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sociedade e dereito paulo nader

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Enviado por Manuela Pessanha em

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Segue mais um texto, extraído do livro de Introdução ao Estudo do Direito ( Paulo Nader)
Capítulo IV
SOCIEDADE E DIREITO
l0. A Sociabilidade Humana
	A própria constituição física do ser humano revela que ele foi programado para conviver e se completar com outro ser de sua espécie. A prole, decorrência natural da união, passa a atuar como fator de organização e estabilidade do núcleo familiar. O pequeno grupo, formado não apenas pelo interesse material, mas pelos sentimentos de afeto, tende a propagar-se em cadeia, com a formação de outros 'pequenos núcleos, até se chegar à constituição de um grande grupo social.
	A lembrança de Ortega y Gasset, ao narrar que a História registra, periodicamente, movimentos de "querer ir-se", conforme aconteceu com os eremitas, indo para os desertos praticar a "moné" - solidão; com os monges cristãos e, ainda, nos primeiros séculos do Império Romano, com homens fugindo para os desertos, desiludidos da vida pública, não enfraquece a tese da sociabilidade humana. A experiência tem demonstrado que o homem é capaz, durante algum tempo, de viver isolado. Não, porém, durante a sua existência. Ele 
conseguirá, durante esse tempo, prescindir da convivência e não da produção social.
	0 exemplo de Robinson Crusoé serve para reflexão. Durante algum tempo, esteve isolado em uma ilha, utilizando-se de instrumentos achados na embarcação. Em relação àquele personagem da ficção, dois fatos merecem observações. Quando Robinson chegou à ilha, já possuía conhecimentos e compreensão, alcançados em sociedade e que muito o ajudaram naquela emergência. Além disso, o uso de instrumentos, certamente adquiridos pelo sistema de troca de riquezas, que caracteriza a dinâmica da vida social, dá a evidência de que, ainda na solidão, Robinson utilizou-se de um trabalho social'. 
	Examinando o fenômeno da sociabilidade humana, Aristóteles considerou o homem fora da sociedade "um bruto ou um deus”, significando algo inferior ou superior à condição humana. O homem viveria como alienado, sem o discernimento próprio ou, na segunda 
hipótese, viveria como um ser perfeito, condição ainda não alcançada por ele. Santo Tomás de Aquino, estudando o mesmo fenômeno ,enumerou três hipóteses para a vida humana fora da sociedade: 
a) mala fortuna; 
b) corruptio naturae; 
c) excellentia naturae. 
	No infortúnio, o isolamento se dá em casos de naufrágio ou em situações análogas, como a queda de um avião em plena selva. Na alienação mental, o homem, desprovido de inteligência, vai viver distanciado de seus semelhantes. A última hipótese é a de quem possui uma grande espiritualidade, como São Simeão, chamado "Estilita" por tentar isolar-se, construindo uma alta coluna, no topo da qual viveu algum tempo. 
	É na sociedade, não fora dela, que o homem encontra o complemento ideal ao desenvolvimento de suas faculdades, de todas as potências que carrega em si. Por não conseguir a auto-realização, concentra os seus esforços na construção da sociedade, seu habitat natural e que representa o grande empenho do homem para adaptar o mundo exterior às suas necessidades de vida. 
11. O "Estado de Natureza"
	É na sociedade que o homem encontra o ambiente propício ao seu pleno desenvolvimento. Qualquer estudo sobre ele há de revelar o seu instinto de vida gregária. O pretenso "estado de natureza", em que os homens teriam vivido em solidão, originariamente, •solados uns dos outros, é mera hipótese, sem apoio na experiência e sem dignidade científica. O seu estudo, entretanto, presta-se a fins científicos, conforme revela Del Vecchio. Através dessa hipótese se chegará, com argumentação a contrario, à comprovação de que fora da sociedade não há condições de vida para o homem.
	Acrescenta o mestre italiano que a mesma prática poderia ser adotada por um cientista da natureza, com relação, por exemplo, à lei da gravidade. Explicar as coisas do 
mundo, com abstração desta lei, seria um meio de demonstrar a imprescindibilidade desta. 
l2. Formas de Interação Social e a Ação do Direito
1. A Interação Social - As pessoas e os grupos sociais se relacionam estreitamente, na busca de seus objetivos. Os processos de mútua influência, de relações interindividuais e intergrupais, que se formam sob a força de variados interesses, denominam-se interação social. Esta pressupõe cultura e conhecimento das diferentes espécies de normas de conduta adotadas pelo corpo social. Na relação interindividual, em que o ego e o alter se colocam frente a frente, com as suas pretensões, a noção comum dos padrões de comportamento e 
atitudes é decisiva à natural fluência do fato. O quadro psicológico que se apresenta é abordado, com agudeza, por Parsons e Shills: "...como os resultados da ação do ego dependem da reação do alter,o ego orienta-se não apenas pelo provável comportamento manifesto do alter, mas também pela interpretação que faz das expectativas do alter com relação a seu comportamento, uma vez que o ego espera que as expectativas do alter influenciarão o seu comportamento."
	A interação social se apresenta sob as formas de cooperação, competição e conflito e encontra no Direito a sua garantia, o instrumento de apoio que protege a dinâmica das ações.
	Na cooperação as pessoas estão movidas por um mesmo objetivo e valor e por isso conjugam o seu esforço. A interação se manifesta direta e positiva. Na competição há uma disputa, uma concorrência, em que as partes procuram obter o que almejam, uma visando a 
exclusão da outra. Uma das grandes características da sociedade moderna, esta forma revela atividades paralelas, em que cada pessoa ou grupo procura reunir os melhores trunfos, para a consecução de seus objetivos. A interação, nesta espécie, se faz indireta e, sob muitos aspectos, positiva. O conflito se faz presente a partir do impasse, quando os interesses em jogo não logram uma solução pelo diálogo e as partes recorrem à luta, moral ou física, ou buscam a mediação da justiça. Podemos defini-lo como oposição de interesses, entre pessoas ou grupos, não conciliados pelas normas sociais. No conflito a interação é direta e negativa. O Direito só irá disciplinar as formas de cooperação e competição onde houver relação potencialmente conflituosa.
	Os conflitos são fenômenos naturais à sociedade, podendo-se até dizer que Ihe são imanentes. Quanto mais complexa a sociedade, quanto mais se desenvolve, mais se sujeita a novas formas de conflito e o resultado é o que hoje se verifica, como alguém afirmou, em que "o maior desafio não é o de como viver e sim o da convivência". Conforme Anderson e Parker analisam, as formas de ação social não costumam desenvolver-se dentro•de um único tipo de relacionamento, pois "na maior parte das situações estão intimamente ligadas 
e mutuamente relacionadas de diversas formas". De fato, tal fenômeno ocorre, por exemplo, com empresas concorrentes que, no âmbito de um determinado departamento, firmam convênio para o desenvolvimento de um projeto de pesquisa, ou se unem a fim de pleitear um benefício de ordem fiscal. Na opinião dos dois sociólogos norte-americanos "nenhuma forma de ação é mais importante para a dinâmica da sociedade do que outra", não obstante reconheçam que uma pode ser mais desejável do que a outra. Em abono à presente opinião, é de se lembrar a tese do jurisconsulto alemão, Rudolf von Ihering, para quem a "luta" sempre foi, no desenrolar da históri•, um fator de propulsão das idéias e instituições jurídicas.

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