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CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA CURSO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS PROF. PAULO EMÍLIO IESB - DIREITO PENAL I – AULA XII CRIME CONSUMADO E TENTADO Crime Consumado Conceito: Na forma do art. 14, inciso I, diz- se consumado o crime quando foram realizados todos os elementos de sua definição legal. Exemplo: o crime de furto se consuma no momento em que o agente subtrai a coisa móvel alheia para si, ou seja, no exato momento em que o bem saiu da esfera de disponibilidade da vítima1. Iter criminis – é o caminho que se atravessa para a consumação de determinado crime e se divide em quatro trechos (ou fases): a) Cogitação – o agente apenas mentaliza, prevê, planeja, representa mentalmente a prática do crime. Nessa fase não há se falar em crime, uma vez que não se pune os atos 1 1 Exemplo de Fernando Capez, op. cit. p. 212. Na doutrina, a posição dominante é a de que a subtração, prevista no tipo penal de furto (art. 155, CP), ocorre quando o agente retira a res furtiva da esfera de vigilância do dono. psíquicos interiores, existentes somente na cabeça do agente (Pensiero non paga gabella, cogitationis poena nemo patitur). b) Preparação – é a prática dos atos anteriores e imprescindíveis para a execução do crime já idealizado pelo agente. O agente, todavia, ainda não começou a realizar a prática do crime por ele planejado, ou seja, a ação descrita no verbo constante da definição legal (núcleo do tipo). Nessa fase, portanto, ainda não há de se falar em início de execução do crime, podendo ocorrer que esses atos preparatório de um determinado crime constituam crimes autônomos. (Exemplo: a aquisição de arma de fogo é ato preparatório de um homicídio pretendido pelo agente e, assim, não se configura como início de execução daquele homicídio. Todavia, é de se ver que a aquisição da arma de fogo, pelo agente constitui outro crime autônomo, qual seja: o de porte ilegal de arma de fogo). No ensinamento de Maurach, ato preparatório é “aquela forma de atuar que crias as condições prévias adequadas para a realização de um delito planejado. Por outro lado, deve ir mais além do simples projeto interno (mínimo) sem que deva, por outro, iniciar a imediata realização tipicamente relevante da vontade delitiva (máximo)”. Ainda com relação a esta etapa do iter criminis devemos lembrar da disposição contida no art. 31 do Código Penal, in litteris: “o ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado”. c) Execução – é o início do ataque ao bem jurídico protegido. Fase em que o agente inicia a realização do núcleo do tipo, e o crime já se torna punível (ao menos na forma tentada). A doutrina, diante da dificuldade de traçar a exata fronteira entre a fase de preparação (impunível) e a fase de execução (já passível de punição, ao menos pela forma tentada, se não obtido o resultado por força de circunstâncias alheias à vontade do agente), estipulou-se que a execução do crime se inicia com a prática do primeiro ato idôneo e inequívoco para a consumação do delito. Assim, por exemplo, enquanto o ladrão perambular pela residência, sem iniciar a subtração do bem (iniciar a sua retirada da esfera de disponibilidade do proprietário), não se iniciou a execução do furto. Só há execução, portanto, quando praticado o primeiro ato capaz de conduzir ao resultado consumativo, sem dúvidas de que tal ato destinava-se à consumação (critério lógico- formal). d) Consumação – todos os elementos descritos no tipo foram realizados. TENTATIVA (CONATUS) Conceito: é a não-consumação de um crime, cuja execução fora iniciada, por circunstâncias alheias à vontade do agente. De acordo com o art 14, II do Código Penal, diz-se o crime: “II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente”. Assim, como ensina Ney Moura Telles2, ‘Tentativa de um crime é a execução inacabada, incompleta, do procedimento típico, por circunstâncias alheias à vontade do agente’. O