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Direitos Reais

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1
MATERIAL DE APOIO 
DIREITO CIVIL 
DIREITOS REAIS 
 
 
Apostila 01 
Prof.: Pablo Stolze Gagliano 
 
 
1. Introdução 
 
Os Direitos Reais ou Direito das Coisas, enquanto ramo do Direito Civil, 
traduzem o conjunto de normas e princípios reguladores das relações 
jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem, 
segundo uma finalidade social.1 
 
Sob outra perspectiva, com fundamento na doutrina do professor 
ARRUDA ALVIM, poderíamos enumerar as seguintes características dos 
direitos reais, para distingui-los dos direitos de natureza pessoal2: 
 
a) legalidade ou tipicidade – os direitos reais somente existem 
se a respectiva figura estiver prevista em lei (art. 1225, CC-
02 e arts. 524 e 674, CC-16); 
b) taxatividade – a enumeração legal dos direitos reais é 
taxativa, ou seja, não admite ampliação pela simples 
vontade das partes; 
c) publicidade – primordialmente para os bens imóveis, por se 
submeterem a um sistema formal de registro, que lhes 
imprime esta característica; 
 
1 Sobre a introdução à matéria e temas correlatos, vale a pena a leitura do excelente livro 
Direito das Coisas – vol. 4, FLÁVIO TARTUCE e JOSÉ SIMÃO, Ed. Método. Outra excelente e 
atualizada obra que também recomendamos é a de CRISTIANO CHAVES e NELSON 
ROSENWALD, Direitos Reais, pela Ed. Lumen Juris. 
 
2 ALVIM, Arruda. Confronto entre Situação de Direito Real e de Direito Obrigacional. 
Prevalência da Primeira, Prévia e Legitimamente Constituída – Salvo Lei Expressa em 
Contrário. Parecer publicado na Revista de Direito Privado, vol. 1, janeiro/março de 2000. 
São Paulo: RT, 2000, págs. 103/106. 
 2
d) eficácia erga omnes – os direitos reais são oponíveis a todas 
as pessoas, indistintamente. Ressalte-se, outrossim, que 
esta eficácia erga omnes deve ser entendida com ressalva, 
apenas no aspecto de sua oponibilidade, uma vez que o 
exercício do direito real – até mesmo o de propriedade, mais 
abrangente de todos – deverá ser sempre condicionado 
(relativizado) pela ordem jurídica positiva e pelo interesse 
social, uma vez que não vivemos mais a era da ditadura dos 
direitos3; 
e) inerência ou aderência –o direito real adere à coisa, 
acompanhado-a em todas as suas mutações. Esta 
característica é nítida nos direitos reais em garantia 
(penhor, anticrese, hipoteca), uma vez que o credor 
(pignoratício, anticrético, hipotecário), gozando de um 
direito real vinculado (aderido) à coisa, prefere outros 
credores desprovidos desta prerrogativa; 
f) seqüela – como conseqüência da característica anterior, o 
titular de um direito real poderá perseguir a coisa afetada, 
para buscá-la onde se encontre, e em mãos de quem quer 
que seja. É aspecto privativo dos direitos reais, não tendo o 
direito de seqüela o titular de direitos pessoais ou 
obrigacionais; 
 
 
 
2. Posse 
 
 Teorias Fundamentais da Posse 
 
Savigny – Sua teoria é simples. A posse consiste no poder exercido sobre 
determinada coisa, com a intenção, o propósito, de tê-la para si. Seu 
conceito pode ser decomposto em dois elementos: animus (a intenção de 
 
3 Nesse sentido, já advertia DUGUIT: “A propriedade não é mais o direito subjetivo do 
proprietário; é a função social do detentor da riqueza”. (DUGUIT, Leon. Las 
Transformaciones Generales del Derecho Privado. Madri: Ed. Posada, 1931, pág. 37). 
 3
domínio, a vontade de ter a coisa como sua) e corpus (o poder, o contato 
direito sobre a coisa, a apreensão física da “res”). Por ser carregada de 
subjetivismo, esta teoria foi duramente criticada por Ihering. Ademais, não 
explicava bem a posse indireta, eis que a noção de “corpus” não estaria 
nítida. A despeito de suas falhas, indiscutivelmente, esta teoria influenciou- 
e influencia – inúmeros sistemas no mundo. 
 
Ihering – Seu pensamento é um pouco diferente. A posse não precisaria 
ser decomposta em dois elementos, pois o corpus não seria requisito 
independente. Seria um elemento implícito. Posse é, simplesmente, em 
uma análise objetiva, a exteriorização da propriedade. Em outras palavras, 
possuidor é a pessoa que exerce poderes de proprietário, imprimindo 
destinação econômica à coisa. Por considerar irrelevante a prova do animus 
– intenção de ter a coisa como sua -, esta teoria conseguiu explicar, de 
maneira bem mais satisfatória, a posse indireta. 
 
Segundo a professora Mariana Santiago, países que sofreram influência do 
direito romano, como França, Portugal, Itália, Espanha, Argentina seguiram 
a teoria subjetiva de Savigny. Já países como Alemanha, Suíça, China, 
México e Peru optaram pela teoria objetiva de Ihering (“Teoria Subjetiva da 
Posse”, a fonte é o excelente site: www.jus.com.br). 
 
O Código Civil Brasileiro, ao regular a posse, em seu art. 1196, optou, em 
nosso sentir, pela teoria objetiva (constitucionalmente reconstruída 
com base no princípio da função social), mas, em diversos dispositivos, 
deixa-se influenciar pela corrente saviniana, a exemplo da disciplina da 
usucapião (vide, v.g., no art. 1238, a referência inequívoca feita ao animus: 
“possuir como seu”). 
 
Kohler – A posse seria um instituto social, admitida para garantir a paz 
social (tb. referida por Beviláqua, in “Direito da Coisas”). Trata-se de teoria 
sem a importância das anteriores. Em nosso sentir, identifica-se com a 
própria finalidade do direito que é, exatamente, a garantia de pacificação 
social. 
 
 4
Questões Especiais de Concurso: 
 
1. O que é o “fâmulo da posse”? 
Trata-se do mero detentor da coisa, aquele que conserva a posse em nome 
de outrem (com mero animus detinendi), a exemplo do motorista particular 
ou do bibliotecário (art. 1198). 
Há, vale observar, entendimento no STJ, no sentido de que a ocupação em 
área pública traduz mera detenção: 
 
MANUTENÇÃO DE POSSE. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA, ADMINISTRADA 
PELA “TERRACAP – COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA”. 
INADMISSIBILIDADE DA PROTEÇÃO POSSESSÓRIA. 
– A ocupação de bem público não passa de simples detenção, caso em que 
se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão 
público. 
– Não induzem posse os atos de mera tolerância (art. 497 do Código 
Civil/1916). Precedentes do STJ. 
Recurso especial conhecido e provido. 
(REsp 489.732/DF, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, 
julgado em 05.05.2005, DJ 13.06.2005 p. 310) 
 
Analisando a detenção, CRISTIANO CHAVES e NELSON ROSENVALD, em 
bela obra, observam: 
 
“Perlustrando essa trilha, nota-se, então, que o capataz de uma fazenda, 
como servidor da posse que é, não concede destinação econômica à coisa”.4 
 
2. O que é “constituto possessório”? 
Trata-se da operação jurídica que altera a titularidade na posse, de maneira 
que, aquele que possuía em seu próprio nome, passa a possuir em nome de 
outrem (Ex.: eu vendo a minha casa a Fredie, e continuo possuindo-a, 
como simples locatário). Contrariamente, na traditio brevi manu, aquele 
que possuía em nome alheio, passa a possuir em nome próprio (caso do 
locatário, que adquire a propriedade da coisa locada). 
 
4 Direitos Reais, 6ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, pág. 75. 
 5
 
3. O que é “auto-tutela da posse”? 
Trata-se de meio legítimo de auto-defesa, exercido segundo o princípio da 
proporcionalidade, operando-se em duas situações: legítima defesa e 
desforço incontinenti. Tais atos de defesa devem ser moderados, e 
mediante o uso de meios necessários. A sua disciplina é feita no art. 1210, 
parágrafo primeiro do Código Civil.
4. O que é “interversão da posse”? 
Tal expressão traduz a transformação ou a inversão no título a posse, como 
se dá na hipótese de o possuidor precário (titular de uma posse “de favor”) 
passar a atuar na qualidade de legítimo proprietário. 
Confira-se, a respeito, o enunciado 237, da III Jornada: 
 
237 – Art. 1.203: É cabível a modificação do título da posse – interversio 
possessionis – na hipótese em que o até então possuidor direto demonstrar 
ato exterior e inequívoco de oposição ao antigo possuidor indireto, tendo 
por efeito a caracterização do animus domini. 
 
5. O que é “patrimônio de afetação”? 
 
Segundo Hércules Aghiarian, “Este novo sistema de direito real de garantia 
oferece oportunidade ao incorporador para destacar de seu patrimônio, ou 
de terceiros parceiros, um conjunto de bens que será reconhecido como 
patrimônio autônomo. Constituído pelos recursos obtidos com a 
comercialização das futuras unidades, pelas benfeitorias a serem agregadas 
a suas receitas, ou mesmo o próprio imóvel sobre o qual venha a ser 
edificada a incorporação. Este patrimônio constituído responderá, quando 
necessário, por quebras e outras indenizações surgentes por culpa do 
incorporador, em favor dos referidos promitentes-compradores, ficando 
imune, aliás, às responsabilidades pessoais daquele, como se verá” (fonte: 
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6408). 
 
 6
Consagrado na Lei nº 10.931/04, o patrimônio de afetação visa a imprimir 
maior segurança jurídica nas relações travadas no âmbito do mercado 
imobiliário, especialmente em favor do consumidor. 
 
Neste sentido, informa o site Precisão Consultoria: 
 
“Esta medida se torna relevante para evitar o que o mercado apelidou de 
‘efeito bicicleta’ ou ‘pedalada’, que significa a situação das empresas em 
dificuldade econômica que desviam recursos de um novo empreendimento 
para um anterior e assim sucessivamente, formando um ciclo vicioso que 
tantos prejuízos já causou no passado, ainda vivos na memória recente do 
país. Com a nova regra, todas as dívidas, de natureza tributária, trabalhista 
e junto a instituições financeiras, ficam restritas ao empreendimento em 
construção, não tendo qualquer relação com outros compromissos e dívidas 
assumidas pela empresa. Dessa forma, na hipótese de ocorrer falência da 
empresa construtora/incorporadora, os compradores poderão dar 
continuidade à obra, contratando outra empresa no lugar da falida, 
configurando o objetivo de garantir ao consumidor a entrega de imóvel 
comprado na planta” (fonte: 
http://www.precisao.eng.br/fmnresp/afeta.htm ). 
 
 Principais Classificações 
 
A) Posse Direta e Posse Indireta (art. 1197); 
B) Posse Justa e Posse Injusta (art. 1200); 
C) Posse de Boa-Fé e Posse de Má-Fé (arts. 1201 e 1202); 
D) Posse Nova e Posse Velha;5 
 
 Quem pode Adquirir a Posse (art. 1205) 
 
 Modos de Perda da Posse (art. 1223) 
 
5 O CC-02 não repetiu os arts. 507 e 508 do CC anterior, que diferenciavam posse nova e 
velha, para efeito de pedido de liminar. Entretanto, entende-se que, nesse ponto, permanece 
em vigor o art. 924 do CPC. Lembramos que aspectos processuais, especialmente ações 
possessórias, integram outras grades do LFG, não constando do conteúdo do presente Curso 
Intensivo 1. 
 7
 
 Principais Efeitos da Posse 
 
A) Percepção dos Frutos (arts. 1214, 1215, 1216) 
 
Vale lembrar, quanto aos produtos, que duas correntes de pensamento se 
desenvolveram na doutrina: a primeira, seguindo interpretação mais literal, 
sustenta que pertencem sempre ao proprietário, na forma do art. 1232; já 
a segunda, entende que se pode aplicar, por analogia, a disciplina especial 
da percepção dos frutos do CC. Seguimos esta última linha de entendimento 
que, em nosso sentir, homenageia os princípios da boa-fé e da função sócia. 
 
OBS.: 
Vale recordar... 
Conforme vimos nas aulas de Teoria Geral, frutos são utilidades 
renováveis, cuja percepção não diminui a substância da coisa principal 
(exemplo: laranja, café); já os produtos são utilidades que não se 
renovam, de maneira que a sua percepção diminui a substância da coisa 
principal (pedras extraídas de uma pedreira).6 
 
B) Responsabilidade pela Perda ou Deterioração da Coisa (arts. 
1217 e 1218) 
 
C) Indenização pelas Benfeitorias Realizadas e Direito de 
Retenção (arts. 1219 e 1220); 
 
D) Proteção Possessória;7 
 
 
3. Direito Real na Coisa Própria – Propriedade 
 
 Conceito. 
 
6 Analisamos este tema, em co-autoria com Rodolfo Pamplona Filho, em nosso volume I – 
Parte Geral, do Novo Curso de Direito Civil, no capítulo “Bens Jurídicos”, Ed. Saraiva. 
7 Tema desenvolvido em outra cadeira no curso LFG, conforme já mencionamos acima. 
 8
 
Trata-se de um direito real complexo, definido no art. 1228 do CC, e 
compreensivo das faculdades reais de usar, gozar/fruir, dispor e reivindicar 
a coisa¸ segundo a sua função social. 
 
Segundo Gustavo Tepedino, baseando-se em Perlingieri, a função social da 
propriedade constitui o título justificativo, a causa de atribuição dos 
poderes do seu titular, de maneira que: 
 
 “a propriedade, portanto, não seria mais aquela atribuição de poder 
tendencialmente plena, cujos confins são definidos externamente, ou, de 
qualquer modo, em caráter predominantemente negativo, de tal modo que, 
até uma certa demarcação, o proprietário teria espaço livre para as suas 
atividades e para a emanação de sua senhoria sobre o bem. A determinação 
do conteúdo da propriedade, ao contrário, dependerá de centros de 
interesses extra-proprietários, os quais vão ser regulados no âmbito da 
relação jurídica de propriedade” (Temas Atuais de Direito Civil, Contornos 
Constitucionais da Propriedade Privada, Ed. Renovar). 
 
 Características 
 
A) complexo – pois é formado por um plexo de poderes ou faculdades; 
B) absoluto – pois a sua oponibilidade é “erga omnes”; 
C) perpétuo – uma vez que não se extingue pelo simples não-uso; 
D) exclusivo – nesse sentido é entendido, pois afasta o exercício do 
poder dominial de terceiro sobre a mesma coisa, ressalvando-se a 
situação do condomínio, em que há divisão ideal do bem; 
E) elástico8 - pois pode ser distendido ou contraído, para formar outros 
direitos reais, sem perder a sua essência; 
 
 
 Extensão (art. 1229 e art. 1230) 
 
 
8 Cuidado com esta característica para concurso! 
 9
 Principal Limitação Constitucional ao Direito de Propriedade – A 
sua Função Social (art. 5. , incs. XXII e XXIII)9 
 
 Limitações Legais – Direitos de Vizinhança 
 
Trata-se do conjunto de regras que disciplina a convivência pacífica entre 
vizinhos. Têm natureza de obrigações “propter rem”. 
 
A) Uso Anormal da Propriedade (arts. 1277 e ss.); 
B) Árvores Limítrofes (arts. 1282 e ss.); 
C) Passagem Forçada (arts. 1286 e ss.); 
D) Passagem de Cabos e Tubulações (arts. 1286 e ss.); 
E) Das Águas (arts. 1288 e ss.); 
F) Limites e Direito de Tapagem (arts. 1297 e ss.); 
G) Direito de Construir (arts. 1299 e ss.) 
 
Faremos a análise desse tema, em sala de aula, mas, desde já, 
recomendamos o texto escrito por LUIZ EDSON FACHIN, a respeito dos 
“Direitos de Vizinhança”, na obra coletiva “Questões Controvertidas de 
Direito Civil – vol. 2”, Ed. Método. 
 
TEXTOS COMPLEMENTARES 
 
TEXTO 01 
 
Posse: Fato ou Direito ? 
Arruda Alvim (texto gentilmente cedido pelo grande 
Professor, dos seus originais “Comentários ao Código 
Civil”)10
9 Veja, a respeito da função social, os textos complementares deste material de apoio. 
10 Aproveitamos, inclusive, a oportunidade, querido (a) amigo (a), para recomendar a 
monumental obra recentemente publicada pelo Professor Arruda Alvim: “Livro Introdutório 
ao Direito das Coisas e o Direito Civil”, bem como, em sequência, a obra “Comentários aos 
arts. 1196 a 1276”, esta última em co-autoria com a brilhante Profa. Monica Couto, 
publicação da Ed. Gen-Forense com a Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo (Fadisp). 
 10
 
Num dos ângulos básicos da visão possessória 
de Savigny ------ depois de colocar a questão consistente 
em se estabelecer se a posse é fato ou direito ------ 
constatamos aí ser considerada, a posse, em si mesma, 
como um fato puro, em relação ao qual, todavia, 
encontram-se atreladas conseqüências de direito. Em 
realidade, mais explicitamente, a dúvida é a que consiste 
saber se a posse é mero fato, ou, se é fato e direito. A 
idéia é a de que a posse é um fato; porém, melhor 
explicada, deve levar a que, conquanto seja um fato, não é 
ela (apenas) um fato, no sentido de nesse se esgotar. 
Muito pelo contrário, à posse ligam-se conseqüências 
jurídicas de alta significação, e, ainda que se possa afirmar 
que ela é fato, as aludidas conseqüências são insuscetíveis 
de serem negadas. 11 
Ernst Immanuel Bekker, 12 sublinha a 
discussão em sua época, em relação a ser a posse fato ou 
direito, afirmando que a posse, como comportamento e 
fazer [do possuidor] é fato; como somatório das 
conseqüências jurídicas, é direito. Este último autor, ao 
tratar da aquisição e perda da posse, fundamentalmente 
como fatos, conclui: “A posse é um fato. Não é um direito -
--- nem ilícito --- acompanha [caminha com] o direito”. 
Há autores que sublinham que a posse é 
elemento de duração de direitos, v.g., como Konrad Cosak, 
que diz: “…mas é [a posse] objeto de um direito e como tal 
suporte fático ou pelo menos elemento fundamental do 
 
