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Gilmar Mendes - Curso de Direito Constitucional (2009)

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Gilmar Ferreira Mendes 
Inocêncio Mártires Coelho 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
Curso 
OH-»S"t xt» \JLC10HL9L 1. 
-
4 s edição 
revista e atualizada 
2009 
Rua Henrique Schoumann, 270 , Pinheiros — São Paulo — SP 
CEP 05413-010 
PABX: (11 ) 3613 3000 
S A Ü U R : 0 8 0 0 0 5 5 7688 
De 2 a a 6 1 , das 8 :30 às 1 9 : 3 0 
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( C â m a r a B ras i l e i r o do L i v r o , SP, B ras i l ) 
Mendes, Gilmar Ferreira 
Curso de direito constitucional / Gilmar Ferreira 
Mendes, Inocêncio Mártires Coelho , Paulo Gustavo 
Gonet Branco. - 4. ed. rev. e atual. - São Patdo : 
Saraiva, 2009 . 
1. Brasil - Direito constitucional 2. Direito 
constitucional I. Coe lho , Inocêncio Mártires. II. 
Branco. Paulo Gustavo Gonet . III. Tí tulo . 
08-11262 C D U - 3 4 2 
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1. Direito constitucional i42 
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Av. A. J. Renner, 231 - Farrapos 
Fone/Fax: (51) 3371-4001 /3371-1467/3371-1567 
Porto Alegre 
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Av. Marquês de São Vicente, 1697 - Barra Fundo 
Fone: PABX (11) 3613-3000 — Saa Paulo 
Diretor editorial Antonio Luiz de Toledo Pinto 
Diretor de produção editorial Luiz Roberto Curió 
Editor Jônotas Junqueira de Mello 
Assistente editorial Ihiago Marcon de Souza 
Produção Editorial Lígia Alves 
Clarissa Boraschi Maria Coura 
Estagiário Vinícius Asevedo Vieira 
Preparação de originais Maria Lúcio de Oliveira Godoy 
Evandro Lisboa Ereire 
Arte e diagramação Cristino Aparecida Agudo de Ereitas 
Aldo Moutinho de Azevedo 
Revisão de provas Rita de Cássio Queiroz Gorgoti 
Maria Cândido Machado 
Serw&ediieuQis Koria Mario de Almeida Costa 
Caria Cristino Morgues 
Ano Paulo Mazzoco 
Muiroqui i Editoração Gráfica 
Dúvidas? 
Acesse www.saraivajur.com,br 
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida 
por qualquer meio ou forma sem a prévia autorização da 
Kditora Saraiva. 
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na 
Lei n. 9 .610/98 c punido pelo artigo 1S4 do Código Penal. 
EXPLICAÇÃO E DEDICATÓRIA 1 
Este livro integra-se ao recente selo em que o IDP se liga, com regozijo, à 
Editora Saraiva, no intuito comum de oferecer aos que se dedicam ao Direito 
novos cenários de reflexão jurídica. 
O IDP — Instituto Brasiliense de Direito Público surgiu em 1998 , com 
um curso que intitulamos Panorama Básico do Direito Constitucional. Hoje , 
contam-se na casa das dezenas as disciplinas jurídicas que compõem as grades 
dos nossos cursos de pós-graduação e, desde março de 2007 , do Mestrado em 
Direito Consti tucional, devidamente credenciado pela C A P E S . 
Os eventos do IDP estão sempre a se multiplicar, e nesse contexto o livro 
foi concebido; é, pois, a base das aulas que ministramos na pós-graduação, sob 
o nome de Curso Avançado de Direito Constitucional. Nele , cada um de nós se 
incumbe de um grupo de tópicos e essa divisão foi aqui respeitada. Assim, os 
capítulos sobre limites dos direitos fundamentais, direito de propriedade, direito 
adquirido, direitos fundamentais de caráter judicial, direito de nacionalidade, direitos 
políticos, Poder Executivo e Poder Judiciário, além de toda a parte sobre controle 
de constitucionalidade, foram escritos por Gi lmar Mendes. A Inocêncio Coe lho 
tocaram os capítulos sobre o ordenamento jurídico, fundamentos do Estado de Di-
reito, Estado de Direito e Estado de exceção, direitos sociais, princípios constitucionais 
da Administração Pública e sobre os princípios da ordem tributária e orçamentária, 
além dos tópicos de hermenêutica jurídica. Paulo Branco redigiu os capítulos 
sobre o Poder Constituinte originário e Poder Constituinte de reforma, sobre tópicos 
de teoria geral dos direitos fundamentais, liberdades fundamentais, Estado Federal, 
Poder Legislativo e sobre as Funções essenciais à Justiça, este último juntamente 
com Inocêncio Coe lho . 
Se concordamos em tantos pontos, daí não se pode inferir, porém, que 
coincidimos necessariamente em tudo. As idéias e convicções lançadas em cada 
parte do Curso, por isso, não devem ser tidas como compartidas necessariamente 
por todos os autores. 
O livro foi preparado sob a perspectiva de que nos dirigimos aos profis-
sionais do Direito e aos que se preparam para a condição de colega da área. 
Aborrecemos as posições que se credenciam apenas pela moda passageira, bem 
como nos enfastia a linguagem hermética, veículo de idéias mal-amanhadas, que 
mais não provoca do que a repulsa do leitor de bom senso. Queremos que você, 
leitor amigo, tenha uma visão tão nítida quanto possível das questões constitu-
cionais relevantes e que possa participar do nosso entusiasmo por essa província 
do Direito, de que depende a boa ordenação da sociedade democrática. 
V 
Pusemos nos capítulos a seguir o que nos parecia indispensável para que 
se transite com alguma segurança nos domínios do Direito Consti tucional. O 
leitor atento observará que este Curso é diferente de vários outros no enfoque e 
na seleção das matérias que o compõem. A disposição temática reflete a nossa 
experiência em torno das necessidades e inquietações que sentimos nos nossos 
amigos do IDP, e não é alheia à condição profissional de cada um de nós, que, 
além do magistério, nos dedicamos à prática jurídica em posições diversas: 
na Suprema Corte como seu membro (caso do primeiro autor do livro), na 
advocacia (caso do segundo autor) e como integrante do Ministério Público 
Federal (caso do terceiro autor). 
O Curso, por definição, não aspira ao status de Tratado. As digressões têm de 
ser resumidas e se impõe o corte de matérias. Não é nosso objetivo esgotar todo 
o estuário de temas relacionados com a Constituição; antes, o nosso empenho 
centrou-se em mapear o que se revela, atualmente, como impostergável. 
Acreditamos que estão expostos, no livro, os princípios necessários para 
que o leitor compreenda
e enfrente os desafios que o conta to com a Lei Maior 
pode propiciar. Isso — cremos também — é o essencial. Não há valia em nos 
reduzirmos ao estado do vertiginoso Funes, personagem a quem Jorge Luis Bor-
ges concedeu o extraordinário talento de reter, na atualidade da sua fantástica 
memória, todos os dados com que se defrontava, na íntegra das suas infindáveis 
minúcias. Funes, em conseqüência, era incapaz de idéias gerais, o que tornava 
o seu saber uma laboriosa inutilidade. "Pensar — ressalta Borges — é olvidar 
diferenças, é generalizar, abstrair", e a metáfora da morte da personagem por 
congestão não podia ser melhor achada 1 . 
Compreende-se, pois, que não nos propusemos a abarrotar o mundo do 
leitor com notícias doutrinárias excessivas, cansativas e acaso prescindíveis, 
mas desejamos apresentar-lhe as principais chaves para a solução de problemas 
reais e prementes. 
Daremos a nossa tarefa por cumprida se o leitor, na companhia deste volume, 
sentir-se disposto e confiante para viver a sua vocação de articulado profissional do 
Direito e de cidadão empenhado no aprimoramento da vida política nacional. 
Somos agradecidos a todos os que colaboraram de diversas formas com a 
confecção deste livro, lendo os seus originais, sugerindo e opinando. Agradece-
mos, de modo especial, a Valéria Porto, Ranuzia Braz dos Santos, André Rufino, 
Daniel Augusto, Christine de Oliveira Peter, Arnaldo Godoy, Liana Dourado e 
Francisco de Salles Mourão Branco. Expressamos nossa gratidão também para 
a formidável equipe de revisão da Editora Saraiva. 
Este livro, afinal, é dedicado aos nossos alunos do IDP. 
Gilmar Ferreira Mendes 
Inocêncio Mártires Coelho 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
' Jorge Luis Borges. Ficciones. Madrid: Alianza Emece, 1985. 
VI 
Nesta 4 a edição, várias passagens do Curso original foram reelaboradas 
e referências jurisprudenciais foram atualizadas. Houve a inclusão de novos 
tópicos. 
O leitor encontrará indicado, no sumário e no texto principal, junto a 
cada uma das divisões estabelecidas, o nome do autor a quem tocou o texto 
respectivo. 
Renovamos os agradecimentos constantes das edições anteriores. Externa-
mos a nossa gratidão também aos pesquisadores A n a Carol ina Figueiró Longo 
e Fábio Thomazini pela valiosa colaboração. 
V I I 
Explicação e dedicatória V 
Capítulo 1 
ORDENAMENTO JURÍDICO, CONSTITUIÇÃO 
E NORMA FUNDAMENTAL 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Ordenamento jurídico, Constituição e norma fundamental. Conceito, 
objeto e elementos da Consti tuição. Classificação das constituições. 
Fontes do direito constitucional. Supremacia constitucional 1 
1.1. Ordenamento jurídico, Constituição e norma fundamental 1 
1.2. Conceito e objeto da Constituição 4 
1.2.1. Constituição como garantia do status quo econômico e social 
(Ernst Forsthoff) 6 
1.2.2. Constituição como instrumento de governo (Hennis) 6 
1.2.3. Constituição como processo público (Peter Hãberle) 7 
1.2.4. Constituição como ordem fundamental e programa de ação 
que identifica uma ordem político-social e o seu processo 
de realização (Bãulin) 8 
1.2.5. Constituição como programa de integração) e representação 
nacionais (Krüger) 9 
1.2.6. Constituição como legitimação do poder soberano, segundo 
a idéia de Direito (Burdeau) 9 
1.2.7. Constituição como ordem jurídica fundamental, material 
e aberta, de determinada comunidade (Hesse) 10 
1.3. Objeto da Constituição 13 
1.4- Elementos da Constituição 13 
1.5. Supremacia constitucional 14 
1.6. Classificação das constituições 17 
1.7. Fontes do direito constitucional 20 
1.8. Preâmbulo 28 
1.8.1. A questão dos preâmbulos 28 
1.8.2. Conceito e definição de preâmbulo 29 
1.8.3. Natureza jurídica dos preâmbulos 30 
IX 
1.8.4- Funções do preâmbulo 34 
1.8.5. Os preâmbulos na experiência constitucional brasileira 37 
1.8.6. O preâmbulo da Constituição de 1988 38 
1.9. Disposições constitucionais transitórias 39 
1.9.1. Visão geral 39 
1.9.2. Valor jurídico das disposições constitucionais transitórias.. 41 
1.9.3. A inalterabilidade das disposições constitucionais transitórias. 44 
2. Norma constitucional: espécies e características, princípios jurídicos e 
regras de direito 46 
2 .1 . Introdução 46 
2.2. Normas constitucionais materiais e formais 46 
2.3. Normas constitucionais operativas e programáticas 49 
2.4. Normas constitucionais auto-executáveis e não auto-executáveis 49 
2.5. Normas de organização e normas definidoras de direitos 52 
2.6. Princípios jurídicos e regras de direito 52 
3. Direito, Estado e Estado de Direito. Origens, desenvolvimento histórico 
e modelos de Estado de Direito 61 
3.1 . Colocação do tema 61 
3.2. Conceito de Estado 61 
3.3. Conceito de Direito 63 
3.4- Conceito de Estado de Direito 63 
3.5. Origens, desenvolvimento histórico e modelos de Estado de Direito. 64 
3.6. Os grandes desafios: a "terceira via" e o Estado de Direito do gênero 
humano 70 
4- Hermenêutica filosófica e hermenêutica jurídica. O Direito como objeto 
cultural e o problema da compreensão. A dialética da aplicação do Direito 
e o caráter exemplar da hermenêutica jurídica para as ciências do espírito. 
Diretrizes para uma hermenêutica jurídica estrutural 75 
4-1 • Hermenêutica e Direito. O Direito como objeto cultural e o problema 
da compreensão 75 
4.2. A dialética da aplicação do Direito e o caráter exemplar da hermenêu-
tica jurídica para as ciências do espírito 77 
4-3. Diretrizes para uma interpretação estrutural dos modelos 
jurídicos 105 
5. Criação judicial do Direito. Fundamentos e limites da atividade judicial 
como fase do processo de produção normativa. Métodos e princípios da 
interpretação constitucional. Limites da interpretação constitucional. 
Mutação constitucional. Jurisdição constitucional: posição institucional, 
legitimidade e legitimação. Estado constitucional de Direito ou Estado 
judicial de Direito? 108 
X 
5.1. O cânone hermenêutico da autonomia do obj eto 108 
5.2. O problema da autonomia do objeto nas ciências do espírito 111 
5.3. A criação judicial do Direito em face do cânone hermenêutico da 
autonomia do objeto e do princípio constitucional da separação dos 
Poderes 114 
5.4- Métodos e princípios da interpretação constitucional 119 
5.4.1. Métodos da interpretação constitucional 121 
5.4.1.1. Método jurídico ou hermenêutico-clássico 122 
5.4-1.2. Método tópico-problemático 123 
5.4.1.3. Método hermenèutico-concretizador 125 
5.4-1-4. Método científico-espiritual 126 
5.4-1-5. Método normativo-estruturante 128 
5.4-1.6. Método da comparação constitucional 130 
5.5. Princípios da interpretação constitucional 132 
5.5.1. Princípio da unidade da Constituição 135 
5.5.2. Princípio da concordância prática ou da harmonização 136 
5.5.3. Princípio da correção funcional 138 
5.5.4- Princípio da eficácia integradora 139 
5.5.5. Princípio da força normativa da Constituição 140 
5.5.6. Princípio da máxima efetividade 140 
5.5.7. Princípio da interpretação conforme a Constituição 141 
5.5.8. Princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade 142 
5.6. Limites da interpretação constitucional 144 
5.7. Mutação constitucional 151 
5.8. Limites da mutação constitucional 152 
5.9. Jurisdição constitucional: posição institucional, legitimidade e legiti-
mação. Estado constitucional de Direito ou Estado judicial de Direito?. 155 
Capítulo 2 
FUNDAMENTOS DO ESTADO DE DIREITO 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Princípios da ordem política 169 
1.1. Princípio republicano 169 
1.2. Princípio do Estado Democrático de Direito 170 
1.3. Princípio da dignidade da pessoa humana 172 
1.4. Princípio da separação dos Poderes 177 
1.5. Princípio do pluralismo político 178 
1.6. Princípio da isonomia 179 
1.7. Princípio da legalidade 180 
X I 
Capítulo 3 
A EXPERIÊNCIA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA: 
DA CARTA
IMPERIAL DE 1824 À CONSTITUIÇÃO DEMOCRÁTICA DE 1988 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. A Carta Política do Império do Brasil de 1824 183 
2. A Constituição de 1891 186 
3. A Constituição de 1934 189 
4- A Carta Política de 1937 191 
5. A Constituição de 1946 194 
6. A Constituição de 1967 197 
7. A Emenda n. 1 à Constituição de 1967 201 
8. A Constituição de 1988 201 
Capítulo 4 
PODER CONSTITUINTE 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
I _ I N T R O D U Ç Ã O : O V A L O R DA C O N S T I T U I Ç Ã O — U M A 
PERSPECTIVA H I S T Ó R I C A 215 
1. Na Europa 215 
1.1. Supremacia do Parlamento e controle de constitucionalidade 222 
2. Nos Estados Unidos 2 2 4 
II — PODER C O N S T I T U I N T E O R I G I N Á R I O 231 
1. Momentos de expressão do poder constituinte originário 2 3 4 
2. Constituição de 1988: resultado de exercício do poder constiminte originário. 234 
3. Formas de manifestação do poder constituinte originário 235 
4. Questões práticas relacionadas com o poder constituinte originário 296 
4 .1 . Supremacia da Constituição 237 
4-2. Recepção 237 
4-3. Revogação ou inconstitucionalidade superveniente? 238 
4-4. Normas da antiga Constituição compatíveis com a nova Constituição 239 
4.5. Normas anteriores à Constituição e modificação de competência. 2 4 0 
4-6. Repristinação 241 
4.7. Possibilidade de se declarar inconstitucional norma anterior à Consti-
tuição, com ela materialmente compatível, editada com desobediên-
cia à Constituição então vigente 241 
4.8. Poder constituinte originário e direitos adquiridos 242 
III — PODER C O N S T I T U I N T E DE R E F O R M A 247 
1. Constituições rígidas e constituições flexíveis 247 
XII 
2. Denominações do poder de reforma 248 
3. Limites ao poder de reforma — espécies 249 
4. As limitações materiais — introdução 250 
4 .1 . Limites materiais — dificuldades teóricas para a sua aceitação 250 
4.2. Natureza da cláusula pétrea 251 
4-3. Finalidade da cláusula pétrea — o que ela veda 253 
4-4. Alcance da proteção da cláusula pétrea 253 
4-5. Controle de constitucionalidade de emendas em face de cláusula 
pétrea 255 
4.6 . As cláusulas pétreas em espécie 256 
4 .6 .1 . Forma federativa do Estado 256 
4.6.2. A separação de Poderes 257 
4.6.3. O voto direto, secreto, universal e periódico 257 
4.6.4- Os direitos e garantias individuais 257 
4.6.5. Direitos sociais e cláusula pétrea 258 
4-6.6. Criação de novos direitos fundamentais 259 
4.6.7. Direitos previstos em tratados sobre direitos humanos 260 
4.6.8. A cláusula pétrea da garantia do direito adquirido 261 
4.7. Cláusulas pétreas implícitas 262 
IV — M U T A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A L 263 
Capítulo 5 
TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 
I — D I R E I T O S FUNDAMENTAIS : T Ó P I C O S DE T E O R I A G E R A L .... 265 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
1. Introdução 265 
2. Histórico 265 
2.1 . Gerações de direitos fundamentais 267 
3. Concepções filosóficas justificadoras dos direitos fundamentais 269 
4. Noção material dos direitos fundamentais (fundamentalidade material).. 269 
5. Características dos direitos fundamentais 273 
5.1. Direitos universais e absolutos 273 
5.2. Historicidade 275 
5.3. Inalienabilidade/indisponibilidade 276 
5.4. Constitucionalização 278 
5.5. Vinculação dos Poderes Públicos 279 
5.5.1. Vinculação do Poder Legislativo 279 
XIII 
5.5.2. Vinculação do Poder Executivo 281 
5.5.3. Vinculação do Poder Judiciário 284 
5.6. Aplicabilidade imediata 285 
6. Tendências na evolução dos direitos humanos 287 
7. Funções dos direitos fundamentais 288 
7.1. A teoria dos quatro status de Jellinek 289 
7.2. Direitos de defesa, a prestação e de participação 289 
7.2.1. Direitos de defesa 289 
7.2.2. Direitos a prestação 291 
7.2.3. Direitos a prestação jurídica 292 
7.2.4- Direitos a prestações materiais 293 
7.2.5. Direitos fundamentais de participação 299 
7.2.6. índole ambivalente de vários direitos fundamentais 299 
8. Dimensões subjetiva e objetiva dos direitos fundamentais 299 
9. Direitos e garantias 302 
10. Garantias institucionais 302 
11. Outros direitos decorrentes do regime constitucional e de tratados 303 
12. Titularidade dos direitos fundamentais 305 
12.1. Direitos fundamentais e pessoa jurídica 305 
12.2. Direitos fundamentais e estrangeiros 3 0 6 
12.3. Capacidade de fato e capacidade de direito 307 
12.4. Sujeitos passivos dos direitos fundamentais 3 0 9 
13. Colisão de direitos fundamentais — breves considerações 3 1 8 
14. Direitos fundamentais e relações especiais de sujeição 325 
II — LIMITAÇÕES DOS D I R E I T O S F U N D A M E N T A I S 328 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Considerações gerais 3 2 8 
1.2. Âmbito de proteção: determinação 3 3 0 
1.3. Conformação e restrição 3 3 0 
1.3.1. Considerações preliminares 3 3 0 
1.3.2. Âmbito de proteção estritamente normativo 332 
2. Restrições a direitos fundamentais 333 
2.1 . Considerações preliminares 333 
2.2. Tipos de restrições a direitos individuais 3 3 6 
2.2.1. Reserva legal simples 3 4 0 
2.2.2. Reserva legal qualificada 343 
2.3. Direitos fundamentais sem expressa previsão de reserva legal 347 
3. Os limites dos limites 3 4 8 
XIV 
3.1. Considerações preliminares 3 4 8 
3.2. O princípio da proteção do núcleo essencial 349 
3.2.1. Considerações preliminares 3 4 9 
3.2.2. Diferentes posições dogmáticas sobre a proteção do núcleo 
essencial 3 5 0 
3.2.3. Núcleo essencial na doutrina constitucional brasileira 353 
3.3. O princípio da proporcionalidade 355 
3.3.1. Considerações preliminares 355 
3.3.2. Fundamentos do princípio da proporcionalidade 3 5 6 
3.3.3. Elementos do princípio da proporcionalidade 3 6 4 
3.3.4- Da proibição do excesso à proibição da proteção insuficiente 
(Untermassverbot) 367 
3.3.5. A proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal 
Federal 367 
3.3.6. Duplo controle de proporcionalidade e controle de proporcio-
nalidade in concreto 3 7 0 
3.4. Proibição de restrições casuísticas 373 
3.5. A colisão de direitos fundamentais 375 
3.5.1. Considerações preliminares 375 
3.5.2. Tipos de colisão 3 7 6 
3.5.3. Solução dos conflitos 377 
3.5.3.1. Considerações preliminares 377 
3.5.4. Colisão de direitos na jurisprudência do Supremo Tribunal 
Federal 3 8 0 
3.6. Concorrência de direitos fundamentais 3 9 0 
Apêndice 1 391 
Apêndice II 392 
Capítulo 6 
DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ESPÉCIE 
I — DIREITO A V I D A 393 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
1. Titularidade do direito à vida 
2. Direito à vida: direito de defesa e dever de proteção 
II — LIBERDADES 402 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
1. Liberdades de expressão 402 
1.1. Conteúdo da liberdade de expressão 403 
1.2. Sujeitos do direito à liberdade de expressão 4 0 4 
1.2.1. A liberdade de expressão enseja a pretensão do indivíduo 
de ter acesso aos meios de comunicação? 406 
XV 
1.3. Modos de expressão 407 
1.4. Limitações ao direito de expressão 4 0 9 
1.4.1. A verdade como limite à liberdade de expressão 4 1 4 
1.4-2. Expressão, honra e sensibilidade 4 1 6 
1.4.3. Liberdade de expressão, família e dignidade 417 
1.5. Proibição das manifestações em casos concretos 4 1 8 
2. Direito à intimidade e à vida privada 4 2 0 
2.1. Em que consiste o direito à privacidade e à intimidade? 4 2 0 
2.2. Limites ao direito à privacidade 4 2 4 
2.2.1. Restrição à privacidade com o consentimento do indivíduo 4 2 4 
2.3. Privacidade e sigilo bancário/fiscal 4 2 8 
2.4. Privacidade e inviolabilidade do domicílio 4 3 0 
2.4-1. Objeto da tutela da inviolabilidade do domicílio 431 
2.4-2. Os sujeitos do direito 432 
2.5. Privacidade e sigilo das comunicações 435 
3. Liberdade de reunião e de associação 437 
3.1. Direito de reunião 437 
3.1.1. Elementos do direito de reunião 4 3 8 
3.1.2. Limites do direito de reunião 4 4 0 
3.1.3. Hipótese de concorrência de
direitos 442 
3.1.4. Direito de abstenção e direito a prestação 443 
3.2. Liberdade de associação 4 4 4 
3.2 .1 . Breve notícia de história 445 
3.2.2. A liberdade de associação na Constituição Federal 4 4 6 
3.2.3. Conteúdo da liberdade de associação 447 
3.2.4. A base constitutiva da associação — pluralidade de pessoas 
e ato de vontade 447 
3.2.5. A finalidade da associação 4 4 8 
3.2.6. Dimensões subjetiva e objetiva do direito à livre associação 
— a liberdade de associação em face do Estado e em face 
dos particulares 4 4 9 
3.2.7. Entidades associativas e representação de associados 455 
4. Liberdade de consciência e de religião 4 5 6 
4 .1 . Liberdade de consciência 4 5 6 
4.1-1. Conteúdo da liberdade de consciência 4 5 6 
4-2. Liberdade religiosa 4 6 0 
III _ o DIREITO DE PROPRIEDADE NA C O N S T I T U I Ç Ã O DE 1988 465 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Considerações preliminares 465 
XVI 
2. Âmbito de proteção 467 
2.1 . Conceito de propriedade 467 
2.2. Propriedade e patrimônio 4 6 9 
2.3. Direito de propriedade e direitos subjetivos públicos de caráter 
patrimonial 4 7 0 
2.4. Direito autoral e sua proteção 471 
2.5. Propriedade de inventos, patentes e marcas 473 
2.6. Propriedade pública 475 
2.7. Direito de herança 475 
2.8. Alteração de padrão monetário e a garantia da propriedade 4 7 6 
2.8.1. Considerações preliminares 4 7 6 
2.8.2. Significado da garantia constitucional da propriedade e alte-
ração do padrão monetário 4 7 8 
3. Limitação 481 
3 .1 . Definição e limitação do conteúdo do direito de propriedade 481 
3.2. Restrição ao direito de propriedade e o princípio da proporcionalidade 486 
3.3. Desapropriação 4 8 8 
3.3.1. Considerações gerais 488 
3.3.2. Desapropriação indireta 492 
3.3.3. Desapropriação de imóvel rural para fins de reforma agrária... 493 
3.3.4- Desapropriação de imóvel urbano não edificado mediante pa-
gamento em títulos públicos 4 9 4 
3.4. Requisição 495 
3.5. Servidões administrativas 495 
3.6. Impenhorabilidade dos bens de família e garantia do fiador 4 9 6 
3.7. Usucapião de imóvel urbano 497 
3.8. Expropriação de terras destinadas à cultura de plantas psicotrópicas.. 498 
4. A garantia institucional do direito de propriedade como limite do limite 
(Schranken-Schranke) 4 9 8 
Anexo I 4 9 9 
Anexo II 4 9 9 
IV — DIREITO A D Q U I R I D O , A T O J U R Í D I C O PERFEITO, C O I S A 
J U L G A D A E S E G U R A N Ç A J U R Í D I C A 501 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Considerações preliminares 501 
2. Direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada 504 
3. Direito adquirido como garantia constitucional ou infraconstitucional? 505 
4. Direito adquirido e instituto jurídico ou estatuto jurídico 508 
XVII 
5. Direito adquirido, direito de propriedade e outros direitos reais 515 
6. Graus de retroatividade e sua repercussão sobre o estatuto contratual.... 517 
6.1. Considerações gerais 517 
6.2. Direito adquirido e leis monetárias 521 
7. Direito adquirido e recurso judicial 5 2 4 
8. A doutrina do direito adquirido na jurisprudência do Supremo Tribunal 
Federal 525 
9. Insuficiência da doutrina do direito adquirido e o princípio da segurança 
jurídica 531 
V — D I R E I T O S F U N D A M E N T A I S D E C A R Á T E R J U D I C I A L 
E G A R A N T I A S C O N S T I T U C I O N A I S DO P R O C E S S O 535 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Introdução 535 
2. Proteção judicial efetiva 5 3 9 
2.1. Considerações gerais 539 
2.2. Âmbito de proteção 5 4 0 
2.2.1. Considerações preliminares 540 
2.2.2. Duplo grau de jurisdição 540 
2.2.3. Arbitragem e juízo arbitral 543 
2.2.4. Duração razoável do processo 545 
2.2.5. Publicidade do processo 547 
2.2.6. Questões políticas 5 5 0 
2.3. Titularidade 553 
2.4. Conformação e limitação 5 5 4 
2 .4 .L Proibição de liminares e exigência de caução 557 
2.4-2. Necessidade de motivação das decisões judiciais 5 5 9 
2.4.3. Substituição processual 561 
2.4.4- Fórmulas de preclusão e outras exigências formais 5 6 4 
2.4-5. Proteção judicial efetiva e Justiça Desportiva 565 
2.5. Habeas corpus 565 
2.5.1. Considerações gerais 565 
2.5.2. Âmbito de proteção 566 
2.5.2.1. Considerações gerais 566 
2.5.2.2. Habeos corpus, ilegalidade que não afeta direito de lo-
comoção e fungibilidade 569 
2.5.2.3. Punições disciplinares militares 571 
2.5.2.4- Cabimento de habeas corpus contra decisão denegato-
ria de liminar em habeas corpus 572 
XVIII 
2.5.3. Titularidade 575 
2.5.4- Conformação e limitação 577 
2.6. Mandado de segurança 577 
2.6.1. Considerações gerais 577 
2.6.2. Âmbito de proteção 578 
2.6.2.1. Considerações preliminares 5 7 8 
2.6.2.2. Mandado de segurança coletivo 580 
2.6.2.3. Impetração de mandado de segurança por órgãos 
públicos 582 
2.6.2.4- Mandado de segurança contra tramitação de proposta 
de emenda constitucional 583 
2.6.2.5. Mandado de segurança contra lei em tese 584 
2.6.3. Titularidade 5 8 4 
2.6.4. Conformação e limitação 585 
2.7. Mandado de injunção 587 
2.8. Habeasdata 588 
2.8.1. Considerações preliminares 5 8 8 
2.8.2. Âmbito de proteção 588 
2.8.3. Conformação e limitação 589 
2.9. Ação popular, ação civil pública, ADI , A D C , ADI por omissão e 
ADPF como instrumentos de proteção judicial 589 
3. Direito à ampla defesa e ao contraditório (na esfera judicial e administrativa) 591 
3.1. Considerações preliminares 591 
3.2. Âmbito de proteção 591 
3.2.1. Considerações preliminares 591 
3.2.2. Processo penal 592 
3.2.2.1. Considerações preliminares 592 
3.2.2.2. Denúncia genérica 5 9 4 
3.2.2.3. Falta de apresentação de alegações finais por parte da 
defesa 597 
3.2.2.4. Condenação com base exclusiva no inquérito policial. 599 
3.2.2.5. Direito de defesa e inquérito policial 6 0 0 
3.2.2.6. Emendatio libelli e mutatio libelli 601 
3.2.2.7. Excesso de linguagem na pronúncia 603 
3.2.3. Aplicação do direito à defesa e ao contraditório nos processos 
administrativos em geral 604 
3.2.3.1. Direito de defesa nos procedimentos administrati-
vos e questões de fato e de direito 608 
3.2.3.2. Direito de defesa e aprovação de proventos de aposen-
tadoria ou pensões pelo T C U 608 
X I X 
3.2.3.3. Direito de defesa nos processos de cassação/rejeição 
de contas de prefeitos 609 
3.2.3.4- Direito ao contraditório e à ampla defesa no processo 
administrativo disciplinar 6 1 0 
3.2.3.5. Direito de defesa nos processos disciplinares contra 
parlamentares 6 1 0 
3.3. Conformação e limitação 611 
4- Direito de petição 611 
4 .1 . Considerações gerais 611 
4.2. Âmbito de proteção 612 
4 .2 .1 . Conceito de petição 612 
4.2.2. Destinatários da petição 612 
4.2.3. Requisitos de admissibilidade 612 
4.2.4. Pretensão de ser informado 613 
4.3. Titularidade 614 
4.4. Conformação e limitação 614 
5. Direito ao juiz natural e proibição de tribunais de exceção 615 
5.1. Considerações gerais 615 
5.2. Âmbito de proteção 616 
5.2.1. Considerações preliminares 616 
5.2.2. A competência da Justiça Militar 617 
5.2.2.1. Considerações preliminares 617 
5.2.2.2. Conformação da Justiça Militar Estadual 618 
5.2.3. Prerrogativa de foro e o princípio do juiz natural 619 
5.3. Titularidade 623 
5.4- Conformação e limitação 623 
5.5. Instituição do Tribunal do Júri 624 
5.5.1. Considerações gerais 624 
5.5.2. Âmbito de proteção 625 
5.5.3. Conformação e limitação 627 
6. Garantias constitucionais quanto à definição do crime, à pena e sua 
execução 628 
6.1. Mandatos constitucionais de criminalização 628 
6.2. Princípios da legalidade e da anterioridade penal 634 
6.2.1. Considerações gerais 634 
6.2.2. Âmbito de proteção 635 
6.2.2.1. Considerações preliminares 635 
6.2.2.2. Determinabilidade do tipo penal e proibição de analogia 636 
X X 
6.2.2.3. Proibição de retroatividade da lei penal 639 
6.2.2.4- Conformação
e limitação 646 
6.3. Princípio da responsabilidade pessoal e responsabilidade patrimonial 
do agente e dos sucessores 646 
6.3.1. Considerações gerais 646 
6.3.2. Âmbito de proteção 647 
6.3.3. Conformação e limitação 648 
6.4. Tipos da pena admitidos e proibição de penas cruéis ou da pena 
de morte 648 
6.4.1. Considerações gerais 648 
6.4-2. Âmbito de proteção 649 
6.5. Individualização da pena e progressão do regime penal 652 
6.5.1. Considerações gerais 652 
6.5.2. Âmbito de proteção 655 
6.5.2.1. Considerações preliminares 655 
6.5.2.2. Direito à individualização: novo conteúdo 658 
6.5.3. Conformação e limitação 658 
7. Da não-extradição de brasileiro e da não-extradição de estrangeiro por 
crime pol í t ico ou de opinião e de outras l imitações ao processo 
extradicional 660 
7.1. Considerações gerais 660 
7.2. Âmbito de proteção 661 
7.2.1. Considerações preliminares: não-extraditabilidade do brasi-
leiro nato ou naturalizado 661 
7.2.2. Não-extraditabilidade do estrangeiro por crime político ou 
de opinião 664 
7.3. Titularidade 669 
7.4. Conformação e limitação 669 
7.4-1. Considerações preliminares 669 
7.4.2. Não-extraditabil idade e ausência de observância dos 
parâmetros do devido processo legal 670 
7.4-3. A prisão preventiva para extradição 674 
7.4.4- Extradição e pena de morte ou prisão perpétua 675 
8. Presunção de não-culpabilidade 676 
8.1. Considerações gerais 676 
8.2. Âmbito de proteção 678 
8.2.1. Considerações gerais 678 
XXI 
8.2.2. Presunção de não-culpabilidade e compatibilidade com o reco-
lhimento à prisão para apelar e com a inadmissibilidade de li-
berdade provisória 679 
8.3. Conformação e limitação 6 8 4 
9. A garantia do devido processo legal 685 
9.1. Considerações preliminares 685 
9.2. Da inadmissibilidade da prova ilícita no processo 687 
9.2.1. Considerações preliminares 687 
9.2.2. Âmbito de proteção 687 
9.2.2.1. Considerações preliminares 687 
9.2.2.2. Interceptações e gravações 690 
9.2.2.2.1. Interceptação e gravação ambiental 690 
9.2.2.2.2. Interceptação e gravação telefônica 692 
9.2.2.2.3. Interceptação telefônica, juiz competente e encon-
tro fortuito de outras provas 696 
9.2.2.3. A inviolabilidade de dados ou da comunicação de dados 
e a liceidade da prova 700 
9.2.2.4. Da inviolabilidade de domicílio e da busca e apreensão 702 
9.3. Das garantias constitucionais quanto à prisão 704 
9.3.1. Considerações gerais 704 
9.3.2. Das condições da prisão em flagrante, da prisão preventiva, da 
prisão provisória, da restituição da liberdade e da liberdade 
provisória com ou sem fiança 704 
9.3.2.1. Prisão em flagrante 705 
9.3.2.2. Prisão preventiva 708 
9.3.2.2.1. Requisitos e prazos para prisão preventiva 712 
9.3.2.3. Prisão temporária 713 
9.3.2.4- Liberdade provisória, restituição da liberdade e relaxa-
mento da prisão ilegal 714 
9.3.3. Do dever de comunicação da prisão e do local, onde se encon-
tre o preso, ao juiz competente e à família ou pessoa por 
ele indicada, informação dos direitos do preso, inclusive 
o direito ao silêncio, direito à assistência da família e de 
advogado, direito à identificação dos responsáveis pela prisão 
ou pelo interrogatório policial 716 
9.3.3.1. Considerações gerais 716 
9.3.3.2. Da comunicação imediata ao juiz competente e aos 
familiares do preso do local onde se encontra 716 
9.3.3.2.1. Âmbito de proteção 716 
9.3.3.2.2. Direito de assistência da família e do advogado 718 
XXII 
9.3.3.3. Do direito de permanecer em silêncio 718 
9.3.3.3.1. Considerações gerais 718 
9.3.3.3.2. Âmbito de proteção 719 
9.3.3.3.3. Direito ao silêncio nas Comissões Parlamen-
tares de Inquérito e nos processos disciplinares.... 722 
9.3.3.3.3.1. Conformação e limitação 722 
9.3.4- Direito de identificação dos responsáveis pela prisão ou pelo 
interrogatório policial 723 
9.3.5. Regime da prisão sob estado de defesa 723 
9.4. Proibição da prisão civil por dívida 723 
9.4-1. Considerações preliminares 723 
9.4-2. Âmbito de proteção 725 
9.4-3. Conformação e limitação 725 
9.4.3.1. Prisão civil do alimentante 725 
9.4.3.2. Prisão civil do depositário infiel 728 
9.4-4. Prisão civil do depositário infiel em face dos tratados interna-
cionais de direitos humanos 737 
Capítulo 7 
DIREITOS SOCIAIS 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Colocação do tema 757 
2. Os direitos civis e políticos e os direitos econômicos, sociais e culturais . 758 
3. Direitos sociais em espécie 762 
4. A interpretação constitucional e os direitos sociais 762 
Capítulo 8 
DIREITO DE NACIONALIDADE E REGIME 
JURÍDICO DO ESTRANGEIRO 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Considerações gerais 765 
2. Nacionalidade brasileira 765 
2.1 . Considerações preliminares 765 
2.2. Brasileiros natos 766 
2.3. Brasileiros naturalizados 769 
2.4- Distinção entre brasileiro nato e naturalizado 769 
2.5. Perda da nacionalidade brasileira 770 
3. O Estatuto de Igualdade entre brasileiros e portugueses 771 
XXIII 
4- Regime jurídico do estrangeiro 772 
4.1- Considerações preliminares 772 
4.2. Exclusão do estrangeiro por iniciativa local 772 
4-3. Asilo político 776 
4-4. A situação de refugiado 777 
Capítulo 9 
DIREITOS POLÍTICOS NA CONSTITUIÇÃO 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Introdução 779 
2. Âmbito de proteção 779 
2.1 . Direito ao sufrágio 779 
2.2. Voto direto, livre, secreto, periódico e igual 783 
2.3. Igualdade de voto e sistemas eleitorais 784 
2.3.1. Considerações gerais 784 
2.3.2. O sistema proporcional brasileiro 786 
2.4- Plebiscito, referendo e iniciativa popular 800 
2.5. Condições de elegibilidade 802 
2.5.1. Das inelegibilidades 805 
3. Restrição ou limitação de direitos políticos: perda e suspensão de direitos 
políticos 810 
3.1. Perda de direitos políticos 8 1 0 
3.2. A suspensão dos direitos políticos 811 
4- Dos partidos políticos 8 1 4 
4 .1 . Considerações preliminares 814 
4.2. Autonomia, liberdade partidária, democracia interna e fidelidade 
partidária 817 
4 .2 .1 . Noções gerais 817 
4-2.2. Fidelidade partidária e extinção do mandato 821 
4.3. Igualdade de "chances" entre os partidos políticos 829 
4.4. Financiamento dos partidos 839 
4-5. Acesso ao rádio e à televisão 844 
4.6. O princípio da anualidade da lei eleitoral e o devido processo legal 
eleitoral 845 
Capítulo 10 
ORGANIZAÇÃO DO ESTADO 
I — E S T A D O FEDERAL 847 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
1. Notícia de História 847 
XXIV 
2. Características básicas do Estado Federal 8 4 8 
2.1 . Soberania e autonomia 848 
2.2. Existência de uma Constituição Federal 849 
2.3. Repartição de competências prevista constitucionalmente 849 
2.4- Participação dos Estados-membros na vontade federal 8 5 0 
2.5. Inexistência de direito de secessão 851 
2.6. Conflitos: o papel da Suprema Corte e a intervenção federal 851 
3. Conceito abrangente de Estado Federal 851 
4- Por que os Estados assumem a forma federal? 852 
5. O Estado Federal brasileiro 852 
5.1. A União 852 
5.1.1. Intervenção federal 853 
5.1.1.1. Entes passíveis de intervenção federal 856 
5.1.1.2. Procedimento 857 
6. Os Estados-membros 859 
6.1. Poder constituinte dos Estados-membros 860 
6.2. Auto-organização do Estado-membro e processo legislativo 861 
6.3. Separação de Poderes e princípio da simetria 862 
6.4. Limitação relativa a competência legislativa reservada da União.. 864 
7. Os Municípios 865 
8. O Distrito Federal 866 
9. Territórios 867 
10. A repartição de competências na Constituição de 1988 868 
10.1. Competência geral da União 868 
10.2. Competência de legislação privativa da União 868 
10.3. Competência relativa aos poderes reservados dos Estados 869 
10.4. Competência comum material da União, dos Estados-membros, 
do Distrito Federal e dos Municípios (competências concorrentes 
administrativas) 870 
10.5. Competência
legislativa concorrente 8 7 0 
10.6. Competências dos Municípios 871 
11. Inexistência de hierarquia entre lei federal e estadual 873 
12. Competência privativa ou exclusiva? 873 
13. Conflitos jurídicos no Estado Federal brasileiro 873 
I I _ P R I N C Í P I O S C O N S T I T U C I O N A I S DA A D M I N I S T R A Ç Ã O 
P Ú B L I C A 875 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Introdução 875 
2. Estrutura da Administração Pública 877 
X X V 
3. Princípios constitucionais da Administração Pública 881 
3.1. Princípio da legalidade 881 
3.2. Princípio da impessoalidade 883 
3.3. Princípio da moralidade 883 
3.4- Princípio da publicidade 884 
3.5. Princípio da eficiência 884 
4- Responsabilidade civil do Estado 884 
Capítulo 11 
ORGANIZAÇÃO DOS PODERES 
I _ PODER LEGISLATIVO 895 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
1. Introdução 895 
2. Estrutura e funcionamento 895 
3. Função de fiscalização 898 
3.1. As Comissões Parlamentares de Inquérito 899 
3.1 .1 . A previsão da CPI na Constituição 9 0 0 
3.1.2. Controle judicial dos atos da CPI 901 
3.1.3. Objeto da CPI 901 
3.1.4. Limitação cronológica 9 0 4 
3.1.5. CPI como direito das minorias parlamentares 905 
3.1.6. Poderes das Comissões Parlamentares de Inquérito 9 0 6 
3.1.7. Testemunhas e indiciados 9 0 6 
3.1.8. Testemunhas, CPI e separação de poderes 9 1 0 
3.1.9. Poderes cautelares 9 1 0 
3,. 1.10. Diligências e requisição de documentos 911 
3.1 .11. Atuação do advogado do depoente 9 1 4 
3.1.12. Considerações finais sobre as CPIs 9 1 4 
4- Função legislativa 915 
4 .1 . Processo legislativo 9 1 6 
4 .1 .1 . A iniciativa 916 
4 - l . l . L Iniciativa comum 9 1 6 
4.1.1.2. Iniciativa reservada 9 1 6 
4-1 • 1.3. Iniciativa privativa de órgãos do Judiciário 9 1 6 
4-1 • 1 -4- Iniciativa privativa do Ministério Público 9 1 6 
4-1-1.5. Iniciativa privativa da Câmara dos Deputados, do 
Senado e do Tribunal de Contas da União 917 
4.1.1.6. Iniciativa privativa do Presidente da República 917 
4.2. Discussão 9 1 8 
4.3. Votação 919 
XXVI 
4.4. Sanção ou veto 920 
4-5. Promulgação e publicação 921 
5. Notas sobre as espécies legislativas 922 
5.1. Leis delegadas ? 922 
5.1.1. Controle da delegação legislativa 923 
5.2. Lei ordinária e lei complementar 923 
5.3. Medidas provisórias 9 2 4 
5.3.1. Notícia de história 9 2 4 
5.3.2. As medidas provisórias na Constituição Federal de 1988. 
Natureza jurídica 925 
5.3.3. Efeitos 926 
5.3.4- Conceito de medida provisória 926 
5.3.5. Pressupostos da medida provisória 926 
5.3.6. Apreciação dos pressupostos da urgência e da relevância... 927 
5.3.7. Medida provisória. O conteúdo possível. Histórico legislativo 928 
5.3.8. As limitações de conteúdo à medida provisória 9 2 8 
5.3.8.1. Direito político 9 2 8 
5.3.8.2. Medida provisória e organização do Ministério Público 
e do Judiciário 9 2 9 
5.3.8.3. Medida provisória e leis orçamentárias 9 2 9 
5.3.8.4- Medida provisória e matéria de lei complementar 930 
5.3.8.5. Direito processual e direito penal 931 
5.3.8.6. Medida provisória e confisco de poupança 931 
5.3.8.7. Medida provisória e projeto de lei já aprovado pelo 
Congresso Nacional 931 
5.3.8.8. Medida provisória e instituição ou majoração de 
impostos 932 
5.3.8.9. Medida provisória e matéria da iniciativa legislativa 
exclusiva de outro Poder ou da competência exclusiva 
ou privativa do Congresso ou das suas Casas 933 
5.3.8.10. Reedição de medida provisória e medida provisória 
sobre matéria objeto de projeto de lei rejeitado 933 
6. Medida provisória — conversão em lei ou rejeição. A medida provisória 
no Congresso Nacional 9 3 4 
6.1. O prazo para apreciação da medida provisória 935 
6.2. Aprovação total da medida provisória 935 
6.3. Aprovação da medida provisória com emendas 936 
6.4. Não-conversão da medida provisória em lei 937 
7. Outras questões em torno das medidas provisórias 939 
XXVII 
7.1. Medida provisória que declara a inconstitucionalidade de outra... 939 
7.2. Medidas provisórias editadas e em vigor antes da EC n. 3 2 / 2 0 0 1 . . 9 4 0 
7.3. Eficácia da medida provisória reeditada no regime anterior à EC 
n. 32/2001 9 4 0 
7.4. Possibilidade de os Estados e o Distrito Federal editarem medidas 
provisórias 941 
8. Estatuto do congressista 941 
8.1. Prerrogativa de foro 9 4 4 
8.2. Perda do mandato 945 
8.3. Deputados estaduais e distritais 9 4 6 
8.4. Vereadores 9 4 6 
II _ PODER E X E C U T I V O 947 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Eleição e mandato do Presidente da República 9 4 8 