artigo 14 é tido como norma de extensão temporal da figura típica, intermediária da adequação típica por subordinação mediata. Segundo Alberto Silva Franco, a tentativa caracteriza-se por ser um tipo manco, pois se de um lado o tipo subjetivo (dolo do agente) está completo (visando a consumação), o tipo objetivo não se realiza plenamente. Por esse mesmo motivo, Zaffaroni e Pierangeli, observaram que a tentativa ‘é um delito incompleto, de uma tipicidade subjetiva completa, com um defeito na tipicidade objetiva’. Os ELEMENTOS DA TENTATIVA são: - início de execução; - não-consumação; - interferência de circunstâncias alheias a vontade do agente. Quanto ao início de execução, cabe dizer que o nosso sistema jurídico-penal adotou o critério lógico-formal, uma vez que se entende que a execução se inicia somente com a prática do primeiro ato idôneo e capaz de ocasionar o resultado delitivo. No dizer de Capez3, ‘Além de idôneo (apto a consumação) o ato deve ser também inequívoco (indubitavelmente destinado à produção do resultado), de maneira que somente após iniciada a ação idônea e 2 In ‘Direito Penal – Parte Geral’, Ed Atlas, p. 210 3 Op. cit., p. 218 inequívoca, ou seja, o verbo do tipo, é que terá início a realização do fato definido no modelo incriminador (tem de começar a matar, a subtrair, a constranger, a falsificar e assim por diante, de acordo com a ação nuclear descrita no tipo)’. ESPÉCIES DE TENTATIVAS (segundo Fernando Capez): - Imperfeita – há interrupção do processo executório; o agente não chega a praticar todos os atos de execução do crime por circunstâncias alheias à sua vontade. - Perfeita (também conhecida por crime falho) – o agente pratica todos os atos de execução do crime, mas não o consuma por circunstâncias alheias à sua vontade. - Branca ou incruenta: Na tentativa do crime de homicídio, ocorre quando a vítima não vem a ser atingida, nem sofre qualquer ferimento. - Cruenta: Também ocorre no crime de homicídio, quando a vítima vem a ser atingida pelos disparos, ferindo-se. Há infrações penais que, por sua natureza, não admitem tentativa: - crimes culposos – neste caso, não é possível a tentativa, uma vez que os crimes culposos sempre apresentam resultado naturalístico indesejado. Assim, não há como se conceber crime culposo onde o agente quisesse atingir o resultado delitivo (característica de crimes dolosos); - crimes preterdolosos – nestes crimes, o resultado que qualifica o crime é sempre obtido por culpa do agente, sendo, pelos mesmos motivos do crime culposo, de impossível tentativa (ex. Lesões corporais seguidas de morte, art. 129, § 3º, CP); - contravenções penais – por expressa previsão, não admitem tentativa – art. 4º da LCP; - crimes para os quais a lei preveja a tentativa como crime já consumado. Ex. Art. 352, CP ‘evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa’. - crimes habituais – são aqueles em que a consumação somente se opera com a reiteração habitual do comportamento típico. Assim, não há como ocorrer a tentativa (Ex. Art 282. Exercício irregular da medicina) EFEITOS DA TENTATIVA. O Código Penal, adotando a teoria objetiva da tentativa, determina que a tentativa de crime seja punida de forma mais branda que a figura consumada (redução de 1/3 a 2/3 da pena cominada ao crime). É certo que, quanto mais próximo o agente chegar da consumação do crime, menor será a redução e vice-versa. DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZ “Art. 15 - O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados”. Conceito: São espécies de tentativa abandonada ou qualificada. O agente pretendia produzir o resultado consumativo, mas optou por mudar de idéia após iniciada a execução, vindo a impedir a ocorrência do resultado por sua própria vontade. No caso da desistência voluntária, o agente após iniciar a prática de alguns atos de execução, e podendo livremente prosseguir no seu intento criminoso, deliberadamente abandona a continuidade da execução. Ex. João, querendo matar