Excelentes juristas participaram dos Comentários ao Livro de Direito das Coisas, nesta 
coleção. 
11 Friedrich Carl von Savigny, Das Recht des Besitzes, Eine civilitistische 
Abhandlung [O direito de posse - Dissertação civilística], 7ª ed, Viena, 
Carl Gedold’s Sohn, 1865, § 5º, p. 43, onde diz que a posse é um fato 
puro (,…ein blosses Factum ist:…) – (v. notas 22 e ss, infra). 
12 V. Ernst Immanuel Bekker, Das Recht des Besitzes bei den Römern [O 
Direito da Posse nos Romanos], Leipzig, ed. Breitkopf und Härtel, 1880, 
no capítulo § 5º (“Ius und Factum”) – (“Direito e Fato”), p. 33 – no 
original: “Der Besitz ist ein Faktum. Er ist kein Recht, ----- kein Umrecht -
---- er geht neben dem Rechte einher”. Igualmente Anton Randa V. Der 
Besitz nach österreichem Rechte [A posse no direito austríaco], Leipzig, 
edição de Breitkopf e Härtel, 1876, § 3º, p. 32. 
 11
suporte fático para a subsistência ou a perdurabilidade de 
um direito”. 13 Afirma Konrad Büchel que é fato porque o 
ladrão pode ter posse, pois se fosse direito, haveria sempre 
de ser adquirida por meios jurídicos, onde diz que a posse 
somente pode ser entendida como relação de fato (“Er 
kann demnach der Besitz nur als faktisches Verhältnis, als 
causa facti, in Betracht kommen, und muß daher überall 
als begründet erscheinen,……” – em vernáculo: ( “Por isto é 
que a posse deve ser havida como relação de fato, como 
causa de fato, e por isso, acima de tudo, deve aparecer 
como fundada,…”). 14 
Anton Friedrich Justus Thibaut, por sua vez, 
estabelece os elementos materiais da posse, dizendo que, 
em conformidade com o próprio significado romano, que é, 
também, no seu sentir, o do direito alemão, possidere, 
significa poder físico: “O possidere romano indica, tal como 
o alemão possuir, entendido a partir do sentido originário 
da palavra significa o fato de alguém poder sentar numa 
coisa ou de ter poder físico de apreensão de um corpo”. 15 
Mas é relevante não deixarmos de ter 
presente que a posse não se reduz a um mero fato, senão 
que provoca uma série grande de conseqüências de ordem 
jurídica. Essa posição, entre muitos, é a de Dernburg, 
depois de descrever a posse em si mesma, ou, numa 
posição que pode ser designada de estática. Diz que “A 
posse como tal não é um direito. Todavia, na maioria dos 
casos a ela corresponde o direito”.16 Essas noções são, 
 
13 V. Konrad Cosac, Der Besitz des Erben [A posse dos herdeiros], 
Weimar, Böhlau, 1877, p. 4 – no original: “…aber er ist Gegenstand eines 
Rechtes und als solcher Thatbestand oder wenigstens Hauptelemente des 
Thatbestands für die Entstehung und Fortdauer eines Rechtes”. 
14 V. Konrad Büchel, Ueber die Natur des Besitzes [Sobre a natureza da 
Posse], Marburg, ed. Elwert, 1868, p. 8. 
15 V. Anton Friedrich Justus Thibaut, na sua obra Ueber Besitz und 
Verjärung [Sobre Posse e Prescrição], Jena, edição Michael Mauke, 1802, 
§ Iº - no original: “Das Römische possidere deutet, wie das Deutsche 
Besißen, seinem ursprünglichen Worte verstande zufolge, das Factum an, 
da Jemand eine körperliche Sache durch Sißen oder körperliches Begreifen 
in seiner physichen Gewalt hat,…”. 
16 V. Heinrich Dernburg, Das Sachenrecht des Deutschen Reichs und 
Preußens [O direito das coisas no Reino alemão e da Prússia], 4ª ed. 
retrabalhada, edição da Halle S.A. - Livraria Waisenhauses, 1908, § 11, p. 
 12
substancialmente, repetidas em livros contemporâneos, 17 
o que não significa para esses autores, também, que não 
ocorram significativas conseqüências jurídicas, a partir ou 
ainda que a partir da afirmação categórica de que a posse 
é um fato. Em realidade, a afirmação feita por esses 
autores (inclusive Savigny) deve ser lida como significando 
que a posse é apenas um fato, em si mesma considerada. 
Essa afirmação, por certo, não se estende e não pretende 
afastar o conjunto imenso de efeitos jurídicos, que derivam 
do “fato” da posse, como se acentuou. 
Mas, para que se configure esse fato da posse 
------ diferentemente da situação de detenção, onde há, 
também, uma situação aparente de poder (controle 
material) sobre uma coisa, que se mostra exteriormente tal 
como se fosse posse ------ é necessário que haja uma 
intenção específica, a que denominou de animus domini, 
no entender de Savigny, posição que não é a do nosso 
Código Civil e não o era do de 1.916. Na detenção há de 
reconhecer-se uma situação de fato a que corresponderia a 
uma situação jurídica. A situação de fato do detentor 
corresponderia à propriedade. 18 É através do animus 
possidendi que essa situação de detenção se alça à 
situação de posse, não sendo esta, todavia, a noção de 
detenção assumida por este Código e nem pelo Código Civil 
de 1916. 19 E, o animus possidendi, a seu turno, explica-se 
 
49 (“Conceito e essência da Posse”), - no original: “Der Besiß als solcher 
ist kein Recht. Doch in der Mehrheit der Fälle entspricht er dem Rechte”. 
17 V. Jan Shapp e Wolfgang Schur, Sachenrecht [Direito das Coisas], 
Munique, 2002, ed. Vahlen, § 5º, b, nº 44, p. 26, onde se lê que a “Posse 
é fato, não direito” (“Der Besitz ist Tatsache, kein Recht” – destaque do 
original) 
18 V. Friedrich Carl von Savigny, Das Recht des Besitzes, Eine civilitistische 
Abhandlung [O direito de posse - Dissertação civilística], 7ª ed., Viena, 
Carl Gedold’s Sohn, 1865, § 1º, p. 27) [“…, so liegt in der Detention die 
Ausübung des Eigenthums, und sie ist
der f a c t i s c h e Zustand, welcher 
dem Eigenthum, als einem r e c h t l i c h e n Zustand, correspondiert”] 
(destaques do autor) – (“…reside na detenção o exercício da propriedade, 
e é ela a s i t u a ç ã o fática, através da qual a propriedade, como uma 
situação j u r í d i c a , corresponde”) - (destaques do original). 
19 V. Friedrich Carl von Savigny, Das Recht des Besitzes, Eine civilitistische 
Abhandlung [O direito de posse, Dissertação civilística], cit., § 9º, p. 109, 
onde diz que ‘por meio do qual [animus possidendi] é que a detenção foi 
alçada à situação de posse’ -----“…, durch welchen [animus possidendi] 
die Detention zum Besitz erhoben wurde”. V. comentários aos arts. 1.198 
 13
pelo animus domini ou animus rem sibi habendi, que é o 
animus (ou, a intenção) que só o possuidor pode exercitar, 
como se proprietário fosse e como este se comportaria em 
relação à coisa; ou seja, ele quer faticamente exercer 
senhoria [sobre a coisa], tal como um proprietário exerce o 
seu direito. 
Embora freqüentemente utilizada, a expressão 
animus domini não encontra apoio em nenhum texto do 
direito romano, sendo uma tradução apontada da paráfrase 
de Teófilo que não corresponderia à tradução de animus 
domini, mas animus dominantis. Ao contrário encontra-se, 
ainda que escassamente, a expressão animus possidendi, 
com suas expressões análogas animus possidentis, animus 
possessionis. 20 - 21 A concepção de Savigny teve como 
pano de fundo a inspiração, possivelmente, do pensamento 
de Kant 22, e a noção de liberdade, i.e., a esfera de 
liberdade do possuidor e a agressão a essa situação, que 
justificava a defesa da posse. 23 
 
e 1.208, em que, ao lado dos comentários a esses textos, se procura 
estudar a detenção nos quadros das teorias subjetiva e objetiva. 
20 V. Paola Lambrini, L’Elemento Soggettivo nelle Situazioni Possessorie 
Del Diritto Romano Classico [O Elemento Subjetivo nas Situações 
Possessórias do Direito Romano Clássico], Padova, Cedam, 1998, p. 28. 
21 V. Savigny, Das Recht des Besitzes, Eine civilitistische Abhandlung, cit., 
§ 9º, p. 110 [O direito de posse, Dissertação civilística], onde está dito: 
“…de tal forma que animus possidendi através do animus domini ou 
animus rem sibi habendi demandam ser esclarecidos, [e] por 
conseqüência somente vale para o que é possuidor, de cuja coisa ele se 
comporta como proprietário [e] tem a detenção, isto é, em relação à qual 
ele tem o controle material, tal como um proprietário está autorizado em 
razão do seu direito”) – no original: “…, so daß der animus possidendi 
durch animus domini oder animus sibi habendi erklärt werden muß, 
folglich nur der als Besitzer gelten kann, welcher die Sache als 
Eigenthümer behandelt, deren Detention er hat, d. h., welcher sie factisch 
eben so beherrschen will, wie ein Eigenthümer Kraft seines Rechts zu thun 
befugt ist, …”. Com essa explicação, v. Moreira Alves, Posse, 2ª ed., 2.ª 
tiragem, Rio de Janeiro, Forense, 1997, vol. I, p. 212, nota 692. 
22 Disse o autor francês Jean-Marc Trigeaud: “La possession-droit 
savignienne coincide pleinement dans sa configuration et sa structure avec 
la notion Kantienne” – (“A posse-direito savigniana coincide inteiramente 
na sua configuração e estrutura com a noção kantiana”). Para uma síntese 
da influência de Kant e do idealismo alemão na teoria de Savigny, v. Jean-
Marc Trigeaud, La Possession des Biens Immobiliers, Economica, 1981, 
p.459 e ss. 
23 Para uma notícia ampla, v. Moreira Alves, Posse, 1.ª ed., 2.ª tiragem, 
vol. I, cit., 1997, pp. 209-210 e nota 691, da p. 209. Observa-se dessa 
informação (nota 691) que, até mesmo alguns lineamentos da idéia de 
 14
Se, v.g., é o proprietário que exerce a posse, 
correspondente ao direito de propriedade, esta é uma 
manifestação do direito subjetivo de que é titular; se, 
diferentemente, outrem é o possuidor (sem titularidade 
alguma), a situação é diferente, justificando-se a si 
própria.24 
A concepção de Savigny teve como mérito 
realçar os dois elementos que compõem a base do 
fenômeno possessório (corpus e animus); não teria, 
porém, resistido às observações e objeções traçadas por 
Ihering, que procurou desmontar a teoria de Savigny. 
Segundo palavras de Ihering “Llamar a la posesión de las 
cosas exterioridad o visibilidad de la propiedad, es resumir 
en una frase toda la teoria posesoria” 25. 
De outra parte, ainda, Ihering nunca negou o 
papel da vontade, pois não há dúvida de que a posse exige 
o “querer” como pressuposto do “ter” (rectius, possuir). 
Como explica Cornil, responsável por aprofundar a teoria 
objetiva: “Em toda relação possessória está implicada 
necessariamente a vontade. Sem vontade a relação 
exterior com a coisa, fosse mesmo um contato corporal 
imediato, é uma simples relação de justaposição local a 
que é completamente indiferente o direito”. 26 Contudo, no 
que tange ao ônus da prova da posse, a comprovação do 
animus colocaria o julgador em posição difícil. Assim, o que 
deve determinar a existência da posse relaciona-se com o 
 
posse, tal como fora entendida por Kant, teriam penetrado no pensamento 
de Savigny (V. no Livro Introdutório ao Direito das Coisas e o Direito Civil 
item 1.8.2, nota 109, o texto de Kant). 
24 V. Fedele, ob. ult. cit., I, 2, p. 14, o qual explica a última situação do 
texto como um fenômeno autônomo (possideo quia possideo ----- possuo 
porque possuo; possuo como estava possuindo). 
25 V. Rudolf von Ihering, La Teoria de La Posesión, 2ª ed., trad. Adolfo 
Posada, Madrid, 1912, tomo I, p. 222. 
26 V. Cornil, Traité de la Possession dans le Droit Romain, Paris, 1905, pp. 
34 e ss. – no original: “Tout rapport possessoire implique nécessairement 
la volonté. Sans volonté le rapport extérieur avec une chose, fût-il même 
un contact corporel immédiat, est un simple rapport de juxtaposition 
locale complètement indifférent en droit”. 
 15
seu perfil (em rigor, perfil externo, o que aparece), tal 
como reconhecido pelo ordenamento jurídico27. 
Ihering procurou demonstrar que a distinção 
entre posse (possessio civilis) e detenção (possessio 
naturalis) com base no animus possidendi, não tinha 
sustentação perante o direito romano 28. A teoria de 
Ihering foi amplamente aceita, mas a influência de Savigny 
foi extremamente grande nas codificações que 
acompanharam o final do século XIX como demonstra 
Cornil. 29 
A teoria de Ihering ‘teria superado’ a teoria 
subjetiva de Savigny menos pela demonstração lógico-
formal, mas através de uma constatação e construção 
 
27 Diz Ihering: “Cuando las dos condiciones de la posesión, esto es, el 
corpus y el animus, concurren, se tiene siempre posesión, a menos que 
una disposición legal no prescriba excepcionalmente, que sólo hay 
simple tenencia” (grifos do autor). (Ihering, La voluntad en la Posesión, 
trad. Adolfo Posada do original Der Besitzwille, Madrid, 1910, t. II, p. 22). 
28 Como afirma Ihering “El animus domini señala el punto de partida de 
mis vacilaciones acerca de la exactidud de la teoria de Savigny. Leyendo 
las fuentes, me he encontrado con textos que no es posible armonizar con 
ellas, y de los cuales he hablado en el cap. XV. Tales textos produjeron en 
mi la convicción de que, para determinar ante las condiciones legales 
exteriores de la posesión, o del corpus, si hay posesión o tenencia, en 
materia de posesión derivada, lo decisivo, en mi concepto, aunque sea en 
contra del sentimento
y de la intención de las partes, no es la diversidad 
de la voluntad de poseer, sino la naturaleza de la relación existente; la 
causa posessionis o el momento causal de la posesión, como yo lo llamo” 
(Ihering, La voluntad en la Posesión, trad. Adolfo Posada do original Der 
Besitzwille, cit., t. II, p. 8). 
29 Para uma simples visualização da influência do animus na definição da 
posse em algumas legislações, arroladas por Cornil: Código Civil da 
Saxônia de 1863, § 186: “Aquele que tem realmente uma coisa em seu 
poder e se há a vontade de exercer [o direito de] propriedade por si 
próprio, este é o seu possuidor” – (“Celui qui a une chose réellement en 
son pouvoir, en est détenteur, et s’il a la volonté d’exercer sur la chose la 
propriété pour lui-même, il en est possesseur”) ; Código do Cantão de 
Zurique (Suíça), art. 64: “a aquisição da posse é subordinada, em 
princípio, a duas condições: 1. …; A vontade de exercer esse poder 
material sobre a coisa” (“L’acquisition de la possession est subordonnée, 
en principe, à deux conditions: 1..., 2ª La volonté d’exercer ce pouvoir 
matériel sur la chose”); Código espanhol de 1889, art. 430: “A posse civil 
é esta mesma detenção, ou este mesmo gozo, unido à intenção de 
considerar a coisa ou o direito, como propriedade” - (“La possession civile 
est cette même détention, ou cette même jouissance, unie à l’intention de 
considérer la chose, ou le droit, comme la propriété”); Código Civil 
Japonês de 1896, art. 180: “A posse se adquire pela detenção de uma 
coisa com a intenção de a exercer no seu próprio interesse”- (“La 
possession s’acquiert par la détention de la chose avec l’intention de 
l’exerer dans son propre intérêt”).V. Cornil, Traité de la Possession dans 
de Droit Romain, Paris, 1905, p. 544 ss. 
 16
teórica mais próximas da realidade. Priorizou a visão 
realista dos institutos, o que só é possível com a percepção 
dos fins para os quais os mesmos existem (método 
teleológico). Não há dúvida de que essa posição 
corresponde ao pensamento de Ihering em sua segunda 
fase, pois o mesmo viveu um período de transição do 
pensamento positivista do século XIX. Num primeiro 
momento, valorizou a jurisprudência dos conceitos e todo o 
seu formalismo racional, por influência de Puchta, posição 
que mais tarde abandonou ante a incapacidade ou 
impotência da jurisprudência dos conceitos se adaptar à 
evolução econômica, bem como em fornecer soluções aos 
problemas sociais. A jurisprudência dos conceitos revelava-
se como um espelho dos arquétipos existentes nas fontes 
romanas, situação incompatível com o ambiente social da 
segunda metade do século XIX. A segunda fase de Ihering 
assenta-se em seu amadurecimento e na adoção de uma 
visão pragmática, a qual correspondeu ao elemento 
catalisador para o surgimento da jurisprudência dos 
interesses. 30 
A história demonstrou que os romanos sempre 
foram avessos a elaborações científicas, no sentido de 
formular abstrações, pois estavam mais preocupados em 
propiciar soluções práticas aos problemas do cotidiano. 
 
TEXTO 02 
 
 
Da função social da propriedade imóvel. 
Estudos do princípio constitucional e de sua regulamentação pelo 
novo Código Civil brasileiro 
 
Juliano Taveira Bernardes 
juiz federal em Goiás, professor na Universidade Federal de Goiás, 
mestre em Direito e Estado pela Universidade de Brasília(UnB), ex-
membro da magistratura e do Ministério Público do Estado de 
Goiás,membro do IBDC (Instituto Brasileiro de Direito 
Constitucional) 
 
 
30 Para maiores esclarecimentos, vide Karl Larenz, Metodologia da Ciência 
do Direito, Lisboa, 1997, Fundação Calouste Gulbenkian. trad. orig. 
Methodenlehre der Rechtswissenschaft [6ª edição, 1991], p. 55 ss. 
 17
Texto disponível no Jus Navigandi 
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4573 
 