2. Reeleição do Presidente da República 9 4 8 
3. Vice-Presidente da República, substituição e vacância 9 4 9 
4- Ordem de sucessão e vacância dos cargos de Presidente e Vice-Presidente 
da República 951 
5. Ministros de Estado 952 
5.1. Considerações gerais 952 
5.2. Requisitos especiais para o exercício de determinados cargos e sua 
compatibilidade com o cargo de Ministro de Estado 953 
5.3. Exercício de cargo de Ministro de Estado por parlamentar e quebra 
de decoro 955 
6. Atribuições do Presidente da República 956 
6.1. Direção da Administração Federal 9 5 6 
6.1.1. Expedição de regulamento 9 5 6 
6.1.2. Regulamento "autorizado" 9 5 8 
6.1.3. Decretos autônomos 9 6 0 
6.2. Relação com o Congresso Nacional e atuação no processo legislativo.. 961 
6.2.1. Considerações preliminares 961 
6.2.2. Edição de medidas provisórias 963 
6.2.3. Sanção, veto, promulgação e publicação 965 
6.2.4- Convocação extraordinária do Congresso Nacional 965 
6.2.5. Atribuições no plano das relações internacionais 965 
6.3. Atribuições concernentes à segurança interna, preservação da ordem 
institucional e da harmonia das relações federativas 967 
XXVIII 
6.4. Nomeação de juízes do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais 
Superiores 967 
7. Responsabilidade do Presidente da República, imunidades e prerrogativas. 967 
7.1. Considerações preliminares 967 
7.2. Crimes de responsabilidade: conceito 9 6 8 
7.3. Procedimento 9 6 9 
7.4. Renúncia ao mandato no processo de crime de responsabilidade.. 971 
7.5. Processo contra o Presidente da República por crime comum 971 
8. Do Conselho da República 972 
9. Do Conselho de Defesa 972 
III — PODER J U D I C I Á R I O 9 7 4 
Gilmar Ferreira Mendes 
1. Introdução 974 
2. Garantias do Poder Judiciário 975 
2.1 . Organização, autonomia administrativa e financeira, aspectos 
institucionais 976 
2.2. Garantias e limitações dos membros do Poder Judiciário 978 
3. Órgãos do Poder Judiciário e competências 9 8 0 
3.1. Supremo Tribunal Federal 9 8 0 
3.1.1. Considerações gerais 9 8 0 
3.1.2. Competência do Supremo Tribunal Federal 9 9 0 
3.1.2.1. Considerações gerais 9 9 0 
3.1.2.2. Competências implícitas 9 9 6 
3.1.3. O Supremo Tribunal Federal e a modernização da prestação 
jurisdicional 998 
3.1.3.1. Considerações preliminares 998 
3.1.3.2. Repercussão geral e controle incidental de constitucio-
nalidade no Supremo Tribunal 1002 
3.1.3.3. O recurso extraordinário contra decisão de juizados 
especiais federais 1005 
3.1.4- O Supremo Tribunal Federal e as súmulas vinculantes 1008 
3.1.4-1- Considerações gerais 1008 
3.1.4.2. Requisitos formais da súmula vinculante, revisão e 
cancelamento 1009 
3.1.4-3. Obrigatoriedade e limites objetivos e subjetivos da 
súmula vinculante 1012 
X X I X 
3.1.4.4. Súmula vinculante e reclamação constitucional 1013 
3.2. Superior Tribunal de ] ustiça 1014 
3.2 .1 . Considerações gerais 1014 
3.2.2. Competência 1015 
3.2.3. Competência recursal do Superior Tribunal de Justiça 1016 
3.3. Tribunal Superior do Trabalho e Justiça do Trabalho 1019 
3.3 .1 . Considerações preliminares 1019 
3.3.2. Tribunais Regionais do Trabalho e juízes do trabalho 1020 
3.3.3. Competência da Justiça do Trabalho 1020 
3.4- Tribunal Superior Eleitoral e Justiça Eleitoral
1021 
3.4 .1 . Considerações preliminares 1021 
3.4-2. Competência 1022 
3.5. Superior Tribunal Militar e Justiça Militar 1024 
3.6. Tribunais Regionais Federais e juízes federais 1026 
3.6 .1 . Competência 1026 
3.6.2. Competência dos Tribunais Regionais Federais 1031 
3.7. Tribunais de Justiça estaduais, juízes estaduais e Justiça Militar 
estadual 1032 
4- Do Conselho Nacional de Justiça 1033 
4 .1 . Considerações preliminares 1033 
4.2. Controvérsia sobre a constitucionalidade do Conselho Nacional 
de Justiça 1035 
4.3. Conselho Nacional de Justiça e Supremo Tribunal Federal 1035 
IV — M I N I S T É R I O P Ú B L I C O , A D V O C A C I A E D E F E N S O R I A 
PÚBLICA — F U N Ç Õ E S E S S E N C I A I S À J U S T I Ç A 1037 
Paulo Gustavo Gonet Branco 
1. Ministério Público 1037 
1.1. Notícias de história 103 7 
1.2. Característica básica do Ministério Público 1039 
1.2.1. Princípios institucionais 1039 
1.3. Garantias e vedações 1040 
1.4- A organização do Ministério Público 1041 
1.4.1- O Ministério Público estadual 1041 
1.4-2. O Ministério Público da União 1042 
1.5. Competências do Ministério Público 1043 
2. Outras funções essenciais à Justiça 1044 
X X X 
2.1. Advocacia 
2.2. Advocacia pública. 
2.3. Defensoria Pública 
1044 
1045 
1047 
Capítulo 12 
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE 
Gilmar Ferreira Mendes 
I _ C O N S T I T U C I O N A L I D A D E E INCONSTITUCIONALIDADE, DE-
FESA DA CONSTITUIÇÃO, TIPOS DE INCONSTITUCIONALIDADE 1049 
1. Considerações preliminares 1049 
2. Constitucionalidade e inconstitucionalidade 1051 
3. Defesa e proteção da Constituição 1054 
3.1. Considerações preliminares 1054 
3.2. Notas sobre os modelos jurisdicionais de controle de constitucionalidade 1056 
3.3. Os diferentes tipos de inconstitucionalidade 1060 
3.3 .1 . Considerações preliminares 1060 
3.3.2. Inconstitucionalidade formal e inconstitucionalidade material 1061 
3.3.2.1. Inconstitucionalidade formal 1061 
3.3.2.2. Inconstitucionalidade material 1063 
3.3.3. Inconstitucionalidade originária e superveniente 1065 
3.3.3.1. Considerações preliminares 1065 
3.3.3.2. Vício formal: inconstitucionalidade originária 1070 
3.3.3.3. Configuração da inconstitucionalidade e mudança nas 
relações fáticas ou jurídicas 1073 
3.3.4- Inconstitucionalidade por ação e inconstitucionalidade por 
omissão 1075 
3.3.5. Inconstitucionalidade de normas constitucionais 1078 
3.3.5.1. O controle de constitucionalidade da reforma consti-
tucional e as "cláusulas pétreas" 1078 
3.3.5.2. Limites imanentes ao poder constituinte 1080 
II _ E V O L U Ç Ã O DO C O N T R O L E DE C O N S T I T U C I O N A L I D A D E 
NO DI REITO B R A S I L E I R O 1083 
1. Introdução 1083 
2. Considerações preliminares: a Constituição Imperial 1083 
3. O controle de constitucionalidade na Constituição de 1891 1084 
4- A Constituição de 1934 e o controle de constitucionalidade 1086 
5. O controle de constitucionalidade na Constituição de 1937 1088 
X X X I 
6. A Constituição de 1946 e o sistema de controle de constitucionalidade 1090 
6.1. A representação interventiva 1090 
6.2. A Emenda n. 16, de 1965, e o controle de constitucionalidade abstrato 1092 
7. O controle de constitucionalidade na Constituição de 1967/69 1094 
7.1. Considerações sobre o papel do Procurador-Geral da República no 
controle abstrato de normas sob a Constituição de 1967/69: proposta 
de releitura 1095 
7.2. O caráter dúplice ou ambivalente da representação de inconsti-
tucionalidade 1097 
8. O controle de constitucionalidade na Constituição de 1988 1101 
8.1. Considerações preliminares 1101 
8.2. Criação e desenvolvimento da ação declaratória de constitu-
cionalidade 1104 
8.3. Desenvolvimento da arguição de descumprimento de preceito 
fundamental 1106 
8.3.1. Considerações preliminares 1106 
8.3.2. Incidente de inconstitucionalidade e arguição de descum-
primento 1109 
III _ i C O N T R O L E INCIDENTAL O U C O N C R E T O 1111 
1. Introdução 1111 
2. Pressupostos de admissibilidade do controle incidental 1116 
2.1. Requisitos subjetivos 1116 
2.2. Requisitos objetivos 1117 
2.3. Participação de amicus curiae, do Ministério Público e de outros inte-
ressados no incidente de inconstitucionalidade perante os tribunais.. 1123 
2.4. Controle incidental de normas e parâmetro de controle 1124 
3. O controle incidental de normas no Supremo Tribunal Federal 1124 
3.1. Considerações preliminares 1124 
3.2. Possibilidade de declaração incidental de inconstitucionalidade pelo 
Supremo Tribunal sem que se verifique a relevância da aplicação 
da lei para o caso concreto 1125 
3.3. Repercussão geral e controle incidental de constitucionalidade no 
Supremo Tribunal 1126 
3.4. Controle preventivo de projeto de emenda constitucional em manda-
do de segurança 1127 
3.5. O papel do Senado Federal 1127 
3.5.1. A suspensão pelo Senado Federal da execução de lei declarada 
inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal na Consti-
tuição de 1988 1131 
X X X I I 
3.5.2. A repercussão da declaração de inconstitucionalidade pro-
ferida pelo Supremo Tribunal sobre as decisões de outros 
tribunais 1133 
3.5.3. A suspensão de execução da lei pelo Senado e mutação 
constitucional 1133 
4. Peculiaridades do controle incidental na Constituição de 1988 1140 
4 .1 . Considerações preliminares 1140 
4.2. A ação civil pública como instrumento de controle de constitu-
cionalidade 1141 
4.3. O controle incidental e a aplicação do art. 27 da Lei n. 9.868/99 . 1146 
IV — A Ç Ã O DIRETA DE I N C O N S T I T U C I O N A L I D A D E 1151 
1. Considerações preliminares 1151 
2. Pressupostos de admissibilidade da ação direta de inconst i tucio-
nalidade 1152 
2.1 . Legitimação para agir e capacidade postulatória 1152 
2.1.1. Legitimação de confederação sindical e entidade de classe 
de âmbito nacional 1152 
2.1.2. Pertinência temática 1157 
2.1.3. Governador de Estado/Assembléia Legislativa e relação de 
pertinência 1158 
2.1.4- Direito de propositura dos partidos políticos 1158 
2.2. Objeto da ação direta de inconstitucionalidade 1159 
2.2.1. Leis e atos normativos federais 1159 
2.2.2. Leis e atos normativos estaduais 1162 
2.2.3. Leis e atos normativos distritais 1163 
2.2.4. Atos legislativos de efeito concreto 1164 
2.2.5. Direito pré-constitucional 1165 
2.2.6. Projeto de lei e lei aprovada mas ainda não promulgada .... 1166 
2.2.7. Ato normativo revogado 1167 
2.2.8. A problemática dos tratados 1168 
2.2.9. Lei estadual e concorrência de parâmetros de controle 1168 
2.3. Parâmetro de controle 1170 
2.4- Procedimento 1171 
2.4.1. Requisitos da petição inicial e admissibilidade da ação 1172 
2.4-2. Intervenção de terceiros e amicus curiae 1173 
2.4.3. Informações das autoridades das quais emanou o ato 
normativo e manifestações do Advogado-Geral da União e do 
Procurador-Geral da República 1175 
XXXII I 
2.4-4. Apuração de questões fáticas no controle de constitu-
cionalidade 1176 
2.4.5. Medida cautelar 1177 
3. Decisão 1178 
V — A Ç Ã O D E C L A R A T Ó R I A DE C O N S T I T U C I O N A L I D A D E 1180 
1. Criação da ação declaratória de constitucionalidade 1180 
2. Legitimidade para propositura da ação declaratoria 1181 
2.1 . Considerações preliminares 1181 
2.2. Demonstração da existência de controvérsia judicial na ação 
declaratoria de constitucionalidade 1181 
3. Objeto 1184 
4- Parâmetro de controle 1184 
5. Procedimento 1184 
5.1. Considerações preliminares 1184 
5.2. Requisitos da petição inicial e admissibilidade da ação 1185 
5.3. Intervenção de terceiros e amicus curiae 1187 
5.4. Apuração de questões fáticas no controle de constitucionalidade. 1189 
6. Medida cautelar 1189 
7. Decisão 1190 
V I — A R G U I Ç Ã O D E D E S C U M P R I M E N T O D E P R E C E I T O
FUNDAMENTAL 1192 
1. Introdução 1192 
1.1. Origens da lei sobre a arguição de descumprimento de preceito 
fundamental 1192 
1.2. A controvérsia sobre a constitucionalidade da Lei n. 9.882/99 1194 
1.3. Incidente de inconstitucionalidade e arguição de descumprimento ... 1195 
1.4- Características processuais: caráter principal ou incidental 1198 
1.5. A arguição de descumprimento de preceito fundamental na 
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal 1198 
2. Legitimidade para argüir o descumprimento de preceito fundamental... 1200 
2.1. Considerações preliminares 1200 
2.2. Legitimação ativa 1201 
2.3. Controvérsia judicial ou jurídica nas ações de caráter incidental.. 1201 
2.4- Inexistência de outro meio eficaz: princípio da subsidiariedade 1202 
3. Objeto da arguição de descumprimento de preceito fundamental 1208 
3.1. Considerações preliminares 1208 
3.2. Direito pré-constitucional 1208 
X X X I V 
3.3. Lei pré-constitucional e alteração de regra constitucional de compe-
tência legislativa 1209 
3.4- O controle direto de constitucionalidade do direito municipal em 
face da Constituição Federal 1210 
3.5. Pedido de declaração de constitucionalidade (ação declaratória) 
do direito estadual e municipal e arguição de descumprimento 1211 
3.6. A lesão a preceito decorrente de mera interpretação judicial 1212 
3.7. Contrariedade à Constituição decorrente de decisão judicial sem 
base legal (ou fundada em falsa base legal) 1213 
3.8. Omissão legislativa no processo de controle abstrato de normas e 
na arguição de descumprimento de preceito fundamental 1215 
3.9. O controle do ato regulamentar 1216 
4- Parâmetro de controle 1216 
4 .1 . Considerações preliminares 1216 
4-2. Preceito fundamental e princípio da legalidade: a lesão a preceito 
fundamental decorrente de ato regulamentar 1219 
5. Procedimento 1222 
5.1. Requisitos da petição inicial e admissibilidade das ações 1222 
5.2. Informações e manifestações do Advogado-Geral da União e do 
Procurador-Geral da República 1223 
5.3. Intervenção de terceiros e amicus curiae 1224 
5.4- Apuração de questões fáticas e densificação de informações na ação 
de descumprimento de preceito fundamental 1224 
6. Medida cautelar 1225 
7. As decisões do Supremo Tribunal Federal na arguição de descumprimento.... 1226 
7.1. Procedimento de tomada de decisões 1226 
7.2. Técnicas de decisão, efeitos da declaração de inconstitucionalidade, 
segurança e estabilidade das decisões 1227 
VII _ A A Ç Ã O D I R E T A DE I N C O N S T I T U C I O N A L I D A D E P O R 
O M I S S Ã O 1229 
1. Introdução 1229 
2. Pressupostos de admissibilidade da ação direta de inconstitucionalidade 
por omissão 1233 
2.1. Considerações preliminares 1233 
2.2. Legitimação para agir 1234 
3. Objeto da ação direta de inconstitucionalidade por omissão 1236 
3.1. Considerações preliminares 1236 
3.2. Omissão legislativa 1237 
X X X V 
3.2.1. Considerações preliminares 1237 
3.2.2. A omissão parcial 1240 
3.2.3. Casos relevantes de omissão legislativa na jurisprudência 
do S T F 1243 
3.3. Omissão de providência de índole administrativa 1245 
3.3 .1 . Exercício de poder regulamentar 1245 
3.3.2. Omissão de medidas ou atos administrativos 1245 
4- Procedimento 1247 
4-1. Considerações gerais 1247 
4-2. Cautelar em ação direta de inconstitucionalidade por omissão 1247 
5. A decisão na ação direta de inconstitucionalidade por omissão 1249 
5.1. Suspensão de aplicação da norma eivada de omissão parcial e/ou 
aplicação excepcional 1253 
5.2. Suspensão dos processos 1256 
VIII — M A N D A D O DE I N J U N Ç Ã O 1257 
1. Cons iderações gerais 1257 
2. Âmbito de proteção 1257 
3. O mandado de injunção na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal... 1260 
4- O direito de greve do servidor e a viragem da jurisprudência 1265 
IX — A R E P R E S E N T A Ç Ã O INTERVENTIVA 1274 
1. Introdução 1274 
2. Pressupostos de admissibilidade da representação interventiva 1277 
2.1. Considerações preliminares 1277 
2.2. Legitimação ativa ad causam 1278 
2.3. Objeto da controvérsia 1279 
2.3.1. Considerações preliminares 1279 
2.3.2. Representação interventiva e atos concretos 1281 
2.3.3. Representação interventiva e recusa à execução de lei 
federal 1282 
2.4- Parâmetro de controle 1283 
3. Procedimento 1288 
3.1. Considerações preliminares 1288 
3.2. Procedimento da representação interventiva segundo o Regimento 
Interno do S T F 1288 
3.3. Cautelar na representação interventiva 1289 
3.4- Procedimento da representação interventiva — Necessidade de 
nova lei 1290 
4. Decisão 1292 
XXXVI 
X — AS DECISÕES NO C O N T R O L E DE C O N S T I T U C I O N A L I D A D E 
DE N O R M A S E S E U S EFEITOS 1296 
1. Introdução 1296 
2. A declaração de nulidade da lei 1296 
2.1 . Considerações preliminares 1296 
2.2. Declaração de nulidade total 1297 
2.2.1. Declaração de nulidade total como expressão de unidade 
técnico-legislativa 1297 
2.2.2. Declaração de nulidade total em virtude da dependência 
ou interdependência entre as partes constitucionais e 
inconstitucionais da lei 1298 
3. Declaração de nulidade parcial 1299 
4. Declaração de nulidade parcial sem redução de texto 1300 
5. A interpretação conforme à Constituição 1302 
5.1. Introdução 1302 
5.2. Qualificação da interpretação conforme à Constituição 1303 
5.3. Admissibilidade e limites da interpretação conforme à Constituição. 1307 
5.4- Entre a interpretação conforme e a decisão manipulativa de efeitos 
aditivos 1307 
6. A declaração de constitucionalidade das leis e a "lei ainda constitucional". 1309 
7. A declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade e a 
declaração de inconstitucionalidade de caráter restritivo ou limitativo . 1311 
7.1. Introdução 1311 
7.2. As decisões proferidas no mandado de injunção e na ação direta 
de inconstitucionalidade por omissão 1312 
7.3. Reflexões conceptuais 1314 
7.3.1. Considerações preliminares 1314 
7.4- Aplicação da lei inconstitucional 1317 
7.5. A declaração de inconstitucionalidade de caráter limitativo ou 
restritivo 1319 
7.5.1. Considerações preliminares 1319 
7.5.2. A declaração de inconstitucionalidade restritiva, sua reper-
cussão sobre as decisões proferidas nos casos concretos e 
admissão da limitação de efeitos no sistema difuso 1321 
XI _ S E G U R A N Ç A E ESTABILIDADE D A S DECISÕES EM C O N -
T R O L E A B S T R A T O DE CONSTITUCIONALIDADE E A RECLA-
M A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A L 1325 
1. Considerações preliminares 1325 
2. Eficácia erga omnes e declaração de constitucionalidade 1325 
XXXVII 
3. Limites objetivos da eficácia erga omnes: a declaração de constitucionalidade 
da norma e a reapreciação da questão pelo S T F 1328 
4. Eficácia erga omnes na declaração de inconstitucionalidade proferida 
em ação declaratória de constitucionalidade ou em ação direta de 
inconstimcionalidade 1330 
5. A eficácia erga omnes da declaração de nulidade e os atos singulares 
praticados com base no ato normativo declarado inconstitucional 1330 
6. A eficácia erga omnes da declaração de inconstitucionalidade e a superve-
niencia de lei de teor idêntico 1331 
7. Conceito de efeito vinculante 1332 
7.1. Limites objetivos do efeito vinculante 1333 
7.2. Limites subjetivos 1338 
7.3. Efeito vinculante da cautelar em ação declaratória de consti-
tucionalidade 1339 
7.4. Efeito vinculante da decisão concessiva de cautelar em ação direta 
de inconstitucionalidade 1340 
7.5. Efeito vinculante de decisão indeferitória de cautelar em ação direta 
de inconstitucionalidade 1341 
7.6. Efeito vinculante de decisão proferida em ação direta de inconsti-
tucionalidade 1342 
8. Eficácia erga omnes, efeito vinculante da decisão e reclamação 1343 
8.1. Considerações preliminares 1343 
8.2. Objeto da reclamação 1346 
8.2.1.
A reclamação para assegurar a autoridade das decisões do 
Supremo Tribunal — Considerações gerais 1346 
8.2.2. A reclamação para assegurar o cumprimento de decisão de 
mérito em ação direta de inconstitucionalidade e em ação 
declaratória de constitucionalidade 1347 
8.2.3. Cabimento da reclamação para preservar a autoridade de 
decisão do Supremo Tribunal Federal em cautelar concedida 
em ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória 
de constitucionalidade 1350 
8.3. Decisão em arguição de descumprimento de preceito fundamental 
e reclamação 1351 
9. Procedimento: linhas gerais 1354 
XII — O C O N T R O L E A B S T R A T O DE C O N S T I T U C I O N A L I D A D E 
DO DIREITO E S T A D U A L E DO DI REITO MUNICIPAL 1356 
1. Considerações preliminares 1356 
2. Controle do direito estadual e municipal na Constituição de 1988 e a 
coexistência de jurisdições constitucionais estaduais e federal 1357 
XXXVIII 
3. Concorrência de parâmetros de controle 1364 
4- Parâmetro de controle estadual e questão constitucional federal 1366 
4 .1 . Considerações preliminares 1366 
4-2. Recurso extraordinário e norma de reprodução obrigatória 1367 
5. Ação declaratória de constitucionalidade no âmbito estadual 1369 
6. A arguição de descumprimento de preceito fundamental e o controle 
de atos municipais em face da Constituição Federal 1371 
6.1. Considerações gerais 1371 
7. O controle da omissão legislativa no plano estadual 1371 
8. O controle de constitucionalidade no âmbito do Distrito Federal 1373 
8.1. Considerações preliminares 1373 
8.2. A possibilidade de instituição de ação direta no âmbito do Distrito 
Federal 1375 
9. Eficácia erga omnes das decisões proferidas em sede de controle abstrato 
no âmbito estadual 1378 
9.1. Considerações preliminares 1378 
Capítulo 13 
ESTADO DE DIREITO E ESTADO DE EXCEÇÃO 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Estado de direito e estado de exceção . Democracia , emergência 
constitucional e defesa das instituições democráticas. Estado de defesa e 
estado de sítio 13 83 
1.1. A organização constitucional e as crises 1383 
1.2. A emergência constitucional no Direito comparado 1387 
1.3. Emergência constitucional no Direito brasileiro. Antecedentes 
históricos e situação atual 1391 
Capítulo 14 
PRINCÍPIOS DA ORDEM TRIBUTÁRIA 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Princípios da ordem tributária 1395 
1.1. Princípio da estrita legalidade tributária 1397 
1.2. Princípio do tratamento isonômico 1397 
1.3. Princípio da anterioridade 1398 
1.4. Princípio da irretroatividade das leis tributárias 1398 
X X X I X 
1.5. Princípio do não-confisco 1398 
1.6. Princípio da capacidade contributiva 1400 
Capítulo 15 
PRINCÍPIOS DA ORDEM ORÇAMENTÁRIA 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Princípios da ordem orçamentária 1401 
1.1. Princípio da legalidade 1401 
1.2. Princípio da unidade 1402 
1.3. Princípio da universalidade 1402 
1.4. Princípio do orçamento bruto 1403 
1.5. Princípio da anualidade ou periodicidade 1403 
1.6. Princípio do equilíbrio 1404 
Capítulo 16 
PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Princípios da ordem econômica e financeira 1405 
1.1. Princípio da função social da propriedade 1407 
1.2. Princípio da livre concorrência 1409 
1.3. Princípio da defesa do consumidor 1413 
Capítulo 17 
PRINCÍPIOS DA ORDEM SOCIAL 
Inocêncio Mártires Coelho 
1. Princípios da ordem social 1417 
1.1. Princípio da solidariedade 1418 
1.2. Princípio da responsabilidade 1418 
1.3. Princípio do equilíbrio financeiro e atuarial 1419 
1.4- Princípio da reserva do financeiramente possível 1420 
1.5. Princípio do acesso universal e igualitário às ações e serviços de 
saúde 1421 
1.6. Princípios informadores da educação: universalidade, igualdade, 
pluralismo, gratuidade do ensino público, valorização dos profis-
sionais, gestão democrática da escola e padrão de qualidade 1421 
1.7. Princípios da comunicação social: liberdade de manifestação do 
pensamento, de criação, de expressão e de informação 1422 
X L 
1.8. Princípios relativos ao meio ambiente 1423 
1.9. Princípios gerais relativos à família, à criança, ao adolescente e ao 
idoso: igualdade e proteção 1425 
1.10. Princípios relativos aos índios 1427 
Referências 1429 
índice alfabético-remissivo 1471 
XLI 
ORDENAMENTO JURÍDICO, 
CONSTITUIÇÃO E NORMA FUNDAMENTAL 
1. ORDENAMENTO JURÍDICO, CONSTITUIÇÃO E NORMA FUNDA-
MENTAL. CONCEITO, OBJETO E ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO. 
CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES. FONTES DO DIREITO CONS-
TITUCIONAL SUPREMACIA CONSTITUCIONAL 
INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO 
1.1. Ordenamento jurídico. Constituição e norma fundamental 
Como a compreensão do ordenamento jurídico, enquanto tal, está inti-
mamente ligada às idéias de Constituição e de norma fundamental, as quais, por 
seu turno, reaparecerão quando formos abordar as questões hermenêuticas 
e o problema da criação judicial do Direito, impõe-se desde logo situar essa 
temática, sumariamente embora, antes de tratarmos da estrutura e da classifi-
cação das normas jurídicas, sobretudo as de nível constitucional, que possuem 
especial relevância para a interpretação/aplicação da normatividade ordinária 
em geral1. 
Registrando, desde logo, que são múltiplos os sentidos atribuídos à expres-
são norma fundamental— a que correspondem outras tantas funções correlatas —, 
inclusive na obra de Hans Kelsen, a quem se deve a sua mais ampla utilização 
no jogo de linguagem do Direito, esclarecemos que, para os fins desta exposição, 
qualificaremos como norma fundamental aquela norma que, numa determinada 
comunidade política, unifica e confere validade às suas normas jurídicas, as quais, 
em razão e a partir dela, se organizam e/ou se estruturam em sistema1. 
Resumidamente, em palavras do próprio Kelsen, considera-se norma 
fundamental aquela que constitui a unidade de uma pluralidade de normas, 
enquanto representa o fundamento de validade de todas as normas pertencen-
1
 Sobre a importância e funções da interpretação constitucional para a totalidade do orde-
namento jurídico, ver Pablo Pérez Tremps, Tribunal Constitucional y poder judicial, Madrid: 
Centro de Estudios Constitucionales, 1985, p. 120; e Jerzy Wróblewski, Constitución y teoría 
general de la interpretación jurídica, Madrid: Civitas, 1985, p. 93-114. 
2
 Sobre os sentidos e funções da norma fundamental, Juan Antonio García Amado, Hans 
Kelsen y la norma fundamental, Madrid: Marcial Pons, 1996. 
1 
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tes a essa ordena normativa; aquela norma que, pelo fato mesmo de situar-se 
na base do ordenamento jurídico, há de ser pressuposta, visto que não pode 
ser posta por nenhuma autoridade, a qual, se existisse e tivesse competência 
para editá-la, só disporia dessa prerrogativa em razão de uma outra norma de 
hierarquia ainda mais elevada, e assim sucessivamente; aquela norma, enfim, 
cuja validade não pode ser derivada de outra e cujo fundamento não pode ser 
posto em questão3. 
Em síntese, como aquele grande jurista acabou admitindo4, essa norma 
fundamental seria uma ficção, um como se; um recurso de que se vale o pensa-
mento quando ele não consegue alcançar o seu objetivo com os elementos 
disponíveis; um truque da razão jurídica graças ao qual, mesmo sem podermos 
contar com essa norma como dado de realidade, nós a utilizamos como hipótese 
instrumental, de natureza lógico-transcendental, para fundamentar não apenas 
a validade da primeira Constituição, mas também, a partir desta, a validade de 
todas as normas que integram o ordenamento jurídico, normas que, de resto, 
entrelaçam-se precisamente pelo conceito de validade, formal e derivativa, que 
cada uma recebe da que lhe é superior5. 
Dessarte, por uma questão de ordem prática, pois do contrário estaríamos 
condenados a um regressus
in infinitum, temos de supor a existência dessa norma 
inaugural — que determina se cumpra aquilo que prescreve a primeira Cons-
tituição6 — e sobre essa norma inaugural, meramente suposta, pôr a primeira 
Constituição histórica, cuja validade é o suposto último do qual depende a validade 
de todas as normas do sistema por ela instituído e de tudo quanto, a partir dela 
e na forma que ela mesma estabelecer, venha a ser positivado como direito7. 
Sobre a impossibilidade não apenas desse regresso fundante, mas também 
de uma interminável seqüência na escala de produção normativa — a chamada 
dupla finitude do Direito como limite da sua interpretação —, merece transcrição 
esta passagem de Sebastián Soler: 
"A filosofia jurídica moderna mostrou que, diferentemente de um raciocínio qual-
quer, consisten-te no encadeamento de proposições predicativas, a fundamentação 
jurídica não é suscetível de um desenvolvimento in infinitum. (...). 
A limitação do retrocesso fundante, além de ser um aspecto formal de toda es-
trutura jurídica, é concretamente uma característica positiva de todo sistema 
vigente de direito. A coisa julgada insere-se nessa estrutura fechada. Não recebe 
sua validez de nenhum sopro carismático que lhe infunde o órgão do Estado; é 
3
 Teoria pura do direito, Coimbra: Arménio Amado Ed., 1962, v. 2, p. 4. 
4
 Hans Kelsen, Teoria geral das normas, Porto Alegre: Sérgio A. Fabris, Editor, 1986, p. 328-
329; Carlos Maria Cárcova, La opacidad dei derecho, Madrid: Trotta, 1998, p. 36-37. 
5
 Maria José Falcón y Telia, Conceito e fundamento da validade do direito, Torres-RS: Instituto 
Brasileiro de Informática e Direito, 1998, p. 163-164. 
6
 Hans Kelsen, Teoria geral das normas, cit., p. 327. 
7
 Hans Kelsen, Teoria general dei derecho y dei Estado, México: UNAM, 1969, p. 135. 
2 
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que todo sistema jurídico autolimita não apenas o retrocesso fundante no sentido 
expresso acima, mas também o processo dedutivo, estabelecendo também aqui um 
limite além do qual não se pode ir. Num extremo da ordem jurídica está a Consti-
tuição, no outro, a coisa julgada; no direito, assim como não há 'regressus', tampouco 
há lprogressus' 'in infinitum', já que a existência deste último seria incompatível 
com aquela limitação. Toda regulação é, por natureza, limitada e limitante, e na 
regulação jurídica é característico que se estabeleça com bastante nitidez o limite 
do próprio desenvolvimento normativo. A sentença, eirada ou certa, não está 
dotada de validez pelo fato de que nela esteja depositada qualquer misteriosa 
essência vivificante. Toda a sua validez provém do mesmo sistema normativo que 
autolimita o âmbito da sua própria interpretação, quer dizer, não procede do juiz 
e sim de uma norma que declara irrevisível a sentença"8, (grifos nossos) 
Se e quando houver ruptura na cadeia de sustentação do sistema — no 
caso de uma revolução vitoriosa, por exemplo —, a velha ordem, globalmente 
considerada, desaparecerá porque terá sido trocada a norma básica que lhe 
conferia os atributos da juridicidade —fundamento, eficácia e vigência —, pas-
sando a vigorar, como direito novo, com o mesmo fundamento de validade, não 
apenas as normas editadas pelo poder recém-constituído, mas também aquelas 
que, embora positivadas antes do fato revolucionário, e em consonância com os 
valores então prevalecentes, admitam recepção pelo sistema emergente ou leitura 
conforme a nova ordem estabelecida. 
Por se constituir em texto que igualmente reputamos de grande importân-
cia, no particular, também merece transcrição esta passagem de Kelsen sobre o 
modo como se dá a absorção/convalidação ou a recepção das normas jurídicas 
preexistentes, nos momentos de ruptura ou de transição institucional: 
"Se algumas leis promulgadas sob o império da velha Constituição 'continuam 
válidas' com a nova Constituição, isso só é possível porque a nova Constituição 
lhes confere validade, expressa ou tacitamente. Esse fenômeno é um caso de 
recepção (semelhante à do Direito Romano). A nova ordem 'recepciona', quer 
dizer, adota normas da velha ordem; e isto significa que a nova ordem considera 
válidas (ou põe em vigor) normas que possuem o mesmo conteúdo daquelas que 
vigoravam sob a ordem precedente. A 'recepção' é, assim, um procedimento abre-
viado de criação jurídica. As leis que, em linguagem comum, permanecem válidas, 
do ponto de vista jurídico são leis novas, cujo sentido coincide com o das leis 
anteriores. Não são idênticas a essas leis, porque seu fundamento de validade é 
distinto e repousa na Constituição nova e não sobte a que foi substituída, não 
existindo continuidade entre essas duas constituições, quer sob a perspectiva da 
Constituição anterior, quer do ângulo da que foi promulgada posteriormente. 
Destarte, não é apenas, a Constituição, mas todo o ordenamento, que muda em con-
seqüência de uma revolução"9. (grifos nossos) 
Assim é que se desenvolvem, no jogo de linguagem do Direito, ao menos 
como este jogo é praticado por Kelsen, as relações, digamos, normais entre a Lei 
8
 La interpretación de la Ley, Barcelona: Ariel, 1962, p. 95-96. 
9
 Teoría general del derecho y del Estado, cit., p. 138. 
3 
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Fundamental — como hipótese ou ficção — e as constituições históricas, enquanto 
realidades constitucionais10. 
1.2. Conceito e objeto da Constituição 
Aplicando-se, também a essa temática, o insttumental teórico antes re-
ferido, sobretudo a idéia de pré-compreensão, poderemos afirmar que qualquer 
noção, por mais elementar que seja, sobre o conceito e objeto da Constituição 
estará condicionada, até certo ponto, pelo que desde logo — a partir de uma 
posição, de uma visão e de uma concepção prévias — nós acharmos o que é ou 
deve ser, e o que contém ou deve conter uma Constituição. 
Como, por outro lado, toda pré-compreensão possui algo de irracional 
porque, entre outros fatores que a detetminam, ela se funda em pré-juízos, pré-
suposições ou pré-conceitos — idéias-crenças ou evidências não refletidas, no 
sentido em que Ortega y Gasset as distinguia das idéias propriamente ditas, 
porque só estas resultam da nossa atividade intelectual1 1 —, em razão disso 
torna-se necessário racionalizar, de alguma forma, a pré-compreensão, o que se 
obterá pela reflexão crítica levada a cabo pela teoria da Constituição. 
Por isso, também constitui tarefa importante da teoria constitucional 
submeter a pré-compreensão da Constituição ao tribunal da razão, em ordem 
a distinguitmos ou pelo menos tentarmos distinguir os pré-juízos legítimos dos 
ilegítimos, os falsos dos verdadeiros e, assim, alcançarmos uma compreensão 
da Lei Fundamental, se não verdadeira, pelo menos constitucionalmente 
adequada. 
Nessa ordem de considerações, Gomes Canotilho afirma que a teoria da 
Constituição não se limita à tarefa de investigação ou descoberta dos problemas 
políticos constitucionais, tampouco à função de elemento concretizador das nor-
mas da Lei Fundamental, antes servindo, também, para racionalizar e controlar 
a pré-compreensão constitucional1 2. 
Posta a questão em termos de pré-compreensão constitucional, o primeiro 
e radical problema, cuja solução condicionará tudo o mais, consiste em sabermos 
como há de ser concebida a Lei Fundamental, se devemos considerá-la apenas 
como Constituição jurídica, simples estatuto organizatório ou mero instrumento 
de governo, no qual se regulam processos e se definem competências; ou, pelo con-
trário, se devemos admiti-la mais amplamente, como Constituição política, capaz 
10
 Para uma crítica da norma fundamental kelseniana, porque traz em si "potencialmente 
todas as possíveis variações do seu conteúdo normativo"; conduz ao arbítrio do legislador 
real, livre de qualquer vínculo jurídico-moral; identifica direito e força; e, ao limite,
acaba 
considerando todo Estado como Estado de Direito, cf. Hermann Heller, La soberania, México: 
UNAM, 1965; e Teoria do Estado, São Paulo: Mestre Jou, 1968. 
11
 Ideas y Creencias, in Obras completas, Madrid: Revista de Occidente, 1964, t. 5, p. 383-394. 
12
 Constituição dirigente e vinculação do legislador, Coimbra: Coimbra Ed., 1982, p. 80-81. 
4 
de se converter num plano normativo-matetial global, que eleja fins, estabeleça 
programas e determine tarefas. 
Noutras palavras, em resumo do próprio Canotilho, o que precisamos de-
cidir — antes de tudo — é se a Constituição há de ser uma lei do Estado, e só 
dele, ou o estatuto jurídico do fenômeno político em sua totalidade, ou seja, 
um plano normativo global que não cuide apenas do Estado, mas também de toda 
a sociedade13. 
É que, a partir dessa decisão preliminar, tanto a teoria quanto a praxis 
constitucionais refletirão a idéia ou a ideologia subjacentes a essa opção de base, 
tornando visível a vontade do constituinte, a fórmula política que, afinal, se 
materializou na Constituição e condicionará a sua realização1*. 
Como anotado anteriormente, a tesposta a essas indagações, que dizem 
respeito à natureza e à função de uma lei constitucional, surgirá do debate teo-
rético-jurídico e teorético-político travado no âmbito da teoria da Constituição, 
que é, precisamente, onde se inicia toda compreensão constitucional. 
Advertindo, desde logo — como o faz Konrad Hesse —, que em termos 
de conceito e peculiaridade da Constituição a teoria do direito constitucional 
ainda está engatinhando, sem ter chegado sequer a uma opinião dominante15, 
resumiremos, a seguir, algumas das mais importantes teorias constitucionais da 
atualidade, cuja compreensão facilitará o acesso aos temas e problemas com que 
se defronta a moderna teoria do direito constitucional, permitindo-nos, afinal, 
formular conceitos de Constituição que, mesmo sem contarem com a aceitação 
majotitária da doutrina, nem por isso careçam de consistência e utilidade. 
Em última análise, trata-se de procurar respostas que, à luz das diversas 
experiências constitucionais, possamos considerar pelo menos aceitáveis para 
aquelas indagações transcendentais que, enquanto tais, precedem ou condicio-
nam, criticamente, as opções concretas em torno dos modelos constitucionais 
revelados no curso da História. 
Nessa ordem de preocupações, acreditamos serem inevitáveis as perguntas 
listadas a seguir, porque traduzem alguns dos mais relevantes problemas com 
que se defronta a doutrina constitucional contemporânea, no particular aspecto 
do objeto e dos elementos consubstanciais a toda Constituição: 
13
 Constituição dirigente, cit., p. 12. 
14
 Sobre o conceito, alcance, finalidade e valor hermenêutico da fórmula política, cf. Raúl 
Canosa Usera, Interpretación constitucional y fórmula política, Madrid: Centro de Estudios Cons-
titucionales, 1988; sobre a idéia de realização constitucional, cf. Gomes Canotilho, Direito 
constitucional e teoria da Constituição, Coimbra: Almedina, 1998, p. 1074-
15
 Concepto y cualidad de la Constitución, in Escritos de derecho constitucional, Madrid: 
Centro de Estudios Constitucionales, 1983, p. 4; Elementos de direito constitucional da Repú-
blica Federal da Alemanha, tradução de Luís Afonso Heck, Porto Alegre: Sérgio A. Fabris, 
Editor, 1998, p. 26. 
• que tarefas ou funções devem ser confiadas à Constituição de um de-
terminado país? 
• que matérias têm ou devem ter dignidade constitucional? 
• deve a Constituição limitar-se a ser uma ordem de competências, uma 
simples norma de organização, embora de caráter fundamental? 
• deve, ao contrário, ostentar um bloco de diretrizes materiais, correspon-
dentes às aspirações e interesses de uma sociedade concreta, isto é, de uma 
sociedade historicamente situada e datada? 
• enfim, deve a Constituição simplesmente sancionar o existente ou 
servir de instrumento de ordenação, conformação e transformação da realidade 
política e social? 
Para ordenar as respostas a essas indagações, trabalharemos com as dou-
trinas constitucionais analisadas por Gomes Canotilho, cuja avaliação crítica, 
no particular, reputamos da maior utilidade para esta exposição. 
1.2.1. Constituição como garantia do status quo econômico e social 
(Ernst Forsthoff) 
Resumindo o que qualifica como as três idéias fundamentais que conden-
sam essa teoria constitucional, Canotilho diz que ela concebe a Constituição 
como garantia do status quo econômico e social; que é uma teoria da Constituição 
em busca do Estado perdido; e, finalmente, que é teoria da Constituição de um 
Estado de Direito meramente formal. 
Em razão desse indiferentismo, que entende inaceitável, quer quanto aos 
seus pressupostos, quer quanto às suas conseqüências — porque uma Constitui-
ção, materialmente entendida, não pode ser axiologicamente neutra, devendo, 
antes, ser democrática e social —, aquele ilustre constitucionalista lusitano diz 
que as idéias de Ernst Forsthoff não constituem ponto de partida para a ela-
boração de uma teoria da Constituição constitucionalmente adequada, de uma 
teoria capaz de compreender o Estado de Direito como ordem jurídica e política 
intencionalmente socializante, à semelhança do modelo inicial adotado pela 
Constituição portuguesa de 1976 1 6 . 
1.2.2. Constituição como instrumento de governo (Hennis) 
Assim compreendida, a Constituição não passa de uma lei processual, em 
cujo texto apenas se estabelecem competências, regulam-se processos e defi-
nem-se limites para a ação política. 
Mesmo contrariando uma tendência de grande parte da teoria constitucional 
contemporânea, que admite sobrecarregar o barco constitucional com matéria 
16
 Promulgada em 2-4-1976, com fórmula política assumidamente socialista — fruto da Revo-
lução dos Cravos, que pretendeu institucionalizar — essa Carta Política já passou por várias 
revisões, do que resultou transformar-se numa Constituição de índole social-democrática, 
essencialmente idêntica à dos outros membros da União Européia, em cujo âmbito parece não 
haver lugar para o chamado socialismo real. Para uma compreensão histórica dessa viragem 
política, ver o próprio Gomes Canotilho, in Direito constitucional, cit., p. 201-208. 
6 
política, econômica e social — uma tendência que, de resto, reflete e conforma 
a realidade constitucional posterior ao primeiro pós-guerra — quando no texto 
das constituições professorais "o político e o social tornam-se jurídico11—, mesmo 
contrariando essa tendência, a concepção instrumental da Constituição tem o 
mérito de facilitar a sua conversão em ordem fundamental do Estado e habilitá-la 
a absorver a clássica tensão entre Constituição e realidade constitucional"18. 
Trata-se de vantagem que, no entanto, deve ser vista com reservas porque 
uma Constituição excessivamente processual ou formal, além de não corres-
ponder às necessidades da prática política, ao limite acaba se convertendo em 
ordem de domínio dos agentes de determinada ideologia, porque atrás de todo 
positivismo jurídico, de toda neutralidade estatal ou de todo indiferentismo po-
lítico, escondem-se aqueles que lograram positivar a Lei Fundamental de acordo 
com as suas idéias, interesses e aspirações19. 
Precisamente por isso, arremata Canotilho, o problema maior não reside 
em contrapor uma Constituição, como instrumento de governo, a uma Consti-
tuição como ordem material fundamental de uma comunidade, mas em precisar o 
modo como "uma Constituição pode e deve ser uma ordem material"20. 
1.2.3. Constituição como processo público (Peter Hãberle) 
Nessa perspectiva, para utilizarmos palavras do próprio Háberle, longe 
de ser um simples estampido ou detonação originária que começa na hora zero, a 
Constituição escrita é, como ordem-quadro da República, uma lei necessária mas 
fragmentária, indeterminada e carecida
de interpretação, do que decorre, por outro 
lado, que a verdadeira Constituição será o resultado — sempre temporário e 
historicamente condicionado — de um processo de interpretação conduzido 
à luz da publicidade. 
Mais ainda, a Constituição é, ela mesma, um processo, donde Háberle 
insistir nessa expressão e em outras do mesmo sentido, tais como compreensão 
pluralística normativo-processual, alternativas, pluralização da legislação constitu-
cional, pluralidade de intérpretes e força normativa da publicidade. 
A luz dessa concepção, em palavras do próprio Háberle, a lei constitucio-
nal e a interpretação constitucional republicana aconteceriam numa sociedade 
pluralista e aberta, como obra de todos os participantes, em momentos de diálogo 
e de conflito, de continuidade e de descontinuidade, de tese e de antítese. Só assim, 
entendida como ordem jurídica fundamental do Estado e da sociedade, a Carta 
17
 Boris Mirkine-Guetzévitch, Les constitutions européennes, Paris: PUF, 1951, p. 17. 
18
 Gomes Canotilho, Constituição dirigente, cit., p. 87. 
19
 Sobre os fatores reais de poder, subjacentes em qualquer Constituição, Ferdinand Lassalle, 
A essência da Constituição, tradução de Walter Stõnner, Rio de Janeiro: Liber Júris, 1988. 
20
 Constituição dirigente, cit., p. 89. 
Política será também uma Constituição aberta, de uma sociedade aberta e verda-
deiramente democrática. 
Essa compreensão, bem se vê, chega a ser fascinante, sobretudo para aqueles 
que, a pretexto de combatetem o positivismo e a dogmática jurídica, processuali-
zam a visão do Direito e do Estado, sem se darem conta, no entanto, de que por 
esse caminho e ao limite acabarão dissolvendo a normatividade constitucional 
numa dinâmica absoluta e retirando da Lei Fundamental uma de suas mais im-
portantes dimensões, que é precisamente a de servir de instrumento ordenador, 
conformador e estabilizador da vida social2 1. 
Por isso, o próprio Canotilho, que inegavelmente admira as posições de 
Peter Hãberle, ao fazer o balanço crítico da teoria desse ilustre jurista alemão, 
opõe-lhe a ressalva de que, caracterizada como processo, a Lei Fundamental apre-
senta um elevado déficit normativo, pois a pretexto de abertura e de existencialismo 
atualizador do pluralismo, o que se tem em verdade é a dissolução da normati-
vidade constitucional na política e na interpretação, faltando pouco para se 
concluir que legiferação constituinte e interpretação constitucional são uma 
só e mesma coisa 2 2. 
1.2.4. Constituição como ordem fundamental e programa de ação 
que identifica uma ordem político-social e o seu processo de 
realização (Bãulin) 
Nessa perspectiva, a Constituição não é um simples instrumento de 
proteção das relações existentes, mas a norma fundamental em que se projeta 
e se realiza uma sociedade em devir e transformação, uma lei superior onde se 
indicam as mudanças e se definem os processos de conformação do sistema 
político, das relações sociais e da própria ordem jurídica. 
Concretamente, além de ser a lei básica do Estado (perspectiva jurídica), a 
Constituição é também a norma fundamental ordenadora e conformadora da 
vida social (perspectiva sociopolítico), em cujo âmbito se formulam os fins sociais 
globais mais significativos, onde se fixam limites às tarefas da comunidade e 
onde, afinal, se ordena o processo político como um todo. 
Em face desse amplo espectro, e para atingir seu desiderato, a Constituição 
deve ser, a um só tempo, ordem fundamental e programa de ação, do que resulta 
construída naturalmente — com e pela própria Constituição — a unidade so-
ciopolítica e econômica da sociedade. 
21
 Peter Hãberle, Hermenêutica constitucional, tradução de Gilmar Ferreira Mendes, Porto 
Alegre: Sérgio A. Fabris, Editor, 1997. Sobre a hermenêutica constitucional de Hãberle, ver 
Inocêncio Mártires Coelho, As idéias de Peter Hãberle e a abertura da interpretação consti-
tucional no direito brasileiro, Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 35,n.l37,p.l57-164, 
jan./mar. 1998; e Konrad Hesse/Peter Hãberle: um retorno aos fatores reais de poder, Revista 
de Informação Legislativa, Brasília, ano 35, n. 138, p. 185-191, abr./jun. 1998. 
22
 Constituição dirigente, cit., p. 476. 
8 
Diversamente do que sustentam Peter Hàberle e os seus seguidores, sob 
o enfoque de Bãulin — embora continue a ser concebida como um programa 
aberto e carente de concretização na praxis constitucional — a Lei Fundamental 
deve ser realizada dentro dos seus limites, sem descambar para um pluralismo ra-
dical, à moda de direito livre, em cujo âmbito torna-se difícil, talvez impossível, 
enxergarmos onde termina a realidade constitucional e começam as práticas 
inconstitucionais. 
1.2.5. Constituição como programa de integração e representação 
nacionais (Krüger) 
Vista como programa de integração e de representação nacionais, a Consti-
tuição é entendida, aqui, apenas como Constituição do Estado, do que decorre 
assumir-se a tese de que uma Constituição só deve conter aquilo que disser res-
peito à comunidade, à nação, à totalidade política — a chamada matéria consti-
tucional—, relegando-se tudo o mais, aquilo que a moderna constitucionalística 
denomina Constituição econômica, Constituição do trabalho, Constituição social, 
Constituição cidadã, por exemplo, à condição de Constituições subconstitucionais 
ou simplesmente subconstituições. 
Essa opção, é evidente, advém da compreensão de que a Constituição, 
para ter estabilidade e duração, não pode constitucionalizar matérias sujeitas a 
oscilações quotidianas, nem cristalizar interesses, relevantes embora, que digam 
respeito apenas a grupos particularizados e não à nação como um todo. 
Criticando essa compreensão da Lei Fundamental, Canotilho diz que ela 
padece dos defeitos do integracionismo mais extremo e não contempla os proble-
mas que hoje se colocam à Constituição de um Estado democrático, nos planos 
político, econômico e social2 3. 
1.2.6. Constituição como legitimação do poder soberano, segundo 
a idéia de Direito (Burdeau) 
Das mais conhecidas e admiradas, a teoria constitucional de Georges 
Burdeau tornou-se material de consumo intelectual obrigatório, seja pela cla-
reza da sua exposição, seja pela abrangência e concisão do seu enunciado — a 
Constituição é o estatuto do poder. 
Como observam os seus inúmeros adeptos, essa teoria tem a vantagem de 
associar a concepção de Constituição com a idéia de Estado de Direito, do qual ela 
se apresenta como pressuposto, tanto com referência aos governantes — porque 
os priva da condição originária de donos do poder, para reduzi-los ao papel de 
meros prepostos da sociedade política — quanto em relação ao próprio poder, 
cujo exercício é juridiázado, vale dizer, racionalizado pela Constituição. 
' Constituição dirigente, cit., p. 112. 
A Constituição, pela forma como atua sobre o poder — afirma Burdeau —, 
deve ser considerada verdadeiramente criadora do Estado de Direito, pois se 
antes dela o poder é mero fato, resultado das circunstâncias, produto de um 
equilíbrio frágil entre as diversas forças políticas que o disputam, com a Cons-
tituição esse poder muda de natureza, para se converter em Poder de Direito, 
desencarnado e despersonalizado24. 
1.2.7. Constituição como ordem jurídica fundamental, material e 
aberta, de determinada comunidade (Hesse) 
Temos, aqui, uma das mais prestigiosas teorias da Constituição do nosso 
tempo, embora, em rigor, não prime pela originalidade, como se verá a seguir. 
Com efeito, como deixam entrever os Escritos do próprio Konrad Hesse, 
se nos conscientizarmos de que não existe sequer uma opinião dominante sobre 
o conceito e a peculiaridade da Constituição — natureza, estrutura, sentido e 
funções da Lei Fundamental —, mas, ainda assim, pretendermos realizar algum 
trabalho profícuo nessa direção, mesmo que não
seja original, poderemos fazê-
lo apenas operando as teorias conhecidas e extraindo delas a iluminação para 
determinado aspecto ou dimensão do compreender constitucional. 
Se assim agirmos, acabaremos realizando tarefa útil e formulando um 
conceito sintetizador, tal como, afinal, foi conseguido por esse importante cons-
titucionalista alemão. 
Para tanto, partiu Konrad Hesse do reconhecimento de que, a par da 
inexistência daquela opinião dominante sobre, digamos, a essência da Consti-
tuição, o que antes se via era uma utilização acrítica de conceitos hauridos de 
teorias de outras épocas, manifestamente incapazes de dar consistência, teórica 
e prática, para uma doutrina da Constituição temporalmente adequada, para 
uma doutrina constitucional que reflita o modo como as leis fundamentais são 
vivenciadas nos dias atuais. 
Dessa tomada de posição, resultou uma análise na qual esse importante 
jurista contempotâneo levou em conta os aspectos ou dimensões ressaltados 
pelas doutrinas constitucionais precedentes — algumas das quais foram resu-
midas acima — para, afinal, formular o seu conceito de Constituição. 
