as particularidades de cada equipamento de iluminação cênica. Questões Geradoras Como estimular o ator a compreender o funcionamento dos equipamentos de iluminação cênica mais utilizados nos teatros brasileiros? Que ações pedagógicas devem se pensar para tornar atraente o aprendizado das nomenclaturas e das características técnico-funcionais dos diversos equipamentos de iluminação cênica para profissionais que não trabalham diretamente com eles? Duração. 3 horas. Procedimentos Apresentação em PowerPoint de alguns aspectos relacionados à eletricidade básica, tais como: tensão elétrica, intensidade de corrente e potência elétrica. 20 min Explorar a rede elétrica do Teatro do DEART/UFRN, descobrindo quadros de distribuição elétrica, tomadas e principais dispositivos de proteção. 30 min Apresentação em PowerPoint dos principais equipamentos utilizados na iluminação teatral no Brasil que não foram abordados na última aula. À medida que discutimos teoricamente cada equipamento mostramos seu funcionamento na prática. 100 min Avaliação final. Nos 10 minutos finais, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 30 min 180 Aula 7. Aula Teórica e Prática - Princípios básicos de iluminação. Objetivo da aula. 1) Apresentar e discutir os princípios básicos de iluminação: ataque, compensação e contra-luz. 2) Estimular a apreciação crítica da luz de filmes e fotografias, tendo como parâmetros de análise os princípios básicos de iluminação: ataque, compensação e contra-luz. Questões Geradoras Como educar o olhar do aluno para a observação dos fenômenos luminosos na vida cotidiana? Como podemos exercitar a capacidade perceptiva dos alunos para enxergarem os efeitos de luz e suas influências nos assuntos iluminados? Duração. 3 horas. Procedimentos Apresentação em PowerPoint dos princípios básicos de iluminação: ataque, compensação e contra-luz. À medida que apresentamos teoricamente cada princípio básico, mostramos na prática os seus efeitos ao iluminar um objeto a partir da técnica das três posições (Iluminação em Y). 50 min Apreciação estética dos filmes. Ao longo dos filmes, selecionamos, trechos para discutir junto aos alunos aspectos referentes à suas fotografias (iluminações). 1 - Filme “Tango”. Direção de Carlos Saura. Europa Filmes. Bobina Cinematográfica (115 minutos) son, color, 1998. 2 - Filme “O Fantasma da Ópera”. Direção Joel Schumacher. Universal Pictures. Bobina Cinematográfica (141 minutos), son, color, 2004. Analisar os filmes nos ajuda a aprofundar o conteúdo problematizado na aula, além de trabalhar a percepção dos alunos frente ao reconhecimento das variáveis da luz e seu uso artístico. 100 min Avaliação final. Nos 10 minutos finais, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 30 min Leitura Complementar para a próxima aula: 1 – CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz. Sorocaba/SP, editora TCM-comunicação, 2000. Páginas 89 a 109. 2 – MOURA, Edgar Peixoto de. 50 Anos de Luz, Câmera e Ação. São Paulo, editora SENAC, 1999. Páginas 28-39. 181 Aula 8. Aula Teórica e prática – Definição Angular e Posicionamentos dos Refletores. Objetivo da aula. 1) Exercitar diversas possibilidades de ângulo e posicionamento dos refletores. 2) Perceber como distintos ângulos e posicionamentos dos refletores modificam a imagem dos assuntos iluminados. Questões Geradoras Como desenvolver no ator a capacidade de perceber se está no ponto ideal da luz? O conhecimento das imagens produzidas pela ação das diferentes luzes sobre o corpo do ator pode ser utilizado como estímulo criativo? Como conscientizar o ator em relação ao tempo e às peculiaridades existentes numa montagem de luz? Duração. 3 horas. Procedimentos Discussão dos textos indicados como leituras complementares sugeridas na aula anterior 60 min Atividade Prática – Iluminar um dos integrantes do grupo experimentando diversos ângulos e posicionamento de refletores. Cada possibilidade deve ser fotografada com máquina digital para posterior análise. 110 min Nos 10 minutos finais, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 10 min 182 Aula 9. Aula Teórica e prática – Definição Angular e Posicionamentos dos Refletores. Objetivo da aula. 1) Exercitar diversas possibilidades de ângulo e posicionamento dos refletores. 2) Perceber como distintos ângulos e posicionamentos dos refletores modificam a imagem dos assuntos iluminados. Questões Geradoras Como desenvolver no ator a capacidade de perceber se está no ponto ideal da luz? O conhecimento das imagens produzidas pela ação das diferentes luzes sobre o corpo do ator pode ser utilizado como estímulo criativo? Como conscientizar o ator no que diz respeito ao tempo e às peculiaridades existentes numa montagem de luz? Duração. 3 horas. Procedimentos Análise comparativa das fotos registradas pelos alunos utilizando um equipamento multimídia para projetá-las. 80 min Apresentação em PowerPoint de uma sistematização sobre definição angular e posicionamento dos refletores, confrontando com o registro fotográfico dos alunos 60 min Nos 20 minutos finais, pedir que os alunos registrem suas impressões no diário de bordo. Nos 10 minutos finais, pedimos para os alunos registrarem suas impressões no diário de bordo. 