 
1 - INTRODUÇÃO 
 Surgida no ordenamento jurídico pátrio após a edição do Código 
Civil de 1916, a função social da propriedade recebeu importantes 
contribuições da Constituição de 1988. Mas, nem bem analisadas as 
implicações da atual Constituição em relação à antiga legislação civil, veio a 
lume o novo Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002), que promoveu 
significativas mudanças acerca da matéria. Logo, é oportuno estudar as 
inovações obtidas e os problemas que surgirão com a recente concretização 
do instituto por meio do novo Código Civil. 
 Nesse esforço, o estudo começará pela conceituação da função 
social da propriedade, passando por breve histórico. Após, pretender-se-á 
demonstrar o porquê e as conseqüências advindas do enquadramento do 
instituto na acepção de princípio constitucional. Em seguida, partindo da 
interpretação da Constituição de 1988, o tema proposto será explorado em 
visão sistemática abrangente, não olvidando a legislação que, 
paralelamente ao Código Civil, promove a regulamentação da função social 
da propriedade. Somente então, no último item do trabalho, é que serão 
analisados artigos específicos que tocam a questão, no novo Código Civil, 
buscando interligá-los às normas preexistentes, especialmente ao recente 
Estatuto da Cidade (Lei 10.257, de 11/07/2001). 
 Destarte, a preocupação maior do subscritor será uma exegese que 
não se limite só à legislação civil recém-editada, mas a ela se chegue após 
estudar todo o sistema normativo em que se insere o princípio da função 
social e as regras que lhe dão corpo. Intenta-se, dessa forma, superar a 
pouca literatura e nenhuma jurisprudência acerca da Lei 10.406/2002. 
 Por fim, quanto ao corte temático, o trabalho concentrar-se-á na 
função social da propriedade imóvel, a despeito de o princípio incidir 
também em face de outros tipos de propriedade. 
2 – DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE 
 Antes de iniciar a exposição sobre o que vem a ser a chamada 
função social da propriedade, não se pode olvidar que o princípio da função 
social tem como pressuposto necessário a propriedade. (1) Daí, é de bom 
alvitre cuidar simultaneamente, ainda que em breves linhas, do liame 
umbilical existente entre função social e direito de propriedade. 
 Nesse prumo, o Código de Napoleão qualificou o direito de 
propriedade, na esfera privada, como o "direito de gozar e dispor das coisas 
da maneira mais absoluta, desde que delas não se faça uso proibido pelas 
 18
leis e regulamentos" (art. 436). 
 De sua vez, a aplicação do princípio da função social da propriedade
descaracteriza o acerto dessa velha concepção civilista, imantando o direito 
de propriedade com um dever de agir, e não apenas uma obrigação de não 
fazer (função social ativa). (2) Assim, a propriedade, modernamente, 
converteu-se em poder-dever voltado à destinação do bem a objetivos que 
transcendem o simples interesse do proprietário. 
 Porém, não se confunde a função social com as limitações da 
propriedade contidas no direito civil, (3) tampouco com as limitações 
administrativas. (4) Mesmo sendo inválido afirmar que se resumem a 
prestações de não fazer, as limitações constituem condição de exercício do 
direito. Já a função social está ligada aos deveres inerentes ao exercício da 
propriedade, convertendo-se em "elemento da estrutura e do regime 
jurídico da propriedade". (5) Como afirma ARAÚJO SÁ, as limitações 
administrativas têm fundamento não na função social da propriedade mas 
no poder de polícia, e são externas ao direito de propriedade, interferindo 
tão-somente no exercício do direito, enquanto a função social interfere no 
conceito e na estrutura do direito de propriedade. (6) 
 Mesmo a desapropriação, instituto bastante associado à função 
social, com ela não se pode baralhar, ainda que o descumprimento desta 
possa implicar a decretação
de desapropriação. O que sucede é simples 
relação de causa e efeito. 
 Como dizem GUSTAVO TEPEDINO e ANDERSON SCHREIBER, a 
funcionalização da propriedade introduz critério de valoração de sua própria 
titularidade, que passa a exigir atuações positivas de seu titular, a fim de 
adequar-se à tarefa que dele se espera na sociedade. (7) 
 Aproveitando-se da definição do jus-agrarista argentino ANTONINO 
C. VIVANCO, citado por TORMINN BORGES, o princípio da função social 
consiste na obrigação condicionante do exercício da propriedade a 
interesses que transcendem a vontade do proprietário, de modo a satisfazer 
indiretamente as necessidades dos demais membros da comunidade. (8) 
 Enfim, com arrimo em PIETRO PERLINGERI, pode-se dizer que a 
função social converteu-se em título justificativo, verdadeira causa de 
atribuição dos poderes do titular da propriedade. (9) 
3 – BREVE HISTÓRICO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE 
 É a partir das obras de direito agrário que melhor se remonta o 
retrospecto da função social da propriedade. Nessa linha, percebe-se que a 
evolução do instituto andou de mãos dadas com o desenvolvimento do 
direito de propriedade. 
 Com base na obra do ilustre professor da Faculdade de Direito da 
 19
Universidade Federal de Goiás BENEDITO FERREIRA MARQUES, (10) as 
origens do princípio da função social estão em lições de ARISTÓTELES, o 
primeiro a entender que aos bens se deveria dar uma destinação social. 
 Depois de ARISTÓTELES, a idéia só foi impulsionada por TOMÁS DE 
AQUINO. O conceito tomista de propriedade possuía três planos distintos na 
ordem de valores. (11) No primeiro deles, o homem teria um direito natural 
ao apossamento de bens materiais, dada sua natureza de animal racional, 
como forma de manter sua própria sobrevivência. No segundo, considerou-
se que o homem não poderia refletir apenas acerca de sua sobrevivência 
imediata, como ocorre com os animais irracionais, porque deveria pensar 
também no amanhã, pois, para que fosse verdadeiramente livre, precisaria 
estar ao abrigo das surpresas econômicas. Num terceiro plano, permitir-se-
ia o condicionamento da propriedade em razão do momento histórico de 
cada povo, desde que não se chegasse a negá-lo. Ou seja, embora a 
propriedade consistiria num direito natural, o proprietário não poderia 
abstrair-se do dever do zelar pelo "bem comum". (12) 
 Em seguida, operaram-se várias fases da evolução do conceito de 
direito de propriedade, até que o Código de Napoleão o fixasse com 
características quase absolutas, conforme dispunha o já transcrito art. 436. 
E foi com base nessa clássica definição francesa que os códigos civis que se 
sucederam buscaram inspiração, inclusive o brasileiro. 
 Porém, segundo MARQUES, "foi com Duguit, escorado no 
pensamento positivista de Comte, que o direito de propriedade se despiu do 
caráter subjetivista que o impregnava, para ceder espaço à idéia de que a 
propriedade era, em si, uma função social." (13) Assim, afirma MARQUES, o 
grande impulso às idéias de subordinação da propriedade a uma finalidade 
social teve início com a célebre palestra proferida por DUGUIT em Buenos 
Aires no ano de 1911. 
 Também GUSTAVO TEPEDINO e ANDERSON SCHREIBER creditam a 
DUGUIT a difusão do termo função social da propriedade, o qual teria sido 
primeiramente estampado na obra Les transformations du droit prive depuis
le Code Napoléon. (14) Os mesmos autores lembram, mais, da contribuição 
da doutrina italiana. Citando SALVATORE PUGLIATTI e STEFANO RODOTÀ, 
prosseguem TEPEDINO e SCHREIBER, foi na Itália que se soube dar à 
função social seu melhor sentido, "não como uma categoria oposta ao 
direito subjetivo, mas como um elemento capaz de alterar-lhe a estrutura, 
inserindo-se em seu profilo interno e atuando como critério de valoração do 
exercício do direito, o qual deverá ser direcionado para um massimo 
sociale." (15) 
 Dignas de registro, ainda, são as influências das teorias marxistas a
apregoar a coletivização da propriedade individual. Tampouco se esqueça a 
importância da Igreja Católica, especialmente as encíclicas papais de 1891 
(Rerum Novarum, de Leão XIII), de 1931 (Quadragesimo Anno, de Pio XI) e
de 1962 (Mater et Magistra, de João XXIII). 
 No Brasil, com apoio em LIMA STEFANINI e FERNANDO PEREIRA 
SODERO, anota MARQUES que, desde a concessão das chamadas 
 20
sesmarias, já havia preocupação com o cumprimento da função social, pois 
os sesmeiros deveriam cultivar a terra e daí tirar-lhe aproveitamento 
econômico. Afirma ainda, embasado em estudo de ROSALINA RODRIGUES 
PEREIRA, que também as Ordenações Manoelinas e Filipinas já se 
ocupavam de questões ligadas ao uso do solo e a técnicas agrícolas. 
 Após a independência, a Constituição de 1824 não se dedicou 
especificamente ao tema, afirmando o direito de propriedade "em toda sua 
plenitude", ressalvada uma "única" exceção: o uso público indenizado do 
bem, quando legalmente necessário (art. 179, XXII). 
 Sob o governo republicano da Constituição de 1891, pouco se 
evoluiu, salvo na parte em que prevista a desapropriação por necessidade 
ou utilidade pública. Outrossim, muito influenciado pelo Código de 
Napoleão, o Código Civil de 1916 não incrementou a função social da 
propriedade, limitando-se a regular genericamente os casos de necessidade 
e de utilidade pública, para fins de desapropriação (art. 590 e §§1º e 2º), e 
de requisição de bens por autoridade pública (art. 591 e par. único). 
 A seguir, a função social só ganhou algum espaço na Constituição 
de 1934, cujo artigo 113, n. 17, estabelecia que o direito de propriedade 
não poderia ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na forma da 
lei. 
 Nenhum desenvolvimento se fez sentir na Constituição de 1937, 
mas a Constituição de 1946 condicionou o uso da propriedade ao "bem-
estar social" (art. 147), dando então margem a regulamentação por meio 
da Lei 4.132, de 10/09/62, que até hoje cuida dos casos de desapropriação 
por interesse social. Não bastasse, nos trabalhos legislativos que 
culminaram com a aprovação da desapropriação por interesse social na 
CF/46, a proposta de emenda apresentada pelo Senador FERREIRA DE 
SOUZA já abordava expressamente a questão da função social, como 
informa MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO. (16) 
 Então, editado o Estatuto da Terra (Lei 4.504, de 30/11/64), seu 
artigo 2º expressamente tratou da função social do imóvel rural. (17) Daí por 
diante, a expressão "função social" foi incorporada nas Constituições 
posteriores, (18) até se chegar à atual Constituição de 1988. Nesta, a 
inspiração mais próxima, segundo MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, 
deve-se à doutrina social da Igreja Católica, especialmente às Encíclicas 
Mater et Magistra, do Papa João XXIII, e Populorum Progressio, do Papa 
João Paulo II, "nas quais se associou a propriedade a uma função social, ou 
seja, à função de servir como instrumento para a criação de bens 
necessários à subsistência de toda a humanidade." (19) 
4 - DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE COMO PRINCÍPIO 
CONSTITUCIONAL 
 Não faz parte deste estudo a conceituação do que vem a ser 
"norma jurídica", tampouco a questão da estrutura lógica das chamadas 
 21
"proposições jurídicas". (20) Porém, sem menosprezar as polêmicas 
doutrinárias acerca do tema, num primeiro esforço de categorização, já se 
afirma que tanto as regras como os princípios serão neste estudo 
enquadrados na definição lato sensu de normas jurídicas. (21) Dessa forma, a
classificação das normas jurídicas em sentido estrito, de modo a nestas 
incluir somente as regras e não os princípios, será de todo irrelevante, salvo
naquilo que de alguma forma possa exprimir censurável tendência
de negar 
aos princípios conteúdo normativo. (22) 
 De sua vez, entendem-se por regras as disposições (interpretadas) 
que estabelecem mandatos, proibições ou permissões de atuação em 
situações concretas previstas nelas mesmas. (23) No conceito de 
CANOTILHO, regras "são normas que, verificados determinados 
pressupostos, exigem, proíbem ou permitem algo em termos definitivos, 
sem qualquer exceção." (24) 
 Já a conceituação de princípios é mais difícil. Para este estudo, 
devem ser entendidos como normas que proporcionam critérios para 
tomadas de posições ante situações concretas indeterminadas. (25) Na 
festejada definição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO: 
 Princípio (...) é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, 
verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre 
diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua 
exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a 
racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá 
sentido harmônico. (26) 
 Tratando já daqueles estampados em textos constitucionais, "os 
princípios são núcleos de condensação nos quais confluem bens e valores 
constitucionais" (CANTILHO e VITAL MOREIRA); (27) "são ordenações que se 
irradiam e imantam os sistemas de normas" (AFONSO DA SILVA). (28) 
Assim, a normatização e a constitucionalização conferiu aos princípios 
constitucionais o status hierárquico de "normas-chaves" do sistema jurídico 
(BONAVIDES). (29) 
 Dito isso, para se saber se a função social, como concebida na 
CF/88, é princípio ou regra, cabe expor alguns critérios para diferenciá-los. 
Nessa tarefa, a despeito dos clássicos e extratificados critérios de distinção 
apontados por CANOTILHO, (30) é de bom alvitre enunciá-los de forma 
menos resumida, com apoio, principalmente, na obra já mencionada de 
EROS ROBERTO GRAU. (31) 
 Assim, tem-se que as regras jurídicas são aplicáveis por completo, 
ou não se aplicam de modo absoluto. Na dicção de DWORKIN, aplicam-se à 
maneira de um tudo ou nada (an all or nothing), (32) não comportando 
exceções. (33) Presentes os pressupostos fáticos a que se refira, a regra 
(válida) há de ser aplicada. (34) 
 Já os princípios sequer exigem a indicação das condições 
necessárias à sua incidência, pois não configuram uma decisão concreta a 
ser necessariamente tomada. Em vez disso, os princípios se qualificam 
 22
como mandamentos de otimização, (35) acenando uma vontade normativa 
inclinada a certa direção. No dizer de ALEXY, os princípios ordenam algo 
que deve ser realizado na maior medida possível, tendo em conta as 
possibilidades jurídicas e fáticas. (36) Daí, os princípios não contêm 
mandamentos definitivos, mas somente prima facie. (37) 
 Dessa maneira, com apoio em BOULAGER, citado por EROS 
ROBERTO GRAU, pode-se afirmar que os princípios, ao contrário das regras, 
não admitem a própria enunciação das hipóteses nas quais não se aplicam, 
bem como carecem de conteúdo de determinação relativo aos princípios 
contrapostos e as possibilidade fáticas, (38) porquanto "são aptos a serem 
aplicados a uma série indefinida de situações". (39) 
 Devido a esse alto grau de abstração, demandam os princípios 
constitucionais medidas concretizadoras, o que é feito por meio de outros 
princípios de maior densidade (40) (subprincípios), (41) ou mesmo por regras, 
até chegar-se, na ponta de final de sua incidência fática, na descoberta da 
"norma de decisão" do caso jurídico-constitucional. (42) Ademais, ainda 
quando se manifestam as condições nele previstas, um princípio não se 
aplica automaticamente. É que, em determinado caso, pode também incidir 
um princípio diverso, apontado em sentido diverso. Surge então outra 
diferença dos princípios frente às regras jurídicas: como somente uma regra
pode incidir em face de uma idêntica situação, se duas ou mais regras estão
em choque, (43) apenas uma – ou nenhuma – delas poderá ser considerada 
válida à regulação da situação concreta, surgindo daí um problema de 
antinomia jurídica a ser resolvido. (44) Contudo, mais de um princípio pode 
regular uma mesma situação, pois princípios diversos comportam juízo de 
ponderação relativa, cujo resultado poderá ser a prevalência de um em 
detrimento do outro. Consoante sintetizado por BONAVIDES, com base em 
ALEXY, resolve-se o conflito de regras na dimensão da "validade", enquanto 
o conflito de princípios é resolvido na dimensão do "valor". (45) 
 Sem embargo, cabe ressaltar não haver antinomia entre princípios 
e regras. Se as regras servem para densificar princípios, o eventual conflito 
envolve, na verdade, o próprio princípio objeto de densificação. Logo, 
quando um princípio antagônico deva prevalecer, a regra contrastante é 
simplesmente afastada da regulação da situação concreta, acompanhando o 
próprio princípio desprezado. (46) 
 Por fim, em vigor a Constituição de 1988, encaixa-se perfeitamente 
no conceito de princípio constitucional explícito a exigência de que a 
propriedade cumpra sua função social (inciso XXIII do art. 5º). É que a 
observância da função social da propriedade não se aplica à maneira de um 
tudo ou nada, tampouco se pode, de antemão, indicar todas as condições 
necessárias à sua incidência. Em vez disso, a verificação do cumprimento da
função social pode exigir juízos de ponderação em face de outros princípios, 
sendo necessária a "concretização" de seu alto grau de abstração. (47) Essa é
a conclusão de JOSÉ AFONSO DA SILVA, para quem a norma-princípio 
contida nesse dispositivo é de aplicabilidade imediata. (48) 
 23
5 – O PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE NA CONSTITUIÇÃO
DE 1988 
 Já foi dito que a Constituição de 1988 tratou da exigência de que a 
propriedade cumpra sua função social no inciso XXIII do art. 5º. Mas a 
Constituição também se referiu à função social na redação original do §1º 
do art. 156 (hoje alterado pela EC n. 29, de 13/09/2000), no inciso III do 
art. 170, no §2º do art. 182, no caput do art. 184, no par. único do art. 185
e no art. 186. Outrossim, o Poder Constituinte derivado se valeu da 
expressão em tela no inciso I do §1º do art. 173, na redação dada pela EC 
n. 19, de 04/06/98. (49) 
 É bem verdade que EROS ROBERTO GRAU sustenta que a 
referência à função social contida no inciso XXIII do art. 5º não se 
justificaria. Defende o ilustre mestre, por essa norma estaria garantida a 
propriedade individual, cuja utilização, como instrumento voltado à 
subsistência individual e familiar, estaria servindo a uma função individual 
ligada ao princípio da dignidade da pessoa humana, daí por que imune à 
questão da função social. (50) 
 Porém, não só com base na premissa de que na Constituição não 
há palavras inúteis, pode-se perfeitamente sustentar que toda e qualquer 
propriedade privada, material ou imaterial, individual ou coletiva, urbana ou 
rural, móvel ou imóvel, deve atender à função social. (51) De efeito, o 
princípio atua de forma diferente em relação a cada tipo de propriedade, 
conforme a destinação reservada aos respectivos bens. (52) Via de regra, é a 
lei que dispõe sobre como a função social estará sendo cumprida, caso a 
caso. (53) Nesse pensar, o que pode ocorrer é que a destinação individual do 
bem satisfaça à função que socialmente dele se espera. (54) Ou seja, 
cumprindo com sua função individual, o exercício do direito de propriedade 
poderá estar também obedecendo à função social, mas isso não significa 
que a propriedade destinada à subsistência individual esteja de antemão 
imune à função social. Tanto não está que o próprio EROS ROBERTO GRAU 
tratou de estabelecer exceção a esse raciocínio, dizendo que a propriedade 
individual pode exceder sua função meramente
individual quando "detida 
para fins de especulação ou acumulada sem destinação ao uso a que se 
volta." (55) 
 É evidente, contudo, que na Constituição não houve maior 
preocupação com a concretização das normas que dispõem acerca do 
princípio da função social da propriedade, salvo em relação aos imóveis 
rurais e, com menor intensidade, em face dos imóveis urbanos. Em razão 
disso, há quem sustente que as medidas voltadas contra o descumprimento 
da função social "só podem ter por objeto terras particulares, sejam 
urbanas ou rurais." (56) Porém, consoante exposto, cada tipo de propriedade 
sujeita-se a determinados modos de cumprimento da função social. De fato,
a razão do tratamento mais exaustivo do tema da função social em relação 
aos imóveis rurais está no maior esforço de regulamentação dos 
parlamentares ruralistas. Mas isso, nem de longe, pode excluir a incidência 
do princípio a respeito dos demais tipos de propriedade. (57) Confirma-se 
esse raciocínio quando se sabe que o conceito de propriedade é mais amplo 
 24
que o de domínio, pois abrange também os bens imateriais. 
 Enfim, não se pautando o exercício da propriedade dentro dos 
pressupostos da função social, sujeita-se o proprietário à expropriação de 
seu direito, seja qual for a modalidade de propriedade. E contra isso não se 
pode alegar que a Constituição só se referiu ao descumprimento da função 
social, como causa deflagradora de desapropriação, naquela movida por 
interesse social para fins de reforma agrária (art. 184). Com efeito, essa 
assertiva apenas enuncia que o cumprimento da função social integra o 
conceito de interesse social para fins de desapropriação. Não se pode negar,
porém, que o atual diploma legal que regula a desapropriação por interesse 
social (Lei 4.132, de 10/09/62) não contemplou expressamente a hipótese 
de inobservância da função social. Isso se explica, como visto, porque a 
expressão "função social" só veio a ser cunhada posteriormente, pelo 
Estatuto da Terra. Mas a própria enunciação dos casos considerados de 
interesse social faz crer a presença "latente" do princípio da função social 
em muitos dos incisos do art. 2º da Lei 4.132/62. Logo, à luz do art. 184 da 
CF, evidencia-se que o legislador poderá encaixar, na regulamentação dos 
casos de desapropriação para fins de interesse social, regras atinentes à 
expropriação decorrente do eventual desatendimento do princípio 
constitucional da função social da propriedade, seja esta de que tipo for. E 
nisso reside a razão da relativização da garantia à propriedade no inciso 
XXIII do art. 5º, em regra que se repete no inciso III do art. 170 e no §2º 
do art. 182 da CF/88. 
 Todavia, mesmo que facultado à lei incluir hipóteses de 
descumprimento da função social aos casos de desapropriação por interesse 
social, salvo as exceções expressamente previstas na Constituição, o 
pagamento deverá ser feito prévia e integralmente em dinheiro (inciso XXIV 
do art. 5º). 
 Dessarte, os conceitos civilísticos de propriedade, com a 
normatização constitucional do princípio da função social, sofreram 
profundas transformações. Ao tratamento civil do direito de propriedade 
hoje em vigor aplicam-se direcionamentos de direito público voltados à 
caracterização da função social, motivo pelo qual, empolgado com a CF/88, 
JOSÉ AFONSO DA SILVA afirmou que "o Código Civil não disciplina a 
propriedade, mas tão-somente as relações civis a ela referentes". (58) 
 Porém, ao contrário do que pretendem alguns, a propriedade não 
se confunde com sua função social, como bem analisou o ilustre professor 
BENEDITO FERREIRA MARQUES. Ainda que a função social faça parte da 
estrutura do direito de propriedade, servindo como título jurídico de 
atribuição plena das faculdades que lhe são inerentes, não se pode 
sustentar que sua eventual inobservância subtraia todos os direitos do 
proprietário inadimplente. Isso seria chancelar exagero que daria margem 
até para justificar a expropriação sem o pagamento de indenização. É que a 
Constituição não baniu o direito de propriedade; apenas impôs a seu 
exercício o dever de cumprimento da função social. (59) 
 Vale dizer: ainda que caiba à lei regular como a função social estará
sendo cumprida, a não-satisfação da princípio só haverá de acarretar as 
 25
conseqüências estabelecidas na própria Constituição. 
 E tais conseqüências podem ser: (a) o parcelamento ou edificação 
compulsórios dos imóveis urbanos (inciso I do §4º do art. 182 (60)); (b) o 
aumento progressivo da carga tributária incidente sobre os imóveis urbanos 
(§1º do art. 156, na redação que lhe deu a EC n. 29/2000, c/c inciso II do 
§4º do art. 182 (61)) e rurais (art. 153, §4º); (c) a desapropriação-sanção de
imóveis urbanos, com pagamento integral mediante títulos da dívida pública
(inciso III do §4º do art. 182 (62)); (d) a desapropriação-sanção de imóveis 
rurais, com o pagamento em dinheiro das benfeitorias úteis e necessárias 
(§1º do art. 184) e o restante em títulos da dívida agrária (art. 184, caput);
(e) a desapropriação-sanção, sem indenização, no caso das glebas onde 
forem encontradas culturas ilegais de plantas psicotrópicas (art. 243 (63)), e; 
(f) a desapropriação comum, prévia e integralmente indenizada em 