Pela natureza do seu trabalho, pode-se dizer que, em vez de desenvolver 
uma teoria constitucional própria, Konrad Hesse em verdade apenas descre-
veu e integrou os diferentes ângulos a partir dos quais se poderia chegar a um 
conceito de Constituição, se não pacífico, pelo menos não rejeitável de plano 
por eventuais opositores. 
Trata-se da mesma e justa preocupação que torturou o saudoso professor 
Orlando Bitar, quando, no início dos anos sessenta, foi desafiado pelos seus ir-
reverentes alunos, na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Pará, a 
24
 Traité de science politique, Paris: LGDJ, 1980, t. 4, p. 44-45. 
10 
ministrar-lhes um conceito inatacável de direito constitucional, um repto a que 
ele respondeu formulando, também descritivamente, com palavras de exemplar 
probidade acadêmica, o seu conceito de direito constitucional: "é um sistema de 
normas, que regulam a organização, o funcionamento e a proteção de um deter-
minado Estado e os direitos e deveres fundamentais de seus jurisdicionados". 
"Preocupou-nos a busca, de certo modo torturada de um conceito válido para a 
universalidade dos Estados modernos; que revelasse uma bivalencia ainda relativa 
(ou, às vezes, nominal) face às duas concepções do mundo que dividem doloro-
samente nossa época. Também que fugisse a peculiaridades desta ou daquela área 
constitucional, prestando-se, é claro, por sua mesma generalidade, a retratá-la. 
Daí não termos dito normas supremas ou escritas, inválido para a Constituição 
btitânica; nem direitos individuais, inválido para a área socialista". 
Após essa explicação sintética, aquele erudito professor detalhou os ele-
mentos desse conceito, em texto que se tornou raro porque, ao que saibamos, 
só foi publicado em periódico do Diretório Acadêmico daquela Faculdade23. 
Mas, voltando a Konrad Hesse, diz-nos esse publicista que a Constituição 
deve ser entendida como a "ordem jurídica fundamental de uma comunidade 
ou o plano esttutural para a conformação jurídica de uma comunidade, segundo 
certos princípios fundamentais", uma tarefa cuja realização só se torna possível 
porque a Lei Fundamental: 
• fixa os princípios diretores segundo os quais se deve formar a unidade 
política e desenvolver as tarefas estatais; 
• define os procedimentos para a solução dos conflitos no interior da 
comunidade; 
• disciplina a organização e o processo de formação da unidade política 
e da atuação estatal; e 
• cria as bases e determina os princípios da ordem jurídica global2 6. 
Além das doutrinas aqui apresentadas, muitas outras também poderiam 
ser expostas, como a de Luhmann, para quem a Constituição é o elemento 
regulativo do sistema político; a de Modugno, que encara a Constituição como 
norma fundamental, forma de governo e princípio de normação jurídica; a de 
Carl Schmitt, que dissolve em quatro — absoluto, relativo, positivo e ideal — um 
conceito integral de Constituição, porque entende não ser possível visualizar 
a Lei Fundamental apenas de determinado ponto de vista; a de Fernando Las-
salle, para quem a verdadeira Constituição de um país é a soma dos fatores reais 
de poder que regem a vida dessa comunidade política; ou, finalmente, a teoria 
constitucional marxista-leninista, que encara a Constituição como a Lei Fun-
25
 Jornal Themis, Belém, ano I, n. 1, mar. 1965, p. 1 e 4. 
26
 Elementos de direito constitucional da República Federal da Alemanha, cit., p. 37, e Concepto 
y cualidad de la Constitución, in Escritos de derecho constitucional, cit., p. 16. 
11 
damental do Estado socialista, que organiza a vida social e estatal segundo os 
princípios do chamado socialismo real (Denisov e Kririchenko). 
Mesmo ampliando a lista das teorias constitucionais, ainda assim não logra-
ríamos alcançar a formulação de um conceito genérico e abstrato, que abrangesse, 
se não a totalidade, pelo menos a maioria das cartas políticas de que se tem co-
nhecimento; e isso pela simples razão de que esse hipotético conceito, para ter uma 
abrangência tão ampla, acabaria necessariamente esvaziado em seu conteúdo 
e, destarte, inviabilizado para fundamentar uma compreensão da Constituição 
conducente à solução de todos os problemas concretamente postos pela expe-
riência constitucional. 
Diversamente, se o pretendido conceito, para ser denso, ficasse demasiada-
mente preso a uma só e mesma experiência constitucional, já não valeria, pelo 
menos como conceito, porque se identificaria com um único objeto, deixando 
de ser, enquanto conceito, a representação dos traços essenciais abstraídos, ne-
cessariamente, de uma pluralidade de objetos. 
Relembremos, a propósito, aquela preocupação de Orlando Bitar em for-
mular um conceito inatacável de direito constitucional — um conceito que 
fosse válido para a universalidade dos Estados modernos; que revelasse uma 
bivalência, ainda que relativa, ou, às vezes, puramente nominal, em face das 
duas concepções do mundo que dividem a nossa época; um conceito, enfim, 
que fugisse a peculiaridades desta ou daquela área constitucional, mas que, por 
sua própria generalidade, se prestasse a retratá-las todas. 
Por isso, a moderna doutrina constitucional, no ponto, insiste em afirmar 
que a teoria da Constituição, para ser útil à metodologia geral do direito cons-
titucional, deve revelar-se como uma teoria da Constituição constitucionalmente 
adequada, o que só se conseguirá explorando, corretamente, um novo círculo 
hermenêutico, consistente na interação e na interdependência entre a teoria da 
Constituição e a experiência constitucional. A primeira, favorecendo a descoberta 
ou investigação das concretas soluções jurídico-constitucionais; a segunda, 
fornecendo o material empírico indispensável para dar consistência à teoria 
constitucional2 7. 
A esta altura, à guisa de teste sobre a consistência deste rol de doutrinas—que 
se fez deliberadamente amplo para abranger os vários pontos de vista sob os quais 
a temática constitucional deve ser abordada —, vamos analisar, criticamente, 
27
 A propósito, registre-se que em 1987, no início dos trabalhos da Assembléia Nacional Cons-
tituinte, o Senado Federal publicou uma obra em 9 volumes — Constituições estrangeiras 
— onde se acham compendiadas algumas das mais importantes experiências constitucionais 
de que se tem conhecimento, um precioso material empírico cujo manejo crítico-compara-
tivo, deliberadamente buscado com essa publicação, influenciou os nossos constituintes e 
contribuiu para que dessem à luz uma Carta Política que, em muitos pontos — no capítulo 
dos Direitos Fundamentais, por exemplo — nada fica a dever às mais avançadas constituições 
do nosso tempo. 
12 
o que nos diz sobre o conceito, o objeto e os elementos da Constituição
um dos 
nossos mais respeitados constitucionalistas, o professor José Afonso da Silva, 
para sabermos se as suas idéias, no particular, são constitucionalmente adequadas, 
isto é, se nos permitem compreender, por exemplo, a Constituição do Brasil 
na lógica de situação em que ela está inserida, enquanto Lei Fundamental da 
Sociedade e do Estado no atual momento da nossa evolução política. 
Pois bem, para o mestre paulista, "a Constituição do Estado, considerada 
sua Lei Fundamental, seria a organização dos seus elementos essenciais: um sis-
tema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, 
a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabe-
lecimento de seus órgãos e os limites de sua ação. Em síntese, a Constituição é 
o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado"28. 
1.3. Objeto da Constituição 
Exposto esse conceito de Constituição, sobre o qual falaremos adiante, 
José Afonso da Silva aponta como objeto das constituições parte do que já se 
contém no próprio conceito e algo mais, como se vê a seguir: "as constituições 
têm por objeto estabelecer a estrutura do Estado, a organização de seus órgãos, 
o modo de aquisição do poder e a forma de seu exercício, limites de sua atua-
ção, assegurar os direitos e garantias dos indivíduos, fixar o regime político e 
disciplinar os fins sócio-econômicos do Estado, bem como os fundamentos dos 
direitos econômicos, sociais e culturais"29. 
1.4. Elementos da Constituição 
Quanto aos elementos das constituições, após registrar que a doutrina di-
verge sobre o seu número e caracterização, afirma que a generalidade das leis 
fundamentais revela, em sua estrutura normativa, cinco categorias de elementos, 
assim definidos: 
• orgânicos, que se contêm nas normas que regulam a estrutura do Estado 
e do Poder; 
• limitativos, assim denominados porque limitam a ação dos poderes estatais 
e dão a tônica do Estado de Direito, consubstanciando o elenco dos direitos e 
garantias fundamentais: direitos individuais e suas garantias, direitos de nacio-
nalidade e direitos políticos e democráticos; 
• sócio-ideológicos, consubstanciados nas normas sócio-ideológicas, normas 
que revelam o caráter de compromisso das constituições modernas entre o Es-
tado individualista e o Estado Social, intervencionista; 
28
 Curso de direito constitucional positivo, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, 
p. 37-38. 
29
 Curso de direito constitucional positivo, cit., p. 42. 
13 
Deivison
Realce
• de estabilização constitucional, consagrados nas normas destinadas a asse-
gurar a solução de conflitos constitucionais, a defesa da Constituição, do Estado 
e das instituições democráticas, premunindo os meios e as técnicas contra sua 
alteração e infringência, a não ser nos termos nela própria estatuídos; e 
• formais de aplicabilidade, consubstanciados nas normas que estatuem regras 
de aplicação das constituições, assim, o preâmbulo, o dispositivo que contém 
as cláusulas de promulgação e as disposições transitórias30. 
Cotejando essas observações com as diferentes doutrinas expostas ao longo 
desta explanação, fácil é verificar que o jurista pátrio não pretendeu oferecer 
conceito próprio, nem indicar objeto e elementos das constituições segundo pontos 
de vista pessoais, antes se limitando a descrever o conteúdo das constituições 
contemporâneas e a indicar, em nossa atual Carta Política, quais dispositivos 
exemplificavam as diversas formulações teóricas, tudo de conformidade com 
a preconizada utilização fecunda do novo círculo hermenêutico, a que nos re-
ferimos linhas acima. 
Assim fazendo, não apenas se manteve nos limites de uma teoria da 
Constituição constitucionalmente adequada, como prestou significativa 
colaboração para colocar em evidência que a nossa experiência constitucional 
está em sintonia com a experiência das demais sociedades políticas do nosso 
tempo, profundamente marcadas pela preocupação em consolidar a idéia de 
que toda Constituição, para responder às exigências da sua época, há de ser 
compreendida não apenas como a Lei Fundamental do Estado, mas também 
como o principal instrumento de construção da sociedade do porvir. 
1.5. SUPREMACIA CONSTITUCIONAL 
Visualizado o ordenamento jurídico como uma estrutura hierarquizada de 
normas, cuja base repousa na ficção da norma fundamental hipotética, de que se 
utilizou Hans Kelsen para descrever a estática e a dinâmica jurídicas e, assim, 
a própria existência do direito, emerge, nítida, a supremacia da Constituição 
como ponto de apoio e condição de validade de todas as normas jurídicas, na 
medida em que é a partir dela, como dado de realidade, que se desencadeia o 
processo de produção normativa, a chamada nomogênese jurídica, que, em 
nosso direito positivo, por exemplo, está disciplinada, sob o título do processo 
legislativo, nos arts. 59 a 69 da Constituição de 1988. 
Noutras palavras, pela sua própria localização na base da pirâmide 
normativa, é a Constituição a instância de transformação da normatividade, 
puramente hipotética, da norma fundamental, em normatividade concreta, 
dos preceitos de direito positivo — comandos postos em vigor — cuja forma e 
conteúdo, por isso mesmo, subordinam-se aos ditames constitucionais. Daí se 
Curso de direito constitucional positivo, cit., p. 43-44-
14 
falar em supremacia constitucional formal e material, no sentido de que qualquer 
ato jurídico — seja ele normativo ou de efeito concreto —, para ingressar ou 
permanecer, validamente, no ordenamento, há se mostrar conforme aos pre-
ceitos da Constituição. 
No plano da teoria política, são de todos conhecidos e de permanente 
atualidade os ensinamentos de Alexander Hamilton sobre a supremacia da 
Constituição e a necessidade de protegê-la — de preferência entregando a sua 
guarda aos juízes, porque os menos perigosos —, para que essa superioridade não 
se reduzisse a um anseio de idealistas. São lições que se tornaram definitivas, 
e não apenas nos Estados Unidos, mas em todos aqueles países, igualmente 
inebriados pela filosofia da Ilustração e, mais especificamente, pelo ideário do 
constitucionalismo, que se deram constituições escritas e rígidas, que nelas cris-
talizaram as suas decisões políticas fundamentais e, afinal, que incumbiram os 
seus juizes de resguardá-las contra a miopia das maiorias ocasionais. São desse 
pregador entusiasmado as palavras transcritas a seguir, que imediatamente re-
percutiram na Suprema Corte dos Estados Unidos e, mais tarde, espalharam-se 
pelo Ocidente como língua materna das suas democracias: 
"Não há proposição que se apoie sobre princípios mais claros do que a que afir-
ma que todo ato de uma autoridade delegada, contrário aos termos do mandato 
segundo o qual se exerce, é nulo. Portanto, nenhum ato legislativo contrário à 
Constituição pode ser válido. Negar isto equivaleria a afirmar que o mandatário 
é superior ao mandante, que o servidor é mais que seu amo, que os representan-
tes do povo são superiores ao próprio povo e que os homens que trabalham em 
virtude de determinados poderes podem fazer não só o que estes não permitem, 
como, inclusive, o que proíbem. 
(...) 
Não é admissível supor que a Constituição tenha tido a intenção de facultat os 
representantes do povo para substituir a sua vontade à de seus eleitores. E muito 
mais racional entendet que os tribunais foram concebidos como um corpo inter-
mediário entre o povo e a legislatura, com a finalidade, entre várias outras, de 
mantet esta última dentro dos limites atribuídos à sua autoridade. A intenpretação 
das leis é própria e peculiarmente da incumbência dos tribunais. Uma Constituição 
é, de fato, uma lei fundamental e assim deve ser considerada pelos juizes. A eles 
pertence, portanto, determinar seu significado, assim como o de qualquer lei que 
provenha
do corpo legislativo. E se ocorresse que entre as duas existisse uma dis-
crepância, deverá ser preferida, como é natural, aquela que possua força obrigatória 
e validez superiores; em outtas palavras, deverá ser preferida a Constituição à lei 
ordinária, a intenção do povo à intenção de seus mandatários. 
Esta conclusão não supõe de nenhum modo a superioridade do poder judicial 
sobre o legislativo. Somente significa que o poder do povo é superior a ambos e 
que onde a vontade da legislatuta, declarada em suas leis, se acha em oposição 
com a do povo, declarada na Constituição, os juizes deverão ser governados pela 
15 
última de preferência às primeiras. Deverão regular suas decisões pelas normas 
fundamentais e não pelas que não o são" 3 1. 
Pois bem, já no ano de 1803, quando do julgamento do caso tAarbury v. 
Madison, John Marshall começará o seu voto dizendo que a questão de saber-se 
se uma resolução da legislatura incompatível com a Constituição pode tornar-se 
lei do país era uma questão profundamente interessante para os Estados Uni-
dos, mas felizmente não apresentava nenhuma dificuldade proporcional à sua 
magnitude e, para resolvê-la, bastaria o reconhecimento de certos princípios, 
que foram longa e otimamente estabelecidos. A evidência, pelo que adiante 
se lê, referia-se o famoso Chie/Justice, entre outras lições, aos ensinamentos de 
Alexander Hamilton, seu velho amigo e companheiro de ideais federalistas. 
"Que o povo tem direito originário de estabelecer para o seu futuro governo os 
princípios que se lhe antolharem mais concernentes a sua própria felicidade, são 
os alicerces sobre que se assenta o edifício americano. 
O exercício desse direito originário representa uma grande soma de esforços; não 
pode, não deve ser freqüentemente repetido. Os ptincípios assim estabelecidos 
são, pois, reputados fundamentais. E como é suprema a autoridade de onde eles 
dimanam, e raras vezes obra, são destinados a ser permanentes. 
A vontade originária e suprema organiza o governo e assina aos diversos depar-
tamentos seus respectivos poderes. E pode contentar-se com isso ou fixar certos 
limites para que não sejam ultrapassados por esses departamentos. 
Pertence à última classe o governo dos Estados Unidos. Os poderes da legislatura 
são definidos e limitados; e para que esses limites não possam se tornar confusos 
e apagados, a Constituição é esctita. 
(...) 
É uma ptoposição por demais clara para ser contestada, que a Constituição veta 
qualquer deliberação legislativa incompatível com ela; ou que a legislatura possa 
alterar a Constituição por meios ordinários. 
Não há meio termo entre estas alternativas. A Constituição ou é uma lei supetior 
e predominante, e lei imutável pelas formas ordinárias; ou está no mesmo nível 
conjuntamente com as resoluções ordinárias da legislatura e, como as outras 
resoluções, é mutável quando a legislatura houver por bem modificá-la. 
Se é verdadeira a primeira parte do dilema, então não é lei a resolução incompa-
tível com a Constituição; se a segunda parte é verdadeira, então as constituições 
escritas são absurdas tentativas da parte do povo para delimitar um poder por sua 
natureza ilimitável. 
Certamente, todos quantos fabricaram constituições escritas considetaram tais 
instrumentos como a lei fundamental e predominante da nação e, conseguinte-
O Federalista, Rio de Janeiro: Editora Nacional de Direito, 1959, p. 314. 
16 
mente, a teoria de todo o governo, organizado por uma constituição escrita, deve 
ser que é nula toda a resolução legislativa com ela incompatível. 
(...) 
Assim, se uma lei está em oposição com a Constituição; se, aplicadas ambas a 
um caso patticular, o Tribunal se veja na contingência de decidir a questão em 
conformidade da lei, desrespeitando a Constituição, ou consoante a Constituição, 
desrespeitando a lei, o Tribunal deverá determinar qual destas regras regerá o caso. 
Esta é a verdadeira essência do Poder Judiciário"32. 
Como a Constituição é hierarquicamente superior, pela sua posição, 
natureza e função no âmbito do ordenamento jurídico, não existe outra alter-
nativa: afasta-se a lei e aplica-se a Constituição. Nisto consiste a supremacia 
constitucional. 
1.6. Classificação das constituições 
Qualquer classificação, para ter alguma valia — observava o mestre Ro-
berto Lyra Filho —, deve ser lógica e possuir certa utilidade. Quanto à exigência 
de logicidade, salvo engano, parece estarmos diante de um cânone tipicamente 
ocidental, ao menos se for verdadeira a informação de Borges, retransmitida 
por Foucault, de que numa certa enciclopédia chinesa estaria escrito — o que 
é de todo absurdo para nós — que "os animais se dividem em: a) pertencentes 
ao imperador, b) embalsamados, c) domesticados, d) leitões, e) sereias, f) fabu-
losos, g) cães em liberdade, h) incluídos na presente classificação, i) que se 
agitam como loucos, j) inumeráveis, k) desenhados com um pincel muito fino 
de pêlo de camelo, l) et cetera, m) que acabam de quebrar a bilha, n) que de 
longe parecem moscas"33. 
Pois bem, em decorrência daquele mar de experiências constitucionais, 
de que nos fala Karl Loewenstein34, as cartas políticas podem ser classificadas 
segundo os mais variados critérios — uns putamente formais, outros pretensa-
mente substanciais — tais como a forma, o conteúdo, a origem, o modo de elabo-
ração, a estabilidade e a extensão das constituições. Acentuando, igualmente, a 
diversidade e a riqueza dessas experiências, Pinto Ferreira assinala, entre nós, 
que as constituições não se apresentam com um modelo uniforme e que, no 
curso da história, dificilmente se manteria a monotonia rígida de uma só forma 
32
 Decisões Constitucionais de Marshall, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1903, p. 24-26. 
33
 Michel Foucault, Prefácio, in As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências huma-
nas, 4. ed., São Paulo: Martins Fontes, 1987, p. 5. Nesse texto, Foucault ressalta que "no 
deslumbramento dessa taxinomia, o que de súbito atingimos, o que, graças ao apólogo, nos 
é indicado como o encanto exótico de um outro pensamento, é o limite do nosso: a impos-
sibilidade patente de pensar isso". 
34
 Karl Loewenstein, Teoría de la Constitución, Barcelona: Ariel, 1979, p. 205-222. 
17 
constitucional, até porque os diferentes países costumam escolher o seu tipo 
predominante de Constituição3 3. 
Quanto à forma — uma classificação cuja utilidade parece restringir-se 
a contemplar a singularidade da experiência constitucional inglesa36 —, as 
constituições são escritas ou não escritas, conforme se achem consolidadas em 
texto formal e solene, ou se baseiem em usos e costumes, convenções e textos 
esparsos, bem assim na jurisprudência sedimentada em torno desses elementos 
de índole constitucional. 
Quanto ao conteúdo, dizem-se materiais as constituições cujo texto con-
tém apenas normas materialmente constitucionais, sendo formais aquelas cartas 
políticas onde, a par dessas normas, também existem preceitos cuja matéria 
não é constitucional. Tal distinção, bem se vê, esconde uma pré-compreensão 
— carregada de ideologia — sobre qual deve ser o núcleo duro das constituições, 
a chamada matéria constitucional. A propósito, adverte Jorge Miranda que a 
Constituição formal é, desde logo, a Constituição matetial, porque lógica e 
historicamente serve de manifestação da Constituição material subjacente e, 
também, porque nenhuma forma vale por si, mas apenas enquanto referida a 
certa substância3'. 
Quanto à origem, denominam-se populares, democráticas ou simplesmente 
promulgadas, as cartas políticas oriundas de assembléias constituintes livtemente 
escolhidas pelo povo para se dar uma Constituição; e outorgadas, as decorrentes 
do arbítrio de governantes iluminados... 
Quanto ao modo de elaboração, chamam-se dogmáticas ou ortodoxas as cons-
tituições intencionalmente
elaboradas à luz de determinados credos, princípios 
ou dogmas; e constituições históricas ou ecléticas aquelas que se materializam ao 
longo do tempo, em vagaroso processo de filtragem/absorção de idéias muitas 
vezes contrastantes. É o caso, sempte lembrado, da Constituição da Inglatena, 
que o saudoso Orlando Bitar — assumindo a opinião de André Maurois sobre 
a formação do governo de gabinete — considerava, ela toda, um produto do 
tempo, do acaso, do bom senso e do compromisso^. 
Quanto à estabilidade ou consistência, as constituições se classificam em 
imutáveis, rígidas, flexíveis e semi-rígidas. Consideram-se imutáveis ou, ironica-
mente, constituições utópicas — como ensina Pontes de Miranda — aquelas 
33
 Curso de direito constitucional, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1964, p. 17. 
36
 Sobre essa experiência constitucional, ver o primoroso estudo de Orlando Bitar Fontes e 
essência da Constituição britânica, in Obras completas de Orlando Bitar, Brasília: Conselho 
Federal de Cultura e Departamento de Assuntos Culturais do MEC, Departamento de Im-
prensa Nacional, 1978, v. 2, p. 261-292. 
37
 Manual de direito constitucional, Coimbra: Coimbra Ed., 1983, t. 2, p. 41. 
38
 Cf. Orlando Bitar, Obras completas, ed. e v. cits., p. 264; André Maurois, Histoire d'Angleterre, 
Paris: Arthème Fayard, 1937, p. 523. 
18 
que nem sequer cogitaram do modo pelo qual se haviam de emendar, ou haviam 
de ser revistas; que tinham por imperecíveis aos seus princípios e a si mesmas; 
constituições, enfim, que, impondo-se ao tempo e "impedindo" que este lhes 
corroa o texto, só deixam ao povo, ou às gerações que nela não vêem solução 
para os seus destinos, os recursos da revolução39. 
Dizem-se rígidas as constituições que, mesmo admitindo emendas, reformas 
ou revisões, dificultam o processo tendente a modificá-las, que é distinto, por 
essa razão, do processo legislativo comum; flexíveis, ao contrário, são as cons-
tituições que podem ser modificadas de forma fácil, tal como se mudam as leis 
em geral, ou cujo texto — por isso mesmo — se altera quando são promulgadas 
disposições legais em contrário. 
Denominam-se semi-rígidas as constituições de estabilidade híbrida, aquelas 
dotadas de partes rígidas e partes flexíveis, como a "Constituição Política do 
Império do Brasil", onde se estatuiu — para efeito de observância do seu rito 
especial de revisão — que só era constitucional o que dizia respeito aos limites e 
atribuições respectivas dos poderes políticos e aos direitos políticos e individuais 
dos cidadãos; e que tudo o mais, ou seja, aquilo que não fosse constitucional, 
poderia ser alterado pelas legislaturas ordinárias. 
Quanto à extensão, classificam-se as constituições em sintéticas ou concisas 
e analíticas ou prolixas, conforme enunciem apenas as regras básicas de organi-
zação do Estado e os preceitos referentes aos direitos fundamentais — o núcleo 
duro das constituições; ou se desdobrem numa infinidade de normas no afã de 
constitucionalizar todo o conjunto da vida social4 0. 
A propósito dessa última classificação, é comum exaltarem-se as virtudes 
das constituições sintéticas — à frente a dos Estados Unidos, velha de mais de du-
zentos anos — e criticarem-se as constituições analíticas, como a nossa e tantas 
outras, cujos textos, reputados volumosos, detalhistas e inchados, dificultariam 
as interpretações atualizadoras, obrigando o constituinte derivado a sucessivos 
esforços de revisão. Louvores e censuras à parte, convém não perdermos de 
vista que as constituições — assim como o direito, em geral, e as demais coisas 
do espírito — refletem as crenças e as tradições de cada povo, valores que não 
podem ser trocados por modelos alienígenas. Nesse sentido, relembremos, com 
Peter Hàberle, que "a Constituição não é apenas um conjunto de textos jurídi-
cos ou um mero compêndio de regras normativas, mas também a expressão de 
um certo grau de desenvolvimento cultural, um veículo de auto-representação 
própria de todo um povo, espelho de seu legado cultural e fundamento de suas 
esperanças e desejos"41. 
39
 Comentários à Constituição de 1967 — com a Emenda n. I, de 1969, Rio de Janeiro: Forense, 
1987, t. 3, p. 145. 
40
 Boris Mirkine-Guetzévitch, Les constitutions européennes, cit., p. 17. 
41
 Teoría de la Constitución como ciencia de la cultura, Madrid: Tecnos, 2000, p. 34. 
19 
Além desses critérios de classificação, muitos outros — igualmente lógi-
cos, úteis e até mais consistentes — poderiam ser utilizados para ordenar a 
verdadeira avalancha constitucional que tomou conta do Ocidente a partir do 
final do século XVIII. 
Justamente com esse propósito é que — levando em conta a mudança 
radical do papel das constituições escritas em face da realidade política e a 
necessidade de romper com categorias tidas como antiquadas e desprovidas de 
realismo — Karl Loevvenstein nos sugere uma análise ontológica das constituições, 
com a sua conseqüente classificação em normativas, nominais ou semânticas, con-
forme o grau de correspondência entre a pretensão normativa dos seus preceitos e 
a realidade do processo do poder42. A essa luz, seriam normativas as constituições 
que efetivamente dirigem o processo político; nominais, a seu turno, aquelas cuja 
força normativa é débil e, por isso, não ordena as decisões políticas fundamentais; 
e semânticas, finalmente, as cartas políticas que apenas refletem as subjacentes 
relações de poder, não passando de meros simulacros de Constituição. 
Em síntese — anota Jorge Miranda —, enquanto as constituições normati-
vas limitam efetivamente o poder e as nominais, embora não o façam, ainda têm 
essa finalidade, as constituições ditas semânticas apenas servem para estabilizar 
e eternizar a intervenção dos dominadores de fato4 3. 
1.7. Fontes do direito constitucional 
Apesai ou por causa da "superioridade" do direito constitucional, 
acreditamos que o estudo das suas "fontes" deva começar pelo seu enquadra-
mento na teoria geral do direito, para saber até que ponto e em que medida 
os constitucionalistas poderão aproveitar os conhecimentos produzidos pelos 
que tratam das normas jurídicas tout court, sem prejuízo das conquistas alcan-
çadas nos distintos "saberes" jurídicos, sobretudo nos domínios da própria 
teoria constitucional. Uma "tática" semelhante à que se adota no âmbito da 
chamada interpretação especificamente constitucional, cuja particularidade 
não dispensa, antes incorpora, os ganhos da hermenêutica jurídica como 
um todo e, mais amplamente, da hermenêutica filosófica como arte geral do 
compreender. 
Pois bem, no âmbito da teoria geral do direito, como sabemos, o enfoque 
tradicional aponta para uma dicotomia básica no estudo das fontes do direito, 
compreendendo as fontes materiais e as fontes formais, assim consideradas, res-
pectivamente, a realidade material subjacente e preexistente a toda e qualquer 
formalização normativa — fatores econômicos, políticos, sociais, religiosos, 
culturais etc. — e as "formas" sob as quais essa realidade, ainda não jurídica 
ou, se quisermos, pré-jurídica, vem a se apresentar enquanto fenômeno especi-
Teoría de la Constitución, cit., p. 216-222. 
Manual de direito constitucional, ed. e v. cits., p. 21. 
20 
ticamente jurídico — como lei, costume, jurisprudencia ou atos negociais —, 
segundo a tipologia de Miguel Reale, para quem essas espécies normativas é 
que constituem verdadeiras fontes do direito, porque só elas estão assentadas 
em estruturas de poder, o que não ocorre com a doutrina, por exemplo, a qual, 
a despeito de sua generalizada inclusão entre as formas representativas do ju-
rídico, só indiretamente participa da nomogênese jutídica, desprovida, que é, 
de injuntividade, vale dizer, de energia para instaurar relações intersubjetivas 
vinculativas, não só garantidas mas tornadas efetivas, se necessário, mediante
sanções socialmente otganizadas44. 
Para que se possa falar, por conseguinte, de "fonte do direito", isto é, de 
fonte de regras obrigatórias, dotadas de vigência e de eficácia — afirma Reale —, 
é preciso que haja um poder capaz de especificar o conteúdo do devido, para 
exigir o seu cumprimento, não sendo indispensável que ele mesmo aplique a 
sanção. E por isso que se diz que o problema das fontes do direito se confunde 
com o das formas de produção de regras de direito vigentes e eficazes, podendo 
ser elas genéricas ou não. 
A luz desse conceito, quatro são as fontes do direito, porque quatro são 
as formas de poder: o processo legislativo, expressão do Poder Legislativo; a 
jurisdição, que corresponde ao Poder Judiciário; os usos e costumes jurídicos, 
que exprimem o poder social, ou seja, o poder decisório anônimo do povo; e, 
finalmente, a fonte negocial, expressão do poder negocial ou da autonomia da 
vontade4 5. 
Aplicando-se esse modelo ao estudo das fontes do direito constitucional, 
tem-se pot descartada, desde logo, a doutrina como fator de produção direta de 
comandos constitucionais, porque, além de não dispor de qualquer estrutura 
de poder que a torne obtigatória, nenhuma teoria constitucional — ao menos 
abertamente —, jamais alimentou pretensões normativas, em que pese a sua 
inegável influência no processo de construção desse ramo do direito, seja nos 
momentos constituintes, seja, ao depois, na diuturna realização constitucional, 
quando, mercê da sua recepção pelos intérpretes/aplicadores da Constituição, as 
diferentes doutrinas vêm a dirigir não apenas a leitura, mas também as eventuais 
revisões do texto constitucional4 6. 
Isto posto, passemos ao exame das "verdadeiras" fontes do direito cons-
titucional, começando pelas chamadas fontes materiais. Nesse domínio, sem 
necessidade de maiores divagações, deparamo-nos, desde logo, com os clássicos 
44
 Karl Larenz, Metodologia da ciência do direito, 4. ed., Lisboa: Gulbenkian, 2005, p. 262. 
45
 Miguel Reale, Lições preliminares de direito, 23. ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 141; e 
Fontes e modelos do direito: para um novo paradigma hermenêutico, São Paulo: Saraiva, 
1994, p. 12. 
46
 Peter Hãberle, Hermenêutica constitucional, Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, Editor, 
1997, p. 28; Carlos Santiago Nino, Fundamentos de derecho constitucional, Buenos Aires: 
Astrea, 1992, p. 102-103. 
21 
fatores reais de poder4', que fizeram a glória de Lassalle na mesma medida em 
que têm obrigado a esforços sem contar todos quantos, fustigados pela expe-
riência das tensões entre as constituições reais e as constituições folhas de papel, 
propugnam pela existência de uma força normativa da Constituição, que se 
mostre independente, embora não de todo contraposta, em face da chamada 
realidade constitucional. Refiro-me, no particular, às figuras de Pablo Lucas 
Verdú e Konrad Hesse, e à sua crença na existência, respectivamente, de um 
sentimento constitucional ou de uma vontade de Constituição, como valores capazes 
de, nalguma medida, ordenar o processo político, em vez de simplesmente se 
verem arrastados na voragem das disputas de poder, ou serem usados apenas 
para conferir legitimidade de fachada a governos de fato ou a ditadores de 
plantão4 8. Outra não é a compreensão de Loewenstein, quando nos adverte de 
que a questão do sentimento constitucional envolve um dos fenômenos psicoló-
gico-sociais e sociológicos do existencialismo político mais difíceis de captai, 
na medida em que pertence aos imponderáveis da existência nacional e não 
pode ser produzido racionalmente, admitindo, no entanto, ser descrito como 
aquela consciência da comunidade que, para além de todos os antagonismos e 
tensões político-partidárias, econômico-sociais, religiosos ou de outra natureza, 
integra detentores e destinatários do poder no marco de uma ordem comunitátia 
obrigatória, justamente a Constituição, submetendo o processo político aos 
interesses da comunidade49. 
Independentemente de qualquer tomada de posição nessa "contenda", 
não há como fugir à constatação de que toda normatividade constitucional, até 
mesmo como condição de possibilidade da sua vigência e eficácia, incorpora 
e reflete as estruturas de poder subjacentes, seja no momento inaugural dos 
processos constituintes, seja no curso do seu desenvolvimento, seja, enfim, 
quando, já promulgadas, as cartas políticas são entregues aos agentes da sua 
realização. 
Quanto às fontes formais do direito constitucional, tem-se, desde logo, 
e principalmente — como lei —, a própria Constituição, que é a sede por ex-
celência das normas que absorvem e veiculam a matéria constitucional, assim 
considerados quaisquer conteúdos que o povo, soberanamente, de forma direta 
47
 Referindo-se à Prússia do seu tempo, Lassalle apontava como fatores reais de poder — a 
que chamava fragmentos de Constituição — a monarquia, a aristocracia, a grande burguesia, os 
banqueiros, a pequena burguesia, a classe operária e, dentro de certos limites, também a consciência 
coletiva e a cultura geral da Nação (Fernando Lassalle, A essência da Constituição, 2. ed., Rio 
de Janeiro: Liber Júris, 1988, p. 11-19). 
48
 Pablo Lucas Verdú, El sentimiento constitucional, Madrid: Reus, 1985, p. 6; Konrad Hesse, 
A força normativa da Constituição. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris, Editor, 1991, p. 19. A 
propósito, relembre-se a classificação ontológica das constituições — normativas, nominais e 
semânticas —, proposta por Karl Loewenstein, já referida neste capítulo. 
49
 Karl Loewenstein, Teoría de la Constitución, Barcelona: Ariel, 1979, p. 200. 
22 
ou por seus delegados, decida levar para o corpus da sua Carta Política, descar-
tando os teóricos e as teorias que, evadidos da realidade, intentam dizer, de fora, 
o que se deve e o que não se deve constitucionalizar, numa pretensão tanto mais 
equivocada quanto não leva em conta que a decisão constituinte não é um gesto 
banal na vida de um povo, antes traduz um momento culminante no processo 
de autoconsttução das comunidades que decidem abandonar o exercício fático 
do poder para vivenciá-lo juridicamente e, assim, deixarem de ser aglomerados 
amorfos e se convertetem em Nações politicamente organizadas50. 
Ainda no que toca à lei propriamente dita, não nos parece descabido 
conceder-lhe o status de fonte do direito constitucional, se tivermos em conta 
que, mesmo vindo a se subordinar à futura Constituição, as leis preexistentes 
ao momento constituinte subsidiam a feitura da Lei Maior, fornecendo aos 
seus construtores precioso material para a edificação do prédio constitucional, 
funcionando, depois, como verdadeiros esquemas de interpretação do seu texto, 
na medida em que exteriorizam a nada desprezível compreensão legislativa do 
linguajar constitucional. De uma vez por todas, a idéia de uma Constituição 
soberba, juridicamente inaugural e auto-suficiente, não encontra respaldo na 
experiência histórica. 
Análise mais atenta exige o tratamento do costume como fonte do direito 
constitucional, porque, à partida, muitos são os problemas que envolvem essa 
espécie normativa, desde a sua aceitação como forma de criação do direito, até 
à explicitação do modo como simples práticas sociais podem adquirir coerci-
bilidade — como se fossem leis —, independentemente de qualquer manifesta 
interferência decisória do Poder que as declare juridicamente obrigatórias. 
Nesse cenário, a realçar a complexidade do tema, registre-se que, enquanto 
uns afirmam que os próprios termos Constituição e costume são incompatíveis, 
outros asseveram, com maior alcance, que a interpretação do direito consue-
tudinário confunde-se com a questão da sua existência, o que implica atribuir 
aos órgãos judicantes a prerrogativa de "atestar" se, de fato, determinada con-
duta tem sido reiterada por largo tempo e, ademais, se esse comportamento
é juridicamente neutro ou decorre da convicção de sua juridicidade. Caso 
contrário, na primeira hipótese, não há falar sequer em costume; e, na segunda, 
em costume jurídico5 1. 
Com esse esclarecimento prévio, de resto indispensável para mostrar que 
não é pacífica sequer a admissão do costume como fonte do direito, em geral, 
assinale-se que, mesmo assim, é velha de alguns séculos a sua presença nas 
ordens constitucionais, tanto nas de conformação histórica, como a singular 
50
 Peter Haberle, Teoría de la Constitución como ciencia de la cultura, Madrid: Tecnos, 2000, 
p. 34. 
51
 Carré de Malberg, Teoría general del Estado, 2. ed., 2. reimpr., México: Fondo de Cultura 
Económica, 2001, p. 1246, nota 10; Karl Larenz, Metodologia da ciencia do direito, 4. ed., 
Lisboa: Gulbenkian, 2005, p. 504 e 616. 
23 
Constituição da Inglaterra, esmiuçada pelo erudito Orlando Bitar 5 2, quanto 
nas que se instituíram em solenes Leis Fundamentais, como a Constituição dos 
Estados Unidos da América, de 1787, e as relativamente padronizadas Cartas 
Políticas nascidas no clima do constitucionalismo europeu-continental, que 
se desenvolveu em torno do art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e 
do Cidadão, a qual, embora situada e datada em 1789, ainda hoje opera no 
imaginário dos constituintes e constitucionalistas do Ocidente. 
No âmbito da experiência constitucional britânica, o exemplo por todos 
lembrado de um autêntico costume constitucional é o do surgimento do Go-
verno de Gabinete, que André Maurois, em síntese admirável, atribuiu à conju-
gação de quatro fatores — o tempo, o acaso, o bom senso e compromisso13 — e 
que os historiadores do direito vinculam, com maior precisão, à circunstância 
fortuita de que, teinando a um título parlamentar; não falando uma palavra 
sequer de inglês; nem se mostrando disposto a continuar dirigindo as sessões 
do Conselho de Gabinete, onde se debatiam coisas que ele não entendia, fas-
tidiosas reuniões que sua antecessora e prima distante, a rainha Ana, realizava 
aos domingos —, o alemão Jorge I simplesmente deixou de comparecer àqueles 
encontros de trabalho, deixando-se substituir por um dos seus ministros, por 
um Primeiro-Ministro apenas de fato — Sir Robert Walpole, o hábil líder 
dos whigs —, que jamais reivindicou aquele título, talvez porque, à época, o 
Parlamento tivesse "horror ao nome e à idéia"...54. 
52
 Fontes e essência da Constituição britânica, in Obras completas de Orlando Bitar, Rio de 
Janeiro: Conselho Federal de Cultura e Departamento de Assuntos Culturais do MEC, 
1978, v. 2, p. 261-316; e Origem e evolução do sistema parlamentar de governo, na Ingla-
terra e no continente europeu, in Obras completas de Orlando Bitar, cit., v. 2, p. 229, onde 
se lê: "... no século XVIII proclamava Lord Chesterfield que somente a Inglaterra [porque 
respeitosa das liberdades] tinha uma Constituição". 
53
 André Maurois, Histoire d'Angleterre, Paris: Arthème Fayard, 1937, p. 523, e História da 
Inglaterra, Rio de Janeiro: Pongetti Ed., 1959, p. 322; Orlando Bitar, Origem e evolução do 
sistema parlamentar de governo, na Inglaterra e no continente europeu, in Obras completas 
de Orlando Bitar, cit., p. 228: "Dar-se-á razão a André Maurois: o sistema parlamentarista 
resultou de quatro ingredientes. Tempo — 250 anos para se consumar o que se tem hoje, 
não contando o desenvolvimento das instituições parlamentares, infra-estrutura não des-
picienda; acaso — um Soberano, que não fala a língua de seus súditos, obrigado a usar um 
latim macarrónico, se uma comunicação mais premente se apresentasse; compromisso — os 
ingleses são conciliadores, procuram denodadamente uma fórmula de não ir a extremos, de 
não serem radicais, de não serem chocantes; bom senso — sempre fugiram às declarações 
solenes e à assunção de princípios racionais, pois assim nunca forçaram a sua realidade para 
adaptações torturadas, pois a Constituição é essa mesma realidade mutável e paradoxalmente 
permanente". 
54
 W. Ivor Jennings, Governo de Gabinete, Brasília: Senado Federal, 1979, p. 2: "Nem o 
Gabinete nem o cargo de Primeiro-Ministro foram estabelecidos pela legislação, nem fo-
ram também reconhecidos pelos tribunais de direito. Até 1937 o Gabinete não era sequer 
mencionado em qualquer Lei (Act) do Parlamento; e a Lei dos Ministros da Coroa de 1937 
24 
Nasceu, assim, por via exclusivamente costumeira, vale dizer, sem respaldo 
em nenhum texto jurídico, em nenhum ato legislativo, uma forma de governo 
"destinada a êxito duradouro", não só na Inglaterra, que lhe serviu de berço, 
mas também em todos os países que, inspirados no modelo britânico, adotaram 
o sistema parlamentatista. 
Registros mais recentes apontam para a sobrevivência do costume como 
fonte do direito constitucional, de que são exemplos, em Portugal, a "regra" de 
nomeação obrigatória, pelo Presidente da República, como Primeiro-Ministro, 
do "candidato a Primeiro-Ministro" indicado pelo partido que venceu as elei-
ções, embora a Constituição da República Portuguesa (CRP, art. 1 9 0 e / l ) não 
fale em "candidatos a Primeiro-Ministro" e apenas estabeleça que o Primeiro-
Ministro será nomeado pelo Chefe do Estado "tendo em conta os resultados 
eleitorais"; e, no Brasil, a "regra" que permite se promulguem apenas "fatias" de 
Emendas Constitucionais, assim entendidas aquelas partes de PECs mais amplas 
que, já tendo sido aptovadas nas duas Casas do Congresso Nacional, podem ser 
imediatamente promulgadas e integradas ao corpus constitucional, sem prejuízo 
do exame das partes ainda pendentes de deliberação final". 
Singularidades à parte, e à moda de conclusão pontual, pode-se dizer que, 
a despeito da resistência de alguns poucos, a maioria admite, sim, o costume 
como fonte do direito constitucional, nas clássicas modalidades secundum legem 
e praeter legem, descartadas, no entanto, as práticas agressivamente contra legem, 
porque incompatíveis com a "primazia da normatividade constitucional", com 
a supremacia da Constituição. É o que se lê, entre outros, em Jorge Miranda, 
que assim resume essa questão: 
"Mesmo os setores mais adversos ao reconhecimento do papel do costume não 
contestam o fato da formação de costume constitucional secundum legem, con-
quanto possam negar a sua autonomia qua tale. 
Algumas vezes trata-se de práticas cronologicamente anteriores à lei constitucio-
nal. Outras vezes — com mais interesse — de práticas posteriores. (...) 
Nuns e noutros casos haverá costume constitucional verdadeiro e próprio, con-
tanto que o comando constitucional seja cumprido não por mera força da sua 
inserção na Constituição formal, mas por força dessas mesmas práticas tidas pot 
obrigatórias; e é na medida em que a norma acatada efetivamente se desprende, 
de certo modo, da Constituição formal que pode haver relevância do costume. 
não fez mais que estabelecer maiores salários para aqueles ministros que eram membros do 
Gabinete, tornando-se assim necessário definir quais eram os ministros que faziam parte 
do mesmo. Até esta Lei ter estabelecido um salário para o Primeiro-Ministro e o Primeiro 
Lord do Tesouro, só tinha havido duas referências incidentais ao Primeiro-Ministro. Nem 
o Gabinete nem o Primeiro-Ministro, nesta qualidade, proclamam exercer qualquer poder 
conferido por alguma lei". 
55
 ]. ]. Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da Constituição, Coimbra: Almedina, 
1998, p. 1009-1010. 
25 
Forçoso vem a ser também registrar a formação de mais ou menos numerosas nor-
mas costumeiras praeter legem, ou seja, interpretativas e integrativas de preceitos 
constitucionalmente escritos, com função de clarificação, desenvolvimento e 
adequação às necessidades de evolução social. (...) 
Outro é o caso do costume contra legem ou contra Constitutionem. A força jurídica 
da Constituição formal repele-o por princípio, tanto mais que, destinando-se
a 
Constituição a teger o processo político, ele [o costume contta] haverá de nascer, 
quase sempre, da não rigorosa observância pelos órgãos do poder das normas cons-
titucionais esctitas. O costume constitucional contra legem equivale à preterição 
da constitucionalidade. 
Contudo, isso não permite fechar os olhos à vida a ponto de assevetar que tal 
costume não existe. Condições pode haver que levem à sua formação, ligadas a 
dúvidas de interpretação de preceitos constitucionais e, sobretudo, a ausência ou 
a deficiência de mecanismos de gatantia3 6. 
A despeito de todas essas reservas, o fato é que não são poucos — para não 
dizermos que são inúmeros —, os exemplos de práticas que, embora flagrante-
mente alheias ou contrárias à Constituição, mesmo assim vêm a se converter em 
costumes constitucionais, vale dizer, em condutas que equivalem a verdadeiras 
normas jurídicas, demonsttando, desse modo, que no âmbito do direito públi-
co, além das usurpações e revoluções, qualquer outro fato consumado — fait 
accompli — "é um fenômeno histórico com força constituinte, diante do qual 
toda oposição das teorias legitimistas é, em princípio, impotente" 5 7 . 
No que diz respeito à jutisprudência, trata-se de genuína fonte do direito 
constitucional, cuja legitimidade, ademais, não se deve e, a rigor, sequer se 
pode questionar, na medida em que os julgados que nela se condensam provêm 
da jurisdição consti tucional , de uma instituição que, s istemicamente, está 
situada fota e acima da tradicional tripartição dos poderes estatais 5 8 e que, no 
exercício das suas atribuições, está autorizada, pela própria Consti tuição, a 
emitir a última palavra sobre o sentido e o alcance das suas disposições, de resto 
gloriosas ambigüidades, que permitem as mais diversas leituras, a compasso das 
transformações sociais 5 9 . 
Não por acaso, entre nós, já se fala em constituição "reinventada" pela 
jurisdição const i tuc ional 6 0 ; e, alhutes, que o direito const i tucional já não 
56
 Jorge Miranda, Teoria do Estado e da Constituição, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 384-385; 
e Manuaí de direito constitucional, Coimbra: Coimbra Ed., 1983, t. 2, p. 100-101. 
57
 Georg Jellinek, Reforma y mutación de la Constitución, Madrid: Centro de Estudios Cons-
titucionales, 1991, p. 29. 
58
 Mauro Cappelletti, O controle de constitucionalidade das leis no sistema das funções 
estatais, Revista de Direito Processual Civil, São Paulo: Saraiva, v. 3, p. 38, 1961. 
59
 A expressão é de Shirley M. Huffstedler, como informa Mauro Cappelletti, in Juízes legis-
ladores1., Porto Alegre: Sergio A. Fabris, Editor, 1993, p. 67. 
60
 José Adércio Leite Sampaio, A Constituição reinventada pela jurisdição constitucional, Belo 
Horizonte: Del Rey, 2002. 
26 
é apenas o que prescreve o texto da Lei Maior, mas também a bagagem de 
padrões hermenêuticos desse bloco normativo incorporada na jurisprudência 
constitucional6 1; afora as frases, sempre lembradas, de Alexander Pekelis e 
Charles Hughes, a proclamarem, respectivamente, que em certo sentido os 
Estados Unidos não têm uma constituição escrita, ou que eles vivem sob uma 
constituição, mas que ela é aquilo que os juízes dizem que ela é 6 2. 
Casos recentíssimos, no Brasil, de grande repercussão política, atestam 
a atualidade desse entendimento. Referimo-nos, por primeiro, às decisões do 
Supremo Tribunal Federal "esclarecendo" que os mandatos de todos os titulares 
de cargos eletivos — de vereador a presidente da República — pertencem aos 
partidos políticos e não aos candidatos eleitos sob as suas legendas, razão por 
que se estes vierem a trocar de partidos estarão sujeitos à perda do mandato, 
nos casos e condições estabelecidos em "legislação judicial"65; e, depois, ao 
julgado do Tribunal Superior Eleitotal que, apreciando pedido de impugnação 
de candidatura, deu-lhe acolhida, considerando como cônjuges, para efeito da 
inelegibilidade estabelecida no art. 14, § 1°, da Constituição, as pessoas do 
mesmo sexo que vivem em estado de casadas64. 
Mais não se precisa dizer para comprovar que verdadeiro legislador não 
é quem faz as leis, mas quem dá a palavra final sobre o sentido e o alcance das 
suas disposições. 
61
 Juan Fernando López Aguilar, Lo constitucional en el derecho: sobre la idea e ideas de 
Constitución y orden jurídico, Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 
1998, p. 60. 