Márcio, dá-lhe um tiro que atinge o braço e, contando com 12 projéteis remanescentes em sua pistola, por sua própria vontade, desiste de prosseguir no crime de homicídio. Na hipótese de arrependimento eficaz, o agente após a prática de todos os atos de execução do crime que desejava praticar, muda de idéia, se arrepende e implementa medidas para evitar a produção do resultado, o que ocorre de forma eficaz (impede a ocorrência do resultado). Ao contrário da tentativa, aqui o resultado típico não se perfaz por disposição volitiva do próprio agente, que impede sua ocorrência. Diverge a doutrina acerca da natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, defendendo alguns (Alberto Silva Franco, Luiz Régis Prado, et al.) tratar-se de causa de exclusão da punibilidade, conquanto outra banda da doutrina (Damásio, José Frederico Marques, Ney Moura Telles, et al) entende tratar-se de causa de exclusão da tipicidade da tentativa (relativa ou absoluta), fazendo com que o autor não responda pela tentativa, mas apenas pelos fatos típicos até então praticados (se os houver) (posição doutrinária que preferimos). No exemplo acima, João não responderia pela tentativa de homicídio, mas somente pela lesão causada no braço de Márcio. Elementos da tentativa abandonada: - início da execução; - não-consumação; - interferência da vontade do próprio agente. Difere, portanto, da tentativa porque aqui o resultado não se alcança pela própria vontade do agente. Se o agente não mata a vítima porque não consegue, é tentativa; se não mata porque mudou de idéia e abandonou a execução, é tentativa abandonada. Espécies de tentativa abandonada. - desistência voluntária. - arrependimento eficaz Desistência voluntária: o agente interrompe voluntariamente a execução do crime, impedindo, desse modo, sua consumação. Exemplo: o agente tem um revólver com seis projéteis. Desfere dois disparos e não atinge a vítima, podendo prosseguir na execução (desferir mais disparos contra a vítima), desiste por vontade própria e vai embora. Arrependimento eficaz: o agente, após encerrar a execução do crime, impede a produção do resultado. Nesse caso, não há interrupção da execução, mas posterior arrependimento do agente que, de forma eficaz, impede a ocorrência do resultado. Exemplo: o agente dispara três tiros na vítima, ferindo-a gravemente, mas, arrependendo-se do desejo de matar, presta-lhe imediato e eficaz socorro, impedindo o resultado letal. Só é possível nos crimes materiais, e não nos formais ou de mera conduta. Observação: Se o arrependimento é ineficaz (ou seja, não surte efeito) não se altera a situação, devendo o agente responder pelo crime praticado. Efeitos Em nenhuma dessas formas de tentativa abandonada atuam circunstâncias alheias à vontade do agente, ao contrário, é a sua própria vontade que impede a ocorrência do resultado. Assim, afasta-se a tentativa, vindo o agente somente a responder por atos típicos até então praticados. Desse modo, se o agente tencionava furtar bens no interior de uma residência e durante a execução vem a desistir da continuação da prática delitiva, só responderá pela violação ao domicílio praticada até aquele momento. Se, após atirar e ferir a vítima, presta-lhe eficaz socorro, que vem a impedir o resultado morte, só responderá pelas lesões corporais. ARREPENDIMENTO POSTERIOR. “Art. 16 - Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços”. Conceito: é causa obrigatória de diminuição de pena possível nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, em que o agente, voluntariamente, repara o dano ou restitui a coisa até o recebimento da denúncia ou queixa. Efeitos: A ocorrência do arrependimento posterior (realizado até o recebimento da denúncia ou queixa) conduz à redução da pena de 1/3 a 2/3. (Obs: Se o arrependimento ocorre após a denúncia ou queixa, há atenuante genérica prevista no art. 65, III, b) O objetivo do legislador foi o de estimular a reparação do dano nos crimes patrimoniais cometidos sem