dinheiro, por motivo de interesse social, nas situações a serem 
estabelecidas por lei ordinária (inciso XXIV do art. 5º). 
 Fora dessas hipóteses, porém, remanesce a garantia da 
propriedade, inclusive a de reivindicá-la das mãos de terceiros que 
injustamente a detenham. 
 Por derradeiro, consoante afirma JOSÉ AFONSO DA SILVA, "é certo 
que o princípio da função social não autoriza a suprimir, por via legislativa, 
a instituição da propriedade." (64) Essa assertiva serve para delimitar o 
núcleo essencial do direito fundamental de propriedade, daí por que, ao 
disciplinar os requisitos de cumprimento da função social, não poderá o 
legislador desviar-se de sua finalidade normativa, erigindo deveres 
desarrazoados ou que tornem impraticável o exercício do direito de 
propriedade. (65) Incidiria aí o princípio da proporcionalidade, em repressão 
ao excesso do poder de legislar, pois a função social deve se resumir a algo 
atingível, até porque, especialmente em se tratando de imóveis rurais, a 
exigência de padrões de produtividade demasiado altos pode acarretar o 
esgotamento dos recursos naturais da terra, o que também iria de encontro 
à função social. 
6 – DO PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL INSERIDO NA ORDEM ECONÔMICA 
 Analisando o texto das Constituições anteriores que expressamente 
consignaram a função social da propriedade, percebe-se, em todas elas, 
que a inclusão do princípio se deu no capítulo destinado à ordem econômica 
(cf. art. 157, III, da CF/67 e art. 160, III, da CF/69). De outro turno, ainda 
que a Carta de 1988 tenha feito o mesmo, inovou o Constituinte 
consagrando o princípio, em relativização ao próprio direito individual de 
propriedade, no capítulo destinado aos direitos fundamentais (inciso XXIII 
do artigo 5º). Ademais, a propriedade privada foi incluída em inciso 
autônomo, entre os princípios da ordem econômica (inciso II do art. 170), 
antes mesmo da enunciação do princípio da função social da propriedade 
(inciso III do mesmo artigo). 
 Por conseguinte, pela nova Constituição, a função social não 
 26
interessa apenas à ordem econômica, mas serve de princípio norteador 
também do direito individual de propriedade. Outrossim, inserido no 
capítulo da ordem econômica, o conceito de propriedade privada foi ainda 
mais "relativizado", (66) em comparação com aquele das Cartas anteriores, 
pois passou a se submeter ao juízo de ponderação decorrente da aplicação 
de todos os outros princípios integrantes da ordem econômica. 
7 – PECULIARIDADES
DO PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE
RURAL 
 Em relação aos imóveis rurais, aplica-se tudo o que se disse acerca 
da função social, especialmente em relação à transformação do regime 
privatístico de propriedade. Contudo, há certas peculiaridades anotadas 
especialmente por jus-agraristas. 
 Primeiramente, cabe dizer que a expressão "função social da 
propriedade rural" é muito criticada pelos estudiosos do direito agrário. 
Defendem eles que a expressão utilizada pelo Constituinte não satisfaz 
plenamente as preocupações com a total dimensão do problema agrário, o 
qual não se resume só à questão da propriedade, pois engloba também a 
função social da posse e dos contratos agrários. Daí, sustenta-se a 
predileção pela expressão genérica "função social da terra" (67) ou "função 
social do imóvel rural", (68) de que seriam espécies a "função social da posse 
agrária" e a "função social dos contratos agrários". 
 Porém, dadas as finalidades deste estudo, que exorbitam o campo 
da função social do imóvel rural, com a vênia dos jus-agraristas, tem-se por 
escusável a utilização da consagrada expressão "função social da 
propriedade". 
 Na esteira da repercussão do princípio da função social em face do 
novo regime da posse agrária, ensina outro ilustre professor GETÚLIO 
TARGINO LIMA, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás, 
em obra já mencionada, a posse de imóvel rural não mais pode ser 
encarada como simples exercício de um dos poderes inerentes ao domínio, 
mas sim como um comportamento em relação à coisa que tenha por 
pressuposto o cumprimento da função social. 
 Essa nova concepção de posse agrária vem contaminando a 
jurisprudência dos tribunais estaduais, não sendo raro encontrar assentado 
em acórdãos que "não se concebe mais a posse como mera emanação do 
domínio. O poder fático sobre a coisa (posse), a partir do regramento 
constitucional, se caracteriza pelo uso econômico do bem". (69) 
 Ressalte-se, porém, não serve esse raciocínio de incentivo a 
invasões de terra praticadas a pretexto de fazer cumprir a função social. 
Conforme jurisprudência do TJRS, citando acórdão do TAMG, não constitui 
"o principio constitucional da função social da propriedade justificativa de 
 27
invasão, a permitir a realização de justiça pelas próprias mãos." (70) 
 Assentado tudo isso, já se pode dizer alguma coisa sobre as regras 
que dão densidade ao princípio da função social do imóvel rural. Essas 
considerações, contudo, serão feitas de maneira perfunctória, dado o 
recorte temático do trabalho. 
 Pois bem. Como antes mencionado, não houve maior preocupação 
da Constituição com a concretização das normas que dispõem acerca do 
princípio da função social da propriedade, salvo em relação aos imóveis 
rurais e, com menor intensidade, em face dos imóveis urbanos. 
 Enfocando os imóveis urbanos, o tratamento um pouco mais 
específico que a Constituição lhes reservou não impediu fosse o tema 
tratado com alto grau de abstração. Dispõe o art. 182, §2º, da CF/88, que a
"propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências 
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor." (CF, art. 
182, §2º). Desse modo, restou ao legislador municipal ampla margem de 
poder para dizer como será cumprida a função social. A lei do plano diretor 
tratará do assunto. Mas a Constituição também cuida da edição de leis 
municipais específicas (no §4º do mesmo artigo) que poderão regulamentar 
exigências menos genéricas - se comparadas às previsões do plano diretor -
, nos termos definidos na recente Lei 10.257, de 11/07/2001, (71) sob pena 
de serem aplicadas as sanções previstas nos incisos I a IV do mesmo 
parágrafo 4º do art. 182 da CF/88. 
 No tocante aos imóveis rurais, entretanto, a Constituição foi menos 
generosa para com o legislador. De início, percebe-se que só a União 
Federal possui competência material para promover a desapropriação por 
descumprimento da função social do imóvel rural (caput do art. 184), bem 
como para legislar sobre os requisitos a serem atendidos (caput do art. 
186). E dessas restrições, com base na teoria dos poderes implícitos, (72) 
pode-se extrair outra: só a União detém atribuição para fiscalizar e 
controlar a observância da função social do imóvel rural. 
 Conforme consta do artigo 2º da Lei 8.629, de 25/02/93, a 
atribuição para ingressar no imóvel rural, em nome da União, para fins de 
levantamento de dados, é realizada por intermédio de "órgão federal 
competente" (§2º do art. 2º), (73) tarefa essa que vem sendo observada por 
uma autarquia federal, no caso, o INCRA – Instituto Nacional de 
Colonização e Reforma Agrária. Nada indica, porém, essa competência de 
controle tenha sido dada com exclusividade à União, motivo pelo qual se 
afigura válida a possibilidade de delegação a Estados-membros, Distrito 
Federal ou a municípios. (74) 
 Volvendo à Constituição, percebe-se que o art. 185 estabelece zona 
de imunidade à desapropriação por interesse social para fins de reforma 
agrária, mesmo que a função social não esteja sendo observada, em 
relação: (a) à pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, 
desde que seu proprietário não possua outra; e (b) à propriedade produtiva.
 Nesse prumo, a conceituação de pequena e média propriedade 
 28
rural só veio a ser estabelecida com o art. 4º da Lei 8.629/93, pelo qual 
ficou assentado que pequena propriedade é aquela com área compreendida 
entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais (75) e média propriedade é o 
imóvel rural (76) de área superior a 4 (quatro) e até 15 (quinze) módulos 
fiscais. 
 Critica-se a dimensão dessa imunidade expropriatória em relação à 
grande propriedade produtiva, dizendo que a produtividade é apenas um 
dos elementos da função social, motivo pelo qual não basta ser produtivo o 
imóvel rural para que seja considerado cumpridor do princípio. (77) Contudo, 
defende CELSO RIBEIRO BASTOS a opção da Constituição, afirmando que 
parcelar "a propriedade produtiva é prenúncio quase certo de diminuição da 
produção com conseqüente degradação dos níveis sociais já atingidos." (78) 
Desse modo, mesmo que sem o aplauso de toda doutrina pátria, o fato é 
que essa imunidade expropriatória da terra produtiva foi expressamente 
consagrada pela Constituição, que previu ainda a edição de lei que garanta 
tratamento especial ao imóvel rural produtivo, fixando normas para o 
cumprimento dos requisitos da função social (par. único do art. 185). 
 Neste ponto, cabem breves digressões em torno dos pressupostos a
serem observados no atendimento da função social do imóvel rural. A 
começar das regras enumeradas pelo art. 186 da Constituição, o imóvel 
rústico deverá simultaneamente satisfazer os seguintes requisitos: (a) 
aproveitamento racional e adequado; (b) utilização adequada dos recursos 
naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; (c) observância das 
disposições que regulam as relações de trabalho; (d) exploração que 
favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. 
 De conseguinte, fala-se que o preenchimento da função social do 
imóvel rural exige a presença simultânea de requisitos espalhados em três 
óticas: (79) (a) econômica, ligada à "produtividade" do imóvel rural, ou seja, 
seu aproveitamento racional e adequado; (b) social, abraçando as 
disposições que regulam as relações de trabalho e as que contemplam o 
bem-estar dos que exploram a terra (incluídos aí não só os proprietários e 
trabalhadores, mas os que detém a posse direta do imóvel); (c) ecológica, 
relacionada com a preservação do meio ambiente, concebido como direito 
fundamental de terceira geração, garantido-o à presente e futuras 
gerações.
(80) 
 Por óbvio, a Constituição, no caput do art. 186, previu que esses 
requisitos fossem fixados por lei, de modo a atender às peculiaridades da 
região onde se situa cada imóvel rural. E essa tarefa foi confiada à Lei 
8.629/93. 
 Em linhas gerais, o esquema legislativo de fixação dos critérios de 
cumprimento da função social do imóvel rural, conforme estabelecidos pela 
Lei 8.629/93, atualmente alterada pela MP 1.577, de 11/06/97, e reedições 
(atualmente, MP 2.183-56, de 24/08/2001), pode assim ser resumido. 
 O reconhecimento da produtividade da gleba exige sejam atingidos, 
cumulativamente, nos termos do art. 6º da Lei 8.629/93: (a) um percentual
mínimo de 80% do grau de utilização da terra (GUT), e; (b) um percentual 
 29
igual ou superior a 100% do grau de eficiência da exploração econômica 
(GEE). 
 O cálculo do índice do GUT considera a área efetivamente utilizada 
do imóvel, em cotejo com a área potencialmente utilizável, excluídas, desse 
último conceito, por força do art. 10 da Lei 8.629/93, as áreas ocupadas por
construções e instalações, excetuadas aquelas destinadas a fins produtivos, 
como estufas, viveiros, sementeiros, tanques de reprodução e criação de 
peixes e outros semelhantes; as áreas comprovadamente imprestáveis para 
qualquer tipo de exploração agrícola, pecuária, florestal ou extrativa 
vegetal; as áreas sob efetiva exploração mineral; as áreas de efetiva 
preservação permanente e demais áreas protegidas por legislação relativa à 
conservação dos recursos naturais e à preservação do meio ambiente. 
 De sua vez, o GEE é obtido por meio da aplicação de sistemática de 
cálculo que leva em consideração a destinação econômica da gleba em face 
de índices de rendimento considerados medianos, de acordo com a região 
onde se localiza o imóvel. Assim, determina o art. 6º, §2º, da Lei 8.629/93, 
que, para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada 
produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecidos pelo órgão 
competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea (inciso 
I); para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades 
Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão 
competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea (inciso 
II). Então, a soma dos resultados obtidos na forma anterior é dividida pela 
área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determinando-se 
assim o grau de eficiência na exploração (GEE) do imóvel rural. Dessa 
forma, um imóvel com níveis de exploração econômica mais eficientes que 
aqueles relativos à média exigida pelos órgãos oficiais poderá obter um 
percentual superior a 100% de GEE. 
 Nada obstante, não há registro de que o Poder Público venha 
respeitando a regra do art. 11 da Lei 8.629/93, que mesmo antes da 
alteração determinada pela MP 1.577/97, já exigia que, na fixação dos 
parâmetros, índices e indicadores que informam o conceito de produtividade
fosse ouvido também o Conselho Nacional de Política Agrícola. 
 De outro turno, mostra-se razoável a Lei 8.629/93, ao não retirar a 
qualificação de propriedade produtiva do imóvel que, por razões de força 
maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, 
devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no
ano respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a 
espécie (art. 6º, §7º). Assim, os danos à produtividade decorrentes de 
esbulho da área podem ser considerados albergados por essa norma legal, 
como já reconheceu o STF. (81) 
 Pela ótica social, considera a lei que a terra, mesmo produtiva, 
poderá estar desatendendo à função social se quem a explora o faz com 
desrespeito às leis trabalhistas, às disposições dos contratos agrários, bem 
como se não forem observadas as normas de segurança do trabalho ou 
provoca conflitos e tensões sociais no imóvel (§§4º e 5º do art. 9º da Lei 
8.629/93). Aqui, portanto, é importante identificar o agente provocador do 
 30
conflito social, pois com ele a lei não se compadece. Daí por que se 
afiguram materialmente corretas as disposições contidas na atual MP 2.183-
56/2001, que inseriram os §§6º a 8º na redação do art. 2º da Lei 8.629/93. 
(82) 
 O último dos requisitos - mas nem por isso menos importante - a 
ser brevemente analisado diz respeito à utilização adequada dos recursos 
naturais disponíveis e preservação do meio ambiente. 
 De efeito, considera-se adequada a utilização dos recursos naturais 
disponíveis quando a exploração se faz respeitando a vocação natural da 
terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade (§2º do art. 
9º da Lei 8.629/93). E por preservação do meio ambiente deseja a lei a 
manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos 
recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio 
ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades 
vizinhas (§3º do art. 9º da Lei 8.629/93). (83) 
 Neste ponto, percebe-se a necessidade de ponderar os aspectos 
relativos ao aproveitamento racional e adequado do imóvel rural (ótica 
econômica) em face daqueles referentes à adequada utilização dos recursos 
naturais e a preservação do meio ambiente (ótica ecológica). Assim, na 
fixação dos requisitos da função social do imóvel rural, a lei há de observar 
uma razoabilidade interna (84) que permita a eleição de critérios adequados 
tanto sob a ótica econômica quanto ecológica, daí o motivo de a 
Constituição mencionar, em ambos os casos, a questão da adequabilidade 
(cf. os incisos I e II do art. 186). Dessarte, a fixação do GUT e o GEE não 
pode perder de rumo a vedação à exploração econômica depredatória. É 
preciso saber se os parâmetros de produtividade que vêm sendo fixados 
pelos órgãos do Executivo não estão trabalhando com padrões por demais 
genéricos, ou que não levem em consideração certas peculiaridades ligadas 
à localização dos imóveis rurais. 
 Essa importante questão, aliás, sujeita-se ao controle judicial não 
só para verificar se o "núcleo essencial" do direito de propriedade está 
sendo preservado, diante de eventuais imposições concretamente 
inatingíveis, mas principalmente para que não se exijam graus de 
exploração econômica mais elevados que a própria capacidade de 
regeneração natural do imóvel rural. 
8 – DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE IMÓVEL E O NOVO CÓDIGO 
CIVIL 
 Por tudo que foi dito, considerando que a lei há de ser interpretada 
sob a ótica constitucional da qual retira validade, é justificado fazer-se uma 
releitura das normas infraconstitucionais acerca da propriedade à luz do 
princípio da função social. E não há por que excluir desse tratamento 
hermenêutico sequer antigos institutos de direito privado, cujas origens 
remontam o tempo do direito romano. Aqueles recepcionados pela 
Constituição passam a valer ungidos pela função social que condiciona o 
 31
exercício da titularidade da propriedade. Nas palavras de ARAÚJO SÁ: 
 A função social, portanto, na concepção dos estudiosos mais 
acatados, incide no conteúdo do direito de propriedade, impondo-lhe novo 
conceito. A constituição posiciona a propriedade privada como princípio da 
ordem econômica, submetendo-a aos ditames da justiça social. É dizer que 
se legitima a propriedade enquanto cumpre sua função social. É importante 
destacar que a disciplina constitucional deve orientar a compreensão das 
normas de direito privado sobre o direito de propriedade, e não o contrário, 
como costuma ocorrer na prática jurídica nacional. (85) 
 Nessa perspectiva, pelo novo Código Civil, instituído pela Lei 
10.406, de 10/01/2002 (que entrará em vigor um ano após sua publicação, 
ocorrida em 11/01/2002),
a questão da função social da propriedade no 
Brasil recebe importantes contribuições e institutos. 
 A começar da seção das disposições preliminares do título relativo à
propriedade (Seção I do Capítulo I do Título III do Livro III da Parte 
Especial), logo após seu respectivo conceito (caput do art. 1.228), o novo 
Código já cuida de traçar pressupostos à utilização do direito de 
propriedade. Seu exercício deverá fazer-se "em consonância com as suas 
finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de 
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as 
belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, 
bem como evitada a poluição do ar e das águas" (§1º do art. 1.228). 
 Assim, a par de reservar à lei especial o tratamento da ótica 
ecológica da função social, optou o legislador civil por avançar na 
positivação do princípio relativo às finalidades econômicas e sociais da 
propriedade, propiciando ao juiz estabelecer as respectivas regras 
concretas. Foi agora explicitado o que no Código antigo era princípio geral 
implícito norteador do direito de propriedade. (86) 
 Aliás, inova o recente Código ao indicar algumas regras ligadas à 
finalidade social e econômica da propriedade. Esse o caso da norma do art. 
1.229, que apesar de inserir na abrangência da propriedade do solo o 
espaço aéreo e subsolo, (87) retira a garantia de proteção do direito do 
proprietário se desenvolvidas atividades por terceiros a "uma altura ou 
profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las." 
 Da mesma forma, o §2º do art. 1.228 consagrou proibição ao 
abuso do direito de propriedade, ao estabelecer serem "defesos os atos que 
não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam 
animados pela intenção de prejudicar outrem." 
 Nessas regras, a intenção da lei é clara. A propriedade também é 
concebida como fato econômico e social. Daí, restam afastadas pretensões 
emulatórias, meramente egoísticas ou idiossincráticas de seu titular, o qual 
não pode opor o direito de propriedade tão-só para prejudicar terceiros. (88) 
É o velho abuso do direito convertido em tipo de descumprimento da função 
social da propriedade. Portanto, a interpretação do §2º do art. 1.228 deve 
ser conciliada com disciplina geral do novo Código acerca do abuso de 
 32
direito (art. 187). É dizer, no estudo da incidência do §2º do art. 1.228, 
está o hermeneuta autorizado a considerar ilícitos os atos que 
manifestamente excedam os limites impostos pela finalidade econômica ou 
social da propriedade, pela boa-fé (objetiva) ou pelos bons costumes. E a 
constitucionalidade de tais preceitos não desperta controvérsias, na medida 
em que a função social compõe o próprio direito de propriedade, que aliás 
não é absoluto - até porque se relaciona com mais de um só sujeito. (89) 
 Em matéria de aquisição da propriedade imóvel por usucapião, a 
Lei 10.406/2002 também é inovadora. (90) O Código de 1916 prevê somente 
"o" usucapião (91) ordinário e o usucapião extraordinário. Os requisitos do 
primeiro prescindem da boa-fé do possuidor, mas dependem da posse 
ininterrupta, e sem oposição, por longos 20 anos. Já no extraordinário, 
exige-se a boa-fé do adquirente, mas o tempo de posse é menor: 10 ou 15 
anos, conforme se trata ou não de pessoas que residem no mesmo 
município. 
 Na nova sistemática, foram reproduzidas nos artigos 1.239 e 1.240 
as hipóteses de usucapião criadas pela CF/88, (92) bem como diminuído o 
prazo da usucapião ordinária para 15 anos (caput do art. 1.238), salvo se o 
possuidor houver estabelecido no imóvel moradia habitual ou nele realizado 
obras ou serviços de caráter produtivo, caso em que o prazo cai para 10 
anos (par. único do art. 1.238). (93) 
 Aqui, mais uma vez, sente-se a preocupação com a função social da
propriedade. (94) A constituição de moradia habitual ou (note-se o caráter 
alternativo dos requisitos) a realização de obras ou serviços que remedeiem 
a inércia do proprietário reduz o prazo da usucapião, ainda que ausente a 
boa-fé do possuidor. 
 Com relação ao estabelecimento de "moradia", talvez influenciado 
pela dicção dos artigos 183 e 191 da CF/88, (95) o novo Código foge de sua 
própria sistemática, abandonando o emprego das consagradas expressões 
"domicílio" e "residência" (art. 70 e seguintes). Dessarte, moradia não se 
confunde com domicílio e tampouco precisa ser a única do possuidor. 
Porém, o conceito de moradia está historicamente ligado ao de habitação. 
(96) Logo, apesar de a redução valer para estrangeiros (ressalvada a 
hipótese do art. 190 da CF/88), é imprópria sua utilização para pessoas 
jurídicas. Outra, aliás, não é a diretriz dos arts. 183 e 191 mencionados. (98) 
Além disso, ao exigir que o possuidor tenha estabelecido no imóvel "sua" 
moradia, a redação do par. único do art. 1.238 não deixa dúvidas quanto ao
caráter pessoal e indelegável da habitação, pelo que a redução do prazo 
não se aplica, e. g., quando, no interstício, tenha havido locação ou 
arrendamento do imóvel. Por fim, de modo a evitar abusos, o critério da 
"habitualidade" da moradia deverá ser verificado com parcimônia pelo juiz. 
"Habitual" não se confunde com "ocasional". 
 Nada obstante, é possível o aproveitamento do tempo de posse do 
antecessor (art. 1.243), desde que presentes as mesmas condições exigidas
ao atual possuidor. E aqui, ao contrário da regra do art. 9º, §3º, do 
Estatuto da Cidade, (99) a usucapião do par. único do art. 1.238 não exige 
que o sucessor da posse já resida no imóvel por ocasião da abertura da 
 33
sucessão do antecessor. Basta que à posse anterior se some tempo 
suficiente de moradia do sucessor. 
 De sua vez, não são quaisquer obras ou serviços que possibilitam a 
redução do prazo da usucapião ordinária. Exige-se o caráter produtivo. 
Assim, em imóveis urbanos, tratando-se de regra excepcional cuja 
interpretação se deve fazer restritivamente, é indevida a aplicação da 
redução do prazo, v. g., em caso de imóvel utilizado como local de simples 
lazer do possuidor. É bem verdade que o art. 182 da CF/88, ao tratar da 
política de desenvolvimento urbano, fixa o objetivo de "ordenar o pleno 
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de 
seus habitantes" (destacou-se). Assim, poder-se-ia argumentar, obras 
destinadas ao lazer satisfariam a política de garantir "bem-estar" ao 
possuidor de imóvel urbano. Contudo, além de a preocupação com o bem-
estar do habitante dizer respeito à política confiada ao "Poder Público 
municipal", não se confundindo assim com a usucapião regulamentada por 
lei federal, não se pode baralhar "caráter produtivo" com "bem-estar do 
habitante". Não bastasse o fato da barreira linguística (100) – aqui 