62
 Alexander Pekelis, La tecla para una ciencia jurídica estimativa, in Ei actual pensamiento 
jurídico norteamericano, Buenos Aires: Ed. Losada, 1951, p. 125. Quanto a Hughes, sua frase é 
referida, entre outros, por Antonio Carrillo Flores, em "Prólogo", à edição espanhola da obra 
de Charles Evans Hughes, The Supreme Court of the United States. Its Foundation, Methods 
and Achievements. An Interpretation, publicada em 1946 pelo Fondo de Cultura Económica 
com o título La Suprema Corte de Estados Unidos. 
63
 BRASIL. STF. Informativo n. 482, de ls a 5 de outubro de 2007. Omisso o Congresso 
Nacional em disciplinar esse aspecto crucial da fidelidade partidaria, embora tal paralisia viesse 
se tornando crescentemente incómoda, para dizer o mínimo, a jurisdição constitucional não 
criou direito novo, apenas "explicitou" — por via de interpretação sistemática —, algo que 
já se continha no corpo e na alma da Constituição: num regime político em que ninguém 
pode se eleger sem filiação partidária, os mandatos pertencem aos partidos e não àqueles que 
se elegem sob as suas legendas. Como essa decisão foi "extraída" do texto constitucional em 
vigor, caso o Congresso Nacional queira restabelecer o "troca-troca" de partidos sem perda 
de mandatos, terá de assumir essa "coisa" e emendar a Constituição... 
64
 Brasil. TSE. Recurso Especial Eleitoral n. 24-564, acórdão publicado em sessão, em 1—-10-
2004- Registro de candidato. Candidata ao cargo de prefeito. Relação estável homossexual 
com a prefeita reeleita do município. Inelegibilidade. Art. 14, § 7°, da Constituição Federal. 
Os sujeitos de uma relação estável homossexual, à semelhança do que ocorre com os de 
relação estável, de concubinato e de casamento, submetem-se à regra de inelegibilidade 
prevista no art. 14, § 7°, da Constituição Federal. 
27 
1.8. Preâmbulo 
1.8.1. A questão dos preâmbulos 
Considerado, pelo insigne Peter Hãberle, como uma espécie de Constituição 
da Constituição6*, e tão importante que este jurista lhe atribui o relevante papel de 
veículo de desentranhamento hermenêutico das cláusulas de eternidade, escritas 
e não escritas, das Constituições do Estado constitucional — o que, por si só, já 
impõe especial dever de atenção aos seus conteúdos essenciais, tal como sinte-
tizados nessas constituições —, nem por isso o Preâmbulo tem merecido estudos 
mais aprofundados por parte da doutrina constitucional66, inclusive da brasileira, 
o que acreditamos se possa explicar pela crença generalizada, de resto assumida 
igualmente pela jurisprudência pátria67, de que esse texto inaugural não faz parte 
da Constituição, carecendo, portanto, de força normativa, muito embora lhe 
sirva de fórmula política68 e de vetor interpretativo69, na medida em que transmite 
a mensagem urbi et orbi do legislador constituinte, revelando a origem do seu 
mandato jurídico-político e aquilo a que ele está obrigado para bem e fielmente 
exercer os poderes que, nessa procuração10, lhe outorga o povo — como detentor 
inicial, autônomo e incondicionado da soberania nacional7 1 —, em momentos sin-
gularmente críticos da sua história72. 
65
 Peter Hãberle, Elementos teóricos de un modelo general de recepción jurídica, in Derechos huma-
nos y constitucionalismo ante el Tercer Milenio, Antonio-Enrique Pérez Luño (Coord.), Madrid: 
Marcial Pons, 1996, p. 165; El Estado constitucional. México, UNAM, 2001, p. 148. 
66
 Cf. Javier Tajadura Tejada, Eí Preámbulo Constitucional,
Granada: Editorial Somares, 
1997, p. 1. 
67
 Brasil, Supremo Tribunal Federal, ADI 2056-AC, Rei. Min. Carlos Velloso, D] 8 ago. 
2003. 
68
 Raúl Canosa Usera, Interpretación constitucional y fórmula política, Madrid: Centro de 
Estudios Constitucionales, 1988. 
69
 Sobre a função hermenêutica do Preâmbulo, ver, por todos, Javier Tajadura Tejada, Eí 
Preámbulo Constitucional, cit., p. 28/49. 
70
 Constituição Política do Império do Brasil, de 25-3-1824 — "Art. 176. Admitida à discussão, e 
vencida a necessidade da reforma do artigo constitucional, se expedirá lei, que será sancionada 
e promulgada pelo Imperador em forma ordinária; e na qual se ordenará aos eleitores dos 
deputados para a seguinte legislatura, que nas procurações lhes confiram especial faculdade 
para a pretendida alteração ou reforma". 
71
 Ver Poder Constituinte Originário, no Cap. 4, deste Curso. 
72
 Referindo-se à experiência constitucional da Inglaterra, sob o título O Direito da Constitui-
ção, Orlando Bitar indica, entre os três corpos de mandamentos que constituem esse direito, 
aqueles insertos em documentos solenes de caráter compactuai (raízes feudais), celebrados em 
situações extraordinárias, em crises sísmicas da nacionalidade — covenants entre a Coroa e 
o Povo —, e que compõem a chamada Bíblia da Constituição: Magna Carta, Petição de Direito 
e Bill dos Direitos. Fontes e essência da Constituição Britânica, in Obras completas de Orlando 
Bitar, Rio de Janeiro, Conselho Federal de Cultura/Departamento de Assuntos Culturais 
do MEC, 1978, T- v., p. 266. 
28 
Mas o que são e para que servem, afinal, os preâmbulos das constituições, 
se várias delas sequer os contemplam em seus textos, como é o caso das cons-
tituições da Áustria, Bélgica, Bolívia, Chile, Itália, México, Suécia e Uruguai, 
a evidenciar que — pelo menos para os autores dessas cartas políticas "incom-
pletas" — tais fórmulas lapidares não passam de meros apêndices, com os quais 
ou sem os quais se promulgam constituições que entram e permanecem em 
vigor? Essa, em suma, é a questão dos preâmbulos constitucionais, que a seguit 
passamos a apreciar. 
1.8.2. Conceito e definição de preâmbulo 
Como o direito é uma coisa que interessa a todos e, por isso, não pode 
renunciar a um mínimo de compreensibilidade geral, é de toda a conveniência 
que os termos do seu jogo de linguagem — conceitos ou definições, por exemplo 
—, sempre que possível, sejam "traduzidos" com palavras da linguagem comum, 
que, nesses casos, funciona como uma espécie de esperanto jurídico, a fim de que 
os leigos e mesmo os iniciados nesse jargão, entendendo os comandos jurídicos, 
possam cumpri-los ou desrespeitá-los, sabendo o que estão a fazer. 
Por isso, sem antecipar a discussão sobre a normatividade do preâmbulo 
das constituições, manejamos dois conceituados dicionários do nosso idioma 
— o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa e o Dicionário da Língua Portugue-
sa Contemporânea, da Academia de Ciências de Lisboa, para mostrar o que o 
vocábulo preâmbulo significa na linguagem ordinária. 
No Houaiss lemos que preâmbulo é o relatório que antecede uma lei ou 
decreto, ou a parte pteliminar em que se anuncia a promulgação de uma lei 
ou decreto, mas também palavreado vago que não vai diretamente ao fato; no 
dicionário da Academia de Ciências de Lisboa está dito, assim como no Houaiss, 
que preâmbulo é tanto um relatório, a parte pteliminar de uma lei, decreto ou um 
diploma, em que o chefe do Estado ou o soberano anuncia a sua promulgação, 
como também algo que precede um discurso, como que atrasando a chegada "ao 
que interessa"73. Em ambos os dicionários, portanto, o preâmbulo é visto, obje-
tivamente, como algo antecedente, mas também, criticamente, como palavras 
vazias —flatus voeis —, que retardam o encontro com o essencial da mensagem, 
podendo, assim, ser descartado, em homenagem aos "finalmentes"... 
Pois bem, adenttando, agora, a língua e a literatura jurídicas, lê-se em 
Peter Hàberle, por exemplo, que essas palavras, que inauguram os textos das 
constituições, longe de serem fórmulas vazias, funcionam como importantes 
"pontes no tempo", seja para evocar ou esconjurar o passado, a depender das 
circunstâncias históricas de cada processo constituinte; seja para falar ao pre-
sente, ocasionalmente orientando desejos; seja, enfim, para contemplar tanto o 
73
 Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 2279; Dicionário 
Houaiss da Língua Portuguesa, Lisboa: Verbo, 2 9 v., p. 2931. 
29 
presente quanto o futuro e, com relação a este, ademais, para antecipar, quanto 
possível, o encontro de um povo com esse almejado porvir74. 
Uma amostragem, de resto igualmente feita pelo mesmo Peter Háberle, 
de alguns preâmbulos constitucionais — desde o da Constituição dos Estados 
Unidos da América, de 1787, ao da malograda Constituição da Europa, de 
2004 7 5 —, evidenciaiá a consistência destas considerações, na medida em que 
todos esses textos solenes, sob variadas formas de expressão, retratam a auto-
compreensão de cada povo sobre a sua história, a sua identidade cultural e a 
sua individualidade, assim como sobre o seu papel no concerto das nações 7 6. 
Afinal, em palavras do próprio Hãberle, o Estado constitucional aberto ne-
cessita de elementos culturais de base, não só porque a cultura é o "húmus" de 
toda sociedade aberta, à qual confere motivos e fundamentos, como também 
porque sem cultura o homo politicus perderia o chão 7 7. 
1.8.3. Natureza jurídica dos preâmbulos 
Em sua clássica Teoria Geral do Direito e do Estado, Hans Kelsen também 
afirma que o preâmbulo é uma introdução solene, que expressa as idéias políticas, 
morais e religiosas que a Constituição tende a promover; que o seu texto não 
sinaliza nenhuma norma definida em relação à conduta humana, carecendo, por 
isso, de um conteúdo juridicamente relevante; que possui caráter mais ideológico 
do que jurídico, razão por que, se vier a ser suprimido, isso não mudará em nada 
o significado real da Constituição; e, que, afinal, ainda assim, o preâmbulo serve 
para conferir maior dignidade e um grau mais elevado de eficácia à Constitui-
ção. Ressalta, por outro lado, que, a depender do seu caráter mais democrático 
ou mais autocrático, no preâmbulo a Constituição apresenta a si mesma como 
expressão da vontade do povo ou de um governante instituído pela graça de 
Deus, "esclarecendo", afinal, que o povo — no qual a Constituição pretende 
ter sua origem — só adquire existência jurídica através da Constituição, pelo 
que apenas em sentido político, não em sentido jurídico, pode-se dizer que o 
povo seja a fonte da Constituição7 8. 
74
 Peter Hãberle, El estado constitucional, México: UNAM, 2001, p. 276. 
75
 Após ratificação da Constituição Européia pelo parlamento da Eslovénia e da Grécia 
e da aprovação da Constituição por meio de referendo na Espanha, no dia 29 de maio de 
2005, os eleitores do referendo na França decidiram não ratificar o texto dessa Constituição. 
Logo após, no dia le de junho de 2005, também os Países Baixos se recusaram a ratificar a 
Constituição Européia, provocando uma crise e uma reavaliação do processo de ratificação 
de tratados mediante referendos, o que iria culminar com a adoção do Tratado de Lisboa 
(2007), que substituiu a frustrada Constituição. 
76
 Peter Hãberle, Teoria de la Constitución como ciência de la cultura, Madrid: Tecnos, 2000, 
p. 34. 
77
 Peter Hãberle, Constituição e cultura, Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008, p. XIII. 
78
 Hans Kelsen, Teoria general dei derecho y dei Estado. México: UNAM, 1969, p. 309. 
30 
Em Jorge Miranda, recolhe-se esta bem-elaborada descrição do que, usual-
mente, e sob os seus principais aspectos, tem sido dito acerca desses textos 
inaugurais das constituições: 
Um preâmbulo ou proclamação mais ou menos solene, mais ou menos
significante 
anteposta ao atticulado não é componente necessário de qualquer Constituição; 
é tão-somente um elemento natural de Constituições feitas em momentos de 
ruptura histórica ou de grande transformação político-social 7 9. O seu carátet 
depende dessas circunstâncias e dessas intenções, bem como da ideologia a que 
apela o legisladot constituinte. E também a sua forma e a sua extensão aparecem 
extremamente variáveis: desde as sínteses lapidares de estilo litetário aos longos 
arrazoados à laia de relatórios preliminares ou exposições de motivos; desde a 
invocação do nome de Deus ou do título de legitimidade do poder constituinte ao 
conspecto histófico; desde a alusão a um núcleo de princípios filosófico-políticos 
à prescrição de determinados objetivos programáticos (...). 
O alcance político e literário do preâmbulo é evidente em qualquer Constituição. 
Ele reflete a opinião pública ou o projeto de que a Constituição retira a sua força80; 
mais do que no articulado as palavras adquirem aqui todo o seu valor semântico 
e a linguagem todo o seu podet simbólico 8 1. 
Menos palpável é o sentido jurídico. Dizer que aí se descobre o "espírito da Cons-
tituição" não basta para se apreender a exata natureza do preâmbulo tanto à face 
do articulado constitucional quanto à face das leis ordinárias. 
A doutrina distribui-se por três posições: a tese da irrelevância jurídica; a tese 
da eficácia idêntica à de quaisquer disposições constitucionais; entte as duas, a 
tese da relevância jurídica específica ou indireta, não confundindo preâmbulo 
e preceituado constitucional. De acordo com a primeira tese, o preâmbulo não 
se situa no domínio do Direito, situa-se no domínio da política ou da história; 
de acordo com a segunda, ele acaba por ser também um conjunto de preceitos; 
de acordo com a terceira, o preâmbulo participa das características jurídicas da 
Constituição, mas sem se confundir com o articulado82. 
79
 Um grande número de textos constitucionais apenas contém fórmulas de apresentação, 
promulgação, sanção ou outorga; e, por vezes, nem isso. 
80
 Carl J. Friedrich, op. cit., p. 86-87. 
81
 Barbosa de Melo, Cardoso da Costa e Vieira de Andrade, op. cit., p. 18: cf. Paulo Ferreira da 
Cunha, Pensar o direito: do realismo clássico à análise mítica, Coimbra, 1990, p. 343 e s. 
82
 Sobre o problema em geral, cf. Edward S. Corwin, op. cit., p. 1 e s.; H. Kelsen, General 
theory..., cit., p. 260-261; Stefan Rozmaryn, La Constitution, loi fondamentale de l'Etat socialiste, 
cit., p. 96-97; V. N. Shukla, The Constitution of India, 6. ed., Lucknow, 1975, p. 1 e 2; José 
Afonso da Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, 2. ed., São Paulo, 1982, p. 187 e s.; 
Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição..., cit., p. 44 e 45; Biscaretti Di Ruffia, Diritto 
costituzionale comparato, cit., p. 661 e 662; Giuseppe de Vergottini, op. cit., p. 202 e 203. Par-
ticularmente sobre o preâmbulo da Constituição francesa de 1916, Robert Pelloux, Le préam-
bule de la Constitution du 27 octobre de 1946, Revue du Droit Public, 1947, p. 347 e s.; sobre 
o da Constituição espanhola, Raul Morodo, El preámbulo de la Constitución Española, in 
Perspectivas constitucionais, obra colectiva, I, p. 103 e s.; e sobre o da Constituição brasileira, 
31 
Para nós, o preâmbulo é parte integrante da Constituição, com todas as suas 
conseqüências. Dela não se distingue nem pela origem, nem pelo sentido, nem 
pelo insttumento em que se contém. Distingue-se (ou pode distinguit-se) apenas 
pela sua eficácia ou pelo papel que desempenha. 
O preâmbulo dimana do órgão constituinte, tal como as disposições ou preceitos; 
é aprovado nas mesmas condições e o ato de aprovação possui a mesma estrutura e 
o mesmo sentido jurídico. Nem deixaria de ser estranho que, estando depositado 
num mesmo documento e inserido numa mesma unidade, fosse subtraído ao seu 
influxo ou fosse considerado despiciendo para a sua compreensão. Tudo quanto 
resulte do exercício do poder constituinte — seja preâmbulo, sejam preceitos 
constitucionais — e conste da Constituição em sentido insttumental, tudo é 
Constituição em sentido formal. 
Os preâmbulos não podem assimilar-se às declarações de direitos. Estas são textos 
autonomamente aplicáveis, sej a qual for o valor — constitucional, legal ou supra-
constitucional — que se lhes reconheça, e separados da Constituição instrumental 
por tazões técnicas e, sobretudo, por razões históricas. Ao invés, aos preâmbulos 
falta essa autonomia e o que neles avulta é, essencialmente, a unidade que fazem 
com o articulado da Constituição, a qual, desde logo, confere relevância jurídica 
ao discurso político que aparentam ser. 
Em conttapattida, não se afiguta plausível reconduzir a eficácia do preâmbulo (de 
todos os preâmbulos ou de todo o preâmbulo, pelo menos) ao tipo de eficácia 
próprio dos attigos da Constituição. O preâmbulo não é um conjunto de preceitos, 
é um conjunto de princípios que se projetam sobre os preceitos e sobre os restantes 
sectores do ordenamento — e daí, a sua maior estabilidade, que se compadece, 
de testo, com a possibilidade de revisão8 3. 
O preâmbulo não pode ser invocado enquanto tal, isoladamente; nem ctia direitos 
ou deveres; invocados só podem ser os princípios nele declarados (aqui, sim, em 
plano idêntico aos que podem set induzidos do restante texto constitucional) 8 4; e, 
do mesmo modo, não há inconstitucionalidade por violação do preâmbulo como 
texto a se; só há inconstitucionalidade pot violação dos princípios consignados 
na Constituição 8 5. 
Não deixa, por conseguinte, de ser importante e útil a sua proclamação no pórtico 
da Constituição. Os pteceitos constitucionais podetão, em certos casos, consumit 
todas as afirmações nele contidas; o preâmbulo como que as unifica e as liga global 
e dialeticamente. Ainda que, no plano dos conceitos, se admita que nada lhes 
Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra da Silva Martins, Comentários à Constituição do Brasil, 
São Paulo, 1988, v. I, p. 407 e s., e Rosah Russomano, Curso de direito constitucional, 5. ed., 
Rio de Janeiro, 1997, p. 232 e s. 
83
 Contra: Barbosa de Melo, Cardoso da Costa e Vieira de Andrade, op. cit., p. 17. Balançando 
entre argumentos a favor e contra, Gomes Canotilho e Vital Moreira, op. cit., p. 45-46. 
84
 Assim, expressamente os arts. 4a e 176 a da Constituição turca de 1982. 
85
 Na França, o art. 9 3 a da Constituição de 1946 excluía da fiscalização da constitucionalidade 
pelo Comité Constitucional os princípios do preâmbulo; mas hoje, sobretudo por ação do 
Conselho Constitucional, a situação é diferente. 
32 
acrescenta, no plano dos valores, da sua impulsão orientadota, do seu estímulo 
crítico, a diferença parece nítida. 
E, doutra banda, não se invoquem eventuais conttadições entte o preâmbulo e o 
articulado da Constituição para negar a sua força jurídica ou a sua autonomia em 
relação à "Constituição ptoptiamente dita"8 6. Porque, a haver tais contradições, 
elas tornam-se mais patentes à face do preâmbulo: os princípios contidos no 
preâmbulo delimitam-nas e restringem-nas e, para quem admita "normas consti-
tucionais inconstitucionais", podem retirar-lhe mesmo validade87. 
Na opinião de Javier Tejada — a quem se deve um estudo de fôlego sobre 
o tema 8 8 — o preâmbulo é parte do texto jurídico em que está situado e ao 
qual antecede, embota não se possa dizer o mesmo quanto ao seu valor nor-
mativo, que, de resto, os douttinadores majoritariamente parecem inclinados 
a descartar. 
Reportando-se, especificamente, à Constituição de Portugal, Gomes 
Canotilho e Vital Moreira observam que não fazendo parte do texto da Carta 
Política, o preâmbulo não contém normas constitucionais, não possui valor 
normativo autônomo nem idêntico ao das normas constitucionais, razão por 
que não pode haver inconstitucionalidade por violação do seu texto ou dos
ptincípios preambulares enquanto tais. Mesmo assim, ressalvam que o preâmbulo 
não é juridicamente irrelevante, funcionando como elemento de interpretação 
— e eventualmente de integração — das normas constitucionais. Mais ainda, 
sustentam que o preâmbulo desempenha outra importante função constitucio-
nal, porque exprime, por assim dizer, o título da legitimidade da Constituição, 
seja em relação à sua origem, seja em relação ao seu conteúdo (legitimidade 
constitucional material). Em suma, entendem eles que, do ponto de vista ma-
terial, o preâmbulo é uma "certidão de origem", um "título de legitimidade" 
e um "bilhete de identidade", razão por que a sua alteração ou supressão não 
teria sentido e significaria uma novação constitucional violadora dos limites 
materiais da revisão89. O mesmo talvez se pudesse dizer a respeito das disposi-
ções constitucionais transitórias, porque operando — tal qual os preâmbulos —, 
como pontes no tempo, uma vez estendidas, elas não podetiam ser alteradas ou 
suprimidas, sob pena de afronta à sua própria natureza. 
Na doutrina brasileira, merece registro especial o minucioso levantamento 
— repleto de instigantes observações críticas —, que empreendeu o erudito 
86
 Afonso Queiró, Lições..., cit., p. 326 e s.; Heinrich Ewald Horster, op. cit., loc. cit., p. 
129-130. 
87
 Jorge Miranda, Manual de direito constitucional. Coimbra: Coimbra Ed., v. 2, 1983, p. 
206/212; Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 436-438. 
88
 Javier Tajadura Tejada, El Preâmbulo Constitucional, cit., p. 20. 
89
 J .J. Gomes Canotilho & Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 
Coimbra: Coimbra Ed., 1984, l3 v„ p. 62-63. 
Orlando Bitar sobre o status jurídico dos preâmbulos, em diferentes experiências 
constitucionais, balanço que ele encerrou com a observação de que, nos Estados 
Unidos, âmbito constitucional a que dedicou maior atenção, apesar de todo o 
valor informativo de que se reveste esse enunciado solene, a opinião corrente 
é no sentido de não considerá-lo como parte do texto constitucional9 0. 
1.8.4. Funções do preâmbulo 
Afora a importante função, já assinalada, de ponte no tempo, como docu-
mento que, simultaneamente, fala no presente e para o presente, evocando o 
passado e mirando o futuro, o preâmbulo constitucional possui outras funções 
significativas, seja como vetor hermenêutico para a compreensão da Constitui-
ção, a que ele serve de texto de abertura, seja como enunciado normativo, em 
que pese, sob este aspecto, à opinião — majoritária —, de que se trata de uma 
fórmula política carente de injuntividade e, por isso, insuscetível, per se, de 
animar qualquer pretensão jurídica com suporte na Constituição. 
Como vetor hermenêutico, são indiscutíveis, se não mesmo imprescindí-
veis, os préstimos do preâmbulo, na medida em que nele e por ele se expressam o 
ethos e o telos da Sociedade e da sua Lei Fundamental, dados materiais de partida 
que funcionam para o intérprete como verdadeira condição de possibilidade do 
compreender constitucional. Se for verdade que um texto só responde a quem 
o interroga corretamente, então parece elementar que a Constituição se recuse 
a falar com quem não saiba dirigir-se a ela 9 1. 
Aquilatando o valor dos preâmbulos como vetor da interpretação constitu-
cional, Javier Tejada invoca ensinamento de outro jurista de relevo, Martin Casals, 
para ressaltar que, sob esse aspecto, o texto preambular tanto pode ser encarado 
como o cânone hermenêutico principal e vinculante, vale dizer, como o primeiro 
e obrigatório, dentre os critérios de interpretação, quanto ser visto como regra her-
menêutica suplementar — de natureza teleológica ou psicológica —, a ser utilizada 
livremente pelos operadores da Constituição, sendo sob esse ângulo supletivo que 
se deve aquilatar o seu valor como regra de interpretação. Se valorado como o 
principal cânone interpretativo e com caráter vinculante — porque se supõe nele 
positivados o sentido, objetivos e finalidade do texto a que precede —, isso impli-
cará que o articulado constitucional há de ser entendido em conformidade com o 
preâmbulo, o que além de limitar a liberdade do intérprete, relega a segundo plano 
os demais cânones hermenêuticos, os quais, de resto, não são hierarquizados, nem 
se apresentam em numerus clausus92. 
90
 Orlando Bitar, A lei e a Constituição, in Obras completas de Orlando Bitar, cit., v. 2, 
P . 44. 
91
 Karl Larenz, Metodologia da ciência do direito, 2. ed., Lisboa: Gulbenkian, 1989, p. 377 e 
444. 
92
 Javier Tajadura Tejada, El Preâmbulo Constitucional, cit., p. 30-31. 
34 
Já no que se refere ao valor normativo dos preâmbulos, o mesmo Javier Te-
jada registra que, sob argumentos vários, uns de Teoria Geral do Direito, outros 
de Direito Positivo, a doutrina parece decantada no sentido de lhes recusar 
esse atributo — porque dos preâmbulos não se podem extrair, diretamente, 
nem deveres nem direitos —, ao mesmo tempo e na exata medida em que essa 
mesma doutrina lhes realça a função hermenêutica, o que permitiria conceder-
se a esses textos inaugurais das constituições pelo menos um valor normativo 
indireto93. Nesse mesmo sentido, entre nós, o clássico Carlos Maximiliano 
assevera que embora não seja parte integrante da lei básica, o preâmbulo serve 
para determinar os fins para os quais ela foi elaborada, indicando, por eles, a 
verdadeira interpretação dos pontos duvidosos; mais, ainda, que o preâmbulo 
não possui caráter dispositivo, apenas enunciativo, pelo que não ordena, só ex-
plica, orienta, esclarece9 4. 
No âmbito da jurisprudência, exceção feita ao Conselho Constitucional 
francês, como esse mesmo jurista ressalta, patece igualmente estabilizado o 
entendimento de que os preâmbulos constitucionais não dispõem de força 
normativa autônoma e direta, até porque, por sua própria fraseologia, não são 
aptos para regular, por si mesmos, situações e relações jurídicas, servindo, quando 
muito, para auxiliar na compreensão do articulado constitucional9 5. 
Nesse sentido, por exemplo, é clara a posição do Tribunal Constitucio-
nal da Espanha, o qual desde os primórdios do seu funcionamento declarou, 
taxativamente, que o Preâmbulo da Constituição não tem valor normativo 
(STC 36/1981), e tampouco é norma dispositiva cuja infração possa implicar 
vulneração constitucional (STC 132/1989) 9 6 . 
No Brasil, embora escassos os julgados que enfrentaram esse tema, parece 
igualmente consolidado no STF o entendimento de que o preâmbulo, não sendo 
preceito central da Constituição e, por isso, carecendo de valor normativo per 
se, é desprovido de força para sustentar pretensões fundadas no seu palavreado, 
como evidencia o trecho a seguir, da decisão em que o Ministro Celso de Mello 
denegou mandado de segurança no qual, entre outros motivos, os impetrantes 
alegavam terem sido transgredidas "as diretrizes interpretativas do preâmbulo 
da Constituição". 
Há que se ter presente, no entanto, considerada a controvérsia em referência, que 
o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em recente (e unânime) decisão (ADI 
2.076/AC, Rei. Min. Callos Velloso), reconheceu que o preâmbulo da Constitui-
ção não tem valor normativo, apresentando-se desvestido de força cogente. Esta 
93
 Op. cit., p. 21 es. 
94
 Carlos Maximiliano, Comentários à Constituição brasileira, 5. ed., Rio de Janeiro: Freitas 
Bastos, 1954, v. I, p. 162. 
95
 Javier Tajadura Tejada, El Preámbulo Constitucional, cit., p. 26. 
96
 Constitución Española, 4. ed., Navarra: Thomson/Aranzadi, 2005, p. 135. 
35 
Suprema Corte, no julgamento plenário em questão, acolheu o magistério de Jorge 
Miranda ("Teoria do Estado e da Constituição", p. 437-438, item n. 216, 2002, 
Fotense), cuja lição, no tema, assim versou a matéria concernente ao valor e ao 
significado dos preâmbulos constitucionais: "(...)
o preâmbulo é parte integrante 
da Constituição, com todas as suas conseqüências. Dela não se distingue nem pela 
origem, nem pelo sentido, nem pelo instrumento em que se contém. Distingue-se 
(ou pode distinguir-se) apenas pela sua eficácia ou pelo papel que desempenha. Os 
preâmbulos não podem assimilar-se às declarações de direitos.(...). O preâmbulo não 
é um conjunto de pteceitos. (...). O preâmbulo não pode ser invocado enquanto tal, 
isoladamente; nem cria direitos ou devetes (...); não há inconstitucionalidade por 
violação do preâmbulo como texto 'a se'; só há inconstitucionalidade pot violação 
dos princípios consignados na Constituição." (grifei) Sob tal aspecto, verifica-se 
que a alegada ofensa ao preâmbulo da Constituição não tem o condão de conferir 
substância à pretensão mandamental ora deduzida pelos impetrantes, eis que, como 
já assinalado, o conteúdo do preâmbulo não impõe qualquer limitação de ordem 
material ao poder reformador outorgado ao Congresso Nacional 9 7. 
Em direção oposta, o Conselho Constitucional francês, em decisão histó-
rica de 16 de julho 1971 9 8 , orientou-se no sentido de atribuir força normativa 
ao preâmbulo da Constituição, num gesto jurídico-político que veio a ser 
qualificado de "audácia tripla e decisiva" porque, num só golpe, atribuiu status 
constitucional à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e ao 
Preâmbulo da Constituição de 1946; deduziu a partir de meras referências, nesse 
preâmbulo, a natureza constitucional de alguns princípios da República; e, afinal, 
extraiu dessas premissas a conclusão de que eram inconstitucionais alterações 
— constantes de ato normativo submetido ao exame daquele Conselho —, que 
o parlamento pretendia introduzir em lei de 1Q de julho de 1901, que dispunha 
sobre a liberdade de associação, o que, tudo somado, no dizer de Jean Rivero, 
fez a Constituição francesa dobrar de tamanho9 9. 
Referindo-se a essa mudança de rumos — que ele situa entre os anos de 
1970 e 1973 —, Louis Favoreu diz que se tratou de uma verdadeira revolução 
operada pelo Conselho Constitucional, na medida em que, com apenas quatro 
decisões, reconheceu força normativa ao Preâmbulo da Constituição de 1958 e 
conferiu o valor de direito positivo à Declaração dos Direitos do Homem e do 
Cidadão, de 26 agosto de 1789, ao Preâmbulo da Constituição de 1946 e a alguns 
princípios fundamentais reconhecidos pelas leis da República, tais como os referentes 
às liberdades de associação, sindical e de reunião1 0 0. 
97
 Brasil, Supremo Tribunal Federal, Mandado de Segurança n. 24645-MC/DF, Rei. Min. 
Celso de Mello. 
98
 Ver o inteiro teor dessa decisão in Claude Franck, Les grandes décisions de la jurisprudence, 
Paris: PUF, 1978, p. 18-19. 
99
 José Acosta Sánchez, Formación de la Constitución y jurisdicción constitucional, Madrid: 
Tecnos, 1998, p. 186 e 311. 
1 0 0
 Louis Favoreu, Los tribunales constitucionales, Barcelona: Ariel, 1994, p. 107-108. 
36 
Rigorosamente, talvez não se pudesse considerar tão tevolucionárias essas 
decisões porque, segundo observa Canosa Usera, na França desde sempre se 
discutiu sobre o valor normativo da Declaração de 1789, assim como, mais 
tarde, sobre o Preâmbulo da Constituição da IV República, que constitucio-
nalizou aquele documento solene, debate em que se contrapuseram, de um 
lado, Carré de Malberg e Esmein, sustentando que aqueles documentos eram 
de natureza metajurídica e insuscetíveis, portanto, de aplicação por qualquer 
juiz; e, de outro lado, juristas do porte de Leon Duguit, para quem seria injusto 
privar-se o sistema francês do seu próprio espírito, confinando-o num espaço 
de ineficácia jurídica e despojando-o da força legislativa positiva daquela famosa 
Declaração101. 
Delineadas, assim, em grandes traços, as principais questões em torno 
dos Preâmbulos das constituições, questões para as quais não existem respostas 
incontroversas, cabe considerá-los como textos —jurídicos, políticos ou jurídi-
co-políticos —, cujo status e prestígio ficam a depender do modo como eles se 
inserem na história e na cultura de cada povo, ou seja, na sua concreta experiência 
constitucional, e não de conceitos abstratos e apriorísticos, até porque a vida do 
direito — obviamente, também a do direito constitucional —, não tem sido 
lógica e sim experiência1 0 2. 
1.8.5. Os preâmbulos na experiência constitucional brasileira 
Da Constituição Política do Império do Brasil, de 1824, à Constituição da 
República Federativa do Brasil, de 1988, todas as nossas Cartas Políticas osten-
taram preâmbulos, cujos termos, como não poderia deixar de ser, trouxeram a 
marca do seu tempo. Com maior ou menor nitidez, todos procuraram refletir 
a conjuntura política e social em que se construíram os edifícios constitucio-
nais a que serviram de pórtico. Daí por que a Catta de 1824, outorgada pelo 
imperador Pedro I, após dissolver a Assembléia Constituinte, que ele mesmo 
convocara; a de 1937, decretada pelo ditadot Getúlio Vargas, depois de fechar 
o Congresso Nacional; a de 1967, cujo projeto, de iniciativa do Executivo, 
foi aprovado "a toque de caixa" pelo Congresso Nacional; e, finalmente, a 
Carta/Emenda de 1969, promulgada pelos Ministros da Marinha, do Exército 
e da Aeronáutica, após se auto-investirem na Chefia do Poder Executivo e no 
exercício de poderes constituintes — todas congenitamente autoritárias —, não 
1 0 1
 Raul Canosa Usera, Interpretación constitucional y fórmula política. Madrid: Centro de 
Estudios Constitucionales, 1988, p. 65-66; R. Carré de Malberg, Teoría general del Estado, 
México: Fondo de Cultura Económica, 1998, p. 1245-1246; A. Esmein, Eléments de droit 
constitutionnel, Paris: Sirey, 1906, p. 456; Léon Duguit, Manuel de droit constitutionnel, Paris: 
Albert Fontemoing, 1907, p. 486-487, Traité de droit constitutionnel, Paris: Albert Fontemoing, 
v. 2, 1923, p. 159-160, e v. 3, 1923, p. 563-565. 
1 0 2
 Oliver Wendell Holmes, O direito comum, Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1967, p. 29. 
37 
se fizeram preceder de preâmbulos libertários, antes se limitando a revelar os 
seus autores e os motivos que os levaram a golpear a democracia. Diversamen-
te, as Constituições de 1891, de 1934, de 1946 e de 1988, porque partejadas 
e vindas à luz em clima de liberdade, ostentam mensagens preambulares que 
nada ficam a dever, na sua forma, como no seu conteúdo, às mais democráticas 
das constituições democráticas. 
1.8.6. O preâmbulo da Constituição de 1988 
Assim como os preâmbulos de outras cartas políticas de igual índole e 
processo de gestação, também o documento de abertura da nossa Constituição 
de 1988 é vazado em linguagem cheia de promessas, de intenções e de anseios, 
para não dizer de sonhos, tantas e tão generosas são as expectativas suscitadas 
pelo seu palavreado. Tal como os textos inaugurais das nossas constituições 
anteriores — excetuadas a Constituição da lã República, de 1891, e a Carta 
do Estado Novo, de 1937 —, também o preâmbulo da Constituição de 1988 
externa a "crença impessoal" do constituinte brasileiro de que é possível invocar 
e receber a proteção de Deus para bem cumprir a sua relevante missão. Afinal, 
como proclama Francisco Nóbrega, assumindo a visão teilhardiana sobre o 
Absoluto, Deus é o "vértice definitivo", o Alfa e o Omega, onde tudo começa 
e termina1 0 3, uma opinião que, na essência, parece coincidir com a postura 
teológico-filosófica de Roberto Lyra Filho, ao observar que mesmo no caso do 
ateísmo, enfrentamos uma religião, apenas virada pelo avesso, pois negar Deus 
é afirmá-Lo pensável, como limite, desteologizando-O e despersonalizando-
O, para devolver a origem, o fim e o comando de todo o processo ao jogo de 
virtualidades da imanência pura104. Aceito esse ponto de vista, o "Deus" dos 
preâmbulos constitucionais, enquanto simples idéia ou puro pensamento, tanto 
pode figurar como não figurar
nesses textos simbólicos, sem nenhum "prejuízo", 
seja para os crentes, seja para os ateus. Para os primeiros, porque o seu Deus, 
Aquele que tudo abarca, convocado ou não, ali sempre estará presente; para 
os descrentes porque, "sabendo" de antemão que Ele não existe, pouco se lhes 
dá invocá-lo como esquecê-lo, mencionar ou não mencionar o seu Nome, nos 
preâmbulos constitucionais como em qualquer lugar, porque — materialistas 
convictos — eles têm "certeza" de que não foi o Verbo quem criou o Mundo 
e, por conseguinte, não há perigo de que palavras, mesmo de indivíduos 
"constituintes", possam fazer aquela "coisa normativa" que nós chamamos de 
Constituição. 
1 0 3
 Francisco Adalberto Nóbrega, Deus e Constituição, Petrópolis-RJ: 1998, p. 16. 
1 0 4
 Roberto Lyra Filho, Filosofia, teologia e experiência mística, Revista Kriterion, Belo 
Horizonte, n. 69, janeiro a dezembro de 1976, p. 136. 
38 
1.9. Disposições constitucionais transitórias 
1.9.1. Visão geral 
Assim como os preâmbulos, as disposições constitucionais transitórias 
não têm merecido maior atenção por parte dos doutrinadores e raras vezes se 
fizeram objeto de debates no âmbito da jurisdição constitucional, o que acre-
ditamos se possa explicar, em ambos os casos, pelo fato de que o preâmbulo 
apenas anuncia o "advento" de uma nova era constitucional, e as disposições 
transitórias não passam de uma "ceiimônia do adeus" para uma ordem jurídica 
em vias de desaparecimento. 
Igualmente como os preâmbulos, também esses preceitos funcionam como 
"pontes no tempo", porque são normas que se incorporam à nova constituição, 
um texto do presente, com a finalidade de trazer do passado e levar para o futuro 
— toda norma jurídica, como expressão de um dever ser, é necessariamente 
prospectiva —, aquelas situações jurídicas105 que embora tenham sido criadas sob 
a ordem constitucional expirante, o constituinte atual, por qualquer motivo, 
não considera incompatíveis com o regime jurídico-político que está em vias 
de se estabelecer. Por isso, observa Machado Horta que, salvo no caso limite 
de ruptura revolucionária radical, a Constituição nova não acarreta a supressão 
total do ordenamento jurídico anterior, tendo a técnica constitucional elaborado 
soluções de acomodação normativa, que afastam o colapso que adviria do vazio 
jurídico, a saber: a recepção do direito anterior pela Constituição, a vigência 
da legislação anterior que não conttariar as disposições da nova Constituição 
e as normas de transição para regular situações discrepantes das normas cons-
titucionais permanentes1 0 6. 
Significativa, a esse respeito, é uma decisão do Tribunal Constitucional da 
Espanha — onde, sabidamente, opeiou-se uma delicada transição política —, a 
proclamar que não obstante voltada para o futuro, a Constituição há de poder 
afetar atos posteriores à sua entrada em vigor, que derivem de situações criadas 
anteriormente e com amparo em leis válidas naquele momento, enquanto tais 
atos sejam contrários à Constituição, sempre que, naturalmente, os efeitos dessas 
situações não se tenham esgotado antes da promulgação da Constituição, o que 
implica, a um só tempo, tanto uma certa modificação de efeitos jurídicos do 
passado em função dos novos princípios, quanto um limite que se impõe pela 
irreversibilidade desse passado, em função da segurança jurídica 1 0 7. 
1 0 5
 Paul Roubier, Les conflits de ¡ois dans le temps, Paris: Sirey, v. I, 1929, p. 378-380. 
1 0 6
 Raúl Machado Horta, Direito constitucional. 3. ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 
289. 
1 0 7
 ESPANHA. STC 87/1982, de 15/11/82, in Constitución Española. Navarra: Thomson/ 
Aranzadi, cit., p. 1675. 
39 
Em síntese, por meio de disposições transitórias, a nova ordem constitu-
cional, amistosamente, recepciona aquelas situações que, mesmo advindas do 
passado, se mostrem dignas de acolhimento. O mesmo já não acontece com as 
constituições da ruptura, da animosidade e do esquecimento, as quais, auto-
iludidas, tudo fazem para negar/sepultar a tradição e, se possível, exorcizar os seus 
fantasmas, para que não atrapalhem a construção do futuro. Nada mais ilusório 
nem contrário ao processo histórico, para não dizermos trágico ou patético, do 
que alguém — seja um povo ou um indivíduo —, imaginar que possa evadir-se 
de si mesmo para empreender, como nova, sua mesma e velha caminhada. 
Por outro lado, como essas situações jurídicas pretéritas consubstanciam 
bens e/ou valores que se incorporaram ao patrimônio de indivíduos concretos, 
isto é, de pessoas que irão viver sob a futura ordem constitucional sem olvidar 
o seu pasado jurídico, não parece "aconselhável" desfazer ou desconsiderar 
o que já foi feito, como se nunca tivesse existido, só porque nasceram e/ou 
se consolidaram sob uma ordem constitucional que "já era", para usarmos a 
expressão de que se utilizam os nossos jovens quando se referem àquelas coisas 
do passado, mesmo às do passado recente, pelas quais não sentem a menor 
consideração, para não dizermos o menor respeito. Não por acaso — o que, de 
resto, se insere na linha do constante apromoramento do Estado de Direito —, 
já se tornou lugar comum, pelo menos entre os juristas de maior estofo, exigir-se 
que quaisquer mudanças de regimes jurídicos, mesmo aquelas mais prementes, 
não apenas sejam anunciadas com antecedência — o que, aliás, usualmente 
acontece, até porque os atos do processo legislativo se distendem no tempo —, 
como também se façam acompanhar de regras de transição, ou, se preferirmos, de 
regras de travessia, pois nada é mais contraditóiio com a idéia de Direito justo do 
que uma insegurança "jurídica", vale dizer, uma quebra de confiança no Direito 
causada pelo próprio Direito... 1 0 8. 
Noutras palavras, para evitar turbulências na passagem de um regime a 
outro, o novo leva consigo um pouco do velho, mas só aquilo que for tolerável 
pela nova ordem, e o velho, por sua vez, atendido no que lhe patece o máximo 
possível, entrega os anéis para preservar os dedos... Um ligeiro olhar sobre a 
experiência constitucional brasileira, como aquele lançado pelo saudoso Miguel 
Reale, mostrará que, no geral, as nossas mudanças de regimes se fizeram sem 
maiores conflitos — em clima de continuidade compositiva, no dizet desse notável 
1 0 8
 Karl Larenz, Derecho justo, Madrid: Civitas, 1993, p. 163: "A inadmissibilidade da chamada 
retroatividade genuína das leis onerosas, isto é, aquela em que as leis intervêm em fatos per-
tencentes ao passado e já consumados, é um princípio do Direito justo, porque não é outra 
coisa senão a aplicação do princípio da confiança às relações entre cidadão e legislador. E 
um princípio do Estado de Direito, porque só o Estado de Direito admite a vinculação do 
legislador a princípios jurídicos"; Rudolf Stammler, Tratado de filosofia dei derecho, Madrid: 
Reus, 1930, p. 241, nota 4: "Todo Direito positivo é um intento de Direito justo1'. 
40 
filósofo do direito 1 0 9 —, fato que, sob a ótica de Machado Horta, explica a pre-
sença de disposições transitórias na grande maioria das cartas políticas negociadas e 
a sua ausência na quase-totalidade das constituições revolucionárias, assim como 
o desenvolvimento do estudo dogmático dessa normatividade intertemporal no 
campo do Direito Privado paralelamente ao retraimento do Direito Público na 
abordagem sistemática desse tema 1 1 0. 
1.9.2. Valor jurídico das disposições constitucionais transitórias 
Diferentemente do que acontece com os preâmbulos, que a maioria 
dos doutrinadores e das cortes constitucionais situa fora das constituições, as 
disposições constitucionais transitórias são tidas como parte da Constituição, 
recebendo o mesmo tratamento dispensado aos seus preceitos de natureza per-
manente e, de quebra, eliminando a distância que alguns afirmam existir entre 
esses dois conjuntos normativos no corpus constitucional1
1 1. 
Discorrendo sobte o tema, na tese com a qual conquistou a cátedra de 
Direito Constitucional na Universidade Federal do Pará, o saudoso mestre 
Orlando Bitar produziu ensinamentos tão fecundos, que vale a pena relembrá-
los integtalmente nesta passagem, inclusive para nos dispensarmos de invocar 
outras lições de igual valia. 
Eis o que nos diz o autor do já clássico A lei e a Constituição, de onde 
extraímos as lições de permanente atualidade transcritas a seguir. 
E as disposições transitórias são "constituição"? Várias observações são cabíveis: 
A) Normalmente o conteúdo das disposições transitótias é de direito intettem-
poral. Eles ptevêem, pela própria exigência de continuidade jurídica do Estado, 
o ajustamento de dois regimes constitucionais diferentes, quando não opostos. 
Mesmo as normas que não tivetem tal escopo não são, em tal parte, permanentes 
e prospectivas, como devem ser as constantes do corpo da Constituição. Como 
definit uma disposição transitória para, em tomo de tal característica, dizermos 
que ela é obrigatória ou não? Não basta, como pode parecer, de primeiro plano, a 
localização física ou geográfica, para nossa decisão, pois, segundo ensina Barbalho, 
no texto central da Constituição pode haver artigos cuja matéria seja transitó-
ria, citando, relativamente a 91, attigo 2 S , art. 43, § 49, art. 69, § 49, arts. 83 e 
91. E digno de obsetvação que a Constituição de 37 não tenha destacado, em 
capítulo à parte, as suas disposições transitórias, que se incluem nos artigos 175 
a 187. O mesmo não ocorreu, todavia, com os Códigos de 91, 34 e 46. Não há 
dúvida, pela própria linguagem usada na Constituição nessa parte, de que esta é 
matétia constitucional (formalmente falando, isto é — é constitucional porque 
1 0 9
 Miguel Reale, Momentos decisivos da história constitucional brasileira, in Direito natu-
ral/Direito positivo, São Paulo: Saraiva, 1984, p. 82-96. 
1 1 0
 Raul Machado Horta, Direito constitucional, cit., p. 290-293. 
1 1 1
 Raul Machado Horta, Direito constitucional, cit., p. 291. 
41 
contida no "documento"). Veja-se: em 91, o art. l e das D.T.: "promulgada ESTA 
CONSTITUIÇÃO".. . ; artigo l2 em 34 — "promulgada esta Constituição" e art. 
26 — "esta Constituição, escrita na mesma ortografia da de 91..."; em 46 — "Ato 
das disposições constitucionais transitórias". 
B) Este, aliás, é argumento marginal e subsidiário, ou, por assim dizer, de ordem 
plástica. Há razões mais técnicas que nos convencerão da natureza constitucional 
das disposições transitórias. Que não se destinem a um vigot perpétuo como as 
demais, algumas delas são de grande alcance jurídico e político e podem ser fulcro 
de graves comoções na vida do país. Exemplifiquemos: em 91 — o famoso artigo 
1 § 29, pelo qual o Presidente e o Vice-Presidente da República, eleitos na forma 
ali ptevista (pelo Congresso), ocupariam tais posições dutante o primeiro período 
presidencial. Sabe-se da rumorosa e delicada questão, posteriormente à tenúncia 
de Deodoro, quando, assumindo Floriano a Presidência, na sua qualidade de Vice-
Presidente, durante o primeiro biênio do período executivo, tecusou-se, contra 
o que preceituava o att. 42 da Constituição, a proceder a uma nova consulra às 
urnas. Nosso escopo não autoriza a reconstituição do debate e o julgamento do 
acerto ou desacetto da interpretação do Marechal de Ferro, estribada no § 29 do 
artigo l9 das D. T., mas seria ocioso dar evidência às profundas conseqüências 
políticas de tal atitude, estando os prós e contras da pendência no Congresso 
indicados em Barbalho. Ainda na Carta de 24 de fevereiro, é de se salientar 
o artigo 69 das D. T, gatantia da magistratura do Império, na composição dos 
primeiros rribunais da República. Era provisão que, pela outorga de direitos, 
poderia ensejar reivindicações fundadas na Constituição, como, efetivamente, 
ensejou, pondo em realce a ação enérgica de Rui Barbosa. Em 34 — que dizer 
do artigo 18 das D. T: "Ficam aprovados os atos do Governo provisório, dos in-
terventores federais nos Estados e mais delegados do mesmo Governo, excluída 
qualquer apreciação judiciária dos mesmos atos e dos seus efeitos". Verdadeiro 
bill de indenidade, é inútil realçar o seu alcance, resguardando o Erário de uma 
provável onda esmagadora de pretensões individuais. Em 37 — o famoso artigo 
180 fundamentou toda a legislação delegada do Executivo até a promulgação da 
Constituição de 46. E, finalmente, nesta, podemos apanhar o artigo 23: trata da 
efetivação dos então funcionários interinos da União, Estados e Municípios que 
contassem cinco anos de exercício. Quantas questões constitucionais podem surgir 
e, certamente, sutgitamde tal dispositivo? Não será francamente inconstitucional 
a demissão pura e simples de um funcionário, cujas condições se subsumiram 
no texto referido, sem o acatamento de qualquer das prerrogativas inerentes à 
efetividade? Em ocorrendo tal violência, não se poderia socorrer o lesado de um 
remédio legal extraordinário, como será o mandado de segurança? E que dizer 
da repercussão do artigo na efetividade de grande massa de membros da admi-
nistração centtal, dos Estados e Municípios? E quid do artigo 8 2 , que extingue os 
territótios de Nova Iguaçu e Ponta Porã, reestruturando, assim, o país? E do art. 
18, parágrafo único, mandando considerar estáveis os funcionários em geral que 
tivessem participado das forças expedicionárias brasileiras? E da concessão geral 
de anistia do artigo 28? 
C) E verdade que algumas constituições não contêm disposições transitórias, 
como a norte-americana (não se podendo assim entender o artigo 7 e , que prevê 
o processo de validez da Constituição pela ratificação de, no mínimo, dois terços 
das Assembléias especiais dos Estados); como a argentina, antes de sua reforma 
em 1949. Constitucionalistas há também que não comentam essa parte, como 
Catlos Maximiliano, tanto em relação à Constituição de 91, quanto à atual; ou 
Temístocles, nos seus Comentários de 46, tal não se dando com Pontes de Miranda. 