violência ou grave ameaça. Aplicação: as regras do arrependimento posterior aplicam-se aos crimes dolosos, culposos, tentados e consumados, simples, privilegiados ou qualificados, desde que não tenham sido cometidos com o emprego de violência ou grave ameaça. CRIME IMPOSSÍVEL O Art. 17 do Código Penal dispõe que: “Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime” Em alguns casos, o homem, desejando praticar um crime, utiliza-se de meios absolutamente ineficazes, o que impossibilita a sua consumação. Em outros, mesmo dispondo de meios eficazes, atua sobre objeto absolutamente impróprio. Em casos tais, o crime jamais se consumaria, motivo pelo qual se denominam, tais situações, crime impossível (ou também, tentativa inidônea ou tentativa inadequada). Assim, imagine-se o exemplo de A que pretendendo matar seu cunhado, B, busca o revólver, invade a casa do cunhado, onde o encontra deitado e nele dispara 6 (seis) tiros. Ocorre, todavia, que o cunhado, naquele momento, já havia morrido de fulminante ataque cardíaco que o acometera 30 minutos antes dos disparos. No exemplo, é fácil perceber que o crime de homicídio supostamente buscado por A não se consumou e sequer poderia ser punido a título de tentativa, pela absoluta impropriedade do objeto (não se pode matar, de forma alguma, que já está morto). Em outro caso, veja-se o exemplo de Carlos que, pretendendo matar seu desafeto, Arnoldo, apanha sua arma, sem saber que estava municiada com projéteis de festim, e dispara 5 tiros em direção a Arnoldo. Não responderá sequer por tentativa, uma vez que a munição de festim não é hábil a matar ninguém (ineficácia absoluta do meio). Observe-se que a ineficácia do meio (bem como a impropriedade do objeto) deve ser absoluta, se for meramente relativa, haverá a tentativa. Assim, por exemplo, se a munição de arma é hábil, mas no caso não deflagrou o disparo, haveria, ainda, assim, a tentativa. A doutrina divisa alguns casos em que há crime impossível, quais sejam: - Delito putativo por erro de tipo (ou crime putativo): o sujeito quer praticar um crime, mas, devido ao desconhecimento da situação de fato, comete um irrelevante penal (exemplo é o da mulher que supondo-se grávida, ingere substância abortiva, ou o da pessoa que imagina transportar cocaína para outro Estado da Federação, mas, em verdade, transporta polvilho). Tais delitos constituem-se crimes impossíveis pela impropriedade absoluta do objeto. - Delito putativo por obra do agente provocador: ocorre nos casos em que um terceiro (ou a polícia) – agente provocador – prepara uma situação em que se induz o agente a cometer o delito. São casos de flagrante preparado, onde o agente participa de uma farsa, onde só ele desconhece ser impossível a consumação do crime (ex. investigadora grávida se submete a cirurgia abortiva criminosa para prender o médico). Por tal motivo a jurisprudência pátria entende ser espécie de crime impossível (Súmula 145/STF). Segundo Capez4, “o elemento subjetivo do crime existe, mas, sob o aspecto objetivo, não há, em momento algum, qualquer risco de violação do bem jurídico, senão uma insciente cooperação para a ardilosa verificação da autoria de crimes anteriores” STF/ SÚMULA 145 – “NÃO HÁ CRIME, QUANDO A PREPARAÇÃO DO FLAGRANTE PELA POLÍCIA TORNA IMPOSSÍVEL A SUA CONSUMAÇÃO”. Observação: Entende-se que somente o flagrante preparado convola-se em crime impossível. O flagrante esperado, ou seja, aquele em que a autoridade policial tem notícia 4 op. cit. v. I, p. 230 da realização futura de crime e se coloca a esperar sua consumação para efetuar a prisão dos envolvidos não figura hipótese de crime impossível; Em todos os casos, todavia, é de se ver que nosso Código Penal adotou a teoria objetiva temperada para os crimes impossíveis de modo que a mera intenção (subjetiva) não é suficiente para ensejar a punição do agente, sendo necessária a exigência de risco objetivo de lesão ao bem jurídico protegido o que, nas hipóteses do art. 17, não ocorre.