insuperável pelo intérprete –, quando a Constituição quis, de certa forma, 
aproximar conceitos tão diversos, usou expressões do tipo "adequado 
aproveitamento", a exemplo do que ocorreu no §4º do mesmo art. 182. 
 Quanto a imóveis rurais, aplica-se supletivamente a legislação que 
cuida da verificação da produtividade como requisito para desapropriação 
por interesse social para fins de reforma agrária. 
 Em relação à usucapião extraordinária, o recém-aprovado Código 
não mais distingue o prazo aquisitivo com base na residência dos sujeitos 
envolvidos. Unificou-se em 10 anos o período necessário para usucapir. 
Porém, foi diminuído para 5 anos o prazo "se o imóvel houver sido 
adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo 
cartório, cancelada (sic) posteriormente, desde que os possuidores nele 
tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse
social e econômico" (par. do art. 1.242). (101)
Desse modo, ainda que qualificada pela boa-fé na formal aquisição 
onerosa de imóvel, outra vez a função social impõe redução ao prazo 
prescricional aquisitivo. Porém, as hipóteses não se assemelham 
inteiramente às do par. único do art. 1.238. Em primeiro plano, porque a lei 
não exige habitualidade na morada. (102) Em segundo lugar, no caso da 
usucapião extraordinária de prazo reduzido, dispensa o Código o "caráter 
produtivo" das obras e serviços realizados no imóvel, contentando-se com a 
exteriorização de "investimentos de interesse social e econômico". Logo, 
amplia-se o leque de possibilidades de incidência da nova regra. 
 Ao final, considerando a própria característica particular do imóvel a
que se refere o art. 1.238, o "interesse social" aqui é entendido de forma 
ampla, abrangendo não só interesses da coletividade mas também aqueles 
que, apesar de aparentemente individuais, devam ser incentivados, 
garantidos ou patrocinados pelo Estado. É dizer, a indeterminação do 
conceito de "interesse social" será preenchida, caso a caso, à luz de 
determinadas diretrizes contidas na Constituição e leis vigentes. Daí, v. g., 
 34
investimentos destinados à "convivência familiar" ou ao "lazer" de crianças 
e adolescentes alavancam a redução do prazo da usucapião extraordinária, 
pois o caput do art. 227 da CF/88 contém princípio programático de atuação
estatal nesse sentido. 
 Em matéria de perda da propriedade, contudo, a maior inovação do 
Código de 2002 diz respeito aos §§4º e 5º do art. 1.228: 
 Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor 
da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a 
possua ou detenha. 
 § 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância 
com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam 
preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a 
fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e 
artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. 
 § 2o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer 
comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar 
outrem. 
 § 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de 
desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, 
bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente. 
 § 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel 
reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, 
por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela 
houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços 
considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. 
 § 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa 
indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como 
título para o registro do imóvel em nome dos possuidores. 
 Assim, por força do §4º, poderá o juiz decretar a perda da 
propriedade sobre imóvel de extensa área, havendo ininterrupta posse de 
boa-fé, por mais de cinco anos, por parte de considerável número de 
pessoas, desde que os possuidores tenham na área realizado, em conjunto 
ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse 
social e econômico relevante. De outro lado, exige o §5º seja fixada justa 
indenização ao proprietário, condicionando ainda o registro do imóvel em 
nome dos possuidores somente quando for pago o preço. 
 Por tais normas, ao condicionar a perda da propriedade a 
considerações ligadas ao interesse social e econômico relevante, mais uma 
vez se revela a preocupação do legislador com a função social da 
propriedade. Contudo, o novo instituto apresenta numerosos problemas. 
 Em primeiro lugar, não se trata de forma de usucapião, pois a 
 35
efetiva perda da propriedade deve ser antecedida de indenização 
equivalente ao "preço" do imóvel. Ademais, ao contrário da típica sentença 
de cunho declaratório da usucapião, a hipótese em tela dá origem a 
sentença do tipo "constitutivo", na medida em que o ato judicial só terá 
eficácia translativa de domínio após o pagamento da indenização. 
 Não bastasse a exigência de indenização, distingue-se o instituto 
em tela da usucapião especial coletiva criada pelo art. 10 do Estatuto da 
Cidade (103) pois esta: (a) é de aplicação restrita às áreas urbanas com mais 
de duzentos e cinqüenta metros quadrados; (b) só se aplica a possuidores 
de baixa renda; (c) está condicionada à utilização da área para fins de 
moradia dos possuidores; (d) prescinde da posse de boa-fé; (e) exige a 
impossibilidade de se identificar os terrenos ocupados por cada possuidor; e 
(f) não beneficia possuidores que sejam proprietários de outro imóvel 
urbano ou rural. 
 De outro lado, não se pode confundir o instituto com algum tipo de 
desapropriação, pois o registro da propriedade se dá em favor de 
particulares. Assim, falta-lhe a característica mais singela da desapropriação
que é a transferência compulsória da propriedade particular (ou pública de 
entidade de grau inferior para a superior) para o Poder Público ou seus 
agentes delegados. (104) Ademais, outras objeções podem ser alinhadas: (a) 
não há procedimento administrativo que o anteceda; (b) não é o Poder 
Público quem deve suportar a despesa com a indenização; (c) já existe 
hipótese de interesse público para desapropriação em caso muito 
semelhante (art. 2º, IV, da Lei 4.132, de 10/09/62); e (d) a antiga tradição 
brasileira segundo a qual ao juiz não compete decidir sobre a oportunidade 
e conveniência da desapropriação (art. 9º do DL 3.365, de 21/06/41). 
 Por fim, se o Código enumerou a desapropriação no §3º do art. 
1.228, pode-se dizer que o §4º subseqüente criou outra forma de perda de 
propriedade pois utilizou a expressão o "proprietário também pode ser 
privado da coisa...". 
 Portanto, a regra dos §§4º e 5º do art. 1.228 da nova codificação 
parece regular caso de alienação compulsória de imóvel, cabendo ao 
Judiciário avaliar a presença dos pressupostos autorizadores, ligados ao 
interesse social ou econômico, que impõem o suprimento da vontade do 
proprietário. (105) É dizer, em prol do melhor atendimento à função social, 
permitem-se que os possuidores adquiram a propriedade do imóvel, de 
forma onerosa, mesmo contra a vontade de seu titular. 
 Nesse prumo, sob pena de não se atingir a vontade da norma, a 
alienação forçada há de ser considerada forma originária de aquisição da 
propriedade, tornando o imóvel, uma vez registrado em nome dos 
possuidores, insuscetível de reivindicação e liberado de quaisquer ônus, (106) 
cabendo aos eventuais credores somente a sub-rogação no preço pago ao 
antigo proprietário. 
 De sua vez, o novo Código não condicionou a vigência do instituto a
nenhum óbice além da cláusula geral de vigência de um ano estabelecida no
art. 2.044. (107) Assim, entrando em vigor a Lei 10.406/2002, são aplicáveis 
 36
os §§4º e 5º do art. 1.228. Dessarte, enquanto não editadas regras 
processuais específicas, deve-se utilizar o procedimento comum ordinário, 
com certas adaptações ligadas à natureza do novo instituto. (108) 
 Nada obstante, a ausência de regras processuais é problemática. 
Caso o preço não seja pago espontaneamente e não possuam os 
possuidores bem penhoráveis, o proprietário ficará em situação delicada. O 
fato de o registro da área continuar em seu nome em nada o ajuda se não 
houver fixação de prazo razoável, na sentença, para que o preço seja pago 
pelos possuidores. Esse, porém, é problema que foge à temática deste 
estudo, por merecer estudo aprofundado de direito processual, em especial 
sobre
a questão das sentenças condicionais (CPC, art. 460, par. único). 
 Quanto à contagem do prazo necessário à alienação forçada, (109) 
vê-se que a regra do art. 1.243 não se estende aos §§4º e 5º do art. 1.228.
Logo, a contrario sensu, afigura-se que o novo Código não deseja a soma 
do tempo de posse dos antecessores ao dos adquirentes. 
 Por fim, em caso de imóvel rural, a grande extensão da área deve 
ser aquilitada pelo juiz com base no art. 4º da Lei 8.629/93. Tratando-se de 
imóvel urbano, haverá de utilizar-se de algum parâmetro descrito na lei 
municipal do plano diretor (art. 182, §2º da CF/88). Na omissão do 
legislativo municipal, deve o juiz se valer da regra do art. 4º da Lei de 
Introdução ao Código Civil, mas não pode negar vigência aos §§ 4º e 5º do 
art. 1.228. 
 Mas não é tudo. A Lei 10.406/2002 veiculou outras figuras que 
devem ser interpretadas sem olvidar a íntima ligação que mantêm com o 
princípio da função social, mesmo tratando-se de institutos de longa data. 
 Nessa linha, pelos arts. 1.258 e 1.259, a construção que invada 
solo alheio pode ensejar a aquisição da propriedade da área invadida: 
 Art. 1.258. Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, 
invade solo alheio em proporção não superior à vigésima parte deste, 
adquire o construtor de boa-fé a propriedade da parte do solo invadido, se o
valor da construção exceder o dessa parte, e responde por indenização que 
represente, também, o valor da área perdida e a desvalorização da área 
remanescente. 
 Parágrafo único. Pagando em décuplo as perdas e danos previstos 
neste artigo, o construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo 
que invadiu, se em proporção à vigésima parte deste e o valor da 
construção exceder consideravelmente o dessa parte e não se puder 
demolir a porção invasora sem grave prejuízo para a construção. 
 Art. 1.259. Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo 
alheio exceder a vigésima parte deste, adquire a propriedade da parte do 
solo invadido, e responde por perdas e danos que abranjam o valor que a 
invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da 
desvalorização da área remanescente; se de má-fé, é obrigado a demolir o 
 37
que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão 
devidos em dobro. 
 Dessarte, em vez da antiga sistemática que impunha a simples 
demolição do prédio invasor, (110) em nítida preocupação com o atendimento 
à função social da propriedade, é possível manter de pé a construção, com 
a transferência da propriedade do solo invadido, independentemente da 
data do esbulho. 
 Pela nova codificação, a caracterização do abandono do imóvel foi 
facilitada, com a presunção – absoluta – da intenção de abandonar o 
imóvel, quando, cessados os atos de posse, deixar o proprietário de 
satisfazer os ônus fiscais (§2º do art. 1.276), a menos que a área se 
encontre na posse de outrem (caput do art. 1.276). (111) 
 Também as velhas regras acerca do uso nocivo da propriedade 
foram embebidas da função social. Continua assegurado o direito do 
proprietário ou possuidor de fazer cessar interferências prejudiciais à 
segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela 
utilização de propriedade vizinha (art. 1.277 do CC novo), determinando a 
lei nova, porém, se devam considerar as interferências conforme a natureza 
da utilização e a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem 
as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores
da vizinhança (par. único do mesmo artigo). (112) No entanto, prevê o novo 
Código que eventual interesse público - aqui servindo de parâmetro de 
aferição do atendimento da função social - poderá justificar a perturbação, 
"caso em que o proprietário ou o possuidor, causador delas, pagará ao 
vizinho indenização cabal" (art. 1.278, caput). Tudo sem prejuízo a que o 
vizinho possa exigir a redução ou eliminação das interferências, quando 
possível (par. do art. 1.278). 
 Não olvidando o antigo direito de passagem do dono de prédio 
encravado (art. 1.285), o Código recém-aprovado criou a figura da 
passagem de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de utilidade 
pública, em proveito dos prédios vizinhos (art. 1.286). Outra concessão à 
função social do imóvel em detrimento da propriedade privada. 
 Por fim, de certa forma, antecipa o novo Código a regulação da 
ótica ecológica da função social de propriedade, conforme diretriz contida no
§1º do art. 1.228 já comentado. 
 Nesse prumo, no art. 1.291, impõe-se a vedação de poluição, por 
parte do possuidor do imóvel superior, das águas indispensáveis às 
primeiras necessidades da vida dos possuidores dos imóveis inferiores. (113) 
 Ademais, proibiram-se construções capazes de poluir, ou inutilizar, 
para uso ordinário, a água do poço, ou nascente alheia, a elas preexistentes 
(art. 1.309), bem como escavações ou quaisquer obras que tirem ao poço 
ou à nascente de outrem a água indispensável às suas necessidades 
normais (art. 1.310). 
 38
 Contudo, a parte final do artigo 1.291 permite ao possuidor de 
imóveis superiores a poluição das águas que não forem indispensáveis às 
primeiras necessidades de vida dos possuidores dos imóveis inferiores, 
mediante recuperação ou o desvio do curso artificial das águas, se possível, 
ou o ressarcimento dos danos sofridos. Nessa parte, porém, ao admitir a 
possibilidade de poluição de águas, o novo Código retrocedeu, já que a 
disciplina da matéria está melhor tratada na Lei 6.938, de 31/08/81, que 
dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, e respectivos 
regulamentos. (114) Logo, seria melhor manter a diretriz fixada no art. 1.228,
§1º, que remetia a questão à legislação especial. 
8 – CONCLUSÕES 
 1. Superando velhas concepções absolutistas, a idéia da função 
social alterou a estrutura do direito de propriedade, convertendo-o em 
poder-dever voltado à destinação do bem a objetivos que, transcendendo o 
simples interesse do proprietário, venham a satisfazer indiretamente as 
necessidades dos demais membros da comunidade. 
 2. Na Constituição de 1988, a função social da propriedade tem 
status de princípio constitucional que norteia o exercício do direito de 
propriedade (inciso XXIII do art. 5º e inciso III do art. 170). Nada obstante, 
a Constituição também materializou regras relativas à função social em 
artigos específicos (redação original do §1º do art. 156, hoje alterado pela 
EC n. 29, de 13/09/2000; §2º do art. 182; caput do art. 184; par. único do 
art. 185; art. 186; e inciso I do §1º do art. 173, na redação dada pela EC n.
19, de 04/06/98). 
 3. A função social vigora em relação a toda e qualquer propriedade 
privada, material ou imaterial, individual ou coletiva, urbana ou rural, móvel
ou imóvel, cabendo à lei regular a forma com que se considera atingido o 
princípio em relação a cada tipo de propriedade, conforme a destinação 
reservada aos respectivos bens. 
 4. No entanto, ao disciplinar os requisitos de cumprimento da 
função social, não poderá o legislador desviar-se de sua finalidade 
normativa, erigindo deveres desarrazoados ou que tornem impraticável o 
exercício do direito de propriedade. Ademais, a não-satisfação do princípio 
só haverá de acarretar as conseqüências estabelecidas na própria 
Constituição. 
 5. A alteração da estrutura do direito de propriedade promovida 
pelo princípio da função social justifica a releitura das normas 
infraconstitucionais acerca da propriedade, mesmo aqueles antigos 
institutos de direito privado, cujas origens remontam o tempo do direito 
romano. 
 6. Nessa perspectiva, o novo Código Civil, instituído
pela Lei 
10.406/2002, incorpora a preocupação com a observância do princípio da 
 39
função social em muitos momentos, a começar da própria conceituação do 
direito de propriedade em geral, cujo exercício deverá pautar-se de acordo 
com finalidades econômicas, sociais e voltadas à preservação do equilíbrio 
ecológico, do patrimônio histórico e artístico (§1º do art. 1.228). 
 7. Além disso, a influência do princípio da função social da 
propriedade na Lei 10.406/2002 é sentida em várias outras inovações 
normativas, entre as quais se destacam: (a) a supressão da garantia de 
proteção do direito do proprietário se desenvolvidas atividades por terceiros 
a "uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em
impedi-las" (art. 1.229); (b) a proibição ao abuso do direito de propriedade 
(§2º do art. 1.228); (c) diminuição do prazo de usucapião considerando a 
fixação, no imóvel, de moradia habitual ou a realização de obras ou serviços
de caráter produtivo (par. único do art. 1.238); (d) a alienação forçada 
prevista nos §§4º e 5º do art. 1.228; (e) a aquisição de propriedade por 
meio de construção invasora (arts. 1.258 e 1.259); (f) a facilitação da 
caracterização do abandono de imóvel foi facilitada; (g) a tolerância ao uso 
nocivo da propriedade quando existente interesse público que justifique a 
perturbação (art. 1.278, caput); (g) o direito de passagem de cabos, 
tubulações e outros condutos subterrâneos de utilidade pública, em proveito
dos prédios vizinhos (art. 1.286); (h) a vedação de poluir as águas 
indispensáveis às primeiras necessidades da vida dos possuidores dos 
imóveis inferiores (no art. 1.291); (i) a proibição de construções capazes de 
poluir, ou inutilizar, para uso ordinário, a água do poço, ou nascente alheia, 
a elas preexistentes (art. 1.309), bem como de escavações ou quaisquer 
obras que tirem ao poço ou à nascente de outrem a água indispensável às 
suas necessidades normais (art. 1.310). 
 8. Nada obstante, tais inovações despertarão problemas sérios, 
especialmente a alienação forçada, bem assim nem sempre representam 
progressos, a exemplo do art. 1.309, se comparadas com a legislação 
preexistente. No entanto, é positivo o saldo deixado pela nova codificação 
em matéria de regulamentação do princípio da função social. 
Notas 
 01. Mais exatamente, anota EROS ROBERTO GRAU, o pressuposto 
da função social é a propriedade privada, pois seria pleonasmo falar-se em 
função social da propriedade coletiva (Os princípios e as regras jurídicas. In 
____. A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica). 
São Paulo: RT, 1990, p. 244). Ressalte-se que esse comentário de GRAU 
consta em obra publicada em 1990. Porém, ele próprio já havia mencionado
a possibilidade de a função social se referir às empresas estatais, como veio 
a ser recentemente positivado pela EC n. 19/98, que alterou a redação do 
art. 173, referindo-se à função social das empresas públicas, sociedades de 
economia mista e suas subsidiárias. 
 02. A expressão é de EROS ROBERTO GRAU (op. cit., p. 251). 
 03. Pela didática divisão das limitações da propriedade feita por 
 40
ARNOLDO WALD (Curso de direito civil brasileiro. Vol. III. Direito das coisas.
10. ed. São Paulo: RT, p. 114 e seguintes), podem-se distinguir três ordens 
de limitações. As voluntárias formam aquelas criadas por ato dispositivo do 
próprio proprietário, como a concessão de direitos reais limitados em favor 
de terceiros (usufruto, servidão, uso), bem assim a instituição de cláusulas 
resolutórias que eliminam o caráter perpétuo do direito (fideicomisso, venda
com reserva de domínio, alienação fiduciária) ou a faculdade de dispor do 
bem (cláusula de inalienabilidade). As existentes no interesse particular são 
limitações às quais se enquadram as regras de direito de vizinhança, em 
caráter suplementar às limitações administrativas. Por fim, as limitações 
existentes no interesse público, segundo WALD, são repercussão das 
emanações da soberania estatal representadas pela tributação, a 
desapropriação e a requisição. Sobre essas últimas, porém, os 
administrativistas não concordam com tal classificação lato sensu de 
limitações. Preferem eles distinguir espécies pertencentes ao gênero das 
restrições do Estado sobre a propriedade privada, entre as quais se incluem 
as chamadas limitações administrativas propriamente ditas (v. g., DI 
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 8. ed. São Paulo: 
Atlas, 1997, p. 101/153). 
 04. Nesse sentido, com fulcro em estudo de CARLOS ARI SUNFELD, 
veja-se EROS ROBERTO GRAU, op. cit., p. 250-251. Cf. especialmente o 
artigo de ARAÚJO SÁ, Adonis Callou de. Função social da propriedade e 
preservação ambiental. Boletim dos Procuradores da República, n. 19, p. 
10-18, nov. 1999). 
 05. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 
15. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 276. 
 06. Função social da propriedade e preservação ambiental, Boletim 
dos Procuradores da República, n. 19, p. 10-18, nov. 1999. 
 07. Cf. "O papel do Poder Judiciário na efetivação da função social 
da propriedade". Cadernos Renap – Rede Nacional dos Advogados e 
Advogadas Populares n. 2, nov. 2001, p. 36. 
 08. Teoria de derecho agrario, v. 2, p. 472-473, apud BORGES, 
Paulo Torminn. Institutos básicos do direito agrário. 7. ed. São Paulo: 
Saraiva, 1992, p. 8-9. 
 09. Apud TEPEDINO e SCHREIBER, op. cit., p. 40. 
 10. Direito agrário brasileiro. 2. ed. Goiânia: AB Editora, 1998, p. 
49-53. 
 11. BORGES, op. cit., p. 5 e seguintes. 
 12. Apud MARQUES, op. cit., p. 49. 
 13. MARQUES, op. cit., p. 50. 
 41
 14. Op. cit., p. 38. 
 15. Idem. 
 16. Direito administrativo. 8. ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 
104/105. 
 17. É este o teor do art. 2º do Estatuto da Terra, na parte em que 
tratou da função social: 
 "Art. 2° É assegurada a todos a oportunidade de acesso à 
propriedade da terra, condicionada pela sua função social, na forma 
prevista nesta Lei. 
 § 1° A propriedade da terra desempenha integralmente a sua 
função social quando, simultaneamente: 
 a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que 
nela labutam, assim como de suas famílias; 
 b) mantém níveis satisfatórios de produtividade; 
 c) assegura a conservação dos recursos naturais; 
 d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de 
trabalho entre os que a possuem e a cultivem." 
 18. Cf. art. 157, III, da CF/67 e art. 160, III, da CF/69. 
 19. Op. cit., p. 105/106. 
 20. Sobre o assunto, cf. LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do 
direito. 3. ed. Trad. José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 
1997, p. 350-389. 
 21. Nesse sentido, apoiando-se em ALEXY, DWORKIN e 
CRISAFULLI, cf. PAULO BONAVIDES, Curso de direito constitucional. 5. ed. 
São Paulo: Malheiros, 1994, p. 243. Outrossim, v.g.: CANOTILHO, J. J. 
Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 3. ed. Coimbra: 
Almedina, 1998, p. 1.086; GRAU, op. cit., p. 122-128; BARROSO, Luís 
Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 2. ed. São Paulo: 
Saraiva, 1998, p. 141; BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da 
proporcionalidade e o controle de constitucionalidade de leis restritivas de 
direitos fundamentais. Brasília: Brasília Jurídica, 1996, p. 153. Contra: JOSÉ
AFONSO DA SILVA, para quem a junção de regras e princípios no conceito 
de normas "exige a conceituação precisa de norma e regras, inclusive para 
estabelecer a distinção entre ambas, o que os expositores da doutrina não
têm feito, deixando assim obscuro seu ensinamento" (Curso..., p. 96). 
 22. É importante de antemão evidenciar que o conceito adotado de 
"disposição" é sinônimo do de "preceito", mas se difere daquele de "norma 
 42
jurídica". Com base em CANOTILHO e VITAL MOREIRA, designar-se-á "por 
‘disposição’ ou ‘preceito’ o simples enunciado de um texto ou documento 
normativo; e por ‘norma’ o significado jurídico-normativo do enunciado 
lingüístico" (Fundamentos da Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 1991,
p. 47). Equivale a dizer, "disposição é a parte de um texto ainda a 
interpretar" e "norma é parte de um texto já interpretado" (CANOTILHO, 
Dir. const. e teoria..., p. 1.128). 
 23. Cf. REVORIO, Franciso Javier Días. Valores superiores e 
interpretación constitucional. Madrid: Centro de Estudos Políticos y 
Constitucionales, 1997, p. 101-102. 
 24. Dir. const. e teoria..., p. 1.177. 
 25. Cf. REVORIO, op. loc. cit. 
 26. Curso de direito administrativo. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 