Nossa conclusão deve ser pela plenitude da Constituição dispositiva, plenitude 
que, ptescindindo do Preâmbulo, não se integtará sem as provisões transitórias, 
tão férteis em gerar direitos e obrigações para governantes e governados como as 
de cerne constitucional permanente e prospectivo1 1 2. 
No âmbito da nossa jurisdição constitucional, idêntico é o entendimento 
sobre o valor jurídico das disposições transitórias, como ilustra esta decisão do 
Suptemo Ttibunal Federal, proferida no julgamento do RE-AgR 215107/PR 
— Paraná, verbis: 
Ementa: Precatório — Pagamento parcelado — ADCT, art. 3 3 — Natureza jurídi-
ca das normas integtantes do A D C T — Relações entre o A D C T e as disposições 
permanentes da Constituição — Antinomia aparente — A questão da coerência 
do ordenamento positivo — Recurso de Agravo impróvido. 
Os postulados que informam a teoria do ordenamento jurídico e que lhe dão o 
necessário substrato doutiinátio assentam-se na premissa fundamental de que o 
sistema de direito positivo, além de catacterizar uma unidade institucional, cons-
titui um complexo notmativo cujas partes integtantes devem mantet, entte si, um 
vínculo de essencial coerência. — O Ato das Disposições Transitórias, promulgado 
em 1988 pelo legislador constituinte, qualifica-se, jutidicamente, como estatuto de 
índole constitucional (RTJ 172/226-227). A esttututa normativa que nele se acha 
consubstanciada ostenta, em conseqüência, a rigidez peculiar às regras inscritas no 
texto básico da Lei Fundamental da República. Disso decorre o reconhecimento 
de que inexistem, entre as normas inscritas no A D C T e os preceitos constantes 
da Carta Política, quaisquer desníveis ou desigualdades quanto à intensidade 
de sua eficácia ou à prevalência de sua autoridade. Situam-se, ambos, no mais 
elevado grau de positividade jurídica, impondo-se,
no plano do ordenamento 
estatal, enquanto categotias normativas subordinantes, à observância compulsó-
ria de todos, especialmente dos órgãos que integram o aparelho de Estado (RTJ 
160/992-993). — Inexiste qualquer relação de antinomia teal ou insuperável 
entte a norma inscrita no art. 33 do A D C T e os postulados da isonomia, da 
justa indenização, do diteito adquirido e do pagamento mediante precatórios, 
consagrados pelas disposições permanentes da Constituição da República, eis que 
todas essas cláusulas normativas, inclusive aquelas de índole transitótia, ostentam 
grau idêntico de eficácia e de autoridade jurídicas (RTJ 161/341-342). — O pre-
ceito consubstanciado no art. 33 do A D C T — que não se estende aos créditos 
de natureza alimentar — compreende todos os precatórios judiciais pendentes 
1 1 2
 Orlando Bitar, A lei e a Constituição, in Obras completas de Orlando Bitar, Brasília: Con-
selho Federal de Cultura e Departamento de Assuntos Culturais do MEC, Departamento 
de Imprensa Nacional, 1978, v. 2, p. 44-46. 
43 
de pagamento em 05/10/88, inclusive aqueles relativos a valores decorrentes de 
desapropriações efetivadas pelo Poder Público. Precedentes. 
Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo, 
nos tetmos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os 
Senhotes Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau. 2 ã Turma, 21.11.2006 1 1 3 . 
1.9.3. A inalterabilidade das disposições constitucionais transitórias 
Problema nem sempre enfrentado com a devida atenção é o da possibili-
dade de se modificatem as disposições constitucionais transitórias, porque essas 
"pontes no tempo", tendo sido construídas no e para o momento das transições 
constitucionais, e com o exclusivo propósito de viabilizá-las sem traumas, em 
princípio não nos parecem suscetíveis de alteração — em verdade, de substi-
tuição —, uma vez consumado o fato histórico, por definição irrepetível, da 
passagem de um para outro regime constitucional. A essa luz, portanto, em que 
pese à opinião dos que — talvez inadvertidamente — pensem em contrário, 
entendemos que "atualizar" disposições transitórias é tão "impensável" quanto 
o seria fotografarmos, reiteradas vezes, um mesmo objeto ou um mesmo cenátio 
e, afinal, apormos nas sucessivas fotos a data do primeiro instantâneo. Coisas 
pretéritas, só por ficção poderemos tratar as disposições transitórias de uma 
Constituição já promulgada e posta em vigor como se ainda estivesse em vias 
ou em processo de promulgação1 M. O que passou, passou e, como tal, se tornou 
irreversível, mesmo para a vontade de Deus, que não pode desfazer o acontecido, 
pois isso seria conttário à sua natureza, como anotou Umberto Eco, lembrando 
tratar-se ensinamento haurido em São Tomás de Aquino e assim resumido: 
Há uma quaestio quodlibetalis de São Tomás (V, 2, 3) que se pergunta "utrum Deus 
possit virginem reparare" — isto é, se Deus pode permitit que uma mulher que 
tenha perdido a virgindade possa ser reintegtada em sua condição original. A 
resposta de Tomás é corajosa. Deus pode perdoar e, portanto, restaurar a virgem 
no seu estado de gtaça, e pode devolvei à virgem sua integridade corporal através 
de um milagre. Mas nem mesmo Deus pode fazer com que aquilo que foi não te-
nha sido, porque essa violação das leis temporais repugnaria à sua natuieza. Deus 
não pode violar o princípio lógico pelo qual "p aconteceu" e "p não aconteceu" 
surgiriam como contraditórios. Aíea iacta est115. 
Enfrentando, com admirável perspicácia, essa questão da modificabilidade 
das disposições constitucionais transitórias, um problema que temos por mal 
1 1 3
 BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE-AgR 215107/PR-Paraná (Ag.Reg. no Recurso 
Extraordinário), Rei. Min. Celso de Mello j. em 21-11-2006, Segunda Turma, DJ 2-2-2007, 
p. 00138. 
1 1 4
 Hans Vaihinger, Filosofia do Como-Se, apud Hans Kelsen, Teoria geral das normas, Porto 
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1986, p. 328-329. 
1 1 5
 Umberto Eco, Os iimites da interpretação, São Paulo: Perspectiva, 1995, p. 22. 
44 
resolvido pelos nossos juristas — inclusive pelos seus pares no STF, em relação 
aos quais, no particular, ele nos parece muitos furos à frente —, o professor 
Carlos Britto assume posição contrária à emendabilidade das disposições cons-
titucionais transitótias, num ensaio repleto de argumentos da mais pura lógica 
formal e material, e por que não dizer, dialética, como evidenciam, entre muitas 
outras, as passagens transcritas a seguir. 
1.3. E isso mesmo: à mercê das emendas constitucionais apenas se coloca o seg-
mento das normas permanentes da Constituição (à exceção das cláusulas pétreas, 
matéria tabu para a função reformadora); que já e um segmento de padronização 
ou de clicherização do fático. Queto dizen conjunto normativo que se proclama 
válido para uma série aberta de sujeitos (impessoalidade) e de ações (generalidade), 
renovando de modo duradouro o vínculo que prende suas hipóteses de incidência 
aos respectivos mandamentos (abstratividade). 
2. Transição Constitucional e Parte Transitória da Lei Maior 
2.1. Assim ajuizámos porque a banda transitória da Magna Lei se tipifica por in-
cidir sobre fatos que o legislador constituinte somente valorou como de regração 
efêmera por efeito, justamente, da quadra histórica de transição então vivida. E 
transição constitucional é fenômeno irreprimivelmente passageiro. Tempo que 
ttanscorre entte dois marcos ou duas eras: a era da Constituição que sai de cena e 
a da Constituição que sobe ao palco da positividade jurídica. Se se prefere, lapso 
temporal que somente acontece no lusco-fusco de uma Constituição que chega 
para revogar outra e entende de criar uma zona intermediária de regulação, ca-
racterizada por nascer com seus dias contados. Mas nascer com seus dias contados 
(a zona intermediária de regulação) pelo único Poder que naquele momento de 
interseção das duas Cartas Políticas a tudo sobranceiramente assiste e notmativa-
mente fotogtafa: o Poder Constituinte. Não pelo Poder Reformador, porque a voz 
de comando que é própria desse Poder de Reforma é para avaliar o desempenho 
da nova Constituição ante o desenrolar dos fatos que se lhe seguitam (primeiro, 
a Constituição; depois, os fatos). E esse desempenho é excludente daqueles fatos 
cujo desenrolar já se encontra empalhado pelo próprio Poder Constituinte no 
chamado ADCT; ou seja, fatos que já foram normados com a precisa indicação 
do seu começo e do seu término, que são fatos não mais susceptíveis de vexar a 
Constituição, colocando-a como peça legislativa démodé ou pot qualquer modo 
descompassada com a dinâmica do pensamento médio da população. 
2.2. Não estamos a falar senão isto: ao determinar, no ADCT, o tamanho tem-
poral de certas matérias, o Constituinte mesmo foi que imunizou tais matérias 
quanto à possibilidade do confronto com a performance da nova Lei Maior e por 
isso é que as excluiu do segmento das notmas constitucionais petmanentes. São 
acontecimentos, coisas, fatos, circunstâncias, condutas, que não mais comportam 
avaliação pari passu com a vida do novo Texto Magno, porque intencionalmente 
deixados para trás dessa vida. A contemporaneidade normativa deles é somente 
com a data de nascimento da Constituição, como ptoblema sutgido e resolvido por 
ocasião dos respectivos trabalhos de parto. Se bem ou mal resolvido o problema, 
nada mais existe a fazer, pois não há como recomeçar um parto legislativo que 
já se consumou. 
45 
Essa, a nosso ver, é a forma mais adequada para o trato com as disposições 
constitucionais transitórias, essas imprescindíveis "pontes no tempo", que nas 
mudanças políticas negociadas foram concebidas para tranqüilizar e acelerar 
a passagem de um a outro regime constitucional e não para tumultuar nem 
eternizar essa travessia. Afinal, nada parece mais intransitivo do
que uma dispo-
sição transeunte que não transita e não deixa transitar, porque a todo instante, 
vale dizer, permanentemente, é substituída por outra e assim indefinidamente. 
Portanto, até mesmo para que tenham vigência plena e reinem soberanamente 
— como é da sua natureza, sentido e função —, as constituições precisam livrar-
se, o quanto antes e da melhor forma possível, das reminiscências transportadas 
em suas disposições transitórias, as quais, a se eternizarem, funcionarão como 
espaços de não-incidência das novas ordens constitucionais ou de inexaurível 
ultra-atividade de sistemas peremptos. 
2. NORMA CONSTITUCIONAL: ESPÉCIES E CARACTERÍSTICAS, PRIN-
CÍPIOS JURÍDICOS E REGRAS DE DIREITO 
2.1. Introdução 
Registrando, com Jorge Miranda, que as normas constitucionais, enquanto 
disposições jurídicas, podem e devem ser agrupadas, aproximando ou afastando 
categorias, de haimonia com diversos critérios, aplicando-se-lhes tanto as classi-
ficações conhecidas da teoria geral do direito quanto as de particular incidência 
no domínio normativo em que atuam, com esse registro esclarecemos desde 
logo que as classificações apresentadas a seguir serão apenas as de interesse 
especificamente constitucional"6. 
2.2. Normas constitucionais materiais e formais 
Isso posto e levando em conta que, do ponto de vista lógico, toda norma 
que se encontra na Constituição é norma constitucional e que, por isso, a Cons-
tituição formal é, também, a Constituição material, a que serve de expressão, 
podemos dizer que uma primeira classificação das normas constitucionais se 
assenta na dicotomia normas constitucionais formais/normas constitucionais ma-
teriais, a despeito da inexistência de critério seguro e objetivo que nos permita 
identificar, a priori e com validade absoluta, o conteúdo essencial ou, se preferir-
mos, a matéria própria de toda norma constitucional. Afinal de contas, ao que 
saibamos, não existe nada que, por natureza, possa reputar-se constitucional e, 
assim, valer como critério para se constitucionalizar o que quer que seja. 
Apesar disso, no particular, anotam-se alguns esforços doutrinários, de 
índole fenomenológica e de procedimento indutivo, tendentes a descobrir na 
experiência constitucional o que seria a essência da Constituição, merecendo 
Manual de direito constitucional, cit., t. 2, p. 212-213. 
46 
destaque, nesse contexto, a célebre conferência de Fernando Lassalle — su-
gestivamente intitulada Sobre a essência da Constituição — na qual esse famoso 
socialista alemão identificou essa essência com os fatores reais de poder atuantes 
numa determinada sociedade117. 
Menos ambiciosos e, por certo, mais pragmáticos do que Lassalle e os 
essencialistas de todos os matizes, os redatores da Constituição Política do Império 
do Brasil inseriram em seu texto o sempre lembrado art. 178, onde decretaram, 
como antes referido, que "é só constitucional o que diz respeito aos limites e 
atribuições respectivas dos poderes políticos, e aos direitos políticos e indivi-
duais dos cidadãos. Tudo, o que não é constitucional, pode ser alterado sem as 
formalidades referidas, pelas legislaturas ordinárias". 
Com essa decisão, evidentemente, não terão formulado um conceito substan-
cial, invariável e universalmente válido, do que fosse matéria constitucional; mas 
não há dúvida que estabeleceram, com observância obrigatória, pelo menos nos 
limites do Império, quais assuntos, no corpo da Constituição, pela sua relevância, 
mereceriam status matetialmente constitucional e de que forma se legitimariam, 
em caráter excepcional, os legisladores ordinários — enquanto detentotes do 
chamado podet constituinte derivado —, para levarem a cabo quaisquer modi-
ficações nesse conteúdo essencial, o qual, mesmo sendo importante, não lhes 
parecia intocável ou merecedor de proteção sob cláusulas de eternidade. 
Afinal de contas, como registra Gilmar Ferreira Mendes, forte na lição 
de Bryde, o limite da revisão constitucional não reside, necessariamente, na 
fronteira entre legitimidade e revolução1 1 8; nem o poder constituinte dito origi-
nário — como satirizado por Genaro Carrio — possui os atributos que Spinoza 
considerava privativos de Deus 1 1 9. 
Por essa fórmula dos juristas do Império, tudo poderia ser mexido na Cons-
tituição de 1824, desde que, para tanto, fosse consultada previamente a população, 
por meio de uma lei específica, na qual se ordenasse aos eleitores dos deputados 
para a seguinte legislatura que nas respectivas procurações lhes conferissem espe-
cial faculdade para a pretendida alteração ou reforma, como se lê nos seguintes 
dispositivos da nossa primeira Carta Política: 
"Art. 173. A assembléa geral no princípio das suas sessões examinará se a Cons-
tituição política do Estado tem sido exactamente obsetvada, para prover como 
fôr justo. 
Art. 174- Se passados quatro annos, depois de jurada a Constituição do Brazil, 
se conhecer que algum dos seus artigos merece reforma, se fará a proposição por 
1 1 7
 A essência da Constituição, cit. 
1 1 8
 Limites da revisão: cláusulas pétreas ou garantias de eternidade — possibilidade jurídica de 
sua superação, Ajuris, n. 60, p. 253, mar. 1994. 
1 1 9
 Sobre los limites dei lenguaje normativo, in Notas sobre derecho y lenguage, 4. ed., Buenos 
Aires: Abeledo Perrot, 1994, p. 235-279; Baruch Spinoza, Ética/Tratado teológico-político, 
México: Porrúa, 1997, p. 7-34. 
47 
escripto, a qual deve ter origem na câmara dos deputados e ser apoiada pela terça 
parte delles. 
Art. 175. A proposição será lida por tres vezes com intervallos de seis dias de uma 
à outra leitura; e depois da terceira deliberará a câmara dos deputados, se poderá 
ser admitida à discussão, seguindo-se tudo o mais que é pteciso para a formação 
de uma lei. 
Art. 176. Admittida à discussão, e vencida a necessidade da reforma do artigo 
constitucional, se expedirá lei, que será sanccionada e promulgada pelo Impera-
dor em forma ordinária; e na qual se ordenará aos eleitores dos deputados para a 
seguinte legislatura, que nas procurações lhes confirão especial faculdade para a 
pretendida alteração ou reforma. 
Art. 177. Na seguinte legislatura e na primeira sessão será a matéria proposta e 
discutida, e o que se vencer prevalecerá para a mudança ou addição à Lei Funda-
mental, e juntando-se à Constituição será solemnemente promulgada. 
Art. 178. É só constitucional o que diz respeito aos limites e attribuições respecti-
vas dos podetes políticos e aos direitos políticos e individuaes dos cidadãos; tudo 
o que não é constitucional pôde ser alterado sem as formalidades referidas pelas 
legislatutas ordinárias". 
Comparando essa engenhosa solução política, concebida há mais de sé-
culo e meio, com a que foi adotada para o processo revisional da Constituição 
espanhola de 1978 — especialmente em seu art. 168 —, causa admiração não 
tanto a semelhança nos ritos estabelecidos para a alteração de ambas as cartas 
políticas, mas principalmente a coincidência nas concepções dos seus formula-
dores sobre a legitimidade do exercício pleno e continuado do poder constituinte 
dito originário, graças a um mecanismo legitimador em que o povo é chamado 
a se manifestar, necessariamente, em dois tempos. 
Primeiro, de forma indireta, através dos seus reptesentantes, quanto à con-
veniência e oportunidade de se habilitar a legislatura ordinária — cautelosamen-
te, sempre a legislatura seguinte — a discutir a questão da reforma constitucional; 
num segundo momento, e diretamente, pela atribuição de poderes constituintes a 
esses legisladores ordinários, para que, sem limitações jurídicas de qualquer natu-
reza, possam resolver essa questão constitucional como lhes parecer adequado, 
inclusive recusando-se a modificar o texto constitucional1 2 0. 
Na Espanha, provavelmente pelas incertezas e dificuldades que singulariza-
ram o delicado
processo de redemocratização desse grande país, ainda se exigiu 
uma segunda manifestação direta do eleitorado — o referendo —, para ratificar, 
depois de aprovadas pelas Cortes Gerais, quer a revisão total da Constituição, 
1 2 0
 São de especial proveito, no particular, os comentários de Pimenta Bueno sobre aqueles 
dispositivos da Carta de 1824, no seu clássico Direito publico brazileiro e analyse da Constituição 
do Império, Rio de Janeiro: Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve, 1857, p. 485-489. 
48 
quer a revisão parcial que afete o seu Título Preliminar; o Capítulo II, Seção 
I, do Título I; ou o Título II (art. 168.3) 1 2 1 . 
Dessarte, pelo menos à luz dessas experiências constitucionais, que não 
podemos reputat extravagantes, é lícito concluir que o povo não precisa ne-
cessariamente pegar em armas para exercer o poder constituinte, que lhe é 
imanente, bastando, para tanto, adotar procedimentos que, sem o banalizai, 
racionalizem o seu continuado exercício 1 2 2. 
Igualmente, e por via de conseqüência, pode-se dizer que sob essa concep-
ção, que é de um pragmatismo político admirável, não existem matétias constitu-
cionais intocáveis — cristalizadas em cláusulas pétreas ou protegidas por garantias 
de eternidade —, mas tão-somente conteúdos normativos de maior significação 
jurídico-política, em relação aos quais, precisamente pelo seu particular relevo, 
quaisquer mudanças de atitude hão de ser detidamente amadurecidas. 
Afinal de contas, se as constituições pretendem ser — como efetivamente 
o são — verdadeiros pactos entre gerações, parece intuitivo concluir que a sua 
preservação dependerá da possibilidade de virem a ser renovadas, pelo menos a 
cada geração, em todos os sentidos que possui a fecunda expressão renovarm. 
2.3. Normas constitucionais operativas e programáticas 
A luz dessa classificação, das mais conhecidas no direito constitucional, e 
que sempre teve grande prestígio, menos por seu intrínseco valor do que pelos 
propósitos a que, vez por outra, tem servido — por via de regra, quando se quer 
negar eficácia a um preceito constitucional diz-se que ele não pode ser aplicado 
porque se trata de norma simplesmente programática —, à luz dessa tradicional 
classificação, que se baseia na executoriedade das normas constitucionais, 
dizem-se operativos os preceitos que são dotados de eficácia imediata ou, pelo 
menos, de eficácia não dependente de condições institucionais ou de fato; e 
programáticos, a seu turno, os que definem objetivos cuja concretização depende 
de providências situadas fora ou além do texto constitucional. 
2.4. Normas constitucionais auto-executáveis e não auto-executáveis 
Tendo em conta, igualmente, a sua eficácia e aplicabilidade, consideram-se 
auto-executáveis as disposições constitucionais bastantes em si, completas e sufi-
1 2 1
 As Constituições da Áustria (art. 44.3) e da Suíça (art. 118) também admitem revisão 
total, igualmente sujeita a referendo popular. 
1 2 2
 Cf., por todos, o sempre atual Emmanuel Sieyès: "Antes de tudo, uma nação não pode nem 
alienar, nem abdicar o direito de querer; e qualquer que seja a sua vontade, ela não perde o 
direito de mudá-la, desde que o exija o seu interesse" (Qu'est-ce que le tiers état?, Genève: 
Doz, 1970, p. 182). 
1 2 3
 Essa renovação não compreende apenas as alterações formais introduzidas no texto das 
constituições — emendas, reformas ou revisões —, mas também os processos informais, 
consubstanciados em novas leituras do mesmo texto, em mutações constitucionais silenciosas 
(Gomes Canotifho, Direito constitucional, cit., p. 1101-1102). 
4!) 
cientemente precisas na sua hipótese de incidência e na sua disposição, aquelas 
que ministram os meios pelos quais se possa exercer ou proteger o direito que 
conferem, ou cumprit o dever e desempenhar o encargo que elas impõem; não 
auto-aplicáveis, ao contrário, são as disposições constitucionais incompletas ou 
insuficientes, para cuja execução se faz indispensável a mediação do legislador, 
editando normas infraconstitucionais regulamentadoras. 
Segundo o magistério de Rui Barbosa, as disposições constitucionais, em sua 
maioria, não são auto-aplicáveis, porque a Constituição não se executa a si mesma, 
antes impõe ou requer a ação legislativa, para lhe tornar efetivos os preceitos, o 
que não quer dizer, entretanto, que a Lei Maior possua cláusulas ou preceitos 
a que se deva atribuir o valor moral de simples conselhos, avisos ou lições, até 
porque todos têm a força imperativa de regras, ditadas pela soberania nacional 
ou popular aos seus órgãos124. 
A propósito do tema, ao ensejo do exame do Mandado de Injunção n. 107, 
quando nos manifestamos, perante o STF, como representante do Ministério 
Público Federal, sobre a preliminar relativa à auto-aplicabilidade do dispositivo 
que instituíra essa nova garantia constitucional, estudamos com razoável pro-
fundidade a questão relativa à operatividade das normas constitucionais, tendo 
concluído que não existe um critério objetivo que nos permita identificar, com 
segurança, quais dispositivos constitucionais reputam-se auto-aplicáveis e quais 
outros dependem de regulamentação. 
Por isso afirmamos, naquela ocasião, sem constrangimento, que nesse 
teneno, em que pese o prestígio de alguns dos modernos doutrinadores que se 
debruçaram sobre o tema, as respostas por eles oferecidas, em sua quase-totali-
dade, embora pareçam ministrar novos critérios para resolver o velho problema, 
em verdade o que têm feito é tepetir as teses expostas pelos antigos, sem avançat 
um passo sequer no ponto em que a questão permanece criticamente estacio-
nada. Mais ainda — arrematamos —, padecendo do mesmo vício tautológico 
das propostas que pretendem superar, esses pensadores "pós-modernos" acabam 
por afirmar, em linguagem rebuscada, que são auto-aplicáveis as normas que 
não dependem de outras para a sua aplicação 1 2 3. 
A título de curiosidade, registre-se que, naquela ocasião, dissemos não ser 
auto-aplicável o preceito constitucional que instituíra o mandado de injun-
ção (art. 5 g , LXXI) porque, a despeito da finalidade que o inspirara, e do que 
dispõe o § Ia do mesmo artigo da Lei Maior — "as normas definidoras dos 
direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata" —, esse dispositivo 
nos parecia incompleto e desprovido dos elementos mínimos indispensáveis à 
sua imediata execução. 
124
 Comentários à Constituição Federal brasileira, São Paulo: Saraiva, 1933, v. 2, p. 488-489. 
1 2 5
 Inocêncio Mártires Coelho, Sobre a aplicabilidade da norma constitucional que instituiu 
o mandado de injunção, Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 104, p. 45, out./dez. 
1989. 
50 
Mesmo assim, sob aplausos gerais — tanto mais intensos quanto menos 
avisados —, o STF rejeitou aquele entendimento e, como prevíramos, e até 
chegamos a vaticinar em nosso parecer, o novo instituto veio a morrer de ina-
plicação, por falta de uma regulamentação adequada à sua natuteza, de nada 
valendo pata viabilizá-lo a legislação apressadamente tomada de empréstimo 
ao mandado de segurança. 
Aliás, se fosse auto-aplicável ou bastante em si, como afinal e contradito-
riamente se afirmou naquela decisão, o mandado de injunção dispensaria a ajuda 
regulamentadora tomada de empréstimo a outro remédio constitucional... 
Quanto aos modernos doutrinadores, apesar dos louváveis esforços que têm 
feito para densificar a eficácia das normas constitucionais não auto-aplicáveis, 
nomeadamente a das chamadas disposições programáticas116, apesat desse traba-
lho, digamos, de garimpagem, forçoso é reconhecermos que pouco avançaram 
nesse árduo empreendimento, dando-nos a impressão de que o filão, tão insis-
tentemente procurado, vai-lhes fugindo a cada nível das suas penosas escavações. 
É o que retratam, salvo engano, estas conclusões de Jorge Miranda: 
"Em suma,
a força jurídica das normas programáticas traduz-se (por ordem mais 
cronológica do que lógica) em: 
1) elas detetminam a cessação da vigência, por inconstitucionalidade superve-
niente, das normas legais anteriores que disponham em sentido conttário; 
2) conquanto o seu sentido essencial seja sempre prescritivo, e não proibitivo, 
elas possuem, complementarmente, um duplo sentido proibitivo ou negativo 
— proíbem a emissão de normas legais contrárias e proíbem a prática de compor-
tamentos que tendam a impedir a produção de atos pot elas impostos — donde 
inconstitucionalidade material em caso de violação; 
3) elas fixam diretivas ou critérios para o legislador ordinário nos domínios sobre 
que versam — donde, inconstitucionalidade por omissão em caso de inércia le-
gislativa e ainda inconstitucionalidade material (que é inconstitucionalidade pot 
ação), por desvio de poder, em caso de afastamento desses critérios; 
4) elas adquirem eficácia sistemática como elemento de integração dos restantes 
preceitos constitucionais e, assim, através da analogia que sobte elas se construa, 
adquirem uma eficácia criadora de novas normas" 1 2 7. 
O mesmo se poderá dizer sobre o balanço de Gomes Canotilho, essencial-
mente idêntico, no particular, ao do seu ilustre compatriota, apesar ou por causa 
da afirmação otimista de que, "...marcando uma decidida ruptura em relação 
1 2 6
 Cf. Gomes Canotilho, Constituição dirigente, cit.; Jorge Miranda, Manual de direito constitu-
cional, cit.; Rolando E. Pina, Cláusulas constitucionales operativas y programáticas, Buenos Aires: 
Astrea, 1973; Maria Helena Diniz, Norma constitucional e seus efeitos, São Paulo: Saraiva, 
1989, p. 103-104; Luis Roberto Barroso, O direito constitucional e a efetividade de suas normas: 
limites e possibilidades da Constituição brasileira, Rio de Janeiro: Renovar, 1990; e Marcelo 
Neves, A constitucionalização simbólica, São Paulo: Acadêmica, 1994-
127
 Manual de direito constitucional, cit., p. 219-220. 
Ol 
à doutrina clássica, pode e deve falar-se da morte das normas constitucionais 
programáticas"128. 
2.5. Normas de organização e normas definidoras de direitos 
Quanto à matéria que disciplinam, e refletindo a clássica dicotomia Estado/ 
indivíduo, as disposições constitucionais podem ser classificadas em normas de 
organização, de estrutura ou de competência, e normas definidoras de direitos, sendo 
as primeiras aquelas que dispõem sobre a ordenação dos poderes do Estado, sua 
estrutura, competência, articulação recíproca e o estatuto dos seus titulares; as 
outras, as que definem os direitos fundamentais dos jurisdicionados. 
2.6. Princípios jurídicos e regras de direito 
Das mais relevantes para a prática do Direito, sobretudo em âmbito cons-
titucional, essa distinção tem como base a estrutura normativo-material dos 
preceitos que integram a parte dogmática das constituições, com enormes re-
flexos na sua interpretação e aplicação, como se verá adiante. 
De início, embora nos desobrigando de apontar uma diferença ontológica 
entre essas espécies normativas, até porque dita ontologia não resistiria ao 
teste da experiência nos diversos quadrantes do mundo jurídico 1 2 9, dispensan-
do-nos desse esforço essencialista afirmaremos, com Mareei Stati, que "aquilo 
que caracteriza particularmente o princípio — e isto constitui sua diferença 
com a regra de direito (...) — é, de um lado, a falta de precisão e, de outro, a 
generalização e abstração lógica..."1 3 0. 
Sob perspectiva um tanto diversa, Josef Esser distingue essas duas espécies 
normativas dizendo que "os princípios jurídicos, diferentemente das normas 
[regras] de direito, são conteúdo em oposição a forma, embora o uso dessas ca-
tegorias aristotélicas — adverte — não nos deva induzir a pensar que a forma 
seja o acessório de algo essencial", até potque "histórica e efetivamente, a forma, 
entendida processualmente como meio de proteção do direito ou materialmen-
te como norma, é sempre o essencial, o único que pode conferir realidade e 
significação jurídica àquele conteúdo fundamental ainda não reconhecido 
como ratio"m. 
Se, por outro lado, adotarmos o critério de Ronald Dworkin, diremos que 
128
 Direito constitucional, cit., p. 1050-1051. Sobre o tema da executoriedade da Constituição, 
ver o clássico de José Afonso da Silva: Aplicabilidade das normas constitucionais, São Paulo: 
Revista dos Tribunais, 1968. 
1 2 9
 Cf., por todos, Josef Esser, Principio y norma en la elaboración jurisprudencial dei derecho 
privado, Barcelona: Bosch, 1961, especialmente as p. 113-179. 
"° Le standard juridique, Paris: LJAM, 1927, p. 56. 
1 3 1
 Principio y norma, cit., p. 65. 
52 
a diferença entre regras e princípios é de natureza lógica e que decorre dos res-
pectivos modos de aplicação1 3 Z. 
Com efeito, em razão da sua estrutura normativo-material — se A deve 
ser B —, as regras são aplicadas à maneira de proposições disjuntivas, isto é, se 
ocorrerem os fatos desctitos na sua hipótese de incidência e se elas forem normas 
válidas, de acordo com a regra de reconhecimento133 do sistema a que pertencem, 
as suas prescrições incidirão necessariamente sobre esses fatos, tegulando-os na 
exata medida do que estatuírem e afastando — como inválidas — outras tegras 
que, eventualmente, possam concorrer ou entrar em conflito com elas. 
Noutras palavras, em se tratando de regras de direito, sempre que a sua 
previsão se verificar numa dada situação de fato concreta, valeta pata essa 
situação exclusivamente a sua conseqüência jurídica, com o afastamento de 
quaisquer outras que dispuserem de maneira diversa, porque no sistema não 
podem coexistir normas incompatíveis. Se, ao conttário, aqueles mesmos fatos 
constituírem hipótese de incidência de outras regras de direito, estas e não as 
primeiras é que regerão a espécie, também integralmente e com exclusividade, 
afastando-se — pot incompatíveis — as conseqüências jurídicas previstas em 
quaisquer outras regras pertencentes ao mesmo sistema jurídico. 
Daí se dizer que na aplicação aos casos ocorrentes, as regras — disjun-
tivamente — valem ou não valem, incidem ou não incidem, umas afastando 
ou anulando as outras, sempre que para uma mesma situação de fato existam 
conseqüências jutídicas antinómicas ou reciprocamente excludentes, uma solução 
que é lógica só nas apatências e não revela o intrincado jogo consigo mesmo que, 
em qualquer instância, o aplicador do direito é obrigado a disputar até descobrir 
e/ou eleger as normas que levará em conta para decidir as causas ou controvér-
sias submetidas à sua apreciação1 3 4. 
Como o Direito, enquanto ordenamento ou sistema, não tolera antinomias 
ou contradições, ao longo dos séculos tanto a legislação quanto a doutrina e a 
jurisprudência foram elaborando algumas regras, de aceitação generalizada, para 
1 , 2
 Los derechos en serio, Barcelona: Ariel, 1995, p. 74 e s. 
1 3 3
 Herbert Hart, El concepto de derecho, Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1992, p. 117-118. 
Ver, também, Juan Ruiz Mañero, La regla de reconocimiento y el status normativo de los 
jueces, in Jurisdicción y normas, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1990, p. 97-
198, e Manuel Atienza e Juan Ruiz Mañero, La regla de reconocimiento, in Las piegas dei 
derecho, Barcelona: Ariel, 1996, p. 143-163. 
1 3 4
 Ver, a propósito, o que disse Karl Larenz sobre o vaivém dialético da aplicação do direito: 
"No começo, está o texto da lei — só aparentemente claro e fácil de aplicar — e no final — se 
este existe —, entretecida em torno do texto, uma teia de interpretações, restrições e comple-
mentações, que regula a sua aplicação no caso singular e que transmudou amplamente o seu 
conteúdo, a pontos de em casos extremos quase o tornar irreconhecível. Com efeito, um 
estranho resultado daquele processo que o jurista se habituou a denominar simplesmente de 
aplicação
das normas1." (Metodologia da ciência do direito, Lisboa: Fundação Calouste Gul-
benkian, 1989, p. 250). 
53 
resolver os conflitos entre normas, pelo menos aqueles simplesmente aparentes, já 
que as antinomias reais permanecem insolúveis ou têm a sua resolução confiada 
ao poder discricionário do intérprete, como assinala Bobbio 1 3 5. 
Fruto desse trabalho são os chamados critérios cronológico, hierárquico e da 
especialidade, em verdade simples regras técnicas que, na maioria dos casos, ao 
serem utilizadas parecem ter resolvido apenas falsos problemas. E que a incidên-
cia de uma norma afasta a incidência da outra, de tal sorte que, no mais das vezes, 
as chamadas regras de solução de conflitos são invocadas pelos aplicadores do 
Direito menos para resolver do que para declarar inexistentes supostos defeitos 
lógicos nos ordenamentos em que operam. 
Afinal de contas, parece intuitivo que aquelas regras, precedendo a pro-
mulgação das normas jurídicas, previnam ou evitem o surgimento de contradi-
ções entre elas, as quais, precisamente por isso, podem ser descartadas como 
simplesmente aparentes. Essa conclusão, no entanto, seria correta apenas se, 
contra toda a evidência, existisse de fato o legislador racional136 e se os sistemas 
jurídicos, fruto do seu trabalho, fossem logicamente consistentes ou imunes à 
ocorrência de conflitos reais, i. e., de situações em que duas ou mais normas 
(i) pertencentes ao mesmo ordenamento, (ii) dotadas de igual hierarquia, (iii) 
editadas simultaneamente, e (iv) possuindo âmbitos de validade idênticos, 
mesmo assim estabelecem para um mesmo caso soluções que — pelo menos aos 
olhos do intérprete — são mutuamente incompatíveis1 3 7. 
Por isso, nesses casos modelares de inconsistência total-total ou de incom-
patibilidade absoluta entre normas1 3 8, não se encontram soluções manejando 
1 3 5
 Norberto Bobbio, Teoria do ordenamento jurídico, Brasília: Polis/Ed. da UnB, 1989, p. 100. 
Embora formulada em contexto diverso, merece registro esta observação de Manuel Calvo 
Garcia sobre a racionalidade das leis: "Frente a uno de los postulados más característicos 
de la concepción metodológica tradicional, las teorías de la argumentación defienden que 
el legislador real no es racional o, lo que es igual, que no hace leyes perfectas que prevean 
soluciones claras y no contradictorias para cualquier caso hipotético que pueda producirse, 
y que, por lo tanto, quines tienen que ser racionales son los juristas, quienes interpretan y 
aplican la ley" (Los fundamentos del método jurídico: una revisión crítica, Madrid: Tecnos, 
1994, p. 217). 
1 3 6
 Sobre a ficção do legislador racional, ver Carlos Santiago Nino, Consideraciones sobre la 
dogmática jurídica, México, UNAM, 1974, p. 85-101. 
1 3 7
 Carlos Santiago Nino, Notas de introducción al derecho, Buenos Aires: Astrea, 1975, v. 4, 
p. 52-84; Norberto Bobbio, Teoria do ordenamento jurídico, cit., p. 86-91. A propósito, para 
ressaltar a dificuldade na identificação das antinomias, registre-se a autocrítica de Roberto 
J. Vernengo, no sentido de que ainda são relativamente pobres os instrumentos de investi-
gação semântica de que dispõem os juristas para testar o rigor dos seus métodos, e de que não 
existem critérios razoavelmente confiáveis que lhes permitam dizer quando duas expressões 
normativas ordenam ou prescrevem um mesmo comportamento (La interpretación literal de 
¡a ley, Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1971, p. 6). 
1 3 8
 Alf Ross, Sobre el derecho y la justicia, 4- ed., Buenos Aires: Ed. Universitaria de Buenos 
Aires, 1977, p. 124-125. 
54 
os critérios cronológico, hierárquico e da especialidade, até porque eles são con-
genitamente insuficientes, podem entrar em contradição e, afinal, só "resolvem" 
mesmo os conflitos aparentes de normas1 3 9. 
No campo da aplicação dos princípios, ao contrário, a maioria entende que 
não se faz necessária a formulação de regras de colisão, porque essas espécies 
normativas — por sua própria natureza, finalidade e formulação — parece não 
se prestarem a provocar conflitos, criando apenas momentâneos estados de 
tensão ou de mal-estar hermenêutico, que o operador jurídico prima facie verifica 
serem passageiros e plenamente superáveis no curso do processo de aplicação 
do Direito. 
Daí a observação de Humberto Avila de que a própria idéia de "conflito" 
deve ser repensada, pois se o conteúdo normativo de um princípio "depende" da 
complementação (positiva) e limitação (negativa) deconentes da relação dialética 
que mantém com outros princípios, parece inconcebível a ocorrência de efetivas 
"colisões" entre eles. Tratar-se-ia, prossegue esse autor, de um conflito aparente 
e não-uniforme, já que a idéia de conflito pressupõe a identidade de hipóteses 
e campos materiais de aplicação entre as normas eventualmente contrapostas, 
o que no caso dos princípios está previamente afastado pois eles são definidos 
justamente em função de não terem uma hipótese de incidência e uma con-
seqüência jurídica abstratamente determinadas. Dessarte, conclui Humberto 
Avila, "o problema que surge na aplicação dos princípios reside muito mais em 
saber qual deles será aplicado e qual a relação que mantêm entre si" 1 4 0. Daí, 
igualmente, a observação de Juan Cianciardo a nos dizer que, a rigor, não se trata da 
primazia de um princípio sobre outro, mas apenas da inaplicabilidade do princípio 
eventualmente afastado, funcionando como suposto de fato da regra de decisão 
— que, então, necessariamente, se formula — as circunstâncias do caso e, como 
sua conseqüência jurídica, a que se extrai do princípio de maior peso 1 4 1. 
É que, diferentemente das regras de direito, os princípios jurídicos não se 
apresentam como imperativos categóricos, mandatos definitivos nem ordenações de 
vigência diretamente emanados do legislador, antes apenas enunciam motivos 
para que o seu aplicador se decida neste ou naquele sentido. Noutras palavras, 
enquanto em relação às regras e sob determinada concepção de justiça, de resto 
integrada na consciência jurídica geral142, o legislador desde logo e com exclusividade 
define os respectivos suposto e disposição, isto é, cada hipótese de incidência e a 
respectiva conseqüência jurídica, já no que se refere aos princípios jurídicos — daí 
1 3 9
 Carlos Santiago Nino, Fundamentos de derecho constitucional, Buenos Aires: Astrea, 1992, 
p. 96-97. 
1 4 0
 A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade, Revista 
de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, 215:151-179, jan./mar.l999 (nota 48, à p. 162). 
141
 El conflictivismo en los derechos fundamentales, Pamplona: EUNSA, 2000, p. 200-201. 
1 4 2
 Karl Larenz, Metodologia da ciência do direito, cit., p. 272-274-
55 
o seu caráter não conclusivo, anota Hart 1 4 1 — esse mesmo legislador se abstém 
de fazer isso, ou pelo menos de fazê-lo sozinho e por inteiro, preferindo compar-
tilhai a tarefa com aqueles que irão aplicar esses standards normativos, porque 
sabe de antemão que é somente em face de situações concretas que eles logram 
atualizar-se e operar como verdadeiros mandatos de otimização. 
Por isso, lembrando Karl Larenz, diríamos que, em si mesmos, os princípios, 
não são — ou ainda não são — regras suscetíveis de aplicação direta e imediata, 
mas apenas pontos de partida ou pensamentos diretores, que sinalizam — aí se 
detém o legislador — para a norma a ser descoberta ou formulada por quem irá 
aplicá-la conforme as exigências do caso 1 4 4. 
Nesse sentido, pode-se dizet que os princípios jurídicos se produzem neces-
sariamente em dois tempos e a quatro mãos: primeiro são fonnulados genérica e 
abstratamente pelo legislador; depois se concretizam, naturalmente, como normas 
do caso ou normas de decisão, pelos intérpretes e aplicadores do Direito. Ou, se 
preferirmos — parafraseando Eduardo Couture1 4' —,
os princípios são as regras a 
longo prazo, porque embora pareçam precedê-las — como enganosamente sugere 
o seu nome — em verdade é delas que eles vão sendo extraídos e genetalizados, 
pelos juízes e tribunais, ao construírem as regras de decisão, que lhes permitem 
realizar a justiça em sentido material, dando a cada um o que é seu1 4 6. 
De outta parte, sem impor aos seus operadores uma única decisão correta 
e justa, eles admitem e até mesmo exigem convivência e conciliação com outros 
princípios — igualmente operantes e eventualmente concorrentes — que ofe-
reçam razão para soluções em sentido diverso, tudo isso num complexo jogo 
concertado de complementações e restrições recíprocas; ou, se preferirmos, num 
processo essencialmente dialético, que se inicia no instante em que o intérprete 
esboça a aplicação dos princípios às situações da vida, e que se conclui quando, 
logrando concretizá-los, ele dá fiel cumprimento a esses mandatos de otimização 
recebidos do legislador147. 
H3
 Herbert L. A. Hart, O conceito de direito, 2. ed., tradução de A. Ribeiro Mendes, Lisboa: 
Fundação Calouste Gulbenkian, 1996, p. 322-323. 
144
 Derecho justo: fundamentos de ética jurídica, Tradução de Luis Diez-Picazo, Madrid: 
Civitas, 1993, p. 33. Em perspectiva idêntica, Peter Haberle observa, por exemplo, que 
todo direito fundamental aspira a ser "regra", para que a sua normatividade se converta em 
normalidade ou prática efetiva no âmbito da sociedade em que pretende atuar (La libertad 
fundamental en el Estado constitucional, Lima: Pontifícia Universidad Católica dei Peru, 
1997, p. 101 e 197). 
1 4 5
 Para Eduardo Couture, "a teoria é a prática a longo prazo", conforme anotado por Sadok 
BelaicL_em.seir Essai sur le pouvoir créateur et normatif dujuge, Paris: LGDJ, 1974. 
1 4 6
 Josef Esser, Principio y norma, cit., p. 71. 
1 4 7
 Claus-Wilhelm Canaris, Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito, 
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989, p. 88-99; Karl Larenz (Metodologia da ciência do 
direito, cit., ed. de 1989, p. 579): "E decisivo, por outro lado, que o pensamento não procede 
aqui 'linearmente', só num sentido: o princípio esclarece-se pelas suas concretizações e estas 
pela sua união perfeita com o princípio". 
56 
A sua gênese e o modo como são positivados nos textos constitucionais 
evidenciam, por outro lado, que os princípios jurídicos possuem, igualmente, 
uma importante dimensão institucional, como fatores de criação e manutenção de 
unidade política, à medida que, nos momentos constituintes, por exemplo, graças 
à amplitude e à indeterminação do seu significado, eles viabilizam acordos ou 
pactos de convivência sem os quais as disputas ideológicas seriam intermináveis, 
e os conflitos delas resultantes não permitiriam a promulgação consensual das 
leis fundamentais148. 
Em decisão paradigmática sobre o modo como se desenvolve o jogo da 
aplicação dos princípios jurídicos, o STF assentou que, em face da Constituição 
de 1988, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e o princípio da livre con-
corrência com os princípios da defesa do consumidor e da redução das desigualdades 
sociais, em conformidade com os ditames da justiça social — valores inconciliá-
veis, se vistos em abstrato ou tomados em sentido absoluto —, pode o Estado, 
por via legislativa, tegular a política de preços de bens e de serviços, abusivo que 
é o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros1 4 9. 
Trata-se, portanto, convém insistir, de uma espécie de convivência ne-
cessariamente amistosa — um jogo concertado — menos pela natureza, digamos, 
pacífica dos princípios do que pelo fato de as colisões entre eles não serem 
antinomias jurídicas em sentido próprio, embora possam dar lugar a regras mu-
tuamente incompatíveis1'0. 
Com efeito, nessa decisão o STF mais não fez do que ponderar e relativizar 
o peso dos princípios concorrentes e, diante das circunstâncias do caso, legitimar a 
intervenção legislativa do Estado em determinado setor da atividade econômica, 
sem que assim decidindo tenha invalidado qualquer dos standards normativos 
em conflito, os quais, abstratamente considerados, continuaram com a mesma 
força normativa e a mesma relevância constitucional. Se e quando, à vista de 
outro caso concreto, aqueles princípios voltarem a entrar em estado de tensão — e 
novamente a depender das circunstâncias —, o tribunal poderá levar a cabo 
um balanceamento diverso, atribuindo maior peso ao que, na situação anterior, 
recebeu menor ponderação. 
Por isso é que, diante das antinomias de princípios, quando em tese mais 
de uma pauta lhe parecer aplicável à mesma situação de fato, em vez de se sentir 
obrigado a escolher este ou aquele princípio, com exclusão de outros que, prima 
facie, repute igualmente utilizáveis como norma de decisão, o intérprete fará 
uma ponderação entre os standards concorrentes — obviamente se todos forem 
1 4 8
 Vital Moreira, Revisão constitucional e "princípios fundamentais", in Constituição e revisão 
constitucional, Coimbra: Caminho, 1980, p. 73. 
1 4 9
 ADI 319/DF, Rei. Moreira Alves, RTJ, 149/666-692. 
1 5 0
 Norberto Bobbio, Teoria general dei derecho, Bogotá: Temis, 1987, p. 190; Josef Esser, 
Principio y norma, cit., p. 55-56. 
57 
princípios válidos, pois só assim podem entrar em rota de colisão 1 ' 1 — optando, 
afinal, por aquele que, nas circunstâncias, lhe pareça mais adequado em termos 
de otimização de justiça. 
Em palavras de Alexy, resolve-se esse conflito estabelecendo, entre os 
princípios concorrentes, uma relação de precedência condicionada, na qual se 
diz, sempre diante das peculiaridades do caso, em que condições um princípio 
prevalece sobre o outro, sendo certo que, noutras circunstâncias, a questão da 
precedência poderá resolver-se de maneira inversa152. 
Tratando-se de um método de ponderação de bens à luz do caso concreto, é 
intuitivo que a priori não exista uma hierarquia fixa e abstrata entre os diversos 
ptincípios, ressalvada — porque fora de cotejo axiológico — apenas a dignidade 
da pessoa humana como valor-fonte dos demais valores, valor fundante da experi-
ência ética ou, se preferirmos, princípio e fim de toda ordem jurídica1 5 5. 
Considerando, como já acentuado, que em face do contexto a avaliação 
dos ptincípios pode mudar de sinal—não nos esqueçamos que a precedência entre 
eles é sempre condicionada —, o fato de se dar menor importância a qualquer 
deles, em determinada situação, não o invalida ou desqualifica para futuras apli-
cações, porque sua preterição terá decorrido exclusivamente das circunstâncias 
do caso, que não se prestam a fomentar precedentes. É que, ao conttário das 
regras de direito — claras ordenações de vigência ou mandatos de realização —, 
os princípios jurídicos são mandatos de otimização ou preceitos de intensidade 
modulável, a serem aplicados na medida do possível e com diferentes graus de 
efetivação1 5 4. 
Pois bem, é precisamente nessa característica — pelo menos ao ver de 
Alexy — que residiria o traço fundamental dos princípios jurídicos, a diferença 
específica que nos permitiria considerá-los qualitativamente distintos das tegras 
de direito: 
"O ponto decisivo para a distinção entte tegras e princípios reside em que os princípios 
são normas ordenadoras de que algo se realize na maior medida possível, dentro das 
possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandatos de 
1 5 1
 Robert Alexy, Teoría de los derechos fundamentales, tradução de Ernesto Garzon Valdês, 
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993, p. 89. 
152
 Teoria de los derechos, cit., p. 92. 
1 5 3
 Cf., sobre a transcendentalidade do valor pessoa humana, Battista Mondin, A metafísica da 
pessoa como fundamento da bioética, in Questões atuais de bioética, coordenação de Stanislav 
Ladusãns, São
Paulo: Loyola, 1990, p. 147-174, e Definição filosófica da pessoa humana, Bauru-
SP: EDUSC, 1998; Miguel Reale, Pluralismo e liberdade, São Paulo: Saraiva, 1963, p. 70-74, 
e Filosofia do direito, São Paulo: Saraiva, 1982, p. 211-214; Gregorio Peces-Barba, Los valores 
superiores, Madrid: Tecnos, 1986, p. 112 e 121; Joaquín Arce y Florez-Valdês, Los principios 
generales del derecho y su formulación constitucional, Madrid: Civitas, 1990, p. 144-151. Em 
sentido contrário, apontando situações em que a dignidade da pessoa humana cederia lugar 
a outros princípios, ver Robert Alexy, Teoría de los derechos, cit., p. 105-109. 