30 min Leitura para a próxima aula: 1 – CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz. Sorocaba/SP, editora TCM-comunicação, 2000. Páginas 149 a 154. 183 Aula 10. Aula Teórica – Operação de Luz. Objetivo da aula 1) Discutir sobre a importância da Operação de Luz no espetáculo teatral. 2) Analisar como o trabalho do ator pode entrar em consonância com a Operação de Luz de um espetáculo. Questões Geradoras 1) Como se estabelece o jogo interativo entre os diferentes aspectos da iluminação cênica (criação, montagem e operação) e o trabalho do ator? 2) Como a luz se torna um dos elementos de atuação do trabalho do ator? Duração. 3 horas. Procedimentos Discussão dos textos indicados como leituras complementares sugeridas na aula anterior 60 min Apreciação em vídeo do espetáculo “O Casamento”, do Grupo de Teatro Clowns de Shakespeare Natal/RN. 60 min Discussão sobre o vídeo. 60 min Leitura para a próxima aula: 2 – COSTA, Ronaldo Fernando. Diálogos com a Iluminação Teatral – Uma Proposta de Ensino. Monografia de Especialização em Ensino de Teatro, UFRN, 2004. Páginas 10-18. 184 Aula 11 e 12. Aula prática – Iluminação de uma cena. Objetivo da aula. 1) Conceber, montar e operar a luz de uma cena. 2) Avaliar como o aluno aplica os conhecimentos desenvolvidos na oficina ao elaborar a iluminação de uma cena. Questões Geradoras Qual a importância de desenvolver com o ator uma prática que envolve as etapas necessárias para a construção de um projeto de iluminação? Duração. 6 horas. Procedimentos Experimentos com luz. 240 min Apresentação dos resultados obtidos com a iluminação das cenas. 60 min Avaliação Final da Oficina 60 min 185 4 - Cronograma da Oficina Dia Hora Conteúdo Atividades 16/01/2009 09:00 – 12:00 Variáveis da luz. Para a próxima aula: Cada grupo trazer 2 (dois) pequenos textos de teatro. 19/01/2009 09:00 – 12:00 Espaço Cênico. Leitura para a próxima aula: 1 – CARREIRA, André. Teatro e invasão: redefinindo a ordem da cidade in Espaço e Teatro: do edifício teatral à cidade como palco. Rio de Janeiro, editora 7letras, 2008. Leitura Complementar: 1 – CARDOSO, Ricardo José Brugger. Inter-relações entre espaço cênico e espaço urbano in Espaço e Teatro: do edifício teatral à cidade como palco. Rio de Janeiro, editora 7letras, 2008. 2 – ROUBINE, Jean-Jacques. A Linguagem da Encenação Teatral. 2º. Edição, Rio de Janeiro, editora Jorge Zahar, 1998. Páginas 81 a 118. 19/01/2009 14:00-17:00 A problemática da iluminação cênica em espaços abertos e fechados antes da utilização da luz elétrica. Leitura em Sala de Aula: CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz. Sorocaba/SP, editora TCM-comunicação, 2000. Páginas 13 a 23. Leitura Complementar: KELLER, Max. A História da Luz no Teatro in Espaço Cenográfico News No. 22. São Paulo, 2005. Para a próxima aula: Sem nenhum tipo de pesquisa escrever sucintamente sobre: qual seu entendimento sobre os termos Luz, Iluminação e Tecnologia Teatral? 20/01/2009 09:00 – 12:00 Luz x Iluminação e Tecnologia Teatral. Leitura em Sala de Aula: 1 - LOUIS, Murray. Dentro da Dança. Rio de Janeiro, editora Nova Fronteira, 1992. Páginas 143 -148 2 - MOREIRA, José Henrique. Tecnologia Teatral. Site: http://www.cbtij.org.br/arquivo_aberto/artigos.htm, acesso 12/01/2009. Apreciação e discussão em sala de aula de Trechos: Show Pink Floyd –Pulse. Direção David Mallet. Sony Music. Show Musical (240 minutos), son, color, 1994. 20/01/2009 14:00 – 17:00 Equipamentos de Iluminação Cênica. XXX 22/01/2009 09:00 – 12:00 Equipamentos de Iluminação Cênica. XXX 22/01/2009 14:00 – 17:00 Princípios básicos de iluminação. Apreciação e Discussão em sala de aula de Trechos: Filme “Tango”. Direção de Carlos Saura. Europa Filmes. Bobina Cinematográfica (115 minutos) son, color, 1998. Filme “O Fantasma da Ópera”. Direção Joel Schumacher. Universal Pictures. Bobina Cinematográfica (141 minutos), son, color, 2004. Leitura Complementar para a próxima aula: 1 – CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz. Sorocaba/SP, editora TCM-comunicação, 2000. Páginas 89 a 109. 2 – MOURA, Edgar Peixoto de. 50 Anos de Luz, Câmera e Ação. São Paulo, editora SENAC, 1999. Páginas 28-39. 186 26/01/2009 09:00 – 12:00 Definição Angular e posicionamentos dos refletores. XXX 26/01/2009 14:00 – 17:00 Definição Angular e posicionamentos dos refletores. Leitura para a próxima aula: 1 – CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz. Sorocaba/SP, editora TCM-comunicação, 2000. Páginas 149 a 154. 27/01/2009 14:00 – 17:00 Operação de luz Leitura em Sala de Aula: CAMARGO, Roberto Gill. Função Estética da Luz. Sorocaba/SP, editora TCM-comunicação, 2000. Páginas 79 a 88. Leitura para a próxima aula: 1 – COSTA, Ronaldo Fernando. Diálogos com a Iluminação Teatral – Uma Proposta de Ensino. Monografia de Especialização em Ensino de Teatro, UFRN, 2004. Páginas 10-18. 28/01/2009 09:00 – 12:00 Iluminação de uma cena XXX 28/01/2009 14:00 – 17:00 Iluminação de uma cena XXX