1996, p. 545-546. Esse conceito de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO 
também é adotado por BARROSO, op. cit., p. 143 e citado por GRAU, op. 
cit., p. 97. 
 27. Op. cit., p. 49. 
 28. Curso..., p. 96. Tal conceito é válido para o presente estudo, a 
despeito de seu autor não concordar com a submissão dos princípios ao 
gênero das normas. 
 29. Op. cit., p. 257. 
 30. Segundo CANOTILHO, a distinção entre princípios e regras pode
ser apontada pelos seguintes critérios: a) grau de asbtração; os princípios 
são normas com grau de abstração superior; b) grau de determinalidade: 
na aplicação do caso concreto, ao contrário dos princípios, as regras são 
suscetíveis de aplicação direta; c) caráter de fundamentabilidade: os 
princípios são normas com um papel fundamental no ordenamento jurídico, 
devido à sua posição de hierárquica no sistema das fontes de direito ou à 
sua importância estruturante dentro do sistema jurídico; d) "proximidade" 
da idéia do direito: os princípios são "standards" juridicamente vinculantes 
radicados nas exigências de "justiça" (DWORKIN) ou na "idéia de direito" 
(LARENZ), enquanto as regras podem ser vinculativas em razão de 
conteúdo meramente funcional; e) natureza normogenéticas: os princípios 
são fundamentos que constituem a ratio das regras jurídicas. Cf. Direito 
constitucional..., p. 1.086-1.087. 
 31. GRAU, de sua vez, utilizou-se de vários autores, com aparente 
predileção pelas lições de RONALD DWORKIN. 
 32. Apud BONAVIDES, op. cit., p. 253. No mesmo sentido, GRAU, 
op. cit., p. 107. 
 33. Contrariamente, ALEXY admite obtemperamento ao caráter 
 43
definitivo das regras exposto por DWORKIN. Diz o mestre alemão que, em 
razão da decisão de um caso concreto, é possível introduzir numa regra 
alguma cláusula de exceção a partir da qual aquela perde seu caráter 
definitivo para a decisão. Afirma ainda que a cláusula de exceção pode ser 
criada com base num princípio, daí por que, ao contrário do que pretende 
DWORKIN, existiriam cláusulas de exceção que não poderiam sequer ser 
teoricamente enumeradas, conferindo assim às regras certo caráter prima 
facie (ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. 2. reimp. 
Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2001, p. 99-100). 
No entanto, como ficará melhor exposto, tal concepção de ALEXY gera 
problemas no estudo da questão relativa ao afastamento ou não da regra 
quando há de prevalecer, contra o princípio que lhe dá base, um princípio 
opositor. 
 34. É bem verdade que, para atingir a abstração e generalidade 
desejadas, as regras jurídicas devem ser formuladas em linguagem textual 
aberta, mas nem por isso é acertado dizer que estejam elas sujeitas a 
exceções que não podem ser previamente especificadas. De efeito, é 
justamente em razão de sua "textura aberta" que se admite que uma regra 
se aplique a esta e não àquela situação. Mesmo quando a regra não seja 
aplicada em face de situações futuras, pois não contempladas em seu 
enunciado, não há que se falar em exceção, e sim em não incidência da 
regra. Cf. GRAU, op. loc. cit. 
 35. A idéia de conformação dos princípios como mandamentos de 
otimização (Optimierungsgebot) é de ALEXY (Teoria..., cit.) e parece ser 
também adotada por CANOTILHO, que trata os princípios como "normas 
jurídicas impositivas de uma optimização, compatíveis com vários graus de 
concretização, consoante os condicionalismos fácticos e jurídicos" (Direito 
constitucional e teoria..., p. 1.087). Mas nem por isso a idéia passa 
incólume pelo crivo crítico da doutrina, como demonstra INOCÊNCIO 
MÁRTIRES COELHO, ao dizer que o raciocínio de ALEXY não é utilizável 
"somente na aplicação dos princípios, mas também na concretização de 
todo e qualquer standard normativo" (COELHO, Inocêncio Mártires. 
Elementos de teoria da Constituição e de interpretação constitucional. In 
____; BRANCO. Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. 
Hermenêutica constitucional e direitos fundamentais. Brasília: Brasília 
Jurídica, 2000, p. 76op. cit., p. 51). 
 36. Teoría..., p. 99. CANOTILHO se vale de conceito praticamente 
idêntico. Para ele, princípios "são normas que exigem a realização de algo, 
da melhor forma possível, de acordo com as possibilidades fácticas e 
jurídicas." (Op. cit., p. 1.177) 
 37. ALEXY, op. loc. cit. 
 38. ALEXY, idem. 
 39. Os princípios..., p. 113. 
 40. Os conceitos de concretização e densificação de uma norma são 
aqueles mesmos expostos por CANOTILHO (Dir. constitucional e teoria..., p. 
 44
1.127). 
 41. Comentando os princípios constitucionais, é digna de nota a 
delimitação de um sistema interno de princípios e regras constitucionais 
exposto por CANOTILHO. Para o autor, também os princípios constitucionais 
respeitam certa graduação, conforme os diferentes graus de concretização 
(densidade semântica) que possuem. Dessa forma, CANOTILHO sugere a 
articulação de esquema progressivo de densificação dos princípios 
constitucionais (princípios estruturantes → princípios constitucionais gerais 
→ princípios constitucionais especiais), até a densificação feita pela atuação 
(→) das regras constitucionais, formando assim um sistema de 
"esclarecimento recíproco". CANOTILHO diz ainda que os princípios 
estruturantes não são densificados apenas por esses princípios e regras 
constitucionais. Assevera que o processo de concretização acontece, 
principalmente, pelas regras feitas pelo legislador (concretização legislativa) 
e pela aplicação do direito pelos tribunais (concretização judicial), 
culminando com a descoberta da "norma de decisão" do caso jurídico-
constitucional, ponta final do processo de concretização do princípio. A 
despeito disso, porém, para CANOTILHO, todas as normas originais de uma 
constituição têm o mesmo valor (Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: 
Almedina, 1993, p. 70-71), sendo improcedente a eleição de normas 
constitucionais "fortes" e "fracas", bem como a doutrina da existência de 
normas constitucionais originais inconstitucionais. 
 42. CANOTILHO. Dir. const. e teoria..., p. 1.127. 
 43. O choque pode ser evitado com a introdução de cláusula de 
exceção em uma das regras, prevendo-se hipótese de aplicação da outra. 
Nesse sentido, cf. ALEXY, op. cit., p. 88. 
 44. Por todos, confira-se a exposição de NORBERTO BOBBIO 
(Teoria do ordenamento jurídico. 10. ed. Trad. Maria Celeste Cordeiro Leite 
dos Santos. Brasília: UnB, 1999, p. 91-110) acerca da antinomia jurídica, 
cujos critérios de resolução foram em três resumidos (lex superior derogat 
inferiori, lex specialis derogat generalis e lex posterior derogat priori).
45. Op. cit., p. 251. 
 46. GRAU, op. cit., p. 134. Aqui, portanto, segue-se caminho 
diverso do adotado para ALEXY, segundo o qual, diferentemente do 
princípio, uma regra não é deixada de lado (soslayada, na tradução 
espanhola) quando, num caso concreto que se deve decidir, o princípio 
oposto tenha maior peso que o princípio sobre o qual se apóia a regra (op. 
cit., p. 100). Afigura-se que o equívoco de ALEXY é reflexo de sua tentativa 
de infirmar a tese do caráter definitivo das regras exposto por DWORKIN, o 
que deu margem à afirmação de ser possível introduzir numa regra cláusula 
de exceção baseada em determinado princípio contrário, daí por que a regra
perderia seu caráter definitivo para a decisão do caso concreto. Foi em 
razão disso que ALEXY teve de aceitar ficasse de pé uma regra, a despeito 
de prevalecer, no caso, o princípio oposto. 
 45
 47. O que não impede, porém, como leciona CANOTILHO, que a 
própria Constituição já alinhe certas regras que densifiquem o princípio da 
função social da propriedade. 
 48. Cf. SILVA, Curso..., p. 285. 
 49. Aqui, porém, a utilização do princípio da função social se 
desviou daquela empregada pelo Constituinte originário, pois se refere à 
função social das empresas públicas, sociedades de economia mista e suas 
subsidiárias. 
 50. Op. cit., p. 247. 
 51. Nesse sentido: BENEDITO FERREIRA MARQUES, para quem o 
princípio incide "sobre qualquer bem, corpóreo ou incorpóreo" (op. cit., p. 
50). Ademais, nas palavras de JOSÉ AFONSO DA SILVA, a função social 
atinge "a propriedade em geral" (Curso..., p. 284), daí por que se estende 
"a todo e qualquer tipo de propriedade" (ibidem, p. 780). 
 52. SILVA, Curso..., p. 277. No mesmo sentido, ARAÚJO SÁ, op. 
loc. cit. 
 53. Exceção é o artigo 186 da CF/88, que, ao cuidar da função 
social da propriedade rural, acabou por reduzir a margem regulatória do 
legislador, ao estabelecer os requisitos previstos nos incisos I a IV. 
 54. Sobre o assunto, afirma CELSO RIBEIRO BASTOS haver "uma 
perfeita sintonia entre a fruição individual do bem e o atingimento da sua 
função social." (Curso de direito constitucional. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 
1998, p. 210). 
 55. Op. cit., p. 249. 
 56. BASTOS, op. cit., p. 210. 
 57. No caso, por exemplo, da propriedade sobre bens de consumo 
e de uso pessoal, anota JOSÉ AFONSO DA SILVA que, em razão do princípio 
da função social, justifica-se até "a intervenção do Estado no domínio da 
sua distribuição, de modo a propiciar a realização ampla da função social." 
(Curso..., p. 779.) 
 58. Op. cit., p. 276. 
 59. Op. cit., p. 48-49. 
 60. Tal norma foi recentemente regulamentada pela Lei 
10.257/2001, cujo projeto aprovado pelo Congresso acabou por consagrar 
(no Capítulo II da Seção II, que antecede os artigos 5º a 6º), ao lado do 
parcelamento e da edificação compulsórios, a figura da utilização 
compulsória, extrapolando assim a permissão constitucional contida no §4º, 
inciso I, do art. 182, motivo pelo qual foi vetado o inciso II do §2º do art. 
 46
5º do Estatuto da Cidade, ao fundamento de que "em se tratando de 
restrição a direito fundamental – direito de propriedade –, não é admissível 
a ampliação legislativa para abarcar os indivíduos que não foram 
contemplados pela norma constitucional" (Mensagem n. 730, de 
10/07/2001, DOU de 11/07/2001, p. 5). 
 61. Norma disciplinada pela Lei 10.257/2001, artigo 7º. 
 62. Confira-se a regulamentação do art. 8º da Lei 10.257/2001. 
 63. Regulamentado pela Lei 8.257, de 26/11/91. Ainda sobre o 
assunto, foi oposto veto ao §8º do art. 8º do projeto que deu origem à Lei 
10.409, de 11/01/2002 (cf. DOU de 14/01/2002). O dispositivo vetado 
excepcionava a expropriação se provada a boa-fé do proprietário que não 
estivesse na posse direta da gleba onde encontrado plantio ilegal. 
 64. Op. cit., p. 286. 
 65. Sobre o assunto do "núcleo essencial" dos direitos 
fundamentais, por todos, cf. BRANCO. Paulo Gustavo Gonet. Aspectos da 
teoria geral dos direitos fundamentais. In ____; COELHO, Inocêncio 
Mártires; MENDES, Gilmar Ferreira. Hermenêutica constitucional e direitos 
fundamentais. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 127. 
 66. Entendendo assim: SILVA, Curso..., p. 778. 
 67. Nesse sentido, v. g., ALCIR GURSEN DE MIRANDA, citado por 
FERREIRA MARQUES (op. cit., p. 52) e LIMA. Getúlio Targino. A posse 
agrária sobre bem imóvel: implicações no direito brasileiro. São Paulo: 
Saraiva, 1992. 
 68. MARQUES, op. cit., p. 53. 
 69. Ap. Cível n. 196005284/Santo Ângelo, Tribunal de Alçada do 
RS, 4ª Câmara Cível, Rel. Juiz WELLINGTON PACHECO BARROS, j. 
11/04/96. 
 70. AGI n. 70001037027, 18ª Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. ILTON 
CARLOS DELLANDREA, julgado em 29/06/2000. No mesmo sentido: 
"Função social da propriedade não significa ensejar-se a invasão, a quem 
assim entender. Respeito à ordem jurídica, como inabalável valor para a 
coexistência civilizada." (APC n. 598450419, 20ª Câmara Cível, TJRS, Des. 
ARMÍNIO JOSÉ ABREU LIMA DA ROSA, julgado em 26/10/1999.) 
 71. A Lei 10.257/2001, regulamentando os artigos 182 e 183 da 
Constituição, cuida do Estatuto da Cidade. 
 72. Acerca da teoria dos poderes implícitos, segundo CARLOS 
MAXIMILIANO, "quando a Constituição confere poder geral ou prescreve 
dever franqueia também, implicitamente, todos os poderes particulares, 
necessários para o exercício de um, ou cumprimento do outro" 
 47
(Hermenêutica e aplicação do direito. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994,
p. 312). Para maiores detalhes na doutrina pátria, cf. BONAVIDES, Curso..., 
p. 430-434. 
 73. Esse dispositivo, atualmente, encontra-se com a redação 
alterada por força da MP 2.183-56, de 24/08/2001, a qual, porém, não 
alterou substancialmente esse aspecto da questão. 
 74. De qualquer modo, está atualmente em vigor a MP 2.183-
56/2001, cujo artigo 2º promove alteração na redação do art. 6º do 
Estatuto da Terra, com a exata finalidade de deferir ao INCRA competência 
para, mediante convênio, delegar aos Estados, ao Distrito Federal e aos 
Municípios o cadastramento, as vistorias e avaliações de propriedades rurais
situadas no seu território, bem como outras atribuições relativas à execução
do Programa Nacional de Reforma Agrária, observados os parâmetros e 
critérios estabelecidos nas leis e nos atos normativos federais. 
 75. O conceito de módulo fiscal é aquele decorrente da alteração do
texto do art. 50 do Estatuto da Terra, por força da Lei 6.746, de 10/12/79. 
 76. Sobre a definição de imóvel rural, cf. art. 4º, inciso I, da Lei 
8.629/93. Porém, deve-se atentar à grande celeuma apontada pelos jus-
agraristas, que remontam a importância do critério da destinação da gleba 
para fins de sua categorização como imóvel rural, o que encontra óbices em 
razão da definição contida nos artigos 29 e 32 do Código Tributário 
Nacional. Acerca do assunto, cf. o julgado do STF no RE 93.850/MG, Pleno, 
Min. MOREIRA ALVES, RTJ 105/194 e especialmente a ótima exposição de 
MARQUES, op. cit., p. 37-44. 
 77. Cf. SILVA, Curso..., p. 786. 
 78. Op. cit., p. 212. 
 79. Nesse sentido, citando trabalho de ROSALINA PINTO DA COSTA 
RODRIGUES PEREIRA, cf. MARQUES, op. cit., p. 56-57. 
 80. Cf. ARAÚJO SÁ, Função social..., cit. 
 81. STF, Pleno, MS 22.328/PR, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, DJU de 
19/09/97, p. 45.583. 
 82. Eis o teor dos dispositivos inseridos no art. 2º da Lei 8.629/93: 
 "§ 6o O imóvel rural de domínio público
ou particular objeto de 
esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário 
de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos dois 
anos seguintes à sua desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de 
reincidência; e deverá ser apurada a responsabilidade civil e administrativa 
de quem concorra com qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o 
descumprimento dessas vedações. 
 48
 § 7o Será excluído do Programa de Reforma Agrária do Governo 
Federal quem, já estando beneficiado com lote em Projeto de 
Assentamento, ou sendo pretendente desse benefício na condição de 
inscrito em processo de cadastramento e seleção de candidatos ao acesso à 
terra, for efetivamente identificado como participante direto ou indireto em 
conflito fundiário que se caracterize por invasão ou esbulho de imóvel rural 
de domínio público ou privado em fase de processo administrativo de 
vistoria ou avaliação para fins de reforma agrária, ou que esteja sendo 
objeto de processo judicial de desapropriação em vias de imissão de posse 
ao ente expropriante; e bem assim quem for efetivamente identificado 
como participante de invasão de prédio público, de atos de ameaça, 
seqüestro ou manutenção de servidores públicos e outros cidadãos em 
cárcere privado, ou de quaisquer outros atos de violência real ou pessoal 
praticados em tais situações. 
 § 8o A entidade, a organização, a pessoa jurídica, o movimento ou 
a sociedade de fato que, de qualquer forma, direta ou indiretamente, 
auxiliar, colaborar, incentivar, incitar, induzir ou participar de invasão de 
imóveis rurais ou de bens públicos, ou em conflito agrário ou fundiário de 
caráter coletivo, não receberá, a qualquer título, recursos públicos." 
 83. Sobre o assunto, não custa repetir, veja-se o excelente artigo, 
já citado, do Procurador da República no Ceará ARAÚJO SÁ, que traça a 
ligação entre o cumprimento da função social e a proteção do meio 
ambiente. 
 84. Comentando a questão da "razoabilidade interna", cf. 
BARROSO, Luís Roberto. O princípio da razoabilidade e da proporcionalidade
no direito constitucional, Cadernos de Direito Constitucional e Ciência 
Política, n. 23, p. 65-78, abr./jun. 1998. 
 85. Op. loc. cit. 
 86. Tanto já era princípio geral que WASHINGTON DE BARROS 
MONTEIRO sustentava a existência de um interesse social que cerceava o 
proprietário que quisesse se opor à passagem de cabos empregados na 
tração do bonde aéreo do Pão de Açúcar ou à perfuração do solo para 
instalação do metrô (cf. Curso de direito civil. 27. ed. São Paulo: Saraiva. 3.
v., p. 93). 
 87. Sem modificar, porém, a regulação especial das jazidas, minas 
e demais recursos minerais, conforme dispõe o art. 1.230. 
 88. Tais comportamentos proibidos ocorrem com freqüência em 
condomínios edilícios, onde é maior a interação entre vizinhos. Exemplo é a 
intolerância frente ao uso de pequena parcela do espaço de garagem, inútil 
a seu proprietário. 
 89. Esse é um dos argumentos utilizados por ROBERT ALEXY para 
negar a existência de princípios absolutos (Teoria..., p. 106). 
 49
 90. Em matéria de usucapião da propriedade móvel, manteve-se, 
no substancial, o mesmo regime do Código de 1916. 
 91. Curiosamente, o novo Código trata usucapião no feminino, 
enquanto o de 1916 o fazia no masculino. Corretas as duas utilizações, 
conforme Dicionário Houaiss da língua portuguesa (Rio de Janeiro: Objetiva,
2001, p. 2.815), ainda que o Aurélio só aceite a forma feminina (14. reimp. 
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, [ca 1986], p. 1.434), não havia motivos 
para se alterar o tratamento legislativo. 
 92. Não olvidar a proibição de usucapião em imóveis públicos (arts. 
183, §3º, e 191, par. único, da CF/88). 
 93. Atentar, porém, para o art. 2.029, que manda acrescer dois 
anos à contagem do prazo par. único dos arts. 1.238 e 1.242, até que se 
completem dois anos da entrada em vigor do novo Código. 
 94. Nesse sentido, CELSO RIBEIRO BASTOS enxerga nas previsões 
de usucapião contidas nos arts. 191 e 183 da CF/88 afinidade com o 
instituto da função social da propriedade (Comentários..., 7º vol, 1990, p. 
336/337). 
 95. Omissa a previsão do usucapião nas Cartas de 1967 e 1969, o 
art. 156, §3º, da CF/46, o art. 148 da CF/37 e o art. 125 da CF/37 também 
falavam em "morada" do possuidor. 
 96. Cf. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: 
Objetiva, 2001, p. 1.958. 
 97. Interpretando assim o art. 183 da CF/88, cf. CELSO RIBEIRO 
BASTOS, Comentários..., 7º vol, 1990, p. 228, rodapé). 
 98. Diz o art. 9º do Estatuto, ao tratar da usucapião especial de 
imóvel urbano: 
 "Art. 9o Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de 
até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, 
ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua 
família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro 
imóvel urbano ou rural. 
 § 1o O título de domínio será conferido ao homem ou à mulher, ou 
a ambos, independentemente do estado civil. 
 § 2o O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao 
mesmo possuidor mais de uma vez. 
 § 3o Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de 
pleno direito, a posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por 
ocasião da abertura da sucessão." 
 50
 99. Sobre o sentido lingüisticamente possível como limite objetivo 
da interpretação, cf. COELHO, Elementos..., p. 76. 
 100. Conferir o art. 2.029, que manda acrescer dois anos à 
contagem do prazo par. único dos arts. 1.238 e 1.242, até completar-se 
dois anos da entrada em vigor do novo Código. 
 101. Motivo a mais para reforçar a desejada cautela do juiz na 
verificação da hipótese do par. único do art. 1.238. 
 102. Confira-se o teor do dispositivo citado: 
 "Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta 
metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua 
moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for 
possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são 
susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores 
não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural. 
 § 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por 
este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas
sejam contínuas. 
 § 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada 
pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no 
cartório de registro de imóveis. 
 § 3o Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a 
cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um 
ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo
frações ideais diferenciadas. 
 § 4o O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo 
passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, 
dois terços dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior 
à constituição do condomínio. 
 § 5o As deliberações relativas à administração do condomínio 
especial serão tomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, 
obrigando também os demais, discordantes ou ausentes." 
 103. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 19. 
ed. atualiz. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 508. 
 104. De se ressaltar que o velho Código também previa casos de 
alienação forçada, como no art. 632 (alienação de coisa indivisível em
condomínio) e no art. 237 (suprimento da outorga uxória), hipóteses essas 
reguladas no novo Código nos artigos 1.322 e 1.648, respectivamente. 
 105. Por isso, deve o juiz condicionar o pagamento do preço ao 
 51
pagamento dos tributos eventualmente incidentes sobre o imóvel. 
 106. É bem verdade que o novo Código, até dois anos após sua 
entrada em vigor, manda acrescer dois anos à contagem do prazo do §4º 
do art. 1.228, conforme art. 2.030, c/c art. 2.029. Mas isso não se confunde
com condição de vigência. 
 107. Não é intenção deste trabalho o estudo dos aspectos 
processuais que subjazem o tema. Mas, à guisa de simples visão superficial,
a petição inicial deverá fazer-se acompanhada da planta do imóvel, com 
memorial descritivo das benfeitorias e com a identificação de todos os co-
possuidores (legitimados ativos necessários). Exige-se a citação dos 
confrontantes, a exemplo do art. 942 do CPC. Além disso, há interesse 
público na intervenção do órgão do Ministério Público (art. 82, III, do CPC), 
ainda que se trate de imóvel urbano. Obrigatória também a intimação dos 
titulares de direito real sobre o imóvel e dos representantes da Fazenda 
Pública dos três níveis da Federação, pois a alienação forçada é forma de 
aquisição originária da propriedade. 
 108. Não olvidar a regra de transição dos arts. 2.030 e art. 2.029, 
que acresce dois anos à contagem do prazo do §4º do art. 1.228, no 
período de até dois anos após a entrada em vigor do novo Código. 
 109. Com exceção, óbvio, das hipóteses em que o construtor era 
beneficiário da usucapião. 
 110. Outra novidade diz respeito à entidade para qual será 
revertida a propriedade dos imóveis rurais abandonados. O art. 589, §2º, 
do Código antigo (com redação da Lei 6.969, de 10/12/81), destinava os 
imóveis objeto de abandono ao Estado, Território ou ao Distrito Federal 
onde se encontrassem, não importando fossem urbanos ou rurais; o novo 
Código, mais consentâneo com a competência constitucional relativa à 
desapropriação para fins de reforma agrária, transfere à União a 
propriedade dos imóveis rurais. 
 111. A jurisprudência já se inclinava pela averiguação do grau de 
tolerabilidade do uso incômodo da propriedade em face dos usos e 
costumes locais (cf. fontes citadas por DINIZ. Maria Helena. Código Civil 
anotado. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 426). 
 112. A matéria já era regulada pelo Código de Águas (Decreto 
24.643, de 10/07/34), que revogou implicitamente os artigos 563 a 568 do 
antigo Código Civil. Porém, ficou mais clara a proteção às águas destinadas 
às primeiras necessidades dos imóveis inferiores. É que a disciplina do 
Decreto 24.643/34, numa leitura desavisada, admitia, em certas condições, 
a poluição de águas destinadas a interesses relevantes à agricultura ou 
indústria (art. 111). Contudo, se analisado seu art. 71, §3º, percebe-se que 
o Código de Águas dava preferência, sobre quaisquer outros, ao "uso das 
águas para as primeiras necessidades da vida." 
 113. Sobre crimes especialmente relacionados com a poluição das 
 52
águas, cf. arts. 33, 53, I, e 54 da Lei 9.605, de 12/02/98. 
 