1 5 4
 Robert Alexy, Derecho y razón práctica, México: Fontamara, 1993, p. 12-14. 
58 
otimização, caracterizados pelo fato de poderem ser cumpridos em diferentes graus, 
e a medida do seu cumprimento não depende apenas das possibilidades reais, mas 
também das possibilidades jurídicas. O âmbito dessas possibilidades jurídicas é 
detetminado pelos princípios e regras opostos. As regras, ao contrário, só podem 
ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então há de se fazer exatamente o 
que ela exige, nem mais, nem menos. Por conseguinte, as regras contêm deter-
minações no âmbito do que é fática e juridicamente possível. Isto significa que a 
diferença entre regras e princípios é qualitativa e não de grau. Toda norma ou é 
uma regra, ou é um princípio"1". 
A despeito da grande aceitação que mereceu da doutrina, não são poucos 
os autores de expressão que se opõem a esse critério diferenciador, seja dizen-
do que não apenas os princípios, mas também as regras, seriam mandatos de 
otimização, seja afirmando que não só as regras, mas também os princípios, 
podem enttar em colisão total, de sorte que, num caso concreto, a aplicação de 
determinado princípio afastaria os outros, eventualmente colidentes, como não 
pertencentes ao mesmo ordenamento jurídico 1 5 6. 
Por isso, a idéia de mandato de otimização em vez de servir de fundamento 
para uma diferença qualitativa entre regras e princípios, antes representaria uma 
simples técnica de argumentação, utilizável não somente na aplicação dos princí-
pios, mas também na concretização de todo e qualquer standard normativo 1 5 7. 
Dignas de registro nesse debate são também as considerações de Gustavo 
Zagrebelsky, para quem a diferença mais importante entre regras e princípios 
talvez possa vir sugerida pelo distinto "tratamento" que lhes dispensa a ciência 
do direito. 
Com efeito, anota Zagrebelsky, só se aplicam às regras os variados e vir-
tuosos métodos da interpretação jurídica que tem por objeto a linguagem do 
legislador; nas formulações dos princípios, ao contrário, há pouco que inter-
pretar, pelo menos desse modo. É que, usualmente, o seu significado lingüístico 
é auto-evidente e nada existe que deva ser esclarecido raciocinando sobre as 
palavras. Suas fórmulas quase sempre se traduzem em expressões um tanto ba-
nais, "produto de uma recepção jurídica de terceira ou quarta mão", mas nem 
por isso menos veneráveis, que remetem a tradições históricas e contextos de 
significado a serem entendidos em seu ethos mais do que "intetpretados" pela 
análise da linguagem. Em poucas palavras, às regras "se obedece" e, por isso, é 
importante determinar com precisão os preceitos que o legislador estabelece 
por meio das formulações que as contêm; aos princípios, pelo contrário, "se 
presta adesão" e, por esse motivo, é importante compreendermos o mundo de 
valores, as grandes opções de cultuta jurídica de que fazem parte e às quais as 
155
 Teoría de los derechos fundamentales, cit., p. 86-87. 
1 5 6
 Humberto Ávila, A distinção..., Revista de Direito Administrativo, cit., p. 163-164. 
1 5 7
 Luis Prieto Sanchís, Sobre principios y normas, Madrid: Centro de Esrudios Constitucio^ 
nales, 1992, p. 44-50. 
59 
palavras não fazem mais que uma simples alusão. Noutros termos, enquanto as 
regras nos dizem como devemos, não devemos ou podemos atuar em situações 
específicas, os princípios a esse respeito nada nos dizem diretamente, embora 
nos proporcionem critérios para tomar posição em circunstâncias só aparen-
temente indeterminadas. Mais ainda, porque não contêm "suposto de fato", 
a eles, diversamente do que ocorre com as regras, só podemos atribuir algum 
significado operativo fazendo-os "reagir" diante de casos concretos. 
Uma outta diferença — prossegue Zagrebelsky — poder-se-ia indicar 
assinalando que só as regras podem ser observadas e aplicadas mecânica e 
passivamente e, por isso, se o direito contivesse apenas essa espécie de normas 
não seria insensato pensar-se em "mecanizar" a sua aplicação, por meio de au-
tómatas pensantes, aos quais indicaríamos o fato e eles prontamente nos dariam 
a resposta, utilizando, quem sabe, os principais esquemas lógicos de aplicação 
de preceitos jurídicos — o silogismo judicial e a subsunção do suposto de fato 
concreto no suposto abstrato da norma. No caso dos princípios essa "aplicação" 
é completamente diferente pois quando a realidade nos exige alguma "resposta", 
nossa "tomada de posição" será conforme com esses princípios. Uma máquina 
capaz de se "comportat" no sentido aqui indicado — conclui Zagrebelsky —, é 
uma hipótese que sequer pode ser considerada, pelo menos enquanto a máquina 
continuar a ser máquina1'8. 
Finalmente, consolidando as principais diferenças entre regras e princípios, 
observa Gomes Canotilho tratar-se de uma tarefa particularmente complexa, 
mas que pode ser cumprida com base nos seguintes critérios: 
• grau de abstração: os princípios jurídicos são normas com um grau de abs-
tração relativamente mais elevado do que o das regras de direito; 
• grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por 
serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (e. g. do 
legislador ou do juiz), enquanto as regras são suscetíveis de aplicação direta; 
• caráter de fundamentalidade no sistema das fontes de direito: os princípios 
são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurí-
dico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (e.g. os princípios 
constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico 
(e. g., o princípio do Estado de Direito); 
• proximidade da idéia de direito: os princípios são standards juridicamente 
vinculantes, radicados nas exigências de justiça (Dworkin) ou na idéia de direito 
(Larenz); as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo meramente 
funcional; 
• natureza normo genética: os princípios são fundamentos de regras, 
isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras 
El derecho dúctil: ley, derechos, justicia, Madrid: Trotta, 1999, p. 110-111. 
60 
jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética funda-
mentante 1 5 9 . 
Fixadas essas noções introdutórias, que mais adiante servirão de base 
para o estudo da interpretação especificamente constitucional, podemos dizer 
que, embora existam expressivas diferenças entre os preceitos constitucionais 
e as demais normas do ordenamento jurídico, a demandarem um tratamento 
hermenêutico diferenciado, nem por isso deveremos imaginar esses preceitos 
fora do sistema a que igualmente pertencem, até porque a unidade desse sistema 
e a validade das suas normas começam e terminam na Constituição. 
3. DIREITO, ESTADO E ESTADO DE DIREITO. ORIGENS, DESENVOLVI-
MENTO HISTÓRICO E MODELOS DE ESTADO DE DIREITO 
3.1. Colocação do tema 
Instado, certa vez, por um jovem estudante, a dizer em poucas palavras o 
que era um Estado de Direito, o saudoso professor Roberto Lyra Filho respondeu de 
pronto: "é aquele Estado que tem limites e fundamentos definidos pelo Direito", 
uma resposta evidentemente correta, mas insuficiente — até mesmo por sua 
formulação sintética —, para traduzir toda a complexidade de que se
reveste o 
fenômeno conceituado, cuja apreensão depende de prévio "acerto de contas" 
sobre o que se entende por Direito e Estado, para só depois nos aventurarmos 
em descobrir o que significam na expressão compósita Estado de Direito, sob a 
qual ainda hoje parece ocultar-se algo enigmático, como sugerem estas palavras 
do clássico Luis Legaz y Lacambra: 
"O Estado de Diteito é um dos misrérios da ciência jurídico-política; é, na esfera 
da ciência do Direito e do Estado, o que na Teologia é o mistério do Deus-Ho-
mem, o mistério do Criador da Natureza submetido à Natureza. Deus e Homem 
verdadeiro, diz o Credo; legislador, e, não obstante, submetido à lei, afirma a 
teoria política" 1 6 0. 
3.2. Conceito de Estado 
Considerando desnecessárias, para os propósitos deste trabalho, incur-
sões mais profundas pelos inúmeros autores que formularam conceitos sobre 
o Estado, relembraremos apenas o que dizem os manuais: Estado é uma nação 
politicamente organizada161, conceito sintético que demandatia desdobramentos 
esclarecedores, pelo menos quanto aos chamados elementos constitutivos do 
Direito constitucional, cit., p. 1034-1035. 
Luis Legaz y Lacambra, Eí Estado de Derecho en la actualidad, Madrid: Reus, 1934, p. 12. 
Euzébio de Queiroz Lima, Teoria do Estado, Rio de Janeiro: A Casa do Livro, 1951, p. 5. 
61 
Estado —povo, território e governo162 — e, principalmente, sobre o modo como, 
em seu interior, se exerce a violência física legítima, cujo monopólio Max Weber 
considera necessário à própria existência do Estado Moderno. 
Pela sua importância para a compreensão do Estado de Direito como instru-
mento de racionalização ou institucionalização do poder163, transcrevemos, apesar 
de sua extensão, estas palavras de Weber, seguramente das mais expressivas 
dentre quantas já foram ditas sobre o tema: 
"O Estado moderno é uma associação de domínio com carácter institucional 
que tratou, com êxito, de monopolizar, dentro de um território, a violência física 
legítima como meio de domínio e que, para esse fim, reuniu todos os meios ma-
teriais nas mãos do seu dirigente e expropriou todos os funcionátios feudais que 
anteriormente deles dispunham por direito próprio, substituindo-os pelas suas 
próprias hierarquias supremas. (...) 
Este Estado é sociologicamente definível pela referência a um meio específico que 
ele, como qualquer associação política, possui: a violência física. 'Todo o Estado 
se funda na violência', disse Trotsky em Brest-Litowsk. Isto está objectivamente 
cetto. Bastaria que tivessem existido configurações sociais que ignorassem o meio 
da violência e o conceito de 'Estado' teria desaparecido, instautando-se o que, 
neste sentido específico, chamatíamos 'anarquia'. Naturalmente que a violência 
não é nem o meio notmal nem o único meio de que o estado se serve, mas é 
realmente o seu meio específico. Precisamente hoje, é especialmente íntima a 
relação do Estado com a violência. No passado, a violência foi utilizada pelas 
mais diversas associações, a começar pela associação familiar (Sippe), como meio 
inteiramente normal. Hoje, pelo contrário, deveremos dizer que o Estado é a 
comunidade humana que, dentro de um determinado território (o 'território' é 
elemento definidor) reclama (com êxito) para si o monopólio da violência física 
legítima. E específico do nosso tempo que a todas as outras associações e indivíduos 
só é concedido o direito à violência física na medida em que o Estado o petmite. 
O Estado é a única fonte do 'direito' à violência" 1 6 4. 
A luz do pensamento de Max Weber, de resto compartilhado pela genera-
lidade dos teóricos do Estado e dos cientistas políticos, o conceito de violência 
legítima é a pedra de toque para a compreensão do Estado de Direito como ins-
trumento de racionalização/institucionalização ou, se preferirmos, de legitimação 
do exercício do poder. 
Por isso é que, desde os seus primórdios, a idéia de Estado de Direito está asso-
ciada à de contenção do Estado pelo Direito, os quais, para tanto, são concebidos 
como realidades distintas, uma formulação ideológica, como a vêem os olhos críticos 
1 6 2
 Para um estudo completo dos temas e problemas da Teoria do Estado, ver, por todos, 
Georg Jellinek, Teoria general dei Estado, México: Continental, 1956. 
1 6 3
 Cf., entre outros, Boris Mirkine-Guetzévitch, As novas tendências do direito constitucional, 
São Paulo: Ed. Nacional, 1933, p. 90-91; Georges Burdeau, Eí Estado, Madrid: Seminarios y 
Ediciones, 1975, p. 25-28; e Miguel Reale, Fontes e modelos do direito: para um novo paradigma 
hermenêutico, São Paulo: Saraiva, 1994, p. 53-56. 
1 6 4
 O político e o dentista, Lisboa: Presença, s.d., p. 57 e 49. 
62 
de Kelsen, para quem o Estado deve ser representado como uma pessoa diferente do 
Direito para que este possa justificar o Estado, que o cria e a ele se submete, sendo 
certo que tal justificação só se torna possível quando o Direito é pressuposto como 
uma ordem essencialmente diferente do Estado, oposta à sua originária natureza 
— o poder — e, por isso mesmo, reta ou justa em um sentido qualquer165. 
3.3. Conceito de Direito 
Quanto ao Direito, poderemos conceituá-lo — à luz do normativismo jurí-
dico concreto de Miguel Reale — como um conjunto de normas que, em determi-
nada sociedade e num dado momento da sua história, mediante a intetferência 
decisória do Poder, ordena os fatos sociais em conformidade com certos valores, 
entendendo-se tais normas não como simples proposições lógicas, abstratas 
ou formais, mas como substratos que dialeticamente integram e superam, que 
sintetizam, portanto, as tensões entre fatos e valores, os quais, nelas e por elas, 
tornam-se fatos e valores especificamente jurídicos. 
3.4. Conceito de Estado de Direito 
O termo Estado de Direito — registra Bôckenfôrde — é uma construção 
lingüística e uma cunhagem conceptual própria do espaço lingüístico alemão, 
sem correspondentes exatos em outros idiomas; e aquilo que nas suas origens se 
queria designar com esse conceito, prossegue o mesmo jurista, é também uma 
criação da teoria do Estado do ptecoce liberalismo alemão, em cujo âmbito sig-
nificava o Estado da razão; o Estado do entendimento; ou, mais detalhadamente, o 
Estado em que se governa segundo a vontade geral racional e somente se busca o que 
é melhor para todos. Noutras palavras — ainda com Bôckenfôrde —, o Estado de 
Direito, em seus primórdios, é o Estado do direito racional, o Estado que realiza 
os princípios da razão na e para a vida em comum dos homens, tal e como esses 
princípios estavam fotmulados na tradição da teoria do direito racional 1 6 6. 
Apesar da ênfase dessas palavras, não são poucos os que discordam de 
Bôckenfôrde e de quantos mais reivindicam para a Alemanha, com exclusividade, 
a condição de terra mater das idéias que deram origem ao Estado de Direito. Tal 
é o caso de Jotge Reis Novais, por exemplo, que, mesmo reconhecendo méritos 
à publicística tedesca, põe em dúvida a existência de uma concepção alemã do 
Rechtsstaat e, afinal — ironicamente apoiado no germânico Otto Mayet —, credita 
aos franceses os principais contributos para o desenvolvimento do conceito de 
Estado de Direito167. 
1 6 5
 Hans Kelsen, Teoria pura do direito, cit., v. 2, p. 173. 
1 6 6
 Ernst Wolfgang Bôckenfôrde, Estúdios sobre el Estado de Derecho y la democracia, Madrid: 
Trotta, 2000, p. 20. 
167
 Contributo para uma teoria do Estado de Direito, Coimbra: Faculdade de Direito da Uni-
versidade de Coimbra, 1987, p. 37-51. 
63 
Deixando de lado essa controvérsia e retornando à conceituação básica 
de Estado de Diteito da velha doutrina alemã, observamos, novamente com 
Bõckenfõrde, que ela contém os seguintes aspectos fundamentais: 
a) está afastada, desde logo, qualquer idéia ou objetivo transpessoal do 
Estado, que não é criação de Deus, nem tampouco uma ordem divina,
mas 
apenas uma comunidade (res publica) a serviço do interesse comum de todos os 
indivíduos. As inclinações supra-sensíveis dos homens, a ética e a religião, sob 
essa ótica, estão fota do âmbito de competências do Estado de Direito; 
b) os objetivos e as tarefas do Estado limitam-se a garantir a liberdade e a 
segurança das pessoas e da propriedade, possibilitando o autodesenvolvimento 
dos indivíduos; 
c) a organização do Estado e a regulação das suas atividades obedecem a 
princípios racionais, do que decorre em primeiro lugar o reconhecimento dos 
direitos básicos da cidadania, tais como a liberdade civil, a igualdade jurídica, 
a garantia da propriedade, a independência dos juízes, um governo responsável, 
o domínio da lei, a existência de representação popular e sua participação no 
Podet Legislativo. 
3.5.0rigens, desenvolvimento histórico e modelos de Estado de 
Direito 
Quanto às suas origens e ao seu desenvolvimento histórico, jutistas, filó-
sofos e cientistas políticos, sem discrepâncias, indicam o surgimento do Estado 
de Direito no momento que se consegue pôr freios à atividade estatal por meio da 
lei, vale dizer, no instante que o próprio Estado se submete a leis por ele criadas, 
ainda que isso possa parecer um paradoxo, e tão embaraçoso paradoxo que o 
citado Legaz y Lacambra, como vimos, chegou a dizer que o Estado de Direito 
era um dos mistérios da ciência jurídico-política e compará-lo ao mistério 
teológico do Deus-Homem, que não obstante tenha criado a Natureza, a ela 
estaria submetido168. 
Mas, afinal, em que consiste o chamado Estado de Direito? Como surgiu a 
sua idéia? Como se desenvolveu no tempo? Qual o seu perfil atual? Quais suas 
perspectivas na entrada deste novo século? 
Prescindindo de pesquisas mais amplas, até porque, no particular, não se 
registram divergências de monta, poderemos dizer, com Elias Díaz, que o Estado 
de Direito — embora originariamente um conceito polêmico, orientado contra o 
Estado absolutista, o Estado-poder, o Estado-polícia ou o Estado invasor — pode-
rá ser caracterizado, em sua essência, como aquele Estado submetido ao direito, 
aquele Estado cujo poder e atividade estão regulados e controlados pela lei, en-
tendendo-se direito e lei, nesse contexto, como expressão da vontade geral169. 
168
 El Estado de Derecho en la actualidad, cit. 
1 6 9
 Estado de derecho y sociedad democrática, Madrid: Taurus (Cuadernos para el Diálogo, 
1975), p. 13. 
64 
No mesmo sentido são os ensinamentos de Manuel García-Pelayo1 7 0 e de 
Ctistina Queiroz171, quando asseveram que, produto da teoria racionalista, o 
Estado de Direito surge, numa primeira fase, polemicamente orientado contra 
a teoria absolutista, e particularmente contra o Polizeistaat, vindo alojar-se, na sua 
formalização técnico-jurídica, não no campo do direito constitucional, mas no 
campo do direito administrativo, onde designa uma ordem de relações entre a 
lei, a administração e o indivíduo, e significa a máxima justiciabilidade possível 
dos atos da administração. 
Logo após, no entanto, como registram a mesma Cristina Queiroz e outros 
estudiosos, o Estado de Direito deixa de ser um postulado do direito adminis-
trativo — ou tão-somente do direito administrativo — pata se transformar num 
princípio de direito constitucional e, assim, embeber a totalidade dos ordena-
mentos jutídicos dos chamados Estados Liberais. 
Como conseqüência dessa afortunada migração, a idéia do Estado de Di-
reito, antes restrita, como se viu, ao âmbito do diteito administtativo, como 
que se fertilizou no terreno constitucional, a ponto de se converter em sinal de 
legitimidade de todo sistema jurídico, inicialmente apenas do ponto de vista 
formal, mas, depois, ao termo do processo, também do ângulo material. Por isso, 
quando hoje em dia se fala em Estado de Diteito, o que se está a indicar, com 
essa expressão, não é qualquer Estado ou qualquer ordem jurídica, mas apenas 
aquele Estado ou aquela ordem jurídica em que se viva sob o primado do Direito, 
entendido este como um sistema de normas democtaticamente estabelecidas e 
que atendam, pelo menos, as seguintes exigências fundamentais: 
a) império da lei, lei como expressão da vontade getal; 
b) divisão de poderes: legislativo, executivo e judicial; 
c) legalidade da administração: atuação segundo a lei, com suficiente 
controle judicial; e 
d) direitos e liberdades fundamentais: garantia jurídico-formal e efetiva 
realização material. 
Trata-se, evidentemente, de um rol de exigências que, mesmo podendo 
ser apontadas como denotativas de todo autêntico Estado de Direito — assim 
as qualifica o citado Elias Diaz —, nem por isso devem ser vistas como algo que 
se obteve em bloco ou de uma vez por todas. Ao contrário, são conquistas al-
cançadas após séculos de luta e de sofrimento, na eterna contenda por novas 
liberdades contra velhos poderes, como nos ensina Norberto Bobbio 1 7 2. 
No mesmo sentido, Pablo Lucas Verdú observa que em qualquer dos seus 
tipos históricos, o Estado de Direito foi sempre uma conquista, uma vitória que 
o mestre espanhol retrata nesta síntese precisa: 
0
 Las transformaciones del Estado contemporáneo, Madrid: Alianza, 1977, p. 52. 
1
 Os actos políticos no Estado de Direito, Coimbra: Almedina, 1990, p. 197-198. 
2
 A era dos direitos, Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 5. 
65 
"O Estado de Direito, em qualquer das suas espécies: Estado libetal de Direito, Es-
tado social de Direito, Estado democrático de Direito, é uma conquista. Quero 
dizer que cada um deles se estabeleceu, ou tentou estabelecet-se, lutando contta 
estrututas de poder conttárias, a saber: Estado liberal de Direito, frente ao Antigo 
Regime; Estado social de Direito, contra o individualismo e o abstencionismo do 
Estado liberal; Estado democtático de Direito que luta com as estruturas socio-
políticas do anterior: resquícios individualistas, neocapitalismo opressor, sistema 
estabelecido privilegiado"1'3. 
Essas conquistas, como se sabe, foram ocorrendo ao longo do tempo 
e correspondem, na tipologia do Estado de Direito, ao que se convencionou 
chamar as suas etapas liberal, social e democrática, iniciadas com a Revolução 
Francesa, que marca a primeira fase, passando pelas transformações surgidas 
sobretudo após a Segunda Guerra — a sua fase social — e culminando com a 
densificação dos direitos fundamentais, antes apenas direitos civis e políticos, 
mas depois também direitos econômicos, sociais e culturais, cujo reconhecimento 
e realização constituem a razão de ser, o compromisso e a tônica do chamado 
Estado democrático de Direito. 
Esclarecendo, desde logo, que essa evolução não se verificou de forma li-
near e sincrónica — antes se realizou com avanços e retrocessos, em contextos 
variáveis ou distintos — como, de testo, sempre ocorreu no processo de desen-
volvimento das idéias e instituições, com esse esclarecimento procuraremos 
destacar, ainda que de forma resumida, os traços característicos de cada etapa 
do processo, ressaltando, ademais, a natureza dialética desse evolver histórico, 
graças ao que as fases subseqüentes devem ser vistas como absorção/transfor-
mação/superação das etapas anteriores, em movimento aberto e infinito, em 
tudo semelhante ao movimento do espírito humano. 
Para proceder a essa caracterização e discriminação entre os diversos 
modelos de Estado de Direito, vale insistir sobre o contexto em que surgiu essa 
nova espécie de Estado para bem compreendermos as causas de seu aparecimento 
e o processo evolutivo por que passou ao longo da História. 
Com esse objetivo, merece transcrição integral — para suprir outras cita-
ções sobre o tema — esta passagem de Manuel García-Pelayo: 
"Convém começat recordando que Estado de Direito é, em sua formulação ori-
ginária, um conceito polêmico orientado contta o Estado absolutista, quer dizer, 
contra
o Estado podet e, especialmente, contra o Estado polícia, que tratava de 
fomentar o desenvolvimento geral do país e fazer a felicidade dos seus súditos à 
custa de incômodas intervenções administtativas na vida ptivada e que, como 
corresponde a um Estado burocrático, não era incompatível com a sujeição dos 
funcionários e dos juízes à legalidade. O Estado de Direito, em seu primitivo sen-
tido, é um Estado cuja função capital consiste em estabelecei e manter o Direito 
e cujos limites de ação estão rigorosamente definidos por este, ficando bem 
La lucha por el Estado de Derecho, Bolonia: Real Colegio de España, 1975, p. 131-132. 
66 
que falava Montesquieu, mas para a liberdade política e a proteção do individuo 
e do atojen, contra os abusos do poder político 1 7 '. 
Era evidente que, mais cedo ou mais tarde, esse modelo, porque unilatetal, 
esgotaria as suas possibilidades, o que efetivamente ocorreu, ensejando mudanças 
profundas no chamado Estado de Direito liberal-burguês, seja de maneira mais 
ou menos pacífica, na vertente das reformas negociadas, seja de forma violenta, 
na esteira das revoluções marxistas, como as que ocorreram na Rússia (1917) 
ena China (1949). 
Resumindo as principais críticas àquele primeiro modelo, mas também os 
louvores ao que de positivo ele continha — e que por isso possibilitou o seu aper-
feiçoamento e, afinal, a sua superação no modelo subseqüente —, recolhemos, 
ainda em Elias Díaz, as observações transcritas a seguir, essencialmente coinci-
dentes, no patticular, com as de outros renomados pensadores políticos: 
"O liberalismo clássico, com o seu fundo de individualismo burguês, constitui 
insuficiente garantia pata a realização e proteção dos diteitos e liberdades de todos 
os homens (e isto foi destacado com motivações e atitudes ideológicas diferentes e, 
mesmo, contrapostas). Com efeito, na ideologia do Estado libetal e na ordem social 
burguesa, os direitos naturais ou direitos humanos identificam-se, sobretudo, com 
os direitos da burguesia, direitos que só de maneira formal e parcial se concedem 
também aos indivíduos das classes inferiores. No sistema econômico capitalista 
que serve de base a essa ordem social, protegem-se muito mais eficazmente a li-
berdade e a segurança jurídica (ambas, por outto lado, imprescindíveis) do que a 
igualdade e a propriedade: entenda-se, a propriedade de todos. 
Uma ampliação da zona de aplicabilidade desses direitos — mas sem alterar subs-
tancialmente os supostos básicos da economia — produz-se com a passagem ao 
Estado social de Direito; constituído este como intento necessátio de superação do 
individualismo, por meio do intervencionismo estatal e da atenção preferencial aos 
chamados direitos sociais, o que aquele pretende é a instauração de uma sociedade 
ou Estado do bem-estat. Mais além deste, o processo dinâmico de democratização 
material e mesmo de garantia jurídico-formal dos direitos humanos, a sua mais 
ampla realização, é o que por sua vez justifica, em minha opinião, a passagem do 
sistema neocapitalista do Estado social de Direito ao sistema, flexivelmente 
socialista, do Estado democrático de Direito. 
Em qualquer caso, o do que se trata aqui e agora é de afirmar claramente que, 
apesar de todas as suas insuficiências em telação aos direitos humanos, o libera-
lismo constitui um ponto de partida válido para esse processo de democratização, 
devendo considerar-se, em dúvida, como Estado de Direito em função também 
da luta, que sustentou contra o absolutismo, em prol dos direitos e liberdades fun-
damentais do homem e do cidadão"1 7 6. 
175
 Teoría de la Constitución, México: Ed. Nacional, 1966, p. 43 e 144. 
1 7 6
 Estado de Derecho y sociedad democrática, cit., 1983, p. 39-40. No mesmo sentido são as lições 
de Pablo Lucas Verdú, La lucha por el Estado de Derecho, cit., especialmente p. 131-134-
68 
que falava Montesquieu, mas para a liberdade política e a proteção do individuo 
e do atojen, contra os abusos do poder político 1 7 5. 
Era evidente que, mais cedo ou mais tarde, esse modelo, porque unilateral, 
esgotaria as suas possibilidades, o que efetivamente ocorreu, ensejando mudanças 
profundas no chamado Estado de Direito liberal-burguês, seja de maneira mais 
ou menos pacífica, na vertente das reformas negociadas, seja de forma violenta, 
na esteira das revoluções marxistas, como as que ocorreram na Rússia (1917) 
ena China (1949). ' 
Resumindo as principais críticas àquele primeiro modelo, mas também os 
louvores ao que de positivo ele continha — e que por isso possibilitou o seu apet-
feiçoamento e, afinal, a sua superação no modelo subseqüente —, recolhemos, 
ainda em Elias Díaz, as observações transcritas a seguir, essencialmente coinci-
dentes, no particular, com as de outros renomados pensadores políticos: 
"O liberalismo clássico, com o seu fundo de individualismo burguês, constitui 
insuficiente garantia para a realização e proteção dos direitos e liberdades de todos 
os homens (e isto foi destacado com motivações e atitudes ideológicas diferentes e, 
mesmo, conttapostas). Com efeito, na ideologia do Estado liberal e na ordem social 
burguesa, os direitos naturais ou direitos humanos identificam-se, sobretudo, com 
os direitos da butguesia, direitos que só de maneira formal e parcial se concedem 
também aos indivíduos das classes inferiores. No sistema econômico capitalista 
que serve de base a essa ordem social, protegem-se muito mais eficazmente a li-
berdade e a segurança jurídica (ambas, por outro lado, imprescindíveis) do que a 
igualdade e a propriedade: entenda-se, a propriedade de todos. 
Uma ampliação da zona de aplicabilidade desses direitos — mas sem alterar subs-
tancialmente os supostos básicos da economia — produz-se com a passagem ao 
Estado social de Direito; constituído este como intento necessário de superação do 
individualismo, por meio do intervencionismo estatal e da atenção preferencial aos 
chamados direitos sociais, o que aquele pretende é a instauração de uma sociedade 
ou Estado do bem-estar. Mais além deste, o processo dinâmico de democratização 
material e mesmo de garantia jurídico-formal dos direitos humanos, a sua mais 
ampla realização, é o que por sua vez justifica, em minha opinião, a passagem do 
sistema neocapitalista do Estado social de Diteito ao sistema, flexivelmente 
socialista, do Estado democrático de Direito. 
Em qualquer caso, o do que se trata aqui e agora é de afirmar claramente que, 
apesar de todas as suas insuficiências em relação aos direitos humanos, o libera-
lismo constitui um ponto de pattida válido pata esse processo de democratização, 
devendo considerar-se, em dúvida, como Estado de Diteito em função também 
da luta, que sustentou contra o absolutismo, em prol dos direitos e liberdades fun-
damentais do homem e do cidadão"1 7 6. 
175
 Teoría de la Constitución, México: Ed. Nacional, 1966, p. 43 e 144. 
1 7 6
 Estado de Derecho y sociedad democrática, cit., 1983, p. 39-40. No mesmo sentido são as lições 
de Pablo Lucas Verdú, La lucha por el Estado de Derecho, cit., especialmente p. 131-134. 
68 
Assentadas, assim, as bases do chamado Estado Social de Direito — no qual 
a expressão social sinaliza para o propósito de corrigir/superar o individualismo 
clássico de caráter liberal pela afirmação dos direitos sociais, com a conseqüente 
realização da justiça social —, verifiquemos, agora, ainda em linhas gerais, quais 
as insuficiências que esse novo modelo não conseguiu superar, do que resultou, 
para seus críticos, a necessidade da formulação de outro modelo de Estado de 
Direito, em cujo âmbito fossem dialeticamente incorporadas/superadas {aufgehoben) 
as conquistas da chamada democracia social 1 7 7. 
Fazendo uso, para tal efeito, da communis opinio, diremos, em resumo, que, 
para seus opositores, a insuficiência maior do Estado Social de Direito residiria
em não ter conseguido realizar a desejada e sempre prometida democratização 
econômica e social, a economia do gênero humano proclamada pelos entusiastas 
do neocapitalismo. 
Por isso, ao ver crítico de Elias Diaz, urge superar esse modelo, rumo ao 
chamado Estado Democrático de Direito, em cujo seio se realizaria a integra-
ção conciliadora dos valores da liberdade e da igualdade, da democracia e do 
socialismo1 7 8. 
Para descrever essa generosa utopia, valemo-nos, ainda uma vez, dos 
preciosos ensinamentos do mesmo Elias Diaz, seguramente um dos maiores 
pensadores políticos do nosso tempo. São desse mestre espanhol as palavras 
transcritas a seguir sobre o Estado Democrático de Direito, em cujo âmbito 
seriam atendidas todas as exigências econômicas, políticas e sociais do homem 
concreto, uma dívida que, embora reconhecida por todos, não foi quitada sequer 
pelos extintos Estados socialistas, que tão enfaticamente se diziam dispostos 
a resgatá-la: 
"O Estado democrático de Direito aparece, nessa perspectiva, como superação 
real do Estado social de Direito. Isso não quer dizer, no entanto, que este conduza 
naturalmente àquele; ao contrário, geralmente apatece muito mais como obstáculo 
para essa superação. Do neocapitalismo não se passa naturalmente ao socialismo; 
do Estado social de Direito não se passa naturalmente ao Estado democrático de 
Diteito. A superficial e aparente socialização que ptoduz o neocapitalismo não 
coincide com o socialismo, assim como tampouco é democracia, sem mais, a 
democratização que a técnica produz por si mesma; de um nível a outro (é impor-
tante insistir-se nisso) há um salto qualitativo e real de primeira ordem. E, como 
dissemos, forças importantes desse primeiro nível (neocapitalismo) constituem-se 
certamente como foiças interessadas em frear ou impedir a evolução até o segundo 
nível (socialismo) em que se produz o Estado democrático de Direito. 
1 7 7
 Sobre esse modelo de Estado de Direito, ver El Estado social, de Wolfgang Abendroth; 
Ernst Forsthoff e Karl Doehring, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1986. 
178
 Estado de Derecho y sociedad democrática, cit., p. 127 e s. 
69 
Junto a essa possível via evolutiva ocidental, assinala-se que também se pode 
chegar ao Estado democrático de Direito pot caminhos que não sejam o do 
Estado social de Direito: assim, por exemplo, a partir dos sistemas chamados de 
democracia popular ou democracia socialista. Com efeito — apesat de indubitáveis 
freios e retrocessos — a evolução que pode chegar a impor-se nesses sistemas 
conduziria, superados monolitismos e dogmatismos que ainda subsistem, a posi-
ções que confitmatiam — desde esse ponto de vista — a compatibilidade entre 
socialismo e Estado de Direito. 
Dessa forma, e sem querer chegar com isso apressadamente à grande síntese final 
ou a qualquer outta forma de culminação da História (isto deve ficar bem claro) 
cabe dizer que o Estado democtático de Direito aparece como a fórmula institu-
cional em que atualmente, e sobretudo para um futuro próximo, pode chegar a 
se concretizar o processo de convergência em que talvez possam encontrar-se as 
concepções atuais da democracia e do socialismo. A passagem do neocapitalis-
mo ao socialismo nos países de democracia liberal e, paralelamente, o crescente 
processo de despersonalização e institucionalização jurídica do poder nos países 
de democracia popular, constituem em síntese a dupla ação para esse processo de 
convergência em que apareceria o Estado democtático de Direito" 1 7 9. 
"Capitalismo e Estado libetal de Direito eram compatíveis, assim como o são 
neocapitalismo e Estado social de Direito; mas o eram com uma só condição: a 
de não tornar nem poder tornar efetivas para todos os homens, nem sequer (e 
isto me parece muito importante) para uma considerável maioria, as referidas 
exigências — lei como expressão da vontade popular, direitos humanos, quer 
dizer, direitos próprios de todos os homens, etc. — que se aduziam como critérios 
legitimadores de tal Estado de Direito. Contudo, a pouca liberdade que existe no 
mundo conquistou-se preferentemente, não nos esqueçamos, no marco contra-
ditório de tais Estados. 
O objetivo do Estado democrático de Direito é justamente o de tornar realidade 
aquelas exigências não cumpridas: para isso, o que se propõe como base é a liqui-
dação do sistema neocapitalista e a passagem progressiva a um modo de produção 
socialista (que hoje deve saber harmonizar planificação e autogestão para alcançar 
um verdadeiro controle coletivo da economia)" 1 8 0 . 
3.6. Os grandes desafios: a "terceira via" e o Estado de Direito do 
gênero humano 
Confrontados esses três modelos de Estado de Direito — que não se con-
trapõem, antes se integram e se completam historicamente —, feita essa compa-
ração, parece que o nosso grande desafio será a construção de um novo Estado 
de Direito, ou a celebração de um novo contrato social, sob cuja égide, sem aban-
Estado de Derecho y sociedad democrática, cit., p. 131-133. 
Estado de Derecho y sociedad democrática, cit., p. 131-133. 
70 
dono das cláusulas anteriores, possamos especificar181 novos direitos humanos e 
atualizar as velhas Declarações de Direitos"182. 
Por outras palavras, o que preconizam os arautos desse almejado socialis-
mo democrático é a abettuta de uma terceira via, que nos permita conciliar os 
valores da liberdade e da igualdade, da democracia e do socialismo, valores 
que a História, infelizmente, parece tet condenado a conflitos insuperáveis e 
contradições radicais. 
Sabedor das dificuldades que a própria expressão socialismo democrático 
já sugere — as de ordem prática e operacional nem se fala —, Roberto Lyra Fi-
lho chegou a qualificá-la como ambígua, para logo em seguida acrescentar esta 
observação: "nós não a empregamos senão com a advertência de que, nela, se 
procura designar uma superação, evitando quer os desvios aburguesados, quer os 
congelamentos ditatoriais; desta maneira é que ela se revigorou, no panorama 
atual, com a rejeição do socialismo bem comportado e confiável (que a burgue-
sia absorve) e também dos socialismos burocráticos-repressivos de cúpula (que 
prevalecem nas repúblicas onde o ttabalho não tenha, efetivamente, canais 
de participação no governo e defesa eficaz contra os burocratas). O socialismo 
democrático, portanto — concluía aquele jurista crítico —, vai, hoje, ganhan-
do sentido da procura duma alternativa perante o capitalismo espoliativo e o 
socialismo gorado"183. 
Então, o socialismo democrático seria a terceira via, que muitos pensadores 
políticos ainda buscam, mas que outros nem sequer procuram, porque se dizem 
convencidos de que não na podem encontrar. 
Entre estes últimos, pela sua importância no cenário político e filosófico 
do nosso tempo, merece destaque a figura de Norberto Bobbio, a quem se devem 
as mais expressivas reflexões sobre a terceira via, idéias que estão expostas, entre 
outras obras, no famoso ensaio Qual socialismo?, para cuja edição brasileira ele 
escreveu instigante prefácio, do qual se transcreve a seguinte passagem: 
"Nas eleições de junho de 1975 o Partido Comunista, provavelmente em con-
seqüência desta nova estratégia, deu um grande salto à frente, a ponto de quase 
igualat os votos da Democracia Cristã que, nesse meio tempo, tinha sofrido a 
maior queda da sua história. A situação chegou a ponto de se temet ou esperar, 
segundo o ponto de vista, que fosse ultrapassada nas eleições políticas seguintes, 
1 8 1
 Segundo Bobbio, os novos direitos humanos — e. g., os direitos da mulher, da criança, do 
idoso, dos deficientes etc. — a rigor não são direitos novos, nascidos ex nihilo, mas apenas 
especificações de um núcleo essencial, que dialeticamente vai se adensando e se expandindo 
em sempre renovadas concretizações históricas (Norberto Bobbio, A era dos direitos, cit.,
p. 62-63 e 127-128). 
1 8 2
 Jacques Maritain, Los derechos dei hombre, México: FCE, 1949, p. 70; O homem e o Estado, 
Rio de Janeiro: Agir, 1966, p. 106. 
1 8 3
 O que é direito, 2. ed., São Paulo: Brasiliense, 1982, p. 98. 
71 
o que na realidade não aconteceu: o PCI deu, sim, um pequeno passo à frente, 
mas a DC teconquistou o terreno perdido, tirando votos, sobretudo, dos dois 
partidos socialistas. 
Ftente a um partido de esquerda que não havia nunca repudiado, talvez pata se 
distinguir de outros partidos socialistas, o matxismo-leninismo, era natural no 
momento em que este partido se aptesentava como candidato a partido de governo 
e quando parecia existirem as condições para que seu desejo se realizasse, que se 
perguntasse quais fossem suas credenciais para participat, com plenos direitos, 
da direção de um país apoiado em uma democracia representativa, uma forma 
de governo que os clássicos do marxismo tinham sempre olhado com suspeita e 
da qual não tinham nunca querido aceitar a legitimidade, a não ser como meio 
favorável à ascensão do movimento opetátio. 
Foi assim que o velho debate sobre a relação entre a democracia e socialismo 
reacendeu-se repentinamente e ardeu por cerca de um ano, em contato com 
a matéria inflamável da polêmica política. Mas, mesmo ocasional, a discussão 
serviu para estabelecer alguns pontos definitivos sobre o significado e valor da 
democracia, para fixar os limites insuperáveis entre o acotdo e o desacordo, para 
dissipar falsas certezas, para diminuir persistentes névoas ideológicas — que se 
tornaram mais densas depois da orgia de projetos irrealizáveis produzidos pelos 
novos movimentos sociais surgidos da onda de contestação global de 68 — em 
torno dos problemas cuja solução é indispensável ao pacífico desenvolvimento 
da convivência democrática, e sobre os quais é mais fácil embrulhar palavras 
confusas do que ter idéias claras" 1 8 4. 
Nessa obra, assim como noutras em que abordou o tema, o grande cientista 
político, do alto da insuspeita posição de senador socialista na República da 
Itália, afirmou, peremptoriamente, que a terceira via não existe e que o socialismo 
democrático, por enquanto, é apenas um desafio, porque, até hoje, a história 
não confirmou nem permitiu que se tomasse realidade qualquer síntese prática 
de democracia e socialismo1 8 5. 
Ao contrário — prossegue em sua crítica refinada o mestre de Turim —, o 
que se constata, realisticamente, é que não existe democracia onde o socialismo 
foi realizado, assim como, onde foram observadas as regras do jogo democráti-
co, o socialismo até agora não chegou, nem mesmo se mostra iminente, como 
parecem atestar a recente experiência com o desmoronamento da antiga União 
Soviética e a redemocratização dos países do leste europeu. 
Por isso, arremata o saudoso pensador, o verdadeiro problema, que é indicar 
a estrada a percorrer, para se chegar ao socialismo através da democracia, está 
apenas começando 1 8 6. 
184
 Qual socialismo? 2. ed., Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983, p. 8. 
1 8 5
 As ideologias e o poder em crise, Brasília: Ed. da UnB, 1988, p. 147; Qual socialismo?, cit., 
p. 77. 
1 8 6
 Qual socialismo?, cit., p. 64 e 106. 
72 
Se o trabalho nessa direção está começando — embora apenas começan-
do —, sem trocadilho podemos dizer que isso já é um bom começo, pelo 
menos para aqueles que acreditam ser possível construir um novo Estado de 
Direito, verdadeiramente democrático, uma ordem jurídico-política que a par 
de reconhecer ou proclamar a existência de certos direitos da pessoa humana, 
lhe assegure a satisfação desses direitos e de quantos mais se forem revelando 
inerentes à sua plena dignidade. 
Essa era a crença, entre outros, de Gomes Canotilho e Vital Moreira, como 
atestam os seus comentários à redação original do art. 22 da Constituição de 
Portugal de 1976, do seguinte teor: 
"Art. 2 2 A República Portuguesa é um Estado democrático, baseado na soberania 
popular, no respeito e na gatantia dos direitos e liberdades fundamentais e no plu-
ralismo de expressão e organização política democtáticas, que tem por objectivo 
assegurar a transição para o socialismo mediante a criação de condições para o 
exercício democrático do poder pelas classes trabalhadoras." 
Daqueles estudos de circunstância — que foram revistos, até certo ponto, 
em razão das alterações constitucionais que sepultaram os ideais socialistas da 
Revolução dos Cravos para viabilizar o ingresso de Portugal na União Européia187 
— transcrevemos as palavras a seguir, que mesmo renegadas pelos seus autores, 
nem por isso deixam de refletir o pensamento de quantos alimentaram a crença 
na viabilidade histórica de um socialismo democrático: 
"O Estado é um Estado de direito democrático. Este conceito — que é seguramente 
um dos conceitos-chave da CRP — é bastante complexo, e as suas duas compo-
nentes — ou seja, a componente do Estado de direito e a componente do Estado 
democrático — não podem ser separadas uma da outra. O Estado de direito é demo-
crático e só sendo-o é que é Estado de direito; o Estado democrático é Estado de 
direito e só sendo-o é que é democrático. Há uma democracia de Estado-de-direito; 
há um Estado-de-direito de democracia. 
Esta preocupação de qualificar o conceito de Estado de direito decorre seguramente 
do propósito de não deixar que o conceito, isoladamente considerado, pudesse ser 
adaptado com um sentido puramente formal, numa perspectiva a-democrática, 
se não mesmo adversa à democracia... 
A qualificação democrática do Estado de direito não significa que as características 
tradicionalmente associadas a este conceito desapareçam; significa porém que 
elas têm de ser lidas a uma luz específica e têm de ser unificadas por esse critério. 
Sobretudo, ela obriga a ler o Estado de direito no quadro do princípio democrá-
1 8 7
 Em conferência com o título "Rever a ou romper com a Constituição Dirigente?", que 
proferiu no Instituto Pimenta Bueno-SP, em 22-9-1994, Gomes Canotilho disse que, a seu 
ver, andou bem o "legislador de revisão" português quando eliminou da Constituição de 1976 
fórmulas pretensamente emancipatórias, do tipo "transição para o socialismo", "exercício 
democrático do poder pelas classes trabalhadoras", "garantia do processo revolucionário" e 
"desenvolvimento pacífico do processo revolucionário", entre outras. 
73 
tico concretamente configurado na CRP, apontado como está a um hotizonte 
de democracia material, consubstanciada na tealização da democracia econômica, 
social e cultural (art. 2°, infine), na efectivação dos direitos econômicos, sociais 
e cultutais, mediante, entre outras coisas, a socialização dos principais meios de 
produção. 
Ao Estado incumbe, não apenas respeitar os direitos e liberdades fundamentais, mas 
também garanti-los. Daqui resulta o afastamento de uma concepção puramente 
formal, ou liberal, dos direitos fundamentais, que os restringisse às liberdades pes-
soais, civis e políticas, e que reduzisse estas a meros direitos a simples abstenções 
do Estado...; por outro lado, direitos fundamentais são também os direitos positivos, 
de carácter económico, social e cultural, sendo que em relação a muitos deles é 
sobte o Estado que impende o encargo da sua satisfação. 
O Estado de diteito democrático tem por objectivo a transição para o socialismo... A 
transição para o socialismo opera-se pela realização da democracia económica, social 
e cultural e pelo aprofundamento da democracia participativa. Poder-se-á, pois, dizer 
que na concepção constitucional existe uma relação necessária entre democracia e 
socialismo, de tal modo que o socialismo não é mais do que (nem pode ser coisa 
diferente de) a realização plena da democracia em todos os campos, o estágio 
consumado da democracia, e que a democracia só atinge a sua completude no 
(e através do) socialismo. Em certo
sentido, aliás, socialismo constitucional é a 
democracia socializada, e a democracia constitucional é a sociedade democratizada 
(em todos os seus aspectos). 
Sendo a transição para o socialismo um processo, um caminhar no sentido de uma 
meta, e constituindo cada avanço no sentido dessa meta um aperfeiçoamento do 
Estado de direito democrático, então cada progresso no sentido do socialismo 
transforma-se em elemento adquirido do Estado de diteito democtático" 1 8 8. 
Publicados, inicialmente, em 1978 e, depois, em 1984, esses comentários, 
é claro, foram escritos antes da queda do Muro de Berlim e da desagregação da 
União Soviética, fatos que parecem ter remetido para o museu da História a 
experiência do socialismo real ou o socialismo real como experiência. 
Se, no futuro — o que não nos parece provável —, renascer a idéia ambi-
ciosa de se fundirem democracia e socialismo, rumo à chamada terceira via, um 
cometimento que tantos consideram impossível, se isso vier a acontecer, todos 
nós, e não apenas os adeptos desse Estado Democrático de Direito, deveremos 
reler essas páginas de Gomes Canotilho e Vital Moreira, quando mais não seja 
porque estão cheias de generosidade e utopia, uma e outra indispensáveis ao 
progresso da "cidade dos homens". 
Enquanto isso não oconer — porque rejeitados, historicamente, tanto o 
socialismo real quanto a "terceira via", esta pela insuperável conttadição entre 
democracia e socialismo — impõe-se-nos a tarefa de aperfeiçoar a opção de-
1 8 8
 Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, Coimbra: 
Coimbra Ed., 1984, v. 1, p. 73-78. 
74 
No mundo ético, diversamente, o descumprimento das normas não cons-
tituirá "disposição em contrário", pois enquanto as leis físicas, como sínteses de 
uma dada experiência, exprimem só o cjue é, aquilo que efetivamente acontece, 
as leis morais não recebem as suas verdades das condutas que intentam regular, 
porque não expressam o que é, mas apenas o que deve ser. Nos domínios da 
ética, em geral, e do direito, em particular, pelo menos em linha de princípio, 
a eficácia não é condição de validade190. 
Já os objetos culturais, porque são ontologicamente valiosos191, exigem para 
o seu conhecimento um método específico e adequado, empírico-dialético, que 
se constitui pelo ato gnosiológico da compreensão, através do qual, no ir e vir 
ininterrupto da materialidade do substrato à vivência do seu sentido espiritual, 
procuramos descobrir o significado das ações ou das criações humanas1 9 2. 
Nesse âmbito da realidade, precisamente em razão da singularidade dos 
seus objetos, a busca de explicações seria tão absurda quanto a idéia de se julgar 
a natureza. 
Sobre o método da compreensão como o ato gnosiológico próprio das 
ciências do espírito, merece leitura esta passagem de Carlos Cossio: 
"...enquanto a explicação prossegue, sem cessar, na mesma direção assinalada pe-
lo seu momento de partida (por exemplo: dos efeitos às suas causas e destas às 
respectivas causas, e assim cada vez mais longe; ou do todo às suas partes e assim 
cada vez a algo mais simples), a compreensão, ao conttário, ao avançar depois 
da primeira referência, retorna ao ponto de partida e daqui, outra vez, ao antes 
referido, num círculo infinito que vai do substrato ao seu sentido e vice-versa. 
No conhecimento por explicação, qualquer retrocesso na direção seguida pelo 
espírito cognoscente é um recomeço e não aumenta o conhecimento, pois o que já 
foi explicado ficou totalmente conhecido. Diversamente, tal como ao se avançar 
numa circunferência volta-se, sem parar, de uma antípoda à outta — verificamos 
que todo retomo em direção à etapa precedente aumenta o conhecimento por com-
preensão, levando-o mais adiante"193. 
Diante das obras de arte — do Quijote de Cetvantes ou da Pietà de Miguel 
Angelo, das Meninas de Velazquez ou da Nona Sinfonia de Beethoven —, esse 
1 9 0
 Giorgio del Vecchio, Lições de filosofia do direito, Coimbra: Arménio Amado Ed., 1959, 
v. 2, p. 72. 