 
 
Sobre o autor 
 
Juliano Taveira Bernardes 
 
E-mail: Entre em contato 
 
 
 
 
Sobre o texto: 
Texto inserido no Jus Navigandi nº151 (4.12.2003) 
Elaborado em 12.2001. 
 
Informações bibliográficas: 
Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas 
(ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser 
citado da seguinte forma: 
BERNARDES, Juliano Taveira. Da função social da propriedade imóvel. 
Estudos do princípio constitucional e de sua regulamentação pelo novo 
Código Civil brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 151, 4 dez. 2003. 
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4573>. 
Acesso em: 12 jun. 2006. 
 
 
 
 
JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA 
 
Está se tornando comum algumas bancas de concurso exigirem do 
candidato, não apenas específicos conhecimentos teóricos, mas também de 
jurisprudência, especialmente dos Tribunais Superiores. 
 
Com esta preocupação, selecionamos jurisprudência do Supremo Tribunal 
Federal acerca do importante tema “função social da propriedade” (você 
pode acompanhar e atualizar-se acerca da evolução pretoriana no 
www.stf.gov.br): 
 
 
 
 
XXIII - a 
 53
propriedade 
atenderá a sua 
função social; 
 
“O direito de edificar é relativo, dado que condicionado à 
função social da propriedade.” (RE 178.836, Rel. Min. Carlos 
Velloso, DJ 20/08/99) 
 
 
“O direito de propriedade não se reveste de caráter absoluto, 
eis que, sobre ele, pesa grave hipoteca social, a significar 
que, descumprida a função social que lhe é inerente (CF, art. 
5º, XXIII), legitimar-se-á a intervenção estatal na esfera 
dominial privada, observados, contudo, para esse efeito, os 
limites, as formas e os procedimentos fixados na própria 
Constituição da República. O acesso à terra, a solução dos 
conflitos sociais, o aproveitamento racional e adequado do 
imóvel rural, a utilização apropriada dos recursos naturais 
disponíveis e a preservação do meio ambiente constituem 
elementos de realização da função social da propriedade.” 
(ADI 2.213-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 23/04/04) 
 
 
“A única hipótese na qual a Constituição admite a 
progressividade das alíquotas do IPTU é a do art. 182, § 4º, 
II, destinada a assegurar o cumprimento da função social da 
propriedade urbana.” (AI 456.513-ED, Rel. Min. Sepúlveda 
Pertence, DJ 14/11/03) 
“A progressividade do IPTU, que é imposto de natureza real 
em que não se pode levar em consideração a capacidade 
econômica do contribuinte, só é admissível, em face da 
Constituição, para o fim extrafiscal de assegurar o 
cumprimento da função social da propriedade.” (RE 192.737, 
Rel. Min. Moreira Alves, DJ 05/09/97) 
 
 
 
“A própria Constituição da República, ao impor ao poder 
público dever de fazer respeitar a integridade do patrimônio 
ambiental, não o inibe, quando necessária a intervenção 
estatal na esfera dominial privada, de promover a 
desapropriação de imóveis rurais para fins de reforma agrária, 
especialmente porque um dos instrumentos de realização da 
função social da propriedade consiste, precisamente, na 
submissão do domínio à necessidade de o seu titular utilizar 
adequadamente os recursos naturais disponíveis e de fazer 
preservar o equilíbrio do meio ambiente.” (MS 22.164, Rel. 
Min. Celso de Mello, DJ 17/11/95) 
 
 
“A garantia da função social da propriedade (art. 5º, XXIII da 
Constituição) não afeta as normas de composição de conflito 
de vizinhança insertas no Código Civil (art. 573 e seus 
parágrafos), para impor gratuitamente, ao proprietário, a 
ingerência de outro particular em seu poder de uso, pela 
 
 54
circunstância de exercer este último atividade reconhecida 
como de utilidade pública.” (RE 211.385, Rel. Min. Octavio 
Gallotti, DJ 24/09/99) 
 
ENUNCIADOS – JORNADAS DE DIREITO CIVIL (DIREITOS REAIS)31 
DIREITO DAS COISAS – I JORNADA 
76 – Art. 1.197: O possuidor direto tem direito de defender a sua posse 
contra o indireto, e este contra aquele (art. 1.197, in fine, do novo Código 
Civil). 
77 – Art. 1.205: A posse das coisas móveis e imóveis também pode ser 
transmitida pelo constituto possessório. 
78 – Art. 1.210: Tendo em vista a não-recepção, pelo novo Código Civil, da 
exceptio proprietatis (art. 1.210, § 2º) em caso de ausência de prova 
suficiente para embasar decisão liminar ou sentença final ancorada 
exclusivamente no ius possessionis, deverá o pedido ser indeferido e 
julgado improcedente, não obstante eventual alegação e demonstração de 
direito real sobre o bem litigioso. 
79 – Art.
1.210: A exceptio proprietatis, como defesa oponível às ações 
possessórias típicas, foi abolida pelo Código Civil de 2002, que estabeleceu 
a absoluta separação entre os juízos possessório e petitório. 
80 – Art. 1.212: É Inadmissível o direcionamento de demanda possessória 
ou ressarcitória contra terceiro possuidor de boa-fé, por ser parte passiva 
ilegítima, diante do disposto no art. 1.212 do novo Código Civil. Contra o 
terceiro de boa-fé cabe tão-somente a propositura de demanda de natureza 
real. 
81 – Art. 1.219: O direito de retenção previsto no art. 1.219 do CC, 
decorrente da realização de benfeitorias necessárias e úteis, também se 
aplica às acessões (construções e plantações) nas mesmas circunstâncias. 
82 – Art. 1.228: É constitucional a modalidade aquisitiva de propriedade 
imóvel prevista nos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do novo Código Civil. 
83 – Art. 1.228: Nas ações reivindicatórias propostas pelo Poder Público, 
não são aplicáveis as disposições constantes dos §§ 4º e 5º do art. 1.228 
do novo Código Civil. 
84 – Art. 1.228: A defesa fundada no direito de aquisição com base no 
interesse social (art. 1.228, §§ 4º e 5º, do novo Código Civil) deve ser 
argüida pelos réus da ação reivindicatória, eles próprios responsáveis pelo 
pagamento da indenização. 
 