Em sentido contrário, i. e., reconhecendo que a validade das normas jurídicas depende da sua 
eficácia, merece registro esta passagem de Kelsen, apesar ou por causa das críticas antipo-
sitivistas de todos os seus adversários: "... não pode negar-se que uma ordem jurídica como 
um todo, tal como uma norma jurídica singular, perde a sua validade quando deixa de ser 
eficaz" (Teoria pura do direito, cit., v. 2, p. 40-42). 
1 9 1
 Miguel Reale, Pluralismo e liberdade, cit., p. 72. 
1 9 2
 Sobre a compreensão como método próprio das ciências humanas, ver, por todos, Wilhelm 
Dilthey, Introducción a las ciencias del espíritu, Madrid: Revista de Occidente, 1956. 
1 9 3
 La teoría egológica del derecho y el concepto jurídico de libertad, Buenos Aires: Abeledo-
Perrot, 1964, p. 78-79. 
7fi 
ir e vir compreensivo, que atravessa séculos e gerações, vai progressivamente 
enriquecendo e ampliando os objetos com novas interpretações, abordagens 
que nem pelo fato de serem diferentes invalidam as interpretações anteriores, 
num processo de superação e, ao mesmo tempo, de conservação e de absorção 
de significados (Aufgehoben). 
No campo do direito, onde também encontramos obras de arte, representa-
das, entre outras, pelos chamados monumentos legislativos — a Lei das XII Tábuas; 
o Corpus Júris Civilis; a Magna Charta; a Constituição dos Estados Unidos ou o 
Código Napoleão, por exemplo —, gerações e gerações de juristas e de filósofos 
do direito, ao longo dos séculos, vêm se debruçando e produzindo interpretações 
sempre renovadas, mas tão impregnadas nas anteriores que muitos as consideram 
elementos originariamente integrantes da normatividade daqueles textos. 
Por isso é que juristas do porte de Radbruch — nisso distinguindo-a da 
interpretação filológica —, afirmam que "a interpretação jurídica não é pura e 
simplesmente um pensar de novo aquilo que já foi pensado, mas, pelo contrário, 
um saber pensar até ao fim aquilo que já começou a ser pensado por um outro"1 9 4. 
Noutros termos, não uma estéril e circular repetição do que já foi dito, mas 
um dialético levar adiante — preservado, transformado e, por essa forma, enri-
quecido —, um pensamento que apenas se iniciou e que, por sua natureza, não 
impõe limites para novas leituras, como é próprio das coisas do espírito1 9 5. 
4.2. A dialética da aplicação do Direito e o caráter exemplar da her-
menêutica jurídica para as ciências do espírito 
Inicialmente, sem necessidade de enfrentar as tormentosas discussões que 
se travam no terreno da lingüística, diremos, com a generalidade dos autores, 
que a interpretação de qualquer norma jurídica é uma atividade intelectual que 
tem por finalidade precípua — estabelecendo o seu sentido —, tornar possível 
a aplicação de enunciados normativos, necessariamente abstratos e gerais, a si-
tuações da vida, naturalmente particulares e concretas. 
Se é verdade que o problema fundamental pata o operador do direito não 
é a distância cronológica entre o momento da elaboração da norma e o da sua 
aplicação, mas a distância material entre a generalidade do seu enunciado e 
a singularidade dos casos a decidir, então o trabalho do intérprete-aplicador 
194
 Filosofia do direito, Coimbra: Arménio Amado Ed., 1961, v. 1, p. 274. Cf., do mesmo 
Radbruch, estas passagens, relembradas por Josef Esser: "O sentido supra-histórico de uma 
obra do espírito é recriado a cada geração"; "A história de uma idéia jurídica não chega ao 
seu fim... pelo fato de ter sido concretizada em uma lei, a história ulterior de suas diversas 
interpretações... não é somente a história das errôneas maneiras de entendê-la" (Principio y 
norma, cit., p. 329, nota 96). 
1 9 5
 Para uma visão crítica do que considera equívocos e exageros das explicações dialéticas 
do desenvolvimento da razão, cf. Karl Popper, Que é a dialética, in Conjecturas
e refutações, 
Brasília: Ed. UnB, 1972, p. 342-365. 
77 
apresenta-se não apenas como uma tarefa de desocultamento ou de fixação de 
significados que, até certo ponto, permanecem escondidos, mas também como 
um esforço de mediação/superação desse abismo entre a generalidade da lei e 
a situação jurídica emergente dos casos particulares, uma distância que Hans-
Georg Gadamer considera essencialmente insuperável e mesmo independente de 
eventual mudança nas relações sociais ou de qualquer alteração histórica da 
realidade, que faça parecer antiquado ou inadequado o direito vigente 1 9 6. 
Nesse sentido, observa Antonio Osuna Fernández-Largo que o nó górdio 
da compreensão normativa reside nessa antinomia entre o abstrato e o concreto 
e que, por isso mesmo, o maior problema para o aplicador do direito consiste, 
precisamente, em trazer para a sua situação histórica e para a sua condição de 
sujeito por ela afetado uma norma que é enunciada sempre em termos genéricos 
e a partir de supostos típicos 1 9 7. 
Ao fim e ao cabo, o de que se trata, diz Francisco Lopez Ruiz, é da trans-
formação de disposições legais em direito interptetado, como decorrência da 
assumida descontinuidade entre a expressão lingüística da disposição e sua 
compreensão/interpretação para fins de aplicação, uma transmutação que se 
opera no e pelo raciocínio dos operadores do direito, indivíduos situados e datados, 
historicamente condicionados, portanto, cujas idéias e valores, para não dizer 
preconceitos e ideologia, se não determinam, pelo menos condicionam, em larga 
medida, a sua visão do que é correto ou justo 1 9 8. 
Por tudo isso, assiste razão a Martin Kriele quando afirma que não se pode 
interpretar nenhum texto jurídico a não ser colocando-o em relação com pro-
blemas jurídicos concretos (reais ou imaginários), com soluções que se procuram 
para os casos ocorrentes, porque é somente na sua aplicação aos fatos da vida 
e na concretização, que assim necessariamente se processa, que se revela com-
pletamente o conteúdo significativo de uma norma e ela cumpre a sua função 
de regular situações concretas 1 9 9. 
Em síntese, sem que se opere a transformação do abstrato em concreto e 
do geral em particular — porque essa é a forma de interrogá-lo corretamente —, 
o texto nada dirá àquele que pretenda compreendê-lo. 
Por outro lado, é de registrar, igualmente, que a cada concretização os modelos 
normativos se ampliam e se enriquecem, adquirindo sempre novas possibilidades 
de utilização, que não poderiam ter sido imaginadas nem pelo mais profético dos 
legisladores históricos. Mais ainda, os casos assim decididos passam a valer como 
196
 Verdad y método, Salamanca: Sigúeme, 1993, v. 1, p. 613. 
197
 El debate filosófico sobre hermenéutica jurídica, Valladolid: Universidad de Valladolid, 
Secretariado de Publicaciones, 1995, p. 96 e 115. 
198
 Fuentes del derecho y ordenamientos jurídicos, Valencia: Tirant lo Blanch, 1997, p. 38. 
1 9 9
 Apud Karl Larenz, Metodología da ciencia do direito, cit., ed. de 1978, p. 396. 
78 
precedentes e ponto de partida para fututas aplicações, sem que esse movimento 
jamais se interrompa200. 
Nisso consiste, entre as ciências do espírito, em geral, assim como na expe-
riência jurídica, em particular, o processo dialético da compreensão como ati-
vidade infinita, seja porque uma interpretação, que até então parecia adequada, 
mais adiante pode vir a mostrar-se incorreta, seja porque de acordo com a época 
em que vive o intérprete e com base no que então ele sabe, não se excluem 
outras interpretações que, precisamente para aquela época e para o que nela se 
sabe, serão melhores ou mais adequadas, sem que essas novas formas de com-
preensão signifiquem a condenação, como erradas, de quantas se produziram 
anteriormente2 0 1. 
Corroborando esse entendimento, Carlos Cossio afirma que, nessas situ-
ações, seria inadequado falarmos em erro teórico, pois as viragens de jurispru-
dência não são correções de equívocos, mas simples mudanças de valoração na 
consciência jurídica, de resto absolutamente normais, porque toda experiência 
jurídica é de natureza estimativa e essas oscilações axiológicas ocorrem no âmbito 
mais getal de valoração de uma mesma lei. 
No fundo, arremata o mestre argentino, o de que se trata é de algo seme-
lhante à substituição de leis, hipótese em que, igualmente, não se poderia dizer 
que as normas posteriores são editadas para corrigir erros teóricos até então 
desapercebidos na legislação em vigor, porque em verdade são epifenómenos 
de subjacentes transformações fático-axiológicas das quais decorrem sempre 
renovadas adaptações normativas2 0 2. 
Sob essa perspectiva, torna-se manifesto o caráter nomogenético dos fatos 
sociais, enquanto fatores determinantes da criação e constante regeneração dos 
modelos jurídicos, um ttabalho de ajustamento e atualização que é levado a 
cabo pelos operadores do direito precisamente para revalidar esses modelos e, 
por essa forma, preservar a sua força normativa. 
No campo da experiência judicial — em que a criatividade do intérprete 
encontra soluções mais rápidas para os conflitos de interesses do que as sempre 
demoradas respostas do legislador—, nesse terreno as exigências sociais são ime-
diatamente absorvidas e racionalizadas pelo aplicador do direito, sob a forma de 
mutações normativas ou novas leituras dos mesmos enunciados normativos, leituras 
tão inovadoras que chegam a criar modelos jurídicos inteiramente novos, o que, 
tudo somado, só faz confirmar a encarecida distinção entre texto e norma, assim 
como o clássico ensinamento de Kelsen, a nos dizer que a norma não é um evento 
sensorialmente perceptível — os votos pela aprovação ou rejeição de um projeto 
2 0 0
 Metodologia da ciência do direito, cit., ed. de 1989, p. 251, 264-265 e 352. 
2 0 1
 Giovanni Reale e Dario Antiseri, Hans-Georg Gadamer e a teoria da hermenêutica, in 
História da filosofia, São Paulo: Edições Paulinas, 1991, v. 3, p. 630. 
2 0 2
 El substrato filosófico de los métodos interpretativos, Revista Universidad, Santa Fé, 
Argentina: Universidad Nacional dei Litoral, n. 6, p. 77-78, 1940. 
79 
de lei, exteriorizados no parlamento, por exemplo —, mas o sentido jurídico es-
pecífico que, objetivamente, o diteito atribui a esse evento, em relação ao qual, 
por isso mesmo, as normas funcionam como "esquemas de interpretação"203. 
Essas novas leituras constituem os modelos jurisdicionais ou modelos autô-
nomos — como os denomina Miguel Reale —, porque o aplicador do direito 
tem competência para criá-los correlacionando dois princípios jurídicos fun-
damentais: o de que o juiz não pode eximir-se de julgar a pretexto de haver 
lacuna ou obscuridade da lei; e o de que, na omissão da lei, ele deve proceder 
como se fora legislador204. 
No âmbito da jurisdição constitucional, por exemplo, o exercício dessa 
criatividade, em rigor, não conhece limites, não só porque as cortes constitucio-
nais estão situadas fora e acima da tradicional tripartição dos poderes estatais205, 
mas também porque a sua atividade interpretativa se desenvolve, essencialmen-
te, em torno de enunciados abertos, indeterminados e plurissignificativos — as 
fórmulas lapidares que integtam a parte dogmática das constituições. 
Nesse contexto de ativismo judicial, alguns juristas mais enfáticos chegam 
a anunciar, entre nós, um sensível deslocamento do centro das decisões politica-
mente relevantes do Legislativo e do Executivo — por eles reputados inertes —, 
em direção ao Poder Judiciário, porque acreditam que a nova magistratura estaria 
disposta a resgatar as promessas de emancipação social inseridas na Constituição 
de 1988 2 0 6 . No plano externo, por força da normatividade da Constituição e da 
sua presença em todo tipo de conflito, e não apenas nos de natureza política, 
que se travam entre os órgãos supremos
do Estado, Prieto Sanchís afirma que o 
novo constitucionalismo desemboca na onipotência judicial, juízo do qual participa 
Andrés Ibáñez, ao dizer que já ocorreu, e continua a ocorrer, uma transferência 
do poder político do legislador para o juiz101-
2 0 3
 Francisco Fernandez Segado, La obsolescência de la bipolaridad tradicional (modelo ame-
ricano — modelo europeo-kelseniano) de los sistemas de justicia constitucional, voDireito 
público, Brasília-Porto Alegre: Instituto Brasiliense de Direito Público/Ed. Síntese, v. 2, p. 77, 
out./nov./dez. 2003. Hans Kelsen, Teoria pura do direito, cit., v. 1, p. 2-7. 
2 0 4
 Miguel Reale, Fontes e modelos do direito, cit., p. 70. 
2 0 5
 Mauro Cappelletti, O controle de constitucionalidade das leis no sistema das funções 
estatais, Revista de Direito Processual Civil, São Paulo: Saraiva, 1961, v. 3, p. 38. Embora 
desprovidos de mandato político para o desempenho dessas novas funções, os tribunais cons-
titucionais lograram compensar a congênita falta de legitimidade do seu ativismo judicial 
com uma espécie de legitimação pelo procedimento, comprovando a tese de Lúcio Bittencourt 
de que "a interpretação é parte integrante do processo legislativo" (Revista do Serviço Público, 
ano V, v. IV, n. 3, p. 121-127, dez. 1942). 
2 0 6
 Lenio Luiz Streck, Hermenêutica jurídica e(m) crise, Porto Alegre: Livr. do Advogado Ed., 
2000, p. 44-45, 216, 233 e 236. 
2 0 7
 Luis Prieto Sanchís, justicia constitucional y derechos fundamentales, Madrid: Trotta, 2003, 
p. 120; P. Andrés Ibánez, La justicia en el Estado de derecho y la crisis dei Estado social, in 
Justicia/Conflicto, Madrid: Tecnos, 1988, p. 120. 
80 
de lei, exteriorizados no parlamento, por exemplo —, mas o sentido jurídico es-
pecífico que, objetivamente, o direito atribui a esse evento, em relação ao qual, 
por isso mesmo, as normas funcionam como "esquemas de interpretação"203. 
Essas novas leituras constituem os modelos jurisdicionais ou modelos autô-
nomos — como os denomina Miguel Reale —, porque o aplicador do direito 
tem competência pata criá-los correlacionando dois princípios jurídicos fun-
damentais: o de que o juiz não pode eximir-se de julgar a pretexto de haver 
lacuna ou obscuridade da lei; e o de que, na omissão da lei, ele deve proceder 
como se fora legislador204. 
No âmbito da jurisdição constitucional, por exemplo, o exercício dessa 
criatividade, em rigor, não conhece limites, não só porque as cortes constitucio-
nais estão situadas fora e acima da tradicional tripartição dos poderes estatais205, 
mas também porque a sua atividade interpretativa se desenvolve, essencialmen-
te, em torno de enunciados abertos, indetetminados e plurissignificativos — as 
fórmulas lapidares que integram a parte dogmática das constituições. 
Nesse contexto de ativismo judicial, alguns juristas mais enfáticos chegam 
a anunciar, entre nós, um sensível deslocamento do centro das decisões politica-
mente relevantes do Legislativo e do Executivo — por eles reputados inertes —, 
em direção ao Poder Judiciário, porque acreditam que a nova magistratura estaria 
disposta a resgatar as promessas de emancipação social inseridas na Constituição 
de 1988 2 0 6 . No plano externo, por força da normatividade da Constituição e da 
sua presença em todo tipo de conflito, e não apenas nos de natureza política, 
que se travam entre os órgãos supremos do Estado, Prieto Sanchís afirma que o 
novo constitucionalismo desemboca na onipotência judicial, juízo do qual participa 
Andrés Ibáñez, ao dizer que já ocorreu, e continua a ocorrer, uma transferência 
do poder político do legislador para o juiz20' • 
2 0 3
 Francisco Fernandez Segado, La obsolescência de la bipolaridad tradicional (modelo ame-
ricano — modelo europeo-kelseniano) de los sistemas de justicia constitucional, in_Direito 
público, Brasília-Porto Alegre: Instituto Brasiliense de Direito Público/Ed. Síntese, v. 2, p. 77, 
out./nov./dez. 2003. Hans Kelsen, Teoria pura do direito, cit., v. 1, p. 2-7. 
2 0 4
 Miguel Reale, Fontes e modelos do direito, cit., p. 70. 
2 0 5
 Mauro Cappelletti, O controle de constitucionalidade das leis no sistema das funções 
estatais, Revista de Direito Processual Civil, São Paulo: Saraiva, 1961, v. 3, p. 38. Embora 
desprovidos de mandato político para o desempenho dessas novas funções, os tribunais cons-
titucionais lograram compensar a congênita falta de legitimidade do seu ativismo judicial 
com uma espécie de legitimação pelo procedimento, comprovando a tese de Lúcio Bittencourt 
de que "a interpretação é parte integrante do processo legislativo" (Revista do Serviço Público, 
ano V, v. IV, n. 3, p. 121-127, dez. 1942). 
1 0 6
 Lenio Luiz Streck, Hermenêutica jurídica e(m) crise, Porto Alegre: Livr. do Advogado Ed., 
2000, p. 44-45, 216, 233 e 236. 
2 0 7
 Luis Prieto Sanchís, Justicia constitucional y derechos fundamentales, Madrid: Trotta, 2003, 
p. 120; P. Andrés Ibánez, La justicia en el Estado de derecho y la crisis dei Estado social, in 
Justicia/Conflicto, Madrid: Tecnos, 1988, p. 120. 
80 
Intérpretes finais da Constituição e juízes últimos de sua própria 
autoridade2 0 8, as modernas cortes constitucionais — de resto com ampla 
aceitação nas sociedades democráticas —, acabaram se transformando 
em quarto poder, gabinete na sombra, variante do poder legislativo, legislador 
complementar, parlamento de notáveis, legislador positivo, juiz soberano, con-
tracapitão, instância suprema de revisão ou, ainda, em verdadeira constituinte 
de plantão109, confirmando, assim, as célebres palavras de Charles Hughes 
— então Governador do Estado de Nova York e, depois, membro da Supre-
ma Corte dos Estados Unidos — quando afirmou que os americanos viviam 
sob uma Constituição, mas que essa Catta Política eta aquilo que os juízes 
diziam que ela o era 2 1 0 . 
Contra esse entendimento, que sempre contou com ampla aceitação entre 
os constitucionalistas, registram-se, no entanto, algumas vozes discordantes. 
Sebastian Soler, por exemplo, ao criticar a opinião de John Gray — para quem, 
igualmente, a Constituição dos Estados Unidos não é o que aparenta ser, mas 
aquilo que a Corte Suprema diz que ela é —, considera um sofisma evidente 
identificar a Constituição com as decisões que a interpretam, porque as normas 
jurídicas são estruturas nas quais se articulam conceitos, idéias e valores cujo 
sentido não é subjetivo, mas objetivo, com relação a todos os possíveis destina-
tários do preceito; se tal entendimento fosse verdadeiro — prossegue o mestre 
platino —, juridicamente valioso não seria aquele texto tão venerado, e sim 
os modestos preceitos legais que dispõem sobre a designação dos membros do 
tribunal e o modo como eles proferem suas sentenças, já que a matéria dessas 
decisões teria valor constitucional independentemente do seu conteúdo efetivo; 
mais ainda, referida precisamente aos Estados Unidos — arremata Soler, com 
fina ironia —, essa tese deveria explicar se a vida jurídica norte-americana 
teria sido a mesma supondo-se que só tivesse existido a Suprema Corte e não 
a Constituição 2 1 1. 
2 0 8
 Nos albores da República, quando do julgamento do célebre pedido de habeas corpus em 
favor dos perseguidos políticos de Floriano Peixoto, Rui Barbosa, invocando a doutrina norte-
americana, assim definiu a posição do STF, no jogo dos poderes do Estado: "Intérprete final 
da Constituição (Dicey), o Supremo Tribunal Federal é, pois, o último juiz da sua própria 
autoridade (Cooley)" (cf. Edgard Costa, Os grandes julgamentos do Supremo Tribunal Federal, 
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964, v. 1, p. 22. 
2 0 9
 Sobre essas denominações críticas, cf., por todos, Helmut Simon, La jurisdicción constitu-
cional, in Ernesto Benda et al., Manual de derecho constitucional, Madrid: Marcial Pons, 1996, 
p. 838. 
2 1 0 A frase, freqüentemente citada, é referida por Antonio
Carrillo Flores, em seu Prólogo à 
edição espanhola da obra de Charles Evans Hughes The Supreme Court of the United States: its 
foundation, methods and achievements — an interpretation, publicada em 1946, pelo Fondo 
de Cultura Económica, com o título La Suprema Corte de Estados Unidos. 
211
 La interpretación de la ley, cit., p. 89-90. 
81 
Ressalvadas essas poucas discordâncias — as quais, embora relevantes, não 
invalidam a prova do pastel de que fala Christopher Wolfe 2 1 2 —, acreditamos 
que as palavras de Charles Hughes tenham acolhida em todos os países que 
atribuem ao Podei Judiciário a última palavra sobre o sentido e o alcance das 
suas constituições2 1 3. 
Por isso, no caso do Brasil — igualmente um Estado judiciarista —, con-
tinuam válidas e, por isso, merecem integral transcrição, estas palavras de Fran-
cisco Campos sobre o papel institucional do STF e o poder criador inerente 
ao exercício da jurisdição constitucional, que lhe foi confiada desde a Carta 
de 1891: 
"Juiz das atiibuições dos demais Poderes, sois o próprio juiz das vossas. O domínio 
da vossa competência é a Constituição, isto é, o instiumento em que se define 
e se especifica o Governo. No poder de interpretá-la está o de traduzi-la nos 
vossos próprios conceitos. Se a inteniretação, e particularmente a interpretação 
de um texto que se distingue pela genetalidade, a amplitude e a compteensão dos 
conceitos, não é opeiação puiamente dedutiva mas atividade de natureza plástica, 
construtiva e criadora, no poder de interpretar há de incluir-se, necessariamente, por 
mais limitado que seja, o poder de formular. O poder de especificar implica margem de 
opção tanto mais latga quanto mais lata, genérica, abstrata, amorfa ou indefinida 
a matéiia de cuja condensação há de resultai a espécie" 2 1 4, (grifos nossos) 
Dessarte, se for verdade que novas acepções atribuídas a um mesmo termo 
equivalem à criação de tetmos novos — assertiva que, de testo, encontra respal-
do entre os estudiosos da semântica 2 1' —, se isso for verdadeiro, então parece 
lícito concluir-se que, nos domínios da experiência jurídica, quando juízes e 
tribunais emprestam sentidos novos a um mesmo enunciado normativo, uma 
212
 La transformación de la interpretación constitucional, Madrid: Civitas, 1991, p. 26-27: "Una 
defensa posible para un poder judicial en expansión es, simplemente, la satisfacción con 
sus resultados. La prueba del pastel está en su sabor, argumentan los defensores del Tribunal 
moderno, y el activismo judicial — cualquiera que sea su receta — há producido mucho 
bien y poco mal". 
2 1 3
 Cf., entre outros, Gilmar Ferreira Mendes, jurisdição constitucional, São Paulo: Saraiva, 
1996; J. Sousa e Brito et al., Legitimidade e legitimação dajustiça constitucional, Coimbra: Coim-
bra Ed., 1995; Pedro Cruz Villalón, La formación del sistema europeo de control de constitucio-
nalidad, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1987; Louis Favoreu, Los tribunales 
constitucionales, Barcelona: Ariel, 1994; Louis Favoreu et al., Tribunales constitucionales eu-
ropeos y derechos fundamentales, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1984; Mauro 
Cappelletti, O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado, Porto Alegre: 
Sérgio A. Fabris, Editor, 1984. 
2 1 4
 O Poder Judiciário na Constituição de 1937, in Direito constitucional, Rio de Janeiro: 
Forense, 1942, p. 367. 
2 1 5
 Michel Bréal, Essai de sémantique: science des significations, Paris: Hachette, 1913, p. 146: 
"Une nouvelle acception équivaut à un mot nouveau. Ce qui le prouve, c'est le précepte — nul-
lement artificiel, mais au contraire confirmé par le sentiment général — qu'il faut répéter 
le mot s'il est pris sucessivement en deux sens différents". 
82 
prática de resto rotineira para eles, rigorosamente o que estão a fazer é produzir 
outros enunciados a partir de textos que se mantêm inalterados. São as chama-
das novas leituras, a que já nos referimos linhas acima, das quais decorrem as 
viragens de jurisprudência, que regeneram os sistemas jurídicos e lhes preservam 
a força normativa. 
Funcionam, então, esses operadores jurídicos como instâncias heterônomas 
de criação abreviada do direito, sem que a ninguém ocorra a idéia de que, no 
exercício desse mister, estejam eles a usurpar função privativa do Poder Legisla-
tivo, uma conclusão que, de resto, conta com o apoio de jurisfilósofos da maior 
expressão, como Elias Diaz, por exemplo, para quem o Direito compteende não 
só as normas mas também o trabalho dos seus operadores, vale dizer, o que eles 
fazem com elas, no amplo espectro das interpretações aceitáveis2 1 6. 
Nesse particular, não somente no âmbito da jurisdição constitucional, 
mas também nos domínios da jurisdição ordinária, quem se der ao trabalho de 
compulsar os repertórios de jurisprudência e comparar as decisões divergentes 
extraídas de um mesmo texto legal, não terá dificuldade em chegar a idêntica 
conclusão, o que nos leva a imaginar a existência de um acordo tácito — alguns 
chegam a falar em cumplicidade11' —, entre legisladores e juízes, a que não falta 
o aval da doutrina, por força de cujas cláusulas, em obediência à natureza das 
coisas e ao princípio da separação dos poderes, o Parlamento continua com o 
monopólio da redação das leis, mas o Judiciário fica liberado para interpretá-las 
criativamente, de preferência se o fizer reiterando que a sua leitura não ultrapassa 
o sentido literal possível...118. 
Em suma — ironiza Guastini —, a criação jurisprudencial do direito é 
pudicamente ocultada sob trajes menos vistosos e apresentada como simples 
explicitação de normas implícitas, como elaboração de normas que se consideram 
já existentes, embora em estado latente, no sistema legislativo, mesmo que o 
legislador não as tenha formulado expressamente219. 
Críticas à parte, o que a experiência demonstra é que tudo isso ocorre de 
maneira necessária, não apenas em decorrência da insuprimível distância entre a 
generalidade/abstração das normas e a especificidade/concretitude das situações 
da vida, mas também em razão das constantes alterações no prisma histórico-
social de aplicação do direito, transformações que ampliam aquela distância, 
suscitando problemas de justiça material, que o juiz do caso está obrigado a re-
solver prontamente, até porque não pode aguardar — reitere-se —, as sempre 
demoradas respostas do legislador220. 
216
 Curso de filosofia del derecho, Madrid: Marcial Pons, 1998, p. 22. 
2
" Manuel Segura Ortega, La racionalidad jurídica, Madrid: Tecnos, 1998, p. 84. 
2 1 8
 Cf. Karl Larenz, Metodología, cit., ed. de 1978, p. 366-370. 
2 1 9
 Riccardo Guastini, Estudios sobre la interpretación jurídica, cit., p. 99. 
2 2 0
 Miguel Reale, Gênese e vida dos modelos jurídicos — problemas de semântica jurídica, 
in O direito como experiencia, São Paulo: Saraiva, 1968, p. 209-218. 
83 
Nessa perspectiva, não seria exagerado dizermos que, ao fim e ao cabo, 
a tão combatida criação judicial do direito é apenas um completamento — de 
resto absolutamente indispensável — do trabalho do legislador, cujas opções 
normativas, ainda que fossem proféticas, jamais conseguiriam aprisionar nas 
malhas da lei toda a complexa realidade social. Numa palavra, para realizar ma-
terialmente o direito e possibilitar que se dê a cada um o que é seu, o legislador 
não prescinde, antes precisa, da participação do juiz, a quem só fornece critérios 
gerais de justiça e não sentenças prêt-a-porter...m. 
Trata-se de uma realidade evidenciada à exaustão nos manuais de anota-
ções a textos legais, nessas muletas profissionais que se reeditam em ritmo frené-
tico para que o mundo jurídico se mantenha em dia com os últimos lançamentos 
da jurisprudência...222. 
Em sede de interpretação constitucional, essas novas leituras denominam-
se mutações constitucionais223,
expressão que Anna Cândida da Cunha Ferraz 
utiliza para designar exclusivamente os processos informais que, sem contrariar 
a Constituição, alterem ou modifiquem o sentido, o significado ou o alcance 
das suas normas, rotulando como inconstitucionais os que ultrapassem os limites 
da interpretação e produzam resultados hermenêuticos incompatíveis com os 
princípios estruturais da Lei Fundamental224. 
No mesmo sentido, e com idêntica preocupação conceituai, Gomes Cano-
tilho acentua que uma coisa é admitirem-se mutações constitucionais — que 
são válidas enquanto alterações do âmbito ou da esfera da norma que ainda 
podem ser abrangidas pelo programa normativo — e outra, bem diversa, é 
legitimarem-se mudanças constitucionais que se traduzem na existência de 
uma realidade constitucional inconstitucional, ou seja, alterações manifestamente 
incomportáveis pelo programa da norma constitucional2 2 5. 
2 2 1
 Cf. Lúcio Bittencourt que, no início dos anos 40, já dizia que a interpretação — leia-se, 
interpretação-aplicação — integra o processo legislativo (A interpretação como parte inte-
grante do processo legislativo, Revista do Serviço Público, cit., p. 121-127). 
2 2 2
 Cf. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, de Theotonio Negrão, uma obra 
que é relançada todos os anos, sob aplausos gerais, inclusive, ou sobretudo, porque indica as 
variações de jurisprudência — pró e contra — em torno de um mesmo texto de lei. 
2 2 3
 Cf. Georg Jellinek (Reforma y mutación de la Constitución, Madrid: Centro de Estudios 
Constitucionales, 1991, p. 7): "Por reforma de la Constitución entiendo la modificación de 
los textos constitucionales producida por acciones voluntarias e intencionadas. Y por muta-
ción de la Constitución, entiendo la modificación que deja indemne su texto sin cambiarlo 
formalmente que se produce por hechos que no tienen que ir acompañados por la intención, 
o consciência, de tal mutación" (destaques nossos). Ver, também, Uadi Lammêgo Bulos, 
Mutação constitucional, São Paulo: Saraiva, 1997. Sobre esse tema, ver tópico específico no 
Capítulo 4, n. VI, deste livro. 
224
 Processos informais de mudança da Constituição, São Paulo: Max Limonad, 1986, p. 10. 
225
 Direito constitucional, cit., p. 1102. 
84 
Em qualquer caso, porém, não se deve perder de vista que pertence às 
cortes constitucionais — e não aos seus críticos externos, por mais qualificados 
que se considerem — a última palavra sobre o que é ou não compatível com a 
Constituição, uma prerrogativa tão excepcional que nos impõe meditar, criti-
camente, sobre o modelo brasileiro de jurisdição constitucional, para sabermos 
até que ponto e em que medida ele estimula ou inibe as sempre necessárias 
releitutas da Lei Fundamental. 
Na seara do direito privado, mais especificamente nos domínios do di-
reito civil francês, em frase que se tornou célebre — a revolta dos fatos contra 
o Código —, Gaston Morin assinalou, criticamente, que a nova ordem jurídica 
surgida daquela revolta não se implantou à luz do dia, nem alterou fórmulas 
ou conceitos; ao contrário, fez-se de maneira camuflada, em obediência a uma 
curiosa lei sociológica segundo a qual a vida jurídica não se desenvolve a céu 
aberto, mas escondida debaixo de noções técnicas, que se conservam formal-
mente intactas, embora esvaziadas em seu conteúdo: 
"Fazendo sobreviverem as palavras às realidades que elas recobrem, impede-se que 
a maioria dos homens tome consciência das ttansformações sociais" 2 2 6. 
Mas não é apenas, genericamente, sob esse aspecto da modificação do sen-
tido das notmas, das mutações normativas, que os fatos sociais atuam sobre os 
modelos jurídicos. Rigorosamente, e com maior profundidade, pode-se dizer que 
as situações da vida são constitutivas do significado das regras de direito, porque 
o sentido e o alcance dos enunciados normativos só se revelam em plenitude 
no momento da sua aplicação aos casos concretos 2 2 7. 
Por isso é que jutistas como Pérez Luno 2 2 8 chegam a dizer que a norma 
jurídica não é o pressuposto, mas o resultado da interpretação, enquanto ou-
tros asseveram — como o faz, com freqüência, Miguel Reale — que o Direito 
é a norma e também a situação normada e que a norma é a sua interpretação229, 
uma afirmação que, de resto, é comprovada pelo fato, não contestado sequer 
pelos críticos da criatividade hermenêutica, de que o direito, em sua concreta 
existência, é aquele "declarado" pelos juízes e tribunais, e que sem o problema 
suscitado a partir do intérprete as normas jurídicas permanecem genéricas e 
estáticas2 3 0, à espera de que ocorram as suas hipóteses de incidência, situações 
-
:f
 Lá revolte du droit contre le code, Paris: Sirey, 1945, p. 4. 
--• Karl Larenz, Metodologia, cit., ed. de 1978, p. 396. 
225
 Derechos humanos, Estado de Derecho y Constitución, Madrid: Tecnos, 1990, p. 254. 
-
9
 Filosofia do direito, cit., p. 594; Teoria tridimensional do direito: situação atual, São Paulo: 
Saraiva, 1986, p. 113; e Fontes e modelos do direito, cit., p. 33. 
- Arthur Kaufmann, Panorámica histórica de los problemas de la filosofia del derecho, in 
El pensamiento jurídico contemporáneo, Madrid: Debate, 1992, p. 49; Antonio Osuna Fernán-
dez-Largo, El debate, cit., p. 92. 
de fato que, também elas, estão sujeitas a juízos de constatação hermenêutica 
pelas instâncias a tanto legitimadas231. 
No mesmo sentido, o arguto Eros Grau afirma e reafirma que, sem a me-
diação criadora do intérprete autêntico, de que nos fala Kelsen, o conjunto das 
disposições (textos, enunciados) é apenas ordenamento em potência, um conjunto de 
possibilidades de interpretação ou, se preferirmos, um elenco de normas potenciais, 
cujo significado — as verdadeiras normas — é produzido pelos seus aplicadores, 
no curso do processo de concretização dos modelos jurídicos2 3 2. 
Identicamente, na linha da hermenêutica filosófica de formulação gada-
meriana, Karl Larenz enfatiza que a aplicação ou a aplicabilidade das normas 
aos casos concretos constitui aspecto imanente da própria interpretação jurídica, 
verdadeira condição de possibilidade do trabalho hermenêutico, uma tarefa que 
não se pode desenvolver abstratamente porque exige — para recíproco escla-
recimento, aproximação e explicitação —, um balançar de olhos entre o geral 
e o particular, entre a norma e o fato, entre o programa normativo e o âmbito 
normativo, entre a possível interpretação e o seu resultado, tal como antevistos 
pelo intérprete-aplicador233. Em síntese, arremata Larenz, invocando Schónfeld, 
na apreciação do caso concreto, o juiz não tem apenas de "generalizar" o caso; 
tem também de "individualizar", até certo ponto, o critério, do que resulta 
que a norma só é verdadeiro Direito porque e enquanto é aplicada ao caso e se 
converte em sentença 2 3 4. 
Trata-se, então, de uma exigência ontognosiológica — inerente ao ser e ao 
conhecer da experiência jurídica — que decorre da natureza histórico-dialética 
do processo de compreensão do Direito, em cujo âmbito se fundem, necessa-
riamente, como momentos distintos, mas complementares, os instantes de 
produção, interpretação e aplicação dos modelos jurídicos2 3 5. 
Daí estas palavras de Recaséns Siches, acentuando a íntima conexão entre 
2 3 1
 Hans Kelsen, Teoria pura do direito, cit., v. 2, p. 91. 
232
 Ensaio e discurso sobre a interpretação-apticação do direito, São Paulo: Malheiros, 2002, p. 72. 
2 3 3
 A expressão balançar de olhos, introduzida no debate hermenêutico por Karl Engish, foi 
acolhida por Larenz, Hruschka, Henke e Kriele, entre outros, mas ironizada por Esser, para 
quem desse "pendular sem fim" nada de direito se pode "retirar em conclusão" se não é 
possível, pela pressuposição de um fundamento valorativo, indicar os critérios que permitam 
dirigir o movimento do pêndulo para uma "determinada subsunção" (Karl Engish,
Introdução 
ao pensamento jurídico, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1988, p. 110 e 150, anotações 
5 e 3, respectivamente). 
2 3 4
 Karl Larenz, Metodologia, cit., ed. de 1989, p. 323; ed. de 1997, p. 147. 
235
 Metodologia, cit., ed. de 1978, p. 323,355 e 396-398; Fernández-Largo, El debate, cit., p. 112: 
"La aplicación se integra a la perfección con los demás momentos comprensivos que la precedie-
ron. La hermenéutica ha recuperado la antigua unidad sistemática entre legislar, interpretar 
y aplicar, mostrando la continuidad indisociable de esos momentos, bajo la unidad que les 
confiere el ser partes del único proceso de comprensión del derecho". 
as diferentes etapas do processo de criação do direito, aí compreendida a sua 
aplicação como momento culminante da normatividade jurídica: 
"Deve-se sepultat definitivamente a errônea idéia, hoje já descartada, mas que 
prevaleceu durante mais de dois séculos, da mal chamada aplicação do Direito. O 
Direito positivo não é o contido na Constituição, nas leis, nos tegulamentos, e tc , 
já preconfigurado, já concluído, já pronto para ser aplicado. O processo de criação 
ou de produção da ordem jurídica positiva vai desde o ato constituinte, através da 
Constituição, das leis, dos regulamentos, etc., até a norma individualizada na 
sentença judicial ou na decisão administrativa, sem solução de continuidade. 
O que equivocadamente chamou-se de aplicação do Direito não é algo que sobrevenha 
a uma norma depois que ela foi editada, antes é parte integtante do Direito mesmo, 
que se torna patente pela individualização levada a cabo pelos órgãos jurisdicionais. 
E é uma parte tão necessária do Direito que, em muitos casos, nós só descobrimos 
o que efetivamente ele é se conhecermos o modo como ele opera e os efeitos que 
produz nas vidas humanas. Uma norma jurídica é aquilo que ela faz"136. 
S o b essa perspectiva, pode-se dizer que a constante adequação das nor-
mas aos fatos — um trabalho essencialmente entregue à clarividência dos in-
térpretes-aplicadores — apresenta-se como requisito indispensável à própria 
efetividade do direito, o qual só funciona enquanto se mantém sintonizado 
com a realidade social, muito embora essa adequação não deva comprometet 
a autonomia dos modelos normativos e a sua pretensão de confotmar, juridica-
mente, a sociedade segundo pautas axiológicas quanto possível independentes. 
Afinal de contas, se as normas jurídicas devessem necessariamente andar a reboque 
dos fatos sociais, seriam estes e não aquelas os verdadeiros conformadores das 
relações humanas. 
Mesmo assim, para que o direito possa operar efetivamente e dar a cada 
um o que é seu, é necessário que os seus aplicadores funcionem como instâncias 
redutoras do descompasso entre os problemas sociais e as respectivas soluções 
legislativas, uma tarefa que apenas eles estão funcionalmente habilitados a de-
sempenhar, como sugere esta passagem de José Puig Brutau: 
"O legislador, certamente, pode avançat mais com um só dos seus passos do que 
os juízes com os passos representados por muitas decisões ou sentenças; porém 
os períodos de inatividade, inércia e irresolução do primeiro não lhe permitem, 
quase nunca, sinalizai novos caminhos à evolução jurídica, em comparação com 
o incessante piogresso representado pela atividade dos ptofissionais do diteito e, 
sobietudo, dos juízes. Ademais, o legislado! só se decide a atuai quando o objetivo 
que se propõe já está traçado por uma série de necessidades acumuladas. O legis-
lador nos dá a sensação de um míope equipado com uma arma poderosa"237. 
2 3 6
 Luis Recaséns Siches, Experiencia jurídica, naturaleza de la cosa y lógica "razonable", México: 
Fondo de Cultura Económica/UNAM, 1971, p. 521. 
237
 La jurisprudencia como fuente del derecho, Barcelona: Bosch, s.d., p. 19. 
87 
Postura semelhante assume François Rigaux, ao dizer que, por múltiplas 
razões, o juiz é coagido a fazer obra criadora — a dobrar a lei — e os tribunais, mais 
do que o legislador, estão aptos a seguir passo a passo as alterações da sociedade 
e estabelecer conexões até então despercebidas238, um modo de ver as coisas 
essencialmente idêntico ao do clássico Jean Cruet, de quem destacamos esta 
sugestiva passagem: 
"O juiz, esse 'ente inanimado', de que falava Montesquieu, tem sido na realidade a 
alma do progresso jurídico, o artífice laborioso do direito novo contra as fórmulas 
caducas do direito tradicional. 
Esta participação do juiz na tenovação do direito é, em cetto grau, um fenômeno 
constante, podia dizer-se uma lei natural da evolução jurídica: nascido da jurispru-
dência, o direito vive pela jurisprudência, e é pela jurisprudência que vemos muitas 
vezes o direito evoluir sob uma legislação imóvel"2'9. 
Por tudo isso, torna-se evidente que incumbe essencialmente aos intérpre-
tes-aplicadores — e não aos legisladores — encontrar as primeiras respostas para 
os novos problemas sociais, uma tarefa da qual só poderão desincumbir-se a 
tempo e modo se forem capazes de olhar para o futuro e trilhar caminhos ainda 
não demarcados; se tiverem a coragem de enfrentar a opinião dominante, em 
vez de se resignarem a seguir a jurisprudência estabelecida; se, finalmente, se 
dispuserem a assumir o ônus redobrado de combater as idéias cristalizadas, até 
porque, via de regra, longe de traduzirem verdadeiros consensos, essas falsas 
unanimidades não passam de preconceitos coletivos, fruto dos argumentos de 
autoridade, que sabidamente esterilizam o pensamento e impedem os vôos 
mais arrojados. 
Encaradas sob essa ótica, portanto, as transformações sociais — usual-
mente apontadas como fenômenos externos ou alheios à vida dos enunciados 
jurídicos — deixam de ser vistas como as corrosivas revoltas dos fatos contra os 
códigos para se converterem, positivamente, em fatores de atualização daqueles 
enunciados e, por essa forma, de regeneração da sua força normativa. 
No mesmo sentido é que, nos domínios da experiência jurídico-constitu-
cional, Fernando Lassalle chega a dizer que a vida das constituições depende da 
sua submissão aos fatores reais de poder imperantes na sociedade, e o moderado 
Konrad Hesse nos adverte que as possibilidades e os limites da força normativa da 
Constituição resultam da correlação entre ser (Sein) e dever ser (Sollen), porque 
a sua pretensão de eficácia está condicionada pelas condições históricas da 
sua realização. 
Dessarte, e pelas mesmas razões, as controvertidas mutações constitucio-
nais poderão ser assimiladas como saudáveis procedimentos que regeneram 
o texto constitucional e, por essa forma, tornam dispensáveis as sempre 
A lei dos juizes, Sao Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 185. 
A vida do direito e a inutilidade das leis, Lisboa: José Bastos Ed., 1908, p. 26-27. 
88 
desgastantes revisões formais, que abalam o prestígio e a força normativa 
da Constituição. 
O de que se trata, enfim, é de assegurar eficácia não apenas à Constituição, 
mas também, a partir dela, a todas as normas do ordenamento jurídico, como 
condição indispensável para que a sua normatividade se converta em energia 
normalizadora, conformando a realidade social segundo os parâmetros de nor-
malidade juridicamente estabelecidos. Caso contrário, isto é, se não alcançarem 
a regularidade a que visam, essas normas nem sequer merecerão qualificar-se 
como normas jurídicas porque, desprovidas de efetividade, terão perdido uma 
das dimensões essenciais do direito2 4 0. 
E tanto isso é verdadeiro que Hans Kelsen, sabidamente um normativista, 
viu-se na contingência de reconhecer que uma ordem jurídica como um todo, 
assim como uma norma jurídica singular, perde a validade quando deixa de ser 
eficaz141 • 
Portanto, é somente pelo trabalho hermenêutico de ajustamento entte 
normas e fatos — no qual se fundem, necessariamente, a compreensão, a inter-
pretação e a aplicação dos modelos
jurídicos —, que se viabiliza a ordenação 
jurídico-normativa da vida social, porque é no ato e no momento da invíduali-
zação da norma que o juiz desempenha o papel de agente redutor da inevitá-
vel distância entre a generalidade dos preceitos jurídicos e a singularidade dos 
casos a decidir. 
Nesse instante, e pot essa forma, atento às particularidades da situação 
posta a seu exame — tanto do ponto de vista objetivo quanto do subjetivo —, 
ele criará a norma concreta, a norma do caso ou a norma de decisão, para efetiva-
mente poder dar a cada um o que é seu e, assim, realizar a justiça em sentido 
material2 4 2. 
Por isso é que Recaséns Siches nos diz que o verdadeiro direito, aquele que 
é dotado de força executiva e de impositividade inexorável, não é o que vem 
esboçado em normas abstratas e getais — como tais insuscetíveis de aplicação 
direta às situações da vida —, mas apenas o que se contém nas sentenças, nas 
resoluções administrativas e nos atos que os destinatários daquelas normas, 
dando-lhes determinada interpretação, hajam por bem praticar, sob esse en-
tendimento, em suas relações de ordem privada não contenciosas 2 4 3. 
Nessa perspectiva, pode-se dizer que as regras de direito só entram em 
vigor no momento da sua aplicação, porque só então é que se aperfeiçoam os 
modelos jurídicos, pela fusão dialética do que neles é norma e situação normada, 
2 4 0
 Hermann Heller, Teoria do Estado, São Paulo: Mestre Jou, 1968, p. 305. 
241
 Teoria pura do direito, cit., v. 2, p. 40-42. 
2 4 2
 Eugen Ehrlich, Fundamentos da sociologia do direito, Brasília: Ed. da UnB, 1986, p. 137; 
Karl Larenz, Metodologia, cit., ed. de 1989, p. 166-167. 
2 4 1
 Luis Recaséns Siches, Panorama del pensamiento jurídico en el siglo XX, cit., p. 512-516. 
preceito e realidade, horizonte de produção e horizonte de aplicação do direito; 
em suma, naquele momento em que, num metafórico balançar de olhos entre o 
programa normativo e o âmbito normativo, o intérprete/aplicador estende uma 
ponte sobre o abismo que separa o seu mundo do mundo do legislador histórico, 
de modo a trazer o texto para o presente, para a situação hermenêutica — aqui 
e agora — em que ele há de ser aplicado2 4 4. 
Nisso consiste o caráter paradigmático da hermenêutica jurídica para as 
ciências do espírito, um atributo superior que Hans-Georg Gadamer pôs em 
evidência ao dizer que, nesses domínios, compreender sempre foi, também, 
aplicar; que a tarefa da interpretação consiste em concretizar a iei em cada caso, 
isto é, na sua aplicação; e que a aplicação não é uma etapa derradeira e eventual 
do fenômeno da compreensão, mas um elemento que a determina desde o 
princípio e no seu conjunto 2 4 5. 
Como, de outro lado, segundo o magistério de Reale, toda norma jurídica 
representa uma solução temporária — momentânea ou duradoura — de uma 
tensão dialética entre fatos e valores, solução essa que é estatuída e objetivada 
pela interferência decisória do Poder, em dado momento da experiência social, 
por tudo isso deve o intérprete-aplicador reconstruir a nomogênese jurídica ou 
percorrer o caminho do legislador histórico — porque esse procedimento re-
trospectivo, via de regra, também se mostra fecundo para a compreensão dos 
modelos jurídicos2 4 6. 
Afinal de contas, parece intuitivo que o conhecimento das circunstâncias 
ou das causas motivadoras das opções do legislador — o horizonte de ptodução 
do texto — possa fornecer ao seu intérprete atual alguma indicação sobre o 
sentido e o alcance dos enunciados normativos. 
Se for verdade que um texto nada diz a quem não entenda já alguma coisa 
daquilo de que ele trata; se também for verdade que ele só responde a quem o 
interroga corretamente24', então parece lícito considerar que uma pergunta bem 
feita já representa mais de meio caminho para se chegar à resposta procurada. 
Refazer a pergunta sobre os problemas sociais que ensejaram determinada respos-
ta normativa é, portanto, um recurso hermenêutico a mais, que não deve ser 
2 4 4
 Robert Alexy, Teoría de la argumentación jurídica, Tradução de Manuel Atienza e Isabel 
Espejo, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1989, p. 221. Essa idéia encontra-se, 
também, em Karl Engisch, para quem se estabelece um efeito permanente de intercâmbio, 
um ir e vir de mirada, entre norma e fato, sem que isso se constitua num círculo vicioso, como 
anotado por Arthur Kaufmann (El pensamiento, cit., p. 131). 
245
 Verdad y método, cit., v. 1, p. 380, 396 e 401; Antonio Osuna Fernández-Largo, La herme-
néutica jurídica de Hans-GeorgGadamer, Valladolid: Universidad de Valladolid, Secretariado 
de Publicaciones,1992, p. 107-108. 
246
 Filosofia do direito, cit., p. 550; Teoria tridimensional do direito, cit., p. 113. 
2 4 7
 Karl Larenz, Metodologia, cit., ed. de 1989, p. 377. 
90 
desprezado, sobretudo quando precisamos descobrir o sentido de textos que 
reputamos enigmáticos2 4 8. 
Não se trata, advirta-se, de proceder a um trabalho de arqueologia jurídica, 
que se mostraria infecundo se tivesse em vista apenas refazer, acriticamente e 
sem compreensão histórica, o processo de elaboração, digamos, externa, dos 
enunciados normativos; trata-se, isto sim, de inverter o itinerário da produção 
normativa, como sugerido por Emilio Betti: 
"Aqui, em suma, o conhecer é um reconhecer ou reconstruir o espírito que, através 
da forma em que se objetivou, fala ao espírito pensante, o qual por isso sente-se 
afim na comum humanidade: é um reconduzir e juntar de novo a forma com a 
interioridade que lhe deu origem e da qual se desprendeu, um interiorizar trans-
pondo, em todo caso, o conteúdo de uma subjetividade divetsa da sua. Desse 
modo, tem lugar uma inversão do processo criativo no processo interpretativo; 
uma invetsão pela qual, no itinerário hetmenêutico, o intérprete deve percorrer 
de novo, em sentido retrospectivo, o caminho genético e tentar refazer ou operar 
em si o outto pensamento" 2 4 9. 
Essencialmente, esse é o modus operandi da compreensão como ato gno-
siológico próprio das ciências do espírito — inclusive da jutisprudência —, 
por via da qual procuramos desvelar ou desentranhar o significado interno 
das obras e das condutas humanas, pondo-nos idealmente no lugar do outro para 
tentar descobrir, através daquilo que externamente e materialmente ele fez, 
qual o propósito que o motivou. Em palavras de Perpina Rodriguez, "pôr-se 
no lugar do outro, não para fazer ou dizer de fato o que ele realiza ou intenta, 
nem para pensar o que eu, sendo como sou, faria ou diria, e sim para conhecer 
idealmente o que o outro faz ou pretende"250. 
Apesar disso, cumpre insistir na advertência de Hans-Georg Gadamer, a 
nos dizer que o intérprete, para compreender o significado de um texto, embota 
deva olhar para o passado e atentar para a tradição, não pode ignorar-se a si mesmo, 
nem desprezar a concreta situação hermenêutica em que ele se encontra — o aqui 
e o agora — pois o ato de concretização de qualquer norma jurídica ocorre no 
presente e não ao tempo em que ela entrou em vigor2 3 1. 
Uma coisa é fundir os horizontes de compreensão do texto; outra, bem 
diversa, é desconhecer que a aplicação de toda norma jurídica tem em mira 
2 4 8
 Karl Larenz (Metodologia, cit., ed. de 1989, p. 223): "a toda norma jurídica pertence, 
como pano de fundo indispensável para a sua compreensão, a realidade social em resposta 
à qual foi concebida, a realidade jurídica aquando do seu surgimento, e a realidade social 
actual face à qual deve operar". 
249
 Interpretación delaley y de los actos jurídicos, Madrid: Revista de Derecho Privado, 1975, 
p. 30. 
2 5 0
 Antônio Perpiña Rodriguez, Me'todos y criterios de la sociología contemporánea, Madrid: Insti-
tuto Balmes de Sociología, 1958, p. 281. 
2 5 1
 Verdad y método, cit., p. 396 e 401. 
91 
resolver problemas atuais, segundo
critérios de valor que vigoram no presente, 
e por decisão de quem — hic et nunc — dispõe de legitimidade para criar novos 
modelos jurídicos ou simplesmente preservar a validade dos que foram editados 
anteriormente. 
Afinal de contas, como dizia Hobbes, o legislador não é aquele por cuja 
autoridade as leis foram editadas inicialmente, mas aquele por cuja autoridade 
elas continuam a set leis 2 ' 2, entendimento que, de resto, é também o de Chaim 
Perelman, para quem "o fato de manter um antigo texto de lei não significa em 
absoluto que o legislador atual deseje que seja interpretado em conformidade 
com o espírito daquele que o adotou", porque "o mais das vezes o legislador atual 
consagra, com seu silêncio, a interpretação nova que a jurisprudência fornece, 
de tempos em tempos, de um texto antigo"2". Outro não é o pensamento de 
Rousseau ao dizer que a lei de ontem não obriga hoje, mas o consentimento tácito 
presume-se pelo silêncio e presume-se que o soberano confirma incessantemente 
as leis que, podendo, não ab-rogou; e que tudo o que uma vez declarou querer, 
quererá sempre, a menos que o revogue254. 
Nessa mesma linha de pensamento, Richard Palmer observa que tanto 
ao transmitir um juízo como ao pregar um sermão, a interpretação deve in-
cluit não só a explicação do que o texto representava no seu próprio mundo, 
na circunstância em que se produziu, como também aquilo que significa no 
momento atual, porque "em todo o ato de compreensão se dá uma aplicação 
ao presente"2". 
Se for verdade — como diz Larenz — que as palavras da lei devem revelar 
o direito àqueles a quem se dirigem no presente, impõe-se concluir que, em-
bora o legislador histótico as tenha usado a partir do contexto lingüístico do 
tempo em que as editou, o seu sentido literal só poderá ser detetminado segundo 
a compreensão lingüística das pessoas a quem elas falam agora e não daquelas 
a quem falaram no passado256. 
De fato, quando o juiz intenta adequar a lei às necessidades atuais — pre-
cisamente para preservar a sua força normativa —, o que ele tem em vista, obvia-
mente, é resolver um problema ou desempenhar uma tarefa prática; por isso é 
que, olhos postos no presente, ele procurará reconhecer o significado jurídico da 
lei, que só pode ser o seu significado atual, e não o significado histórico, aquele 
que lhe foi atribuído ao tempo da promulgação257. Em síntese, como observa 
252
 Leviatã, 1~ reimpr., México: Fondo de Cultura Económica, 1996, p. 220. 
2 5 3
 Ética e direito, São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 625. 
2 5 4
 J. J. Rousseau, Do contrato social, in Obras de ]ean-Jacques Rousseau, Rio de Janeiro: 
Globo, 1962, v. 2, p. 81. 
2 5 5
 Hermenêutica, Lisboa: Edições 70, 1986, p. 191 e 193. 
2 3 6
 Metodologia, cit., ed. de 1978, p. 404; ed. de 1989, cit., p. 389. 
2 5 7
 Hans-Georg Gadamer, Verdad y método, cit., p. 400. 
!)2 
Carlos Cossio, toda valoração jurídica, enquanto fato, é necessariamente um 
fato do presente, porque um sentido só pode existir no presente2 5 8. 
Tudo isso ressalta, mais uma vez, o significado exemplar da hermenêutica 
jurídica, em cujo âmbito — pela mediação vivificadora do intérprete —, inte-
gram-se historicamente os dois horizontes significativos, o do texto e o do seu 
aplicador, o qual, ao interpretar para poder aplicar, não abandona o seu próprio 
horizonte, antes o amplia para fundi-lo com o horizonte do texto. 
Porque expande o seu horizonte hermenêutico, o intérprete alarga tam-
bém o seu campo visual, que se torna mais rico pela incorporação de novos ins-
trumentos de análise. Superando os condicionamentos que lhe encurtavam a 
visão — sem que tivesse consciência dessa limitação —, aquele que descortina 
novos horizontes capacita-se a ver mais e melhor, tanto no plano físico quanto 
no plano espiritual. 
No âmbito do direito, por outro lado, esse enriquecimento de perspectiva, 
porque aumenta a capacidade de análise e de persuasão do intérprete-aplicador, 
acentua-lhe, concomitantemente, o dever de prestar contas do seu trabalho in-
terpretativo, o qual, para ser legítimo, há de ser racional, objetivo e controlável, 
pois nada se coaduna menos com a idéia de Estado de Direito do que a figura 
de um oráculo despótico ou iluminado, pairando acima da lei e dos critérios 
usuais de interpretação. 
Daí esta outra observação de Gadamer, no sentido de que só é possível 
uma hermenêutica jurídica onde a lei vincule, igualmente, todos os membros 
da comunidade jurídica, governantes e governados, legisladores e juízes: 
"A idéia do direito contém a idéia da igualdade jurídica. Se o soberano não está 
submetido à lei, mas pode decidir livremente acerca da sua aplicação, fica então, 
obviamente, destruído o fundamento de toda hetmenêutica. Aqui também se 
mostra que a inteniretação correta das leis não é uma simples teotia da atte, uma 
espécie de técnica lógica da subsunção sob parágrafos, mas uma concreção prática 
da idéia do direito. A arte dos juristas é também o cultivo do direito"2 3 9. 
Nos regimes absolutistas, em que a vontade do ptíncipe onipotente está 
acima da lei, já não é possível hermenêutica alguma, pois o senhor todo-pode-
roso, melhor do que ninguém, sempre poderá esclarecer as suas próprias palavras 
e dar-lhes o sentido "correto", ainda que esse sentido se evidencie em total de-
sacordo com as regras usuais de interpretação, que, de resto, para ele não serão 
vinculantes2 6 0. Em síntese, nesses regimes de força, não existe hermenêutica 
porque não existe o que interpretar: tanto a vontade da lei quanto a do legis-
lador são substituídas pela vontade do intérprete, que manipula o objeto do 
conhecimento como senhor e possuidor da interpretação. 
2 5 8
 El substrato filosófico de los métodos interpretativos, Revista Universidad, Santa Fé, 
Argentina: Universidade Nacional dei Litoral, n. 6, p. 103 e 107, 1940. 
2 5 9
 A razão na época da ciência, Tradução de Ângela Dias, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 
1983, p. 63-64. 
260
 Verdad y método, cit., p. 401. 
93 
Daí a necessidade, por todos encarecida, de que no curso do processo in-
terpretativo se observem as chamadas regras de interpretação, para que se possa 
controlar a racionalidade do trabalho hermenêutico e, também, avaliar o seu 
resultado261. 
Visualizada em perspectiva mais ampla — não apenas lógica, mas também 
deontológica—, dir-se-ia que essa transparência do raciocínio atende, igualmen-
te, ao imperativo ético e político de que, num autêntico Estado de Direito, as 
decisões dos agentes públicos, para se reputarem legítimas, devem convencei 
aqueles a quem tenham a pretensão de obrigar262. Ê que, diversamente do le-
gislador — que apenas pretende ordenar163 —, o juiz deseja também convencer, 
o que, de resto, além de emprestar consistência aos comandos jurisdicionais, 
densifica o direito à tutela judicial efetiva2 6 4. 
Por que a Constituição exige, sob pena de nulidade, que todos os julga-
mentos dos órgãos do Poder Judiciário sejam públicos, e fundamentadas todas 
as decisões? Por que as leis processuais impõem ao juiz o dever de fundamentar 
a sentença, ainda que sucintamente? Pela simples razão de que, à míngua de 
justificação, todo ato decisório tem-se por ilegítimo, objetivamente inválido e 
incompatível com a idéia do Direito enquanto instrumento de ordenação justa 
e racional da convivência humana. 
Nessa linha é de todo oportuna a observação de Francesca Puigpelat 
Marti, a nos dizer que no atual estágio jurídico é a motivação que assegura ra-
cionalidade e, com isto, mais segurança às decisões2 6 5. 
Se não existe interptetação sem intérprete; se toda interpretação, embo-
ra seja um ato de conhecimento, traduz-se, afinal, em uma manifestação de 
vontade do aplicador do Direito; se a distância entre a generalidade da norma 
e a particularidade do caso exige, necessariamente, o trabalho mediador do
intérprete, como condição indispensável ao funcionamento do sistema jurí-
2 6 1
 Karl Larenz, Metodologia, cit., ed. de 1989, p. 177-178. 
2 6 2
 V. a Lei n. 9.784, de 29-1-1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Ad-
ministração Federal, especialmente o art. 2 2 , onde se definem princípios e critérios inspirados 
nessa idéia. 
2 6 3
 Em 1807, o procurador Dupin, extemando a ideologia francesa da onipotência da lei, dizia 
que "o legislador deve falar como soberano e não como retórico" (André Dupin, Reflexões 
sobre o ensino e o estudo do direito, Tradução de J. J. de Campos da Costa de Medeiros e Albu-
querque, Recife: Typographia Universal, 1868, p. 39). Trata-se de uma concepção que teve 
longa vigência e só foi superada com o aprimoramento do Estado de Direito, em cujo âmbito 
todos devem obediência — inclusive o legislador — ao princípio da proporcionalidade ou da 
razoabilidade. Ver Gilmar Ferreira Mendes, O princípio da proporcionalidade e o devido pro-
cesso legal substancial na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, in Moreira Alves e o 
controle de constitucionalidade no Brasil, São Paulo: Celso Bastos, Editor, 2000, p. 107-119. 
2 6 4
 Arthur Kaufmann, Filosofia del derecho, cit., p. 223. 
265
 Funciones y justificación de la opinión dominante en el discurso jurídico, Barcelona: Bosch, 
1994, p. 134. 
94 
dico; se, no desempenho dessa tarefa, resta sempre uma insuprimível margem 
de livre apreciação pelos sujeitos da interpretação; se, ao fim e ao cabo, isso 
tudo for verdadeiro, então o ideal de racionalidade, de objetividade e, mesmo, 
de segurança jurídica, aponta para o imperativo de se recuar o mais possível o 
momento subjetivo da decisão e reduzir ao mínimo aquele "resíduo incômodo" 
de voluntarismo e de livre convencimento, que se faz presente, inevitavelmente, 
em todo trabalho hermenêutico. 
Daí a impottância de que se revestem, nos países de tradição democrática, 
o princípio do devido processo legal e as garantias judiciais, como instrumentos 
de racionalização/otimização do debate processual e, conseqüentemente, de 
legitimação dos seus resultados. 
Em conclusão, neste ponto, a exigência de motivação, que se impõe ao 
intérprete-aplicador do Direito, é condição de legitimidade e de eficácia do seu 
labor hermenêutico, cujo tesultado só se tornará coletivamente vinculante se 
obtiver o consenso social, que, no caso, funcionará, se não como prova, pelo 
menos como sintoma de racionalidade166. 
A propósito, leia-se esta passagem de Aulis Aarnio, a ressaltar a importância 
que o dever de justificar as decisões vem assumindo na vida contemporânea: 
"Em uma sociedade moderna, exige-se que as decisões não apenas sejam dotadas 
de autoridade, mas também que apresentem suas razões. Isso vale igualmente para a 
administração da justiça. A responsabilidade do juiz converteu-se, cada vez mais, 
na responsabilidade de justificar suas decisões. O fundamento para o uso do poder 
por parte do juiz reside na aceitabilidade das suas decisões e não na posição fotmal 
de mando que, eventualmente, ele possa ter. Nesse sentido, a responsabilidade 
de oferecer justificação é, especificamente, uma tesponsabilidade de maximizar o 
controle público da decisão. (...) Por outro lado, é especificamente pela justifica-
ção que o autor de uma decisão — quer se trate de um juiz ou de uma autoridade 
administtativa — constrói a credibilidade sobre a qual repousa a confiança que 
nele depositam os cidadãos"267. 
E a tal ponto chegaram essas exigências de motivação, de resto plenamen-
te compreensíveis no contexto de aprimoramento do Estado de Direito, que 
já não basta apresentar razões normativas — reputadas necessárias, mas não 
suficientes — para justificar as decisões jurídicas ou quaisquer outras de reper-
cussão social. Torna-se necessário justificar a própria justificação, oferecer uma 
justificação última e profunda, que se baseie em outras razões — tais como justiça, 
razoabilidade, oportunidade e correção —, tazões que não derivam diretamente 
das notmas ou dos princípios do ordenamento jurídico, mas que nem por isso 
deixam de ser objetivas e compreensíveis por quantos possam ser afetados, direta 
ou indiretamente, pelas decisões dos aplicadores do Direito 2 6 8. 
Rodolfo Luis Vigo, Interpretación constitucional, Buenos Aires: Abeledo-Penot, 1993, p. 232. 
Lo racional como razonable, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1991, p. 29. 
Manuel Segura Ortega, La racionalidad jurídica, cit., p. 117-118. 
95 
Noutros termos, para que os respectivos atos decisórios se reputem válidos, 
dotados de consistência e legitimidade, dit-se-ia que é da natureza desse proce-
dimento que aquilo que de início é apenas subjetivo possa tornar-se objetivo — o 
intersubjetivo transcendental husserliano —, por via do qual, a partir do mesmo 
ponto de vista, o que no começo se apresente como verdade só para mim venha 
a mostrar-se verdadeiro também para todos. 
"Em suma — como anota José Vilanova — o objeto e suas catacterísticas, que 
eu enuncio, devem valer não somente para mim, aqui e agora, mas também para 
qualquer sujeito que se ponha nas minhas condições. O sujeito que realiza um ato 
de conhecimento ttanscende o seu mero existir contingente, fático e presente, e 
se coloca no ponto de vista denominado transcendental. Daí que a objetividade se 
defina como a intersubjetividade transcendental, já que ela tem validez não só para 
mim enquanto sujeito cognoscente, mas também para todos os demais sujeitos 
que se coloquem ou possam colocar-se na posição do sujeito transcendental. Esta 
intersubjetividade transcendental catacteriza ou constitui a objetividade"2 6 9. 
Dessarte, graças a esse processo de convencimento tacional, aquilo que, 
a princípio, era apenas um ponto de vista subjetivo, uma opinião pessoal de 
detetminado intérprete-aplicador, passa a ser também o entendimento objetivo 
(= intersubjetivo), se não unânime, pelo menos da maioria do grupo social, que o 
avaliza ou lhe dá consentimento na exata medida do seu poder de persuasão. 
Porque foi produzida segundo o devido processo legal em sentido amplo 
(substantive due process/procedural due process; justificação externa/justificação 
interna), a decisão judicial, que assim se obteve, estará revestida de legitimidade 
e eficácia, tornando-se insuscetível de desfazimento. 
Em linguagem jurídico-processual, dir-se-á que o resultado a que se che-
gou através desse discurso — porque se trata de um discurso racional — não 
admite ação rescisória; e a sentença assim prolatada, porque se formalizou em 
conformidade com o devido processo legal, poderá converter-se em acórdão ( = 
acordam), transitar em julgado e, pragmaticamente, aceitat-se como verdade 
real (res judicata pro veritate habetur)210. 
Assentados esses pressupostos que, embora sejam comuns às atividades 
hermenêuticas nas ciências do espírito, em geral, foram apreciados com supor-
269
 Filosofia dei derecho y fenomenologia existencial, Buenos Aires: Cooperadora de Derecho y 
Ciências Sociales, 1973, p. 99. A propósito, Arthur Kaufmann nos fala de uma teoria con-
vergente da verdade, segundo a qual o critério apropriado para a veracidade ou a correção de 
um enunciado não é a existência de um consenso, mas a circunstância de que muitos sujeitos 
independentes entre si alcancem com relação ao mesmo assunto (!) conhecimentos convergentes 
objetivos (Filosofia dei derecho, cit., p. 495-496). 
2 7 0
 Augusto Teixeira de Freitas, Vocabulário jurídico, Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1883, p. 7 e 
44-45: "Acórdão é o presente plural substantivado do Verbo — Acordar (Concordar), pêlo qual 
costumão-se designar as Sentenças Collectivas dos Tribunáes Superiores"; "Cousa julgada c 
a verdade autorisada pelas decisões judiciáes, que são irrevogáveis, por bem da regra — res 
judicata pro veritate habetur". 
96
te no trabalho interpretativo que se desenvolve no âmbito da jurisprudência, 
urge agora testados, concreta e especificamente, na interpretação/aplicação dos 
modelos jurídicos. 
Para tanto, em homenagem à clateza e precisão dos seus ensinamentos, 
tomaremos como referência e roteiro as lições de Karl Larenz e Antonio Entique 
Pérez Luño; o primeiro na perspectiva da epistemologia jurídica e da meto-
dologia da ciência do Direito, o segundo, do ponto de vista da teoria política 
e do direito constitucional. 
Com a combinação dessas duas vertentes de análise ampliar-se-á, sobrema-
neira, o horizonte de compreensão do problema hermenêutico, à medida que, 
às considerações abstratas e gerais, desenvolvidas no âmbito da epistemologia 
jurídica2 7 1, vem juntar-se a concretitude da abordagem levada a cabo à luz de 
experiências jurídicas historicamente acumuladas2'2. 
Preliminarmente, é de destacar o caráter lingüístico de qualquer interpre-
tação, a exigir que os interlocutores falem a mesma linguagem, como condição 
de possibilidade de sua mútua compreensão, até porque — adverte Gadamer — 
"quem fala uma linguagem que mais ninguém fala, em realidade não fala"2 7 3. 
Disso decorre, em rigor, e imediatamente, a perda de sentido da velha dis-
puta entre aqueles que atribuem à tarefa interpretativa a finalidade de descobrir, 
por detrás das normas jurídicas, uma suposta vontade do legislador, e os que, tam-
bém voluntaristas, impõem ao intérprete o dever de se curvar às palavras ou à 
vontade da lei, como condição de legitimidade de todo labor hermenêutico. 
Nem uma coisa, nem outra, pois onde aquela vontade — seja a da lei, seja 
a do legislador —, não se exteriorizou em determinada linguagem normativa, de 
uso comunitariamente inteligível, não há falar sequer em atividade hermenêu-
tica. Afinal de contas — anota Emilio Betti —, o objeto da interpretação não é 
a vontade como tal, mas a forma em que está explicitada: o feito ou o falado274. 
A propósito, relembremos que na discussão sobre a natureza das normas 
jurídicas, mesmo aqueles que as consideram como imperativos ou mandatos 
têm o cuidado de ressalvar que essas "ordens" não configuram fenômenos psí-
quicos, que não são manifestações de vontade em sentido próprio, mas apenas 
imperativos despsicologizados, o que não deixa de ser uma expressão original. 
No campo da interpretação constitucional, pot exemplo, em que as normas 
positivadas nem sequer traduzem decisões inequívocas do legislador constituin-
te, nem muito menos uma suposta ou imaginária vontade da própria Consti-
tuição — limitando-se, no mais das vezes, a enunciar princípios ou a indicar 
objetivos a serem comunitariamente alcançados e/ou renovados ao longo do 
2 7 1
 Karl Larenz, Metodologia, cit., eds. de 1978 e 1989. 
2 7 2
 Antonio Enrique Pérez Luño, Derechos humanos, Estado de Derecho y Constitución, cit. 
273
 Verdad y método, cit., v. 2, p. 150. 
274
 Interpretación de la ley y de los actos jurídicos, cit., p. 28. 
97 
tempo —, nesse domínio parece disparatado conceber-se o intérprete como um 
psicanalista que, no divã do seu consultório, procure descobrir o cliente verdadeiro, 
que se esconde atrás do. paciente de carne e osso. 
Ao contrário, é precisamente nesse âmbito da hetmenêutica jurídica onde 
se manifesta em grau mais elevado a criatividade dos aplicadores do direito, pelas 
razões que apreciaremos mais adiante. 
A seguir, relembremos o carátet necessário da atividade intetpretativa, a 
desacreditar, também, o velho brocardo interpretatio cessat in claris, um topos que, 
ingenuamente utilizado, além de conduzir a um círculo vicioso, pressupõe a 
existência de leis cuja redação, se bem cuidada, impediria dúvidas, obscuridades 
ou contradições, tomando dispensável o labot interpretativo275. 
Refutando esse modo de vet as coisas, e após ressaltar a natureza neces-
sariamente problemática de toda interpretação — porque em seu âmbito o 
intérprete deve considerar os diferentes significados possíveis de um termo, ou 
de uma seqüência de palavras, para escolher, afinal, aquele que lhe pareça o 
correto —, Karl Larenz adverte que seria um erro aceitar que os textos jurídicos 
só carecem de interpretação quando surgem como particularmente obscuros, 
pouco claros ou contraditórios. 
Diversamente — anemata o mestre da metodologia da ciência do direito —, 
em princípio, todos os textos jurídicos são suscetíveis e carecem de interpreta-
ção, sendo essa necessidade não um defeito, que se possa evitar mediante uma 
redação tão precisa quanto possível, mas um dado de realidade, que continuaiá a 
subsistir enquanto as leis, sentenças, resoluções e mesmo os contratos não forem 
redigidos exclusivamente em linguagem codificada ou simbolizada276. 
Por isso mesmo é de atentar para a advertência de Montesquieu, a nos 
dizer que o texto das leis deve ser conciso e simples; que a sua expressão há de 
ser direta em vez de meditada; e que os estilos empolados não passam de obras 
de ostentação. Daí a sua confessada admitação pela Lei das Doze Tábuas, para 
ele tão precisas que as crianças as aprendiam de cor 2 7 7 . Entre nós, Victor Nunes 
Leal comparava a elaboração das leis ao acondicionamento de explosivos, em 
que todo o cuidado é pouco e qualquer descuido pode ser fatal 2 7 8. 
Sirva-nos de consolo, no particular, a observação de Carlos E. Alchourrón 
e Eugénio Bulygin de que "solo en los lenguages puramente fotmales — como 
son los de la lógica y de la matemática puras — no se plantean problemas de va-
2 7 5
 Sobre o sentido desse brocardo, como princípio lógico-abstrato, mas, sobretudo, como 
categoria histórica, ver o texto de Miguel Reale Para uma hermenêutica estrutural, in Estudos 
de filosofia e ciência do direito, São Paulo: Saraiva, 1978, p. 75-76. 
2 7 6
 Karl Larenz, Metodologia, cit., ed. de 1989, p. 240-241. 
2 7 7
 De l'esprit des lois, in Oeuvres complètes de Montesquieu, Paris: Chez Lefrève, 1859, p. 622, 
e Do espírito das leis, cit., v. 2, p. 275. 
27s
 Problemas de direito público, Rio de Janeiro: Forense, 1960, p. 8. 
98 
guedad, pero no porque sus conceptos sean más exactos que los de otras ciencias, 
sino porque no son empíricos", observação enriquecida pela citação, logo a 
seguir, deste precioso ensinamento de Einstein: "na medida em que se referem 
à realidade, os conceitos são vagos; na medida em que não são vagos, não se 
teferem à realidade"279. 
De outra parte, há de considerar-se que nenhuma interpretação ocone no 
vazio. Ao contrário, trata-se de uma atividade contextualizada, que se leva a cabo 
em condições sociais e históricas determinadas, produtoras de usos lingüísticos 
dos quais deve partir qualquer atribuição de significado, em todos os domínios 
da hermenêutica jurídica. E isso, como já acentuado, sem falarmos nos condi-
cionamentos socioculturais, nos preconceitos ou na ideologia dos intérpretes e 
aplicadores do direito, dados de tealidade, insista-se, cujos efeitos são reputados 
perversos no âmbito da sociologia do conhecimento, mas valorados, positiva-
mente , nos domínios da hermenêutica filosófica, como elementos constitutivos 
da pté-compreensão. 
Daí, ainda a propósito desses usos e contextos lingüísticos, as percucientes 
observações de Larenz, alertando-nos que a interpretação de qualquer enuncia-
do normativo há de iniciar-se pelo seu sentido literal —, assim entendido o 
significado de um texto ou de uma cadeia de palavras no uso lingüístico geral —, 
e que, onde for possível constatar usos lingüísticos especiais, valerá o signifi-
cado emergente dessa linguagem técnica porque a sua adoção, no texto de 
detetminada lei, terá sido intencional e decottente da necessidade de atingir 
objetivos que, ao ver do legislador, poderiam não ser alcançados se ele utilizasse 
a chamada linguagem vulgar280. 
Ainda assim, como o direito é uma coisa que interessa a todos
e, por isso, não 
pode renunciar a um mínimo de compreensibilidade geral, mesmo essa linguagem 
técnica, para se tornar acessível, deve apoiar-se na linguagem comum — uma es-
pécie de esperanto jurídico —, a fim de que os destinatários das leis, entendendo 
as suas ordens, possam guiar-se por elas e delas receber instrução. Isso tudo, evi-
dentemente, sem peidetrnos de vista que mesmo a linguagem ordinária, como 
metalinguagem em relação à específica linguagem jurídica, também ela padece 
de limitações, porque, além de não constituir um sistema completo, fechado e 
invariável — antes é uma praxis social em permanente reconsttução, pela in-
teração dialética entre langue e parole —, não ocupa posição hierarquicamente 
superior à daquela linguagem particular, a ponto de se lhe impor como fórmula 
de controle nas situações problemáticas, como observa Castanheira Neves 2 8 1. 
279
 Introducción a la metodología de las ciencias jurídicas y sociales, Buenos Aires: Astrea, 1998, 
p. 62-63. 
280
 Metodologia, cit., ed. de 1989, p. 385-390. 
2 8 1
 A. Castanheira Neves, O actual problema metodológico da interpretação jurídica — I, Coim-
bra: Coimbra Ed., 2003, p. 197. 
99 
Ainda assim, nas hipóteses em que, evidentemente, a lei se tenha desviado 
do seu uso lingüístico especial, deve-se apelar pata a linguagem ordinária, que, 
então, funcionará como instância de tradução, balizando os limites dentro dos 
quais há de se encontrar o sentido procurado, até mesmo como condição de 
legitimidade do preceito que se pretenda aplicat, porque parece intuitivo que 
uma norma ininteligível, veiculada em linguagem singularmente esotérica, não 
possa impor obrigações a ninguém2 8 2. No particular, isso significa, também, que 
ao aplicador do direito — por mais ampla que seja a sua necessária liberdade 
de interpretação —, não é dado, subjetivamente, criar ou atribuir significados 
arbitrários aos enunciados normativos, nem tampouco ir além do seu sentido 
linguisticamente possível, um sentido que, de resto, é conhecido e/ou fixado 
pela comunidade e para ela funciona como limite da interpretação183. 
No âmbito da cultura e, por via de conseqüência, também nos domínios 
da jurisprudência, apesar das críticas que recebeu pela rigidez das suas posições, 
impõe-se creditar a Emilio Betti o. mérito de ter desenvolvido possivelmente 
as mais profundas reflexões sobre a hermenêutica como metodologia geral das 
ciências do espírito, assim como o reconhecimento de haver lutado para que, 
a pretexto de se preservar a liberdade de interpretação — que todos, inclusive 
ele, consideram inerente ao ato de compreender —, a atividade hermenêutica 
não descambasse para um relativismo estéril e banalizador. 
Ftuto dessas suas reflexões de base, foi a formulação dos cânones herme-
nêuticos fundamentais com relação ao sujeito e ao objeto da interpretação, dos 
quais destacamos, pela sua pertinência, no particular, o cânone da autonomia 
hermenêutica do objeto ou da imanência do critério hermenêutico. 
Segundo o autor da monumental Teoria generale delia interpretazione, para 
que não se comprometa a objetividade da interpretação, quaisquer formas sig-
nificativas — obviamente também as formas jurídicas —, enquanto objetivações 
da mente de um outro, têm de ser compreendidas em relação a essa mente, que 
nelas foi objetivada, e não com referência a qualquer sentido que a própria for-
ma possa adquirir, uma vez abstraída da função representativa que tinha para 
aquela mente ou aquele pensamento. 
Em suma, para esse importante jurista e filósofo — porque sensus non est 
inferendus sed efferendus —, o sentido procurado há de ser extraído ou provir das 
formas significativas, e não introduzido nessas objetivações do espírito humano 
de modo arbitrário e, até certo ponto, sub-reptício ou fraudulento. 
"Com isso, o que desejamos dizet — arremata Emilio Betti — é que as formas 
significativas têm de set consideradas autônomas e compteendidas de acordo com 
2 8 2
 Relembre-se, ainda uma vez, a lição de Gadamer: "quem fala uma linguagem que mais 
ninguém fala, em realidade não fala" (Verdad y método, cit., v. 2, p. 150). 
2 8 3
 Cf. o sentido e o alcance, no particular, da diferença entre langue e parole (Saussure), opor-
tunamente lembrada por Luigi Ferrajoli (Derecho y razón, Madrid: Trotta, 1998, nota 51, 
P . 83-84). 
100 
a sua própria lógica de desenvolvimento, conforme à sua necessidade interior, 
coerência e racionalidade; que hão de ser avaliadas de acordo com os parâmetros 
imanentes na intenção inicial a que deveriam cotresponder, do ponto de vista 
do autor e do seu impulso formativo no processo de criação, e não segundo sua 
idoneidade para servir a este ou àquele fim exttínseco que possa parecer relevante 
para o seu intérprete"284. 
Nessa perspectiva, em que o respeito à autonomia do texto é indispensá-
vel à objetividade e à controlabilidade da interpretação — assim como, nos 
domínios da teoria do conhecimento, a transcendência do objeto é condição 
de possibilidade do próprio evento cognitivo como apreensão de algo que está 
fora do sujeito, que se lhe opõe e que para ele permanece um outro, mesmo de-
pois de apreendido pela sua consciência —, nessa perspectiva dir-se-ia, citando 
Meier-Hayoz, que a letra da lei possui dupla finalidade, funcionando, de um 
lado, como ponto de partida para a elucidação do seu sentido pelo intérprete e, 
de outro, como limite à atividade hermenêutica enquanto tal 2 8 5. 
Ulttapassados esses limites — que servem de fronteira entre a interpretação 
em sentido estrito e a criação judicial do direito —, a atividade hermenêutica 
como que se contaminaria de subjetividade e de voluntarismo, expondo o 
intérprete ao risco de produzir decisões ilegítimas e, por isso, fadadas a se tor-
narem socialmente ineficazes, um risco que, para alguns, é compensado pela 
inesperada aceitação das suas novidades heimenêuticas. 
Em linguagem kelseniana, dir-se-ia que, embora a atividade interpreta-
tiva não seja apenas um ato de conhecimento, mas também de vontade, não 
é dado ao intérprete-aplicador desconsiderar o marco normativo imposto pela 
norma de nível superior, da qual deve extrair, por derivação, a decisão para o 
caso concreto. 
Trata-se de uma advertência que permanece válida ainda quando se reco-
nheça que, ao limite, a própria definição desse marco normativo acaba sendo, 
também ela, um construído hermenêutico do aplicador do direito, como nos objetou, 
com total pertinência, Odim Brandão Ferreira. É que, no Estado de Direito, 
pata ser socialmente vinculante, sobretudo essas construções devem observar 
normas e critérios passíveis de controle pela comunidade. 
Daí se afirmar que uma opção apenas razoável ou simplesmente plausível, 
uma decisão que não se considere a melhor, embora seja passível de críticas 
segundo padrões de correção absoluta — a Dworkin, por exemplo 2 8 6—, mesmo 
assim não estará sujeita a desfazimento se, apesar disso, tiver sido adotada no 
marco das derivações possíveis e à luz dos critérios usuais de interpretação. 
284
 La interpretación de la ley y de los actos jurídicos, cit., p. 32-33. 
2 8 5
 Apud Karl Larenz, Metodología, cit., ed. de 1978, p. 367, nota 3. 
2 8 6
 Los derechos en serio, cit., p. 396 e s.; Conferencias de Ronald Duiorkín en Chile, Santiago: 
Corporación Nacional de Reparación y Reconciliación, 1994, p. 49-76. 
101 
É que — ainda relembrando Kelsen —, assim como da Constituição, atra-
vés de interpretação, não podemos extrair as únicas leis retas, tampouco pode-
mos, a partir da lei, por interpretação, obter as únicas sentenças corretas2 8 7. 
Esse, para nós, é o fundamento hermenêutico da Súmula 400 do STF, 
segundo a qual, sob o regime constitucional anterior a 1988, não se admitia 
recurso extraordinário contra decisão que desse razoável interpretação à lei, 
ainda que não fosse
a melhor, o mesmo valendo para a Súmula 343, ao estabelecer 
que não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, se a decisão 
rescindenda estiver baseada em texto legal de interpretação controvertida nos 
tribunais, uma interdição que subsistirá mesmo que a jurisprudência da Corte 
venha, posteriormente, a se fixar em sentido contrário 2 8 8. 
Apesar dessa orientação, e sem prejuízo de se reconhecer aos julgadores 
a prerrogativa ou, até mesmo, a obrigação de mudar de entendimento quando, a 
seu ver, melhores razões apontem para outra interpretação — afinal de contas, 
ensina Gadamer, a idéia de uma interpretação definitiva parece ser uma contra-
dição em si mesma, pois a interpretação é algo que está sempre a caminho, que 
nunca se conclui 2 8 9 —, mesmo assim ninguém imagina dispensar os operadores 
jurídicos da exigência de explicitar os motivos por que mudaram de opinião, 
nem tampouco de demonstrar que os seus argumentos sustentam a nova inter-
pretação, tanto à vista do caso que se está a decidir quanto de casos novos, da 
mesma espécie, que venham a surgir no futuro290. 
Por isso é que o abandono dos precedentes exige não apenas a explicação 
ordinária das razões de fato e de direito que fundamentem essa decisão, mas 
também uma justificação adicional dos motivos que levaram o intérprete a se 
afastar do critério anterior. Afinal de contas, quem resolve desprezar um prece-
dente, assume o ônus da argumentação, pois não parece sensato abandonar, sem 
melhores razões em contrário, um entendimento até então prevalecente2 9 1. 
Por tudo isso é que, ainda quando bem fundamentadas, as viragens de 
jurisprudência não invalidam nem questionam as interpretações adotadas no 
passado; apenas sinalizam que, doravante — tendo em vista alterações ocorridas 
na chamada situação normativa —, "a norma passa a vigorar no significado ou 
na modificação que a jurisprudência lhe deu"292. 
De outra parte, como as transformações sociais, de que decorrem as mudanças 
de jurisprudência, não se verificam da noite para o dia, muito embora, em certas 
2 8 7
 Teoria pura do direito, cit., v. 2, p. 292 . 
2 8 8
 Cf., no mesmo sentido, Súmula 134 do extinto T F R ; e Enunciado 83 do T S T . 
2 8 9
 Hans-Georg Gadamer, A razão na época da ciência, cit., p. 71 . 
2 9 0
 Karl Larenz, Metodologia, cit., ed. de 1978, p. 358 ; ed. de 1989, p. 3 7 8 . 
2 9 1
 Robert Alexy, Teoria de ¡a argumentación jurídica, cit., p. 265 ; Marina Gascón Abellan, 
La técnica del precedente y la argumentación racional, Madrid: Tecnos, 1993, p. 39-40 ; Aulis 
Aamio , Lo racional como razonable, cit., p. 260 . 
2 9 2
 Karl Larenz, Metodologia, c i t , ed. 1978 , p. 136; ed. de 1997, p. 4 9 5 - 5 0 0 . 
102 
épocas, possam adquirir maior velocidade, parece lícito concluirmos que, em razão 
do modo como se altera a realidade social, a escolha do caso ou do momento em 
que se deva atribuir um novo significado a determinado texto de lei encerra, em 
rigor, uma decisão discricionária dos intérpretes/aplicadores do Direito. 
Nessa perspectiva, pode-se dizer que os chamados leading cases são instan-
tes de viragem hermenêutica que, em certa medida, poderiam ser antecipados 
ou diferidos, como atesta, aliás, a experiência do chamado apelo ao legislador 
(Appellentscheidung), uma prática de que se utiliza a Corte Constitucional alemã 
quando se defronta com situações que, embora ainda sejam constitucionais, po-
dem vir a se tornar de todo inconstitucionais, se não forem adotadas as medidas 
legislativas que, pelo menos aos olhos do tribunal, se mostrem necessárias para 
a conjuração desse estado de patologia constitucional. Em palavras de Háberle, 
trata-se de decisões em que o tribunal estabelece uma "reserva de melhoria": 
o legislador deve "reconsiderar e, se possível, melhorar" a lei "não obstante 
constitucional"2 9 3. 
Finalmente, como derradeira condição do trabalho hermenêutico, cum-
pre assinalar o caráter unitário do processo em que ele se desenvolve, do que 
resulta considerarem-se as suas distintas fases como momentos necessários de 
uma unidade de compreensão, a exigir que todos os instrumentos hermenêuticos 
sejam integrados na tarefa de atribuir sentido às normas sob interpretação, in-
dependentemente da sua natureza e posição hierárquica no âmbito do sistema 
jurídico. 
Por isso, embora essa observação tenha sido feita em sede de interpretação 
constitucional, pode-se dizer, citando Canotilho, que atualmente a interpre-
tação de toda norma jurídica, e não apenas das normas constitucionais, é um 
conjunto de métodos e de princípios, desenvolvidos pela doutrina e pela jurispru-
dência com base em critérios ou premissas — filosóficas, metodológicas, epis-
temológicas — diferentes mas, em geral, reciprocamente, complementares294. 
Trata-se de uma realidade que, de resto, pode ser comprovada à luz do 
próprio direito positivo. Tal é o caso do Código Civil espanhol, cujo art. 4-1 
determina que as normas se interpretem segundo o sentido próprio das suas pala-
vras, em relação com o contexto, os antecedentes históricos e legislativos, e a realidade 
social do tempo em que devam ser aplicadas, atendendo-se, fundamentalmente, 
ao seu espírito e finalidade, regra hermenêutica que se completa com a previsão, 
no mesmo artigo, de que na aplicação dessas normas também se use a eqüidade, 
embora com a restrição de que decisões fundadas exclusivamente nesse critério 
dependem de expressa autorização legal 2 9 5. 
2 9 3
 Gilmar Ferreira Mendes, Jurisdição constitucional, c i t , p. 229-243 : Peter Hãberte, O recurso 
de amparo no sistema germânico, Sub]udice, p. 127, 2 0 0 1 . 
2 9 4
 J . J . Gomes Canoti lho, Direito constitucional, c i t , p. 1084-
2 9 5
 No direito brasileiro: L I C C , art. 5 S ; C P C , art. 127. 
103 
Pois bem, analisando esses preceitos legais no contexto do que chamou 
de racionalidade na produção e na aplicação do direito, Manuel Atienza observa 
que aí se contemplam cinco tipos ou momentos da interpretação, correspon-
dentes, respectivamente, a cinco níveis de racionalidade, que, a seu ver, balizam, 
igualmente, o trabalho do legislador — interpretação textual ou lingüística, 
sistemática, pragmática, teleológica, e ética ou valorativa —, formas ou técnicas de 
interpretação tão intimamente ligadas que cada uma pressupõe a anterior e, ao 
mesmo tempo, a ela se subordina, segundo determinado padrão de racionalidade. 
Em síntese, interdependência e complementaridade, sob a mesma e necessária 
racionalidade, não apenas entre os diferentes métodos, princípios, momentos 
ou espécies de interpretação, mas também entre legislação e jurisdição, entre 
produção e aplicação do direito 2 9 6. 
Sobre essa interdependência entre produção e interpretação de normas 
e com vistas a racionalizar a sua aplicação, de resto indispensável à plena 
realização do direito, merece análise a nossa Lei Complementar n. 95, de 
26-2-1998 — alterada pela Lei Complementar n. 107, de 26-4-2001 —, que 
dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, em 
cumprimento ao parágrafo único do art. 59 da Constituição. 
Pois bem, o que evidenciam os dispositivos desse diploma legal, especial-
mente os seus arts. 10, l i e 12, é que muito embora eles veiculem regras técnicas 
a serem observadas na feitura dos atos legislativos — elaboração, redação e alte' 
ração —, em verdade o que traduzem são exigências cujo prévio atendimento 
facilitará a futura compreensão, interpretação e aplicação dos comandos legais, 
dispensando os seus operadores de falácias como a do legislador racional, um 
topos argumentativo de que todo eles se valem para construir falsas premissas 
e, a partir delas, extrair conclusões que precisam ser verdadeiras... 
Sustentando, igualmente, a íntima conelação entre as regras tradicionais de 
interpretação, Friedrich Müller diz que elas
não podem ser individualizadas como 
métodos independentes entre si porque, desde o início do processo de concreti-
zação, manifestam-se não apenas complementando-se e apoiando-se reciproca-
mente, mas também enttelaçadas, materialmente, umas com as outras2 9 7. 
Apesar de importantes, essas observações não primam pela originalidade, 
porque há mais de século e meio o velho Savigny já advertia que os elementos 
gramatical, lógico, histórico e sistemático não constituem quatro classes distintas 
de interpretação, entre as quais se possa optar segundo o gosto ou o capricho, 
mas apenas quatro operações, diferentes embora, cuja integração é indispensável 
para o êxito da interpretação2 9 8. 
296
 Contribución a una teoría de la legislación, Madrid: Civitas, 1997, p. 9 5 - 1 0 0 . 
2 9 7
 Friedrich Müller, Métodos de trabalho do direito constitucional, Porto Alegre: Súrtese, 1999, 
p. 61 -69 , apud Karl Larenz, Metodología, c i t , ed. de 1989, p. 3 9 5 . 
298
 Sistema del derecho romano actual, 2. ed , Madrid: Centro Editorial de Gongora, s./d, t. 1, 
p. 188. 
104 
Como, por outro lado, não existe uma relação hierárquica fixa entre os 
diversos critérios de interpretação299, essa pluralidade de métodos, como acentua 
Martin Kriele 3 0 0, converte-se em "veículo da liberdade do juiz", o qual — em 
razão disso e até certo ponto —, acaba por escolher os meios em função dos 
fins, que, estimando corretos e justos, pretenda alcançar em cada caso. 
Tratando-se, porém, de uma liberdade objetivamente vinculada à correção 
e à justiça da decisão — atributos de testo passíveis de avaliação e controle ex-
ternos —, não deve o intérprete, contraditoriamente, partir de resultados precon-
cebidos e, para legitimá-los, afeiçoar a norma aos seus preconceitos, utilizando-se 
de uma pseudo-argumentação, pois, se agir assim, essa inversão do itinerário do 
raciocínio acabará desqualificando o seu trabalho e comprometendo a avaliação 
dos resultados como critério de controle da interpretação. 
Afinal de contas, uma coisa é a pré-compreensão do aplicador do direito ou a 
sua intuição do justo, que lhe insinuam a decisão final, legitimando, assim, a tese 
de Radbruch de que "a interpretação é o resultado do seu resultado"301; e outra, bem 
diversa, é a deliberada distorção de fatos e perspectivas, com o propósito de atingir 
objetivos que, sem esse desvio funcional, dificilmente seriam alcançados302. 
À vista dessa interdependência metodológica e da ausência de hierarquia 
entre os diversos procedimentos interpretativos — os quais se entrelaçam sob a 
idéia de que a decisão do caso concreto, para se reputar jurídica, há de ser correta 
e justa —, diante dessa nova realidade, perdeu sentido a velha disputa entre os 
chamados "métodos" de interpretação do direito, os quais devem ser utilizados 
em conjunto e complementarmente, em ordem a refletir a extrema complexidade 
do trabalho hermenêutico como atividade em que se fundem, necessariamente, 
a compreensão, a interpretação e a aplicação dos modelos jurídicos. 
4.3. Diretrizes para uma interpretação estrutural dos modelos jurídicos 
Adotada essa perspectiva integradora da atividade hermenêutica, uma 
abordagem que, de resto, decorre da unidade essencial da experiência jurídica, 
ganham relevo reflexões como as de Miguel Reale sobre as diretrizes de uma in-
terpretação estrutural, cujas notas distintivas ele sistematizou em conferência de 
homenagem ao septuagésimo aniversário de nascimento de Recaséns Siches 3 0 3. 
Considerando que o ordenamento jurídico é uma totalidade orgânica em 
perene dinamismo; que as regras de direito, como todo produto histórico-cultutal, 
encerram um motivo e um sentido consubstanciadores de certa intencionalidade; 
1 9 9
 Karl Larenz, Metodologia, c i t , ed. de 1978, p. 390 ; Hans Kelsen, Teoria pura do direito, c i t , 
v. 2, p. 290 . 
3 0 0
 Apud Karl Larenz, Metodologia, c i t , ed. de 1978, p. 394 . 
3 0 1
 Apud Josef Esser, Principio y norma, c i t , p. 150 e 326 . 
3 0 2
 Karl Larenz, Metodologia, c i t , ed. de 1978, c i t , p. 175, 328 e 394-398; ed. de 1989, p. 144. 
303
 Estudos de filosofia e ciência do direito, c i t , p. 72-82 . 
105 
e que, diante da correlação essencial entre ato normativo e ato hermenêutico, lhe 
parecia absurdo ter de optar entre dois termos que são complementares — o 
propósito inicial da lei e a sua possível adequação a valores e fatos supervenien-
tes —, Miguel Reale sustentou que chegara a hora de reformular a Tradicional 
compreensão da experiência normativa, para deixar de entendê-la como es-
trutura lógico-formal e passar a vivenciá-la em termos retrospectivos de fontes e 
prospectivos de modelos. 
Pois bem, em razão dessa nova compreensão da experiência normativa, 
operaram-se radicais mudanças nos domínios da hermenêutica jurídica, abando-
nándole os antigos métodos ou critérios de interpretação — que aprisionavam 
o aplicador do direito à estrita literalidade da lei —, para se adotarem pautas 
axiológicas mais amplas e flexíveis, não raro indeterminadas, que permitissem 
aos operadores do direito ajustar os modelos jurídicos às necessidades de um 
mundo cada vez mais complexo e, por isso, cada vez menos propício a toda forma 
de arrumaçãom. 
Na esteira dessa viragem hermenêutica, mesmo sob o risco de se comprome-
terem os valores da estabilidade e da segurança jurídicas, alguns dos autodeno-
minados juristas críticos — muitos deles ideólogos sem consciência dialética, que 
não conseguem apreender a síntese dos contrários, até porque os assemelham 
aos contraditórios —, alguns desses "pós-modemistas" chegaram a sugerir, sem 
maior exame, que se trocasse a interpretação da lei pela concretização do direito 
e as inegabilidades dogmáticas pelas aporias (u)tópicas 3 0 5. 
Nesse contexto de crise, as diretrizes para uma interpretação esttutural da 
experiência jurídica — no modo como apresentadas por Miguel Reale — con-
substanciam inegavelmente o mais completo inventário crítico das diferentes 
contribuições que foram sendo incorporadas à hermenêutica jurídica, um 
balanço a tal ponto abrangente que logrou retratar quase todas as correntes 
da teoria jurídica contemporânea, no particular aspecto das respostas que os 
3 0 4
 Sobre a interação entre complexidade do mundo e complexidade do Direito, ver Carlos 
María Cárcova, La opacidad del derecho, Madrid: Trotta, 1998, especialmente as p. 165-183. 
3 0 5
 Acerca da diferença entre interpretação e concretização, ver Ernst-Wolfgang Bõckenfõrde, 
Escritos sobre derechos fundamentales, Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1 9 9 3 , 
p. 126-127; sobre as inegabilidades da dogmática jurídica, Niklas Luhmann, Sistema jurídico 
y dogmática jurídica, Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1983, p. 27-42; e Karl 
Larenz, Metodologia, c i t , ed. de 1989, p. 272-277 . Sobre as aporias e as soluções tópicas, ver 
Theodor Viehweg, Tópica y jurisprudencia, Madrid: Taurus, 1964, especialmente a p. 49: "El 
término aporia designa precisamente una cuestión que es acuciante e ineludible, la 'falta de 
un camino', la situación de un problema que no es posible apartar, lo que Boecio tradujo, 
acaso débilmente, con la palabra latina 'dubitatio'. La tópica pretende suministrar datos para 
saber cómo hay que comportarse en una situación semejante a fin de no quedar detenido 
sin remisión. Es, por lo tanto, una técnica del pensamiento problemático". 
106 
juristas-filósofos entendetam adequadas para o problema do compreender 
enquanto dimensão essencial da existência humana 3 0 6. 
Pela importancia dessas diretrizes, por sua forma lapidar e para evitar sín-
teses deformadoras, vale a pena transcrevê-las integralmente, à guisa de fecho 
para esta parte das nossas reflexões: 
• a interpretação das normas jurídicas tem sempre caráter unitário, devendo 
as suas diversas formas ser consideradas

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