31 Fonte: www.professorsimao.com.br 
 55
85 – Art. 1.240: Para efeitos do art. 1.240, caput, do novo Código Civil, 
entende-se por "área urbana" o imóvel edificado ou não, inclusive unidades 
autônomas vinculadas a condomínios edilícios. 
86 – Art. 1.242: A expressão justo título, contida nos arts. 1.242 e 1.260 do 
CC, abrange todo e qualquer ato jurídico hábil, em tese, a transferir a 
propriedade, independentemente de registro. 
87 – Art. 1.245: Considera-se também título translativo, para fins do art. 
1.245 do novo Código Civil, a promessa de compra e venda devidamente 
quitada (arts. 1.417 e 1.418 do CC e § 6º do art. 26 da Lei n. 6.766/79). 
88 – Art. 1.285: O direito de passagem forçada, previsto no art. 1.285 do 
CC, também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for 
insuficiente ou inadequado, consideradas inclusive as necessidades de 
exploração econômica. 
 
89 – Art. 1.331: O disposto nos arts. 1.331 a 1.358 do novo Código Civil 
aplica-se, no que couber, aos condomínios assemelhados, tais como 
loteamentos fechados, multipropriedade imobiliária e clubes de campo. 
90 – Art. 1.331: Deve ser reconhecida personalidade jurídica ao condomínio 
edilício nas relações jurídicas inerentes às atividades de seu peculiar 
interesse. 
91 – Art. 1.331 - A convenção de condomínio, ou a assembléia geral, 
podem vedar a locação de área de garagem ou abrigo para veículos a 
estranhos ao condomínio. 
92 – Art. 1.337: As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem 
ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo. 
93 – Art. 1.369: As normas previstas no Código Civil sobre direito de 
superfície não revogam as relativas a direito de superfície constantes do 
Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/2001) por ser instrumento de política de 
desenvolvimento urbano. 
94 – Art. 1.371: As partes têm plena liberdade para deliberar, no contrato 
respectivo, sobre o rateio dos encargos e tributos que incidirão sobre a área 
objeto da concessão do direito de superfície. 
95 – Art. 1.418: O direito à adjudicação compulsória (art. 1.418 do novo 
Código Civil), quando exercido em face do promitente vendedor, não se 
condiciona ao registro da promessa de compra e venda no cartório de 
registro imobiliário (Súmula n. 239 do STJ). 
Enunciados propositivos de alteração legislativa: 
 56
96 - Alteração do § 1º do art. 1.336 do CC, relativo a multas por 
inadimplemento no pagamento da contribuição condominial, para o qual se 
sugere a seguinte redação: 
“Art. 1.336 - .................. 
§ 1 º - O condômino que não pagar sua contribuição ficará sujeito aos juros 
moratórios convencionados ou, não sendo previstos, de um por cento ao 
mês, e multa de até 10% sobre o ou eventual risco de emendas sucessivas 
que venham a desnaturá-lo ou mesmo inibir a sua entrada em vigor. 
Não obstante, entendeu a Comissão da importância de aprimoramento do 
texto legislativo, que poderá, perfeitamente, ser efetuado durante a 
vigência do próprio Código, o que ocorreu, por exemplo, com o diploma de 
1916, com a grande reforma verificada em 1919. 
DIREITO DAS COISAS – III JORNADA 
 
236 – Arts. 1.196, 1.205 e 1.212: Considera-se possuidor, para todos os 
efeitos 
legais, também a coletividade desprovida de personalidade jurídica. 
237 – Art. 1.203: É cabível a modificação do título da posse – interversio 
possessionis – na hipótese em que o até então possuidor direto demonstrar 
ato 
exterior e inequívoco de oposição ao antigo possuidor indireto, tendo por 
efeito a 
caracterização do animus domini. 
238 – Art. 1.210: Ainda que a ação possessória seja intentada além de “ano 
e dia” 
da turbação ou esbulho, e, em razão disso, tenha seu trâmite regido pelo 
procedimento ordinário (CPC, art. 924), nada impede que o juiz conceda a 
tutela 
possessória liminarmente, mediante antecipação de tutela, desde que 
presentes 
os requisitos autorizadores do art. 273, I ou II, bem como aqueles previstos 
no art. 
461-A e §§, todos do CPC. 
239 – Art. 1.210: Na falta de demonstração inequívoca de posse que atenda 
à 
função social, deve-se utilizar a noção de “melhor posse”, com base nos 
critérios 
previstos no parágrafo único do art. 507 do CC/1916. 
240 – Art. 1.228: A justa indenização a que alude o parágrafo 5º do art. 
1.228 não 
tem como critério valorativo, necessariamente, a avaliação técnica lastreada 
 57
no 
mercado imobiliário, sendo indevidos os juros compensatórios. 
241 – Art. 1.228: O registro da sentença em ação reivindicatória, que opera 
a 
transferência da propriedade para o nome dos possuidores, com 
fundamento no 
interesse social (art. 1.228, § 5o), é condicionada ao pagamento da 
respectiva 
indenização, cujo prazo será fixado pelo juiz. 
242 – Art. 1.276: A aplicação do art. 1.276 depende do devido processo 
legal, em 
que seja assegurado ao interessado demonstrar a não- cessação da posse. 
243 – Art. 1.276: A presunção de que trata o § 2o do art. 1.276 não pode 
ser 
interpretada de modo a contrariar a norma-princípio do art. 150, IV, da 
Constituição da República. 
244 – Art. 1.291: O art. 1.291 deve ser interpretado conforme a 
Constituição, não 
sendo facultada a poluição das águas, quer sejam essenciais ou não às 
primeiras 
necessidades da vida. 
245 – Art. 1.293: Muito embora omisso acerca da possibilidade de 
canalização 
forçada de águas por prédios alheios, para fins da agricultura ou indústria, o 
art. 
1.293 não exclui a possibilidade da canalização forçada pelo vizinho, com 
prévia 
indenização aos proprietários prejudicados. 
246 – Art. 1.331: Fica alterado o Enunciado n. 90, com supressão da parte 
final: 
“nas relações jurídicas inerentes às atividades de seu peculiar interesse”. 
Prevalece o texto: “Deve ser reconhecida personalidade jurídica ao 
condomínio 
edilício”. 
247 – Art. 1.331: No condomínio edilício é possível a utilização exclusiva de 
área 
“comum” que, pelas próprias características da edificação, não se preste ao 
“uso 
comum” dos demais condôminos. 
248 – Art.: 1.334, V: O quorum para alteração do regimento interno do 
condomínio 
edilício pode ser livremente fixado na convenç ão. 
 58
249 – Art. 1.369: A propriedade superficiária pode ser autonomamente 
objeto de 
direitos reais de gozo e de garantia, cujo prazo não exceda a duração da 
concessão da superfície, não se lhe aplicando o art. 1.474. 
250 – Art. 1.369: Admite-se a constituição do direito de superfície por 
cisão. 
251 – Art. 1.379:
O prazo máximo para o usucapião extraordinário de 
servidões 
deve ser de 15 anos, em conformidade com o sistema geral de usucapião 
previsto 
no Código Civil. 
252 – Art. 1.410: A extinção do usufruto pelo não-uso, de que trata o art. 
1.410, 
inc. VIII, independe do prazo previsto no art. 1.389, inc. III, operando-se 
imediatamente. Tem-se por desatendida, nesse caso, a função social do 
instituto. 
253 – Art. 1.417: O promitente comprador, titular de direito real (art. 
1.417), tem a 
faculdade de reivindicar de terceiro o imóvel prometido à venda. 
DIREITO DAS COISAS – IV JORNADA 
 
301 – Art.1.198. c/c art.1.204. É possível a conversão da detenção em 
posse, desde que rompida a subordinação, na hipótese de exercício em 
nome próprio dos atos possessórios. 
302 – Art.1.200 e 1.214. Pode ser considerado justo título para a posse de 
boa-fé o ato jurídico capaz de transmitir a posse ad usucapionem, 
observado o disposto no art. 113 do Código Civil. 
 
303 – Art.1.201. Considera-se justo título para presunção relativa da boa-fé 
do possuidor o justo motivo que lhe autoriza a aquisição derivada da posse, 
esteja ou não materializado em instrumento público ou particular. 
Compreensão na perspectiva da função social da posse. 
 
304 – Art.1.228. São aplicáveis as disposições dos §§ 4º e 5º do art. 1.228 
do Código Civil às ações reivindicatórias relativas a bens públicos 
dominicais, mantido, parcialmente, o Enunciado 83 da I Jornada de Direito 
Civil, no que concerne às demais classificações dos bens públicos. 
 
 59
305 – Art.1.228. Tendo em vista as disposições dos §§ 3º e 4º do art. 
1.228 do Código Civil, o Ministério Público tem o poder-dever de atuação 
nas hipóteses de desapropriação, inclusive a indireta, que envolvam 
relevante interesse público, determinado pela natureza dos bens jurídicos 
envolvidos. 
 
306 – Art.1.228. A situação descrita no § 4° do art. 1.228 do Código Civil 
enseja a improcedência do pedido reivindicatório. 
 
307 – Art.1.228. Na desapropriação judicial (art. 1.228, § 4º), poderá o juiz 
determinar a intervenção dos órgãos públicos competentes para o 
licenciamento ambiental e urbanístico. 
 
308 – Art.1.228. A justa indenização devida ao proprietário em caso de 
desapropriação judicial (art. 1.228, § 5°) somente deverá ser suportada 
pela Administração Pública no contexto das políticas públicas de reforma 
urbana ou agrária, em se tratando de possuidores de baixa renda e desde 
que tenha havido intervenção daquela nos termos da lei processual. Não 
sendo os possuidores de baixa renda, aplica-se a orientação do Enunciado 
84 da I Jornada de Direito Civil. 
 
309 – Art.1.228. O conceito de posse de boa-fé de que trata o art. 1.201 do 
Código Civil não se aplica ao instituto previsto no § 4º do art. 1.228. 
 
310 - Art.1.228. Interpreta-se extensivamente a expressão “imóvel 
reivindicado” (art. 1.228, § 4º), abrangendo pretensões tanto no juízo 
petitório quanto no possessório. 
 
311 - Art.1.228. Caso não seja pago o preço fixado para a desapropriação 
judicial, e ultrapassado o prazo prescricional para se exigir o crédito 
correspondente, estará autorizada a expedição de mandado para registro da 
propriedade em favor dos possuidores. 
 
312 – Art.1.239. Observado o teto constitucional, a fixação da área máxima 
para fins de usucapião especial rural levará em consideração o módulo rural 
 60
e a atividade agrária regionalizada. 
 
313 – Arts.1.239 e 1.240. Quando a posse ocorre sobre área superior aos 
limites legais, não é possível a aquisição pela via da usucapião especial, 
ainda que o pedido restrinja a dimensão do que se quer usucapir. 
 
314 – Art. 1.240. Para os efeitos do art. 1.240, não se deve computar, para 
fins de limite de metragem máxima, a extensão compreendida pela fração 
ideal correspondente à área comum. 
 
315 – Art. 1.241. O art. 1.241 do Código Civil permite que o possuidor que 
figurar como réu em ação reivindicatória ou possessória formule pedido 
contraposto e postule ao juiz seja declarada adquirida, mediante usucapião, 
a propriedade imóvel, valendo a sentença como instrumento para registro 
imobiliário, ressalvados eventuais interesses de confinantes e terceiros. 
 
316 – Art. 1.276. Eventual ação judicial de abandono de imóvel, caso 
procedente, impede o sucesso de demanda petitória. 
 
317 – Art. 1.243. A accessio possessionis, de que trata o art. 1.243, 
primeira parte, do Código Civil, não encontra aplicabilidade relativamente 
aos arts. 1.239 e 1.240 do mesmo diploma legal, em face da normatividade 
do usucapião constitucional urbano e rural, arts. 183 e 191, 
respectivamente. 
 
318 – Art.1.258. O direito à aquisição da propriedade do solo em favor do 
construtor de má-fé (art. 1.258, parágrafo único) somente é viável quando, 
além dos requisitos explícitos previstos em lei, houver necessidade de 
proteger terceiros de boa-fé. 
 
319 – Art.1.277. A condução e a solução das causas envolvendo conflitos de 
vizinhança devem guardar estreita sintonia com os princípios constitucionais 
da intimidade, da inviolabilidade da vida privada e da proteção ao meio 
ambiente. 
 61
 
320 – Art.1.338 e 1.331. O direito de preferência de que trata o art. 1.338 
deve ser assegurado não apenas nos casos de locação, mas também na 
hipótese de venda da garagem. 
 
321 – Art. 1.369. Os direitos e obrigações vinculados ao terreno e, bem 
assim, aqueles vinculados à construção ou à plantação formam patrimônios 
distintos e autônomos, respondendo cada um dos seus titulares 
exclusivamente por suas próprias dívidas e obrigações, ressalvadas as 
fiscais decorrentes do imóvel. 
 
322 – Art. 1.376. O momento da desapropriação e as condições da 
concessão superficiária serão considerados para fins da divisão do montante 
indenizatório (art. 1.376), constituindo-se litisconsórcio passivo necessário 
simples entre proprietário e superficiário. 
 
323 - É dispensável a anuência dos adquirentes de unidades imobiliárias no 
“termo de afetação” da incorporação imobiliária. 
 
324 - É possível a averbação do termo de afetação de incorporação 
imobiliária (Lei n. 4.591/64, art. 31b) a qualquer tempo, na matrícula do 
terreno, mesmo antes do registro do respectivo Memorial de Incorporação 
no Registro de Imóveis. 
 
325 - É impenhorável, nos termos da Lei n. 8.009/90, o direito real de 
aquisição do devedor fiduciante. 
 
PROPOSIÇÕES LEGISLATIVAS 
 
326 - Propõe-se alteração do art. 31A da Lei n. 4.591/64, que passaria a ter 
a seguinte redação: Art. 31A. O terreno e as acessões objeto de 
incorporação imobiliária, bem como os demais bens, direitos a ela 
vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e 
constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da 
incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos 
 62
respectivos adquirentes 
 
327 - Suprima-se o art. 9° da Lei n. 10.931/2004. (Unânime). 
 
328 - Propõe-se a supressão do inciso V do art. 1.334 do Código Civil. 
 
FIQUE POR DENTRO 
 
Pensão alimentícia incide sobre o décimo terceiro e o terço 
constitucional de férias 
27/11/2009 
 
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou, conforme o 
rito do recurso repetitivo (Lei 11.672/08), processo que questionava a 
incidência da pensão alimentícia sobre o décimo terceiro salário e o terço 
constitucional de férias, também conhecidos, respectivamente, por 
gratificação natalina e gratificação de férias. 
 
A Seção, seguindo o voto do relator, desembargador convocado Paulo 
Furtado, firmou a tese de que a pensão alimentícia incide sobre o décimo 
terceiro e
o terço constitucional de férias, pois tais verbas estão 
compreendidas nas expressões ‘vencimento’, ‘salários’ ou ‘proventos’ que 
consubstanciam a totalidade dos rendimentos recebidos pelo alimentante. 
 
No caso, um menor, representado por sua mãe, recorreu ao STJ após 
decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que considerou não 
abrangida na pensão alimentícia a gratificação natalina e a gratificação de 
férias recebidas pelo alimentante. 
 
Fonte: 
http://www.stj.gov.br/portal_stj/objeto/texto/impressao.wsp?tmp.estilo=&tmp.are
a=398&tmp.texto=94849 
Processos: Resp 1106654 
 
 
Ação de beneficiário do DPVAT prescreve em três anos 
10/06/2009 
O DPVAT (seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos 
automotores de vias terrestres) tem caráter de seguro de responsabilidade 
civil, razão pela qual a ação de cobrança de beneficiário da cobertura 
prescreve em três anos. A decisão é da Segunda Seção do Superior Tribunal 
de Justiça (STJ), ao julgar processo remetido pela Quarta Turma. 
 
O caso trata de viúva de vítima atropelada em 2002 que deu início à ação 
apenas em 2006. O juiz inicial negou seguimento ao pedido, afirmando 
estar prescrito o direito da autora de buscar a indenização. O Tribunal de 
 63
Justiça paulista manteve o entendimento. 
 
Para o relator, ministro Luis Felipe Salomão, o DPVAT teria finalidade 
eminentemente social, de garantia de compensação pelos danos pessoais 
de vítimas de acidentes com veículos automotores. Por isso, diferentemente 
dos seguros de responsabilidade civil, protegeria o acidentado, e não o 
segurado. A prescrição a ser aplicada seria, portanto, a da regra geral do 
Código Civil, de dez anos. O entendimento foi seguido pelos 
desembargadores convocados Vasco Della Giustina e Paulo Furtado. 
 
Em voto vista, o ministro Fernando Gonçalves divergiu. Para ele, embora o 
recebimento da indenização do seguro obrigatório independa da 
demonstração de culpa do segurado, o DPVAT não deixa de ter caráter de 
seguro de responsabilidade civil. Por isso, as ações relacionadas a ele 
prescreveriam em três anos. O voto foi acompanhado pelos ministros Aldir 
Passarinho Junior, João Otávio de Noronha e Sidnei Beneti. 
 
Os dois últimos ressaltaram também a tendência internacional de reduzir os 
prazos de prescrição nos códigos civis mais recentes, em favor da 
segurança jurídica. 
Fonte: 
http://www.stj.jus.br/portal_stj/objeto/texto/impressao.wsp?tmp.estilo=&tmp.area
=398&tmp.texto=92416 acessado em 11 de junho de 2009. 
Processos: RESP 1071861 
 
 
Revisado.2009.2ok 
c.D.s. 
 
 
Paz e Luz, sempre! 
O amigo, 
Pablo.

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